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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA CARLOS EDUARDO PEREIRA DO NASCIMENTO CIDADES MÉDIAS, INTERAÇÕES ESPACIAIS E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: UM OLHAR PARA O ESTADO DO CEARÁ Natal/RN 2021 CARLOS EDUARDO PEREIRA DO NASCIMENTO CIDADES MÉDIAS, INTERAÇÕES ESPACIAIS E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: UM OLHAR PARA O ESTADO DO CEARÁ Dissertação apresentada ao curso de Pós- Graduação em Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Economia Regional. Orientador: Prof. Dr. William Eufrásio Nunes Pereira. Natal/RN 2021 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA Nascimento, Carlos Eduardo Pereira do. Cidades médias, interações espaciais e desenvolvimento regional: um olhar para o estado do Ceará / Carlos Eduardo Pereira do Nascimento. - 2021. 152f.: il. Dissertação (Mestrado em Economia) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas. Natal, RN, 2021. Orientador: Prof. Dr. William Eufrásio Nunes Pereira. 1. Desenvolvimento Regional - Ceará - Dissertação. 2. Cidades Médias - Dissertação. 3. Multiescalaridade - Dissertação. 4. Globalização - Dissertação. 5. Economia Regional - Dissertação. I. Pereira, William Eufrásio Nunes. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/Biblioteca CCSA CDU 332.1(813.1) Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355 CARLOS EDUARDO PEREIRA DO NASCIMENTO CIDADES MÉDIAS, INTERAÇÕES ESPACIAIS E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: UM OLHAR PARA O ESTADO DO CEARÁ Dissertação apresentada ao curso de Pós- Graduação em Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Economia Regional. Aprovada em: 23 de abril de 2021. BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Prof. Dr. William Eufrásio Nunes Pereira Orientador Universidade Federal do Rio Grande do Norte ______________________________________ Prof. Dr. Denilson da Silva Araújo Examinador Externo ao Programa Universidade Federal do Rio Grande do Norte ______________________________________ Prof. Dr. Francisco do O’ de Lima Junior Examinador Externo à Instituição Universidade Regional do Cariri Aos meus pais, pelo carinho, amor e dedicação contínuos. AGRADECIMENTOS Agradecer aqueles(as) que nos incentivam e nos ajudam a remar contra as correntezas da vida, seja qual for a empreitada, é sempre um momento de alegria e retribuição pelos bons e maus momentos compartilhados. Antes de tudo, agradeço ao bom e grandioso Deus por me proporcionar mais essa conquista; por sempre me rodear de pessoas de uma energia incrível, antes, durante e após a conclusão do mestrado (levarei vocês comigo para onde for). A minha mãe, Sonia, e a meu pai, Gilberto, pelo carinho, amor e dedicação incondicionais. Por sempre acreditarem e terem fé em mim. Amo vocês com todo o meu coração! A minha querida irmã, Samia que, a despeito das discussões diárias, sempre me faz rir e torce pelo meu sucesso. Uma ótima companhia (às vezes) para assistir filmes. Te amo, irmã! Ao meu orientador/amigo, prof. William Pereira, pelas orientações, ensinamentos, conversas informais, puxões de orelha. Por me ajudar a entender a qual área de pesquisa pertenço e, sem dúvida, suas aulas de economia regional e as discussões suscitadas no Grupo de Estudos do GEPETIS me deram as respostas que eu precisava. Também, por me ajudar a avançar a próxima fase da minha vida, o doutorado. Sua ajuda foi muito significativa e sou grato por isso. Agradeço a excelente banca examinadora formada pelos professores Lima Junior e Denilson. Aos senhores, muito obrigado pelas considerações, as quais me ajudaram a melhorar e enriquecer esta dissertação. Um agradecimento especial a Lima pela contínua assistência, pelos ensinamentos, por tudo que apreendi ao longo da graduação e da pós- graduação e também pela ajuda com o projeto de tese de doutorado. Você é, sem dúvida, uma das minhas inspirações a seguir a carreira acadêmica. Agradeço as pessoas maravilhosas que o mestrado me permitiu conhecer, e que pude compartilhar ótimos momentos nos últimos dois anos, além das trocas de ideias, parcerias cientificas e, o mais importante, dos momentos divertidos e espontâneos que vocês me proporcionaram: Guilherme Brandão, Joana Priscila, Amanda Renally, Camila Medeiros, Marcelo Brandão, Danyelle Mestre, Denis Fernandes e Luiz Vinicius. Amizades que levarei comigo para sempre. Por fim, agradeço ao Programa de Pós-Graduação em Economia (PPECO) e a todos(as) do corpo docente, em especial aqueles(as) que tive contato seja através das disciplinas, seja através de breves conversas; à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) por me disponibilizar uma estrutura sensacional, através da biblioteca, das salas de estudo, do refeitório etc.; à cidade de Natal-RN por me receber de braços abertos; e grato a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de mestrado, código de Financiamento 001. “O direito à cidade é muito mais do que o direito à moradia, é o direito a uma vida digna dentro de tudo aquilo que uma cidade pode proporcionar: escolas, postos de saúde, hospitais, praças, áreas verdes, água, esgoto, coleta de lixo, enfim, todos os equipamentos sociais e infraestrutura que possam tornar a vida urbana saudável e segura”. (BRAGA, R.; CARVALHO, P. F. de. Cidade: espaço da cidadania, 2004, p. 118). RESUMO O presente trabalho tem como objetivo geral analisar as cidades médias cearenses enquanto agentes fundamentais no processo de promoção do desenvolvimento regional em suas áreas de influência numa perspectiva multiescalar. A metodologia tem base bibliográfica, fazendo uso dos métodos exploratório e descritivo com análise quali-quantitativa. O período de análise compreende as duas décadas do século XXI. O lócus de pesquisa é o estado do Ceará. A classificação e o critério estabelecidos para definir as cidades médias compreendem aquelas que possuem entre 75.000 e 500.000 habitantes. Destarte, foram definidas 11 cidades, a saber: Canindé, Crateús, Crato, Iguatu, Itapipoca, Juazeiro do Norte, Quixadá, Quixeramobim, Russas, Sobral e Tianguá. Conclui-se, portanto, que as cidades médias analisadas têm mecanismos para promover a regionalização do desenvolvimento, sendo pontos estratégicos e, no caso de algumas delas, já consolidados enquanto espaços de promoção às políticas de desenvolvimento regional, cada qual com suas dimensões espaciais. Além disso, algumas pesquisas que antecedem o REGIC 2007 (2008) já atestavam que algumas dessas cidades poderiam ser caracterizadas como cidades médias. Palavras-chave: Ceará. Cidades Médias. Desenvolvimento Regional. Multiescalaridade.ABSTRACT The present work has as its general objective to analyze the medium-sized cities of Ceará as fundamental agents in the process of promoting regional development in their areas of influence from a multiscale perspective. The methodology has a bibliographical base, making use of exploratory and descriptive methods with quali-quantitative analysis. The period of analysis comprises the two decades of the 21st century. The research locus is the state of Ceará. The classification and the criteria established to define medium-sized cities comprise those with between 75,000 and 500,000 habitants. Thus, 11 cities were defined, namely: Canindé, Crateús, Crato, Iguatu, Itapipoca, Juazeiro do Norte, Quixadá, Quixeramobim, Russas, Sobral and Tianguá. It is concluded, therefore, that the analyzed medium-sized cities have mechanisms to promote the regionalization of development, being strategic points and, in the case of some of them, already consolidated as spaces for the promotion of regional development policies, each one with its spatial dimensions. Moreover, some researches that preceded the REGIC 2007 (2008) already attested that some of these cities could be characterized as medium-sized cities. Keywords: Ceará. Medium-Sized Cities. Regional Development. Multiscalarity. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Cidades médias cearenses definidas conforme classificação adotada ..................... 28 Figura 2: Evolução urbana na Antiguidade. ............................................................................ 34 Figura 3: Processo de implosão-explosão ............................................................................... 38 Figura 4: Modelo da Teoria da Localização Agrícola de Von Thünen ................................... 54 Figura 5: Localização ótima industrial através do modelo de triângulo locacional ................ 55 Figura 6: A Teoria dos Lugares Centrais de Christaller .......................................................... 56 Figura 7: O cone de Lösch....................................................................................................... 57 Figura 8: Modelos de Christaller (esquerda) e adaptação por Lösch (direita). ....................... 58 LISTA DE QUADROS Quadro 1: Região de Influência de Cidades para o Ceará segundo REGIC (2008)................ 23 Quadro 2: Regiões Geográficas Intermediárias e Regiões Geográficas Imediatas do Ceará .. 24 Quadro 3: Região de Influência de Cidades para o Ceará segundo REGIC (2020)................ 25 Quadro 4: A visão convencional das cidades médias (anos 1960): síntese dos principais aspectos ..................................................................................................................................... 87 Quadro 5: Evolução e significados do conceito de cidade média ........................................... 