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Teoria da Arquitetura e Urbanismo Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla Coordenador de Conteúdo Andréia Gonçalves. Designer Educacional Kaio Vinicius C. Gomes. Revisão Textual Érica Fernanda Ortega, Cintia Prezoto Ferreira, Helen Braga do Prado, Meyre Barbosa da Silva, Silvia Caroline Gonçalves e Talita Dias Tomé. Editoração Isabela Belido, José Jhonny, Melina Be- lusse Ramos e Thayla Guimarães Cripaldi. Ilustração Bruno Pardinho. Realidade Aumentada Kleber Ribeiro da Silva, Leandro Naldei e Thiago Surmani. C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; GORLA, Grasielle Cristina dos Santos Lembi. Teoria da Arquitetura e Urbanismo. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla. Maringá-PR.: Unicesumar, 2018. 352 p. “Graduação - EAD”. 1. Arquitetura. 2. Urbanismo. 3. EaD. I. Título. CDD - 22 ed. 720 CIP - NBR 12899 - AACR/2 ISBN: 978-65-5615-290-5 NEAD - Núcleo de Educação a Distância Av. Guedner, 1610, Bloco 4 - Jardim Aclimação CEP 87050-900 - Maringá - Paraná unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 Impresso por: Gráfica Mona. DIREÇÃO UNICESUMAR Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor e Pró-Reitor de Administração, Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva, Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi. NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Diretoria Executiva Chrystiano Mincoff, James Prestes, Tiago Stachon , Diretoria de Graduação e Pós-graduação Kátia Coelho, Diretoria de Permanência Leonardo Spaine, Diretoria de Design Educacional Débora Leite, Head de Produção de Conteúdos Celso Luiz Braga de Souza Filho, Head de Metodologias Ativas Thuinie Daros, Head de Curadoria e Inovação Tania Cristiane Yoshie Fukushima, Gerência de Projetos Especiais Daniel F. Hey, Gerência de Produção de Conteúdos Diogo Ribeiro Garcia, Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira, Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila de Almeida Toledo, Projeto Gráfico José Jhonny Coelho e Thayla Guimarães Cripaldi, Fotos Shutterstock. PALAVRA DO REITOR Em um mundo global e dinâmico, nós trabalha- mos com princípios éticos e profissionalismo, não somente para oferecer uma educação de qualida- de, mas, acima de tudo, para gerar uma conversão integral das pessoas ao conhecimento. Baseamo- -nos em 4 pilares: intelectual, profissional, emo- cional e espiritual. Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil: nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba, Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 250 polos EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. Produzimos e revi- samos 500 livros e distribuímos mais de 500 mil exemplares por ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos educacionais do Brasil. A rapidez do mundo moderno exige dos educadores soluções inteligentes para as ne- cessidades de todos. Para continuar relevante, a instituição de educação precisa ter pelo menos três virtudes: inovação, coragem e compromisso com a qualidade. Por isso, lançamos os chama- dos cursos híbridos nas áreas de Engenharia e Arquitetura, que reúnem o melhor do ensino presencial e a distância. Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária. Vamos juntos! BOAS-VINDAS Prezado(a) Acadêmico(a), bem-vindo(a) à Co- munidade do Conhecimento. Essa é a característica principal pela qual a Unicesumar tem sido conhecida pelos nossos alu- nos, professores e pela nossa sociedade. Porém, é importante destacar aqui que não estamos falando mais daquele conhecimento estático, repetitivo, local e elitizado, mas de um conhecimento dinâ- mico, renovável em minutos, atemporal, global, democratizado, transformado pelas tecnologias digitais e virtuais. De fato, as tecnologias de informação e comu- nicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, lugares, informações, da educação por meio da conectividade via internet, do acesso wireless em diferentes lugares e da mobilidade dos celulares. As redes sociais, os sites, blogs e os tablets ace- leraram a informação e a produção do conheci- mento, que não reconhece mais fuso horário e atravessa oceanos em segundos. A apropriação dessa nova forma de conhecer transformou-se hoje em um dos principais fatores de agregação de valor, de superação das desigualdades, propagação de trabalho