Buscar

Resumo de citação O povo brasileiro - Darcy Ribeiro

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 13 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

RIBEIRO, Darcy. O povo Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: 3º Edição, Editora Global, 2015. 
O novo mundo
[...] não se iluda comigo, leitor. Além de antropólogo, sou homem de fé e de partido. Faço política e faço ciência movido por razoes éticas e por um fundo patriotismo. Não procure, aqui, análises isentas. Este é um livro que quer ser participante, que aspira a influir sobre as pessoas, que aspira a ajudar o Brasil a encontrar-se a si mesmo. P 15.
[...] os brasileiros se sentem e se comportam como uma só gente, pertencente a uma mesma etnia. Vale dizer, uma entidade nacional distinta de quantas haja, que fala uma mesma língua, só diferenciada por sotaques regionais, menos remarcados que os dialetos de Portugal. P 19.
A luta pela unificação potencializa e reforça, nessas condições, a repressão social e classista, castigando como separatistas movimentos que eram meramente republicanos ou antioligárquicos. P 19. Brasil não teve guerras de unificação como a Itália e Alemanha, mas para se manter unido se utilizou da guerra e da opressão. Como na guerra dos Canudos.
[...] só temos o testemunho de um dos protagonistas, o invasor. Ele é quem nos fala de suas façanhas. É ele, também que relata o que sucedeu aos índios e aos negros, raramente lhes dando a palavra de registro de suas próprias falas. O que a documentação copiosíssima nos conta é a versão do dominador. P 26.
Comprova essa dinâmica o texto de Hans Staden, que três vezes foi levado a cerimonias de antropofagia e três vezes os índios se recusaram a comê-lo, porque chorava e se sujava, pedindo clemência. Não se comia um covarde. P 29.
- Deusa Maíra.
- Indio como principal exportação para a metrópole P. 34.
A branquitude trazia da cárie dental à bexiga, à queluche, à tuberculose e ao sarampo. Desencadeia-se, ali, desde a primeira hora, uma guerra biológica implacável. [...] Assim é que a civilização se impõe, primeiro, como uma epidemia de pestes mortais. P 37.
Centralização: Rápida conquista, como no Peru e no México.
Descentralização: Dificuldade de conquista, é o que ocorre no Peru.
Isso se verifica comparando a rapidez da conquista e da pacificação onde o europeu se deparou com altas civilizações – como no México e no Peru – com a lentidão da conquista do Brasil, que prossegue até hoje com tribos arredias resistindo armadas à invasão de seus territórios para além das fronteiras da civilização. P 39.
Acabou ficando claro, para eles, que nada se podia esperar da Europa, corrompida e corrupta. A esperança única da salvação possível para ela seria o Apocalipse. O Novo Mundo, ao contrário, eles viam confirmar, a cada dia, suas esperanças de concretizar as profecias bíblicas. P 47.
O processo civilizatório, acionado pela revolução tecnológica que possibilitou a navegação oceânica, transfigurou as nações ibéricas, estruturando-as como impérios mercantis salvacionistas. P 50.
Nações germinais, como Roma no passado, foram os iberos, os ingleses e os russos no mundo moderno. Cada um deles deu origem a uma variante ponderável da humanidade – a latino-americana, a neobritânica e a eslava -, criando gentes tão homogêneas entre si, como diferenciadas de todas as demais, Estranhamente, a Alemanha, a França e a Itália, tão realizadas e plenas como ramos da civilização ocidental, não foram germinais. Fechadas em si, feudalizadas, ocupadas em dissensões com suas variantes internas, elas não se organizaram como Estados nacionais nem exerceram papel seminal. P 51.
Extermínio indígena se deu pois os indígenas se negaram a se escravizas, mas também se negaram a escravizar os demais
Com base nessa comunidade atípica e em seu acervo sociocultural, as novas entidades puderam enfrentar prontamente dois desafios cruciais. Um foi aniquilar os grupos indígenas, que não havendo sido apresados e obrigados a trabalhar como escravos, se afastaram do litoral e hostilizavam, desde o interior, os núcleos neobrasileiros assentados na costa. P 59.
