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Elementos de Mecânica das Rochas 1.1 SÍNTESE EVOLUTIVA DOS CONHECIMENTOS GEOLÓGICOS Como se sabe, a Geologia tem sido definida como a “ciência que trata da origem, história e estrutura da Terra tal como aparecem registradas nas rochas, bem como do estudo das forças e processos que atuam, modificando-as” (Krynine e Judd). Por isso mesmo, dizia-se que as rochas “eram as letras do grandioso livro da Terra”. Sabe-se também que a estrutura da Terra é constituída por quatro camadas superpos- tas, normalmente chamadas de esferas concêntricas (Quadro 1.1). De fora para dentro, essas camadas de densidades crescentes são assim denominadas: atmosfera (massa gasosa, consti- tuída de ar, que envolve completamente a Terra); hidrosfera (capa líquida descontínua, que cobre vasta porção da crosta terrestre); litosfera ou crosta terrestre (camada sólida, consti- tuída pelas “rochas” e “solos” e demais constituintes, com espessura variável de 40 a 60 km; segundo a predominância dos elementos químicos que a compõem – silício e alumínio – é abreviadamente designada por SIAL, nomenclatura criada pelo célebre geólogo Sues); e finalmente a endosfera (que constitui o núcleo central da Terra, suscetível de ser desdobrada em três camadas, mas que não cabe aqui considerar). Evidentemente, essas regiões ou cama- das não apresentam limites geométricos ou separação perfeitos. Assim, de acordo com a definição dada, seriam objeto da Geologia todos os estudos refe- rentes a essas camadas. Nos últimos 65 anos, no entanto, com a profunda evolução e enriquecimento dos co- nhecimentos próprios, a Geologia tem, ao contrário, se caracterizado pela especialização, dividindo-se em uma série de partes que, por sua vez, se subdividem em novas e recentes dis- ciplinas. Desse modo, a Geologia perdeu seu caráter enciclopédico. Nesse desmembramento em vários ramos, alguns deles – como a Cosmografia, Meteorologia, Oceanografia, Minera- logia e outros – afastaram-se tanto da primitiva ciência, que alguns autores consideram como “ciências parageológicas”. Modernamente, portanto, deve-se considerar a Geologia como um conjunto de “ciências geológicas” que naturalmente se relacionam entre si. 1 e-2 CAPÍTULO 1 Evidentemente, com a individualização dos diferentes ramos, criam-se, em decorrência, faixas de contato cada vez mais estreitas, o que dificulta a demarcação de fronteiras definidas e nítidas. 1.2 GEOLOGIA APLICADA Paralelamente à Geologia especulativa ou pura, tem-se desenvolvido a Geologia Aplicada, em particular a Geologia para Engenheiros, que utiliza e aplica os conhecimentos geológicos, em combinação com a prática e a experiência, na solução de problemas de engenharia, tais como: construção de rodovias e ferrovias, barragens, túneis e canais, fundações, obtenção de água subterrânea etc. O famoso geólogo-engenheiro Charles Berkey (1929), já em retrospecto histórico (A res- ponsabilidade do geólogo nas obras de engenharia civil), destaca: Prática (problemas geotécnicos) Atmo sfera Hid rosfera Lit os fe ra ou crosta terrestre Endos- fera 40/60 km Geologia Conjunto de ciências geológicas Modernamente considera-se como Desenvolvendo-se com finalidade Especulativa (geologia pura) Com vistas na engenharia a estudos sobre Previsão e classificação dos materiais a escavar Materiais de construção Problemas de drenagem Desmorona- mentos e desli- zamentos de solos e rochas Estabilidade de fundações de obras de arte Abertura de túneis Estabilidade e estanquei- dade de barragens Geologia para engenheiros Englobando o complexo de ciências Minera- logia Petrologia Petro- grafia Geomor- fologia Geofísica Sismo- logia Pedologia Mecânica dos solos Mecânica das rochas Hidrologia Hidrogeo- logia Meteoro- logiaTectônica QUADRO 1.1 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-3 Deve-se recordar que a descoberta da relação íntima entre a Engenharia e a Geologia não é absolutamente nova. O primeiro a descobri-la foi provavelmente um engenheiro, resolvendo ele mesmo os seus problemas geológicos. Deste dia em diante – há mais de 100 anos –, grande parte dos problemas geológicos, relacionados com projetos de Engenharia Civil, tem sido resolvida mais por engenheiros ligados ao projeto do que por geólogos profissionais. Somente nos últimos 35 a 40 anos (o trabalho que estamos citando data de 1929) este estado de coisas começou a modificar-se, reconhecendo-se hoje que um geólogo profissional com boa experiência constitui elemento essencial junto à organização encarregada de todo projeto de Engenharia de certa importância. Constitui, de fato, requisito prévio para o projeto de qualquer obra, sobretudo se de vulto (barragem, túnel, obra de arte, aterro), o conhecimento da formação geológica local, estudo das rochas, solos, minerais que compõem, bem como a influência da presença da água sobre ou sob a superfície da crosta. É verdade que, em se tratando de solos e rochas, a heterogenei- dade é a regra, a homogeneidade, a exceção. Tais estudos são indispensáveis para se alcançar a “boa engenharia”, isto é, aquela em que se assegura a indispensável condição de segurança e, também, de economia. Há uma tendência acentuada para o trabalho em equipe, de geólogos e engenheiros, tanto na fase de projeto como na execução de obras de grande porte. Com vistas à necessidade dessa coparticipação na solução dos problemas práticos é que os cursos de Geologia incluem estudos de Mecânica dos Solos e Mecânica das Rochas, e os de Engenharia abordam questões de Geologia Aplicada ou Geologia de Engenharia. Nota-se que, para os problemas de Engenharia, o interesse geológico concentra-se na área local à obra que se pretende construir e numa faixa da crosta terrestre nunca superior a 100 m, portanto muito aquém da que se considera acessível aos estudos geológicos. 1.3 CIÊNCIAS DA TERRA Indicamos no Quadro 1.1, ainda, a constelação das chamadas “Ciências da Terra” (como designam alguns autores o complexo de ciências que tratam do estudo da Terra) com vistas ao estudo de alguns problemas de engenharia. Os estudos geológicos, além da sua utilidade imediata e específica ao problema em exame – seja no que se refere a prospecção, construção ou verificação das condições de estabilidade de uma obra – representam inestimável patrimônio de conhecimentos que se remete ao futuro. Citemos novamente Berkey, com sua enorme experiência prática e profundo conheci- mento do assunto, quando se refere à indispensável habilitação profissional para levar em conta as exigências geológicas em projetos de Engenharia. Diz o renomado mestre: Foi-se o tempo em que qualquer um podia pretender possuir competência nos diversos setores de pesquisas relacionadas com as obras de Engenharia e foi-se, também, o tempo de confiar-se um trabalho desta natureza a homens sem experiência e treino adequados. 1.4 CRONOLOGIA GEOLÓGICA No Quadro 1.2, reproduzimos, a título de ilustração, uma escala abreviada dos tempos geo- lógicos, dividida em eras, períodos e épocas. A idade da Terra, maior que a máxima estimada para as rochas é, provavelmente, de 4600 milhões de anos. 1.5 MECÂNICA DAS ROCHAS Para o engenheiro geotécnico, muito mais importante do que a identificação da rocha como material componente da crosta terrestre é o conhecimento das suas “propriedades e-4 CAPÍTULO 1 tecnológicas” e do comportamento do maciço rochoso in situ, com suas separações geológicas que podem ser diáclases, falhas, certas superfícies de estratificação ou quaisquer superfícies de contato entre zonas homogêneas, isto é, de análogas propriedades geológicas e mecânicas. A esse estudo é que se propõe a Mecânica das Rochas,1 em plena expansão nas últimas décadas. Ela é, pois, uma mecânica do descontínuo, constituindo uma ciência bastante complexa. O Comitê de Mecânica das Rochas da Academia Nacional de Ciências assim a define: A Mecânica das Rochas é a ciência teórica e aplicada que trata do comportamento mecânico das rochas; é o ramo da Mecânica queestuda a reação das rochas aos campos de força do seu entorno físico. A origem da Mecânica das Rochas remonta a 1878, fruto dos trabalhos do geólogo suíço Heim, por ocasião da abertura dos grandes túneis transalpinos. Importantes investigações foram, também, levadas a efeito para explicar as fissurações observadas no túnel Ritom, na Suíça, em 1920. No entanto, somente em 1957 foi publicado o livro pioneiro de Talobre, La mécanique des roches. Entre os que têm enriquecido a Mecânica das Rochas com seus valiosos trabalhos, ci- tam-se Schmidt, Fenner, Stini, Müller, Oberti, Jaeger e Laginha Serafim, entre outros. Neste elenco de pesquisadores é importante ressaltar o papel do Prof. Terzaghi, a quem se deve, além de outras contribuições, estudos acerca da estabilidade de taludes em rochas fissuradas. A Sociedade Internacional de Mecânica das Rochas foi criada em 1962, na Áustria. 