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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO LINHA DE PESQUISA: EDUCAÇÃO E INCLUSÃO EM CONTEXTOS EDUCACIONAIS JAISE DO NASCIMENTO SOUZA CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UM DIÁLOGO COM PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL NATAL/RN 2021 JAISE DO NASCIMENTO SOUZA http://lattes.cnpq.br/5679206182601793 CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UM DIÁLOGO COM PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador(a): Profa. Dra. Maria Aparecida Dias NATAL/RN 2021 http://lattes.cnpq.br/5679206182601793 JAISE DO NASCIMENTO SOUZA http://lattes.cnpq.br/5679206182601793 CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UM DIÁLOGO COM PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Aprovada em: 22/07/2021. BANCA EXAMINADORA Profa. Dra. Maria Aparecida Dias (Orientadora) Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Profa. Dra. Luzia Guacira dos Santos Silva (Examinadora Interna Titular) Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Profa. Dra. Débora Regina de Paula Nunes (Examinadora Interna Suplente) Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Profa. Dra. Graciele Massoli Rodrigues (Examinadora Externa Titular) Universidade São Judas Tadeu (USJT) Profa. Dra. Michele Pereira de Souza da Fonseca (Examinadora Externa Suplente) Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) http://lattes.cnpq.br/5679206182601793 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes - CE Souza, Jaise do Nascimento. Corpo e aprendizagem da criança com Transtorno do Espectro Autista : um diálogo com professoras da educação infantil / Jaise do Nascimento Souza. - 2021. 138 f.: il. color. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação. Natal, RN, 2021. Orientadora: Profa. Dra. Maria Aparecida Dias. 1. Inclusão escolar - Dissertação. 2. Transtorno do Espectro Autista - Dissertação. 3. Corpo - Dissertação. 4. Formação de professores - Dissertação. I. Dias, Maria Aparecida. II. Título. RN/UF/Biblioteca Setorial Moacyr de Góes CDU 376 Elaborado por Jailma Santos - CRB-15/745 AGRADECIMENTOS Agradeço e dedico este estudo primeiramente a Deus, fonte de luz, inspiração e sabedoria. Nada teria sido possível sem os Seus cuidados diários e inquestionável amor. Ao meu papai (in memoriam), homem íntegro e destemido a quem devo a vida e o desejo pelo bem viver. Trago alguns de seus ensinamentos nesta pesquisa, com referência, inclusive, ao grande profissional que foi um dia. À minha mainha, Dona Nena, mulher simples, batalhadora, maior incentivadora, de um coração lindo e acolhedor. Estudar e debruçar-me sobre este texto dissertativo não teria sido possível sem o seu apoio e amor. Obrigada por tudo e por tanto, querida “veinha”. À minha linda filha Ana Caroline, que está com seis meses de nascida, contrariando um diagnóstico médico de que eu não poderia engravidar, embora em meu coração sempre tenha existido a certeza de que seria mãe um dia. Juntas, enfrentamos durante o ano de 2020, uma gravidez de risco, o distanciamento social, todas as dificuldades decorrentes da pandemia do novo coronavírus e uma exaustiva rotina de atividades on-line e estudos que se estendeu por noites e dias. Em meu ventre ela foi a minha força e companhia nessa solitária travessia que se chama Mestrado, e hoje é o Sol que aquece a minha vida. No seu sorriso banguela tenho encontrado motivos para sonhar novos sonhos e continuar a lutar. Te amo, minha pequena bonequinha! Ao meu irmão Jailton, por toda força, cuidados e alegria. Mesmo distantes fisicamente, beijo sua face todos os dias. O amo além das palavras. À Profa. Débora Regina de Paula Nunes, ser humano lindo e grande pesquisadora de quem tive o privilégio de ser aluna especial na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, um ano antes de chegar ao Mestrado. Minha admiração e respeito por essa profissional que se dedica com amor à Educação Especial e aos estudos sobre o Transtorno do Espectro Autista, nos incentivando a olhar com zelo e responsividade para o exercício da pesquisa e da escrita acadêmica. À minha orientadora, a Profa. Maria Aparecida Dias, pelas contribuições e constante encorajamento. A concepção de corpo apresentada nesta dissertação é fruto de uma busca legítima e apaixonada entremeada a quatro mãos. Minha gratidão por sua parceria, compreensão e ensinamentos. Aos professores do PPGED/UFRN, em especial aos que fazem parte da Linha de Pesquisa “Educação e Inclusão em Contextos Educacionais”, pela contribuição no decorrer desta caminhada. Aos professores Jefferson Fernandes, Rita de Cássia Magalhães, Géssica Fabiely, Luzia Guacira e Débora Nunes, pelas valiosas contribuições nos Seminários de Dissertação. Aos professores da banca examinadora, pela disponibilidade e contribuição no trabalho proposto. À Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Parnamirim/RN, por concordar com a nossa pesquisa, e a toda a equipe do Centro Municipal de Educação Infantil lócus desta investigação, pela acolhida e colaboração, em especial aos professores participantes pela também possibilidade de formação. Às amigas Tatiana Rachel, Josélia Praxedes e Suênia Karla, por se fazerem sempre presentes na minha vida apesar da distância, e se alegrarem com as minhas realizações. Cada uma, a sua maneira, ocupa um lugar especial em meu coração. A todos, minha gratidão. Nós somos responsáveis pelo outro, estando atentos a isto ou não, desejando ou não, torcendo positivamente ou indo contra, pela simples razão de que, em nosso mundo globalizado, tudo o que fazemos (ou deixamos de fazer) tem impacto na vida de todo mundo e tudo o que as pessoas fazem (ou se privam de fazer) acaba afetando nossas vidas (BAUMAN, 2010, p. 75-76). RESUMO As políticas de inclusão do Brasil, a exemplo da Lei nº 12.764/2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), ampliaram o debate acerca da garantia de direitos e do processo de inclusão escolar desses indivíduos no sistema regular de ensino. No entanto, há relatos, na literatura, de que esse movimento ainda enfrenta muitos desafios, sendo um dos mais graves a precariedade na formação dos professores para atuar numa perspectiva inclusiva, com reflexo na execução de práticas pedagógicas que ainda compreendem o corpo separado do sujeito. Considerando o exposto, nosso estudo se desenvolveu objetivando analisar a percepção de professoras da Educação Infantil sobre a relação entre corpo e aprendizagem no processo de inclusão escolar de crianças com Transtorno do Espectro Autista. Desse objetivo geral, desdobraram-se os seguintes objetivos específicos: a) Identificar a concepção de professoras da Educação Infantil sobre inclusão escolar,corpo e aprendizagem de crianças com Transtorno do Espectro Autista; b) Analisar a relação entre corpo e aprendizagem de crianças com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil; c) Aplicar uma proposta de formação continuada com ênfase na relação corpo e aprendizagem e crianças com TEA. Dentre os autores a que recorremos para a consecução dos objetivos desta pesquisa, estão os trabalhos desenvolvidos por Mantoan (2003); Mendes (2006) e Magalhães (2007) sobre diversidade e inclusão escolar; Nóvoa (2009); Favoretto e Lamônica (2014) sobre formação de professores; Schuwartzman (2003); Nunes; Azevedo; Schmidt (2013) e Fernandes (2008) acerca do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Destacamos ainda os estudos de Merleau-Ponty (2006); Gaya (2006); Nóbrega (2005) e Freire (2011), onde encontramos subsídios para fundamentarmos nossas discussões sobre a relação corpo e aprendizagem. Trata-se, portanto, de uma pesquisa qualitativa, de caráter exploratório, na qual adotamos a técnica de Grupo Focal combinada às entrevistas individuais para obtenção de dados. Já o tratamento dos dados das entrevistas semiestruturadas, foi feito a partir da análise de conteúdo de Bardin (2016). Participaram desta investigação 05 professoras da Educação Infantil da rede municipal de Parnamirim/RN que tinham regularmente matriculadas em suas turmas crianças diagnosticadas com TEA, e a nossa proposta de formação se deu via plataforma digital de comunicação visando problematizar a relação corpo, aprendizagem e inclusão escolar de crianças com TEA no contexto da Educação Infantil. Os resultados apontam para a ausência de vivências coletivas e de espaços destinados à formação continuada para a construção de saberes a partir da ação- reflexão no fazer docente, desconhecimento das professoras acerca do TEA e a presença marcante de concepções que não valorizam o corpo da criança no processo educativo, por ainda o enxergarem apenas como um corpo físico, em muitos casos reprimido a favor da valorização do desenvolvimento cognitivo. Consideramos que a compreensão de corpo como espaço de aprendizagem na educação é indispensável à inclusão escolar de estudantes com TEA na escola regular, e nesse cenário, investir na formação do professor, remota ou presencialmente, continua sendo essencial. Palavras-chave: Corpo. Transtorno do Espectro Autista (TEA). Inclusão escolar. Formação docente. ABSTRACT The inclusion policies in Brazil, such as Law No. 12,764/2012, which establishes the National Policy for the Protection of the Rights of the Person with Autistic Spectrum Disorder (ASD), have broadened the debate about the guarantee of rights and the process of school inclusion of these individuals in the regular education system. However in the literature there are reports that this movement still faces many challenges, one of the most serious being the precariousness in the training of teachers to work in an inclusive perspective reflected in the execution of pedagogical practices that still understand the body as separate from the subject. Considering this, our study aimed to analyze the perception of Kindergarten teachers about the relationship between body and learning in the process of school inclusion of children with Autistic Spectrum Disorders. From this general objective the following specific objectives unfolded: a) Identify the conception of Kindergarten teachers about school inclusion, body, and learning of children with Autistic Spectrum Disorder; b) Analyze the relationship between body and learning of children with ASD in the conception of Kindergarten teachers; c) Apply a continuing education proposal with emphasis on the relationship between body and learning and children with ASD. Among the authors to which we resorted to achieve the objectives of this research are the works developed by Mantoan (2003); Mendes (2006) and Magalhães (2007) on school diversity and inclusion; Nóvoa (2009); Favoretto and Lamônica (2014) on teacher training; Schuwartzman (2003); Nunes; Azevedo; Schmidt (2013) and Fernandes (2008) on Autistic Spectrum Disorder (ASD). We also highlight the studies by Merleau-Ponty (2006); Gaya (2006); Nóbrega (2005), and Freire (2011), in which we found subsidies to base our discussions about the relationship between body and learning. This is, therefore, a qualitative, exploratory research, in which we adopted the focus group technique combined with individual interviews to obtain data. The data treatment of semi-structured interviews was based on Bardin's content analysis (2016). This research was conducted with the participation of 05 Kindergarten teachers from the municipal education system of Parnamirim/RN who had regularly enrolled in their classes children diagnosed with ASD, and our training proposal was by digital communication platform, aiming to problematize the relationship between body, learning and school inclusion of children with ASD in the context of Early Childhood Education. The results point to the absence of collective experiences and of spaces for continuing education to build knowledge from action-reflection in the teaching process, teachers' lack of knowledge about ASD, and the strong presence of conceptions that do not value the child's body in the educational process, for still seeing it only as a physical body, in many cases, repressed in favor of valuing cognitive development. We believe that understanding the body as a learning space in education is indispensable to the school inclusion of students with ASD in regular school. And in this scenario investing in teacher training, remotely or in person, continues to be essential. Keywords: Body. Autistic Spectrum Disorder (ASD). School inclusion. Teacher training. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABA – Análise Comportamental Aplicada ABRA – Associação Brasileira de Autismo AEE – Atendimento Educacional Especializado (AEE) AMA – Associação de Amigos do Autista APA – American Psychiatric Association BDTD – Banco Digital de Teses e Dissertações BNCC – Base Nacional Comum Curricular CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEI – Centro de Educação Infantil CEP – Conselho de Ética em Pesquisa CF – Constituição Federal CID – Classificação Internacional das Doenças CMEI – Centro Municipal de Educação Infantil COVID-19 – Corona Vírus Disease (Doença do Coronavírus) DF – Distrito Federal DSM – Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais EI – Educação Infantil HOUL – Hospital Universitário Onofre Lopes IBICT – Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia IES – Instituições de Ensino Superior LBI – Lei Brasileira de Inclusão LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional NAS – National Autistic Society NEE – Necessidades Educacionais Especiais OMS – Organização Mundial de Saúde PAEE – Público-alvo da Educação Especial PMEP – Plano Municipal de Educação de Parnamirim PPGED – Programa de Pós-Graduação em Educação PPP – Projeto Político-Pedagógico RCNEI – Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil RN – Rio Grande do Norte SEMEC – Secretaria Municipal de Educação e Cultura TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TEA – Transtorno do Espectro Autista TEACCH – Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com déficits relacionados à Comunicação TID – Transtornos Invasivos do Desenvolvimento UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Crianças presas a um radiador, no hospital psiquiátrico de Deir el Qamar, no centro-sul do Líbano, no ano de 1982 ...................................................................................... 39 Figura 2 – Operacionalizaçãodo Grupo Focal ......................................................................... 58 Figura 3 – Entrada principal do CMEI ..................................................................................... 64 Figura 4 – Área verde da instituição investigada ..................................................................... 65 Figura 5 – Convite virtual para os professores participarem da formação ............................... 72 Figura 6 – Teorias da Aprendizagem ..................................................................................... 102 Figura 7 – Formação das professoras via Google Meet ......................................................... 108 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Publicações selecionadas para a feitura do estado da arte ..................................... 20 Quadro 2 – Participantes do Grupo Focal de nossa pesquisa ................................................... 59 Quadro 3 – Quantitativo de crianças atendidas por turno e por turma no ano de 2020 ........... 65 Quadro 4 – Quantitativo de crianças com laudo de TEA matriculadas no CMEI no ano de 2020 .......................................................................................................................................... 67 Quadro 5 – Informações gerais sobre as participantes da pesquisa .......................................... 68 Quadro 6 – Fases da pré-análise ............................................................................................... 73 Quadro 7 – Respostas das professoras quanto à concepção de autismo ................................... 87 Quadro 8 – Respostas das professoras quanto às características do TEA ................................ 89 Quadro 9 – Desafios e possibilidades da prática docente para trabalhar com crianças autistas .................................................................................................................................................. 91 Quadro 10 – Proposta de formação docente via Google Meet ............................................... 105 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO: DAS INTENÇÕES À EFETIVAÇÃO DA PESQUISA ..................... 16 2 DO CORPO OBJETO AO CORPO SUJEITO: UMA TRAJETÓRIA DE GRANDES DESAFIOS .............................................................................................................................. 25 2.1 CORPO E DEFICIÊNCIA .............................................................................................. 25 2.2 O CORPO NO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA ....................................... 33 2.3 EDUCAÇÃO INFANTIL, CORPO E APRENDIZAGEM ........................................... 44 3 FORMAÇÃO DOCENTE E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA ........................................... 48 3.1 FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DE QUE ESTAMOS FALANDO? ...................................................................................................... 48 4 PERCURSO METODOLÓGICO ..................................................................................... 55 4.1 ASPECTOS ÉTICOS ..................................................................................................... 56 4.2 DELINEAMENTO DA PESQUISA .............................................................................. 57 4.3 INSTRUMENTOS UTILIZADOS ................................................................................. 60 4.4 LÓCUS DA PESQUISA ................................................................................................ 63 4.5 PROFESSORAS PARTICIPANTES ............................................................................. 67 4.6 OPERACIONALIZAÇÃO DA PESQUISA .................................................................. 69 4.7 PROCEDIMENTOS PARA A ANÁLISE DOS DADOS ............................................. 72 5 APRESENTAÇÃO DAS CATEGORIAS ......................................................................... 76 5.1 A INCLUSÃO ESCOLAR DA CRIANÇA COM TEA NO CONTEXTO DA ESCOLA REGULAR ............................................................................................................................ 77 5.2 CORPO E AUTISMO .................................................................................................... 87 5.3 RELAÇÃO CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TEA NA CONCEPÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL .................................. 96 6 CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UMA PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL VIA GOOGLE MEET ........................ 104 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 112 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 115 APÊNDICE A – CARTA DE ANUÊNCIA DA SEMEC, PARNAMIRIM/RN .............. 127 APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA APLICADA ÀS PROFESSORAS ................................................................................................................... 128 APÊNDICE C – TERMO DE ESCLARECIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) ................................................................................................................................... 130 APÊNDICE D – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE VOZ ......... 134 ANEXO A – PARECER CONSUBSTANCIADO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA (CEP) ................................................................................................................ 135 16 1 INTRODUÇÃO: DAS INTENÇÕES À EFETIVAÇÃO DA PESQUISA Nutro, desse a graduação em Pedagogia (2003-2007), um interesse especial por estudos relacionados à formação do profissional docente e as práticas em educação, sobretudo no que envolve a inclusão de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), na Educação Infantil (EI). O entusiasmo pela temática surgiu no início do ano de 2003, quando, pela primeira vez, no desempenho de minha atividade docente, tive a oportunidade de trabalhar com uma criança autista, de quatro anos, na escola regular. A situação era nova, extremamente desafiadora e, além de sozinha, eu me sentia totalmente despreparada para colaborar com a efetiva inclusão escolar daquela criança. Nesse processo, me vi tomada por muitos questionamentos: O que fazer? Quais estratégias de ensino eu poderia acionar para contribuir com o seu processo de aprendizagem? Como mediar situações de crise? Como dialogar com a família da criança? Eram tantas as interrogações que, em meio as minhas angústias, resolvi debruçar-me com mais afinco sobre o assunto. Movida pela inquietação e por uma necessidade constante de aprendizado participei de eventos, oficinas pedagógicas, cursos de capacitação na área de Educação Especial, e depois de alguns meses, concomitantemente as minhas atividades como professora da EI e também às da universidade, que desenvolvia no turno da noite, comecei a trabalhar como Terapeuta Ocupacional com base no Programa TEACCH1 (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com déficits relacionados à Comunicação), experiência muito enriquecedora, que despertou em mim um sentimento novo, um senso de curiosidade técnica e científica para o aperfeiçoamento de minha prática, que no espaço em questão seria o primeiro motivo a justificar minha procura pelo mestrado. Outro motivo a mobilizar-me na busca por essa formação envolve a falta que sempre senti, tanto na minha trajetória acadêmica quanto profissional, do diálogo com outros professores sobre aspectos teóricos e práticos relacionados à inclusão escolar de estudantes1 Programa interventivo criado por Eric Schopler e colaboradores na década de 1960, na Universidade da Carolina do Norte (EUA), amplamente disseminado na literatura científica como uma prática cientificamente válida ou PBE no contexto educacional (LACERDA et al., 2011). Em linhas gerais, o referido programa propõe o ensino individualizado e combina diferentes materiais concretos e visuais para auxiliar a criança a estruturar o seu ambiente e a sua rotina (SILVA, 2012), elementos considerados imprescindíveis para as pessoas com TEA que “precisam de uma estrutura externa para otimizar uma situação de aprendizagem” (GENTIL; NAMIUTI, 2015, p. 182). 17 com TEA na escola regular. Não se tratava, no entanto, de simplesmente saber o que pensavam e como trabalhavam meus colegas docentes para qualificá-los de competentes ou despreparados. Minha inquietação erguia-se sobre a sentida carência de comunicação entre nós professores, seguida da falta de envolvimento para a resolução de determinadas problemáticas que brotavam no espaço escolar. O desejo era mobilizar as vozes desses profissionais, seus saberes, e tratar possibilidades de reflexão teórica integrada à prática docente, como uma alternativa viável para o aperfeiçoamento de práticas pedagógicas inclusivas. O intento era chamar a atenção de forma delicada para a necessidade de se olhar para esse professor como um sujeito aprendente, que primeiramente precisaria “experimentar-se existente” (MERLEAU-PONTY, 2006, p. 4), para efetivamente poder contribuir com a vida escolar da criança com TEA. E, assim, configura-se o anseio de aprofundar minha formação e, através desta, quiçá, poder colaborar com a formação de outros de professores de Educação Infantil a favor da inclusão. Nessa busca, logo após terminar o curso de Pedagogia, dei início, no ano de 2008, a uma especialização em Psicopedagogia Educacional, na qual pude retomar questionamentos e abrir-me a novos aprendizados no que diz respeito à inclusão escolar das pessoas com deficiência, sempre atentando para a forma como nós, professores de EI, temos adequado nossas práticas para tal perspectiva. Posteriormente, alguns anos depois e já em solo potiguar – regalo de inesperadas e doces conquistas – ingresso como aluna especial no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPGED/UFRN), no qual tive a oportunidade de cumprir dois almejados componentes curriculares: Formação, desenvolvimento e profissionalização docente (2017.1) e Educação de alunos com Transtorno do Espectro do Autismo (2018.2). Em linhas gerais, o primeiro componente me permitiu articular importantes reflexões à compreensão de fatores que influenciam na aprendizagem, formação e desenvolvimento do profissional docente na atualidade, assunto cada vez mais presente tanto no campo das reformas educacionais como, também, de boa parte das pesquisas em educação. Enquanto o segundo, respectivamente, constituiu-se numa singular oportunidade para trocas de experiências, estudo mais aprofundado sobre o TEA, reflexão, pesquisa e operacionalização entre teoria e prática, considerados elementos fundamentais para nossa formação enquanto professores pesquisadores. 18 Juntos, os dois componentes curriculares me ajudaram a escrever o projeto de pesquisa que levou a minha aprovação no Mestrado em Educação da UFRN e com ela ao desabrochar de novas possibilidades, e, por que não dizer, de novas inquietações. Desse modo, e tendo como cenário das discussões o espaço da Educação Infantil – lugar educativo voltado ao desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físicos, emocionais, cognitivos e sociais, onde também se podem vivenciar situações de inclusão – surge a pesquisa intitulada “Corpo e aprendizagem da criança com Transtorno do Espectro Autista: um diálogo com professoras da Educação Infantil”. Mas, por que dissertar acerca do corpo dentro desse contexto de buscas e reflexões sobre formação docente e inclusão escolar de estudantes com TEA na Educação Infantil? Bem, considerando que as minhas primeiras experiências formativas na perspectiva da inclusão se deram na gleba do TEACCH, a proposição não teria uma motivação infundada, haja vista tratar-se de uma prática cientificamente válida no contexto educacional (NUNES; AZEVEDO; SCHMIDT, 2013) que presume o envolvimento do corpo do estudante com TEA para o desenvolvimento de suas habilidades acadêmicas e funcionais. No entanto, a temática “corpo” só entrou nesta pesquisa após aprovação no mestrado, graças aos diálogos/discussões com a minha orientadora, a professora Maria Aparecida Dias, que o apresentou como sendo um lugar de inclusão, “vetor semântico pelo qual a evidência da relação com o mundo é construída” (LE BRETON, 2007, p. 7). Além disso, o TEACCH figura-se mais próximo de uma compreensão organicista do corpo, que a rigor confere significativa importância ao visual como via sensorial de maior facilidade pela qual as pessoas com TEA demonstram aprender, e a nossa proposta nesta dissertação é perscrutar o desafio de estar falando de um corpo como “unidade expressiva” (MERLEAU PONTY, 2006), que me foi apresentado como capaz de construir narrativas mediante o diálogo com o mundo sensível para além da condição de objeto, por acreditarmos na hipótese de que os professores que atuam na Educação Infantil enfrentam dificuldades para desenvolver práticas inclusivas tendo o corpo como lugar de aprendizagem. O intento é explorar, a favor da inclusão escolar da criança com TEA na Educação Infantil, uma compreensão de corpo ausente à minha formação, e quem sabe à formação de colegas de profissão, frente à ideia de que o movimento corporal nem sempre é valorizado na prática pedagógica (CHICON et al., 2018), sendo considerado, em alguns casos, unicamente como sinal de indisciplina ou desorganização devido à constante agitação. 19 Assim sendo, discorrer sobre aprendizagem considerando a condição corpórea e sensível do ser humano, pressupõe sair de minha zona de conforto, enveredar por campos desconhecidos, possivelmente flagelar algumas de minhas percepções, e refazer-me enquanto profissional docente ao passo que almejo contribuir com a formação de outros professores da Educação Infantil. Algo assentado na linha do desafio, da impermanência, da ideia que se fazia casulo para ganhar ares de inquietação. E justamente aí se dá o interesse pelo estudo do tema corpo associado às discussões sobre TEA, inclusão escolar na Educação Infantil e formação docente. Sob essa perspectiva e utilizando como critérios de inclusão trabalhos nacionais e em língua portuguesa, foi realizado um levantamento de dados nos ambientes virtuais do Banco Digital de Teses e Dissertações (BDTD) do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT/BDTD), no Repositório de Teses e Dissertações da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), e no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), utilizando os descritores “corpo”, “Transtorno do Espectro Autista”, “inclusão escolar” AND “formação docente”. Esses descritores também são conceitos que orientaram a nossa pesquisa e fundamentaram esta dissertação. Partindo desses descritores, utilizamos como filtro para refinar o resultado de nossas buscas, pesquisas dos últimos oito anos, ou seja, desde a promulgação da Lei nº 12.764/2012, que institui a “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista” até dezembro de 2020. Já os critérios de exclusão foram: duplicidade dos trabalhos, indisponibilidade nos sistemas pesquisados e falta de aproximação com os temas de nossas discussões. Considerando o período em foco, foram encontradas 78 publicações, entre artigos, teses e dissertações, sendo 39 no Portal de Periódicos Fundação CAPES/MEC;11 no Repositório Institucional da UFRN e 28 na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD). Na sequência, após a leitura na íntegra de títulos e resumos, conforme será exposto no Quadro 1, apenas duas pesquisas foram selecionadas para análise por envolverem alunos com TEA e trazerem a concepção de corpo como espaço de aprendizagem, cujo estudo não deve ser dissociado do estudo da criança. 20 Quadro 1 – Publicações selecionadas para a feitura do estado da arte Fonte: Elaborado pela autora (2020). O estudo de Chicon et al. (2018) buscou compreender os aspectos relacionais de uma criança autista com outras crianças em situações de brincadeiras, no lócus de uma brinquedoteca universitária. Participaram desse estudo 17 crianças de três a seis anos, sendo dez de um Centro de Educação Infantil (CEI) com desenvolvimento típico, seis com TEA e uma com Síndrome de Down, todas oriundas da comunidade de Vitória/ES. Nos resultados da pesquisa, os autores afirmam que o trabalho pedagógico desenvolvido em um ambiente social inclusivo, potencializado pela mediação de profissionais experientes capazes de articular a ação reflexão teórico-prática, favoreceu a predisposição da criança com TEA para compartilhar interesses, objetos e brincadeiras com outras crianças, sendo a qualidade dessas relações algo crucial para o desenvolvimento infantil. Para Chicon et al. (2018, p. 171), a criança deve ser “compreendida como uma totalidade, e não a partir de uma separação entre corpo e mente ou de uma dicotomia entre o social e o individual”. Assim sendo, embora os 17 participantes dessa pesquisa tenham sido atendidos por 13 estagiários do curso de Educação Física em um ambiente controlado (realidade apartada do chão da escola regular), o estudo se torna relevante para os nossos constructos por problematizar e refletir sobre o desenvolvimento integral das crianças com autismo nas relações estabelecidas na escola, como também por conferir importância à necessidade de se investir continuamente na formação do professor, para que este seja capaz BANCO DE DADOS TIPO DE PUBLICAÇÃO/ANO TÍTULO AUTORES PALAVRAS- CHAVE Portal de Periódicos Fundação CAPES/MEC Artigo da Revista Brasileira de Ciência do Esporte (2018) Brincando e aprendendo: aspectos relacionais da criança com autismo CHICON, José Francisco; OLIVEIRA, Ivone Martins de; GAROZZI, Gabriel Vighini; COELHO, Marcos Ferreira; SÁ, Maria das Graças Carvalho Silva de. Autismo infantil; Interação social; Mediação pedagógica; Brincadeira. Biblioteca digital de Teses e Dissertações (BDTD) Tese doutoral em educação (PUC Goiás, 2015) Corpo e percepções no espectro autista FREITAS, Ana Beatriz Machado de. Fenomenologia; Percepção; Educação Especial; Corpo; Autismo. 