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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 1.843.853 - MG (2019/0313460-0) RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS RECORRIDO : ELTON JOSE HONORIO (PRESO) ADVOGADO : JOSÉ BONIFÁCIO SANTANA - DEFENSOR DATIVO - MG115030 DECISÃO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS interpõe recurso especial, fundado no art. 105, III, "a", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça daquele estado (Apelação n. 1.0702.16.014822-8/001). Alega o recorrente que a absolvição dos réus pela Corte estadual acarreta a violação dos arts. 157, § 2º, II e 311, ambos do Código Penal. Salienta que para a configuração do delito do art. 311 do CP, "basta que tenha ocorrido adulteração de um dos sinais identificadores do veículo, o que se verifica no caso em análise" (fl. 404). Sustenta, ainda, que as provas dos autos são suficientes para a condenação de Elton pelo crime de roubo. Requer, ao final, o provimento do recurso, com o fim de que seja restabelecida a sentença condenatória proferida pelo Magistrado singular. Contrarrazões (fl. 434) e decisão de admissibilidade (fls. 456-459). O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 471-475). Decido. O recurso é tempestivo e foram preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual merece conhecimento. Em primeiro grau, o Juiz condenou o réu à pena de 14 anos e 8 meses de reclusão, pela prática dos delitos descritos nos arts. 311, caput, c/c o Documento: 105329841 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 11/02/2020 Página 1 de 5 Superior Tribunal de Justiça 157, § 2º, II, na forma do art. 69, todos do Código Penal. O Tribunal de origem considerou atípica a conduta descrita no art. 311, caput, do Código Penal, bem como ausentes a provas de autoria em relação ao recorrente no tocante à quatro crimes de roubo pelos quais havia sido condenado em primeira instância. Em relação à absolvição pelos delitos de roubo, assim ficou consignado no acórdão (fls. 339-341): O apelante Elton José Honório confessou apenas a prática o delito de roubo praticado contra a vítima José Carlos de Oliveira, que o reconheceu tanto na fase inquisitiva como em juizo - [f.06 e 155] não sendo sequer questionada esta condenação pela defesa. Este, ademais, não delatou o corréu, inexistindo também em relação ao delito praticado contra a mencionada vítima prova da participação de Jander Lúcio Rosa, não sendo reconhecido pela vítima, a saber: "[...] que os policiais mostraram ao declarante as fotografias dos dois suspeitos no que o apelante reconheceu com certeza absoluta Elton José Honório como sendo o assaltante que se aproximou com uma ama de fogo; que quanto ao outro suspeito o declarante relata que este não se aproximou e não poderia dizer com certeza[...]" [f 06, confirmado à f. 1 55]. Há, portanto, nos autos, meros indícios que não constituem prova segura e estreme de dúvida para a condenação do apelante Jander Lúcio Rosa pela prática dos cinco delitos descritos na exordial e do apelante Elton Lúcio Rosa pela prática de quatro delitos. Prevalece no presente caso, destarte, a absolvição em observância ao principio do in dúbio pro reo. [...] Absolvo assim o apelante Jander Lúcio Rosa da prática dos delitos de roubo descritos na denúncia e o apelante Elton José Honório da prática dos delitos de roubo em relação às vítimas Marcelo Martins Viana, Cláudia Ribeiro Marra, Simone Soares da Silva e Diemi Alves de Oliveira nos termos do artigo 386 inciso VII do Código de Processo Penal. Dos trechos transcritos, verifico que a Corte estadual, após minucioso exame das provas que instruem o feito, produzidas sob o crivo do contraditório, concluíram pela absolvição do recorrido, uma vez que entendeu não comprovadas a autoria em relação aos quatro roubos que lhe haviam sido imputados na sentença. Documento: 105329841 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 11/02/2020 Página 2 de 5 Superior Tribunal de Justiça Dessa forma, rever tal entendimento, para decidir pela condenação, como pugna o especial, importaria em reexame do acervo fático-probatório dos autos, procedimento vedado em recurso especial, por força do enunciado sumular n. 7 do Superior Tribunal de Justiça. Nesse sentido, mutatis mutandis: [...] 