1 Como excelentes livros básicos sobre Mecânica das Rochas, recomendam-se: Stagg Zienkiewicz, Mecánica de rocas en la ingeniería práctica (1970), Fernando de Mello Mendes, Mecânica das rochas (1967/68), Manuel Rocha, Mecânica das rochas (1981) e D. F. Coates, Fundamentos de mecánica de rocas (1973), sobre os quais nos baseamos para a redação de grande parte deste capítulo. Enorme perda sofreu a geotecnia mundial com o falecimento, em 1981, do eminente Prof. Manuel Rocha. QUADRO 1.2 Eras e tipos de vida Períodos Épocas Idade aproximada das rochas em milhões de anos Cenozoica: mamíferos e flora moderna Quaternário RecentePleistoceno 0-1 Terciário Plioceno Mioceno Oligoceno Eoceno 1-60 Mesozoica: répteis Cretácio Jurássico Triássico 60-200 Paleozoica: anfíbios, peixes e invertebrados de ordem superior Permiano Carbonífero Devoniano Siluriano Ordoviciano Cambriano 200-500 Proterozoica: invertebrados de ordem inferior Arquezoica: carência de vida Précambriano 500-3000 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-5 O Primeiro Congresso foi realizado, em 1966, em Lisboa, o Segundo em 1970, na Iugoslá- via, o Terceiro em 1974, em Denver, o Quarto em 1979, na Suíça, o Quinto foi na Austrália, em 1993, o Décimo Primeiro em 2007, em Portugal, e, mais recentemente, o Décimo Segun- do, em outubro de 2011, na China. Em 1968, realizouse em Madri um Simpósio Internacional sobre Mecânica das Rochas, e o mais recente aconteceu em 2010, na Índia. No Brasil, pode-se dizer que a Mecânica das Rochas nasceu em 1951 com os ensaios in situ para determinação do módulo de elasticidade do maciço rochoso da Usina de Paulo Afonso. Ensaios subsequentes foram realizados em outras importantes obras. Além de Er- nesto Pichler, já falecido, os divulgadores iniciais da Mecânica das Rochas, no Brasil, foram os engenheiros A. J. da Costa Nunes e Murilo Ruiz. A Associação Brasileira de Mecânica dos Solos (ABMS) criou, em 1965, o Comitê Bra- sileiro de Mecânica das Rochas. Em 1968, foi criada a Associação Brasileira de Geologia de Engenharia (ABGE), que já organizou desde então diversos congressos. Em 1998, a ABGE publicou a primeira edição do livro Geologia de engenharia, referência brasileira nesta área, além de várias outras importantes publicações para a comunidade técnica e científica. 1.6 ROCHA, SOLO E MINERAL Em Engenharia, a palavra rocha designa apenas os materiais naturais consolidados, duros e compactos da crosta terrestre ou litosfera. Para os fragmentos isolados, reservam-se as deno- minações bloco de rocha quando o diâmetro médio é superior a 1 m, matacão quando entre 1 m e 25 cm e pedra se entre 25 cm e 76 mm. Ao material não consolidado que recobre as rochas e destas provêm por “intemperismo”, constituindo a epiderme do esqueleto rochoso da crosta, denomina-se solo; confunde-se, portanto, com o que os geólogos chamam de manto de intemperismo ou rególito. Para os pedólogos (do grego pédon, solo, –logos, estudo), o termo solo tem sentido mais restrito, pois refere-se somente à parte superficial da crosta terrestre, onde se desenvolve a vida vegetal. As partículas sólidas que compõem as rochas e os solos são os minerais. A designação de minério é atribuída a um mineral de valor econômico, como, por exem- plo, a “hematita”, de que se extrai o ferro. 1.7 MINERAIS Mineral é uma substância inorgânica e natural, com composição química e estrutura defini- das. Quando adquire formas geométricas próprias, correspondentes à sua estrutura atômica, chama-se cristal. Das propriedades físicas de maior interesse para o engenheiro, destacam-se a densidade e a natureza. Para a maioria dos minerais não metálicos, a densidade varia entre 2,65 e 2,75; para mine- rais de ferro, como a magnetita, o seu valor é de 5,2. A dureza de um mineral (símbolo D) refere-se, por comparação, ao número indicativo da conhecida escala de Mohs, em que um elemento risca todos os precedentes e é riscado pelos subsequentes: e-6 CAPÍTULO 1 Dureza D Talco Gesso Calcita Fl riscados pela unha 1 2 3 4 − − − − uuorita Apatita Ortósia Quartzo riscados pelo aço − − − − 5 6 7 8 TTopázio Coríndon Diamante riscam o vidro 9 10 − − 1.8 MINERAIS FORMADORES DE ROCHA Conquanto se conheçam cerca de 2000 minerais, apenas 15 aproximadamente são suficientes para serem considerados como formadores de rochas. Tendo em vista a composição química dos minerais, podemos agrupá-los em: y silicatos: feldspato, mica, quartzo, serpentina, clorita, talco; y óxidos: hematita, magnetita, limonita; y carbonatos: calcita, dolomita; y sulfatos: gesso, anidrita. Feldspatos São silicatos duplos de Al e de um metal alcalino ou alcalinoterroso (K, Na ou Ca). Os prin- cipais são ortoclasita, anortita e albita. Há ainda combinações dos dois últimos, chamados de plagioclásios. Os feldspatos sofrem decomposição mais ou menos acentuada pelos agentes da natureza; pela ação da água carregada de CO2 é característica a alteração em argila branca, denominada caulim. Constituem quase a metade dos minerais da crosta terrestre. Micas São, geralmente, ortossilicatos de Al, Mg, K, Na ou Li e, mais raramente, de Mn e Cr. Distin- guem-se imediatamente por suas delgadas lâminas flexíveis e por sua clivagem extremamente fácil. Os principais tipos são a muscovita (mica branca), a mais abundante, e a biotita (mica preta). Quartzo É o mais importante dos minerais do grupo dos silicatos. Sua composição química é SiO2, sílica cristalina pura. Os seus cristais apresentam a forma de um prisma hexagonal, tendo, nas bases, pirâmides hexagonais. É facilmente identificado macroscopicamente. Devido à sua estabilidade química e dure- za, é um dos minerais mais resistentes aos habituais agentes de intemperismo, tais como a água e a variação de temperatura; por isso, passa quase incólume da rocha aos solos. ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-7 O quartzo apresenta-se, também, em formas amorfas, como é o caso da opala. Serpentina, clorita e talco Os dois primeiros de tonalidade verde e, o último, branco ou branco-esverdeado; a serpenti- na dá origem à rocha de mesmo nome. Hematita, magnetita e limonita São os principais minerais entre os óxidos de ferro; suas fórmulas químicas são hematita (Fe2O3), magnetita (Fe3O4) e limonita (Fe2O3 ∙ H2O). Calcita e dolomita São os mais importantes minerais no grupo dos carbonatos. Embora tenham propriedades fí- sicas semelhantes, a dolomita [(CO3)2 CaMg] difere da calcita (CO3Ca) pela sua maior dureza e fraca reação (mesmo quando pulverizada) em contato com o HCl. Gesso e anidrita Diferenciam-se pela “água estrutural” e, consequentemente, pelos valores da densidade e da dureza: gesso (SO4Ca . 2H2O) e anidrita (SO4Ca). Minerais argílicos São complexos de silicatos de alumínio hidratados, formadores de solos. Os minerais mais comuns, e que se destacam por exibirem comportamentos peculiares, são: caolinita, ilita e montmorilonita; de dimensões muito reduzidas, somente são reconhecidos por ensaios de raios X. As argilas sãomuito expansivas e, portanto, instáveis na presença da água. 1.9 CLASSIFICAÇÃO DAS ROCHAS Com relação à porcentagem da sílica, as rochas se classificam em: ácidas, se a porcentagem é maior que 66 %; intermediárias, se entre 66 e 52 %; básicas, se menor que 52 %. Quanto à gênese, as rochas são classificadas em três grandes grupos: magmáticas ou ígne- as, sedimentares ou metamórficas. Rochas magmáticas São as resultantes do resfriamento e consolidação de material fundido ou “magma”. Magma É uma solução natural, complexa, de silicatos, formada a elevadas temperaturas e sob grandes pressões. As rochas ígneas podem ser intrusivas (plutônicas), se formadas a grandes profundidades, e extrusivas (vulcânicas), se resultantes da consolidação, por resfriamento, de lavas. As pri- meiras apresentam elevado teor de Si, e as segundas, reduzido teor de Si. Lava É o material fundido, que chega à superfície da Terra ou ao fundo dos mares expelido pelos vulcões. Exemplos de rochas intrusivas: granito, gabro e diorito; de extrusivas: basalto, riolito e andesito. Rochas sedimentares As rochas sedimentares são formadas pela deposição de detritos oriundos da desagregação de rochas preexistentes ou pela acumulação de substâncias orgânicas animais ou vegetais ou, e-8 CAPÍTULO 1 ainda, pela precipitação química de sais dissolvidos nas águas dos rios, lagos e mares. Podem ter, assim, formação mecânica (rochas clásticas ou detríticas), orgânica ou química. Tendo em vista o seu modo de formação, as rochas sedimentares são geralmente estrati- ficadas, isto é, dispostas em camadas separadas por planos de estratificação. A estratificação pode ser concordante ou discordante, conforme esses planos sejam ou não paralelos. São exemplos de rochas sedimentares: calcário, arenito e conglomerado. As áreas onde se encontram as rochas sedimentares são conhecidas como bacias sedimen- tares como, por exemplo, aquelas onde se localizam as cidades de São Paulo e Curitiba. Rochas metamórficas As rochas metamórficas provêm da transformação ou metamorfismo das rochas magmáticas ou sedimentares. A este grupo pertencem os gnaisses (metamorfose dos granitos), os mármores (dos calcá- rios) e os quartzitos (dos arenitos). As áreas constituídas de rochas magmáticas e metamórficas são denominadas núcleo ou escudos cristalinos, ou ainda, embasamento cristalino. 1.10 CICLO DE TRANSFORMAÇÃO DAS ROCHAS As rochas, sob a ação contínua do intemperismo, transformam-se, dando origem a novas ro- chas, completando assim o chamado ciclo de transformação das rochas, indicado na Figura 1.1. 1.11 OUTRAS CLASSIFICAÇÕES Tendo em vista o estado das rochas e independentemente da sua classificação geológica, Ter- zaghi, citado por Milton Vargas, classifica as rochas, para fins de engenharia de túneis, em cinco grandes grupos: rochas sãs ou quase sãs, estratificadas ou moderadamente fraturadas, fendilhadas em blocos, completamente fraturadas e expansivas. A cada um desses grupos corresponde determinado comportamento do maciço rochoso, o qual é, então, levado em conta no projeto e na construção dos túneis. Magma Sedimentos R ochas Erosão transporte FIGURA 1.1 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-9 Do ponto de vista geotécnico, Deere e Miller propuseram, em 1966, a classificação apre- sentada na Figura 1.2, a qual se baseia apenas nos valores da resistência à compressão (Rc ou σc) e do módulo de elasticidade (E) do material rochoso, obtidos em ensaios de laboratório, como veremos adiante. 