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Relacoesentrealtopotencial-Sousa-2022

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
 Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - Departamento de Psicologia 
Programa de Pós-graduação em Psicologia 
 
Priscila Cristine Andrade de Sousa 
 
RELAÇÕES ENTRE ALTO POTENCIAL INTELECTUAL, FUNÇÕES 
EXECUTIVAS E CRIATIVIDADE EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES 
 
 
 
Natal/ RN 
Dezembro/2022 
 
 
 
 
 
Priscila Cristine Andrade de Sousa 
 
 
 
 
 
RELAÇÕES ENTRE ALTO POTENCIAL INTELECTUAL, FUNÇÕES 
EXECUTIVAS E CRIATIVIDADE EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES 
 
Projeto de Tese elaborado sob orientação da Profª 
Drª Izabel Hazin apresentado ao programa de Pós-
Graduação em Psicologia da Universidade Federal 
do Rio Grande do Norte, como requisito parcial a 
obtenção do título de Doutora em Psicologia. 
 
 
Natal 
2022 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Todos os dias eu capto e me surpreendo como 
alguma coisa que ainda não tinha sabido ver. Que 
difícil de fazer é essa catedral! Quanto mais 
avanço, mais me fatiga restituir o que sinto; eu 
me digo que aquele que diz ter terminado uma 
tela é um terrível orgulhoso”. (Monet) 
 
 
 
 
Agradecimentos 
À Deus, que mesmo diante da minha pequena fé, me trouxe à memória o que me dava 
esperança. 
À minha mãe e meu padrasto, por dedicarem tempo e embarcarem comigo em todas as 
aventuras da minha vida. Obrigada pelos abraços, risadas e amor dedicado a mim. Eu os amo 
profundamente. 
A meu companheiro Eduardo, que durante os dias, horas e minutos difíceis me tirava 
sorriso e desafiava a si mesmo para me ajudar no que fosse preciso. Te amo, Du! Você me faz 
feliz. 
À minha vó, Maria Fernandes e minha tia, Rita de Cassia, que nutriram minha infância 
de carinho e simplicidade. Obrigada por me ensinarem a me comunicar com o mundo com 
respeito, alegria e honestidade. 
Às minhas queridas pesquisadoras assistentes e futuras excelentes psicólogas, 
Giovanna, Débora e Glenda que, durante dois anos seguidos, disponibilizaram do amor, tempo, 
eficiência, compromisso, paixão e profissionalismo. Sou eternamente grata por tê-las 
conhecido, espero poder retribuir pelo menos um pouco do que recebi. Jamais as esquecerei! 
À minha orientadora, Profª Drª Izabel Hazin, que desde 2014 me acolheu, acreditou e 
despertou em mim o que nenhuma outra professora conseguiu, a vontade instigante de aprender 
e descobrir. Obrigada professora, pela paciência, generosidade, por me ensinar sobre 
neuropsicologia, mas também sobre ser uma profissional coerente, ética, flexível e criativa. 
À minha (co) orientadora de coração, Drª Laura Aragão, que já me disse trezentas vezes, 
que não leva esse título, pois bem, ela é muito mais que isso, é uma função executiva em formato 
 
 
 
 
de mulher, com um coração do tamanho do universo, inteligentíssima e que me ajudou a 
enfrentar meus medos, aceitar minhas limitações e buscar a superação. Meu imenso 
agradecimento e admiração a você. 
Ao professor Jorge Falcão, um docente ímpar que tem o dom e a técnica de ensinar 
ciência com poesia, filosofia, números e serenidade. Professor, é significativamente agradável 
lhe ouvir. 
Ao meu professor de estatística Mateus Estevam, que com espontaneidade, paciência e 
raciocínio psicológico me auxiliou a compreender os números e dar sentido a eles com cautela 
e segurança. Você foi essencial para que eu pudesse finalizar esta tese de doutorado. 
Às minhas amigas Carol, Cyndi, Lau e Sil, assim, na ordem alfabética, para ser justa 
com cada uma dessas queridas, parceiras e amigas de verdade verdadeira. Carol, obrigada pela 
leveza e simplicidade. Cyndi, obrigada por me fazer rir e olhar para vida assim como olhamos 
para a arte. Lau, obrigada pelo carinho e por desenhar para mim o que é uma irmandade e Sil, 
obrigada por se dedicar com paixão a nossa amizade. 
À minha sogra Marliete, vovó Marlene e Sr. Evalton, pelas orações, cuidado e pelas 
jantas saborosas e gratuitas nos dias de exaustão física. Vocês achavam que estavam me 
nutrindo só de alimento, mas também me nutriram de amor. 
Às queridas, estudantes de psicologia e futuras colegas de profissão, Jaque, Malu e 
Maria Isabel, por disponibilizarem do precioso tempo de vocês e contribuírem com esse estudo 
de doutorado junto com os fofos que compuseram o grupo controle. Meus sinceros 
agradecimentos e admiração pela busca do aprendizado de vocês. Tenho certeza de que cada 
uma irá alçar altos voos. 
 
 
 
 
Aos meus amigos e padrinhos de casamento, Marina, Renan, Kenji e Raquel pelos dias 
de paz, de conversa boa e do compartilhamento dos percalços e sabores da vida. Com vocês eu 
vivo o que foi deixado por nosso senhor Jesus Cristo. 
À Drª Amanda Guerra, que me prestou atenção, tempo e motivação para que eu pudesse 
aprender a aplicar, corrigir e analisar a FEC com destreza. Obrigada por sua generosidade e por 
ensinar, a quem lê o que você escreve, a seriedade de ser um pesquisador em neurociências. 
À minha banca de doutorado, pela paciência, flexibilidade cognitiva avançada e pelas 
contribuições que auxiliará a mim como pesquisadora e aos meus colegas da área, que podem 
fazer deste material uma breve introdução para os seus estudos. 
À Profª Ivana Lucena, que por anos cumpriu seu dever com maestria no Núcleo de 
Atividades de Altas Habilidades/Superdotação do Rio Grande do Norte e, confiou a mim, tantas 
crianças e familiares para participarem deste estudo. 
A todos os membros do Laboratório de Pesquisa e Extensão em Neuropsicologia 
(LAPEN) que me oportunizaram momentos alegres e de profundo aprendizado profissional. 
Em especial, obrigada a Profª Drª Cintia Salgado, Rê, Lu, Mi, Hedy, Hansel e Roberta, que 
sempre estiveram disponíveis para me ajudar, mesmo diante de tantos compromissos 
atribuições e prazos a cumprir. 
Às minhas companheiras de trabalho, Márcia, Edi, Claris, Clarita, Rafa, Marcinha, Dadá 
e Lidi pelo desejo de meu sucesso, pelo cuidado diário com minhas emoções e pela maravilhosa 
companhia no café da manhã e no almoço. Vocês foram essenciais neste último ano de 
doutorado. Muito obrigada! 
 
 
 
 
Por fim, e não menos importante, a cada família e a cada criança/adolescente que 
durante quatro meses, semanalmente, estavam na porta do meu consultório com sorriso no rosto 
e bravura em prol da ciência brasileira. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Resumo 
Os estudos em indivíduos com alto potencial intelectual (API) destacam funcionamento 
intelectual marcado por ativação global e menos segregação do córtex. Portanto, vários autores 
problematizam o impacto de alguns processos cognitivos específicos na determinação da 
inteligência, dentre os quais se destacam, as funções executivas (FE) e a criatividade. O presente 
estudo pretende dar continuidade ao recente estudo desenvolvido por Felinto (2018) que 
evidenciou a sobreposição da criatividade e inteligência na população adolescente e a relação 
entre inteligência e memória de trabalho (MT) em jovens adultos com API. Isto posto, o 
objetivo desse estudo é analisar as relações entre o API, FE e criatividade no público 
infantojuvenil. A tese foi subdividida em três estudos: 1) Capítulo de Livro - Relações 
"Paradoxais” entre Altas Habilidades/Superdotação e Dislexia; 2) A idade como moderadora 
da criatividade em crianças com alto potencial intelectual. 3) Desempenho em MT e 
criatividade em crianças e adolescentes com API. Participaram desse estudo 38 crianças e 
adolescentes, com idades entre 7 e 14 anos de escolas públicas e particulares da cidade de 
Natal/RN. Realizou-se procedimento de avaliação da inteligência, FE e criatividade com os 
participantes através de uma bateria de instrumentos neuropsicológicos e, em seguida, análises 
descritivas e inferenciais foram implementadas. No Estudo 1, foi abordado aspectos clínicos do 
perfil cognitivo assíncrono em crianças com dupla excepcionalidade. No estudo2, as análises 
possibilitaram a compreensão das relações dos aspectos cognitivo e afetivo no desenvolvimento 
da criatividade. No Estudo 3, os resultados apontaram correlações significativas e fortes entre 
inteligência e criatividade, bem como diferença entre os grupos nas variáveis supramencionadas 
e em etapa específica do teste de MT. Diante disso, conclui-se que crianças e adolescentes com 
API apresentam características particulares para as FE e criatividade. 
 
 
 
 
Palavras-chave: alto potencial intelectual; altas habilidades/superdotação; funções executivas; 
criatividade; neuropsicologia; 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Abstract 
Studies in individuals with high intellectual potential (HIP) highlight intellectual functioning 
marked by global activation and less segregation of the cortex. Therefore, several authors 
problematize the impact of some specific cognitive processes in determining intelligence, 
among which, executive functions (EF) and creativity stand out. The present study intends to 
continue the recent study developed by Felinto (2018) that highlighted the overlap of creativity 
and intelligence in the adolescent population and the relationship between intelligence and 
working memory (WM) in young adults with HIP. That said, the aim of this study is to analyze 
the relationships between HIP, EF, and creativity in children and youth audiences. The thesis 
was subdivided into three studies: 1) Book Chapter - "Paradoxical" Relationships between High 
Abilities/Giftdness and Dyslexia; 2) Age as a moderator of creativity in children with HIP. 3) 
Performance in TM and creativity in children and adolescents with HIP. Thirty-eight children 
and adolescents, aged between 7 and 14 years old, from public and private schools in the city 
of Natal/RN participated in this study. An assessment procedure of intelligence, FE, and 
creativity was carried out with the participants through a battery of neuropsychological 
instruments, and then descriptive and inferential analyses were implemented. In Study 1, 
clinical aspects of the asynchronous cognitive profile in children with double exceptionality 
were addressed. In Study 2, the analyses made it possible to understand the relations of the 
cognitive and affective aspects in the development of creativity. In Study 3, the results pointed 
out significant and strong correlations between intelligence and creativity, as well as differences 
between the groups in the variables mentioned above and in specific stages of the MT test. 
Given this, it is concluded that children and adolescents with APIs present particular 
characteristics for FE and creativity. 
 
