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Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE EDUCAÇÃO 
CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA 
 
 
 
 
 
 
 
VANESSA SOUZA DE MIRANDA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A ESCOLA DOMÉSTICA DE NATAL/RN E O ENSINO DE PUERICULTURA NO 
CUIDADO COM A INFÂNCIA (1919 / 1929) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2021 
 
 
VANESSA SOUZA DE MIRANDA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A ESCOLA DOMÉSTICA DE NATAL/RN E O ENSINO DE PUERICULTURA NO 
CUIDADO COM A INFÂNCIA (1919 / 1929) 
 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
Licenciatura em Pedagogia da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, como 
requisito parcial à obtenção do título de 
Licenciada em Pedagogia. 
 
Orientadora: Profa. Dra. Kilza Fernanda 
Moreira de Viveiros. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2021 
 
 
Miranda, Vanessa Souza de.
 A Escola Doméstica de Natal/RN e o ensino de Puericultura no
cuidado com a infância (1919 / 1929) / Vanessa Souza de Miranda.
- Natal, 2021.
 73 f.: il.
 Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, Centro de Educação, Pedagogia.
 Orientadora: Profa. Dra. Kilza Fernanda Moreira de Viveiros.
 1. Escola Doméstica - Monografia. 2. Puericultura -
Monografia. 3. Educação Feminina - Monografia. 4. Infância -
Monografia. I. Viveiros, Kilza Fernanda Moreira de. II. Título.
RN/UF/BS/CE CDU 37-055.2(813.2)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes - CE
Elaborado por Rita de Cássia Pereira de Araújo - CRB-804/15
 
VANESSA SOUZA DE MIRANDA 
 
 
 
 
A ESCOLA DOMÉSTICA DE NATAL/RN E O ENSINO DE PUERICULTURA NO 
CUIDADO COM A INFÂNCIA (1919 / 1929) 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
Licenciatura em Pedagogia da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, como 
requisito parcial à obtenção do título de 
Licenciada em Pedagogia. 
 
 
Aprovada em: 31 de março de 2021. 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
___________________________________________________________________ 
Prof.ª Dra. Kilza Fernanda Moreira de Viveiros 
Orientadora 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
 
 
___________________________________________________________________ 
Profª Drª. Andreia Gabriel Francelino Rodrigues 
Membro Externo 
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte 
 
 
___________________________________________________________________ 
Prof.ª Dra. Sarah de Lima Mendes 
Membro Externo 
Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Parnamirim/RN 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2021 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À minha filha Ana Clara Miranda Braga, meu 
orgulho, tens todo meu amor. 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 “Rendei graças ao Senhor, porque ele é bom; porque a sua misericórdia 
dura para sempre” (BÍBLIA, I Crônicas, 16,34). 
 
Um sonho tão distante que agora se aproxima e prestes a encerrar esse ciclo em minha 
formação acadêmica. Faço a retrospectiva de tudo que fui conquistando ao longo desses anos e 
dou graças a Deus pelo sustento e forças, minha fé foi firmada na rocha inabalável e me fez ter 
forças para continuar. Além disso, ao meu lado sempre pude ter pessoas que foram parte 
fundamental neste ciclo de aprendizados, sem elas certamente seria um período mais denso. 
Aos meus pais, João Maria Araújo de Miranda e Dóris Souza de Miranda, meus 
primeiros professores, gratidão por cada momento de aprendizado que vocês me 
proporcionaram, ensinamentos da vida, o zelo em cada instrução tem sido indispensável. 
Gratidão aos meus irmãos Felipe Souza de Miranda e Diego Souza de Miranda, a parte séria e 
alegre que tenho é de vocês, mesmo sendo a primogênita vocês agem com todo amor e cuidado 
comigo. A força e determinação de vocês são exemplos para mim. Em minhas memórias tenho 
guardado as mais belas lembranças que estamos construindo. Amo vocês! 
Aos amores de minha vida, meu amado esposo Francenilson Ferreira Braga e nossa 
linda filha Ana Clara Miranda Braga, por tanto companheirismo e colaboração, a vocês todo 
meu amor e carinho, essa conquista é de nossa família. 
Agradeço também aos meus familiares por toda torcida e colaboração em tantos 
momentos, certamente teria sido diferente sem esse amparo tão essencial de cada um de vocês. 
A tia Ruth Araújo de Souza Batista, tenho uma gratidão especial, por todo material 
disponibilizado para contribuir com a pesquisa, foi bastante significativo, também por me 
propiciar aprendizados na prática docente com as crianças e professoras do Centro Infantil 
Municipal Dona Liquinha Alves1, a escola que tanto aprendi. 
Gratidão aos amigos e minhas queridas amigas que conquistei na UFRN, nós pudemos 
dividir as alegrias e as angústias em ser estudante de graduação tendo uma infinidade de 
afazeres. Sem deixar de mencionar meus amigos do projeto do Programa Nacional de 
Educação, Pobreza e Desigualdade Social, Francisca Liliane Cunha e Arthur Beserra, que 
sempre se colocaram à disposição no auxílio dos meus estudos, vocês são maravilhosos. 
 
1 Escola de Educação Infantil, localizada em Pirangi do Norte, na cidade de Parnamirim, foi fundada em 2001, na gestão de 
Agnelo Alves. 
 
Aos professores, tenho gratidão por cada ensinamento, por me fazer perceber a 
importância dessa linda profissão, que mesmo sendo cheia de desafios e lutas por 
reconhecimentos vocês não se deixam abalar, em minha formação tenho um pouco dos saberes 
que cada um me propiciou. 
A professora Dra. Kilza Fernanda Moreira de Viveiros, minha orientadora, só tenho a 
agradecer por cada palavra, cuidado, respeito, zelo, empatia. O encorajamento recebido ficará 
marcado em minha memória, tornou esse momento mais fácil, mesmo quando muitas vezes eu 
não tinha ânimo, suas palavras de estímulos me trouxeram energia. Obrigada! 
Não poderia deixar de agradecer à professora Dra. Sarah de Lima Mendes, pelos 
ensinamentos práticos, afinal você foi minha primeira professora supervisora no Estágio I, lá 
no CIM dona Liquinha Alves, depois disso pedi licença a tia Ruth Batista para ter você também 
como amiga e exemplo de superação, te admiro muito, por suas conquistas e perseverança em 
não se permitir esmorecer. 
Por fim, quero agradecer a todas as pessoas e instituições que contribuíram direta ou 
indiretamente com este trabalho. Sou muito grata a Deus por vocês! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Esse trabalho retrata a criação do Instituto de Puericultura da Escola Doméstica de Natal/RN e 
evidencia seus primeiros anos de atuação no cuidado com a infância (1919-1929). Objetiva 
identificar a importância do Ensino da Puericultura, a partir da educação feminina na Escola 
Doméstica de Natal. Justifica-se pela importância da Instituição Escola Doméstica para a 
sociedade natalense e a educação feminina, além de ser uma temática de relevância para o 
campo da História da educação e da mulher potiguar. Conclui que, com o desejo em 
proporcionar uma educação moderna e laica às jovens moças do Estado do Rio Grande do 
Norte, o ensino de Puericultura foi materializado com esforço em conjunto, promovendo uma 
formação científica com conhecimentos teóricos e práticos necessários a incentivar os 
ensinamentos adequados à época a fim de mostrar zelo à saúde feminina e promover 
crescimento saudável para as crianças. Trata-se de pesquisa no campo da História Cultural 
fundamentada teórico-metodologicamente a partir de fontes documentais e bibliográficas sobre 
a Escola Doméstica de Natal. Para fundamentação, trabalhou-se com os conceitos de 
Puericultura; Cultura Escolar; Currículo; Infância e Higienismo; Contexto Social,Cultural, 
Histórico e Político que marcaram a época analisada; Educação feminina. 
 
Palavras-chave: Escola Doméstica. Puericultura. Educação Feminina. Infância. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This work portrays the creation of the Childcare Institute of the Domestic School of Natal/RN 
( Escola Doméstica de Natal / RN) and highlights its first years of work in childcare (1919-
1929). It aims to identify the importance of Teaching Childcare, based on female education at 
the Domestic School of Natal. It is justified by the importance of the Domestic School 
Institution for Natal society and female education, in addition to being a topic of relevance to 
the field of History of education and women from Rio Grande do Norte. It concludes that, with 
the desire to provide a modern and secular education to young girls in the State of Rio Grande 
do Norte, childcare teaching was materialized with a joint effort, promoting scientific training 
with theoretical and practical knowledge necessary to encourage appropriate teaching at the 
time in order to show zeal for women's health and promote healthy growth for children. It is a 
research in the field of Cultural History based theoretically and methodologically from 
documentary and bibliographic sources on the Domestic School of Natal. For reasons, we 
worked with the concepts of Childcare; School Culture; Resume; Childhood and Hygienism; 
Social, Cultural, Historical and Political Context that marked the analyzed period; Female 
education. 
 
 
 
Keywords: Domestic School. Childcare. Female Education. Childhood. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE IMAGENS 
 
Imagem 1 - A Escola Doméstica no dia da sua inauguração, 1914 23 
Imagem 2 - Lago de Lucerne, no Cantão Suíço, 1910 25 
Imagem 3 - Mlle Hélène Bondoc, primeira diretora da Escola Doméstica, 
1914. 26 
Imagem 4 - Miss Leonora James (1919-1922) e Julie Serivé (1926) - 
Diretoras. 27 
Imagem 5 - Maria Emiliana Silva (1927-1930) e Caetana de Brito Guerra 
(1930-1935) - Diretoras. 27 
Imagem 6 - Alix Pessoa Ramalho (1935-1944) e Amélia Bezerra FIlha 
(Melissinha) (abril a novembro/ 1944) - Diretoras. 28 
Imagem 7 - Professora Noilde Ramalho - (1945-2010). 28 
Imagem 8 - Dr. Henrique Castriciano de Souza. 29 
Imagem 9 - Aula de jardinagem, 1915. 38 
Imagem 10 - Demonstrativo de horário da Escola Doméstica de Natal. 47 
Imagem 11 - Alunas concluintes que receberam o Diploma de Dona de Casa, 
1925 48 
Imagem 12 - A dissertação sobre a educação física das crianças de Ballexserd, 
1762. 52 
Imagem 13 - Dr. Carlos Arthur Moncorvo Filho. 55 
Imagem 14 - Alunas de Puericultura no seu labor de mãe. 58 
Imagem 15 - Varela Santiago em vários momentos. 
Imagem 16 - Pavilhão de Puericultura da Escola Doméstica de Natal, 1919. 62 
Imagem 17 - O professor Varela Santiago e as alunas de Puericultura com as 
crianças. 63 
Imagem 18 - O professor Varela Santiago mostrando para as alunas como 
usar a balança antropométrica . 63 
Imagem 19 - A Hygiene no lar - Outubro/1925. 64 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
 
ED Escola Doméstica 
LERN Liga de Ensino do Rio Grande do Norte 
RN Rio Grande do Norte 
IPAI Instituto de Proteção e Assistência à Infância 
RJ Rio de Janeiro 
 
 
LISTA DE QUADROS 
Quadro 1 Condições de Admissão. 
Quadro 2 Programa da Escola Doméstica de Natal. 
 
