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PorUmDireitoFeminista-Souza-2022

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS 
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO 
 
 
 
 
 
LARA LEMOS RAULINO DE SOUZA 
 
 
 
 
 
 
POR UM DIREITO FEMINISTA: A PERSPECTIVA DE GÊNERO NA FORMAÇÃO 
EM DIREITO DA UFRN 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL, RN 
2022 
 
LARA LEMOS RAULINO DE SOUZA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
POR UM DIREITO FEMINISTA: A PERSPECTIVA DE GÊNERO NA FORMAÇÃO 
EM DIREITO DA UFRN 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
Graduação em Direito, do Centro de Ciências 
Sociais Aplicadas, da Universidade Federal 
do Rio Grande do Norte como requisito para 
obtenção do título de Bacharel em Direito. 
 
Orientadora: Profa. Dra. Mariana de Siqueira. 
 
 
 
 
NATAL/RN 
2022 
 
Esta obra está licenciada com uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional. 
Permite que outros distribuam, remixem, adaptem e desenvolvam seu trabalho, mesmo 
comercialmente, desde que creditem a você pela criação original. Link dessa licença: 
creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode 
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN 
Sistema de Bibliotecas - SISBI 
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Elaborado por Shirley de Carvalho Guedes - CRB-15/440 
 
 
 
Souza, Lara Lemos Raulino de. 
Por um direito feminista: a perspectiva de gênero na formação em Direito da 
UFRN / Lara Lemos Raulino de Souza. - 2022. 
112f.: il. 
 
Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 
Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Curso de Direito, Natal, RN, 2022. 
Orientadora: Profa. Dra. Mariana de Siqueira. 
 
 
1. Direitos fundamentais - Monografia. 2. Educação jurídica - Monografia. 3. 
Feminismo - Monografia. 4. Relação de gênero - Mulher - Monografia. I. 
Siqueira, Mariana de. II. Título. 
 
RN/UF/CCSA CDU 342.726-055.2 
 
LARA LEMOS RAULINO DE SOUZA 
 
 
POR UM DIREITO FEMINISTA: A PERSPECTIVA DE GÊNERO NA FORMAÇÃO 
EM DIREITO DA UFRN 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
graduação em Direito, da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, como 
requisito à obtenção do título de Bacharel em 
Direito. 
 
Aprovada em: __/__/____ 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
Profa. Dra. Mariana de Siqueira 
Orientadora 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
 
 
 
Profa. Dra. Karoline Lins Marinho 
Membro Interno 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
 
 
 
Prof. Dr. Ângelo José Menezes Silvino 
Membro Externo 
Centro Universitário Maurício de Nassau de Natal 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Aos meus avós. 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Talvez a tarefa mais árdua desse trabalho seja tecer os agradecimentos. Acredito que 
tudo o que construímos é fruto da coletividade, e com isso em mente, sei que em cada palavra 
dessa pesquisa carrego comigo a força de tantas e tantos que me ampararam. Não foi fácil 
pesquisar Educação em meio a tantos ataques direcionados às Universidades Públicas (e à 
educação em geral). Ainda mais difícil foi estar em contato com as violências de gênero, em 
um cenário aterrorizante àquelas e àqueles que se indignam em face das injustiças. Em um 
contexto doloroso, tenho plena certeza de que os frutos dessa monografia são devidos a todas 
e todos que caminharam ao meu lado durante esses anos. 
Assim, começo agradecendo ao meu berço, meu primeiro (e eterno) suporte: meus 
pais, Hilton e Janiara. Carrego comigo a responsabilidade, herdada de vocês, de nunca deixar 
de me indignar com tudo o que é injusto. Sou profundamente grata por todo o apoio, 
paciência e afeto compartilhado, por sempre acreditarem em mim e investirem tanto tempo e 
dedicação nos meus estudos. Agradeço ainda, ao meu irmão, Davi, por dividir essa jornada – 
sou feliz assistindo seu crescimento. À toda a minha família, avós, avôs, tios, tias, primos e 
primas, meu mais sincero obrigada pela esperança que depositam em mim. Faço um 
agradecimento póstumo à minha avó, Regina, minha maior incentivadora e fonte de 
inspiração, e a quem dedico essa monografia – com ela, aprendi o significado de amor 
incondicional. 
Agradeço a Iago, meu companheiro de vida, por me acolher e apoiar em todos os 
momentos, por acreditar no meu potencial e ser aquele que traz leveza e amor para o 
cotidiano. Me inspiro em você e também agradeço as inúmeras contribuições nesse trabalho 
em horas de insegurança. Juntos, caminhamos melhor. 
Agradeço à minha “família extensa”, minhas amigas e amigos: Cecilia, Mariana, DG, 
Giovana, Nino, João Paulo, Marcelo e Pedro. Sou grata pelas risadas e choros divididos, pelas 
brincadeiras do cotidiano e por essa rede de afeto que construímos. Me sinto em casa com 
vocês. Obrigada também por cada palavra de incentivo e acalento, e, especialmente à Cecilia, 
Mariana e DG, pela revisão do trabalho e pelas chamadas todas as segundas-feiras, me 
lembrando, no início de cada semana, o que realmente importa nessa vida. 
Aos meus amigos da faculdade, agradeço, em nome de Bia Azevedo, pelas risadas 
que tonaram esses anos mais leves. Aos projetos, agradeço pela possibilidade de enxergar um 
espaço no Direito que acolhe aquelas(es) que não estão satisfeitas(os) com esse mundo: ao 
Efetivando o Direito à Educação agradeço por ser meu primeiro lugar no curso; à SOI, 
 
agradeço especialmente ao meu último comitê, o CRPD, que se tornou um verdadeiro 
encontro de almas – vocês me dão esperança. 
Aos projetos de pesquisa, agradeço ao GEDUP por me fazer voltar os olhos à minha 
própria vivência e refletir sobre o cotidiano. E ao DEFEM, meu berço na pesquisa, agradeço 
por me permitir experienciar o brilho no olho que é pesquisar um tema que move minhas 
paixões e minha justa raiva, e por mostrar que a Academia pode, e deve, ser construída de 
afetos. A cada uma das pesquisadoras, agradeço por inúmeras contribuições que me 
permitiram chegar até aqui, pela disposição de tempo para responder o questionário e realizar 
as entrevistas: obrigada Berê, Débora, Júlia, Jacke, Bianca, Fernanda e Manu, em especial, 
pela disposição em ler e revisar meu trabalho. 
Ao meu último estágio, o Centro de Referência em Direitos Humanos – Marcos 
Dionísio, agradeço por renovar minha fé no direito e por demonstrar que é possível alinhar 
meus ideais com um exercício da profissão que seja pautado nos direitos humanos. Agradeço 
aos meus colegas estagiários, em nome de Luis Lucas, amigo que me acompanha desde o 
começo da graduação e em quem me inspiro diariamente, pela parceria e momentos de 
descontração. 
À banca, profa. Karol Marinho e ao prof. e amigo Ângelo, agradeço pelas 
contribuições ao meu trabalho e pelo exemplo de docência com afeto. À minha orientadora, 
Mariana de Siqueira, agradeço pela paciência, pelos longos áudios, reuniões e, sobretudo, pela 
coragem de trazer o DEFEM ao curso de Direito da UFRN. Que felicidade foi ter como 
orientadora uma professora que carrega consigo esperança. 
Por fim, agradeço a todas e todos que de alguma forma colaboraram com a minha 
pesquisa, e responderam ao questionário. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A noite não adormecerá 
jamais nos olhos das fêmeas 
pois do nosso sangue-mulher 
de nosso líquido lembradiço 
em cada gota que jorra 
um fio invisível e tônico 
pacientemente cose a rede 
de nossa milenar resistência 
 
Conceição Evaristo - Poemas da recordação e outros movimentos 
 
 
RESUMO 
 
A presente monografia se dedica a estudar a formação discente no curso de Direito da 
UFRN, com enfoque em uma educação jurídica com perspectiva de gênero. Assim, busca 
identificar seo curso de direito da UFRN, do campus de Natal, prepara as alunas e alunos 
para interpretar o Direito aplicando o que chamamos de “lentes de gênero” - as quais 
compreendem enxergar as desigualdades de gênero, raça e classe em cruzo. Nesse ínterim, 
o tema advém da necessidade de fomentar no direito uma atuação engajada com o 
enfrentamento às desigualdades de gênero, raça e classe, também com atenção à 
aproximação dos movimentos feministas e o campo jurídico. Trabalhamos, então, com a 
hipótese de que ainda não há uma formação estabelecida nesse sentido, mas que o Grupo de 
Pesquisa Direito, Estado e Feminismos (DEFEM), criado em 2019, expressa o início de 
uma mudança. Desse modo, o trabalho inicialmente realiza uma pesquisa bibliográfica, 
onde busca-se definir o que significa interpretar o direito com perspectiva de gênero, e de 
que forma a educação jurídica pode promover essa formação. Posteriormente, há a 
realização de uma pesquisa de campo, por meio da aplicação de dois questionários: 1. com 
estudantes ingressantes no curso entre o primeiro semestre de 2017 e 2020, 2. com 
pesquisadoras integrantes do DEFEM. A análise dos resultados obtidos nos permite ter uma 
compreensão de como o contato com temáticas de feminismos e gênero na graduação 
contribui para a formação de juristas engajadas(os) com as lentes de gênero, bem como se 
há algum item do tripé universitário que se destaca ao trabalhar essas temáticas. Ao fim da 
monografia, identificamos que a extensão, em geral, se destaca na formação com 
perspectiva de gênero, e que o Grupo DEFEM é uma iniciativa que vem promovendo uma 
mudança mais ampla, sendo exemplo de boas práticas para a educação jurídica. 
 
Palavras-chave: educação jurídica; feminismos; perspectiva de gênero. 
 