 
 
 
 
Keywords: high intellectual potential; high abilities/giftdness; executive functions; creativity; 
neuropsychology; 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Lista de Tabelas 
Tabela 1 – Teoria GF-GC de Cattel.........................................................................................35 
Tabela 2 – Representação do conceito CHC............................................................................37 
Tabela 3 – Características dos principais tipos de superdotação.............................................50 
Tabela 4 – Modelo de funções executivas de Flores-Lazaro e Ostrosky Shejet......................58 
Tabela 5 – Distribuição dos participantes no Estudo 2............................................................69 
Tabela 6 – Distribuição dos participantes no Estudo 3............................................................71 
Tabela 7 – Instrumentos utilizados na pesquisa.......................................................................73 
Tabela 8 – Itens avaliados pelo Teste de Criatividade Figural Infantil (TCFI).......................81 
Tabela 9 – Instrumentos utilizados na pesquisa do Estudo 3.................................................134 
Tabela 10 – Análises correlacionais entre inteligência, MT e criatividade entre o G2..........137 
Tabela 11 – Análises correlacionais ente inteligência, memória de trabalho e criatividade figural 
no G2 (adolescentes)...............................................................................................................138 
Tabela 12 – Coeficientes de correlação entre os escores de inteligência, memória de trabalho 
verbal e criatividade figural para o GP..................................................................................139 
Tabela 13 – Análise descritiva (média e desvio padrão) e comparativa (U de Mann Whitney) 
entre G1 e G2 no Subteste Dígitos (DOD, DOI e DT...........................................................141 
 
 
 
 
 
 
 
 
Lista de Figuras 
Figura 1 - Representação do conceito de Altas habilidades/Superdotação – Modelo dos Três 
Anéis ......................................................................................................................................... 46 
Figura 2 - Representação do Modelo Estrela de Dotação e Talento ........................................ 49 
Figura 3 - Capa e editorial do livro Dupla Excepcionalidade .. Erro! Indicador não definido. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Lista de Siglas 
2E: Twice Exceptionality ou Dupla Excepcionalidade 
A3: Desempenho matemático 
A5: Desempenho em geografia 
API: Alto Potencial Intelectual 
AH/SD: Altas Habilidades/Superdotação. 
CHC: Cattell-Horn-Carroll. 
CDS: Rapidez para decisão correta 
DMGT: Differentiated Model of Giftedness and Talent 
DP: desvio-padrão. 
EU: Conhecimento do uso da língua nativa 
FE: funções executivas. 
Fator g: inteligência geral. 
Ga: Processamento auditivo 
Gai: Índice de capacidade geral 
GC: grupo controle. 
GE: grupo de estudo. 
Gc: inteligência cristalizada. 
Glr: Memória de longo prazo 
 
 
 
 
Gf: Inteligência fluida. 
Gq: Conhecimento quantitativo 
Grw: Leitura escrita 
Gs: Velocidade de processamento 
Gsm: Memória de curto prazo 
Gv: Processamento Visual 
g-VPR: Verbal perceptual Image Rotation 
Km: Conhecimento Matemático 
K0: Conhecimento geral 
K1: Informação sobre ciência 
K2: Informação sobre a cultura 
k:m: Habilidades psicomotoras perceptuais espaciais e mecânicas 
LAPEN: Laboratório de Pesquisa e Extensão em Neuropsicologia. 
MO: memória operacional. 
p: nível de significância estatística. 
PC: percentil. 
QI: quociente de inteligência. 
RA: resultado padronizado. 
RCLE: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. 
 
 
 
 
TCFI: Teste de Criatividade Figural Infantil. 
TDMM: Mega Model Talent Development 
TI: Tecnologia da Informação. 
Torrance: Teste de Pensamento Criativo de Torrance. 
UFRN: Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
v:ed: Habilidades verbais e numéricas 
WAIS-III: Wechsler Adult Intelligence Scale. 
WISC-IV: Wechsler Intelligence for Children 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sumário 
Agradecimentos 12 
Resumo 16 
Abstract 18 
Lista de Tabelas 20 
Lista de Figuras 21 
1. Considerações Iniciais 28 
2. Breve revisão das teorias sobre a inteligência 36 
3. Alto Potencial Intelectual e Altas Habilidades/Superdotação: São Sinônimos? 44 
o Altas Habilidades/Superdotação - Modelos Teóricos .................................................. 46 
o Identificação e Caracterização do Alto Potencial Intelectual ..................................... 52 
4. Inteligência, Funções Executivas & Criatividade 56 
o Modelos de Funções Executivas .................................................................................. 58 
o Modelos de Criatividade .............................................................................................. 64 
o Modelos Sistêmicos de Criatividade ............................................................................ 64 
o Modelos Cognitivos de Criatividade ............................................................................ 65 
o Proposta Histórico-Culturalde Criatividade .............................................................. 66 
o Funções Executivas, Criatividade & Alto Potencial Intelectual .................................. 67 
 
 
 
 
5. Objetivo Geral 70 
Objetivos Específicos ........................................................................................................... 70 
6. Método 71 
o Desenhos dos Estudos .................................................................................................. 71 
o Participantes ................................................................................................................ 72 
o Operacionalização ....................................................................................................... 75 
o Instrumentos ................................................................................................................. 77 
7. Procedimentos de Discussão e Análise de Dados 84 
8. Estudo 1 – Capítulo de Livro Publicado 85 
9. Estudo 2 – A idade como moderadora da criatividade em crianças com alto 
potencial intelectual 107 
o Objetivos ..................................................................................................................... 114 
o Método ........................................................................................................................ 114 
Participantes ...................................................................................................................... 114 
Instrumentos ...................................................................................................................... 114 
Procedimento de coleta de dados ...................................................................................... 115 
o Análise de Dados ........................................................................................................ 115 
o Resultados .................................................................................................................. 116 
o Discussão ................................................................................................................... 124 
 
 
 
 
10. Estudo 3 - Memória de trabalho verbal e criatividade figural em crianças e 
adolescentes com alto potencial intelectual 128 
o Objetivos ..................................................................................................................... 135 
Objetivos Específicos ......................................................................................................... 135 
o Método ........................................................................................................................ 135 
Participantes ...................................................................................................................... 135 
Instrumentos ...................................................................................................................... 137 
Procedimento de coleta de dados ...................................................................................... 138 
o Análise de dados ......................................................................................................... 138 
o Resultados .................................................................................................................. 139 
o Discussão ................................................................................................................... 144 
11. Considerações Finais 152 
12. Referências 154 
APÊNDICE I 191 
APÊNDICE II 197 
 
 
 
1. Considerações Iniciais 
A psicologia produziu construtos considerados clássicos, estes possuem uma longa 
história e raízes que comumente remontam à filosofia. Dentre estes a inteligência é um dos mais 
controversos, com contribuições oriundas de diferentes paradigmas, o que implica em distintas 
definições, explicações e métodos de investigação e avaliação. 
Dentre os esforços de organização das teorias psicológicas sobre inteligência, destacam-
se aqui três contribuições. A primeira oriunda de Case (1974) que organiza as teorias sobre 
inteligência em três grandes grupos. O primeiro tem sua base filosófica no empirismo britânico 
e está subjacente à perspectiva comportamental e ao método psicométrico de avaliação. O 
segundo grupo tem sua base no racionalismo e encontram na psicologia representantes como 
Piaget e Chomsky. Por fim, o terceiro grupo é representado pelas teorias psicológicas de base 
histórica e social, influenciando autores como Vigotski (Case, 1974). 
O segundo esforço de categorização da produção psicológica agrupa as teorias de 
inteligência em três grandes abordagens: fatorial ou psicométrica, desenvolvimentista e 
cognitiva. As teorias fatoriais têm como foco o produto, ou seja, o resultado obtido em testes 
psicométricos. Para estes autores, a inteligência pode ser definida como um fator geral, um 
conjunto de fatores específicos, ou ainda, como uma multiplicidade de fatores. As teorias 
desenvolvimentistas adotam um modelo mais dinâmico e têm como foco de interesse as 
estruturas ou esquemas mentais de funcionamento. Por fim, as teorias cognitivistas centram 
esforços na compreensão e caracterização dos processos subjacentes à cognição (Primi, 2002). 
A terceira formatação para categorizar as teorias acerca da inteligência agrupa as 
proposições em dois grandes domínios, a saber, o das teorias explícitas e o das teorias 
implícitas. O primeiro domínio, o das teorias explícitas, engloba as teorias 
fatoriais/psicométricas e cognitivas. As teorias fatoriais têm como objetivo estabelecer 
diferenças individuais entre os sujeitos com base em suas capacidades para raciocinar, recordar, 
29 
 