21 de desenvolver mediações pedagógicas intencionais, que sejam sensíveis às experiências corporais da criança com TEA. A tese doutoral de Freitas (2015) objetivou desvelar modos de percepção característicos do espectro autista, predominantemente a partir da perspectiva de quem o apresenta, ou seja, pelo viés da existência, por considerar que o conhecimento e a relevância da dimensão perceptiva pouco são destacados na Educação, mesmo nos estudos e formações pedagógicas concernentes à Educação Especial. Partindo desse pressuposto, a autora buscou na literatura testemunhos de pessoas com deficiência ou alterações sensoriais e/ou de profissionais que estudaram o fenômeno da percepção nesse público, abrindo janelas para reflexões acerca do corpo como espaço de expressão dos indivíduos com TEA, a partir de suas falas. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, à luz de Merleau-Ponty [1908-1961], que convida o leitor a refletir se o estudo das corporeidades de pessoas com deficiências ou alterações sensoriais poderia ser o caminho para desvendar aspectos da corporeidade autista. Em linhas gerais, as duas publicações selecionadas e na íntegra analisadas, podem ser classificadas como investigações de natureza qualitativa que tratam da perspectiva educativa e pedagógica perpassada pela ótica inclusiva no ensino formal. Além disso, nelas aparece o descritor “corpo” atrelado à preocupação com o processo de inclusão escolar de estudantes com TEA na escola regular, com relatos de que o corpo e os movimentos corporais dessas crianças não são cuidados na prática pedagógica, sendo na verdade reprimidos a favor da valorização do desenvolvimento cognitivo. Nesse sentido, as discussões suscitadas nessas pesquisas são enriquecedoras, principalmente no que diz respeito ao (re)conhecimento do corpo como espaço de aprendizagem no TEA. No entanto, nossas buscas revelaram a ausência de uma conexão da temática com os saberes dos docentes e o fazer pedagógico, o que, por consequência, compreendemos que os impedem de integrar a dimensão do corpo e do movimento às suas práticas. Assim sendo, nesta pesquisa trataremos da inclusão de crianças com TEA no contexto da escola regular com foco na formação de professores para a concretização de uma prática pedagógica inclusiva que estabeleça uma relação uníssona entre corpo e aprendizagem, visto que, na maioria das escolas, ainda predomina o ensino “hegemonicamente centrado na racionalização” (GAYA, 2006, p. 254). 22 Nossa intenção é agregar valores ao processo de formação de professores para atuarem numa vertente inclusiva, por meio de uma ação que estabeleça uma relação dialógica entre teoria e prática. Ademais, propomo-nos pensar no corpo dentro do processo educativo como uma reserva de potência (MERLEAU-PONTY, 2006), por entendermos, a partir do levantamento realizado, que a ideia de corpo manipulável, separado da mente, conforme apontam os trabalhos selecionados para a feitura do estado da arte, ainda persiste nas práticas pedagógicas atuais, configurando-se como um entrave ao processo de aprendizagem de todas as crianças, inclusive as que se encontram dentro do espectro autista. Em face à relevância desses aspectos, nossa pesquisa buscará responder o seguinte problema: O que uma proposta de formação continuada sobre a relação corpo e aprendizagem da criança com Transtorno do Espectro Autista poderá provocar em professoras de Educação Infantil? Com base nisso, esta pesquisa se desenvolveu objetivando analisar a percepção de professoras da Educação Infantil sobre a relação entre corpo e aprendizagem no processo de inclusão escolar de crianças com Transtorno do Espectro Autista. Desse objetivo geral, desdobram-se os seguintes objetivos específicos: a) Identificar a concepção de professoras da Educação Infantil sobre inclusão escolar, corpo e aprendizagem de crianças com Transtorno do Espectro Autista; b) Analisar a relação entre corpo e aprendizagem de crianças com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil; c) Aplicar uma proposta de formação continuada com ênfase na relação corpo e aprendizagem de crianças com TEA. Vale ressaltar que o grupo investigado era formado predominantemente por professoras, o que justifica a utilização do termo no título, objetivos geral e específicos, estrutura e elementos desta pesquisa. Dentre os autores a que recorremos para a consecução dos objetivos desta pesquisa, estão os trabalhos desenvolvidos por Mantoan (2003); Mendes (2006) e Magalhães (2007) sobre diversidade e inclusão escolar; Nóvoa (2009); Favoretto; Lamônica (2014) sobre formação de professores; Schuwartzman (2003); Nunes; Azevedo; Schmidt (2013); Fernandes (2008) acerca do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Destacamos ainda os estudos de Merleau-Ponty (2006); Gaya (2006); Nóbrega (2005) e Freire (2011), onde encontramos subsídios para fundamentar nossas discussões sobre a relação corpo e aprendizagem. Para a concretização dos objetivos propostos nesta investigação, optou-sepor uma abordagem metodológica qualitativa (FLICK, 2009), aqui entendida como aquela que se 23 ocupa do nível subjetivo e relacional da realidade social, onde um fenômeno pode ser melhor entendido a partir da compreensão das pessoas nele envolvidas, considerando todos os pontos de vista relevantes (MINAYO, 2001), que no espaço em questão corresponde às relações estabelecidas entre o processo formativo e a prática pedagógica do professor. Nessa perspectiva, adotamos a técnica de Grupo Focal, caracterizada como uma estratégia metodológica predominantemente qualitativa, de inegável importância para tratar questões da educação, que sugere a integração, discussão e avaliação de um tema proposto visando à produção de conhecimento (GATTI, 2005; ASCHIDAMINI; SAUPE, 2014; MINAYO, COSTA, 2018). Combinada à técnica de Grupo Focal, utilizamos como instrumento para a construção dos dados desta pesquisa, a entrevista do tipo semiestruturada (TRIVIÑOS, 1987; RESTE, 2015), aplicada individualmente com cinco professoras de um Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) da cidade de Parnamirim/RN, que tinham regularmente matriculadas em suas turmas crianças com TEA, a fim de identificarmos os conhecimentos delas sobre os eixos que fundamentam esta dissertação. Já os dados, por sua vez, foram analisados a partir da utilização da técnica de Análise de Conteúdo, fundamentada por Bardin (2016). Do tratamento das entrevistas realizadas, emergiram três categorias, a serem apresentadas no corpo desta dissertação. São elas: a inclusão escolar da criança com TEA no contexto da escola regular; corpo e autismo; relação corpo e aprendizagem da criança com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil. Cabe ressaltar que iniciamos nosso estudo nos moldes da pesquisa-ação (THIOLLENT, 2009), porém, no dia 17 de março de 2020, poucos dias após o início do ano letivo e bem no começo de nossa prática interventiva, fomos abruptamente surpreendidos pelo fechamento das escolas em virtude da propagação do novo coronavírus2 (Covid-19), e sem que houvesse tempo hábil para entendermos a situação e nos reorganizarmos metodologicamente, vimos a nossa pesquisa que dependia da participação das professoras parar quase que completamente. Sob os reflexos da Covid-19, que não poupou o setor educacional de suas agruras, a prática interventiva de nossa pesquisa permaneceu suspensa por exatamente seis meses, sendo retomada acanhadamente apenas no segundo semestre do ano de 2020, após a reorganização de nossa metodologia e a retomada do contato com as professoras participantes da 2 Sobre a doença. Disponível em: https://g1.globo.com/saude/coronavirus/noticia/2021/09/29/brasil-registra- media-movel-de-544-mortes-diarias-por-covid-obitos-estao-em-estabilidade-ha-5-dias.ghtml. Acesso em: 30 ago. 2021. https://g1.globo.com/saude/coronavirus/noticia/2021/09/29/brasil-registra-media-movel-de-544-mortes-diarias-por-covid-obitos-estao-em-estabilidade-ha-5-dias.ghtml https://g1.globo.com/saude/coronavirus/noticia/2021/09/29/brasil-registra-media-movel-de-544-mortes-diarias-por-covid-obitos-estao-em-estabilidade-ha-5-dias.ghtml 24 investigação, que na ocasião relataram estarem passando por dificuldades para desenvolverem suas atividades pedagógicas no formato virtual, reflexo do despreparo generalizado das instituições educativas ao modelo remoto de ensino (MATUOKA, 2020). Respeitando todos os protocolos de distanciamento segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a prática interventiva de nossa pesquisa ocorreu de forma síncrona através de encontros virtuais via Google Meet, plataforma digital de comunicação desenvolvido pelo Google. Ademais, a presente dissertação está estruturada em seis seções, incluindo esta introdução, na qual procuramos apresentar os caminhos que nos levaram à busca por esta formação em nível de mestrado, as intenções de nosso estudo e de que maneira buscaremos efetivá-lo. Também dialogamos com publicações cujos temas apresentados se aproximaram de nossa pesquisa de mestrado. Na segunda seção, denominada de “Do corpo objeto ao corpo sujeito: uma trajetória de grandes desafios”, conferimos valor ao modo como a sociedade vem percebendo a corporeidade autista ao longo dos anos, buscando entrelaçar as discussões desenvolvidas com reflexões acerca da construção do sujeito aprendente no âmbito da Educação Infantil, cujas experiências corporais podem e devem ser valorizadas no desenvolvimento de mediações pedagógicas. Antes, porém, faremos uma breve caminhada pela História, a fim de situarmo- nos a partir da observação de diferentes formas de tratar o corpo. Na terceira seção, exploramos a temática formação de professores para atuarem numa perspectiva inclusiva atentando para a necessidade da construção de um diálogo mais profundo entre teoria, prática e o revelar do conhecimento. Na quarta seção, traçamos o percurso metodológico de nossa pesquisa, com destaque para a apresentação da técnica de Grupo Focal, e, na seção seguinte, apresentamos as três categorias de análise obtidas após o tratamento dos dados das entrevistas: a inclusão escolar da criança com TEA no contexto da escola regular; corpo e autismo; relação corpo e aprendizagem da criança com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil. Na sexta e última seção, encontra-se a descrição da prática interventiva elaborada com vistas à formação de professores da Educação Infantil. Logo após, as considerações finais, que sintetizam os resultados alcançados a partir dos objetivos propostos. 25 2 DO CORPO OBJETO AO CORPO SUJEITO: UMA TRAJETÓRIA DE GRANDES DESAFIOS No corpo estão inscritas todas as regras, todas as normas e todos os valores de uma sociedade específica, por ser ele o meio de contacto primário do indivíduo com o ambiente que o cerca (DAOLIO, 1995, p. 105). Neste capítulo, conferimos valor ao modo como a sociedade vem percebendo a corporeidade autista ao longo dos anos, acenando para a possibilidade de uma prática docente que faça a leitura do espectro a partir de um olhar fenomenológico. Antes, porém, faremos uma breve caminhada pela História, a fim de entendermos os sentidos e significados atribuídos ao corpo na atualidade. Desta feita, o presente capítulo está dividido em três tópicos: Corpo e deficiência A educação do corpo no Transtorno do Espectro Autista Educação Infantil, corpo e aprendizagem Em linhas gerais, no primeiro tópico, é feita uma breve incursão pela história ocidental do corpo, a fim de situarmo-nos em relação à temática. No segundo tópico, buscaremos compreender como se dá a educação do corpo no TEA a partir da ascensão do transtorno. Por fim, entrelaçaremos as discussões desenvolvidas nos tópicos anteriores com reflexões acerca da construção do sujeito aprendente no âmbito da Educação Infantil, cujas experiências corporais podem e devem ser valorizadas no desenvolvimento de mediações pedagógicas. 2.1 CORPO E DEFICIÊNCIA O que é corpo? A epígrafe de Daolio utilizada no começo deste capítulo nos remete às contribuições do filósofo francês Maurice Merleau-Ponty (2006), que em sua perspectiva fenomenológica concebe o corpo como lugar onde se fundem as noções de sujeito e objeto. 26 De acordo com a fenomenologia3 merleaupontyana, o corpo está no mundo a entranhar-se nele, de modo que o biológico e o cultural se fundem na estrutura da existência. Para Merleau-Ponty (2006, p. 203): O corpo é nosso meio geral de ter um mundo. Ora ele se limita aos gestos necessários à conservação da vida e, correlativamente, põe em torno de nós um mundo biológico; ora, brincando com seus primeiros gestos e passando de seu sentido próprio a um sentido figurado, ele manifesta através deles um novo núcleo de significação: é o caso dos hábitosmotores da dança. Ora enfim, a significação visada não pode ser alcançada pelos meios naturais do corpo; é preciso então que ele construa um instrumento, e ele projeta em torno de um mundo cultural. Por essa perspectiva, consideramos que o corpo é fluido, socialmente construído, e a concepção que temos do mundo advém das experiências pelas quais nosso corpo passa. Desse modo, o corpo não pode ser apreendido apenas como um objeto visto apenas pelo viés biológico, mas elemento vital para a constituição da nossa consciência, condição e base para a existência. A fim de entendermos exatamente o que isso significa e de que forma reverbera na educação, estabelece-se a necessidade de fazermos uma breve imersão pela história do corpo, aqui especificamente, pela história ocidental do corpo, desde os primórdios até a atualidade, considerando que, ao longo dos anos, ele tem sido objeto de diferentes formas de atenção e valorização. Nossa intenção não é fazermos um apanhado de datas e marcos históricos, mas situarmo-nos e situar o leitor. Nas sociedades primitivas, estruturalmente mais simples e predominantemente nômades, o corpo humano se apresenta como instrumento de sobrevivência e expressão suprema das atividades artísticas (BIANCHETTI, 1998). Nesse período, ter um corpo com aspecto vigoroso, forte e saudável, era fundamental para a manutenção dos grupos de indivíduos, que, além da intensa participação corporal nos acontecimentos importantes da comunidade, a exemplo de rituais e celebrações (GONÇALVES, 2012), constantemente se deslocavam à procura de abrigo e alimentos. Na luta pela sobrevivência existia uma espécie de seleção natural, onde apenas os indivíduos mais fortes e saudáveis eram aceitos pelo grupo, e, embora não existam vestígios arqueológicos de como os primeiros homens se comportavam em relação às pessoas com deficiência, presume-se que, nas sociedades primitivas, em virtude desse processo seletivo, elas eram submetidas a sentimentos de intolerância, destruição ou abandono. 3 O termo fenomenologia significa estudo dos fenômenos, daquilo que aparece à consciência, daquilo que é dado, buscando explorá-lo (SILVA et al., 2008, p. 254). 27 Conforme assevera Gaio (2004, p. 147): Para uma sociedade na qual as relações de produção eram baseadas na coletividade, principalmente ligadas ao trabalho com a terra, sem recursos materiais e somente com a força do ser humano, o corpo deficiente se viu isolado [...] a sobrevivência era o maior dos problemas e os corpos deficientes pouco poderiam auxiliar no tocante à solução. Na Antiguidade, se instaura a filosofia racionalista, que tem Sócrates4 e Platão5 como principais representantes, e o homem, que até então se envolvia intensamente com a natureza como ser corporal e sensível, passa a viver sob a égide de um pensamento dicotomizado que promove a divisão do ser humano em corpo e mente (GONÇALVES, 2012). Desse modo, o corpo se desenha na Idade Antiga como um artefato de poder e a exclusão de pessoas com deficiência justifica-se pelo fato de serem consideradas inabilitadas mental ou corporalmente. É nesse cenário, de acordo com a literatura, que abrolham Grécia, Roma e Egito na história ocidental do corpo das pessoas com deficiência. No contexto greco-romano, os homens eram valorizados pela beleza e pelo bom condicionamento físico, enquanto as pessoas que nasciam ou adquiriam alguma deficiência (o que muito acontecia principalmente em virtude das guerras) eram marginalizadas ou sacrificadas por ordem do Estado. Nessas civilizações, estampava-se no corpo a busca por uma imagem perfeita, sinônimo de saúde e força, por isso, a eugenia6 instaurou-se como prática comum para uma sociedade que não conseguia enxergar possibilidades em “corpos diferenciados” (OLIVEIRA, 2013). Os sobreviventes ao processo de higienização predominante nesse período, fossem cegos, surdos, deficientes mentais, deficientes físicos ou pessoas nascidas com má formação (SILVA, 1987), foram explorados comercialmente nas cidades ou serviram de entretenimento para as famílias mais abastadas, principalmente nos circos. “Corpos disformes/anômalos “justificavam” práticas excludentes sob o auspício de uma sociedade da eugenia, que se baseava na ‘higienização’ social com fins de categorizar os aptos e não aptos ao exercício da cidadania” (SILVA; SILVA, 2019, p. 4). No Egito Antigo, evidências arqueológicas, a exemplo de túmulos, múmias, papiros, obras de arte e afrescos, revelam que as pessoas com deficiência não eram necessariamente 4 Sócrates (469-399 a.C.). 5 Platão (427-347 a.C.). 6 A eugenia é uma teoria presente desde a Antiguidade que busca produzir um aperfeiçoamento da espécie humana baseado em leis genéticas. Considera que existe grau de humanidade, seres inferiores e superiores, e vidas que não merecem ser vividas. Ela está presente na origem de crimes da humanidade como os praticados por nazistas contra judeus, eslavos, ciganos etc. (Cf., 2006, p. 12). 28 isoladas da sociedade, sugerindo que algumas se integravam às mais distintas classes sociais da época como nobres, artesãos, agricultores, pescadores, escravos e outros. Muitos estudos também fazem referência às pessoas com nanismo, que não encontravam empecilhos para realizar suas ocupações e ofícios. Conforme Lopes (2013, p. 6): De maneira geral os anões tinham uma representação muito positiva no Egito Antigo, pois se acreditava que seu aspecto representava alguma significância mágica, existindo inclusive preces específicas para proteção em situações de perigo. Outro aspecto bastante interessante reside no fato de que alguns deuses eram anões e tinham culto próprio. Uma dessas divindades era o Deus anão Bes, que era cultuado como o Deus do Amor, da Fertilidade e da Sexualidade. Essa aceitação dava-se, principalmente, porque os “médicos egípcios acreditavam que as doenças graves e as deficiências físicas ou os problemas mentais graves eram provocados por maus espíritos, por demônios ou por pecados de vidas anteriores que deviam ser pagos” (PEREIRA; SARAIVA, 2017, p. 170). Desse modo, só por imissão dos deuses essas pessoas poderiam ser exterminadas. Todavia, as evidências disponíveis também apontam que, apesar da atestada “complacência”, a aparência física era o principal fator de exclusão das pessoas com deficiência na sociedade egípcia, sobretudo e as que adivinham de famílias menos privilegiadas e que, por consequência, eram totalmente desassistidas pelos médicos-sacerdotes (SILVA, 1987). Nesse contexto, podemos observar que, o peso da atitude discriminatória estaria não na deformidade do corpo, mas sim na condição social do indivíduo. Por isso, compreendemos nesta pesquisa, que a constituição da deficiência se mostra como um conceito histórico, social e cultural carregado de significados de como o sujeito se vê e é visto na sociedade. Na Idade Média, com o advento do Cristianismo, a dicotomia muda de corpo/mente para corpo/alma. Nesse período, a deficiência passa a ser associada ao pecado, sendo a morte, em grande parte, substituída pela segregação. Com isso, os infanticídios outrora praticados, tornaram-se inaceitáveis e as crianças nascidas com deficiência passaram a ser responsabilidade da família ou da Igreja, que tinham a obrigação de afastá-las do convívio social, pois seus corpos imperfeitos não refletiam a imagem de Deus. Condenadas à marginalização, as pessoas “marcadas pelo pecado”, passaram a ser recolhidas em porões, asilos, igrejas ou ainda confinadas em instituições quase sempre de caráter filantrópico que não lhes ofereciam nenhuma assistência humanitária. É nesse período 29 da História que surgem os primeiros hospitais de caridade para pessoas com deficiência,que mais tarde, já ao final da Idade Média, passaram a receber e abrigar também mendigos, leprosos, doentes terminais e indivíduos considerados loucos, tornando-se verdadeiros depósitos insalubres de pessoas pobres. A tudo isso se acresce que, além das condutas segregatícias, à instituição religiosa do período medieval também estão associadas práticas duramente punitivas7 contra as pessoas com deficiências físicas ou mentais, e contra os indivíduos que se manifestassem criativamente através de seus corpos, pois considerava-se que estariam possessos pelo demônio. Conforme Gaio (2004, p. 153): Apesar de encontrarmos, com a propagação e solidificação do cristianismo, um outro posicionamento em relação ao ser humano, mais justo, mais atencioso, no qual os valores de caridade, fraternidade, compaixão, amor ao próximo elevaram a vida ao posto de direito adquirido de todo ser humano, seja ele normal ou anormal, dando fim aos tempos de infanticídio e extermínio de deficientes, não podemos afirmar que houve uma mudança radical e efetiva no conjunto da sociedade. O que predominou verdadeiramente ao longo de todos esses anos, foi o desprezo, a negligência, e as atitudes apenas de tolerância em relação aos corpos deficientes. Na Idade Moderna, que se inicia ao final da Idade Média e se estende até as Revoluções do século XVIII, ocorreram sensíveis transformações socioculturais8 no mundo europeu cristão, e o corpo, até então considerado prisão da alma, torna-se servo da razão. Com isso, as ações humanas passam a se orientar por valores capitalistas e pelo avanço da ciência, revelando um homem cada vez mais preocupado com o domínio e controle da natureza assim como de seu corpo (GONÇALVES, 2012). É nesse período da História que ganham notoriedade duas distintas correntes ideológicas: o racionalismo de René Descartes [1596-1650], base do cartesianismo9, e o empirismo de Francis Bacon [1561-1626], considerado o fundador da ciência moderna. Segundo Barbosa et al. (2011, p. 28): 7 JÚLIO, Rennan A. As dez técnicas de tortura mais assustadoras da Idade Média: métodos terríveis marcaram o período conhecido como “Idade das Trevas”. Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2014/10/10-tecnicas-de-tortura-mais-assustadoras-da-idade- media.html. Acesso em: 29 maio 2020. 8 SILVA, Odair Vieira da. A idade moderna e a ruptura cultural com a tradição medieval: reflexões sobre o renascimento e a reforma religiosa. Revista Científica Eletrônica da Pedagogia, ano XVI, n. 28 jan. 2017. Disponível em: http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/P4zxYBJG5YWskHR_2018-3-17- 11-31-51.pdf. Acesso em: 29 maio 2020. 9 BATTISTI, César Augusto. O método de análise cartesiano e seu fundamento. Sci. stud., São Paulo, v. 8, n.4, Dec. 2010. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678- 31662010000400004. Acesso em: 30 maio 2020. https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2014/10/10-tecnicas-de-tortura-mais-assustadoras-da-idade-media.html https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2014/10/10-tecnicas-de-tortura-mais-assustadoras-da-idade-media.html http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/P4zxYBJG5YWskHR_2018-3-17-11-31-51.pdf http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/P4zxYBJG5YWskHR_2018-3-17-11-31-51.pdf https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-31662010000400004 https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-31662010000400004 30 O corpo, agora sob um olhar “científico”, serviu de objecto de estudos e experiências. Passa-se do teocentrismo ao antropocentrismo. O conhecimento científico, a matemática, enfim, o ideal renascentista: O corpo investigado, descrito e analisado, o corpo anatómico e biomecânico. A redescoberta do corpo, nessa época, aparece principalmente nas obras de arte, como as pinturas de Da Vinci e Michelangelo, valorizando-se, deste modo, o trabalho artesão, juntamente com o pensamento científico e o estudo do corpo (Rosário, 2006). A disciplina e controle corporais eram preceitos básicos. Todas as actividades físicas eram prescritas por um sistema de regras rígidas, visando a saúde corporal. Estando o corpo imerso num sistema de sujeição insensível à diversidade humana, onde “só se torna força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo e submisso” (FOUCAULT, 1987, p. 26), a pessoa com deficiência continuou sendo marginalizada, se antes por representar a materialização do pecado, agora por não se ajustar aos critérios de rendimento e eficácia exigidos pela sociedade. Essa marginalização deu origem às primeiras casas de correção e de trabalho, e aos hospitais gerais, que tinham “autoridade para fazer uso de recursos curativos e corretivos que a biomedicina comumente oferecia como única alternativa para o bem-estar das pessoas com deficiência” (DINIZ et al., 2009, p. 69). Só ao final do século XVIII, tendo por base as ideias iluministas difundidas pela Revolução Francesa (1789-1799), e sob o argumento de um tratamento mais humanizado, é que surgiram as primeiras instituições especializadas de atendimento às pessoas com deficiência. Cabe-nos aqui ressaltar que, nas situações acima referenciadas de atendimento à pessoa com deficiência predominou, nesse período, o caráter assistencialista, sem que se perceba nenhuma atenção com propósito educacional. No entanto, de acordo Martins (2015), há evidências históricas de iniciativas particulares muito significativas, que foram decisivas para a construção de um pensamento voltado ao atendimento educacional dessas pessoas. Dentre elas, destacam-se as que foram protagonizadas na Espanha pelo monge Pedro Ponce de Leon [1520-1584], considerado um dos pioneiros na educação de surdos entre os anos de 1541 até 1549, como também pelo padre espanhol Juan Pablo Bonet [1573-1633], que publicou em 1619 a obra Redação das Letras e Artes de Ensinar os Mudos a Falar, “considerado o primeiro manual de ensino de surdos-mudos, exercendo grande influência nesta área também em outros países” (MARTINS, 2015, p. 31). Chegando à contemporaneidade, ocorre uma “redefinição do significado de habitar um corpo que havia sido considerado, por muito tempo, anormal” (DINIZ et al., 2009, p. 65), e 31 cresce a discussão sobre a deficiência como sendo um problema de ordem social. Por consequência, surge um interesse quanto aos direitos das pessoas com deficiência, sendo a sociedade provocada a assumir posturas que respeitem em princípios, políticas e práticas a manifestação da diversidade humana. Porém, antes de adentramos no campo dessa redefinição, uma prática discriminatória ocorrida entre os anos de 1840 e 1970 merece atenção no contexto de nossas discussões sobre corpo e deficiência. São os denominados “freak shows” e os espetáculos dos corpos monstruosos traduzidos como “circo dos horrores” ou “show de aberrações” (FABRI; FISCHER, 2017; PEIXOTO, 2019). Com registro de ocorrência em várias partes do mundo, a exemplo dos EUA, Paris e Londres, os “freak shows”eram realizados geralmente em teatros itinerantes, circos, praças públicas ou parques de diversões, e os elencos incluíam indivíduos com nanismo, albinismo, mulheres barbadas, gêmeos xifópagos ou qualquer outra pessoa que chamasse a atenção por sua aparência. De acordo com Fabri e Fischer (2017), nesse cenário reinava o modelo do “monstro”, que anulava a diversidade humana com o objetivo de ensinar à sociedade o poder da norma, sendo o corpo projetado como um produto de grande valor em um mercado de massa. Um exemplo dessa forma de entretenimento pode ser visto em trechos do filme norueguês “A leoa”, lançado no ano de 2016, que conta a história de Eva Arctander, que nasceu com uma doença rara denominada hipertricose10. Naobra, o circo dos horrores aparece como única alternativa de sobrevivência para a jovem Eva, vítima de rejeição por sua família, como também do preconceito existente na sociedade, assim como todos que, à época, também se integravam aos espetáculos dos corpos monstruosos. Os “freak shows” tratavam-se, portanto, de uma prática excludente que por muitas décadas explorou o corpo considerado “anormal” para alimentar a curiosidade de multidões e fomentar a indústria capitalista em expansão (COURTINE, 2009). Com a multiplicação dos estudos científicos, a monstruosidade humana se mostra passível de observação apenas nos ambientes médicos tornando-se proibidos os espetáculos para exibição de pessoas com “anormalidades”. No entanto, há registros de que os “freak shows” ainda existem nos dias atuais, porém, com a então apresentação de “corpos saudáveis, esteticamente normais transformados em deformidades por artistas que não querem ser incluídos no padrão da sociedade ocidental” (VERGARA, 2013, p. 62). 10 Hipertricose – Hypertrichosis. Disponível em: https://pt.qwe.wiki/wiki/Hypertrichosis. Acesso em: 30 maio 2020. https://pt.qwe.wiki/wiki/Hypertrichosis 32 Além dos “freak shows”, a eugenia, já referenciada neste texto dissertativo, corresponde a outra prática preconceituosa e discriminatória com grande notoriedade entre o final do século XIX e as primeiras décadas da Idade Contemporânea, visto envolver o extermínio elevado de vários grupos de indivíduos, a exemplo de pessoas com deficiências físicas ou mentais, idosos, doentes incuráveis, homossexuais etc., frente à ideia de que algumas pessoas eram biologicamente superiores a outras. Segundo a literatura, essa e outras práticas discriminatórias ocorridas nessa época evidenciam que, apesar da expansão da ciência e da tecnologia terem promovido profundas mudanças na sociedade entre os séculos XIX e XX, o olhar voltado às pessoas com deficiência permanecia engessado nos princípios arcaicos da exclusão. Assim sendo, as primeiras mudanças na maneira como a sociedade via e tratava as pessoas com deficiência só são realmente percebidas após a Segunda Guerra Mundial, a partir dos esforços realizados para reabilitar o elevado número de indivíduos que voltavam para seus lares mutilados e/ou com estresse pós-traumático. Portanto, é nesse movimento a favor dos “filhos da guerra” que se observa o despontar de novas expectativas em relação às pessoas com deficiência. Algumas tendências teóricas que emergiram nesse período também abriram novas possiblidades de ressignificação para a vida humana, incluindo a corporeidade, ao se posicionarem radicalmente contra a metafisica cartesiana que separava a matéria do espírito ou o sujeito do objeto, provocando uma ruptura no conhecimento (SIQUEIRA, 2014, p. 12). Destacamos, nesse cenário, a fenomenologia elucidada pelo filósofo francês Maurice Merleau-Ponty [1908-1961], que se opõe às dicotomias e afirma que o ser humano pode ser compreendido de várias maneiras, por sua condição de ser corpóreo em incessante movimento. Nessa perspectiva, Nóbrega (2010, p. 54), assevera: Merleau-Ponty apresenta uma visão de corpo diferente desse modelo matemático: nem coisa, nem ideia, o corpo está associado à motricidade, à percepção, à sexualidade, à linguagem, ao mito, à experiência vivida, à subjetividade, às relações com o outro, à poesia, ao sensível, apresentando-se como um fenômeno enigmático e paradoxal, não se reduzindo à perspectiva de objeto, fragmento do mundo regido pelas leis de movimento da mecânica clássica submetido a leis e estruturas matemáticas exatas e invariáveis. Assim sendo, na perspectiva fenomenológica de Merleau-Ponty (2006, p. 122), dialeticamente, temos consciência do corpo por meio do mundo, e do mundo por meio do corpo: “O corpo é o veículo do ser no mundo, e ter um corpo é, para um ser vivo, juntar-se a um meio definido, confundir-se com certos projetos e empenhar-se continuamente neles”. 