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RecuperacaoMais-valiasFundiAírias-Pinheiro-2016


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RECUPERAÇÃO DE MAIS-VALIAS
FUNDIÁRIAS URBANAS EM NATAL:
ESTUDO SOBRE A VALORIZAÇÃO DO SOLO E OS EFEITOS
DOS INVESTIMENTOS PRÉ/PÓS COPA DO MUNDO 2014
DANIEL NICOLAU DE VASCONCELOS PINHEIRO
Orientador: Márcio Moraes ValençaNatal, 2016
Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
Centro de Tecnologia 
Departamento de Arquitetura 
Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo 
 
 
 
DANIEL NICOLAU DE VASCONCELOS PINHEIRO 
 
 
 
 
RECUPERAÇÃO DE MAIS-VALIAS FUNDIÁRIAS URBANAS EM NATAL: 
ESTUDO SOBRE A VALORIZAÇÃO DO SOLO E OS EFEITOS DOS 
INVESTIMENTOS PRÉ/PÓS COPA DO MUNDO 2014 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Natal 
2016 
DANIEL NICOLAU DE VASCONCELOS PINHEIRO 
 
 
 
 
 
 
RECUPERAÇÃO DE MAIS-VALIAS FUNDIÁRIAS URBANAS EM NATAL: 
ESTUDO SOBRE A VALORIZAÇÃO DO SOLO E OS EFEITOS DOS 
INVESTIMENTOS PRÉ/PÓS COPA DO MUNDO 2014 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa 
de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, 
da Universidade Federal do Rio Grande do 
Norte, como requisito à obtenção do título de 
Mestre em Arquitetura e Urbanismo. 
Orientador: Márcio Moraes Valença 
 
 
 
 
 
 
 
 
Natal, 2016 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN 
Sistema de Bibliotecas - SISBI 
C S
 
Pinheiro, Daniel Nicolau de Vasconcelos. 
 Recuperação de mais-valias fundiárias urbanas em Natal: 
estudo sobre a valorização do solo e os efeitos dos 
investimentos pré/pós copa do mundo 2014 / Daniel Nicolau de 
Vasconcelos Pinheiro. - Natal, RN, 2017. 
 181f.: il. 
 
 Orientador: Márcio Moraes Valença. 
 Dissertação Mestrado - Universidade Federal do Rio Grande do 
Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura e 
Urbanismo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A Teodoro, por tudo que ele 
representa, na minha e nas 
nossas vidas. 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Aos professores do PPGAU pela oportunidade ofertada e sem a qual 
este trabalho nem seria começado. Em especial a Professora Ruth Ataide, que 
me acolheu nos primeiros momentos deste trabalho, sempre incentivando. 
A todos os meus amigos que me incentivaram, em especial a Professora 
Sara Raquel, que me trouxe muitos conhecimentos novos, pelo incentivo e pelo 
apoio. A amizade que sempre ajudou nos momentos mais pesados desta 
etapa. 
A minha família, que me aguentou! Em especial a meu pai, José Adalto 
e a minha mãe, Ana Maria, que com sacrifício, sempre lutaram pelo meu futuro. 
a Maria Elisa, minha esposa, pelo incentivo, pela paciência e apoio com nosso 
bebê. e a Teodoro, meu filho amado, por todo aprendizado e horas de 
brincadeiras sacrificadas para seu pai estudar! 
Ao meu grande orientador, sempre amigo, compreensivo e próximo. Um 
grande irmão! 
Ao Grande Arquiteto do Universo, porquê tudo isso traçou e permitiu que 
eu vencesse as dificuldades presentes nos meus caminhos para chegar aqui. 
Para todos o meu MUITO OBRIGADO!!! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“A primeira condição para 
modificar a realidade consiste 
em conhecê-la” 
 Eduardo Galeano 
 
RESUMO 
As intervenções estatais financiadas com verba pública criam ambiências 
(externalidades), que valorizam algumas localizações em detrimento de outros. Essa 
valorização (mais-valia fundiária), não é gerada com o esforço solitário de um único 
proprietário, mas sim, é construída socialmente com a evolução do espaço urbano das 
cidades ao longo do tempo. Torna-se justo que sejam implementadas ações e 
medidas que visem recuperar esta valorização, ou parte dela, e que esse valor seja 
reinsvestido em localidades menos favorecidas socialmente. Este trabalho buscou 
encontrar os lugares com maior valorização imobiliária na cidade de Natal-RN, 
utilizando como ferramentas as análises dos dados de IPTU, ITIV e OODC, 
confrontadas com as obras estruturantes e equipamentos públicos da cidade, com o 
fim de identificar se existe a implementação de ferramentas de recuperação de mais-
valias fundiárias urbanas e se os recursos obtidos através delas, estão sendo 
aplicados de forma redistributiva. 
Palavras-chave: Recuperação de mais-valias fundiárias urbanas, valorização 
imobiliária, renda da terra, impostos. 
 
ABSTRACT 
Public investments in the city create urban features that add value to certain 
locations but not to others. This is a plus value collectively generated in the long run, in 
the production of urban space, not by specific individuals. Thus, it is only fair that 
individuals who benefit from this process have to pay back and contribute towards 
investments to develop less favoured, and poorer areas. This dissertation sought to 
identify the most valued areas in Natal, Brazil, using three data sets related to taxation 
on land transactions, property and use (IPTU, ITIV and OODC). The amount of taxes 
collected is seen in confrontation with structural developments and investments in new 
public equipments and services in the city. The idea is to evaluate if the taxation 
system has served as a means of income redistribution. 
Keywords: real estate value capture; value appreciation; real estate valuation; 
land rent; taxes. 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 01: Componentes do valor da Terra Urbana .................................................. 49 
Figura 02 – Localização de Natal─RN. ..................................................................... 59 
 
LISTA DE QUADROS 
 
Quadro 01 ─ Comparativo autor/agente descrito.......................................................37 
Quadro 02 ─ resumo dos impostos/contrapartida abordados ...................................53 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
 
Gráfico 01 – Receitas Municipais...............................................................................65 
Gráfico 02 – Receita Tributária / Receita Total / Imposto sobre Patrimônio..............66 
Gráfico 03 Receitas/Despesas...................................................................................67 
Gráfico 04 IPTU pre/pos Copa e Total ...................................................................... 89 
Gráfico 05 - Curva histórica IPTU .............................................................................. 94 
Gráfico 06 Arrecadação comparada de ITIV pré e pós Copa 2014 ......................... 102 
Gráfico 07 - Curva histórica ITIV ............................................................................. 106 
Gráfico 08 – OODC pré/pós Copa............................................................................114 
Gráfico 09 – Curva histórica OODC.........................................................................116 
Gráfico 10 – Quantidade de processos/ano de ITIV................................................117 
Gráfico 11 – Quantidade de processos/ano de IPTU...............................................118 
Gráfico 12 – Curva histórica OODC – IPTU – ITIV..................................................121 
Gráfico 13 Valores efetivos do OGU para Copa 2014.............................................123 
 
LISTA DE MAPAS 
Mapa 01 - Renda por bairro ...................................................................................... 71 
Mapa 02 - Densidade demográfica ........................................................................... 71 
Mapa 03 - Área construída ........................................................................................ 72 
Mapa 04 - Sistema viário ................................................................................. 72,79,87 
Mapa 05 - Divisão administrativa .............................................................................. 73 
Mapa 06 – Concentração da verticalização .............................................................. 73 
Mapa 07 – Locação dos outdoors da cidade ............................................................. 78 
Mapa 08 - Balões, bandeiras epanfletos .................................................................. 78 
Mapa 09 - Eventos ................................................................................................... 79 
Mapa 10 - IPTU Total 2000-2016 .............................................................................. 84 
Mapa 11 - IPTU 2000-2009 ....................................................................................... 85 
Mapa 12 - IPTU 2010-2016 ....................................................................................... 85 
Mapa13 – Obras Copa .............................................................................................. 86 
Mapa 14 - Indústrias .................................................................................................. 87 
Mapa 15 – Processos de licenciamento .................................................................... 91 
Mapa 16 - Obras publicas ......................................................................................... 91 
Mapa 17 - Pontos Comerciais ................................................................................... 92 
Mapa 18 - Praças, unidades de saúde e escolas ...................................................... 92 
Mapa – 19 ITIV total 2000-2016 ................................................................................ 95 
Mapa 20 - ITIV 2000-2009 ........................................................................................ 96 
Mapa 21 - ITIV 2010-2016 ........................................................................................ 96 
Mapa 22 - Obras da copa .......................................................................................... 97 
Mapa 23 – ITIV x Comércio ..................................................................................... 105 
Mapa 24 – ITIV x Equipamentos de saúde, educação e lazer ................................ 105 
Mapa 25 - OODC Total 2003-2016 ......................................................................... 111 
Mapa 26 - OODC 2003-2009 .................................................................................. 111 
Mapa 27 - OODC 2009-2016 .................................................................................. 112 
Mapa 28 - Obras copa ............................................................................................. 112 
Mapa 29 – OODC por bairro ................................................................................... 115 
 