 
dentre outros fatores. A mensuração da inteligência, ou o desempenho em provas que avaliam 
os fatores, é feita através da aplicação de provas psicométricas. Por sua vez, as teorias cognitivas 
consideram a inteligência como um processo de resolução de problemas. A conduta inteligente 
humana é compreendida como a resultante da combinação de processos elementares de 
informação (Solovieva, 2022). Convém destacar que as teorias explícitas são construções de 
psicólogos ou outros cientistas que se baseiam em dados coletados de pessoas que executaram 
tarefas que presumivelmente medem o funcionamento psicológico (Sternberg, 1985). 
Destaca-se que, apesar das controvérsias, o teste de inteligência psicométrica obteve boa 
aceitação enquanto definição operacional da inteligência. Porém, despontam outras teorias, as 
denominadas implícitas, que podem fornecer uma estrutura conceitual para o surgimento de 
novas teorias explícitas. Tais teorias ressaltam a importância do meio social e das diferenças 
socioculturais, destacando a necessidade de investigar a inteligência no contexto da vida 
cotidiana (Solovieva, 2022). Isso porque estas são visões culturais comuns que dominam 
construções psicológicas, permitem dar significados ao fenômeno da inteligência, baseadas 
fundamentalmente nas crenças pessoais de pessoas ou teóricos (Goméz & Molina, 2006). 
Compreender as teorias implícitas pode ajudar a entender ou fornecer bases para teorias 
explícitas, porque as teorias explícitas derivam, em parte, de teorias implícitas dos cientistas 
(Sternberg, 1985). 
Partindo-se das teorias explícitas, é possível afirmar que a medição da inteligência 
humana foi uma conquista histórica da psicologia, mas com um alto preço a pagar, notadamente 
em termos dos usos históricos, com destaque para a manipulação por parte de vertentes nazistas, 
bem como pela criação de “guetos” ilustrados pelos extremos da curva normal. Deficientes 
intelectuais e pessoas com alto potencial intelectual1 (API) são resultantes da medição que 
 
1 Termo definido pela primeira vez por Terman (1925) como característico de crianças com um QI acima da média. 
30 
 
 
estabiliza a noção de inteligência e a dissemina,contaminando o discurso de escolas e empresas 
(Porter, 2009). 
Entretanto, é preciso ressaltar que estes dois extremos das curvas não podem ser 
considerados antípodas, em cada um deles convivem forças e fraquezas, dialética característica 
da condição humana. O alto potencial convive com fragilidades, os talentos podem coexistir 
com deficiências, como no caso da dupla-excepcionalidade, quando o API vem acompanhado 
de transtornos diversos, tais como a dislexia. A plena expressão de um talento emergente ou 
déficit é um produto de fatores internos e externos, o que leva autores a denominar esta condição 
de patologia da superioridade (Nadia, 2011). 
Nesta mesma direção, o verbete genialidade, escrito por Vigotski, nas colunas 612 a 
614, do Tomo VI, na Grande Enciclopédia de Medicina, editado pela Cia. Enciclopédia 
Soviética, em 1929, afirma que "o gênio é uma variante em evolução progressiva da tipologia 
humana. Sua divergência em relação ao tipo normal o afilia à doença, mas esta é uma 
divergência superlativa, isto é, um desvio para outro lado, e de natureza diversa da natureza da 
degenerescência. Do ponto de vista científico, a genialidade deve ser analisada como uma 
variação extrema da tipologia humana, e assim sendo, todas as pessoas geniais devem obedecer 
às leis de variação referentes a este tipo” (Vigotski, 1929). 
No outro extremo, a síndrome de Savant é uma condição na qual pessoas com 
deficiência intelectual, incluindo transtorno autista, têm alguma “ilha de genialidade” que se 
destaca em contraste marcante e incongruente com a deficiência geral (Treffert, 2009). 
Dentre as críticas direcionadas aos instrumentos utilizados para avaliação e proposição 
da inteligência, está a ausência na consideração de aspectos como funcionalidade, 
criatividade, habilidades artísticas e socioemocionais (Yates et al, 2014). Apesar disso, 
convém destacar que, o uso ou desuso de testes de desempenho estreitam caminhos de análise 
e intervenção, já que as medidas psicométricas de investigação do funcionamento cognitivo 
31 
 
 
também fornecem dados neuropsicológicos e podem ampliar a compreensão e a explicitação 
de dificuldades escolares e escolhas sociais (Hazin et al, 2009; Nakano, Campos & Santos, 
2016; Yates et al, 2014). 
Sabe-se que a inteligência é alicerçada por ampla rede neuronal na qual as áreas frontal 
e parietal desempenham função primordial (Jung & Haier, 2007) e, se tratando do 
funcionamento em indivíduos com API, os estudos destacam funcionamento marcado por 
ativação global e menos segregação do córtex (Jin et al., 2006; Lee et al., 2006; Solé-Casals 
et al.,2019). Portanto, vários autores problematizam o impacto de alguns processos cognitivos 
específicos na determinação do comportamento inteligente, dentre os quais se destacam, 
significativamente, as denominadas funções executivas (FE) e a criatividade (García-Molina 
et al., 2010; Lépine, Barrouillet, & Camos, 2005; Montero-Linares, 2013; Nakano, Campos 
& Santos, 2017; Montero-Linares, Navarro-Guzmán & Aguilar-Villagrán, 2013;). 
Funções executivas e criatividade são outros dois construtos que integram a agenda da 
psicologia. O primeiro caracterizado com um conjunto de processos de controle que regulam 
os pensamentos e comportamentos de uma pessoa (Miyake & Friedman, 2013), sendo 
essenciais para que o sujeito possa navegar com sucesso em quase todas as nossas atividades 
diárias (Snyder, Miyake & Hankin, 2015). 
Por sua vez, o construto criatividade não adquire o mesmo consenso que as funções 
executivas, é um tema tão vasto que foi discutido por teorias clássicas e contemporâneas. Para 
Kaufman & Glăveanu (2021) existe um consenso razoável em relação à definição de 
criatividade, seria algo novo e apropriado para a tarefa. Para os autores, existem muitos outros 
componentes possíveis para essa definição, como alta qualidade, surpresa, estética, 
autenticidade e a criação de um produto. 
Durante os últimos anos, verifica-se aumento dos estudos que se propõem a investigar 
como se relacionam as FE e as capacidades intelectuais, como: raciocínio, pensamento e 
32 
 
 
resolução de problemas (Diamond, 2013; Friedman & Miyake, 2017). As FE são 
predominantemente associadas ao córtex pré-frontal e às suas múltiplas conexões subcorticais 
que guiam os processos cognitivos relacionados à iniciação voluntária ou inibição de 
comportamento (Friedman & Miyake, 2017). Esses fatores aproximam-se do conceito de 
inteligência fluida, quando a compreendemos como a capacidade de resolver problemas e 
analisar padrões e relações partindo do raciocínio lógico, indutivo e dedutivo (Diamond, 
2013). 
De modo geral, a literatura que contempla a relação entre inteligência e FE não detêm 
consenso. Pesquisas com grupos clínicos e não clínicos, destacam que lesões frontais não 
necessariamente comprometem o QI (Milner, 1982; Damásio & Anderson, 1993). 
Em estudo de revisão, Fiamoncine e Satler (2021) evidenciaram que a memória de 
trabalho (MT) se mostrou o principal componente das FE associado à inteligência fluida em 
crianças, adolescentes e adultos. Contudo, também destacaram que as habilidades intelectuais 
estariam associadas em menor grau às FE na população infantil, quando comparado à 
adolescentes. Esse dado torna-se ainda mais interessante à medida que é compreendido à luz 
do processo do desenvolvimento das funções psicológicas superiores, visto que as FE se 
desenvolvem em maior intensidade entre o sexto e oitavo ano de vida e atingem um platô em 
torno da segunda década de vida (Diamond, 2013). 
No que tange a relação desses fenômenos na população de API, a literatura destaca o 
uso eficiente e precoce das FE em crianças, notadamente a capacidade para analisar 
informações de modo a favorecer a plasticidade neuronal (Dai, Müller, Wang, & Deoni, 2018; 
Fiske & Holmboe, 2019; Goriounova & Mansvelder, 2019; Sastre-Riba & Viana-Sanz, 2016; 
Solé-Casals et al. 2019). Adicionalmente, em estudo de meta-análise, Rodríguez-Navieras et 
al (2019) evidenciaram que a MT é considerada a única variável das FE que expressa forte 
correlação com a capacidade intelectual em crianças e adolescentes com API. 
33 
 
 
Esse dado corrobora o recente achado de Rocha, Almeida e Perales (2020) que 
sinalizou desempenho acima do esperado de crianças e adolescentes com API em tarefas de 
MT e em funções de raciocínio e solução de problemas. Entretanto, o mesmo estudo indicou 
que essa relação se mostrou limítrofe para a flexibilidade cognitiva e, ausente, quando 
correlacionado a atividades de controle inibitório e planejamento, não sendo identificada 
diferença de desempenho entre o grupo de sujeitos com API e típicos. Em contrapartida, 
Luque Rojas et al (2021) encontraram correlações positivas entre desempenho em testes que 
avaliam o QI e comportamentos associados à inibição (trabalho de guia, autonomia, controle 
de impulso, hábitos, habilidades e estratégias de trabalho intelectual na classe). 
De modo semelhante, a relação entre inteligência e criatividade já foi investigada e 
sugere o compartilhamento de aspectos cognitivos comuns, no entanto, é ainda tema 
controverso no campo da Psicologia. As investigações são predominantemente caracterizadas 
pela busca da existência e magnitude dessa associação em fases distintas da vida e em 
diferentes populações (Elisondo & Donolo, 2010). Nas concepções mais atuais, a criatividade 
tem sido definida como a interação entre aptidão, processo e ambiente, por meio da qual um 
indivíduo produz algo original para o seu contexto social (Plucker, Beghetto & Dow, 2004). 
De modo geral, a literatura atual defende que o valor da correlação existente entre 
inteligência e criatividade é influenciado por qual fator de inteligência é avaliado e o perfil 
intelectual dos indivíduos e, destacam, fortes correlações da criatividade com a inteligência 
fluida e fracas associações com a inteligência cristalizada(Kaufman, Luria, & Beghetto, 2018; 
Miroshnik & Scherbakova, 2019; Nakano, 2018). 
Nessa direção, com o propósito de ampliar a compreensão e intervenção necessárias 
às pessoas com API a literatura científica tem evidenciado a importância de se considerar a 
inter-relação dos achados não cognitivos (aspectos socioemocionais, afetivos regulação de 
estados emocionais e sentimentos sobre si mesmo e sobre os outros), bem como cognitivos e 
34 
 