89 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Estimativas da população das cidades médias cearenses entre 75.000 e 500.000 em 2020 .......................................................................................................................................... 27 Tabela 2: Cidades médias no Brasil*: 1950/2020 ................................................................... 93 Tabela 3: Empregos totais nas cidades médias definidas no/do Ceará .................................... 98 Tabela 4: Participação relativa nos empregos totais nas cidades médias definidas no/do Ceará ................................................................................................................................................ 144 Tabela 5: Empregos por setores do IBGE nas cidades médias definidas do Ceará ............... 144 Tabela 6: Empregos por grau de escolaridade nas cidades médias definidas do Ceará ........ 146 Tabela 7: Empregos por faixa salarial nas cidades médias definidas no/do Ceará ............... 148 Tabela 8: Empregos por tamanho dos estabelecimentos nas cidades médias definidas do Ceará ....................................................................................................................................... 150 Tabela 9: PIB das cidades médias definidas no/do Ceará (2000/18)*, em R$ 1.000 ............ 151 Tabela 10: Valor das exportações das cidades médias definidas no/do Ceará (2000/20), em valor FOB (US$) .................................................................................................................... 152 Tabela 11: Valor das importações das cidades médias definidas no/do Ceará (2000/20), em valor FOB (US$) .................................................................................................................... 152 LISTA DE SIGLAS AP - Arranjo Populacional BNB - Banco do Nordeste do Brasil BM - Banco Mundial CVSF - Comissão do Vale do São Francisco CEPAL - Comissão Econômica para os Países da América Latina e Caribe CODENO - Conselho de Desenvolvimento do Nordeste CNDU - Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano CNPU - Conselho Nacional de Planejamento Urbano DNOCS - Departamento Nacional de Obras Contra as Secas FMDU - Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano FNDU - Fundo Nacional de Desenvolvimento Urbano GTDN - Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPECE - Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IAA - Instituto do Açúcar e do Álcool IES - Instituição de Ensino Superior IFCE - Instituto Federal do Ceará MHU - Ministério de Habitação e Desenvolvimento Urbano MICES - Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços NGE - Nova Geografia Econômica PIB - Produto Interno Bruto PLAMEG - Plano de Metas Governamentais PND - Plano Nacional de Desenvolvimento RAIS - Relação Anual de Informações Sociais ReCiMe - Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias REGIC - Região de Influência das Cidades RM Cariri – Região Metropolitana do Cariri RMF – Região Metropolitana de Fortaleza SM - Salário Mínimo SUDEC - Superintendência de Desenvolvimento do Estado do Ceará SUDENE - Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste UECE - Universidade Estadual do Ceará UFC - Universidade Federal do Ceará UFCA - Universidade Federal do Cariri UGI – União Geográfica Internacional UNESP - Universidade Estadual Paulista URCA - Universidade Regional do Cariri UVA - Universidade do Vale do Acaraú SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 16 2 METODOLOGIA ................................................................................................................ 21 2.1 CRITÉRIOS E CLASSIFICAÇÃO DE DIVISÕES REGIONAIS ................................. 22 2.2 CRITÉRIOS E CLASSIFICAÇÃO DAS CIDADES MÉDIAS: PROPOSTA METODOLÓGICA .............................................................................................................. 26 3 O URBANO E A CIDADE E A EVOLUÇÃO DA ECONOMIA REGIONAL ............ 30 3.1 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O URBANO E A CIDADE .............................. 30 3.1.1 A constituição do urbano ....................................................................................... 30 3.1.2 A cidade e suas versões .......................................................................................... 33 3.2 ECONOMIA, REGIÃO E DESENVOLVIMENTO ....................................................... 47 3.2.1 Da gênese à construção da economia regional ..................................................... 50 3.2.2 Espaço e economia: uma relação recente ............................................................. 59 4 GLOBALIZAÇÃO, INTERAÇÕES ESPACIAIS E AS (NOVAS) FUNÇÕES DAS CIDADESMÉDIAS ............................................................................................................... 69 5.1 GLOBALIZAÇÃO, INTERAÇÕES ESPACIAIS E MULTIESCALARIDADE .......... 70 5.2 CIDADES MÉDIAS: APONTAMENTOS TEÓRICOS E CONCEITUAIS .................. 80 5 DINÂMICA ECONÔMICA, CIDADES MÉDIAS E DESENVOLVIMENTO REGIONAL: UM OLHAR PARA O CEARÁ .................................................................... 95 5.1 MERCADO DE TRABALHO NO CEARÁ EM ANOS SELECIONADOS .................. 98 5.2 ESTRUTURA PRODUTIVA E A BALANÇA COMERCIAL .................................... 112 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 123 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 129 APÊNDICE ........................................................................................................................... 143 16 1 INTRODUÇÃO O urbano e a cidade, frutos das relações sociais, revelam-se importantes no debate espacial. Salienta-se, dessa forma, o papel do urbano na constituição da cidade enquanto espaço de produção e poder e como lócus da reprodução social. Assim, a urbanização acompanha a evolução da cidade em suas novas configurações historicamente consolidadas (LEFEBVRE, 2001, 2002, 2011; MONTE-MÓR, 2006a, 2006b). Nessa perspectiva, observa-se a complexidade do que é cidade e do que ela vem a ser sob a égide das transformações promovidas pelo ser humano e pelo capital. Sem previsões exatas sobre seu surgimento, admite-se que muitos períodos são mencionados pelos(as) pesquisadores(as), apesar de situarem a origem das cidades na região da Mesopotâmia. Enquanto expressão da produção social, a cidade tem passado por transformações relacionadas aos modos de produção. De espaço de reflexão e debate político na Grécia Antiga, a espaço-mercadoria; ambiente de acumulação e reprodução do capital, um espetáculo à economia mundial. Seu papel aumenta com o tempo, principalmente em meados do século XX, com as atenções às desigualdades regionais, o forte adensamento populacional e produtivo nos grandes centros urbanos mundiais e as mudanças tecnológicas e informacionais (CARLOS, 1997; SPÓSITO, 1988). Nesta lógica, a questão regional ganha corpo nos debates políticos e econômicos a partir da II Guerra Mundial, mais especificamente anos 1950, ressaltando, à luz das reconstruções dos países europeus e o Japão, as desigualdades entre e dentro das nações. Tal questão encontra-se na base dos estudos da Teoria Clássica da Localização, na constituição incipiente da Ciência Regional, nas Teorias de Desenvolvimento Regional pautadas nas Aglomerações Produtivas e na Nova Geografia Econômica (NGE), intensificadas, principalmente após o referido período (BENKO, 1999, 2002; MONASTÉRIO; CAVALCANTE, 2011). A evolução teórica no que concerne a questão regional suscitou o debate sobre as cidades à luz das novas estruturas socioespaciais e econômicas preconizadas a partir desse contexto e suas repercussões sobre os novos papeis auferidos por elas. Destarte, o desenvolvimento regional tornou-se um tema recorrente e buscado pelas nações desde os anos 1950 via planejamentos estratégicos. Assim, a questão regional e a cidade tomaram destaque nas políticas urbanas e econômicas. A relação entre esses objetos evidencia também a complexidade e as inúmeras formas e terminologias conceituais. Nesse 17 sentido, ela expressa a divisão socioespacial do trabalho e o aprofundamento da dinâmica espacial presente na identidade e interação sociais nas diversas escalas. Nesse contexto, a multiplicidade e complexidade das ações e funções que a cidade aufere ao longo do tempo deve-se ao forte protagonismo por ela adquirido nas diversas esferas da sociedade. A globalização trouxe transformações em larga escala e em toda parte. Corolário disto, a configuração espacial tomou complexidades significativas nas relações socioespaciais, modificando as relações entre as escalas geográficas. Com isso, os territórios nacionais transformam-se em espaços da economia internacional, movidos pelas relações sociais agora em escala mundial. A interação e/ou imbricação entre as escalas auxilia na compreensão do objeto enquanto sujeito que interage com o meio espacial, ou seja, evidencia o importante papel da multiescalaridade, da análise espacial sob a ótica de mais de uma escala (ALENTEJANO, 2001; BRANDÃO, 2004a, 2004b, 2012; BRENNER; JESSOP; JONES, 2018; SANTOS, 1994). Nessa perspectiva, a análise espacial assume variáveis complexas, indicando as relações mais profundas e difusas entre as escalas e suas novas configurações tais como glocalização e cidade global, por exemplo, enfatizando que o uso multidimensional enriquece as dimensões