qualificado e de bem-estar. Logo, como agente social, convido você a saber cada vez mais, a conhecer, entender, selecionar e usar a tecnologia que temos e que está disponível. Da mesma forma que a imprensa de Gutenberg modificou toda uma cultura e forma de conhecer, as tecnologias atuais e suas novas ferramentas, equipamentos e aplicações estão mudando a nossa cultura e transformando a todos nós. Então, prio- rizar o conhecimento hoje, por meio da Educação a Distância (EAD), significa possibilitar o contato com ambientes cativantes, ricos em informações e interatividade. É um processo desafiador, que ao mesmo tempo abrirá as portas para melhores oportunidades. Como já disse Sócrates, “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida”. É isso que a EAD da Unicesumar se propõe a fazer. Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequentemente, transformamos também a so- ciedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportunidades e/ou estabe- lecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompa- nhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica e encontram-se integrados à proposta pedagógica, contribuindo no processo educa- cional, complementando sua formação profis- sional, desenvolvendo competências e habilida- des, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessários para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de crescimento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o Stu- deo, que é o seu Ambiente Virtual de Aprendiza- gem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de apren- dizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranquili- dade e segurança sua trajetória acadêmica. APRESENTAÇÃO Caro(a) aluno(a), este livro objetiva orientar os estudos no âmbito da Teoria da Arquitetura e Urbanismo, considerando a sua essência e os conhecimentos que tratam da sua definição e conceitos. Ao longo das unidades, serão tratados temas relacionados com a caracterização da arquitetura no seu aspecto de interdisciplinaridade e capacidade intrínseca de transmitir mensagens culturais à sociedade vigente; contexto histórico em que a arquitetura desenvolve-se no âmago das diversas civilizações; estudo das for- mas, realçando seus princípios esistemas de organização; conceito de espaço e a especificidade que o transforma em lugar, assinalando extremidades conceituais que demarcam possibilidades de transição espacial e, por último, abordagem dos princípios de composição e sua importância para a concepção de projetos de arquitetura e urbanismo. De caráter conceitual, o livro visa orientar você, aluno(a), no reconhecimento, na associação e na reflexão sobre os principais elementos que compõem a arquitetura, apresentando uma base técnica e científica que o auxiliará no desenvolvimento das demais atividades e disciplinas do curso. No decorrer do livro, houve a preocupação em relacionar os conceitos abordados com a sua aplicação prática, assinalada por meio da demonstração de exemplos de obras arquitetônicas. O livro inicia-se com uma conceituação abrangente sobre o vasto território que a arquitetura abrange, demarcando suas raízes e seu desenvolvimento histórico, além dos parâmetros que caracterizam a arquitetura como uma arte funcional, dotada de particularidades que envolvem o cotidiano do homem. Também há ênfase nos procedimentos que permitem a sua composição, almejando que haja maior entendimento sobre a evolução processual do ato de conceber e desenvolver projetos arquitetônicos e urbanísticos. Neste contexto, faz-se importante a com- preensão, de sua parte enquanto aluno(a), do papel do arquiteto e do urbanista na sociedade atual. Nas Unidades II e III, vejo a eminente necessidade de destinar um espaço para o relato das principais correntes arquitetônicas, dos estilos e dos tratados que se desenvolveram ao longo da história. Não identifico possibilidade de, aqui, esgotar o conteúdo sobre cada período histórico, nem a viabilidade de iniciar a descrição pelas civilizações remotamente primitivas. O foco desta síntese converge, então, a abordar temas, princípios e conceitos que são recorrentes à arquitetura atual, buscando os primórdios de tais diretrizes. O objetivo é caracterizar como algumas civilizações importantes para o mundo ocidental desenvolveram sua relação com a arquitetura e como esta as representou por meio de sua