 
histórico-culturais haja vista a abrangência no processo de identificação e oportunidades de 
desenvolvimento (Neihart & Yeo, 2018; Stoeger et al., 2018). 
Posto isso, e diante da contribuição oportuna de novas evidências neurocientíficas 
acerca da organização e do funcionamento cerebral de pessoas com API e, consequentemente, 
a promoção de caminhos de desenvolvimento e cuidado, surgiram as questões norteadoras do 
presente estudo, ainda em tempos que atuei como voluntária em estudos de mestrado e 
doutorado no Laboratório e Pesquisa e Extensão em Neuropsicologia (LAPEN-UFRN) no ano 
de 2013. No entanto, foi ao final de 2013 que o desafio de principiar estudo sobre a temática 
me foi apresentada e, entre os anos de 2014-2016, desenvolvi pesquisa de mestrado junto ao 
Programa de Pós-graduação em Psicologia da UFRN, com dissertação intitulada “Relações 
entre inteligência e funções executivas em crianças com altas habilidades/superdotação”, 
cujos resultados foram publicados em artigo científico (Andrade et al, 2017). 
Ainda no ano de 2015, pude compor o grupo de voluntários psicólogos do primeiro 
Curso de Inverno do Programa Talento Metrópole, realizado pelo Instituto Metrópole Digital 
da UFRN. O projeto voltava-se para a identificação e enriquecimento de jovens com AH/S no 
domínio da Tecnologia da Informação (Hazin et al, 2015). 
Com intuito de aprofundar os achados da dissertação de mestrado em 2014, ingressei 
no doutorado em 2018, tendo como foco caracterizar o perfil neuropsicológico de crianças 
com AH/S nas áreas acadêmico e produtivo criativo. Entretanto, tal objetivo foi sendo 
modificado a partir das necessidades analisadas durante o curso de revisão do estado da arte. 
O presente trabalho foi atravessado pela pandemia da COVID-19 e seus 
desdobramentos no que tange às medidas de isolamento, inviabilizando a coleta no período 
inicialmente programado. Nessa direção, a presente pesquisa demandou ser reestruturada e, 
seguindo as regras estabelecidas pelos órgãos de saúde, a coleta de dados foi realizada no 
segundo semestre de 2021 e primeiro semestre de 2022. Toda coleta de dados exige esforços 
35 
 
 
e nesse estudo foi marcada pelo período pandêmico, impactando sobremaneira o cronograma 
para construção da tese. 
Destaca-se que o presente estudo, que se propõe a investigar a relação dos construtos 
FE e criatividade em pessoas com API no LAPEN/UFRN, é uma ampliação da pesquisa 
inicialmente desenvolvida por Felinto (2018) que apresentou resultados estatisticamente 
significativos para a relação entre inteligência e memória de trabalho e identificou a 
sobreposição da criatividade e inteligência na população adolescente e jovem adulto. Nessa 
mesma linha de produção de conhecimento e, na tentativa de ampliar a compreensão acerca 
desse fenômeno, adotou-se como ponto de partida investigar se tais relações são semelhantes 
no público infantil com API e como os achados podem contribuir para a análise do perfil de 
sujeitos com alto potencial. 
Ademais, espera-se que os dados provenientes deste trabalho se somem a outros 
desenvolvidos pelo LAPEN/UFRN, de modo a aprimorar as pesquisas desenvolvidas e que 
estão por vir, considerando as evidências científicas e as considerações clínicas dessa 
população. Espera-se igualmente que os subsídios produzidos contribuam com a prática de 
pesquisadores e clínicos das áreas da educação e saúde. Por fim, considera-se que pesquisas 
dessa natureza contribuem para suporte no atendimento das necessidades educacionais 
especiais, conforme previsto pela Lei Nacional nº. 13.234/2015 (Brasil, 2015). 
 
 
 
 
 
36 
 
 
2. Breve revisão das teorias sobre a inteligência 
A apreciação do campo da inteligência e o seu futuro, exige o conhecimento acerca da 
história científica. Os estudos da inteligência, a partir da psicometria, tem como bojo teórico 
e metodológico a descrição empírica de construtos da arquitetura intelectual mediante testes 
de desempenho. As pesquisas associadas a essa empreitada tinham e têm como característica 
a correlação de fatores das funções cognitivas. No entanto, diante da complexidade inerente 
ao funcionamento do córtex cerebral, as perspectivas teóricas de inteligência ainda se dividem 
sobretudo em duas direções: a) inteligência como único fator e b) inteligência composta por 
variadas aptidões ou habilidades (Almeida, et al 2008; Laros et al, 2014). 
Francis Galton (1822-1911), influenciado pelo primo Charles Darwin, inaugura a 
investigação das funções cognitivas mediante a dissociação entre a herança genética e a 
experiência individual. Assim, em 1869, Galton publica o livro “Hereditary Genius” em que 
advoga às diferenças e aproximações entre os sujeitos, o que, futuramente, seria chamado de 
“distribuição normal de inteligência” (Flores-Mendonza & Saraiva, 2018). Pode-se destacar 
que o enfoque nas funções perceptivas e sensoriais na atividade intelectual defendida por 
Galton é considerado ultrapassado por alguns, mas fundamentado por pesquisadores 
britânicos de abordagem biológica e experimental (Silva, 2003). 
Embora os estudos da inteligência humana fossem foco de investigação por vários 
cientistas nos diversos lugares do mundo, Charles Spearman (1863-1945) destaca-se como 
um dos pioneiros e mais influentes dos achados quantitativos da inteligência. A ideia central 
do conceito de Spearman era voltada para a capacidade de um indivíduo em perceber e aplicar 
relações, fundamentando o desenvolvimento dessa função cognitiva em três processos 
básicos: a) Apreensão das experiências – capacidade de percepção, rapidez de percepção dos 
estímulos; b) Edução – capacidade de estabelecer relação entre duas ideias sejam elas da 
37 
 
 
percepção ou de aspectos mnêmicos e C) Edução - criação de novas ideias a partir de outra 
(Spearman, 1904; 1927). 
Ao passo que a concepção e medição da inteligência era alvo de investigações e 
recebia críticas por uma visão psicofísica, ou seja, centrada nas funções sensoriais e motoras, 
foi, em 1905, que Binet e Simon estrearam uma bateria de trinta testes cognitivos em busca 
de respostas ao fracasso escolar de crianças francesas. O teste criado propunha dimensionar 
habilidades verbais e lógicas e foi traduzida e adaptada rigorosamente por Lewis Terman, que 
passou a estudar de modo longitudinal a capacidade intelectual de crianças californianas. 
Nesse percurso, Terman (1877-1956) proporcionou a identificação de crianças que 
apresentavam escores acima da média comparada a idade (Virgolim & Konkiewitz, 2014). 
Em contrapartida a teoria do fator “g” de Spearman, Louis L. Thurstone (1938) 
apresenta para a comunidade científica um modelo de concepção de inteligência reconhecida 
como “teoria das capacidades mentais primárias”. Para Thurstone, a capacidade intelectual 
era mais bem compreendida por habilidades mentais diversas e independentes entre si e não 
somente por um único fator, assim é conhecido por dividir essas habilidades em fatores: a 
compreensão verbal (V); a fluência verbal (W); a aptidão numérica (N); a aptidão espacial 
(S), as habilidades de memória (M), a velocidade perceptiva (P) e o raciocínio (R) (Thurstone, 
1945). 
 Não obstante, as concepções polarizadas expandiram para um modelo integrado e 
hierárquico. Raymond Cattell e John Horn (1941; 1971; 1991;) principiaram os conceitos de 
inteligência fluida (Gf) e inteligência cristalizada (Gc). A Gf compreende habilidades de 
raciocínio abstrato ede resolução de problemas novos, neurologicamente influenciada, para 
os quais o indivíduo tem pouco conhecimento precedente. 
Nessa direção, a Gf está comumente associada ao raciocínio indutivo e dedutivo, a 
funções cognitivas não verbais, é responsável por operar em tarefas que exigem: a formação 
38 
 
 
e o reconhecimento de conceitos, a identificação de relações complexas, a compreensão de 
implicações e a realização de inferências e sofre baixa influência de conhecimentos adquiridos 
(Carroll, 1993; Cattell, 1987; Keith & Reynolds, 2010). Por conseguinte, interferências 
orgânicas (ex.: lesões cerebrais, problemas decorrentes da má nutrição) impactam em maior 
magnitude a Gf em detrimento da Gc (Brody, 1992). 
Em contrapartida, a Gc representa habilidades requisitadas na solução da maioria dos 
complexos problemas do cotidiano, sendo identificada como “inteligência social” ou “senso 
comum”, refere-se então à obtenção e cristalização de conhecimentos formais e informais 
assimilados por construção histórico-cultural (Cattell, 1971; Horn, 1991). Devido as estreitas 
relações com às experiências culturais do indivíduo, a Gc tende a evoluir com o avanço da 
idade, diferentemente da Gf, que devido à gradual degeneração das estruturas fisiológicas, 
tende a declinar após a segunda década de vida (Brody, 2000; Cattell, 1998; Horn & Noll, 
1997; Sattler, 2001). 
É importante destacar que após a evidência acerca do Gf-Gc, John Horn (1965) 
expandiu o modelo proposto inicialmente por Cattel, o autor incorporou ao sistema Gf-Gc 
quatro capacidades cognitivas: Processamento Visual (Gv – Visual Processing), Memória a 
Curto Prazo (Gsm – Short Term Memory), Armazenamento e Recuperação a Longo Prazo 
(Glr – Long-Term Storage and Retrieval) e Gs (Speed of Processing), representando a 
Velocidade de Processamento (McGrew & Flanagan, 1998). 
Ademais, duas capacidades foram adicionadas às quatro anteriores: a Rapidez para a 
Decisão Correta (CDS – Correct Decision Speed) (Horn, Donaldson & Engstrom, 1981) e a 
de Processamento Auditivo (Ga – Auditory Processing Ability) (Horn & Stankov, 1982). 
Seguidamente, novos achados do autor, como a identificação do fator Gq (Quantitative 
Knowledge), associado ao Conhecimento Quantitativo (Horn, 1985) e do Grw (Reading & 
39 
 
