Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA REGIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE - PRODEMA CONHECIMENTO ECOLÓGICO LOCAL E BIOLOGIA REPRODUTIVA DO LAGARTO-DE-FOLHIÇO Coleodactylus natalensis FREIRE, 1999, EM ÁREA PROTEGIDA DE MATA ATLÂNTICA: SUBSÍDIOS À CONSERVAÇÃO DESTA ESPÉCIE AMEAÇADA PARA A COTONICULTURA FAMILIAR SUSTENTÁVEL A BIOTECNOLOGIA VEGETAL COMO ALTERNATIVA PARA A COTONICULTURA FAMILIAR SUSTENTÁVEL A BIOTECNOLOGIA VEGETAL COMO ALTER PARA A COTONICULTURA FAMILIAR SUSTENTÁVELAAA HOLDA RAMOS DA SILVA 2022 Natal – RN Brasil Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Leopoldo Nelson - Centro de Biociências - CB Silva, Holda Ramos da. Conhecimento ecológico local e biologia reprodutiva do Lagarto-de-folhiço Coleodactylus natalensis Freire, 1999, em área protegida da Mata Atlântica: subsídios à conservação desta espécie ameaçada / Holda Ramos da Silva. - 2022. 87 f.: il. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Biociências, Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/PRODEMA. Natal/RN, 2022. Orientadora: Profa. Dra. Eliza Maria Xavier Freire. Coorientador: Prof. Dr. Raul Fernandes Dantas de Sales. 1. Conhecimento ecológico local - Dissertação. 2. Parques urbanos - Dissertação. 3. Reprodução de lagartos - Dissertação. 4. Etnoconservação - Dissertação. I. Freire, Eliza Maria Xavier. II. Sales, Raul Fernandes Dantas de. III. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. IV. Título. RN/UF/BSCB CDU 574 Elaborado por KATIA REJANE DA SILVA - CRB-15/351 2 Holda Ramos da Silva CONHECIMENTO ECOLÓGICO LOCAL E BIOLOGIA REPRODUTIVA DO LAGARTO-DE-FOLHIÇO Coleodactylus natalensis FREIRE, 1999, EM ÁREA PROTEGIDA DE MATA ATLÂNTICA: SUBSÍDIOS À CONSERVAÇÃO DESTA ESPÉCIE AMEAÇADA SUSTENTÁVEL A BIOTECNOLOGIA VEGETAL COMO ALTERNATIVA PARA A COTONICULTURA FAMILIAR SUSTENTÁVEL A BIOTECNOLOGIA VEGETAL COMO ALTER PARA A COTONICULTURA FAMILIAR SUSTENTÁVELAAA Dissertação apresentada ao Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PRODEMA/UFRN), como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre. Orientadora: Profª. Drª. Eliza Maria Xavier Freire Coorientador: Prof. Dr. Raul Fernandes Dantas de Sales 2022 Natal – RN Brasil 3 HOLDA RAMOS DA SILVA Dissertação submetida ao Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PRODEMA/UFRN), como requisito para obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Aprovado em: BANCA EXAMINADORA: ____________________________________________ Dra. Eliza Maria Xavier Freire (UFRN) Orientadora/Presidente _______________________________________________ Dr(a). Kallyne Machado Bonifácio Universidade Federal da Paraíba (UFPB/PRODEMA) Membro interno _____________________________________________ Dr. Daniel Cunha Passos Universidade Federal Rural do Semi-árido (UFERSA) Membro externo 4 AGRADECIMENTOS Agradeço à CAPES pelo financiamento da bolsa de mestrado. Aos gestores do Parque da Cidade e demais funcionários que cordialmente me ofereceram todo o suporte necessário para a realização da pesquisa. À minha orientadora e coorientador, Drs. Eliza Freire e Raul Sales pelo acolhimento que recebi no LabHerpeto desde antes da seleção do mestrado. Sem vocês, esse trabalho não teria sido tão empolgante e importante para o meu crescimento profissional. Serei para sempre grata. À equipe do LabHerpeto que incansavelmente esteve presente em todos os 12 trabalhos de campo e me recebeu não só como companheira de trabalho, mas como amiga. Sem Olyana, Thawaan, Daniel, Dezão, Letícia, Duda e Lucas, os campos não teriam sido tão prazerosos e os almoços pós campo no Zumbi bar menos saborosos. Agradeço em especial a Joaquim Bruno e minha irmã Évila Ramos, que genuinamente se propuseram a me ajudar quando eu já estava muito cansada; vocês foram igualmente importantes para esse trabalho se realizar. Ao meu irmão Gustavo, por me ajudar incasavelmente na construção dos mapas, meu eterno agradecimento. Essa dissertação foi construída em um período caótico com a Pandemia do Covid-19. Contudo, tive a sorte de várias pessoas me receberem em suas casas para me promover um lugar pacífico para estudo. Por isso, aqui vai o agradecimento ao meu irmão Gustavo Henrique, Tia Kika, Tia Mirella e Tia Liliane, por terem me oferecido um espaço em suas casas para a escrita dessa dissertação. Acolhimento é suporte e vocês me ofereceram isso. Especialmente, quero agradecer à Dra. Francisca Ramos (Tia Kika), que além de me acolher na sua casa em Açu, me acompanhou em noites de maratonas de estudos, conversas e Nescafé no seu aconchegante escritório. Você me foi uma amiga, uma inspiração acadêmica e de vida. Sem saber, em pequenas conversas e companhia, você me deu força para ter chegado até aqui. Nos momentos amargos, você me lembrou do doce que é ser uma pesquisadora. Sem você esse trabalho teria perdido o encanto. Por isso e muito mais, te amo. 5 Às minhas amigas Raynara e Sâmara por acreditarem em mim, muitas vezes mais do que eu acreditei; vocês são minhas musas inspiradoras e deram a força motriz para eu ter começado essa jornada. Ao meu pai e minha mãe, que sempre colocou meus estudos como meu maior presente de vida. Hoje, só sou Mestre por causa de vocês e por vocês. Te amo I would like to thank my husband to be, Benjamin. I can’t remember one hard path that I took along these two years that you weren’t there cheering for me. You were many times my arms and legs. You gave me unconditional support and love, and for that, I would never be able to thank you enough. I love you. Por fim, quero agradecer à Maria Auxiliadora de Souza, que sozinha criou cinco filhas negras, as alimentou em muitas vezes das plantações de alface no sertão. Cinco filhas, as quais hoje, chamo quatro de tias e uma de mãe. Sem você e sua base forte, não teríamos mais uma mulher negra Mestre no mundo. Você foi a matriarca que nos deu o suporte pra chegar onde chegamos, nunca me tire das suas orações. Te amo, amo e amo. 6 RESUMO A dificuldade de inserção de comunidade local nas estratégias de conservação, é amplamente discutida, porém é ainda mais preocupante quando se refere a espécies de pequeno tamanho corporal e de coloração críptica. Nesse contexto, levando em consideração que o lagarto-de-folhiço é uma espécie oficialmente ameaçada, endêmica de fragmentos da Mata atlântica potiguar, críptica e com pequeno tamanho corporal, utilizá-la como modelo para entender quais os conhecimentos das pessoas sobre espécies de pequeno tamanho corporal pode constituir dados de relevância global que embasam estratégias de etnoconservação. Nesse cenário, este estudo teve como objetivos analisar o Conhecimento ecológico local (CEL) dos funcionários de um Parque urbano no município de Natal/RN sobre a fauna de répteis, especialmente sobre o lagarto Coleodactylus natalensis, espécie-bandeira desta área protegida e ameaçada de extinção, bem como investigar o ciclo reprodutivo desta espécie, em prol de sua conservação e da biodiversidade associada. Os dados sobre CEL foram coletados através de questionários semiestruturados aplicados para 39 funcionários do Parque sobre conservação, herpetofauna, e ecologia do lagartinho-de-folhiço. Os funcionários demonstraram conhecimentos mais específicos sobre a flora local do que sobre fauna, e reconhecem a importância do parque para conservação das espécies. Os funcionários com maior tempo de trabalho no parque possuem maior CEL sobre a espécie críptica e ameaçada de extinção, C. natalensis; este dado é de grande relevância, pois não é o padrão observado em outrosestudos de CEL. Também se destacaram as ameaças às quais parques urbanos estão submetidos, inclusive as diferenças entre estes e os parques rurais. As coletas dos dados reprodutivos de C. natalensis foram efetuadas durante excursões mensais, de janeiro a dezembro de 2021, totalizando 12 meses de amostragem, sendo que em todos os meses os ovos foram monitorados com 15 dias de intervalo. Os resultados demonstram ocorrer reprodução contínua em C. natalensis, com ninhada fixa de um ovo. O conjunto dos dados obtidos constitui subsídio importante e valioso para o monitoramento e conservação da espécie ameaçada, bem como para a gestão dessa Unidade de conservação, além de corroborar a relevância do CEL para a conservação de espécies ameaçadas na perspectiva da etnoconservação. Palavras-Chave: Conhecimento ecológico local; parques urbanos; reprodução de lagartos; Etnoconservação. 7 ABSTRACT ECOLOGY AND LOCAL ECOLOGICAL KNOWLEDGE OF THE ENDANGERED LEAFLE LIZARD, Coleodactylus natalensis FREIRE, 1999, IN A PROTECTED AREA OF NORTHERN BRAZILIAN ATLANTIC FOREST The difficulty of including the local community in conservation strategies is widely discussed, but it is even more worrying when it comes to species of small body size and cryptic coloration. In this context, taking into account that the leaf lizard is an officially threatened species, endemic to fragments of the Potiguar Atlantic Forest, cryptic and with small body size, to use it as a model to understand what people's knowledge of small body sized species, can provide globally relevant data that support ethnoconservation strategies. In this scenario, this study aimed to analyze the local ecological knowledge (LEK) of the employees of an urban park in the city of Natal/RN on the reptile fauna, especially on the lizard Coleodactylus natalensis, a flagship species of this protected and threatened area of extinction, as well as investigating the reproductive cycle of this species, in favor of its conservation and associated biodiversity. Data on LEK were collected through semi-structured questionnaires applied to 39 park employees, on conservation, herpetofauna, and ecology of the leaf lizard. The employees demonstrated more specific knowledge about the local flora than about the fauna, and they recognize the importance of the park for the conservation of the species. Employees with longer working time in the park have higher LEK on the cryptic and endangered species, C. natalensis; this data is of great relevance, as it is not the pattern observed in other LEK studies. The threats to which urban parks are subjected were also highlighted, including the differences between these and rural parks. The collections of reproductive data of C. natalensis were carried out during monthly excursions, from January to December 2021, totaling 12 months of sampling, and in all months the eggs were monitored 15 days apart. The results demonstrate that continuous reproduction occurs in C. natalensis, with a fixed litter of one egg. The set of data obtained constitutes an important and valuable subsidy for the monitoring and conservation of the threatened species, as well as for the management of this Conservation Unit, in addition to corroborating the relevance of the LEK for the conservation of threatened species from the perspective of ethnoconservation. 