 
 
ABSTRACT 
 
The present monograph is dedicated to study the students' formation at the Law School of 
the Federal University of Rio Grande do Norte (UFRN), focused on a legal education with 
gender perspective. Therefore, it seeks to identify if the undergraduate on Law, at UFRN, 
campus Natal, prepares the students to interpret the Law applying what we call “gender 
lens” - which can perceive gender, race and class inequalities combined. In this context, the 
theme comes from the need to foment engaged law practices against the discriminations of 
gender, race and class, in addition to an approximation between the feminist movements 
and the legal field. Hence, we work with the hypothesis that there still isn’t a formation 
established in this manner, but that the Research Group in Law, State and Feminisms 
(DEFEM), founded in 2019, expresses the beginning of a change. Accordingly, this 
monograph initially realizes a bibliographic research, where we intend to define what it 
means to interpret law applying a gender perspective, and how the legal education in 
undergraduate could promote this formation. Subsequently, we conduct a field research, 
through the application of two questionnaires: 1. with students entering the course between 
the first semester of 2017 and 2020; 2. with researchers from the group DEFEM. The 
analysis of the results obtained allows us to construct a comprehension of how the contact 
with subjects of feminisms and gender during the graduation contributes to the formation of 
jurists engaged with the gender lens, as well as if there is some item from the tripod 
teaching, research and extension that stands out in terms of working with these thematics. 
By the end of this monograph, we found out that the extension, in general, was prominent in 
the formation of students that have a gender perspective, and that the group DEFEM is an 
initiative that has been promoting a bigger change, being an example of good practices for 
legal education, at least in this local scenario. 
 
Keywords: legal education; feminisms; gender perspective. 
 
 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
 
Gráfico 1 - Contagem de respondentes por período de ingresso no curso (GERAL) ............. 64 
Gráfico 2 - Contagem de respostas à pergunta "Você concorda que o Direito tem marcadores 
de gênero, raça e classe?” (GERAL) .................................................................................... 67 
Gráfico 3 - Contagem de mecanismos legais estudados em sala de aula (GERAL) ............... 69 
Gráfico 4 - Contagem de “Você participa/participou de algum projeto de extensão do 
departamento de Direito da UFRN em que trabalhou com mulheres em situação de 
vulnerabilidade?” (GERAL) ................................................................................................. 73 
Gráfico 5 - Cruzamento das respostas de alunos que não participaram de nenhum projeto de 
extensão com as suas respostas sobre os marcadores de gênero, raça e classe ....................... 77 
Gráfico 6 - Dados de estudantes que já participaram de algum grupo, projeto ou linha de 
pesquisa do curso de Direito da UFRN que se dedica a estudar direitos das mulheres, 
feminismos ou gênero .......................................................................................................... 80 
Gráfico 7 - Contagem de alunos que já pesquisaram sobre violência contra as mulheres, em 
grupo, projeto ou linha de pesquisa do curso de Direito da UFRN ........................................ 81 
Gráfico 8 - Alunos que participaram de eventos ou congressos organizados pelo curso de 
Direito da UFRN sobre temáticas de direito, gênero e feminismos. ...................................... 82 
Gráfico 9 - Respostas de “você diria que conhece a rede de apoio às mulheres em situação de 
violência doméstica e familiar?” .......................................................................................... 83 
Gráfico 10 - Contagem de respostas à pergunta "Você teve contato com os equipamentos da 
rede de apoio para mulheres em situação de violência em Natal/RN durante as experiências 
profissionais enquanto estudante (estágio ou NPJ)?” ............................................................ 84 
Gráfico 11 - Quantidade de alunos que marcaram conhecer os equipamentos (GERAL) ...... 85 
Gráfico 12 - Mecanismos legais estudados em sala de aula (DEFEM) .................................. 90 
Gráfico 13 - Quantidade de alunas que marcaram conhecer os equipamentos (DEFEM) ...... 93 
Gráfico 14 - Respostas à pergunta “qual(is) desses campos no curso de Direito da UFRN você 
acredita que poderia abordar as temáticas relativas à violência doméstica e familiar contra as 
mulheres?” (GERAL) .......................................................................................................... 95 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1 - Cruzamento das respostas de aulas sobre gênero e feminismos X compreensão dos 
estudantes sobre os marcadores de gênero, raça e classe (GERAL) ...................................... 71 
Tabela 2 - Cruzamento das respostas de “Você participa/participou de algum projeto de 
extensão do departamento de Direito da UFRN em que trabalhou com mulheres em situação 
de vulnerabilidade?” X respostas sobre os marcadores de gênero, raça e classe .................... 74 
Tabela 3 - Cruzamento das respostas de “Você participa/participou de algum projeto de 
extensão do departamento de Direito da UFRN onde trabalhou com mulheres em situação de 
violência doméstica e familiar?” X respostas sobre os marcadores de gênero, raça e classe .. 75 
Tabela 4 - Cruzamento das respostas de “Você participa de projeto de extensão do 
departamento de Direito da UFRN onde trabalhou com demandas de gênero de modo geral 
(mulheres e população LGBTQIAP+)?” X respostas sobre os marcadores de gênero, raça e 
classe ................................................................................................................................... 76 
Tabela 5 - Contagem de respostas sobre o item “ensino” - DEFEM ...................................... 89 
Tabela 6 - Respostas sobre vivências em estágiose NPJ (DEFEM) ...................................... 92 
Tabela 7 - Categorias de sugestões apresentadas pelos estudantes (geral e DEFEM)............. 97 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
ABSP – Anuário Brasileiro de Segurança Pública 
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior 
CAPS – Centro de Atenção Psicossocial 
CAPS AD – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas 
CC/16 – Código Civil de 1916 
CEDAW – Comitê Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as 
Mulheres 
CES – Câmara de Educação Superior 
CF/88 – Constituição Federal de 1988 
CFOAB – Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil 
CNE – Conselho Nacional de Educação 
CNJ – Conselho Nacional de Justiça 
CNPQ – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
CRAS – Centro de Referência de Assistência Social 
CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social 
CREN – Centro de Referência Elizabeth Nasser 
DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais 
DEAM – Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher. 
DEFEM - Grupo de Pesquisa Direito, Estado e Feminismos 
DH – Direitos Humanos 
EAD – Educação à Distância 
EDH – Educação em Direitos Humanos 
ENADE – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes 
FBSP – Fórum Brasileiro de Segurança Pública 
Inep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira 
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação 
LGBTQIAP+ – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Transgêneros, Travestis, Queer, 
Intersexo, Assexuais, Pansexuais e mais. 
LMP – Lei Maria da Penha. 
MEC – Ministério da Educação 
NAMVID – Núcleo de Atendimento às Mulheres Vítimas de Violência Doméstica 
NPJ – Núcleo de Prática Jurídica 
 
NUDEM – Núcleo de Defesa da Mulher 
ONU – Organização das Nações Unidas 
PNEDH – Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos 
PPC – Projeto Pedagógico do Curso 
PROPLAN – Pró-Reitoria de Planejamento 
RN – Rio Grande do Norte 
SIGAA – Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas 
SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior 
TIC – Tecnologias da Informação e Comunicação 
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
UP – Universidade Pública 
VDFM – Violência Doméstica e Familiar contra as Mulheres
 
SUMÁRIO 
 
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................................................ 16 
2 CONTAR HISTÓRIAS: METODOLOGIA DA PESQUISA ........................................ 22 
3 ABRAÇAR A MUDANÇA: POR QUE TECER UMA ANÁLISE CRÍTICA 
FEMINISTA DA EDUCAÇÃO NO DIREITO? ............................................................. 27 
3.1 O pensamento crítico: quem são as mulheres para o direito? ..................................... 28 
3.2 Para acabar com a opressão sexista: gênero, patriarcado e violência contra as 
mulheres............................................................................................................................ 36 
3.3 Colaboração e diálogo: educação problematizadora, atuação em rede e 
interdisciplinaridade ........................................................................................................ 47 
3.4 Educando juristas: uma análise das ementas das disciplinas obrigatórias do curso de 
direito da UFRN ............................................................................................................... 56 
4 COMPARTILHANDO HISTÓRIAS: UM OLHAR SOBRE A EXPERIÊNCIA ......... 62 
4.1 Aplicação do questionário com os estudantes ............................................................... 63 
4.1.1 Vivências no ensino ...................................................................................................... 67 
4.1.2 Vivências na extensão................................................................................................... 73 
4.1.3 Vivências na pesquisa ................................................................................................... 79 
4.1.4 Vivências nos estágios e núcleo de prática jurídica ....................................................... 83 
4.2 Sabedoria Prática: aplicação do questionário com alunas integrantes do DEFEM .... 87 
4.3 Uma Revolução de Valores: por uma outra construção do direito ............................. 94 
5 CONCLUSÕES ................................................................................................................ 99 
 REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 102 
 ANEXO A - ROTEIRO DOS QUESTIONÁRIOS E RESULTADOS ......................... 112 
 
