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EstigmatizacaoLoucura-Silva-2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL 
HELOISA HELENA DA SILVA
ESTIGMATIZAÇÃO SOCIAL DA LOUCURA E OS DESAFIOS DA ATUAL
CONJUNTURA BRASILEIRA PARA A SAÚDE MENTAL
UMA ANÁLISE SOBRE A CONSTRUÇÃO SÓCIO-HISTÓRICA DA LOUCURA E OS
IMPASSES DO AVANÇO DO CONSERVADORISMO PARA A REFORMA
PSIQUIÁTRICA 
NATA - RN
2019
HELOISA HELENA DA SILVA 
ESTIGMATIZAÇÃO SOCIAL DA LOUCURA E OS DESAFIOS DA ATUAL
CONJUNTURA BRASILEIRA PARA A SAÚDE MENTAL
UMA ANÁLISE SOBRE A CONSTRUÇÃO SÓCIO-HISTÓRICA DA LOUCURA E OS
IMPASSES DO AVANÇO DO CONSERVADORISMO PARA A REFORMA
PSIQUIÁTRICA 
Monografia apresentada a Universidade
Federal do Rio Grande do Norte como
requisito para a obtenção do Título de
Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Profª Drª Larisse de Oliveira
Rodrigues 
 
AGRADECIMENTOS 
Agradeço primeiramente à espiritualidade sem a qual eu não teria forças para
seguir em frente. A todo apoio e conforto que encontrei nos pontos cantados para
firmar minha fé e focar nos meus objetivos. Há dias em que só queremos que tudo
acabe mas a sabedoria divina nos ilumina e aquece com o vislumbre de que ainda
há muito que se fazer tanto pessoal como profissionalmente. 
À minha família, que mesmo em meio a tantas tribulações e provações,
permaneceu ao meu lado sem julgamentos, sem cobranças. Quando o mundo
parecia desmoronar lá fora, em casa eu encontrava o descanso muitas vezes não
merecido mas sempre garantido. Aqueles que sempre me incentivaram e com a
sabedoria própria deles, me aconselharam e orientaram nas diversas fases que
passei durante o curso. 
Aos meus amigos, que à sua maneira, me aqueciam o coração em meio a
tanta ansiedade e nervosismo nesta reta final do curso. Que se ofereciam para
ajudar a estudar e até discutiam sobre o tema comigo nos dias em que o bloqueio
mental não me permitia dar continuidade à pesquisa. 
À equipe do Hospital Doutor João Machado, em especial, as supervisoras de
campo do estágio obrigatório, as assistentes sociais Vilca e Fátima, que em muito
contribuíram com seu conhecimento e experiência na área de Saúde Mental para
esse processo tão complexo que é a formação profissional. E me inspiraram a seguir
na luta em defesa da garantia de direitos, autonomia e liberdade dos usuários (as). 
Às companheiras do estágio obrigatório: Larissa (minha dupla), Bárbara e
Luyza. Esse processo seria muito mais complicado se não houvessem
companheiras como vocês, passamos dois períodos (um ano inteiro) compartilhando
a experiência de estar em um local que historicamente marginaliza e exclui outras
pessoas por suas diferenças, discutindo e refletindo acerca daquela realidade tão
dura para os (as) internos (as). 
À minha orientadora, Profª Drª Larisse de Oliveira Rodrigues, pelo incentivo e
pela paciência. Desde a supervisão acadêmica no período do Estágio Obrigatório
nos incentivando a exercitar a reflexão crítica da realidade, a questionar e não
apenas absorver o que nos é apresentado. 
À tantas pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para que este
momento se tornasse real, que sem perceber me deram forças para não desistir e
abriram meus olhos para que eu enxergasse coisas que estava deixando para trás,
que estava perdendo.
À todos (as), muito obrigada! 
RESUMO
O trabalho a seguir trata-se de uma pesquisa em torno da trajetória histórica da
estigmatização social da loucura compreendida enquanto construção sociocultural
para o debate dos desafios da atual conjuntura política e social brasileira. A proposta
é analisar no âmbito sociocultural o papel da loucura e do louco na sociedade
brasileira para a apreensão dos desafios atuais para a efetivação da Reforma
Psiquiátrica brasileira e da Luta Antimanicomial num contexto de avanço do
conservadorismo. A partir do método da revisão bibliográfica considerando as
principais questões que permeiam o tema central da pesquisa e autores de
referência na área de Saúde Mental, bem como das Entidades relacionadas à
Reforma Psiquiátrica e a Luta Antimanicomial. Com este trabalho, o objetivo é
contribuir com as pautas da Reforma Psiquiátrica na desmistificação da loucura e na
apreensão dos desafios impostos pelo avanço do conservadorismo e de sua agenda
de retrocessos na área de saúde mental que reforça o retorno à lógica e prática
manicomiais. A partir da pesquisa e da análise do que foi produzido, conclui que é
necessário reconhecer a sociedade e o Estado como estigmatizantes para que
possamos desconstruir velhos preconceitos e nos fortalecer frente ao avanço
conservador.
Palavras-chave: Estigmatização social; Loucura; Reforma Psiquiátrica; Luta
Antimanicomial.
ABSTRACT
The following work deals with a research about the historical trajectory of the social
stigmatization of madness understood as a socio-cultural construction for the debate
of the challenges in the current Brazilian political and social conjuncture. The
proposal is to analyze in the socio-cultural scope the role of madness and insanity in
Brazilian society in order to apprehend the current challenges for the implementation
of the Brazilian Psychiatric Reform and the Antimanicomial Struggle in a context of
conservatism. Based on the bibliographic review method considering the main issues
that permeate the central theme of the research and reference authors in the area of 
Mental Health, as well as the Entities related to the Psychiatric Reform and the
Antimanicomial Struggle. With this work, the objective is to contribute with the
guidelines of the Psychiatric Reform in the demystification of insanity and in the
apprehension of the challenges posed by the advance of conservatism and its
setbacks in the area of mental health that reinforce the return to the logic and
practice of asylums. From the research and analysis of what has been produced, it
concludes that it is necessary to recognize society and the State as stigmatizers so
that we can deconstruct old prejudices and strengthen ourselves against the
conservative advance.
Keywords: Social stigmatization; Madness; Psychiatric Reform; Antimanicomial
Struggle.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
HJM Hospital Doutor João Machado
Colônia Hospital Colônia de Barbacena
CAPS Centro de Atenção Psicossocial
OMS Organização Mundial da Saúde
SUS Sistema Único de Saúde
MTSM Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
SRT Serviços Residenciais Terapêuticos 
NAPS Núcleo de Atenção Psicossocial
RAPS Rede de Atenção Psicossocial
PLURAL Associação Potiguar Plural
ABRASME Associação Brasileira de Saúde Mental
ABRASCO Associação Brasileira de Saúde Coletiva
ABP Associação Brasileira de Psiquiatria
CFM Conselho Federal de Medicina
CIT Comissão Intergestores Tripartite
CTs Comunidades Terapêuticas
CFESS Conselho Federal do Serviço Social
CRESS Conselho Regional do Serviço Social 
COFI Comissão de Orientação e Fiscalização Profissional
UA Unidades de Acolhimento 
ECT Eletroconvulsoterapia
Fiocruz Fundação Oswaldo Cruz
CFP Conselho Federal de Psicologia
CNS Conselho Nacional de Saúde
PEC Proposta de Emenda à Constituição
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...........................................................................................................9
2. PROCESSO DE CONSTRUÇÃOHISTÓRICA E CULTURAL DO ESTIGMA
SOCIAL DA LOUCURA..............................................................................................12
2.2 OS HOSPITAIS PSIQUIÁTRICOS E A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LOUCURA
.....................................................................................................................................22
2.3 BARBACENA, A CAPITAL BRASILEIRA DA LOUCURA....................................23
3. REFORMA PSIQUIÁTRICA E LUTA ANTIMANICOMIAL NA DEFESA DOS
DIREITOS DAS PESSOAS EM SOFRIMENTO PSÍQUICO......................................28
3.2 OS DESAFIOS DA ATUAL CONJUNTURA POLÍTICA BRASILEIRA PARA A
DEFESA DOS DIREITOS DOS DITOS LOUCOS......................................................38
CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................49
REFERÊNCIAS...........................................................................................................52
9
 1 INTRODUÇÃO 
O presente trabalho trata-se de uma pesquisa acerca da estigmatização social
da loucura a partir de sua trajetória sócio-histórica compreendendo esse estigma
social enquanto construção cultural, que permanece até os dias atuais e se
apresenta como um dos desafios aos princípios da Reforma Psiquiátrica brasileira e
da Luta Antimanicomial. A Reforma Psiquiátrica Brasileira avançou em muitos
aspectos em relação à assistência, atenção e direitos dos sujeitos em sofrimento
psíquico, no entanto nota-se ainda na sociedade, no aspecto cultural, a manutenção
do preconceito e do estigma característico desses sujeitos enquanto pessoas
incapazes e perigosas.
É perceptível a fragilidade do debate em torno do assunto (a realidade dos
sujeitos em sofrimento psíquico) fora do ambiente acadêmico ou dos serviços na
área de saúde mental. Muito do que pensamos conhecer acerca do sofrimento
psíquico vem do senso comum, do que temos acesso através de livros, filmes,
séries. A mídia tem forte influência no imaginário popular e na manutenção de
estereótipos, preconceitos, do estigma social dessa população.
