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Geovana Sanches, TXXIV VULVOVAGINITES FLORA VAGINAL NORMAL A flora vaginal de uma mulher normal, em idade reprodutiva, assintomática, inclui diversas espécies aeróbias e facultativas, bem como anaeróbias obrigatórias, sendo os Lactobacillus o principal entre elas. Essas bactérias mantêm relação simbiótica com o hospedeiro e sofrem modificaçãoes dependendo do ambiente, de forma que a microbiota é determinada por fatores que afetam a capacidade de sobrevivência desses seres, tais como o pH vaginal e a disponibilidade de glicose para o metabolismo. Dentro desse ecossistema vaginal, alguns microrganismos produzem substâncias que inibem os organismos não nativos, tais como o ácido láctico e o peróxido de hidrogênio. Vários outros componentes antibacterianos, chamados de bacteriocinas, desempenham papel similar, incluindo peptídeos como acidocina e lactacina. Além disso, para proteção contra muitas substâncias tóxicas, a vagina secreta o inibidor da protease dos leucócitos, proteína que protege os tecidos locais contra produtos inflamatórios tóxicos e infecções. pH vaginal O pH vaginal normal varia entre 4,0 e 4,5. Acredita-se que esse valor é mantido principalmente pela produção de ácido láctico, ácidos graxos e outros ácidos orgânicos por espécies de Lactobacillus. O glicogênio presente na mucosa vaginal saudável fornece nutrientes para as bactérias e é metabolizado pelas próprias células e pelos lactobacilos, produzindo o ácido láctico. Menopausa À medida que o conteúdo de glicogênio dentro das células epiteliais vaginais diminui após a menopausa, há redução do substrato para a produção de ácido, com consequente elevação do pH vaginal - na ausência de sintomas, o pH vaginal de 6 a 7,5 é bastante sugestivo de menopausa. Gestação Durante a gestação, o estrógeno promove a proliferação dos órgãos sexuais e faz haja maiores quantidades de glicogênio aderidos na parede vaginal. Com isso, há maior produção de ácido láctico, fazendo com o que o pH vaginal da grávida fique mais baixo, em torno de 3,2. Essa alteração é o principal fator predisponente para a candidíase durante a gestação, uma das vulvovaginites que será discutida a seguir. Conteúdo vaginal fisiológico O conteúdo vaginal fisiológica é constituído por secreções das glândulas sebáceas e sudoríparas vulvares, de Bartholin e de Skene; transudato da parede vaginal; células vaginais e cervicais esfoliadas; muco cervical; líquidos endometriais e da tuba; e microrganismos com seus produtos metabólicos. Elas apresentam consistência flocular e cor branca, sendo geralmente localizadas no fórnix posterior da vagina. O exame microscópico normal evidencia muitas células epiteliais superficiais e poucos leucócitos. A coloração de Gram mostra células epiteliais superficiais normais e predomínio de bacilos gram-positivos (lactobacilos). VAGINOSE BACTERIANA A vaginose bacteriana (VB) é resultante de um desequilíbrio da microbiota vaginal que resulta na redução de lactobacilos e supercrescimento de bactérias anaeróbias, especialmente Gardnerella vaginalis, Ureaplasma urealyticum. Mobiluncus spp., Mycoplasma hominis e Prevotella spp. Isso aumenta a produção de enzimas proteolíticas que liberam aminas (trimetilamina, cadaverina e putrescina). Fatores de risco A doença não é considerada uma IST, podendo ser observada em mulheres sem experiência sexual prévia. Todavia, muitos fatores de risco estão relacionados a atividade sexual, tais como: • Sexo oral • Duchas higiênicas • Troca de adereços sexuais • Sexo durante a menstruação • Sexarca precoce • Múltiplos ou novos parceiros • Atividade sexual com outras mulheres Além disso, constituem outros fatores de risco a raça negra, o tabagismo e o uso frequente de antibióticos. Quadro clínico • Leucorreia branco-acizantada, de consistência homogênea, fina, com