 
LISTA DE SIGLAS 
RD-01 ─ Renda Diferencial - 01 
RD-02 ─ Renda Diferencial - 02 
IPTU ─ Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana 
ITIV ─ Imposto de Transmissão Inter Vivos 
OODC ─ Outorga Onerosa do Direito de Construir 
ITBI ─ Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos 
ISS ─ Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza 
IRPF ─ Imposto de Renda de Pessoa Física 
IRPJ ─ Imposto de Renda de Pessoa Jurídica 
OUC ─ Operação Urbana Consorciada 
EC ─ Estatuto da cidade 
ICMS ─ Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias 
e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, 
intermunicipal e de comunicação 
ITCMD ─ Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação 
TPC ─ Transferência de Potencial Construtivo 
RN ─ Rio Grande do Norte 
ABNT ─ Associação Brasileira de Normas Técnicas 
CUB ─ Custo Unitário Básico 
IBAM ─ Instituto Brasileiro de Administração Municipal 
CTN ─ Código Tributário Nacional 
SEMUT ─ Secretaria Municipal de Tributação 
IBGE ─ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica 
PPA ─ Plano Plurianual 
LDO ─ Lei de Diretrizes Orçamentárias 
LOA ─ Lei de Orçamento Anual 
SEMPLA ─ Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão 
AEIS ─ Área de Interesse Social 
SEMURB ─ Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo 
PDN ─ Plano Diretor de Natal 
STTU ─ Secretaria de Transporte e Trânsito Urbano 
FIFA ─ Federação Internacional de Futebol 
SINDUSCON ─ Sindicato da Construção 
MCMV ─ Minha Casa Minha Vida 
FURB ─ Fundo de Urbanização 
UFRN ─ Universidade Federal do Rio Grande do Norte 
IFRN – Instituto Federal de Educação Tecnológica 
PAC ─ Programa de Aceleração do Crescimento 
OGU ─ Orçamento Geral da União 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sumário 
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 13 
NOTA METODOLÓGICA .......................................................................................... 16 
1 A renda da terra: geração e apropriação ............................................................ 20 
1.1 Renda da terra – A TERRA COMO FONTE DE RENDA ................................... 21 
1.2 A localização – a externalidade como construção social .............................. 29 
1.3 Os Produtores do espaço ................................................................................. 35 
2. AS FORMAS DE RECUPERAÇÃO DE MAIS-VALIAS FUNDIÁRIAS ................. 43 
2.1 Estado mediador ............................................................................................... 44 
2.2 A recuperação de Mais Valias fundiárias urbanas ......................................... 49 
2.3 Instrumentos de Recuperação de Mais Valias ................................................ 52 
2.3.1 Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana – IPTU ............................. 56 
2.3.2 Imposto de Transmissão Inter Vivos ─ ITIV ................................................. 57 
2.3.3 Outorga Onerosa do Direito de Construir – OODC ..................................... 58 
3. NATAL E A UTILIZAÇÃO DOS INSTRUMENTOS .............................................. 60 
3.1 Natal: objeto da análise .................................................................................... 60 
3.1.1 Natal: a geografia ........................................................................................... 60 
3.1.2 O ambiente construído: legislação urbanística e ambiental ...................... 62 
3.1.3 Situação tributária: a legislação ................................................................... 64 
3.1.4 Contabilidade local: investimentos, arrecadação e despesas ................... 66 
3.1.5 Cenário Natal: caracterização geral da legislação ...................................... 70 
3.2NATAL: a identificação dos problemas ............................................................ 71 
3.2.1 Cenário básico da distribuição de rendas e espaço edificado .................. 72 
3.2.2 Atividades temporárias e sua relação com a estrutura de valorização ..... 78 
3.3 o caminho da valorização ................................................................................. 83 
4. NATAL E A DISTRIBUIÇÃO DA ARRECADAÇÃO ............................................. 85 
4.1 Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana – IPTU ............................... 85 
4.2 Imposto de Transmissão Inter Vivos - ITIV .................................................... 96 
4.3 Outorga Onerosa do Direito de Construir - OODC ....................................... 109 
4.4ITIV, IPTU E OODC e a integração dos tributos ............................................. 118 
Conclusão .............................................................................................................. 127 
Referências ............................................................................................................ 138 
ANEXO I -MAPAS .................................................................................................. 146 
ANEXO II -Anexo Metodológico ........................................................................... 177 
13 
 
INTRODUÇÃO 
A ideia da realização deste estudo surgiu da inquietação do autor ─ como 
servidor integrante de um órgão público da área de planejamento urbano ─ frente à 
realidade da gestão do mercado de terras e da administração pública dos ganhos de 
"valorização" gerados pelas intervençõesestatais na cidade. Trabalhando diariamente 
com regulamentação das atividades e ocupações da cidade, percebeu que seria 
possível identificar as origens de alguns fenômenos urbanos dentro do território, ao 
mesmo passo que também notou um direcionamento de algumas políticas públicas 
urbanas para algumas áreas da cidade ou setores imobiliários. 
Para além disso, a leitura de obras de referência sobre os temas do mercado 
de terras urbano ensejou a compreensão de que a municipalidade pode e deve intervir 
de forma mais direta nessa dinâmica, tornando-se mais ativa no processo. Contudo 
era necessário que se tomasse conhecimento de como a dinâmica acontecia na 
cidade, antes de realizar proposições para o seu direcionamento. Dentre todas as 
formas de atuação do Estado no mercado de terras, o tema de Recuperação de mais-
valias fundiárias urbanas chamou mais atenção devido a sua transversalidade em 
relação a diversas ações de planejamento urbano e estruturação da cidade. 
Durante o levantamento de referências teóricas, percebeu-se que não existiam 
obras acadêmicas que analisassem esses instrumentos de forma integrada, nem 
mesmo um mapeamento de onde os instrumentos de recuperação estariam sendo 
mais eficientes em termos de arrecadação. Por outro lado, a apreensão dos 
conhecimentos de como os recursos auferidos poderiam ser utilizados para melhorar 
áreas da cidade menos favorecidas levou à reflexão de onde estariam sendo 
executadas as obras estruturantes municipais, resultantes da aplicação desses 
recursos. 
Com essa motivação, concebeu-se a proposta de estudo que, no seu Plano de 
Trabalho inicial, tinha como objetivo geral identificar as formas de recuperação de 
mais-valias urbanas aplicadas no município de Natal-RN para construir uma leitura 
geral da situação local a partir de referências nacionais e internacionais. Visando ao 
14 
 
alcance desse propósito, foram definidos cinco objetivos de cunho mais específico, 
quais sejam: identificar as formas de recuperação de mais-valias, partindo do 
município; identificar os contextos gerais das localidades onde são aplicados; avaliar 
se as receitas auferidas por meio dos impostos, das contrapartidas e dos tributos são 
viabilizadoras de melhorias urbanas; analisar a utilização dos recursos dentro das 
previsões de melhorias urbanas e construir uma leitura da situação da captura de 
mais-valias urbanas no município. 
O recorte geográfico original foi o entorno do estádio Arena das Dunas, num 
raio de 500m, tendo ainda como recorte temporal o período de 2005 a 2015. A 
intenção inicial era estudar a dinâmica dessa fração territorial com vistas a identificar 
as possibilidades de cumprimento dos objetivos propostos. As fontes a que se 
recorreu para a obtenção dos dados empíricos situam-se basicamente em órgãos 
públicos; correspondendo, em boa parte, à atualização de publicações municipais 
anteriores. As demais foram levantadas pelo autor deste trabalho. 
A organização das informações e geração do corpus foi realizada pelo autor e 
demandou a utilização de softwares de geoprocessamento e de planilhas. Vale 
registrar que todos os arquivos e dados gerados são uma adição ao banco de dados 
da base de pesquisa Estudo e Conceito, criada pelo Professor Marcio Moraes Valença 
e ampliada pelos professores Sara Medeiros e Luciano Barbosa. 
Ao longo das leituras e da sistematização dos dados, foi ficando evidente que 
alguns ajustes à proposta original seriam necessários, começando pelos recortes 
temporal e espacial. O acesso ao conteúdo informacional das secretarias municipais 
levou-nos à convicção de que o recorte temporal deveria ser estendido até 2000, nos 
casos do Imposto de Transmissão Intervivos ─ ITIV e Imposto sobre a Propriedade 
Territorial Urbana ─ IPTU, e até 2003, no caso da Outorga Onerosa do Direito de 
Construir ─ OODC. De modo semelhante, convencemo-nos de que o recorte espacial 
deveria ser ampliado para toda a cidade, o que, em deriva, se reverteu em uma análise 
realizada de forma mais ampla, comparando bairros e considerando, em mais detalhe, 
obras e intervenções estruturantes identificadas. 
Após os ajustes realizados na estrutura pensada inicialmente, foi concebido um 
planejamento de trabalho, com os dados já levantados, que mostrou a possibilidade 
15 
 
de manter os mesmos objetivos propostos inicialmente, ajustando apenas os recortes 
espacial e temporal. Assim, esta dissertação apresenta quatro capítulos, sendo o 
primeiro e o segundo correspondentes à compilação dos marcos teóricos que 
balizaram o estudo, e os terceiro e quarto reservados à análise do corpus. 
No capítulo I, em que serão apresentados os termos técnicos e acadêmicos, 
utilizados para a análise, a teoria da renda da terra é abordada apenas para 
demonstrar a origem dos valores que são alvo das ferramentas de recuperação de 
mais-valias fundiárias urbanas. A definição do que se entende como localização 
servirá para demonstrar que a renda surge devido à diversidade de características 
das frações territoriais analisadas na cidade. Também discute-se o entendimento 
sobre a justa distribuição dos impactos positivos e negativos das intervenções 
públicas e privadas na dinâmica imobiliária da cidade. 
Esses conceitos são importantes para permitir aos leitores a compreensão da 
base teórica que justifica a utilização, pelo Estado, de ferramentas de recuperação de 
mais-valias. Fundamentando-se no entendimento de como a terra pode gerar renda e 
entendendo como a criação de localizações e externalidades no tecido urbano, 
permitem o surgimento de diferenças nos preços dos lotes urbanos. Assim, 
justificando a distribuição dos ônus e bônus da vida na cidade, em sendo esta, uma 
construção social coletiva. 
No capítulo II, encontra-se o arcabouço conceitual acerca da mediação do 
Estado e da consequência de suas intervenções. A recuperação de mais-valias 
fundiárias urbanas também está definida neste capítulo. Por último, são ainda 
discutidos os instrumentos fiscais que viabilizam a captura de mais-valias. Com os 
dois primeiros capítulos, fecha-se o ciclo que inclui a definição da renda fundiária, 
passando pela discussão de como ela surge, de quem contribui com a sua 
valorização, de quem é o mediador do mercado de terras, de como este atua e em 
que se baseia a captura de mais-valias. 
Partindo das experiências discutidas na primeira parte, o segundo momento da 
análise tem por objetivo começar a aproximar a base teórica a sua aplicação prática, 
evidenciando-se o papel do Estado como mediador da distribuição dos ganhos e 
perdas das políticas urbanas da cidade. Esta discussão direciona para o terceiro 
16 
 