coletiva e individualmente. Assim, entender o papel da cidade média para o desenvolvimento de um espaço seja qual for o nível escalar (no caso em questão, de uma região), é destacar a importância da análise multiescalar como mecanismo essencial para entender as transformações espaciais (BRENNER; JESSOP; JONES, 2018). Não obstante, a formação das cidades no quadro atual “tem na historicidade da construção e organização espacial, em seus contextos regionais de localização, as marcas que explicam” além de sua localização, “[...] a sua atual importância e peso regional, a partir de suas funções e papeis, sobre um determinado número de outras cidades” (LIMA, 2019, p. 75), ou seja, o papel de comando regional exercido por algumas cidades. Essa interação hierárquica ocorre nas diversas escalas. As dinâmicas intra e/ou inter-regionais que se dão entre as cidades marcam uma miríade de interações econômicas, espaciais, culturais, intensificando as relações de mercado, movimento pendular, elementos de infraestrutura e a circulação contínua de produtos, serviços e insumos (PORTO, 2003; LIMA, 2019). Nesse quadro, a discussão sobre cidades médias apresenta historicamente uma evolução, que assume pelo menos duas visões. A primeira está vinculada a questão dimensional e populacional da cidade, frisando o papel intermediador entre os pequenos e grandes centros. A segunda ganha força a partir da II Guerra Mundial, na Europa, pela 18 preocupação em superar os desequilíbrios e promover o desenvolvimento regional (COSTA, 2000, 2002; LIMA; SILVEIRA, 2018). Considerando a heterogeneidade e complexidade que as redes urbanas auferiram, elas tomam diversas formas a partir de sua localização geográfica e função regional, as quais incorporam novas escalas, temáticas e métodos, descortinando uma série de contribuições e teorias, em decorrência de sua complexidade urbano-regional, além de sua diversidade inserida na lógica das diversas escalas (AMORIM FILHO, 2007; ARAÚJO; MOURA; DIAS, 2011). Na década de 1960, surgem as villes moyennes 1 e o aménagement du territoire 2 , as cidades médias francesas com o objetivo de melhor distribuir as atividades econômicas e garantir a eficácia econômica e atenuar o desequilíbrio regional 3 (AMORIM FILHO, 2007; AMORIM FILHO; RIGOTTI, 2003; AMORIM FILHO; SERRA, 2001; ANDRADE; SERRA, 2001; FERRÃO; HENRIQUES; NEVES, 1994). À luz das teorias da Ciência Regional, a cidade, sobretudo, a cidade média, se apresenta como uma boa opção para fomentar o desenvolvimento regional. No Brasil, a partir da Constituição Federal de 1988, as unidades federativas auferiram certa autonomia político-administrativa, as cidades tomam destaque e se abrem à concorrência em busca de espaço na economia mundial através da abertura comercial. As cidades médias se mostram bons mecanismos de desenvolvimento regional. O grande debate sobre elas versa em sua classificação. O aspecto quantitativo já perdeu sua primazia como característica principal. A inserção de outras característicasenriqueceu o debate e modernizou a ideia de cidade média. Tanto que algumas cidades como Picos-PI e Pau dos Ferros-RN apresentam aspectos para além de suas características demográficas, configurando-as enquanto centros de influência regional, evidenciando a presença de cidades com aportes menores de 100.000 habitantes que tem potenciais forças de comando regional. Todavia, será que outras realidades no Brasil, como no caso cearense, também apresentam cidades médias caracterizadas não mais pelo adjetivo quantitativo delineado pelas instituições competentes, isto é, pelo interstício populacional apregoado pelo IBGE? Portanto, o debate sobre cidades, sobretudo cidades médias, está longe de se encerrar e isso alimenta a discussão 1 Cidades médias. 2 Planejamento urbano e regional. 3 Mesmo diante de diversas contribuições acerca do tema estudado, a escola francesa criou diversas bases para as cidades chamadas de médias e que, destarte, se configuram como a principal influência nos estudos sobre esta temática no Brasil, lembrando nomes como Amorim Filho a partir de 1973 (AMORA; COSTA, 2007; AMORIM FILHO, 2007). 19 e a interlocução multidisciplinares sobre este tema tão atual e recorrente (DANTAS; CLEMENTINO, 2013; LIMA, 2019). Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo geral analisar as cidades médias cearenses enquanto agentes fundamentais no processo de promoção do desenvolvimento regional em suas áreas de influência numa perspectiva multiescalar. Os objetivos versam sobre apresentar concisamente a constituição da cidade mediante diversas perspectivas teóricas, enquanto construção humana histórica e social, além de não descartar a dinâmica intraurbana desse processo; apresentar o debate histórico-conceitual sobre espaço e região e sua relação com a economia; evidenciar a importância da multiescalaridade na formação e transformação dos espaços; caracterizar e definir as cidades médias no Ceará; discorrer sobre o papel de comando regional que as cidades médias exercem ou não sobre suas áreas de influência regional pela análise quali-quantitativa; e, por fim, analisar as cidades médias cearenses previamente definidas e seus papeis na promoção do desenvolvimento regional e se exercem funções de comando regional. Os objetivos elencados têm como papel primordial subsidiar conceitos referentes às cidades médias, que a antecedem e que evidenciam seu importante papel na constituição urbana e regional contemporânea. Analisando conceitual, histórica e multidisciplinarmente, a cidade, o urbano, a economia regional e as interações espaciais conformam um arcabouço significativo para melhor apresentar o papel de influência inter-regional que determinadas cidades com determinadas características que serão elencadas, exercem sob suas áreas contíguas (ou não). A metodologia pautar-se-á em pesquisa bibliográfica, fomentando o diálogo entre os principais autores das linhas de pesquisa sobre cidades, cidades médias, desenvolvimento regional e interações espaciais numa perspectiva multiescalar. Far-se-á uso dos métodos exploratório e descritivo (GIL, 2008; MARCONI; LAKATOS, 2003). O presente estudo tem como lócus de pesquisa as cidades médias cearenses previamente definidas. O recorte temporal de análise proposto segue as primeiras décadas do século XXI. Ademais, a análise é quali-quantitativa, no que tange as cidades cearenses analisadas a partir de microdados de instituições e agências credenciadas traçando links entre teoria e empiria. A ideia pauta-se na tentativa de delimitar, se constatada o comando regional, o nível de influência regional (microrregional, mesorregional ou maior do que estas). A estrutura da dissertação, excetuando a introdução e as considerações finais, será da seguinte forma: apresenta-se a metodologia através dos critérios e classificação das divisões regionais e das cidades médias, bem como a proposta para defini-las. O capítulo seguinte traz 20 breves considerações sobre o urbano e a cidade, uma análise sucinta sobre os conceitos de urbano e de cidade que auxiliem na construção inicial e contextualização dos capítulos seguintes deste trabalho, sobretudo para os conceitos e discussões sobre cidade e dinâmica intraurbana e se faz um resgate da evolução teórico-metodológica da economia regional, analisando os conceitos de espaço e região e sua relação com a economia e o desenvolvimento/desigualdade regional; o quarto capítulo preconiza a importância de se pensar o espaço e as interações socioespaciais na perspectiva multiescalar, evidenciando a importância da multiescalaridade na formação e transformação dos espaços e se faz um resgate histórico e conceitual sobre cidade média, caracterizando-as e definindo-as; por fim, fazem-se breves considerações acerca da formação da rede urbana do estado do Ceará, explicando a formação econômico-espacial das cidades cearenses, e análise sobre o papel de comando regional que as cidades médias exercem ou não sobre suas áreas de influência regional através da análise quali-quantitativa. 21 2 METODOLOGIA A metodologia pautar-se-á em pesquisa bibliográfica sobre a temática aqui abordada, fomentando o diálogo entre os principais autores das linhas de pesquisa sobre cidades, cidades médias, rede urbana, desenvolvimento regional e interações espaciais numa perspectiva multiescalar. Far-se-á uso dos métodos exploratório e descritivo, buscando, a partir de princípios reconhecidos como verdadeiros e abrangentes, chegar a novas conclusões; questionar conceitos e ideias buscando entender, delimitar, de forma mais apropriada o objeto de pesquisa (GIL, 2008). Além disso, pretende-se analisar as transformações da cidade, enquanto objetos em movimento, pois as coisas são sempre analisadas na qualidade de objetos em movimento; contínuos movimentos de transformação e desenvolvimento, ou seja, “passam por uma mudança ininterrupta de devir e decadência”, até que há de chegar o desenvolvimento progressivo (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 101). Portanto, o debate sobre cidades, sobretudo cidades médias, está longe de se encerrar e isso alimenta a discussão e a interlocução multidisciplinares sobre este tema tão atual e recorrente. Ademais, a análise é quali-quantitativa, no que tange as cidades cearenses analisadas a partir de microdados de instituições e agências credenciadas, tais como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), a Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), o Comex