 
16 
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
Desde as proximidades do século XVIII, mulheres têm se organizado em 
movimentos reivindicando direitos e condições de igualdade. São importantes marcos as lutas 
das mulheres na Revolução Francesa, representada por Olympe de Gouges ao escrever a 
Declaração dos Direitos das Mulheres e da Cidadã em resposta à Declaração dos Direitos do 
Homem e do Cidadão; a luta das mulheres sufragistas pelo direito ao voto; a luta das mulheres 
negras na abolição da escravidão e as reivindicações das mulheres trabalhadoras ao redor do 
mundo pela superação da exploração capitalista - hoje sedimentada no 8 de março, que 
reivindica a marcha de operárias russas em Petrogrado por pão e paz, que deu o pontapé 
inicial para a Revolução Russa. 
Todas essas reivindicações culminaram numa diversidade de movimentos feministas, 
de diferentes vertentes teóricas e epistemológicas1, os quais estão, em geral, comprometidos 
com pensar construções alternativas de mundo ou reformas à sociedade atual, buscando 
melhores condições de vida para todas as mulheres. A partir da interação dialética entre 
movimentos sociais e Direito, os feminismos passaram a influenciar a reflexão jurídica a 
partir do que hoje se vem construindo como Teoria Feminista do Direito - caminhando para se 
tornar, no plural, “Teorias”, da mesma forma que os movimentos, com base nas diferentes 
vertentes e epistemologias adotadas. 
Da existência de uma Teoria Feminista do Direito, portanto, é consequente pressupor 
que as desigualdades de gênero existentes na sociedade atravessam as situações que chegam 
ao Direito. Essa afirmação encontra espaço na materialidade ao verificar que as mulheres 
enfrentam questões como: é sobre elas que recai o trabalho de reprodução social2; as mulheres 
recebem salários menores que os homens nas mesmas funções3; são alarmantes e crescentes 
 
1 A epistemologia consiste na perspectiva de construção de saber que é adotada. Conforme Sabrina Fernandes, 
os feminismos podem ser divididos em vertentes teóricas, que são, essencialmente, a forma de ver o mundo 
adotada por aquelas feministas (marxista, anarquista, liberal, radical e pós-moderno). Em outra divisão, é 
possível falar de epistemologias feministas, isto é, de onde estão vindo os saberes produzidos - é nessa 
classificação que a pesquisadora coloca os feminismos negros, transfeminismos, ecofeminismos etc. Cf: 
TESE ONZE. Sobre feminismos e vertentes. Youtube, 2 de março de 2019. Disponível em: 
https://www.youtube.com/watch?v=08A7PD-frxo. Acesso em: 22 de nov. 2022. 
2 Para compreender o tema, cf.: BHATTACHARYA, Tithi. WHAT IS SOCIAL REPRODUCTION 
THEORY? Socialist Worker. Disponível em: https://socialistworker.org/2013/09/10/what-is-social-
reproduction-theory. Acesso em: 08 de nov. 2022. 
3 Conforme pesquisa realizada em 2022 a partir de dados obtidos do IBGE, as mulheres receberam em média 
20,5% a menos que os homens no primeiro semestre de 2021. A pesquisa foi divulgada pelo G1 e pode ser 
conferida: https://g1.globo.com/dia-das-mulheres/noticia/2022/03/08/mulheres-ganham-em-media-
205percent-menos-que-homens-no-brasil.ghtml 
17 
os números de violência praticada contra as mulheres em razão do gênero4; há privaçãode 
acesso a direitos sexuais e reprodutivos, como na criminalização do aborto e barreiras de 
acesso ao planejamento familiar e tantas outras questões de ordem estrutural que serão melhor 
desenvolvidas ao longo deste trabalho. 
Nesse contexto, o Direito, enquanto um mecanismo para onde são direcionados os 
conflitos sociais, se depara em todos os seus ramos com as imbricações de gênero, raça e 
classe como fatores determinantes das demandas sociais. Assim, é essencial observar que a 
violência contra as mulheres esteve em contínuo crescimento de 2009 a 2019, conforme o 
Atlas da Violência de 2021 - inclusive chamando atenção os altos índices do Rio Grande do 
Norte (RN), que teve um crescimento de 54,9%. Ainda, o RN foi o estado com maior risco de 
letalidade para mulheres negras, sendo estas 88% das mulheres assassinadas. 
Em um aparente contraponto, com a Pandemia da COVID-19, deflagrada em 2020, 
houve uma redução nos registros de lesão corporal dolosa, estupro e estupro de vulnerável 
com relação a 2019. Um olhar descuidado da crise social, sanitária e econômica poderia 
concluir que a violência contra a mulher diminuiu naquele ano - contudo, o mais provável é 
que tenha ocorrido um aumento da subnotificação dessas ocorrências, por influência de 
diversos fatores, como as medidas de isolamento social, de fechamento das delegacias e 
demais serviços de atendimento às mulheres (BARBOSA et al, 2020). Os estudos ao redor do 
mundo indicam que as medidas de isolamento social e quarentena foram intensificadoras da 
violência contra as mulheres, mas com diminuição no número de denúncias (SIEGFRIED, 
Kristy, 2020). 
Essa ocorrência escancara a necessidade do mundo jurídico voltar a atenção para 
como as questões estruturantes da sociedade influenciam na vida dos indivíduos, de modo a 
pensar e aplicar o Direito buscando não intensificar essas desigualdades. A tese “Azul 
Profundo: Etnografia das práticas de advocacia feminista e antirracista na Bahia”, de 
Andressa Morais (2020) documentou experiências do grupo de juristas feministas Tamojuntas 
e como o comprometimento delas com suas vivências e com uma atuação jurídica engajada 
no enfrentamento do sexismo, racismo e das desigualdades de classe é essencial para mudar o 
 
4 Conforme a pesquisa “Violência contra as mulheres em 2021”, divulgada pelo Fórum Brasileiro de 
Segurança Pública, houve un aparente recuo de casos de feminicídio. Contudo, uma observação total dos 
dados da pesquisa demonstra que houve um aumento, espcialmente nos meses em que o isolamento social 
esteve mais intenso. Considerando os casos de violência sexual (estupro e estupro de vulnerável), houve um 
crescimento na mesma medida em que os registros foram aparentemente diminuídos, o que a própria 
pesquisa aponta como consequência do isolamento social. Cf. FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA 
PÚBLICA. Violência contra mulheres em 2021. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-
content/uploads/2022/03/violencia-contra-mulher-2021-v5.pdf. Acesso em: 29 de nov. 2022. 
18 
rumo de casos de violência contra mulheres na justiça, por exemplo. Ao final, ela conclui que 
a atuação delas promove uma verdadeira justiça de gênero. 
Nesse trabalho específico, voltamos o olhar para a urgência de ter profissionais do 
direito capacitadas/os para interpretá-lo aplicando lentes de gênero, considerando a 
complexidade das relações sociais. Isso porque, conforme Mascaro (2016, p. 259), o Direito é 
um instrumento que garante a reprodução do sistema socioeconômico vigente e que 
retroalimenta a opressão das mulheres, sendo um mecanismo de controle social que atende 
aos interesses da classe dominante. Portanto, é essencial se debruçar sobre ele como um 
campo de disputa, o que acreditamos poder iniciar pelos seus campos de construção do saber - 
as universidades. 
Ao longo desta monografia também iremos nos deter na reflexão sobre os limites e 
possibilidades deste próprio Direito, que, conforme Leite (2020) está intrinsecamente 
relacionado com a manutenção do Estado Capitalista, Patriarcal e Racista. Ademais, 
observamos as desigualdades enfrentadas pelas mulheres, considerando como as estruturas de 
opressão recaem sobre elas. 
Assim, incentivar nos cursos de graduação em direito o debate sobre teoria crítica e 
teoria feminista do direito pode ser uma forma de buscar uma concepção alternativa. A partir 
dessa perspectiva, entendemos que a educação nas faculdades de direito tem direta relação 
com a formação de profissionais que o “operam” como um instrumento de controle social, 
revestido de uma pretensa neutralidade - mas que, na prática, é violador dos direitos humanos 
de tantas e tantos. 
Ante o exposto, o ponto de partida deste trabalho considera que para caminhar rumo à 
mudança e ao enfrentamento a todas as formas de violência contra as mulheres, o Direito 
precisa ser um campo de disputa e, portanto, também devem ser seus centros de construção do 
saber - nesse caso, as universidades. Nesse quesito, pactuamos com a compreensão de que a 
educação jurídica enfrenta duas dificuldades principais, quais sejam: a metodologia utilizada e 
as bases epistemológicas a partir das quais se ensina o direito.5 Da mesma forma, a atual 
estrutura do direito (exegético, judicialista, manualesco e descontextualizado)6 contribui para 
 
5 Lyra Filho, em “O direito que se ensina errado”, nos traz (....) o paradigma epistemológico seguido nas 
faculdades de direito segue o positivismo-normativista a partir do método lógico-formal, o que reduz a 
capacidade de compreensão dos juristas aos aspectos da norma, “A educação jurídica se reduziria a uma 
hermenêutica de normas” (FEITOZA, 2011, p. 26) 
6 Conforme constrói FEITOZA (2011) e iremos trabalhar mais detalhadamente ao longo do subcapítulo 3.1: o 
pensamento crítico: quem são as mulheres para o direito? 
19 
a revitimização7 das mulheres que buscam o sistema de justiça em face de uma violência 
sofrida. 
Desse modo, compreendemos que o Direito possui marcadores de gênero, raça e 
classe, de maneira tal que um jurista comprometido com a justiça social precisa ser capaz de 
direcionar um olhar sensível às desigualdades que são fruto do sistema excludente que está 
imposto. Por exemplo, a/o profissional do direito que atua com violências e violações de 
direitos precisa dialogar com outras áreas - como a assistência social e saúde. Por isso, 
acreditamos que ter uma perspectiva interdisciplinar e que considere as imbricações entre o 
capitalismo, o racismo e o patriarcado é um caminho que permite enxergar as complexidades 
das demandas. 
Destarte, acreditamos que uma formação acadêmica focada apenas nas normas e na 
dimensão do ensino em detrimento da pesquisa e da extensão é incapaz de garantir uma 
compreensão ampla da sociedade e do próprio direito. Essa compreensão não surge isolada: 
no ano de 2021, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou o Protocolo para Julgamento 
com Perspectiva no Gênero, que surge justamente através da compreensão de que o cenário de 
desigualdades em que estamos inseridas influencia na forma como interpretamos o direito, e 
que é necessário tomar atitudes para caminhar rumo à emancipação das mulheres e à 
igualdade de gênero. 
Ademais, a publicação do Protocolo veio acompanhada de outras normativas 
incorporadas ao cenário nacional: ainda em 2013 o Comitê Sobre a Eliminação de Todas as 
Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) das Nações Unidas recomendou aos 
estados-parte que buscassem a formação dos juristas em seus países para atentarem-se às 
questões de gênero. A Recomendação Geral nº 33, que versa sobre o acesso das mulheres à 
justiça, ainda reconhece que estereótipos e preconceitos de gênero geram consequências na 
forma como as mulheres acessam seus direitos humanos, e estabelece a necessidadede uma 
Educação a partir de uma perspectiva de gênero. 
De modo mais amplo, ainda é necessário mencionar que este trabalho se encontra 
alinhado com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações 
Unidas (ONU), publicados na Agenda 2030. Destacamos os objetivos 4, 5, 10 e 16, que 
versam sobre educação de qualidade, busca pela igualdade de gênero, redução de 
desigualdades e promoção da paz, justiça e instituições eficazes. 
 