 
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................................ 14
2 CIDADE DE NATAL - DAS MUDANÇAS SOCIAIS À IDEALIZAÇÃO DA
ESCOLA DOMÉSTICA - RELATOS DE UMA HISTÓRIA .................................. 17
3 ESCOLA DOMÉSTICA CONCRETIZAÇÃO DE UM SONHO ........................... 23
4 A CULTURA DA ESCOLA DOMÉSTICA E O ENSINO DE PUERICULTURA 36
5 PUERICULTURA E INFÂNCIA HIGIENIZADA NA ESCOLA DOMÉSTICA
(1919 - 1929).................................................................................................................. 52
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 67
REFERÊNCIAS............................................................................................................ 71
14
1 INTRODUÇÃO
Lá pelos idos de 1914 a figura da mulher mudou de forma drástica, quando os homens
passaram a ser convocados para lutarem na 1ª Guerra Mundial. Antes desse fatídico evento, as
mulheres somente podiam sair se estivessem acompanhadas de seus pares, se casadas, não
podiam exercer qualquer atividade se não a do lar, poucas tinham acesso ao estudo e quando o
faziam era de forma superficial, tinham como principais atribuições cozinhar e cuidar dos
filhos.
Dolorido imaginar quão difícil era, às mulheres ocidentais, subsistir em um tempo não
tão distante, como no início do século passado, quando apenas aos homens cabia o direito de
exercerem uma carreira, de receberem seus pagamentos. Ao homem cabia a alcunha de herói,
o onipotente, no entanto, dois eventos devastadores, as Guerras Mundiais (Primeira Guerra -
1914-1918) e (Segunda Guerra - 1939-1945) fizeram cair por terra esse estereótipo, ao
mesmo tempo em que promoveram mudanças comportamentais importantes e irreversíveis
nas décadas seguintes.
Nesse período de sofreguidão, coube, às mulheres, a obrigação de assumir os papéis
antes ocupados pelos maridos. Diante do quadro que se instalava, regras e valores da
sociedade ficaram de lado, porque era necessário e urgente contar com a força de trabalho
feminina. E foi exatamente nesse cenário que Henrique Castriciano, com a colaboração de
Francisco de S. Meira e Sá, José Augusto Bezerra de Medeiros, entre outros idealizaram e
fundaram a Liga de Ensino do Rio Grande do Norte, com o intuito de corroborar com os
poderes públicos estaduais, nas ideias voltadas à educação do povo potiguar.
Tomando como base o modelo da escola Suíça, a Liga de Ensino do Rio Grande do
Norte implementou, então, como seu único projeto, a Escola Doméstica de Natal, o que
sucedeu em meados de 1914. No entanto, aquele projeto pensado para implementar uma
educação acessível a todos, tornou-se um ambiente “fechado”, no qual apenas as moças da
elite potiguar tiveram acesso.
Posteriormente, desta feita no ano de 1919 foi inaugurado o Instituto de Puericultura,
idealizado esse, pelo médico e professor Dr. Manuel Varela Santiago Sobrinho, o qual passou
a funcionar no prédio anexo à Escola, sendo, portanto, o primeiro curso de Puericultura
instalado no Rio Grande do Norte, direcionado ao atendimento das crianças desamparadas,
vítimas “indiretas” das guerras. Diante desse fato, questiona-se, então, “como a criação do
Instituto de Puericultura da Escola Doméstica contribuiu com o cuidado das crianças
desvalidas na cidade do Natal, nos seus primeiros anos de atuação?
 
 
15 
A definição dessa temática foi o resultado de observações e escuta dos relatos de três 
ex-alunas, Dóris Souza (mãe dessa autora), e Ruth Batista e Suzana Medeiros (tias dessa 
autora). Ambas estudaram na Escola Doméstica e sempre compartilharam suas experiências e 
momentos de aprendizado enquanto estudantes da distinta escola. O termo Puericultura foi 
ouvido, pela primeira vez, a partir de seus relatos. 
O ingresso na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no ano de 2015, como 
aluna do curso de Licenciatura em Pedagogia, em cuja estrutura curricular existe uma disciplina 
chamada Educação Infantil, despertou a percepção para os conteúdos apresentados, os quais 
tratavam do cuidar e do educar da criança em idade tenra. Assistir uma aula sobre a pesquisa 
de Dissertação da professora Dra. Sarah Mendes, fez conhecer sobre os jardins de infância e 
também um pouco da História da Escola Doméstica de Natal. Tal fato serviu de incentivo para 
um maior aprofundamento do “entender a infância” numa perspectiva histórica, fazendo relação 
dessa história com a instituiçãoescolar, enfatizando, sobremaneira, o ensino de Puericultura na 
Escola Doméstica, o que rendeu a elaboração desse estudo - um projeto de pesquisa inovador. 
Este fato fez fluir, na memória, os relatos de experiência das ex-alunas, fazendo 
perceber as minúcias dos referidos relatos com as aulas de Puericultura, ministradas às alunas 
da Escola Doméstica (ED), com a disciplina Educação Infantil ministrada no curso de 
Pedagogia da UFRN. Tais informações traziam compreensões em relação ao cuidado com a 
infância a partir dos estudos apresentados. Esse foi um dos motivos que serviu como escada 
para a busca mais intensa das fontes que retratam a referida temática, voltada ao contexto da 
educação à época do início do século XX, para fundamentar esta pesquisa. 
Na metade da graduação surgiu a oportunidade de compartilhar desta inspiração com 
a professora Dra. Kilza Fernanda Moreira de Viveiros, a qual, ao ouvir que essa pesquisa aborda 
a Puericultura dentro da educação, trazendo cuidados assistenciais para a criança desvalida, 
aceitou participar de sua construção, enquanto orientadora. 
Assim sendo, a realização dessa pesquisa, além da já citada anotação de fatos relatados 
no ambiente familiar, ingressou-se na busca por fontes documentais, como fotos, revistas da 
Escola Doméstica - edição Fac Similar, jornais e outros, com intuito de anotar fatos e traze-los 
como fundamentação para a concretização dessa ideia. 
Pretende-se ressaltar a importância em permear esse caminho da pesquisa, a fim de 
favorecer um aprendizado e desenvolvimento do senso crítico, das técnicas e dos métodos de 
pesquisa estudados durante a graduação, os quais se tornaram essenciais para a elaboração dos 
capítulos seguintes, sistematizando a pesquisa proposta. 
 
