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Unidade 3 Livro Didático Digital Éderson da Cruz Metodologia do Ensino da Arte Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Gerente Editorial CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA Projeto Gráfico TIAGO DA ROCHA Autor ÉDERSON DA CRUZ O AUTOR Éderson da Cruz Olá. Meu nome é Éderson da Cruz. Sou formado em Letras-Português (UNISINOS, 2010), Mestre e Doutor em Educação (UNISINOS, 2015; 2019), Especialista em Gestão Escolar – Orientação e Supervisão (Faculdade São Luís, 2017) e Pedagogo (UFRGS, 2020), com uma experiência técnico profissional nas áreas de Letras, Linguagens e Educação de mais de dez anos. Passei por instituições públicas (estaduais e municipais) e privadas, de Educação Infantil, Ensinos Fundamental e Médio, Ensino Técnico e Ensino Superior, no estado do Rio Grande do Sul, atuando como docente e também como supervisor escolar. Sou apaixonado pelo que faço e adoro transmitir minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas profissões. Por isso, fui convidado pela Editora Telesapiens e integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Neste material, estudaremos os fundamentos do ensino da Arte. Você verá que a arte, além de uma forma de expressão, é um campo de saber muito rico e conectado com nossa realidade de diferentes formas, possibilitando o gosto estético e também o repensar e realidade e a forma como percebemos o mundo que nos cerca. Vamos nessa? Conte comigo para o que precisar. Bons estudos! ICONOGRÁFICOS Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: INTRODUÇÃO: para o início do desenvolvimento de uma nova compe- tência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de se apresentar um novo conceito; NOTA: quando forem necessários obser- vações ou comple- mentações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser priorizadas para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofundamen- to do seu conheci- mento; REFLITA: se houver a neces- sidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou dis- cutido sobre; ACESSE: se for preciso aces- sar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso se fazer um resumo acumulativo das últi- mas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma atividade de au- toaprendizagem for aplicada; TESTANDO: quando o desen- volvimento de uma competência for concluído e questões forem explicadas; SUMÁRIO Arte e inclusão ............................................................................................. 12 A arte, a inclusão e o papel do docente ........................................................................ 12 Arte, inclusão e legislação ...................................................................................................... 13 Fases do desenvolvimento da criança – desenho .............................. 15 A Arte e a deficiência visual .................................................................................. 18 A Arte e a deficiência física ................................................................................... 19 A Arte e a deficiência auditiva ............................................................................ 20 Reflexões acerca da metodologia do ensino da arte ..................22 A organização dos conteúdos no ensino da Arte ....................................................23 A avaliação em Arte .......................................................................................................................24 Artes visuais .........................................................................................................................................26 Música ..................................................................................................................................27 Teatro ....................................................................................................................................28 Dança ....................................................................................................................................28 Formas de avaliação ....................................................................................................................29 Autoavaliação .....................................................................................................................................29 Docência da disciplina “Arte” .................................................................32 Sociedade do futuro ou do presente? .............................................................................32 O fazer arte como um exercício de experimentação ....................... 36 O professor e o ensino da Arte ..............................................................................................37 Dificuldades enfrentadas pelo professor de Arte ................................................. 39 A arte como produto da cultura e da diversidade ........................43 O que é diversidade? ....................................................................................................................43 A construção da diversidade sociocultural na sociedade ................................45 O que é cultura? ............................................................................................................45 Regras culturais ............................................................................................................................... 48 A Arte como um produto da diversidade e da cultura ........................................ 51 9 LIVRO DIDÁTICO DIGITAL UNIDADE 03 Metodologia do Ensino da Arte 10 INTRODUÇÃO Mas o que será que diferencia a arte das demais atividades humana? De modo geral, arte é técnica. Porém, funções do dia a dia também exigem uma técnica. Também podemos dizer que arte é linguagem. Mas, por exemplo, uma notícia não é artística e também é linguagem. Podemos dizer que a arte também é aquilo que nos toca. Mas... tragédias da vida real também podem nos tocar! Percebe como definir arte pode ser fácil e complicado ao mesmo tempo? Se nós, pessoas com experiências de vida mais plurais, temos essa dificuldade, imagine, então, numa sala de aula! Metodologia do Ensino da Arte 11 OBJETIVOS Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 3. Nosso propósito é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes objetivos de aprendizagem até o término desta etapa de estudos: 1. Associar arte e inclusão; 2. Investigar a metodologia do ensino da arte 3. Descrever a docência da disciplina “Arte”. 4. Identificar a arte como produto da cultura e da diversidade. Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Metodologia do Ensino da Arte 12 Arte e inclusão INTRODUÇÃO: Ao término desse capítulo, você será capaz de compreender que o ensino de arte é um tema democrático e abrangente, que pode ser trabalhado conforme as especificidades de cada aluno e sujeito envolvido. Isso também está em consonância com as principais diretrizes da educação brasileira. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 1 Fonte: Pixabay A arte, a inclusão e o papel do docente Um aspecto muito importante ao profissional que pretende atuar nos anos iniciais do Ensino Fundamental é a questão inclusiva. Na atualidade, todo professor, independentemente do nível de ensino que atue, encontrará em maior ou menor escala, alunos “de inclusão” Metodologia do Ensino da Arte 13 com alguma forma de dificuldade considerada especial e, paras isso, é importante que estejamos preparados. No ensinoda Arte não é diferente, pois sempre estamos sujeitos a encontrar alunos diferentes, que necessitarão de uma atenção especial do docente. Por este motivo, destinamos um espaço desta unidade para refletir sobre o ensino de Arte para as crianças com necessidades especiais. De modo geral, não com o objetivo de rotular, preconceituar ou segregar, as crianças com necessidades especiais são caracterizadas por serem portadores de alguma forma de limitação que requer certas modificações ou adaptações em seu programa educacional, a fim de que possa atingir seu potencial ao máximo. SAIBA MAIS: Você pode ampliar sua compreensão sobre o ensino de arte numa perspectiva inclusiva assistindo ao documentário: Inclusão-Arte, no link: <https://bit.ly/2HpMlld> . Acesso em: 24 mar., 2020. Arte, inclusão e legislação A legislação educacional brasileira, bem como as principais diretrizes que orientam a organização dos currículos de forma inclusiva, abrangendo o ensino de Arte. Porém, essa é abordada sob a perspectiva de quatro blocos, a saber: artes visuais, música, teatro e dança. Você, caro aluno, já se perguntou como trabalhar, por exemplo, artes visuais com um deficiente visual? Ou ainda, música, teatro e dança com deficientes físicos e auditivos? Será que isso é possível? Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LEI nº 9394/96), em seu capítulo dedicado para tratar somente da educação especial, Metodologia do Ensino da Arte 14 A modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas do aluno, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. (BRASIL, 1996) Pode-se perceber que a Lei estipula como prioridade a inclusão do aluno em classes regulares, e por isso, se torna tão necessário que todos os professores, atualmente e futuramente em sala de aula, conheçam esse assunto. A atualidade se caracteriza, entre outros aspectos, pelo contato com imagens, luzes e cores em quantidade impensável séculos antes. A criação e a exposição a uma multiplicidade de manifestações visuais geram a necessidade de uma educação para saber ver, perceber e distinguir diversos fatores, como: sentimentos, sensações, ideias e qualidades contidas nas formas e nos ambientes. Uma das habilidades artísticas que podem ser trabalhadas com os alunos inclusivos é o desenho, que pode ser considerada a principal linguagem artística infantil, pois independe até mesmo da existência de um mediador adulto. Essa manifestação é espontânea e só depende de recursos materiais disponíveis, não necessariamente sofisticados, apenas papel e lápis. Já nos primeiros anos de vida, antes mesmo da criança registrar a sua existência por meio de outras linguagens, ela se expressa, já no período sensório-motor, por meio das primeiras garatujas (rabiscos Metodologia do Ensino da Arte 15 desordenados) que cria, que representam suas capacidades, habilidades e potencialidades. Há dois autores, Lowenfeld e Brittain (1971), que sintetizaram as etapas de desenvolvimento do desenho infantil, em sua obra “Desenvolvimento da capacidade criadora”. Traremos, a seguir, alguns elementos abordados pelos autores, que podem ser pensados numa perspectiva inclusiva. Fases do desenvolvimento da criança – desenho Num primeiro momento de vida, as crianças começam a rabiscar para representar o imediato, o próximo, o “aqui” e o “agora”. Essa fase é chamada de “Fase das Garatujas”, em que a criança começa a descobrir a relação entre o desenho, o pensamento e a realidade, que vai dos 2 (dois) aos 4 (quatro) anos de vida, aproximadamente. A criança, inicialmente, realiza um determinado movimento sem qualquer significado, apenas para fixar, através da repetição, os movimentos manuais. (LOWENFELD, 1971) Pouco a pouco, a criança passa a dar significados aos seus desenhos, nomeando-os. Por volta dos 5 (cinco) anos de idade, começam a surgir, no desenho das crianças, algumas formas fechadas (semelhantes a círculos), organizadas de acordo com determinados preceitos (dentro/ fora, em cima/ embaixo). Essas formas fechadas são conquistadas pelas crianças em sua fase de desenvolvimento chamada de “pré-esquemática”. Entre os 7 (sete) e 12 (doze) anos, aproximadamente, a criança entra na fase “esquemática”, caracterizada pela utilização de linhas geométricas e de formas esquemáticas. A figura é representada com exagero em partes que a criança considera importantes e com omissão ou esquecimento de outras partes sentidas como irrelevantes. As cores utilizadas buscam corresponder às cores reais dos objetos e das coisas. Entre os 9 (nove) e 11 (onze) anos, começa a se delinear o realismo. A criança se afasta dos esquemas e das linhas geométricas, passando a se preocupar com detalhes, como a diferenciação entre masculino e Metodologia do Ensino da Arte 16 feminino, com a caracterização dos vestuários, dentre outros aspectos. (LOWENFELD, 1971) Dependendo do grau de dificuldades de aprendizagem, as crianças com necessidades especiais podem (ou não) seguir as etapas anteriormente apresentadas e, se assim for, isso acontecerá de uma forma diferenciada, mais lenta, podendo não seguir “ao pé da letra” a descrição realizada nas páginas anteriores. Quando trabalhamos por crianças portadoras de necessidades especiais, precisamos levar em consideração a necessidade de um espaço físico que seja adequado, bem como oferecermos estímulos e liberdade para que manipulem instrumentos e objetos e para que movimentem seu próprio corpo, desenvolvendo-se e descobrindo o mundo ao seu redor. Dessa forma, a escola deve contribuir para que todos os alunos passem por um conjunto amplo de experiências voltadas à criação e à aprendizagem, para que articulem a percepção, a sensibilidade, o conhecimento e a produção artística, de forma individual e coletiva. Ao perceber e ao criar formas visuais, estamos trabalhando com elementos específicos da linguagem e suas relações em espaços bidimensionais (imagens planas) e tridimensionais (objetos com altura, largura e profundidade). Elementos como ponto, linha, cor, plano, luz, textura, movimento e ritmo relacionam-se, dando origem a códigos, representações e sistemas de significações. A Arte também pode ser utilizada para auxiliar no desenvolvimento das habilidades e das capacidades de um portador de necessidades especiais, pois, por meio dela, esse indivíduo construirá suas próprias representações ou ideias e as transformará ao longo do desenvolvimento, à medida que avança no processo educativo. Um ensino diferenciado pode ajudar os alunos especiais de várias maneiras. Deste modo, a Arte, segundo Lowenfeld (1971): • Deve propiciar, por ser uma linguagem natural, atividades que proporcionem a observação, exploração, associação, comparação, imaginação, reprodução, simbolização e expressão por meio das formas, cores, planos, espaços e texturas; Metodologia do Ensino da Arte 17 • Estimula, por meio de exercícios de pintura, a realização e também o controle de movimentos específicos. A prática da arte pode facilitar a organização pessoal e os pensamentos; já as atividades em grupo auxiliam a desenvolver a cooperação, a comunicação com os outros, além de ofertarem oportunidades interpessoais; • Não deve instigar a competição, ela é essencialmente individual, pois não há pontos que serão disputados, entre oponentes, não há jogos a serem ganhos ou perdidos. Por outro lado, a própria atividade artística pode ser compartilhada entre muitas pessoas. A Arte pode influenciaras seguintes situações: • Durante a realização de atividades artísticas, a criança especial pode vivenciar, de forma natural, situações que a encorajem a ampliar seus limites físicos e mentais; • Após certo tempo de práticas artísticas, a criança especial poderá começar a controlar e a dirigir suas emoções. O professor, através da escolha cuidadosa de atividades artísticas, pode encorajar a criança a utilizar certos movimentos e mostrá-la que diferentes movimentos resultam em diferentes sinais no desenho e no espaço. Veja, caro aluno, que as crianças podem vir a aprender por meio de atividades artísticas simples, como a manipulação de materiais variados, identificando semelhanças e diferenças de texturas, formas e tamanhos. Todos os sentidos do corpo humano são passíveis de nos transmitirem sensações diversas, sejam elas agradáveis ou desagradáveis, mas essas sensações dependem não só da relação com o objeto de concentração, mas também das aptidões receptivas de cada indivíduo. Por isso, independente de sua deficiência, o portador de necessidades especiais usará a Arte por algum dos seus sentidos. (LOWENFELD, 1971) A seguir, abordaremos o ensino da Arte relacionado às deficiências com maior número de indivíduos, a saber: deficiência visual, deficiência auditiva e deficiência física. Metodologia do Ensino da Arte 18 A Arte e a deficiência visual De início, você pode achar impossível, uma vez que a característica da deficiência visual é a ausência de ou a baixa visão. Porém, os deficientes visuais são muito mais sensíveis às artes do que as pessoas podem pensar. Pelo fato de não enxergarem, eles desenvolvem mais apuradamente os outros sentidos, o que lhes permite uma melhor compreensão das sensações visuais, ainda que isso pareça um tanto paradoxal. É primordial para o deficiente visual, como também para a criança que não apresenta esse tipo de deficiência a ação sobre as coisas, para conhecê-las, formar as imagens e interioriza-las, evocando-as, desse modo, quando necessário e expressando-as por meio de diversas linguagens. Quanto mais experiências propiciadas, mais “imagens” de coisas, pessoas e situações vão sendo delineadas com clareza. O desempenho do deficiente visual é mais lento na seleção de elementos úteis para formar imagens. O aluno que é deficiente visual, por meio da exploração dos canais expressivos relacionados às experiências sinestésicas e táteis, conseguirá realizar a decodificação, a interpretação e a reprodução de ideias, imagens e objetos. Grande parte dos projetos artístico educacionais, com vistas à inclusão, apresentam preocupação com os portadores de necessidades especiais. Atualmente, já encontramos, em museus, preparação para deficientes visuais os visitarem – as visitas monitoradas. SAIBA MAIS: Você pode ampliar seus conhecimentos e fomentar ideias assistindo ao vídeo “Deficiência visual e arte”, disponível em: < https://bit.ly/2HgmUTD>. Acesso em: 24 mar., 2020. Metodologia do Ensino da Arte 19 A Arte e a deficiência física A arte, para o deficiente físico – por meio da expressão plástica – pode atuar de duas formas: na deficiência primária, constituída pela alteração muscular, e na deficiência subjetiva, caracterizada pela incapacidade de superação de comprometimentos emocionais. Mesmo que cada caso de deficiência física deve ser considerado em suas peculiaridades, é importante que o professor tenha sempre a atenção em aula, pois, em qualquer atividade de Arte, a coordenação motora e os efeitos emocionais constituem sempre a sua parte essencial. Em casos mais extremos de alterações musculares, será difícil estabelecer, de início, uma autoidentificação com as expressões criativas, pois a dificuldade de controlar os músculos, quando se trata de coordenação motora, constitui-se um obstáculo difícil de ser vencido. Em qualquer tentativa de desenvolver uma coordenação muscular, a expressão plástica torna-se importante. Nas primeiras atividades com o deficiente físico, pode ser utilizada uma técnica de pintura com os dedos. Esse tipo de trabalho traz satisfação à criança que vê o resultado do movimento com seus dedos. Ao pintar com pincel, a necessidade de ter que pressionar esse instrumento com os