Gestação étnica
[...] epidemias de varíola, de 1562 a 1563, que não atingem os portugueses, mas em três meses matam mais de 30 mil índios e negros. P 71.
Itamaracá, que chegou a ter prosperidade, foi abandonada pelos portugueses em razão dos ataques de índios aliados dos franceses. O mesmo sucedeu a Ilhéus e a Porto Seguro, que chegaram a ter, cada uma delas, mais de duzentos vizinhos, mas também sucumbiram acossados pelos Aimoré. P 73.
No plano linguístico, o tupi-guarani, como língua-geral, permaneceu sendo por séculos a fala dos brasilíndios paulistas. P 74.
Mem de Sá autorizou uma guerra de vingança para escravizar os índios Caeté por haverem comido o bispo Fernandes Sardinha. P 76.
O efeito dizimador das enfermidades desconhecidas, somado ao engajamento compulsório da força de trabalho e ao da deculturação, conduziram a maior parte dos grupos indígenas à completa extinção. P 108.
Qual a dificuldade de falar dos estupros Darcy?
A incorporação de indígenas à população brasileira só se faz no plano biológico e mediante o processo, tantas vezes referido de gestação dos mamelucos, filhos do dominador com mulheres desgarradas de sua tribo, que se identificavam com o pai e se somavam ao grupo paterno. Por essa via, através dos séculos, a mulher indígena veio plasmando o povo brasileiro e seu papel de principal geratriz étnica. P 109.
Portugal, que viveu mil anos na obsessão de fronteira, temeroso de ser engolido pela Espanha, aqui, desde a primeira hora, tratou de marcar e alargar as bases de suas posses territoriais. P 111.
Celso Furtado (1959) calcula que funcionariam, então, 120 engenhos de açúcar, e que o rebanho bovino atingiria, já, 680 mil cabeças. A produção anual de açúcar teria alcançado 2 milhões de arrobas, cujo valor seria de 2,5 milhões de libras esterlinas daquele tempo. Como se assinala, uma renda tão extraordinariamente alta fazia do empreendimento colonial português a empresa mais próspera da época. E, por isso mesmo, a mais cobiçada por holandeses e franceses, que passariam, desde então, a disputar sua posse. P 112.
Pobreza nas minas
Espantosa também foi a fome de gente que comprava uma galinha por seu peso em ouro. P 114.
Em 1800, a população do território brasileiro recupera seu montante original de 5 milhões. Mas o faz com uma composição invertida. A metade é formada, agora, por "brancos" do Brasil, predominantemente "pardos" - quer dizer, mestiços e mulatos -, falando principalmente o português como língua materna, e já completamente integrados à cultura neobrasileira. P 118.
Ser reacionário era positivo financeiramente e lucrativo para as elites econômicas brasileiras 
Os revezes experimentados pelas diversas economias regionais de exportação e a conseqüente queda do poderio do empresariado latifundiário e monocultor pareceram abrir aos brasileiros, naquele momento, a oportunidade de se estruturarem como um povo que existisse para si mesmo. Isso talvez tivesse ocorrido se não surgisse um novo produto de exportação - o café -, que viria rearticular toda a força de trabalho para um novo modo de integração no mercado mundial e de reincorporação dos brasileiros na condição de proletariado externo. Bem pode ser, porém, que, mesmo sem o auge do café, aquela reversão dos brasileiros sobre si mesmos não se cumprisse. O Brasil, produto da expansão da economia mundial, necessitaria profundas transformações para subsistir fora dela. As decisões indispensáveis para isso - abolição, reforma agrária, industrialização autônoma - excediam à capacidade daquele segmento social existente, uma vez que, para a classe dominante, permanecia sendo lucrativa economicamente a importação de bens manufaturados dos centros europeus e a exportação de produtos tropicais. P 119
Percepção de branco no Brasil e branco na europa são percepções distintas aqui o branco é o mestiço.
O "branco" colonizador e seus descendentes aumentavam século após século, não pelo ingresso de novos contingentes europeus, mas, principalmente, pela multiplicação de mestiços e mulatos. P 120.