16
Esse percurso metodológico resulta, portanto, em quatro momentos, sendo o
primeiro intitulado Cidade de Natal - Das mudanças sociais à idealização da Escola
Doméstica - Relatos de uma História. Descreve sobre a cidade de Natal e sua sociedade no
início do século XX, os anseios de modernidade e como se desenvolveu o ideal de educação
feminina aos moldes europeus, retratando sobre a importância dessa pesquisa para a
construção histórica da educação potiguar.
A Escola Doméstica - Concretização de um sonho, discorre sobre a fundação da
Escola Doméstica de Natal, seu início, inspiração e idealizadores. Em seguida apresenta a
história da Liga de Ensino do Rio Grande do Norte, desde a sua idealização, fundação e atores
envolvidos, assim como, a que se propôs. Destaca, ainda, em uma breve história, a figura do
doutor Varela Santiago - sua vida e luta por uma infância mais respeitada e bem cuidada na
cidade do Natal.
Em um terceiro momento são retratados a Cultura da Escola Doméstica e o Ensino
de Puericultura, em paralelo, averiguado o currículo inserido na escola - seus elementos e
práticas, a fim de saber se acompanhava o cronograma curricular da instituição, além de
perscrutar acerca de sua importância para a formação feminina no período estudado.
Por fim, o quarto momento apresenta alguns detalhes acerca da Puericultura e o
cuidado com a Infância (1919-1929), apresentando o conceito do estudo - seus
desdobramentos históricos, o sentido da Puericultura para a educação e como a disseminada
no âmbito da Escola Doméstica.
Por fim, a conclusão, onde se pode observar se os objetivos propostos foram
alcançados, além de apresentar algumas considerações sobre a infância higienizada.
17
2 CIDADE DE NATAL - DAS MUDANÇAS SOCIAIS À IDEALIZAÇÃO DA ESCOLA
DOMÉSTICA - RELATOS DE UMA HISTÓRIA.
Essa pesquisa, que aborda a criação do Instituto de Puericultura na Escola Doméstica
da cidade do Natal/RN, evidencia sua história e primeiros anos de atuação (1919-1929). O
recorte temporal diz respeito ao início do século XX. Antes, para sua construção foi elaborada
uma análise sobre a trajetória da referida Escola, com vistas a entender todo percurso até a sua
fundação (1914) e os avanços para os quais contribuiu nas searas social, tecnológica e
intelectual observados após sua inserção na capital do Rio Grande do Norte.
Identificar a importância do Ensino de Puericultura no cuidado com a Infância a partir
da educação voltada à figura feminina, no âmbito da Escola Doméstica de Natal, se faz de
extrema importância pela necessidade de se fazer conhecer que desde um passado remoto a
preocupação com a ala feminina da sociedade já existia na “cabeça” de homens preocupados
com as situações análogas à escravidão - realidade na vida das mulheres àquela época.
Por assim ser é que surgiu a primeira proposta para a concepção de uma escola
moderna, com ensinamentos avançados e direcionados à formação de um novo perfil de
mulher, um modelo civilizado em meio a uma sociedade na qual se apontava “os primeiros
indícios de desenvolvimento social e econômico”. Tal proposta passou a ser esperada com
expectativa e orgulho por alguns que compunham as autoridades públicas do Estado do RN e
intelectuais progressistas (RODRIGUES, 2007, p. 83).
A cidade de Natal, à época, dava seus primeiros passos para a modernização,
emergindo, portanto, de um modelo provinciano, tomando como base as demais capitais
brasileiras. Segundo relatos de Rodrigues (2007, p. 88), os cidadãos tinham uma condição de
vida bem precária, a exemplo desse fato, é que somente em meados de 1905 veio receber as
primeiras instalações elétricas. Conforme explica a autora, apenas na gestão de Alberto
Maranhão é que a cidade de Natal passou a ter abastecimento de água, saneamento,
transporte, calçamento e outros melhoramentos.
Entende-se como necessário um novo ordenamento político-cultural
nacional, com a implantação de um universo cognitivo modernizante que,
em última instância, no projeto republicano libertaria o Brasil de seus
resquícios rurais e coloniais. Uma das estratégias adotadas pelo Estado foi a
reformulação do espaço urbano no início do século XX [...]. Em 1908, no
governo de Alberto Albuquerque Maranhão, o crescimento demográfico
demandava urbanização, higienização e disciplinamento da cidade
(PINHEIRO, 2005, p. 74).
18
Esses acontecimentos ficaram marcados como um avanço, diante dos
norte-rio-grandenses, no entanto, Pinheiro (2005, p. 74) esclarece que, apesar das melhorias
sendo implantadas, havia uma resistência na aceitação dos projetos arrojados - era o receio do
novo. Porém, tal fato soava como emergencial, visto que a sociedade ansiava por alcançar as
demais capitais brasileiras no que se referia ao desenvolvimento social, econômico e
estrutural. Vale frisar que a dominação regional das oligarquias, formadas pelos fazendeiros,
políticos e etc, exercia grande vantagem nas decisões.
Sobre o conceito de modernização, Pinheiro (2005, p. 67) defende ser um “processo
de fluxo contínuo, no qual não há diferenciação real de uma conjuntura ou época em relação à
outra, a não ser pela sucessão cronológica ou novo se convertendo em velho, o anterior em
posterior, e assim sucessivamente”.
Ao afirmar que “as nações atingidas pelo imperialismo ocidental, quando
conseguiram alcançar mais ou menos sua independência, foram confrontadas com o problema
do seu atraso em certos campos”, Le Goff (1990, p. 163) explica que a questão da
modernização foi também emblemática nas sociedades que passaram por esse processo, posto
que, passariam por transformações do que é considerado antigo para o novo. O problema
estava no decorrer dessa mudança, onde muitas vezes não se preservaram os valores que
foram construídos na formação da identidade desse povo.
Essa modernização, motivada pelo discurso de progresso republicano, deveria ter
equilíbrio, sem que sua ação fosse brusca, apenas mostrando os benefícios em avançar,
explicando as melhorias que trariam para a sociedade. Há época, a cidade de Natal, Capital do
Rio Grande do Norte era bastante tranquila e crescia a passos lentos. Em 1914 tinha “cerca de
vinte mil habitantes, distribuídos nos bairros de BeloMonte, Cidade Alta, Baldo, Barro
Vermelho, Lagoa Seca e Alecrim, sendo a Ribeira o coração da cidade”. O bairro de Belo
Monte é atualmente conhecido por Petrópolis. Algumas escolas2 já funcionavam, e a sua
maioria era dirigida pela Igreja Católica.
Barros (2000) detalha como era a sociedade natalense, seus costumes e tradições, as
influências que recebia no meio intelectual, estrutural e na moda. No início do século XX a
cidade teve inaugurado o Theatro Carlos Gomes, atual Teatro Alberto Maranhão. Jornais
como “A República” e “O Liberal do Norte”, traziam as notícias do Estado. O único Hospital
2 O Colégio Imaculada Conceição das Irmãs Dorotéia, o Ginásio Diocesano Santo Antônio - hoje
Colégio Marista, a Escola Normal, o Atheneu, os grupos Escolares Frei Miguelinho e Augusto Severo,
e poucas outras escolas, formavam o complexo educacional da cidade (BARROS, 2000. p. 83).
19
era o Hospital de Caridade Juvino Barreto, que atendia todo o RN, hoje conhecido como
Hospital Universitário Onofre Lopes.
Por entender que era necessário avançar nas melhorias do Estado do Rio Grande do
Norte, o governador Alberto Albuquerque Maranhão adotou estratégias de “reformulação do
espaço urbano no início do século XX”, entendendo que melhorar o espaço público e a
sociedade deveria seguir alguns padrões já empreendidos em outras capitais, dentre eles,
disciplinar os pobres. A ruptura com o passado fazia-se necessária para que houvesse os
avanços desejados.
Era entendido que por meio da educação escolar podia se formar uma sociedade mais
voltada para o desenvolvimento esperado. Uma concepção no modelo de educação a ser
seguido estava entre os objetivos, principalmente após os relatos de Henrique Castriciano
sobre sua experiência ao conhecer pessoalmente a educação suíça:
Ao penetrar a Escola Normal Ménagère de Friburgo senti logo o encanto, o
bem-estar que dá a Suíça, em que, não raro, a decoração vegetal imprime
uma nota pacificante de bucolismo, dando ao espírito do hóspede um como
aviso de tranquilidade, de trabalho silencioso, de ternura forte. (SOUZA,
1911, p. 29 apud RODRIGUES, 2007).
A autora destaca que “o espaço físico, o currículo e o funcionamento da escola, os
ares de tranquilidade, cultura e ciência despertou em Henrique Castriciano o desejo em
divulgar” no RN o modelo de educação feminina da Suíça, por ser diferente das demais já
existentes no Brasil.
Era crescente no Brasil os princípios de uma educação que adotasse uma abordagem
curricular voltada para um ensino transformasse os cidadãos em seres organizados e
desenvolvidos, dando especial atenção a educação feminina, de forma que pudesse ser
adequada aos aspectos de uma escola moderna nos âmbitos social, econômico e cultural,
conforme era a educação europeia. Sendo assim, apresentar aquele modelo escolar passou a
ser um compromisso de Castriciano.
Segundo Rodrigues (2007, p. 98), a realidade da educação do Rio Grande do Norte
era precária, os recursos material e humano estavam escassos e a estrutura física das escolas
desgastadas. Contudo, trazer uma escola desse nível para o Estado era desconsiderar as
dificuldades enfrentadas pelo sistema educacional naquele período.
Estando fundamentado no modelo da escola Suíça, Henrique Castriciano em
companhia de “Francisco de S. Meira e Sá, José Augusto Bezerra de Medeiros, entre outros
[...]” (RODRIGUES, 2007, p. 54), fundaram a Liga de Ensino do Rio Grande do Norte, “que
20
visava auxiliar os poderes públicos estaduais, em tudo o que dissesse respeito à instrução e à
educação do povo” (BARROS, 2000, p. 41).
No entanto, a única instituição fundada pela Liga de Ensino do Rio Grande do Norte
foi a Escola Doméstica de Natal, em 1914. Seu projeto era audacioso e inovador para o campo
educacional. Mas apesar da proposta aparentemente contemplar uma educação acessível, a
escola tornou-se um ambiente adequado apenas para as moças da elite potiguar. As alunas que
frequentavam eram filhas dos políticos, fazendeiros e pessoas influentes no Estado do Rio
Grande do Norte. O investimento no currículo, a seleção do corpo docente e as instruções