dedos pode causar dificuldades ao aluno. Uma alternativa para essa atividade é adaptar uma fita adesiva como recurso de fixação do pincel à mão, mesmo que se saiba que o uso exclusivo do pincel proporciona maior incentivo para o desenvolvimento do aluno. O planejamento das atividades de Arte de forma inclusiva requer do professor conhecimento de causas, tipo de deficiência física e que movimentos físicos evidenciam mais tal deficiência. Também é necessário que o deficiente físico aprenda a enfrentar suas limitações quando realiza as atividades. Muitas vezes, é possível observar que ele experimenta uma sensação de alívio ao representar, por Metodologia do Ensino da Arte 20 meio da Arte, certas partes do corpo, pois consegue, dessa forma, realizar através da imaginação, o que de outro modo, será incapaz de fazer. Os objetivos da Arte com relação ao trabalho com deficientes físicos são basicamente os de promover uma consciência corporal; reforçar a identidade do próprio indivíduo e reforçar a percepção dos próprios limites e dos limites dos outros, e como objetivo principal, promover a integração social do indivíduo. SAIBA MAIS: Amplie seus conhecimentos e horizontes, assistindo ao vídeo “Arte na educação especial, incentivando a aprendizagem”, disponível em: <https://bit.ly/3klofqx>. Acesso em: 24 mar., 2020. A Arte e a deficiência auditiva A comunicação é um elemento primordial para promover a inclusão dos deficientes auditivos na sociedade. E nada melhor do que a Arte para oportunizar o desenvolvimento da comunicação nesse deficiente. O deficiente auditivo, embora não ouça (ou ouça pouco), tem uma grande percepção para a música, pois ele sente suas vibrações. Vários profissionais já fizeram projetos nessa área, como por exemplo o projeto Surdodum, criado em 1995, em Brasília, pela professora Ana Lúcia da Silveira Soares. No Surdodum, jovens surdos são iniciados na música, aprendendo a cantar e a tocar percussão. As atividades têm como objetivo trabalhar, principalmente, a fala, a dramatização, a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e a autoestima do surdo. Outro projeto interessante, também nessa área, criado em 2003, é o projeto Céu e Terra, que propõe balé para portadores de deficiência auditiva. Metodologia do Ensino da Arte 21 O uso da música é uma excelente forma de desenvolver a fala natural, pois estimula e aguça a percepção das crianças surdas, possibilitando que potencializam sua sensibilidade. É importante destacar, no entanto, especialmente, em relação ao deficiente auditivo que as atividades – assim como em todos os demais casos de deficiência – não devem ter por objetivo “corrigir” ou “normalizar” esses indivíduos, mas desenvolver seu potencial. A comunidade surda, por exemplo, tem se mobilizado cada vez mais fortemente em relação ao seu reconhecimento não como um grupo de deficientes, mas como uma grande comunidade com características próprias de comunicação. Da mesma forma, os deficientes visuais hoje contam com uma rede de apoio bem mais ampla do que há alguns anos atrás, sendo importante que a escola desenvolva, de alguma forma, seu conhecimento sobre braille. Os deficientes físicos, por sua vez, devem ter suas limitações respeitadas e, ao mesmo tempo, é importante que se estimule sua interação com o próprio corpo e com o ambiente externo. Ainda assim, cabe ressaltar ser importante que nenhum caso de deficiência seja tratado com “coitadismo”, com pena ou com menosprezo, mas com respeito, para que o indivíduo sinta-se acolhido e também valorizado dentro do contexto. Amplie seus conhecimentos e tire ideias para o trabalhoartístico com os surdos assistindo aos vídeos a seguir, que abordam os projetos apresentados nesta seção: • BRASIL, Fábio. Surdodum Documentário. 2017. Disponível em: < https://bit.ly/37rvAkG>. Acesso em: 24 mar., 2020. • TV HORIZONTE. Pra mudar o mundo – Projeto Céu e Terra. 2014. Disponível em: < https://bit.ly/3kkGUTm>. Acesso em: 24 mar., 2020. • Metodologia do Ensino da Arte 22 Reflexões acerca da metodologia do ensino da arte INTRODUÇÃO: Ao término deste capítulo você será capaz de entender alguns pressupostos importantes para o ensino de arte na escola. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Neste capítulo, apresentaremos algumas questões relevantes à metodologia do trabalho pedagógico na área de Arte. Dentre aquilo que aqui discutiremos, estão a organização dos conteúdos, a avaliação e a autoavaliação; o papel docente e as dificuldades enfrentadas por ele; a metodologia de ensino por meio de projetos e sua relevância para o ensino de Arte, além dos temas transversais presentes no cotidiano de nossos alunos. Figura 2 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino da Arte 23 A organização dos conteúdos no ensino da Arte Os principais documentos norteadores da educação no país, assim como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs, 2006), não trazem uma definição rígida sobre as modalidades a serem trabalhadas em cada ciclo (o 1º ciclo corresponde aos 1º e 2º anos; o 2º ciclo, ao 3º e 4º anos). Eles orientam o professor a adequar suas atividades ao repertório cultural que a criança traz à escola. Desta forma, o professor necessita saber como selecionar os conteúdos, uma vez que a área de artes apresenta uma vastidão de assuntos que podem ser trabalhados no Ensino Fundamental. Segundo orientações do documento, o conjunto de conteúdos em Arte está articulado ao contexto de ensino e aprendizagem em três eixos norteadores: produção, fruição e reflexão, sendo que a produção se refere ao fazer artístico, a fruição, se refere à apreciação da arte, e a reflexão, à construção do conhecimento sobre o trabalho artístico pessoal dos colegas sobre a Arte como sendo um produto histórico. Os conteúdos de Arte podem ser trabalhados em qualquer ordem, segundo a decisão do professor, desde que em conformidade com o currículo escolar e, especialmente, de acordo com a formação e tendência do professor. Além disso, dentro dos conteúdos gerais das linguagens artísticas, tais como as artes visuais, a música, o teatro e a dança, são necessárias considerar, baseado nos PCN (2006), que: • Os conteúdos devem estar de acordo com as possibilidades de aprendizagem dos alunos; • É importante valorizar o ensino de conteúdos básicos de Arte, em especial, aqueles que são necessários à formação cidadã, considerando, ao longo dos ciclos de escolaridade, manifestações Metodologia do Ensino da Arte 24 artísticas de povos e de culturas de diferentes momentos históricos, inclusive o momento atual; • Devem ser trabalhadas, também, especificidades do conhecimento e da ação artística. • Percebe-se, também, que nas diretrizes oficiais, os conteúdos não estão separados por séries ou por anos, ficando essa divisão ao critério de cada escola. SAIBA MAIS: Aprofunde a discussão sobre os conteúdos de arte assistindo ao vídeo “Conteúdos e Metodologias do Ensino da Arte”, disponível em: < https://bit.ly/3jqfDgJ>. Acesso em: 25 mar., 2020. A avaliação em Arte Um dos gargalos de qualquer sistema educacional, desde a Educação Infantil até a Pós-Graduação é, sem dúvidas, a avaliação. Já verificamos em nossa vida profissional ou mesmo acadêmica o quanto é difícil avaliar. A avaliação sempre é motivo de muita preocupação para os professores, independente da área do conhecimento humano ou do nível de ensino em que atuem na educação. Os professores costumam realizar questionamentos sobre isso, especialmente, se estão avaliando de forma correta, coerente e ética, e se a avaliação está colaborando para um processo qualitativo e não somente quantitativo ou classificatório. Para avaliar o aproveitamento discente em Arte, o professor deve considerar o seu histórico e sua relação com as atividades desenvolvidas Metodologia do Ensino da Arte 25 na escola, observando a qualidade dos trabalhos em seus diversos registros. Por certo, a avaliação é parte integrante do processo de ensino e de aprendizagem, em que o aluno é sujeito do processo educativo. Deste modo, faz-se necessário que o docente se preocupe com a observação dos progressos dos alunos, os conceitos que têm de determinados assuntos e as articulações que fazem no decorrer das aulas, reelaborando seus conhecimentos e adquirindo outros. Avaliar em Arte, segundo os PCNs (2006), constitui uma situação de aprendizagem na qual o estudante pode perceber aquilo que aprendeu, retrabalhar conteúdos, e o professor pode verificar como ensinou e o que seus alunos vieram a aprender. Deste modo, a avaliação no processo de ensino e de aprendizagem pode ser considerada como um momento importantíssimo, tanto para o professor quanto para o aluno, uma vez que ambos fazem parte desse processo interagindo entre si, diariamente na escola. A Arte trabalha com sentimentos, emoções, sensações. Nesse sentido, não podemos avaliar um aluno julgando uma opinião sua, mas avaliá-lo por sua disponibilidade de participar e de contribuir com a aula de Arte e com o grupo a que ele pertence. Avaliar em Arte também é verificar que conhecimentos podem acrescentar valores ao aluno, trazendo mudanças, tanto afetivas, cognitivas, relacionais ou como as relacionadas à valorização da vida, do patrimônio, da cultura e da própria Arte. Ao avaliar o aluno, o professor deve estar atento à trajetória de vida de cada aluno, e a participação e ao interesse de cada um. É necessário também que o aluno tenha consciência do resultado que o professor espera dele no final do processo. A avaliação das atividades artísticas é complexa, principalmente, quando se refere ao estabelecimento de critérios