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PNEUMONIA NA PEDIATRIA

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Luana Jucá – Medicina (TXIV/UNINORTE)
CONCEITO
O termo pneumonia tem sua origem no grego e significa “inflamação dos pulmões”. É uma inflamação do tecido pulmonar causada, geralmente, por um agente infeccioso. A pneumonia é uma das principais causas de mortalidade em crianças fora do período neonatal. Sua prevalência tem diminuído nos últimos anos principalmente devido à implementação de vacinas contra S. pneumoniae e H. influenzae tipo b(1, 2)
A pneumonia neonatal refere-se à infecção pulmonar no neonato. Pode ter início nas primeiras horas de vida e fazer parte de uma síndrome septicêmica generalizada ou aparecer após 7 dias, limitada aos pulmões. Os sinais podem ser restritos a uma disfunção respiratória ou evoluir para choque e morte(3). 
EPIDEMIOLOGIA
A pneumonia é a causa mais comum de mortes em bebês e crianças menores de cinco anos, sendo responsável por 15% dos óbitos(1, 4). Conforme o departamento de informática do Sistema Único de Saúde do Brasil (DATASUS), entre março de 2021 a março de 2022, ocorreram 118.040 internações de menores de 9 anos referentes a quadros de pneumonia(5).
Desse dado, 96,5% dos atendimentos foram urgentes; quase 86% das crianças tinham menos de 5 anos; 54,8% eram do sexo masculino e a maioria das internações ocorreram nos meses de outubro, novembro e dezembro(5).
ETIOLOGIA
A identificação da causa da PNM é importante para guiar o tratamento, para desenvolver recomendações clínicas para tratamento empírico e para avaliar o impacto de intervenções preventivas (vacinas). Entretanto, não é simples definir a etiologia da PNM porque a doença pode ter múltiplos patógenos, pois bactérias raramente invadem sítios estéreis (sangue) e porque é difícil distinguir flora colonizante de organismos patogênicos (testes moleculares). É difícil conseguir amostra representativa da via aérea inferior e é provável que haja contaminação com S. pneumoniae e H. influenzae, que são bactérias patogênicas, mas, ao mesmo tempo, colonizantes da via aérea superior(6).
Assume-se que o S. pneumoniae seja o agente mais frequentemente associado à PNM bacteriana, responsável por 1/3 dos casos(7). Outros patógenos são: H. influenzae,M. catarrhalis,S. aureus e estreptococo do grupo A. Estes dois últimos evoluem mais frequentemente para quadros graves e/ou empiema(8,9).
Os vírus são uma causa importante de pneumonia em crianças menores (< 2-5 anos), sendo o vírus sincicial respiratório o principal agente. Outros patógenos são: rinovírus, influenza, parainfluenza, adenovírus, varicela vírus, citomegalovírus, enterovírus, herpes, metapneumovírus, bocavírus e coronavírus. Cerca de 1/3 a 45% dos casos podem cursar com coinfecção bacteriana, sendo o S. pneumoniae a bactéria mais frequentemente envolvida(6,8,10). Na Tabela 1, encontram-se os principais patógenos associados à pneumonia de acordo com a faixa etária(11).
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O quadro clínico da pneumonia infantil pode variar conforme a idade, o estado nutricional, presença de doença de base e o agente etiológico. Classicamente os sinais e sintomas são(1, 4).
· Febre de início agudo;
· Taquipneia e dispneia;
· Tosse.
A febre nem sempre estará presente nos lactentes com infecção por Chlamydia trachomatis, Bordetella pertusis ou Ureaplasma(1). Os menores de 5 anos costumam apresentar pródromos (febre baixa e rinorreia) devido a infecção viral prévia em via aérea superior(4). 
Quais são os sinais de gravidade? Quando está indicada a internação?
A gravidade da pneumonia em lactentes e crianças é predominantemente avaliada por critérios clínicos. Após o diagnóstico de PAC, a presença dos sintomas abaixo, em ordem crescente de gravidade, são critérios para classificação como pneumonia grave(12):
· Tiragem subcostal 
· Dificuldade para ingerir líquidos
· Sinais de dificuldade respiratória mais grave (movimentos involuntários da cabeça, gemência e batimentos de asa do nariz) 
· Cianose central(12)
DIAGNÓSTICO
CLÍNICO: Vários sinais e sintomas foram descritos em casos Pneumonia e são dependentes da idade da criança, da extensão do acometimento e gravidade do quadro. Tosse, febre, respiração rápida (taquipneia), presença de retrações do tórax (tiragens subcostais), estertores finos (crepitações), dor torácica, hipoxemia e sintomas sistêmicos associados fazem parte deste grupo. Na criança com sinais de infecção respiratória aguda como febre e tosse, a frequência respiratória (FR) deverá sempre ser avaliada (Quadro 1). Na ausência de sibilância, as crianças com taquipneia podem ser diagnosticadas com PAC(13).