Stat do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MICES) dentre outros, traçando links entre teoria e empiria, na “obtenção de um sentido mais amplo para os dados analisados, o que se faz mediante sua ligação com conhecimentos disponíveis, derivados principalmente de teorias” (GIL, 2008, p. 178). A ideia pauta-se na tentativa de delimitar, se constatada o comando regional, o nível de influência regional (microrregional, mesorregional ou maior do que estas). O presente estudo tem como lócus de pesquisa as cidades médias cearenses definidas a partir do critério de classificação proposto na segunda subseção deste capítulo. O recorte temporal de análise proposto segue as primeiras décadas do século XXI, período em que as cidades médias ganham maior enfoque nas estruturas econômica e política no Brasil. Sobre a cidade e o urbano, a ideia é buscar uma apresentação concisa das diversas dimensões conceituais sobre as suas constituições. Para as cidades médias e o desenvolvimento regional, propõe-se entender sua formação teórica e material e sua 22 importância recente ao desenvolvimento observando a heterogeneidadeespacial e suas diversas aplicações à cidade a partir de estudos importantes atinentes a relação cidade- desenvolvimento regional. Quanto à escala de análise, dar-se-á ênfase na escala regional, buscando compreender o nível de influência regional exercido pelas cidades médias cearenses definidas. Todavia, a análise intraurbana será incorporada ao trabalho, entendendo sua importância, pois na construção de um objeto de estudo complexo como a cidade média, é necessário que se resgate também as dinâmicas e relações intraurbanas (ARAÚJO; MOURA; DIAS, 2011). 2.1 CRITÉRIOS E CLASSIFICAÇÃO DE DIVISÕES REGIONAIS Os estudos sobre rede urbana e classificações regionais remontam aos anos 1960. O IBGE elaborou diversas classificações de divisões regionais. Entre elas têm-se as Zonas Fisiográficas (1940/60), as Microrregiões e Mesorregiões Homogêneas (1968 e 1976, respectivamente) e as Microrregiões e Mesorregiões Geográficas (1990) (IBGE, 2017). Ademais, diversos artigos foram publicados na Revista Brasileira de Geografia tratando da regionalização do país, bem como trabalhos realizados por outras instituições de pesquisa como o IPEA, com a série Caracterização e Tendências da Rede Urbana do Brasil, dividida em seis volumes. Outra contribuição do IBGE está para o documento Região de Influência das Cidades (REGIC) 4 , com cinco publicações: 1972, 1987, 2000, 2008 e 2020 (IBGE, 1967a, 1967b, 1967c, 1972, 1987; REGIC, 2008, 2020). Enfatizando os dois últimos trabalhos, em 2008, o IBGE lançou esse documento objetivando ilustrar as cidades e seus níveis de influência regional sobre outras cidades. Estas foram classificadas em cinco grandes níveis, os quais, por sua vez, foram subdivididos em dois ou três subníveis, a saber: Metrópole, Capital Regional, Centro Sub-regional, Centro de Zona e Centro Local. O estudo tem como metodologia a classificação dos centros e delimitação de suas áreas de atuação, privilegiando a função de gestão do território 5 (REGIC, 2008). Além disso, em complementaridade e preparação para o trabalho seguinte, em 2020, o IBGE lançou mais dois trabalhos, Divisão Urbano-Regional (2013) e Redes e Fluxos do 4 Objetiva identificar e analisar a rede urbana brasileira, estabelecendo a hierarquia dos centros urbanos e as regiões de influência das cidades. 5 Centro de gestão de território significa uma cidade onde estão localizados os órgãos do Estado e sedes de empresas que, direta ou indiretamente, influenciam sob o controle da cidade mediante as empresas nela sediadas (REGIC, 2008). 23 Território: Gestão do Território (2014), os quais traziam novas definições e classificações urbano-regionais e no que concerne à gestão do território. As contribuições foram identificações de três escalas de referência regional, sendo Regiões Ampliadas de Articulação Urbana, Regiões Intermediárias de Articulação Urbana e Regiões Imediatas de Articulação Urbana (IBGE, 2013) e na condução da gestão em diversas esferas (pública, privada e territorial) (IBGE, 2014). Para o Ceará, objeto de estudo deste trabalho, a divisão via REGIC (2008) ficou da seguinte forma: Quadro 1: Região de Influência de Cidades para o Ceará segundo REGIC (2008) CENTROS NÍVEIS DE HIERARQUIA DOS CENTROS CENTROS CEARENSES Metrópole Metrópole Fortaleza Capital Regional Capitais Regionais C Juazeiro do Norte-Crato- Barbalha 6 e Sobral Centro Sub-Regional Centros Sub-regionais A Crateús, Iguatu e Quixadá Centros Sub-regionais B Itapipoca Centro de Zona Centros de Zona A Acaraú, Aracati, Canindé, Icó, Limoeiro do Norte e Russas Centros de Zona B Brejo Santo, Camocim, Cruz, Guaraciaba do Norte, Ipu, Iracema, Itapagé, Jaguaribe, São Benedito, Senador Pompeu e Tauá Centro Local - Demais 158 cidades Fonte: Elaborado a partir do REGIC (2008). Conforme quadro acima, observa-se que as cidades com maior dinamismo, desconsiderando a metrópole Fortaleza, são Crato-Juazeiro do Norte-Barbalha e Sobral como Capitais Regionais C, sendo estes os principais polos regionais do estado. Ademais, tem-se como Capital Sub-regional A, Crateús, Iguatu e Quixadá, e como Capital Sub-regional B, Itapipoca. 6 Mesmo não sendo considerada uma cidade média pela classificação adotada pelo IBGE, Barbalha assume tal papel, pois a conurbação Juazeiro do Norte-Crato-Barbalha apresenta uma consonância estrutural intrínseca às suas economias que se integram e interagem espacialmente. 24 Além destes, o IBGE, em 2017, lançou um documento online no qual preconiza as novas classificações para os limites e divisões regionais, chamado de “Novas Divisões Regionais do Brasil: Regiões Geográficas Imediatas e Regiões Geográficas Intermediárias”. Além da conhecida divisão por grandes regiões (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul), há também outras divisões, tais como as microrregiões e mesorregiões. Na lógica deste trabalho, estas duas são substituídas pelas novas nomenclaturas regionais: Regiões Geográficas Imediatas e Regiões Geográficas Intermediárias, respectivamente. As primeiras são estruturadas mediante centros urbanos limítrofes no suprimento de necessidades imediatas à população, como o acesso a bens de consumo, serviços e emprego. Elas são limitadas a uma estrutura formada entre cinco e 25 municípios e formada por uma população mínima de 50 mil habitantes. As segundas relacionam-se às Regiões Geográficas Intermediárias via um polo urbano superior, o qual apresenta funções urbanas complexas. A despeito das mudanças nas nomenclaturas e na composição das novas áreas regionais, este é um passo que leva tempo e que estas modificações serão absorvidas paulatinamente pela pesquisa e pela academia. Para o Ceará, a divisão é marcada pela existência de seis Regiões Geográficas Intermediárias (ante as sete mesorregiões) e 18 Regiões Geográficas Imediatas (ante as 33 microrregiões). Quadro 2: Regiões Geográficas Intermediárias e Regiões Geográficas Imediatas do Ceará Regiões Geográficas Intermediárias Regiões Geográficas Imediatas Fortaleza Fortaleza, Itapipoca, Redenção-Acarape, Canindé e Itapagé Quixadá Quixadá, Russas-Limoeiro do Norte e Aracati Iguatu Iguatu e Icó Juazeiro do Norte Juazeiro do Norte e Brejo Santo Crateús Crateús e Tauá Sobral Sobral, São Benedito-Ipu-Guaraciaba do Norte-Tianguá, Acaraú e Camocim Fonte: Elaboração a partir de dados do IBGE (2017). 25 Fazendo análise comparativa dos quadros expostos, percebe-se a concentração em seis grandes cidades, destacando algumas delas que até então tinham pouca influência regional (Quixadá) e outras que sequer figuravam entre as mais dinâmicas (Iguatu). Já a mais recente contribuição para os estudos urbanos e regionais, a REGIC 2018, publicada em 2020, atualiza a rede urbana nacional. Traz as novas configurações espaciais dos centros regionais. Mantem-se as classificações utilizadas em 2008, porém, com melhoramento metodológico. Para o Ceará, há mudanças significativas, conforme Quadro 3: Quadro 3: Região de Influência de Cidades para o Ceará segundo REGIC (2020) CENTROS NÍVEIS DE HIERARQUIA DOS CENTROS ARRANJOS POPULACIONAIS Metrópole Metrópole C Fortaleza Capital Regional Capital Regional B Juazeiro do Norte-Crato- Barbalha 7 Capital Regional C Sobral Centro Sub-Regional Centro Sub-regional A Iguatu Centros Sub-regionais B Aracati, Baturité, Camocim, Crateús, Itapajé, Itapipoca, Limoeiro do Norte, Pacajus, Quixadá, Russas e Tianguá Centro de Zona Centros de Zona A Brejo Santo, Horizonte, Icó, Quixeramobim, São Benedito e São Gonçalo do Amarante Centros de Zona B Acopiara, Canindé, Guaraciaba do Norte, Ipu, Mauriti, Mombaça, Santa Quitéria e Tauá Centro Local - Demais 155 cidades Fonte: Elaborado a partir doREGIC (2020). Conforme os anos se passaram desde o último documento REGIC, em 2008, observam-se algumas mudanças. Fortaleza aparece como Metrópole C 8 . O Arranjo Populacional (AP) Juazeiro do Norte-Crato-Barbalha torna-se Capital Regional B, elevando sua posição de centro de influência regional dentro do estado. Sobral permanece como Capital Regional C. Iguatu permanece como Centro Sub-regional A. Os núcleos que antes 7 A despeito de referenciar somente a Juazeiro do Norte, a conurbação Juazeiro do Norte-Crato-Barbalha continua em evidência pela dinâmica compartilhada e integrada e pela integração espacial e econômica destes municípios, cidades estas centro econômico da Região Metropolitana do Cariri (RM Cariri). 