momento, no qual há a caracterização estrutural, administrativa e legal da cidade para 
possibilitar a análise das informações coletadas. 
O capítulo III, traz a contextualização da realidade socioeconômica do 
município. Aqui, são apresentados os dados que balizaram a conciliação teórica do 
capítulo IV e da conclusão: dados gerais do município como rendas, população, 
maiores incidências de utilização do espaço, tudo isso preparando o caminho para a 
análise frente as teorias definidas nos primeiros capítulos. 
No capítulo IV, apresenta-se a contextualização do conjunto de dados, 
apresentado em mapas e gráficos, seguidos de uma análise comparativa, a fim de 
evidenciar as peculiaridades de cada situação. No processo de análise, optou-se por 
comparar alguns desses dados, separando o período pré e pós-Copa 2014 para dar 
destaque a fenômenos tributários ou urbanísticos de interesse para a pesquisa. 
Após identificar as frações territoriais com melhor externalidade, que, por 
consequência, também são os mais valorizados, foi possível verificar, na localização, 
a incidência dos impostos. A conclusão conjuga os dados com o repertório teórico, de 
forma a verificar se os objetivos do trabalho foram alcançados, discutindo a utilizaçãodos recursos públicos e os princípios de redistribuição social. 
 
NOTA METODOLÓGICA 
Nesta seção, apresentam-se os procedimentos utilizados no processo 
investigativo. Definindo o recorte temporal e espacial, procedeu-se à coleta de dados 
e à sua tabulação, à análise e confecção de mapas. E para estar em sintonia com o 
novo desenho da pesquisa, optamos por trabalhar toda a cidade por bairros e regiões 
administrativas, comparando o sistema viário, os pedidos de licenciamento, a renda, 
a concentração populacional, a localização de obras e equipamentos de serviços, os 
tipos de atividades e o volume de área construída, com os valores arrecadados nos 
impostos e nas contrapartidas, objetos desta investigação. 
O recorte temporal adotado inicialmente previa, conforme mencionado, o ano 
de 2005, como ponto de partida, mas foi modificado e ampliado (considerando-se o 
acervo disponível nas secretarias pesquisadas), ficando o ITIV e o IPTU de 2000 a 
17 
 
2016 e a OODC de 2003 a 2016. Esses dados foram compilados e espacializados; 
sua análise foi realizada considerando que, em 2009, Natal foi confirmada como sede 
da Copa 2014. Para analisar a dinâmica, tendo em vista a especulação e a valorização 
que os imóveis sofreram, realizamos tanto uma pesquisa bibliográfica quanto uma 
pesquisa de campo. Nessa perspectiva, os procedimentos metodológicos adotados 
na investigação foram a obtenção de dados a partir de fontes primárias e secundárias. 
O corpus constituiu-se de dados oriundos de fontes bibliográficas impressas e virtuais, 
bem como de informações documentais advindas de órgãos e/ou instituições públicas 
e privadas responsáveis por registros históricos e estatísticos concernentes aos 
eventos que configuraram a atual situação. 
A etapa de levantamento bibliográfico e documental teve como finalidade tanto 
a apropriação de saberes quanto a construção do referencial teórico-conceitual 
pertinente. O processo de coleta desenvolveu-se junto ao acervo da Biblioteca Central 
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e das bibliotecas setoriais 
dos Departamentos de Geografia, Economia, História e Arquitetura e Urbanismo. 
Também foram acessados sites oficiais, tais como o portal da Capes, para a consulta 
de dissertações e teses; o site da revista de geografia e ciências sociais, Scripta Nova, 
que abriga artigos diversos; as publicações do Lincoln Institute; em especial, a revista 
Land Lines, entre outros. Além dessas buscas, ainda recorremos aos seguintes 
acervos em órgãos de controle e geração de informação: 
 à Secretaria Municipal de Arquitetura Urbanismo de Natal (SEMURB),em que 
foram pesquisados os processos de intervenções públicas executadas na área 
de recorte geográfico escolhida. Foi realizada uma busca nos arquivos físicos 
e digitais com fins de recuperar as informações sobre Outorga Onerosa e dados 
edilícios. O acesso foi feito diretamente na Secretaria, em seu acervo físico, e 
no sistema informatizado com compilação dos dados nele existentes; 
 à Secretaria Municipal de Tributação (SEMUT), em que foram pesquisados 
dados de processos no sistema informatizado Directa. O acesso às 
informações foi realizado por funcionários que forneceram os relatórios das 
informações sobre impostos e características edilícias constantes nas fichas 
cadastrais que essa Secretaria possui. Ainda na Secretaria Municipal de 
18 
 
Tributação, foram compilados dados de IPTU, ITIV e OODC relativos à área de 
estudo, e informações relevantes, como a metodologia de atualização da base 
de cálculo do IPTU realizada em 2014 e 2015; 
 à Secretaria de Planejamento Municipal – SEMPLA, em que foram levantadas 
informações sobre as receitas municipais e sobre os contratos das obras 
estruturantes desde o período de 2002. As informações permitiram a 
espacialização das intervenções e a tabulação de dados de contabilidade para 
comparativos. 
As técnicas de sensoriamento remoto e do geoprocessamento foram valiosas 
ferramentas para compilar as informações obtidas no campo e compor os mapas 
apresentados neste trabalho. As informações recebidas estavam agregadas ao 
sequencial de cada imóvel e ou aos bairros em que se encontravam inseridos, 
permitindo a criação dos mapas temáticos apresentados neste estudo. 
O Plano Diretor de Natal (Lei 82/07) possui alguns instrumentos de recuperação 
de mais-valias e de indução de desenvolvimento. Dentre eles está presente a 
Operação Urbana Consorciada – OUC, o Propriedade Territorial Urbana – IPTU 
Progressivo, Outorga Onerosa do Direito de Construir – OODC e a Transferência de 
Potencial Construtivo – TPC. Contudo, segundo as Secretarias de Meio Ambiente e 
Urbanismo e a de Tributação, o Imposto Sobre a Propriedade Territorial Urbana - IPTU 
Progressivo não foi implementado ainda no município, a TPC está em fase de revisão, 
visto que os processos finalizados desse instrumento apresentavam incoerências 
jurídicas e estavam sob demanda judicial, além de comporem um universo pequeno, 
frente ao recorte geográfico. E por último, a OUC está estudada dentro dos dados de 
OODC que foram fornecidos pela SEMUT. 
Embora existam muitas formas de recuperação e captura de mais-valias 
fundiárias urbanas no Plano Diretor e no Código Tributário, optamos por estudar os 
três instrumentos de recuperação de mais-valias aplicados em Natal-RN: o Imposto 
sobre a Propriedade Territorial Urbana – IPTU, o Imposto de Transmissão Inter Vivos 
– ITIV e a Outorga Onerosa do Direito de Construir. Isso, motivados pelo conteúdo 
dos dados levantados, que embora seja extenso, não permitiria ir além da análise 
destas três ferramentas. 
19 
 
O processo de análise foi assim sequenciado: em primeiro lugar, construímos 
um cenário de valorização urbana em que foi possível verificar onde ficam as áreas 
mais valorizadas e as menos servidas por atributos que favorecem a valorização do 
solo. Essa leitura foi possível, verificando a o lugar de concentração dos maiores 
volumes de construção, a verticalização, a população, as rendas, os pedidos de 
licenciamento e as atividades de prestação de serviços. Em segundo lugar, 
verificamos as áreas de maior incidência dos instrumentos de recuperação de mais-
valias fundiárias urbanas, em confronto comparativo com as áreas demarcadas, no 
Plano Diretor de Natal, como sendo de interesse social. Nessa etapa, a espacialização 
dos dados foi de grande importância, visto que permitiu verificar visualmente onde 
estão as maiores arrecadações de impostos, taxas e contrapartidas. Por último, 
analisamos a redistribuição dos valores arrecadados, baseados nas execuções e 
expectativas de implantação futura de equipamentos e infraestruturas que pudessem 
melhorar as condições e ambiências dos bairros menos valorizados. Com a 
espacialização dos endereços das obras públicas previstas e executadas, foi possível 
verificar se essas estão onde a população de rendas mais baixas está concentrada. 
Além disso, com os dados da contabilidade, houve também a possibilidade de verificar 
para onde os montantes investidos nas obras públicas foram direcionados. 
As informações levantadas foram pesquisadas e ou fornecidas por funcionários 
das secretarias citadas. Essas foram trabalhadas pelo autor deste estudo na tentativa 
de permitir a leitura mais amigável das informações e que essas pudessem dar lastro 
para as afirmações realizadas na conclusão. Optou-se por evitar o uso de tabelas e 
longas listas de informação com o objetivo de dar ao leitor uma experiência mais fluida, 
assim, todo o conteúdo de dados está apresentado em forma de mapas ou gráficos. 
 