simbologia. Quando possível, o texto evidencia arquitetos e obras relevantes de determinada época, transmitindo, de forma mais concreta, a sua importância para a produção arquitetônica. Entender como a arquitetura foi concebida ao longo da história é fundamental para compreendermos o cenário vigente e buscarmos referências válidas para nossas concepções. Nas Unidades IV e V, a abordagem envolve o estudo da forma e sua aplicação na prática projetiva da arquitetura. Inicio a abordagem sobre o tema com a apre- sentação dos principais elementos gráficos e sólidos regulares que influenciam a composição projetiva, além da caracterização das tipologias formais. Depois avanço para as possibilidades de transformação da forma e sua organização em núcleos compositivos. Nas Unidades VI e VII, o assunto central é o espaço. No primeiro momento, a abor- dagem acontece em nível conceitual, apresentando possibilidades de intervenção no espaço e a sua ascensão em conceito de lugar, com características que sensibilizam o usuário e definem o seu comportamento no contexto social. Também trabalho com a análise perceptiva do espaço, assim como sua delimitação e dimensionamento na produção arquitetônica. Já na Unidade VII, trato dos elementos formais definidores do espaço e das possibilidades de organização arquitetônica que envolvem forma e espaço em configurações esquematizadas. Na parte final do livro, a arquitetura é caracterizada segundo princípios de orde- namento, que representam importantes recursos de composição projetiva, como na Unidade VIII, em que a discussão é sobre os princípios de eixo e a simetria, que proporcionam equilíbrio às concepções arquitetônicas. A Unidade IX aprofunda os princípios de ordem na arquitetura, gerando reflexão sobre os recursos de hie- rarquia, dado, ritmo e transformação. Em um contexto abrangente, este livro tem como objetivo promover o conheci- mento, a reflexão e a discussão sobre a essência da arquitetura, contemplando os conteúdos necessários à formação de um profissional capacitado e engajado com as questões técnicas e criativas que o processo projetivo exige. Assim, ele se tornará capaz de conceber uma arquitetura de qualidade com base na tríade vitruviana, que satisfaça as demandas sociais cada vez mais complexas. Um ótimo aprendizado! CURRÍCULO DOS PROFESSORES Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla Mestre em Engenharia Urbana pela Universidade Estadual de Maringá - UEM (2013); especia- lista em Docência da Educação Profissional, Técnica e Tecnológica de Nível Médio pelo Núcleo Educação à Distância, do Instituto Federal do Paraná - IFPR (2015). Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Paranaense - UNIPAR (2004). Atuação em docência do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico no Instituto Federal do Paraná - IFPR - Campus Umuarama, desde 2012. Atuação profissional em prática de arquitetura e urbanismo no escritório de projetos Grasielle Lembi, no período entre 2005 - 2015. Atuação profissional como docente auxiliar graduada da Universidade Estadual de Maringá - UEM - Campus Umuarama no pe- ríodo entre 2010 - 2012. Lattes: <http://lattes.cnpq.br/5240339988304956>. 51 Mastaba – Túmulo primitivo egípcio 151 Efeito da cor na arquitetura 224 Efeito da luz A Essência da Arquitetura 13 História da Arquitetura 49 Arquitetura Moderna e Contemporânea 91 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura 131 175 Organização Conceitual do Espaço em Lugar 217 Forma, Espaço e Ordem A Abrangência da Ordem na Composição Arquitetônica 291 Princípio de Ordem em Composição Arquitetônica 329 257 PLANO DE ESTUDOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla • Entender os aspectos relacionados à definição e conceituação da arquitetura. • Conhecer os conceitos associados à essência da arquitetura. • Conhecer e entender a interdisciplinaridade presente na formação do arquiteto e urbanista. • Conhecer e compreender os aspectos relacionados à linguagem arquitetônica. • Compreender os aspectos relacionados à história, teoria e crítica da arquitetura. O que é Arquitetura Essência da Arquitetura: firmitas, utilitas e venustas Linguagem Arquitetônica História, teoria e crítica da Arquitetura Formação Profissional A Essência da Arquitetura O que é Arquitetura Caro(a) aluno(a), iniciaremos nossa unidade abordando questões fundamentais para a defini- ção e