8 KEYWORDS: Local ecological knowledge; lizard reproduction; urban parks; Ethnoconservation 9 LISTA DE FIGURAS INTRODUÇÃO GERAL E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Figura 1 - Indivíduo de Coleodactylus natalensis (macho) no folhiço do Parque da cidade Dom Nivaldo Monte........................................................................................................15 Figura 2 - Localização do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, destacando a área do Centro de Experimentos e Pesquisas da Mata Atlântica – CEPEMA, onde foi realizado o estudo sobre biologia reprodutiva....................................................................................22 Figura 3 - Fotos dos animais apresentados aos funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte durante as entrevistas para identificação de quais deles são répteis. 1 = tatu-peba (Euphractus sexcinctus); 2 = jabuti-piranga (Chelonoidis carbonaria); 3 = jiboia (Boa constrictor); 4 = minhoca (Annelida); 5 = perereca-do-chaco (Boana raniceps); 6 = lagartixa (Tropidurus hispidus); 7 = embuá/piolho-de-cobra (Diplopoda); 8 = cobra-cipó (Chironius flavolineatus)........................................................................24 Figura 4 - Fotos dos animais apresentados aos funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte durante as entrevistas para identificação de qual deles era o lagarto de folhiço, Coleodactylus natalensis. 1 = Vanzosaura multiscutata; 2 = Brasiliscincus heathi; 3 = Hemidactylus mabouia; 4 = Salvator merianae; 5 = Coleodactylus natalensis.........................................................................................................................25 Figura 5 - Fêmea de Coleodactylus natalensis contendo ovo visível a partir do ventre...............................................................................................................................27 Figura 6 - Ovo de Coleodactylus natalensis encontrado em uma das excursões, sob o folhiço..............................................................................................................................27 Figura 7 - Banderinha usada para a identificação do local onde foram encontrados ovos de Coleodactylys natalensis, durante o trabalho de campo...............................................................................................................................28 Capítulo 1 - Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida. Figura 1 - Valores médios (± 1 DP) dos escores de conhecimento ecológico local sobre o ambiente natural do Parque e os répteis entre as pessoas que reconheceram e as que 10 https://www.google.com/search?bih=770&biw=1707&rlz=1C1CHZL_pt-BRBR910BR910&hl=pt-BR&sxsrf=AOaemvIuWpc1kP5M7ZgwH3o_Frng7kzi_g:1633378765442&q=Chelonoidis&stick=H4sIAAAAAAAAAONgVuLSz9U3SDc1zytOW8TK7ZyRmpOfl5-ZklkMAGd_yR0cAAAA&sa=X&ved=2ahUKEwi13uOIyrHzAhWdJLkGHU5lACIQmxMoAXoECEsQAw não reconheceram a espécie Coleodactylus natalensis dentre as imagens de lagartos apresentadas.....................................................................................................................46 Capítulo 2 - Biologia reprodutiva do lagarto ameaçado Coleodactylus natalensis Freire, 1999 (Squamata: Sphaerodactylidae) em remanescente da Mata atlântica setentrional brasileira. Figura 1 – Localização do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, destacando a área do Centro de Experimentos e Pesquisas da Mata Atlântica – CEPEMA, onde foi realizado o estudo sobre biologia reprodutiva. Fonte: Autores...........................................................62 Figura 2 – Dados abióticos de precipitação e temperatura média mensais no município de Natal no ano de 2021, e média histórica de precipitação. Fonte: EMPARN e INMET.............................................................................................................................63 Figura 3 – Número de indivíduos e de ovos de Coleodactylus natalensis registrados mensalmente no ano de 2021 no Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, Natal, Estado do Rio Grande do Norte, nordeste do Brasil.....................................................................66 Figura 4 – Frequências mensais de atividade reprodutiva das fêmeas de Coleodactylus natalensis no ano de 2021 no Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, Natal, Estado do Rio Grande do Norte, nordeste do Brasil. Números acima das barras indicam os tamanhos amostrais..........................................................................................................................67 Figura 5 - Proporçõesmensais de adultos (CRC > 17 mm), juvenis (CRC entre 13 e 17 mm) e neonatos (CRC < 13 mm) de Coleodactylus natalensis no ano de 2021 no Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, Natal, Estado do Rio Grande do Norte, nordeste do Brasil...............................................................................................................................67 11 LISTA DE TABELAS INTRODUÇÃO GERAL E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Tabela 1 - Pontuações atribuídas para as perguntas sobre a fauna e flora local e sobre os répteis durante as entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte...............................................................................................................................29 Tabela 2 - Pontuações atribuídas para as perguntas sobre atributos ecológicos de Coleodactylus natalensis durante as entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte. Estas perguntas foram realizadas somente com os participantes que reconheceram adequadamente a espécie por fotografia...................................................30 Capítulo 1 - Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida Tabela 1 - Cognição comparada sobre os répteis, elaborada a partir de entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, realizadas em julho e agosto de 2021.................................................................................................................................42 Tabela 2 - Quadro de cognição comparada sobre a ecologia de Coleodactylus natalensis obtido através de entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, realizadas em julho e agosto de 2021................................................................................43 Tabela 3 - Valores médios (± 1 DP) dos escores de conhecimento ecológico local sobre o ambiente natural do Parque e sobre os répteis (amostra total); e sobre a espécie de lagarto Coleodactylus natalensis (amostra de pessoas que reconheceram a espécie), ambos por tipo de ascendência (rural x urbana) e tempo de trabalho no Parque..............................................................................................................................45 Tabela 4 – Números absolutos e percentuais de pessoas que reconheceram Coleodactylus natalensis, nas diferentes categorias relacionadas ao tempo de trabalho no Parque e tipode ascendência (rural ou urbana).............................................................................................................................47 12 SUMÁRIO INTRODUÇÃO GERAL E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ....................................14 Etnoconservação e Conhecimento Ecológico Local (CEL) – bases conceituais e relevâncias ......................................................................................................................17 Reprodução e estratégias reprodutivas: relevantes para conservação de espécies..........18 METODOLOGIA GERAL ............................................................................................21 Área de estudo.................................................................................................................21 Procedimentos metodológicos ........................................................................................22 - Conhecimento ecológico local – aplicação dos questionários......................................22 - Amostragem sobre a biologia reprodutiva de Coleodactylus natalensis......................26 Análise dos dados............................................................................................................28 - Conhecimento ecológico local......................................................................................28 - Biologia reprodutiva de Coleodactylus natalensis........................................................31 CAPÍTULO 1 - Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida ..........................32 Introdução........................................................................................................................36 