A presença de sibilância tem sido o sinal clínico apontado pelo AIDPI (Atenção Integrada às Doenças Prevalentes da Infância) – como o principal achado que diferencia as demais condições da PAC, uma vez que a presença de sibilos na pneumonia não é comum (Quadro 2). Importante ressaltar que diante de sinais de gravidade como tiragem subcostal, dificuldade para ingerir líquidos e gemência a abordagem deve ser imediata(13).
RADIOGRAFIA: A radiografia de tórax não deve ser realizada de rotina para o diagnóstico de pneumonia em crianças sem sinais de gravidade, sem necessidade de tratamento hospitalar, uma vez que não há evidências que altere o resultado clínico. Deve ser realizada nas seguintes situações(14): 
· Se há dúvida de diagnóstico, embora radiografia normal não exclua pneumonia e radiografia anormal pode ser interpretada como normal; 
· Pneumonia com hipoxemia, desconforto respiratório, entre outros sinais de gravidade;
· Falha de resposta ao tratamento em 48 a 72h ou se piora progressiva, para verificar se há complicações (empiema, pneumotórax, escavação); 
· Paciente hospitalizado (PA e perfi l). A radiografia de tórax não deve ser realizada após tratamento de pneumonia com boa resposta clínica(14).
Em que situações deve-se realizar radiografia de controle após o tratamento? 
· Após 4 a 6 semanas, se história de pneumonias recorrentes, sempre no mesmo lobo; suspeita de malformação ou aspiração de corpo estranho; 
· Deve ser considerado nos casos de pneumonia redonda, presença de colapso pulmonar e/ou sintomas persistentes(14).
EXAMES LABORATORIAIS: Quadro clínico compatível é suficiente para formular a hipótese diagnóstica de pneumonia. Entretanto, exames complementares podem auxiliar o processo diagnóstico. Na busca pelo agente etiológico, a hemocultura é recomendada para todos os pacientes hospitalizados por PAC. Por sua vez, a pesquisa viral em secreções respiratórias é sensível para a investigação da etiologia, além de ser um exame pouco invasivo(15).
No derrame pleural, quando possível, o exame bacteriológico (bacterioscópico e cultura) pode ser de utilidade na identificação da etiologia(15).
A relação entre a proteína total e a desidrogenase lática (LDH) do líquido pleural e do plasma é importante no diagnóstico diferencial entre exsudato e transudado. O teste de aglutinação do látex para a pesquisa de antígenos do pneumococo e do H. influenzae tipo b no líquido pleural ou urina, inclusive até cerca de cinco dias após o início de antibióticos, é outro recurso que pode ser empregado. Na suspeita de infecção por Mycoplasma pneumoniae, a sorologia é recomendada, considerando-se que a IgM eleva-se em sete a dez dias após o início do processo e a IgG deve quadruplicar em uma segunda coleta com intervalo de duas a três semanas, ou cair na mesma proporção caso o paciente seja avaliado na fase de resolução. Quando a dúvida recai sobre a Chlamydia sp, a pesquisa de anticorpos IgM ou IgG também está indicada(16).
Testes inespecíficos, como as dosagens de proteína C-reativa, procalcitonina, velocidade de hemossedimentação e contagem de leucócitos, têm valor limitado na presunção da etiologia da PAC, podendo sugerir infecção bacteriana quando os valores forem muito elevados, aparentemente, acima do percentil 90 ou mais. Na infecção por Chlamydia trachomatis a presença de eosinofilia é frequente. A PCR (reação em cadeia da polimerase) pode ser de utilidade no diagnóstico de determinados agentes etiológicos. Nos casos hospitalizados, commá evolução, podemos utilizar métodos mais invasivos como broncoscopia ou biópsia pulmonar(16).
TRATAMENTO
O tratamento inicial com antibióticos em geral é empírico, pois o isolamento do agente infeccioso não é sempre realizado e pode demorar. Baseia-se no conhecimento dos principais agentes infecciosos em cada faixa etária, situação clínica e região(2).
A amoxicilina é a primeira opção terapêutica no tratamento ambulatorial, sendo recomendada para o tratamento das PAC em crianças de dois meses a cinco anos, na dose de 50 mg/kg/dia de 8 em 8 horas ou de 12 em 12 horas. Em crianças maiores de cinco anos a droga de escolha também é amoxicilina nas mesmas doses. Devido à possibilidade de M.pneumoniae pode-se optar pela introdução de macrolídeos (pneumonia atípica), como eritromicina, claritromicina ou azitromicina(1).
Toda criança com pneumonia, que tenha condições clínicas de ser tratada em seu domicílio deve ter uma consulta de reavaliação agendada após 48 a 72h do início do tratamento ou a qualquer momento se houver piora clínica. Caso apresente melhora, o tratamento deve ser mantido até completar sete dias. Por outro lado se a criança estiver pior ou inalterada cabe avaliar internação hospitalar(4).
Qual é o antibiótico de escolha para o tratamento hospitalar? 
As recomendações da OMS para crianças de dois a 59 meses de idade aplicáveis para a nossa realidade são(17): 
1. Pneumonia sem tiragem subcostal deve ser tratada com amoxicilina oral: 50 mg/kg/dia duas ou três vezes ao dia, durante sete dias. 
