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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 Lombalgias ANATOMIA E SEMIOLOGIA DA COLUNA VERTEBRAL A coluna apresenta uma serie de curvaturas no plano sagital: Lordose cervical Cifose torácica Lordose lombar Cifose sacral A coluna é composta por 33 ossos: são 7 vertebras cervicais, 12 vertebras torácicas, 5 vertebras lombares, 5 vertebras sacrais, todas fundidas formando o sacro e 3 ossos coccígeos formando o cóccix. Obs: o diâmetro do forame vertebral diminui progressivamente, enquanto o corpo vertebral aumenta! ANATOMIA MUSCULAR DA COLUNA VERTEBRAL Temos uma enorme quantidade de musculatura próxima a coluna. Ela é responsável não só pelos movimentos do dorso, como por manter a coluna estável. Fraqueza nesta musculatura leva inevitavelmente a dor - especialmente por sobrecarga da coluna vertebral. A musculatura que estabiliza a coluna vertebral é o core abdominal! A maior parte das lombalgias se relaciona a fraqueza desta musculatura! ANATOMIA E DESENVOLVIMENTO DA MEDULA ESPINHAL A parte anterior da medula espinhal é responsável pela eferencia, levando os comandos motores para os seus respectivos músculos. O axônio do primeiro neurônio motor faz uma sinapse como segundo neurônio ainda dentro da medula espinhal, e é o axônio deste segundo neurônio que vai ao musculo. A parte posterior da medula é responsável pela aferencia levando as informações sensitivas ao encéfalo. SEMIOLOGIA DA COLUNA VERTEBRAL 1. TESTE DE LASÉGUE: é exclusivo para raízes baixas, do ciático, avaliando assim de L4- S1. O teste é feito com o paciente em 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 decúbito dorsal e joelho estendido, devendo-se fazer a elevação passiva da perna. Em um determinado ângulo (30- 60º), devem-se reproduzir os sintomas de compressão medular, ou seja: dor neuropática seguindo pelo trajeto do dermatomo. 2. TESTE DE SCHOBER: este é um teste clássico para espondilite anquilosante, uma doença que deixa a coluna vertebral mais rígida. Consiste em fazer uma marcação de 6 cm abaixo da vértebra L5 e 10cm acima. Pede-se ao paciente para fazer uma flexão e se mede a distância entre os pontos, que deve ser maior do que 21cm. Abaixo disso é indicativo de espondilite anquilosante. 3. TESTE DE PATRICK-FABERE: este teste foi criado para diferenciar patologias do quadril e sacroiliaca. Com o paciente em decúbito dorsal e fazendo a forma de 4 com a perna (quadril abduzido, fletido e rodado externo com o tornozelo apoiado sobre o joelho contralateral), faz-se pressão contra a crista ilíaca e o joelho. No teste positivo para doenças do quadril (coxaartrose) irá doer na região inguinal do lado do joelho pressionado. Quando há sacroileíte a dor ocorre na região sacral da crista ilíaca pressionada. 4. TESTE DE YEOMAN: é um teste especifico para sacroileíte. Com o paciente em decúbito ventral, estabiliza-se a pelve contra a maca e faz extensão de um dos quadris. Em caso de dor na região sacral o teste é considerado positivo. LOMBALGIAS Lombalgia é a dor na região lombar. É mais comum em mulheres, especialmente gestantes e naquelas entre 40-69 anos. É a segunda queixa mais frequente em pronto- atendimentos. Lombalgia aguda: dura até 6 semanas; Lombalgia crônica: dura > 12 semanas. ETIOLOGIA Primária: lombalgia idiopática ou mecânica. 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 Secundária: fratura por insuficiência, estenose do canal e hérnia discal, câncer, espondilite anquilosante, infecções. QUADRO CLÍNICO A dor lombar compreende uma dor na região lombar com possível irradiação para membros inferiores (região posterior da coxa), porém sem características neurológicas (não é em queimação, nem com sensação de parestesia, não respeita dermatomos e não leva a déficit motor ou sensitivo); É considerada uma dor axial; Na dor lombar o teste de lasegue é negativo. A dor normalmente se relaciona com atividades ou esforços físicos (a obesidade é importante) e melhora com o repouso. A lombalgia é autolimitada: 90% se recupera em quatro a sete semanas. SINAIS DE ALARME Os sinais de alarme servem para selecionar os casos em que devemos realizar exames de imagem; IDADE: <20 ou >50 anos (maior risco de tumor em idosos e de espondiolíse em jovens); TRAUMA RECENTE (sempre solicitar RX) TUMOR: história ou suspeita (emagrecimento, dor noturna); INFECÇÃO: história ou suspeita (febre, perda de peso); DÉFICIT NEUROLÓGICO (indica compressão radicular seja tumoral ou por hérnia discal); OSTEOPOROSE (a principal fratura é a vertebral); CAUDA EQUINA (anestesia em sela, alteração do controle esfincteriano); USO PROLONGADO DE CORTICOIDE (leva a perda óssea); DOR REFRATÁRIA (persistência da dor > 6 semanas mesmo com uso de medicamento); IMUNOSSUPRIMIDOS COM INFECÇÃO RECORRENTE (suspeitar de infecções como osteomielite); USO DE DROGAS INJETÁVEIS (aumenta o risco de infecções); DIAGNÓSTICO O diagnóstico de lombalgia é 90% pela anamnese e 10% pelo exame físico. Em casos de sinais de alarme deve solicitar exames de imagem; 1. RADIOGRAFIA: É possível ver basicamente estruturas ósseas. Não é possível avaliar hérnia discal por meio da radiografia, pode-se apenas inferir que apresenta uma doença degenerativa discal, pela diminuição do espaço. Pode ser feita tanto em decúbito dorsal quanto em ortostatismo. Na figura em AP (anteroposterior), nós podemos observar: • Nas linhas amarelas tracejadas, o alinhamento coronal da coluna. Lembre-se que é aceito um desvio de até 10°. • Nos círculos verdes, os processos transversos, que chamamos de “olhos de coruja”. O apagamento de um deles (coruja caolha) indica tumor. • No triângulo vermelho, temos o processo espinhoso (o “bico da coruja”), cujo apagamento também indica tumor Na radiografia em perfil, temos ainda mais informações: • As linhas amarelas tracejadas indicam, da esquerda para a direita: O alinhamento 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 anterior dos corpos vertebrais; O alinhamento posterior dos corpos vertebrais; e o alinhamento dos processos espinhosos; • A seta amarela indica a pars interarticularis, na qual uma alteração pode indicar espondiólise. • A linha vermelha tracejada indica a relação da L5-S1. Esse é o principal nível afetado pela espondilolistese, na qual a vertebra L5 escorrega sobre a S1. • A seta azul indica o tamanho do corpo vertebral, que pode estar afetado por fraturas. • A seta verde aponta para a esclerose subcondral característica do processo de envelhecimento e artrose vertebral. • As setas vermelhas apontam para osteofitose, também do processo reativo degenerativo que pode comprimir o canal vertebral. • Os quadros verdes indicam os espaços discais; 2. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA Tudo que é visto na radiografia pode ser visto com mais detalhes na TC. É interessante para avaliar padrões de fratura, lesões tumorais com destruição óssea ou o alinhamento detalhado entre vertebras. Seu uso é basicamente restrito ao contexto de trauma. 3. RESSONÂNCIA MAGNÉTICA É o melhor exame para avaliação de partes moles da coluna vertebral. É indicada para investigação de partes moles, lesões ligamentares, infiltração tumoral. Não é indicada para lombalgia mecânica. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Se o Lasègue é positivo, trata-se de compressão radicular. Em pacientes jovens, isso é uma hérnia discal; em pacientes idosos, deve-se tratar de metástase. Se a dor é pior à noite e melhora quando anda, é uma dor de caráter inflamatório. Se não há características de compressão radicular ou dor inflamatória e o paciente é jovem, trata-se de uma lombalgia mecânica. Idosos podem ter três tipos de patologiasda lombar: • Metástase óssea, se houver sinais consumptivos, associado ou não a compressão radicular; • Estenose lombar, se a dor piorar ao caminhar (com Lasègue negativo!). • Artrose, se houver sintomas meramente mecânicos (contudo, isso não exclui a possibilidade de lombalgia mecânica musculoligamentar em idosos!); TRATAMENTO Não importa a causa, toda dor lombar é tratada da mesma forma!! Tratamento conservador: 1. REPOUSO: o repouso na lombalgia deve ser restrito a somente dois a três dias. Ademais, deve ser um repouso relativo: nada de ficar deitado o dia inteiro. 2. ATIVIDADE FÍSICA E FORTALECIMENTO MUSCULAR: atividade aeróbica de baixo impacto é importante para controle do peso. Ao mesmo tempo, o fortalecimento isométrico do core abdominal é a chave para o controle de lombalgia. 