7 Aqui considera-se revitimização no sentido de vitimização secundária, isto é, o fato de que uma mulher que 
sofreu violência é submetida a passar pelo processo de reviver o ocorrido ao ser atendida pelas instituições 
que deveriam acolhê-la - seja pelo ato de fazer a mulher contar repetidas vezes sua história, ou por um 
discurso de culpabilização da vítima. Ávila apud Patterson, 2017, p. 109. 
20 
Nesse momento, cabe explicar brevemente que o ensino superior brasileiro divide-se 
em três pilares: ensino, pesquisa e extensão. Enxergamos esse tripé como indispensável na 
formação de um profissional habilitado para trabalhar com questões sociais, com uma atenção 
especial aos espaços da extensão e pesquisa, na medida em que são previstos para 
proporcionar o contato com a comunidade externa à universidade. Sendo assim, entendemos 
também que esses são espaços em disputa no campo político, de modo que classificamos o 
tripé na perspectiva do que Freire (2018, p. 55) e Boaventura (2010, p. 73 - 80) trazem. Isto é, 
como forma de sair dos muros da universidade e abandonar os sofás epistemológicos 
(SIMAS; RUFINO, 2018, p. 19), limitantes do conhecimento transformador e crítico. 
Ademais, os títulos dos capítulos e subcapítulos desta monografia foram escolhidos 
para fazer referência a textos de bell hooks, marco teórico adotado ao falar sobre educação e 
gênero. Bell foi professora, feminista e voz central nas questões que envolvem gênero, raça e 
classe na pedagogia. A autora faz fortes críticas ao feminismo liberal8 e, a partir do seu lugar 
como mulher negra na academia, sugere uma teoria feminista “da margem ao centro”, sempre 
discutindo como o elitismo do mundo acadêmico (inclusive de mulheres brancas) exclui 
mulheres negras do lugar de estudos e pesquisas, compartilhando situações que ela viveu. 
Hooks também estabelece muitos diálogos com Paulo Freire ao pensar os modelos 
educacionais e propor a Pedagogia Engajada. 
Pelas razões expostas, escolhemos como universo de pesquisa o curso de graduação 
em Direito da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), campus Natal/RN. 
Buscamos investigar se o curso tem preparado os estudantes para interpretar o Direito a partir 
de perspectivas de gênero, estabelecendo diálogo com a comunidade estudantil e suas 
impressões acerca da sua própria formação. A análise passa pelas categorias do ensino, 
pesquisa e extensão, permitindo um olhar amplo sobre como essas dinâmicas se apresentam. 
O percurso metodológico da monografia será melhor desenvolvido no próximo capítulo, 
específico para tratar dessa temática. 
Dessa maneira, buscamos trazer algumas contribuições que possam instigar o debate 
acerca da necessidade de reformulação da educação jurídica para acolher as demandas sociais 
(em pauta, com perspectiva de gênero), de modo a enxergar a raiz dos problemas. Sem 
pretensão de concluir a temática, essa monografia tem um fim: inquietar-se em face das 
 
8 Feminismo liberal é uma vertente dos feminismos que parte de uma teoria individualista e capitalista para 
pensar as questões de gênero. Assim, propõe reformas na sociedade, buscando reduzir as desigualdades 
utilizando-se de mecanismos já existentes - a nível institucional. Cf. mais em: RAUBER, Beatriz Viera, et al. 
Dicionário de Gênero e Segurança: Feminismo Liberal. [s.l.] 25 nov. 2021. Disponível em: https://gedes-
unesp.org/feminismo-liberal/. Acesso em: 29 de nov. 2022. 
21 
opressões contra as mulheres e sensibilizar aquelas e aqueles que lutam por uma sociedade 
onde haja justiça social. 
 
22 
2 CONTAR HISTÓRIAS9: METODOLOGIA DA PESQUISA 
 
“[...] quanto do que nos diziam ser ciência dura ou dados eram, na verdade, histórias, a 
interpretação de dados e de fatos.” 
(bell hooks) 
 
Conforme já dito, essa monografia está dividida em três etapas, de modo que cada 
momento seguirá abordagens teórico-metodológicas diversas. Disso, a escolha em dedicar um 
capítulo apenas para a explicação dos métodos utilizados para a realização desta pesquisa, 
bem como o caminho que levou à determinação do tema tratado. Assim, o universo de 
pesquisa é o Curso de Direito da UFRN, por ser o local de graduação desta autora e permitir 
uma melhor inserção na vida acadêmica para a coleta dos dados. 
Ademais, foi realizado o recorte sob o olhar apenas do corpo discente, pois a 
intenção desta monografia é tecer considerações das experiências dos estudantes - de modo 
que, desde já, frisamos a importância de mais pesquisas que tragam o olhar do corpo docente, 
haja vista que compreendemos a educação como um campo de construção que depende da 
participação ativa de todos os envolvidos - educando e educador. 
Nesse ponto, é importante ressaltar que não desconsideramos que o universo de 
estudo está continuamente em relação com as expressões da “questão social”10, é dizer: não 
estudamos um ambiente neutro, e as vivências dos estudantes na universidade não podem ser 
dissociadas de suas vivências fora dos muros da universidade, de maneira tal que as respostas 
dadas a essa pesquisa precisam ser compreendidas dentro de contexto e considerando as 
dinâmicas sociais em que estamos inseridos/as. 
A pergunta-problema que guia essa pesquisa é: o curso de graduação em Direito da 
UFRN prepara as/os estudantes para interpretar o Direito aplicando lentes de gênero? A 
partir dessa pergunta, formulamos a hipótese de que o curso não prepara os estudantes para 
interpretar o Direito a partir de lentes de gênero, contudo, que há uma via de mudança sendo 
institucionalizada desde 2019, a partir da criação do Grupo de Pesquisa Direito, Estado e 
Feminismos (DEFEM). Assim, o objetivo geral é responder à pergunta, analisando se o curso 
de graduação em Direito da UFRN, campus Natal, prepara os alunos para aplicar lentes de 
 