direcionadas para a educação das moças colocou a escola num local de privilégio, por manter
o padrão e inovar sempre que fosse necessário.
Com isso, a relevância que a Escola Doméstica tem até os dias atuais para a História
da educação norte-rio-grandense, à época de sua fundação, tornou-a referência para as escolas
de todo o país. Essa inovação na educação feminina, cujos ensinamentos foram inspirados na
formação das moças europeias, passaram por mudanças para serem adequadas à realidade
local.
Para a sociedade natalense não foi apenas uma escola, mas a representação do
progresso para a educação daquele período, o que veio a possibilitar a modernização que a
classe política e elite almejavam. Apoiada no que defende em Rodrigues (2007, p. 30), vê-se
que além do discurso de identidade nacional, era ansiado pela sociedade brasileira a
modernização, e esses desejos republicanos foram trazidos para Natal nos ideais dos
fundadores da Escola Doméstica.
Após a sua inauguração, com um currículo estruturado e um corpo docente
capacitado, a Escola Doméstica “iniciou seu ano letivo com onze alunas. Ainda era o começo,
a interrogação, a surpresa. A Liga de Ensino, esforça-se para divulgar o programa da Escola,
em conversas, visitas e palestras” (BARROS, 2000, p. 105).
Em 1915, o então presidente da LERN, o Dr. Francisco Sales Meira e Sá, convida o
Dr. Varela Santiago Sobrinho para fazer parte do corpo docente da ED, passando a lecionar as
cadeiras de Higiene e Anatomia[...]. Segundo Galvão (2017, p. 80), foi noticiado no jornal “A
República”, no ano de 1916 que o médico estava “empenhado em incrementar o curso de
Puericultura na Escola Doméstica”, ele compartilhou com os membros da Liga de Ensino do
Rio Grande do Norte o seu desejo em construir um pavilhão que seria o local das aulas
práticas do ensino de Puericultura. Era necessário arrecadar recursos financeiros que
pudessem financiar a obra.
21
Foi então que “surgiu a ideia de produzir uma série de conferências sobre relatos de
experiências das figuras importantes da cidade, elas foram realizadas no Theatro Carlos
Gomes, com entrada paga”. Por compartilhar desse desejo, as conferências foram iniciadas
por Henrique Castriciano, “que abriu a sequência no dia 7 de março”, onde ministrou sobre
uma viagem feita a Jerusalém. Galvão (2017, p. 81), compartilhou que uma “exposição foi
ilustrada com projeções luminosas (posteriormente se adotou o americanismo slide)”, dando
indicação de que foi “a primeira utilização de um “moderno” recurso audiovisual”.
Após finalizar a construção do pavilhão de Puericultura, e fazer as devidas
adequações com os recursos necessários, em 1919 foi inaugurado o Instituto de Puericultura
na Escola Doméstica, pelo médico e professor Dr. Manuel Varela Santiago Sobrinho, o qual
passou a funcionar no prédio anexo à Escola, sendo, portanto, o primeiro curso de
puericultura instalado no Rio Grande do Norte. Esse espaço destinado ao acolhimento de
crianças funcionava como um laboratório para as aulas de Puericultura, abrangendo em seu
programa toda a vida da criança [...] (MENDES; MENEZES, 2011, p. 20).
O curso tinha, em seu conteúdo, o planejamento de aulas voltadas ao bem-estar
físico, emocional e psicológico das crianças, as quais eram oriundas, na sua maioria, de
famílias de baixa renda” (GALVÃO, 2017, p. 104) e residentes em Natal ou cidades
circunvizinhas. Durante o ano letivo, as crianças ficaram por seis meses “internadas” na casa,
sob os cuidados das alunas da Escola Doméstica. Ao descrever o programa de ensino de
Puericultura, Barros (2000, p. 125) assevera que
O ensino dessa disciplina abrangia toda a vida da criança, desde o
nascimento até o fim da chamada primeira infância e os procedimentos
práticos a ela referentes. [..] Para cursar essa disciplina, a aluna já deveria ter
pagado as cadeiras de Enfermagem, Higiene,Nutrição e Medicina, bases e
pré-requisitos para a Pediatria. A aluna fazia estágio na Puericultura por uma
semana, com uma ajudante que seria a “MÃE”, no período seguinte. [..] O
Dr. Varella Santiago, comparecia diariamente à Puericultura para observar o
desempenho da aluna no seu labor de mãe, e fez isso durante quarenta anos
(BARROS, 2000, p. 125).
A História de vida do médico era dedicada ao cuidado da criança pobre em Natal,
seu trabalho foi reconhecido pela sociedade que via com bons olhos os atos de compaixão, ao
tratar da saúde dos pequenos infantes no Instituto de Proteção e Assistência à Infância (IPAI),
criado também por ele no ano de 1917, e funcionava em sua residência. O Dr. Varela Santiago
era um professor atuante na Escola Doméstica, trazendo ensinamentos sobre os cuidados na
saúde, sendo primordiais para a formação das alunas.
22
Focada nesse contexto de mudanças, Pinheiro (2005) em sua obra intitulada
“Educação e Modernização em Henrique Castriciano”, traz uma recuperação histórica à
modernidade na educação que Henrique Castriciano almejava para os potiguares, abordando
os movimentos culturais e a educação como convencimento para um novo modelo social,
descrevendo ainda o encanto que ele teve ao conhecer a École Ménagères, de Friburgo, na
Suíça.
A tese de Rodrigues (2007) intitulada “Educar para o lar, educar para a vida: cultura
escolar e modernidade educacional na Escola Doméstica de Natal (1914 - 1945)”, apresenta
um olhar diferente sobre a instituição escolar, retrata a multiplicidade dos atores e as práticas
educativas envolvidas, conceituando memória e cultura escolar.
O Dr. Varela Santiago é homenageado nas obras “A visão de um homem”, de autoria
da Dra. Maria Zélia Fernandes e “Um apóstolo entre nós”, de autoria do historiador Cláudio
Galvão. Os autores escrevem sobre a trajetória do médico higienista que tanto assistiu
gratuitamente às crianças desvalidas do Estado do Rio Grande do Norte, destacando sua
atuação como filantropo e higienista atuante na busca por uma saúde com qualidade
principalmente para os menos favorecidos.
Nessa construção referencial, foram importantes os aportes recebidos aquando da
elaboração deste trabalho, a exemplo de Saviani (2007), que possibilitou um pensar sobre o
contexto social, cultural, histórico e político, que marcaram a época analisada (1919-1929).
Seguindo por Gondra (2000) com sua concepção de infância e do higienismo, que conduz ao
entendimento de como a infância era pensada no início do século XX e como fora atrelada ao
movimento de higiene. Para além dos já citados autores, no referente ao conceito de Cultura
Escolar Julia (2001) ressalta que se trata de um conjunto de práticas, normas, ideias e
procedimentos que se expressam em modos de fazer e pensar o cotidiano da escola, findando
então, tal fundamentação, com Silva (2013), que apresenta a história do currículo e seus
desdobramentos, sendo fundamental a sua leitura para compreendermos o conceito de
currículo pelos autores da época.
23
3 A ESCOLA DOMÉSTICA – CONCRETIZAÇÃO DE UM SONHO
Imagem 1: A Escola Doméstica no dia da sua inauguração, 1914
Fonte: Barros (2000, p. 60).
Idealizada pelo intelectual norte-rio-grandense Henrique Castriciano de Souza, e
fundada pela Liga de Ensino do Rio Grande do Norte (LERN), a Escola Doméstica de Natal
abriu suas portas no dia primeiro de setembro de 1914, com sede própria, na Praça Augusto
Severo, n° 281, tendo como vizinhança a Escola Normal e o Theatro Carlos Gomes”
(BARROS, 2000, p. 90). Sua estrutura arquitetônica refletia a modernidade, sobre o que
Rodrigues (2007, p. 254) descreve que
A construção tinha que se pensar num modelo de estrutura física que
vislumbrasse os anseios e o projeto de quem a idealizava. A imagem da
fachada principal da Escola Doméstica de Natal com traços neoclássicos,
visualizada na época em que fora fundada, nos transmite ares de poder e
pujança, com típica arquitetura ensejada pelos republicanos no Brasil que
almejavam construir no cenário nacional estruturas arquitetônicas com ares
de modernidade e progresso, exemplos materializados na construção dos
primeiros grupos escolares.
Outro aspecto observado era a localização da escola, a qual se situava no bairro da
Ribeira - à época, o mais frequentado pela elite potiguar. Sua estrutura física atendia aos
critérios de acolhimento, e os agentes envolvidos na sua construção foram criando marcas
sociais na cultura de uma cidade que, por hora estava querendo evoluir e mostrar sua
24
modernização. Natal tinha uma população de aproximadamente 25 mil habitantes, sendo, os
bairros mais populosos, no ano de 1914, a Cidade Alta e a Ribeira.3 O jornal “A República”
noticiou a fundação da escola Doméstica em 02 de setembro de 1914, trazendo considerações
relevantes que marcaram a época.
Realizou-se ontem nesta capital sob a presidência do Sr. Governador do
Estado, com a presença da Diretoria da Liga de Ensino, as professoras
Hélène Bondoc e Jeanne Negulesco, o representante do sr. bispo diocesano,
altas autoridades do ensino, pessoas gradas e grande número de senhoras de
nossa melhor sociedade, a inauguração solene da Escola Doméstica criada
pela Liga de Ensino, no edifício próprio [...] (LIMA, 2004, p. 240).
Proporcionando a sociedade natalense uma educação inovadora, especificamente
voltada às moças da época, torna-se pioneira no ensino doméstico, “que enfatizava a formação
de uma mulher voltada para atender aos anseios modernos despontados com o advento da
República”, assevera Rodrigues (2007).
O Estado do Rio Grande do Norte teve sua história marcada tanto “pelo pioneirismo
do projeto, como pela contribuição inexcedível que o estabelecimento tem proporcionado [...],
na sua área específica de atuação", explica Lima.4
As mulheres das famílias mais abastadas viviam em seus casarões, rodeadas de
empregados e recebiam uma educação mais recatada, já os homens tinham acesso aos estudos
formando-se muitas vezes em cursos de engenharia, direito e medicina.
A título de Europa, a educação feminina tinha uma roupagem diferenciada e
moderna. Segundo Barros (2000, p. 89), “a Suíça, país onde a educação da mulher era
encarada com seriedade, trabalhar e atuar eram exercícios de cidadania”. Além disso, “na
École Ménagère de Friburgo, estudava-se a ciência da dona de casa [...], havia também uma
admirável cultura e a profunda intuição da mudança do mundo, através da educação da
mulher”.
No século XX houve uma expansão dos cursos direcionados à Educação Doméstica