Foi tentador demais o desejode montar fazendas de criação de negros para livrar os empresários das importações. O negócio nunca deu certo. Os negrinhos, espertíssimos, que ali se criavam, encontravam modos de ganhar o mundo fazendo-se passar por negros forros, o que tornava o negócio muito oneroso. Acresce que, o moleque que não entrasse no duro trabalho do canavial muito novinho, doze anos presumivelmente, jamais se adaptaria à dureza desse trabalho. P 122.
Não concordo com a justificativa a compra era promovida pelo favorecimento financeiro da coroa através do tráfico.
Processo sociocultural 
Conflitos interétnicos existiram desde sempre, opondo as tribos indígenas umas às outras. Mas isto se dava sem maiores conseqüências, porque nenhuma delas tinha possibilidade de impor sua hegemonia às demais. P 127.
Isso foi feito no curso de um empreendimento econômico secular, o mais próspero de seu tempo, em que o objetivo jamais foi criar um povo autônomo, mas cujo resultado principal foi fazer surgir como entidade étnica e configuração cultural um povo novo, destribalizando índios, desafricanizando negros, deseuropeizando brancos. P 135.
Brasil era um país com múltiplas línguas antes da proibição das demais línguas que não fossem a língua do colonizador. 
Na sua história se inclui um balanço geral dos povos indígenas, que viviam na costa do mar até o sertão onde chegaram os portugueses e que ele divide em tupis e tapuias. Os primeiros, repartidos em dez nações principais, que viviam de Pernambuco a São Vicente. Falavam "uma só língua e esta é a que entendem os portugueses. É facil e elegante, e suave; e copiosa. A dificuldade dela está em ter muitas composições". Acrescenta que os portugueses, quase todos que estão no Brasil, "a sabem em breve tempo e seus filhos, homens e mulheres, a sabem melhor" (Cardim 1980:101 ). P 136.
E, ainda, sobre os Tamuya do Rio de Janeiro, acrescenta, "estes destruíram os portugueses quando povoaram o Rio e deles há muito poucos" (Cardim 1980:103 ). P 137.
Nossa primeira cidade, de fato, foi a Bahia, já no primeiro século, quando surgiram, também, o Rio de Janeiro e João Pessoa. No segundo século, surgem mais quatro: São Luís, Cabo Frio, Belém e Olinda. No terceiro século, interioriza-se a vida urbana, com São Paulo; Mariana, em Minas; e Oeiras, no Piauí. P 146.
A industrialização e a urbanização são processos complementares que costumam marchar associados um ao outro. P 149.
A elite brasileira como principal fator do atraso político. Reacionários são contras os avanços industriais 
Essa política de capitalismo de Estado e de industrialização de base provocou sempre a maior reação por parte dos privatistas e dos porta-vozes dos interesses estrangeiros. Assim é que, quando Getúlio Vargas se prepara para criar a Petrobrás e a Eletrobrás, uma campanha uníssona de toda a mídia levou seu governo a tal desmoralização que ele se viu na iminência de ser enxotado do Catete. Venceu pelo próprio suicídio, que acordou a nação para o caráter daquela campanha e para os interesses que estavam atrás dos inimigos do governo. Em conseqüência, os líderes da direita não alcançaram o poder e o candidato de centro-esquerda, Juscelino Kubitschek, foi eleito presidente. Com ele, se desencadeia a industrialização substitutiva. Num mundo em que nem Dutra nem Getúlio conseguiam qualquer investimento, Jtc, abandonando a política de capitalismo de Estado, atrai numerosas empresas para implantar subsidiárias no Brasil, no campo da indústria automobilística, naval, química, mecânica etc. Para tanto, concedeu toda a sorte de subsídios, tais como terrenos, isenção de impostos, empréstimos e avais a empréstimos estrangeiros. O fez com tanta largueza, que muita indústria custou a seus donos menos de 20% de investimento real do seu capital (Tavares 1964 ). P 153.
Quem quiser acabar com o crime organizado, deve conter o subsídio ao vício dado pelos norte-americanos. P 155.