9 Esse título faz referência ao ensinamento 9 da obra “ensinando pensamento crítico: sabedoria prática”, de bell 
hooks. 
10 Considera-se, aqui, o conjunto de problemas políticos, históricos e culturais vivenciados pela sociedade com 
o advento do capitalismo e, portanto, com o surgimento da classe trabalhadora. (NETTO, José Paulo. 
Capitalismo e barbárie contemporânea. Argumentum, v. 4, n. 1, p. 202-222, 2012.) 
23 
gênero ao Direito. 
Para cumprir com o proposto, os objetivos específicos são: 1. Delinear as principais 
críticas ao Direito a partir de perspectivas feministas; 2. Definir o que são lentes de gênero e 
como aplicá-las ao Direito; 3. Observar as experiências dos estudantes no curso de Direito da 
UFRN no que tange ao contato com as temáticas de gênero e feminismos; 4. Comparar as 
noções de gênero e feminismos dos estudantes em geral e das alunas que integram o Grupo de 
Pesquisa Direito, Estado e Feminismos; 5. Identificar boas práticas em educação feminista no 
direito e 6. Apontar campos que precisam de melhorias. 
Para atingir tais objetivos, foi adotada majoritariamente a vertente jurídico-
sociológica, buscando investigar relações entre o direito e a sociedade (GUSTIN, 2010, p. 
27). Isso porque caminha nos aspectos de efetivação do direito à educação das/os estudantes 
do curso de Direito da UFRN, visto que a Resolução nº 5/2018 do MEC prevê o tratamento 
transversal de conteúdos sobre educação em direitos humanos, educação em políticas de 
gênero e educação das relaçõesétnico-raciais, dentre outras. Em determinados momentos, 
também seguiremos a vertente jurídico-dogmática, a partir da análise de normativas. Isso 
posto, o método de abordagem adotado foi o hipotético-dedutivo (LAKATOS; MARCONI, 
2017, p. 66-71), pois a pesquisa vai buscar realizar o teste de falseamento da hipótese criada 
para o problema. 
Para tanto, esta monografia estruturou-se da seguinte forma: o primeiro e segundo 
capítulos dedicam-se à introdução e à metodologia desta pesquisa. O terceiro capítulo, 
intitulado “Abraçar a mudança: porque tecer uma análise crítica feminista no Direito?”, 
apresenta as discussões sobre os principais conceitos que envolvem este trabalho, para 
compreender o porquê de se buscar uma educação feminista no Direito. Esse capítulo está 
dividido em quatro subtópicos, onde no primeiro, chamado “O pensamento crítico: quem são 
as mulheres para o Direito?” serão feitas considerações sobre a formação do direito, quem são 
os ditos “sujeitos de direitos” e as contribuições da teoria feminista a esses pontos, tendo por 
referência principal Taylisi Leite. 
O segundo subtópico foi nomeado “Pelo fim da violência: gênero, patriarcado e 
violência contra as mulheres”, em que serão realizadas conceituações sobre gênero, 
patriarcado e violência, a partir das contribuições de Heleieth Saffioti e bell hooks, 
majoritariamente. No terceiro subtópico, “Constituir o diálogo: educação problematizadora, 
atuação em rede e interdisciplinaridade” apresentamos uma proposta de educação alternativa à 
bancária, modelo atualmente seguido no curso de Direito da UFRN, também pontuando como 
e porque inserir a interdisciplinaridade e atuação em rede no processo formativo. 
24 
Ainda nesse capítulo inicial, no quarto subtópico, chamado “Educando juristas: uma 
análise das disciplinas obrigatórias do curso de Direito da UFRN”, será realizado um estudo 
das ementas das disciplinas obrigatórias do curso de Direito da UFRN, com o objetivo de 
compreender qual a previsão de assuntos a serem vistos em sala de aula. Para tanto, será feita 
uma busca às palavras “gênero”, “feminismos”, “feminismo”, “mulher” e “mulheres” nas 
ementas, bem como referências à Lei Maria da Penha, à Convenção de Belém do Pará (ou 
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher) e à 
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher. Essas 
normativas foram elencadas em razão da sua relevância a nível nacional e internacional. 
Explica-se a busca nas disciplinas obrigatórias do curso porque são componentes que 
todos os estudantes precisarão cursar. Assim, são aquelas disciplinas que integram o que o 
curso de Direito da UFRN compreendeu como fundamental na formação de seus estudantes, 
também com base no que as diretrizes curriculares do Ministério da Educação (MEC) 
estabelecem para as graduações em direito. Nesse primeiro momento, será portanto realizada 
uma pesquisa bibliográfica, aplicada a técnica de pesquisa de documentação indireta 
(LAKATOS; MARCONI, 2017, p. 118), utilizando-se de fontes documentais (documentos 
oficiais e jurídicos) e de fontes bibliográficas. 
Posteriormente, no quarto capítulo, intitulado "Compartilhando Histórias: um olhar 
sobre a experiência", serão apresentados os resultados da observação realizada com os 
estudantes do curso de Direito da UFRN. Serão utilizadas duas técnicas de observação, sendo 
ambas de documentação direta, com pesquisa de campo. Assim, o capítulo se dedica a 
apresentar os resultados de questionário aplicado com estudantes que ingressaram no curso de 
direito da UFRN a partir de 2017.1 até 2020.1. O período de ingresso é considerado até 
2020.1 pois aqueles que ingressaram até esse semestre encontram-se atualmente há dois anos 
e meio no curso, sendo esta exatamente a metade da graduação, considerando a contagem de 
cinco anos de curso. 
O questionário também será aplicado com as alunas integrantes e fundadoras do 
Grupo de Pesquisa DEFEM, com intenção de cumprir o terceiro, quarto, quinto e sexto 
objetivos específicos. Serão comparados os dados obtidos a partir do questionário para o 
público geral e para as integrantes do Grupo, como forma de identificar se o DEFEM, 
enquanto única iniciativa do curso que se dedica especificamente às questões entre Direito e 
gênero, refletiu na formação dessas alunas e se há diferença significativa entre as respostas. 
Além do questionário, também serão realizadas entrevistas semiestruturadas com as 
integrantes do DEFEM. O objetivo das entrevistas é colher a experiência das integrantes do 
25 
DEFEM possibilitando cumprir o quarto, quinto e sexto objetivos específicos, também como 
forma de enrobustecer os dados. A escolha do Grupo deve-se ao fato de ser o primeiro a 
dedicar-se ao estudo das relações entre Direito, Estado e Feminismos no curso de Direito da 
UFRN. Assim, considera-se essa uma amostragem relevante de alunas para investigar como o 
contato específico com essas temáticas pode influenciar na formação voltada a incentivar a 
aplicação da perspectiva de gênero. 
Destarte, o Grupo de Pesquisa DEFEM foi criado em abril de 2019, e em 2022 
publicou o primeiro livro organizado pelas pesquisadoras. Nesse ínterim, foram escolhidas 
para serem entrevistadas as oito alunas que integraram o Grupo quando de sua criação, no ano 
de 2019, e que permaneceram no grupo até a publicação do Livro Direito, Estado e 
Feminismos. 
Dessa maneira, a técnica de entrevistas semiestruturadas será aplicada a partir de um 
roteiro de perguntas a serem realizadas a todas as integrantes do grupo que serão entrevistadas 
- sem a necessidade de seguir a mesma ordem de perguntas ou de fazê-las com as mesmas 
palavras. Em suma, é um tipo de entrevista que requer a preparação de um material prévio, 
mas que permite algum tipo de flexibilidade (QUEIROZ; FEFERBAUM, 2019, p. 284). Será 
garantido o anonimato às alunas entrevistadas no momento de redação desta monografia, 
visando deixá-las confortáveis para responder às perguntas. 
Para a análise dos dados das entrevistas, utilizaremos da metodologia da análise de 
conteúdo, que permitirá processar dados científicos qualitativamente. Nessa pesquisa, 
focaremos no que as entrevistadas querem dizer, isto é, realizaremos uma análise temática. 
Para tanto, esse método de análise se desenvolve em 5 etapas: A primeira é a preparação das 
informações, onde serão transcritas as entrevistas e emitidas as respostas do questionário e 
será realizada a leitura de todos os materiais obtidos. (MORAES, 1999). A segunda etapa 
envolve a definição de unidades de análise, que podem ser palavras, trechos, documentos 
integrais etc, a serem delineadas a partir do material recebido e preparado. (MORAES, 1999) 
Após serem individualizadas, parte-se à terceira etapa, de categorização, onde 
agrupam-se dados a partir de semelhanças ou analogias, neste caso, a partir de critérios 
semânticos/temáticos. Os princípios da categorização envolvem: 1. Validade ou pertinência 
em face da problemática; 2. Exaustividade, que enfatiza a necessidade de analisar todas as 
unidades de análise; 3. Homogeneidade, devendo ser utilizado o mesmo critério de 
classificação; 4. Exclusividade, cada unidade não pode estar em duas categorias; 5. 
Objetividade, permitindo a replicação por outros pesquisadores. (MORAES, 1999) 
Para o quarto momento é realizada a descrição dos resultados, que para uma pesquisa 
26 
qualitativa, deve envolver uma síntese dos significados encontrados a partir das unidades de 
análise e das categorias estabelecidas. Enfim, a quinta etapa é a interpretação dos resultados, e 
nesse caso, parte de uma contrastação dos resultados obtidos com a teoria definida 
anteriormente, no capítulo 3 desta monografia. (MORAES, 1999). Em face do exposto, 
cumpre ainda dizer que a pesquisa terá um caráter majoritariamente qualitativo, pois o 
objetivo geralcentra-se na busca por compreender o ponto de vista dos alunos e dialogar com 
as respostas obtidas para a compreensão de um cenário geral. 
Ao final da pesquisa, acredita-se que será possível fazer um diagnóstico atual do 
perfil dos alunos do curso de Direito da UFRN, e propor sugestões do que acreditamos ser 
uma forma eficaz de trazer um olhar atento e crítico para o Direito acerca das desigualdades 
de gênero, que compreenda também as imbricações de raça e classe. Assim, durante este 
trabalho, nos utilizaremos majoritariamente do arcabouço metodológico que traz bell hooks, 
com a concepção de Pedagogia Engajada (HOOKS, 2013). Também nos ocuparemos em 
trazer contribuições do feminismo marxista, a partir de Saffioti (2015) e Leite (2020), ao falar 
sobre as categorias Gênero, Patriarcado e Violência e ao tratar dos direitos das mulheres e 
movimentos feministas. 
27 
3 ABRAÇAR A MUDANÇA11: POR QUE TECER UMA ANÁLISE CRÍTICA 
FEMINISTA DA EDUCAÇÃO NO DIREITO? 
 
“Tivemos de lembrar a todos, várias vezes, que nenhuma educação é politicamente 
neutra.” 
(bell hooks) 
 
Os estudos feministas e de gênero são marcados historicamente pelo questionamento 
do status quo, das hegemonias e do modo de fazer Ciência. (MARCONDES; FARAH, 2021). 
Nesse âmbito, o Direito é um campo que recebeu e recebe críticas e apontamentos que se 
reúnem no que hoje algumas teóricas chamam de feminismo jurídico, outras de teoria 
feminista do direito. Independentemente do termo, as críticas feministas ao Direito 
manifestam-se principalmente em três perspectivas: 1. à teoria do Direito, definindo-o 
enquanto produto de sociedades patriarcais e reprodutor dos interesses masculinos; 2. crítica 
de determinadas instituições jurídicas, como normas excludentes e discriminatórias das 
mulheres; 3. à aplicação do direito, apontando o machismo presente na hermenêutica jurídica. 
(SILVA, 2018) 
Consoante Carmen Hein de Campos, jurista feminista, o direito brasileiro ainda tem 
dificuldade em incorporar as críticas da teoria feminista do direito, embora seja um campo já 
consagrado internacionalmente. A nível local, temos uma forte tradição de doutrinadores 
homens (ao que Campos vai referir-se como malestream, para expor que há uma centralidade 
masculina na nossa produção acadêmica) e de negação das contribuições feministas ao direito, 
o que, conforme a autora, se expressa não apenas pelo claro antagonismo de ideias, mas 
também pela ocultação teórica de estudiosas feministas. Dessa forma, pontua que dificilmente 
encontraremos referenciais bibliográficos feministas nas disciplinas dos cursos de direito 
brasileiros. (CAMPOS, 2015, p. 980) 
A partir dessa inquietação de Carmen Hein, que também acomete a autora deste 
trabalho, sugerimos que as críticas feministas ao direito devem englobar a educação nos 
cursos de graduação e pós-graduação - embora essa pesquisa foque no primeiro campo. 
Consoante Silva (2018, p. 90) “o pensamento/movimento jurídico feminista ainda é pouco 
conhecido nas faculdades de direito na América Latina”, e quando o é, está restrito a grupos 
 