para expressão de julgamentos sobre a produção estética e expressiva de outrem. Por isso, consideramos importante buscar subsídios para avaliação nos documentos Metodologia do Ensino da Arte 26 oficiais que norteiam a disciplina e educação, pois, no decorrer dos quatro anos do Ensino Fundamental, espera-se que os alunos vão adquirindo, de forma progressiva, competências de sensibilidade e de cognição em Arte. Nas próximas linhas, traremos um resumo das orientações estabelecidas pelos PCNs de Artes (1997). SAIBA MAIS: Amplie seus conhecimentos sobre os PCNs de Arte, acessando o vídeo “Resumo PCN de Arte”, disponível em: < https://bit.ly/37vmTWz>. Acesso em: 25 mar., 2020. Artes visuais Vejamos abaixo de acordo com Cumming (1996): • Criação de formas artísticas demonstrando algum tipo de capacidade ou de habilidade. Com esse critério, pretende-se avaliar se o aluno produz formas bi ou tridimensionais, desenvolvendo um processo de criação individual ou coletiva; • Estabelecimento de relações do trabalho de Arte produzido por si com o de outras pessoas sem discriminações estéticas, artísticas, étnicas e de gênero. Com esse critério, pretende-se avaliar se o aluno identifica o valor e gosto e argumentar a respeito deles em relação às imagens produzidas por ele ou pelos colegas; • Identificação de alguns elementos da linguagem visual que se encontram em múltiplas realidades. Busca-se avaliar se o aluno reconhece os elementos da linguagem visual; • Reconhecimento e apreciação de vários trabalhos e objetos de arte por meio das próprias emoções, reflexões e conhecimentos. Com esse critério, busca-se avaliar se o aluno tem condições de apreciar, com curiosidade e respeito,trabalhos e objetos de arte, bem como de relacionar com suas próprias produções ou de outrem; Metodologia do Ensino da Arte 27 • Valorização das fontes de documentação, preservação e o acervo da produção artística. Pretende-se avaliar se o aluno valoriza, respeita e reconhece o direito à preservação da própria cultura e das demais. Música • Interpretação, improviso e composição demonstrando alguma capacidade ou habilidade. Pretende-se avaliar se o aluno cria e interpreta com musicalidade, desenvolvendo a percepção musical, a imaginação e a relação entre emoções e ideias musicais em produções com a voz, com o corpo, com os diversos materiais sonoros e instrumentos; • Reconhecimento e apreciação dos seus trabalhos musicais, de colegas e de músicos por meio das próprias reflexões, emoções e conhecimentos, sem preconceitos estéticos, artísticos, étnicos e de gênero. Assim, busca-se avaliar se o aluno identifica e discute com discernimento sobre valorização, valoração e gosto nas produções musicais e se percebe nelas relações com os elementos da linguagem musical; • Compreensão da música como produto cultural, histórico e evolutivo, bem como sua articulação com as histórias do mundo, analisando as funções, valores e finalidades que foram atribuídas a ela por diferentes povos e épocas. Desse modo, pretende-se avaliar se o aluno relaciona estilos, movimentos artísticos, períodos, músicos e respectivas produções com o contexto histórico, social e geográfico; • Reconhecimento e valorização do desenvolvimento pessoal em música nas atividades de produção e apreciação, assim como na elaboração de conhecimentos sobre a música entendida como um produto da cultura e da história. Com isso, buscar-se avaliar se o aluno valoriza o caminho de seu desenvolvimento. Metodologia do Ensino da Arte 28 Teatro • Estar habilitado para se expressar na linguagem dramática. Avaliar se o aluno desenvolve capacidades de atenção, concentração, observação, se enfrenta as situações que surgem nos jogos dramatizados e se articula o discurso falado e o escrito – a expressão do corpo; • Compreender o teatro como uma ação realizada coletivamente. Assim, isso permite avaliar se o aluno sabe se organizar e interagir em grupo, ampliando as suas capacidades de socializar, de ver e de ouvir, em processo de interação com seus colegas, bem como quanto à capacidade que tem de se expressar. Dança • Compreensão da estrutura e do funcionamento do corpo e dos elementos que compõem seus movimentos. Com esse critério, pretende-se avaliar se o aluno reconhece o funcionamento de seu corpo no movimento, se demonstra segurança ao se movimentar e se desenvolve pesquisa para uso do corpo no espaço; • Interesse pela dança como uma atividade coletiva. Isso possibilita avaliar se o aluno desenvolve-se na criação em grupo de forma solidária, se é capaz de improvisar e criar sequências de movimentação em grupo, se realiza interações com os colegas respeitando as qualidades individuais de movimento, de modo a cooperar com aqueles que têm dificuldades; se aceita as diferenças, valoriza o trabalho em grupo e se empenha na obtenção de resultados de movimentação harmônica; • Compreensão e apreciação das diversas danças como manifestações culturais. Esse critério pretende avaliar se o aluno é capaz de observar e avaliar as diversas danças presentes tanto na sua região como em outras culturas, em diferentes épocas. Metodologia do Ensino da Arte 29 Formas de avaliação Há várias formas de avaliar o aluno, porém na área de Arte existe uma forma se evidencia: avaliar por meio de um portfólio. Ele é um instrumento que compreende o conjunto de trabalhos realizados pelos alunos durante um determinado período, série ou disciplina. Seus benefícios para avaliação não são automáticos, como também não dependem dos portfólios em si, mas do que os alunos aprendem ao criá- lo e ao alimentá-lo. O portfólio é uma ferramenta avaliativa promissora que poderá, sem dúvida, inspirar outras possibilidades, além das abordadas ao longo desse texto, pois a avaliação é um processo que precisa ser constantemente refinado. Esse instrumento possibilita ao professor considerar os trabalhos dos alunos de forma processual, atribuindo, inclusive, uma certa autonomia ao aluno, que escolherá os melhores trabalhos para alimentar seu portfólio. Autoavaliação Em Arte, o docente deve avaliar mais os processos criativos dos alunos e nem tanto os resultados. Por isso, a avaliação feita pelo próprio aluno sobre si torna-se um importante instrumento. Com a autoavaliação realizada pelo aluno, os professores têm ideia de como o aluno percebeu-se durante as aulas, e esses dados podem ser de extrema validade para uma avaliação em que o professor vai expressar em conceitos ou notas. O exercício da autoavaliação é, antes de tudo, o primeiro passo para o processo de aprendizagem, pois o aluno, enquanto se avalia, também aprende. É de extrema importância que o aluno avalie também a turma em que se insere e que seja capaz de expressar essa visão da aprendizagem Metodologia do Ensino da Arte 30 e analisar o comportamento de todos: esses trabalhos são dados valiosos para a avaliação final do professor. A autoavaliação do próprio professor, do mesmo modo, é muito importante, pois diagnosticar a si mesmo implica compreender os parâmetros a que se está sujeito, de modo a verificar o próprio desempenho e, com base nisso, propor metas para superar e sanar dificuldades, podendo, com isso, realizar um balanceamento dos acertos e equívocos que marcaram o ano letivo. É importante, também, que o professor tenha sensibilidade em organizar a autoavaliação de forma contextualizada em relação ao nível de aprendizagem dos alunos. Em níveis de ensino não alfabetizados ou pré-alfabetizados, essa autoavaliação deverá prever manifestações de forma oral. Pode-se realizar um trabalho, um desenho, uma pintura etc. que expresse como a criança se sente em relação àquilo que aprendeu em Arte. Porém, de alguma forma, isso deverá ser sistematizado. Em níveis de ensino que já passaram pelo processo de alfabetização, é interessante que o professor solicite alguma forma de escrita e que, antes, estabeleça com seus alunos quais critérios pretenderá avaliar. O momento de sistematização dessas avaliações também é de fundamental importância no processo, uma vez que a leitura e a fala podem causar diferentes impressões no leitor/ ouvinte quando consideradas separadamente. O professor deve estar ciente de que os pontos positivos e negativos apresentados pelos alunos não são somente sua responsabilidade, mas que o papel docente dentro da sala de aula é essencial para que cada aluno, consideradas suas particularidades, desenvolva seu potencial. Para isso, o docente deve “treinar” seu ouvido para as críticas também. É muito importante, além disso, ter em mente de que a avaliação e a autoavaliação não são processos fechados em si, que darão conta do “todo”, nem da parte do aluno, nem da parte do professor, muito menos da parte da escola. Por isso, esses elementos devem estar permanentemente associados às aulas, nem sempre com trabalhos e tarefas todo dia, mas Metodologia do Ensino da Arte 31 com observações, anotações, diagnósticos e feedbacks da parte do professor. Ter um caderno ou outro aparelho que possibilite anotar suas observações é importante para o professor no momento em que realizará sua avaliação. Da mesma forma, é importante – não só na disciplina de Arte, mas em todas – que o professor, sempre que sentir dificuldades em relação a alguma situação, busque auxílio pedagógico e especializado. A avaliação, quer em Arte ou em outra disciplina, é um exercício conjunto, dependente de uma série de fatores, que nem sempre produz as respostas prontas ou aquelas que esperamos. Lidar com isso de modoflexível é o primeiro passo para que se produza diagnósticos de aprendizagem mais abrangentes. RESUMINDO: Neste