8 Ao consultar o REGIC 2018 (2020), pode-se evidenciar três classificações para as metrópoles, em A, B e C. 26 apresentavam a mesma classificação deste, Crateús e Quixadá, caem para Centro Sub-regional B, ao lado de Itapipoca. Este nível de influência regional é o que mais se destaca pela quantidade de novos membros que ascendem a ela. Este nível só tinha um representante em 2008 (Itapipoca). Nos Centros de Zona destacam-se Brejo Santo, Ipu e São Benedito, que sobem um nível; Quixeramobim, Horizonte e São Gonçalo do Amarante, que passam de Centros Locais a Centros de Zona A. Amora e Costa (2007) já destacavam, antes do REGIC 2007 (2008), algumas cidades que para a realidade cearense poderiam ser caracterizadas como cidades médias, entre elas Quixadá, Crateús, Tianguá, Russas e Quixeramobim. Esse movimento de importância central, no que concerne a hierarquia urbana e regional do estado, pode ser explicado pela tendência da inserção do Ceará nas novas formas de exploração da heterogeneidade territorial promovidas pelo regime de acumulação capitalista contemporâneo em nível global. As implicações disso na rede urbana do estado convergem à permanência e reforço das polarizações tradicionais: “metrópole, por se beneficiar mais diretamente do processo de mundialização da economia e; especialização crescente de cidades médias” (MORAIS; MACEDO, 2014, p. 57-58). Tomando o segundo ponto, as cidades médias acentuam suas interações espaciais com outros centros e apresentam crescente especialização econômica. Ademais, esse movimento envolve também centros de zona, o que explica a importância regional de outros centros além dos que são destacados e o aumento na quantidade de centros de influência regional no estado entre os REGICs (2008, 2020). Diante do exposto, observa-se a ampliação no número de cidades (26 para 29) que exercem certa influência regional com intensidades variadas. 2.2 CRITÉRIOS E CLASSIFICAÇÃO DAS CIDADES MÉDIAS: PROPOSTA METODOLÓGICA O presente trabalho faz uso da classificação para as cidades médias entre 75.000 e 500.000 habitantes, diferentemente das utilizadas por outros autores como Amorim Filho e Serra (2001), Andrade e Serra (2001), Branco (2006, 2007), Corrêa (2007), Spósito et al. (2007), e instituições como o IBGE a partir de trabalhos como o REGIC (2008, 2020) e a publicação Divisão Regional do Brasil em Regiões Geográficas Imediatas e Regiões Geográficas Intermediárias (2017). Destacando a classificação do IBGE, que salienta a importância das cidades médias, sobretudo no que se refere às funcionalidades urbanas e regionais que elas exercem, mas que, não abdica do interstício populacional entre 100 mil e 27 500 mil habitantes, sendo a principal modificação proposta por este trabalho, atestando que possíveis variações neste critério (salientando esta variação para o limite inferior) possam ser adotadas paulatinamente nos futuros trabalhos sobre esta forma de cidade. A justificativa para uso desta classificação parte do pressuposto de que a questão populacional não mais norteia uma cidade a apresentar funções e papeis complexos de intermediação ou centros regionais para além da região da metrópole. Cidades fora do intervalo populacional proposto pelo IBGE, como os casos de Pau dos Ferros-RN 9 (DANTAS; CLEMENTINO, 2013) e Picos-PI 10 (LIMA, 2019) pelo dinamismo regional alcançado nas últimas décadas podem ser classificadas como cidades médias. Assim, busca-se observar se esta realidade está presente no estado do Ceará, analisando as cidades médias definidas através de uma proposta de classificação, dispostas conforme Tabela 1 e Figura 1. Tabela 1: Estimativas da população das cidades médias cearenses entre 75.000 e 500.000 em 2020 Município Pop. (2020) Canindé 77.244 Crateús 75.159 Crato 133.031 Iguatu 103.074 Itapipoca 130.539 Juazeiro do Norte 276.264 Quixadá 88.321 Quixeramobim 81.778 Russas 78.882 Sobral 210.711 Tianguá 76.537 Fonte: Elaboração feita pelo autor a partir de dados do Sidra/IBGE (2020). 9 Sua dinâmica e ampliação da rede urbana são evidenciadas pela interiorização do ensino superior e descentralização dos serviços de saúde, os quais atraíram investimentos privados nas suas respectivas áreas (DANTAS; CLEMENTINO, 2013). 10 Num sentido mais complexo, Lima (2019) apresenta Picos-PI enquanto cidade que auferiu novos papeis; papeis estes complexos na lógica capitalista, de modo que, a partir do conceito denominal de Cidade de Comando Regional apresentado pelo autor, não no sentido de uma hierarquia entre cidades, de comando, mas de competência, ou seja, algumas cidades “podem promover capacidades de integração e/ou de desenvolvimento regional, ao considerar suas capacidades produtivas, funcionalidades diversas e potencialidades regionais” (LIMA, 2019, p. 272). 28 Figura 1: Cidades médias cearenses definidas conforme classificação adotada Fonte: Elaboração própria com a utilização do software QGis. Portanto, tenta-se responder a seguinte questão: as cidades médias cearenses promovem o desenvolvimento regional de suas respectivas áreas, enquanto agentes fundamentais desse processo? A classificação baseia-se nos pressupostos de trabalhos do IBGE quanto às cidades e seu papel e influência regionais. Tem-se como hipótese norteadora a possibilidade de cidades com números populacionais inferiores, terem capacidade suficiente de exercer as mesmas funções que uma cidade média em locais menos desenvolvidos (AMORIM FILHO; BUENO; ABREU, 1982; BESSA; BORGES; SOARES, 2002; FRANÇA, 2007; OLIVEIRA; SOARES, 2014; STEINBERGER; BRUNA, 2001). Em consonância, Araújo, Moura e Dias (2011) destacam que, no contexto específico das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o intervalo populacional entre 50.000 e 100.000 habitantes podem se configurar como cidades médias devido às características do sistema urbano-regional. A ideia é entender, a partir da estrutura produtiva e outros fatores dessas cidades, como a dinâmica econômica, sua influência urbano-regional e econômica, promovem o 29 desenvolvimento regional. Além disso, a despeito de Caucaia (365.212), Maracanaú (229.458), Maranguape (130.346), Pacatuba (84.554) e Aquiraz (80.935) contemplarem o critério aqui estabelecido, não estarão no escopo deste estudo, pois estão inseridas na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), que apresenta uma forte concentração da estrutura produtiva do Estado e, em detrimento disto, não exercem características intrínsecas a cidade média. Destacando o aspecto da localização espacial, a cidade média pode estar sob a influência, direta ou indiretamente, de uma metrópole nacional ou regional (aqui, no caso, Fortaleza, ‘Metrópole C’), o que, em alguns casos até conurbadas, essas cidades se especializam visando atender às demandas da metrópole, o que, por sua vez, lhe confere maiores chances de crescimento e desenvolvimento. Tais fatores indicam a singularidade das cidades médias em seus respectivos contextos (BESSA; BORGES;SOARES, 2002; FRANÇA, 2007; OLIVEIRA; SOARES, 2014; STEINBERGER; BRUNA, 2001). 30 3 O URBANO E A CIDADE E A EVOLUÇÃO DA ECONOMIA REGIONAL 3.1 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O URBANO E A CIDADE O urbano enquanto fenômeno socioespacial e a cidade enquanto expressão material, ambos frutos das relações sociais, revelam-se importantes no debate urbano e regional e significativos para atingir o objetivo aqui proposto. Ademais, neste contexto, analisar as transformações intraurbanas revela possíveis desdobramentos sobre as relações interurbanas contemporâneas, ou seja, a relação da cidade com as diversas escalas (local, regional, nacional e global). 3.1.1 A constituição do urbano Etimologicamente, o urbano deriva do latim, “urbanum (arado), vem o sentido de povoação, a forma física da ocupação do espaço de vida delimitado pelo sulco do arado dos bois sagrados que marcava o território da produção e de vida dos romanos” (MONTE-MÓR, 2006b, p. 11). Configura-se como processo espacial e temporal, pois se estende no espaço que modifica e se desenvolve no tempo, tomando forma, tornando-se predominante da prática e da história (LEFEBVRE, 2002). As relações entre urbano e rural, antes delimitadas e já estabelecidas (KIELING; SILVEIRA, 2015; WIRTH, 1979), apresentam atualmente, uma relação difusa, contínua e sem delimitações precisas. As relações do urbano com o espaço transcendem o território, englobam amplas regiões vizinhas, se integram e se estendem além dos territórios limítrofes e distantes. No urbano, a terra não é instrumento de produção imediata, como ocorre no campo. A reprodução do espaço urbano não ocorre apenas através da incorporação de novas áreas, mas também pelo adensamento e verticalização (CARLOS, 1997; MONTE-MÓR, 2006b). A relação entre o urbano e a cidade está associada ao capitalismo industrial, ou melhor, à sociedade capitalista industrial, com a urbanização presente a partir da indústria, com a subsunção do rural ao urbano, com este sendo o centro das ações e relações sociais de produção no coração citadino, ou seja, pressupõe um conjunto de manifestações da cidade sobre o campo (LEFEBVRE, 2002; LENCIONI, 2008; MONTE-MÓR, 2006a, 2006b). Nesse sentido, a cidade expressa à divisão socioespacial do trabalho e o aprofundamento na conformação de uma comunidade que se estende ao urbano onde se dá a completa dominação do campo. Sendo assim, a indústria é fator importante para passagem 31 efetiva da cidade à urbanização, da produção ao espaço de poder. Nesse