A trajetória dessa população na história do Brasil é marcada pelo descaso e
pela violência, se outrora foram ignorados e simplesmente deixados à própria sorte,
a perspectiva higienista transforma esse cenário e a vida dos ditos loucos livres nas
ruas do nosso país. Compreender a construção histórica do estigma social é
reconhecer que, culturalmente, desumanizamos a pessoa em sofrimento psíquico e
a excluímos da sociedade, de seus direitos e deveres. E por essa razão, o debate
cultural consiste em pauta da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial.
Principalmente no atual contexto sociopolítico brasileiro de avanço do
conservadorismo que reflete nos retrocessos nas políticas sociais e, em particular
para esse trabalho, no fortalecimento da lógica manicomial, do tratamento
excludente e desumano.
Neste sentido, a pesquisa realizada para a elaboração do Trabalho de
Conclusão de Curso de Graduação em Serviço Social, além de ser requisito para a
obtenção do Título de Bacharel em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN) em 2019, também tem como objetivo analisar a construção
sociocultural do estigma da loucura a partir da sua trajetória histórica para
10
compreender os retrocessos na política de saúde mental. Nesse percurso,
apreender o significado da estigmatização social e como se configura como um
instrumento de poder e controle, o conceito de loucura para desconstrução de
preconceitos e do papel da institucionalização da loucura na desumanização dos
ditos loucos para justificar sua exclusão do convívio social.
Em virtude da experiência do estágio supervisionado no Hospital Doutor João
Machado (HJM) estimulou a afinidade com a área de Saúde Mental enquanto
espaço sócio ocupacional e de compromisso do Serviço Social em defesa dos (as)
usuários (as) desse serviço enquanto pessoas com direitos. Considerando o hospital
espaço de usuários (as) historicamente marginalizados (as) e estigmatizados (as)
pela sociedade e pelo próprio serviço que isola e exclui o (a) usuário (a) do convívio
social.
Diante disso, a pesquisa está também para contribuir com a desconstrução
sociocultural do estigma da loucura, pauta da Luta Antimanicomial e princípio
presente na Reforma Psiquiátrica visando a ressocialização das pessoas em
sofrimento psíquico. Bem como reafirmar o compromisso da categoria com a defesa
dos direitos dos usuários (as) da saúde mental e com o princípio de fortalecimento
dos movimentos sociais e defesa intransigente dos direitos humanos presente no
Código de Ética do (a) Assistente Social.
A saúde mental consiste em um campo bastante amplo e rico para o Serviço
Social. Para os (as) profissionais que atuam na área ou estão vinculados aos
movimentos pela Reforma Psiquiátrica a questão da estigmatização da loucura se
apresenta de forma mais direta, pois os sujeitos que se encontram no cerne dessa
questão são usuários dos serviços de saúde mental nos quais os (as) assistentes
sociais estão inseridos (as). Dessa forma, a pesquisa possui caráter qualitativo e
exploratório, considerando a complexidade do tema pesquisado e da realidade dos
sujeitos que o compõem.
E o Serviço Social possui um lugar reconhecido nesse processo e na equipe
multiprofissional inserido no contexto da saúde mental. Os valores do Projeto ético-
político da profissão expressos no Código de Ética aprovado pela Resolução do
CFESS nº. 273/93, com alterações introduzidas pelas resoluções CFESS nº290/94,
293/94, 333/96 e 594/11, direciona as (os) assistentes sociais para uma atuação
profissional na defesa intransigente aos direitos humanos, da cidadania, ampliação
11
da democracia e empenho na eliminação de todas as formas de preconceito,
discriminação, opressão e voltada para a emancipação humana.
Dessa forma, o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) reafirma em
seus manifestos no Dia Nacional da Luta Antimanicomial (18 de Maio), que essa
pauta é parte da agenda política das (os) assistentes sociais no Brasil. Articulando
com os princípios ético-políticos do Serviço Social "possibilitando uma direção
emancipadora tanto para o campo da saúde mental quanto para o Serviço Social"
(CFESS, 2012). Configurando assim, a Reforma Psiquiátrica como um processo que
se inscreve também numa dimensão ética, "pois é também uma luta contra o
estigma, a exclusão, a violência, a marginalização, e neste sentido propõe a
convivência social na diversidade" (CFESS, 2012).
O Serviço Social defende o reconhecimento dos (as) pessoas que vivem em
sofrimento psíquico como sujeitos de direitos, que podem e devem ser participantes
ativos da sociedade (CFESS, 2012). Aos (as) assistentes sociais em seu trabalho
profissional inseridos (as) em instituições, movimentos sociais, grupos temáticos,
conselhos, compete atuar na perspectiva de legitimá-los e reconhecê-los como
sujeitos de direitos para a superação das práticas sociais manicomiais que violam a
autonomia e liberdade desses sujeitos (CFESS, 2012).
 Nesse sentido, um (a) profissional comprometido com os direitos da classe
trabalhadora, articulado (a) com movimentos sociais não poderia se abster da luta
em defesa dos direitos das pessoas com sofrimento psíquico, da equidade e justiça
social, visto que, são grupos socialmente discriminados, bem como de se posicionar
em defesa dos preceitos da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, que
possuem em sua essência princípios que articulam com as dimensões ética e
política da profissão.
A metodologia adotada consiste em pesquisa bibliográfica a partir do método
marxiano, que melhor se adequa à necessidadede analisar a realidade social do
objeto desta pesquisa. A revisão bibliográfica está discriminada a partir dos
elementos que contemplam o tema em questão. No primeiro capítulo, para a
discussão a respeito da estigmatização social da loucura foi necessário
primeiramente analisar o termo “estigmatização” e o que representa na sociedade,
segundamente compreender o que é a loucura e, posteriormente, discutir sobre a
institucionalização e seu papel na área da saúde mental. No segundo capítulo, são
feitos alguns recortes acerca da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial
12
embasando a discussão sobre os desafios da atual conjuntura política brasileira para
a defesa dos direitos das pessoas em sofrimento psíquico.
Considerando esse roteiro, a revisão bibliográfica para este trabalho conta com
leituras de autores como Paulo Amarante, Eduardo Mourão e Lucia Rosa
contribuindo para a construção da trajetória histórica da loucura, Erving Goffman e
Michel Foucault para o debate acerca da estigmatização social e a relação de poder
e controle. Documentos produzidos pelas entidades ligadas à Luta Antimanicomial
também fazem parte da revisão bibliográfica, principalmente em relação a análise
dos retrocessos na política de saúde mental.
O trabalho encontra-se dividido em dois capítulos. O primeiro capítulo traz o
processo de construção histórica e cultural do estigma social da loucura antes e
depois de sua institucionalização; o segundo capítulo apresenta a Reforma
Psiquiátrica e a Luta Antimanicomial para discutir os desafios da atual conjuntura
política brasileira para a defesa dos direitos dos ditos loucos.
2. PROCESSO DE CONSTRUÇÃO HISTÓRICA E CULTURAL DO 
ESTIGMA SOCIAL DA LOUCURA.
É a cultura que faz pessoas demandarem manicômio,
exclusão, limitação. 
 Paulo Amarante
Uma pequena frase que carrega o peso de um pensamento popular
construído ao longo dos anos e que reflete o preconceito, a violação dos direitos
humanos e o estigma em torno da loucura e dos ditos loucos perpetuados na
sociedade como tabu, “lugar de louco é no hospício”, representa o peso do debate
cultural que deve ser promovido para que esses sujeitos sejam vistos além de sua
“condição”, para que o atendimento humanizado seja garantido e o medo do
desconhecido seja superado, conscientizando-se do sujeito por trás do estigma. Por
essa razão, a Reforma Psiquiátrica, em meio as propostas para além da mudança
na assistência e tratamento dos sujeitos em sofrimento psíquico, visa também a
desmistificação da loucura na sociedade.
13
Neste trabalho, optei pelos termos “louco” e “loucura” por ser uma pauta da
Luta Antimanicomial na desconstrução do sentido pejorativo desses termos. Afinal, o
que é ser “louco”? O que é “loucura”? No nosso cotidiano não é raro ouvir uma vez
ou outra “fulano ficou louco ou doido”, “isso é loucura”, “está pensando que sou
doido, é?”. Na ciência, loucura é “doença”, “transtorno”, “sofrimento”. Na arte,
loucura é liberdade, confusão, mistério da mente humana. E para a sociedade o
louco é esse ser incompreendido, fora dos padrões, irracional, por vezes incapaz,
violento, um risco para si e para outros e que desperta medo ou pena por sua
condição, como se a loucura não pudesse ser reflexo da própria sociedade.
No entanto, familiares, profissionais e os ditos loucos, hoje lutam para que
esses mesmos loucos tenham seus direitos garantidos, que sejam reconhecidos
como os sujeitos de direitos que são, que recebam tratamento digno e humanizado,
nos serviços utilizados e nas ruas. Na experiência do estágio obrigatório no Hospital
Doutor João Machado (HJM), um ensinamento muito importante em relação ao
assunto nos foi concedido, todos somos passíveis da loucura, impossível alegar com
toda certeza que alguém é totalmente “são”, que não possa vir a ser um risco para si
ou para outros. Como escutamos muitas vezes nessa experiência, “nenhum ser
humano está livre do surto”.