pequenas bolhas, aderente a parede vaginal, sem irritação e com mal cheiro Geovana Sanches, TXXIV • Pode ser acompanhada por disúria, dispareunia e colpite discreta • Em regra, avagina não se encontra eritematosa e o exame de colo uterino não releva anormalidades Diagnóstico Critérios de Amsel Para confirmação do diagnóstico, 3 dos 4 critérios de Amsel devem estar presentes. Critério Significado Fluxo homogêneo, branco-acizentado pH vaginal > 4,5 Ø Resultante da redução dos lacto- bacilos e na produção de ácido láctico Teste das aminas positivo (Whiff test) Ø Adição de KOH a 10% na amostra fresca de secreção vaginal libera aminas voláteis de odor de peixe Presença de clue cells Ø Indicadoras confiáveis de VB (valor preditivo de 95%) Ø Células epiteliais vaginais com bactérias aderidas, as quais criam uma borda celular pontilhada mal definida. Score de Nugent Escore Lactobacilos GV, Bacterioides Bacilos curvos 0 4+ 0 0 1 3+ 1+ 1+ ou 2+ 2 2+ 2+ 3+ ou 4+ 3 1+ 3+ 4 0 4+ Tratamento • Metronidazol 500mg, VO, 2x/dia, 7 dias • Metronidazol gel 0,75%, 5g, VV, 5 dias • Clindamicina 300mg, VO, 2x-dia, 7 dias • Clindamicina creme 2%, 5g, VV, 7 dias • Condições especiais o Vaginose bacteriana recorrente (> 4 diagnósticos em 1 ano) à macrolídeos e nitroimidazólicos o Associação com tricomoníase à preconiza-se o tratamento oral • Parceiros sexuais não devem ser tratados CANDIDÍASE VULVOVAGINAL A candidíase vulvovaginal é causada pela Candida albicans e outras espécies (C. glabrata, C. tropicalis e C. parapsilosis). Trata-se de uma infecção muito comum ao longo da vida das mulheres, sendo que até 75% delas vão ter ao menos um episódio durante a vida. Fatores predisponentes • Uso de antibióticos ou tamoxifeno • Uso de anticoncepcionais orais • Gravidez • Obesidade • Diabetes Mellitus • Imunossupressão (doença de base ou medicação) • Hábitos alimentares • Vestimenta propícia ao crescimento de fungos Sinais e sintomas • Corrimento branco, grumoso, de aspecto caseoso, aderido à parede vaginal e sem odor, semelhante a queijo coalhado • Intenso prurido vulvovaginal • Dor, ardência, eritema, escoriações, fissuras, edema, dispareunia e disúria externa Diagnóstico • Exame físico: eritema e edema vulvar; colo de aparência normal. É possível identificar lesões periféricas pustulopapulares bem delimitados. • pH vaginal normal (< 4,5) • Teste das aminas negativo • Exame microscópico: elementos fúngicos (pseudo-hifas) Tratamento • Antifúngicos azólicos orais ou tópicos Geovana Sanches, TXXIV o Em gestantes, utilizar os tópicos à Nistatina creme vaginal, 1 medida, VV, 14 noites • Fluconazol 150mg, dose única • Miconazol creme vaginal, 1 medida, VV, 7 noites • Butoconazol 2%, 5g, dose única • Não é necessário tratar o parceiro Candidíase recorrente • > 4 episódios em 1 ano • Sintomas irritativos persistentes no vestíbulo e na vulva, sendo que a queimação substitui o prurido como principal sintoma • Tratamento: Fluconazol 150mg, 1x por semana, por 6 meses Candida não albicans As cândidas não albicans (C. glabata e C. tropicalis) são suspeitadas especialmente quando é realizado o tratamento e este não é efetivo. Nesse caso, manipulamos a medicação: • Ácido bórico 600mg, VV, 1 vez ao dia, 7 a 14 noites TRICOMONÍASE A tricomoníase é causada pelo Trichomonas vaginalis, um parasito tetra- flagelado sexualmente transmitido. A taxa de transmissão é muito alta, sendo que até 70% dos homens adquirem o parasito após uma única exposição. Quadro clínico • Intensa descarga vaginal amarelo- esverdeada, bolhosa, espumosa, por vezes acizentada, acompanhada de odor fétido, não aderente às paredes vaginais • Prurido vulvar • Disúria • Edema e eritema vaginal e vulvar • Dispareunia Diagnóstico • Exame físico: cervicocolpite difusa e focal (colo com aspecto de framboesa) • Exame a fresco, com gota de conteúdo vaginal e soro