contexto, o lócus de excedente (a cidade), do poder e da reprodução social, a práxis urbana, antes restrita à cidade, repolitizou todo o espaço social (LENCIONI, 2008; MONTE-MÓR, 2006a). Ademais, a despeito do urbano se assentar nas relações socioespaciais com a indústria, as intervenções urbanas com interesse científico se iniciam no século XIX, tais como Barcelona, com Ildefons Cerdá (1854) e Paris com o Barão Georges-Eugène Haussmann (meados do século XIX). Paralelamente a isso, os ditames e influências das teorias sociais sobre a cidade e organização do espaço urbano foram se desenvolvendo. Seja pela tradicional influência da Escola Ecológica de Chicago 11 com suas abordagens culturais e ecológicas para compreender a cidade e o urbano diante da explosão urbana da cidade de Chicago, seja pelas ações da economia regional e urbana advindas das ricas contribuições da Ciência Regional a partir de Walter Isard (HALL, 2005; MONASTERIO; CAVALCANTE, 2011; MONTE- MÓR, 2006b) 12 . O urbano se apresenta como espaço no qual se processa duas visões polares: “enquanto lugar da reprodução da força de trabalho e das relações sociais no cotidiano que se expressam através do consumo; e [...] enquanto lugar da reprodução das relações sociais de produção na perspectiva da reprodução dos bens de produção” (LIMONAD, 1999, p. 82) que se aglutinam conforme o estágio de aperfeiçoamento das forças produtivas ligadas, sobretudo, ao desenvolvimento do meio técnico-científico. Durante certo tempo, essas esferas de produção foram concatenadas em um mesmo espaço. Entretanto, atualmente, tais esferas são colocadas em espacialidades diferentes (CASTELLS; HALL, 1994; LIMONAD, 1999, 2019). A superação da dicotomia urbano e rural suscita um novo debate às cidades mediante novas demandas de planejamento urbano e regional, além de novas atribuições a elas incumbidas pelo novo paradigma capitalista (CAPEL, 1975). As contradições não se situam mais entre cidade e campo, urbano e rural; situam-se no interior do fenômeno urbano: “entre a centralidade do poder e as outras formas de centralidade, entre o centro riqueza-poder e as periferias, entre a integração e a segregação” (LEFEBVRE, 2002, p. 155). 11 A ideia de Ecologia aplicada por Ezra Park, um dos principais expoentes da Escola de Ecologia Urbana de Chicago, advém do conceito por ele criado de ‘área natural’, a qual assumia que “as forças competitivas naturais tendem a produzir um equilíbrio também ‘natural’ de adaptação social ao ambiente urbano” (MONTE-MÓR, 2006b, p. 5) envolvendo costumes, tradições, processos vitais daqueles que a compõem (PARK, 1979). 12 A Escola de Chicago se desenvolve como um constructo para as investigações das disposições intraurbanas ao passo que a Ciência Regional direciona-se aos fenômenos do espaço regional numa perspectiva mais ampla. Frisado no início deste capítulo, evidenciar os pressupostos relacionados as disposições intraurbanas serve de subsídios significativos para entender a cidade e suas relações numa perspectiva multiescalar a partir das sua dinâmica e relações intraurbanas. 32 Assim, o urbano não produz à maneira da agricultura e/ou indústria, ele cria; se impõe em escala mundial (ARAÚJO, 2012). Assim funciona a práxis urbana enquanto tal reúne e transforma aquilo que reúne (ordens e desordens, mensagens e códigos do passado); não apresenta ter nenhum conteúdo específico, mas tudo a ele vem e nele vive (LEFEBVRE, 2002); assume qualidades e significados distintos historicamente, processado em espaços pré- existentes, pré-produzidos e pré-organizados, resultado constante da (re)estruturação do espaço de reprodução das relações sociais de produção, da força de trabalho e da vida cotidiana, através das relações que os homens travam entre si e a natureza (LIMONAD, 2019). Destarte, ressalta-se o papel do urbano na constituição da cidade como espaço de produção e poder; como lócus da reprodução social da geração de demandas e o espaço de lutas políticas dos estratos sociais que reivindicam acesso aos meios de consumo coletivo e inserção no mercado de trabalho (BRANDÃO, 2004b). A partir da indústria, o urbano toma- se como espaço privilegiado de reprodução, acumulação e ampliação do capital. Assim, este se apresenta como um terceiro elemento, opositor, da (antiga) dicotomia cidade-campo, “a manifestação material e socioespacial da sociedade urbano-industrial contemporânea, estendida, virtualmente, por todo o espaço social” (MONTE-MÓR, 2006a, p. 14). Dessa forma, o urbano se estende virtualmente por todo o espaço social, fruto de implosões e explosões que engendram os movimentos da supremacia do urbano na cidade, ou seja, o tecido urbano prolifera, estende-se, corroi os resíduos de vida agrária (LEFEBVRE, 2002); “[...] é permeado por relações de poder, relações de dominação e subordinação, que canalizam a diferenciação regional e o regionalismo, a territorialidade e o desenvolvimento desigual, e as rotinas e revoluções, em muitas escalas diferentes” (SOJA, 1993, p. 186). As transformações, que historicamente se deram, permitindo a estruturação do modo de produção capitalista, constituem consequências contundentes do próprio processo de urbanização. A cidade nunca fora um espaço tão importante, e nem a urbanizaçãoum processo tão expressivo e extenso a nível mundial, como a partir do capitalismo (SPOSITO, 1988, p. 30). As preocupações com a rede de cidades, a hierarquia urbana e o diálogo entre estas se tornaram contínuos, articulando as dimensões urbanas e regionais. Assim, a questão regional toma caminhos emergentes, ofuscando o problema urbano da esfera social e da organização intraurbana para o aspecto econômico, tendo como principais focos programáticos o espaço regional e nacional e a organização interurbana (MONTE-MÓR, 2006b). 33 3.1.2 A cidade e suas versões Esta seção tem como objetivo descrever sucintamente as fases da cidade no contexto capitalista, enquanto construção humana histórica e social (CARLOS, 1997): a cidade comercial, a cidade industrial e a cidade contemporânea, estão incluídas nas lógicas do neoliberalismo e do planejamento estratégico, entendendo sua formação e constituição como espaço urbano de relações sociais, mas também como lócus de produção, reprodução e circulação do capital, ou seja, como unidade capitalista. Pensar a cidade é algo instigante e, ao mesmo tempo, desafiador. Ela não é um fato novo (GOITIA, 1982). São diversas as interpretações que pensam sobre ela, o que justifica sua complexidade teórico-empírica para seu entendimento (RAMOS, 2015), além das funções especializadas que a mesma adquire histórica e espacialmente, configurando-se em um polígono de mundos sociais pela identificação social daqueles(as) que a compõem (WIRTH, 1979), ou seja, deve-se considerar todos os determinantes (econômicos, sociais, políticos e culturais) que, no passar dos anos, a constroi, a transforma e a reconstroi. Portanto, o espaço é história e, destarte, a cidade de hoje é corolário cumulativo das cidades de antes, isto é, transformadas, demolidas, reerguidas, produzidas pelas transformações sociais através dos tempos (SPOSITO, 1988). Não se tem ao certo quando, de fato, originaram-se as primeiras cidades. No momento em que o homem deixa de ser nômade, fixando-se no solo como agricultor foi dado o primeiro passo para a formação das cidades. Um segundo momento pode ser salientado, o qual as pessoas iniciam a dominação de técnicas menos anacrônicas que lhes permitem extrair o excedente agrícola (CARLOS, 1997). Todavia, muitos são os períodos mencionados pelos(as) pesquisadores(as), apesar de situarem a origem das cidades em regiões parecidas. Carlos (1997) indica para 5.000 anos a.C. o surgimento das primeiras civilizações que pode nomear de cidade, a exemplo de Kish, Ur e Uruk, civilizações sumérias situadas nas Baixa e Média Mesopotâmias. Sposito (1988) cita seu aparecimento na Mesopotâmia, por volta do ano 3.500 anos a.C., na região dos rios Tigre e Eufrates, posteriormente surgindo próximas a rios como o Vale do Rio Nilo (3.100 anos a.C.), no Vale do Rio Indo (2.500 anos a.C.) e no rio Amarelo (1.550 anos a.C.) 13 . Braga e Carvalho (2004) situam o surgimento das primeiras cidades na Mesopotâmia. Doravante, se desenvolveram no norte do continente africano (Vale 13 Uma explicação para criar cidades contíguas aos rios advém de uma motivação natural, pois tais cidades estão localizadas em regiões predominantemente semiáridas. Embora o processo que as criou baseie-se em aspectos políticos e sociais (dominação), as condições naturais foram os determinantes espaciais, visto que, até então, o desenvolvimento técnico da humanidade não permitia superar estes empecilhos (SPOSITO, 1988). 