na Europa, os quais cuidavam de reforçar o papel a ser desempenhado pela figura feminina no
âmbito familiar e no contexto social.
“A preocupação com a qualificação profissional para o mercado de trabalho também é
elemento que se reafirma, nesse contexto devido, à expansão do comércio e principalmente
das indústrias agrícolas” arregimenta Amaral (2002) apud Rodrigues (2007). Na busca pela
4 Idem., 2004, p. 240 e 241.
3 LIMA, Daladier Pessoa Cunha. Noilde Ramalho: uma história de amor à educação. Natal: Liga de
Ensino do Rio Grande do Norte, 2004. p. 237
25
modernização na educação feminina, a elite potiguar articulou-se para que as mulheres
pudessem ter os ensinamentos tão avançados quanto os que foram vistos na Suíça, porém era
necessário um investimento alto para tornar acessível esses ensinamentos nas escolas já
existentes. Rodrigues (2007, p. 84), afirma que a Escola Doméstica não foi pensada para a
classe popular, exatamente por ter característica seletiva e elitista. Algumas exigências como
cobrança de mensalidade era um fator predominante para definir quem podia ou não
frequentar aquele ambiente escolar.
O encanto de Henrique Castriciano pela educação da escola Suíça não poderia ser
distinto, ele esteve diante de um padrão de formação feminina diferente do que
costumeiramente encontrava pelo RN. Ele visitou a Suíça em 1909, quando conheceu a École
Normal pour la formation d’Institutrices d'Écoles Ménagère de Friburgo, no CantãoSuíço. A
imagem abaixo mostra o Lago Lucerne, no Cantão Suíço, o registro foi feito em 1910, um ano
após Henrique Castriciano ter visitado a Suíça.
Imagem 2: Lago de Lucerne, no Cantão Suíço - Ano: 1910
Fonte: Biblioteca Digital Mundial - Agência de Boston da Notman Photo Co, (1910).
Era fato que o modelo de ensino da Suíça transmitia inovação e modernidade, tinha
o melhor da educação escolar da Europa e dos Estados Unidos, sendo almejado por Henrique
Castriciano e pelos homens públicos da época em Natal. Entendia-se que era necessário
promover mudanças no sistema de educação e para que isso acontecesse ações urgentes
deveriam ser colocadas em pauta [...], as quais se desenrolaram por meio da instituição de
uma “política de reestruturação dos espaços físicos e dos recursos humanos e materiais, e
surgiria como caminho viável para uma mudança no setor educacional, numa atitude de
entusiasmo com o futuro, com o vir a ser um distanciamento e indiferença com o presente”
(RODRIGUES, 2007, p. 100).
Foi nessa perspectiva que se priorizaram as professoras estrangeiras para compor o
corpo docente da Escola Doméstica, seria mais fácil resolver essa solicitação que estruturar as
demais escolas distribuídas por Natal e cidades do Estado do RN.
26
Ao argumentar sobre a importância de inicialmente ter professoras estrangeiras
diplomadas pela École Ménagère de Friburgo, Henrique Castriciano fez um apelo ao
governador Alberto Maranhão que esse pedido fosse “levado ao Ministro do Brasil na Suíça,
Raul do Rio Branco, para a contratação de duas professoras diplomadas”, [...], sendo
“atendido com a intervenção do Ministro do Exterior Lauro Muller”.
Mais adiante Barros, (2000, p. 75) apresenta os nomes das “duas jovens professoras”
- Hélène Bondoc e Jeanne Negulesco. Elas administraram a escola nos anos de 1914 até 1918,
sendo responsáveis pela organização funcional da instituição. A direção da escola ficou a
cargo da Mlle Hélène Bondoc - primeira Diretora da Escola, permanecendo no cargo de
setembro de 1914 a 1915 – então responsável pela estruturação e implementação do currículo
escolar. Posteriormente, a Mlle. Jeane Negulesco assumiu a diretoria, permanecendo nele, de
1915 a 1918. Oriunda da Suíça, juntamente com a Mlle. Bondoc foi, também, a responsável
pela organização funcional da escola.
Imagem 3: Mlle Hélène Bondoc, primeira diretora da Escola Doméstica, 1914
Fonte: Barros (2000, p. 77).
Nos anos seguintes, de 1919 a 1926, as professoras estrangeiras Miss Leonora James
(1919-1922), Srta. Allexandra Von Schimnielpfeig (1923), Mlle Edwirges Schuller (1924),
Miss Isabel Baird (1925), Júlia Serivé (1926), também trouxeram contribuições satisfatórias
para a formação feminina, no tocante ao aprimoramento do currículo anteriormente
organizado pelas primeiras diretoras da escola (BARROS, 2000, p. 75-76).
27
Imagem 4: Miss Leonora James e Julie Serivé - Diretoras
Fonte: Barros (2000, p. 77).
Somente a partir de 1927 é que a direção da escola passou a ser efetivada com
professoras brasileiras, sendo a primeira contratada a Sta. Maria Emiliana Silva, mantendo o
mesmo padrão cultural adotado pelas diretorias anteriores. Sua gestão perdurou durante três
anos (1927-1930).
Imagem 5: Maria Emiliana Silva
Fonte: Barros (2000, p. 78).
28
Posteriormente a escola teve à frente a Srta. Santa Guerra, que foi diretora de 1930 a
março de 1935. Alix Ramalho dirigiu a escola de abril de 1935 a março de 1944. Amélia
Bezerra Filha foi diretora em um curto período de tempo, permanecendo de abril a novembro
de 1944. Noilde Pessoa Ramalho assumiu posteriormente a direção em março de 1945,
ficando à frente da instituição durante 65 anos.
Imagem 6: Alix Pessoa Ramalho e Amélia Bezerra Filha
(Melissinha)
Fonte: Barros (2000, p. 78).
Imagem 7: Professora Noilde Ramalho
Fonte: Barros (2000, p. 79).
29
Embora fosse uma educação feminina voltada à preparação para organização do lar,
as moças também recebiam ensinamentos para uma formação profissional. A escola deu
espaço para que suas alunas pudessem ter um “ensino laico e científico, com bases no modelo
das escolas modernas europeias, significando um avanço para a educação das mulheres na
região” (PINHEIRO, 2005, p. 128).
A Escola Doméstica de Natal e a Liga de Ensino do Rio Grande do Norte (LERN)
refletem os ideais de Henrique Castriciano5, portanto é impossível falar sobre essas
instituições sem citá-lo. Em concordância com Barros (2000, p. 23), o começo dessa
“memória histórica da Escola Doméstica é com o seu fundador, o Dr. Henrique Castriciano, o
seu idealizador e o principal pilar da estrutura dessa Escola”.
Imagem 8: Dr. Henrique Castriciano de Souza
Fonte: Barros (2000, p. 37).
Importante frisar que a LERN foi fundada por “homens preocupados com a
educação”, [...], “interessados no problema educacional” (BARROS, 2000, p. 41), e por
5 Natural do município de Macaíba/RN, nasceu em 15 de março de 1874 e faleceu em Natal/RN, no
dia 26 de julho de 1947. Filho de Eloi Castriciano de Souza e Henriqueta Leopoldina Rodrigues, da
tradicional elite agrária de Macaíba/RN.
30
assim ser é que as pessoas procuradas por Henrique Castriciano eram principalmente homens
influentes na sociedade local e que ocupavam cargos dentro do governo.
Sempre atento à modernização que ocorria na Europa, devido as suas viagens para
tratamento de saúde, Henrique Castriciano aproveitou e conheceu mais sobre a educação
escolar e as técnicas que propiciadas às escolas europeias, em especial no referente a
inovação, posto que era o que tanto idealizava para o ensino do Rio Grande do Norte.
Para a sociedade natalense, que vivia imersa em uma realidade de atraso em seu
desenvolvimento - nas mais variadas esferas, ver refletidos na cidade os ideais de
modernidade baseados na Europa, era um lapso de esperança, posto que, se estava
vivenciando uma forma inteligente e ousada, iniciada em favor da educação feminina, pois
por ela seria possível perceber futuramente uma sociedade preparada para as transformações
que viessem a acontecer.
Para o professor Henrique Castriciano, seu sonho se traduzia em
Uma Escola Doméstica, à semelhança das que a previdência dos povos
cultos desde muito vem fundando em larga escala, nos grandes e pequenos
núcleos; em que, ao lado do indispensável ensino teórico, sejam ministrados
seguros conhecimentos práticos, que habilitem a mulher a velar
criteriosamente pela educação física, intelectual e moral dos filhos,
orientando o espírito dela de modo a poder viver por si, no caso de faltar o
apoio dos que lhe servem de arrimo; uma escola assim representa por certo o
início de uma promissora fase social, porque é da mulher que depende a
felicidade da família e esta é a nação em miniatura (CASCUDO, 2008, p.
164 e 165).
Era importante priorizar mudanças na educação feminina, pensando em reformar a
sociedade, almejando uma padronização coletiva. Incomodado pela forma como a educação
feminina era tratada, para Henrique Castriciano, “a mulher deveria ser vista, não como um
belo enfeite de uma família, nem como matriz reprodutora de uma espécie, ou mesmo uma
escrava cumpridora de ordens e obrigações” (BARROS, 2000, p. 29). Ele vivia em uma época
em que o mundo passava por transformações e, desejar mudanças na educação feminina fazia
parte do que era mais moderno e aproximado dos costumes europeus.
Perrot (2007, p. 92) afirma que "os Estados almejam mulheres instruídas para a
educação básica das crianças. O mercado de trabalho precisava de mulheres qualificadas,
principalmente no setor terciário de serviços: correios, datilógrafas, secretárias [...]”.
Influenciado por essa formação e encantado pela condução das escolas femininas da
Europa, Castriciano apresentou para autoridades e elite local esse modelo de ensino. Sua
31
liberdade e influência ao dirigir-se a eles facilitou a aceitação do projeto, trazendo para Natal
uma escola de moças, aos moldes europeus.
Pensando sempre à frente de sua sociedade, poiscriticava bastante os costumes que
eram enraizados entre os potiguares, aproveitou o momento em que se implantava, no Brasil,
o Sistema Republicano, 1889, bem como o desmembramento do poderes político e econômico
regionais, desta feita, não mais escravocrata e passou a questionar todas as vezes em que se
deparava “com a mesma mentalidade do regime anterior, bem como a resistência às tentativas
de implementação das novidades nas técnicas de produção e no movimento cultural que
fomentava a Europa Ocidental” (PINHEIRO, 2005, p. 15).
Na empreitada pelas mudança, Henrique Castriciano se espelha no modelo de uma
escola profissionalizante para moças, da Suíça e então, "formula um conteúdo curricular
voltado para a criação do ‘espírito moderno’, no qual a escola passa a ser o espaço
privilegiado para a propagação de um novo modelo social e para a criação de uma nova moral