1.12 ALTERAÇÃO DAS ROCHAS Em função dos valores da resistência à compressão, é usual a seguinte distinção: y rocha alterada: quando superiores a 5 MN/m2; y alteração de rocha: quando entre 5 e 2 MN/m2; y solo residual: quando inferiores a 2 MN/m2. Como exemplo brasileiro de um perfil geológico, transcrevemos do excelente trabalho “Estabilização de Encostas” (1966), do Prof. A. J. da Costa Nunes, o seguinte trecho: Os morros da Guanabara, do mesmo modo que os da serra do Mar, Mantiqueira, Paranapiacaba e outros, são constituídos por um núcleo de rochas cristalinas (em geral, granito-gnáissicas) recobertas por um manto de alteração ou solo residual. As rochas cristalinas, quando sãs, apresentam-se muito resistentes, mas, à medida que vão sendo alteradas por meteorização, sua resistência é progressivamente reduzida até exibirem propriedades de solo compressível e fofo, de pequena resistência aos deslizamentos. O manto de alteração, que se chama rególito, tem espessura que depende da natureza da rocha, do clima, da insolação, da drenagem e da inclinação da encosta. Em nossas latitudes essa espessura pode variar de zero, quando a rocha viva aflora, a até mais de 100 metros. 1.13 EFEITOS TECTÔNICOS Genericamente, os movimentos da crosta terrestre denominam-se diastrofismo. Se resul- tam de esforços verticais, dizem-se epirogênicos e, se de esforços tangenciais, orogênicos. Resistência muito baixa Resist. baixa Resist. média Resist. elevada Resist. muito elevada 20 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0,9 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 321684 C (10 3 psi) 9876543 10 20 30 40 50 6021 (10 3 psi) Resistência à compressão uniaxial 75 125 250 500 1000 2000 4000 (10 2 kN/m2) M ód ul o de e la st ic id ad e E (1 0 kN /m 2 ) 7 16 8 4 2 1 0,5 0,25 E (1 0 ) 6 ps i = 50 0 ele va do m éd io = 20 0 ba ixo FIGURA 1.2 e-10 CAPÍTULO 1 Tais movimentos geram deformações que dependem da intensidade dos esforços e das características (módulo de elasticidade) das deformações atingidas. Os efeitos tectônicos, de grande importância no estudo do comporta- mento dos maciços rochosos, agrupam-se em dois tipos: dobras e falhas. Se os estratos encurvam-se, passam a constituir dobras que se deno- minam anticlinais quando convexas para o exterior, e sinclinais quando côncovas (Fig. 1.3). Observe-se que em um túnel locado numa anticlinal (Fig. 1.4(a)), por exemplo, a água escoa para seu interior e as pressões laterais são maiores nas suas extremida- des; numa sinclinal (Fig. 1.4(b)), os efeitos são contrários. Em um relevo dobrado consideram-se, como indicado na Figura 1.5, os seguintes elemen- tos: flancos, lombada, plano axial e núcleo. Com relação à posição do seu plano axial, as dobras classificam-se em: normal ou simétri- ca, inclinada, tombada ou deitada. Se as camadas são cortadas, têm-se as fraturas que se diferenciam em: diáclases, no caso de simples fissuras abertas ou fechadas, e falhas ou paráclases, quando ocorreu deslocamen- to de uma das partes em relação à outra, ao longo de uma superfície ou um plano de falha (Figs. 1.6 e 1.7). (b) Túnel (a) Túnel FIGURA 1.4 Plano axial Núcleo Flanco Flanco Lombada FIGURA 1.5 Diáclases Falha FIGURA 1.6 FIGURA 1.7 Sinclinal Anticlinal FIGURA 1.3 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-11 O termo junta restringe-se à fratura causada pela contração por resfriamento, enquanto o termo diáclase é reservado para as fraturas de origem tectônica. O desnível relativo entre diferentes camadas de uma falha chama-se rejeito. A massa de fragmentos que, por vezes, resulta do esmagamento das paredes de uma falha denomina-se brecha de falha. Chama-se milonito a rocha finalmente triturada que aparece, comumente, ao longo de fraturas e falhas. Quando da associação de falhas existentes (Fig. 1.8) resulta levantamento da região, a estrutura que se for- ma é designada muralha tectônica (ou horst) e quando o conjunto das falhas conduz a uma depressão chama-se fossa tectônica (ou graben). O estudo dos diaclasamentos e falhas das rochas é fundamental nas questões relativas à estabilidade dos cortes, túneis e fundações de obras de arte. É de se ressaltar a importância nesses estudos da investigação da natureza e das características do material de preen- chimento das diáclases e falhas. Sabe-se, por exemplo, que a existência de argilas do grupo montmorilonita (por serem muito expansivas) pode ser responsável pelo desmoronamento de maciços rochosos. 1.14 MACIÇOS ROCHOSOSO comportamento de um maciço rochoso em seu conjunto é condicionado pelas três seguin- tes propriedades fundamentais, estabelecidas em 1962 por Klaus: a) as propriedades tecnológicas de um maciço rochoso dependem mais das descontinui- dades do maciço do que da resistência em si mesma; b) a resistência de um maciço rochoso é determinada pelos vínculos de interpenetração dos “blocos” que o constituem (bloco é uma porção de maciço limitado pelo sistema de fraturas do maciço; para uma mesma família de fraturas pode-se definir um espaça- mento médio entre elas); c) a deformidade de um maciço rochoso resulta, predominantemente, dos deslocamen- tos relativos dos blocos que o constituem. Num maciço rochoso distinguem-se as macrofissuras, cuja largura é superior a 0,1 mm e que são vistas a olho nu, e as microfissuras, cuja largura é inferior a 0,1 mm e, em geral, vizi- nhas de 0,01 mm. A fissuração depende, fundamentalmente, do estado de tensão existente no maciço. Para determinado maciço, considerando-se: – as zonas de homogeneidade e sua extensão, – os tipos de rochas e suas propriedades mecânicas, – os tipos de fraturas e seus materiais de preenchimento, – as condições de presença da água, dispõe-se de indicações para uma descrição do maciço rochoso, particularmente no que con- cerne à sua heterogeneidade e anisotropia. A heterogeneidade provém da irregular distribuição dos materiais num maciço rochoso e a anisotropia decorre da desigual frequência das heterogeneidades segundo as diferentes direções. Muralha tectônica Fossa tectônica FIGURA 1.8 e-12 CAPÍTULO 1 1.15 RECONHECIMENTO E PROSPECÇÃO Em um projeto de uma fundação ou de uma obra em maciços rochosos, cumpre prelimi- narmente um reconhecimento geológico de superfície precedido de dados topográficos e de informações relativas a eventuais acidentes anteriores; nesta fase, as fotografias aéreas po- dem ser de grande utilidade. As fraturas, assimiladas a planos, são definidas pela direção e inclinação. Prospecção e ensaios, com vistas à determinação da natureza dos materiais e suas características físicas e mecânicas e as grandes linhas estruturais do maciço Os diversos processos de prospecção e ensaios são: sondagens rotativas, aberturas de galerias ou poços, prospecção geofísica (especialmente por meio de métodos elétricos ou sísmicos) e ensaios em laboratório ou in situ. Adiante abordaremos sumariamente esses diversos proces- sos de investigação. Na maioria dos casos, há necessidade do emprego conjunto destes diversos recursos de amostragem e ensaio, para uma tão perfeita quanto possível caracterização do maciço rocho- so no seu todo. A necessidade de uma “análise estatística” rigorosa de maciços rochosos muito fraturados e a consequente representação da distribuição das descontinuidades têm conduzido ao uso de vários tipos de projeção. Os mais usados são: a projeção estereográfica ou de ângulos iguais (Wulf) e a projeção de áreas iguais (Lambert). Nota: projeção estereográfica é uma projeção cônica ou central que permite representar os pontos de uma esfera sobre um plano tangente à esfera. Demonstra-se que esse tipo de projeção central constitui uma representação conforme da superfície esférica sobre o plano. 1.16 SONDAGENS, GALERIAS E POÇOS O equipamento e a técnica para execução de sondagens (por percussão ou rotativas) são am- palmente conhecidos. Um programa bem orientado de sondagens, em geral rotativas, com a obtenção de amostras (ou testemunhos) para os consequentes ensaios de laboratório, fornece indicações valiosas sobre a natureza e a estrutura do maciço rochoso. Os diâmetros padrão das amostras são designados por EX (7/8″), EX (1 1/8″), BX (1 5/8″) e NX (2 1/8″). As coroas são de aço, com parte cortante de diamante, aços especiais, carbureto de tungstênio, ou mistas. Na fase de coleta das amostras, durante a execução das sondagens, a qualidade do maciço rochoso é avaliada por um número chamado de porcentagem de recuperação do testemunho, definido pela razão entre o comprimento do testemunho recuperado e o comprimento da perfuração (Fig. 1.9). L H 100 Note-se que os testemunhos de rocha extraídos representam, apenas, as partes do ma- ciço de melhor qualidade,2 não sendo levadas em conta as fendas e as regiões de maior decomposição. Em função desse índice, as rochas classificam-se de acordo com o Quadro 1.3. 2 Se levados em conta somente os testemunhos de comprimento igual ou superior a 10 cm, em estado são e com- pacto, define-se o Índice de qualidade das rochas, RQD (Rock Quality Designation), proposto por Deere. H L FIGURA 1.9 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-13 QUADRO 1.3 RQD (em %) Qualidade da rocha 0-25 Muito má 25-50 Má 50-75 Regular 75-90 Boa 90-100 Excelente Existem técnicas que, utilizando uma câmara especial de televisão colocada no interior de um furo de sondagem ou na escavação para execução de um poço, permitem inspeção visual das paredes dos maciços. No caso de suspeita de superfícies de descontinuidade, a abertura de galerias e poços (esco- rados ou não), além de permitir um exame direto do maciço rochoso, propicia a realização de ensaios in situ destinados a medir a deformação do maciço e do seu módulo de elasticidade. 1.17 RESISTÊNCIA DAS ROCHAS Nas aplicações da Mecânica das Rochas, tal como na Mecânica dos Solos, distinguem-se dois problemas básicos: o da deformação e o da ruptura do maciço rochoso. O primeiro requer o cálculo das deformações que as massas de rocha podem apresentar. É exemplo desse problema a questão dos recalques das obras assentadas em rochas. Observa-se que a deformação total (D) de um maciço rochoso é expressa pela soma das compressibilidades dos materiais das juntas (Sdj) com a dos blocos de rocha (Sdr), isto é: ∆= +∑ ∑d dj r No segundo problema, atenção especial é dada ao cisalhamento dos maciços rochosos, principalmente ao longo de direções preferenciais – como as de descontinuidade. Cita-se como exemplo a possibilidade de deslizamento de encostas rochosas. Por meio de ensaios in situ ou com base em amostras obtidas pelas sondagens ou abertura de galerias ou poços, determinam-se no laboratório as características físicas e mecânicas dos materiais. 