33 Desse modo, pouco a pouco, a deficiência, que já fora considerada “um drama pessoal ou familiar, com explicações religiosas que a aproximaram ora do infortúnio, ora da benção divina em quase todas as sociedades” (DINIZ et al., 2009, p. 68), vai sendo redefinida como um assunto de ordem pública, uma questão social que repercute nos processos de constituição das identidades dos indivíduos. Assim, começa a se desenhar a partir da década de 1960, o modelo social segundo o qual as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência resultariam da forma pela qual a sociedade compreende as limitações de cada indivíduo. Nessa perspectiva, dois importantes marcos sociais merecem destaque no século XX: a Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Conferência de Jomtien – 1990), que incide sobre a Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem; e a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais (Salamanca – 1994), a partir da qual se expande e começa a ser sistematizada a ideia de inclusão das pessoas com deficiência e sua importância para a sociedade. Chegando ao século XXI, observa-se uma “redução dos fenômenos sociais a favor do plano da psique individual” (BAUMAN; DONSKIS, 2014, p. 33), sendo perceptível o desenvolvimento de uma sociedade cética, narcisista e marcadamente tecnológica que caminha cada vez mais firme sob as insígnias da globalização. Dentro dessa nova narrativa, embora existam divergências entre muitos autores a respeito do atual lugar do corpo na sociedade, já é possível situar “distintas funções exercidas pelo corpo em seus diversos aspectos: corpo território, corpo viril, corpo excesso e corpo beleza” (CARRETEIRO, 2005, p. 65), posições que, fatidicamente, têm exacerbado o individualismo e anestesiado as relações sociais. Nessa perspectiva, coloca-se ao homem hodierno, o desafio de não perder a sensibilidade (BAUMAN; DONSKIS, 2014), superar os paradoxos e contradições que reforçam as desigualdades, e aperceber-se enquanto “sujeito consagrado ao mundo” (MERLEAU-PONTY, 2006, p. 6), tendo o corpo como condição e base para a própria existência. 2.2 O CORPO NO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA Embora nas últimas décadas tenhamos avançado nos estudos, compreensão do TEA, e debate sobre inclusão (BAPTISTA; BOSA, 2002), frequentemente ouvimos o termo 34 “autismo” associado quase que exclusivamente à ideia de um indivíduo antissocial que, na maioria dos casos, está com o corpo sempre em frenético movimento. Para essa discussão, trouxemos como exemplo, a fala de uma das professoras participantes desta pesquisa sobre como ela vê o corpo da criança com TEA na Educação Infantil: O corpo da criança com TEA é bem mais agitado. A gente percebe que é bem mais agitado. Falando sobre essa questão de agitação no caso de (X), a mãe me revelou que tinha ido ao médico e ele passou uma substância, é... Não sei se é a substância: Depakene porque ele não conseguia dormir. Ele era agitado em casa, né? E por causa dessa agitação ele não conseguia dormir. E aí teve que usar pra ajudar... O Depakene11, se não me engano, era 25 miligramas líquido pra ele. E tem toda uma queixa de problemas porque disse que causava prisão de ventre, né? E aí eu vejo essa questão do corpo como algo que não pode ficar muito agitado porque transparece que a criança realmente tem algo digamos, né? Precisa ser tratado, mas também não tem como a criança ficar totalmente estática porque por ele ficar assim, mais contido, tá relacionado aí, acredito, a prisão de ventre também, né? Que precisa de um pouco de movimento... Era uma (como posso dizer?) uma espada de dois gumes, podemos dizer assim, né? Que tinha que conter aquela agitação dele, mas, ao mesmo tempo precisava que ele também se movimentasse (MILITANA, 12/03/2020). Partindo do pressuposto de queo corpo é pleno de subjetividade, se encontra perpassado pela historicidade, e nos permite perceber o mundo e tudo o que nele há (MERLEAU-PONTY, 2006), podemos considerar que na fala acima apresentada, está evidenciada uma noção de corpo, que, por ser “inquieto e agitado”, estaria a revelar “que a criança tem algo” que “precisa ser tratado”. O que pode sugerir que se passe na mente da professora, a ideia de que aquele corpo inquieto e agitado da criança com TEA, em função do próprio transtorno, seja algo incapacitante, bastante limitado para a aprendizagem. Indo um pouco mais adiante, ao analisar como a escola vem concebendo a noção de corpo no TEA, Freitas (2015, p. 09), considera que: As propostas curriculares costumam enfocar o estudo das deficiências, suas características clínicas e o uso de recursos pedagógicos que compensem diretamente a perda biológica de uma função [...]. Recai-se, assim na 11 A título de conhecimento, o Depakene é indicado isoladamente ou em combinação a outros medicamentos, no tratamento de pacientes adultos e crianças acima de 10 anos (grifo nosso) com crises parciais complexas, que ocorrem tanto de forma isolada ou em associação com outros tipos de crises. Também é indicado isoladamente ou em combinação a outros medicamentos no tratamento de quadros de ausência simples e complexa em pacientes adultos e crianças acima de 10 anos. Disponível em: https://consultaremedios.com.br/depakene/bula. Acesso em: 17 mar. 2021. https://consultaremedios.com.br/depakene/bula 35 instrumentalização, como se aos professores bastassem conhecimentos sobre critérios diagnósticos e o provimento de recursos específicos, conforme suspeita, para lidar com o aluno considerado com deficiência. Depreende-se, assim que, anulada a corporeidade do aluno com TEA, os entraves à sua aprendizagem seriam superados basicamente via utilização de técnicas e materiais concretos, fundamentos bem presentes nos cursos de formação e capacitação pedagógica (GAYA, 2006), que preparam os professores para a execução de práticas que priorizam a disciplina dos corpos e/ou a compensação da perda biológica de uma função do estudante com deficiência (FREITAS, 2015). A fim de dialogarmos um pouco mais sobre essa consideração, buscamos recuperar na literatura, alguns dos elementos que cumulativamente ao longo da história auxiliaram a constituir o discurso de corpo no Transtorno do Espectro Autista. De acordo com a literatura, a concepção de autismo se desenvolveu no campo médico- psiquiátrico entre os séculos XVIII e XIX, época em que, provavelmente, as pessoas acometidas pelo transtorno foram consideradas “idiotas” ou “débeis mentais”, assim como aquelas que sofriam de retardo metal, psicoses ou esquizofrenia (GAUDERER, 1997). Silenciadas as diferenças individuais, rigorosas intervenções medicamentosas, exclusão, sacrifícios e punições a partir de processos de controle do corpo e modificação do comportamento marcaram, possivelmente, a atenção dada às pessoas com TEA nesse período. Três médicos psiquiatras destacaram-se nas primeiras pesquisas sobre o TEA, a começar pelo psiquiatra Plouller, em 1906, o primeiro estudioso a introduzir o adjetivo “autista” na literatura mundial após estudos desenvolvidos com pacientes esquizofrênicos com sinal clínico de isolamento. Alguns anos depois, em 1911, o também psiquiatra suíço Eugen Bleuler [1857-1939] apregoou o termo definindo-o como uma perda de contato com a realidade para descrever um dos sintomas da esquizofrenia no adulto (ORRÚ, 2012). Mas, foi por intermédio do médico austríaco Leo Kanner [1894-1981], no ano de 1943, a partir de experiências desenvolvidas com onze12 crianças americanas, que se difundiu a existência do autismo e os dois critérios que seriam os eixos da desordem: a solidão e a insistência pelo imutável (sameness). Kanner descreveu o autismo como sendo uma patologia que se estruturava nos dois primeiros anos de vida e sugeriu que seu aparecimento estaria associado a questões ambientais, de modo mais específico, a maternagem inadequada, que geravam no indivíduo 12 A primeira pessoa da história a receber o diagnóstico de autismo foi o americano Donald Triplett [1933], classificado como o “caso 1” entre 11 crianças estudadas pelo médico Léo Kanner (DONVAN; ZUCKER, 2017). 36 com TEA a impossibilidade na comunicação, na linguagem e na capacidade de estabelecer vínculos afetivos. Para Kanner, o autismo estaria dentro do grupo das psicoses infantis e os pais de pessoas com TEA tinham um perfil de “mães emocionalmente frias e de pais intelectuais que investiam mais na observação do seu bebê do que no contato com ele” (CAVALCANTI; ROCHA, 2001, p. 48). Essa visão, acolhida por vários autores e clínicos de renome, impulsionou o desdobramento do conceito da “mãe geladeira” e fez com que se difundisse a “etiologia relacional do AI” (SCHWARTZMAN, 2003, p. 6). Com o passar dos anos, as ideias apregoadas pelo psiquiatra Léo Kanner sofreram significativas alterações, sendo o TEA considerado na atualidade um “conjunto de transtornos neurodesenvolvimentais de causas orgânicas, caracterizado por dificuldades de interação e comunicação que podem vir associadas a alterações sensoriais, comportamentos estereotipados e/ou interesses restritos” (SCHMIDT et al., 2016, p. 223), o que desmitifica a crença de que os pais seriam os culpados pelo quadro de autismo apresentado por seus filhos. Todavia: Responsabilizar a mãe ainda é muito comum hoje em dia por diversos profissionais da área da saúde, que ficaram parados no tempo e reproduzem a teoria de Léo Kanner. É uma teoria equivocada, mas que foi muito divulgada. No entanto, o que poucas pessoas sabem é que anos mais tarde o mesmo psiquiatra veio a público para retrata-se por essa consideração (SILVA, 2012, p. 160). Subsequente às pesquisas de Kanner, outros autores também se dedicaram ao estudo do autismo e suas possíveis causas. Entre eles, o médico austríaco Hans Asperger [1906- 1980], que popularizou o termo “Síndrome de Asperger” ao descrever no seu artigo “Psicopatologia Autística da Infância”, no ano de 1944, indivíduos bem semelhantes aos descritos pelo Léo Kanner, após estudo observacional com mais de 400 crianças avaliando seus padrões de comportamento e habilidades. Seus estudos também o levaram a concluir que o autismo estaria associado a fatores ambientais, como também a comprometimentos orgânicos, afetando mais meninos que meninas. Conforme assevera Silva (2012, p. 160): Hans Asperger descreveu um transtorno da personalidade que incluía falta de empatia, baixa capacidade de fazer amizades, monólogo, hiperfoco em assunto de interesse especial e dificuldade de coordenação motora (quadro que depois ficou denominado síndrome de Asperger). Hans Asperger cunhou o termo psicopatia autística e chamava as crianças que estudou de 37 “pequenos mestres”, devido à sua habilidade de discorrer sobre um tema minunciosamente. No ano de 1965, em meio a discussões sobre as possíveis causas do autismo, a americana Mary Temple Grandin13 [1947], diagnosticada ainda na infância com autismo, cria a “Máquina do abraço”, um aparelho projetado para acalmar e aliviar a sentida ansiedade proveniente das alterações sensoriais14 características do transtorno. As experiências sensoriais vivenciadas e descritas por Temple, bem como a veiculação de todos os fatores que a colocam dentro do espectro autista, contribuíram com o alargamento de muitas pesquisas desenvolvidas na busca pela compreensão do transtorno, e, de acordo Freitas (2015, p. 103) servem de fundamento para a “compreensão acerca de perceptualidade da pessoa com TEA sob a perspectiva dos dizeres do corpo”. Isso porque extrapolam aideia de que as pessoas com TEA encontram-se presas dentro de um corpo disfuncional, que para ser aceito pela sociedade e incluso no ambiente escolar precisa ser normalizado, controlado. Um pouco mais adiante, destaque também para as contribuições do psicólogo libanês Michel Rutter [1933] e da médica psiquiátrica e mãe de uma menina autista, a inglesa Lorna Wing [1928-2014]. Os estudos desses dois pesquisadores ajudaram a tirar o TEA do campo exclusivo da psiquiatria. Rutter propôs uma nova definição para autismo, que, segundo ele, tratar-se-ia de um transtorno mental único, independente da esquizofrenia, alicerçado em quatro critérios: atrasos e desvios sociais não só decorrentes da deficiência intelectual; problemas de comunicação também não só decorrentes da deficiência intelectual; comportamentos incomuns como movimentos estereotipados e maneirismos; sintomas presentes antes dos 30 meses de idade (KLIN, 2006). As contribuições de Rutter foram acolhidas pela terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais (DSM III), em 1980, no qual, pela primeira vez o autismo aparece incluso na classe dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID), que seriam os distúrbios que prejudicam a interação social e as habilidades comunicativas e comportamentais dos indivíduos (CAVALCANTI; ROCHA, 2001). 13 Disponível em: https://sites.google.com/site/templegrandinautismo/home/biografia-de-temple-grandin. 14 As alterações sensoriais são comuns e geralmente invalidam as crianças com transtorno do espectro do autismo, porém não são específicas do autismo, sendo uma característica frequentemente descrita também em indivíduos com deficiência intelectual. Três principais padrões sensoriais foram descritos no transtorno do espectro do autismo: hiporreatividade, hiperreatividade e busca sensorial; a eles, alguns autores acrescentaram um quarto padrão: percepção aprimorada. As alterações sensoriais podem afetar negativamente a vida desses indivíduos e de suas famílias. Hipotetizamos uma deficiência não apenas das modalidades não sensoriais, mas também da integração multissensorial (POSAR; VISCONTI, 2018). https://sites.google.com/site/templegrandinautismo/home/biografia-de-temple-grandin 38 Por sua vez, Lorna Wing descreve pela primeira vez a “tríade” de sintomas que caracterizava o autismo, também conhecida como a “Tríade de Lorna Wing”, que seriam: alterações na sociabilidade, na comunicação/linguagem e no uso da imaginação. Considerada uma das primeiras a enxergar o autismo como um espectro, Lorna Wing também se tornou conhecida pelo trabalho em instituições voltadas ao atendimento para essas pessoas, a exemplo da National Autistic Society (NAS), primeira Associação de pais de crianças com TEA no mundo, fundada em 1962 no Reino Unido. Na mesma década em que Lorna Wing desenvolveu muitos de seus estudos, encontramos ainda pesquisas do psicólogo norte-americano Bruno Bettelheim [1903-1990], defensor de que a causa do autismo seriam “as mães geladeiras”: mães frias, sem sentimentos, que levavam os filhos a um isolamento mental. Para Bettelheim, a criança com TEA deveria ser acolhida em regime de internato, longe do contato com a família. Segundo Amy (2001, p. 36): A hipótese de Bettetlheim é a seguinte: a criança encontra no isolamento autístico (como os prisioneiros de DACHAU) o único recurso possível a uma experiência intolerável do mundo exterior, experiência negativa vivida muito precocemente em sua relação com a mãe e seu ambiente familiar. [...] partindo desse princípio, ele só aceitava em seu instituto crianças que ele podia, ao menos por um certo período de tempo, separar de seus pais. Ele afirmava querer dar a elas a possibilidade de estabelecer com os adultos uma relação continente, calorosa, porém jamais intrusiva. Por isso escrevera: “Os pais não têm o direito de conhecer o mundo onde vive seu filho... Nós compreendemos certamente que eles tenham esse desejo, mas não podemos satisfazê-lo. As pesquisas de Bruno Bettetlheim sobre o autismo promoveram o que muitos autores chamam de “radicalização da culpa” (LOPES, 2017, p. 4), e, entre as décadas de 1960 e 1980, levaram muitas pessoas com deficiência, em sua maioria com TEA, a viverem afastadas do convívio social, geralmente confinadas em espaços desumanos ou internadas em hospitais psiquiátricos vestindo camisa de força e sob o rígido regime de castigos corporais. Nessa perspectiva, observa-se uma compreensão de corpo no TEA ainda centrada no exercício da autoridade, em que se busca a habilitação ou reabilitação do indivíduo pela via da privação e dos castigos, o que, segundo Foucault (1987), traz consigo uma maneira específica de disciplinar e punir tudo o que está inadequado à regra, pensamento originário de uma tecnologia política do corpo. 39 Figura 1 – Crianças presas a um radiador, no hospital psiquiátrico de Deir el Qamar, no centro-sul do Líbano, no ano de 1982 Fonte: Internet. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=1Xkr87Jtzso. Acesso em: 16 jan. 2021. A imagem acima, amplamente divulgada na internet como sendo de crianças com TEA amarradas ao radiador num Hospital Psiquiátrico, ilustra bem a nossa última fala, ao evidenciar os duros “tratamentos” aos quais gerações de pessoas com deficiência foram submetidas por não serem compreendidas. A foto foi tirada pelo jornalista francês José Nicolas, no interior de um Hospital Psiquiátrico de um vilarejo chamado Deir al Qamar, no Líbano, no ano de 1982 e, embora não haja evidências que se refira necessariamente a pessoas com TEA, não apaga da história o fato de terem sido submetidas por anos a duras punições corporais e tratamentos controversos (AMY, 2001) em lugares como sanatórios, casas de correção e até presídios. Por essa dureza do “tratamento”, como também pela maneira como tratava os pais, mães e as pessoas com TEA, as ideias de Bettetlheim foram severamente criticadas por muitos estudiosos. Um desses foi o psicólogo americano Eric Shopler [1927-2006], desenvolvedor de uma pesquisa pioneira sobre o autismo que levou à criação do programa https://www.youtube.com/watch?v=1Xkr87Jtzso 40 TEACCH (Treatmentand of Autisticand Related Communication Handicapped Children), modelo que defende a participação ativa de educadores e das famílias no processo de intervenção educacional para pessoas com TEA e que se caracteriza pelo uso de ensino estruturado e a adaptação às características particulares do sujeito (MARQUES; MELLO, 2002; RODRIGUES; GONZÁLEZ, 2015). No entanto, embora se reconheça a importância do referido modelo interventivo, muitas críticas são feitas ao TEACCH dentro do processo educativo, principalmente por se acreditar que o corpo da pessoa com TEA seria visto apenas como instrumento, um espaço para a manifestação das capacidades mentais, “reflexo dos princípios organicista e ambientalista de compreensão do desenvolvimento humano” (FREITAS, 2015, p. 91). Nesse espaço de discussão, destacam-se ainda os estudos do pedagogo francês Fernand Deligny [1913-1996], que se opunha ao “exílio” de crianças difíceis, delinquentes ou autistas tornando-se uma importante referência para o ensino especial em todo o mundo, e também os trabalhos do professor e psicólogo comportamental norte-americano Ole Ivan Lovaas [1927-2010], o primeiro a apresentar provas de que o comportamento de crianças com TEA poderia ser modificado através práticas interventivas de ensino (AZEVEDO, 2017). Ole Ivan Lovaas também foi considerado o pioneiro no campo da Análise Comportamental Aplicada15 (ABA). Desse modo, podemos considerar que, entre os anos de 1970 e 1980, houve o surgimento e a difusão de importantes estratégias educacionais e comportamentais voltadas às pessoas com TEA, o que caracteriza um novoimpulso da sociedade no acolhimento a esse público. Com relação ao crescente número de pesquisas sobre o TEA nesse período, Marques e Mello (2002, p. 145) afirmam: Na medida em que a ciência foi avançando e mais estudos foram sendo realizados, as teorias que culpavam os pais foram caindo, a educação foi assumindo um papel cada vez mais importante no tratamento do autismo e os pais, além de coterapeutas, foram também ocupando um papel político importante na luta pelos direitos de seus filhos. Nesse cenário, podemos destacar as pesquisas científicas dos neurologistas americanos Margaret L. Bauman e Thomas L. Kemper, que, niveladas a outros estudos no campo da genética, provocaram uma mudança na maneira de se pensar o autismo em todo o mundo, 15 Análise Comportamental Aplicada (ABA) – Abordagem da psicologia comportamental que foi adaptada e aplicada ao ensino de crianças com autismo. Baseia-se nos princípios de reforço positivo, solicitações graduais, repetição e a divisão das tarefas em pequenas partes, ensinadas inicialmente em separado. O programa é feito muitas vezes em casa (BOSA, 2006). https://en.wikipedia.org/wiki/Applied_behavior_analysis 41 após confirmarem a base biológica para o transtorno (GARCIA; MOSQUERA, 2011), deixando assim o autismo de ser visto, definitivamente, como uma forma de “psicose com início na infância e com tendência a evolução para esquizofrenia (CID16-9, 1984)”. Gradativamente, houve uma melhor definição e alinhamento do autismo, e aos poucos novos critérios diagnósticos descritivos surgiram, influenciados, principalmente, pelo avanço da ciência (SILVA, 2012). Até que em maio de 2013, por ocasião da publicação do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, em sua quinta edição, o DSM V, surge a denominação Transtorno do Espectro Autista (TEA). Com isso, distúrbios antes observados isoladamente passaram a ser analisados como um transtorno singular com distintos níveis de gravidade (MICHELAN, 2017), o que repercutiu diretamente na forma como a sociedade passou a enxergar a pessoa com TEA. A partir de então, entende-se que a pessoa para ser diagnosticada com TEA, precisa apresentar deficiências sociais e de comunicação, e comportamentos repetitivos e estereotipados. A isso se acresce que, com o DSM V, tal classificação passa a se dar em três níveis: Autismo grave – nível 3, Autismo moderado – nível 2, e Autismo leve – nível 1 (APA, 2014). Assim sendo, o autismo é reconhecido atualmente como “uma síndrome comportamental complexa que apresenta etiologias múltiplas, combinando fatores genéticos e ambientais” (MANSUR; NUNES, 2020, p. 52), que se manifesta tipicamente antes dos três anos de idade, acometendo, primordialmente, indivíduos do sexo masculino (SCHWARTZMAN, 2003; MICHELAN, 2017). No ano de 2020, segundo dados do CDC (Center of Deseases Control and Prevention), órgão ligado ao governo dos Estados Unidos, no mundo existe hoje 1 caso de autismo a cada 54 pessoas. No Brasil, embora não existam dados estatísticos, estima-se que o autismo atinja cerca de 2 milhões de pessoas (PAIVA JUNIOR, 2020). A perda de habilidades previamente adquiridas, os movimentos corporais estereotipados, o uso incomum de brinquedos, a relação precária com o corpo, o que inclui o autocuidado, a ausência da linguagem ou ecolalia e os distúrbios da percepção, como, por exemplo, a incapacidade de se fixar ou dedicar atenção a certos estímulos visuais, voltando-se quase que exclusivamente a outros, são alguns dos sintomas que podem facilitar o diagnóstico da criança com TEA. 16 CID – Classificação Internacional das Doenças publicada pela OMS – Organização Mundial da Saúde. 42 Ademais, também podem observados numa criança com autismo de aparência física provavelmente normal, prejuízos qualitativos na interação social; na comunicação verbal e não verbal e nas brincadeiras; alterações sensoriais; repertório notavelmente restrito de atividades e interesses; resistência ao aprendizado e à mudança de rotina; acentuada hiperatividade. No entanto, vale salientar, que, apesar das informações compartilhadas na atualidade, inclusive através dos meios de comunicação, o diagnóstico do TEA é essencialmente clínico, a realizar-se “tanto com base na observação comportamental dos critérios dos sistemas de classificação quanto por meio do uso de instrumentos validados e fidedignos” (BOSA; MARQUES, 2015, p. 43), sempre sob a responsabilidade de profissionais especializados que “conseguirão traçar um perfil refinado das características de desenvolvimento da criança” (p. 44). Quando na escola, o diagnóstico dos casos suspeitos de TEA deve ainda acionar todos os agentes envolvidos no processo educacional de estudantes inseridos no espectro (SILVA, 2012), a fim de que, desde cedo, esses indivíduos possam desfrutar de uma comunidade escolar onde todos ali presentes respeitem suas habilidades e diferenças individuais, assim como as peculiaridades de suas famílias. Nessa perspectiva, Com a entrada dos alunos com autismo na escola é necessário que seja feita uma preparação tanto do espaço físico, quanto dos profissionais que fazem parte desse espaço e que terão que lidar com a criança com esse diagnóstico. Essa proposta de estruturar o ambiente escolar corresponde à ideia de que devemos adaptar as situações a essas crianças, ao invés de querer que elas se adaptem às formas típicas de funcionamento dentro desse contexto (LORENZO et al., 2019, p. 4). Dentro da proposta a que nos prestamos neste tópico, observamos que, além das já mencionadas contribuições por diferentes autores, outras importantes pesquisas sobre o TEA, foram realizadas também no campo da psicanálise, teoria afetiva, teoria da mente, teorias neuropsicológicas e de processamento da informação (BOSA, 2000), o que direciona o autismo a várias concepções, quais sejam: cerebrais, relacionais, afetivas, cognitivas e estruturais. No entanto, verifica-se que os diferentes achados ainda não contemplam toda a extensão das diferenças individuais ao longo do espectro, o que levanta a necessidade de que mais estudos sejam desenvolvidos na busca por sua compreensão e ampliação do acesso médico e educacional qualificado. 43 Uma dessas lacunas aparece nas discussões acerca da corporeidade da pessoa com TEA (FREITAS, 2015), em grande medida ainda endereçadas às impossibilidades corporais dos indivíduos, o que, pode ser, entre outras, uma das razões que dificulta e, em muitos casos impede a relação do autista com o mundo externo (FERNANDES, 2008). De fato, pessoas com TEA podem apresentar limitações corporais, e a depender do nível do espectro, como também do acúmulo de informações sensoriais a que são expostas, agitação extrema e/ou comportamento agressivo. No entanto, o foco nas adversidades anula toda a extensão das expressões individuais presente nessas pessoas, e pode levar o professor ao desenvolvimento de práticas incondizentes com as reais necessidades delas. Tais reflexões permitem-nos entender, que, apesar de o corpo já ser reconhecido no sistema educativo formal como importante aos processos ensino, aprendizagem e inclusão, o “dualismo mutilante”, enunciado por René Descartes [1596-1650], continua válido, com registros de práticas pedagógicas que compartimentalizam os seres humanos (GAYA, 2006), impondo-lhes a necessidade de controle do corpo a favor da razão. No que diz respeito, especificamente, à atual compreensão de como se dá a educação do corpo no TEA, Fernandes (2008, p. 112) afirma que: O corpo no autismo permanece mudo, silencioso, carente de qualquer gestualidade, mantém-se encapsulado e coisificado nessa única posição do mutismo. Mutismo que não se produz por ter um problemana audição, mas porque o que olha e escuta é o seu não lugar. Posição mortífera em que nenhum significado remete a outro, nem ordena a linguagem. Tanto o corpo quanto as posturas, o tônus muscular, os movimentos, o silêncio, o espaço e o tempo, estão numa relação de exclusão à linguagem. Não fazem superfície, não fazem borda. Desse modo, o corpo da criança autista movimenta-se num tempo eterno, infinitamente, sem pausa, num espaço sem limites, sem um lugar no qual possa orientar, navegando no vazio próprio da coisa inerte. Implica dizer, que, embora a Educação, enquanto área, tenha acompanhado as mudanças ocorridas na humanidade ao longo da história, e isso tenha repercutido diretamente na forma como percebemos, sentimos e desdobramos nossas ações, o corpo, “como o coração no organismo” (MERLEAU-PONTY, 2006, p. 273), permanece desapercebido em muitas práticas e espaços educacionais, persistindo a negação ou tentativa de normalizá-lo, como se à aprendizagem da criança, incluindo as que são autistas, bastasse o investimento no que vem de fora. Realidade que pode ser observada desde as salas de Educação Infantil, onde a inclusão escolar de crianças com TEA ainda representa um grande desafio para muitos professores. Um dos principais motivos diz respeito à formação inicial ou continuada desses 44 educadores, que ainda se apresenta voltada “à dimensão metodológica e procedimental, contrária a proposta das diretrizes curriculares normatizadas em 2005, que visam à formação humanística deste profissional” (FAVORETTO; LAMÔNICA, 2014, p. 112). Nessa perspectiva, entende-se que pensar o lugar do corpo da pessoa com TEA na educação escolar, significa avançar para além do aspecto da instrumentalidade (NÓBREGA, 2005), e buscar nas entrelinhas da sutileza da percepção dinamizar práticas que não se contraponham à história que o corpo dessas pessoas carrega. 2.3 EDUCAÇÃO INFANTIL, CORPO E APRENDIZAGEM De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, RCNEI, (BRASIL, 1998), a constante exigência de contenção motora, assim como a impossibilidade de se manifestar corporalmente, pode dificultar a aprendizagem da criança. Na vertente desse pensamento, Freire (2011) afirma que a criança precisa de uma “educação de corpo inteiro”, constituindo-se um ato de violência privá-la de liberdade para expressar sua individualidade. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), por sua vez, evidencia que: Com o corpo (por meio dos sentidos, gestos, movimentos impulsivos ou intencionais, coordenados ou espontâneos), as crianças, desde cedo, exploram o mundo, o espaço e os objetos do seu entorno, estabelecem relações, expressam-se, brincam e produzem conhecimentos sobre si, sobre o outro, sobre o universo social e cultural, tornando-se, progressivamente, conscientes dessa corporeidade (BRASIL, 2018, p. 40). Dito isto, depreende-se que, na EI o corpo da criança ganha centralidade, cabendo, pois, às instituições educativas da infância organizarem espaços e tempos de aprendizagem para que possa se manifestar expressivamente como ser corporal que o é, anunciando suas experiências e vivências culturais. Nessa perspectiva, parece-nos óbvio pensarmos na Educação Infantil como um espaço de atenção à complexidade e à totalidade humana perceptíveis pela via da corporeidade, cuja responsabilidade seria introduzir a criança no universo escolar sem lhes furtar o direito de viver a sua infância. No entanto, pesquisas revelam que, embora nas últimas décadas se registre avanços quanto à educação corporal da criança, práticas educativas deslocadas de sentido e significado social, coletivo e subjetivo, que compreendem o indivíduo como uma soma de partes, 45 resistem (NÓBREGA, 2005; CRUVINEL, BRITO, 2019), sugerindo que o corpo ainda não está sendo totalmente absorvido pela escola. Conforme assevera Gaya (2006, p. 253): Nosso ensino tradicional é prioritariamente razão. Fala-se em complexidade, mas o corpo não vai à escola. [...] Corpo disciplinado, ordenado, de forma que seus sentimentos, suas emoções não penetrem no mundo demasiado humano da suprema razão. Corpo desprezado. Corpo sem sentido. Razão sem corpo. Enfim, uma pedagogia que acaba por resumir sua anunciada complexidade ao res cogitans. Descarta Descartes no discurso, mas o acata na prática. Fecha-lhe a porta, mas convida-o a entrar pela janela. Assim sendo, o que se observa na Educação Infantil, cujas concepções e práticas deveriam traduzir a ideia de unidade da criança, é que o corpo e o movimento corporal ainda são reprimidos a favor da dimensão racional do conhecimento (SIQUEIRA, 2014), como se não fosse possível ao professor trabalhar respeitando a relação umbilical existente entre corpo e aprendizagem. Em outras palavras, quando a escola está pautada no plano intelectual, o corpo deixa de ser visto como condição primordial à existência humana (MERLEAU-PONTY, 2006), para ocupar a categoria de instrumento que auxilia no despertar da inteligência da criança. Nesse processo, dar-se o delineamento de perspectivas escolarizantes que priorizam o desenvolvimento de habilidades motoras, a moralização ou a disciplinarização do corpo, negligenciando a compreensão da criança como um ser integral, sujeito histórico e cultural, que se relaciona com o que está a sua volta, ao mesmo tempo em que possui necessidades afetivas, biológicas e cognitivas. É nesse cenário que o brincar, o lúdico e o movimento se perdem entre os traços, as letras e os números de uma fina folha de papel. Sobre o processo de moralização ou de disciplinarização, Foucault (1987) coloca que aponta a coerção do corpo ativo para torná-lo dócil, submisso, “apto” ao aprendizado, evidenciando formas claras de regulamentação, inspeção e controle presentes há muitas décadas na estrutura da sociedade, incluindo também a escola e as práticas pedagógicas. A saber, historicamente, na Educação Infantil, “a educação do corpo se inseriu no contexto do cuidado e da higiene infantil para a contenção de enfermidades e, ao mesmo tempo, como controle corporal” (CRUVINEL; BRITO, 2019, p. 125), não existindo, portanto, na base das primeiras instituições de atendimento à criança pequena, nenhuma preocupação com a aprendizagem ou respeito à infância. Nesses estabelecimentos, a proposta era unicamente cuidar das crianças enquanto as mulheres, por alavanque da Revolução Industrial [1760-1840], se lançavam no mercado de trabalho. 