para a sociedade” (PINHEIRO, 2005, p. 25).
A preocupação com a educação e instrução do povo, o projeto de uma escola
feminina, que "habilita a mulher criteriosamente pela educação phísica, intelectual e moral
dos filhos”, Castriciano compartilhou com a elite local. Alguns deles, como por exemplo o
“Dr. Manoel Dantas, Dr. Francisco Meira e Sá, Dr. Juvenal Lamartine, Dr. José Augusto, Dr.
Dionysio Filgueira, homens de letras, [...], interessados no desenvolvimento do Estado”
(BARROS, 2000, p. 40-41).
Tendo deles o apoio necessário para fundar a Liga de Ensino do Rio Grande do Norte
- LERN, em 1911 e posteriormente a Escola Doméstica de Natal, em 1914. A LERN visava,
“auxiliar os poderes públicos em tudo quanto disser respeito à instrução e educação do povo,
e em particular, fundar escolas para a instrução e educação da mulher” (CASCUDO, 2008, p.
163).
Pretendia tornar a mulher protagonista na formação de uma sociedade ideal, além de
enfatizar qual era a posição hierárquica do homem diante desse contexto, nos fez
compreender que apesar da busca por modernidade e pioneirismo na educação escolar para as
mulheres nesse processo de criação, a Liga de Ensino tinha consolidado o patriarcalismo
existente na sociedade à época, fortificando a educação das elites.
A finalidade da Liga de Ensino do Rio Grande do Norte “não era pregar a
emancipação da mulher nem encaminhá-la para a solução do que se convencionou apelidar de
feminismo”. Cascudo (2008, p. 164) ainda completa que o “principal objetivo da Liga pode
ser resumido em quatro palavras: aperfeiçoar a educação doméstica”. Contudo, não foi
32
empecilho para que houvesse na educação feminina o aproveitamento desses ensinamentos
recebidos, tornando estas moças as personagens de sua emancipação. A exemplo dessa
afirmação, vimos anteriormente a lista das mulheres que exerceram cargos de liderança no
ambiente escolar.
Em conformidade com Rodrigues (2007, p. 54)
A Liga surgiu da necessidade de intelectuais e políticos norte-rio-grandenses,
[...], criarem uma entidade que congregasse os seus ideais e reunisse esforços
em função da concretização dos seus propósitos sociais e republicanos. [...]
Manifestaram a necessidade de renovar o ensino potiguar que consideravam
arcaico, ultrapassado em seus métodos de ensino, quando no Brasil eram
fundadas, em várias cidades, Ligas e/ou entidades congregadoras de ideias,
na sua maioria, de cunho nacionalista, cívica e embrionariamente partidária.
Em uma carta circular escrita em maio de 1911, Henrique Castriciano descreve sobre
a importância em criar uma escola voltada para a mulher, e que essa educação “representa por
certo, o início de promissora fase inicial, porque é da mulher que depende a felicidade da
família e essa, é a nação em miniatura” (BARROS, 2000, p. 42).
Planejar uma educação feminina que trouxesse ensinamentos comportamentais e
ainda noções técnicas de como gerenciar seu lar e educar de forma culta os filhos ou demais
crianças, era o modo mais adequado aos olhos dos homens intelectuais da Liga de Ensino para
formar cidadãos cultos que fossem úteis para sua nação. Instruindo-lhes em seus
comportamentos e atitudes, influenciando até mesmo nas suas vestimentas, visando atender as
demandas de uma sociedade que ansiava estabelecer um modelo de comportamento para o seu
povo.
Havia uma urgência em relação “a criação de uma escola em orientação técnica na
ciência da dona de casa”, era fundamental educar e instruir a mulher do campo e da cidade.
Barros (2000, p. 43), descreve ainda um trecho lido por Henrique Castriciano quando
abordava sobre A Educação da Mulher em uma conferência para a sociedade natalense,
relatando o programa da Escola que a Liga de Ensino pretendia fundar, “vê-se bem a
preocupação: instruir, mas principalmente educar a mulher, disciplinando-lhe a vontade, ao
mesmo tempo que se quer fazer dela a principal guiadora dos filhos”.
O desejo de modernizar e ter uma sociedade educada à custa da escola, tornou a
mulher responsável em partilhar nos lares esses saberes, bem como ter do governo as ações
necessárias para que houvesse um planejamento voltado para os problemas de analfabetismo
existentes na sociedade, seria a “nova e augusta maternidade: a formação social do Brasil de
33
amanhã” (BARROS, 2000, p. 43). Portanto, ao concluir seu curso, as alunas da Escola
Doméstica estavam aptas para lecionar, e o nível curricular, estabelecido para a formação
delas, as tornava qualificadas para atuarem no campo da educação.
A Escola Doméstica foi fundada para atender aos desejos de uma sociedade que
buscava modernidade, de forma que, segundo Le Goff (1990, p. 167), se pode entender que “a
modernidade torna-se então o atingir dos limites, a aventura da marginalidade, e já não a
conformidade à norma, o refúgio na autoridade, a ligação ao centro, que o culto do “antigo”
sugere”. Sendo assim, todo o entendimento de modernidade para a época ultrapassou a
compreensão do que era o processo de instituição de uma escola feminina aos moldes
europeus. Tornando a escola uma referência em educação para a sociedade, devido ao modo
arrojado e eficaz do seu processo de ensino e aprendizagem à época.
Portanto, a partir desses ideais desenvolve-se um diálogo com Saviani (2005, p. 28),
quando ele apresenta o conceito de instituição relacionando a quatro significados que
remetem a instituição escolar, quais sejam: planejar, ensinar, capacitar e desenvolver o
conhecimento. Para a fundação da escola houve esse processo de organização que visava
atender os ideais de uma educação Suíça, dentro do regionalismo potiguar compreendido pela
elite. Todo planejamento fora elaborado com a intenção de desenvolver, nas alunas,
capacidades recebidas de um modelo escolar desejado pela sociedade, que segundo Cunha
(1986 apud Rodrigues, 2007), fosse, uma escola “representativa e democrática, que se
caracterizasse como mantenedora dos valores humanos, mas também formadora de cidadãos
conscientes de suas responsabilidades e direitos perante o social; uma escola agilizadora do
processo de desenvolvimento social do país”.
O seu público alvo eram as moças residentes em Natal, e as oriundas do interior do
Estado do RN, além daquelas que vieram de outros Estados do Brasil. Sendo modelo para a
educação feminina, naquilo que está atrelado a organização, e com uma estrutura curricular
voltada aos ideais desejados para o ensino da mulher, [com vistas a torná-la] diferente das
demais instituições escolares. Sobre o fato Saviani (2005, p. 28), afirma que
As instituições escolares são, portanto, necessariamente sociais, tanto na
origem, já que determinadas pelas necessidades postas pelas relações entre
os homens, como no seu próprio funcionamento, uma vez que se constituem
como um conjunto de agentes que travam relações entre si e com a sociedade
a que servem.
Entende-se que a Escola Doméstica se constituiu como ambiente escolar quando seus
ideais foram sustentados com ações que firmaram o ensino proposto, e com o passar dos anos
34
seu currículo foi sendo modificado, adequando-se às necessidades do momentoem que a
escola estivesse vivenciando.
Um exemplo foi a criação do Instituto de Puericultura da ED, inaugurado para que as
alunas pudessem ter além das aulas teóricas sobre o cuidado da infância, a prática desses
ensinamentos recebidos, demonstrando cautela e domínio do conteúdo aprendido, sendo
“mãe”, por alguns dias, de crianças recebidas no berçário do instituto.
Considera-se que essa atividade era o aprimoramento da prática maternal, Saviani
(2005, p. 29), esclarece que “o processo de criação das instituições coincide com o processo
de institucionalização de atividades que antes eram exercidas de forma não institucionalizada,
assistemática, informal, espontânea”, em outras palavras, o cuidado maternal é instintivo,
naturalmente a mulher desenvolve métodos para cuidar de seus filhos ou de outras crianças
menores.
Com a instituição desse ensino, a escola passou a ter mais responsabilidade no tocante
a preparar a mulher de modo adequado e científico, vinculando os conhecimentos recebidos
da teoria com a prática dos cuidados com a criança em idade tenra. Para Rodrigues (2007, p.
102), a Escola Doméstica trouxe “significados nos discursos de intelectuais e políticos da
época”, e ainda contribuiu sobremaneira para a formação de valores coletivos - morais,
intelectuais, culturais – além de investir para a prática dos conhecimentos adquiridos, ou seja,
uma formação focada contexto social, e portanto, útil para a sociedade, posto que se adaptava
ao modelo “produtivo que despontava com o crescimento industrial, nas fábricas e no
mercado, exigindo da escola uma cultura de formação que passasse a privilegiar a pedagogia e
seus elos com os objetivos políticos e culturais da sociedade vigente” (RODRIGUES, 2007, p.
102).
Dessa maneira constata-se que a escola produz além do conhecimento teórico, uma
cultura nas práticas, que foram inseridas com o desenvolvimento das atividades propostas,
assim “implicando a existência de uma multiplicidade de culturas” em seu interior,
principalmente por ser um ambiente que tem um público diverso, que trazem consigo suas
experiências e práticas adquiridos em sua vida cotidiana (SAVIANI, 2005, p. 30).
No entanto, alcançar tais benefícios não foi fácil! Nesse ínterim, as mulheres
percorreram um longo caminho na luta por seu espaço na educação, o patriarcalismo era
predominante e as mulheres da elite, segundo Perrot (1990, p. 95), “reivindicaram muito cedo
o direito à instrução. [...] não confiavam no ensino que concediam a elas. Temiam sua
desvalorização”. Exatamente porque o currículo da educação feminina era planejado por
35
homens, que direcionaram qual tipo de ensinamentos as mulheres deveriam receber,
desmerecendo a capacidade de aprendizado delas.
36
4 A CULTURA DA ESCOLA DOMÉSTICA E O ENSINO DE PUERICULTURA
Por meio de uma “sessão solene de inauguração”, ocorrida no dia 01 de setembro de
1914, teve início a História da Escola Doméstica de Natal /RN, a qual foi realizada em sua
sede, na Praça Augusto Severo, na Ribeira, e contou “com a presença do Governador do
Estado, Dr. Francisco Ferreira Chaves, altas autoridades, diretores da Liga de Ensino, além de
inúmeras figuras da sociedade local” (BARROS, 2000, p. 51). Ainda de acordo com o autor,