1.18 PROPRIEDADES TECNOLÓGICAS DAS ROCHAS Não é simples a correta determinação das propriedades tecnológicas das rochas, tendo em vista os vários fatores que as afetam, tais como: os minerais que as constituem, a textura (grossa ou fina) e a estrutura (densa ou porosa) da rocha, as juntas (abertas ou visíveis e fe- chadas ou indiscerníveis) existentes no maciço, as condições de intemperismo (químico ou físico), as falhas (decorrentes de movimentos tectônicos) etc. 1.19 ENSAIOS EM LABORATÓRIO Peso específico aparente Definido pela razão entre o peso da amostra seca e o seu volume: γ = P V Sua determinação é muito simples e seu valor (para o granito é da ordem de 27 kN/m3) é utilizado com frequência no estudo das propriedades das rochas. O peso específico pode, também, referir-se à amostra saturada ou submersa. e-14 CAPÍTULO 1 Porosidade É a razão entre o volume de vazios da amostra da rocha e o seu volume total: n V V v Para sua determinação, basta dividir o volume de água que enche os vazios da amostra pelo volume total obtido por medida direta. Assim: n P P V sat w (%)= ⋅ ⋅ ⋅ 2 100 γ em que Psat é o peso da amostra saturada e gw, o peso específico da água (10 kN/m3). Absorção de água ou índice de absorção i, proposto por Hamrol, em 1961, é um índice de qualidade, que expressa, em porcentagem, a razão entre o peso da água absorvida A = Psat – P e o peso da amostra seca (durante um mínimo de 48 horas): i P P P A P sat(%)= − × = ×100 100 Para maciços graníticos, as Figuras 1.10 e 1.11 mostram as correlações entre i, o módulo de elasticidade e a resistência à ruptura, determinadas em laboratórios. Resistência à compressão simples É determinada medindo-se a carga de ruptura P de uma amostra isenta de fendas e defeitos; se A é a áreada seção transversal, tem-se para resistência à compressão (Fig. 1.12): R P Ac 500 000 400 000 300 000 200 000 100 000 50 000 0 0 1 2 3 4 5 6 7 Índice de absorção ( )i M ód ul o de e la st ic id ad e (1 02 k N /m 2 ) R es is tê nc ia à c om pr es sã o un ia xi al ( 10 2 kN /m 2 ) 1100 1000 900 800 700 600 500 400 300 200 100 0 0 1 2 3 4 5 6 Índice de absorção ( )i FIGURA 1.10 FIGURA 1.11 P P FIGURA 1.12 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-15 Como na natureza os maciços rochosos apresentam planos de estratificação, fraturas, diáclases e outros planos de menor resistência, o valor real de Rc vai depender da inclinação das forças em relação a esses planos; a maior resistência corresponderá aos esforços que lhes sejam normais. Sabe-se, também, que quanto mais elevada a porosidade da rocha e, portan- to, a absorção percentual da água, menor será a resistência da rocha. Segundo Protodiakonov, a resistência à compressão simples da rocha obtida de corpos de prova de forma regular Rc correlaciona-se com as cargas P, necessárias para a ruptura de blocos irregulares (Fig. 1.13), pela fórmula: R P Vc 5 263 2 3, / em que V é o volume do bloco medido mergulhando-o previamente em recipientes conten- do areia fina. A Figura 1.14 mostra-nos uma relação entre o peso específico e a resistência à compres- são simples da rocha. A partir de Rc e afetando-o de um coeficiente de segurança, obtém-se a pressão admis- sível da rocha. Para condições normais, isto é, quando as rochas não apresentam extensas falhas diáclases, comumente adotam-se coeficientes de segurança que variam de 5 a 10. Valores médios para E, m e Rc de diversas rochas são dados no Quadro 1.4. Resistência à tração indireta Para uma amostra sujeita à compressão dia- metral (Fig. 1.15) – ensaio proposto pelo Eng. Lobo Carneiro, em 1943 – a tensão de ruptura à tração é calculada pela fórmula: R P D Lt = ⋅ ⋅ ⋅ 2 π em que P é a carga e D e L as dimensões da amostra, respectivamente, diâmetro e comprimento do corpo da prova. Ensaio de cisalhamento direto Pode ser realizado como mostrado na Figura 1.16. O seu valor depende da resistência da rocha e das diferentes resistências dos materiais de enchimento das superfícies de desconti- nuidade, bem como da tensão normal. 3000 2000 1000 0 10 20 30 40 R c (1 02 k N /m 2 ) (kN/m3) FIGURA 1.14 FIGURA 1.13 QUADRO 1.4 Tipo de rocha E (105 kN/m2) m Rc 102 kN/m2) Granito são Granito alterado Granito muito alterado Granodiorito Basalto Pórfiro Gnaisse Gnaisse alterado Xisto* Xisto* Xisto** Micaxisto* Ardósia Quartzito Calcário Gesso Cré Grés Conglomerado 760 204 125 665 1000 960 933 501 1350 635 385 760 773 756 830 88 40 538 1060 0,21 0,10 0,09 0,23 0,27 0,26 0,22 0,09 0,20 0,21 0,14 0,23 0,14 0,26 0,23 0,19 0,22 0,25 0,20 1180 350 139 1981 2155 917 1600 1150 935 750 1140 495 1740 3000 1130 137 32 820 2440 * Paralelo à xistosidade. ** Normal à xistosidade. e-16 CAPÍTULO 1 Compressão triaxial No caso de rochas brandas ou alteradas, realizam-se também ensaios de compressão triaxial. Módulo de elasticidade ou de Young O valor (Fig. 1.17) de E P b h h = ( ) ( ) 2 ∆ , que constitui uma característica da deformabilidade do material, é determinado no laboratório, por meio da curva pressão-deformação obtida em ensaios de corpos de prova mantidos saturados. O seu valor E d d = σ ε pode ser obtido de três maneiras diferentes, como indicado na Figura 1.18, fornecendo, assim, os módulos secante (Es), tangente (Et) e inicial (Ei); este último é normalmente adotado. FIGURA 1.15 Tensões de tração induzidas P FIGURA 1.16 P' P' h b b + O Ei Es Et FIGURA 1.17 FIGURA 1.18 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-17 Um valor aproximado de E em função do peso específico da rocha é fornecido pela fórmula: ( ), , 8 2E kN m= − ⋅ 0 9 2 1 10 /γ Para valores médios de E das rochas, veja-se o Quadro 1.4. Em função das características pressão-deformação, as rochas classificam-se em dois gru- pos: rochas de módulo E elevado e rochas de módulo baixo, dependendo se seu valor é maior ou menor que 107 kN/m2. As do primeiro grupo comportam-se como materiais elásticos, o que não ocorre com as do segundo. Para o aço doce E = 2,1 × 10 kN/m2 e para o concreto trabalhando à compressão E = 0,2 × 10 kN/m2. Coeficiente de Poisson Como se sabe (Fig. 1.17): µ = ∆ ∆ b b h h / / Os seus valores são muito variáveis e apenas aproximados. Para os granitos, por exemplo, ele oscila entre 0,10 e 0,24. Experimentalmente, encontra-se para o aço µ = 0,30 e para o concreto o seu valor é da ordem de 0,20. Fluência A fluência, isto é, a deformação lenta sob carga constante, não ocorre senão para as rochas elásticas ou rochas cujas deformações são parcialmente reversíveis. Há rochas em que a flu- ência diminui com o tempo, enquanto outras exibem fluência ilimitada. 1.20 ENSAIOS IN SITU Esses ensaios são indispensáveis para o estudo dos maciços rochosos, pois somente eles le- vam em conta a existência de diáclases, planos de estratificação e fissuras do maciço. Ensaios em galerias Embora demorados e onerosos, resultados mais reais são fornecidos por ensaios in situ exe- cutados em pequenas galerias escavadas no maciço rochoso, onde as tensões são aplicadas por meio de pressão d’água ou placas carregadas com macacos hidráulicos. É conveniente realizar ensaios verticais (carregamentos em superfícies horizontais) e horizontais (carregamentos em superfícies verticais); há autores que recomendam determinações em quatro direções a 45°. Os deslocamentos correspondentes são medidos por meio de deflec- tômetros sensíveis. A comparação entre os módulos Ev (na direção vertical) e Eh (na direção horizontal) fornece indicações sobre a anisotropia das rochas. Com aplicação da carga por intermédio de macacos hidráulicos (Fig. 1.19), uti- liza-se a fórmula: E p r d = ⋅ ⋅ ⋅ −2 1 2( )µ em que p é a pressão aplicada, r o raio da superfície de carga, µ o coeficiente de Poisson e d o deslocamento deformação medido. Quando o ensaio é feito por meio de pressão d’água, o cálculo de E baseia-se na fórmula: E p D D = + ∆ ( )1 µ FIGURA 1.19 M ac ac o e-18 CAPÍTULO 1 em que p é a pressão d’água no túnel de prova, D e DD, respectivamente, o seu diâmetro e acréscimo em virtude da pressão e m o coeficiente de Poisson da rocha. Ensaio de cisalhamento Pode-se, também, in situ proceder a ensaios de cisalhamento em grande escala, como esque- matizado na Figura 1.20. Tais ensaios apresentam maior interesse em maciços com grande número de desconti- nuidades, quando então se faz necessário, também, conhecer as características do material de preenchimento das superfícies de descontinuidade. Se o material é constituído por argilas expansivas (montmoriloníticas), as pressões podem atingir 400 kN/m2. Métodos geofísicos3 De grande valia em Mecânica das Rochas, como forma auxiliar do reconhecimento geológi- co, são as pesquisas geofísicas por prospecção elétrica ou sísmica (por refração ou reflexão), cujos princípios são bastante conhecidos. 3 1) Tais estudos incluem-se na chamada Dinâmica dos Solos, que pode ser definida como a parte da Mecânica dos Solos que estuda o comportamento dos solos quando solicitados por condições dinâmicas, sejam de- correntes de impulsos externos (explosões, tráfego urbano – rodoviário e ferroviário –, cravação de estacas, operação de máquinas pesadas, entre outros agentes) ou internos (tremores de terra). Esse último, felizmente, de pequena probabilidade de ocorrência entre nós. A Dinâmica dos Solos é uma disciplina relativamente nova. As primeiras pesquisas datam de 1928, tendo sido realizadas pela Sociedade Alemã de Pesquisas para Mecânica dos Solos (abreviadamente DEGEBO). Mui- to evoluiu o conhecimento do assunto desde então, sobretudo a partir da década de 1960, com vistas a sua aplicação no campo das fundações offshore. 