No processo de consolidação da Reforma Psiquiátrica Brasileira um dos
principais desafios é a formação de recursos humanos, que está intimamente ligada
à capacidade de superação do paradigma da tutela do louco e da loucura. Os dados
apresentados no relatório do Ministério da Saúde (2005) apontam que esse
processo exige cada vez mais da formação técnica e teórica dos trabalhadores. E a
realidade desses trabalhadores é que, muitas vezes, encontram-se desmotivados
por baixas remunerações, contratos precários, condições de trabalho precárias
como falta de recursos ou um local adequado para exercer suas funções ou mesmo
garantir um atendimento de qualidade aos usuários.
E, para que possamos analisar esse processo de construção histórica é
necessário compreender o que é a loucura e estigmatização social. Muito do que
conhecemos sobre a loucura vem do senso comum, do que temos acesso através
de livros, filmes, séries. A mídia tem forte influência no imaginário popular e na
manutenção de preconceitos, do estigma social dessa população. Dessa mesma
forma, o modo como o Estado lida com a loucura também influencia em como é
compreendida pela sociedade.
14
O trajeto histórico do Renascimento até a atualidade tem o sentido da
progressiva separação e exclusão da loucura do seio das experiências
sociais. O conceito de loucura vem sendo historicamente construído e ainda
guarda remanescentes de antigas concepções como o pareamento entre
loucura e periculosidade, por exemplo. A segregação se dá mais do que
fisicamente, permeia o corpo social numa espécie de barreira invisível que
impede a quebra de velhos paradigmas. (FERNANDES e MOURA, 2009)
Com os ditos loucos reconhecidos como uma das populações mais excluídas
socialmente, ainda em Fernandes e Moura (2009), em comparação com a
população fora desse perfil, essas pessoas apresentam redes sociais menores do
que a média. Sendo uma das consequências da estigmatização social construída
historicamente às custas da desumanização do louco. Ao longo dos anos, a
definição e tratamento para o dito louco e sua loucura foram se modificando, de caso
de polícia a co-responsabilidade entre Estado e família, entre doença, transtorno ou
sofrimento.
O processo de estigmatização da loucura está intimamente relacionado ao
processo de construção da loucura enquanto doença mental, justificando sua
reclusão e medicalização pelos profissionais da área.
A construção da noção científica de doença mental implicaria uma série de
apropriações de imagens da loucura veiculadas pelo senso comum. No
entanto, as idéias e as vivências leigas da loucura expressariam, ao mesmo
tempo, rejeições e assimilações de várias concepções elaboradas e
difundidas pelos alienistas e psiquiatras. (ENGEL, 2001, página 12)
 
Dentro desse processo, no qual o saber popular era o reflexo da postura do
Estado em relação aos ditos loucos, houve uma fase em que
[...] os loucos eram associados aos bêbados e aos animais ferozes, cuja
presença nos espaços públicos podia representar ameaça não apenas à
ordem e à tranqüilidade públicas, mas também à própria integridade física e
moral da população urbana. O estado de embriaguez era, assim,
aproximado ao estado de loucura, na medida em que ambos
caracterizavam-se pela ausência de consciência nos atos praticados. Nesse
sentido, o Código Criminal de 1830 reconhecia o estado de embriaguez
como circunstância atenuante na prática dos crimes nele prescritos. No
Código das posturas municipais, os loucos e os embriagados eram
associados aos animais ferozes, representando, assim, um perigo –
diretamente relacionado ao estado de irracionalidade/animalidade– que
circulava, sem controle, pelas ruas da cidade. (ENGEL, 2001, página 186)
15
Observando as condutas iniciais e as comparações feitas pelo Estado e
cultivadas na cultura popular, o estigma da loucura sempre esteve vinculado à ideia
de irracionalidade e periculosidade. Logo, algo que não deveria permanecer nas
ruas, sem controle, sem a dita ordem. E que, inicialmente, dependiam apenas de
caridade, algo que ainda é bem marcante na realidade dessa população apesar dos
avanços alcançados pela Reforma Psiquiátrica e pela Luta Antimanicomial, pois
essa questão é de ordem estrutural e política.
A construção histórica do estigma da loucura, com sua institucionalização e
medicalização, gerou a chamada “indústria da loucura” e para aqueles que dela se
beneficiam, a manutenção da estigmatização e dos mitos em relação ao louco e a
loucura são indispensáveis. Manter a loucura sob tutela dos grandes hospitais e dos
medicamentos é uma estratégia política visto que, com o avanço neoliberal, se
fortalece também a lógica manicomial, que será abordada no próximo capítulo em
virtude da agenda de retrocessos no campo da saúde mental.
Em vista disso, é relevante analisarmos a questão do estigma social, sua
concepção e sua utilidade. Goffman (1963) em sua obra Estigma - Notas sobre a
Manipulação da Identidade Deteriorada define "estigma" enquanto "situação do
indivíduo que está inabilitado para aceitação social plena" (GOFFMAN, 1963, pág.
5), na sociedade temos dois tipos principais de identidade: aquela criada pela
sociedade (o que se espera de determinado grupo) e a identidade real, quem
realmente somos, ser diferente do que a sociedade espera que sejamos gera uma
marca que irá servir como um visor pelo qual seremos julgados.
Assim sendo, o que a sociedade compreende por “loucura” foi se construindo
historicamente e associando culturalmente loucura à periculosidade, incapacidade,
uma compreensão intimamente ligada a forma de tratamento que essas pessoas
receberam ao longo dos anos, desde sua compreensão enquanto fenômeno
sobrenatural ao status de doença mental. Mesmo com o avanço da ciência,
culturalmente a loucura já havia sido mistificada e marginalizada, despertando medo
e fascínio nas pessoas através da mídia e do imaginário popular e, há que se
considerar que o avanço da ciência também teve sua parcela de colaboração ao
conferir ao sujeito o status de “doente mental”.
Apreendendo essa discussão, a “doença mental” é a marca construída pela
ciência e reforçada na sociedade para os ditos loucos, as pessoas acometidas pela
loucura serão julgadas pela concepção que os “estudiosos” (aqueles que detém o
16
conhecimento médico) explanam para a sociedade e, esse julgamento geralmente
sustentado pela concepção de que loucura é o oposto de razão, da doença mental
incapacitante e perigosa, justificando para a sociedade sua tutelagem e exclusão
social, tornando fértil o terreno para o preconceito e atitudes discriminatórias que se
materializam no estigma social da loucura.
Considerando que, em Foucault (1975) "a doença só tem realidade e valor de
doença no interior de uma cultura que a reconhece como tal" e que, "[...] cada
cultura formará da doença uma imagem cujo perfil é delineado pelo conjunto das
virtudes antropológicas que ela negligencia ou reprime". Em outras palavras, o valor
da loucura modifica-se com a sociedade, com o avanço histórico-cultural, a exemplo:
a sociedade burguesa e seu ideário, todo aquele que não se encaixa nos seus
moldes, é passível da loucura. E, nessa relação, “nossa sociedade não quer
reconhecer-se no doente que ela persegue ou que encerra; no instante mesmo em
que ela diagnostica a doença, exclui o doente” (FOUCAULT, 1975, pág. 51).
Esse raciocínio serve como base para a trajetória da loucura na sociedade,
vista como algo feio, sujo, ameaçador e improdutivo. E na sociedade capitalista, todo
aquele que não se adapta aos seus moldes de produzir e consumir, que não se
encaixa aos seus padrões, é uma ameaça ou um peso desnecessário. Nessa
perspectiva, considerando o cenário brasileiro no qual a loucura perambulava pelas
ruas ou era trancafiada nos porões das Santas Casas de Misericórdia,
os médicos brasileiros começariam a reivindicar para si a responsabilidade
sobre a loucura, defendendo, mediante relatórios, artigos e discussões na
Academia de Medicina do Rio de Janeiro, a necessidade da construção de
hospícios onde os alienados mentais pudessem ser recolhidos e tratados
convenientemente por especialistas. Os marcos finais da pesquisa apontam
para os novos rumos tomados pela psiquiatria brasileira a partir dos anos 20
do século XX, marcados pela difusão da perspectiva preventiva da higiene
mental articulada em torno dos princípios e das propostas eugênicas.
(ENGEL, 2001, página 15)
Nesse sentido, ao reivindicar a loucura para si, a ciência buscou reformular a
loucura enquanto doença mental para que fosse possível formular e implementar
novos mecanismos de controle social, como é possível compreender com a criação
de instituições asilares e a possibilidade de reclusão das pessoas diagnosticadas
como doentes mentais.
17
A construção da noção científica de doença mental implicaria uma série de
apropriações de imagens da loucura veiculadas pelo senso comum. No
entanto, as idéias e as vivências leigas da loucura expressariam, ao mesmo
tempo, rejeições e assimilações de várias concepções elaboradas e
difundidas pelos alienistas e psiquiatras. (ENGEL, 2001, página 12)
Compreendendo que a luta para desmistificação da loucura também se dá
quanto à sua conceituação,
o que é 'doença mental'? É o oposto de saúde mental? É o desequilíbrio
mental? Deparamo-nos agora com um outro sentido da expressão saúde
mental, ou seja, com a idéia de que saúde mental seja um estado mental
sadio, portanto, poderíamos concluir, um estado normal. Ou, dito de outra
forma, de um estado de bem-estar mental, ou de sanidade mental, ou ainda,
de não existir nenhuma forma de desordem mental. (AMARANTE, 2007,
página 15)
Realmente nos deparamos com um impasse. O que é normal? O que é ser
normal? De perto, ninguém é normal? Mas, se isto é 'verdade', podemos
concluir, como argumenta Ernesto Venturini (2005), que "de perto também
ninguém é anormal"! Existia um médico que considerava que normal era
alguém que não foi devidamente examinado ... Mais que um jogo de
palavras, estamos de frente a um problema científico muito sério e grave.