conceituação da arquitetura. Definição Etimológica Entre os gregos, a palavra arquitetura surgiu da necessidade de diferenciar as obras com algum significado existencial mais relevante em relação a outras, que são meramente providas de soluções técnicas ou pragmáticas. Dessa forma, a definição etimológica une o radical arché, que caracteriza uma condição de início, com o termo tektonicos, representando o ato de construir. Nesta determinação, a expressão arquitetura transcede a utilidade construtiva e nos remete aos princípios fundamentais e às leis originais e éticas que atravessam toda uma sociedade. A arquitetura, portanto, fornece a visibilidade de um determinado mundo e sua ordenação e, por intermédio da arché nela contida – representante do centro da esfera social grega - aproxima-nos do campo originário de onde a edificação se manifesta com a superioridade que o objeto arquitetônico merece (BRANDÃO, 2006). 15UNIDADE I Há, nessa definição, três aspectos que são pri- mordiais e devem ser ressaltados: a) o suplemen- to de origem, que submete a arquitetura a uma categoria originária que a diferencia da simples construção; b) o suplemento de ordenação, já que essa origem é organizadora, e isso faz com que a obra possua harmonia, oferecendo, em si, uma unidade e uma lei exemplar de ordenação; c)o suplemento de visibilidade, que indica que a arquitetura é digna de ser teorizada, admitindo uma investigação que atinja o universo que lhe originou (BRANDÃO, 2006). Em virtude da sua própria definição, perce- bemos a necessidade de um estudo histórico e teórico da arquitetura, capaz de demonstrar como ela se relaciona com as suas origens, re- presentações e concepções dos povos que a edi- ficaram. Desta forma, a arquitetura faz parte da história das significações existenciais, possibili- tando que o homem atinja concepções sobre si próprio acerca da natureza que o envolve e so- bre a divindade ou origem do universo (BRAN- DÃO, 2006). Caracterização abrangente de Arquitetura É muito difícil explicar o que a arquitetura é de fato, pois sua abrangência é multifacetada, envolvendo vários fatores em sua prática de atuação. De qual- quer modo, ela traduz uma das manifestações mais representativas que envolvem o homem no agrupa- mento em sociedade (CASTELNOU, 2003). Sua atuação engloba, além do ambiente restri- to, a experiência espacial − própria da arquitetura – que se prolonga nas cidades, nas ruas, nas praças, nos parques e nos jardins, ou seja, em todos os locais onde a obra humana criou possibilidades de delimitar espaços (ZEVI, 1996). Segundo Silva (1994, p. 100): “A arquitetura é a manifestação cultural ma-terializada na modificação intencional do ambiente, para adequá-lo ao uso humano, através da produção de formas concretas habitáveis imóveis, caracterizadas por uma organização instrumental, uma configura- ção construtiva e um conteúdo estético. Partindo do pressuposto de que a arquitetura atua no aperfeiçoamento do ambiente e que essa trans- formação tem um objetivo específico, constata- mos que ela é fruto de um processo intencional (SILVA, 1994). De fato, a arquitetura nasceu para permitir a construção de todos os abrigos necessá- rios às atividades cotidianas do homem – habitar, divertir-se, trabalhar, realizar cultos religiosos etc. (CASTELNOU, 2003). Vários aspectos são responsáveis por definir a qualidade desses lugares que construímos para habi- tar (no sentido mais amplo do termo), entre os quais se destacam o nível de ordem e a invenção da forma arquitetônica, além da sua capacidade de hospitalida- de e adaptação social ao meio (GREGOTTI, 2010). A arquitetura foi transformada em arte por meio de nossos instintos de criação e da busca por signifi- cados formais. Aliada à pintura e à escultura, a arqui- tetura forma a tríade das belas-artes, compartilhando muitos dos seus princípios de composição (CHING; ECKLER, 2014). Para Zevi (1996), o que a diferencia das outras atividades artísticas é o seu caráter pecu- liar de trabalhar com um vocabulário tridimensional que inclui o homem em sua concepção. Com o poder de organizar a realidade, a arqui- tetura visa regular o relacionamento entre homem e espaço, considerando as necessidades e expec- tativas humanas, para adaptá-las às característi- cas físicas do contexto (SILVA, 1994). Na medida em que responde aos requisitos reais e imagina- dos pelo homem, a arquitetura permite o reflexo cultural da sociedade em que surgiu (CHING; ECKLER, 2014). 