20 
 
1 A RENDA DA TERRA: GERAÇÃO E APROPRIAÇÃO 
A abordagem proposta ancora-se no arcabouço teórico que subsidia a análise 
dos dados levantados na pesquisa. Antes, porém, consideramos necessário fazer 
uma rápida ponderação sobre o que se entende por renda da terra no espaço urbano, 
ondeela é negociada como bem. Isso porque, a princípio, a terra é percebida como 
um meio de produção e não como uma mercadoria qualquer. Na cidade, o solo urbano 
mostra-se detentor das duas qualidades: a de produto e a de meio de produção, 
tornando-se uma mercadoria especial1. O objetivo desta seção é compreender a 
formação da renda da terra no meio urbano, um saber que possibilitará o 
desvendamento dos fatos geradores de impostos, taxas e contrapartidas, que serão 
confrontados com os dados da pesquisa decampo, nos capítulos seguintes. 
Os dados de campo são levantamentos numéricos de impostos e 
contrapartidas pagas, que têm por base os direitos de utilização e produção no solo 
urbano. A teoria da renda da terra, embora não seja notada de forma muito evidente 
nestes montantes, ajuda a entender por que as alíquotas de cobranças são diferentes, 
esclarecendo o porquê de existirem emolumentos diferentes para a utilização, a venda 
e a produção construtiva no solo urbano. 
Para além disso, os instrumentos arrecadatórios, que são estudados neste 
trabalho, têm origem na renda auferida por meio da utilização do solo urbano. Têm 
características que permitem a indução do crescimento e a ocupação da cidade e por 
isso se mostram como importantes ferramentas de planejamento urbano, se estiverem 
bem integrados com outras políticas públicas. Tanto que o Estatuto da Cidade (Lei 
10.257/01) possui alguns dos chamados instrumentos da política urbana diretamente 
 
1Segundo Harvey (2013), a Terra é considerada mercadoria especial porque, embora tenha valor de uso, não pode 
ser reproduzida, nem levada ao mercado. O que é negociado nas trocas por terra são as qualidades que ela possui, 
do ponto de vista construtivo ou produtivo, e os direitos de utilização. Para Singer (1982, p.23), o uso do solo é 
uma mercadoria sui-generis, cujo preço tem origem no acesso à utilização do espaço. 
21 
 
relacionados com este estudo, como o IPTU Progressivo no Tempo e Outorga 
Onerosa do Direito de Construir. 
 
1.1 RENDA DA TERRA – A TERRA COMO FONTE DE RENDA 
 
A Teoria da Renda da terra explica a forma pela qual o proprietário da terra 
consegue auferir renda, como forma de retorno/compensação pela posse ou 
propriedade da terra. Para uma compreensão desse processo, torna-se necessário 
apropriar-se de saberes que envolvem alguns temas e conceitos básicos da teoria da 
renda fundiária2. Começaremos por apresentar o delineamento teórico do que se 
entende, nesta dissertação, por rendada terra. Considerando essa perspectiva, 
situaremos a definição de sobrelucros advindos de localizações e externalidades, com 
a discussão sobre os valores de uso e de troca, para chegar aos tipos de renda. 
As necessidades de cada sociedade refletem-se nas formas de produção e 
consumo de bens (mercadorias). Nesse processo, o “lado material das mercadorias é 
capturado em sua relação com os desejos e necessidades humanos pelo conceito do 
valor de uso” (HARVEY, 2013, p. 47, grifo do autor). A utilidade de uma mercadoria 
torna-a desejável na sociedade, seja a sua utilização real ou simbólica, servindo ou 
não para representar status. Há dois aspectos que devem ser notados ao definir-se o 
valor: um quantitativo, outro qualitativo. Depois de estabelecido o valor de uso, o 
mercado, exprimindo as necessidades sociais, poderá estabelecer o valor de troca 
agregado ao produto. Os valores de uso e troca não têm significado sem as relações 
sociais que os delineiam. O valor de troca seria a relação quantitativa entre 
mercadorias, definindo, assim, como as quantidades de uma mercadoria que 
correspondem à outra, possibilitando determinar a quantidade de moeda a que cada 
bem corresponde (HARVEY, 2013). 
 
2Os termos Renda da Terra e Renda Fundiária são frequentemente utilizados pelos autores consultados para 
descrever o mesmo fenômeno. 
22 
 
A terra, em si, por ser um bem não reprodutível, não possui valor3, mas possui 
preço. Apesar dessa menção, não cabe aqui discorrer sobre o valor gerado a partir do 
trabalho, descrito por Marx, já que este estudo trata de solo urbano e da forma de 
geração de renda da terra (RIBEIRO, 1997). A terra in natura, mesmo não sendo uma 
mercadoria, adquire um preço regulado pelo mercado. 
Dessas relações de troca é que surge o mercado, local onde o solo é negociado 
e as relações de disputa pelo acesso à terra e as localizações privilegiadas 
possibilitam aos proprietários determinarem preços, situação em que “o preço da terra 
é somente um reflexo da disputa entre os diversos capitalistas pelo controle das 
condições que permitem o surgimento dos sobrelucros” (RIBEIRO, 1997, p.40). 
Inseridos no preço, os sobrelucros que as diferenças de localização propiciam ficam 
mais perceptíveis quando da diferença entre o lucro final obtido e o lucro médio das 
outras operações econômicas. Jaramillo (2003) afirma que o sobrelucro só existe se 
no mercado houver alguma espécie de preço unitário que sirva de referência, ou, 
como denominado por Ribeiro (1997), um preço médio para a negociação de um 
terreno. Só é possível verificar quão vantajosa é uma transação se houver algum tipo 
de preço de referência que nivele a maioria dos terrenos em uma externalidade e 
permita identificar aqueles que possuem alguma vantagem locacional. 
No caso do solo urbano, o “preço do solo é o instrumento de mercado 
fundamental na organização espacial da produção capitalista em geral e na grande 
aglomeração urbana em particular” (DEÁK, 1987, p. 01). Ao lucro médio, determinado 
pelo mercado, somam-se os custos de produção e matéria prima, para quantificar a 
renda. No momento da negociação no mercado, a escassez do produto e sua 
capacidade de utilização irão determinar se esse alcançará, além do lucro esperado 
e "justo”, algum excedente de ganhos advindo de particularidades do terreno. Se o 
negociador conseguir realizar uma troca de seus produtos por preços mais elevados 
que a média, e considerando que a força de trabalho já foi paga, poderá o lucro total 
da negociação possuir alguma parcela de sobrelucro, que é a faixa do lucro acima do 
 
3 Valor é definido como sendo o tempo de trabalho socialmente necessário para a produção de mercadorias. A 
terra não pode ser produzida com trabalho, o que a torna uma Mercadoria Especial (MARX, 2013). 
23 
 
lucro médio que foi gerada por alguma característica diferenciada da externalidade do 
terreno. O sobrelucro, por si só, não existe; depende necessariamente dos valores de 
uso e troca e é determinado no momento da negociação das mercadorias, por ter uma 
parcela de especulação do mercado ante a oferta e a procura de determinado produto 
(RIBEIRO, 1997). Assim, o sobrelucro− em sendo ele uma possibilidade de ganhos 
advinda da localização −é criado em sociedade no contexto da interação do processo 
produtivo até a comercialização, sofrendo interferência direta dos investimentos 
públicos, visto que a infraestrutura e as externalidades do terreno são a base para sua 
determinação. 
Para entender um pouco mais o fenômeno que dota o solo urbano de preços 
diferentes, possibilitando à formação do preço e desse sobrelucro ─ e como a 
sociedade pode e deve participar de alguma forma das rendas geradas advindas do 
solo urbano ─ faz-se necessário, antes, saber como a propriedade imobiliária adquire 
um preço ou as características que a dotam de valor de troca e de uso. 
 
A Teoria da renda fundiária resolve o problema de como a terra, que não é 
um produto do trabalho humano, pode ter preço e ser trocada como uma 
mercadoria. [...] O que é comprado e vendido não é a terra, mas o direito à 
renda fundiária produzida por ela (HARVEY, 2013, p. 471). 
 