(AMARANTE, 2007)
Percebendo o louco como doente mental, justificando como desordem e
anormalidade, perpetuamos o estigma da periculosidade e incapacidade de conviver
socialmente, justificando métodos de tratamento que ferem seus direitos e
marginalizam a loucura e, consequentemente, excluem o louco como parte
integrante da sociedade, retirando do sujeito sua autonomia e liberdade.
No dicionário, a loucura significa: alienação mental, insensatez, imprudência;
extravagância, ato descontrolado ou irrefletido. Todos relacionados a uma ideia de
incapacidade, irracionalidade e periculosidade, algo que deve ser reprimido.
As atitudes que nós, normais, temos com uma pessoa com um estigma, e
os atos que empreendemos em relação a ela são bem conhecidos na -
medida em que são as respostas que a ação social benevolente tenta
suavizar e melhorar. Por definição, é claro, acreditamos que alguém com
um estigma não seja completamente humano. Com base nisso, fazemos
vários tipos de discriminações, através das quais efetivamente, e muitas
vezes sem pensar, reduzimos suas chances de vida: Construímos uma
teoria do estigma; uma ideologia para explicar a sua inferioridade e dar
conta do perigo que ela representa, racionalizando algumas vezes uma
animosidade baseada em outras diferenças, tais como as de classe social.Utilizamos termos específicos de estigma como aleijado, bastardo,
retardado, em nosso discurso diário como fonte de metáfora e
representação, de maneira característica, sem pensar no seu significado
original. (GOFFMAN, 1963, página 8)
18
O estigma é, de certa forma, um modo que a sociedade encontrou para lidar
com as diferenças que não é capaz de suportar, para justificar a exclusão, a
violência. Como podemos perceber observando a história da loucura, os ditos loucos
sempre foram marginalizados, não só pelo Estado como também pela sociedade,
conivente com os métodos desumanos para enfrentar a loucura. O exemplo maior é
o processo de institucionalização através dos hospitais psiquiátricos que, foram bem
definidos pelo cineasta Helvécio Ratton (1979), em seu documentário Em nome da
razão, como instituições que cumprem um determinado papel em nossa sociedade
no qual a cura não é o objetivo e nem a recuperação mas o controle, pois é através
do hospício que a sociedade exclui os que não se adaptam aos seus padrões de
"normal" e "adequado".
Desde tempos antigos o louco e sua loucura são marginalizados e
relacionados à algo ruim, mal. O estigma social dessa população gera preconceito
que se materializa em vários tipos de discriminações, que são naturalizadas pela
cultura da sociedade. Retomando os hospícios como a expressão total de um
instrumento de exclusão e controle daqueles que não correspondem aos padrões
impostos pela sociedade. Enquanto naturalizamos termos e atitudes que justificam a
exclusão social desses indivíduos, o estigma social se fortalece, bem como a
manutenção da lógica manicomial.
A trajetória da loucura se deu, em sua maior parte, na dualidade entre o
natural e o místico. Nas sociedades pré-socráticas e antigas, a loucura era atribuída
a algo sobrenatural, a presença e possessão de maus espíritos na qual a cura se
dava através de psicocirurgias primitivas ou trepanação. Na Grécia e Roma antigas
a explicação se deu pelos filósofos e sua concepção de loucura enquanto doença
natural e, já na idade média, o louco tornou-se a personificação do mal, a
demonização da loucura e busca da cura por meios religiosos como o exorcismo. No
Renascimento (meados do século XVI - final do século XVI), as portas se abrem
para a visão médica e com o advento do Iluminismo (século XVII - XVIII) e a
exaltação do poder da razão e do avanço da ciência.
Com os processos provocados pela Revolução Francesa, "surge uma nova
sensibilidade social, marcadamente a partir dos séculos XVII E XVIII" (ROSA, 2003,
p. 41). Essa nova sensibilidade social é o Iluminismo, que em sua essência tinha a
liberdade do homem. Se libertar da ignorância enaltecendo o saber e o uso da
19
razão, tratava-se aqui de tornar o homem consciente de sua realidade e responsável
por suas ações.
Lucia Rosa (2003) nos remete ao ideário da burguesia revolucionária
expressado pela ilustração e a modernidade. O sujeito agora é o centro da
sociedade. O indivíduo enquanto ser moral e racionalmente autônomo. À margem
dessa sociedade se encontra o louco e a loucura, pois põem à prova a essência da
sociedade burguesa da época, a razão. Rosa (2003) explica que, segundo a leitura
jusnaturalista, o motivo por trás da marginalização do louco se dava pelo fato do
louco não partilhar da mesma racionalidade burguesa, ele a desafiava e punha à
prova seus princípios, negócios e instituições.
E nessa racionalidade que serão fundadas as bases ideológicas que
legitimam a exclusão e a segregação do louco pelo Estado (ROSA, 2003). Diante
disso, a percepção e o tratamento que a sociedade confere ao louco e a loucura ao
longo da história nos possibilita analisar o estigma enquanto construção sócio-
cultural.
É notável a dicotomia na sociedade burguesa, produtividade e
improdutividade, riqueza e pobreza, inclusão e exclusão. Não há meios termos e a
loucura, numa sociedade de produção, é improdutiva. Justificando sua
marginalização e exílio, a burguesia delega à psiquiatria o problema político e
econômico que o louco representa, tornando a loucura administrável, como explica
Rosa (2003), tornou possível sua medicalização, questão importante a ser abordada
em outra oportunidade, o marketing da loucura e indústria dos psicotrópicos.
Na idade contemporânea, em particular na França, “loucura” é todo aquele
que não se encontra nos padrões da sociedade: inválidos, pobres, mendigos,
pessoas com doenças venéreas, libertinos, entre outros considerados escória para
os quais a exclusão do convívio social era a resposta, “não podia deixar na rua um
mentecapto” (Machado de Assis em O alienista, 1882). No Brasil, a loucura foi
ignorada socialmente por quase 300 anos e só passou a ser objeto de intervenção
por parte do Estado no início do século XIX com a chegada da família real
(FONTES, 2012). O louco era resíduo da sociedade e uma ameaça a ordem pública.
Uma trajetória marcada pela discriminação e descaso que até hoje, ao
observar a realidade dessa população, pesa em suas vidas e daqueles a ela
relacionados, como seus familiares, amigos e profissionais. A manutenção do
estigma social da loucura se dá pelos vestígios de pensamentos ultrapassados que
20
ainda persistem na nossa sociedade, o temor do desconhecido, a religiosidade e o
próprio descaso do Estado mistificam a loucura sem pesar as consequências na
realidade dessas pessoas.
Para descortinar a influência do estigma social da loucura na sociedade basta
atentarmos para seu reflexo social, cultural e político. O Yahoo produziu uma
reportagem com os candidatos à presidência do Brasil em outubro de 2018 e
questionou sobre políticas públicas em torno da saúde mental e apenas 6 dos 13
candidatos responderam. E, desses 6 candidatos, apenas dois citaram em seu plano
de governo sobre saúde mental. Essa circunstância nos remete a reflexão de Leon
Garcia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, “nosso país se
encontra em um cenário de ajuste fiscal no qual o governo aumenta o investimento
para o tipo de serviço em saúde mental mais contestado pelo ponto de vista técnico
e de direitos humanos” (GARCIA, 2018).
O modo como o Estado lidava com a loucura refletiu em como a sociedade
percebia os ditos loucos e construiu-se ao longo dos anos a cultura da
periculosidade, da incapacidade e da falta de humanização nos tratamentos dessa
população. Com isso, privados de sua liberdade e do convívio em sociedade nos
antigos manicômios, “lugar de louco é no hospício” passou a ser uma expressão
comumente usada e mesmo atualmente, percebemos que esse ainda é um
pensamento cultural, pois não é um tema discutido em todo lar brasileiro ou
constantemente exposto na mídia sem ser mistificado, romantizado.
Logo, principalmente para os pobres, o comportamento agressivo e
desordeiro levava a reclusão. Eram destinados para os porões das Santas Casas de
Misericórdia, onde eram amarrados e viviam em péssimas condições de higiene e
cuidado.
Os primeiros estabelecimentos para os loucos, termo que, pelo que podemos
notar na trajetória da loucura, era destinado a qualquer pessoa que não se
enquadrava aos padrões da sociedade ou à expectativa do grupo familiar, afetivo ou
social que integrava. A exemplo, na França eram internados (as): inválidos (as),
pobres, pessoas em situação de rua, com doenças venéreas, libertinos e etc. No
Brasil a realidade para os ditos loucos não era diferente como foi supracitado,
reclusão e condições desumanas de internação.
Compreendendo que a loucura modificou-se com a sociedade e com as
noções de produtividade e improdutividade e do que é socialmente aceito ou não.
21
Em outraspalavras, a loucura foi historicamente construída sob os estigmas
justificados pelo Estado e pelos saberes psi (detentores do conhecimento médico) e
reforçados na sociedade (os loucos perigosos ou que não contribuíam para a
sociedade). Uma trajetória marcada pela desumanização do sujeito, pelo descaso e
violência, pelas condições precárias de sobrevivência.