 
Writing), relacionado à Leitura-Escrita, estruturou novo modelo, formado por dez 
capacidades (Tabela 1). 
Tabela 1 
Teoria GF-GC de Cattel 
Fator e Símbolo Descrição 
Inteligência 
Fluida (Gf) 
Definido como a capacidade para raciocinar em situações novas ou 
inesperadas, sendo manifestado na reorganização, transformação e 
generalização da informação. As deficiências neste fator se 
caracterizam pela dificuldade em generalizar regras, formar 
conceitos e observar implicações. 
Inteligência 
Cristalizada (Gc) 
Representa a profundidade e quantidade de experiência e 
conhecimentos adquiridos. Inclui a compreensão da comunicação e 
tipos de raciocínios baseados em processos previamente aprendidos. 
Gc não é sinônimo de aproveitamento escolar. As deficiências neste 
fator se caracterizam pela carência de informações, de habilidades 
linguísticas e dificuldade em processar conhecimentos. 
Processamento 
Visual (Gv) 
Envolve a habilidade para sintetizar estímulos visuais. As 
deficiências neste fator podem ser caracterizadas por dificuldades: 
na orientação espacial, na percepção da relação objeto-espaço, em 
compreender mapas. 
Processamento 
Auditivo (Ga) 
Envolve a compreensão e síntese da configuração auditiva, 
excluindo-se a compreensão da linguagem, representada por Gc. 
Esta capacidade cognitiva é fundamental para a realização de 
atividades envolvendo música e para o desenvolvimento da 
linguagem. A deficiência neste fator pode ser caracterizada por 
dificuldades em discriminar sons. 
Velocidade de 
Processamento 
(Gs) 
Está relacionado à capacidade de realizar rapidamente tarefas 
comuns em um limite de tempo. A deficiência neste fator pode ser 
representada pela lentidão em executar tarefas cognitivas de pouca 
dificuldade. 
40 
 
 
Memória de Curto 
Prazo (Gsm) 
Envolve a apreensão e uso da informação em um curto período. A 
deficiência neste fator é caracterizada pela dificuldade em recordar 
uma informação recém adquirida. 
Memória de 
Longo Prazo (Glr) 
Implica no armazenamento e recuperação da informação. As 
deficiências neste fator estão relacionadas à dificuldade de recordar 
informações importantes e em aprender e recordar nomes. 
Conhecimento 
Quantitativo (Gq) 
Relacionado à compreensão de conceitos e relações quantitativas, 
bem como à manipulação de símbolos numéricos. A deficiência 
neste fator é refletida na dificuldade em tarefas numéricas. 
Rapidez para 
Decisão Correta 
(CDS) 
Definida como a rapidez em fornecer respostas corretas em 
problemas de compreensão e raciocínio. 
Leitura-Escrita 
(Grw) 
Relacionada às habilidades básicas de leitura e escrita utilizadas na 
compreensão da linguagem escrita e na expressão de pensamentos 
pelo ato de escrever. 
Nota. Fonte: Adaptado de Schelini (2006) 
Constata-se que os avanços para compreensão do que viria a ser a inteligência 
apresentam como característica a redescobertas a partir do que já havia sido desbravado por 
pesquisadores passados. Nessa direção, em 1993, John Carrol reuniu estudos dos anos 50 e 
60 e propôs um modelo hierárquico, que chamou de teoria dos três estratos ou camadas. 
Posto isso, a tese de Carrol (1993) era da existência de habilidades amplas, divididas 
em três diferentes camadas ou estratos. A teoria requereu que no estrato mais alto (III) está 
um fator geral (g). O segundo estrato (II) é responsável por influenciar vários aspectos 
comportamentais e é composto por oito fatores gerais (ex: inteligência fluida, cristalizada, 
memória e aprendizagem, percepção visual, percepção auditiva, capacidade de recuperação, 
rapidez cognitiva e velocidade do processamento) e o primeiro estrato (I) formado por 60 
fatores específicos de primeira ordem que, representam especializações do segundo estrato 
(II). 
41 
 
 
Apesar das diferenças entre os modelos de Carroll e Horn-Cattell, a saber: a) o fator 
(g) como subjacente ou não a todos outros fatores; b) o Conhecimento Quantitativo (Gq) e a 
Leitura-Escrita (Grw) como uma capacidade específica ou geral (Sheline, 2006). Os 
contemporâneos, psicólogos educacionais, Kevin McGrew e Dawn Flanagan (1997) 
integraram os conceitos à aplicabilidade, apresentando o modelo Carroll, Cattel e Horn (CHC) 
de inteligência que hoje pode ser considerado o conceito mais bem aceito entre os estudiosos 
da inteligência (Flanagan & McGrew, 1997). 
No modelo de integração (CHC), Mc Grew e Flanagan mantiveram as dez capacidades 
gerais de Horn-Cattell, relacionando a elas grande parte das capacidades específicas do estrato 
I, proposta por Carroll, e justificaram a exclusão de um fator geral do modelo, devido à 
ausência de aplicabilidade ao conceito e não por negarem a existência dele. No entanto, alguns 
fatores específicos, apesar de não citados por Carroll (1993), foram incluídos no estrato I, 
como: Conhecimento Matemático (KM – Mathematical Knowledge), Desempenho 
Matemático (A3 – Mathematical Achievement), Informação Geral (K0 – General 
Information), Informação sobre a Cultura (K2 – Information about Culture), Informação sobre 
Ciência (K1 – General Science Information), Desempenho em Geografia (A5 – Geography 
Achievement) e Conhecimento do Uso da Língua Nativa (EU – English Usage Knowledge) 
(Tabela 2). 
Tabela 2 
Representação do conceito CHC 
Fator e Símbolo do 
Estrato II 
Descrição 
Inteligência Fluida (Gf) Envolve a capacidade de relacionar ideias, compreender 
implicações, extrapolação e reorganização de informações. 
Inteligência Cristalizada 
(Gc) 
Representa a aquisição de conhecimentos de uma 
determinada cultura e o uso ou aplicação desses42 
 
 
conhecimentos para solucionar problemas cotidianos. 
Fortemente dependente da linguagem. 
Processamento Visual 
(Gv) 
Habilidade de gerar, perceber, armazenar, analisar, e 
transformar imagens visuais, ou seja, manipulação mental de 
estímulos visuais ou imagens. 
Processamento Auditivo 
(Ga) e (Gu) 
Habilidade associada à percepção e análise de estímulos e 
padrões sonoros. Capacidade de discriminar estes estímulos 
sonoros quando são apresentados em contextos mais 
complexos (com ruído, por exemplo) 
Velocidade de 
Processamento (Gs) 
Habilidade de realizar tarefas simples e automatizadas de 
forma rápida. Está geralmente ligado a tarefas em que há um 
tempo definido para que a pessoa execute o maior número 
possível de tarefas simples e repetitivas. 
Memória de Curto Prazo 
e/ou Aprendizagem (Gsm 
ou Gy) 
Habilidade de retenção de informação e recuperação delas 
em um período de curto espaço de tempo. 
Memória de Longo Prazo 
(Glr), (Gr) 
Habilidade de retenção de informação e recuperação delas 
num período mais longo de tempo. Relacionada a memória 
de longo prazo, em que a informação depende de associação 
a algo para ser recordada. 
Conhecimento 
Quantitativo (Gq) 
Representa a aquisição de conhecimentos e de procedimentos 
quantitativos. Capacidade de usar informação quantitativa e 
manipular símbolos numéricos. 
Velocidade de Reação 
(Gt), Rapidez para 
Decisão Correta (CDS) 
Rapidez tomar decisões envolvendo processamentos 
complexos. É o tempo de reação entre o recebimento de um 
estímulo (ou tarefa) e o início da resposta. 
Leitura-Escrita (Grw) Habilidade básica de compreensão de textos e expressão 
escrita. Reconhecimento e uso de normas da língua nativa. 
Nota. Fonte: adaptado de Primi (2003) e Aguiar e Rocha (2015) 
Mesmo diante de relativo consenso para explicar a inteligência, críticas importantes e 
novas pesquisas são realizadas para acurar a estrutura desse fenômeno. A mais recente foi 
pensada e afinada por Johnson e Bouchard (2005) que apontam a ausência de validação das 
43 
 
 
análises confirmatórias utilizadas em defesa dos modelos psicométricos da inteligência e 
inauguram o modelo Verbal-Perceptual-Image Rotation (g-VPR) fundamentado no modelo 
proposto por Vernon (Vernon,1983). 
Vernon (1983;) defendeu a existência de dois amplos fatores, o v:ed (habilidades 
verbais, escolares e numéricas) e k:m (habilidades psicomotoras, perceptuais, espaciais e 
mecânicas) para explicar a inteligência, entretanto, também apontou a presença de um fator 
geral, subjacente a todas as habilidades. Nessa direção, em busca de evidências sobre o 
construto da inteligência, Johnson e Brouchard (2005) propuseram um terceiro fator amplo, 
composto testes que avaliavam habilidades de rotação de imagens, que anteriormente 
compunham o fator k:m. 
Contudo, o modelo g-VPR possui na camada I, número indefinido de habilidades 
específicas, na camada dois as habilidades amplas (Verbal, Perceptual e Rotação de Imagens) 
e na camada três, um fator geral, capaz de explicar todas as habilidades intelectuais propostas. 
Após a proposição do modelo, seus teóricos e outros pesquisadores têm testado a validade 
deste modelo, analisando vários bancos de dados disponíveis para pesquisa (Johnson, & 
Bouchard, 2005). 
Considerando os amplos modelos de inteligência, é compreensível a complexidade em 
conceituá-la. Diante disso, faz-se necessário considerar três grandes referências que 
propuseram o conceito desse fenômeno, a saber: a resposta “o que é inteligência” formulada 
por renomados psicólogos para o The Journal Of Educational Psychology (1921), o livro 
fundamentado no papel dos processos cognitivos postulado por Sternberg e Detterman (1986) 
e a proposição de Snyderman e Rothman (1987) que sustenta uma definição de inteligência 
constituída por raciocínio abstrato, resolução de problemas e aquisição de conhecimento. 
Contudo, após décadas de estudos e avanços sobre o comportamento inteligente, os estudos 
44 
 