16 A Essência da Arquitetura Essência da Arquitetura: Firmitas, Utilitas e Venustas O arquiteto e engenheiro romano Marcus Vitru- vius Pollio foi autor do tratado De architectura, uma célebre reflexão que abrange o caráter da arquitetura e responde (de forma introdutória) à abordagem da sua origem (HEGEL, 2008). Escrito na primeira metade do século I d.C., o tratado foi dividido em dez volumes (GLAN- CEY, 2001) e representa um importante manual de prescrições para arquitetos e administradores públicos, envolvendo vários assuntos, dos quais se destacam a classificação das tipologias arquitetô- nicas e o uso de materiais construtivos (GLAN- CEY, 2001). Tratado é uma obra de caráter sistemático acerca de um ramo de conhecimento. (Dicionário Michaelis) 17UNIDADE I Para Vitrúvio, a essência da arquitetura consiste em firmitas, utilitas e venustas – termos comu- mente traduzidos como solidez, utilidade e beleza. Nesta acepção, solidez representa a estabilidade estrutural do edifício, a utilidade é o cumpri- mento das suas exigências funcionais, e a beleza, a sua fruição estética (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). Considerar a arquitetura sob o aspecto de fir- mitas conduz-nos a uma abordagem em que os parâmetros da engenharia são ressaltados e dão suporte à efetiva materialização da arquitetura enquanto forma física. No segundo aspecto, Vi- trúvio atribui origem utilitária à arquitetura ao considerar a edificação como fruto da necessida- de humana de providenciar abrigo e proteção às ameaças do meio externo (HEGEL, 2008). Já em relação ao caráter venustas, Vitrúvio considera que a imitação da natureza, amparada pela divina proporção do corpo humano, é uma das condições essenciais que permitem à arqui- tetura alçar o seu ideal de beleza (HEGEL, 2008). Considerações sobre a tríade vitruviana Segundo Pereira (2010), os componentes firmitas, utilitas e venustas ainda são fundamentais para a arquitetura atual. Desde os tempos antigos, a arquitetura molda-se para atender às necessidades das variadas atividades que envolvem o cotidiano humano. A caracterização desses espaços rela- ciona-se com o fator utilitas da tríade vitruviana (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Para que esses ambientes assumam forma fí- sica, a arquitetura precisa da associação dos siste- mas estruturais com os materiais construtivos, por meio de técnicas específicas que garantam a esta- bilidade da obra. Isso representa a capacidade de construção e se relaciona com o aspecto firmitas, descrito por Vitrúvio (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). Porém, além desses requisitos, o desejo de edificar envolve outras necessidades humanas, englobando anseios espirituais, psico- lógicos e emocionais, que se refletem na busca por um ideal estético – caráter venustas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Firmitas: técnica de edificar Enquanto projeto, a arquitetura é apenas uma re- presentação gráfica daquilo que poderá vir a ser. Sua existência materializa-se quando ela passa a ser, de fato, uma forma física, edificada por meio de técnicas e materiais de construção para atender a finalidades predeterminadas (MALARD, 2006). Segundo Castelnou (2003), as concepções ar- quitetônicas derivam das possibilidades que os materiais construtivos e aparatos técnicos e tec- nológicos permitem realizar em cada período his- tórico. Rasmussen (1998) ressalta que o material de construção é o próprio veículo da arquitetura e que a vocação do arquiteto é dar forma aos ma- teriais disponíveis em cada contexto. Ao longo do tempo, a arquitetura seguiu sendo erigida por meio do emprego dos materiais que predominavam no entorno regional de cada ci- vilização. Desse modo, os materiais construtivos influenciavam o caráter de diversos estilos arqui- tetônicos. Os egípcios, por exemplo, possuíam a pedra em demasia e, a partir dessa realidade, fize- ram imponentes pirâmides com o material. Já os gregos eram escultores habilidosos, possivelmente, pelo fato de terem mármore em abundância na região onde viviam (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). No entanto, além dos mate- riais, é preciso conhecimento da técnica constru- tiva para erigir estruturas estáveis e duradouras. Em tempos remotos, os