2) Em particular, são os seguintes os seus principais camposde aplicação: – métodos dinâmicos e geofísicos de exploração dos solos – fundações de máquinas – cravação de estacas – compactação vibratória – estabilidade de taludes Só a referência a esses problemas típicos já nos dá a dimensão de sua importância. 3) A estabilidade de um solo depende da resistência à aceleração produzida pelas vibrações, que têm na acelera- ção o seu preponderante fator nocivo. O seu valor, como se sabe da teoria do movimento vibratório, é dado pela fórmula: γ π= ⋅ ⋅ ⋅4 2 2f a em que f é a frequência e a a amplitude. Nos abalos sísmicos a frequência é baixa, predominando no valor de g a amplitude; ao contrário, as vibrações produzidas por máquinas pesadas são de alta frequência, sendo, portanto, este o fator principal na elevação de g. 4) A energia transmitida ao solo se propaga em forma de ondas. Em um meio homogêneo, elástico e isotrópico, uma perturbação dinâmica atuante na sua superfície produz ondas de três naturezas: ondas longitudinais, de compres- são ou ondas P, ondas transversais, de cisalhamento ou ondas S e ondas superficiais, que se propagam ao longo da superfície livre do meio [os tipos mais bem conhecidos são as ondas Rayleigh (ou R) e as ondas Love]. As expressões das velocidades de propagação das ondas longitudinais e transversais são apresentadas a seguir. Para um agente excitador atuando na direção vertical e sobre uma área circular, Miller e Pursey calcularam que a energia transmitida assim se distribui: 67 % em ondas R, sendo 26 % em ondas S e 7 % em ondas P. 5) Entre os importantes efeitos decorrentes da vibração nos solos destacaremos a liquefação, a vibroflotation e a ressonância. 6) Para um estudo sobre a Dinâmica dos Solos e suas aplicações, veja, entre outros: NAPOLES NETO, A. D. Ferraz. Vibrações e trepidações dos solos. Separata da Revista Politécnica n. 145, 1944. TERZAGHI, K. Mecánica teórica de los suelos, 1945. JUMIKIS, A. R. Theoretical soil mechanics,1969. LAMBE, T. W.; WHITMAN, R. V. Mecánica de suelos, 1972. GUIDI, C. Cestelli. Geotecnica e tecnica delle fondazioni. Vol. 1, 1975. VARGAS, Milton. Introdução à mecânica dos solos, 1977. TSCHEBOTARIOFF, G. P. Fundações, estruturas de arrimo e obras de terra, 1978. ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-19 Por meio do método geossísmico, o coeficiente de Poisson e o módulo de elasticidade do maciço rochoso podem ser obtidos pelas fórmulas: µ = − − a a 2 2 2 2 1( ) E g v a a t= − − γ 2 2 2 3 4 1 ( ) em que a v v l t , sendo vl e vt as velocidades de propagação das ondas originadas pela detona- ção de uma carga explosiva; vl corresponde às ondas longitudinais e vt às ondas transversais; g é o peso específico aparente da rocha e g a aceleração de gravidade. Essas fórmulas são obtidas partindo-se das expressões teóricas das velocidades das ondas, longitudinal: n E l = ⋅ − ⋅ + − γ µ γ µ µ ( ) ( )( ) 1 2 1 1 2 e transversal: v E gl = ⋅ ⋅ +2 1γ µ( ) 1.21 TENSÕES RESIDUAIS Assim se denominam as tensões que remanescem nas rochas após a retirada da carga que as causou. Conquanto se reconheça sua existência e importância (particularmente na construção de túneis), não se tem ainda perfeito conhecimento da sua natureza, nem da sua variação em função do tempo. Os métodos de determinação utilizados são baseados no princípio da liberação de ten- sões, que consiste em destacar da galeria de reconhecimento, por meio de sonda rotativa, um anel cilíndrico do maciço rochoso e determinar as deformações por meio dos deflectôme- tros instalados como indicado na Figura 1.21, conforme técnica de ensaio preconizada pelo Prof. Oberti. Conhecido o módulo de deformação da rocha, podem-se deduzir as tensões preexistentes. M ac ac o Macaco Rocha FIGURA 1.20 e-20 CAPÍTULO 1 1.22 PERMEABILIDADE A determinação no laboratório do coeficiente de permeabilidade de uma amostra de rocha sã é de pequeno interesse para fins práticos; para os granitos, por exemplo, o seu valor é da or- dem de 10–13 a 10–12 m/s. Na realidade, a presença de aberturas nas formações rochosas torna sem significado o resultado de tal determinação. Por outro lado, constitui indicação de grande valia a medida do grau de estanqueidade das rochas por meio de ensaios de perda d’água, introduzidos na técnica pelo geólogo suíço Lugeon. O ensaio consiste na injeção d’água, sob pressão, nos furos realizados por sondas rotativas (Fig. 1.22), visando à obtenção do coeficiente de perda d’água, definido por: C V t l p = ∆ ⋅ ⋅ em que V é o volume d’água que, sob pressão p e num intervalo de tempo Dt, se infiltra através das fendas e diáclases da rocha; l é o trecho do furo ensaia- do, o qual é limitado na parte superior por um tampão de vedação. A unidade de C é o lugeon se Dt = 10 min, a pressão do ensaio for de 1 MN/m2 e as unidades de tempo e comprimento forem o minuto e o metro, a qual é equivalente a um valor compreendido entre 1 e 2 × 10–7 m/s (segundo Cambefort). Valores superiores a 20 lugeons revelam perdas excessivas d’água. Com vistas a problemas de fundações de barragens, o ensaio de perda d’água é conduzido do seguinte modo: a) primeiro ensaio, com p H w= ⋅ 1 2 γ (metade da carga prevista no reservatório (Fig. 1.23)); b) segundo ensaio, com p H w= ⋅ ⋅1 2, γ ; c) eventualmente um terceiro ensaio, com carga bem superior à carga do reservatório. Se o valor de C aumentar com o acréscimo de 0,5 a 1,2∙H∙gw, significa que as fendas da rocha estão se abrindo por efeito das pressões aplicadas. Neste caso, dispensa-se o terceiro ensaio. A B Rocha Corte AB FIGURA 1.21 Manômetro Hidrômetro Bomba Rocha Tampão l FIGURA 1.22 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-21 Se o valor de C for grande e não sofrer alterações quando se passa de uma pressão para outra, recomenda-se aumentar p até que haja variação de C, ou seja, quando se iniciar a abertura das fendas. Com os resultados dos ensaios de perda d’água e porcentagens de recu- peração dos testemunhos é feito o programa de injeções de cimento para impermeabilização das fundações de uma barragem, por exemplo. Caso de “Malpasset” Trata-se de um acidente catastrófico ocorrido em 3/12/1959 com uma barragem abóboda de dupla curvatura, do tipo esquema- tizado na Figura 1.24, construída sobre um gnaisse. O acidente foi, em parte, explicado por um intenso estado de fissuração do maciço rochoso. Considerando que para certas rochas não fissuradas o coeficiente de per- meabilidade é, praticamente, independente do estado de solicitação, o mesmo não ocorre para as rochas vacuolares, em que a razão entre as permeabilidades sob tensão nula e sob tensão de 5 MN/m2 varia de 1 a 5. Para rochas microfissuradas, essa razão atinge os valores de 6 a 35, sendo que para as amostras do local da barragem de Malpasset, na França, ela variava de 1 a 5000, o que caracterizava excepcional estado de fissuração. Observa-se, ainda, que das causas de acidentes de barragens nos Estados Unidos, pelo menos 40 % são, direta ou indiretamente, de ordem geológica. 1.23 MODELOS REOLÓGICOS Para apresentar, descrever e interpretar o comportamento dos materiais rochosos, têm sido utilizados, com frequência, inúmeros modelos reológicos, ou seja, associações de elementos mecânicos simples (molas, amortecedores, elemento de atrito sólido), por meio dos quais é possível um tratamento matemático das relações entre esforços atuantes e deformações correspondentes. 1.24 FUNDAÇÕES EM ROCHA As aplicações da Mecânica das Rochas são de grande interesse à engenharia de fundações e às obras de estabilização e contenção de maciços rochosos. Por sua própria natureza, esses trabalhos exigem permanente controle durante sua execu- ção. Só assim poder-se-á garantir seus resultados e evitar surpresas desastrosas. As injeções de cimento, das mais difundidas, consistem em injetar uma calda de cimento, através de tubos galvanizados de 2² a 3² de diâmetro, com a ponta aberta ou paredes perfura- das, os quais são cravadosaté a cota em que se deseja a consolidação. H FIGURA 1.23 Planta Corte NA FIGURA 1.24 e-22 CAPÍTULO 1 Quanto à relação água/cimento, aconselha-se iniciar com caldas bem ralas e terminar com caldas grossas. A Figura 1.25 esquematiza um exemplo de emprego de injeções para consolidar e imper- meabilizar estratos rochosos fissurados de apoio de uma barragem. O tratamento de maciços rochosos para fundações de estruturas é, também, feito à base de injeções de resinas sintéticas, do tipo epóxi. 