 
dispostos na história da arte ampliam a visão acerca desse construto, identificando-o de modo 
multidimensional (Sternberg, 2018). 
3. Alto Potencial Intelectual e Altas Habilidades/Superdotação: São Sinônimos? 
De forma similar ao construto da inteligência, o conceito e a caracterização da pessoa 
com AH/S foram, igualmente, sendo modificados ao longo do tempo. Ao realizarmos a 
varredura do estado da arte encontramos diversos termos que aludem a pessoa com AH/S. 
Assim, verifica-se que os termos mais citados na literatura nacional e internacional 
são: “talento” (talent); “superdotação” ou “dotação” (giftedness); “altas habilidades” ou “alta 
capacidade” (high abilities); “altas habilidades acadêmicas” ou “altas habilidades 
intelectuais” (“high academic ability” ou “high intelectual abilities”); “superdotados 
criativos” (creativity gifted); “potencial excepcional” ou “alto potencial” (high potential) 
(Antipoff & Campos, 2010; Ourofino & Fleith, 2011). Posto isso, o modelo de inteligência 
empregado, implica diretamente na terminologia utilizada, identificação e consequentemente 
na educação e oportunidades oferecidas à pessoa com AH/S (Terriot, 2018). 
Em revisão bibliográfica, Carman (2013) evidenciou nove categorias em termos de 
variáveis subjacentes à identificação do API a saber: testes de inteligência, nível escolar, 
recomendações de professores, pais, conselheiros e comitês; testes acadêmicos; atividades 
extracurriculares e entrevistas. O autor concluiu que a utilização da pontuação de QI foi o 
único método escolhido em mais de 50% dos artigos válidos. 
Em síntese, a literatura pautada na abordagem psicométrica emprega o termo² para 
referir-se a crianças que apresentam QI total, na Escala de Inteligência Wechsler para Crianças 
(WISC-IV), geralmente igual ou superior a 130 pontos (Terriot, 2018). Contudo, o critério 
de pontuação escolhido é tema de discussão e debate, notadamente pelo atravessamento de 
aspectos socioculturais, variabilidade do resultado do mesmo indivíduo em testes intelectuais, 
uso do critério QI Total ou Índice de Capacidade Geral (GAI) como medida fidedigna, tendo 
45 
 
 
em vista as assincronias comuns do desenvolvimento da pessoa com API (Grégoire, 2012; 
Terriot, 2018). 
Nessa direção, torna-se relevante abordar as críticas acerca da identificação das AH/S 
pautada exclusivamente no Quociente Intelectual (QI), notadamente pela necessidade de se 
considerar fatores como a criatividade, aspectos interpessoais e artísticos (Alencar & Fleith, 
2001; Extremiana, 2000; Rech & Freitas, 2005). A literatura científica constata importante 
mudança das discussões em torno do construto AH/S nas décadas de 1950 e 1960. É nesse 
período que se torna evidente a visão crítica à psicometria e inicia-se as discussões 
contemporâneas acerca da inteligência e AH/S. 
É imperativo frisar que, historicamente, a educação destinada à pessoa superdotada2 
também esteve atrelada às elevadas capacidades intelectuais e à premissa que a pessoa com 
altas capacidades intelectuais será bem-sucedida em qualquer contexto que esteja inserido 
durante todo o percurso da vida (Subotnik, 2011). Nesta perspectiva, a superdotação é vista 
como qualidade inata de um indivíduo, desvelada mediante avaliação cognitiva ou do QI 
(Robinson, Zigler, & Gallagher, 2000). 
A literatura destaca múltiplos modelos para descrever a superdotação. Sternberg e 
Davidson (1986) incluíam 16 concepções diferentes sobre o fenômeno. Diante disso, Worrel, 
Subotnik, Olszewski-Kubilius e Dixson (2018) propuseram a divisão dos modelos em três 
grupos: a) modelos com foco na capacidade, (b) modelos com foco no desenvolvimento do 
talento em interação com as oportunidades no ambiente, e (c) modelos integrativos. A seguir, 
serão abordadas as teorias consideradas mais influentes para discutir o fenômeno e que 
compõem os grupos de conceitos anteriormente mencionados.2 Termo utilizado por Subotnik (2011) para caracterizar a pessoa com AH/S. 
46 
 
 
o Altas Habilidades/Superdotação - Modelos Teóricos 
Dentre as teorias que abordam o fenômeno das AH/S, serão abordados nesta seção: o 
Modelo dos Três Anéis de Renzulli (1977; 2004a, 2004b), o Modelo de Estrela de 
Tannembaum (1979), a Teoria das Inteligências Múltiplas de Gardner1(2012), a Teoria 
Triárquica de Sternberg (1986) e, o Modelo Diferenciado de Superdotação e Talento de Gagné 
(1994; 2004). 
O modelo proposto por Renzulli (1977; 1986; 2004) - modelo com foco no 
desenvolvimento do talento - concebe a superdotação a partir da intersecção de três círculos 
(ou anéis): habilidade acima da média, envolvimento com a tarefa e criatividade (Figura 1). 
 
Figura 1 Representação do conceito de Altas habilidades/Superdotação – Modelo dos Três 
Anéis 
Fonte: Renzulli, J. S; Reis, S. M. The Three-ring conception of giftedness: A Development Model for Creative 
Productivity. The Triad Reader. Connecticut: Creative Learning Press, 1986. 
 
A Habilidade acima da média descreve o potencial superior em determinada área, 
podendo ser geral ou específico. Essa se aplica em diferentes contextos, é caracterizada pelo 
potencial para processar informações, integrar experiências e fornecer respostas adequadas e 
adaptadas às novas situações, também responde pelos altos níveis de pensamento, 
memorização, fluência verbal, raciocínio numérico e espacial. As habilidades específicas 
47 
 
 
consistem na habilidade em adquirir conhecimento para desempenhar uma ou mais atividades 
especializadas. Cada habilidade específica pode se subdividir em competências ainda mais 
restritas e expressas em situações e contextos diferentes. De modo geral, estas habilidades são 
avaliadas por testes de desempenho ou de aptidão específica. 
 O Envolvimento com a tarefa refere-se aos traços não cognitivos das AH/S (Renzulli, 
2016). O envolvimento com a tarefa pode ser definido como altos níveis de interesse, 
entusiasmo, fascínio ou energia, exercidos sobre uma determinada tarefa, problema ou área 
de atuação. Em síntese, trata-se de motivação extrema para se envolver em uma atividade. 
Essa habilidade pode ser observada em comportamentos de perseverança, resistência, 
dedicação e autoconfiança. Embora esse grupo de características não seja tão objetivamente 
mensurável quanto às habilidades cognitivas gerais, elas constituem um componente 
importante das AH/S e, por isso, devem ser incluídas na identificação do perfil. 
 Por último, a Criatividade como terceiro anel de Renzulli (1986) destaca os traços de 
originalidade de pensamento; engenhosidade; talento para cumprir demandas de modo eficaz; 
comportamento que ignora convenções e procedimentos estabelecidos, buscando a inovação. 
Renzulli (2004) distingue a fluência, flexibilidade e originalidade como as principais 
características da criatividade. Define o comportamento criativo nas AH/S como a abertura à 
experiência. Para o autor, o indivíduo altamente criativo é curioso, especulativo, aventureiro, 
sensível aos detalhes e disposto a assumir riscos. A criatividade e a motivação são traços 
variáveis, presentes em maior ou menor grau, dependendo da atividade. 
Renzulli (1896; 2004; 2016;) aponta a existência de dois tipos de superdotação, a 
saber, a acadêmica e a criativo-produtiva. A primeira é caracterizada por aqueles indivíduos 
que possuem um bom desempenho em demandas de natureza abstrata, lógica, ou seja, aquelas 
que facilmente são identificadas pelos testes de QI, ou testes que investigam funções 
cognitivas, enquanto o segundo tipo agrupa indivíduos que exibem aspectos da atividade e do 
48 
 