A História da Loucura se mistura com a história da nossa sociedade. O hoje
chamado louco já foi o sábio, o artista, o escolhido divino, até mesmo o
bobo da corte. Mas, com o passar do tempo – a Revolução Industrial e a
consolidação do capitalismo – o doente mental passou a ser visto como
alguém que não produzia, que não possui ou perdeu sua capacidade
laboral. Não rendia lucros e incomodava a sociedade.
(RIBEIRO, 2012)
Como já supracitado, a loucura foi socialmente ignorada no nosso país por
quase 300 anos, sendo objeto de intervenção por parte do Estado no início do
século XIX com a chegada da família real, numa perspectiva higienista considerando
que o louco era visto como resíduo da sociedade e uma ameaça à ordem pública.
Considerando isso, como traz em seu artigo, Poz et al. (2012), na história do Brasil
na organização dos cuidados ao doente mental, a criação do Hospício Pedro II no
Rio de Janeiro em 1852 caracteriza-se como um marco inaugural, pois até então
não existia no país uma instituição especificamente destinada para essa população.
No Brasil, como aborda Ribeiro (2012), os manicômios são descendentes dos
antigos leprosários, que eram grandes casas afastadas da civilização, criadas para
alojar os portadores da lepra e evitar a pandemia. Outro nome para "depósito", pois
ofereciam pouco ou nenhum cuidado com aqueles fadados a permanecer no local
até a morte.
Mesmo com o desaparecimento da Lepra, a partir do século XV, as marcas
e a estrutura física dos leprosários ainda permaneciam. Aos poucos, no
decorrer dos séculos, o ‘jogo de exclusão’ (como lembra-nos Foucault), será
retomado. E, a partir do século seguinte, os leprosos são substituídos por
pobres, presidiários, velhos, vagabundos e... os chamados ‘alienados’.
Aqueles que não contribuíam e/ou ofereciam perigo à sociedade.
Desumanizados, maltratados, viviam em condições muito precárias.
(RIBEIRO, 2012)
E o estigma antes carregado pelos antigos leprosários será repassado para
os hospitais psiquiátricos e para os sujeitos forçados à sobreviver dentro de seus
muros. Os hospitais psiquiátricos provocavam e, até os dias hodiernos, provocam
22
medo, aflição e tristeza para todo aquele que entra em contato com suas histórias,
com suas fundações e sobreviventes.
2.2 OS HOSPITAIS PSIQUIÁTRICOS E A INSTITUCIONALIZAÇÃO 
DA LOUCURA 
“Quando a instituição destrói e mata, não há solução de
compromisso possível, pois seria um compromisso com a
morte” 
 Franco Basaglia
Institucionalizar é adaptar o sujeito às rotinas características da instituição
(horários, regras, normas) a ponto de prejudicar sua adaptação a vida fora desse
local ou, em casos mais extremos, torná-lo dependente desse local de forma que
sua reinserção social seja muito mais complicada, o que ocasiona os casos de
reinternação após curtos períodos fora da instituição.
Com a trajetória histórica da loucura, apreendemos que a institucionalização
da loucura (com os hospitais psiquiátricos) se deu através da necessidade de lidar
com aqueles que eram considerados "resíduos da sociedade", que eram uma
ameaça à ordem pública e que por essa razão não deveriam estar às vistas dos
"cidadãos de bem", dos ditos "sãos". Um processo de construção da necessidade e
legitimidade de reclusão desses sujeitos em instituições totais.
as primeiras instituições psiquiátricas surgiram em meio a um contexto de
ameaça à ordem e à paz social, em resposta aos reclamos gerais contra o
livre trânsito de doidos pelas ruas das cidades; acrescentem-se os apelos
de caráter humanitário, as denúncias contra os maus tratos que sofriam os
insanos. A recém-criada Sociedade de Medicina engrossa os protestos,
enfatizando a necessidade dar-lhes tratamento adequado, segundo as
teorias e técnicas já em prática na Europa (RESENDE, 2007, p. 38 apud
FONTE, 2012).
Dessa forma, a característica em comum entre essas instituições, seja Santa
Casa ou hospital psiquiátrico, é a sua principal função: excluir socialmente o louco
garantindo que não fique livre para ir e vir nas ruas contrariando o que a sociedade e
o Estado concebem por "normalidade" e "ordem". A postura que o Estado e a ciência
assumiram perante o louco e sua loucura foi um dos principais fatores que
contribuíram para a conivência da sociedade diante toda a barbárie que marca a
trajetória da institucionalização dessa população.
23
2.3 BARBACENA, A CAPITAL BRASILEIRA DA LOUCURA
Como analisar o estigma social da loucura no Brasil e não discutir sobre o
ápice da violação de direitos humanos das pessoas ditas loucas e a expressão
maior da institucionalização da loucura e da exclusão social como forma de controle
daquele que não se adaptava ao sistema: os hospitais colônias. Hospitais
psiquiátricos construídos em locais afastados que tinham por objetivo resolver os
problemas de superlotação dos hospícios e tinham como proposta a laborterapia, a
terapia através do trabalho, principalmente manual. No entanto, como podemos
notar na realidade da história da loucura em nosso país, a laborterapia não era
aplicada enquanto tratamento terapêutico para o sofrimento psíquico mas como um
meio de obter mão-de-obra barata.
A criação do hospício reflete como as expressões da questão social eram
percebidas no período, sendo:
um assunto ilegal, subversivo e, portanto, tratado como crime ou desordem
e, por isso, reprimido. Seus agentes eram detidos e reclusos em cadeias
públicas, excluídos do cenário social. Embora igualmente excluídos da
sociedade e privados da liberdade de ir e vir, os loucos, com a
criação do hospício, recebiam tratamento distinto, sendo reclusos nos
porões das Santas Casas de Misericórdia, mantidos sob vigilância de
guardas e carcereiros, submetidos à camisa de força e maus tratos. A
função principal do hospício nessa fase foi a de remover, excluir e sanear a
cidade de um segmento que potencialmente era considerado
desordeiro/perigoso (RESENDE, 1990, apud ROSA, 2003, p. 86).
Ainda, como relatou Daniela Arbex (2013) em seu livro-reportagem
Holocausto Brasileiro, um funcionário aposentado do Hospital Colônia admitiu que “o
tratamento de choque e o uso de medicações nem sempre tinham finalidades
terapêuticas, mas de contenção e intimidação” (Arbex, 2013, página 31). “A teoria
eugenista, que sustentava a ideia de limpeza social, fortalecia o hospital e justificava
seus abusos. Livrar a sociedade da escória, desfazendo-se dela, de preferência em
local que a vista não pudesse alcançar” (Arbex, 2013, página 21).
Percebe-se que a discriminação, o preconceito e o estigma da loucura em
nosso país foram respaldados pela forma como os doentes mentais eram tratados
pelo sistema, por uma política higienista e institucionalista, que tornava casos de
24
polícia e criminaliza a loucura, em particular os loucos agressivos e/ou agitados, com
um quadro clínico mais grave. Eram deixados à mercê ou em instituições que não os
tratava como seres humanos, como também havia a possibilidade de serem
alocados a entidades caritativas, muitas vezes religiosas, que se propunhavam a
cuidar daqueles que sofriam com suas “perturbações mentais”(ROSA, 2003).
A criação de novos hospitais não amenizou a situação desordenada dos
hospitais públicos, que continuavam com excesso de pacientes internados em
situações precárias e degradantes. Os três grandeshospitais do Brasil que
mantinham pacientes internados: Hospital de Diamantina em Minas Gerais, no qual
atualmente funciona o CAPS Renascer nos fundos do antigo hospital; Hospital Bom
Retiro em Curitiba, Paraná e o Hospital Colônia de Barbacena em Minas Gerais
(7PSAN, 2017), comparado a um campo de concentração nazista travestido de
hospital.
Daniela Arbex em seu livro-reportagem, como diz na descrição da obra
"resgata do esquecimento um dos capítulos mais macabros da nossa história", essa
frase se refere à barbárie e a desumanidade praticadas no maior hospício do Brasil,
conhecido por Colônia.
Ao fazê-lo, a autora traz à luz um genocídio cometido, sistematicamente,
pelo Estado brasileiro, com a conivência de médicos, funcionários e também
da população, pois nenhuma violação dos direitos humanos mais básicos se
sustenta por tanto tempo sem a omissão da sociedade. Pelo menos 60 mil
pessoas morreram entre os muros da Colônia. Em sua maioria, haviam sido
internadas à força. Cerca de 70% não tinham diagnóstico de doença mental.
Eram epiléticos, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, gente que se
rebelava ou que se tornara incômoda para alguém com mais poder.
(Descrição do livro-reportagem, Holocausto Brasileiro, ARBEX, 2013)
O Hospital Colônia de Barbacena recebia seus pacientes através do "trem
dos loucos", como ficou conhecido o trem que tinha como parada única, destino
final, o Colônia. Muitos também eram enviados de ônibus ou em viatura policial
(ARBEX, 2013).
Desde o início do século XX, a falta de critério médico para as internações
era rotina no lugar onde se padronizava tudo, inclusive os diagnósticos.