O tema da renda da terra em solo urbano é complexo, em virtude das variações 
e dos efeitos decorrentesde interações e valores sociais envolvendo o terreno e sua 
externalidade. Contudo, é possível elencar alguns fatores que permitem reconhecer 
quando uma gleba, que está inserida em uma localidade que a tornam mais vantajosa, 
é mais adequada a um tipo de uso do que outra. Esses fatores, que são de ordem 
quantitativa ou qualitativa, assinalam as variações entre terrenos, considerando, 
comparativamente, o ambiente, o meio natural ou antrópico, os equipamentos urbanos 
próximos ou distantes e até as condições favoráveis (ou não) de uma área, 
concernentes à promessa de um bom ritmo de crescimento. (HARVEY, 2013) 
A renda no solo urbano apresenta-se de três formas as quais variam de 
classificação e relevância, quando se muda o referencial de comparação. Um terreno 
24 
 
comparado a outro dentro de um mesmo bairro propicia a leitura, sob uma ótica de 
classificação de rendas, que pode mudar se ele for comparado a outro terreno em um 
bairro ou cidade diferente (SINGER, 1982; JARAMILLO, 2003). Mesmo com essa 
variação e com um pouco de subjetividade na leitura das formas de renda que incidem 
sobre um lote, esta discussão serve de exercício analítico para compreender como os 
preços se formam e qual é a lógica da influência dos investidores capitalistas, dos 
proprietários e da sociedade na construção dos preços de terrenos. A comparação de 
alguns aspectos e características dos terrenos possibilitam agrupar as formas de 
renda para compreender como esta se forma. As rendas podem ser divididas em três 
tipos: diferenciais, de monopólio e absoluta. 
A renda absoluta origina-se na propriedade privada do solo e resulta da 
diferença entre os interesses do proprietário e os da sociedade como um todo4. Para 
Singer (1982) e Ribeiro (1997, p. 61), a renda absoluta é “a explicação da renda 
gerada no pior terreno”. Botelho (2007) complementa essa percepção dizendo que o 
proprietário da terra troca o valor de uso do solo por um preço que acha justo, e esta 
renda pode ser embolsada por ele, em períodos determinados, por meio de 
arrendamentos, de aluguéis e de venda. Em um contexto geral, na cidade, até o pior 
terreno possui algum valor de uso e, portanto, possibilita a realização de alguma 
renda, que é chamada de absoluta. 
Observa-se o fato de que a escassez de terrenos em determinadas áreas cria 
confusão no entendimento das rendas absolutas e de monopólio, quando ocorre do 
“pior terreno”, em uma área de escassez de solo, ser negociado. Jaramillo (2003) 
sugere que a renda ao proprietário, ao mesmo tempo, é absoluta, devido ao fato de o 
proprietário ser o detentor do direito de usar a área; e de monopólio, devido a raridade 
de terrenos em uma localidade. Contudo a renda absoluta está vinculada à 
propriedade, enquanto a de monopólio está vinculada a externalidades. Portanto, “a 
renda absoluta distingue-se da renda do monopólio, por dar origem ao preço de 
 
4 Por sociedade entenda-se o grupo que precisa utilizar o solo para moradia e produção. 
25 
 
monopólio, enquanto um preço de monopólio determinado independentemente 
permite que se ganhe renda de monopólio” (HARVEY, 1980, p. 155). 
É importante ressaltar que as formas de renda são encontradas, 
concomitantemente, em um mesmo terreno. O contexto da análise é que irá 
diferenciar cada uma delas. Assim, um terreno à beira mar possui uma forma de 
exclusividade da paisagem e também um preço mínimo a ser pago por ele, se 
comparado a terrenos em outra localização. 
A renda de monopólio está baseada em um atributo do terreno que não pode 
ser reproduzido e que agrega alguma característica positiva a ele, tornando-o capaz 
de gerar lucros extraordinários advindos desta característica não reprodutível. 
(BOTELHO, 2007). Singer (1982, p. 27) esclarece que “o acesso a serviços urbanos 
tende a privilegiar determinadas localizações em medida tanto maior quanto mais 
escassos forem os serviços em relação à demanda”. Alguns exemplos mais comuns 
são as paisagens naturais e as formações topográficas e hidrológicas. 
 
A renda de monopólio surge porque é possível gravar um preço de monopólio 
“determinado pela avidez do comprador em comprar e capacidade de pagar, 
independentemente do preço determinado pelo preço geral de produção, 
tanto como pelo valor do produto” (Capital, volume 3, 775). A oportunidade 
de cobrar preço de monopólio cria oportunidade para o proprietário obter 
renda de monopólio (HARVEY, 1980, p. 153, grifo do autor). 
 
A escassez de terrenos em uma determinada localização da cidade também 
propicia a renda de monopólio devido à posse de uma externalidade que, sendo uma 
construção social, somatória de esforços e ações coletivas (cultura, história etc.), não 
permite ser reproduzida. Ribeiro (1997, p. 67) afirma que [...] “o preço do monopólio 
está fundamentado na não-reprodutibilidade de um valor de uso”- opinião corroborada 
por Singer (1982). 
Devido à característica de não-reprodutibilidade do solo e de sua externalidade, 
para aproveitar mais localizações em situação de escassez, a multiplicação da área 
do terreno original é realizada, artificialmente, com a verticalização. Na cidade, a ela 
26 
 
é permitida, por meio de legislações específicas, planos diretores e zoneamentos, 
criando uma variação de “fertilidade” ou como é conhecida a capacidade construtiva 
de um terreno, coeficiente de aproveitamento. Se na propriedade rural a fertilidade de 
um terreno é medida através de seu potencial de produção de mercadorias agrícolas, 
no solo urbano é medida pela capacidade construtiva ─ que é o quanto se pode ter 
de área construída ─ localização e externalidades. 
Como sabemos, o conjunto de externalidades de um local não pode ser 
reproduzido em sua totalidade; por isso mesmo, é possível observar o terceiro tipo de 
renda, a diferencial, que é assim chamada porque se origina da diferença entre o 
preço individual de uma propriedade e o preço geral de outras propriedades. Esse tipo 
de renda está relacionado ao fato de um capitalista/proprietário utilizar gratuitamente 
condições excepcionais de produtividade, que estão vinculadas à localidade e ao seu 
entorno (no caso de propriedades territoriais), e se diferenciam das outras, porque 
podem ser replicadas com a aplicação de investimentos. (RIBEIRO, 1997; SINGER, 
1982). Harvey (2013, p. 155), nessa mesma linha de raciocínio, afirma que “a renda 
diferencial assume seu significado em um espaço relativo que é estruturado por 
diferenciais em capacidade produtiva, em localizações diferentes, e que é integrado, 
espacialmente, através das relações de custo de transporte”. 
Essa modelagem de renda subdivide-se em dois tipos: a RD-1 (renda 
diferencial tipo 1) e a RD-2 (renda diferencial tipo 2). Para Jaramillo (2003), essas 
rendas, diferencial tipo I e II, no solo urbano, estão ligadas à acessibilidade do terreno 
e à sua fertilidade5, respectivamente. Transporte, acessos viários e distância dos polos 
centrais influenciam a criação de um diferencial na renda auferida pelo proprietário, 
que não se mistura ou confunde com as rendas de monopólio ou absoluta, já que 
estradas e acessos podem ser replicados: “a localização é decisiva para a formação 
dos preços dos terrenos nas cidades” (JARAMILLO, 2003, p. 20). 
Botelho também afirma que 
 
5 No espaço urbano, a fertilidade é entendida como a capacidade construtiva do terreno, instituída através das leis 
de uso e ocupação das cidades brasileiras. (JARAMILLO, 2013). 
27 
 
 
[...] entre os fatores que contribuem para aumentar ou diminuir a 
desigualdade dos resultados da aplicação de capital e trabalho no solo, 
temos: a fertilidade, a localização da terra, a distribuição dos impostos, 
desigualdade na repartição de infraestruturas (pública ou privada) investida 
na terra, entre outros (BOTELHO, 2007, p. 73). 
 
Portanto,um terreno bem localizado, do ponto de vista legal, que permita um 
volume de construção adequado ao contexto onde está inserido, que tenha agregado 
a ele uma boa externalidade, terá um preço diferenciado dos lotes próximos que não 
agreguem as mesmas qualidades. 
Harvey (2013, p. 456) observa que “é bem mais fácil apresentar a versão da 
RD-2 separada da RD-1. Ela simplesmente expressa os efeitos das aplicações 
diferenciais do capital a terras de igual fertilidade”. Para Jaramillo (2003, p. 20), a RD-
1 evidencia-se pelos “custos de transporte para a produção do espaço construído” e 
as externalidades (como infraestrutura e serviços urbanos), além da proximidade com 
elementos naturais e ou construídos que diferenciem a localização escolhida. Já a 
RD-2estaria ligada à capacidade de utilização do terreno frente a condicionantes 
legais, vinculada, por exemplo, a leis de uso e ocupação do solo, que permitam ao 
empreendedor investir mais dinheiro para “criar solo” e construir mais,6 fazendo um 
paralelo direto entre fertilidade e capacidade construtiva. Em deriva, obtém-se um 
número maior de unidades a serem comercializadas, na medida em que se aproveita 
melhor a situação geográfica e de acesso e proximidade a serviços, transporte e 
demais amenidades que um terreno apresenta em relação a outro (JARAMILLO, 
2003). 
Traçando um perfil identitário para esses tipos de renda, podemos associar a 
RD-1 aos diferentes custos de transporte e aquisição de materiais de construção para 
 
6 Previsto no Estatuto da Cidade, Lei 10.257/2001, como Outorga Onerosa do Direito de Construir. Instrumento 
que permite um fenômeno chamado de solo criado, ou verticalização. 
28 
 
imóveis dentro e fora do perímetro urbano ou até de áreas onde as vias ainda não 
estão pavimentadas. Em tal quadro, podem-se gerar custos adicionais para a melhoria 
do acesso dos trabalhadores e para o transporte dos materiais, mesmo antes do início 
das obras. A RD-2 caracteriza-se pelas diferenças de preços dos terrenos urbanos 
nas diferentes zonas dos planos de uso e ocupação dos solos dos municípios e pela 
possibilidade do pagamento de contrapartidas opcionais utilizadas para adicionar área 
construída aos projetos pretendidos. Assim, um terreno que está em uma área com 
maiores coeficientes de utilização, normalmente é mais valorizado que os localizados 
em áreas mais restritivas, considerando-se que outros fatores, como externalidades, 
sejam equivalentes. Parte do preço total do terreno é a renda diferencial que foi 
propiciada por uma condição de “fertilidade” mais vantajosa que a dos demais 
situados em áreas próximas, mas fora da mesma zona edificável. 
Mas vale ressalvar o fato de que, embora consideremos essa possibilidade de 
caracterização, os diversos tipos de renda são formulações teóricas, abstratas, não 
sendo possível configurá-las isoladamente, dada a sua coexistência e a variação de 
suas proporções no preço de um imóvel, quando comparamos terrenos em situações 
diferentes ou semelhantes. Ao analisarmos lotes na mesma localidade, com a mesma 
externalidade, constatamos pequenas diferenças de preço e percebemos um padrão 
semelhante nas formas de rendas. 
Levando em conta tais ponderações, podemos estudar a localização, que é 
uma das formas de perceber como alguns aspectos influenciam positiva ou 
negativamente os preços de um terreno. A localização reúne características, não 
replicáveis em sua totalidade, que permitem a comparação entre propriedades 
fundiárias, estabelecendo um ranking de classificação dos melhores terrenos, em 
virtude das rendas que podem gerar (para o utilizador) o potencial valor de uso do 
terreno para os negócios ou outra utilização desejada. 
As análises teóricas sobre a origem do preço do solo, do sobrelucro e dos tipos 
de renda revelaram-se, como visto, um exercício necessário para a compreensão de 
alguns instrumentos de planejamento e controle do mercado de terras de uma cidade. 
Também, por via desse conhecimento, torna-se possível fazer o diagnóstico de quais, 
29 
 
dentre esses instrumentos, devem ser utilizados para a recuperação de mais-valias 
fundiárias urbanas, sempre com base nos fatos geradores das rendas. 
 