46 Conforme Ariès (1978), até o início do século XVII, não existia um sentimento de infância, sendo as crianças manipuladas como um mero “ser pequeno”, adultos em miniatura não reconhecidos pela sociedade como sujeitos que possuíam singularidades, de maneira que as práticas voltadas para elas priorizavam o intelecto e tinham um cunho de preparação para a vida adulta. Só a partir do século XX, sob o reflexo de significativas mudanças políticas, socioeconômicas e tecnológicas ocorridas na sociedade, é que a infância passa a ser vista como uma construção histórico-cultural e a criança como um ser individual dotado de direitos com merecida atenção nos espaços destinados ao ensino infantil. Com isso, propostas reducionistas, assim como a ideia de assistencialismo, começam a ser lentamente substituídas pela de desenvolvimento global da criança, cabendo, pois, às instituições educativas, cabia a obrigação de darem atenção às várias dimensões do desenvolvimento infantil. Segundo Bujes (2001, p. 17): Cada época tem à sua maneira própria de considerar o que é ser criança e de caracterizar as mudanças que ocorrem com ela ao longo da infância. Nos últimos três ou quatro séculos, a criança passou a ter uma importância como nunca havia ocorrido antes e ela começou a ser descrita, estudada, a ter o seu desenvolvimento previsto […] A ideia de sujeito em formação e de como évivida a experiência da infância podem variar de época para época (são históricas). No Brasil, de acordo com a literatura, esse é um debate que só ganha forças expressivas a partir da década de 1980, mais especificamente com a promulgação da Constituição Federal (CF) de 1988, onde a criança passa a ser concebida como um sujeito de direitos e a EI como parte integrante do sistema educacional brasileiro. A partir de então, assume-se, o desafio de legitimar uma Educação Infantil que tenha como objetivo a aprendizagem e o desenvolvimento integral da criança de 0 a 5 anos, tratando o cuidar e o educar como indissociáveis na ação pedagógica, conforme coloca a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9394/96: A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL, 1996, Art. 29). Assim sendo, compreendemos que, numa relação de interdependência entre os aspectos físicos, sociais, emocionais e cognitivos, a Educação Infantil deve prover condições 47 e recursos para garantir a aprendizagem e o desenvolvimento integral das crianças em suas especificidades etárias, o que demanda uma ação pedagógica impregnada de consciência para a promoção de atividades recheadas de sentido, que considerem as nuances peculiares à infância e a concepção da criança acerca do seu mundo vivido. No plano das práticas pedagógicas, significa ir contra a realidade de que, “em nossas escolas, os corpos só participam, brincam, jogam, dançam, fazem esporte, cantam e interpretam após realizarem seus deveres” (GAYA, 2006, p. 266), a favor de uma pedagogia que seja sensível a plena expressão da criança como ser que age, vive e sente o mundo corporalmente. 48 3 FORMAÇÃO DOCENTE E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA Não conseguiria destacar o suficiente a importância de bons professores17 (TEMPLE GRANDIN, 1996). Mary Temple Grandin [1947] é uma renomada pecuarista norte-americana, diagnosticada com TEA ainda na infância. Sua trajetória, amplamente retratada, é marcada por profundas dificuldades e preconceito, e, também pela figura notável de um professor de ciências que acreditou no seu grande potencial e a incentivou a ingressar, ainda jovem, na universidade para cursar agropecuária. Em palestras que dá pelo mundo inteiro sobre o autismo, a Dr. Temple sempre se refere aos professores como peças fundamentais para o processo de inclusão escolar de pessoas com TEA, e evoca a importância de investimento na qualificação desses profissionais para que se tornem sensíveis às diferenças e possam inspirar seus alunos a revelar suas potencialidades. Nessa direção, este capítulo trata da questão da formação de professores no Brasil para a Educação Inclusiva, tomando por base a legislação nacional, atentando ainda para a necessidade da construção de um diálogo mais profundo entre teoria, prática e o revelar do conhecimento, considerados insumos importantes para a efetiva inclusão escolar de pessoas com TEA na escola regular. 3.1 FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DE QUE ESTAMOS FALANDO? Formar professores para e na diversidade pressupõe uma nova ordem à educação, que, como vimos, busca superar séculos de um ensino distorcido e marcadamente negligente às diferenças. Tal como nos encontramos hoje, imersos numa heterogeneidade de culturas que marca a sociedade atual, é no mínimo inconsistente pensar em formação de professores descolada da ideia da inclusão. Ela é fruto de muitas lutas, faz parte do princípio de que todas as pessoas, 17 Trecho da entrevista com Temple Grandin realizada em 1º de fevereiro de 1996 pelo Dr. Stephen Edelson. Disponível em: https://topediatrica.blogspot.com/2011/11/entrevista-com-temple-grandin.html. Acesso em: 22 abr. 2021. https://topediatrica.blogspot.com/2011/11/entrevista-com-temple-grandin.html 49 independentemente de suas limitações, têm direito à educação (BRASIL, 1988) e, como tal, deve ser garantida de forma equânime e justa. De acordo com Silva (2012, p. 233): Inclusão é uma política que busca perceber e atender as necessidades educativas especiais de todos os alunos, em salas de aula comuns, em um sistema regular de ensino, de forma a promover a aprendizagem e o desenvolvimento pessoal de todos. Na proposta de educação inclusiva, todos os alunos devem ter a possibilidade de integrar-se a um ensino regular, mesmo aqueles com deficiências ou transtornos do comportamento. A escola, portanto, deverá adaptar-se às necessidades individuais desses alunos, requerendo mudanças significativas na estrutura e no funcionamento das instituições de ensino, nas formações dos professores e nas relações família-escola. Nessa perspectiva, a inclusão “implica mudança do atual paradigma educacional, para que se encaixe no mapa da educação escolar que estamos retraçando” (MANTOAN, 2003, p. 12), cabendo ao processo formativo dos docentes, portanto, a pertença, e à escola mudar sua compreensão de escola, de ensino, de processos de aprender, de concepções e atitudes em torno da diversidade tão aclamada na contemporaneidade. Sabemos que no Brasil, as últimas décadas são marcadas por avanços significativos em relação à formação de professores, em termos de legislação e produção do conhecimento acadêmico sobre a Educação Inclusiva. Em relação à legislação, destaca-se como marco jurídico-institucional fundamental, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96), promulgada em 20 de dezembro de 1996. A LDB não aborda diretamente a questão da Educação Inclusiva, mas, por sua conjectura, se faz importante a discussão na formação inicial dos professores sobre a temática. Um exemplo está no Capítulo VI, que trata dos profissionais da educação e de aspectos voltados à formação desses profissionais: A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal (BRASIL, 1996, Art. 62). A LDB institui novas exigências para a formação inicial de professores, que atualmente ocorre nos cursos de graduação de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados não licenciados e cursos de segunda licenciatura (BRASIL, 2015), sendo 50 ainda admitida a formação mínima em curso normal para a atuação na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Vale salientar que essas “novas exigências” vêm na esteira do Paradigma da Educação Inclusiva já amparado no Brasil desde a promulgação da Constituição Federal, em 1988, (quando diz que a educação é para todos), e ratificado com a incorporação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência em 2008, que tem caráter de Emenda Constitucional. Portanto, a formação de professores para atuar numa perspectiva inclusiva, encontra-se garantida na legislação e nos documentos oficiais brasileiros que tratam, de maneira mais específica, da educação de pessoas com deficiência, tal como a Resolução CNE/CP nº 1/2002, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, definindo que as instituições de ensino superior devem prever, em sua organização curricular, formação docente voltada para a atenção à diversidade e que contemple conhecimentos sobre as especificidades dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação,a Política Nacional de Educação Especial numa perspectiva Inclusiva (2008), e a LBI – Lei Brasileira de inclusão (2015). Para essa discussão, trazemos ainda a Proposta de Diretrizes para a Formação de Professores em Curso de Nível Superior (BRASIL, 2000), que imprime os princípios norteadores a serem concebidos pelos currículos dos cursos de formação de profissionais para a Educação Básica. De acordo com essas diretrizes, os cursos formadores deverão: Estimular o desenvolvimento do compromisso profissional com uma sociedade democrática, justa e solidária; Criar condições para desenvolver as capacidades e atitudes de interação, comunicação, cooperação, autonomia e responsabilidade; Incluir uma dimensão comum a todos os profissionais de educação básica. Portanto, há competências profissionais que todos eles precisam desenvolver; Desenvolver a atitude investigativa do profissional em formação, a partir da colocação da pesquisa como elemento essencial na formação profissional; Estimular a construção de competências como eixo nuclear da formação da identidade profissional e da dimensão pedagógica do trabalho; Promover o desenvolvimento do compromisso com os valores estéticos, políticos e éticos da sociedade moderna; Desenvolver a capacidade, do futuro profissional, de compreender o atual papel social da escola frente às novas exigências postas pela contemporaneidade; Promover a resolução de situações-problema contextualizadas, que necessitam abordagens interdisciplinares; 51 Desenvolver a postura interdisciplinar; Articular a teoria-prática ao longo de todo curso de formação, isto é, a prática pedagógica permeará todo o curso, de modo a promover o conhecimento experiencial do profissional em formação; Contemplar em seus currículos atividades diversificadas, bem como tempos e espaços diferenciados, como oficinas, seminários, grupos de trabalho supervisionado, grupos de estudo, tutoriais e eventos; Promover a autonomia por meio da organização de atividades pelo aluno em formação, tais como: constituição de grupos de estudo, seminários sobre temas educacionais e profissionais, exposições e debates; Estimular a capacidade de gerenciamento do próprio desenvolvimento profissional. Indiretamente, o documento citado representou um passo importante para a construção do pensamento inclusivo no Brasil, por definir objetivos que apontam para a necessidade de superação de problemas institucionais e curriculares que permeavam, e, ainda permeiam, os programas de formação inicial de professores, que em nosso entendimento devem visar o aprimoramento do fazer docente, considerando sempre a realidade educacional e toda a diversidade da comunidade escolar. Bem à frente, mas sem perder de vista os documentos subsequentes à LDB (BRASIL, 1996), chegamos à Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), que impactou na organização e no funcionamento dos serviços especializados para estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, e altas habilidades/superdotação, considerados o público-alvo da Educação Especial (PAEE). De acordo com a literatura, essa Política trouxe a questão da transversalidade da Educação Especial desde a Educação Infantil até a Educação Superior, ampliando o acesso de pessoas com deficiência à escola regular, embora tenha sido acusada de “legitimar formas de exclusão e de invisibilidade” (BEZERRA, 2021, p. 12) desses indivíduos pelo fato reduzir o conceito de AEE ao trabalho das Salas de Recursos Multifuncionais. Outro ponto importante a destacar é que no texto final da PNEE (BRASIL, 2008, p. 13), coloca-se ainda a importância da formação inicial e continuada do professor atuante no AEE para o exercício da docência junto aos estudantes público-alvo da Educação Especial: Para atuar na educação especial, o professor deve ter como base da sua formação, inicial e continuada, conhecimentos gerais para o exercício da docência e conhecimentos específicos da área. Para assegurar a intersetorialidade na implementação das políticas públicas a formação deve contemplar conhecimentos de gestão de sistema educacional inclusivo, tendo em vista o desenvolvimento de projetos em parceria com outras áreas, 52 visando à acessibilidade arquitetônica, aos atendimentos de saúde, à promoção de ações de assistência social, trabalho e justiça. Segundo disposto, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), ampliou o debate acerca da formação inicial e continuada dos professores para atuarem com o PAEE no âmbito nacional, aumentando, consequentemente, a responsabilidade das Instituições de Ensino Superior em estimular nos cursos de licenciatura a inclusão de disciplinas tratando da temática. Com isso, a formação inicial de professores no campo da Educação Especial foi sendo gradativamente incorporada na formação geral dos professores. Porém, nesse normativo, ainda não se percebe uma atenção específica ao professor da sala de aula comum e a sua formação para inclusão, algo que aparece nas falas das professoras participantes de nossa pesquisa que terminaram seus respectivos cursos de graduação sob os auspícios dessa Política. Sem exceção, todas relataram não terem recebido nenhuma formação mais profunda sobre a temática da inclusão. No máximo, segundo as docentes, tiveram acesso a conceitos e definições sobre as deficiências isoladamente através de buscas bibliográficas. Isso pode nos sugerir que o Brasil tardou a refletir sobre o que seria exatamente o termo “formar para incluir”, o que em parte explicaria a relatada ausência pelas professoras entrevistadas, da temática “educação inclusiva” em sua formação inicial embora o tema seja uma discussão presente na sociedade desde o início da década de1990 (MENDES, 2006). Nesta discussão, cabe ainda destacar a Resolução nº 2, de 1º de julho de 2015, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior e para a formação continuada. Essas diretrizes versam sobre os princípios, fundamentos, dinâmica formativa e procedimentos a serem observados nas políticas, na gestão, nos cursos de formação, bem como no planejamento, nos processos de avaliação e de regulação das instituições de educação que as ofertam. De acordo com essa resolução, as instituições de Ensino Superior devem conceber a formação inicial e continuada dos profissionais do magistério da Educação Básica na perspectiva do atendimento às políticas públicas de educação. Assim sendo: A formação inicial e a formação continuada destinam-se, respectivamente, à preparação e ao desenvolvimento de profissionais para funções de magistério na educação básica em suas etapas e modalidades (educação de jovens e adultos, educação especial, educação profissional e técnica de nível médio, educação escolar indígena, educação do campo, educação escolar quilombola e educação a distância (BRASIL, 2015, Art. 3). 53 Cabe destacar que, nesse normativo legal, os termos formação inicial e continuada de professores aparecem como complementares e indispensáveis aos professores que devem ser capacitados para atender a diversidade. No que concerne especificamente à proteção dos direitos das pessoas com TEA, destacamos a Lei nº 12.764/2012, que institui a “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”. A Lei nº 12.764/12, também chamada Lei Berenice Piana18, sobrepõe-se a documentos anteriores como a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), em que alunos com Transtorno do Espectro Autista não eram considerados pessoas com deficiência, e estabelece que indivíduos comprovadamente diagnosticados com TEA, têm o direito de estudar em escolas regulares, tanto na Educação Básica quantono Ensino Profissionalizante, garantindo-lhes, caso necessário, o direito ao acompanhamento de um profissional especializado para auxiliá-los com as atividades desenvolvidas no ambiente escolar. Ante o direito assegurado, essa lei incentiva as instituições regulares de ensino a estimular a formação e a capacitação dos professores, bem como a de pais e responsáveis (BRASIL, 2012, Art. 2º), através da promoção de estudos, levantamentos, debates e práticas pedagógicas, motivando também a participação destes em cursos, simpósios, seminários e outros eventos afins, na busca pela formação e atualização de recursos humanos para atuar com alunos/as inseridos no espectro autista. Podemos então inferir que os propósitos da instituição determinarão parte do processo de formação continuada dos professores para o processo de inclusão escolar de estudantes com TEA, visto tratar-se de um processo contínuo e inacabado que se perpetua mesmo após a passagem do professor pela academia. Por fim, chegamos à Lei Brasileira de Inclusão (LBI) de nº. 13.146/15, que representou um grande avanço na garantia de direitos das pessoas com deficiência e consequente formação dos professores para atuarem numa perspectiva inclusiva. No parágrafo 10º do capítulo IV, a lei determina que sejam adotadas “práticas pedagógicas inclusivas pelos programas de formação inicial e continuada de professores e oferta de formação continuada para o AEE” (BRASIL, 2015). Considerando essa 18 Berenice Piana é considerada uma das maiores ativistas do país na atualidade. Iniciou seu ativismo quando teve o diagnóstico de autismo no filho Daylon e descobriu a inexistência de políticas públicas e conhecimento sobre o assunto. Também é a fundadora da Clínica-Escola do Autista de Itaboraí/RJ, instituição pública que atende autistas de todo o Brasil. Assim sendo, a Lei, nº 12764/12, é também chamada de Lei Berenice Piana, em homenagem a sua luta pelos direitos das pessoas com autismo. 54 determinação, percebe-se o quanto as Instituições de Ensino Superior (IES) precisam se engajar nesse processo, tendo em vista serem estas responsáveis pelos profissionais que vão atuar diretamente com o público diverso contido nas escolas de Educação Básica. No parágrafo 11º desse mesmo capítulo, a lei prevê a “formação e disponibilização de professores para o atendimento educacional especializado, de tradutores e intérpretes da Libras, de guias intérpretes e de profissionais de apoio” (BRASIL 2015). Nesse caso, a LBI reforça ainda mais a adaptação das escolas ao público-alvo da educação inclusiva para a então garantia de acesso e vivência aos direitos de aprendizagem dos educandos. Como podemos perceber, a LBI surgiu no sentido de trazer para o centro dos debates os direitos das pessoas com deficiência como qualquer outro cidadão brasileiro, lembrando- nos que essa luta é de grande valia para a sociedade como um todo e, principalmente, para o público que dela mais necessita, pois por muito tempo estes permaneceram invisibilizados, negados e apagados das discussões políticas, inclusive através da ausência de referência à formação de professores para o trato humanístico da diversidade. Falar, portanto, sobre formação inicial ou continuada de professores, é reconhecer tratar-se de um conceito que está intimamente relacionado ao significado do papel do professor na sociedade e acompanha os movimentos políticos, econômicos e socioculturais aos quais esses profissionais estão expostos. Pensar dentro desse contexto em inclusão é consequência desses movimentos, e reconhecimento de que precisamos reconstruir paradigmas considerando a diversidade, os traços de subjetividade e as tessituras das relações que se estabelecem entre alunos e docentes no universo da educação. 55 4 PERCURSO METODOLÓGICO Pesquisar é um processo de ir além, de ir em busca de caminhos, percorrer lugares escuros e claros, densos e leves, tristes e alegres, movediços e sinceros, frios e quentes, indiferentes e acolhedores, dominantes e libertários, situações que necessariamente, opostas e complementares, dialogam com a nossa inquietação e despertam o nosso desejo de conhecer e interpretar realidades (DIAS, 2002, p. 12). Ao que Dias (2002) considera ser pesquisar, acrescento que, sem paciência, dedicação e disciplina, não conseguiríamos conhecer e interpretar realidades. Talvez, por isso, trazendo o texto para o contexto de minhas vivências, sempre que penso em metodologia e pesquisa ou metodologia da pesquisa, lembro de meu querido pai (in memoriam), que por quase cinco décadas exerceu com abastado amor o ofício de relojoeiro. Ele não tivera a oportunidade de ir além do quarto ano primário19 e não chegou a fazer fortuna por conseguir pinçar o tempo com suas ágeis mãos, mas, sabia como ninguém dançar suavemente com as palavras, flertar com os números e tratava cada relógio que se propunha consertar, sempre como a sua mais importante investigação. “O que esse homem faz é uma ciência”, diziam algumas pessoas quando o viam totalmente entretido em sua ocupação. De domingo a domingo, o papai pacientemente se dedicava ao que fazia tal qual o mais disciplinado dos pesquisadores, e não foram poucas as vezes que o vimos confrontado entre o desejo e a realidade, enquanto tratava de buscar ferramentas que o ajudariam a resolver o problema que o mais recente relógio o trazia. O papai trabalhava com todos os tipos de relógio, mas era conhecido por ser um dos poucos profissionais da região que com destreza consertava os raros relógios de bolso e mecânicos, fossem eles de pêndulos, de quartzo ou cronômetro. Em seu ofício, primava pela observação minuciosa do objeto a ser consertado; obtenção de informações junto ao dono do relógio sobre problema que deveria ser resolvido; análise da situação; indicação clara do que ia fazer; seleção das ferramentas que o ajudariam a solucionar o defeito detectado; busca de peças para colocar no relógio; elaboração de um orçamento com a estimativa dos investimentos necessários e, também, pela permanente comunicação com seus clientes, tanto para a coleta de dados quanto para apresentação dos resultados de seu trabalho. 19 O ensino primário perdurou na história da educação brasileira até a reforma política do ensino de 1971 (SOUZA, 2019). 56 Numa relação análoga à de um relojoeiro, do mais curioso que conhecera, neste capítulo trataremos das engrenagens de nossa pesquisa, do “conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos” (GIL, 1999, p. 26) que foram utilizados neste estudo para que os objetivos traçados fossem alcançados. Assim sendo, neste segmento de nosso trabalho, apresentaremos as opções metodológicas adotadas nesta investigação, de modo a definir o tipo de estudo, lócus de atuação, o universo da pesquisa, instrumentos de coleta de dados, bem como a tabulação e análise das informações recolhidas. Lembrando que a nossa pesquisa se desenvolveu objetivando analisar a percepção de professoras da Educação Infantil sobre a relação entre corpo e aprendizagem no processo de inclusão escolar de crianças com Transtorno do Espectro Autista, e, conforme o objetivo enunciado, visa agregar valores ao processo de inclusão escolar da criança com TEA no sistema regular de ensino por meio de uma ação que procurou estabelecer uma relação dialógica entre teoria e prática. 4.1 ASPECTOS ÉTICOS O projeto foi submetido à análise ética no CEP UFRN – Hospital Universitário Onofre Lopes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – HUOL/UFRN, em 07/11/2019, e aprovado sob o número 3.897.902 (Anexo A), CAAE 25192819.4.0000.5292. Numa etapa anterior a esse processo, reunimo-nos, após agendamento presencial, com representantes da Secretaria Municipal de Educaçãoe Cultura (SEMEC) de Parnamirim/RN para apresentarmos nossa proposta de estudo e conseguirmos autorização assinada, conforme exige o Comitê de Ética, para desenvolvermos nossa investigação na instituição que se adequava aos critérios de inclusão que foram perfilhados pela pesquisa. De posse desse documento, fomos até o Centro Municipal de Educação Infantil apontado pela SEMEC, para conversamos com a direção e as coordenadoras pedagógicas sobre a relevância da nossa pesquisa e apresentarmos os procedimentos gerais para sua efetivação. Na ocasião fomos muito bem acolhidos pela equipe gestora da escola que se mostrou bastante interessada na temática central de nosso estudo, colocando-se à disposição para colaborar com todo o processo de investigação. 57 4.2 DELINEAMENTO DA PESQUISA Nosso estudo caracteriza-se como uma pesquisa de natureza qualitativa (FLICK, 2009; MINAYO, 2001) de caráter exploratório (MORESI, 2003), na qual adotamos a técnica de Grupo Focal (GATTI, 2005; ASCHIDAMINI; SAUPE, 2014; MINAYO; COSTA, 2018) em sequência às entrevistas individuais. Segundo Minayo (2001, p. 21), a pesquisa qualitativa é “aquela que se preocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado”, podendo abrigar um horizonte variado de aspirações, crenças, valores, atitudes, motivos e significados. Ainda de acordo com a autora, o desenvolvimento da pesquisa qualitativa permite ao pesquisador imergir na realidade interna dos sujeitos que estuda, aprofundar-se na compreensão dos fenômenos investigados e estabelecer ligações entre os achados e os conceitos que fundamentam a sua procura. Na prática, essa imersão demanda interação entre o objeto e pesquisador, registro de dados ou informações coletadas, respeito à complexidade dos fenômenos e interpretação do pesquisador acerca da realidade observada (FLICK, 2009). Na perspectiva da abordagem qualitativa, optamos nesta investigação, por trabalhar com o Grupo Focal, em sequência às entrevistas individuais, por se tratar de uma técnica que respeita os princípios acima apresentados na busca pela compreensão de uma realidade particular. A saber, essa técnica surgiu na área do marketing, na década de 1920, visando o desenvolvimento de questionários de opinião pública, mas foi entre as décadas de 1950 e 1970, sob influência do sociólogo estadunidense Robert King Merton [1910-2003], que se projetou no âmbito da pesquisa, após ser empregada para “estudar as reações das pessoas à propaganda de guerra” (GATTI, 2005, p. 8), além de diferentes formas de trabalho em grupo. Passado esse período, sua redescoberta só se deu na década de 1980, sendo utilizada desde então, especialmente no campo das Ciências Humanas e Sociais, como estratégia metodológica qualitativa destinada ao levantamento de dados (ASCHIDAMINI; SAUPE, 2014). Outro ponto a se considerar é que, a técnica de Grupo Focal tem sido bem mais utilizada no âmbito das abordagens qualitativas, por ocupar-se da subjetividade, permitir a interatividade e o uso da liberdade de expressão (GATTI, 2005). No entanto, isso não impede que também seja empregada como estratégia metodológica quantitativa. Para Minayo e Costa (2018, p. 144): 58 O termo focal assinala que se trata de um encontro para aprofundamento em algum tema (o foco), para o qual a lente do pesquisador está apontada. O pressuposto metodológico é o valor da interação, da troca de opiniões entre os participantes quando a reflexão de um pode influenciar o outro, provocar controvérsias ou permitir o aprofundamento de uma reflexão. A ideia é explorar e mapear consensos e dissensos sobre o tema em questão. No que diz respeito a sua aplicabilidade, Morgan (1997) afirma que, a depender do tipo de abordagem e propósitos da investigação, os Grupos Focais podem classificados em: autorreferentes (técnica utilizada como principal fonte de dados); grupos focais como técnica complementar (ênfase no estudo de um tema determinado, na avaliação de programas de intervenção e construção de questionários e escalas); grupo focal como proposta de multimétodos qualitativos (análise intergrupal dos processos internos). Entende-se com isso que, mediante a definição clara do objetivo da pesquisa, os Grupos Focais podem ser utilizados em diversas situações, a exemplo de estudos exploratórios, pesquisas sociais e processos de avaliação, uma vez que em pouco tempo e a baixo custo (GATTI, 2005) permitem investigar questões complexas, fomentando a produção de conhecimentos. Figura 2 – Operacionalização do Grupo Focal Fonte: Mazza et al. (2009, p. 198). Frente a essa perspectiva, propusemos, nesta investigação, a utilização de alguns elementos da técnica de Grupo Focal, por estarmos trabalhando com um grupo pequeno e homogêneo de professoras em torno de um tema de interesse comum, para o qual a nossa lente estava apontada. De acordo com Gondin (2003, p. 153): 59 Tais combinações de método dependem dos objetivos da pesquisa. A utilização de grupos focais em sequência às entrevistas individuais, por exemplo, facilita a avaliação do confronto de opiniões, já que se tem maior clareza do que as pessoas isoladamente pensam sobre um tema específico. De maneira geral, um Grupo Focal é constituído por um número que varia de quatro a dez participantes, “devendo o tamanho do grupo estar adaptado aos propósitos da tarefa” (ASCHIDAMINI; SAUPE, 2014, p. 14). O recrutamento destes é intencional, ocorre dentro do grupo social investigado, podendo apresentar variações quanto aos critérios de sexo, idade, escolaridade, estado civil, entre outros. Quadro 2 – Participantes do Grupo Focal de nossa pesquisa 05 Professoras da Educação Infantil Atuantes na rede Municipal de ensino de Parnamirim/RN Grupo 100% do sexo feminino Fonte: Elaborado pela autora (2020). A isso se acresce que, a utilização da técnica de Grupo Focal prevê: a organização do espaço e ambientação para os encontros, desenvolvimento de um guia de discussão e a presença de um moderador (pesquisador) qualificado para incentivar a interação e promover uma discussão produtiva acerca do tema estudado. Em relação ao número de encontros, “varia de acordo com a complexidade da temática e o interesse da pesquisa, podendo ser alterado após análise conjunta dos dados coletados” (ASCHIDAMINI; SAUPE, 2014, p. 11). A literatura sugere que, para se evitar o cansaço e o desconforto dos participantes, o tempo de duração das sessões em Grupo Focal deve ser entre uma e duas horas, mediante a prévia elaboração de um roteiro que facilite o trabalho do moderador, a interação entre os participantes e o alcance dos objetivos almejados. Um último ponto a se considerar diz respeito à análise dos dados coletados através da utilização da técnica de Grupo Focal que deve ser feita “levando-se em consideração o contexto social, visto que são dados potencialmente subjetivos” (ASCHIDAMINI; SAUPE, 2014, p. 13). 60 Na nossa pesquisa, os encontros com os participantes da pesquisa se deram no espaço virtual através de uma plataforma de comunicação, procurando, embora distantes fisicamente, estarmos atentos a todos os elementos que estruturam o Grupo Focal. Assim sendo, frente ao objetivo geral e o referencial teórico adotado nesta perquirição, encontramos no Grupo Focal respaldo para implementarmos uma intervenção que respondesse às necessidades do grupo pesquisado sem perder de vista as dimensões coletiva e interativa da formação. Ainda sobre as características desta pesquisa, ela pode ser classificada como uma investigação de caráter exploratório (MORESI, 2003), por consideramos, com base em nossa busca em importantes repositórios abertos, que há pouco conhecimento acumulado e sistematizado na área da educação sobre a temática central de nosso estudo, que seria a relação corpo e aprendizagemno processo de inclusão escolar de crianças com TEA na Educação Infantil. Esse procedimento metodológico permite ao pesquisador conhecer o campo de pesquisa, assim como fatores que recaem sobre ele, podendo ainda ajudar a resolver algumas dificuldades em que vierem a surgir no decorrer da investigação. Em outras palavras, a pesquisa exploratória, ou estudo exploratório, tem por objetivo conhecer a variável de estudo tal como se apresenta, seu significado e o contexto onde ela se insere. Pressupõe-se que o comportamento humano é melhor compreendido no contexto social onde ocorre [...]. Assim, tem por finalidade evitar que as predisposições não fundadas no repertório que se pretende conhecer influam nas percepções do pesquisador e, consequentemente, no instrumento de medida. Não corrigido, este tipo de tendência poderá conduzir o pesquisador a perceber a realidade segundo sua ótica pessoal, de caráter técnico-profissional. A pesquisa exploratória, permitindo o controle dos efeitos desvirtuadores da percepção do pesquisador, permite que a realidade seja percebida tal como ela é, e não como o pesquisador pensa que seja (PIOVESAN; TEMPORINI, 1995, p. 321). Portanto, a pesquisa exploratória apresenta natureza qualitativa e contextual, e como procedimento metodológico dentro da pesquisa, se mostra adequada à ampliação da compreensão da realidade estudada, como nos propomos neste estudo. 