Maria de Jesus, brasileira de apenas vinte e três anos, teve o Colônia como
destino, em 1911, porque apresentava tristeza como sintoma. Assim como
ela, a estimativa é que 70% dos atendidos não sofressem de doença
mental. Apenas eram diferentes ou ameaçavam a ordem pública. Por isso, o
Colônia tornou–se destino de desafetos, homossexuais, militantes políticos,
mães solteiras, alcoolistas, mendigos, negros, pobres, pessoas sem
documentos e todos os tipos de indesejados, inclusive os chamados
insanos. A teoria eugenista, que sustentava a ideia de limpeza social,
25
fortalecia o hospital e justificava seus abusos. Livrar a sociedade da escória,
desfazendo-se dela, de preferência em local que a vista não pudesse
alcançar. (ARBEX, 2013, página 21)
E por muito tempo, o Colônia serviu ao país como depósito de seres humanos
que não eram vistos ou tratados como tal, padecendo de todo tipo de moléstias dada
as condições nas quais se encontravam, além de fortalecer estigmas e estereótipos
da loucura que marcaram toda uma geração. Não é de modo algum exagero
comparar com o Holocausto, o assassinato em massa de cerca de seis milhões de
judeus durante a Segunda Guerra Mundial, como nos apresentam no artigo
disponibilizado pelo site do Museu Memorial do Holocausto nos Estados Unidos, os
campos de concentração na Alemanha Nazista consistiam em campos de
aprisionamento e extermínio.
Distinto do que muitas pessoas possam pensar sobre o assunto, a maioria
dos prisioneiros nos primeiros campos de concentração eram: alemães de ideologia
comunista ou social-democrata, ciganos da etnia Romani, Testemunhas de Jeová,
homossexuais, acusados de comportamento "anti-social" ou fora dos padrões
sociais e, após o massacre em 1938, que ficou conhecido como "kristallnacht"
("Noite dos Cristais"), os nazistas iniciaram as prisões em massa de judeus.
É histórica a semelhança desses locais (campos nazistas) com a trajetória
dos hospitais psiquiátricos no Brasil e no mundo. As mortes ocorridas dentro dessas
instituições não foram acidentais, fatalidades, pois acidente é algo que não se prevê
e fatalidades são, em teoria, situações que não se pode evitar. As vidas perdidas
dentro dos muros dessas instituições não foram acidentais, elas possuem um
significado histórico e cultural que diz “louco não era considerado gente” e pessoas
fora dos padrões sociais, fora do que é socialmente aceito como “normal” não
merecia convívio social ou tratamento digno.
A teoria eugenista, que sustentava a ideia de limpeza social, fortalecia o
hospital e justificava seus abusos. Livrar a sociedade da escória,
desfazendo-se dela, de preferência em local que a vista não pudesse
alcançar. Em 1930, com a superlotação da unidade, uma história de
extermínio começou a ser desenhada. Trinta anos depois, existiam 5 mil
pacientes em lugar projetado inicialmente para 200. A substituição de
camas por capim foi, então, oficialmente sugerida, pelo chefe do
Departamento de Assistência Neuropsiquiátrica de Minas Gerais, José
Consenso Filho, como alternativa para o excesso de gente. A intenção era
clara: economizar espaço nos pavilhões para caber mais e mais infelizes. O
modelo do leito chão deu tão certo, que foi recomendado pelo Poder Público
para outros hospitais mineiros em 1959. (ARBEX, 2013, página 21-22)
26
A banalização da vida ocorre numa via de mão dupla entre a sociedade e o
Estado, culturalmente fomos coniventes com o que ocorria dentro dos muros dos
hospícios.
"Ô seu Manoel, tenha compaixão
Tira nóis tudo desta prisão
Estamos todos de azulão
Lavando o pátio de pé no chão.
Lá vem a bóia do pessoal
Arroz cru e feijão sem sal
E mais atrás vem o macarrão
Parece cola de colar balão
Depois vem a sobremesa
Banana podre em cima da mesa
E logo atrás vem as funcionárias
Que são as putas mais ordinárias"
Autoria: Sueli Aparecida Rezende, ex menina de Oliveira, internada no Hospital
Colônia de Barbacena desde os 10 anos de idade, faleceu em 2011 antes de
reencontrar a filha Débora, a qual deu à luz no Colônia.
A música tornou-se hino do hospital e foi imortalizada na voz de sua autora no
documentário de Helvécio Ratton, Em nome da razão. Arbex (2013) relata que até
os dias atuais, os sobreviventes do Colônia lembram de sua letra e do significado
em suas vidas, em sua história.
Em meio a tanta crueldade, aqueles que sobreviveram receberam a chance
de conhecerem e experimentarem o real significado de viver e não apenas
sobreviver à exclusão e à barbárie e é nessa perspectiva que nos debruçamos para
discutir as consequências da institucionalização e da estigmatização social que
marcam a trajetória da loucura na sociedade com o advento dos hospitais
psiquiátricos; compreendendo que, a mera desospitalização sem assistência não é o
suficiente mas a apresentação de um ambiente acolhedor e de condições dignas
como é direito de todo ser vivente. Sabemos que as marcas deixadas por uma vida
inteira sobrevivendo aos muros e condições degradantes dos manicômios está muito
27
além das marcas físicas, psicológicas, uma marca tão pesada quanto, a marca
social que se apresenta quase como uma barreira final para o verdadeiro convívio
em sociedade dessas pessoas.
Goffman (1961) define uma instituição total como um local no qual um número
significativo de indivíduos em situação semelhante residem e trabalham separados
da sociedade por considerável período de tempo sendo formalmente administrados.
E, enquanto instituição total, é caracterizada principalmente por excluir os internos
de uma relação social com o mundo externo através de proibições à saída (que
refletem no esquema físico, como paredes e portas altas e fechadas, fossos, água,
arame farpado) (GOFFMAN, 1961, página 16). Essas características nos remete a
realidade dos hospitais psiquiátricos, construídos em locais afastados do grande
centro urbano, com uma estrutura imponente e intimidadora.
Ainda dissertando em torno das instituições totais, Goffman traz outras
características, "todos os aspectos da vida são realizados no mesmo local e sobúnica autoridade" e todas as atividades diárias são monitoradas por um grupo de
outras pessoas e rigorosamente estabelecidas em horários e regras formais
explícitas que, à princípio, são planejadas para atender aos objetivos oficiais da
instituição. Podemos exemplificar aqui as atividades realizadas pela laborterapia nos
Hospitais Colônias. Premissa básica em uma instituição total: "controle de muitas
necessidades humanas pela organização burocrática de grupos completos de
pessoas" (GOFFMAN, 1961).
Nesse tipo de instituição é comum o distanciamento social entre as partes
envolvidas, os internos que não possuem contato com o mundo externo e a equipe
dirigente que transita nos dois mundos e tem a função de administrar a vida desse
grande grupo. Considerando a experiência do estágio obrigatório em um hospital
psiquiátrico, podemos observar o cotidiano de uma instituição total e dos sujeitos
inseridos nela, seja como paciente ou como profissional. Por mais que a instituição
não funcione como os antigos manicômios, ainda se caracteriza como uma
instituição total de forma a institucionalizar os sujeitos com sua estrutura, regras e
profissionais que perpetuam práticas manicomiais, como a “contenção” como forma
de controlar as ações dos internos e a perda da individualidade.
Mediante o exposto, considerando o atual cenário político de participação e
construção no campo da saúde mental e segundo Amarante (2007), a existência do
hospital psiquiátrico ainda permanece como "gaiola de ouro", pois não há cidadania,
28
liberdade e autonomia. Por mais "'maquiado" que esteja, com as diversas
estratégias, dispositivos e profissionais dispostos a alterar essa realidade, o hospital
psiquiátrico ainda é um marco do estigma e da desumanização da loucura.
Construída há quase quarenta anos, as políticas públicas de saúde mental
sofrem com os retrocessos que se fortalecem com o avanço neoliberal baseados na
mercantilização da vida, na indústria da loucura. Em virtude desse debate,
retomaremos algumas questões em relação a Reforma Psiquiátrica Brasileira e a
Luta Antimanicomial.
3. REFORMA PSIQUIÁTRICA E LUTA ANTIMANICOMIAL NA
DEFESA DOS DIREITOS DAS PESSOAS EM SOFRIMENTO
PSÍQUICO
Prosseguindo com o contexto da estigmatização da loucura e o processo de
mudanças em relação ao louco e sua loucura com as propostas da Reforma
Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, são feitos saltos e recortes da história para
otimizar a compreensão acerca do assunto a ser abordado. Até o presente momento
analisamos a trajetória histórica do estigma da loucura, conceitos e definições para o
que é a loucura, o estigma social, instituição total e seu papel de controle e reclusão
da loucura.
não se deveria reduzir a reforma psiquiátrica a uma reforma de serviços e
nem a uma simples humanização do modelo manicomial, ideia que persiste
até hoje — “ser mais humano com os coitadinhos”. Defendia que era preciso
trabalhar com protagonismo, autonomia; ver esses sujeitos como sujeitos
diversos, porém sujeitos. (AMARANTE, 2014)
Amarante nos incita a questionar um dos desafios dos CAPS (Centro de
Atenção Psicossocial) e da própria Reforma, que é a questão da tutela. Apesar de
ser entregue a tecnologias menos violentas e invasivas, os sujeitos ainda
encontram-se tutelados pela instituição, pois há uma dificuldade social e cultural de
aceitação das diferenças, as pessoas são e devem ser diferentes. O autor
reconhece sua luta na suspensão da medicação, que para essa população só é
possível manter-se vivo tomando remédio, o que para Amarante é um mito criado
29
pela indústria farmacêutica, questão igualmente relevante para a luta antimanicomial
mas que nesse trabalho não será abordada de forma aprofundada.