Não é por acaso, pois, que o Brasil passa de colônia a nação independente e de Monarquia a República, sem que a ordem fazendeira seja afetada e sem que o povo perceba. Todas as nossas instituições políticas constituem superfetações de um poder efetivo que se mantém intocado: o poderio do patronato fazendeiro. P 165.
A definição brasileira de negro não pode corresponder a um artista ou a um profissional exitoso. Exemplifica essa situação o diálogo de um artista negro, o pintor Santa Rosa, com um jovem, também negro, que lutava para ascender na carreira diplomática, queixando-se das imensas barreiras que dificultavam a ascensão das pessoas de cor. O pintor disse, muito comovido: "Compreendo perfeitamente o seu caso, meu caro. Eu também já fui negro". P 169.
Essa situação não chega a configurar uma democracia racial, como quis Gilberto Freyre e muita gente mais, tamanha é a carga de opressão, preconceito e discriminação antinegro que encerra. Não o é também, obviamente, porque a própria expectativa de que o negro desapareça pela mestiçagem é um racismo. Mas o certo é que contrasta muito, e contrasta para melhor, com as formas de preconceito propriamente racial que conduzem ao apartheid. P 170.
Ontem, era uma força de trabalho escrava de uma empresa agromercantil exportadora. Hoje, é uma oferta de mão-de-obra que aspira a trabalhar e um mercado potencial que aspira a consumir. Nos dois casos, foi sempre uma empresa próspera, ainda que só o fosse para minorias privilegiadas. P 188.
Quando é declarada a independência, a classe dominante local se nacionaliza alegremente, preparando-se para lucrar com o regime autônomo, tal como lucrara com o colonial. P 188.
Na verdade, essa camada senhorial constitui um círculo fechado de convívio eurocêntrico, que mais cultua a moda que seus próprios valores hauridos no acesso ao centro metropolitano, onde, bem ou mal, se faz herdeira da literatura, da música, das artes gráficas e plásticas, bem como de outras formas eruditas de expressão de uma cultura que, apesar de alheia, passaria a ser a sua própria. P 196.
O fundamental, porém, é que milagrosamente o povo, sobretudo o negro-massa, continua tendo erupções de criatividade. Esse é o caso do culto a Iemanjá, que em poucos anos transformou-se completamente. Essa entidade negra, que se cultuava a 2 de fevereiro na Bahia e a 8 de março em São Paulo, foi arrastada pelos negros do Rio de Janeiro para 31 de dezembro. Com isso aposentamos o velho e ridículo Papai Noel, barbado, comendo frutas européias secas, arrastado num carro puxado por veados. Em seu lugar, surge, depois da Grécia, a primeira santa que fode. A Iemanjá não se vai pedir a cura do câncer ou da AIDS, pede-se um amante carinhoso e que o marido não bata tanto. P 197.
Isso significa que, apesar de tudo, somos uma província da civilização ocidental. Uma nova Roma, uma matriz ativa da civilização neolatina. Melhor que as outras, porque lavada em sangue negro e em sangue índio, cujo papel, doravante, menos que absorver europeidades, será ensinar o mundo a viver mais alegre e mais feliz. P 198.
Os brasis na História
Só muito mais tarde, depois de 1700, com o início do ciclo do ouro, deixa de ser o setor mais dinâmico da economia brasileira e o mais importante como fonte de recursos para a Coroa. P 206.
O escravo, índio ou negro, que sobrevivia ao duro trabalho no engenho também se abrasileirava no mesmo ritmo e com igual profundidade. Embora polarmente opostos ao senhor, tinham, no fim, mais de comum com ele pela língua que falavam e pela visão do mundo que com seus ancestrais tribais brasileiros ou africanos. P 207.
Surge, assim, uma estrutura socioeconômica totalmente distinta da feudal, ainda que arcaica e pré-capitalista. P 215.
A liberdade, todavia, se eduziria à assunção desse escravo à posição de parceiro: receberia um trato de terra para lavrar, a fim de produzir a comida escassa que, agora, ninguém lhe dava, com a obrigação de fazer os mesmos serviços de outrora, mediante um pagamento que lhe permitia comprar o sal, os panos e as pouquíssimas outras coisas indispensáveis para cobrir a nudez e satisfazeràs necessidades elementares de sua vida frugal. P 224.