4.3 INSTRUMENTOS UTILIZADOS 61 Para a consecução dos objetivos desta pesquisa, utilizamos como instrumento para recolha de dados, a entrevista do tipo semiestruturada (RESTE, 2015; TRIVIÑOS, 1987), conhecida ainda como semidiretiva ou semiaberta, caracterizada como aquela que parte de certos conhecimentos básicos apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante. Desta forma, o informante seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar do conteúdo de pesquisa (TRIVIÑOS, 1987, p. 146). O autor segue afirmando que a entrevista semiestruturada “[...] favorece não só a descrição dos fenômenos sociais, mas também sua explicação e a compreensão de sua totalidade [...]”, além de manter a presença consciente e atuante do pesquisador no processo de coleta de informações (TRIVIÑOS, 1987, p. 152). Implica dizer que se trata de uma técnica de recolha de dados que permite ao pesquisador compilar informações dentro de um determinado contexto e também conhecê-lo em sua integralidade sem que para isso seja necessário perder de vista a objetividade nem a capacidade metarreflexiva do entrevistado. Assim, todo o material produzido nas entrevistas, pode ser considerado, ao mesmo tempo, material verbal e material simbólico (RESTE, 2019), pois dá acesso ao não observável, às entrelinhas das palavras utilizadas pelos investigados. Isso nos reporta às contribuições de Merleau-Ponty (2006), que ao tratar das tessituras do conhecimento, assevera que na interpretação do real sempre transborda a percepção, e seus sentidos ultrapassam os “dados” e os “conceitos”. Ainda sobre essa técnica, Reste (2015, p. 227) assevera que: Uma entrevista é literalmente uma “entre – vista”, uma troca de pontos de vista entre duas pessoas, neste caso, o entrevistador e o entrevistado, que conversam sobre um tema de mútuo interesse. Ela é uma “conversação estruturada”, cuja força reside, precisamente, na apreensão da multiplicidade de pontos de vista dos sujeitos sobre um tema, de modo a construir uma imagem da diversidade e controvérsia do mundo humano. Portanto, embora siga um esquema ou roteiro básico para levantamento de dados, a entrevista dá abertura para quem está sendo estudado, podendo levar o pesquisador a alcançar terrenos não vislumbrados. 62 Como fonte de pesquisa, utilizamos o Projeto Político-Pedagógico (VEIGA, 2003) da instituição investigada, documento que pode ser entendido como um instrumento orientador da ação educativa escolar a ser elaborado e executado por toda instituição brasileira de ensino (BRASIL, 1996, Art. 12). Em essência, reúne: objetivos, diretrizes, valores norteadores e ações, além de concepções, reflexões e princípios pedagógicos a serem empreendidos pelos que estão envolvidos com o processo educativo da instituição. De acordo com Veiga (2003, p. 11), um bom Projeto Político-Pedagógico caracteriza- se por: a) ser um processo participativo de decisões; b) preocupar-se em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições; c) explicitar os princípios baseados na autonomia da escola, na solidariedade entre seus agentes educativos e no estímulo à participação de todos no projeto comum e coletivo; d) conter opções explícitas na direção da superação de problemas, no decorrer do trabalho educativo voltado para uma nova realidade específica; e) explicitar o compromisso com a formação do cidadão. Assim sendo, o Projeto Político-Pedagógico pode ser considerado o principal documento da escola, um produto específico fruto da reflexão e do trabalho colaborativo, que reflete os princípios e fundamentos de uma instituição escolar. Nesse sentido, espera-se que seja coerente com uma proposta de educação para todos e que contemple uma ação educativa pautada no respeito à diversidade e fomento de princípios inclusivos. O PPP da instituição investigada data de 2018, e nele observamos a identificação completa da escola, breve história e seus princípios, perfil dos alunos e de suas famílias, recursos disponíveis, diretrizes pedagógicas e concepções norteadoras de trabalho, incluindo concepção de homem, criança, infância e educação. No mais, percebemos tratar-se de um documento em construção com ações e objetivos bem definidos. Porém, observamos a ausência em sua estrutura de um Plano de Ação (desdobramento do PPP no Plano Escolar Anual) e de referências diretas à questão da inclusão, embora haja menção à diversidade associada ao termo ações pedagógicas. Para o levantamento de outras informações após a intervenção, utilizamos o Google Forms, “ferramenta gratuita de criação de formulários on-line disponível para qualquer usuário que possui uma conta Google, que pode ser acessado em diversas plataformas, inclusive, por meio do celular” (MOTA, 2019, p. 371). 63 Ainda de acordo com a autora, esse formulário pode ser utilizado “para facilitar o processo de pesquisa dos acadêmicos, bem como servir de ferramenta para avaliação e buscar feedback junto aos alunos acerca da realização das atividades em sala de aula” (MOTA, 2019, p. 379), em virtude de seu fácil manuseio e praticidade para coletar informações. Cabe ressaltar que as professoras participantes desta investigação já tinham assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), e a nossa pesquisa já havia sido submetida ao comitê de ética quando optamos pela utilização do formulário virtual. Por esse motivo, respondê-lo após a formação foi opcional para o grupo participante. O formulário virtual foi disponibilizado por meio de link ao término de nossa proposta de formação, e, através deste, coletamos os nomes dos participantes para fins de certificação. Acrescentamos ao formulário a seguinte questão: Você acha que existe alguma relação entre corpo e aprendizagem? Se sim, como você enxerga que os alunos com TEA têm vivenciado essa relação? Essa mesma pergunta já havia sido realizada na entrevista semiaberta e a refizemos com o objetivo de instigarmos as professoras participantes a repensarem a questão e, por consequência, engrossarmos nossas discussões. 4.4 LÓCUS DA PESQUISA A presente pesquisa foi realizada em um Centro Municipalde Educação Infantil Eugênia Palhares, localizado na cidade de Parnamirim/RN, que atende crianças entre dois e cinco anos de idade nos turnos matutino e vespertino. Fundado no ano de 1998 pelo então prefeito Raimundo Marciano de Freitas [1939], está entre os vinte Centros Municipais de Educação Infantil distribuídos em diferentes áreas demográficas do município até o ano de 2015 (PMEP, 2015). Fica localizado próximo a principal feira livre da cidade, em prédio próprio da SEMEC e conta com uma clientela de pais e/ou responsáveis bastante diversificada. Conforme o Projeto Político-Pedagógico (PPP, 2018) da escola, estes, em sua maioria, possuem ensino fundamental incompleto, são assalariados ou sobrevivem do trabalho informal, existindo ainda uma parcela considerável que se mantém com os benefícios sociais disponibilizados pelo Governo Federal. 64 A instituição educativa dispõe em sua estrutura de 07 salas de aulas, sendo uma com sanitário e trocador para bebês; almoxarifado; área verde; banheiro adequado a alunos com deficiência ou mobilidade reduzida; banheiro adequado à Educação Infantil; banheiro com chuveiro para adultos; ludoteca (em anexo ao prédio principal); cozinha; despensa; escovódromo (local para escovar os dentes); parque infantil; pátio coberto; refeitório; sala de diretoria/coordenação; sala de professores e sala de secretaria. Figura 3 – Entrada principal do CMEI Fonte: Facebook da instituição. Trata-se de um estabelecimento internamente bem iluminado pela luz solar, arejado e com uma ampla área verde ao seu redor. As salas de aula são bem estruturadas, dispõem de mesas circulares que acomodam 06 crianças cada, e além das portas internas possuem portas laterais que dão acesso à parte verde da escola. Nesta, além das inúmeras árvores, as crianças podem desfrutar de um espaço amplo e ventilado com gramado, parque infantil feito de madeira, balanços, escorregos, pneus diversos e coloridos presos ao chão, bancos de areia e um local com chuveirões para banhos coletivos. 65 Figura 4 – Área verde da instituição investigada Fonte: Facebook da instituição. Quanto à organização administrativa e pedagógica, no ano de 2020, o CMEI era formado por 01 diretora, 02 coordenadoras pedagógicas (uma para cada turno), 16 professores efetivos sendo 14 da sala regular e 02 de arte e movimento, 09 estagiários, 02 auxiliares de secretaria (um para cada turno), 01 cozinheira, 01 auxiliar de cozinha, 02 auxiliares de serviços gerais e 02 porteiros (um para cada turno). Segundo dados fornecidos pela equipe gestora da instituição, o CMEI detém turmas de creche e pré-escola e atende anualmente uma média total de 300 crianças, distribuídas entre os turnos matutino e vespertino. A maioria das crianças vivia sob a responsabilidade dos pais, e cerca de 20% tinham apenas a mãe e/ou avôs como responsável. No quadro a seguir, que fora elaborado e disponibilizado pela Secretaria da instituição, temos uma visão geral do quantitativo de crianças matriculadas no CMEI distribuídas por níveis e turnos no ano da coleta de dados. Do total das 300 crianças matriculadas, havia 07 com Necessidades Educacionais Especiais (NEE). Quadro 3 – Quantitativo de crianças atendidas por turno e por turma no ano de 2020 TURNO MATUTINO NÍVEIS/TURMAS III-A IV-A IV-B V-A V-B VI-A VI-B QUANTIDADE 19 19 19 23 23 21 19 146 *NEE --- --- 01 01 01 --- --- 66 TURNO VESPERTINO NÍVEIS/TURMAS III-B IV-A IV-B V-A V-B VI-A VI-B QUANTIDADE 19 21 20 21 23 22 24 154 *NEE --- --- --- 02 01 01 --- *Necessidade Educacional Especial – Criança público alvo da Educação Especial TOTAL GERAL DE CRIANÇAS ATENDIDAS PELA INSTITUIÇÃO: 300 Fonte: Arquivo da escola. Elaborado pela Secretaria do CMEI (2020). De acordo com o PPP da instituição, o CMEI é uma referência em ensino infantil no município e por isso recebe crianças de diversos bairros, o que justifica o elevado número de matrículas. O documento ainda aponta que esse reconhecimento se dá em virtude do trabalho de qualidade oferecido pela escola, cujas propostas envolvem o desenvolvimento de ações que “contemplam as necessidades, diversidade e especificidades de cada criança e o envolvimento da comunidade e do poder público, contribuindo assim para formação de uma geração de cidadãos críticos, conscientes e participativos” (PPP, 2018, p. 04). No que tange ao processo de inclusão escolar de crianças com deficiência, embora tenhamos observado um considerável número de matrículas, vimos que o PPP da escola não faz nenhuma referência direta a essa clientela. Porém, apresenta princípios e fundamentos que se mostram coerentes com uma proposta de educação para todos: Visão de futuro: primar por ser um Centro Infantil de referência, trabalhando para a melhoria da qualidade da Educação Infantil, com propostas e ações que contemplem as necessidades, diversidade e especificidades de cada criança e o envolvimento da comunidade e do poder público. Contribuindo para formação de uma geração de cidadãos críticos, conscientes e participativos (PPP, 2018, p. 4, grifo nosso). O maior número de matrículas de crianças diagnosticadas com TEA no ano de 2020 foi o critério utilizado para que CMEI pudesse ser lócus de nossa pesquisa, levantamento que fizemos junto a SEMEC de Parnamirim/RN. Abaixo, segue o detalhamento das informações obtidas sobre as crianças com TEA. 67 Quadro 4 – Quantitativo de crianças com laudo de TEA matriculadas no CMEI no ano de 2020 TURNO MATUTINO TURMA DATA DE NASCIMENTO/IDADE 01 criança Nível IV – A 12/01/2016 – 4anos e 1mês 01 criança Nível V – A 09/01/2015 – 5 anos e 1mês TURNO VESPERTINO TURMA DATA DE NASCIMENTO/IDADE 01 criança Nível V – A 28/10/2014 – 5anos e 4meses 01 criança Nível V – B 16/03/2014 – 5anos e 11meses 01 criança Nível VI – A 30/03/2015 – 4anos e 11 meses Fonte: Arquivo da pesquisadora (2020). Vale destacar, que, por ocasião da recolha de dados junto à SEMEC do município de Parnamirim/RN, observamos que outros Centros Infantis relatavam apresentar um número maior de crianças com TEA matriculadas naquele ano. No entanto, muitos ainda eram casos suspeitos ou estavam em fase de investigação, e as crianças terem laudo foi um dos critérios de inclusão do CMEI Eugênia Palhares na nossa pesquisa. No que diz respeito ao PPP da escola, observamos que, embora se encontre em processo de construção, o documento traz em sua proposta curricular uma visão integradora do trabalho pedagógico que contempla reflexões em torno da concepção de homem e criança, educação, realidade social, cultural e econômica. 4.5 PROFESSORAS PARTICIPANTES Participaram desta investigação 05 professoras da Educação Infantil que tinham em suas turmas crianças diagnosticadas com TEA, sendo duas do turno matutino e três do turno vespertino. A fim de facilitarmos a identificação das participantes e resguardarmos suas identidades, atribuímos-lhe pseudônimos: Auta, Celina, Clara, Militana e Nísia. Os nomes fictícios escolhidos são de mulheres insurgentes do Rio Grande do Norte20, reconhecidas pela peculiaridade de seus talentos e/ou gestos destemidos de bravura. A opção por esses nomes se deu por ocasião da leitura do PPP da escola lócus de nossa pesquisa, que 20 Seis notáveis mulheres do RN que fizeram história. Disponível em: https://apartamento702.com.br/6- notaveis-mulheres-do-rn-que-fizeram-historia/. Acesso em: 20 fev. 2021. https://apartamento702.com.br/6-notaveis-mulheres-do-rn-que-fizeram-historia/ https://apartamento702.com.br/6-notaveis-mulheres-do-rn-que-fizeram-historia/ 68 atribui ao amor e determinismo de uma moradora local o surgimento do CMEI, que, por sinal, recebe o seu nome. De acordo com o documento, “antes da fundação desta instituição, o município de Parnamirimnão contava com escolas para Educação Infantil, uma vez que a cidade estava iniciando o seu processo de habitação” (PPP, 2018, p. 6). Isso só veio a acontecer pelo exemplo de uma mulher aguerrida que, ao abrir as portas de sua residência para acolher a comunidade e prestar assistência às crianças mais carentes, deu visibilidade às necessidades da região. À força de todas as mulheres, portanto, nossa homenagem neste texto dissertativo. Voltando às professoras participantes de nossa pesquisa, conseguimos através das entrevistas realizadas traçar um perfil mais detalhado de cada uma delas, no que diz respeito a idade, tempo de docência, escolarização e exercício da profissão no município de Parnamirim/RN. No quadro abaixo, organizamos essas informações para melhor compreensão do leitor. Quadro 5 – Informações gerais sobre as participantes da pesquisa NOME IDADE TEMPO DE DOCÊNCIA TEMPO NA REDE MUNICIPAL DE PARNAMIRIM FORMAÇÃO ACADÊMICA Auta 39 anos 10 anos 06 anos Graduação em Pedagogia/2006 Especialização em Psicopedagogia/2010 Celina 41 anos 11 anos 09 anos Graduação em Pedagogia/2009 Especialização em Psicopedagogia/2015 Clara 31 anos 12 anos 10 anos Graduação em Pedagogia/2009 Especialização em Libras, Saúde, Educação Especial e Inclusiva/ 2020. Militana 40 anos 07 anos 07 anos Graduação em Pedagogia/2007 Especialização em Educação Infantil/2015 Nísia 45 anos 20 anos 10 anos Graduação em Pedagogia/2005 Especialização em Educação Infantil/2010 Fonte: Entrevista aplicada pela pesquisadora (2020). Observamos tratar-se de um grupo de professoras com idade entre 30 e 45 anos, com vasta experiência no ensino de crianças pequenas e uma média de 06 a 10 anos trabalhando na rede municipal de Parnamirim/RN. Sobre ser um grupo formado apenas por mulheres, os 69 dados só reforçam a constatação da forte presença feminina no magistério e a divisão sexual do trabalho (VIANNA, 2013). Para mais, se acresce que, em consonância com a LDB, título VI, que trata dos profissionais da educação, todas possuem formação em nível superior para atuar na Educação Infantil, como exige a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996): A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura plena, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nos cinco primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal (BRASIL, 1996, Art. 62). Na verdade, para além do determinado, as professoras entrevistadas já possuem pós- graduação em diferentes áreas da Educação, inclusive com registro de uma delas na área da Educação Inclusiva, o que representa um ganho qualitativo em suas formações. 4.6 OPERACIONALIZAÇÃO DA PESQUISA Para melhor compreensão do leitor dos procedimentos adotados, organizamos este estudo em 11 momentos: Momento 1 – Inicialmente foi realizada uma revisão de literatura em bibliotecas e repositórios abertos sobre as temáticas: corpo, Transtorno do Espectro Autista (TEA), inclusão escolar na Educação Infantil e formação docente. Também foi feita uma análise documental da Lei nº 12.764/2012, que institui a “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”, e do Plano Municipal de Ensino de Parnamirim/RN (2015), cidade sede do Centro Municipal de Educação Infantil lócus de nossa investigação. Momento 2 – Posteriormente, fizemos, junto à SEMEC de Parnamirim, um levantamento do CMEI com maior número de matrículas de crianças diagnósticas com TEA, a fim de alcançarmos um número significativo de professoras para participar de nossa investigação. A instituição que se alinhou aos critérios de inclusão tinha duas crianças com TEA no turno matutino e três crianças no turno vespertino, totalizando, por consequência, a participação de cinco docentes. Na ocasião, também apresentamos oralmente e por escrito 70 nossa proposta de estudo para a repartição, e solicitamos uma autorização assinada, conforme exige o Comitê de Ética, para entrarmos na escola selecionada. Momento 3 – Após o CMEI ter sido informado pela SEMEC via telefone sobre a pretensão de realização desta pesquisa, e já de posse da Carta de Anuência (Apêndice A), reunimo-nos presencialmente com a equipe gestora da instituição, que nos atenderam com solicitude e entusiasmo, dando-nos, inclusive, permissão para acessar o PPP da escola, “instrumento clarificador da ação educativa da escola em sua totalidade” (VEIGA, 2003, p. 11). Momento 4 – Dada a submissão de nossa proposta de estudo ao Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Onofre Lopes (HUOL) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), elaboramos o roteiro da entrevista semiestruturada. O guião da entrevista produzido (Apêndice B) continha questões fechadas sobre os dados pessoais participantes da pesquisa, e 08 perguntas objetivando identificar a compreensão das professoras da Educação Infantil sobre o corpo e sua relação com a aprendizagem de crianças com e sem deficiência. Momento 5 – Após arranjos organizados pela gestão da escola, nos reunimos em situações de planejamento coletivo nos turnos matutino e vespertino, com todos os professores e estagiários da instituição para sensibilizá-los quanto à pertinência de nossa pesquisa, seus objetivos, o modo como os dados seriam coletados, os termos de autorização, e fazermos o recrutamento do grupo focal; Momento 6 – As entrevistas semiestruturadas (Apêndice B) foram realizadas individualmente entre os dias 05 e 12 de março do ano de 202021, em horários acordados com os docentes e direção do CMEI, tiveram duração mínima de 30 minutos e foram analisadas visando responder ao problema e objetivos desta pesquisa. Cada professora entrevistada teve acesso à leitura prévia dos termos a serem assinados para sua realização. Explicamos que as falas seriam gravadas em áudio para posterior transcrição, e asseguramos o caráter de confidencialidade e anonimato inerentes aos participantes da pesquisa e à escola investigada. Cientes das questões éticas e dos princípios que fundamentam nossa pesquisa, todas as participantes assinaram voluntariamente o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e apenas uma delas não consentiu a autorização para gravação de voz (Apêndice D), alegando não se sentir confortável com a situação. Respeitosamente, acolhemos sua posição e fizemos a escrita de suas falas no ato da entrevista. 21 Em 17/03/2020, cinco dias após a realização das entrevistas semiestruturadas, o estado do Rio Grande do Norte lançou o Decreto de nº 29524, que dispõe sobre medidas para o enfrentamento da Situação de Emergência em Saúde Pública provocada pelo novo coronavírus (Covid-19). Essas medidas restringiram as atividades das escolas, que até a presente data se encontram fisicamente fechadas. 71 Momento 7 – Após a realização das entrevistas, foi feita a análise de conteúdo (BARDIN, 2016), para interpretação das informações recolhidas, o que permitiu uma compreensão que vai além dos significados imediatos expressos nos discursos dos documentos e estudos primários. Essa etapa, seguindo os critérios de organização de uma análise por Bardin (2016), envolveu: pré-análise, exploração do material coletado e tratamento dos resultados. Momento 8 – Feita a análise de conteúdo, reunimo-nos presencialmente com a equipe gestora da escola e com as participantes da pesquisa para dar uma devolutiva das entrevistas e apresentar as demandas previamente levantadas. Na ocasião, ficou acordado que desenvolveríamos uma formação para o grupo em formato de oficinas pedagógicas, e que estas seriam planejadas colaborativamente no nosso próximo encontro, a ser articulado em acordo com a equipepedagógica da instituição. Momento 9 – Então, veio a pandemia do novo coronavírus, desestabilizando alunos, corpo docente e as instituições educativas de todo o mundo, inclusive a que fora lócus de nossa investigação e precisou de algum tempo para conseguir administrar os impactos do Covid-19 sob o seu funcionamento. Assim sendo, a retomada de nosso contato com o CMEI, só se deu no segundo semestre do ano de 2020, após um novo encontro com representantes da SEMEC de Parnamirim, no dia 20/10/2020, via plataforma de comunicação. Na ocasião, reiterarmos os objetivos e a proposta metodológica de nossa pesquisa, formalizamos via e- mail junto à repartição nossa proposta de formação e acordamos que, respeitando todas as medidas sanitárias instituídas pelos governos estadual e municipal, a formação dar-se-ia no formato virtual dentro do tempo e disponibilidade do CMEI. Momento 10 – Após serem informados pela SEMEC sobre nossa reunião, entramos em contato via telefone com a equipe gestora do CMEI para conversarmos sobre o desenvolvimento de uma formação no formato virtual, possíveis dias e horários. Na ocasião, concordamos que, além das professoras participantes da pesquisa, seria mais proveitoso para a escola estender a formação para todo o corpo docente e administrativo da instituição, e que a possível data para reunir a todos, devido às atividades remotas e demais ações já programadas, seria dia 06/11/2020, às 14h 30. Momento 11 – Nessa perspectiva, tratamos de elaborar um convite virtual para que todos se sentissem convidados a participar da formação, que foi repassado via WhatsApp pelas coordenadoras pedagógicas do CMEI. Também o enviamos para a Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Parnamirim via aplicativo de mensagem WhatsApp. Vale ressaltar 72 que a elaboração e distribuição dos convites respeitou as orientações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa22 para procedimentos em pesquisas com qualquer etapa em ambiente virtual. Figura 5 – Convite virtual para os professores participarem da formação Fonte: Elaborado pela autora (2020). 4.7 PROCEDIMENTOS PARA A ANÁLISE DOS DADOS Para procedermos a análise dos dados coletados nas entrevistas, utilizamos a técnica de análise de conteúdo fundamentada por Bardin (2016, p. 48), que a designa como Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. 22 Orientações para procedimentos em pesquisas com qualquer etapa em ambiente virtual. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/images/Oficio_Circular_2_24fev2021.pdf. Acesso em: 3 mar. 2021. http://conselho.saude.gov.br/images/Oficio_Circular_2_24fev2021.pdf 73 Nessa perspectiva, a análise de conteúdo pode ser entendida com um conjunto de instrumentos metodológicos, em constante aperfeiçoamento, que se presta a analisar diferentes formas de comunicação, sejam elas verbais ou não. Para a autora, trata-se de uma técnica delicada, exaustiva, que exige do pesquisador paciência e tempo para fazer uma descrição apurada, sistemática e objetiva do conteúdo analisado, sem menosprezar a “fecundidade da subjetividade” e as estruturas das informações contidas nas mensagens. Complementando esse pensamento, Godoy (1995), assevera que ao analista cabe entender o sentido da comunicação, como se fosse o receptor normal, e, principalmente, desviar o olhar, buscando outra significação, outra mensagem, passível de se enxergar por meio ou ao lado da primeira. Ainda de acordo com Bardin (2016), a utilização da análise de conteúdo prevê três fases fundamentais: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados – a inferência e a interpretação. A pré-análise é a fase de organização, de estruturação do esquema de trabalho que orientará as ações do analista. Nela, estão fundidas três missões: “a escolha dos documentos a serem submetidos à análise, a formulação das hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final” (BARDIN, 2016, 125). A pré-análise ainda comporta algumas operações, conforme se pode observar no quadro abaixo. Quadro 6 – Fases da pré-análise Leitura flutuante Primeiro contato do pesquisador com a matéria da análise; Na leitura flutuante, toma-se contato com os documentos a serem analisados, conhece-se o contexto e deixa-se fluir impressões e orientações (GODOY, 1995). A escolha dos documentos Consiste na definição do corpus de análise; A escolha dos documentos deve acontecer mediante regras: Exaustividade: não deixar de fora da pesquisa qualquer um de seus elementos, sejam quais forem as razões; Representatividade: a análise pode partir de amostras que representem o universo inicial; Homogeneidade: os dados devem referir-se ao mesmo tema, serem coletados por meio de técnicas iguais e indivíduos semelhantes (BARDIN, 2016); Pertinência: adaptação dos documentos aos objetivos da pesquisa. 74 A formulação das hipóteses e dos objetivos É realizada a partir da leitura inicial dos dados; Afirmação provisória que se propõe a verificar (confirmar ou infirmar), recorrendo aos procedimentos de análise (BARDIN, 2016). Referenciação dos índices e a elaboração de indicadores Escolha dos índices que a análise explicitará; Organização sistemática dos indicadores que determinarão a análise do material produzido. Preparação do material Antecede a análise propriamente dita do material coletado (BARDIN, 2016); Ajuntamento do material preparado. Fonte: Elaborado pela autora (2020). Após transcrição na íntegra das entrevistas realizadas, fizemos leituras e releituras do material coletado, buscando estabelecer um esquema de trabalho com procedimentos bem definidos, sem perder de vista o referencial teórico inicialmente adotado e os demais estudos que foram sendo agregados a esta pesquisa no decorrer do processo investigativo. Concluída a primeira fase – transcrição das entrevistas – partimos para a exploração do material de análise, que, segundo Bardin (2016), consiste essencialmente em operações de codificação, decomposição ou enumeração. É a fase onde se dá a análise propriamente dita do material coletado para a escolha de índices ou categorias que posteriormente poderão ser organizados em indicadores ou temas. Nesse sentido, fizemos a exploração do material através da codificação dos dados, “processo pelo qual os dados brutos são transformados sistematicamente e agregados em unidades, as quais permitem uma descrição exacta das características pertinentes do conteúdo” (HOLSTI, 1969 apud BARDIN, 2016, p. 133), e criamos categorias temáticas para agrupamento das informações. Dessa análise, emergiram três categorias temáticas: a inclusão escolar da criança com TEA contexto da escola regular; corpo e autismo; relação corpo e aprendizagem da criança com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil. Na perspectiva da análise de conteúdo, a análise temática é aquela em que se adotam critérios semânticos (temas) para estudar opiniões, atitudes, valores, crenças, tendências etc., e “consiste em descobrir os «núcleos de sentido» que compõem a comunicação e cuja presença, 75 ou frequência de aparição podem significar alguma coisa para o objectivo analítico escolhido” (BARDIN, 2016, p.135). A terceira fase do processo de análise de conteúdo é denominada tratamento dos resultados – a inferência e a interpretação, considerada uma busca por tornar os resultados brutos significativos e válidos. Nessa etapa, “o analista,tendo a sua disposição resultados significativos e fiéis, pode então propor inferências e adiantar interpretações a propósito dos objetivos previstos – ou que digam respeito a outras descobertas inesperadas” (BARDIN, 2016, p. 131). Desse modo, voltamo-nos atentamente para os marcos teóricos pertinentes à investigação e, através do processo de triangulação dos dados, buscamos extrapolar a textura das palavras para alcançar significados por trás dos discursos anunciados. 76 5 APRESENTAÇÃO DAS CATEGORIAS Um comportamento nunca ocorre no vácuo. Ele é o resultado final entre o ambiente, e tudo aquilo que o ambiente inclui, inclusive as pessoas.23 (TEMPLE GRANDIN, 1996). Tinha os pés levemente fora do chão quando saí da entrevista... O corredor cinza e naquela manhã praticamente vazio, que por muitas vezes me acolheu em cansaço, pareceu abrir os braços em cores para saudar-me com alegria. O resultado ainda não havia sido divulgado, porém meu corpo pulsava em gratidão, se alargando pelo caminho, tal qual costumava acontecer quando eu voltava da casa de minha avó cortando a noite fria, que se engrandecia por usar um colar de vagalumes. Poucos dias depois, o que era sonho transformou-se em alegria e a filha do fogão de lenha chegou ao Mestrado, na expectativa de adquirir conhecimento, aperfeiçoar sua prática e, num gesto de ousadia, talvez ser ponte onde para muitos não houvesse travessia. De certo, o leitor haverá de se interrogar o porquê desse momento de nostalgia dentro deste texto dissertativo, e qual a relevância da memória resgatada para o que nos propomos nesta seção, que é explorar as categorias temáticas originadas do tratamento dos dados. É que hoje, na condição de analista, não posso me esquecer da pessoa entrevistada que fui um dia, e do apanhado de sensações que de forma secreta e latente em meu corpo se escondiam. Como disse a Temple Grandin, o ambiente e tudo aquilo que ele inclui é significativo e exerce uma força sobre nós. Não foi fácil passar por uma entrevista da qual dependia a realização de um de meus sonhos. Quanta coisa senti naquele dia! Tantas outras guardei por euforia. Como também não foi fácil entrevistar e analisar mensagens procurando manter-se atenta aos significados. O uso dessa técnica e consequente análise de conteúdo, exigiu sensibilidade ao que está invisível aos olhos e às sutilezas das palavras. Por isso, o que se coloca adiante, são dados e tentativas de interpretação, pois de certo não conseguimos tocar todos os vagalumes que os entrevistados avistaram pelo caminho, nem as estradas que em sua formação cruzaram um dia. 23 Trecho da entrevista com Temple Grandin realizada em 1º de fevereiro de 1996 pelo Dr. Stephen Edelson. Disponível em: https://topediatrica.blogspot.com/2011/11/entrevista-com-temple-grandin.html. Acesso em: 22 abr. 2021. https://topediatrica.blogspot.com/2011/11/entrevista-com-temple-grandin.html 77 Os resultados aqui apresentados e sua discussão referem-se às questões da entrevista realizada, cuja análise rendeu a elaboração de três categorias: a inclusão escolar da criança com TEA contexto da escola regular; corpo e autismo; relação corpo e aprendizagem da criança com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil. Dessas categorias, emergiram posteriormente algumas subcategorias cujos resultados apresentaremos a seguir. 