Material e métodos..........................................................................................................38 Resultados........................................................................................................................40 Discussão.........................................................................................................................47 Conclusão........................................................................................................................50 Agradecimentos...............................................................................................................51 Referências......................................................................................................................51 CAPÍTULO 2 - Biologia reprodutiva do lagarto ameaçado Coleodactylus natalensis Freire, 1999 (Squamata: Sphaerodactylidae) em remanescente da Mata atlântica setentrional brasileira.......................................................................................................58 INTRODUÇÃO...............................................................................................................59 MATERIAL E MÉTODOS.............................................................................................61 Área de estudo.................................................................................................................61 Coleta e análise de dados.................................................................................................63 RESULTADOS...............................................................................................................65 DISCUSSÃO...................................................................................................................68 REFERÊNCIAS..............................................................................................................69 CONSIDERAÇÕES FINAIS DA DISSERTAÇÃO.......................................................72 13 REFERÊNCIAS DA PARTE INTRODUTÓRIA DA DISSERTAÇÃO.......................73 Apêndice 1 – Questionário..............................................................................................79 Apêndice 2 - Material suplementar do artigo submetido referente ao capítulo 1............81 Anexo 1 – Comprovante de submissão de Artigo...........................................................86 Anexo 2 – Autorização da CEUA...................................................................................88 14 INTRODUÇÃO GERAL E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A vida na terra está passando pela sexta extinção em massa, que está colocando em risco toda a biodiversidade mundial (CEBALLOS; EHRLICH; RAVEN, 2020). As interferências antropogênicas que causam perda e fragmentação de habitats compreendem um dos principais fatores que influenciam declínios populacionais de espécies (GIBBONS et al., 2000; PRIMACK; RODRIGUES, 2001; RODRIGUES, 2005). Conhecer a história natural das espécies e investir em estratégias de conservação junto à sociedade é um primeiro e grande passo para a conservação efetiva, porém quando se trata de espécies de répteis de pequeno tamanho corporal, crípticas e que tendem a ter menos contato e carisma para a população local, implantar essas estratégias se torna mais problemático (FRYNTA et al., 2013; MACDONALD et al., 2015; ROLL et al., 2016; SITAS; BAILLIE; ISAAC, 2009). O Brasil é detentor de uma das maiores riquezas de répteis do mundo, com 848 espécies, o que corresponde a cerca de 8% das espécies mundiais (COSTA; BÉRNILS, 2021). No que diz respeito aos lagartos, cerca de 47% das espécies registradas no Brasil são endêmicas do território nacional (COSTA; BÉRNILS,2021). Neste cenário, destaca-se a família Sphaerodactylidae, composta por cinco gêneros, dentre eles o gênero Coleodactylus, que está distribuído no norte da América do Sul e reúne cinco espécies, quatro delas endêmicas do Brasil. Os lagartos desse gênero são predominantemente diurnos e vivem associados à serapilheira de habitats florestados (FREIRE, 1999 ; MORETTI, 2009; VANZOLINI, 1968). Uma das espécies deste gênero é Coleodactylus natalensis Freire, 1999, conhecido popularmente como lagarto-de-folhiço (Figura 1), e considerado o menor lagarto da América do Sul, medindo até 24 mm de comprimento rostro-cloacal (FREIRE, 1999). Coleodactylus natalensis pode ser identificada pela combinação dos seguintes caracteres, que em conjunto a diferenciam do congênere C. meridionalis, a espécie mais próxima filogeneticamente (FREIRE, 1999): (a) comprimento rostro-cloacal máximo de 22 mm nos machos e 24 mm nas fêmeas; (b) região dorsal castanho escuro com duas a três manchas brancas de cada lado, pareadas ou não, sendo este padrão evidente principalmente nos machos; (c) uma faixa clara transversal sobre a nuca; (d) machos com uma mancha branca trapezoidal no focinho e outra escura em forma de “V” na região parietal; (e) escama rostral muito alta com a margem posterior em forma de “W”; e (f) unhas cobertas por um estojo ungueal composto por cinco escamas assimétricas. 15 Estudos ecológicos realizados com populações de C. natalensis demonstraram que esses lagartos são termorreguladores passivos, dependentes da sombra da floresta para sobreviver (SOUSA; FREIRE, 2011); alimentam-se de artrópodes, predominantemente isópodes e aranhas (LISBOA; SALES; FREIRE, 2012); as fêmeas possuem ninhada fixa de um ovo (LISBOA; SOUSA; RIBEIRO, 2008) e depositam este ovo isoladamente ou de maneira agrupada/comunal, ou seja, próximos a ovos de outras fêmeas da mesma espécie (SALES et al., 2020). Figura 1 - Indivíduo de Coleodactylus natalensis (macho) no folhiço do Parque da cidade Dom Nivaldo Monte. – Foto: Olyana da Silva Furtado. A distribuição geográfica de C. natalensis está restrita a remanescentes florestais da Mata atlântica potiguar, com preferência por habitats sombreados e clima mais ameno. Os habitats florestados utilizados por C. natalensis estão bastante fragmentados pela expansão urbana e turismo desordenados (FREIRE et al., 2018), fatos que causam interrupção do fluxo gênico entre as subpopulações e declínio constante da qualidade do hábitat e, consequentemente, das subpopulações insulares (DIXON et al., 2007; VOS et al., 2001). Em adição a essas ameaças, soma-se a dificuldade de inserção da população local nas estratégias de conservação, devido ao pequeno tamanho corporal e coloração críptica da espécie, conforme constatado em espécie semelhante por Berti et al (2020a) e Roll et al. (2016). Devido ao conjunto desses fatos, Coleodactylus natalensis foi 16 classificada como ameaçada, na categoria “em perigo”, na última avaliação da fauna brasileira ameaçada de extinção (BRASIL, 2014; MMA, 2018). Frente às ameaças à Mata Atlântica, em especial à herpetofauna da Mata Atlântica nordestina, o Centro de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – RAN/ICMBio instituiu inicialmente o Plano de Ação Nacional (PAN) para Conservação da Herpetofauna Ameaçada da Mata Atlântica Nordestina (Portaria nº 200, de 1º de julho de 2013; período 2013-2018), em continuidade pelo PAN Herpetofauna do Nordeste (Portaria nº 354, de 25 de julho de 2019; período 2019-2024), com o objetivo de criar estratégias para a conservação das espécies de répteis e anfíbios ameaçadas de extinção nessa região. Dentre as espécies alvos dos referidos PAN’s, está o lagarto-de-folhiço, Coleodactylus natalensis Freire, 1999. O lagarto-de-folhiço atualmente possui uma ocorrência bastante limitada, apenas em remanescentes da Mata Atlântica do Rio Grande do Norte, além de submetido à perda de habitat; por outro lado, a maioria das populações conhecidas e parcialmente monitoradas está em Unidades de Conservação de proteção integral, na categoria Parques (FREIRE, 1999; LISBOA; SOUSA; RIBEIRO, 2008; SALES et al., 2020; SOUSA; FREIRE, 2011). Os Parques de ocorrência desta espécie estão ilhados dentro de áreas urbanas, portanto, a sua conservação depende diretamente da manutenção destas áreas protegidas e consciência da população que vive no entorno e/ou trabalha nesses Parques. A conservação de espécies é um grande desafio; maior dificuldade ainda quando se trata da conservação de espécies de pequeno porte, devido ao menor financiamento destinado, atuação em pesquisa e ações de conservação do que espécies maiores e carismáticas, como grandes mamíferos (FISHER, 2011). Quando se trata de espécies de répteis, esses números podem ser bem mais preocupantes (MAREŠOVÁ; FRYNTA, 2008; SITAS; BAILLIE; ISAAC, 2009). Estudos mostram que muitas vezes a disposição de proteger e os recursos alocados para a conservação estão relacionados às atitudes humanas frente ao animal em questão, e não em relação a indicadores da real prioridade de conservação, como o status da red list da IUCN, por exemplo (SITAS; BAILLIE; ISAAC, 2009). Nesse contexto, levando em consideração que o lagarto- de-folhiço é uma espécie oficialmente ameaçada, endêmica de fragmentos da Mata atlântica potiguar, críptica e com pequeno tamanho corporal, utilizá-la como modelo para entender quais os conhecimentos das pessoas sobre espécies de pequeno tamanho 17 corporal, pode fornecer dados de relevância global que embasem estratégias de etnoconservação. Ao mesmo tempo, estratégias e ações de conservação dependem de informações básicas sobre a história natural das espécies. Portanto, outra forma imprescindível de contribuir para a conservação de espécies ameaçadas é o estudo dos padrões reprodutivos, pois, os períodos de acasalamento, de desenvolvimento embrionário e de recrutamento de juvenis são de grande importância para a sobrevivência e dinâmica das populações (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). Etnoconservação e Conhecimento Ecológico Local (CEL) – bases conceituais e relevâncias Em se tratando de conservação da biodiversidade, é fundamental analisar a história e a forma como as sociedades humanas se relacionaram com o meio ambiente e a biodiversidade local (ALVES; ALBUQUERQUE, 2012). Essa relação direta ou indireta é de grande relevância, uma vez que sua compreensão contribui para a conservação da biodiversidade (GADGIL; BERKES; FOLKE, 1993), de espécies raras (COLDING, 1998), de áreas protegidas (JOHANNES, 1998), processos ecológicos e uso sustentável de recursos em geral (BERKES; COLDING; FOLKE, 2000; CUNHA, 1999; RAMIRES et al., 2015; SILVANO et al., 2006). Esse conhecimento acumulado por sociedades humanas sobre fauna e flora é estudado pela Etnobiologia. A característica multidisciplinar dessa ciência possibilita um amplo espectro de abordagens e aplicações, bem como o surgimento de diversas áreas relacionadas como etnobotânica, etnoecologia, etnozoologia (ALVES; SOUTO, 2011). Embora a Etnobiologia, especificamente a Etnozoologia, sejam áreas promissoras e que vêm crescendo consideravelmente nos últimos anos no Brasil (BEAUDREAU; LEVIN, 2014; LANA PINTO; CRUZ; SILVÉRIO PIRES, 2015; RAMIRES et al., 2015; REYES-GONZÁLEZ et al., 2020; SILVANO et al., 2006), ainda existe carência sobre a Etnoherpetologia, subárea da Etnozoologia que se dedica ao estudo da relação de culturas humanas e conhecimento popular sobre a herpetofauna (ALVES et al., 2010). Esse fato limita a elaboração de estratégias de conservação adequadas para várias espécies, considerando que tais estudos são fundamentais dentro da perspectiva conservacionista (ALVES et al., 2010; ALVES; SOUTO, 2011; DIEGUES, 2000; PASSOS et al., 2015). 18 Uma vertente conservacionista bastante promissora na área da Etnobiologia, mas ainda subexplorada, é a Etnonconservação, a qual estuda o conhecimentodas populações humanas sobre processos da natureza e práticas de manejo, promovendo uma conexão entre o conhecimento popular e o científico em prol da conservação da biodiversidade (DIEGUES, 2000; MAGALHÃES; NETO; SCHIAVETTI, 2020). Nessa perspectiva, diversos pesquisadores propõem uma aliança entre os cientistas e os construtores e portadores do conhecimento local, considerando que os dois conhecimentos — o científico e o local — são igualmente importantes devido à grande necessidade de se integrar essas duas contribuições no planejamento e execução de ações conservacionistas (ASWANI; LEMAHIEU; SAUER, 2018; LANA PINTO; CRUZ; SILVÉRIO PIRES, 2015; NASH; WONG; TURVEY, 2016; RAMIRES et al., 2015; SILVANO et al., 2006). No entanto, a expressão dos conhecimentos nas populações urbanas permanece ainda pouco conhecida. Neste sentido, a existência de algumas espécies de lagartos adaptadas a ambientes antrópicos ou negativamente impactadas, mas que ainda conseguem permanecer em remanescentes florestais urbanos, como é o caso do lagarto Coleodactylus natalensis, somada à ascendência familiar de parcelas da população urbana, frequentemente relacionadas à zona rural, suporta a ocorrência de concepções particulares sobre lagartos nos centros urbanos (PASSOS et al., 2015). Nesse contexto, uma das maneiras de se estudar/trabalhar na perspectiva etnobiológica, particularmente da etnoconservação, é focar nos estudos sobre o conhecimento ecológico local (CEL) de uma comunidade. O conhecimento ecológico local (CEL) pode ser definido pelo conjunto de conhecimentos sobre ecologia e gestão de recursos naturais que uma pessoa adquire ao longo da vida, que pode variar por gênero, idade, nível educacional e frequência de contato com áreas naturais (BERKES; COLDING; FOLKE, 2000; GADGIL; BERKES; FOLKE, 1993). Constitui um campo do conhecimento científico que tem como objetivo testar a validade ecológica de determinadas formas de manejo dos recursos naturais utilizadas por um grupo cultural em uma determinada área (ALVES; SOUTO, 2015). Reprodução e estratégias reprodutivas: importância para conservação de espécies Ações de conservação exigem informações básicas sobre a história natural das espécies. Isto posto, outra forma imprescindível de contribuir para a conservação de 19 espécies ameaçadas é o estudo ecológico dos padrões reprodutivos, uma vez que os períodos de acasalamento, de desenvolvimento embrionário nos ovos e de recrutamento de juvenis são de grande importância para a sobrevivência e dinâmica das populações (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). Os ciclos reprodutivos em lagartos têm sido associados a fatores ambientais limitantes, sendo a precipitação, temperatura e o fotoperíodo os mais importantes na determinação do período reprodutivo de espécies de zonas temperadas (JAMES; SHINE, 1985; TINKLE; WILBUR; TILLEY, 1970). Para lagartos de regiões tropicais, que vivem em ambientes com uma sazonalidade de precipitação bem previsível, normalmente observa-se reprodução cíclica bem demarcada e correlacionada com as estações e variáveis ambientais, principalmente precipitação e temperatura (VAN SLUYS et al., 2010; WIEDERHECKER; PINTO; COLLI, 2002). No entanto, no que se refere a espécies de lagartos de regiões tropicais onde as chuvas são imprevisíveis e não existe uma padronização cíclica das variáveis ambientais bem demarcadas, a reprodução contínua é por diversas vezes observada (VITT; GOLDBERG, 1983; ZANCHI-SILVA; BORGES-NOJOSA; GALDINO, 2014), sendo esta configuração discutida do ponto de vista de assincronia dos períodos reprodutivos individuais na população em virtude da falta de pistas ambientais previsíveis (SALES; FREIRE, 2016). Nessa perspectiva, existem duas hipóteses para a influência de condições ambientais na reprodução de lagartos tropicais (BROWN; SHINE, 2006; VITT; COLLI, 1994): (1) reprodução contínua ao longo do ano em ambientes nos quais as chuvas são abundantes e relativamente constantes (e.g. Floresta Amazônica), ou sazonais porém bastante imprevisíveis (e.g. Caatinga); e (2) reprodução sazonal em locais nos quais chuvas são periódicas e concentradas numa época do ano (e.g. Cerrado) (VITT; GOLDBERG, 1983; WIEDERHECKER; PINTO; COLLI, 2002). Para lagartos ovíparos, após a postura dos ovos, a incubação também depende diretamente de variáveis ambientais para fornecer as condições necessárias para o desenvolvimento embrionário bem sucedido (SIVITER; CHARLESDEEMING; WILKINSON, 2019). Portanto, o estado de conservação da área, disponibilidade de luz solar, temperatura e precipitação podem impactar o sucesso da incubação, sendo a temperatura a variável mais importante para o sucesso dos recém-nascidos (FLATT et al., 2001). Logo, o monitoramento de ovos com identificação das condições de postura, número e época de nascimento de filhotes fornecem dados de história natural 20 importantes e necessários para uma eficaz avaliação do risco de extinção de uma população ou espécie (TINGLEY; MEIRI; CHAPPLE, 2016). Para Coleodactylus natalensis, os dados disponíveis sobre biologia reprodutiva ainda são bastante escassos (SALES et al., 2020). Assim, considerando que ações de conservação são urgentes por se tratar de uma espécie ameaçada, e que o conhecimento sobre a biologia e história natural de uma espécie é o primeiro passo para embasar estratégias de conservação (PRIMACK; RODRIGUES, 2001; SALES et al., 2020), estudar a biologia reprodutiva desta espécie endêmica e ameaçada é de necessidade eminente. Objetivos e estrutura da Dissertação Diante do exposto, e partindo da perspectiva de que a conservação moderna opera no nexo de influências biológicas e sociais, esta Dissertação objetiva analisar o conhecimento ecológico local dos funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, Natal/RN, sobre a fauna de répteis, especialmente quanto a Coleodactylus natalensis, espécie-bandeira desta área protegida e ameaçada de extinção, assim como investigar o ciclo reprodutivo da espécie, em prol de sua conservação e de toda a sociobiodiversidade associada. Especificamente, objetiva-se (1) identificar o conhecimento ecológico local (CEL) dos funcionários sobre a fauna de répteis e flora local, bem como a importância da existência da Unidade de Conservação; (2) identificar se o CEL dos funcionários converge com a literatura científica e se há concepções alternativas sobre a hepetofauna local; (3) determinar quais conhecimentos ecológicos esses trabalhadores possuem sobre C. natalensis; (4) avaliar as diferenças no CEL dos entrevistados em função das variáveis tempo de trabalho no Parque e ascendência social (rural ou urbana); (5) monitorar a densidade populacional de adultos e filhotes ao longo do ano; (6) identificar a duração do período reprodutivo (contínuo ou sazonal), bem como os parâmetros ambientais envolvidos na sua determinação; e (7) monitorar o tempo de eclosão dos ovos e identificar ocorrência de nidificação comunal e época de nascimento de filhotes. A Dissertação está estruturada em dois capítulos. O Capítulo 1 abrange os objetivos específicos 1 a 4 e está intitulado “Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida”. Já o Capítulo 2 contempla os objetivos específicos 5 a 7, e possui como título “Biologia reprodutiva do lagarto ameaçado Coleodactylus natalensis Freire, 1999 21 (Squamata: Sphaerodactylidae) em remanescente da Mata atlântica setentrional brasileira”. Após os dois capítulos, são tecidas as Considerações Finais da Dissertação. METODOLOGIA GERAL Área de estudo Este estudo foi realizado no Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, uma Unidade de Conservação (UC) de Proteção Integral da Mata Atlântica setentrional. Compreende uma área de 136,54 hectares e está inserido na área urbana do município de Natal/RN (“Prefeitura Municipal do Natal”, [s.d.]). Mais conhecido como Parque da Cidade, esta UC foi