1.2 A LOCALIZAÇÃO – A EXTERNALIDADE COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL 
 
As formas através das quais a renda da terra se apresenta são balizadas pela 
valoração das características de cada propriedade fundiária, há então, no mercado 
imobiliário, a determinação do preço do lote. Dentre essas características, podemos 
elencar duas como sendo as mais significativas: a capacidade produtiva e o local onde 
se situa. Uma determina os limites de aproveitamento do terreno e a outra determina 
o custo do deslocamento para acesso dos consumidores a externalidades positivas, 
como amenidades na forma de equipamentos e infraestruturas urbanas e formações 
ambientais e paisagísticas (CUNHA; SMOLKA, 1978). 
A capacidade produtiva ou fertilidade do solo da propriedade rural é substituída, 
no ambiente urbano, pelos condicionantes legais de uso e ocupação do solo, que 
dotam os terrenos de maior ou menor possibilidade de realização de atividades e ou 
construtibilidade. O Estado atua como regulador e cria condições para exploração de 
seu território; nesse contexto, a localização urbana, devido a peculiaridades legais, 
reúne duas características: a capacidade produtiva e o tempo de deslocamento7. 
A localização na cidade é um fenômeno crucial: influencia e é influenciado por 
todos os outros componentes que, agregados, formam externalidades. Na economia 
urbana, é um dos fatores que mais condicionam e possibilitam a geração de renda. 
Distância e tempo de deslocamento definem as vantagens de um terreno. Boas 
localizações são raridades na cidade, mas são determinantes para cada tipo de 
empreendimento (GOTTDIENER, 1997). A proximidade de serviços e ambientes pode 
ser negociada; entretanto, é dificilmente reproduzida por apenas um único produtor 
 
7Isso considerando que na cidade não existirá produção agrícola, e que o aproveitamento dos terrenos é 
condicionado pelas legislações de uso e pela ocupação do solo locais, conforme estabelecido na Constituição 
Federal de 1988 e no Estatuto das Cidades de 2001. 
30 
 
do espaço urbano. Ribeiro (1997, p. 67) explica que “o preço do monopólio nasce de 
o fato de alguém ter produzido um valor de uso especial, alguma coisa que os outros 
agentes capitalistas não podem (ou só parcialmente podem) reproduzir”. Dessa forma, 
as intervenções públicas e privadas, e/ou a ausência delas, dotam determinadas 
áreas da cidade de mais ou menos infraestruturas e serviços, valorizando de forma 
desigual as propriedades por sua capacidade de acesso a esses serviços. 
Como consequência, numa situação concreta, alguém que procura, no 
mercado de terras, uma gleba onde inserir seu empreendimento (para morar ou 
produzir) e paga pelo uso do terreno, está, na verdade, pagando pelo uso da 
localização, uma vez que se trata de um preço composto por diversos itens e aspectos 
como distâncias, capacidade produtiva, paisagem agregada. Villaça (2001, p.74, 75 e 
79) afirma que “O preço da terra urbana tem, portanto, dois componentes. Um que 
decorre do seu preço de produção, e outro que é um preço de monopólio”, advindos 
dos efeitos de influência da localização e do entorno (SINGER, 1982). Na visão de 
Ribeiro (1997, p. 47), 
 
[...] a concorrência entre as empresas na busca do controle das 
condições que permitem o surgimento de sobrelucros de 
localização gerará uma competição pelo uso do espaço urbano, 
gerando uma tendência à concentração espacial das atividades 
e, consequentemente, dos equipamentos e da infraestrutura. 
 
Segundo VILLAÇA (2001), o sistema de localizações, que se estabelece com 
o passar do tempo e o acúmulo de intervenções espaciais, define o “bomponto” e o 
que é “fora de mão”8. Ele atribui a expansão urbana e o direcionamento da ocupação 
da cidade aos interesses da classe dominante e entende ser “um equívoco a ideia de 
 
8“Bom ponto” e “ponto fora da mão” são termos usados por Villaça, em sua obra, para exemplificar como a 
localização pode ser expressa por uma centralidade. Basicamente se refletem em boas e más localizações, se 
associadas ao que se busca produzir e a população a que se destina. 
31 
 
que a terra urbana é dom gratuito da natureza, de que por isso não tem valor ou não 
é possível controlar sua oferta” (VILLAÇA 2001, p. 313). Singer (1982), corroborando 
esse parecer, alega que as “vantagens locacionais” geralmente estão mais acessíveis 
para os grupos com maiores rendas. 
Decompondo a chamada localização, percebe-se que as melhores e piores 
áreas da cidade possuem características que podem ser identificadas com certa 
facilidade. Harvey (1980) afirma que, no sistema urbano, a acessibilidade e a 
proximidade estão diretamente ligadas à capacidade de uma propriedade fundiária 
gerar renda. Em sua concepção, acessibilidade diz respeito ao fato de um terreno 
estar perto ou possibilitar deslocamento rápido para dar acesso a oportunidades de 
emprego, recursos e serviços. A proximidade, por sua vez, define-se pela perspectiva 
de influência de alguns equipamentos públicos e privados na ambiência em que o 
terreno se localiza. 
Em contrapartida, para além da proximidade e da acessibilidade, há outro fator 
que interfere nas escolhas por terrenos na cidade. Harvey (1980) discorre, por 
exemplo, sobre os efeitos das externalidades, as quais podem surgir de ações e 
omissões, tanto públicas quanto privadas. A externalidade é o efeito criado por 
equipamentos, manutenção e ambiências no cenário urbano, que tendem a valorizar 
ou desvalorizar uma área. Como as ações e omissões de diferentes agentes 
produtores do espaço urbano, públicas e privadas não são homogêneas no tecido 
urbano, não influenciam por igual todos os terrenos. Um shopping center pode 
influenciar de forma positiva seu entorno; já um ponto de coleta de lixo reciclável atingi-
lo-ia de forma negativa; “portanto, o significado dos efeitos de externalidade para uma 
análise econômica da estrutura urbana não pode ser desprezado” (HARVEY 1980 P. 
47). 
Abramo (2007), fazendo uma análise do mercado imobiliário, considera que a 
localização é um fator determinante na escolha de investimentos ou moradia. Para 
ele, “o que norteia é a ideia de que as escolhas buscam, acima de tudo, uma 
externalidade de vizinhança, ou melhor, sinergias associadas à proximidade de 
famílias do mesmo tipo e recursos semelhantes” (ABRAMO, 2007, p. 109). Essa forma 
de escolha por proximidade de famílias está ligada aos efeitos de externalidade que 
32 
 
as diferentes comunidades e divisões sociais evidenciam na cidade, o que vai ao 
encontro, de forma complementar, do pensamento de Harvey (1980). 
Sobre a externalidade, pode-se ainda acrescentar alguns exemplos como os 
trazidos por Mariana Fix (2007), que estuda o agrupamento de comunidades 
corporativas (empresas) e relata o esforço de São Paulo em construir um ambiente 
de negócios, externalidade capaz de firmar a cidade no circuito econômico mundial. 
Nesse estudo, a autora descreve intervenções do Estado em busca de transformar 
aquela metrópole em um local moderno e bem servido de infraestruturas e serviços 
corporativos e gerais, no que tange ao ambiente urbano. Esse tipo de iniciativa do 
Estado muitas vezes é necessário, porque, segundo Botelho (2007), existe uma 
tendência entre os capitalistas de não investirem sozinhos em uma área ou 
empreendimento com o intuito de valorizá-lo. Preferem aguardar para tirar vantagem 
das intervenções uns dos outros. Observa-se esse movimento na descrição feita por 
Fix (2007), quando ela afirma que o Estado cria um ambiente de negócios, com 
vantagens e infraestruturas específicas para atrair investidores. Tal pensamento é 
corroborado por Singer (1982) ao descrever a tendência de concentração urbana em 
espaços onde as vantagens locacionais favorecem um determinado tipo de atividade. 
Contudo, nem sempre o Estado precisa investir ou intervir, de forma tão concentrada, 
como se ilustra com o exemplo de São Paulo, para criar ambiências. Afinal, todas as 
vezes em que as comunidades se agrupam territorialmente na cidade, uma ambiência 
se forma possibilitando uma determinada externalidade. 
Harvey (1980) e Singer (1982) esclarecem que a facilidade de acesso a 
serviços e à infraestrutura urbana, como ruas pavimentadas, esgotamento sanitário, 
drenagem, entre outros, cria espaços e locais com privilégios e rendas de monopólios. 
Essa facilidade de acesso, em alguns casos, pode ser criada quando alguém constrói 
ou melhora vias. A necessidade de investimento para viabilizar o uso do solo evidencia 
as rendas diferenciais, uma vez que os terrenos já servidos por vias, e em situações 
semelhantes, não obrigam os empreendedores a investir mais capital para viabilizar 
obras. 
33 
 