capítulo, você aprendeu que: A organização dos conteúdos de Arte não é rígida, porém, é necessário que o aluno vá evoluindo em seu desenvolvimento, especialmente no 1º e nos 2º ciclos do Ensino Fundamental; A avaliação em Arte deve olhar não apenas para o que o aluno produziu de forma pontual, mas para aquilo que ele está sendo capaz de produzir, ou ainda, para como ele tem se relacionado com o componente curricular de Arte. Diversas são as competências que podem ser observadas e avaliadas pelo professor; O portfólio, como um conjunto de trabalhos que vai sendo organizado pelos alunos e pelo professor ao longo de um período letivo, é uma das ferramentas mais interessantes para se avaliar o componente curricular de Arte; A autoavaliação é outro instrumento extremamente importante, pois considera as potencialidades e limites do aluno, do contexto de aprendizagem, do professor e também da escola. Metodologia do Ensino da Arte 32 Docência da disciplina “Arte” INTRODUÇÃO: Ao término deste capítulo você será capaz de entender retomar alguns pressupostos básicos da docência, assim como alguns elementos importantes para se pensar à docência em Arte. Conhecer a natureza dos gêneros literários, e como eles constituem os gêneros textuais considerados como pertencentes à linguagem literária será fundamental para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 3 Fonte: Pixabay Sociedade do futuro ou do presente? O tempo em que vivemos pode ser qualificado como esquisito. Talvez, não haja melhor definição para caracterizá-lo. Isso porque com tanta coisa mudando de forma tão rápida, temos dois caminhos a serem Metodologia do Ensino da Arte 33 tomados. Ou lideramos as mudanças, aceitando-as como inevitáveis, ou seremos arrastados por elas, ficando completamente fora. Trata-se de um desafio e de uma questão de sobrevivência na contemporaneidade. Segundo Fedrizzi (2017), isso acontece, especialmente, porque vivemos durante bastante tempo precisando apenas de habilidades genéricas, para profissões que mudavam muito pouco. E esse fato ocorreu durante praticamente toda, ou boa parte da história da humanidade. Nos últimos séculos, porém, cada geração viu profissões desaparecerem e novas surgirem. As máquinas – oriundas das revoluções industriais e tecnológicas – foram automatizando a manufatura cada vez mais rapidamente. E todas as funções repetitivas foram passando para as mãos de robôs e de computadores. Com toda essa mudança, obviamente, o ensino não ficaria para trás e, embora as transformações nessa área pareçam – por vezes – ser mais demoradas, o fato é que elas, cedo ou tarde, vêm para ficar. O que ocorre com nossos alunos e com as pessoas é que todos nós nos tornamos produtores de informação e de conhecimento. O mundo passou a ser feito por usuários, por muita gente e não apenas por um seleto e escasso grupo, vinculados a instituições e a veículos tradicionais. Atualmente, todo mundo produz, quer conversar, dialogar, interagir, debater, trocar, compartilhar, informar e ser informado. Os discentes, nesse contexto, deixaram de ser alunos passivos e passaram a se tornar criativos, muito ativos e criadores quase natos. Hoje, a cada minuto, milhões de e-mails são enviados no mundo todo. O Google é a ferramenta de pesquisa mais potente no que diz respeito a consultas globais. O número de páginas da internet, independente do conteúdo que apresentam, é quase infinito. Além disso, há os milhares de blogues, vlogues, perfis de Faceboook, Twitter e Instagram, além das postagens no Youtube e no WhatsApp, para citar algumas ferramentas de comunicação. Com essa quantidade de Metodologia do Ensino da Arte 34 informação circulando, sua atualização, obsolência e desatualização ocorre quase que simultaneamente. Agora, caro aluno, imagine toda essa riqueza de informação e de troca de conhecimentos na nossa vida e na vida de nossos alunos. É certo que, nesse caldeirão de informações, um novo tipo de gente surge em nossas salas de aula. E os professores que estão nesse espaço ou ocupando cargos de direção escolar se deparam com essa realidade todos os dias. Simultaneamente, a máquina pública está se tornando cada vez mais obsoleta e emperrada, cheia de burocracias desnecessárias e centrada em si mesma, quase impossibilitada de se recriar. Nossa legislação está desatualizada, e primeiro, as coisas acontecem para, muitas vezes depois, existir uma lei que as regulamente. A emergência de aplicativos como o Uber e o Ifood, por exemplo, nos mostram isso claramente. E, a cada dia, surgem novos modelos e ações que “facilitam nossa vida”, que mudam nosso jeito de viver, conviver e interagir com o mundo que nos cerca. O mundo está cada vez mais difícil de ser regrado. É muito mais disruptivo. Por conta disso, terminamos formando gente para ir embora, em busca de mais oportunidades. Percebe-se, no dia a dia, que as pessoas estão muito aceleradas, buscando informações no mundo inteiro, querendo inovar e, muitas vezes, a comunidade não está respondendo a isso. Como resultado, os mais empreendedores, inquietos e criativos vão embora. E nos tornamos exportadores de talentos, pois muita gente com boa formação, que estudou nas melhores escolas e universidades do país, já foi para outras terras. A adaptação ao mundo, seja ele chamado de moderno, pós- moderno, líquido ou contemporâneo, está cada vez mais difícil, pois suas mudanças são muito velozes. E isso impacta diretamente na sala de aula, já que, mesmo que seu layout não tenha sido tão afetado, ainda assim a Metodologia do Ensino da Arte 35 configuração da escola por meio dos sujeitos que a procuram está em constante mudança. Além disso tudo, do excesso de informações, temos a falta de oportunidades e a violência. E com isso, temos testemunhado um número grande de pessoas que buscam uma vida mais tranquila e menos violenta fora do país. Isso tudo se torna um grande desafio para a educação, que é onde tudo começa. Como formar pessoas para que tenham interesse em permanecer, em produzir para essa comunidade, fortalecendo a sociedade, a pesquisa e a política nacional? É bastante difícil desempenhar a posição e o papel de educador hoje, pela necessidade – principalmente – de ter que lidar com alunos que praticamente já nascem com o tablet ou com o celular na mão, e que chegam às salas de aula encharcados de informação. E, ainda por cima, com pais muitas vezes omissos e infantilizados, que não têm autoridade sobre seus filhos, não sabem dar-lhes limites nem os estimular no que sambem e gostam de fazer, delegando toda árdua tarefa de ensinar somente aos professores. Diante disso, podemos nos perguntar: como segurar essa “onda”? Como manter o interesse do aluno dentro da sala de aula? Quais carreiras existirão no futuro e quais tecnologias estarão disponíveis daqui a cinco ou dez anos? No mundo onde os ciclos estão se acelerando, quais habilidades temos que ensinar às próximas gerações? Pensamos que muitos dos currículos atuais não estão preparando seus alunos para inovações tecnológicas e comunicacionais, para a volatilidade dos mercados e para as incertezas do século XXI. Para tentar atender a isso, algumas escolas estão ensinando codificação e outras habilidades. Mas a tecnologia muda tão rapidamente que essas novas Metodologia do Ensino da Arte 36 habilidades talvez não sejam mais relevantes para quando esses alunos estiverem na idade adulta e entrarem no mercado de trabalho. Nesse mundo hiper conectado de hoje, precisamos de “resolvedores de problemas”, pensadores que sejam criativos e que estejam adaptados às mudanças que vêm pela frente. E, se formos ver, o modelo educacional como qual trabalhamos é um modelo criado muitos séculos atrás, para momentos de mercados estáveis, que cada vez mais deixam de existir. O fazer arte como um exercício de experimentação Diante de todo esse cenário de mudanças, é importante que não apenas os alunos/ filhos, mas que os professores/ pais se reeduquem. Quando dizem para seus filhos, por exemplo, que “acabou uma brincadeira”, que estarão sinalizando? Pior ainda: quando dizem “não faz arte, meu filho”, o que ensinam sobre criatividade a arte? Não fazer arte, num sentido mais amplo, é não experimentar, não brincar. As pessoas estão tendo seu desenvolvimento artístico muitas vezes podado desde a infância, perdendo a espontaneidade e a capacidade de experimentação e de criação. Depois, quando grandes, as empresas precisam fornecer-lhes cursos de criatividade, porque não possuem vidas criativas. A arte, nesse contexto de mudanças, ou melhor, o ensino da Arte, é um elemento indispensável para preparar e desenvolver competências e habilidades necessárias para o exercício criativo e também para o enfrentamento das mudanças que ocorrem no mundo de forma cada vez mais veloz. Não podemos, como professores, deixar que nossos alunos percam a “veia criativa”, que deixem de buscar soluções inusitadas para os desafios cotidianos. Com isso, é também bom para todos que o perfil do professor também mude. Não basta ser apaixonado por ensinar; é preciso ter certo grau de inquietude, de modo a romper com a noção de que a docência Metodologia do Ensino da Arte 37 seja um sacerdócio, mas algo em movimento, atendo às transformações sociais. Na mesma lógica de necessidade de mudança, estão os alunos que só querem saber o que vai cair nas avaliações. Esse tipo de aluno não está interessado em aprender, mas em passar na avaliação. Se estamos interessados em fazer escolas para ter uma grande procura e notas boas nos sistemas de avaliação em larga escala, algo está errado. Nosso papel como professores é