naquela ocasião era notória a gratidão de todos os participantes ao gesto de apoio do Governo
do Estado do Rio Grande do Norte, ao idealizador, o Dr. Henrique Castriciano, à Liga de
Ensino e também às professoras suíças contratadas por quatro anos.
Antes da inauguração, foi publicada uma matéria no jornal “A República” em 27 de
agosto de 1911, na ocasião o Dr. Meira e Sá traz detalhes do projeto pretendido pela Liga de
Ensino para fundar a Escola Doméstica em Natal, enfatizando que seguiria o modelo em voga
do programa da Escola Ménagère de Friburgo, explicando que o método a ser implementado
seria mais prático que teórico e, conforme o entendimento dele consistia em,
Apprender fazendo (ou, na precisa phrase dos americanos do norte - learning
by doing) - eis o methodo a seguir. Sem grandes canseiras e sempre sob a
direção das mestras, [...]. As disciplinas serão apprendidas por meio de
applicações methódicas e continuadas, tudo quanto estiver indicado no
referido programa educativo”6. (BARROS, 2000, p. 54).
Ao longo deste capítulo será abordado o desenvolvimento das práticas da Escola
Doméstica, quais as influências recebidas e que modificações ocorreram para que a escola
tivesse a sua identidade construída. Julia (2001, p. 9) afirma que “a cultura escolar é descrita
como um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e
um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação
desses comportamentos”. Percebe-se que na organização das normas da Escola havia uma
preocupação em manter um padrão na formação das alunas. Todo programa de ensino foi
minuciosamente elaborado para atender às solicitações da Liga de Ensino do Rio Grande do
Norte.
O então Governador do Estado, Dr. Ferreira Chaves também discursou e em sua fala
de gratidão por fazer parte daquele momento enfatiza a importância da educação para o
desenvolvimento de uma sociedade próspera, e ainda, que o ensino das Escolas Domésticas
6 Trecho do discurso do Dr. Meira e Sá, na inauguração da Escola Doméstica.
37
da Suíça trariam, ao Estado do Rio Grande do Norte, um modo eficaz e decisivo no processo
de aprendizagem, educando e formando o caráter das alunas ingressas naquela instituição.
A Educação e a instrucção, afirma o notável philosopho, tem conjunctamente
por objetivo o desenvolvimento e o exercício das faculdades; mas a primeira
dirige-se mais à alma, ao coração, às paixões, e a segunda à imaginação, ao
entendimento, ao espírito; aquella tem antes por objectivo formar o carácter
e os hábitos; crear e alimentar a intelligencia.” (BARROS, 2000, p. 56).
Idealizada para que a educação fosse laica e sem a intervenção da igreja, os
ensinamentos eram voltados para a preparação das alunas nos mais diversos campos de
atuação, como: economia doméstica, horticultura, culinária, cuidados do lar, etiqueta, língua
portuguesa, francês, inglês, e etc. Nesse novo momento não caberia mais a mulher, tão
somente aquele modelo educativo onde se pregavam apenas os princípios religiosos, mas
agora também os científicos fariam parte de seu aprendizado, no entanto, ainda seguindo os
parâmetros anteriores, ou seja, “ainda na perspectiva de seus deveres primordiais com a
família. A feminilidade liga-se ao conceito da caridade e da filantropia para redimir graves
problemas sociais” (PINHEIRO, 2005, p. 125).
Como idealizava a Liga de Ensino, a escola foi criada para “fazer a diferença”, posto
que “defendia uma educação onde a mulher fosse instruída para que, no lar ou fora dele,
soubesse guiar-se nos caminhos da vida”, aduz Barros (2000, p. 91). Nessa trajetória, a
transformação se daria à medida que as alunas fossem ensinadas a terem capacidades de
desenvolver as mais diversas habilidades, além de serem preparadas a terem uma vida social
mais recatada, culta e elegante, seja ela da cidade ou do campo.
O compromisso de Castriciano era inculcar na sociedade potiguar a certeza de que
era possível haver uma educação séria para as mulheres, assim como o era na Suíça,
possibilitando a elas, atuar e exercer sua cidadania e desenvolver novas habilidades, além das
que costumeiramente lhes eram repassadas, naquilo que se refere às suas obrigações para a
sociedade, naquela época.
A ideia de deixar a Escola com estrutura de uma grande casa fez com que as alunas
se sentissem mais acolhidas, com “salas amplas e claras, seus jardins, seu pomar, sua horta,
sua sala de refeições, sua grande cozinha, suas portas sempre abertas davam a sensação de
uma grande casa, de um lar” (BARROS, 2000, p. 90).
Na imagem abaixo é possível apreciar as alunas em uma aula prática de jardinagem,
ministrada no jardim da Escola Doméstica. Essa aula aconteceu no ano de 1915 ea obra faz
38
parte do acervo pessoal do professor da Escola Doméstica e 7° presidente da Liga de Ensino
do RN (1984-1999), Osório Bezerra Dantas.
Imagem 9: Aula de jardinagem, 1915
Fonte: Barros (2000, p. 109).
As alunas eram formadas não somente para o lar, mas também para uma educação
que as capacitasse com ensinamentos essenciais a sua formação escolar, preparando-as
inclusive para o mercado de trabalho. Tal mudança foi instituída com a elaboração de um
currículo que “contemplava matérias práticas e teóricas, o qual seria trabalhado pela educação
e pela instrução, levando a aluna, ao final do curso, à aptidão para as elites domésticas e para
os desafios da vida, pelos conhecimentos e cultura adquirido (LIMA, 2004, p. 241).
O programa de ensino da Escola Doméstica era distinto dos já existentes, o que
contribuiu para que se destacasse das demais escolas. Pioneira na educação voltada para a
vida cotidiana feminina, o modelo foi considerado, na época, um rompimento aos moldes
empregados pela sociedade, no tocante ao que se referia à função do homem e da mulher.
Perrot (2007, p. 91), assegura que “o saber é contrário à feminilidade”, e que havia um
entendimento de que o conhecimento era privilégio do homem, e por assim ser, a mulher que
ousasse estudar seria severamente punida, pois estaria cometendo um pecado imperdoável.
A mulher, na ânsia pelo saber “sucumbiu à tentação do diabo e foi punida por isso”;
as escrituras (judaísmo, cristianismo, islamismo) e sua interpretação eram confiadas aos
39
homens. A Bíblia, a Torá, os versículos islâmicos do Corão foram escritos por homens...
(PERROT, 2007).
Como se vê, sua instrução era através da observação, segundo Perrot (2007, p. 91), o
desenvolvimento da “instrução das meninas” se deu após a Reforma Protestante, quando foi
possível permitir que a Bíblia fosse lida por homens e mulheres, e não apenas pelos
sacerdotes da igreja. Escolas femininas e masculinas surgiram também com o intuito de trazer
uma educação adequada ao público específico.
A igreja era contrária à educação feminina, porém ao perceber sua influência, passou
a investir em escolas, mas em meio a avanços um tanto acanhados, a conquista no território
do saber para a mulher foi árdua. Para muitos homens, uma mulher instruída era bastante
perigoso, era vergonhoso que a mulher soubesse mais que o marido, por exemplo. Perrot
(2007, p. 92) discorre como era dada a importância da educação feminina e sua destinação,
descrevendo a fala de alguns autores da época que diziam sobre esse tipo de educação, um
deles foi Rousseau quando escreveu sobre Sophia, companheira de Émile, para ele
Toda a educação das mulheres deve ser relativa aos homens. Agradá-los,
ser-lhes úteis, fazer-se amar e honrar por eles, criá-los, cuidar deles depois de
crescidos, aconselhá-los, consolá-los, tornar-lhes a vida agradável e suave:
eis os deveres das mulheres em todos os tempos, é o que se deve ensinar-lhes
desde a infância. (PERROT, 2007, p. 92).
No entanto, todos esses critérios não foram empecilhos para que a mulher buscasse
espaço no ambiente escolar indo além do que era proposto na educação feminina,
principalmente quando o seu direito em aprender era para que as tornassem bela, recatada e
do lar, muitos dos ensinamentos propostos estavam direcionados para a organização do
ambiente familiar, educar as meninas significava instruí-las apenas no que fosse “necessário
torná-las agradáveis e úteis”. Ainda conforme defende Perrot (2007, p. 93) à mulher cabia às
atribuições de dona-de-casa, de esposa e mãe”.
Os idealizadores7 da LERN buscaram alcançar princípios inovadores, e esperavam
que na Escola Doméstica isso fosse concretizado através do ensino proposto, pois eles
ansiavam pela modernização na capital do Rio Grande do Norte. Apesar da busca por
7 Foram designados para compor a diretoria provisória da LIGA de Ensino do RN os senhores, o Dr.
Francisco Meira e Sá, Cel. Fabrício Gomes de Albuquerque Maranhão, Dr. Henrique Castriciano de
Souza, Desembargador Luiz Manoel Fernandes Sobrinho, João Dionysio Filgueira, Dr. José Augusto
Bezerra de Medeiros, João Juvenal Pedroza Tinoco, Avelino Alves Freire, Francisco Cascudo,
Romualdo Lopes Galvão e Pedro Amorim de Araújo (BARROS, 2000, p. 44).
40
transformação no sistema de ensino na época, eles se mantinham em ações conservadoras,
quando a maior preocupação era ensinar a mulher para formar cidadãos ideais.
Era necessário compreender a importância da constituição do currículo para
organização da estrutura escolar, a sua história, de como ela se alinhava na teoria, na prática e
na cultura escolar. Esses conhecimentos tiveram grande influência na educação brasileira,
“sendo estabelecida a ideia de organização e desenvolvimento” (SILVA, 2013, p. 24-25). Isso
vemos claramente na organização do currículo da Escola Doméstica, quando pudemos
observar as disciplinas estudadas, como eram divididos os ensinos, a idade das alunas, o
cronograma diário de atividades, distribuído em horários minuciosamente estabelecidos.
Mesmo entendendo que a estruturação de seu programa curricular era organizada e
meticulosa, a Escola Doméstica relacionou os saberes na forma de transmitir esses
ensinamentos que, segundo Rodrigues (2007, p. 162),
As proposições das ideias da Pedagogia Nova no currículo da Escola
Doméstica de Natal nos anos iniciais de sua fundação, na estruturação de
diversas disciplinas de ordem teórica e prática que tinham em vista o fazer
das alunas com base nos seus interesses e necessidades.
O currículo da escola refletia os princípios das diretoras estrangeiras, pois
inicialmente foi elaborado por elas e pelos componentes da LERN. As professoras trouxeram