criada por meio do DecretoMunicipal Nº 87.078/2006, na categoria de Unidade de Conservação de Proteção Integral, cujo objetivo é preservar a natureza, admitindo apenas o uso indireto dos seus recursos naturais. No âmbito deste Parque, as entrevistas com os funcionários, cujos resultados compõem o Capítulo 1 desta Dissertação, foram realizadas na sede da UC. Já as coletas dos dados reprodutivos, que compõem o Capítulo 2, foram realizadas no Centro de Experimentos e Pesquisas da Mata Atlântica – CEPEMA (5°51’02” S, 35°14’18” O, 44 m elev.), que compreende uma área de aproximadamente 4,7 hectares do Parque, onde C. natalensis ocorre em alta densidade (SALES & FREIRE, dados não publicados). Na área do CEPEMA (Figura 2), funcionava um horto florestal destinado a cultivo de espécies de plantas ornamentais, contudo a área do horto desativado foi integrada à área da UC no âmbito de um processo de compensação ambiental decorrente do licenciamento de um empreendimento imobiliário nas margens do Parque. O CEPEMA possui uma vegetação arbórea predominante alta, proporcionando áreas sombreadas e com grande quantidade de folhiço, ambiente propício à ocupação e permanência de Coleodactylus natalensis (FREIRE, 1999). A temperatura e umidade relativa do ar no município de Natal são relativamente constantes durante o ano, com médias de 26,2 ± 0,1 °C e 79,7 ± 3,1%, respectivamente; já a precipitação anual média é de 1614,3 ± 77,5 mm (fonte: Instituto Nacional de Metereologia – INMET). 22 Figura 2 – Localização do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, destacando a área do Centro de Experimentos e Pesquisas da Mata Atlântica – CEPEMA. Fonte: IBGE Malhas digitais (2021) e SEMURB (2020). Procedimentos metodológicos Conhecimento ecológico local – aplicação dos questionários As entrevistas foram feitas com 39 funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, alocados nos Setores de manejo ambiental (n = 11), de educação ambiental (n = 11), administrativo (n = 3), guardas municipais do Grupo de Ação Ambiental - GAAM (n = 10), e auxiliares de serviço gerais - ASGs (n = 4). A coleta de dados foi feita através do uso de questionários semiestruturados sobre conservação, herpetofauna, e ecologia do lagartinho-de-folhiço, aqui representando um modelo de espécie críptica de pequeno porte, além de ser espécie-bandeira do Parque (NATAL, 2014). Os questionários foram aplicados individualmente para evitar indução nas respostas, em entrevistas que duraram entre 15 e 30 minutos. 23 As entrevistas ocorreram entre julho e agosto de 2021 na sede do Parque (Figura 2). Antes da entrevista, foi explicado brevemente a proposta do estudo e perguntado se a pessoa gostaria de participar; aqueles que aceitaram assinaram um Termo de Consentimento (TCLE), autorizando a utilização dos dados para a pesquisa, que seguiu as recomendações do Comitê de ética e pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (CAAE 46979421.8.0000.5537). O questionário foi dividido em 4 partes: (1) dados pessoais, como idade, ascendência de ambiente rural ou urbano, tempo de trabalho no parque, gênero, escolaridade, setor de atuação no parque (10 questões); (2) conhecimento sobre conservação (6 questões); (3) conhecimento sobre a fauna de répteis local (5 questões); e (4) ecologia do lagarto-de-folhiço (11 questões). O questionário completo pode ser visualizado no Apêndice 1. Durante cada entrevista foram mostradas oito fotos de animais que ocorrem na região, e solicitado aos funcionários que identificassem quais eles classificavam como répteis. As fotos apresentadas estavam fora de escala. Os animais apresentados (Figura 3) foram o tatu-peba (Euphractus sexcinctus), o jabuti-piranga (Chelonoidis carbonaria, Spix 1824), a jiboia (Boa constrictor, Linnaeus, 1758), uma minhoca (Annelida), a perereca-do-chaco (Boana raniceps, Cope 1862), a lagartixa (Tropidurus hispidus, Spix, 1805), um embuá/piolho-de-cobra (Diplopoda) e a cobra-cipó (Chironius flavolineatus, Jan, 1863). Em seguida, em outro ponto do questionário, foram apresentadas aos funcionários fotos de cinco lagartos que ocorrem na área do Parque (Vanzosaura multiscutata, AMARAL 1933, Brasiliscincus heathi Schmidt & Inger, 1951, Hemidactylus mabouia, Jonnes, 1818, Coleodactylus natalensis e Salvator merianae, Duméril & Bibron, 1839; Figura 4) e foi perguntado se, dentre esses lagartos, eles sabiam identificar quem era o lagarto-de-folhiço, Coleodactylus natalensis. Para os entrevistados que responderam que não sabiam identificar ou que identificaram erroneamente, a entrevista foi encerrada; já para aqueles que identificaram C. natalensis corretamente, a entrevista prosseguiu com perguntas específicas sobre aspectos ecológicos dessa espécie, incluindo biologia reprodutiva, uso de habitat, período de atividade, dieta e termorregulação. 24 https://www.google.com/search?bih=770&biw=1707&rlz=1C1CHZL_pt-BRBR910BR910&hl=pt-BR&sxsrf=AOaemvIuWpc1kP5M7ZgwH3o_Frng7kzi_g:1633378765442&q=Chelonoidis&stick=H4sIAAAAAAAAAONgVuLSz9U3SDc1zytOW8TK7ZyRmpOfl5-ZklkMAGd_yR0cAAAA&sa=X&ved=2ahUKEwi13uOIyrHzAhWdJLkGHU5lACIQmxMoAXoECEsQAw Figura 3 - Fotos dos animais apresentados aos funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte durante as entrevistas para identificação de quais deles são répteis. 1 = tatu-peba (Euphractus sexcinctus); 2 = jabuti-piranga (Chelonoidis carbonaria); 3 = jiboia (Boa constrictor); 4 = minhoca (Annelida); 5 = perereca-do-chaco (Boana raniceps); 6 lagartixa (Tropidurus hispidus); 7 = embuá/piolho-de-cobra (Diplopoda); 8 = cobra-cipó (Chironius flavolineatus). Fonte: Autores 25 https://www.google.com/search?bih=770&biw=1707&rlz=1C1CHZL_pt-BRBR910BR910&hl=pt-BR&sxsrf=AOaemvIuWpc1kP5M7ZgwH3o_Frng7kzi_g:1633378765442&q=Chelonoidis&stick=H4sIAAAAAAAAAONgVuLSz9U3SDc1zytOW8TK7ZyRmpOfl5-ZklkMAGd_yR0cAAAA&sa=X&ved=2ahUKEwi13uOIyrHzAhWdJLkGHU5lACIQmxMoAXoECEsQAw Figura 4 - Fotos dos animais apresentados aos funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte durante as entrevistas para identificação de qual deles era o lagarto Coleodactylus natalensis. 1 = Vanzosaura multiscutata; 2 = Brasiliscincus heathi; 3 = Hemidactylus mabouia; 4 = Salvator merianae; 5 = Coleodactylus natalensis. Fonte: Foto 3: Vinícius Thawaan Cerqueira Silva; demais fotos: Autores. Esta pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte sob o número certificado CAAE 46979421.8.0000.5537 e número do Parecer 4.812.599. Seguindo as regras desse Comitê, antes de aplicar o questionário, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi dado aos funcionários conforme as normas estabelecidas pela Resolução nº 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde e previamente aprovadas pelo Comitê de 26 Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) (CEP/ UFRN nº 227/12). Amostragem sobre a biologia reprodutiva de Coleodactylus natalensis Os dados sobre a biologia reprodutiva de Coleodactylus natalensis foram coletados mensalmente de janeiro a dezembro de 2021, totalizando 12 meses de amostragem. A cada mês foram feitas duas incursões a campo com 15 dias de intervalo entre elas, sendo a primeira visita (V1) destinada à busca dos espécimes e ovos de C. natalensis, e a segunda visita (V2) destinada somente ao acompanhamento dos ovos encontrados nas visitas anteriores, sendo possível obter dados mais detalhados sobre o tempo de eclosão dos ovos em monitoramento. Para essa amostragem sobre biologia reprodutiva, foram demarcados seis quadrantes de 5 x 10 m (50 m2) em locais sombreados e com abundância de serapilheira no solo. Em todas as V1, cada quadrante foi inspecionado durante 30 minutos por 4 pessoas, revirando-se lentamente toda a serapilheira no solo, protegidos por luvas de raspa de couro, no período matutino, entre 8:00h e 13:00h. Além disso, para registro dos dados abióticos, foram feitas as aferições da temperatura do ar (TA), umidade do ar (UA) 1 cm acima da serrapilheira, temperaturado folhiço (TF) e profundidade do folhiço (H) em cinco pontos escolhidos de forma randômica. Essas medidas foram feitas em campo com o uso de um sensor de temperatura (Instrutherm® model S- 02K) acoplado a um termohigrômetro (precisão de 0,1 ° C; Instrutherm® modelo HTR-350), em um ponto em cada um dos 6 quadrantes. Os espécimes de C. natalensis encontrados foram coletados manualmente para realização das medidas morfométricas com um paquímetro digital: comprimento rostro-cloacal (CRC); comprimento da cauda (CC); largura da cabeça (LC). As fêmeas foram inspecionadas no ventre com auxílio de lanterna para verificar se havia presença de ovo, fato que evidencia se ela está ou não no período reprodutivo; é possível visualizar a presença de ovo no ventre do animal pela coloração diferenciada (Figura 5). Os lagartos foram mantidos temporariamente numa caixa de contenção até que todo o quadrante fosse amostrado. Todos os animais capturados foram soltos nos mesmos locais de coleta, após a inspeção da área delimitada, conforme metodologia utilizada por Lisboa; Freire (2012) em estudo semelhante com essa mesma espécie em outra localidade. Para cada indivíduo encontrado foram registrados os dados abióticos (TA, UA, TF, H) do local exato onde foi encontrado. 27 A localização dos ovos encontrados no ambiente (Figura 6) foi sinalizada com bandeirinhas confeccionadas com papel vegetal e palitos de churrasco (Figura 7), assim foi possível encontrar facilmente os ovos nas visitas seguintes. Esses locais foram inspecionados quinzenalmente para verificar se os ovos eclodiram, bem como para registros dos dados abióticos (TA, UA, TF, H) do local onde os ovos foram encontrados. Figura 5 - Fêmea de Coleodactylus natalensis contendo ovo visível a partir do ventre. Foto: Vinícius Thawaan Cerqueira Silva. Figura 6 - Ovo de Coleodactylus natalensis encontrado em uma das visitas, sob o folhiço. Foto: Vinícius Thawaan Cerqueira Silva. 