11 Esse título faz referência ao capítulo 3 da obra “Ensinando a transgredir: a educação como prática de 
liberdade”, de bell hooks. Originalmente, o título seria “abraçar a mudança: o ensino num mundi 
multicultural”. 
28 
específicos que estudam essa temática. Propomos que para o direito ser um campo útil à 
redução de desigualdades e ao enfrentamento da violência contra as mulheres, essa realidade 
precisa mudar. 
Nesse sentido, a Resolução Geral nº 33 do Comitê CEDAW da ONU traz, nos arts. 
32 e 33, que os estados-parte devem fomentar a educação a partir de uma perspectiva de 
gênero como forma de assegurar que as mulheres acessem seus direitos. Esses artigos 
recomendam: 1. Fomento do conhecimento sobre gênero, com mais especialistas no tema; 2. 
Difusão de materiais informativos sobre os direitos das mulheres; 3. A inclusão das temáticas 
de igualdade de gênero e direitos das mulheres nos currículos de todos os níveis de ensino. A 
partir desses pontos, inegável é a urgência de as universidades buscarem promover educação 
com perspectiva de gênero. 
Indo além, entendemos que a educação deve ser prática de liberdade, como propõem 
bell hooks e Paulo Freire. Para tanto, a educação no direito precisa ser um campo também de 
críticas e construções feministas, antirracistas e libertadoras. A frase “abraçar a mudança”, 
que abre esse capítulo, é retirada do livro “Ensinando a Transgredir”, onde hooks trabalha a 
importância de uma educação crítica em um contexto multicultural, reforçando que nenhuma 
educação é politicamente neutra e que educadores e educadoras precisam ter 
comprometimento com a mudança e com a democracia. 
Isto é, não basta abordar gênero: é preciso uma educação feminista. Ainda, 
acrescentamos que toda educação libertadora e críticas feministas ao direito devem considerar 
as imbricações entre gênero, raça e classe. Dessa maneira, há também a necessidade de ser 
uma educação antirracista e com viés de classe. Isso posto, os tópicos seguintes se dedicam a 
explorar pontos centrais que buscam responder à pergunta realizada no título desse capítulo, e 
permitir compreender o que consideramos interpretar o Direito a partir de perspectivas ou 
“lentes” de gênero. 
 
3.1 O pensamento crítico12: quem são as mulheres para o direito? 
 
No texto que inspirou o título deste subcapítulo, bell hooks explica que o pensamento 
crítico é composto por cinco perguntas: identificamos quem, o quê, quando, onde e como das 
coisas. Assim, iniciamos nos perguntando quem são as mulheres para o direito, abrindo 
margem para duas interpretações: a partir da pergunta, é possível imaginar que o direito 
 
12 Esse título faz referência ao Ensinamento 1 da obra “ensinando pensamento crítico: sabedoria prática” de bell 
hooks. 
29 
constrói uma narrativa do “ser mulher”. Por outro lado, é possível ler com uma indicação de 
subalternidade das mulheres para o direito, querendo em verdade perguntar-se: afinal, as 
mulheres são alguém para o direito? Ou ainda: quando falamos dos “sujeitos de direitos”, as 
mulheres estão incluídas? 
 A partir dessas duas interpretações podemos iniciar duas narrativas diferentes, mas 
que, como veremos, conectam-se ao final para dizer: sim, o direito se ocupa de construir uma 
narrativa do ser mulher - e essa construção as entrega o lugar de “Outro”13, de não-sujeito. 
Nessa perspectiva, um ponto central no apagamento das mulheres para o mundo jurídico - 
bem como na criação de um “ser mulher” estereotipado e dotado de viés de gênero14 - é o 
mito da neutralidade do Direito. Abrindo a reflexão, ao pensar acerca da própria definição de 
direito reproduzida pela Academia e pelas instâncias do judiciário, Silvino (2022, p. 205)15 
questiona a ideia de neutralidade apresentando como um de seus exemplos a perpetuação de 
valores patriarcais na legislação. 
Conforme trazem César e Suxberger (2019), ao falarem sobre o gênero do direito, a 
farsa de que o sistema jurídico opera de maneira imparcial, ou quase asséptica, é o que 
permite que esse campo se constitua numa estrutura de poder androcêntrica e patriarcal16. Em 
outras palavras, a neutralidade é masculina, e isso pode ser observado ao analisar julgamentos 
de violência de gênero contra as mulheres. O que indicam as pesquisas estudadas que se 
dedicaram a fazer uma análise de discurso desses julgamentos é que estes se baseiam em 
estereótipos e preconceitos de gênero e exercem o poder do controle dos corpos das mulheres 
a partir desses discursos. (CÉSAR, SUXBERGER, 2019; ALMEIDA, NOJIRI, 2018). 
Desse modo, os julgamentos de violências praticadas contra mulheres são fortemente 
influenciados pelo estereótipo da mulher honesta e de que as mulheres não são confiáveis, 
como identificaramAlmeida e Nojiri (2018) ao analisarem os discursos de julgamentos de 
crimes de estupro praticados contra mulheres no estado de São Paulo. Neste estudo, também 
afirmam que esses estereótipos são acobertados pelo paradigma da neutralidade do Direito, 
 
13 Ao dizer a famosa frase “não se nasce mulher, torna-se”, Simone de Beauvoir trabalha a categoria do Outro 
afirmando que o masculino é a construção universal, ele é o ponto de partida - ela é o que deriva. Nos diz 
Simone: “O homem é o Sujeito, o Absoluto; ela é o Outro”.(BEAUVOIR, 2016, p.13 ) 
14 Consideramos aqui por viés de gênero a predisposição de tomar decisões ou ações a partir de noções de 
papéis de gênero pré-concebidas e formuladas por noções patriarcais e machistas. (ALMEIDA, NOJIRI, 
2018). 
15 A tese referenciada nesse trecho encontra-se atualmente em situação de submetida à publicação, mas não está 
disponível no repositório institucional. O conteúdo integral para referência foi obtido diretamente com o 
autor. 
16 Adiante, será demonstrado que podemos e devemos ir além: o Direito é masculino e desassocia as mulheres 
por essência, pois deriva de uma estrutura capitalista e patriarcal. É o que sugere a crítica marxista feminista 
do Direito de Leite apud Scholz. 
30 
“que naturaliza estereótipos e impõem padrões de conduta, especialmente às mulheres” 
(ALMEIDA; NOJIRI, 2018, p. 833). 
Assim, é razoável afirmar que os discursos do poder judiciário possuem uma 
compreensão do ser mulher que não as classifica enquanto sujeitas dotadas de autonomia e 
direitos. Nesse ponto, cabe fazer uma breve digressão sobre quem seriam esses sujeitos de 
direitos. Gomes (2019), ao pensar a categoria da dignidade da pessoa humana a partir dos 
marcos de gênero e raça, faz uma divisão entre a pessoa humana e o sujeito de direitos. Diz 
ela que “O sujeito de direitos é a entrada da pessoa humana no mundo normativo-jurídico e 
suas instituições, o sujeito de direitos é uma instituição desse mundo jurídico.” (GOMES, 
2019, p. 874). 
Então, pode-se dizer que ser considerado sujeito de direitos é condição fundamental 
para o acesso a todos os direitos garantidos à pessoa humana. Portanto, também não é forçoso 
concluir que essa noção está diretamente ligada à construção feita sobre quem são as pessoas 
dotadas de humanidade. Nessa linha de pensamento, Gomes (2019) constrói a ideia de que o 
conceito de humanidade é fundamento do projeto colonial, e toma por base a racionalidade. 
Nessa perspectiva, as leis seriam fruto do exercício da racionalidade por um ser 
humano e poderiam ser aplicadas universalmente a todas as pessoas.17 Esse humano de quem 
falam essas leis, contudo, é uma pessoa sem corpo, sem influências ou pré-concepções: é um 
ideal concebido a partir da colonialidade, que é especialmente violento contra os desviantes 
de gênero e raça. Desse modo, temos que a construção de sujeito de direito adota esse ideal 
permitindo a exclusão e punição dos desviantes (como as mulheres), como também reforça 
sua desumanização (Gomes, 2019, p. 892). 
Por conseguinte, a naturalização de estereótipos é um dos elementos que compõem a 
violação e revitimização das mulheres pelo poder judiciário. Porém, é preciso ir além para 
entender que essa violação é expressão da própria concepção de humanidade para o mundo 
jurídico, que, na narrativa dominante, desconhece as mulheres como pessoas humanas com 
dignidade. Logo, até aquelas que se adequam aos estereótipos sofrem com violência e 
feminicídios (Gomes, 2019, p. 893). 
Indo além, Leite (2020) propõe que o “Direito é homem”, de modo que a forma-
sujeito (ou, como aqui nos referimos, o sujeito de direito) é também, e sempre será, 
correspondente à masculinidade e à branquitude. Logo, o sujeito das revoluções burguesas é 
sempre formalmente referenciado como o homem - a exemplo, na revolução francesa, da 
 
17 Conforme Taylisi Leite, o sujeito racional desdobra-se em sujeito de direito, unidade mínima da modernidade 
jurídica. (LEITE, 2020, p. 71-73 ) 
31 
“Declaração sobre os Direitos do Homem e do Cidadão” - e materialmente, é sempre o 
homem branco e proprietário que exerce as liberdades, direitos políticos e transações. 
 Corroborando com esse entendimento, Saffioti (2013, p. 60) demonstra que a 
marginalização de determinadas pessoas na sociedade é gerada pelas relações de produção, e 
não pelas características individuais. Em outras palavras: gênero e raça não são a origem do 
machismo e do racismo, essas características foram selecionadas, em determinado momento, 
como marcadores para criar hierarquias sociais. Em razão disso, atender ao molde que foi 
designado às mulheres não significa deixar de sofrer opressão - e igualmente, renunciar 
totalmente a esse molde também não implica na emancipação. Completa a autora: 
 
há que se buscar nas primeiras (relações de produção) a explicação da seleção de 
caracteres raciais e de sexo para operarem como marcas sociais que permitem 
hierarquizar, segundo uma escala de valores, os membros de uma sociedade 
historicamente dada. (SAFFIOTI, 2013, p. 60) 
 