 
envolvimento humano no qual se valoriza o incremento de ideias, produtos e demonstrações 
artísticas originais. 
O “Modelo dos Três Anéis” avançada por Renzulli mostra-se uma perspectiva 
abrangente e também utilizada pela Ministério da Educação Brasileira para identificação, 
caracterização e promoção de inclusão desses indivíduos (Renzulli, 2004; Brasil, 2001), 
Entretanto é criticado por outros autores por não possibilitar a identificação de um estudante 
com baixo desempenho, já que há a presença de indivíduos inteligentes e criativos, embora 
desmotivados e com dificuldades em comprometer-se em tarefas estruturadas (Lee Corbin & 
Denicolo, 1998; Siegle, 2018; Al Hroube & El Koury, 2018). 
O modelo postulado por Tannenbaum (1979), com foco no desenvolvimento do 
talento, foi fundamentado a partir de uma perspectiva psicológica e educacional sobre as 
características dos indivíduos que ele denominava de “dotados” e, tem como premissa, 
identificar crianças e adolescentes com potencial de "se tornarem artistas aclamados pela 
crítica ou produtores exemplares de ideias". A especificidade desta visão do talento sugere 
que o modelo foi concebido para ser holístico, pois transcende a identificação de capacidades 
gerais e específicas e inclui atributos de personalidade e interações ambientais. 
O chamado “Modelo Estrela” de Tannenbaum (Figura 2) postula que cinco elementos 
se interligam e contribuem para a expressão do talento: (1) capacidade geral (um fator de 
inteligência geral que engloba todas as capacidades cognitivas do indivíduo), (2) aptidão 
especial, (3) requisitos não intelectuais (autoconceito ou motivação, relacionado ao 
desenvolvimento pessoal), (4) apoios ambientais (Influências do ambiente escolar e familiar, 
ambiente estimulante), e (5) oportunidade, possibilitando a identificação, o estabelecimento 
do tipo de AH/S e indicações para o desenvolvimento dos potenciais. 
Nessa direção, o autor divide esses indivíduos em dois grandes grupos: os 
“produtores” e os “artistas”, sendo o primeiro grupo constituído por sujeitos que expressam a 
49 
 
 
dotação mediante pensamentos e produções reais e, o segundo grupo, os “performers” de arte 
encenada, artistas cênicos ou aqueles que realizam o que denomina de serviços humanos. 
Alguns produtores e artistas abordam as suas tarefas de forma criativa, enquanto outros são 
proficientes em vez de inovadores. De acordo com este modelo, a criatividade é uma opção 
para realização notável, mas não uma exigência no cumprimento dos critérios de 
identificação. 
 
 
Figura 2 Representação gráfica do Modelo Estrela de Dotação e Talento de Tannenbaum 
Fonte: Tannenbaum, A. J. (2000). Gifted children: Psychological and educational perspectives. New York: 
MacMillan. 
A perspectiva teórica das Inteligências Múltiplas (Gardner, 2001), com foco na 
habilidade, consiste em um modelo multidimensional, para o qual a inteligência seria produto 
do potencial biológico, das relações culturais e sociais (Almeida, Guisande & Ferreira, 2009). 
Posto isso, Gardner propõe a existência de oito categorias de inteligência: linguística, lógico-
matemático, espacial, musical, cinestésica, naturalista, interpessoal e intrapessoal (Gardner, 
1983; 2001). 
50 
 
 
A Teoria Triárquica, com premissa semelhante a teoria mencionada anteriormente, 
advoga que a inteligência fornece subsídios para que os indivíduos constituam pensamentos 
e atuações coerentes e adaptativas, de modo a lidar tanto com as necessidades internas quanto 
com demandas do contexto social (Sternberg, 1985). A perspectiva de Sternberg destaca-se 
por defender que a inteligência é um fenômeno composto por três componentes, a saber, a 
habilidade de se relacionar com o meio, a capacidade de manter uma relação com a 
experiência individual e a aptidão de desenvolver relações. 
O autor sugere que os indivíduos considerados com QI elevado não necessariamente 
são habilidosos nos três componentes. Alguns possuem maior facilidade com o controle das 
próprias funções psíquicas e com os fatores que se entrelaçam à aquisição de conhecimento, 
ou seja, apresentam alto nível de inteligência analítica e, geralmente, são promissores na vida 
acadêmica. Outros indivíduos apresentamcaracterísticas voltadas para processos 
experimentais, utilizando as funções psíquicas em atividades específicas - são os sujeitos que 
apresentam aptidão para lidar com novas situações e para regular o processamento de 
informações, o que Sternberg denomina de inteligência criativa. Contudo, outro grupo de 
pessoas caracteriza-se por um melhor desempenho na aplicabilidade, isto é, adaptar os 
processos mentais na experiência no mundo real, representada em uma inteligência prática 
(Sodré, 2006). 
Nos anos 2000, Sternberg modifica a teoria triárquica e inclui a sabedoria como um 
subtipo de inteligência prática. Sabedoria, de acordo com Sternberg, centra-se na preocupação 
com "as necessidades e o bem-estar dos outros". (Sternberg, 2000a, p. 61). Portanto, "alta 
sabedoria" significa dar bons conselhos a outros, bem como a si próprio. Sternberg criou um 
modelo de dádiva, chamado o modelo WICS (Wisdom, Intelligence, Creativity, Synthesized) 
de superdotação. Contudo, de forma semelhante à teoria de Gardner, o modelo de Sternberg 
51 
 
 
foi criticado pela complexidade que interfere na identificação e intervenção prática junto a 
esses indivíduos (Al Hroube & El Koury, 2018). 
o Modelo Diferenciado de Superdotação e Talento de Gagné (1991; 1994; 2004;), 
também voltado para o desenvolvimento do talento, se propõe a distinguir “superdotação” e 
“talento”. Gagné advoga que a superdotação é um fenômeno inato e a expressão ocorre 
despretensiosamente, sem treino e exercício, considerando as aptidões ou dons. O talento, 
entretanto, refere-se a um domínio superior de habilidades, desenvolvidas em, pelo menos, 
um campo da atividade humana. 
Gagné destaca a existência de cinco áreas de talento: intelectual, criativa, socioafetiva, 
sensório-motora e percepção extrassensorial. As concepções modernas de AH/S expõem o 
refinamento de ideias anteriores, identificando e caracterizando o fenômeno mediante 
intersecções, acréscimos e interações (Kaufman & Sternberg, 2008). 
Ademais, o “Megamodelo de Desenvolvimento do Talento” o (Mega Model Talent 
Development - TDMM) de Subotnik et al (2011; 2018;) compõe o grupo de modelos 
integrativos do fenômeno. Para os autores, os termos “Talento” e “Superdotação” são 
sinônimos e o construto é caracterizado a partir do desenvolvimento, com diferentes estágios 
nos quais as variáveis específicas estão subjacentes. 
Nessa direção, os autores defendem que os primeiros anos (estágio inicial) do 
indivíduo identificado como superdotado é caracterizado pelo potencial para realizações. 
Diante de oportunidades, esforços e incentivos, o sujeito transita para a especialização em um 
domínio (estágio intermediário), etapa essa caracterizada por talentos plenamente 
desenvolvidos, refletidos em contribuições duradouras em um domínio do desenvolvimento. 
Ancorado nos estágios anteriores e atrelada à especialização está a produção criativa e 
original, o que pode levar a níveis de eminência. (Olszewski-Kubilius et al., 2017; Subotnik 
et al., 2011). 
52 
 
 
O TDMM apresente em seu bojo teórico cinco importantes princípios: (a) as 
habilidades, gerais ou específicas, são flexíveis ou maleáveis (b) cada área ou domínio do 
talento tem diferentes trajetórias de desenvolvimento; (c) em cada fase do processo de 
desenvolvimento do talento, devem ser oferecidas oportunidades no momento adequado ao 
desenvolvimento; (d) o indivíduo talentoso ou superdotado deve aproveitar as oportunidades 
para aprimorar o talento; e) as competências psicológicas e sociais mental são fatores 
determinantes na transformação de capacidades em competências, competências em perícia e 
perícia em eminência; f) o desenvolvimento de talentos caminha ao lado do empenho a longo 
prazo, estendendo-se até à idade adulta (Worrell, Subotnik, Olszewski-Kubilius & Dixson, 
2019). 
Nesse sentido, Wai e Worrell (2021) defendem que a inteligência tem demonstrado 
estar entrelaçada a numerosos resultados da vida, e especialmente ao desempenho educacional 
(Brown, Wai, & Chabris, 2021; Deary, Strand, Smith, & Fermandes, 2007). Isto posto, a 
“inteligência alta” ou API pode ser considerado como habilidade fundadora, e a educação a 
tradução dessa capacidade bruta em especialização ou superdotação em domínio. 
o Identificação e Caracterização do Alto Potencial Intelectual 
Em um estudo de meta-análise acerca das práticas de identificação da pessoa 
superdotada e talentosa, Hodges et al (2018) sinalizam que ao considerarmos a concepção 
superficial de um estudante com alta capacidade (ex: excelente estudante, com altas notas e 
resultados excepcionais em testes padronizados) desprezamos o potencial latente, 
possivelmente mascarado por fatores socioeconômicos, culturais, não descoberto ou 
subdesenvolvido e, nos limitamos apenas às capacidades manifestas (Briggs, Reis, & 
Sullivan, 2008). 
53 
 
 
Johnsen (2021) defende que estudantes “talentosos” e “dotados”3 podem expressar 
várias, mas não todas características associadas a área de destaque, o que torna de extrema 
relevância que os profissionais envolvidos no processo de identificação avaliem 
características durante um período e em contextos variados. 
Estudos apontam a importância de considerar que as crianças com API não se 
destacam necessariamente em todas as medidas de desempenho, podendo elas operarem de 
modo semelhante a crianças típicas ou, apenas, apresentarem desempenho ligeiramente à 
frente dos seus pares em áreas específicas (Schofield & Ashman, 1987) ou expressarem 
assincronias do desenvolvimento atravessadas por fatores intrapsíquicos, sociais e genéticos, 
o que impacta diretamente no modo de expressão das potencialidades (Clark, 1997; 
Whitmore, 1981;). 
Além disso, na literatura da área, outro tema tem chamado a atenção de alguns 
pesquisadores: (Alvez & Nakano, 2015; Foley-Nicpon et al.,2011; Kaufman, 2018; Rangni 
& Costa, 2016; Taucei & Stoltz, 2018) a coexistência de AH/S em indivíduos com deficiência 
visual, auditiva ou transtornos do neurodesenvolvimento, tais como a dislexia e o Transtorno 
do Déficit de Atenção e Hiperatividade, denominando essa condição de dupla 
excepcionalidade (2E)4. 
Considerando a multidimensionalidade dos modelos teóricos e, consequentemente, as 
características das AH/S, Nakano e Primi (2021) atenta que esses indivíduos apresentam 
perfis heterogêneos e interesses e capacidades personalizados. Nessa direção, revisa o estado 
da arte e lista, o que considera os principais tipos de superdotação (Tabela 3). 
 