28 Figura 7 - Banderinha usada para a identificação do local onde foram encontrados ovos de Coleodactylys natalensis, durante o trabalho de campo. Foto: Raul Sales A abordagem metodológica aqui utilizada foi aprovada pela Comissão de Ética em Uso de Animais (CEUA) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, certificado sob número 232.023/2020, assim como autorizada pelo Sistema de autorização e informação em biodiversidade (SISBIO), para atividade com finalidade científica, sob número 75883-1. Análise de dados Conhecimento ecológico local A investigação do conhecimento local foi analisada qualitativamente e quantitativamente. Para a identificação qualitativa, foi construído um “quadro de cognição comparada”, contendo as informações providas pelos informantes (respostas mais frequentes) sobre o meio ambiente, répteis e C. natalensis, e as convergências e divergências com a literatura científica (COSTA NETO; SANTOS FITA; VARGAS CLAVIJO, 2009). Quando a informação não foi encontrada na bibliografia científica para a espécie, foi levado em consideração o que havia disponível para o gênero Coleodactylus, e quando não encontrado para este gênero foi levado em consideração as informações gerais para lagartos gecos (Gekkota) de serrapilheira, em razão da proximidade filogenética das espécies desse grupo (KLUGE, 1995). Para a análise quantitativa dos dados, primeiramente organizou-se uma tabela com escores (pontuação) para as respostas obtidas (Tabela 1). Aqueles entrevistados que obtiveram pontuação máxima, ou seja, acertaram todas as respostas, atingiram 10 29 pontos. A mesma metodologia foi utilizada para as informações sobre atributos ecológicos de Coleodactylus natalensis (Tabela 2); estas perguntas especificas sobre o lagarto-de-folhiço foram realizadas somente com os participantes que identificaram adequadamente a espécie por fotografia. Com essa pontuação feita para cada um dos informantes, testes t de amostras independentes foram realizados para verificar se havia influência do tempo de trabalho no Parque (maior ou menor que 5 anos) e da ascendência do informante (urbana ou rural) sobre os escores de CEL quanto ao ambiente natural do Parque e os répteis. Um teste t independente também foi aplicado para comparar os escores de CEL entre os informantes que reconheceram e os que não reconheceram a espécie C. natalensis dentre as imagens de lagartos apresentadas. Adicionalmente, o teste Chi-quadrado foi aplicado para testar se o tempo de trabalho no Parque e a ascendência do informante influenciaram no reconhecimento de C. natalensis. Para as pessoas que reconheceram C. natalensis, uma análise de regressão linear simples foi realizada para testar se havia relação entre os escores de CEL sobre o ambiente natural do Parque e os répteis, e os escores de CEL sobre a espécie C. natalensis. Todas as análises estatísticas foram realizadas usando o software SPSS Statistics 20.0 (IBM) para Windows (α = 0,05). Todas as variáveis foram testadas quanto à normalidade e homoscedasticidade das variâncias antes de realizar testes paramétricos. Tabela 1 – Pontuações atribuídas para as perguntas sobre a fauna e flora local e sobre os répteis durante as entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte. Perguntas Escore (pontos) Pontuação máxima Tipo de vegetação predominante no Parque 2 – Correto 1 – Parcialmente correto 0 – Incorreto/não soube responder 2 Encontros com animais no Parque 1 – Encontra 0 – Não encontra 1 Principal característica dos répteis 2 – Forneceu satisfatoriamente uma característica 1 – Forneceu uma resposta vaga 0 – Não soube responder 2 Reconhecimento de répteis 4 – Identificação 100% correta das fotografias 3 – Identificação 75% correta das fotografias 4 30 2 – Identificação 50% correta das fotografias 1 – Identificação 25% correta das fotografias 0 – Não soube identificar os répteis nas fotografias Percepção de répteis como animais peçonhentos 1 – Respondeu corretamente (alguns são peçonhentos) 0 – Respondeu incorretamente (todos são peçonhentos ou nenhum é peçonhento) 1 TOTAL MÁXIMO DE PONTOS 10 Tabela 2 - Pontuações atribuídas para as perguntas sobre atributos ecológicos de Coleodactylus natalensis durante as entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte. Estas perguntas foram realizadas somente com os participantes que reconheceram adequadamente a espécie por fotografia. Perguntas Escore (pontos) Pontuação máxima Como se reproduz? 1 – Resposta correta (reprodução sexuada ovípara) 0 – Incorreto/não soube responder 1 Tamanho da ninhada 1 – Resposta correta (1 ovo) 0 – Incorreto/não soube responder 1 Ocorrência de oviposição comunal 1 – Soube responder (ovos solitários ou ovos encontrados juntos) 0 – Não soube responder 1 Período reprodutivo ao longo do ano 1 – Soube responder (reprodução contínua ou concentrada numa época do ano) 0 – Não soube responder 1 Período de atividade 1 – Respondeu corretamente (atividade diurna) 0 – Incorreto/Não soube responder 1 Categoria de luminosidade predominantemente ocupada (sombreada ou ensolarada) 1 – Respondeu corretamente (hábitats sombreados) 0 – Incorreto/Não soube responder 1 Microhabitat predominante ocupado 1 – Respondeu corretamente (folhiço) 2 – Incorreto/Não soube responder 1 Dieta 1 – Respondeu corretamente (pequenos invertebrados) 0 – Incorreto/Não soube responder 1 31 Consequências ecológicas do pequeno tamanho corporal 1 – Respondeu corretamente (o tamanho diminuto traz alguma consequência ecológica, seja positiva ou negativa) 0 – Respondeu incorretamente/Não soube responder 1 Variação em densidade ao longo do tempo 1 – Soube responder (aumentou, diminuiu ou manteve-se) 0 – Não soube responder 1 TOTAL MÁXIMO DE PONTOS 10 Biologia reprodutiva Foi contabilizado o número de indivíduos adultos, juvenis e neonatos, além de contabilizados os números de ovos e fêmeas grávidas para as análises dos dados reprodutivos. Para verificar a influência de variáveis ambientais das áreas(precipitação mensal, temperatura média mensal) sobre a abundância mensal de indivíduos e ovos, bem como na proporção mensal de fêmeas em condição reprodutiva, foram usadas correlações de Spearman. 32 CAPÍTULO 1 Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida Holda Ramos da Silva 1, Raul Fernandes Dantas de Sales 2, Eliza Maria Xavier Freire 3 1.Aluna do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. e-mail: ramos.holda@gmail.com 2. Pós-Doutorando em Desenvolvimento e Meio Ambiente /UFRN e-mail: raulsales17@gmail.com. 3. Professora do Departamento de Botânica e Zoologia/UFRN (Orientadora). e-mail: elizajuju1000@gmail.com. ESTE ARTIGO ESTÁ SUBMETIDO AO PERIÓDICO “AMBEINTE & SOCIEDDE”, QUALIS A2, E, PORTANTO, ESTÁ FORMATADO DE ACORDO COM AS RECOMENDAÇÕES DESTA REVISTA (acessar https://www.scielo.br/journal/asoc/about/#instructions) 33 mailto:ramos.holda@gmail.com mailto:raulsales17@gmail.com mailto:elizajuju1000@gmail.com https://www.scielo.br/journal/asoc/about/#instructions Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida Holda Ramos da Silva I Raul Fernandes Dantas Sales I Eliza Maria Xavier Freire I I Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Rio Grande do Norte, Brasil. 34 Conhecimento ecológico local sobre a fauna de répteis e lagarto críptico, ameaçado de extinção, em floresta urbana de área protegida Resumo Áreas protegidas constituem estratégias importantes de conservação da biodiversidade, mas é um desafio mantê-las, especialmente em áreas urbanas. Em um Parque Urbano na Mata Atlântica, foi investigado o Conhecimento ecológico local (CEL) dos funcionários sobre a fauna de répteis e de espécies de lagartos crípticas de pequeno porte. Foram entrevistados 39 funcionários do Parque. Constatou-se que os funcionários detêm conhecimentos mais específicos sobre a flora local, e reconhecem a importância do Parque para conservação das espécies. Funcionários com maior tempo de trabalho no Parque possuem maior CEL sobre a espécie críptica e ameaçada de extinção Coleodactylus natalensis. Esse fato, quando adicionado ao tamanho diminuto da espécie, e inexistência de valor cultural e utilitário para os funcionários, é de grande relevância, visto que não é o padrão observado em outros estudos de CEL. Este trabalho também evidencia as ameaças às quais parques urbanos estão submetidos e diferenças de parques rurais. Palavras-chaves: Conhecimento local; parques urbanos; espécies crípticas; etnoherpetologia; conservação. Local ecological knowledge about reptiles and cryptic lizard in an urban forest Abstract Protected areas are important strategies for conserving biodiversity, but maintaining them is a challenge, especially in urban areas. In an urban park in the Atlantic Forest, the local ecological knowledge (LEK) of employees on the fauna of reptiles and small cryptic lizard species was investigated. 