Assim, quando nos perguntamos quem são as mulheres para o direito, precisamos 
inicialmente ter em mente que a narrativa hegemônica as exclui - os direitos humanos não são 
pensados para elas, porque a própria pessoa humana é um mero ideal, e quanto mais à 
margem está o indivíduo, mais difícil alcançá-lo [o ideal]. Percebe-se isso ao identificar que 
décadas após a positivação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, os direitos lá 
contidos estão longe de serem realidade para a maior parte da população mundial (LEITE, 
2020, p. 69). 
De modo mais geral, Silvino (2022) trata sobre o que ele denomina teoria 
hegemônica dos direitos humanos. Esses direitos positivados em legislações nacionais e 
internacionais são falsamente expostos nos manuais como “plataformas para se obter 
direitos”, não estão assentados na materialidade. Essa ideia sedimenta tudo o que viemos 
falando até o momento: os direitos humanos não são vivenciados pela população porque, de 
fato, eles não são pensados a partir do cotidiano: são meros ideais. Por essa razão, para pensar 
quem são as mulheres para o direito, defendemos partir de teorias contra-hegemônicas de 
direitos humanos, que os construam a partir das relações sociais e mobilizações populares. 
A partir desses pontos, portanto, os primeiros passos a serem dados para aplicar as 
aqui ditas lentes de gênero ao direito são: 1. A superação do mito da neutralidade; 2. A 
percepção da condição de humanidade das mulheres, que precisam ser compreendidas como 
sujeitas de direitos para terem acesso às garantias que lhes protegem. Ademais, esses passos 
não se fazem sem realizar o exercício do pensamento crítico com o aporte teórico feminista 
32 
que já no início trouxemos. Seguimos buscando responder quem são essas mulheres para o 
direito. 
Feitas essas considerações, pretendemos, nesse segundo momento, direcionar o olhar 
para como as normativas nacionais alimentaram e ainda alimentam esses estereótipos do que é 
ser mulher. Parte importante dessa análise é considerar como o mundo jurídico tem se portado 
frente à crescente presença de mulheres ocupando cargos no direito. Conforme dados do 
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), o número de advogadas 
inscritas já supera o número de advogados18. Não há, contudo, informações sobre raça e etnia 
dos inscritos. De todo modo, esse número já mostra que as mulheres são maioria, mas ainda 
nos questionamos se a prática as acolhe, ou se os estereótipos de gênero alcançam também o 
fazer profissional das advogadas e demais juristas. 
Nesse quesito, a antropóloga Andressa Morais (2020) demonstra diversas situações 
em que advogadas mulheres, brancas e negras, receberam tratamentos desiguais em razão de 
seugênero, raça, etnia, vestimenta etc. Em geral, elas precisam criar estratégias, 
majoritariamente coletivas, para se fazerem ouvir e exercer sua profissão. Ademais, as 
discriminações são diferentes a depender da cor da pele, local de origem e classe das 
advogadas, denotando como não é possível dissociar os preconceitos de gênero das estruturas 
de opressão de raça e classe. 
Dessa maneira, a ideia de neutralidade também atinge a atuação profissional de 
mulheres nas diversas áreas do direito. Tendo isso em mente, apesar das considerações feitas 
anteriormente acerca da limitação do Direito em modificar a realidade social, é fato que a luta 
por direitos ainda é necessária para o hoje19, razão pela qual os avanços da constituinte 
precisam ser reconhecidos. 
Nesse ponto, a ordem constitucional criada a partir da Constituição Federal (CF/88) 
vigente trouxe um amplo rol de direitos e inaugurou no Brasil um período de retomada da 
democracia e da luta por direitos humanos. Mesmo assim, a partir da sociologia jurídica, 
compreendemos que a vigência de uma lei não importa, necessariamente, na sua efetividade20, 
 
18 Durante a realização dessa pesquisa, são 668.595 pessoas do gênero feminino e 643.516 do gênero masculino 
inscritas na OAB. 
19 Para iniciar a discussão acerca das contradições entre as limitações do Direito burguês e a luta por direitos 
nesse sistema, cf. REVOLUSHOW. Pachukanis: direito e marxismo. Entrevistados: José Luis Alcantara, 
Carla Appollinário, Ana Cecilia Faro Bonan e Carlos Eduardo Martins. Entrevistador: Zamiliano. [S.l]: 
Revolushow, 04 fev. 2019. Podcast. Disponível em: https://revolushow.com/35-pachukanis-direito-e-
marxismo/. Acesso em: 03 ago. 2022. 
20 Compreendemos por efetividade ou eficácia social o cumprimento da norma pela sociedade - seja de maneira 
espontânea, seja porque o Estado exerce ação coercitiva em face do seu descumprimento. (SABADELL, 
2013, p. p. 61). 
33 
de modo que ainda continuaram vigentes, após a constituição, leis violadoras dos direitos das 
mulheres. Por essa razão, escolhemos o período desde a promulgação da CF/88 como marco 
temporal para olhar como as normativas se referiam e se referem às mulheres. 
Frente a isso, cabe começar expondo que a Constituição Federal de 1988 recebeu 
forte influência do movimento de mulheres, que elaboraram a Carta das Mulheres Brasileiras 
aos Constituintes21, envolvendo reivindicações nos âmbitos do trabalho, educação, 
enfrentamento à violência, saúde etc. Tiveram diversas conquistas, notadamente, o artigo 5º, I, 
da CF/88 que assegura a igualdade22 entre homens e mulheres. (PIOVESAN, 2008). Contudo, 
a máxima de igualdade entre homens e mulheres custa a sair do mundo do dever ser, ou ainda, 
a alcançar a ordem infraconstitucional. 
Uma das legislações que continuou em vigor à época da promulgação da CF/88 foi o 
Código Civil de 1916 (CC/16), carregado de parâmetros discriminatórios contra as mulheres. 
Um dos pontos que mais chama a atenção é a restrição dos direitos civis das mulheres 
casadas, as quais eram consideradas “relativamente incapazes” (art. 6º, II). Ademais, o art. 
233, que tratava da sociedade conjugal, conferia ao marido o poder de chefia na relação, de 
modo que também era trazido no art. 242 um rol de atos que a mulher não poderia realizar 
sem a autorização do marido. 
O Código Civil de 1916 também trazia diversos dispositivos que se baseavam nos 
estereótipos de “mulher honesta”, “virgindade” e “inocência” - a título de exemplo, era 
considerado erro essencial sobre a pessoa do cônjuge, e motivo justificado para anulação do 
casamento, “o defloramento da mulher, ignorado pelo marido” (art. 219, IV). Ademais, a 
ofensa à honra da mulher apenas ensejava responsabilidade do agressor se esta fosse “mulher 
honesta” ou “virgem e menor de idade”. Aspecto que também merece ser mencionado desse 
dispositivo é que o agressor poderia reparar o dano casando-se com a mulher que violentou.23 
O CC/16 veio a ter alguns dispositivos alterados ainda em 1962, com a Lei nº 4121, 
 
21 Para ver a carta, cf.: CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA MULHER - CNDM. Carta das 
Mulheres. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/Constituicoes_Brasileiras/constituicao-cidada/a-constituinte-e-as-
mulheres/arquivos/Constituinte%201987-1988-Carta%20das%20Mulheres%20aos%20Constituintes.pdf. 
Acesso em: 29 de nov. 2022. 
22 hooks (2016, p. 112-113) faz uma crítica sobre como o movimento feminista foi corrompido por uma busca 
das mulheres brancas por “igualdade” com os homens. Segundo a estudiosa, o foco do feminismo precisa ser 
o fim da opressão contra as mulheres, e a busca por igualdade é uma briga de poder entre a branquitude para 
que mulheres privilegiadas (brancas, de classe média ou burguesas) possam desfrutar da mesma força de 
dominação que seus pares - homens brancos. 
23 Art. 1.548. A mulher agravada em sua honra tem direito a exigir do ofensor, se este não puder ou não quiser 
reparar o mal pelo casamento, um dote correspondente à condição e estado da ofendida: I. Se, virgem e 
menor, for deflorada.; II. Se, mulher honesta, for violentada, ou aterrada por ameaças.; III. Se for seduzida 
com promessas de casamento. IV. Se for raptada. 
34 
popularmente conhecida como Estatuto da Mulher Casada. Essa lei foi uma conquista de 
mulheres juristas24, e retirou a incapacidade relativa das mulheres casadas, bem como trouxe a 
possibilidade do desquite. Contudo, o poder familiar continuava em função do homem, que 
seria exercido com a ajuda da mulher: “O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que 
exerce com a colaboração da mulher, no interêsse comum do casal e dos filhos” (art. 233, 
caput). 
Ante o exposto, o Código Civil de 1916 trazia um rol de dispositivos que tolhiam a 
autonomia das mulheres, e permaneceu vigente durante a nova ordem constitucional até o ano 
de 2002, quando o Código atual foi publicado. A partir do Código Civil de 2002, as menções 
ao “pátrio poder” e a hierarquia do homem sobre a mulher foram retiradas, contudo, ainda 
permanecem traços dos estereótipos de mulher honesta no código atual. 
Como exemplo, podem ser citados os artigos 1.573, VI, e 1.520, os quais 
mencionam, respectivamente, a conduta desonrosa como razão para a impossibilidade do 
casamento, e a permissão de matrimônio com quem ainda não atingiu a idade núbil para evitar 
punição criminal, ou em casos de gravidez. Quanto a esse último, apenas veio a ser alterado 
em 2019, pela Lei 13.811, e o primeiro segue vigente até o momento de realização desta 
monografia. Acerca desses dispositivos, Pimentel apud Piovesan (2008, p. 16) afirma que: 
 