34 do rio Nilo) e pela Ásia (Índia e China). Posteriormente expandiram-se pela região do Mediterrâneo e Europa, sob as civilizações Grega e Romana. No novo mundo, as cidades se desenvolveram na América central há mais de 2000 anos, sob as civilizações Maia e Asteca. Os autores sintetizam esta evolução das cidades através da figura 2. Figura 2: Evolução urbana na Antiguidade. Fonte: Braga e Carvalho (2004) A cidade enquanto expressão da produção social tem passado por transformações relacionadas aos modos de produção. Exemplos disso têm-se as cidades da Grécia Antiga e aquelas dominadas pelo Império Romano. Em ambos os casos as cidades eram dominadas pelo aspecto político, o qual sobrepujava o aspecto espacial no que concerne o conceito de cidade da época. A despeito da ainda anacrônica formação social e urbana, as cidades antigas demonstravam certo nível de desenvolvimento pela complexidade social engendrada seja pelo aspecto político ou bélico, ou ambos, em seus tempos e, de fato, revelou-se importante na formação das cidades posteriores, sobretudo pela sua complexidade estrutural. As cidades da Grécia Antiga, por exemplo, já apresentavam vestígios de uma divisão social do trabalho. Ademais, ao Império Romano atribui-se a descontinuidade ‘espontânea’ da urbanização visto que as cidades foram moldadas para permitir a hegemonia política romana e ampliar a divisão interurbana do trabalho, já que o território romano expande-se e cria um forte papel comercial aos novos espaços conquistados (ARAÚJO, 2012; LEFEBVRE, 2011; ROLNIK, 1995; SPOSITO, 1988). 35 Na Idade Média, que segue o curso da história após a derrocada do Império Romano no século V, apresenta-se o feudalismo como organização econômica e social dominante, eminentemente rural e com uma parca formação e relação socioespaciais entre os citadinos. Apesar de ser considerado um período sem grandes evoluções, houve avanços tecnológicos como o aperfeiçoamento na agricultura e no artesanato. Além disso, diversas cidades surgiram da prática foris-burgus. 14 Engels (2010), em seu livro “A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra”, relata tais relações, de uma sociedade escravocrata e rural a um proletariado e prematuro sistema urbano. Esse movimento além de evidenciar as transformações socioespaciais, também evidencia o engajamento inicial da classe trabalhadora em reivindicar direitos a partir de movimentos sociais, ou seja, tal época, situada nos idos da primeira Revolução Industrial, é “expressão máxima de todos os movimentos sociais e a mais visível manifestação de nossa miséria social” (ENGELS, 2010, p. 41), visto que a situação de grande parte da população era precária, subumana. Atinente à questão urbana pode-se afirmar que o renascimento urbano (proveniente do Império Romano) teve como base inicial o aglomerado medieval que, por sua vez, não possuía caráter urbano. Ademais, cidades nasciam em espaços até então inabitados, houve registros de cidades romanas reconstruídas. Essa renovação da urbanização e consequentemente das cidades foi possível graças à reativação do comércio, o qual criou bases à constituição do modo de produção capitalista e, concomitantemente, o declínio do sistema feudal. Nesse sentido, houve diversas modificações no sistema econômico. Revoluções comerciais e urbanas, complexificando as relações de troca, a divisão do trabalho e o estabelecimento de uma vida social organizada com a substituição das praças de reflexão e debate pelos mercados e mercadorias agora inseridos na lógica citadina mercantil, a qual preconiza a troca comercial como função urbana fazendo assim surgir uma nova estrutura do espaço urbano. Destarte, os espaços comerciais disputam a centralidade urbana com os espaços políticos, administrativos (as instituições) (LEFEBVRE, 2002). Com isso, as terras perderam seu caráter autossuficiente, pois até então sua função era de suprir as necessidades do feudo e de seu senhor. Com a ascensão do Absolutismo, a urbanização recebe um forte reforço, pois a ordem capitalista impôs-se à ordem feudal e derrubou seu monopólio de alimentos, transformando a terra em mercadoria. Ademais, com a necessidade de expansão, o capital mercantilizava o 14 Neste período, as fortalezas garantiam aospoucos mercantes, proteção a seus bens. Todavia, algumas destas fortalezas não conseguiam mais contê-los, engendrando o chamado foris-burgus, ou seja, burgos adjacentes a ela (SPOSITO, 1988). 36 processo artesanal urbano e estimulava a produção manufatureira, além, também, do desenvolvimento marítimo, promovendo navegações e, assim, expansão colonial e criação de novos monopólios comerciais. Esta ação reforçou a economia mercantil que disseminou a urbanização ao mundo colonial a partir do século XV. Com a ampliação do comércio, o desenvolvimento de uma economia monetária que transformou a relação das pessoas com as mercadorias e o próprio crescimento das cidades configuraram-se em movimentos históricos que fortaleceram um espaço fora do escopo feudal, ou seja, a corrosão da instituição servil, pois permitia aos camponeses romper às amarras que os prendiam a economia feudal (SPOSITO, 1988). Portanto, o capitalismo surge primitivamente sob a égide do comércio, nova centralidade econômica da cidade. A morfologia arquitetural e urbana é modificada dando lugar ao encontro de pessoas não mais para refletir e debater, mas ao estabelecimento de trocas. A intensificação destas amplia a riqueza e a circulação de mais trocas para além das fronteiras da cidade. Cria-se maior fluxo de capital em circulação o que, por sua vez, instiga na criação de instituições financeiras (bancos) e novos mercados (ARAÚJO, 2012). Tendo como passo inicial o processo de mercantilização das cidades como fase inicial em passagem para o urbano, a segunda transformação e efetiva dar-se pela entrada da indústria na cidade. Neste cenário, o campo, até então espaço de insumos para a cidade, passa a depender do parque industrial para sua própria produção, ferramentas e alimentos e bens de consumo básicos. Esse movimento identifica a subsunção do campo à cidade (LEFEBVRE, 2002). Ocorrem, assim, implosões e explosões que criam os movimentos da supremacia do urbano na cidade, colocando-a a frente do campo como lócus privilegiado de reprodução, acumulação e ampliação do capital (MONTE-MÓR, 2006a). O planejamento começa, a partir daí, a ganhar corpo na organização espacial da cidade. Todavia os planejamentos realizados não obtiveram o sucesso requerido. A reação das ideias para o espaço urbano no século XX surge como contrapartida as do século anterior, 37 estas sem muito êxito. Exemplo disso há a Cidade-Jardim 15 de Ebenezer Howard, em 1902, e a Cidade Radiosa 16 de Le Corbusier, em 1933 (HALL, 2005). Todavia, a indústria nascente se instalava em espaços contíguos às fontes de energias, matérias-primas, meios de transporte, reservas de trabalho (LEFEBVRE, 2011), ou seja, ocorreu um movimento de implosão-explosão na cidade. Primeiro, a industrialização negou a centralidade na cidade (implosão), pois, o conteúdo político e comercial perde sua potência social. Posteriormente, ocorre a explosão da cidade ou projeção de fragmentos da malha urbana disjuntos por uma vasta região (explosão) 17 . Este duplo processo de implosão e explosão acarretou na criação de uma anticidade, isto é, a negação da cidade que a antecede, a cidade política-comercial (ARAÚJO, 2012; LEFEBVRE, 2001, 2002, 2011). Destarte, esvazia-se a qualidade dos costumes e das relações cotidianas, aplainando-as a uma condição quantitativa, por exemplo, “as festas outrora ricas de significações se tornaram uma repetição de signos destinados ao consumo. É como se a cidade fosse compelida a se transformar em uma empresa” (ARAÚJO, 2012, p. 135). Com a quebra do sistema feudal, o sistema urbano se abre. A cidade cria algo além do que ela representa em três planos: econômico (indústria), social (propriedade mobiliária) e político (Estado) (LEFEBVRE, 2001). 15 O conceito de Cidade-Jardim é formado no ambiente britânico do último quartel do século XIX, como solução para o crescimento das grandes cidades. Apresentava-se como um diferente modelo de organização, tendo como precursor Ebenezer Howard. A Cidade-Jardim traduzia-se no conjunto de moradias em extensos espaços arborizados. Assim, ela teria “um ambiente dominado por superfícies arborizadas, plantadas e ajardinadas que permitiriam o máximo acesso virtual e físico a todos os espaços” (LAMAS, 2004, p. 312), pensando na evolução das ideias sobre esta forma de cidade já aplicada em Letchworth, Hampstead e Welwyn, na Inglaterra. Trata-se, neste momento, da quebra de paradigma quanto à cidade tradicional, indo em direção à cidade moderna (HALL, 2005; LAMAS, 2004). 16 A Cidade Radiosa de Le Corbusier, mostrada nos anos 1930, era uma cidade verde com solo livre; construções enormes e pontuais, assentadas em pilotis (de origem francesa, é um sistema construtivo em que uma edificação é sustentada através de uma grelha de pilares em seu pavimento térreo) que libertavam o solo para os peões e prolongavam os espaços verdes sob as construções; unidades de habitação que incluíam os equipamentos elementares. A unidade de habitação, para Le Corbusier, é fundamental na constituição da unidade-base de organização e composição da Cidade Radiosa. Este modelo citadino influencia até os anos 1970 (HALL, 2005; LAMAS, 2004). 17 Gera-se uma enorme concentração na realidade urbana, de pessoas, de atividade, de riqueza, de coisas e de objetos, de instrumentos, de meios e de pensamento (implosão) e, ao atingir o apogeu da concentração, ocorre a projeção de fragmentos múltiplos e disjuntos, a saber: periferias, subúrbios, residências secundárias, satélites etc. (explosão) (LEFEBVRE, 2002). 