A exclusividade do saber-poder do médico já havia sido contestada por
Michel Foucault em sua obra Microfísica do Poder (2012). Nela o autor
critica o enclausuramento da loucura sustentado pelo poder médico, nos
chamando a atenção de que o papel do médico passa a ter uma relação de
poder muito específica, pois em sua aplicação/atuação encontra-se a
verdade sobre a doença. A institucionalização da loucura – composta por
um território e por um poder para melhor conhecer/tratar – traz a ideia de
que a doença mental era propriedade do manicômio/hospital psiquiátrico, e
que seu guardião seria o médico (SANDER, 2010). Michel Foucault, apesar
de ter escrito suas obras há mais de 50 anos, trouxe uma problemática que
permanece na atualidade; a exclusividade do saber-poder do médico, que
em certa medida ainda impregna nossa cultura no tocante ao tratamento
daqueles considerados “loucos” por esse saber. Internamento, isolamento,
normatização, diagnóstico, e a exclusividade do saber-poder do médico
tornavam-se os principais alvos de críticas à psiquiatria moderna.
(FIGUEIREDO et al., 2014)
E esse saber-poder médico, que ainda exerce muito influencia na nossa cultura
em relação à loucura e ao tratamento dos ditos loucos, caracteriza-se como uma
base forte para a manutenção da lógica manicomial e, consequentemente, dos
hospitais psiquiátricos (expressão maior da hegemonia do saber-poder médico). Os
hospitais psiquiátricos, por sua trajetória histórica, reforçam a estigmatização social,
pois expressam a cultura de exclusão e marginalização da loucura. E, mesmo com
as propostas da Reforma Psiquiátrica em relação às equipes multiprofissionais, da
interdisciplinaridade, para o compartilhamento de conhecimento profissional, a
hegemonia do médico psiquiatra ainda é muito forte.
Recordando o documento elaborado pela Coordenação Geral de Saúde Mental
(2005) e apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde
Mental, a Reforma Psiquiátrica Brasileira tem suas especificidades embora seja
contemporânea à Reforma Sanitária, se deu num contexto internacional de
mudanças pela superação da violência asilar denunciada.
No Brasil, como já explicitado anteriormente, o processo de reforma
psiquiátrica teve início em 1970 em um período de mudanças políticas que
sinalizavam para a redemocratização do país (SILVA et al., 2014). O modelo de
assistência psiquiátrica anterior à Reforma se baseava no isolamento e exclusão do
"louco" pelo Estado e posteriormente, com as internações hospitalares, o "louco" é
30
transformado em "doente mental" e a internação e medicalização são utilizados com
o intuito de tratar e curar sua "doença" (ROSA, 2003).
O sujeito não era assistido em sua totalidade, considerando a realidade na qual
se encontrava, seja ela social, afetiva ou econômica, a proposta era “curar a doença”
como um enfermo chega a um hospital. Entretanto, com o avanço da humanização
no tratamento dessas pessoas e da própria psiquiatria e de outras profissões na
área de saúde mental, compreende-se que a mesma se encontra inserida em um
contexto social, econômico, político que devem ser considerados em seu tratamento,
além da mera medicalização.
Contemporâneo a Reforma Sanitária, o processo de Reforma Psiquiátrica
brasileira se dá através dos profissionais da saúde na luta pela superação da
violência asilar, do estigma e discriminação dos pacientes com transtornos
psiquiátricos, para um tratamento mais humanizado e em prol da reinserção desses
sujeitos na sociedade. Aproveitando-se da crise do modelo de assistência que a
época centralizava-se no hospital psiquiátrico, o documento organizado pelo
Ministério da Saúde remete aos esforços dos movimentos sociais pelos direitos dos
pacientes psiquiátricos destaque frente a sanção de novas leis e normas.
A Reforma Psiquiátrica é processo político e social complexo, composto de
atores, instituições e forças de diferentes origens, e que incide em territórios
diversos, nos governos federal, estadual e municipal,nas universidades, no
mercado dos serviços de saúde, nos conselhos profissionais, nas
associações de pessoas com transtornos mentais e de seus familiares, nos
movimentos sociais, e nos territórios do imaginário social e da opinião
pública. Compreendida como um conjunto de transformações de práticas,
saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da vida das instituições,
dos serviços e das relações interpessoais que o processo da Reforma
Psiquiátrica avança, marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios.
(MINISTÉRIO DA SAÚDE; COORDENAÇÃO GERAL DE SAÚDE MENTAL,
2005)
Sendo assim, a proposta da política no novo modelo de assistência psiquiátrica
é pautada na garantia de direitos à população com transtornos mentais, promoção e
acesso a serviços que ofereçam apoio no tratamento e prevenção da crise, que o
sujeito possa conviver em sociedade. E, na tentativa de superar o modelo hospitalar,
a criação de serviços substitutivos como uma alternativa a esse ambiente
(hospitalar) que promove o isolamento, exclusão e alienação do sujeito.
Como pudemos apreender, a discussão acerca da necessidade de
humanização no tratamento da loucura teve início na década de 1970, momento em
31
que diversos setores da sociedade brasileira se mobilizaram em torno da
democratização do país, a exemplo: a constituição do movimento dos trabalhadores
em saúde mental, como já supracitado, a partir das denúncias de violência em asilos
e as péssimas condições de trabalho em instituições psiquiátricas.
Restrita ao modelo hospitalocêntrico e marcada pela ineficácia dos tratamentos
e violação dos direitos humanos, a assistência psiquiátrica no Brasil torna-se pauta
de muitos debates, discussões dos profissionais de saúde e grupos de familiares de
internos. E, seguindo o histórico da Reforma, o primeiro marco é a crítica ao modelo
hospitalocêntrico (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005).
A experiência italiana de desinstitucionalização em psiquiatria e "sua crítica
radical ao manicômio" tiveram grande influência no processo da Reforma
Psiquiátrica Brasileira e na própria construção de um novo modelo de atuação na
saúde mental.
Simões (2011) recorta o contexto da Itália em 1978, ano em que uma lei proibiu
novas internações em manicômios e estabelecia a desocupação progressiva desses
locais, firmando a necessidade da criação de estruturas que pudessem abarcar a
demanda, possibilitando a desvinculação imediata entre a noção de periculosidade
social e a doença mental.
O sofrimento psíquico para a sociedade exibe uma ideia de incapacidade e
improdutividade, causando vergonha em familiares e pessoas próximas com
relação à condição do sujeito que sofre (VECCHIA; MARTINS, 2006). O
preconceito a partir desse sofrimento ocorre não só na sociedade de forma
geral, mas até dentro das próprias instituições que o recebem –
manicômios/hospitais psiquiátricos –, e de hospitais gerais, principalmente.
São produzidas representações sociais que “[...] impregnam a maioria de
nossas relações estabelecidas, os objetos que nós produzimos ou
consumimos e as comunicações que estabelecemos” (MOSCOVICI,
1961/1976 apud MOSCOVICI, 2003, p. 10). Estigmatiza-se o paciente,
considerando-o um perturbado ou que perdeu o juízo – uma substância
simbólica que o adjetiva negativamente. (FIGUEIREDO et al., 2014)
Simões (2011) explicita que essa lei representou um marco na história da
saúde mental mundialmente, tornando referência para a Organização Mundial de
Saúde (OMS). Sendo, também, um dos efeitos das ações de Basaglia e do
Movimento da Psiquiatria Democrática Italiana. Nós tememos o que desconhecemos
e só nos indignamos com a realidade alheia quando somos afetadas por ela, expor a
população dessas instituições e suas precárias condições, reinserindo-as à um
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tratamento com convívio social sensibilizando a sociedade para que não mais seja
conivente na desumanização da loucura.
Aos poucos as propostas da Reforma Psiquiátrica Brasileira alcançaram os
ambientes governamentais. Foram realizadas duas Conferências Nacionais de
Saúde Mental em 1987 e 1992 junto a inscrição da proposta do SUS na Carta
Constitucional de 1988, promovendo novas discussões e experiências em torno da
loucura (AMARANTE; TORRE, 2001 apud FIGUEIREDO). Uma das pautas também
defendidas pela Reforma é o trabalho interdisciplinar, "não apenas a simples
presença de psicólogos, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais, mas sim a
valorização desses profissionais" (FIGUEIREDO, 2014). Dessa forma, destituindo a
exclusividade do saber-poder médico e compartilhando com outras categorias da
área a responsabilidade pelo tratamento do louco e da loucura, seja com o sujeito,
com a família ou com a comunidade.
Nesse contexto, o Movimento da Luta Antimanicomial no Brasil surgiu a partir
do I Encontro Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental em 18 de Maio de 1987
sob o lema "por uma sociedade sem manicômios", disseminado por todos os
estados do Brasil, almejando o fechamento dos manicômios e a promoção de uma
cultura de tratamento, convivência e de tolerância na sociedade em relação as
pessoas em sofrimento psíquico (SIMÕES, 2011).