1.25 ANCORAGENS E TIRANTES As técnicas de ancoragens por meio de tirantes têm tido grande desenvolvimento nos últimos tempos, cabendo destacar as importantes contribuições de engenheiros brasileiros, como o Prof. Costa Nunes, que em caráter pioneiro desenvolveu métodos empregados hoje em ou- tros países. Os tirantes, que podem ser verticais, horizontais ou inclinados, são constituídos das se- guintes partes (Fig. 1.26): a) Cabeça No caso de tirantes de barra de aço, a cabeça é composta de peça rosqueada e porca, ou de um sistema de encunhamento apoiado na placa metálica de distribuição. Os tirantes com fios de aço utilizam as fixações patenteadas conhecidas do concreto protendido. b) Trecho livre Consiste na armadura protegida externamente por um tubo, uma camisa de mate- rial plástico ou uma espessa camada de pintura semirrígida. Esta proteção destina-se a NA Barragem Rocha fissurada Furos de injeção FIGURA 1.25 Zona injetada Parede de escoramento Terreno Porcas Trecho livre Trecho de ancoragem Cabeça FIGURA 1.26 ELEmEnTOs dE mECâniCA dAs ROChAs e-23 evitar contato direto armadura/terra ou armadura/cimento, tendo em vista o proble- ma da corrosão. Ao lado da armadura passam, também, os eventuais tubos de injeção. Normalmente, este trecho varia de 6 a 15 m. c) Trecho de ancoragem Em alguns tipos de solos e para uma carga de trabalho de 400 kN, o seu compri- mento varia de 5 a 7 m. Em linhas gerais, o processo consiste em introduzir no maciço rochoso, por meio de ti- rantes de ancoragem (fixados com injeção de cimento), esforços capazes de aumentar sua estabilidade. Os esforços na ancoragem normalmente são da ordem de 400 kN, embora já tenham sido executadas ancoragens com mais de 1000 kN (1 MN). A Figura 1.27 esquematiza as forças atuantes na ancoragem de blocos, onde se obtém que a condição de equilíbrio é expressa pela desigualdade. T k N F S≤ + + ⋅( ) sen β τ ou, introduzindo-se um coeficiente de segurança v: v P sen k F S⋅ ⋅ ⋅ + ⋅ + ⋅ = (P senα α β τcos ) em que: P = peso do bloco de rocha; a = declividade da encosta; F = esforço de protensão no tirante AB; k = coeficiente de atrito rocha-solo; τ = tensão admissível de cisalhamento no tirante; S = n . s é a soma das áreas das seções transversais dos n tirantes de seção s. Se σ é a tensão admissível à tração do material do tirante, F S n s= ⋅ = ⋅ ⋅σ σ , daí se obtendo a área: ⋅ ⋅ α α( c σ β S P v k k = ⋅ − ⋅ + os )sen sen τ e, consequentemente, o número n s S s⋅ = de tirantes a utilizar. No caso de camada de rocha fissurada, de espessura h e peso específico γ γP h= ⋅( ) , o número nu de tirantes por unidade de área será: ( ) n hu = ⋅γ ⋅ ⋅σ βk +sen τ α α( cv k⋅ − ⋅ os )sen A técnica de utilização de tirantes para estabilização de blocos ou maciços rochosos alte- rados tem sido estendida aos maciços terrosos. Com suas diferentes maneiras de realizar a ancoragem (ou chumbamento), o método tem tido, com diferentes finalidades, grande apli- cação na construção de “cortinas ancoradas”. No caso da verificação da estabilidade de um talude e (Fig. 1.28) pelo conhecido “método sueco”, o fator de segurança, considerando-se as componentes normal e tangencial do esfor- ço de ancoragem F(Fn e Ft), passa a ser escrito: S N F tg c L T F n t = +( ) + ⋅∆ − ∑ ∑ ∑ φ Bloco de rocha A F T N P B FIGURA 1.27 sen tg e-24 CAPÍTULO 1 As Figuras 1.29 e 1.30 ilustram duas aplicações do método, observando-se o seu grande emprego na construção das chamadas cortinas ancoradas, recurso que vem sendo adotado na construção de metrôs. A Figura 1.30 mostra uma aplicação de tirantes verticais na solidarização de um muro de arrimo a certa profundidade do solo de fundação. Como exemplo dessa aplicação, cita-se, entre outros, o caso da Barragem de Cheurfas, na Argélia, em 1935 (por indicação de Coyne). Outra aplicação dos tirantes é indicada na Figura 1.31, onde eles são utilizados para fixa- ção dos blocos de fundação das torres para linhas de transmissão. A norma brasileira que trata da técnica de ancoragem no terreno e de suas aplicações é a NBR 5629 (Tirantes ancorados no terreno – Projeto e Execução). Corte Ancoragens FIGURA 1.29 Ancoragem Muro de arrimo FIGURA 1.30 F FIGURA 1.28 FIGURA 1.31 Estabilização de Maciços Em sua acepção mais geral, o termo estabilização designa qualquer processo ou tratamento capaz de melhorar a estabilidade de um maciço terroso ou rochoso. Ainda que os motivos e os processos de estabilização sejam os mais diversos, vamos nos referir aqui apenas às injeções e ao congelamento do solo, que alguns autores englobam nos chamados processos de consolidação. 2.1 INJEÇÕES As injeções se propõem a melhorar as características dos maciços terrosos e rochosos, nos seus aspectos de resistência e impermeabilização. A origem desse processo é atribuída ao engenheiro francês Berigny e sua primeira aplicação remonta a 1802. Atualmente, é vasto o campo de suas aplicações, permitindo soluções técnica e economicamente interessantes. É de se notar que esses trabalhos, por sua própria natureza, exigem permanente controle durante sua execução. Só assim pode-se garantir seus resultados e evitar surpresas desastro- sas. Sobre os tipos de injeção corretamente empregados, faremos um breve resumo. Injeção de cimento Esse tipo de injeção, dos mais difundidos, consiste em injetar uma calda de cimento no ter- reno, através de tubos galvanizados de 20 a 30 mm de diâmetro, com uma ponta aberta ou paredes perfuradas, os quais são cravados até a cota em que se deseja a consolidação. Quanto à relação água-cimento, aconselha-se iniciar a injeção com caldas bem ralas (200 litros de água por saco de cimento) e terminar com caldas grossas (40 litros por saco). As injeções de cimento são aplicadas com sucesso aos solos granulares (desde o pedregu- lho até a areia fina), limitando-se o seu emprego aos solos com diâmetro efetivo superior a 1 mm (D10 > 1 mm). Nos solos arenosos de granulometria fina, é de boa técnica, antes de iniciar a injeção de calda, forçar uma injeção de água em tubos alternados, criando, assim, canais no solo entre vários tubos. 2 e-26 CAPÍTULO 2 Tendo em vista que o material sobre o qual se assentam as fundações de uma barragem deve ser resistente e impermeável, é usual o emprego de injeções de cimento para consolidar e impermeabilizar estratos rochosos fis- surados que sirvam de apoio a tais obras, como esquematizado na Figura 2.1. Injeção de argila O processo baseia-se na propriedade tixotrópica de certas argilas, ou seja, de formarem suspensões que se mantêm líquidas quando agitadas, recuperan- do sua resistência coesiva quando em repouso. É particularmente o caso das bentonitas. Injeção à base de produtos betuminosos Consiste em injetar no solo uma emulsão betuminosa, fluida e estável, constituída por uma dispersão de asfalto na água, juntamente com um agente regulador de tempo de “ruptura”1 da emulsão. Rompida a emulsão, as partículas de asfalto se aglomeram e impermeabilizam o maciço. Silicatização Tratase de um processo químico de estabilização que consiste em injetar no solo, separa- damente, duas soluções (por exemplo, o silicato de sódio e o cloreto de cálcio), as quais, entrando em contato, “petrificam” o maciço. Este é o chamado processo Joosten. Jet grouting Os sistemas de consolidação de solos baseados em injeções de misturas de cimento que se inserem nos terrenos permaneceram sempre condicionadosa elementos que, geralmente, ou limitaram seu emprego, ou prejudicaram seu resultado. É o caso, por exemplo, de terrenos com características de permeabilidade e granulometria muito heterogênea, que podem gerar fuga de mistura nas zonas de maior permeabilidade e ausência de cimentação nas zonas me- nos permeáveis ou, ainda, dificuldade de execução nos casos em que é necessário limitar a pressão de injeção para evitar danos nas estruturas vizinhas. Por esta razão foi desenvolvido um método capaz de se valer da atuação de um jato de calda de cimento introduzido no terreno a alta pressão e elevada velocidade através de bicos injetores, num raio bem determinado, de tal modo que, desagrega o solo misturando-se a ele, formando, assim, as colunas de solocimento. A Figura 2.2 mostra a metodologia executiva de uma coluna de jet grouting, cujo diâmetro pode atingir até 4,00 m e, nesses casos, além da injeção de calda com bomba de alta pressão, usa-se o ar comprimido envolvendo o jato de calda. 2.2 Congelamento do solo A técnica de congelamento do solo é somente empregada nos casos difíceis de fundações em terrenos maus (solos moles e saturados de água), visto que se trata de solução muito onerosa e que exige a prévia instalação de uma central de refrigeração. O sistema, idealizado em 1883 pelo engenheiro alemão Pötsch para a perfuração de poços de minas, tem sofrido sucessivos aperfeiçoamentos. 1 Recordemos que ruptura de uma emulsão é o tempo necessário à separação do asfalto pela eliminação da água, após sua aplicação. FIGURA 2.1 EsTAbiLizAçãO dE MACiçOs e-27 A Figura 2.3 esquematiza o princípio em que se baseia, o qual consiste em fazer circular por tubos congeladores, instalados no terreno, um líquido refrigerante ou salmoura, que irá então congelar o solo e, consequentemente, estabilizar o maciço enquanto durar o processo. Como exemplo de aplicação no Brasil, cita-se o caso do reforço das fundações do edifício da Companhia Paulista de Seguros, em São Paulo, realizado por Estacas Franki Ltda. A Figura 2.4 mostra um corte do subsolo, a planta de fundação do edifício e um gráfico da evolução, com o tempo, dos recalques de algumas das colunas. Esse trabalho de congelamento é assim referido no IV volume do Manual do Engenheiro, Globo. Devido a uma lente de silte mole subjacente, um dos cantos do edifício estava recalcando ininterruptamente a uma velocidade de 2 mm por dia, havendo, portanto, perigo de colapso total do prédio, que tinha uma altura de cerca de 100 m. Decidiu-se congelar o solo na região da cunha de silte. Instalaram-se 130 congeladores numa área de cerca de 200 m2, atingindo uma profundidade média de 13 m. A energia gasta pela máquina frigorífica era de cerca de 70 000 kW/hora por mês. A temperatura média da salmoura FIGURA 2.2 FIGURA 2.3 e-28 CAPÍTULO 2 era de –17 °C e o solo congelou-se, mantendo-se a uma temperatura de –13 °C. Cerca de 80 dias após o início dos trabalhos de congelação, o recalque parou. Foi possível, então, abrir poços sob o edifício, para a moldagem de tubulões de concreto. Uma vez concretados os tubulões, instalaram-se macacos hidráulicos entre os mesmos e as colunas do prédio, os quais conseguiram suspender a estrutura, compensando-se o recalque. O degelo foi feito enquanto os macacos ainda estavam aplicados sob o prédio, para ser possível compensar os recalques dos tubulões, provocados pelo próprio degelo. Esses recalques atingiram valores muito elevados, porém nenhum dano causaram à estrutura devido à presença dos macacos hidráulicos, que possibilitaram a sua compensação. Para mais detalhes sobre esse trabalho, veja-se Géotechnique, v. IV, n. 1, 1956. Em artigo publicado na Revista Politécnica, em janeiro de 1972, o Prof. Milton Vargas re- fere-se ao caso em questão e comenta outros problemas de fundações de edifícios, ocorridos na mesma época, em Santos e em São Paulo, como o do Edifício do Banco do Estado, onde foi constatado o levantamento do terreno à medida que as estacas eram cravadas, passando a submetê-las a esforços de tração e rompendo-as na transição do fuste para a base; com o emprego de apropriada técnica executiva, outras estacas foram cravadas (no total, mais de 800) e o problema solucionado. PERFIL A–BFIGURA 2.4 Estradas e Aeroportos 3.1 INTRODUÇÃO Para que sejam asseguradas as condições de conforto, segurança e economia na construção de uma rodovia, além das condicionantes geométricas de traçado (Fig. 3.1), há que se proceder a investigações de natureza geológica e geotécnica da região a atravessar, as quais constituem os fundamentos dos estudos de drenagem e de estabilidade dos cortes e túneis, aterros e seus terrenos de suporte, fundações de obras de arte e dimensionamento dos pavimentos. Neste capítulo, trataremos de alguns aspectos básicos relativos às fundações de aterros e de dimensionamento dos pavimentos, comuns aos problemas de estradas e de aeroportos. 