3. PERDER PESO: o excesso de peso sobrecarrega a coluna lombar. Desta forma o alvo é perder 5% do peso corporal em 20 semanas. Tratamento farmacológico: Na dor aguda você desce a escada, enquanto na dor crônica você sobre! 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 ANALGÉSICOS: o que tem melhor efeito na lombalgia é a dipirona 1g, VO/IV. AINE: O Naproxeno 550mg é o mais seguro do ponto de vista cardíaco e o Celecoxibe 200MG 12/12H é o mais seguro do ponto de vista gástrico. Diclofenaco (Voltarem) 75mg IM; Cetoprofeno 100mg 12/12h. RELAXANTES MUSCULARES: temos o Carisoprodiol (dorflex ou tandrilax 6/6h) e ciclobenzaprina (Musculare/ Miosan) 5/10mg 8/8h. São indicados em crises agudas, pois não devem ser usados de forma continua. OPIÓIDES FRACOS: Tramadol 50mh 8/8h e Codeína 30mg 6/6h OPIÓIDE FORTE: Morfina 10/30mg 4/4h, oxicodona e metadona. ANTIDEPRESSIVOS: usados geralmente em dose baixa para auxiliar no tratamento de lombalgia crônica. Amitriptilina 25mg 1x ANTICONVULSIVANTES: indicados principalmente para dor neuropática, temos a Gabapentina e Pregabalina 75mg 12/12h VITAMINA B12: indicada para dor neuropática e neuropatias, ou seja, na lombociatalgia com resultados após 2-3 semanas de uso. Obs: Corticoides não tem qualquer indicação no tratamento de lombalgias mecânicas ou lombociatalgias. Dexametasona 10mg IV/IM ATAQUE + 4mg VO8/8H 3 DIAS OU DEXALGEN 1X AO DIA IM 3 DIAS. DOENÇA DEGENERATIVA DISCAL E HÉRNIA DISCAL A doença degenerativa discal é o processo de envelhecimento discal, inerente ao ser humano. A hérnia discal por outro lado é um processo patológico com extrusão do conteúdo do núcleo pulposo. O disco intervertebral serve como amortecedor das vertebras. É formado pelo anel fibroso, mais resistente e um conteúdo gelatinoso em seu interior, o núcleo pulposo. Como o processo de herniação se relaciona diretamente à carga exercida nas estruturas, as hérnias discais são muito mais comuns nos níveis L4-L5 e L5-S1. Um sinônimo de hérnia discal com compressão radicular é radiculopatia discal. Seu pico de incidência é entre 30 e 50 anos, acometendo 3x mais homens. FISIOPATOLOGIA A degeneração discal ocorre em três estágios, são eles: 1. DISFUNÇÃO: neste primeiro estágio ocorre entre os 15 e 45 anos, devido ao impacto 6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 nos discos por sustentar a coluna, ocorrem roturas no ângulo fibroso. Com isso, sua estrutura vai se desfazendo e o disco passa pelos estágios de abaulamento, protrusão e herniação. No abaulamento há apenas o esmagamento do disco, que perde sua estrutura e fica literalmente abaulado. Na protrusão, uma parte do disco, cuja estrutura foi mais fragilizada, começa a deslizar, protuindo-se assim para o canal. Por fim, quando o anel fibroso é rompido, o núcleo pulposo escorre formando a hérnia discal, que pode comprimir as raízes ou canal medular. 2. INSTABILIDADE: esta fase engloba os 35 aos 70 anos. Ocorre o rompimento do anel fibrosos do disco (herniação) subsequente reabsorção por ação macrofágica, e consequente degeneração articular. Esta é a fase mais sintomática da doença. Obesidade, atividades de impacto e tabagismo pioram os sintomas. 3. ESTABILIZAÇÃO: essa fase ocorre nos maiores de 60 anos. Uma vez que o disco perdeu o seu núcleo pulposo e desidratou ele perde sua capacidade de absorção de impacto. O resultado é uma franca osteoartrose: esclerose subcondral, perda de osso trabecular e osteofitose. Apresenta uma dor axial e bem menos intensa. QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO A dor de hérnia discal é uma lombociatalgia apresentada por: Dor axial: principalmente de origem mecânica, mas possivelmente devido a uma herniação central. Dor radicular: irradiada pelo trajeto da raiz comprimida. Tem características neuropáticas como queimação, formigamento, dormência e alterações da função muscular e sensitiva. SÍNDROME DA CAUDA EQUINA: É uma urgência ortopédica. As principais características são anestesia em sela e perda de controle de esfíncteres. Em ordem decrescente de frequência temos: lombalgia, dores nas pernas, parestesia perianal, disfunção de bexiga, impotência, persa sensimotora dos membros inferiores. A avaliação de uma suspeita de herniação discal exigira um exame físico neurológico completo, com avaliação da força motora e sensibilidade. • TESTE DE LASEGUE; • TESTE