5.1 A INCLUSÃO ESCOLAR DA CRIANÇA COM TEA NO CONTEXTO DA ESCOLA REGULAR O que significa inclusão? Na perspectiva de Mantoan (2003, p. 12): A inclusão é uma inovação que implica um esforço de modernização e de reestruturação das condições atuais da maioria de nossas escolas (especialmente as de nível básico), ao assumirem que as dificuldades de alguns alunos não são apenas deles, mas resultam, em grande parte, do modo como o ensino é ministrado e de como a aprendizagem é concebida e avaliada. Já na perspectiva das participantes de nossa pesquisa: Inclusão é inserir o aluno na sala... Assim, acho que não tratando ele diferente apesar dele ter umas dificuldades, umas limitações. Só que eu acho que a rede não está preparada. Por exemplo, a gente precisa de uma auxiliar e não temos. Não tem brinquedos, assim pra eles, mais didáticos, que eles poderiam usar. Acho que faltam algumas coisinhas assim pra poder inclui- las melhor (CELINA). Eu acho que a inclusão é necessária, certo? Mas, que nem sempre a gente como professora está preparada, né? Por mais que a gente estude, leia, sobre o assunto, cada criança traz suas características, né? Então, assim, a inclusão é necessária, mas tem essa questão, né, do preparo do professor e da própria instituição, assim, escolar, de cima pra baixo. Partindo de prefeituras, que também não são estruturadas... Então, assim: é algo que está posto ali, eu acredito que tenha que acontecer, mas eu vejo de forma bem falha. No geral. Partindo de todos os sentidos (CLARA). É... É um processo difícil, né? Se a gente for pensar na realidade mesmo do chão, do cotidiano da escola pública – eu não acho que só pública, mas de uma maneira geral – é um processo muito difícil, mas ele é necessário. E é importante que o profissional e que todas as pessoas que estejam envolvidas na educação dessa criança tenham a sensibilização pra acolhê-la, pra buscar os conhecimentos necessários, pesquisar os conhecimentos que muitas vezes a gente alega não ter, né? – Não! Não fui preparada! Na graduação, enfim... Na vida acadêmica, eu não fui preparada para receber uma criança com deficiência, seja ela qual for. Mas, acho que a nossa função como professor 78 pesquisador, é essa pesquisa contínua. Então, mesmo eu não tendo sido preparada, eu preciso buscar as ferramentas, os referenciais pra isso. Embora, é, eu acho importante, eu acho é um dos melhores caminhos para a aprendizagem e o desenvolvimento da criança com deficiência, eu acho que é ela estando na sala regular, sim! É... Embora ela também precise da Sala Multifuncional e dos acompanhamentos com toda a equipe médica, também pra o seu desenvolvimento, mas sei que é um desafio! Ainda é um desafio. É isso! (AUTA) É um pouco difícil de acontecer, né? Porque essa questão de auxiliar, né, que no caso do aluno que a gente tá trabalhando ele ficou quase dois anos sem auxiliar. Acho que veio ter auxiliar mais de um ano porque eu fiquei com a turma dois anos e só veio chegar no mês de agosto, mais ou menos. Então, eu fiquei quase um ano e meio sem auxiliar. Então, como é que você vai conseguir fazer uma inclusão, né, com essa criança? Depois veio a dificuldade... No caso, a dificuldade que eu tive é que a auxiliar nunca tinha entrado em sala de aula. Entende? Então, tudo que eu fosse fazer de atividade, né, inclusiva com ele, eu tinha que passar pra ela.... Sempre orientação, né? Mas, nunca é como a gente faz, né? Mas, também essa dificuldade, por exemplo, você ter um tempo para pesquisar, né? O planejamento você tem... É da turma ali, mas é muito complicado vc fazer esse planejamento porque é diferente... Uma criança que tem necessidades, você tem que fazer uma pesquisa diferente e não pode ser algo superficial. Então, eu sempre achava assim que ficava aquém. Eu não tinha como dar essa atenção. E assim, a inclusão, realmente eu acho muito complicado acontecer! (MILITANA). A inclusão é um desafio devido à falta de formação específica para incluir. Falta formação para entender as diferenças e ajuda para desenvolver o nosso trabalho (NÍSIA). Observamos nos excertos acima que a tendência primeira das professoras entrevistadas, ao conceituarem a inclusão, é apresentá-la como um “ato ou efeito de inserir”, e, ainda como algo que tem provocado inúmeros desafios em decorrência da falta de formação específica para atender as diferenças e desenvolvero trabalho docente (NÍSIA). Por sua vez, Mantoan (2003) chama-nos a atenção para a dimensão do termo, colocando-nos frente a uma definição que extrapola a faculdade do agir. Segundo a autora, a inclusão escolar representa uma inovação, um esforço de modernização, que nesta pesquisa compreendemos como um avanço em relação a um modelo anterior; um movimento que demanda a articulação de um esforço coletivo e uma nova concepção de educação, para acolher a diversidade e as múltiplas formas de aprender. Para entendermos o que isso significa, precisamos voltar um pouco na história, mais precisamente até meados da década de 1980, quando “todos os modelos pressupunham a manutenção dos serviços já existentes e uma opção preferencial pela inserção na escola comum” (MENDES, 2006, p. 390, grifo nosso). Ou seja, embora as pessoas com deficiência 79 tivessem a opção por frequentar a escola regular e conviver socialmente com outros indivíduos, as políticas oficiais eram de integração e postulavam expectativas normativas, só podendo frequentar a escola aqueles que eram considerados escolarizáveis. Sobre isso Mantoan (2003, p. 15) ressalta: Nas situações de integração escolar, nem todos os alunos com deficiência cabem nas turmas de ensino regular, pois há uma seleção prévia dos que estão aptos à inserção. Para esses casos, são indicados: a individualização dos programas escolares, currículos adaptados, avaliações especiais, redução dos objetivos educacionais para compensar as dificuldades de aprender. Em suma: a escola não muda como um todo, mas os alunos têm de mudar para se adaptarem às suas exigências. O período de integração erguia-se sob o princípio da normalização, uma ideologia que se tornou mundialmente dominante a partir da década de 1970, e consistia em proporcionar às pessoas com deficiência condições de vida iguais a de qualquer outra pessoa, o que rapidamente consolidou o desenvolvimento de práticas integracionistas. A ideia de normalização também impulsionou o que muitos autores chamam de princípio da normificação, em que as pessoas com deficiência eram encorajadas a se passarem por “normais” assumindo a responsabilidade por sua condição de “anormalidade” (MENDES, 2006). No Brasil, foram quase 30 anos de uma política educacional regida pelo princípio da integração escolar. O movimento atual de inclusão só se deu na década de 1990, sobretudo a partir da Declaração de Salamanca (1994), que redirecionou o foco de atenção, que antes recaía sobre a pessoa com deficiência, para o ambiente social (DINIZ, 2009). Com isso, percebe-se uma mudança na concepção de deficiência, e a escola, antes marcada pelo determinismo característico do pensamento científico moderno (MANTOAN, 2003), busca ser capaz de valorizar e respeitar efetivamente a diversidade (MAGALHÂES, 2017). Assim sendo, nesta pesquisa entendemos inclusão como um ato de escuta sensível e afetuosa às diferenças visando o protagonismo da pessoa com deficiência, que para acontecer precisa, entre tantos outros elementos, da empatia, sensibilização e conscientização de toda a comunidade escolar. Nessa perspectiva, “inserir o aluno na sala” (CELINA), não é inclusão. Ter um auxiliar de sala para acompanhar o aluno com deficiência (MILITANA), por si só, também não garante a inclusão. Essas falas revelam, na verdade, a fragilidade do jovem movimento inclusivo, e a presença ainda marcante no cenário educacional de práticas integracionistas voltadas, como vimos, à normalização das pessoas com deficiência. 80 De acordo com a literatura, as práticas integracionistas vêm sendo pouco a pouco superadas, tanto do ponto de vista teórico quanto legal (MENDES, 2006). As inúmeras publicações relacionadas à temática, e as políticas nacionais voltadas às pessoas com deficiência que foram publicadas a partir da década de 1990, nos revelam isso. A exemplo da Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, que diz: A Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva tem como objetivo assegurar a inclusão escolar de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, orientando os sistemas de ensino para garantir: acesso ao ensino regular, com participação, aprendizagem e continuidade nos níveis mais elevados do ensino; transversalidade da modalidade de educação especial desde a educação infantil até a educação superior; oferta do atendimento educacional especializado; formação de professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da educação para inclusão; participação da família e da comunidade; acessibilidade arquitetônica, nos transportes, nos mobiliários, na comunicação e informações; e articulação inter-setorial na implementação das políticas públicas (BRASIL, 2008, p. 15). Contudo, o processo da inclusão não depende apenas da literatura, das leis e/ou dos decretos para acontecer. Como assevera Mantoan (2003, p. 32), a isso, também se coloca, a necessidade de “modernização e reestruturação das condições atuais da maioria de nossas escolas” para dar possibilidades aos profissionais da educação de melhor atender as pessoas com deficiência, visto ser nas instituições educativas que a inclusão escolar de fato acontece. Inclusão esta que precisa “reunir os alunos em geral (independentemente de sua condição étnica, social, física, sensorial, intelectual) e fazer com que aprendam juntos e tenham sucesso em sua aprendizagem” (SILVA, 2014, p.40), sentindo-se acolhidos em suas especificidades. Outro ponto importante nas falas das participantes da pesquisa, diz respeito ao auxiliar de sala para a inclusão. Conforme está estabelecido no inciso XIII do Art.3º da Lei nº 13.146/2015, o auxiliar de sala é um profissional de apoio escolar, pessoa que exerce atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com deficiência e atua em todas as atividades escolares nas quais se fizer necessária, em todos os níveis e modalidades de ensino, em instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecida (BRASIL, 2015). Com base nisso, considera-se que ao auxiliar de sala, cabe complementar o trabalho do professor responsável pela turma em todas etapas e modalidades de ensino da rede pública ou particular. De acordo com Camilo (2013), ele deve “acompanhar diariamente o aluno com 81 deficiência, contribuindo na compreensão de suas características e eliminando barreiras que o impedem de se inserir na vida escolar”. A autora ainda acrescenta que, cada governo decide qual o perfil desse profissional, podendo ser um professor auxiliar, um especialista em inclusão, um estagiário de Pedagogia ou Psicologia, ou alguém da área de Saúde. No Rio Grande do Norte, especificamente, a Resolução nº 03/2016-CEB/CEE/RN, 23 de novembro de 2016, que “Fixa normas para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade de Educação Especial”, regendo as resoluções municipais, corrobora essa perspectiva e acrescenta o nível de formação, que deverá ter: Parágrafo único – Os profissionais de apoio que cuidam da higiene – alimentação e locomoção dos alunos com NEE – deverão ter certificados de nível médio e serem orientados pela equipe pedagógica da escola, do professor da SRM ou de itinerância (BRASIL, 2016, Art. 26). Contudo, de acordo com a lei, não há exigências técnicas referentes à formação desse profissional, o que muitas vezes o leva a atuar no campo do cuidar e/ou do improviso. Existem ainda relatos de deslocamento da total responsabilidade pela inclusão dos alunos com deficiência para esse profissional (CAMILO, 2013). Por sua vez, o Plano Municipal de Parnamirim/RN (2015), assevera que, visando universalizar e atender com qualidadea população de 4 (quatro) anos a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais e funcionais do desenvolvimento, altas habilidades/superdotação, bem como alicerçar o trabalho pedagógico de forma democrática e acolhedora, oportunizando a superação das diferenças, não permitindo mecanismos de seleção e discriminação, constitui-se uma meta do a ser realizada no decênio 2015-2025: Proporcionar a ação dos profissionais efetivos de apoio ou auxiliares, com formação adequada para acompanhamento nas salas de aula regular e em sala de recursos multifuncional, quando necessário dos alunos com deficiência, transtornos globais e funcionais do desenvolvimento, altas habilidades/ superdotação como garantia da qualidade e permanência destes no sistema educacional de ensino, através da reelaboração da legislação, ampliando o público alvo para acompanhamento desses profissionais de apoio. Como também os, tradutores e intérpretes de Libras, guias-intérpretes para surdocegos, professores de Libras, prioritariamente surdos, e professores bilíngues (PME, 2015, p. 49). A saber, na rede municipal de Parnamirim/RN, os auxiliares de sala são, geralmente, estudantes do curso de Pedagogia que ingressam nas escolas públicas por um determinado período para fazer um estágio com remuneração, e assumem a função de profissional de apoio escolar. Não haveremos de nos aprofundar na questão, mas cabe considerar que as entrevistas 82 revelaram indagações e frustações das professoras de sala em relação a esses profissionais. Isso quando podem contar com um auxiliar no município, pois, em alguns casos, o professor trabalha sozinho na sala de aula com o aluno com deficiência, como nos relata a professora Militana. Assim sendo, a depender de sua necessidade educacional, o estudante com deficiência de fato precisa do apoio de um profissional de apoio escolar. A lei garante isso! No entanto, a responsabilidade pela inclusão escolar desse sujeito não é apenas do auxiliar de sala, mas dos órgãos públicos e de toda a comunidade escolar, que devem estar articuladas para o trato da diversidade do alunado presente nas escolas. Outro ponto a destacarmos nessa categoria diz respeito à sobrecarga de trabalho do professor, elemento que aparece sutilmente na fala de Militana, mas que observamos fazer parte da realidade de todos os sujeitos desta pesquisa. As cinco profissionais entrevistadas exercem jornada dupla de trabalho, algumas moram em outros municípios, vivem diariamente a questão do deslocamento de um trabalho para outro, e ainda possuem obrigações com suas famílias. De acordo com Gouvêa (2016, p. 209), as condições de sobrecarga de trabalho para os professores são associadas a dois elementos principais: a) os trabalhos escolares semanais realizados no domicílio pelo professor devido à insuficiência da carga horária contratada; b) a dedicação do professor a trabalhos extras, como forma de aumentar a renda. Ainda segundo o autor, cumulativamente, esses elementos associados à falta de tempo livre para outras atividades e para o lazer levam o professor a situações de estresse, e provocam uma “diminuição da qualidade do ensino e no grau de proficiência ou aprendizado dos alunos” (GOUVÊA, 2016, p. 209), o que por consequência torna o processo inclusivo ainda mais ineficiente, que aqui compreendemos como um direito incondicional de todos. Não estamos afirmando que seja essa a situação das professoras entrevistadas, nem tentando justificar nenhum dessabor ou ausência de práticas inclusivas. Nossa intenção foi dar notoriedade a um problema que foi abordado de forma sutil nas falas das professoras e que é cada vez mais comum entre os profissionais da educação (GOUVÊA, 2016), pois consideramos que ser sensível às necessidades do professor, muitas vezes escondidas nas entrelinhas, é também uma maneira de tornar a escola não excludente. No que diz respeito especificamente à questão da inclusão escolar da criança com TEA na escola regular, as professoras voltam a relacionar suas dificuldades à falta de 83 formação específica para trabalharem numa perspectiva inclusiva, o que, segundo Dias (2016), só revela a precariedade do sistema educacional para processar a inclusão dos alunos com “Perturbação do Espectro do Autismo” no ensino regular. Para a autora, a maioria dos professores aceita o paradigma da inclusão. No entanto, só alguns conseguem promover a aprendizagem desses alunos na sala de aula utilizando práticas e estratégias inclusivas diversificadas e adequadas, sendo observada a falta de conhecimentos essenciais e experiência pedagógica para intervir adequadamente devido à complexidade dessa problemática, recorrendo permanentemente ao apoio do professor de educação especial. Dias (2016) também considera que ao trabalho dos professores ainda se coloca o receio que sentem perante o comportamento dos alunos, falta de tempo para gerir o grupo, turmas com um número elevado de alunos, gestão de horários para articulação, falta de recursos humanos e materiais, e ainda a necessidade de formação contínua e especializada. Vejamos os excertos que seguem e cuja transcrição respeita a fluência do discurso tal qual expresso oralmente. Pergunta: Durante a carreira você recebeu alguma formação voltada para a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva? Então! Na graduação a gente paga, né? Paga uma disciplina a respeito disso, mas é muito superficial. E agora na pós foi que eu pude aprofundar um pouquinho, mas realmente foi um pouquinho porque foi uma busca mais pessoal e não foi uma coisa que me ofertaram, na carreira como você me perguntou (AUTA). Nunca! Nunca! Nunca! Nunca! Nem na graduação nem pelo município. No curso só a disciplina de Educação Especial que a gente paga, né? Mas, assim na rede pública nunca teve. Assim, eu já fui uma vez para uma palestra sobre autismo lá no NEI... Era um homem... Eu não lembro! Muito boa a palestra, mas era mais voltada para a questão dos pais, sabe? Jeferson, eu acho. Mas, foi legal (CELINA). Recebi! Pelo estado. Não pela prefeitura de Parnamirim, mas o estado já ofereceu, sim. Foi um curso pra gente na área de TDH, específico para TDH. Mas, assim, um curso específico para autismo, não! Para Síndrome de Down, não! Certo? Até agora eu só tive esse (CLARA). Só quando a pessoa faz a pós, né? A pós-graduação. Mas, era tipo uma pesquisa bibliográfica... Pra o professor trazer mesmo ficava muito naquela questão de fundamentos, né? A teoria. Então assim, uma aplicação é difícil. É tanto que na nossa Semana Pedagógica uma vez eles fizeram um questionário perguntando o que você gostaria que a gente discutisse nos próximos anos e ai eu falei justamente sobre a Educação Especial porque é algo muito forte no município... Assim, né? Uma carência muito grande que a gente percebe. Porque exige da gente e a gente não tem como dar conta. 84 No município nunca recebi formação sobre isso. No município não (MILITANA). Tive apenas uma pincelada no curso de aperfeiçoamento. Muito superficial, mas na graduação não (NÍSIA). As falas apresentam dois espaços formais de desenvolvimento profissional dos professores: o da formação inicial e o da formação continuada, cujos significados investigamos a fim de situarmos nossas discussões. De acordo com a Enciclopédia de Pedagogia Universitária (2006, p. 353), por formação inicial, “entendem-se os processos institucionais de formação para uma profissão”, que, atualmente, segundo a legislação brasileira (BRASIL, 2015), dar-se nos cursos de graduação de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados não licenciados e cursos de segunda licenciatura. Esses cursos são os responsáveis pela formação inicial de professores para atuação na Educação Básica e devem corresponder ao que a legislação propõe em relaçãoaos seus objetivos, formatos e duração (CUNHA, 2013). Já a formação continuada, segundo esse mesmo glossário, diz respeito às [...] iniciativas de formação realizadas no período que acompanha o tempo profissional dos sujeitos. Apresenta formato e duração diferenciados, assumindo a perspectiva da formação como processo. Tanto pode ter origem na iniciativa dos interessados como pode inserir-se em programas institucionais. Neste último, os sistemas de ensino, universidades e escolas são as principais agências de tais tipos de formação (Enciclopédia de Pedagogia Universitária, 2006, p. 254). Assim sendo, a formação inicial e a formação continuada destinam-se, respectivamente, à preparação e ao desenvolvimento de profissionais para funções de magistério na Educação Básica em todas as suas etapas e modalidades. Nessa configuração, considera-se que os princípios para a formação inicial e continuada são: sólida formação teórica e interdisciplinar; b) unidade teoria-prática; c) trabalho coletivo e interdisciplinar; d) compromisso social e valorização do profissional da educação; e) gestão democrática; f) avaliação e regulação dos cursos de formação (BRASIL, 2015). No que diz respeito especificamente à formação do professor para atuar na perspectiva da educação inclusiva, encontramos na legislação brasileira, documentos oficiais que em suas proposições e orientações gerais tratam da necessidade de se investir em conhecimentos sobre a inclusão nos programas de formação, a exemplo da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa 85 com Deficiência (BRASIL, 2015) e da atual Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008). A Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) orienta os sistemas de ensino para promover respostas às necessidades educacionais dos alunos e define que todas as crianças e jovens com deficiência devem estudar na escola regular. Um ponto que consideramos interessante nesse, diz respeito ao fato de o descritor “formação docente” aparecer três vezes em seu texto, algo que consideramos significativo dentro do debate sobre formação de professores, visto que, até então, não tínhamos percebido a utilização do termo em nenhum outro dispositivo legal brasileiro. Um pouco mais adiante, temos o Estatuto da Pessoa com deficiência, também conhecido como Lei Brasileira de Inclusão (LBI), Lei nº 13.146/15 (BRASIL, 2015), considerada uma das leis mais completas sobre acessibilidade no Brasil. No que diz respeito à formação de professores para atuar numa perspectiva inclusiva, o Capítulo IV, que trata do direito à educação, diz que: Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar: adoção de práticas pedagógicas inclusivas pelos programas de formação inicial e continuada de professores e oferta de formação continuada para o atendimento educacional especializado (BRASIL, 2015, Art. 28). Desse modo, a LBI consagra ao Estado a responsabilidade de viabilização de práticas pedagógicas inclusivas em todos os programas de formação inicial e continuada de professores, visando zelar pela aprendizagem de todos os alunos, sem distinção. No entanto, a literatura nos revela que os marcos normativos, embora imprescindíveis, por si só não garantem essa promoção (PLETSCH, 2009), e que expressivas são as lacunas nos cursos de formação de professores para a eficaz inclusão de alunos com deficiência na rede regular de ensino (FAVORETTO; LAMÔNICA, 2014; PEIXOTO, 2019; DIAS, 2016). Reportando-nos às falas das professoras entrevistadas, fica fácil identificarmos esses hiatos, principalmente quando alegaram não receber formação na perspectiva da educação inclusiva na graduação (CELINA; MILITANA; NÍSIA), ou ainda receber, porém de forma isolada, em uma única disciplina (AUTA, CLARA), o que retrata a ausência de uma abordagem interdisciplinar no currículo das instituições formativas. Outro vácuo na formação dos professores aparece na fala de Militana, quando ela diz: “Só quando a pessoa faz a pós, né? A pós-graduação. Mas, era tipo uma pesquisa 86 bibliográfica... Pra o professor trazer mesmo ficava muito naquela questão de fundamentos, né? A teoria. Então assim, uma aplicação é difícil”. Nesse segmento, parece-nos que em sua formação houve uma teorização desconectada da prática e do cotidiano dos docentes e alunos, algo que há muito já vem sendo criticado e repensado no campo da educação, mas que persiste de forma significativa boicotando, por consequência, a dinâmica da inclusão. Sabemos que, considerando a diversidade presente nas escolas, não há como a formação inicial atender todas as particularidades do ensino que são diariamente vivenciadas, mas, se elas existem, merecem ser conhecidas e observadas a fim de que a formação do professor esteja conectada com a realidade. Ainda considerando que o espaço pertinente da formação contínua, não é o professor isolado, mas apensado num corpo profissional e numa estrutura escolar (NÓVOA, 2009), destacamos nas falas das professoras, o que denominaremos de “solidão laboral”, referindo- nos à falta que as docentes sentem de incentivo da Secretaria de Educação do Município de Parnamirim para trabalharem a proposição inclusiva da educação. Pelo que compreendemos, iniciativas da rede municipal existem, e algumas professoras já tiveram a oportunidade de participar de eventos relacionados à temática da inclusão. Entretanto, com relatos de se tratarem de ações pontuais, sem caráter interdisciplinar que não acontecem na mesma proporção de matrículas de crianças com deficiência no município. No que diz respeito à formação de professores para atuarem na perspectiva da educação inclusiva, o PME (2015, p. 36) de Parnamirim diz que, sob a Gerência de Desenvolvimento da Educação Especial da SEMEC, tem colocado em prática desde o ano de 2015 o Projeto Agir, cujo objetivo é tratar de temas sobre a Inclusão de alunos com deficiências e necessidades educativas especiais, assim como discutir estratégias para práticas pedagógicas efetivas contemplando as deficiências, síndromes e transtornos específicos de cada escola visitada. Essa ação, como denomina o documento, estaria dentro das estratégias traçadas por Parnamirim/RN para o cumprimento de suas metas municipais de educação que visam à inclusão de todas as pessoas, independe de suas limitações. No entanto, as professoras entrevistadas, ainda relataram desconhecer essas ações. Além disso, pudemos observar que o PPP (2018) da escola também não contempla a questão da formação dos professores para inclusão. 87 Sobre a formação continuada ser uma busca pessoal, como relatam as participantes da pesquisa, consideramos tratar-se de um ponto positivo, visto refletir um posicionamento autônomo e de autogestão do professor. Contudo, isso não anula a responsabilidade das instituições educativas e do Estado pelo fomento de práticas educacionais inclusivas e a produção contínua de conhecimentos na área de educação, tal como já previsto no Artigo 26 da Resolução nº 03/2016-CEB/CEE/RN, 23 de novembro de 2016: Art. 26. Aos educadores da rede pública de ensino, pertencentes ao sistema estadual, deverão ser oferecidas oportunidades de formação continuada, pelas instâncias educacionais do Estado e dos Municípios, de modo a possibilitar a competência técnica necessária às suas funções, para atender às demandas de aprendizagem na educação especial. (BRASIL, 2016) Assim sendo, consideramos que a capacitação dos professores da sala de aula regular para o trabalho com as pessoas com deficiência, é um assunto de extrema significância, e como tal merece maior atenção em todas as instancias da Educação, inclusive nas escolas, local onde nascem as necessidades e se germinam as sementes do fazerdocente. 5.2 CORPO E AUTISMO Os resultados aqui apresentados e sua discussão, referem-se às questões 3, 4 e 7 do guia da entrevista, cuja análise inseriu-se na categoria temática “Corpo e autismo”. Da análise dos dados emergiram quatro subcategorias que se traduziram em: concepção de autismo, características do TEA, desafios e possibilidades da prática docente para trabalhar com crianças autistas e concepção de corpo no Transtorno do Espectro Autista. Para começo de conversa, vejamos como as professoras participantes da pesquisa concebem o Transtorno do Espectro Autista: Quadro 7 – Respostas das professoras quanto à concepção de autismo PARTICIPANTE CONCEPÇÃO DE AUTISMO AUTA Pra mim é um transtorno que afeta a comunicação e a interação da criança, da pessoa dentro do espectro, né? [...] um transtorno que afeta a questão da comunicação e da interação da criança com os outros, e que isso tem vários níveis, outros desmembramentos. 88 CELINA Autismo é quando a criança tá tipo no mundo dela. Parece que ela tá sozinha no ambiente, sabe? Acho que é isso! CLARA Autismo é o que tá posto, né? É um transtorno, né, e que traz... É um transtorno, mas, que não é algo que pode ser diagnosticado para todas as crianças da mesma forma. Cada uma tem seu grau, sua característica. MILITANA Autista, eu até já tinha comentado com você, né? É... a gente teve uma orientação... Pronto! A gente teve uma orientação uma vez da coordenadora, que ela fez uma pesquisa e na sala era um pouco difícil porque as crianças não entendiam o comportamento de... Pode falar o nome da criança? (Sim) De Ângelo Artur... “Tia, por que ele não obedece os combinados, né?”