39 employees of the park were interviewed. It was found that employees have more specific knowledge about the local flora, and recognize the importance of the park for the conservation of species. Employees with longer working time in the park have a higher LEK on the cryptic and endangered species Coleodactylus natalensis. This fact, when added to the small size of the 35 species, and the lack of cultural and utilitarian value for the employees, is of great relevance since it is not the pattern observed in other LEK studies. This work also highlights the threats to which urban parks are subjected. Keywords: Local knowledge; urban parks; cryptic species; ethnoherpetology; conservation. Saber ecológico local sobre la fauna de reptiles y lagartijas crípticas en el bosque urbano Resumen Las Áreas Protegidas o Unidades de Conservación son estrategias de preservación, pero mantenerlas es un desafío, especialmente en áreas urbanas. En el Parque Municipal Urbano, con un remanente de Mata Atlántica Norte, se investigó el saber ecológico local (SEL) de los empleados sobre la fauna de reptiles y sobre especies de lagartijas crípticas pequeñas. Se entrevistaron 39 empleados de diferentes sectores del Parque. Entre los resultados se encontró que los empleados tienen un conocimiento más específico sobre la flora local, y reconocen la importancia del parque para la conservación de las especies. Los empleados con más tiempo de trabajo en el parque tienen un SEL más alto en la especie críptica y amenazada Coleodactylus natalensis. Este hecho, sumado al pequeño tamaño de la especie, y la falta de valor cultural y utilitario para los empleados, es de gran relevancia, ya que no es el patrón observado en otros estudios de SEL. Este trabajo también destaca las amenazas a las que están sujetos los parques urbanos y destaca las diferencias entre los parques urbanos y los rurales. Palabras llave: Saber local; parques urbanos; especies crípticas; etnoherpetología; conservación. Introdução A vida na terra está passando pela sexta extinção em massa, e este evento está colocando em risco toda a biodiversidade mundial (CEBALLOS; EHRLICH; RAVEN, 2020). As interferências antropogênicas que causam 36 fragmentação de habitat constituem um dos principais fatores que influenciam o declínio populacional, sendo este considerado severa causa deste problema (GIBBONS et al., 2000; PRIMACK; RODRIGUES, 2001; RODRIGUES, 2005). Conhecer a história natural das espécies e investir em estratégias de conservação junto à sociedade é um primeiro e grande passo para a conservação efetiva, porém quando se trata de espécies de répteis de pequeno tamanho corporal, crípticas e que tendem a ter menos contato e carisma para a população local, implantar essas estratégias se torna mais problemático (FRYNTA et al., 2013; MACDONALD et al., 2015; ROLL et al., 2016; SITAS; BAILLIE; ISAAC, 2009). Existe uma grande dificuldade para a conservação de espécies de pequeno porte, em decorrência de menor financiamento, atuação em pesquisa e ações de conservação do que espécies maiores e carismáticas, como grandes mamíferos (FISHER, 2011). Quando se trata de espécies de répteis, esses números podem ser bem mais preocupantes (MAREŠOVÁ; FRYNTA, 2008; SITAS; BAILLIE; ISAAC, 2009). Estudos mostram que muitas vezes a disposição de proteger e os recursos alocados para a conservação estão relacionadas às atitudes humanas frente ao animal em questão, e não em relação a indicadores da real prioridade de conservação, como o status da red list da IUCN, por exemplo (SITAS; BAILLIE; ISAAC, 2009). Nesse contexto se encontram alguns lagartos da família Sphaerodactylidae, que são predominantemente diurnos e vivem associados à serapilheira de habitats florestados (FREIRE, 1999 ; MORETTI, 2009; VANZOLINI, 1968). Uma das espécies desta família é o geco pigmeu de Natal, o lagarto-de-folhiço Coleodactylus natalensis Freire, 1999, considerado o menor lagarto da América do Sul, medindo até 24 mm de comprimento rostro-cloacal (FREIRE, 1999). Esta espécie é endêmica da região setentrional da Mata Atlântica brasileira, especificamente de remanescentes florestais do Rio Grande do Norte, e está oficialmente ameaçada de extinção (MMA, 2018). Os habitats florestados utilizados por C. natalensis estão bastante fragmentados pela expansão urbana e turismo desordenados. Juntamente a essas ameaças, o pequeno tamanho corporal e coloração críptica da espécie torna ainda mais difícil inserir a população local nas estratégias de conservação (BERTI et al., 2020a; ROLL et al., 2016). Os Parques onde esta espécie ocorre 37 estão ilhados dentro de áreas urbanas, portanto, a sua conservação depende diretamente da manutenção destas áreas protegidas e conscientização da população que vive no entorno e/outrabalha nesses Parques. Em se tratando de conservação da biodiversidade, é fundamental analisar a história e a forma como as sociedades humanas se relacionaram com o meio ambiente e a biodiversidade local (ALVES; ALBUQUERQUE, 2012). A compreensão desta relação é de grande relevância, uma vez que contribui para a conservação da biodiversidade (GADGIL; BERKES; FOLKE, 1993), de espécies raras (COLDING, 1998), de áreas protegidas (JOHANNES, 1998), de processos ecológicos e uso sustentável de recursos em geral (BERKES; COLDING; FOLKE, 2000; CUNHA, 1999; RAMIRES et al., 2015; SILVANO et al., 2006). Uma ferramenta importante para se trabalhar conservação junto à sociedade, é o estudo do conhecimento ecológico local (CEL), que pode ser definido pelo conjunto de conhecimento sobre ecologia e gestão de recursos naturais que uma pessoa adquire ao longo da vida, que pode variar por gênero, idade, nível educacional e frequência de contato com áreas naturais (BERKES; COLDING; FOLKE, 2000; GADGIL; BERKES; FOLKE, 1993). Desse modo, este trabalho aborda a avaliação do conhecimento ecológico local de funcionários de um Parque urbano sobre a Mata Atlântica, a herpetofauna, e o lagarto críptico de pequeno porte C. natalensis, que constitui espécie-bandeira deste Parque. Especificamente, objetiva-se (1) identificar o conhecimento ecológico local (CEL) dos funcionários sobre a fauna de répteis e importância da existência da Unidade de Conservação; (2) identificar se o CEL dos funcionários converge com a literatura científica e se há concepções alternativas sobre a hepetofauna local; e (3) determinar quais conhecimentos ecológicos esses trabalhadores possuem sobre o lagarto C. natalensis.; (4) Avaliar as diferenças no CEL dos entrevistados em função do tempo de trabalho no Parque e ascendência familiar rural ou urbana. Material e métodos Área de estudo 38 Este estudo foi realizado no Parque Municipal Dom Nivaldo Monte (Figura S1), uma Unidade de Conservação (UC) de Proteção Integral da Mata Atlântica setentrional. Compreende uma área de 136,54 hectares, e está inserido na área urbana do município de Natal/RN (“Prefeitura Municipal do Natal”, [s.d.]). Mais conhecido como Parque da Cidade, esta UC foi criada por meio do Decreto Municipal Nº 87.078/2006, na categoria de Unidade de Conservação de Proteção Integral, cujo objetivo é preservar a natureza, admitindo apenas o uso indireto dos seus recursos naturais. No âmbito deste Parque foram realizadas as entrevistas com os funcionários na sede dessa UC. Coleta de dados A coleta de dados ocorreu nos meses de julho e agosto de 2021 através de questionários semiestruturados aplicados com funcionários do Parque sobre conservação, herpetofauna, e ecologia do lagarto-de-folhiço, Coleodactylus natalensis, aqui representando o nosso modelo de espécie críptica de pequeno porte, que também é espécie-bandeira do Parque (Lei N.º 6.438 de 07 de Março de 2014). Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte sob o número certificado CAAE 46979421.8.0000.5537 e número do Parecer 4.812.599. Seguindo as regras desse Comitê, antes de aplicar o questionário, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi dado aos funcionários conforme as normas estabelecidas pela Resolução nº 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde e previamente aprovadas pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) (CEP/ UFRN nº 227/12). Os questionários foram aplicados individualmente para evitar indução nas respostas, em entrevistas que duraram entre 15 e 30 minutos. Antes da entrevista, explicou-se brevemente a proposta do estudo e foi perguntado se a pessoa gostaria de participar; aqueles que aceitaram assinaram o TCLE, autorizando a utilização dos dados para pesquisa. O questionário foi dividido em 4 partes: (1) dados pessoais, como idade, ascendência de ambiente rural, tempo de trabalho no parque, gênero, escolaridade, setor de atuação no parque (10 questões); (2) conhecimento sobre conservação (6 questões); (3) 39 conhecimento sobre a fauna de répteis local (5 questões); e (4) aspectos ecológicos do lagarto C. natalensis (11 questões). Durante cada entrevista foram mostradas oito fotos de animais que ocorrem na região (um tatu, um jabuti, duas serpentes, uma perereca, uma minhoca e um embuá/piolho-de-cobra; Figura S2), e solicitado aos funcionários que identificassem quais eles classificavam como répteis. Em seguida, em outro ponto do questionário, foram apresentadas aos entrevistados fotos de cinco lagartos que ocorrem na área do Parque (Figura S3) e perguntado se, dentre esses lagartos, eles sabiam identificar quem era o lagarto-de-folhiço Coleodactylus natalensis. Para os entrevistados que responderam que não sabiam identificar este lagarto ou que identificaram erroneamente, a entrevista foi encerrada; já para aqueles que identificaram C. natalensis corretamente, a entrevista prosseguiu com perguntas específicas sobre aspectos ecológicos dessa espécie, incluindo biologia reprodutiva, uso de habitat, período de atividade, dieta e termorregulação. Análise dos dados O Conhecimento ecológico local (CEL) foi analisado qualitativamente e quantitativamente. Para a análise qualitativa, foi elaborado um “quadro de cognição comparada”, contendo as informações providas pelos entrevistados (respostas mais frequentes) sobre o meio ambiente, répteis e C. natalensis, e as convergências e divergências com a literatura científica (COSTA NETO; SANTOS FITA; VARGAS CLAVIJO, 2009). Quando a informação fornecida pelo entrevistado não foi encontrada na bibliografia científica para a espécie, foi levado em consideração o que havia disponível para o gênero Coleodactylus, e quando não encontrado para este gênero foi levado em consideração as informações gerais para lagartos gecos (Gekkota) de serrapilheira, em razão da proximidade filogenética das espécies desse grupo (KLUGE, 1995). Para a análise