desenvolver pessoas para se responsabilizarem por si mesmas, pelo seu próprio conhecimento e desenvolvimento, atuando de forma criativa e, mesmo que grandes conhecedoras das ditas ciências exatas, ainda assim capazes de criar, de humanizar e de serem humanizadas. O professor e o ensino da Arte Uma das tarefas principais do professor que ensina Arte é instrumentalizar o aluno no domínio de diferentes linguagens artísticas, por meio de informações, do estudo e da análise da construção do conhecimento. O docente necessita compreender que ele é o mediador das experiências existentes entre o educando e sua realidade e que pode contribuir no processo sutil de desenvolvimento da percepção. Portanto, é necessário que o educador que ensina Arte tenha conhecimento e vivência em Arte. Nesse sentido, talvez o melhor mestre não seja somente aquele que impõe, que se afirmar como uma espécie de dominador do espaço mental, porém, ao contrário disso, aquele que se torna aluno de seu próprio aluno, que se esforça para acordar uma consciência ainda ignorante de si mesmo e de guiar seu desenvolvimento no sentido que melhor lhe convir. É importante que os educadores acreditem na individualidade e no poder de cada ser humano; no poder criativo e na necessidade vital que temos de nos expressar. Metodologia do Ensino da Arte 38 Para que o professor possa conduzir com eficiência e com segurança o processo de expressão dos alunos, é primordial que ele próprio passa também por esse mesmo processo, descobrindo e exercitando suas potencialidades expressivas. Isso significa que é fundamental o seu constante aperfeiçoamento artístico. Cabe ainda ao processor a escolha de métodos e recursos didáticos que considerar mais adequados para apresentar as informações, zelando sempre pela necessidade de introduzir formas artísticas, por que ensinar Arte com Arte é um dos melhores caminhos. A Arte propõe ao homem momentos de descoberta e de sensações fantásticas, pois trabalha com a sensibilidade humana. Um ensino de forma criadora, que favoreça a integração entre a aprendizagem técnica e estética dos alunos poderá contribuir para o exercício conjunto complementar de razão e de sonho, de modo a tornar o conhecer um exercício de maravilhar-se, brincar com o desconhecido, arriscar hipóteses ousadas, trabalhar, esforçar-se e alegrar-se com descobertas. Assim, esse é o momento em que o professor precisa ser um sujeito que envolve o aluno com esse fascínio que a Arte contém, mas essa não é uma tarefa fácil. O professor enquanto cidadão – sujeito que participa da sociedade – possui sua própria identidade. Porém, enquanto professor, o sujeito deve refletir sobre suas experiências, sua inserção em um determinado momento histórico e social e, indispensavelmente, deve manter uma atitude de revisão e de análise de sua própria história de vida de forma constante para, como profissional, apresentar uma prática pedagógica que seja interessante, atual e coerente com as necessidades e propostas da educação contemporânea. Por sua vez, é importante que o aluno também seja um sujeito integrado à sociedade, a qual possui uma identidade cultural com Metodologia do Ensino da Arte 39 conhecimentos não sistematizados, mas que precisam e devem ser respeitados e valorizados no ambiente escolar. Em sala de aula, professor e aluno podem apreender a interagir permanentemente com a realidade que os cercam, definindo alternativas para novas questões. Cabe ao professor, cada vez mais, reelaborar e redimensionar os conhecimentos, buscando soluções de trabalho que garantam melhores resultados no processo de ensino e de aprendizagem. Não há professor ideal, mas o professor mais coerente com seu tempo é aquele profissional que está em constante estudo, que é preocupado com as mudanças na sociedade, aquele que acredita em transformações, que é estimulador que respeita e que valoriza o processo criativo do aluno, ou seja, sua cultura. Dificuldades enfrentadas pelo professor de Arte Enquanto docentes, podemos nos deparar com desafios, tais como: a falta de recursos, como audiovisual, livros, imagens e outros; alunos sem materiais (próprios); falta de lugar adequado para desenvolver música, teatro e dança; a indisciplina; a autocrítica dos alunos e a carga horária da disciplina. Para o ensino de Arte, é importante um espaço diferenciado, com materiais, imagens e instrumentos adequados, o que requer qualidade para que a disciplina não se forme apenas mais uma atividade informativa e desconectada da vida do aluno. Devemos gerar signos e também significados destinados para crianças e adolescentes que não possuem acesso à arte e à cultura. É importante também pensar que nem sempre o aluno chegará na escola com o repertório cultural que o professor esperava que ele tivesse. No entanto, cabe lembrar que a escola, como espaço onde também se produz e se reproduz arte, deve incentivar que o aluno amplie seu Metodologia do Ensino da Arte 40 repertório artístico e cultural, lançando mão de todos os recursos possíveis que a escola disponibiliza. A Arte está em todo lugar. Cabe ao professor “abrir os olhos” dos alunos para que esses se percebam como apreciadores e também como produtores de obras de arte. Caso a escola não tenha condições materiais para organizar saídas pedagógicas a espaços que contêm obras de arte para que os alunos as apreciem, isso não impede que o professor realize atividades nas quais essas obras, mesmo que virtualmente, sejam apresentadas. E também, dentro desse contexto, é necessário que os alunos não conheçam as obras somente para copiá-las ou mesmo, apenas por conhecê-las. Quando mais desenvolvida for a competência de interação com as obras, melhor será o desenvolvimento de sua criatividade e de sua humanidade artística, de forma que a produção artística desse aluno poderá aparecerem diferentes contextos e situações. Além disso, é importante lembrar que, se a escola não vai até a Arte, a Arte pode vir até a escola, por meio do trabalho do professor, da ampliação do repertório artístico dos alunos e da organização de trabalhos que tornem as produções dos alunos verdadeiras obras de arte. Exposições e mostras de trabalhos são bons exemplos disso. Por fim, ensinar Arte na escola não é uma tarefa fácil, pois requer o preparo do professor de forma constante e o enfrentamento de diversos desafios. No entanto, o professor de Arte, se estiver interessado em ensinar, e seu aluno em aprender, logo perceberão quão ricos artisticamente podem ser os espaços que nos cercam, pois a Arte, conforme já dissemos em outros momentos, está em todo lugar. Outro elemento importante para o ensino de arte é a habilidade do professor em trabalhar de forma integrada e interdisciplinar com outras áreas de conhecimento. Praticamente, todos os campos de saber podem Metodologia do Ensino da Arte 41 ser representados ou relacionados com a Arte, o que possibilita trabalhar de diferentes formas e com diferentes linguagens. A história, por exemplo, é um campo riquíssimo, no qual muitos elementos artísticos podem ser explorados, tais como: pintura rupestre, arte egípcia, arte grega, arte gótica, arte contemporânea, etc. A literatura, ou a língua portuguesa, podem servir subsídios para o trabalho artístico através das obras literárias, que podem contribuir significativamente para a construção e constituição de releituras, adaptações e outros elementos que dialoguem com as obras. O campo da educação física, por meio do movimento e do conhecimento corporal, pode ser útil para o desenvolvimento do teatro, da dança e da própria música, uma vez que o acompanhamento do ritmo com o corpo, a expressividade e o “falar” por meio do corpo podem ser explorados nas duas áreas. Da mesma forma, áreas exatas, como ciências e matemática podem auxiliar o desenvolvimento artístico, fornecendo noções de formas geométricas, por exemplo, de diversidade de cores e de seres, dentre outros elementos. Para a ampliação do repertório artístico dos alunos, toda interdisciplinaridade é sempre bem-vinda. Por isso, é importante que o professor de Arte abandone a ideia de trabalhar isoladamente, ou ainda, de que só nas aulas de Arte se aprende Arte. Seus movimentos e esforços devem ser com o objetivo de despertar nos alunos o gosto estético, ampliar seu repertório artístico e permitir que vejam o mundo também sob outra perspectiva: a artística. Metodologia do Ensino da Arte 42 RESUMINDO: Neste capítulo, você aprendeu que: A sociedade contemporânea passa por constantes mudanças. E diante disso, o desafio da escola é o que ensinar e como ensinar, haja vista que as tecnologias estão cada vez mais banais; A arte, nesse contexto de mudanças pelas quais a sociedade passa, por servir como estimuladora da criatividade e da agilidade, competências tão apreciadas em nosso tempo; O professor, no processo de ensino de Arte, deve ser um constante aprendiz; deve viver a Arte que ensina, e deve buscar respeitar o repertório artístico dos alunos, porém, oferecendo oportunidades de ampliação desse repertório. Metodologia do Ensino da Arte 43 A arte como produto da cultura e da diversidade INTRODUÇÃO: Ao término deste capítulo você será capaz de compreender os elementos básicos que caracterizam e constituem o conceito de cultura e de diversidade, em sua relação com o ensino de Arte. Como um estudante do curso de Pedagogia, é importante que você os conheça, para que sua análise e trabalho com obras de arte se torne mais abrangente, fundamentada e profissional. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 4 Fonte: Pixabay O que é diversidade? O termo “diversidade” está relacionado à qualidade daquilo que é diverso, diferente e variado, ou da variedade. Se fizermos uma busca em dicionários, encontraremos essa palavra relacionada a um conjunto variado, ou ainda, à multiplicidade, ao desacordo, à contradição, à oposição. Quando relacionada à ecologia, diversidade relaciona-se Metodologia do Ensino da Arte 44 ao índice que leva em conta a equitabilidade e a abundância de uma comunidade. O termo “equitabilidade” descreve a proporção dos indivíduos de cada uma das espécies presentes em uma comunidade em relação ao total de indivíduos dessa mesma comunidade. Designa também uniformidade. Para as ciências sociais diversidade encontra correspondência com as palavras “alteridade”, diferença” e dessemelhança”. Vejamos, a seguir, o que cada uma delas representa. A palavra “diversidade” é mais genérica que as três demais e pode estar relacionada a cada uma delas em separado, ou as três simultaneamente. Toda alteridade, diferença ou dessemelhança pode, outrossim, indicar a simples distinção numérica que se tem quando duas coisas não diferem em nada exceto por serem numericamente diferentes. Nesse sentido, a diversidade é a negação da identidade. A seguir, a partir de Michaliszyn (2008), tentaremos abordar os três conceitos do qual a noção de diversidade se aproxima. • Por “alteridade”, um conceito mais restrito que o de diversidade, entendemos o sentimento de um indivíduo em ser outro, ou melhor, de colocar-se ou de constituir-se como o outro. Através desse sentimento, conseguimos perceber o outro, o diferente, sem segregá- lo pelas características que nos diferenciam. • A “diferença” é a determinação da alteridade. Uma vez que a alteridade não implica necessariamente uma determinação, a diferença traz consigo a determinação. Podemos dizer, por exemplo, que João e Pedro são indivíduos pertencentes à espécie humana e, uma vez que passaram pelos mesmos processos que os inseriram nos grupos sociais, são agora chamados de seres humanos. Como João e Pedro vivem no Brasil, são brasileiros e essa característica os assemelha, os identifica. Por outro lado, João possui descendência alemã, e Pedro, Metodologia do Ensino da Arte 45 descendência africana. Assim, embora João e Pedro sejam indivíduos da espécie humana, seres humanos que adquiriram valores culturais próprios de seus grupos e são considerados cidadãos brasileiros, João e Pedro representam etnias diferentes, cujas características – diferenças – são expressas não somente no campo dos valores culturais, mas em características físicas pertinentes às suas descendências. • A dessemelhança, por sai vez, se caracteriza pelas marcas que visivelmente tornam os seres diferentes, sejam elas marcas físicas ou culturais. A construção da diversidade sociocultural na sociedade O que se torna evidente na contemporaneidade é que vivemos num modelo social que se prevalece pelas diferenças, admite a alteridade, mas acentua a dessemelhança e, consequentemente, evidencia a diversidade. Em consequência desse tipo de comportamento social, somos, em determinados momentos, vítimas da diversidade e, em outros, dela fazemos uso para reafirmar nossa própria identidade. Por esses motivos, é extremamente importante entendermos como a sociedade constrói a diversidade. Para isso, é necessário revisitarmos e compreendermos melhor o que se caracteriza como diversidade cultural. O que é cultura? Podemos entender a cultura de diferentes maneiras. Uma delas é a definição de que a cultura é um processo através do qual o homem dá sentido a si e a todas as coisas que o cercam: a natureza e o outro com o qual convive. A cultura não possui conteúdo em si mesma, sendo produto Metodologia do Ensino da Arte 46 exclusivo da condição humana. O homem, portanto, é tanto produtor quanto produzido pela cultura. A cultura nos acompanha desde o surgimento dos primeiros agrupamentos humanos e é uma das principais responsáveis pela sobrevivência de nossa espécie. A sobrevivência da espécie humana,espécie que talvez não possua mais do que 150 mil anos, e descende de um grupo que viveu na África, se deve à capacidade por ele desenvolvida de criar símbolos, de simbolizar situações de seu cotidiano. Em seguida, esse grupo foi capaz de criar ferramentas, simplificando as formas destinadas à obtenção de alimentos. Criou seu próprio sistema comunicativo, aprimorou a linguagem e, por necessidade de melhor determinar as estratégias para sua sobrevivência e convivência com os demais membros de seu grupo, estabeleceu regras sociais e de sociabilidade. Esses laços de solidariedade construídos contribuíram para o estabelecimento de vínculos entre os integrantes do grupo. A união e a consequente organização tornaram possível a elaboração de estratégias para sua defesa em relação a outros indivíduos, mais fortes, mais velozes, porém, sem os traços que determinam a cultura humana. Através da noção de cultura, podemos perceber que os seres humanos se diferenciam dos demais animais pela função simbólica, ou melhor, pelo conjunto de sistemas simbólicos que determinam nossas identidades como atores sociais e como integrantes de grupos sociais distintos. Tal conjunto de sistemas simbólicos é responsável tanto pelo estabelecimento da comunicação no interior dos agrupamentos sociais quanto pela definição da forma como os indivíduos relacionam-se entre si e também com a natureza, explorando-a em nome de sua sobrevivência e do desenvolvimento de seu grupo. Fazem parte desse conjunto de sistemas simbólicos a linguagem, as relações de parentesco, a religião e a crença no sagrado, os mitos, a arte, Metodologia do Ensino da Arte 47 a economia, dentre outros elementos responsáveis pelo estabelecimento da comunicação humana nos diferentes níveis. Nossa relação de humanidade, nos é dada a partir da capacidade que temos, desde o nosso nascimento, de nos comunicarmos com nossos iguais e com eles nos relacionarmos e estabelecermos relações, necessárias à convivência em sociedade. Essa capacidade comunicativa desenvolve-se a partir da articulação da língua, pois, através da fala, aprimoramos a capacidade de nos comunicarmos. O desenvolvimento e a evolução da linguagem oral podem ser considerados como os princípios responsáveis pelo aumento das atividades corporativas e pelo desenvolvimento dos núcleos familiares e de comunidades. No momento de nosso nascimento, imediatamente somos apresentados a uma sociedade, cujos valores, regras, sistemas de significados – ou seja, a cultura – foram previamente estabelecidos e construídos por outros. Desde os primeiros instantes de nossa existência, vamos assimilando um conjunto de informações simbólicas e de experiências que nos vão sendo transmitidas pelo grupo social ao qual nos somamos e que foram por eles construídas e vividas ao longo de muitas e muitas gerações. Ao mesmo tempo em que assimilamos as informações culturais de nosso grupo social, também as processamos, acrescentando novos dados e eliminando outros. Nossa vivência e a experimentação de novas situações nos permite descobrir, inventar, reconstruir o conjunto de informações que recebemos. Dito de outra forma, a cultura pode ser entendida como um conjunto de princípios explícitos e implícitos herdados por indivíduos que são membros de uma dada sociedade. Tais princípios mostram aos Metodologia do Ensino da Arte 48 indivíduos como ver o mundo, como vivenciá-lo emocionalmente e como se comportar em relação às outras pessoas, às forças sobrenaturais ou aos deuses e também ao ambiente natural. Essa cultura também permite aos indivíduos constituírem um meio de transmissão de suas diretrizes para a geração seguinte mediante o uso dos símbolos, da linguagem, da arte e dos rituais. Em certa medida, podemos dizer que a cultura pode ser vista como uma espécie de “lente” herdada para que o indivíduo perceba e entenda o seu mundo e para que aprenda a viver nele. Por isso, crescer em determinada sociedade é uma forma de enculturação pela qual o indivíduo, aos poucos, adquire a sua “lente”. Sem essa percepção de mundo, tanto a coesão quanto a continuidade de qualquer grupo humano seriam impossíveis. Por isso, podemos dizer que somos produto e também produtores de cultura. Somos por ela construídos e contribuímos para sua construção e reformulação. Nossa capacidade de simbolização e criação cultural nos permite constituir uma característica bastante extraordinária: pensar no que não está diante dos nossos olhos. Essa capacidade de abstração e transcendência permitiu que superaremos as limitações impostas pela natureza. Com isso, conquistamos o planeta e colocamos as demais espécies sob nosso domínio. Somos capazes de elaborar uma vestimenta para nos proteger do frio e, assim, embora sem um organismo adaptado para tanto, sobrevivemos em regiões árticas. Somos capazes de criar aviões e submarinos e, sem asas ou nadadeiras, avançarmos por ares e por mares. Podemos dizer, inclusive, que a cultura nos torna os mais poderosos do planeta. Regras culturais Como vimos anteriormente, o comportamento social é o resultado da maneira pela qual os seres humanos se organizam, através do Metodologia do Ensino da Arte 49 estabelecimento de regras de conduta e de valores. São as relações culturais que estabelecemos entre nós que norteiam a construção da vida social, econômica e política. Os modos de pensar, agir, sentir de todo ser humano, assim como os meios que procuramos para garantir nossa sobrevivência através de nossa ação sobre a natureza (trabalho) são por nós apreendidos por meio das experiências e das relações que nos são impostas ao longo de nossa