2. Pneumonia grave deve ser tratada com ampicilina parenteral 50mg/kg/dose, de 6 em 6 horas ou penicilina cristalina 150 000U/Kg/ dia a cada 6 horas. Gentamicina 7,5 mg/kg/ dia, a intervalos de 12 horas, deve ser associada nos menores de dois meses. 
3. A associação de amoxicilina com inibidores de beta-lactamase, como o clavulanato ou o sulbactam ou a cefuroxima podem ser utilizadas como segunda opção por via oral ou parenteral em doses habituais. 
4. Na suspeita de pneumonia atípica recomenda-se azitromicina 10mg/kg/dia dose única por 5 dias ou claritromicina 7,5 mg/kg/dose, 12 em 12 horas, por 10 dias(17).
COMPLICAÇÕES
Em crianças, o Derrame Pleural é a complicação mais frequente da PAC bacteriana. No Brasil ocorre em aproximadamente 40% das crianças hospitalizadas por PAC. Pode ser definido como o acúmulo de líquido no espaço pleural resultante de desequilíbrio das forças que regulam a formação e reabsorção do líquido pleural ou de eventos patológicos na pleura. O DP infeccioso é um sinal de complicação de quadro pneumônico e é chamado DP parapneumônico (DPP). Seu reconhecimento precoce permite definir a melhor forma de tratamento, visando reduzir os riscos de morbidade e de mortalidade(4).
Os DPP são exudatos que resultam da reação inflamatória da pleura. Iniciam-se como exudato reacional, de aspecto claro, não viscoso, com baixa celularidade e sem bactérias, com valores baixos de pH, desidrogenase láctica (LDH) e glicose. Se o processo não for controlado, o DP pode se tornar complicado, com o aumento do volume de líquido, da celularidade pleural, da LDH e queda acentuada do pH, podendo evoluir para empiema pleural(7).
A pneumatocele é uma cavidade pulmonar de paredes finas que pode ser complicação da PAC de qualquer etiologia. Embora seja mais caracteristicamente causada por estafilococos, nota-se sua maior frequência nas PAC por Streptococcus pneumoniae(7).
A pneumonia necrotizante ou necrosante pode se desenvolver como resultado de necrose alveolar ou bronquiolar localizada. Embora Streptococcus pneumoniae seja o principal agente etiológico, outras bactérias, como Staphylococcus aureus e anaeróbios, podem estar envolvidas(10). 
PREVENÇÃO
A introdução da vacina 10-valente reduziu a incidência, a hospitalização e a mortalidade por pneumonia pneumocócica no Brasil. Este efeito é visto não só nas crianças vacinadas, mas também na comunidade em geral, o que pode ser explicado pela redução na colonização da via aérea da população(18,19).
As vacinas contra H. influenzae,B. pertussis, influenza e sarampo igualmente causam impacto na prevenção de pneumonia na infância. A pneumonia bacteriana é uma complicação comum do sarampo (S. pneumoniae é o agente mais comumente isolado), sendo importante causa de morte pela doença(20,21).
VALORES NORMAIS DE FREQUÊNCIA CARDÍACA E HEMOGRAMA COMPLETO
REFERÊNCIAS:
1. de Pneumologia (2019-2021), D. C. (2021). Abordagem Diagnóstica e Terapêutica das Pneumonias Adquiridas na Comunidade Não Complicadas. Acesso em: 30 de Abril de 2023. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/23054d-DC-Pneumonias_Adquiridas_Nao_Complicadas.pdf
2. Schafer S, Chakr V, Petitot G. Pneumonias comunitárias não complicadas em crianças imunocompetentes. Resid Pediatr. 2019;9(3):265-269. Acesso em: 30 de Abril de 2023. DOI: 10.25060/residpediatr-2019.v9n3-12
3. Gabriel LP, Aurilio RB, Sant’Anna CC. Perfil clínico e radiológico de crianças internadas com pneumonias complicadas. Resid Pediatr. 2022;12(3). Acesso em: 30 de Abril de 2023. DOI: 10.25060/residpediatr-2022.v12n3-426
4. Pediatria, S.B. D. (2021). Tratado de pediatria (volume 2) (5th edição). Editora Manole.
5. DATASUS – Ministério da Saúde. June 4, 2022. Acesso em: 30 de abril de 2023. Disponível em: https://datasus.saude.gov.br
6. Zar HJ, Andronikou S, Nicol MP. Advances in the diagnosis of pneumonia in children. BMJ. 2017 Jul 26;358:j2739. 
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8. Marostica P, Stein R. Community-Acquired Bacterial Pneumonia. In: Wilmott RW, Deterding RR, Boat TF, Bush A, Chernick V, Deterding RR, Ratjen F, eds. Kendig & Chernick’s Disorders of the Respiratory Tract in Children: Philadelphia: Elsevier Saunders; 2012. p. 461-72.
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18. Moreira M, Cintra O, Harriague J, Hausdorff WP, Hoet B. Impact of the introduction of the pneumococcal conjugatevaccine in the Brazilian routine childhood national immunization program. Vaccine. 2016 May 27;34(25):2766-78.
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