quantitativa dos dados, primeiramente organizou-se uma tabela com escores (pontuação) para as respostas obtidas (Tabela S1). Os entrevistados que obtiveram pontuação máxima, ou seja, acertaram todas as respostas, atingiram 10 pontos. A mesma metodologia foi utilizada para as informações sobre atributos ecológicos de Coleodactylus natalensis (Tabela S2); estas perguntas especificas sobre o lagarto-de-folhiço foram realizadas 40 somente com os participantes que identificaram adequadamente a espécie por fotografia. Com essa pontuação feita para cada um dos informantes, testes t de amostras independentes foram realizados para verificar se havia influência do tempo de trabalho no Parque (maior ou menor que 5 anos) e da ascendência do informante (urbana ou rural) sobre os escores de CEL quanto ao ambiente natural do Parque e os répteis. Um teste t independente também foi aplicado para comparar os escores de CEL entre os entrevistados que reconheceram e os que não reconheceram a espécie C. natalensis dentre as imagens de lagartos apresentadas. Adicionalmente, o teste Chi-quadrado foi aplicado para avaliar se o tempo de trabalho no Parque e a ascendência do informante influenciaram no reconhecimento de C. natalensis. Para as pessoas que reconheceram C. natalensis, uma análise de regressão linear simples foi realizada para testar se havia relação entre os escores de CEL sobre o ambiente natural do Parque e os répteis, e os escores de CEL sobre a espécie C. natalensis. Todas as análises estatísticas foram realizadas usando o software SPSS Statistics 20.0 (IBM) para Windows (α = 0,05). Todas as variáveis foram testadas quanto à normalidade e homoscedasticidade das variâncias antes de realizar testes paramétricos. Resultados Um total de 39 funcionários do Parque da Cidade foram entrevistados entre julho e agosto de 2021 (27 do sexo masculino e 12 do sexo feminino), com idade entre 24 e 63 anos. Do total de entrevistados,onze trabalhavam no setor de manejo ambiental - SMA (28,2%), onze no centro de educação ambiental – CEA (28,2%), dez no grupo de ação ambiental – GAAM (25,6%), 4 funcionários assistentes de serviços gerais – ASG (10,3%) e 3 funcionários do setor Administrativo – ADM (7,7%). Dentre estes, 71% declararam morar no município de Natal durante toda a vida, contudo 53,8% tinham ascendência até 2º grau (avós e avôs) no meio rural. Além disso, 53,8% possuem ensino superior completo, mas apenas 7,7% com formação na área ambiental. Um total de 61,5% dos funcionários trabalha no parque há 5 anos ou mais (alguns desde a sua inauguração, há 13 anos), enquanto 38.5% dos trabalhadores 41 trabalham no parque há menos de 5 anos. Também foi perguntado quais animais eles mais viam no Parque, e 73.7% afirmaram que as aves constituem o grupo mais avistado; 26,3% afirmaram que os répteis são mais avistados. Conhecimento sobre o ambiente natural e a Mata Atlântica No que se refere às respostas das questões sobre conservação, 100% dos entrevistados consideraram a existência do Parque como “muito importante” para a conservação da fauna e flora locais. Em relação às informações sobre a vegetação e bioma predominantes no Parque, a maioria respondeu corretamente que a Mata Atlântica é o bioma predominante, mas também foi citado por eles a restinga, vegetação arbustiva densa ou espaçada, tabuleiro costeiro, floresta semidecidual arbustiva, capim dunar, floresta estacional”, que são tipos de vegetação associadas à Mata atlântica. Apenas duas pessoas indicaram o bioma principal do parque como sendo “Cerrado”, ou “Caatinga”. Quando foi pedido aos entrevistados para classificar de 0 a 10 o quanto as espécies da fauna e flora local teriam a possibilidade de sobreviver sem a existência do parque após 10 anos, todos responderam que sem esta área protegida haveria interrupção da sobrevivência e permanência das espécies no local do Parque com o passar dos anos. A justificativa principal citada pelos entrevistados para o “desaparecimento” rápido da biodiversidade local foi a especulação imobiliária, posto que o Parque está localizado em uma área urbana da cidade de Natal, e recentemente alguns condomínios de luxo vêm sendo construídos em seu entorno. Conhecimento sobre os répteis A partir das respostas dos entrevistados, foram selecionadas frases recorrentes sobre répteis e distribuídas na Tabela 1, para conferir se havia congruência entre estas e a literatura científica. A maior parte dos entrevistados (79%) afirmaram não ter medo de répteis, contudo 38,4% afirmaram que répteis ou alguns répteis podem transmitir doenças, uma das concepções alternativas errôneas encontradas. Adicionalmente, 25,6% dos entrevistados classificaram que todos os répteis são peçonhentos. 42 Tabela 1 - Cognição comparada sobre os répteis, elaborada a partir de entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, realizadas em julho e agosto de 2021. Fonte: Holda Ramos-Silva Declarações dos entrevistados Informações da bibliografia científica Características gerais de répteis “são animais que rastejam” “deixam rastro na trilha” Cobras e lagartos terrícolas rastejam e costumam deixar rastros na areia, podendo-se identificar a sua passagem pelo rastro da cauda e/ou patas dos animais (HICKMAN et al., 2014) “possuem casco” As tartarugas são envolvidas por uma armadura (casco) que consiste em uma carapaça dorsal e um plastrão ventral (HICKMAN et al., 2014) “tem habitat terrestre e se esconde na vegetação” Os amniotas ocupam nichos variados de habitat aquático e terrestre (VITT; CALDWELL, 2014) “colocam ovos e se escondem em tocas” Seu sucesso como vertebrados terrestres pode ser atribuído a várias adaptações, incluindo o ovo amniótico (HICKMAN et al., 2014) “são animais de sangue frio” “são pecilotérmicos” Animais de sangue frio é a denominação comum dada a animais ectotérmicos, como os anfíbios e répteis, que dependem de fontes ambientais para ganho de calor; portanto, respondem à variação no ambiente físico para regulação da temperatura (VITT; CALDWELL, 2014). “...são caçadores” As atividades em répteis que demandam o maior gasto energético são reprodução, fuga, aquisição de presas e forrageamento, no qual as duas últimas estão ligadas a busca de alimento, podendo considerar assim algumas espécies de lagartos e cobras caçadores por serem forrageadores ativos (VITT; CALDWELL, 2014) Conhecimento sobre o lagarto-de-folhiço, Coleodactylus natalensis 43 Quando foram apresentadas as cinco imagens de lagartos aos entrevistados, 22 (56,4%) identificaram corretamente o lagarto Coleodactylus natalensis. Para os que identificaram corretamente, continuamos a entrevista perguntando as características ecológicas especificas sobre o lagarto-de-folhiço, tais como, habitat, reprodução, período reprodutivo, quantidade de ovos por postura, horário de maior atividade, e alimentação, cujas principais e mais recorrentes respostas estão na Tabela 2. Tabela 2 - Quadro de cognição comparada sobre a ecologia de Coleodactylus natalensis obtido através de entrevistas com funcionários do Parque Municipal Dom Nivaldo Monte, realizadas em julho e agosto de 2021. Fonte: Holda Ramos-Silva Declarações dos entrevistados Informações da bibliografia científica Reprodução “eles colocam ovos” Fêmeas de Coleodactylus natalensis são ovíparas, assim como outros gecos (grupo Gekkota) (SALES et al., 2020). “colocam vários ovos em uma ninhada” Não condiz com a literatura científica disponível até a publicação deste trabalho, pois o tamanho de sua ninhada é fixo, de um ovo único (LISBOA; SOUSA; RIBEIRO, 2008). “colocam apenas 1 ovo” Esta espécie tem um tamanho de ninhada fixo de um ovo único (LISBOA; SOUSA; RIBEIRO, 2008). “é comum encontrar mais de um ovo no mesmo local” É muito provável que diferentes fêmeas de C. natalensis usem os mesmos locais para ovipositar, detectando a presença de ovos coespecíficos durante a escolha do local de oviposição (SALES et al., 2020) “não é comum encontrar mais de um ovo no mesmo local” As fêmeas de Coleodactylus possuem uma postura fixa de um ovo, e podem realizar a postura em local isolado ou próximo a ovos de outras fêmeas (SALES et al., 2020) Alimentação 44 “...se alimentam de pequenos insetos.” “Se alimentam de formigas.” A dieta de C. natalensis é composta principalmente de artrópodes, mais categoricamente representados por Isopoda e Araneae (LISBOA; SALES; FREIRE, 2012) “...se alimentam de fungos e resina de árvores” Não condiz com a literatura científica disponível até a publicação deste trabalho, e.g., LISBOA; SALES; FREIRE, 2012. Comportamento/habitat “gostam de umidade” Coleodactylus natalensis ocupa preferencialmente habitats florestados, em áreas úmidas com temperaturas mais amenas, sem luz solar direta e com folhiço espesso (LISBOA; FREIRE, 2012). “são mais vistos no inverno (estação chuvosa)” “são mais vistos quando chove” Foi encontrada ocorrência significantemente maior de lagartos de C. natalensis na estação chuvosa (LISBOA; FREIRE, 2012). “são mais ativos de dia” Espécies de lagartixas do gênero Coleodactylus são encontradas ativas apenas durante o dia (VITT et al., 2005). “ficam mais na sombra onde tem muitas folhas e ao redor de árvores” Coleodactylus natalensis ocupa preferencialmente habitats de mata, os quais possuem características mésicas, tais como, ambiente sombreado e com folhiço espesso (CAPISTRANO; FREIRE, 2009). “eles gostam de ficar ao redor de árvores onde tem muito folhiço” Quanto maior a espessura do folhiço maior a densidade encontrada de C. natalensis. O mesmo vale para região de mata alta, onde é encontrada a maior densidade (LISBOA; FREIRE, 2012) 45 Características determinantes do CEL Entrevistados com ascendência rural e urbana não diferiram nos escores de CEL sobre o ambiente natural do Parque e sobre os répteis (t = -0,589, gl = 37,
Compartilhar