O conjunto de externalidades9permite o aumento das rendas fundiárias na 
abrangência de suas áreas de influência. A capacidade de gerar rendas mais elevadas 
é descrita, embora com outras palavras, na obra de Villaça (2001), quando explica o 
que chama de bom ponto. Trata-se de um lugar na cidade dotado de características 
únicas, que o valorizam, reafirmando ser a localização um fator chave para entender 
a valorização do solo urbano. Para esse autor, “o valor de uso oriundo da força 
produtiva social do trabalho da aglomeração cidade consiste no valor de uso das 
localizações” (VILLAÇA, 2001, p. 77). 
Via de regra, localizações são escolhidas por agentes de visão capitalista como 
incorporadores, empreendedores e mesmo consumidores. Seja para residência, seja 
para produção, ou para prestação de serviços, no processo de escolha, o fator 
distância parece ser preponderante para as decisões da sociedade. As externalidades 
de Harvey (1980) e Abramo (2007), o chamado bom ponto, de Villaça (2001), e as 
infraestruturas e conjunturas urbanas descritas por Singer (1985), Botelho (2007) e 
Fix (2007), quando convergem para um mesmo lugar, revelam o significado do que 
chamamos de localização. Abramo (2007) acredita que existe uma convenção urbana 
para a aquisição e utilização de terrenos na área urbana; mas admite que, além da 
importância da localização, como fator físico dentro do território, o mosaico urbano só 
é viável com a ajuda de todos os agentes e atores que compõem a sociedade, já que 
os espaços são criados, porém devem ser “consumidos” para reproduzir o capital. 
Essa convenção urbana, nos termos de Abramo (2007), trata da análise das 
escolhas de investimento e aquisição de imóveis para moradia na área urbana; 
todavia, o termo é utilizado para descrever um padrão de comportamento dos 
investidores e compradores no momento de alocar seus recursos em um imóvel. Essa 
ótica demonstra uma tendência coletiva que distingue locais e vizinhanças 
consideradas adequadas em suas visões. Segundo observamos, há em comum entre 
 
9 A tradução da obra de Harvey (1994) registra o termo exteriorização associado a efeitos de influência de 
determinados equipamentos urbanos, públicos ou privados, em uma vizinhança. Já Abramo (2007) emprega 
externalidade em referência a famílias e investidores de um determinado nível social. 
34 
 
todos os autores alguma espécie de convenção, uma reunião de fatores que parece 
eleger localizações como boas ou ruins. 
Compõem o que aqui se denomina de localização, a cultura, as comunidades, 
a legislação, as centralidades, o acesso aos meios de transporte, as influências diretas 
e indiretas de equipamentos e infraestruturas instaladas. Essas características 
influenciam diretamentena apropriação da renda da terra. Para além disso, vale 
ressaltar que a cidade informal também contribui na leitura dos lugares e na 
composição da externalidade. As ocupações e as comunidades informais têm peso, 
quando observamos a ambiência de uma localização e as áreas irregulares; na 
prática, não deixam de possuir acessibilidade, proximidade e de gerar externalidades, 
fazendo parte ativa na dinâmica da economia do solo urbano. 
Fica assim evidente o fato de que, independentemente da origem ou do objetivo 
da análise dos autores referenciados, há um consenso em conceber a localização 
como um fator determinante na produção do espaço urbano, o que, em decorrência, 
induz ao entendimento de que a construção social dos espaços não poderia ser 
realizada apenas por um só agente, vez que se tornaria muito difícil reproduzir-se a 
mesma ambiência com os mesmos efeitos. Assim, faz-se necessário que a política de 
gestão pública dos espaços formados pelas localidades ponha em prática a 
redistribuição dos ônus e dos bônus advindos da construção coletiva. A necessidade 
de mediação do Estado justifica-se pelo fato de os equipamentos e as infraestruturas 
que contribuem comas externalidades serem fruto de uma construção coletiva, seja 
com recursos públicos, seja com recursos privados. Em princípio, o reflexo dessas 
ações representa os anseios da sociedade buscando o equilíbrio e a melhoria da 
qualidade de vida em geral. 
Vale ainda esclarecer que, embora seja importante a leitura do espaço 
construído, a localização, como mercadoria de natureza especial, só será consumida 
se houver uma vontade coletiva articulada. Podemos, então, pressupor que, em sendo 
uma construção social alinhada aos preceitos estabelecidos pelas legislações urbanas 
atuais, os bônus e os ônus daí recorrentes devem ser redirecionados para equilibrar 
situações de discrepância socioespacial. Encontramos aí a justificativa para a 
variação de alguns impostos urbanos, que servem para regular e possibilitar a 
35 
 
redistribuição das riquezas e benefícios criados por esse constructo a que 
denominamos cidade (CUNHA; SMOLKA, 1978). 
O reconhecimento de que a localização e as rendas só são possíveis com a 
interação na sociedade, foi positivado em nossa legislação. No Brasil, as legislações 
e os movimentos de reforma urbana trazem, desde a consolidação da Constituição 
Federal (1988) e do Estatuto da Cidade (2001), os princípios de equilíbrio e 
redistribuição dos ônus e bônus da cidade, permitindo aos responsáveis por essa 
gestão atuarem para garantir a ação. Daí a importância de compreender essas 
demarcações teóricas para que se viabilize a análise das políticas subjacentes às 
ferramentas de recuperação de mais-valias urbanas fundiárias utilizadas no Brasil. 
 
1.3 OS PRODUTORES DO ESPAÇO 
 
Procurou-se, até aqui, aproximar a teoria da renda da terra, que explica como 
as rendas fundiárias funcionam, à da localização, que buscou evidenciar como o 
espaço é construído socialmente e cria pontos mais privilegiados que outros. 
Chegamos ao momento onde identificamos quem são os agentes que produzem este 
espaço urbano para que se perceba quem e como acontecem os ganhos, capitalistas 
ou não, advindos de intervenções estatais na cidade. O objetivo não é o de discutir a 
legitimidade ou pormenorizar as teorias sobre os agentes, mas sim, identificar quem 
são e por qual meio eles auferem os ganhos. 
Se pretendemos deixar claro o que concebemos como construção social das 
localizações na cidade, faz-se imprescindível, antes, entender o que significa mercado 
imobiliário e quem são seus agentes. Tal propósito direciona-nos à compreensão de 
que os agentes produtores do espaço, que visam à reprodução de seus capitais, 
buscam a realização de seus objetivos no ambiente chamado mercado, espaço em 
que 
 
[...] esses agentes econômicos realizam trocas de bens e serviços por uma 
unidade monetária ou por outros bens. Sendo assim, o mercado pode ser 
36 
 
caracterizado como um conjunto de compradores e vendedores que atuam 
interagindo com a finalidade de comprar e vender seus produtos ou serviços 
(MATOS e BARTKIW 2013, p. 11). 
 
O mercado imobiliário é o setor que atua sobre os imóveis. A propriedade 
imobiliária é uma mercadoria especial diferenciada, que não é levada a um lugar físico 
para ser negociada; o que é negociado no chamado mercado imobiliário são os 
direitos de propriedade e ouso (REYDON, et al., 2006). As notas de Valença (2010, 
p. 168) complementam essa afirmação, lembrando que um bem imóvel possui “fixidez 
geográfica”, não permitindo ser deslocado para outra localidade, estando, portanto, 
sujeito à externalidade na qual se insere. Para esse mercado funcionar, faz-se 
necessária a existência dos que vendem e dos que compram a terra, adquirindo o 
direito de usá-la, e assim criar rendas que são apropriadas de diversas formas, em 
vários momentos, desde a negociação até a utilização do terreno. 
 
[...] presume-se que os mercados fundiários são competitivos no sentido de 
que nenhum agente pode individualmente afetar os preços relevantes para a 
decisão locacional. Ou seja, requer-se a existência de um número 
suficientemente grande de competidores pelo uso do solo. Com isso, todos 
os ganhos de produtividade seriam repassados ao proprietário do solo, na 
forma de rendas (CUNHA; SMOLKA, 1978, p. 42). 
 