Sendo assim,
O sofrimento psíquico deve ser pensado no campo da saúde coletiva, tendo
em consideração os diversos contextos em que o indivíduo está inserido
como a família, o trabalho, cultura, contexto histórico, entre outros. O
serviço busca um cuidado/atendimento personalizado e um tratamento de
intensidade máxima, gerando reflexões dos serviços e sistematização de
informações e experiências (AMARANTE; TORRE, 2001 apud
FIGUEREDO)
O Dia Nacional da Luta Antimanicomial é comemorado em 18 de Maio e já
completou 30 anos desde que se iniciou sua comemoração. De acordo com o artigo
publicado pelo Ministério da Saúde (2017), a escolha do dia que simboliza a luta tem
dois marcos importantes, o Encontro dos trabalhadores da saúde mental, em Bauru/
SP, e a I Conferência Nacional de Saúde Mental, em Brasília, a qual contou com a
participação de 176 delegados eleitos nas pré-conferências estaduais e demais
segmentos representativos da sociedade (Conferência Nacional de Saúde Mental,
1987) que debateram sobre três principais temas: 1 - Economia, Sociedade e
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Estado; impactos sobre saúde e doença mental; 2 - Reforma Sanitária e
reorganização da assistência à saúde mental; 3 - Cidadania e doença mental:
direitos, deveres e legislação do doente mental. Na apresentação do relatório, o
presidente da conferência, Evaldo Gomes Leite Vieira, salienta a realização dessa
conferência como marco histórico na psiquiatria brasileira pois reflete a
compreensão da comunidade científica da área em torno da necessidade de integrar
a política nacional de saúde mental à política nacional de desenvolvimento social do
Governo Federal. Além disso,
permite que se reúnam as diferentes categorias profissionais ligadas à área
específica, bem como partidos políticos, entidades religiosas, instituições
privadas, associações de usuários, instituições de ensino e demais
segmentos da sociedade para que, num esforço coletivo, viabilizem o
intercâmbio de informações para a melhoria da qualidade assistencial, num
processo participativo e democrático. (I CONFERÊNCIA NACIONAL DE
SAÚDE MENTAL, 1987)
O lema da luta "por uma sociedade sem manicômios" contempla diferentes
categorias profissionais, associações de usuários e familiares, instituições
acadêmicas, representações políticas, bem como outras parcelas da sociedade que
questionam o modelo hospitalocêntrico de assistência que tem como foco as
internações em hospitais psiquiátricos propondo uma reorganização do modelo de
atenção em saúde mental no Brasil.
O Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental(MTSM), movimento
plural formado por trabalhadores integrantes do movimento sanitário,
associações de familiares, sindicalistas, membros de associações de
profissionais e pessoas com longo histórico de internações psiquiátricas,
surge neste ano. É sobretudo este Movimento, através de variados campos
de luta, que passa a protagonizar e a construir a partir deste período a
denúncia da violência dos manicômios, da mercantilização da loucura, da
hegemonia de uma rede privada de assistência e a construir coletivamente
uma crítica ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico na
assistência às pessoas com transtornos mentais. (COORDENAÇÃO GERAL
DE SAÚDE MENTAL, 2005, página 7)
Em vista disso, a importância de categorias como o Serviço Social, que
compreende o louco e sua loucura como expressão da questão social, uma vez que
o dito louco também é sujeito que integra a sociedade e por isso não está isento das
consequências de suas mudanças, do poder capitalista e dos problemas sociais que
se agravaram com esse advento. Compreender o dito louco em sua totalidade e sua
estigmatização decorrente da marginalização histórica e cultural agravada pela
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racionalidade burguesa, na concepção do sujeito racional e da competitividade no
modo capitalista de produzir e consumir.
Dessa forma, para garantir o suporte adequado à pessoa que apresenta
transtorno mental e que se encontra em processo de desinstitucionalização
foi criada uma série de serviços substitutivos que devem funcionar de forma
articulada e pautada na assistência em território. Os Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS), os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), os
Centros de Convivência e Cultura e o Programa “De volta pra casa”, aliados
as leis e portarias ministeriais, representam essa nova rede de atenção à
saúde mental, que se propõe a transformar parâmetros de uma assistência
psiquiátrica anteriormente voltada para a doença mental, para conferir
aspecto biopsicossocial à abordagem do sofrimento psíquico. (RAMOS,
2011)
Nesse sentido,
O NAPS possui algumas estratégias que são fundamentais para a
realização de seus objetivos. Há a estratégia de regionalização, visando a
ação de transformação cultural – conhecer as necessidades; o percurso da
demanda psiquiátrica –; a estratégia da abertura do debate aos cidadãos,
dialogando com a comunidade por meio das associações, sindicatos e
igrejas – discutindo as diferentes formas de compreender a loucura, e a
exclusão. (AMARANTE; TORRE, 2001 apud FIGUEIREDO).
E o CAPS,
serviço que proporciona um tratamento diferente do hospital psiquiátrico, na
medida em que acompanha o paciente diariamente, através de equipe
interdisciplinar, buscando evitar a necessidade de que ele deixe de conviver
em sociedade. Outras ações são realizadas [...] o fortalecimento de
associações em prol de melhoras no atendimento ao portador de transtorno
mental. (RIBEIRO, 2012)
Apreendendo que, para que os princípios reformistas sejam garantidos e a
reinserção dessa população ao convívio social seja efetiva, requer transformação
cultural e política de uma trajetória histórica de estigmatização e exclusão baseadas
na desumanização do sujeito em sofrimento psíquico, que a desinstitucionalização
dessa população não se resuma a desospitalização e desassistência. Desenvolver
estratégias, políticas públicas que envolvam a família e a comunidade para que
essa população seja respeitada, que exerça sua autonomia e desfrute de sua
liberdade, dialogar com a sociedade anos de institucionalização da loucura e a
negação de direitos à essas pessoas.
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Como já supramencionado, o processo de Reforma Psiquiátrica brasileira se
deu num contexto internacional pela superação da violência asilar
(COORDENAÇÃO DE SAÚDE MENTAL, 2005), que por meio da proposta de
reinserção no meio social e familiar, possibilita a garantia de direitos humanos ao
portador de transtorno mental (AMARANTE, 1996 citado por BEZERRA e
DIMENSTEIN, 2011). Nessa perspectiva, o modelo de assistência psiquiátrica
brasileira sofreu influência dos princípios de desinstitucionalização europeus, que
refletiram na Reforma Psiquiátrica no nosso país. Tratou-se de uma oportunidade de
possibilitar uma atenção diferenciada na tentativa de romper com os estigmas e
estereótipos do transtorno mental (BEZERRA e DIMENSTEIN, 2011).
Mas foi somente em 6 de abril de 2001 que a Lei 10.216 instituiu a reforma
no modelo assistencial em saúde mental, conhecida como lei da reforma
psiquiátrica. Ela alterou as disposições sobre a proteção e os direitos das
pessoas portadoras de transtornos mentais e redirecionou o modelo de
atenção à saúde mental. Se antes havia um modelo chamado
hospitalocêntrico, centrado na internação dos doentes em hospitais
psiquiátricos, a partir de então institui-se um modelo psicossocial (também
conhecido como modelo comunitário) que privilegia o não-internamento e
objetiva oferecer atendimento clínico ambulatorial e reinserir os pacientes na
sociedade. (SILVA, 2012, p. 13)
O projeto de lei do deputado Paulo Delgado, também conhecida como a Lei da
Reforma Psiquiátrica, além de propor a regulamentação dos direitos dessa
população, propunha a extinção progressiva dos manicômios. Esse projeto de lei
tramitou no Congresso por 12 anos até ser aprovado, em 2001, após algumas
alterações no texto original.
Constituindo-se enquanto marco legal, a Lei Paulo Delgado estabelece a
responsabilidade do Estado no desenvolvimento da política de saúde mental no
Brasil (Ministério da Saúde, 2017), não só através do fechamento progressivo de
hospitais psiquiátricos como também com a abertura de novos serviços comunitários
incentivando a participação social no acompanhamento de sua implementação.
O movimento de Reforma Psiquiátrica permitiu o retorno desses sujeitos ao
âmbito familiar e a sua reinserção a comunidade. Dessa forma, modificando a
concepção de que o tratamento ideal deveria ser através das internações em
hospitais psiquiátricos, que na verdade transforma o serviço hospitalar psiquiátrico
em moradia ou asilo (SILVA; ROSA, 2014). Assim,
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O processo de desinstitucionalização caracteriza-se por implicar novos
contextos de vida para as pessoas com transtorno mental, bem como para
seus familiares e “pretende mobilizar como atores os sujeitos sociais
envolvidos, modificar as relações de poder entre os usuários e as
instituições e produzir diversas ações de saúde mental substitutivas à
internação no hospital psiquiátrico”. (OLIVEIRA; MARTIGNHAGO;
MORAES, 2009, p. 39 apud SILVA; ROSA, 2014, p. 254).
A desinstitucionalização da pessoa em sofrimento psíquico é um processo que,
observando a realidade das instituições psiquiátricas, não inicia no momento da alta
hospitalar mas desde o primeiro dia de sua internação, com as atividades que
promovam autonomia e individualidade para que a pessoa não seja reconstruída aos
moldes da instituição.
Da alta hospitalar à reinserção ao convívio familiar e social são considerados
os diversos aspectos da realidade particular do sujeito e de sua família, por essa
razão a importância da articulação na rede socioassistencial. A intersetorialidade,
que é uma estratégia política de articulação entre os diversos setores para
superação da fragmentação das políticas públicas. O acesso as demais políticas
públicas sociais representa outro processo da reinserção social, do resgate a
cidadania e a garantia de direitos além do campo da saúde e saúde mental.
Compreendendo que a pessoa em sofrimento psíquico também é passível das
expressões da questão social que permeiam a vida na sociedade capitalista. Outra
questão que permeia o assunto do presente trabalho,

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