Lingua Tupi
A disciplina imposta por esses trabalhos e as condições de convívio entre índios de diferentes matrizes impuseram a homogeneização lingüística e o enquadramento cultural compulsório do indígena no corpo de crenças e nos modos de vida dos seus cativadores. Sob essas compulsões é que se tupinizaram as populações aborígenes da Amazônia, em sua maioria pertencentes a outros troncos lingüísticos, mas que passaram a falar a língua geral, aprendida não como um idioma indígena, mas como a fala da civilização, como ocorria então com quase toda a população brasileira. P 232
Mais do que transmissores de modos tradicionais de sobrevivência na floresta úmida, desenvolvidos em milênios de esforço adaptativo, os índios foram o saber, o nervo e o músculo dessa sociedade parasitária. Índios é que fixavam os rumos, remavam as canoas, abriam picadas na mata, descobriam e exploravam as concentrações de especiarias, lavravam a terra e preparavam o alimento. Nenhum colonizador sobreviveria na mata amazônica sem esses índios que eram seus olhos, suas mãos e seus pés. P 233.
O padre Antônio Vieira, que foi da Companhia de Jesus, descrevendo no século XVII rios que ele visitara uma década antes, se espanta com a quantidade de gente dizimada pelos colonos em nome da civilização. Ele fala - certamente sem exagero - de 2 milhões de índios que se teriam gasto e se continuavam gastando. P 235-236.
Nenhuma condição humana é talvez mais miserável que a desses seringueiros, isolados nas suas cabanas dispersas pela mata, trabalhando de estrela a estrela, maltrapilhos, subnutridos, enfermos e analfabetos e, sobretudo, desenganados da vida, que não lhes oferece qualquer esperança de libertação. P 243.
Toda a antropologia brasileira e mundial repetia dados inequívocos que demonstravam como, a cada ano, diminuía o número de membros de cada tribo conhecida. A morte parecia ser o destino fatal dos índios brasileiros e, de resto, dos demais povos chamados primitivos. De repente, começou a se ver a reversão desse quadro. P 244.
Os Yanomami, que constituem hoje o maior povo prístino da face da terra, começam a extinguir-se, vitimados pelas doenças levadas pelos brancos, sob os olhos pasmados da opinião pública mundial. São 16 mil no Brasil e na Venezuela. Falam quatro variantes de uma língua própria, sem qualquer parentesco com outras línguas, vivendo dispersos em centenas de aldeias na mata, ameaçados por garimpeiros que, tendo descoberto ouro e outros metais em suas terras, reclamam dos governos dos dois países o direito de continuarem minerando através de processos primitivos, baseados no mercúrio, que polui as terras e envenena as águas dos Yanomami. P 245.
Suicídios indígenas 
Nessas condições, as próprias tradições indígenas se redefinem, às vezes, já não para lhes dar sustentação moral e confiança em si mesmos, mas para induzi-los ao desengano. Esse é o caso dos mitos heróicos guaranis referentes à criação do mundo, que se converteram em mitos macabros, em que a própria terra apela ao criador que ponha um fim à vida porque está cansada demais de comer cadáveres. P 246.
Em todos os desvãos do Mato Grosso e Goiás, do Maranhão, do Pará e do Amazonas, milhões de hectares de terras virgens foram concedidos, nas últimas décadas, a "donos" que nunca as viram, mas um dia se apresentam para desalojar os pioneiros sertanejos como invasores que, tangidos por um movimento secular de expansão da ocupação humana dos desertos interiores, as alcançaram, almejando nelas se instalarem permanentemente. P 258.