3 Perfil A P C Seção A-B 22_1 65 P T B Planta 50 55 60 P C P T 50 55 60 65 c FIGURA 3.1 e-30 CAPÍTULO 3 3.2 FUNDAÇÕES DE ATERROS Os problemas de fundações de aterros para estradas ou aeroportos surgem, em geral, na cons- trução de aterros sobre argilas moles ou terrenos pantanosos (Fig. 3.2), quando então é de se prever o aparecimento de grandes recalques ou, até mesmo, a ruptura da fundação. A ocorrência de aterros sobre solos compressíveis apresenta, em geral, três condições em comum; situam-se em zonas planas, são formados por solos fi- nos ou orgânicos e apresentam má drenagem. No projeto da chamada “Linha Vermelha” (Acesso Norte do Rio de Janei- ro), surgiu o caso, bastante interessante, da passagem da via por um trecho (com aproximadamente 1,5 km) de “aterro sanitário” (lixo), de grande espessura, sobrejacen- te a uma camada de argila mole. Os problemas encontrados na construção de aterros sobre camadas moles demandam os seguintes procedimentos: a) avaliar os recalques diferenciais do pavimento, em decorrência das deformações da camada mole, pelo efeito do peso do aterro; b) estimar o tempo necessário para que esses recalques se efetivem; c) dar indicações sobre a eficácia dos processos executivos que, por um lado, assegurem a estabilidade do aterro e, por outro, reduzam os recalques ou acelerem o tempo de ocorrência. Sobre os itens a e b, recalques e tempo de evolução, recordemos que, esquematicamente, é usual decompor o recalque total Dht de uma camada compressível, saturada, carregada por um aterro, nas parcelas a seguir mencionadas. Recalque imediato Dhi É o que se produz preliminarmente à drenagem, portanto, a volume praticamente constante (sendo a compressibilidade da água desprezível diante do esqueleto sólido). Seu cálculo pode ser feito a partir do módulo de deformabilidade E, deter- minado por um ensaio triaxial não drenado, pela fórmula: ∆ ∆ h H E Ii = ⋅σ em que Dσ é a sobrecarga do aterro, H a espessura da camada de solo compressível e I um coeficiente de influência, função da geometria do meio. Seu valor pode representar até 25% do recalque total. Recalque por adensamento Dha É o que decorre da drenagem da água através dos vazios do solo. Seu cálculo e sua evolução com o tempo são previstos pela conhecida Teoria do Adensamento, de Terzaghi e Fröhlich. Recalque secundário Dhs É aquele que continua a se produzir à deformação lateral nula, mesmo após a dissipação da pressão neutra, variando linearmente com o logaritmo do tempo. É mais significativo para as argilas orgânicas. Recalque devido ao escoamento lateral do solo Dhe É aquele que se constata ao final da construção do aterro. Assim, o recalque total do aterro é dado por: Dht = Dhi + Dha + Dhs + Dhe 22_2 h Camada mole FIGURA 3.2 EsTrAdAs E AErOPOrTOs e-31 Além dos problemas de recalque, há que se considerar também a possibilidade de ruptura do aterro por deformação plástica da camada mole, quando esta é sobrejacente a uma camada de elevada resistência. Quanto ao item c, ou seja, processosconstrutivos de aterros sobre solos compressíveis, pode-se recorrer a uma das soluções a seguir referidas, dependendo, naturalmente, das con- dições de cada caso. 3.3 CONSTRUÇÃO LENTA DO ATERRO Esta solução consiste em manter tão próximas de zero quanto possível as pressões neutras, mo- bilizando, assim, maior resistência ao cisalhamento do solo, com o consequente aumento da sua capacidade de carga. Sendo a resistência ao cisalhamento expressa pela equação de Coulomb: t = c + (σ – u)tg f quanto menor u, maior (σ – u) e, portanto, t. Daí se concluir que a fase mais crítica da vida do aterro é a que corresponde à sua cons- trução, pois, com a expulsão da água, há o adensamento e, no curso do processo, a resistência ao cisalhamento aumenta. Nessas condições, será possível construir o aterro sem o perigo de ruptura do material de fundação, embora em tempo longo, tendo em vista ser muito pequena a permeabilidade da argila. A construção do aterro deverá ser, naturalmente, rigorosamente controlada, quer por medição de recalques (Figs. 3.3 e 3.4), quer por observação das pressões neutras que se de- senvolverão na água dos poros de argila, através de tubos piezométricos instalados na zona aterrada e em diferentes alturas (Fig. 3.5). Quando se constata que os recalques estão exagerados ou que as pressões se mantêm mui- to altas, interrompe-se a deposição das terras até que aqueles se estabilizem ou que estas diminuam. RN (fora da obra) Recalque Terreno mole Terreno firme Aterro Plataforma de madeira 22_3 FIGURA 3.3 Terreno firme Recalque Terreno mole Aterro 22_4 Haste fixa Cano solidário com o aterro FIGURA 3.4 h = Sobrepressão hidrostática NANA Terreno mole Areia Terreno firme 22_5 Aterro FIGURA 3.5 e-32 CAPÍTULO 3 3.4 REMOÇÃO DA CAMADA MOLE Neste caso, o solo compressível é removido parcial ou totalmente pelo material do aterro. Se a profundidade alcançada pela camada mole é pequena (inferior a 4 m), a remoção pode ser feita por meio de draglines. Caso contrário, podem ser utilizados explosivos para facilitar o deslocamento da camada mole, conseguindo-se, assim, o assentamento do aterro sobre uma camada mais resistente, subjacente à argila mole. A Figura 3.6 elucida o processo de execução de aterros nos terrenos moles, pelo emprego de explosivos. Este foi o processo utilizado, em 1972, para a expulsão da turfa na transposição do chama- do “Brejo da Severina”, na diretriz da BR101 – Rio de Janeiro. O deslocamento do material mole poderá também ser conseguido pela carga do próprio aterro, auxiliada pela prévia abertura de uma vala ao longo do trecho. Na construção da estrada Piaçaguera-Guarujá, no litoral de estado de São Paulo, dadas as excepcionais condições locais – camada de até 70 m de terreno pantanoso – foi adotada a solução de parcial remoção da camada mole por um colchão de aterro hidráulico com 3,5 m 22_6 Material de aterro lançado previamente 1) Explosões para afundar o centro do aterro. Terreno resistente Carga 3, 50 m 3, 50 m Lodo 2) Explosões para afundar as partes laterais. 3) Explosões para formar o pé do aterro. Terreno resistente Cargas Lodo Lodo Cargas Terreno resistente 3,50 m Aterro FIGURA 3.6 EsTrAdAs E AErOPOrTOs e-33 de profundidade e 32 m de largura, sobre o qual foi construído o aterro com 2,5 m de altura e 14 m de plataforma, seguido de uma pavimentação asfáltica. 3.5 DRENOS VERTICAIS DE AREIA Os drenos verticais de areia, executados em camada de solo que se adensa sob a ação de uma sobrecarga, têm por objetivo acelerar esse processo de adensamento. O princípio de funcionamento, ilustrado esquematicamente na Figura 3.7, baseia-se no caso mais geral da teoria do adensamento, pois, além de persistir o fluxo d’água vertical, os drenos dão lugar a um fluxo horizontal radial, simétrico em relação ao eixo do dreno, dentro de certo espaço de influência suposto limitado por um cilindro de diâmetro Dc. Os drenos verticais de areia, em geral, são executados cravando-se um tubo aberto no solo e limpandoo; o tubo, com diâmetro de 20 a 60 cm, é retirado à medida que vai sendo cheio com material permeável (areia) e de granulometria adequada. Da teoria clássica de Terzaghi (adensamento unidimensional), sabemos que o tempo t requerido para uma camada alcançar certo grau de adensamento é proporcional ao quadrado da espessura H da camada por face de drenagem, isto é, ao quadrado da distância máxima que uma molécula de água tem que percorrer até atingir uma zona permeável: t T H cv = ⋅ 2 em que T é o fator tempo e cv o coeficiente de adensamento. Assim, se a distância a entre os drenos é bem menor que H (Fig. 3.8) e, como além disso, o coeficiente de permeabilidade horizontal é, em geral, maior que o coeficiente de permea- bilidade vertical, verifica-se que o tempo para se atingir o mesmo grau de adensamento será menor. O adensamento de camada mole por meio de drenos verticais de areia envolve, portanto, um processo de adensamento chamado tridimensional, muito mais complexo do que o ex- posto por Terzaghi. 