fisiológico, demonstra o protozoárioao microscópio, associado ao aumento do número de leucócitos • pH > 5 (geralmente > 6,6) • Teste de amplificação de ácidos nucleicos (NAATs): padrão-ouro devido a alta sensibilidade • testes das aminas negativo ou levemente positivo • Pode haver clue cells em razão da comum associação com vaginose bacteriana Por ser uma infecção sexualmente transimíssel, as mulheres com tricomoníase devem ser submetidas a exames para detecção de outras ISTs, em particular Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis; deve-se considerar também o teste sorológico para sífilis e infecção pelo HIV. Tratamento • Os cremes vaginais não são eficazes no tratamento de tricomoníase, mas podem ser associados ao tratamento via oral para alívio dos sintomas • Metronidazol o 2g, VO, dose única o 500 mg, VO, 2x/dia, por 7 dias § Escolha durante a gestação § Incompatível com o consumo de álcool • Tinidazol 2g, VO, dose única • O parceiro sexual deve ser tratado o Suspender relações sexuais durante o tratamento COMPARATIVO ENTRE AS PRINCIPAIS VULVOVAGINITES CERVICITES GONORREIA A cervicite por gonorreia é uma doença infecciosa aguda caracterizada por invasão primária do trato urogenital. Tem como agente etiológico a Neisseria gonorrhoeae, cocobacilo gram negativo que invade as células epiteliais colunares e transicionais, passando para o meio intracelular. Muitas mulheres infectadas são assintomáticas, de forma que as dos grupos de risco devem ser rastreadas periodicamente. Geovana Sanches, TXXIV Fatores de risco • Idade < 25 anos • Outras ISTs • Antecedente de infecção por gonococos • Parceiro sexual recente ou múltiplos parceiros • Prática sexual sem preservativos • Compartilhamento de seringas ou objetos cortantes com resíduo de sangue • Profissionais do sexo Sinais e sintomas • Pode apresentar-se sob forma de vaginite ou cervicite • Secreção vaginal abundante sem odor, não irritante e de cor branca-amarelada • Pode ocorrer infecção das glândulas de Bartholin e de Skene e da utetra, com ascenção para o endométrio e tubas uterinas à infecção do trato reprodutivo superior • A presença de dor indica uma DIP Diagnóstico • NAAT (ampliação de ácido nucleico) o Substituiu a cultura na maioria dos laboratórios. o Amostras podem ser coletadas da vagina, ectocérvice ou urina, sendo as duas primeiras mais sensíveis • Exame bacteriológico da endocérvice o Identificação de diplococos gram- negativos no interior dos leucócitos • Cultura em meio específico Thayer-Martin Tratamento • Ceftriaxona 250mg IM + Azitromicina 1g, dose única • Doxiciclina 100mg, 2x/dia, por 7 dias • Faz-se necessário o tratamento dos parceiros sexuais • Deve haver abstinência sexual até que a terapia individual e dos parceiros tenha sido concluída. CLAMÍDIA A Chlamydia trachomatis é um parasita intracelular obrigatório, ou seja, depende do hospedeiro para sobreviver; causa infecção colunar e das glândulas ectocervicais. Sinais e sintomas • Assintomático • Descarga mucopurulenta ou secreções ectocervicais • Pode ocorrer uretrite, com intensa disúria • Infecções altas o Esterilidade o Risco de gravidez ectópica o Algia pélvica crônica Diagnóstico • Exame físico: Endocervicite hipertrófica erosiva, com secreção mucopurulenta • Análise microscópica das secreções em preparo hialino: > 20 leucócitos por campo • Exames específicos: cultura, NAAT e ELISA Tratamento Primário • Azitromicina 1g, dose única o Apresenta a vantagem de garantir a adesão ao tratamento por permitir que o médico observe a ingestão do medicamento no momento do diagnóstico. • Doxiciclina 100mg 2x/dia por 7 dias Alternativos • Eritromicina base 500mg 4x/dia, 7 dias • Etilsuccinato de eritromicina 800mg 4x/dia por 7 dias • Ofloxacino 300mg 2x/dia por 7 dias • Levofloxacino 500mg 1x/dia por 7 dias
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