 
 
 
3 Termo apoiado na perspectiva de Gagné para referir-se a pessoa com AH/S. 
4 Termo utilizado para referir-se à coexistência de altas habilidades/ superdotação com uma 
deficiência/transtorno/distúrbio/síndrome. 
54 
 
 
Tabela 3 
Características dos principais tipos de superdotação 
Tipo Habilidade acima 
da média 
Característica 
Intelectual 
Capacidade 
cognitiva geral 
• Inteligência fluida e cristalizada. 
• Memória Curta e de Longo Prazo. 
• Flexibilidade e Fluência do 
pensamento. 
• Pensamento abstrato e associações. 
• Rapidez e independência de 
pensamento. 
• Alta capacidade de resolver e lidar 
com problemas. 
• Conhecimentos adiantados para 
idade e precocidade. 
 
Acadêmica ou 
Escolar 
Inteligência 
Testes de 
desempenho escolar 
• Altos níveis de desempenho 
escolar. 
• Boa memória e atenção. 
• Intensa atividade intelectual. 
• Facilidade no processamento de 
informações complexas. 
• Motivação por disciplinas 
escolares do interesse. 
• Alta capacidade de produção 
acadêmica. 
Social Liderança 
• Uso eficaz das habilidades sociais. 
• Empatia. 
• Adaptabilidade social. 
• Capacidade de liderança. 
• Sensibilidade interpessoal. 
55 
 
 
• Atitude cooperativa. 
• Alta sociabilidade. 
• Capacidade de resolver conflitos. 
• Alto poder de persuasão e de 
influência no grupo. 
Produtivo-
Criativa ou 
Talentosa 
Criatividade 
•Capacidades artísticas ou que 
busca como resultado uma 
produção ou expressão artística. 
• Alto nível de criatividade. 
• Pensamento divergente. 
• Resolução personalizada de 
problemas. 
• Originalidade. 
• Curiosidade. 
• Imaginação. 
• Novas Ideias. 
• Produções artísticas e produtos 
inovadores. 
Psicomotora Psicomotricidade 
1. Facilidade de expressão por meio de 
movimentos corporais. 
2. Faz uso de objetos e/ou o corpo na 
solução de problemas ou construção de 
produtos. 
3. Habilidades e interesses psicomotores. 
4. Velocidade. 
5. Agilidade nos movimentos. 
6. Força. 
7. Coordenação, resistência e controle 
motor. 
Nota. Fonte: adaptado de Nakano e Primi (2021). 
 
56 
 
 
Nesta direção, o API parece ser um dos perfis das AH/S, podendo estar também 
atrelado às potencialidades em variadas áreas ou até mesmo coexistir com transtornos do 
neurodesenvolvimento (Renzulli, 2018). 
4. Inteligência, Funções Executivas & Criatividade 
O desenvolvimento das neurociências nas últimas décadas, notadamente as novas 
técnicas de neuroimagem, análise do material genético, manipulação e visualização de 
sinapses, bem como a atividade elétrica e achados neurodesenvolvimentais, forneceram 
subsídios para compreensão da expressão do sistema nervoso central do homem em sua 
vivência histórico-cultural. 
Ao realizar varredura da história da arte conclui-se que Luria (1966; 1980) pautado 
nas contribuições de Vigotski, introduziu ideia de que o lóbulo frontal possui um papel 
executivo, assim, distinguiu três unidades funcionais do córtex: (a) excitação-motivação 
(límbico e sistemas reticulares); (b) recebimento, processamento e armazenamento 
informação (áreas corticais pós rolândicas); e (c) programação, controle, e verificação da 
atividade (lóbulos frontais), sendo esta terceira unidade a que estaria relacionada as FE. 
Embora sejam caracterizadas como funções frontais, as FE são inerentes e relacionadas à 
circuitaria frontoestriatal, frontoparietal e frontocerebelar (Zahr, Pfefferbaum & Sullivan, 
2017). O córtex pré-frontal dorsolateral tem sido alvo de interesse de estudiosos do campo da 
cognição humana, tendo em vista que são associadas a funções cognitivas de alta ordem com 
as FE e processos atencionais. 
As FE são um conjunto de competências neurocognitivas que fundamentam o controle 
consciente mediante processo mental top-down, necessário quando a concentração é 
requisitada e está subjacente ao pensamento, ação e emoção. Nesta direção as FE são 
necessárias para um raciocínio deliberado, intencional, regulação das emoções e 
57 
 
 
funcionamento social complexo, permitindo a aprendizagem autorregulada e adaptação às 
circunstâncias (Barros & Hazin, 2013; Diamond, 2013, Zelazo 2015). 
Moriguchi, Chevalier e Zelazo (2016) apontam que vários são os estudos que se 
propõem investigar como estes processos se desenvolvem, como estão inter-relacionados e 
destacam que os estudos nessa área têm evidenciado que as FE podem desenvolver-se com 
diferenciação progressiva dos processos cognitivos mais básicos. 
Alguns autores investigam acerca das condições que modulam as FE (FitzGibbon et 
al, 2014.; Unger et al. 2014), outros, como elas são expressas ao longo do tempo (Garcia & 
Dick, 2013), quais os processos executivos específicos são requisitados em uma determinada 
tarefa (Wright & Diamond, 2014) e quais as janelas críticas de desenvolvimento dessas 
funções (Lucenet & Blaye, 2014). 
Wiebe e Charak (2008) já haviam evidenciado ausência de diferenças estruturais no 
funcionamento executivo da MT e do controle inibitório entre crianças de dois a seis anos de 
idade. Em busca de ampliar a investigação do desenvolvimento das FE em crianças maiores, 
Brydges, Reid, Fox e Anderson (2012) avaliaram o controle inibitório, MT e medidas de 
flexibilidade cognitiva em centenas de crianças típicas entre sete e nove anos de idade e 
revelaram que, embora seja possível apontar avanços comportamentais entre as idades, não 
foi achado diferenças na estrutura subjacente da FE nessa faixa etária. 
Posto isso, é necessário destacar que os estudos desenvolvimentais das FE apontam 
que da infância até aproximadamente os nove anos de idade, as FE (memória de trabalho e 
controle inibitório) desenvolvem-se e expressam-se de modo unitário, ou seja, um modelo de 
funcionamento executivo de um único fator é o que melhor caracteriza o desenvolvimento 
dessa função (Brydges et al., 2014). Nessa direção, a diversidade (capacidades específicas de 
cada executivo função) é discutida na literatura como evidente a partir dos 10 anos de idade 
(Shing, Lindenberger, Diamond, Li & Davidson, 2010). Destarte, estudos que também se 
58 
 
 
apoiam em técnicas de neuroimagem indicam que enquanto observa-se maturação da 
expressão comportamental e das FE, torna-se cada vez mais explícito a diminuição da ativação 
neuronal, possivelmente justificada pelo menor esforço cognitivo global, e maior 
especialização do córtex humano (Brydges et al., 2014). 
o Modelos de Funções Executivas 
A literatura aponta que não há consenso sobre o qual seria o modelo perfeito de FE. 
Assim, em revisão sistemática, Baggetta e Alexander (2016) problematizam e agregam pontos 
conceituais e operacionais de estudos empíricos e contemporâneas sobre as FE e evidenciam 
que os estudiosos da área concordam que as FE: a) guiam ações e comportamentos essenciais 
à aprendizagem e execução de tarefas diárias; b) contribui para a regulação e controle das tarefas 
diárias; (3) não diz respeito apenas ao domínio cognitivo, mas é também composto por aspectos 
socioemocionais e comportamentais; e também (4) é de essência multidimensional, com mais 
do que um componente ou função individual. 
Miyake et al. (2000) defende a existência de uma habilidade geral, subjacente a todos 
os processos executivos, bem como várias habilidades independentes específicas para cada FE 
(Miyake & Friedman, 2012). A habilidade geral possibilita que cada função executiva se 
correlacione entre si, ao passo que as habilidades específicas atuam para que cada função seja 
dissociável uma da outra. Embora o modelo de Miyake et al. (2000) seja considerado modelo 
profícuo das FE, para que fosse compreendido a luz do desenvolvimento infantil, foi necessário 
que novos elementos fossem combinados. 
Atualmente, sabe-se que as FE dependem de circuitos neurais cada vez mais bem 
compreendidos que envolvem regiões cerebrais no córtex pré-frontal (CPF) e outras áreas 
(Cole et al., 2013), e são comumente avaliadas pelo comportamento de três habilidades: 
59 
 
 
controle inibitório, memória de trabalho e flexibilidade cognitiva (Miyake et al. 2000; 
Diamond, 2013). 
O controle inibitório implica a inibição intencional da atenção e interferências do 
pensamento e comportamento (por exemplo, ignorar uma distração ou parar uma ação 
impulsiva). Segundo Barkley (1997) o controle inibitório pode ser representado por três 
processos inter-relacionados: a) inibição de respostas dominantes, ou seja, a inibição de 
comportamentos condicionados e que não são apropriados ou cabíveis em determinados 
contextos, b) o impedimento de respostas em andamento, ou seja, a capacidade de 
descontinuar comportamentos que já estejam se sucedendo em momento específico; c) 
controle de interferências internas e externas, a saber, o “crivo” atencional de modo que o 
indivíduo alcance um objetivo. 
A MT é definida como a habilidade de manter a informação em mente e, manipulá-la 
em tempo real (por exemplo, mantendo dois números em mente e subtraindo um do outro). 
Está relacionada à capacidade de raciocínio, aprendizagem, compreensão e solução de 
problemas (Baddeley & Hitch, 1974). Variados são também os modelos que propõem 
investigar a MT. Contudo, é o modelo de Baddeley (2000) mais bem aceito para a 
compreensão dessa FE. 
De acordo com Baddeley (2000; 2003) e Baddeley, Alen e Hitch

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