Está claro o fato de que a cidade e o mercado do solo urbano são criações 
coletivas, o que impede um agente isolado de poder, sozinho, criar preços ou gerar 
rendas. Além disso, a forma de produção capitalista do espaço cria diferenças nas 
distribuições de renda, e isso se reflete concretamente na cidade sob diversas formas 
de ocupação e de uso, criando espaços com grandes discrepâncias de exterioridade 
e qualidade de vida (SINGER, 1982, 1985; HARVEY, 1980; BOTELHO, 2007). 
A localização e as exteriorizações produzidas coletivamente na cidade geram 
rendas. “Há um aumento de valor – criação de valor –, que é fruto do trabalho 
socialmente necessário despendido na construção da via e na produção de todos os 
37 
 
pontos que a ela possam ser contatados – todos os pontos do espaço construído” 
(VILLAÇA, 2001, p. 80). Esse valor que se torna renda é apropriado de diversas 
formas e por diversos produtores do espaço urbano, descritos a posteriori.10 
Ao afirmar que “o espaço e a localização aparecem como fontes ativas de mais-
valor para capitalistas individuais”, Harvey (2013, p. 502) refere-se a um grupo de 
agentes que interage na produção do espaço, recebendo renda de diversas formas 
em momentos diferentes das negociações imobiliárias. “Os proprietários de terra 
recebem renda, os empresários recebem aumentos de renda baseados nas 
melhorias, os construtores ganham o lucro do empreendimento, os financistas 
propiciam capital monetário em troca de juros” (HARVEY, 2013, p. 503). Esse 
pensamento é corroborado por Botelho (2007), para quem o setor imobiliário envolve 
participantes, como consumidores, agentes financeiros, empresários, construtores e 
proprietários de terras. Cunha e Smolka (1978), em seu estudo, refere-se apenas a 
produtores capitalistas, englobando todos os agentes que envolvem o processo de 
produção do espaço urbano, diferenciando, em alguns momentos, o proprietário de 
terras, que nem sempre será um produtor, mas recebe tributo pelo uso de sua 
propriedade. 
Ribeiro (1997), por sua vez, descreve como relação de troca o que existe entre 
esses dois grupos, os produtores capitalistas (empresários, corretores e financistas), 
na figura de incorporadores, e os proprietários de terras, detentores dos direitos sobre 
o uso da terra. De forma complementar, Abramo (2007) cita agentes que, por vezes, 
são esquecidos: os consumidores e os pequenos investidores. Em sua obra, aponta 
o consumidor comprador do solo urbano construído como um investidor em potencial, 
guardando a escalade sua influência financeira e levando em consideração que, em 
algum momento, essa compra para consumo também será repassada e conterá, em 
seu preço, parte da valorização ou desvalorização que a propriedade sofreu ao longo 
do tempo. 
 
10 Ver quadro resumo na página 39. 
 
38 
 
Jaramillo (2003), contemplando os agentes que atuam no mercado de terras, 
também concorda com a separação em duas categorias, a dos capitalistas e a dos 
proprietários de terras. Ao tratar do funcionamento do mercado de terras, esclarece 
que o Estado, atuando como regulador e interventor estruturante, possibilita a criação 
de oportunidades de investimento para donos de terras e capitalistas. Não obstante, 
assinala um diferencial em sua análise: o fato de a população da cidade contribuir com 
a atuação do Estado, via pagamento de impostos, o que evidencia ainda mais a 
característica de constructo social que a cidade possui. 
Roberto Lobato Corrêa (1995) explica e categoriza os produtores do espaço 
urbano, dividindo-os em cinco categorias: proprietários de meios de 
produção/indústrias, proprietários fundiários, promotores imobiliários, Estado e grupos 
sociais excluídos. Ele ressalta que os três primeiros têm como objetivo norteador a 
multiplicação de seus capitais, já o Estado administra e media, buscando minimizar 
as desigualdades, e os grupos excluídos buscam condições mínimas de 
sobrevivência. 
Os discursos precedentes servem de ancoragem à afirmação de que há um 
aparente consenso entre os autores citados quanto ao fato de os produtores 
capitalistas e os proprietários de terra e, em menor escala, o investidor individual11, 
retirarem renda da utilização do espaço construído na cidade. Ao agregarmos o fator 
localização/exteriorização, demonstramos claramente que nenhum deles teria 
condições de, individualmente, gerar a valorização de suas propriedades urbanas. É 
certo, portanto, que atuam no mercado imobiliário especulando os preços em busca 
de sobrelucros, ou seja, da venda de seus produtos acima do preço médio praticado 
naquela realidade econômica (ABRAMO, 2007; RIBEIRO, 1997). 
Podemos, assim, considerar que os agentes do mercado de terras urbanas 
interagem com a dinâmica econômica urbana escolhendo determinadas localidades 
para se estabelecerem, incluindo-se, nessa tomada de decisão, a moradia e a 
atividade produtiva. Naturalmente, algumas dessas áreas, em virtude da disputa das 
 
11O comprador individual ou de pequena escala. 
39 
 
localizações, acabam por tornarem-se centralidades e áreas de concentrações de 
atividades, o que, por sua vez, influi na diferenciação de preços dos terrenos. É, 
verdadeiramente, a imagem que reflete a produção desigual do espaço urbano e a 
distribuição capitalista das rendas aí geradas (CORRÊA, 1995; SINGER, 1982; 
HARVEY, 1980). 
 
Quadro 01 ─comparativo autor/agente descrito 
Autor Participantes Observação 
BOTELHO 
(2007) 
Consumidores, agentes financeiros, 
empresários, construtores e 
proprietários de terras. 
Botelho refere-se a eles como participantes do 
mercado imobiliário. 
HARVEY 
(2013) 
Os proprietários de terra, os 
empresários, os financistas. 
Harvey descreve-os relacionando-os às formas 
de ganhos que cada um percebe nas 
operações. 
RIBEIRO 
(1997) 
Produtores capitalistas: Proprietários 
de terras, empresários, corretores e 
financistas. 
Ribeiro refere-se aos agentes dividindo-os em 
dois grupos: os produtores capitalistas e os 
proprietários de terras. 
ABRAMO 
(2007) 
Consumidores, agentes financeiros, 
empresários, construtores e 
proprietários de terras. 
Abramo denomina todos os componentes do 
grupo de agentes. 
JARAMILLO 
(2003) 
Capitalistas e proprietários de terras. Jaramillo descreve apenas dois grupos: os que 
detêm a propriedade e os direitos sobre ela e 
sua produção, e os que pagam para utilizar 
esses direitos e produzir. 
CORRÊA 
(1995) 
Proprietários de meios de 
produção/indústrias, proprietários 
fundiários, promotores imobiliários, 
Estado e grupos sociais excluídos 
Corrêa descreve de forma ampla a atuação 
desses grupos, separando a atuação dos três 
primeiros, que visam a reprodução de seus 
capitais; o Estado como responsável pela 
mediação de conflitos; e os grupos excluídos, 
aqueles que sofrem de forma mais evidente com 
as desigualdades materializadas na cidade. 
Fonte: Elaboração do autor. 
40 
 
Conhecer a cidade e a forma como é produzido o espaço urbano é de interesse 
de todos os agentes envolvidos. E, como se sabe, as decisões do Estado, por também 
ser um agente de produção do espaço urbano, afetam a economia. (CORRÊA, 1995). 
Nos anos mais recentes, temos acompanhado, no cenário nacional, o surgimento (ou 
ressurgimento) de programas e políticas públicas de diversas naturezas, focados nas 
atividades urbanas embasadas na propensa melhoria da qualidade de vida da 
população. Estes envolvem um universo que vai do diagnóstico das fragilidades 
urbanas a linhas de financiamento direcionadas a erradicar essas deficiências 
(ROLNIK, 2001). Estes programas e políticas públicas nem sempre consideraram a 
importância dos cidadãos como elementos influentes na equação que regula o 
mercado imobiliário, ou mesmo dota eles de maior poder de decisão sobre o 
direcionamento das políticas econômicas da cidade. 
 
[...] colocando juntos Jameson e Harvey, é possível vislumbrar como 
investimentos no espaço público podem estar associados aos mercados 
imobiliários. A produção de espaços públicos na cidade contemporânea é um 
evento espetacular ligado à lógica do capital e do desenvolvimento urbano, 
não necessariamente ao empoderamento dos cidadãos e aos princípios da 
justiça social (VALENÇA, p.57, 2010). 
 
Contudo, ainda assim, desde meados da década de 1960, quando ocorreu o 
início do movimento pela Reforma Urbana, há a luta por uma cidade mais igualitária, 
democrática e com melhores distribuições dos ônus e bônus gerados pela produção 
e pelas atividades desenvolvidas em seu território. Embora já conhecida como 
fenômeno urbano, evidenciou-se a valorização do solo urbano fruto das intervenções 
privadas e públicas. Partindo da busca pela igualdade social, aclamada nos 
movimentos de Reforma Urbana, o Estado assume uma grande importância na 
regulação desses valores criados no urbano, sendo o detentor legal do poder de 
aplicar e administrar as diversas formas de arrecadação ligadas ao uso e ocupação 
do solo urbano (ROLNIK, 2001). 
41 
 
É correto que se pratique a justa distribuição dos ganhos e perdas das 
intervenções na cidade, aplicando políticas redistributivas; mas é difícil definir o que 
estamos redistribuindo, considerando a cidade como uma criação materializada da 
complexa inter-relação de interesses individuais. “Há os que reivindicam que uma 
condição necessária e suficiente para conseguir distribuição justa de renda consiste 
em imaginar meios socialmente justos para chegar àquela distribuição” (HARVEY, 
1980, p. 92). Esses meios de distribuição e redistribuição podem surgir de formas 
diversas na economia urbana. 
 
[...] uma “distribuição justa" está relacionada com tudo o que afeta as rendas 
e deve considerar vários aspectos, os mais importantes dos quais são 
"necessidade" (um total de nove itens são listados, incluindo alimentação, 
moradia, saúde e educação), "contribuição para o bem comum” (efeitos 
colaterais benéficos sobre outros territórios, externalidades) e “mérito” (grau 
de dificuldade ambiental que deve ser superada) (VALENÇA, P.58, 2010, 
grifos do autor). 
 
O Estado, por meio de intervenções estruturais e legais, cria localizações 
conjuntamente com a sociedade. Por isso, pode e deve intervir para criar formas de 
uso e ocupação do solo e de regulação da ocupação, buscando uma justiça 
redistributiva dos ônus e dos bônus da cidade