o melhor da educação Suíça, como “a educação e a instrução da mulher e, sobretudo, a
consciência do seu próprio valor. A Liga de Ensino defendia uma educação onde a mulher
fosse instruída para que, no lar ou fora dele, soubesse guiar-se nos caminhos da vida”
(BARROS, 2000, p. 91).
Entretanto, ele foi sendo moldado para atender as demandas da sociedade, não
seguindo fielmente o modelo tão valorizado da escola Suíça, devido aos hábitos e costumes
da população local. Desejosos tornar a população mais culta, a instituição escolar deveria
atender aos anseios da elite que compunha a LIGA e seus associados8 também,
proporcionando uma instrução adequada às moças que prontamente foram matriculadas
naquele ambiente de ensino.
A conduta das professoras estrangeiras foi essencial para que as filhas de intelectuais
e da elite agrária do RN fossem matriculadas na Escola Doméstica, o programa que foi
desenvolvido atendia aos critérios que muitos pais pretendiam para a educação de suas filhas.
8 Os sócios João Dionysio Filgueira, Pedro Soares de Araújo, João Juvenal Pedrosa Tinoco e
Romualdo Lopes Galvão, [...] O Dr. Manoel Dantas, Juvenal Lamartine e Luiz Fernandes de Oliveira
(BARROS, 2000, p. 45).
41
Sendo assim, foi possível observar que a cultura escolar recebeu influência externa,
conforme as relações que a instituição mantinha com a sociedade no seu entorno, as
características do público alvo, os funcionários que integravam a equipe pedagógica, tinha um
critério pré-estabelecido.
Por ser uma escola que não fazia imposições religiosas, era possível que as alunas
pudessem professar sua fé, sendo respeitadas e tendo como garantias o seu direito em exercer
sua crença com liberdade. Outra característica da instituição é que as alunas mantinham o
hábito de dialogar entre si, estreitando vínculos de amizades e afunilando os laços afetivos.
Esse incentivo chamou atenção pois em outras escolas era proibido manter esse
costume, e quando isso acontecia eles eram reprimidos e punidos, por vezes proibidos de
conversar com o colega. Já na Escola Doméstica, “o falar e o conversar eram incentivados
pelas professoras suíças. Era por esse falar e por uma conversa que haveria a troca de
informações, identificações, amizades” (BARROS, 2000, p. 92).
Como já citado,o jornal “A República” de n° 91, apresentou à sociedade, o
programa elaborado pela diretora a Mlle Hélène Bondoc, no qual se descrevia a estrutura
curricular da escola, e também tinha as Condições de Admissão para o ingressar e as
Condições Regulamentares para as condutas comportamentais.
Quadro 1: Modelo do formulário Condições de Admissão
CONDIÇÕES DE ADMISSÃO9
A Escola Doméstica de Natal, comprehenderá duas categorias de alumnas: as
internas e as semi-internas. São as condições para a admissão:
1° Ter a idade de 15 annos pelo menos
2° Possuir um diploma ou attestado da escola primaria.
> As alumnas de fora da cidade serão internas; as residentes na cidade
semi-internas.
> As alumnas internas deverão trazer como enxoval, além de vestidos e da
roupa de e de toucador, quatro aventaes de cor, com mangas que cubram
inteiramente o vestido e quatro aventaes brancos de diversos modelos.
> O penteado simples será absolutamente indispensável. As jóias não serão
admitidas na Escola. Será também necessario um chapeo de palha, simples e
grande, para os trabalhos de jardinagem.
Fonte: Barros (2000, p. 104).
9 A tabela foi adaptada, porém mantém a escrita da época.
42
Quadro 2: Programa da Escola Doméstica de Natal
Approvado pela Diretoria da Instrução Pública do Estado. O presidente do Conselho Director da Liga
de Ensino, em Natal, em conformidade com o art. 19, n. VI dos respectivos Estatutos, resolve adoptar
“ad referendum” do referido Conselho, o Programa dos estudos da Escola Doméstica, organizado pela
Diretora Mlle. Hélène Bondoc e que adeante se segue10:
Cozinha:
Comprenhenderá o
estudo da cozinha
operária, da cozinha
burgueza, da cozinha
artística e da cozinha
para doentes e
creanças. Curso
theórico e prático.
Cozinha
Prática:
Carne;
legumes;
gorduras;
pastellaria
doméstica.
Curso Theórico de
alimentação:
Alimentação racional,
Diversos regimes
allimentares; cozinha
vegetariana; regras da
arte culinária;
conservação e limpeza
da cozinha; mobília e
etc.
Leiteria:
Fabricação de
manteiga; queijo;
exercícios práticos
sobre a produção
dos derivados do
leite.
Animaes
domésticos -
Espécie bovina:
Caracteres da vaca
leiteira,
melhoramento do
gado, alimentação e
cuidados a dar à
vaca leiteira,
processo de
ordenha, criação e
engorda de vitellos.
Avicultura:
Criação dos pintos;
alimentação das
galinhas poedeiras;
engorda; raças;
moléstias e parasitas.
Apicultura:
Criação das
abelhas de mel;
modo de
tratal-as;
conservação do
mel; a cera; a
colméia; o
favo, etc.
Economia:
Trato dos aposentos e
attribuições da dona
de casa; papel da
mulher na casa, filha,
esposa e mãe;
Conhecimentos
exactos da sciencia
caseira. Seriação das
occupações
domésticas.
Lavagem de
roupa:
Passagem a ferro e
conservação da
roupa branca e dos
vestuários. Modo
de molhar a roupa
e de a ensopar,
ensaboar, ferver,
lavar, ferver,
enxaguar, etc.
Conserto de
roupa:
1° ano: Tricot,
costura.
2° e 3° anos: Corte
e costura de roupa
caseira. Remendo e
etc.
Contabilidade:
Contabilidade
doméstica.
Corte e feitio
do vestuário:
Costura.
Rouparia:
Desenho, corte,
juntura da camisa da
mulher e etc.
Botânica e
jardinagem:
Horta.
Phisica:
Noções
preliminares. Estado
dos corpos.
Movimento, etc.
Chimica:
Carburetos; alcool;
acidos;
desinfectantes;
materias graxas;
hydricarburetos;
albuminoides.
Anatomia:
Physiologia.
Hygiene individual e
medicina prática:
Emprego do tempo;
hygiene phisica;
vestuário; hygiene
intellectual; hygiene
moral.
Medicina prática:
O quarto do
doente; o leito e
seus accessorios;
antisepsia e
assepsia; curativos
e apparellos
provisorios;
primeiros socorros
e etc.
Língua nacional -
chorografia e
História do Brasil,
especialmente a do
Rio Grande do
Norte.
Fonte: Barros (2000, p. 94-104).
10 A língua portuguesa passou por algumas fases de modificações em sua escrita. Queremos destacar a
do início do século XX e antes da Reforma Ortográfica de 1911 em Portugal, chamada
histórico-científico, a intenção era padronizar a língua, estabelecendo uma ortografia oficial, mas o
Brasil não participou dessa reforma. Portanto, alguns dos vocábulos em itálico no parágrafo eram
escritos com base em palavras latinas ou gregas, estas passaram por modificações em nosso
vocabulário ortográfico após alguns anos. Biblioteca Virtual (2018, sn).
Ver mais em: http://www.bibliotecavirtual.sp.gov.br/temas/educacao/reforma-ortografica.php.
43
Atendidas as referidas condições, os pais recebiam uma lista de itens necessários
para que a interna pudesse usufruir na escola. Essa relação contemplava materiais
indispensáveis ao uso pessoal, saber: roupas de cama (colchas brancas11, lençóis, fronhas
brancas) de banho (toalhas para o rosto e corpo), guarda-chuva, copos, colher de chá, sacos
para roupas usadas, porta-guardanapo, vestidos brancos simples [...]” (RODRIGUES, 2007, p.
241).
Ao atentar para o texto do programa da Escola Doméstica, percebe-se que seus ideais
foram descritos através da estruturação curricular proposta inicialmente pelas diretoras e
também pela Liga de Ensino, mostrando qual é a visão que a instituição teve em relação aos
ensinamentos que eram transmitidos às alunas, do mesmo modo na assimilação desse
conhecimento com a produção de atividades desenvolvidas no ambiente escolar.
Barros (2000, p. 94-104) detalha como eram divididos os cursos individuais
importantes para a formação das alunas, e nós estruturamos e adaptamos o quadro acima,
descrevendo sobre cada curso ofertado pela Escola Doméstica.
Como se constata, o currículo formulado para as alunas da Escola Doméstica foi
preparado com o propósito de instruí-las para o lar e também para que tivessem os
conhecimentos necessários para contribuir na educação de sua comunidade, e podendo ser
excluídos de sua estrutura os cursos que não eram pertinentes ao programa curricular.
Perceber o saber escolar dessa forma implicou reconhecer que as disciplinas
escolares são como criações contextuais do sistema escolar, produtos
históricos e instrumentos de trabalho da instituição segundo seus interesses,
convicções e ideias. O saber, portanto, que a disciplina ordena no currículo
sobrepõe-se à necessidade de apenas repassar o saber científico, passando a
ser instrumento de trabalho pedagógico necessário ao atendimento da
filosofia de trabalho da instituição, dos seus anseios e do seu projeto
pedagógico (RODRIGUES, 2007, p. 151-152).
Nos anos seguintes o currículo da Escola Doméstica foi se adequando aos interesses
das alunas que vinham do interior, muitas delas filhas de fazendeiros, donos de engenhos etc.
Eles queriam que as filhas tivessem uma educação com conteúdo apropriado para sua
realidade de vida.
A preocupação da Liga de Ensino do RN era com o fato de as alunas se apropriarem
dos conhecimentos ajustados dentro do campo científico, de forma que fosse transmitido para
11 A observação para a cor branca de alguns itens de uso pessoal, remete a um critério de limpeza,
asseio.
44
elas, as noções de cuidados com a saúde e higiene e assim estariam aptas a contribuírem com
o cuidado da população local.
Até então, as matérias ensinadas contemplavam os ensinamentos necessários para
que as alunas adquirissem habilidades a serem utilizadas aquando do auxilio seus familiares
nas tarefas cotidianas. Rodrigues (2007, p. 153), destaca, como exemplo, o cronograma de
Medicina Prática. Nele as alunas aprendiam sobre procedimentos dos tipos: “primeiros
socorros, aplicação de vacinas, verificação de temperatura, contusão, feridas, envenenamento,
convulsão, [...]”. Essas orientações, segundo a Liga de Ensino, eram úteis para a comunidade
rural, pois as moças instruídas saberiam socorrer os doentes na ausência de um profissional da
saúde (RODRIGUES, 2007, p. 153).
Compreender a realidade das alunas e adequar os ensinamentos ao seu cotidiano, foi
um avanço nas práticas de ensino e aprendizagem, tornando o tempo de estudo e estadia das
alunas na escola mais acolhedor, assim como era em seus lares. No entanto,

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