Sob a aparência de uma neutralidade ideológica quanto ao gênero, a expressão 
“conduta desonrosa” apresenta-se como passível de ser atribuída a ambos os sexos. 
Contudo, tradicionalmente, expressões alusivas à honra e à honestidade, em 
nossa legislação civil, estão carregadas de conotações pejorativas e 
discriminatórias quanto à sexualidade das mulheres. [...] Mantém-se, assim, no 
Novo Código Civil, o tradicional papel destinado à mulher na sociedade: o 
casamento. Essa norma viola o princípio da igualdade e fere a dignidade e os 
direitos humanos das mulheres, ao atribuir ao casamento o caráter reparador da 
violência cometida e, consequentemente, também o de gerador da impunidade. 
(Grifo nosso) 
 
Assim, percebe-se que a legislação civil brasileira, ainda nos dias atuais, está repleta 
de compreensões estereotipadas e que corroboram com a construção de uma mulher 
específica que será protegida pelo Direito. Esse padrão de mulher (honesta, virgem, para 
casar) reflete a imagem construída socialmente sobre a mulher branca, rica, cisheterossexual. 
Davis (2016, p. 18) chama de ideologia da feminilidade a construção sobre o lugar dasmulheres brancas, que data ainda do século XIX, e afirma que as mulheres negras eram 
 
24 Para uma análise das alterações que o Estatuto da Mulher Casada trouxe ao direito brasileiro na época,Cf. 
GAZELE, Catarina Cecin. Estatuto da mulher casada: uma história dos direitos humanos das mulheres no 
brasil. 2005. 194 f. Dissertação (Mestrado) - Centro de Ciências Humanas e Naturais, Universidade Federal 
do Espírito Santo, Vitória, 2005. Disponível em: https://repositorio.ufes.br/handle/10/9246. Acesso em: 29 
nov. 2022. 
35 
alheias a essa ideologia.25 
 Também merece citação o Código Penal de 1940, que ainda é vigente, embora 
tenha passado por várias reformas desde a Constituição Federal de 1988. Este ainda traz em 
seu rol crimes contra o “pátrio poder”, bem como a punição do aborto praticado pela gestante 
ou com seu consentimento. Trazemos a menção à criminalização do aborto como mais um 
exemplo de situação em que a legislação pátria é seletiva quanto à mulher que irá proteger26, 
haja vista que a Pesquisa Nacional do Aborto (DINIZ, MEDEIROS, MADEIRO, 2017), traz 
que 15% das mulheres pretas e 24% das mulheres indígenas já realizaram um aborto, 
contrapostas a 9% das mulheres brancas. Isto é, esse é um fenômeno que atinge 
majoritariamente mulheres atravessas por discriminações de raça e classe.27 
 Desse modo, os indicativos de que a mulher protegida pelo direito brasileiro, 
ainda nos dias atuais, é a mulher branca, rica, heterossexual e monogâmica aparentam que há, 
de fato, um marcador de gênero que repercute no direito. Retoma, portanto, a construção que 
foi feita sobre os sujeitos de direitos: se há uma mulher que consegue acessar certos direitos 
garantidos, essa mulher possui características bem delimitadas.28 
Em face do que foi dito, verifica-se que mesmo a CF/88 sendo um marco importante 
na luta dos direitos humanos de modo geral, e dos direitos das mulheres especificamente, 
permanecem ranços da opressão contra as mulheres na lei escrita e na sua aplicação nos 
tribunais. Em partes, isso se deve porque a alteração de leis nunca trará emancipação. Por 
outro lado, também porque os avanços conquistados, como se tentou brevemente delinear, 
nunca irão se concretizar nas classes mais oprimidas, enquanto nossa referência for esse 
mesmo Direito, que é discurso vazio e se materializa apenas para o homem cishétero, burguês, 
 
25 O discurso “Não sou eu uma mulher?” de Soujouner Truth, feito em uma convenção de mulheres em 1851, 
rebateu os discursos contra o sufrágio feminino que se centravam no estereótipo do sexo frágil. Expondo a 
diferença nas vivências de mulheres brancas e mulheres negras, ela também escancarou o classismo e o 
racismo no movimento de mulheres da época, que se baseava apenas no contexto de vida de mulheres 
brancas da classe média e da burguesia. Cf. em DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. São Paulo: 
Boitempo, 2016. 
26 Assim, acrescenta-se que quando os códigos se referem à maternidade como algo inerente ao ser mulher, por 
si essa também já é uma compreensão que traz violações: corpos não são femininos só porque gestam, e 
corpos masculinos também podem ficar grávidos. 
27 Para um debate mais aprofundado acerca do direito à maternidade e ao aborto, Cf. VILLAS BÔAS, Bianca 
de Figueiredo Melo. Procriar é obrigação e ser mãe não é escolha: crítica feminista, reprodução social e 
contradições entre a criminalização do aborto e a seletividade do direito à maternidade no Brasil. In: 
SIQUEIRA, Mariana de (Org.). Direito, Estado e Feminismos. João Pessoa, PB: Editora Porta, p. 314 – 
358, 2022. 
28 Importante relembrar o que já foi anteriormente dito: não existem mulheres que não sofrem com a opressão 
patriarcal e machista, fato comprovado pelos altos índices de violência contra as mulheres. Contudo, por 
vivermos em um patriarcado de supremacia branca e capitalista, raça e classe social sempre vão ser fatores 
que implicarão em maior exclusão e violações. Cf. HOOKS, bell. Teoria feminista: da Margem ao 
Centro.São Paulo: Perspectiva, 2019. 
36 
cristão, branco (LEITE, 2020, p. 69). 
Essa conclusão é o terceiro aspecto que defendemos fazer parte da interpretação do 
Direito com perspectiva de gênero: é preciso compreender como as desigualdades de gênero 
estão presentes na lógica do fazer jurídico: normas, decisões, doutrinas, para enxergar os ditos 
e não-ditos. Essa compreensão, portanto, exige noções gerais de como os direitos se 
constituem enquanto processos sócio-históricos, além de um olhar para quando, onde e como 
o fato ou aspecto jurídico observado aconteceu. 
Para prosseguirmos ao próximo tópico, cabe reforçar: não acreditamos na conversão 
do Estado e do Direito para serem entes de luta contra o patriarcado e emancipação das 
mulheres. Contudo, entendemos que é necessária a luta por inclusão de direitos nas leis, pois é 
preciso trabalhar com as contradições, pela minimização das dores dos oprimidos. 
 
A positivação de demandas em forma de leis apresenta-se como uma luta que deve 
ser respeitada, mas jamais será emancipação, pois as garantias jurídicas ainda 
operam a partir de universais abstratos, como a percepção universalizante do sujeito 
de direito. (LEITE, 2020, p. 71). 
 
Por essa razão, a importância de trabalhar com a práxis, na perspectiva que Freire 
(2018, p. 167) propõe - movimento de ação e reflexão tendo como finalidade a transformação 
do mundo. Ainda, conforme Leite (2020, p. 140), é necessário saber realizar o equilíbrio e 
interpretar a relação dialética entre as lutas (feministas) e as formas (Estado, Direito, 
Patriarcado). Isto é, não se trata de descartar um caminho ou o outro, mas de reconhecer a 
importância de ambos: cobrar o avanço das legislações em favor dos direitos das mulheres, 
mantendo no horizonte a mudança radical da sociedade. 
 
3.2 Para acabar com a opressão sexista29: gênero, patriarcado e violência contra as 
mulheres 
 
É preciso, neste ponto, definir alguns conceitos-base já citados anteriormente, mas 
que agora merecem uma atenção especial. A definição conceitual faz parte do exercício de 
construção de uma resposta para pensarmos o que são as tais lentes de gênero que defendemos 
que devem ser aplicadas ao Direito. Já estabelecemos alguns pontos, mas essencial é, sem 
dúvidas, compreender então que gênero é esse do qual estamos falando, bem como outras 
categorias indissociáveis ao pensar nas desigualdades de gênero - é o caso do que iremos 
 
29 Esse título faz referência ao capítulo 2 do livro “Teoria Feminista: Da Margem ao Centro”, de bell hooks, o 
qual é originalmente intitulado “Feminismo: um movimento para acabar com a opressão sexista.” 
37 
entender por patriarcado e violência. 
Assim, partimos dos conceitos trazidos por Heleieth Saffioti, socióloga, pioneira nos 
estudos feministas no Brasil a partir de uma ótica marxista. Desse modo, a autora trabalha 
com a ideia de que o gênero é uma categoria sócio-histórica que se relaciona com fatores 
culturais, símbolos, expressões corpóreas, sendo representações construídas da imagem do 
feminino e do masculino. (SAFFIOTI, 2015, p. 45) 
Nesse sentido, gênero é algo que está presente desde o início da história da 
humanidade, e não denota necessariamente uma relação hierárquica. Mesmo assim, os estudos 
acerca desse conceito permitiram uma série de teorizações feministas que vieram demonstrar 
como as ciências são fortemente influenciadas pelo gênero - ou “engendradas” (CAMPOS, 
2015, p. 3). Além disso, é preciso pontuar que essas reflexões dos estudos de gênero permitem 
investigar diversas relações jurídicas que, de alguma forma, tenham relação com 
significados/vivências de gênero, como as reivindicações de direitos da população 
LGBTQIAP+30. 
Nesse quesito, Campos pontua que