vivência em sociedade. Para que o viver e o conviver em sociedade sejam possíveis, os grupos sociais estabelecem para si um conjunto de regras, que são aceitas coletivamente. Essas regras delimitam nossos pensamentos, nossas ações e determinam nossos “modelos” de vida. Em um sentido mais amplo, as culturas podem ser vistas como linguagens, cuja característica é permitir que se produzam sentido e ordem à atuação dos seres humanos e à realidade que eles produzem para si, estando na base da ordenação da subjetividade humana, das relações entre os indivíduos e do mundo que constroem ou experimentam. Enquanto linguagens, as culturas têm uma gramaticalidade, uma estrutura responsável pelo sentido presente nas manifestações humanas e, portanto, se constituem como campos fundados por regras. Sendo assim, as regras têm uma função simbólica que vai além da coerção. Elas permitem a produção de sentido. Uma vez que não há sociedades sem regras sociais estabelecidas, podemos dizer que ela, a regra, é produto e princípio de uma cultura. Assim, se nos primeiros momentos de nossa vida agimos exclusivamente por instinto ao nos relacionarmos com nossos “iguais”, ou melhor, com outros seres humanos, com eles aprendemos cultura e, automaticamente, incorporamos regras e padrões de viver socialmente. Pensamentos, ações, emoções, não são – deste modo – formas inatas ou biologicamente herdadas, mas o resultado de experiências e relações impostas pelo outro no decorrer de nossa inserção social. Logo, Metodologia do Ensino da Arte 50 essas emoções, valores construídos, juízos morais, éticos, religiosos, são determinados culturalmente por regras que seguimos e construímos. Nesse sentido, essa “ordem”, que é humana por definição, tem por princípio e fundamento as regras que produzimos e sobre as quais alicerçaram a possibilidade de sermos humanos. Sem as regras, seríamos incapazes de produzir ordem e sentido para nossos pensamentos e ações e, consequentemente, para a realidade que vivemos e produzimos. Observemos, por exemplo, o teatro de marionetes. Vemos as marionetes dançando no palco minúsculo, movendo-se de um para outro lado levados pelos cordões, seguindo as marcações deseus papéis. Aprendemos a compreender a lógica desse teatro e nos encontramos nele. Localizamo-nos na sociedade e assim reconhecemos a nossa própria posição, determinada por fios sutis. Por um momento, podemos realmente nos vermos como fantoches. Porém, de repente percebemos a diferença decisiva entre o teatro de bonecos e nosso próprio drama. Ao contrário dos bonecos, temos a responsabilidade de interromper nossos movimentos, olhando para o alto e divisando o mecanismo que nos moveu. Tal ato constitui o primeiro passo para a liberdade. EXPLICANDO MELHOR: A cultura é o processo pelo qual o homem dá sentido a si e a todas as coisas que o cercam: a natureza e o outro. Não possui conteúdo em si mesma e é um produto exclusivo da condição humana, pois o homem é seu produtor e, por ela, é produzido. O mundo cultural é um sistema de significados (linguagens, arte, parentesco, religião, mito, arte, economia) estabelecidos pelo grupo social do qual fazemos parte. Ao nascermos iniciamos um processo de Metodologia do Ensino da Arte 51 assimilação, onde aprendemos, a partir da linguagem, um conjunto de informações simbólicas construídas ao longo de várias gerações. Cada grupo social estabelece para si um conjunto de regras responsáveis por delimitar os pensamentos, as ações e por determinar “modos” de vida. Nossas emoções, valores construídos, juízos morais, éticos e religiosos são determinados culturalmente por todas as regras que seguimos e construímos. Sem as regras, seríamos incapazes de produzir ordem e sentido para nossas ações e pensamentos e, consequentemente, para a realidade que vivemos e produzimos. Sem elas, não seríamos a espécie humana. Nesse contexto, podemos dizer que a cultura perpassa a humanidade e nos torna seres humanos, fazendo com que partilhemos de determinadas regras de uso comum, que além de constituírem nossas identidades, nos marcam como membros de umas determinada cultura e não de outra. A Arte como um produto da diversidade e da cultura Se a cultura é o que nos torna humanos, a Arte, por sua vez, nos faz “deixarmos nossa marca” no mundo, tornamo-nos imortais como espécie e diferentes dos animais. Como uma linguagem produzida por signos e carregada de sentidos, a Arte é uma forma de manifestar os anseios e sentimentos humanos, um modo de universalizar determinadas relações e pontos de vista. Assim, a Arte pode ser considerada como um produto da diversidade porque é plural, porque está em todo lugar e porque assume as mais determinadas formas. A diversidade se constitui na Arte, que busca representar diferentes traços humanos, diferentes formas de ver e de interagir com o mundo. Metodologia do Ensino da Arte 52 A cultura, por sua vez, é o grande “guarda-chuva” que sustenta a Arte, pois sem ela, a produção humana não teria sentido. É a cultura que cria condições de possibilidade para que se produza a arte de diferentes maneiras, para que se ouse, para que se busque novas técnicas e mestres. Com isso, pensamos que tanto a diversidade como a cultura, dentro da sala de aula de Arte, devem ser consideradas. Primeiramente, desde o primeiro contato com os alunos, é importante que o professor vá traçando os perfis dos alunos, avaliando em que medida sua turma/ suas turmas/ sua escola assumem um caráter de precariedade e de exclusão social. A cultura e a diversidade, aliadas à Arte, nos ensinam que é necessário aguçar a percepção em relação às diferenças e às relações de poder que nos cercam. Por isso, ao ensinar Arte em sala de aula, o professor deve propor atividades que conversem com a cultura da comunidade, considerando que essa cultura é formada pela diversidade, sendo constituída como plural. Valorizar as potencialidades de cada cultura, considerando sua multiplicidade, pode ser um bom passo para resgatar o criar o interesse pela escola, pelas artes e pelos estudos. Da mesma forma, quando falamos sobre diversidade na Arte, estamos defendendo a pluralidade de técnicas, de representações e também de estilos. Somente assim será possível trabalhar a disciplina de modo democrático, inclusivo e preocupado com o presente e o futuro. Metodologia do Ensino da Arte 53 RESUMINDO: Neste capítulo, você aprendeu que: A arte é fruto da cultura e da diversidade; A cultura é aquilo que nos torna humanos; é o que construímos e o que nos constrói; é a atribuição de valores e de regras estabelecidas por uma grande comunidade, passadas por muitas e muitas gerações; A diversidade é um conceito ancorado na noção de diferença, na qual a marca principal não é o que se tem em comum, mas o que se acha que não se tem. Caro estudante: Chegamos ao final desta unidade. É importante que você revise este material, tome nota de suas principais aprendizagens e principais dúvidas, busque nas indicações de pesquisa leituras e vídeos que podem contribuir muito nessa etapa! Além disso, ao término desta unidade, você encontrará as principais referências bibliográficas utilizadas na elaboração dessa obra, que podem ser consultadas. Não desanime nas dificuldades de estudo, mas faça com que essas dificuldades de hoje venham ajudá-lo a se tornar um estudante e um profissional melhor amanhã! Metodologia do Ensino da Arte 54 REFERÊNCIAS ANAINARA, Vanessa. Arte na educação especial, incentivando a aprendizagem. 2015. Disponível em:< https://www.youtube.com/ watch?v=lhN70AWMWJo> Acesso em: 24 mar. de 2020. BRASIL, Fábio. Surdodum Documentário. 2017. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=G9Oo2emteek>. Acesso em: 24 mar. de 2020. BRASIL. LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em: 24 mar., 2020. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil. Vol. 1. Brasília: DF, 2006. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/ Educinf/eduinfparqualvol1.pdf>. Acesso em: 25 mar., 2020. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: arte. Brasília: MEC/SEF, 1997. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro06.pdf>. Acesso em: 25 mar., 2020. CUMMING, Robert. Para entender a arte. Trad. Isa Mara Lando. São Paulo: Ática, 1996, p. 8. EDUCAÇÃO FUTURO. Resumo PCN de Arte. 2018. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=BHsGKIFQDA4>. Acesso em: 25 mar., 2020. FACULDADE FETAC. Conteúdos e Metodologia do Ensino da Arte. 2017. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=l5_ EMEU4kwY>. Acesso em: 25 mar., 2020. FEDRIZZI, Alfredo. As escolas e a sociedade do futuro. In: CARVALHO, Mônica Timm.(Org.). Educação 3.0. 1 ed. São Leopoldo: Editora UNISINOS; Porto Alegre: SINEPE, 2017, p. 11-24. Metodologia do Ensino da Arte 55 JORNAL MINHAS. Deficiência visual e arte. S/d. Disponível e: <https://www.youtube.com/watch?v=U7msIBrYZ2A>. Acesso em: 24 mar., 2020. LOWENFELD, VICTOR; BRITTAIN, W. L. Desenvolvimento da Capacidade Criadora. São Paulo: Ed. NMestre Jou, 1971. MICHALISZYN, Mario Sergio. Educação e diversidade. Curitiba: Ibpex, 2008. SANTOS, Gisele do Rocio Cordeiro Mugnol. Metodologia do Ensino de Artes. Curitiba: Ibpex, 2006. TV C MARA SÃO JOSÉ DO RIO PRETO. Inclusão – Arte. S/d. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=p00IHyowlKE> Acesso em: 24 mar., 2020. TV HORIZONTE. Pra mudar o mundo – Projeto Céu e Terra. 2014. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=h80oiGHmybU> Acesso em: 24 mar. de 2020. Metodologia do Ensino da Arte Éderson da Cruz Metodologia do Ensino da Arte
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