. Aí tinha essa informação que ela fez todo colorido, né? E eu passei a explicar para eles na rodinha que Ângelo Artur era uma criança especial! A gente colocou assim especial! Especial por que, né? Porque ele, por exemplo: não vai sentar como vocês; ele tem uma agitação; talvez eu vou ter que trazer alguns brinquedos pra sala que é pra Ângelo Artur; algumas crianças vão brincar com ele, né? Coisas assim, né? E assim, Ângelo Artur eu acredito assim que era um grau leve. NÍSIA Autismo é uma individualidade do sujeito. Um jeito de ser. [...] Eu pude ver isso nos alunos que tive e são autistas. Fonte: Entrevista aplicada pela pesquisadora (2020). Essa primeira subcategoria “concepção de autismo”, revela-nos que o Transtorno do Espectro Autista ainda é pouco conhecido das docentes, embora sua presença na escola venha crescendo progressivamente em consonância com o paradigma da inclusão (AZEVEDO, 2017). Das cinco professoras entrevistadas, apenas duas se referiram ao TEA como um transtorno, enquanto as demais foram menos precisas na tentativa de fazer tal definição, mesmo tendo uma criança com TEA em sua sala de aula. Segundo Favoretto e Lamônica (2014), essa é uma dificuldade do professor que possivelmente está associada à falta de formação específica para o trato da dimensão inclusiva, podendo ainda ser decorrente da ausência de uma prática reflexiva permanente que nutra o fazer docente. Nessa perspectiva, houve também dificuldade das professoras ao descrever as características da criança com TEA, mas, em virtude da convivência com esse alunado, elas já conseguem identificar alguns traços autísticos, conforme podemos observar no quadro que segue: 89 Quadro 8 – Respostas das professoras quanto às características do TEA PARTICIPANTES CARACTERÍSTICAS CITADAS AUTA Afeta a questão da comunicação e da interação da criança com os outros, e que isso tem vários níveis, outros desmembramentos. [...] é, outras comorbidades, né? Às vezes, tem autismo e hiperatividade. Às vezes, tem autismo, enfim, é isso CELINA Ecolalia, mexe as mãos assim [ela agita as mãos e me pergunta o que é e respondo que se trata das estereotipias], estereotipias, não gosta muito de abraços, não olha nos olhos. Se bem que Samuel, ele deixa abraçar. Mas, ele não olha nos olhos. CLARA Já tive quatro alunos autistas totalmente diferentes um do outro. De similar, eu acho que eles têm a questão da desatenção. Eu percebi em todos, do mais calmo ao mais agitado, tem a desatenção. [...] Eles não são totalmente atenciosos, concentrados, né? Que eu percebo em cada um deles... Aí vem aquelas outras, que um tinha tic, aqueles tics, né? Outro não tinha. Um era agressivo, o outro era bastante calmo, entendeu? Então, assim, já tive um autista alfabetizado, que ia além das outras crianças da turma. Muito inteligente e fez sozinho esse processo... [...] também recebi um no segundo ano totalmente agressivo, sem falar, a linguagem não era desenvolvida, era só sons, tics, né? MILITANA É porque assim, o conhecimento que eu tinha, a minha vivência já com autistas anteriormente (dois autistas, que eu soube, né?). Então, esses dois autistas, eles tinham atração por objetos, né? Óculos, por exemplo, quando eu sentava na rodinha que ficava na altura deles, eles viam... Objetos, né? [...] Eu acredito que o autismo, pelo que já observei, né, a criança ela tem dificuldades de atender os combinados, tem uma certa agitação, e isso às vezes é por dia também porque tinha dia que parecia que aquela criança não tava nem na sala, né? Que ele não tava envolvido. Claro, isso já uma rotina que ela tinha, digamos assim: absorvido, aquela rotina. Então, é isso! Tinha dias que vinha mais agitado. NÍSIA Quem é autista tem interesse e gostos específicos. Fonte: Entrevista aplicada pela pesquisadora (2020). De acordo com as professoras entrevistadas, são características das pessoas com TEA: problemas na comunicação e na interação; ecolalia (distúrbio de linguagem, definida como a repetição da fala do outro); estereotipias; não olha nos olhos; agitação; desatenção; “tic’s”; agressividade; inteligência acima da média; linguagem não desenvolvida; atração por objetos; dificuldades de atender combinados; interesses e gostos específicos. As características citadas, que na transcrição das falas grifamos a fim facilitar a localização pelo leitor, não dão conta da dimensão e complexidade do espectro autista, mas de fato podem ser observadas dentro do transtorno, que se caracteriza por dificuldades de interação e comunicação que podem vir associadas a alterações sensoriais, comportamentos estereotipados e/ou interesses restritos (APA, 2014). Outro ponto importante a destacar é que, os trechos de onde extraímos essas informações foram ajuntados conforme a nossa percepção das questões 3, 4, e 7. Ou seja, as 90 características citadas pelas professoras estavam em meio ao todo, ao fluir dos dizeres, revelando uma dificuldade das docentes para descrever as características do TEA de forma direta, algo que pudemos perceber claramente durante as entrevistas de onde foram levantadas essas informações. Dessa forma, apropriando-nos das contribuições de Favoretto e Lamônica (2014, p. 113): “infere-se que os professores responderam ocasionalmente para não afirmarem uma resposta e que muitos se basearam em conhecimento prático e popular ao invés de conhecimento científico”. Com exceção da professora Nísia, que demonstrou maior segurança e conhecimento para falar sobre a concepção e as características do TEA, algo que possivelmente avém de sua busca pessoal como relata em sua entrevista. Já a terceira subcategoria, “desafios e possibilidades da prática docente para trabalhar com crianças autistas”, refere-se ao fazer do professor; as experiências vivenciadas no chão da escola para promover a inclusão escolar de alunos com TEA. Vejamos: 91 Quadro 9 – Desafios e possibilidades da prática docente para trabalhar com crianças autistas PARTICIPANTES DESAFIOS E POSSIBILIDADES AUTA O desafio de trabalhar com uma criança com TEA é como o desafio de trabalhar com qualquer outra criança com deficiência. [...] É precisoconhecer essa criança, conhecer a sua história, conhecer as suas potencialidades individuais e as suas dificuldades. Não só elas, mas como todas as crianças da sala de aula, né? A gente precisa ter esse olhar porque todos são diferentes. É... Mas, falando especificamente da criança com autismo, é, dependendo do nível dela, eu acho que esse desafio vai mudando. Dependendo do nível do transtorno, né? É a gente viu. A gente tem aqui muitas experiências de crianças dentro do transtorno, dentro do espectro que são muito diferentes, né? Então, eu penso assim: que os desafios eles vão sempre de acordo com o nível dessa criança, de quem é essa criança. E aí esses desafios eles vão sendo maiores ou menores. Desafio no convívio com os outros... E como eu disse anteriormente, eu acho que o principal desafio é a pesquisa. É você ir atrás pra ver o que eu posso fazer, que metodologias eu posso usar, que materiais eu posso usar pra ajudar a minha criança a desenvolver-se, a superar as dificuldades dela. Que novamente eu digo: não é só para as crianças com transtorno, né? A gente tem criança que não tem transtorno, mas que eu preciso estar pesquisando e revendo minha prática. Especificamente com o meu aluno, que foi muito rápido também a experiência que eu tive com ele, pois era muito ausente, mas não foi um desafio muito grande a questão da inclusão. CELINA É um grande desafio. Os desafios seriam a falta de um auxiliar, materialzinho melhor, gizão para eles que não têm muita coordenação. Eu acho muito interessante também aquelas tesourinhas para trabalhar a motricidade. Tem uns conta-gotas também que a gente não tem acesso. A não ser que a gente compre, né? Eu até já pensei em comprar, mas é caro porque é importado. Eu fico doida quando vejo os brinquedos assim pra eles... CLARA Eu acho assim, o desafio vem acompanhado com a família, que nem sempre tá preparada, e assim, às vezes a gente não tem muita dificuldade com a criança em si, mas com o que a família quer que aconteça, né? Então, eu acho assim, que a possibilidade é você perceber o que aquela criança necessita e em cima daquilo você fazer o seu melhor para que ela desenvolva e não para atender o desejo de uma mãe, né? [...] Então, é isso. Assim, além dos desafios com a própria criança que a gente vai ter que conhecer e buscar onde ela tá, tem a questão da família que às vezes atrapalha, deixa tensa, assim... [...] Lhe deixa às vezes nunca situação de: será que eu não tô conseguindo, né? Com a criança, a maior dificuldade é ter noção. Então, eu acho assim, eu acho desafiante você tá procurando também informações... É diferente de pegar uma turma que não tenha e você faz ali, lógico, sempre procurando saber onde a criança está, o que que ela precisa, mas a questão de você com autista, nem sempre o que você faz o que a turma no geral alcança, ele não alcança, né? Então, eu acho isso um desafio também. [...] tem a possibilidade, sim, de fazer que ocorra algum avanço, mas que é uma possibilidade e um desafio também. Não sei se fui clara ou se falei, falei e não disse nada [risos]. MILITANA Essa questão que eu falei de início sobre a pesquisa, né? Já que a gente não tem essa formação, então a gente tem que pesquisar pra que a gente possa ajudar essa criança a se desenvolver... Teve um ano que a coordenadora, Fábia, e a da manhã também elas chamavam pessoas, 92 PARTICIPANTES DESAFIOS E POSSIBILIDADES digamos assim psicólogos, alguém que tivesse um conhecimento de saúde, pra fazer palestras pros pais... Isso é uma possibilidade! NÍSIA É muito difícil trabalhar com crianças autistas, principalmente por causa da comunicação e das necessidades deles. Preparar atividades específicas também é muito difícil. As possibilidades são as regras, a construção de combinados, imagens/gestos, a linguagem e a comunicação. Tem que falar com a criança. Descobrir a criança. A agressividade também é um desafio. Dar comandos. Fonte: Entrevista aplicada pela pesquisadora (2020). De acordo com as professoras entrevistadas, os principais desafios à prática docente para a inclusão de alunos com TEA na escola regular, são: conhecer a criança, sua história, potencialidades e as suas dificuldades; a necessidade de pesquisa contínua; baixa frequência escolar dos alunos com autismo; falta de um auxiliar de sala; poucos recursos materiais; lidar com a família da criança; busca por informações; comunicação; a agressividade de alguns alunos; dar comandos; desenvolvimento de atividades específicas. E, dentre os mais difíceis, segundo as professoras estão: a pesquisa contínua, a comunicação e a falta de conhecimento sobre o aluno. Ao afunilarmos os principais desafios, os três elementos que se destacam apontam para a carência que as professoras sentem de formação e informação acerca do TEA. Certamente, o leitor haverá de concordar que estamos nos repetindo nessa constatação. Porém, o fato de termos conseguido apreender as principais necessidades formativas desse grupo de professoras, se coloca como um elemento novo as nossas reflexões. Ao exporem suas dificuldades nessa conversação, as docentes dão pistas de onde mais precisam de ajuda, e os elementos destacados nesse contexto poderiam funcionar como princípios de uma formação continuada pela escola, inclusive com o respaldo da pesquisa- ação que prevê o empreendimento de ações interventivas, a partir das necessidades que emergem do coletivo (THIOLLENT, 2009), ou do Grupo Focal, que “permite fazer emergir uma multiplicidade de pontos de vista e processos emocionais, pelo próprio contexto de interação criado, permitindo a captação de significados que, com outros meios, poderiam ser difíceis de se manifestar” (GATTI, 2005, p. 5). Cabe aqui destacar que, no Brasil existem orientações específicas voltadas para professores de alunos com TEA, conforme descrito na Nota Técnica nº 24/2013/MEC/SECADI/DPEE. Esse documento orienta os sistemas regulares de ensino 93 quanto à implementação da Lei nº 12.764/2012 e enfatiza a necessidade se investir na formação dos professores para o trato da dimensão inclusiva no seu fazer pedagógico. Outra dificuldade que merece destaque, dada a importância do trabalho conjunto para a dinâmica da inclusão, diz respeito à questão da família da pessoa com TEA. De acordo com a professora Clara, “às vezes a gente não tem muita dificuldade com a criança em si, mas com o que a família quer que aconteça”. E, complementando, afirma que, “além dos desafios com a própria criança que a gente vai ter que conhecer e buscar onde ela tá, tem a questão da família que às vezes atrapalha, deixa tensa, assim... [...] Lhe deixa às vezes nunca situação de: será que eu não tô conseguindo, né?”. Ou seja, quando a família e a escola não são concordantes, a inclusão escolar da criança com TEA torna-se um processo extremamente difícil e cansativo para o professor, que assim como a professora Clara pode vir a se sentir sozinho em seu trabalho pedagógico. Deste modo, acolher a família da criança com TEA no espaço educativo formal constitui-se uma necessidade a vivência da inclusão e a valorização à diversidade, e pressupões que os professores não devem trabalhar sozinhos, mas em equipes que incluam também as famílias (PANIAGUA, 2004). Voltando às questões da entrevista, no que diz respeito às possibilidades, chama-nos a atenção a fala da professora Clara que as considera também um desafio para a prática docente. De acordo com Clara, não é fácil “perceber o que a criança necessita e em cima daquilo você fazer o seu melhor”. É algo desafiante, que demanda entrega, busca por informações e parceria com a família. Ou seja, a inclusão do aluno com TEA é um processo desafiador e angustiante para o professor, mesmo existindo possiblidades de aprendizado e formação. Ainda como possibilidades para o trato com o aluno comTEA, as professoras citaram: o estabelecimento de regras, construção de combinados utilizando imagens e gestos, incentivo ao desenvolvimento da linguagem e comunicação, oferecimento de palestras e/ou capacitações específicas que entendemos estarem dentro da perspectiva da formação continuada. Estratégias exequíveis que podem ajudar o professor a contribuir com a inclusão escolar do aprendente com TEA. A quarta subcategoria, “Concepção de corpo no Transtorno do Espectro Autista” diz respeito à questão 7 da entrevista realizada, e levanta reflexões a partir do modo como o corpo dessas crianças tem sido olhado pelas professoras investigadas. De acordo com Nísia, Celina, Clara e Auta, respectivamente: 94 A criança com TEA tem o corpo igual ao das outras crianças, mas possuem um tônus muscular mais rígido. Por exemplo, meu aluno Kadu, tinha pouca autonomia quando chegou na escola e aos poucos foi ganhando autonomia para comer, brincar, subir e descer do parque, comer, lavar as mãos. Elas devem ter suas habilidades instigadas (NÍSIA). Ela tem o corpo parecido com o de outras crianças. São diferentes nos movimentos que os autistas costumam fazer. Acho que só. Não há outra coisa que eu diga assim: não, é diferente! Acho que é só isso mesmo que diferencia o corpo da criança (CELINA). Bom, eu vejo perfeitamente. Meus autistas são todos perfeitos; fisicamente. Lindos! Agora, assim, a questão do movimento que eu vejo assim do corpo, é... Como que eu posso lhe dizer? Comprometido! Alguns, não são todos. Não sei se é isso! Comprometidos em realizar movimentos, sabe? É... Como que eu posso dizer, meu Deus? [pausa] Não sei (CLARA). Eu permaneço com essa mesma visão. Que eu penso que é um corpo que tem os cuidados físicos e biológicos, que também precisa ser respeitado, e a diferença é eu acredito que precisa haver uma sensibilidade maior, uma atenção maior não só com o professor, mas de todos que fazem parte da equipe, né? Que compõem a escola, a comunidade escolar quanto a essa criança, porque esse corpo que possui esse transtorno, ele vai ter necessidades diferentes, ou maiores ou iguais. Vai depender muito de que é essa criança, do nível do seu transtorno, enfim... Você está entendendo o que eu estou querendo dizer! E a experiência que a gente tem aqui na escola, não só com meu aluno do ano passado, com a criança que estava na minha turma, mas há crianças que usam, se locomovem, brincam muito naturalmente como todas as outras brincam. E há crianças que há uma intensidade maior desse corpo... Há uma intensidade maior, né? De se jogar no chão, de precisar andar, de precisar sair da sala, de precisar correr, enfim... Então, o corpo da criança com o transtorno tem a ver com o nível dela e como todo corpo deve ser respeitado considerando suas necessidades e suas especificidades (AUTA). As professoras concordam, mesmo tendo respondido às questões de pesquisa individualmente, que as crianças com TEA “possuem um corpo igual” ao de seus pares neurotípicos, diferenciando-se apenas por conta de aspectos como: postura corporal e estereotipias típicas. Essa visão nivelada de corpo nos permite fazer duas significativas inferências. A primeira diz respeito à concepção ainda existente entre as educadoras, de um corpo predominantemente material, físico, que pode ser funcional ou não, e cujas individualidades são aplainadas pelo perpendículo da razão. Como vimos em capítulos anteriores, por anos, ideologias que supervalorizavam o físico dominaram a civilização ocidental, subvertendo o corpo a dimensão do palpável, do 95 organismo, produzindo dualidades e fragilizando a capacidade de elaborarmos nossas próprias noções sobre os distintos fenômenos que nos circundam. Então, autores como Merleau-Ponty (2006) afirmam que o homem precisa ser apreendido não apenas enquanto corpo material, mas principalmente enquanto um fenômeno corporal, ou seja, enquanto expressividade, palavra e linguagem. Implica dizer que o nosso corpo é o responsável pela tomada de decisões de tudo que nos rodeia. “O corpo é nosso meio geral de ter um mundo” (MERLEAU-PONTY, 2006, p. 203). Por sua vez, Freitas (2015, p.39) considera que A concepção de corpo como organicidade não está superada e persiste a preocupação de normalizá-lo, até na intenção de incluir (a um mundo organizado majoritariamente por e para “corpos” comuns), na intervenção localizada em funções e na desconsideração de uma totalidade que percebe, sente, desenvolve-se, interage no mundo e o conhece. Assim sendo, o corpo não é parte nem instrumento. Ele é meio. “Graças à mediação do corpo, nossas experiências são classificadas e organizadas, processo cujo início ocorre antes mesmo de sermos capazes de operar a linguagem” (FERREIRA, 2010, p. 54). Então, como nós, professores, estaríamos olhando e pensando o corpo das crianças com TEA, sabendo que, independentemente da origem de transtorno, ele também é gerado e convive em contextos socioculturais? Seriam de fato “diferentes só nos movimentos que costumam fazer”? (CELINA). Abrindo um parêntese, as perguntas lançadas ao leitor partem de nossas próprias inquietações enquanto professor investigador, que nesse ponto do texto embarca numa vertigem reflexiva. ... As falas das professoras Nísia, Celina, Clara e Auta também nos permitem reiterar que o “autismo não tem cara”, por tratar-se de transtorno neurológico, não físico (SCHMIDT et al., 2016). A frase, “autismo não tem cara”, que por sinal é slogan de uma campanha com grande veiculação nas redes sociais, alerta para a necessidade de olharmos a pessoa com TEA desapegados do preconceito, pois, independentemente do transtorno, eles devem ser vistos como sujeitos de direitos cuja identidade deve ser reconhecida e respeitada. Dando continuidade ao que pensam as docentes sobre o corpo no Transtorno do Espectro Autista, a professora Miltana diz: “O corpo da criança com TEA é bem mais agitado. A gente percebe que é bem mais agitado”. 96 A fala de Militana, intencionalmente apresentada sozinha, revela uma percepção de corpo fragmentado, que “permanece passivo, disciplinado e distante dos interesses de uma pedagogia predominantemente intelectualista” (GAYA, 2006, p. 251). A fragmentação corpo-mente é oposta à concepção de sujeito da percepção que percebe o mundo em seu movimentar-se, atuando, recriando e reconstruindo-o (MERLEAU- PONTY, 2006), e coloca o corpo na condição de elemento acessório no processo de aprendizagem, a ser contido, disciplinado, medicado. 5.3 RELAÇÃO CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TEA NA CONCEPÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL Os resultados aqui apresentados – e sua discussão, referem-se às questões 5, 6 e 8 do guia da entrevista, cuja análise nos permitiram conhecer a percepção de professores sobre a relação corpo e aprendizagem da criança com TEA no âmbito da Educação Infantil. Iniciamos nossas discussões trazendo para essa bancada o conceito de corpo segundo os sujeitos entrevistados: Corpo é movimento, sensações, dança, música. O corpo é isso (NÍSIA). Eu acho que corpo é a parte de forma integral do ser, né? Não existe um ser sem um corpo. Então, o corpo é movimento, corpo é... Eu não consigo enxergar um ser sem um corpo, né? Começando que a gente é um ser, né? Que somos compostos, somos seres humanos, as características físicas do que pode ser realizado com o corpo, e que corpo é movimento... Eu não sei explicar mais não [risos] (CLARA). Corpo não é algo estático, né? E assim, a parte motora diz muito sobre o ser humano... E assim, levando para o autista, a gente vê que ele tem assim: uma dificuldade em realizar, por exemplo, no parque, subir, descer. Então, pra mim o corpo é algo que se expressa de alguma forma. Não é algo estático! É através da música, né? Através da brincadeira, e por aí vai(MILITANA). Corpo é parte do ser humano. É uma das dimensões do ser humano. E tem suas limitações e tem suas potencialidades. E que precisa ser visto, principalmente na Educação Infantil. Ser visto, ser respeitado, ser entendido, ser ouvido... O corpo também é ouvido... (AUTA). Corpo... [pausa]... Tem umas coisas que você pensa que é fácil a resposta, mas... [pausa] Corpo... [pausa]. Difícil achar a resposta! Não tô conseguindo não achar uma resposta pra isso... Corpo são os membros, o tronco, a cabeça que utilizamos pra [pausa] comer, andar, correr, pular, escrever, abraçar (CELINA). 97 De modo geral, embora existam pontos destoantes e a registrada presença nos fragmentos de uma visão mais profunda de corpo, as professoras entrevistadas, o definem, predominantemente, como um elemento secundário no processo educativo; um somatório de órgãos ou conjunto de partes distintas entre si, que se encontram submissas aos aspectos cognitivos. A fala da professora Celina, especificamente, é a que nos mostra com maior clareza essa visão segmentada, quando considera: “Corpo são os membros, o tronco, a cabeça que utilizamos pra [pausa] comer, andar, correr, pular, escrever, abraçar”. Muito embora não possamos afirmar que as professoras entrevistadas estão a cindir suas práticas, nossos olhares sobre suas falas evidenciam fortemente uma dicotomização entre corpo e mente dentro do contexto da Educação Infantil daquela instituição de ensino, possivelmente resultante da falta de qualificação profissional para trabalhar com a diversidade do alunado presente nas escolas, considerando o corpo no ato de ensinar (SIQUEIRA, 2014; PEIXOTO, 2019). Outro motivo seria a concepção que os sujeitos da pesquisa tinham acerca de seus próprios corpos, pois seria no mínimo incoerente se esforçarem para conceituar o corpo da criança dentro de uma visão dualista, se isso estivesse desconectado das suas realidades, questão que nos instiga a pensar como nós professores somos e nos tornamos educados. Considerando as reflexões de Merleau-Ponty e dos biólogos Maturana e Varela, Nóbrega (2005, p. 610) alerta que “não se trata de incluir o corpo na educação. O corpo já está incluído na educação. Pensar o lugar do corpo na educação significa evidenciar o desafio de nos percebermos como seres corporais”, incluindo também o professor. Voltando às questões da entrevista, perguntamos às professoras participantes da pesquisa como elas viam a criança e seu corpo: É um corpo em desenvolvimento, que possui possibilidades infinitas para se desenvolver com autonomia (NÍSIA). Como eu disse, o corpo é uma dimensão... É afetividade, é cognitivo, e esse corpo precisa ser respeitado nas suas necessidades, né? Na Educação Infantil, a gente sabe que o cuidar é indissociável... A gente tem que cuidar desse corpo! Que eu acho que o cuidado que nós temos e o cuidar que acontece na Educação Infantil ele perpassa o corpo, né? É, nós cuidamos desse corpo, mas também cuidamos dessa mente, cuidamos dessa criança, desse ser. Vai além do físico. Além do biológico. É um corpo como um... É a criança, né? Em processo de aprendizagem, desenvolvimento... E quando em ser respeitada, é ser respeitada nos movimentos dele, movimentos da criança... É... e ela vai aprendendo o tempo das coisas também, né? O tempo 98 de parar, o tempo de se movimentar... Temos essa sensibilidade pras necessidades desse ser que é ser criança (AUTA). O corpo da criança está sempre em movimento. É complicado para eles ficarem parados na sala, mas tem alguns momentos que eles precisam parar. Na hora das atividades. Na hora das atividades de escrita, né? Mas, a gente pode trabalhar a motricidade fina, a motricidade ampla deles na brincadeira, na atividade, né? (CELINA). Eu acho que o corpo ele fala. Ele mostra, assim, ele fala por si só... Às vezes você observa uma criança, a forma como ela usa o corpo, como ela se movimenta, ela já passa alguma coisa pra você... Se tá tudo ok. Se precisa... (CLARA). Eu acho que nosso trabalho como a questão de conteúdo, a gente não pode ver essa criança dentro da sala totalmente estática. A gente sabe que isso é impossível! Eu lembro até assim de uma orientação que eu não tinha percebido, e isso foi até algo que eu aprendi na minha formação, que uma professora disse assim: É! A gente está em sala de aula e a gente diz: vamos ficar cinco minutinhos sentados ou numa certa posição. Estáticos! Mas, com as crianças a gente percebe que é diferente, esse tempo delas. E elas estão a todo tempo se movimentando. Mas, a gente tem que também ter uma ordem por que senão a gente não consegue fazer muita coisa (MILITANA). Referindo-se ao corpo da criança na Educação Infantil, as professoras Nísia e Auta, especificamente, se mostraram coerentes ao que haviam respondido na questão anterior, e trouxeram para a discussão a percepção de criança como sujeito aprendente que precisa vivenciar as dimensões do cuidar e do brincar em seu processo de aprendizado. Tal percepção é compatível com a concepção de criança presente no Projeto Político- Pedagógico da instituição investigada, que a concebe como “um ser social, crítico, histórico e cultural, com suas características e especificidades próprias”, que aprende “através das interações que estabelecem com as pessoas e com o meio que as circundam, material e social” (PPP, 2018, p. 10). Porém, revisitando a categoria anterior, especificamente a subcategoria: “Concepção de corpo no Transtorno do Espectro Autista”, chama-nos a atenção o fato de as professoras não repetirem tais concepções quando à discussão, acrescentamos o corpo da criança com TEA, ficando evidente uma mudança de postura delas, como se o corpo dessa criança fosse essencialmente matéria ou corpo físico a se movimentar no vazio. Com isso, nos perguntamos: Por que os conceitos de criança e infância não comportariam as crianças com TEA? Seria o indício de que o olhar endereçado às pessoas TEA tem intensificado as diferenças até na intenção de incluir? Assim sendo, consideramos que a compreensão do corpo na Educação Infantil demanda uma atenção do professor aos significados que atribui à concepção de criança, 99 infância e à complexidade dos processos corporais. Segundo Gonçalves (2012, p. 55), “ao deixarmos o movimento corporal fora das estratégias de aprendizagem e desenvolvimento da escola, estamos mutilando a natureza filogenética das crianças que, feridas em sua ontogenia, tornar-se-ão futuros adultos mutilados”. Na questão 8 da entrevista, perguntamos: Você acha que existe alguma relação entre corpo e aprendizagem? Se sim, como você enxerga que os alunos com TEA têm vivenciado essa relação? Não! Eu penso assim, que não existe! Porque tem também a questão da criança ser perfeitamente; seu corpo é perfeito, tudo funciona e o cognitivo não. Entendeu? A questão do corpo é movimento, mas muito deles num tem, né, o movimento? Num é falta de movimento! A pergunta é difícil! Sei lá! Será que ele não tá preso dentro desse corpo. Meu Deus, eu não sei. Sei não. Não sei te dizer porque eles têm um mundinho tão deles, né? [pausa de aproximadamente seis minutos] Eu acho que é assim: vendo o outro, convivendo com o outro, nas relações, de repente... Eu não sei se isso é correto, se esse pensamento é correto, mas eu acho que essa agitação, eu acho que o outro tem que intervir. É tanto que, eu acredito, eles precisam tanto de uma equipe, né? Pra poder evoluir, pra poder aprender... Então, eu acho assim, que ele aprende mesmo com esses movimentos, mas muito dependente do outro. A aprendizagem seria visual. Eu acho que nunca vai acontecer dele estar assim e de repente: “Ah, é hora da roda! Será que eu posso sentar?”. Por si só. Sem ver o exemplo dos outros, sem professora tá lá: “Vamos lá! Vamos sentar um pouco aqui. Vamostentar ouvir. Vamos...”. Ou outra coisa lá, uma brincadeira... Depende do outro: o outro, da interação... Se não escuto, não enxergo, sou autista, como eu vou aprender algo se o outro não tiver ali lhe tocando, lhe mostrando (CLARA). Sim. Existe! Mas, não saberia lhe responder a segunda parte da pergunta. Só sei que tem que ter sensibilidade (NÍSIA). Sim! Inclusive nesse tema de corpo e aprendizagem e a questão do movimento, eu lembro que no tempo da faculdade de Wallon, que ele já falava, sobre essa questão do corpo, né? Eu não sei se é um dos teóricos que você tá na sua linha aí, mas disse que tem tudo a ver... Eu acho que a própria proposta do CMEI é nesse sentido... De proporcionar... A própria rotina tem esse momento, por exemplo, o parque, eles se soltam mais. Então, tem a ver sim, no desempenho, né? No desenvolvimento dele. Tem tudo a ver. Acredito que uma criança que ela tenha uma atividade física, vamos dizer assim, ela vai conseguir ter um melhor desempenho digamos assim, escolar. Tem tudo a ver (MILITINA). Com certeza! [Pausa de 5/10 minutos na gravação, a pedido da professora, para pensar um pouco] Entendendo o corpo uma dimensão da formação do ser humano e da criança, especificamente na criança com Transtorno do Espectro Autista, é, eu vejo o corpo como... [pausa] que precisa ser considerado em todo o processo e em muitas vezes ela vai estar desenvolvendo, vai estar aprendendo, e alcançando os objetivos, seja lá quais sejam eles propostos, para aquela idade, para aquele nível... [pausa] fazendo 100 uso desse corpo de maneiras diferentes principalmente dependendo de como é essa criança... É! Com o meu aluno, ele era uma criança muito tranquila na questão do corpo. Então, a experiência que tivemos com ele, especificamente com ele, é a visão mesmo da criança de um modo geral. De criança como um ser integral que se desenvolve plenamente. E que eu preciso considerar não só o seu cognitivo, mas o seu corpo e a maneira como ela aprende através dele, através do movimento, através da brincadeira, através das experimentações. É... [pausa] Enfim, é uma pergunta difícil (AUTA). Sim. Existe. Principalmente na infância. Existe sim. Pra eles, tipo assim, darem o próximo passo em algum tipo de atividade. Na escrita, eles precisam trabalhar as maõzinhas deles na motricidade fina. E também eles assim: na questão de equilíbrio... A motricidade ampla... [pausa de dois minutos]. Complicadinho, eu acho. Porque não sei se é porque eu tenho a minha dificuldade de tá com a criança, às vezes porque tá sem auxiliar... Samuel só veio o ano passado, então eu não consegui fazer um trabalho bom com ele e esse ano ele ainda não tá vindo porque tá sem auxiliar e ainda não ta podendo vir... [pausa] Eu acho muito difícil! Mas, eu acho que se a gente tem aquele tempinho com a criança autista, a gente consegue fazer ele aprender através dos movimentos mesmo. Trabalhando a motricidade dele. Mas, eles assim, têm um pouquinho de resistência. Feito Samuel. Samuel agora, no final do ano passado ele já começou a subir no parque que antes ele não queria, desce o escorrego... Hoje em dia ele vai... Por esses dias, ele subiu e a mãe dele ficou até admirada! Tem que ter aquela atençãozinha que a gente gostaria de dar... Com os materiais também para o uso do corpo, eu acho que eles desenvolveriam igual uma criança normal... Um pouquinho mais lento, mas desenvolveria (CELINA). A questão 8 do roteiro da entrevista, que se referiu especificamente à relação corpo e aprendizagem no Transtorno do Espectro Autista, foi a que mais inquietou as participantes da pesquisa. Também foi a questão com o maior registro de interrupções na gravação durante sua execução, embora as professoras já tivessem falado anteriormente sobre os elementos tônicos presentes na pergunta. Ao analisarmos os excertos acima, evidenciamos inicialmente a fala da professora Clara, que afirmou não existir uma relação entre corpo e aprendizagem, pois muitas crianças têm corpos perfeitos, porém “o cognitivo não funciona”. Conforme vimos em capítulos anteriores, o corpo submisso à análise intelectualista, como apresentado pela professora Clara, não é uma realidade isolada nem privilégio de uma área específica, mas herança da concepção cartesiana, marcadamente dicotomizada (NÓBREGA, 2005; GAYA, 2006), que exerceu considerável influência nas abordagens científicas sobre o corpo, como na Fisiologia e na Psicologia, que limitaram a dimensão do universo corporal ao conhecimento de suas partes ou ao direcionamento psíquico (LE BRETON, 2007). 101 Na educação, essa influência representou a instauração de uma ideia de corpo atrelada quase que unicamente às noções de esquema ou de imagem corporal, associado à disciplina dos corpos para a eficiência do plano intelectual. Assim sendo, ao afirmar que não existe relação entre corpo e aprendizagem, a professora Clara permite-nos perceber falhas na sua formação docente para o trato da relação indivíduo/sociedade, e a presença marcante em suas falas do pensamento dualista tarimbado por René Descartes. Outras duas questões que nos chamaram a atenção nas entrevistas dizem respeito ao fato de as professoras associarem a aprendizagem das crianças unicamente à oferta de recursos matérias, a exemplo de brinquedos, para o desenvolvimento dos processos cognitivos (CLARA), e ao provimento de materiais externos para o uso do corpo (CELINA). Entendemos que a utilização de distintos recursos materiais, a exemplo de brinquedos e objetos gráficos diversificados, auxilia no processo de ensino-aprendizagem das crianças, inclusive as que se encontram dentro do espectro autista. Porém, práticas que priorizam a utilização destes, podem representar a marginalização daqueles que têm “corpos diferenciados” (OLIVEIRA, 2013), e que, como as demais crianças, aprendem através das mútuas inter-relações. A saber, e o momento se faz oportuno, o conceito de aprendizagem Emergiu das investigações empiristas em Psicologia, ou seja, de investigações levadas a termo com base no pressuposto de que todo conhecimento provém da experiência”. Isso significa afirmar o primado absoluto do objeto e considerar o sujeito como uma tabula rasa, uma cera mole, cujas impressões do mundo, fornecidas pelos órgãos dos sentidos, são associadas umas às outras, dando lugar ao conhecimento. O conhecimento é, portanto, uma cadeia de idéias atomisticamente formada a partir do registro dos fatos e se reduz a uma simples cópia do real (GIUSTSA, 2013, p. 22, grifo do autor). Assim sendo, na nascente das teorias da aprendizagem está a ideia de que o sujeito seria uma tábula rasa, e o conhecimento pelos órgãos dos sentidos se daria, subalternizado o corpo a favor dos aspectos cognitivos no espaço escolar, pensamento que se opõe aos constructos de Merleau-Ponty (2006), segundo o qual o corpo não é parte nem instrumento. Ele é meio. Matriz do desenvolvimento humano. Não cabendo, portanto, a necessidade de dividi-lo em partes ou funções para na busca pelo conhecimento. No quadro abaixo, trazemos várias outras teorias da aprendizagem, botija nas percepções da humanidade. 