Suas duas formas principais de expressão foram o cangaço e o fanatismo religioso, desencadeados ambos pelas condições de penúria que suporta o sertanejo, mas conformadas pelas singularidades do seu mundo cultural. Até meados da década de 1930, quando se acelerou a construção de estradas através do mediterrâneo sertanejo, operava, como forma de revolta típica da região, o cangaço. Foi uma forma de banditismo típica do sertão pastoril, estruturando-se em bandos de jagunços vestidos como vaqueiros, bem-armados, que percorreram as estradas do sertão em cavalgadas, como ondas de violência justiceira. Cada integrante do bando tinha sua própria justificativa moral para aliciar-se no cangaço. Um, para vingar uma ofensa à sua honra pessoal ou familiar; outro, para fazer justiça com as próprias mãos, em razão de agravos sofridos de um potentado local; todos fazendo do banditismo uma expressão de revolta sertaneja contra as injustiças do mundo. Resultaram, por vezes, na eclosão de um tipo particular de heroísmo selvagem que conduziu a extremos de ferocidade. Tais foram os cangaceiros célebres que, se por um lado ressarciam aos pobres de sua pobreza com os bens que distribuíam depois de cada assalto, por outro, matavam, estropiavam, violentavam, em puras exibições de fúria. P 261.
A memória de Canudos perpetuou-se, também, na tradição oral das populações sertanejas, que recolheram os poucos sobreviventes do morticínio e deles ouviram e guardaram os episódios heróicos de resistência e de luta. E, sobretudo, a lição de esperança dos ensinamentos do Conselheiro sobre a possibilidade de criar uma ordem social nova, sem fazendeiros, nem autoridades. P 264.
Missões inteiras, das mais ricas e populosas, como Guaíra (oeste paranaense), Itatim (sul do Mato Grosso) e Tapes (Rio Grande do Sul), foram assim destruídas pelos bandeirantes paulistas, que saquearam seus bens e escravizaram seus índios. É de supor que paulistas tenham vendido mais de 300 mil índios, principalmente missioneiros, aos senhores de engenho do Nordeste. P 270.
Enquanto entreposto mercantil, São Paulo era um módulo da trama econômica transatlântica de produção e comércio, comunicada através de naus oceânicas. Sua principal mercadoria eram índios caçados para vender como escravos aos núcleos açucareiros do Nordeste e também para outros lugares. Capistrano de Abreu, referindo-se a São Paulo, dizia que o Brasil, antes de importador, fora exportador de escravos. P 273.
O escamoteio de ouro e dos diamantes e a sonegação dos impostos prevalecem, desde então, como o sentimento mais profundo dos corações mineiros e como sua forma particular de rebeldia. P 275.
Buscando manter sua procedência social, muitas parentelas antes ricas, mas de bens minguantes, emigraram com sua escravaria para sesmarias conseguidas em territórios ermos. Aí reconstituem núcleos de vida autárquica, novamente orgulhosos de só depender do comércio para o provimento do sal, mal escondendo, atrás dessa vaidade, a sua penúria. O núcleo fidalgo destas parentelas continuava cultuando certa erudição. Os pais ensinavam a ler e a escrever aos seus filhos varões, iniciando-os às vezes em rudimentos de latim e de literatura clássica. Mesmo as camadas populares mantêm, por algumas décadas, nesses núcleos de citadinos ruralizados, certos traços culturais de extração urbana européia, como a música erudita. Ainda no século XIX, músicos afeiçoados a quartetos de corda surpreendem o sábio alemão Karl von Martius, que atravessava a região, com convites para tertúlias de puro gosto fidalgo, em pleno sertão mineiro. P 280.
Soma-se a isso a circunstância de viver apartada do resto do Brasil e submetida a influências intelectuais e políticas de centros urbanos culturalmente avançados, como Montevidéu e Buenos Aires. Nessas condições, não podiam deixar de surgir aspirações de independência, inspiradas às vezes na concepção de que o Sul melhor realizaria suas potencialidades como um país autônomo do que como um estado federado; motivadas outras vezes por ideários políticos arrojados, como as lutas anti-escravistas e a campanha republicana dos farrapos. P 302.
O destino nacional
Não há, nunca houve, aqui um povo livre, regendo seu destino na busca de sua própria prosperidade. O que houve e o que há é uma massa de trabalhadores explorada, humilhada e ofendida por uma minoria dominante, espantosamente eficaz na formulação e manutenção de seu próprio projeto de prosperidade,sempre pronta a esmagar qualquer ameaça de reforma da ordem social vigente. P 330.

Continue navegando