1. A pretensão do recorrente de modificar o entendimento firmado pelas instâncias ordinárias, no sentido da sua absolvição, por ausência de prova acerca da autoria delitiva, ou, subsidiariamente, o afastamento do concurso de agentes e do uso de arma, demandaria reexame de provas, o que é inviável na via do recurso especial, segundo dispõe o enunciado n. 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça. [...] 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 1.503.125/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., DJe 30/8/2019) Em relação ao delito de adulteração de sinal de veículo automotor, assim ficou consignado no acórdão (fls. 342-345): A adulteração dos números e letras da placa da motocicleta com o uso de fita isolante foi no presente caso grosseira, facilmente perceptível a olho nu pelos agentes que efetuaram a abordagem do veículo, não sendo tal conduta capaz de configurar o delito, pois, não atingiu a fé pública. [...] A colocação de uma fita isolante com o fim de alterar a placa do veículo se constituiu em uma adulteração grosseria, incapaz de ludibriar alguém, tornando a conduta atípica Ao contrário do que decidiu o Tribunal de origem, a conduta realizada pelo recorrido, que, com o uso de fita isolante, modificou o número da placa da motocicleta, configura o delito tipificado no art. 311 do Código Penal. O art. 311 do Código Penal estabelece que: Documento: 105329841 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 11/02/2020 Página 3 de 5 Superior Tribunal de Justiça Art. 311 - Adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento. Pena - reclusão, de três a seis anos, e multa. O Código de Trânsito Brasileiro, por sua vez, esclarece que "o veículo será identificado externamente por meio de placas dianteira e traseira, sendo esta lacrada em sua estrutura, obedecidas as especificações e modelos estabelecidos pelo CONTRAN" (art. 115). Dessa forma, as placas constituem, sim, um sinal identificador de qualquer veículo. O tipo em questão visa resguardar a autenticidade dos sinais identificadores de veículos automotores, não fazendo qualquer restrição. Com isso, ele busca tutelar a fé pública, mais especificamente a propriedade, o registro e a segurança dos veículos automotores. Objetiva, também, resguardar o poder de polícia do Estado. Assim, não se exige que a conduta do agente seja dirigida a uma finalidade específica, basta que modifique qualquer sinal identificador de veículo automotor. Nesse sentido é a jurisprudência deste Superior Tribunal que entende que a simples conduta de adulterar a placa de veículo automotor é típica, enquadrando-se no delito descrito no art. 311 do Código Penal. Ilustrativamente: [...] 2. A jurisprudência desta Corte superior entende que a conduta de alterar a placa de veículo automotor, por qualquer meio, ainda que grosseira e perceptível a "olho nu" configura a conduta típica descrita no art. 311 do Código Penal. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 420.466/SC, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 16/10/2018) [...] 1. É firme a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido da tipicidade da conduta consistente em alterar a placa de veículo automotor por meio da colocação de fita adesiva, sendo Documento: 105329841 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 11/02/2020 Página 4 de 5 Superior Tribunal de Justiça irrelevante, para tanto, que o proprietário o tenha feito pessoalmente ou por intermédio de terceira pessoa não credenciada junto ao Departamento de Trânsito. 2. Agravo regimentaldesprovido. (AgRg no REsp n. 1.186.950/RJ, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., DJe 14/5/2013) À vista do exposto, dou parcial provimento ao recurso especial, apenas para, afastada a atipicidade da conduta descrita no art. 311 do Código Penal, restabelecer a sentença condenatória. Publique-se e intimem-se. Brasília (DF), 03 de fevereiro de 2020. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ Documento: 105329841 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 11/02/2020 Página 5 de 5
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