102 Figura 6 – Teorias da Aprendizagem Teorias de Aprendizagem Características Epistemologia Genética de Piaget Ponto central: estrutura cognitiva do sujeito. As estruturas cognitivas mudam através dos processos de adaptação: assimilação e acomodação. A assimilação envolve a interpretação de eventos em termos de estruturas cognitivas existentes, enquanto que a acomodação se refere à mudança da estrutura cognitiva para compreender o meio. Níveis diferentes de desenvolvimento cognitivo. Teoria Construtivista de Bruner O aprendizado é um processo ativo, baseado em seus conhecimentos prévios e os que estão sendo estudados. O aprendiz filtra e transforma a nova informação,infere hipóteses e toma decisões. Aprendiz é participante ativo no processo de aquisição de conhecimento. Instrução relacionada a contextos e experiências pessoais. Teoria sociocultural de Vygotsky O desenvolvimento cognitivo é limitado a um determinado potencial para cada intervalo de idade (ZPD); o indivíduo deve estar inserido em um grupo social e aprende o que seu grupo produz; o conhecimento surge primeiro no grupo, para só depois ser interiorizado. A aprendizagem ocorre no relacionamento do aluno com o professor e com outros alunos. Aprendizagem baseada em Problemas/ Instrução ancorada (John Bransford & the CTGV) A aprendizagem se inicia com um problema a ser resolvido. O aprendizado é baseado em tecnologia. As atividades de aprendizado e ensino devem ser criadas em torno de uma “âncora”, que deve ser algum tipo de estudo de um caso ou uma situação envolvendo um problema. Teoria da Flexibilidade Cognitiva (R. Spiro, P. Feltovitch & R. Coulson) Trata da transferência do conhecimento e das habilidades. É especialmente formulada para dar suporte ao uso da tecnologia interativa. As atividades de aprendizado precisam fornecer diferentes representações de conteúdo. Aprendizado Situado (J. Lave) A aprendizagem ocorre em função da atividade, contexto e cultura e ambiente social na qual está inserida. O aprendizado é fortemente relacionado com a prática e não pode ser dissociado dela. Gestaltismo Enfatiza a percepção ao invés da resposta. A resposta é considerada como o sinal de que a aprendizagem ocorreu e não como parte integral do processo. Não enfatiza a sequência estímulo-resposta, mas o contexto ou campo no qual o estímulo ocorre e o insight tem origem, quando a relação entre estímulo e o campo é percebida pelo aprendiz. Teoria da Inclusão (D. Ausubel) O fator mais importante de aprendizagem é o que o aluno já sabe. Para ocorrer a aprendizagem, conceitos relevantes e inclusivos devem estar claros e disponíveis na estrutura cognitiva do indivíduo. A aprendizagem ocorre quando uma nova informação ancora-se em conceitos ou proposições relevantes preexistentes. Aprendizado Experimental (C. Rogers) Deve-se buscar sempre o aprendizado experimental, pois as pessoas aprendem melhor aquilo que é necessário. O interesse e a motivação são essenciais para o aprendizado bem-sucedido. Enfatiza a importância do aspecto interacional do aprendizado. O professor e o aluno aparecem como os corresponsáveis pela aprendizagem. Inteligências múltiplas (Gardner) No processo de ensino, deve-se procurar identificar as inteligências mais marcantes em cada aprendiz e tentar explorá-las para atingir o objetivo final, que é o aprendizado de determinado conteúdo. Fonte: Internet. Disponível em: http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/teorias.htm. Acesso em: 16 jan. 2021. Em nossa pesquisa, orientamo-nos pela teoria de aprendizagem que reconhece a criança um ser social, e o corpo como parte integrante e de fundamental importância ao http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/psicologia.htm#piaget http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/psicologia.htm#bruner http://www.emtech.net/learning_theories.htm#Vygotsky1 http://tip.psychology.org/anchor.html http://tip.psychology.org/anchor.html http://tip.psychology.org/spiro.html http://tip.psychology.org/spiro.html http://tip.psychology.org/lave.html http://tip.psychology.org/wertheim.html http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/psicologia.htm#ausubel http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/abordagens.htm#rogers http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/abordagens.htm#rogers http://www.infed.org.uk/thinkers/gardner.htm http://www.nce.ufrj.br/ginape/publicacoes/trabalhos/t_2002/t_2002_renato_aposo_e_francine_vaz/teorias.htm 103 desenvolvimento, que jamais deveria ser desconsiderado do processo de ensinagem (ANASTASIOU, 2003). O que mais nos cabe inferir, é que, por várias razões, inclusive políticas, teorias que concebem o indivíduo como um ser apartado da História resistem, categorizando as pessoas e seus corpos em aptos e não aptos, quando o que se precisa, no contexto dessas discussões, é da promoção de práticas inclusivas que estabeleçam novas relações entre corpo e aprendizagem. 104 6 CORPO E APRENDIZAGEM DA CRIANÇA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: UMA PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL VIA GOOGLE MEET Antes de qualquer coisa, a existência humana é corporal. (Le Breton, 2007, p. 7). Sendo a existência humana antes de qualquer coisa corporal, como afirma o antropólogo francês David Le Breton [1953], podemos considerar que o biológico possui valor secundário e o corpo pode ser concebido como universo das representações, dos valores e do imaginário social. Tendo em vista essa compreensão de corpo, partimos para a implementação do plano de ação de nossa pesquisa, que foi realizada visando problematizar a relação corpo, aprendizagem e inclusão escolar de crianças com TEA no contexto da Educação Infantil. Inicialmente, havíamos adotado a pesquisa-ação (THIOLLENT, 2009) como método de investigação, a se materializar no desenvolvimento de oficinas pedagógicas presenciais (CANDAU, 1995), cada qual com uma temática a ser discutida e refletida na ação-reflexão do fazer docente. No entanto, no mês março de 2020, em virtude da pandemia do novo coronavírus e a consequente política de distanciamento social alvitrada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), perdemos contato com a escola e com as professoras participantes de nosso estudo. Assim sendo, a nossa proposta de formação se deu no formato virtual, respeitando a dinâmica do CMEI e a disponibilidade dos docentes, que por ocasião da ação formativa relataram terem precisado de um tempo para se adaptarem às inúmeras demandas de um novo cenário educativo, que inesperadamente teve de se apropriar de tecnologias da informação e comunicação. Isto posto, nosso encontro virtual ocorreu às 14:30 do dia 06/11/2020, via Google Meet com o tema: Corpo e aprendizagem da criança com Transtorno do Espectro Autista: um diálogo com professoras da Educação Infantil. Cabe ressaltar, que, apesar de apenas cinco professoras terem participado da coleta de dados através das entrevistas, no total 20 pessoas entre professores, equipe gestora da escola e representantes da Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Parnamirim/RN, estiveram presentes na formação. Cabe aqui destacar, ainda que, antes do desenvolvimento da formação, reunimo-nos virtualmente com representantes da SEMEC de Parnamirim/RN, no dia 20/10/2020, para 105 reiterarmos os objetivos, a proposta metodológica de nossa pesquisa e formalizarmos junto à repartição nossa proposta de intervenção. Também tivemos uma nova conversa com a equipe gestora da instituição sobre o desenvolvimento da formação no formato virtual, disponibilidade de dias e horários para a ação. Na ocasião, acordamos que seria mais proveitoso estender a atividade para todo o corpo docente e administrativo do CMEI, e que a possível data para reunir a todos devido às atividades remotas e demais ações já programadas pela escola, seria dia 06/11/2020. Acertado dia e horário com a SEMEC de Parnamirim/RN e a instituição educativa lócus de nossa investigação, enviamos via aplicativo WhatsApp um convite24 (Figura 5) para que todos se sentissem convidados a participar da formação. Assim sendo, segue toda a nossa proposta de formação, que se deu em quatro etapas de trabalho, sendo utilizados os programas Power Point e oformulário virtual Google Forms durante o processo. Através do formulário virtual, coletamos os nomes de todos os participantes para fins de certificação e refizemos a pergunta 8 do roteiro da entrevista com vistas à avaliação da atividade interventiva. Essa parte, no entanto, contou como item “não obrigatório”, pois não tínhamos autorização do Comitê de Ética para o uso de tal ferramenta nessa perquirição. Desse modo, responderam ao formulário somente as pessoas que assim quiseram após terem sido informadas sobre o seu objetivo. De acordo com a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (BRASIL, 2021), o pesquisador só poderá fazer uso de conteúdos de formulários on- line após os participantes da pesquisa terem dado seu consentimento, e caso tenha pergunta obrigatória, deve constar no TCLE do participante a opção de não responder à pergunta. Como o formulário virtual foi introduzido na nossa pesquisa após submissão do projeto ao Comitê de Ética, tomamos o cuidado de utilizar a ferramenta com cautela, respeito e informalidade. Quadro 10 – Proposta de formação docente via Google Meet ETAPAS E RECURSOS DESCRIÇÃO DA ATIVIDADE OBJETIVOS DA ATIVIDADE 1ª etapa Uso do programa Power Point Sensibilização dos participantes; Apresentação da prática interventiva. Motivar as professoras a participar da prática interventiva, construindo assim um processo coerente com os princípios da ação-reflexão; 24 A elaboração e a distribuição dos convites respeitaram as orientações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. 106 ETAPAS E RECURSOS DESCRIÇÃO DA ATIVIDADE OBJETIVOS DA ATIVIDADE Apresentar os temas fundantes de nossa pesquisa e os eixos da formação. 2ª etapa Uso do programa Power Point Síntese das entrevistas e exposição dos resultados obtidos através da análise de conteúdo; Apresentação das categorias temáticas: a inclusão escolar da criança com TEA no contexto da escola regular; corpo e autismo; relação corpo e aprendizagem da criança com TEA na concepção de professoras da Educação Infantil. Problematizar a relação corpo, aprendizagem e inclusão escolar de crianças com TEA na Educação Infantil. 3ª etapa Uso do programa Power Point Um olhar sobre o corpo sujeito; O corpo na percepção de Merleau- Ponty. Apresentar o corpo sujeito ressignificado no pensamento de Merleau-Ponty; Estabelecer relações entre a fenomenologia do corpo e a educação. 4ªetapa Uso da ferramenta Google Forms Em que podemos avançar? Com a palavra, os participantes. Incentivar a participação e a troca de conhecimentos entre os participantes durante a ação formativa; Avaliar a formação. Fonte: Elaborado pela autora (2020). Nosso encontro começou de maneira descontraída e, embora estivéssemos em ambientes diferentes, a sensação era de proximidade e união. As visitas feitas ao CMEI no decorrer da fase exploratória e analítica desta pesquisa, nos aproximaram e de alguma maneira de todos os profissionais que estavam participando da formação, que com seus quentes olhares se mostravam prontos para a oportunidade de refletir sobre suas práticas e dizeres acerca do corpo da criança com TEA no contexto da Educação Infantil. Cada janela aberta, fosse de um aparelho celular ou computador, era um convite à observação de nossos corpos enquadrados, que se mostravam parecidos, mas em nada eram iguais. Estávamos, então, diante do desafio de sublimação de nossa percepção estrutural de corpo para alcançarmos o sujeito da percepção (MERLEAU-PONTY, 2006). 107 Comunicando-nos virtualmente através de nossos corpos, que são também meios de comunicação, desenvolvemos o momento de sensibilização do encontro logo após a leitura deleite do texto “As cem linguagens da criança25” de Loris Malaguzi (1995, p. 01): A criança é feita de cem. A criança tem cem mãos, cem pensamentos, cem modos de pensar, de jogar e de falar. Cem, sempre cem modos de escutar as maravilhas de amar. Cem alegrias para cantar e compreender. Cem mundos para descobrir. Cem mundos para inventar. Cem mundos para sonhar. A criança tem cem linguagens (e depois, cem, cem, cem), mas roubaram-lhe noventa e nove. A escola e a cultura separam-lhe a cabeça do corpo. Dizem-lhe: de pensar sem as mãos, de fazer sem a cabeça, de escutar e de não falar, De compreender sem alegrias, de amar e maravilhar-se só na Páscoa e no Natal. Dizem-lhe: de descobrir o mundo que já existe e, de cem, roubaram-lhe noventa e nove. Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho, a realidade e a fantasia, a ciência e a imaginação, O céu e a terra, a razão e o sonho, são coisas que não estão juntas. Dizem-lhe enfim: que as cem não existem. A criança diz: ao contrário, as cem existem. Posteriormente, sem utilizar um sinal específico de pontuação em nossa fala, fizemos a apresentação da prática interventiva e dos eixos sobre os quais se erguem esta dissertação, sem perder de vista as inquietações do grupo. Na sequência conversamos sobre: Transtorno do Espectro Autista, corpo e aprendizagem, inclusão escolar na Educação Infantil e formação docente. Para o desenvolvimento dessa etapa, utilizamos 17 slides em Power Point contendo a síntese das entrevistas, exposição dos resultados obtidos e a apresentação das categorias temáticas fruto da análise de conteúdo (BARDIN, 2016). Nosso objetivo nessa fase da formação foi problematizar o debate e instigar os professores a refletir sobre sua prática docente. 25 Poesia de Loris Malaguzzi: Invece il cento c’è, publicada in: Edwards, C., Gandin, L. i Forman, G. I cento linguaggi dei bambini. Edizione Junior, Italia, 1995, e recentemente publicada em português pelas Artes Médicas como: As Cem Linguagens da Criança. Com ilustração de Francesco Tonucci. Tradução de Patrícia Chittoni Ramos. Porto. Alegre: Artes Médicas, 1997. 108 Figura 7 – Formação das professoras via Google Meet Fonte: Arquivo da pesquisadora. O corpo fala! Nesse ponto de nosso encontro, o meu corpo (falo-lhes ousadamente em primeira pessoa) reclamava muito de cansaço. Estava com 40 semanas e dois dias de gestação. Era corpo que sentia sendo também moradia. Chegamos então à apresentação do corpo sujeito ressignificado no pensamento de Maurice Merleau-Ponty, que em suas conjecturas “considera nossos corpos uma estrutura viva e experiencial, em que o interno e o externo, o biológico e o fenomenológico se comunicam, sem oposições” (NÓBREGA, 2005, p. 605). A atitude fenomenológica de Ponty afronta as teorias sobre aprendizagem cuja compreensão de corpo centra-se no orgânico, no físico e na consequente falta de valorização do corpo nos processos educativos. Nessa etapa da formação conversamos sobre corpo objeto e corpo sujeito, partindo de reflexões sobre o lugar do corpo na sociedade. Para a discussão trouxemos ainda O corpo da criança com TEA, que, segundo a literatura, “permanece mudo, silencioso, coisificado numa posição de mutismo” (FERNANDES, 2008, p. 112). A isso também se acresce, segundo Freitas (2015), que nas entrelinhas, é como se insinuasse a pergunta: o que se poderia esperar de desempenho por parte de um aluno autista, se ele praticamente não interage nem se comunica? 109 Nosso objetivo, então, foi resgatar nos professores a importância do próprio corpo e desse corpo na relação com o outro, bem como a necessidade de estarem atentos à percepção dos gestos, linguagem, sentimentos, relações e emoções dos estudantes com TEA, porque isso poderia ajudá-los a encontrar novos meios de expressão. Nesse ponto de nosso encontro já totalizávamos a utilização de 27 slides, e partimos para as inquietações dos participantes acerca da formação. As professoras falaramsobre suas práticas e experiências junto aos alunos com TEA, e expressaram suas dúvidas a respeito do tema. Todas as docentes, sem exceção, também manifestaram o desejo de participar de oficinas pedagógicas presenciais junto com os estagiários para poder dar continuidade as já iniciadas reflexões. Na ocasião, também recebemos um convite da SEMEC para estendermos a formação para todos os professores de Educação Infantil do município de Parnamirim no ano de 2021. Na sequência, lançamos o formulário virtual para registro de presença e ulterior certificação dos participantes. Ao formulário acrescentamos ainda a seguinte questão: Você acha que existe alguma relação entre corpo e aprendizagem? Se sim, como você enxerga que os alunos com TEA têm vivenciado essa relação? Essa mesma pergunta já havia sido realizada na entrevista semiaberta e a refizemos para fins de avaliação da formação. Todas as participantes escrevam algo sobre o encontro, mas para este texto traremos apenas as respostas para as quais obtivemos consentimento. Comecemos, então, pela fala de Auta após a formação e no momento da entrevista: Você acha que existe alguma relação entre corpo e aprendizagem? Se sim, como você enxerga que os alunos com TEA têm vivenciado essa relação? Corpo e aprendizagem estão diretamente relacionados. O corpo é a criança que se move, interage, brinca, sente e pensa. As crianças com TEA ainda têm sido bastante negligenciadas nessa questão, pois ainda é bastante presente em nossas salas de aula a cultura do corpo parado, em que se aprende sentado. Acredito que estamos, mesmo que a passos lentos, progredindo nessa compreensão do quanto que as crianças de modo geral e especificamente as com TEA necessitam serem respeitadas nas suas especificidades, e o quanto que o corpo e o movimento é fundamental no processo de desenvolvimento e aprendizagem (AUTA, 06/11/2021). Com certeza! [Pausa de dois minutos, a pedido da professora, para pensar um pouco] Entendendo o corpo como uma dimensão da formação do ser humano e da criança, especificamente na criança com Transtorno do Espectro Autista, é, eu vejo o corpo como... [pausa] que precisa ser considerado em todo o processo e em muitas vezes ela vai estar 110 desenvolvendo, vai estar aprendendo, e alcançando os objetivos, seja lá quais sejam eles propostos, para aquela idade, para aquele nível... [pausa] fazendo uso desse corpo de maneiras diferentes, principalmente dependendo de como é essa criança... É! Com o meu aluno, ele era uma criança muito tranquila na questão do corpo. Então, a experiência que tivemos com ele, especificamente com ele, é a visão mesmo da criança de um modo geral. De criança como um ser integral que se desenvolve plenamente. E que eu preciso considerar não só o seu cognitivo, mas o seu corpo e a maneira como ela aprende através dele, através do movimento, através da brincadeira, através das experimentações. É... [pausa] Enfim, é uma pergunta difícil! (AUTA, 05/03/2021). Em nossa análise, pudemos inicialmente perceber maior segurança da professora para falar sobre a dimensão do corpo na aprendizagem após sua participação na formação. A isso se acresce um rico detalhe de percepção em relação ao corpóreo, agora reconhecido em sua complexidade, pode ser tido como uma linguagem repleta de valores, e possibilidade de inserção do sujeito no mundo (SILVA, 2011). Na entrevista, Auta afirma que seu aluno com TEA é muito “tranquilo na questão do corpo”. Após a formação, ela diz que “as crianças com TEA ainda têm sido negligenciadas nessa questão, pois ainda é bastante presente em nossas salas de aula a cultura do corpo parado, em que se aprende sentado”. Nesse depoimento, embora não possamos garantir uma mudança de práticas, fica evidente uma mudança de concepção da professora sobre a relação corpo e aprendizagem. Como vimos, a ideia de que as crianças aprendem se estiverem quietas e “prestando atenção”, ainda povoa o cenário escolar e evidencia que os professores da Educação Infantil, de uma forma geral, demostram dificuldade para considerar a dimensão corporal como elemento constitutivo da prática pedagógica (SILVA, 2011). Assim sendo: Nossa reflexão busca apontar outros caminhos de compreensão do corpo na educação, segundo uma atitude que busca superar o instrumentalismo e ampliar as referências educativas ao considerar a fenomenologia do corpo e sua relação com o conhecimento, incluindo reflexões contemporâneas sobre os processos cognitivos advindos de uma nova compreensão da percepção (NÓBREGA, 2005, p. 205). Nessa perspectiva, se vencem os discursos pedagógicos análogos unicamente ao entendimento de corpo como organismo, pois “fica difícil falar de Educação concreta na escola quando o corpo é considerado um intruso” (FREIRE, 2011, p. 9). A complementar nossas discussões, vejamos o que nos diz a professora Militana: 111 Sim! Inclusive nesse tema de corpo e aprendizagem e a questão do movimento, eu lembro no tempo da faculdade de Wallon, que ele já falava sobre essa questão do corpo, né? Eu não sei se é um dos teóricos que você tá na sua linha aí, mas disse que tem tudo a ver... Eu acho que a própria proposta do CMEI é nesse sentido... De proporcionar... A própria rotina tem esse momento, por exemplo, o parque, eles se soltam mais. Então, tem a ver sim, no desempenho, né? No desenvolvimento dele. Tem tudo a ver. Acredito que uma criança que ela tenha uma atividade física, vamos dizer assim, ela vai conseguir ter um melhor desempenho, digamos assim, escolar Tem tudo a ver (MILITANA, 12/03/2020). Entendo que exista relação entre corpo e aprendizagem. A expressão corporal é um meio de compreender as aprendizagens no caso de crianças com TEA porque algumas crianças não conseguem se expressar através da fala. Então, muitas vezes precisam ser motivadas por meio de recursos lúdicos, ou seja, brincadeiras, para que possamos observar a relação que fazem com a aprendizagem (MILITANA, 06/11/2020). Em Auta observamos ganho de segurança ao responder à questão de avaliação. Já na fala de Militana, percebemos maior precisão para no uso das palavras para se expressar. Não ousamos atribuir unicamente à formação tais ganhos, mas acreditamos que o que fora incentivado através das discussões pode significar o desabrochar de novas possibilidades no fazer docente desses professores. Outro ponto a considerar é que as falas de Militana sempre nos levam para a questão da formação docente e do papel da instituição educativa no processo de inclusão escolar da criança com TEA. Considerando seus constructos, falar de corpo, é remetermo-nos aos processos de formação de professores, e à falta de atenção a questão da corporeidade do aprendiz com ou sem deficiência. Na questão de avaliação, Militana também se refere ao corpo como meio, saindo da consideração isolada de que o corpo precisa de um lugar específico para ser corpo. Sobre a formação em si, as demais participantes, em sua maioria, falaram o quanto havia sido “interessante esse retorno das observações e pesquisas, e que pós-vacina do Covid- 19 esperavam poder vivenciar as oficinas no formato presencial”. Houve também quem dissesse estar vivenciando uma atividade muito produtiva e enriquecedora que com a colaboração de todas as participantes se fez ainda mais enriquecida. Chegamos, então, à quarta e última fase do uso da técnica de Grupo Focal onde pudemos avaliar a efetividade e o conhecimento da pesquisa, vislumbrando divulgar nossa investigação. 112 CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando as discussões desenvolvidas neste texto dissertativo, podemos concluir que um dos maiores desafios para os cursos de formação inicial e continuada de professores na atualidade, é produzir conhecimentos para que os docentes possam exercer com responsividade o seu papel deaprender e ensinar na e para a diversidade. Frente ao montante literário que trata da temática formação de professores para atuarem numa perspectiva inclusiva, não resta dúvidas que os anos recentes já trouxeram um grande avanço nesse sentido (CUNHA, 2013). No entanto, as discussões levantadas nesta pesquisa nos levam a considerar que, muitos ainda são os problemas enfrentados na busca pela concretização de espaços formativos carregados de sentido para a qualificação do profissional docente (NÓVOA, 2009), o que justifica a necessidade de que mais estudos sejam desenvolvidos. Daí a importância desta pesquisa, que se configurou na perspectiva de engrossar as discussões acerca da inclusão escolar das pessoas com TEA na escola regular através de uma proposta de formação continuada que apresentou a instituição escolar como um espaço favorável ao diálogo, à reflexão, à troca de experiências e ao aperfeiçoamento de práticas. Obviamente não dirimimos com esta proposta de formação continuada todas as dificuldades enfrentadas pelas professoras participantes desta pesquisa frente ao desafio da inclusão escolar da criança com TEA na escola comum. Mas, podemos afirmar que, ao abrir espaço de fala para as docentes, resgatamos a importância do diálogo e da reflexão para a construção do conhecimento e vivência de práticas menos excludentes. Respaldados por essas constatações, asseguramos que, embora ainda existam lacunas nos processos de formação inicial e continuada de professores, nós, enquanto profissionais inquietos que geralmente somos, temos a possibilidade de transformar nossas escolas em espaços de ebulição, dinamização de conhecimentos e de formação que beneficia um grupo, não só com os resultados de uma pesquisa, mas com o próprio desenvolvimento de uma investigação. No que diz respeito à formação dos professores da Educação Infantil para desenvolver práticas inclusivas tendo o corpo como lugar de aprendizagem, consideramos tratar-se de um tema carente de estudos, embora haja na literatura autores que exaltem a importância da temática, por entenderem que o domínio da racionalidade pelos docentes tem contribuído com 113 a perpetuação de práticas pedagógicas mecanicistas que tendem a reprimir a realidade corpórea dos estudantes a favor dos aspectos intelectuais (NÓBREGA, 2005; GAYA, 2006). Segundo Nóbrega (2005, p. 609), “o desafio está em superarmos o aspecto instrumental, que, em geral, caracteriza boa parte das abordagens sobre o corpo na educação, [...] e nos percebermos como seres corporais”, pois, a ausência dessa percepção pode trazer consequências não só para a maneira como desde cedo aprendemos na Educação Infantil, como também para a forma como no decorrer da vida aprenderemos e com o corpo nos relacionaremos. Assim sendo, consideramos que, cabe à capacitação do profissional docente, seja ela inicial ou continuada, a compreensão de que “toda educação é a educação do corpo, e que esta percorre caminhos diversos” (ALMEIDA, et al., 2013, p. 203) para que estes sejam capazes de aperceberem-se enquanto corpo e o conceberem indissociável do processo de aprendizagem. Cabe aqui ressaltar, que, dada a carência de estudos na nossa formação inicial, entendermos a dimensão do corpo na aprendizagem foi por meses um difícil processo de ruminação literária. Tivemos de nos lançar na história da sociedade ocidental do corpo, fazer visitas às nossas memórias, escamotear algumas expectativas, cursar um Componente Curricular no Programa de Educação Física: “Arte, corpo e deficiência”, estudar, escrever, apagar, e nos perder nas madrugadas com Merleau-Ponty, mesmo sem conseguir até o presente, desvendar todas as suas intimidades fenomenológicas. O corpo como eu o concebia em minha prática pedagógica antes de entrar no Mestrado (ouso trazer o texto para a primeira pessoa), encaixava-se em grande parte nos princípios da racionalidade técnica, que fragmenta o ser humano em vários domínios e o coloca como acessório para a aprendizagem (NÓBREGA, 2005). Hoje, como já especulávamos no texto introdutório desta pesquisa, o conceito de corpo que tínhamos ganhou um corpo quente e capaz, que não se desvincula do sujeito aprendente. Por isso, ouso dizer que, apostar nas minhas inquietações foi gratificante e producente. Sobre a questão da diversidade nos cursos de formação docente que foi mencionada no começo dessas considerações, ponderamos que é um requisito para a inclusão escolar de crianças com ou sem deficiência. Somos diversos! Enquanto professores, tendo alunos com deficiência ou não na sala de aula, lidamos diariamente com a diversidade. Acolher essa percepção nos espaços de formação docente, é ampliar a ideia de inclusão, propor a aceitação 114 das diferenças que se dão no âmbito escolar e “tirar dos ombros” das pessoas com deficiência a responsabilidade total pelo movimento inclusivo. A partir do momento em que a diversidade é considerada na escola e nos espaços de formação docente, as linhas imaginárias que separam as pessoas de acordo com suas características, principalmente físicas, em deficientes ou não, dão lugar às oportunidades para todos de aceitação e aprendizagem sem distinção. Acolher essa percepção no espaço escolar pode ser fundamental para que os indivíduos, desde muito cedo, adquiram um saber completo e de maneira significativa, inclusive aqueles com Transtorno do Espectro Autista, que muitas vezes passam pela escola sem ter a oportunidade de aprender porque seus corpos são considerados agitados demais ou ausentes. Assim sendo, concluímos esta investigação ressaltando a importância de se continuar a investir nos estudos sobre as temáticas centrais desta pesquisa: corpo, Transtorno do Espectro Autista (TEA), inclusão escolar na Educação Infantil e formação docente, a fim de que sejamos capazes de aprofundarmos discussões, e aos poucos irmos incorporando conhecimentos mais significativos ao fazer docente, pois grande ainda é nas escolas, a presença de concepções que não valorizam o corpo da criança no processo educativo porque permanecem a enxerga-la apenas como um corpo físico (GAYA, 2006). Ademais, confirmamos a hipótese de que os professores que atuam na Educação Infantil enfrentam dificuldades para desenvolver práticas inclusivas tendo o corpo como lugar de aprendizagem e concluímos, a partir dos objetivos alcançados, que a compreensão do corpo e da aprendizagem na educação é indispensável ao desafio da inclusão escolar de estudantes com TEA na escola regular, e nesse cenário investir na formação do professor, remota ou presencialmente, continua essencial. Lembrando, que a nossa experiência formativa se deu via plataforma digital de comunicação e, embora tenha nos limitado fisicamente, não minimizou a importância do professor nem os seus dizeres tão significativos para o desabrochar de experiências profissionais respeitosas e coerentes com uma proposta de Educação para todos. 115 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Evany Bettine de; MARTINS, Anna Karenina Azevedo; NUNES, Viviane Abreu. 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Conforme você foi informado no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), as informações obtidas são de caráter anônimo e confidencial, e a justa resposta às perguntas contribuirá com os objetivosde nossa pesquisa. Data da entrevista: ____/____/____ Duração da entrevista: ________________________ Permissão para gravar a entrevista: ( )Sim ( )Não Dados identificadores e de formação: Nome: ______________________________________________________________ Idade: ______________________________________________________________ Sexo:_______________________________________________________________ Formação acadêmica e ano de conclusão: _________________________________ Pós-graduação/cursos de aperfeiçoamento: _______________________________ Tempo como professora: _______________________________________________ Tempo na Rede Municipal/ no CMEI: _____________________________________ 1. O que você pensa sobre a inclusão de alunos com deficiências na sala de aula regular? 129 2. Durante a carreira, você recebeu alguma formação voltada para a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva? 3. O que é autismo para você? 4. Como é trabalhar com uma criança com Transtorno do Espectro Autista? Quais os desafios e possibilidades. 5. O que você compreende por corpo? 6. Como você vê a criança e o seu corpo? 7. Como você vê o corpo da criança com TEA na Educação Infantil? 8. Você acha que existe alguma relação entre corpo e aprendizagem? Se sim, como você enxerga que os alunos com TEA têm vivenciado essa relação? 130 APÊNDICE C – TERMO DE ESCLARECIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) 131 132 133 134 APÊNDICE D – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE VOZ 135 ANEXO A – PARECER CONSUBSTANCIADO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA (CEP) 136 137 138 139 140