22_7 Terreno resistente Aterro Corte Camada drenante Planta Argila mole Drenos de areia FIGURA 3.7 e-34 CAPÍTULO 3 A teorização dos drenos verticais é traduzida pela equação em coordenadas cilíndricas (Fig. 3.9): c u z c u r r u r u tv r ∂ ∂ + ∂ ∂ + ⋅ ∂ ∂ = ∂ ∂ 2 2 2 2 1 que, resolvida separadamente, nos dá: c u z u t U f Tv z ∂ ∂ = ∂ ∂ → = 2 2 ( ) com T c t H v= ⋅ 2 c u r r u r u t U f Tr r r n ∂ ∂ + ⋅ ∂ ∂ = ∂ ∂ → = 2 2 1 ( ), T c t Dr r c = ⋅ 2 e n D D r r r r c d = = ⋅ ⋅ = 2 2 2 1 2 1 sendo Dd o diâmetro do dreno, Dc o diâmetro de influência do dreno e U o grau de adensamento global, dado pela fórmula de Carrillo: 1 1 1−( )= −( ) −( )U U Ur z com Ur (%) e Uz (%), respectivamente, os graus de adensamento devidos às drenagens radial e vertical. Como se verifica, o cálculo depende fundamentalmente do conhecimento, obtido experimentalmente, dos coeficientes de adensamento cv e cr. Para se obter U, calcula-se Uz pela teoria clássica de Terzaghi e Ur utilizan- do-se a fórmula: T c t Dr r c = ⋅ 2 e as curvas da Figura 3.10 para o valor de D D nc d . A eficiência da instalação dos drenos nos processos de adensamento poderá ser avaliada pela comparação dos valores de U (%) e Uz (%). Barron inclui no cálculo a influência da perturbação causada no solo adjacente aos drenos durante a sua execução. Esta região amolgada e periférica ao dreno, chamada smear, reduz o coeficiente de permeabilidade na direção horizontal e, consequentemente, afeta a eficiência do dreno. a < H H D c Dd a Dd FIGURA 3.8 z D rd = 2 1 r 2 H kv kh D rc = 2 2 Dreno Zona de influência FIGURA 3.9 EsTrAdAs E AErOPOrTOs e-35 As mais econômicas distribuições dos drenos verticais de areia, em planta, são em malha quadrada ou triangular de lado a (Fig. 3.11). Os raios de influência para essas distribuições, como facilmente se obtém, são r2 = 0,564.a (malha quadrada) e r2 = 0,525.a (malha triangular). Ao acelerar o processo de adensamento, os drenos promovem mais rapidamente a mobili- zação da resistência ao cisalhamento do solo e, portanto, melhores condições de estabilidade do aterro. Com os mesmos objetivos dos drenos de areia, o processo Kjellman-Franki consiste em enterrar no solo, por meio de máquinas especiais, drenos verticais constituídos por fitas de papelão com 10 cm de largura e 3 mm de espessura. Estudos de De Beer, Wallays, Paquat e Veillez sobre a eficiência dos drenos verticais de cartão foram publicados na revista La Technique des Travaux, em março/abril de 1974. Exemplo Um aterro é constituído sobre uma camada de argila com 10 m de espessura e sobrejacente a um leito impermeável. O aterro acarretará na argila uma sobrecarga constante de 65 kN/m2. Para a argila tem-se cv = 1,5 × 10–7 m2/s, cr = 2,5 × 10–7 m2/s e mv = 2,5 × 10–4 m2/kN. Deseja-se que, após seis mesesda construção do aterro, o recalque máximo seja de 25 mm. Determine o espaçamento de uma malha quadrada de drenos de areia com 400 mm de diâmetro. Recalque total: ∆ ∆H p h m mmv= ⋅ ⋅ = ⋅ ⋅ × ≅ −65 10 2 5 10 1624, mm O recalque mínimo que deverá ocorrer ao final de seis meses (180 dias) será, então, 162 – 25 = 137 mm. Daí: U = ⋅ =137 162 100 85% 22_10 G ra u de a de ns am en to 100 40 10 5 100 80 60 40 20 0 0,01 0,04 0,10 0,20 0,40 Fator tempo Tr 1,0 Valores de n FIGURA 3.10 22_11 a a a a a FIGURA 3.11 e-36 CAPÍTULO 3 Com n D D Dc d c 0 4, vem D nc = ⋅0 4, Tem-se, ainda, que: T c t H v= ⋅ = × ⋅ ⋅ ⋅ = − 2 7 2 2 1 5 10 180 24 60 10 0 023 , , donde, da curva (1) da figura, obtém-se Uz ≅ 17%. Por outro lado: T c t D n nr r c = ⋅ = × ⋅ ⋅ ⋅ ⋅ = − 2 7 2 2 2 2 2 5 10 180 24 60 0 4 24 3, , , e daí: n Tr 24 3, Como 1 1 1−( )= −( ) −( )U U Ur z ou 0 15 0 83 1, ,= −( )Ur vem Ur = 0,82 Para Ur = 0,82 e considerando n = 10, obtém-se da figura, Tr ≅ 0,32. Com esse valor: n= = ≠ 24 3 0 32 8 7 10 , , , Tipo 2 Tipo 1 Tipo 3 P or ce nt ag em d e a d en sa m en to 0 U % 20 40 60 80 100 0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 Fator tempo, T Tipo 1 Pressão na sup. permeável 2 3 4 5 Pressão na sup. impermeável FIGURA 3.12 EsTrAdAs E AErOPOrTOs e-37 Tentando n = 9, teremos Tr = 0,30 e daí n 24 3 0 30 9 , , Assim: r2 = 9 ∙ 0,2 = 1,80 m e o espaçamento pedido: α = ≅ 1 80 0 564 3 2, , , m 3.6 BERMAS As bermas – ou banquetas laterais – de equilíbrio têm por objetivo ajudar a resistência ao ci- salhamento da camada mole de fundação do aterro. Essas plataformas laterais de contrapeso, construídas junto ao aterro (Fig. 3.14), criam um momento resistente que, se opondo ao de ruptura provocado pela carga do aterro, auxilia a resistência ao cisalhamento própria da argila. Assim como mostrado na Figura 3.15, o momento resistente acrescido ao momento devido à própria resistência ao cisalhamento da camada mole passa a ser c . R + F2 . n. Esse momento, opondo-se ao de ruptura provocado pela carga do aterro (F1m), permitirá, então, uma configuração de equilíbrio para o conjunto. Torna-se necessário, é claro, que o solo resista ao peso das bermas, cuja altura é calculada em função da altura crítica do aterro, isto é, altura máxima da qual se pode lançá-lo sem o perigo de ruptura da camada-suporte. Segundo Fellenius, o seu valor é dado por: 22_10 G ra u de a de ns am en to 100 40 10 5 100 80 60 40 20 0 0,01 0,04 0,10 0,20 0,40 Fator tempo Tr 1,0 Valores de n FIGURA 3.13 Berma Aterro Berma Camada mole Camada resistente 22_12 FIGURA 3.14 e-38 CAPÍTULO 3 h c cr = ⋅0 18, γ e a altura admissível por: h h FSadm cr em que: hcr = altura crítica; c = resistência ao cisalhamento do solo da camada de fundação; γ = peso específico do material do aterro; FS = fator de segurança. Dimensionamento de bermas Exemplificamos, a seguir, o cálculo de uma berma de equilíbrio, tendo em vista a superfície de ruptura considera- da na Figura 3.16 e os valores particulares dos parâmetros c = 15 kN/m2 e γ = 17 kN/m3. Aplicaremos o método de Jakobson, omitindo por brevidade o seu desenvolvimento teórico, que pode ser visto, por exemplo, em Géote- chnique, v. 1, n. 2, 1948. Admitamos os seguintes dados: largura da plataforma do aterro: 11,00 m; inclinação do talude: 2 : 3; altura do aterro: h1 = 5,40 m; peso específico do material de aterro: γ = 17 kN/m3; espessura da camada de argila mole: D = 6,00 m; resistência ao cisalhamento da argila: c = 15 kN/m2. a) Cálculo da altura crítica do aterro h mcr = ⋅ ⋅ = 15 0 18 17 1 1 4 45 , , , com um fator de segurança igual a 1,1. b) Cálculo da altura da berma h2 = h1 – hcr = 5,40 – 4,45 = 0,95 m Adotemos h2 = 1,00 m. C mnR F2 F1 γ FIGURA 3.15 Camada moleD d 0,758 Camada resistente h1 ( < )x b1 b1 b2h0 0 d x Gráfico válido para: C 15 kN e 17 kN/m 3 = = 3 2 0 2 3 4 5 6 87 9 10 11 12 b D 2 60° 50° 40° 30° 20° 10° 0° h h 1 2 b D 2 x b2 1 x b2 FIGURA 3.16 EsTrAdAs E AErOPOrTOs e-39 c) Cálculo da largura da berma Com a razão: h h 1 2 5 40 1 00 5 4 , , , O gráfico fornece: b D x b 2 2 2 02 0 8 , , a = 52° Sendo D = 6,00 m, teremos: b2 = 2,02 ∙ 6,00 = 12,12 m ou, aproximadamente, 12,00 m para a largura da berma. Daí: x = 0,8 ∙ 12,00 = 9,6 m Como b m1 11 3 2 4 4 17 6= + ⋅ =, , m tem-se x < b1 desigualdade que confirma a hipótese inicial em que nos baseamos. d) Determinação do centro da superfície de deslizamento. Para este cálculo, utiliza-se a fórmula: l h h b 2 1 2 a qual nos dá: l m= ⋅ = 1 00 5 40 12 00 2 22 , , , , m e daí: a = l + x = 2,22 + 9,60 = 11,82 m Temos, assim, todos os elementos para o dimensionamento do aterro com as bermas, bem como para o traçado da superfície de deslizamento mais desfavorável. De fato (Fig. 3.17): – altura do aterro: h1 = 5,40 m; – altura da berma: h2 = 1,00 m; – largura da plataforma do aterro: 11,00 m; – distância entre os meios dos taludes do corpo central do aterro: b1 = 17,60 m; e-40 CAPÍTULO 3 – distância do meio do talude do corpo central do aterro ao meio do talude (também 2 : 3) da berma: b2 = 12,00 m; – largura da plataforma da berma: 12,00 – (1,5 ∙ 2,20 + 1,5 ∙ 0,5) = 7,95 m; – distância que determina a vertical que passa pelo centro da superfície de deslizamento: a = 11,82 m; – ângulo correspondente à superfície de deslizamento: 2α =104°. Um dimensionamento prático de bermas pode ser conduzido a partir do gráfico da Figura 3.17, reproduzido do Design Manual for Soil Mechanics, Foundations and Earth Structures – Department of the Navy; Bureau of Yards and Docks (1962). Outros recursos Além dos recursos clássicos que acabamos de mencionar, são bem difundidas outras técnicas de melhoramento do solo para sua utilização como suporte de estruturas, tais como: Estacas de alívio O aterro é suportado por placas de concreto armado sobre estacas de madeira. O proces- so, pouco conhecido, foi originalmente desenvolvido na Suécia, e tem sido mais usado na Noruega, como declara Bjerrum. Em um importante trabalho intitulado Remblais sur sols compressibles (1973), um dos autores, referindo-se a este método construtivo, considera-o de “custo elevado e reservado a problemas muito particulares”. Colunas de brita vibrada É uma das técnicas de melhoramento de solos moles bem difundida e que consiste em formar no terreno colunas de brita vibrada segundo uma malha preestabelecida, com o objetivo de melhorar sua resistência minimizando os recalques da camada compressível. Essas colunas têm diâmetro de até 90 cm e podem atingir profundidades de até 20,00 m. A Figura 3.19 mostra a metodologia executiva de uma coluna de brita vibrada. Compactação intensiva dinâmica É uma técnica que data de 1970, cuja finalidade é melhorar as qualidades de suporte de um terreno, pela aplicação, na superfície, de forças dinâmicas intensivas, produzidas pela queda livre e sucessiva de um pilão. A escolha do peso do pilão, P, e da altura de queda h, dependem da espessura, H, da camada a ser compactada. A energia por golpe, P ∙ h, é um parâmetro fundamental; varia 22_15 Camada mole 17,6012,00 11,00 6, 00 1,00 7,95 11,82 9,602,22 5, 402: 3 52°52° 0 2:3 FIGURA 3.17 EsTrAdAs E AErOPOrTOs e-41 normalmente de 150 tf.m (1500 kN.m) a 500 tf.m (5000 kNm), podendo atingir, excepcional- mente, 1000 tf.m (10 000 kN.m) a 2000 tf.m (20 000 kN.m). Em primeira aproximação, este parâmetro pode ser determinado pela relação P ∙ h > H2 com h e H em metros e P em kN (veja Ménard e Broise (1976) em Ground treatment by deep compaction). FIGURA 3.18 Projeto de bermas para aterros sobre argilas moles. e-42 CAPÍTULO 3 Drenos fibroquímicos O dreno fibroquímico apresenta uma série de vantagens em relação aos drenos verticais tradicionais, pois possui ótima capacidade drenante, garantia contra entupimento, minimi- zação da colmatação do
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