DE HOOVER: é feito com o paciente em decúbito dorsal. Com os membros esticados, apoiam-se os calcanhares sobre as palmas das mãos do examinador e se pede que o paciente tente erguer, sem dobrar o joelho, uma das pernas (isso avalia o reto femoral, portanto, o quadríceps). No paciente com verdadeira perda de força motora, o esforço feito o levará a comprimir a mão do examinador do lado não examinado, enquanto tenta elevar a perna contralateral. • TESTE DE SPURLING: ao se comprimir o crânio axialmente, reproduzem-se os sintomas de compressão radicular. No teste positivo, os sintomas são reproduzidos à compressão. Uma segunda fase do teste é a distração; após a compressão e reprodução dos sintomas, traciona-se a cabeça para cima, apoiando-se as mãos na mandíbula, o que alivia os sintomas. AVALIAÇÃO DOS EXAMES DE IMAGEM • RESSONÂNCIA MAGNÉTICA A RM é o exame mais rico para avaliação dessa patologia. Quando solicitar? - Dor refrataria ao tratamento conservador com mais de um mês de duração. - Avaliação diagnostica de suspeita de tumor, infecção ou trauma. • Nos asteriscos verdes, o núcleo pulposo, e nos asteriscos vermelhos, o anel fibroso. 7 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2023 • As setas verdes indicam abaulamentos discais. • As setas laranjas, por sua vez, indicam protrusão discal; com a lesão parcial do anel fibroso, os discos se protruem de cima do corpo vertebral. • Nas setas vermelhas, temos a hérnia discal: você pode ver que houve rompimento do anel fibroso, e o conteúdo do núcleo pulposo sai na região foraminal. • Na seta azul, temos um abaulamento discal posterocentral, enquanto, na seta laranja, temos uma protrusão foraminal. A RM é indicada para planejamento cirúrgico do paciente, pois o diagnóstico de uma hérnia discal é basicamente clínico, e o grau de doença degenerativa discal visto à ressonância não irá alterar o seu tratamento. TRATAMENTO Como a doença discal degenerativa é um processo atrelado ao envelhecimento, não há como impedi-la. Portanto, teremos de agir como na lombalgia: cuidando dos sintomas, prevenindo novas crises e tratando a causa; Os sintomas (dor lombar e dor radicular) são tratados por meio de repouso (igualmente por dois a três dias), analgesia medicamentosa, perda de peso, atividade física de baixo impacto e fortalecimento muscular. De medicações diferentes a serem associadas, entram aqui os anticonvulsivantes, visando a tratar a dor neuropática; A hérnia discal, em específico, dá-se um prazo de seismeses para que o tratamento conservador (bem feito) funcione. Caso não tenha havido melhora, considera-se o tratamento cirúrgico. O tratamento cirúrgico é a ressecção da hérnia e, ocasionalmente, do disco intervertebral. ESPONDILÓLISE E ESPONDILOLITESE Lesão da articulação entre duas vértebras, ocasionada por uma mistura de defeito de formação e estresse repetitivo em hiperextensão. Principal causa de lombalgia em crianças. ESPONDILOLITESE: é o escorregamento vertebral ocorrendo mais frequentemente no nível da L5-S1. Uma lesão da pars interarticularis leva ao deslizamento e consequente compressão do canal medular. QUADRO CLÍNICO A espondilólise é na maioria dos casos assintomática e seu diagnóstico passará certamente despercebido até iniciarem os sintomas, ou surgir como achado incidental de exame de imagem. Apresenta-se como uma dor axial, relacionada à atividade causal (atividade física), com piora à extensão e melhora à flexão do tronco. Ao exame físico, pode ser observada uma retificação lombar (especialmente quando já ocorreu a espondilolistese), dor à palpação da faceta articular e encurtamento dos isquiotibiais (por contratura muscular). DIAGNÓSTICO O diagnóstico é feito por meio da combinação entre história clínica e exame radiográfico. A espondilólise é classicamente mais bem vista à radiografia oblíqua, pelo sinal do Scotty Dog. A espondilolistese, no perfil, pelo deslizamento anterior da vértebra superior. O exame mais sensível para diagnóstico é a cintilografia TRATAMENTO O tratamento conservador é o mesmo para lombalgia. Entretanto, especificamente aqui, é essencial o afastamento do atleta de sua atividade causal. Nos casos refratários indica-se a fusão das vertebras ou reparo da pars.
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