38 Figura 3: Processo de implosão-explosão Fonte: Lefebvre (2002, p. 27) Nesse sentido, as cidades, até então presas às raízes locais e regionais, veem, a partir da industrialização, a ampliação de suas funções e relações não somente com os espaços adjacentes, mas também com os espaços distantes. Dessa forma, reforçou o papel da divisão social do trabalho em âmbito espacial, a divisão territorial do trabalho, ou seja, os lugares se especializaram funcionalmente. Esta divisão última tornou-se mais efetiva e possível a partir do desenvolvimento das comunicações e dos transportes (SPOSITO, 1988). O movimento de transição do mercantilismo da Idade Média para o capitalismo industrial dar-se pela Revolução Industrial do século XVIII com a ascensão do liberalismo econômico e do movimento filosófico-social cujas doutrinas constituíram a base ideológica do novo desenvolvimento industrial e capitalista (laissez-faire, laissez-passer) materializados por Adam Smith, Jeremy Bentham e Stuart Mill. Houve grande explosão do crescimento industrial e da urbanização. Com a divisão social do trabalho e o desenvolvimento dos transportes, as indústrias, antes localizadas ao longo dos rios, com a invenção da máquina a vapor de James Watt, em 1775, poderiam se concentrar em locais determinados, o que auxiliou no surgimento das cidades industriais. As situações iniciais das cidades industriais eram catastróficas pelas más condições de saneamento das slums 18 acarretando em uma taxa de mortalidade infantil elevadíssima chegando aos anos de 1870 a 260 óbitos para cada 1.000 nascimentos. Tal realidade se modifica paulatinamente com mudanças nas condições 18 Favelas. Cortiços. 39 sanitárias da classe de trabalhadores. Um dos primeiros a adotar medidas sanitárias favoráveis 19 foi Robert Owen nos anos 1810 (ENGELS, 2010; GOITIA, 1982). A indústria transformou regiões longínquas em mercados potenciais. A fábrica, expressão material incipiente do movimento industrial, nasce antes dela, de uma forma e natureza diferenciadas pautada numa produção artesanal pouco coordenada. Com a industrialização de fato e sua intrínseca relação com o processo vertiginoso de urbanização,produtos poderiam ser vendidos a preços menores e em larga escala. O conceito de fábrica anteriormente apregoado se esvai. Dessa forma, mais e mais pessoas se alinham ao mercado de trabalho industrial (além da desleal concorrência com este setor de produção) (ROLNIK, 1995). A busca pela homogeneização do consumo foi um aspecto ligado a esse sistema produtivo em sua hegemonia no capitalismo do século XX. O urbano se prolifera vertiginosamente, absorvendo o rural, pequenas e médias cidades e espaços até então inabitados pelo capital (CARLOS, 1997). Nesse sentido, a cidade se estabelece enquanto espaço no qual a população local satisfaz parcialmente suas necessidades essenciais de demanda diária no mercado local e outra parte essencial satisfaz-se mediante localidades e/ou habitantes dos arredores que produzem ou adquirem para disponibilizar no mercado. Ela se consolida como um local de mercado, ou seja, como centro econômico do estabelecimento com um mercado local e uma especialização permanente da produção econômica (WEBER, 1979). A cidade industrial é espetáculo, mas também é detestável. As pressões demográficas e a insuficiência das políticas públicas no urbano desestabilizam as relações socioespaciais, criando camadas sociais, espaços subutilizados e precários movidos pelo caos urbano levando, consequentemente, as metamorfoses da cidade. Essa aglomeração exacerbada em grandes cidades levou a formação das metrópoles ou cidades globais como espaço produtivo e nexo dos fluxos de mercadorias e pessoas pelo mundo. Esse contexto se inscreve na lógica de transição do capital produtivo para o capital especulativo, para uma cidade pós-industrial (CARLOS, 1997; MONGIN, 2009; ROLNIK, 1995). Os anos dourados da era industrial (1930/70) convertem-se em anos tenebrosos e instáveis que culminam em novas alternativas de planejamento econômico e socioespacial. A indústria dominante e coativa converte-se em realidade dominada no “curso de uma crise 19 A ideia de favorecimento colocada neste contexto significa favorecimento de uma classe em detrimento de outra, ou seja, visa esclarecer que a melhoria das condições sanitárias garante aos trabalhadores mais anos de vida e vigor físico por mais tempo, o que, por sua vez, garante ao mercado de trabalho (leia-se capitalistas) mais fator trabalho disponível para expansão da cidade e, principalmente, do lucro. 40 profunda, às custas de uma enorme confusão, na qual o passado e o possível, o melhor e o pior se misturam” (LEFEBVRE, 2002, p. 27). Nessa perspectiva, a cidade se metamorfoseia, toma formas diferenciadas, e tais mudanças não são acompanhadas ou expressadas pelos estudiosos. Destarte, a palavra ‘cidade’ atravessou séculos sem alterações, mesmo sendo um objeto em perpétua e contínua mudança, sem conseguir expressar as transformações constantes de algo tão mutável, mantem-se sua nomenclatura e a ela adiciona adjetivos que permita compreender suas características, funções, partes e transformações, tais como cidade satélite, cidade horizontal, cidade verticalizada, cidade mundial, cidade moderna, cidade administrativa, cidade interiorana, cidade informal; além dos adjetivos aos novos aglomerados metropolitanos que surgem na nova fase da acumulação capitalista, cidades globais, metrópole, megalópole, megametrópole, metápole (LENCIONI, 2008; ROCHEFORT, 2002). Entretanto, antes de falar da nova concepção do capital e suas repercussões sobre o espaço, logo, na cidade, cabe frisar as contribuições marxistas à luz deste novo movimento que surge nos anos 1970/80. Materializado por diversos autores adeptos às ideias de Karl Marx, como Lefebvre, Gottdiener, Castells (temporariamente), Harvey, Massey, dentre outros, estes evocam a questão urbana e a questão do espaço sob a perspectiva marxista, mesmo que Marx nunca tenha dado a adequada atenção ao espaço e a cidade, tentando absorver suas ideias e formular uma hipótese de viés marxista para a formação da cidade e evidenciar a urbanização capitalista 20 (GOTTDIENER, 1993; HARVEY, 2012a; LEFEBVRE, 2001, 2002, 2011). A vertente marxista opõe-se as ideias da Escola de Chicago. Para esta defende-se que a cidade é o resultado de movimentos espontâneos e naturais, um corpo de costumes e tradições, envolvido nos processos vitais das pessoas que as compõem, não somente um mecanismo físico de construção artificial (PARK, 1979). A cidade é caracterizada por contatos mais secundários, ou seja, os contatos da cidade ocorrem face a face, mas são, não obstante, impessoais, superficiais, transitórios e segmentários (WIRTH, 1979) apregoando a atitude blasé (SIMMEL, 1979). Para aquela, “o espaço da cidade é determinado pelas forças produtivas e pelas relações de produção que se originam delas” (RAMOS, 2015, p. 304). A cidade, nesse sentido, advém de um consumo coletivo, no qual as relações capitalistas se desenvolvem, ou seja, a acumulação do/pelo capital requer um ambiente que garanta a expansão dos meios de produção e controle do fator trabalho. Dessa forma, o Estado assume papel significativo nesse processo como um agente submisso às ações do capital. Assim, a 20 ‘Movimento calculado’ pelo capital no processo de espraiamento de acumulação capitalista, diminuindo os caminhos de sua reprodução e ampliando seu raio de atuação (HARVEY, 2012a). 41 cidade é um ambiente construído que surge da mobilização, extração e concentração geográfica de vultosa quantidade de mais-valia, isto é, o ambiente erguido é conformado, sobretudo pelo capital intervencionista materializado pelo Estado (GOTTDIENER, 1993; HARVEY, 1977; RAMOS, 2015). A natureza atuante do Estado se faz latente, segundo esta perspectiva teórica do espaço e da cidade, pois o papel desempenhado por ele nos processos espaciais urbanos fica explícito, seja direta (através da produção e distribuição de bens e serviços de natureza coletiva) ou indiretamente (através das legislações de uso do solo e códigos de obras, do mercado de capitais imobiliários etc.). Destarte, o Estado, através de suas políticas urbanas, está apenas exercendo seu papel: manter a segregação que é funcional, e, além disso, garantir os modos pelos quais a ordem urbana se expande. Em consonância, Camargo (1976 apud RAMOS, 2015) afirma que, na realidade brasileira, os movimentos desse agente sempre seguiram o setor privado e investimentos públicos a serviço da dinâmica especulativa. Além deste autor, Hall (2005) chama atenção para a nova função da cidade e do Estado que, segundo ele, na visão marxista, é formada pelo capital em busca do lucro, alterando o uso do solo e modelos de atividade. E é pelas instabilidades atuais do sistema que o socorro advém do Estado, trabalhando a favor do capital, corrigindo os desequilíbrios no mercado. Nesse sentido, o planejamento urbano leva a problemas contínuos, ou seja, a resolução de um problema gera outro. Tal planejamento envolvido pelas ações do Estado apresenta viés político na tomada de decisão gerando as intervenções públicas têm caráter desigual (HALL, 2005). Além dessas contribuições, Lojkine (1981) atesta que a cidade é corolário de uma dupla socialização, ou seja, advém das condições gerais de produção e do espaço. Esta visão evidencia diversas cidades da atualidade pelos seus atributos urbanos e suas posições de espaços importantes na expansão do capital (incluindo nesta lógica as cidades médias). Considerando o exposto sobre a vertente teórica marxista da cidade pode-se dizer que a cidade seria o espaço que serve de suporte ao desenvolvimento do modo de produção capitalista, sendo ela uma forma de socialização capitalista das forças produtivas; sede e ambiente da reprodução das classes, das atividades de produção, distribuição, troca e consumo (BRANDÃO, 2004b).
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