homens primitivos ob- servavam as formas da natureza para compor seus primeiros sistemas construtivos, experimentando 18 A Essência da Arquitetura possibilidades associativas de elementos que en- contravam em seu entorno. As experiências bem sucedidas eram aproveitadas para novos arranjos e, em um processo contínuo de tentativa e erro, os primeiros construtores foram edificando os espaços necessários à sua sobrevivência. Agindo dessa forma, eles adquiriram um co- nhecimento intuitivo das propriedades dos mate- riais e, por meio da sua manipulação, foram per- cebendoas melhores maneiras de estruturá-los. Por fim, repassavam o que aprendiam às gerações sucessoras (SARAMAGO ; LOPES, 2011). Duran- tes, séculos, as edificações foram construídas com sistemas estruturais baseados neste mecanismo de tentativa e erro, referenciando-se em obras pre- cedentes e similares. Somente nos últimos 150 anos é que os avanços tecnológicos permitiram quantificar as cargas atuantes nas estruturas e de- terminar a resistência dos materiais construtivos (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Como a estrutura é parte intrínseca da forma arquitetônica, os conceitos estruturais têm deter- minações diretas na elaboração da arquitetura (DONICI, 2011). Desse modo, a possibilidade de prever o comportamento estrutural das edifica- ções favoreceu a técnica construtiva, permitindo, nos tempos mais recentes, avanços consideráveis nas concepções projetivas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Ainda assim, embora a tecnologia estrutural possibilite a evolução arquitetônica, Zevi (1979) adverte que não é simplesmente o avanço tecnoló- gico o único responsável pela concepção de obras extraordinárias. Embora o ato de projetar arqui- tetura inclua, intrinsecamente, o fator estrutural, não se esgota nele. É preciso que o arquiteto en- tenda que uma técnica mais aprimorada não con- duz, necessariamente, a uma arquitetura notável (ZEVI, 1979) - é preciso, então, que ele considere outros fatores importantes na sua composição. Atualmente, arquiteto e engenheiro, juntos, po- dem conceber vários tipos de sistemas estruturais e utilizar técnicas construtivas que enriqueçam a composição arquitetônica. Segundo Zevi (1979), cada obra deve utilizar a técnica que julgar mais apropriada à situação, conforme as suas exigên- cias expressivas. A escolha adequada depende de vários parâmetros, os quais englobam: a parti- cularidade da obra, os materiais disponíveis, as condições do terreno, as restrições orçamentá- rias, os requisitos espaciais e estéticos etc. (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Utilitas: requisitos funcionais Antes de se pensar na concepção de um edifício, é preciso que haja uma função para ele cumprir, seja no âmbito coletivo de uma sociedade, seja na neces- sidade particular de um indivíduo (COLIN, 2000). Isso porque a arquitetura é uma arte funcional, que instaura vínculos entre as necessidades humanas e as soluções arquitetônicas (GREGOTTI, 2010). De modo abrangente, é a função que confere propósito à determinada obra, além de desem- penhar um papel decisivo no julgamento da ar- quitetura como um todo (RASMUSSEN, 1998). Venustas: atributos estéticos A beleza de uma obra é um parâmetro subjetivo cujo julgamento pode variar por meio da cultu- ra e da época analisada. Para algumas pessoas, a estética surge naturalmente no edifício, ao se atender requisitos de caráter funcional. Outras, a consideram o resultado formal de uma adequada associação entre materiais construtivos e sistemas estruturais. Há quem diga, ainda, que a beleza se relaciona com a ornamentação do edifício (FA- ZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Para outros, a essência do belo é atingida por meio de fórmulas matemáticas ou sistemas de proporção, validados pelo curso da história. 19UNIDADE I Segundo Pereira (2010), o ideal estético da ar- quitetura transcende o seu conceito superficial e, portanto, está longe de ser um artifício agre- gado à edificação. Ele é inerente à arquitetura. Na concepção de Zevi (1996), para que uma arquitetura seja considerada bela, é essencial que ela possua um interior atrativo, que nos subjuga espiritualmente. Isso tem mais a ver com uma concepção ideal de espaço do que propriamente com o seu tratamento decorativo. Se for verdade que uma notável decoração não conseguirá criar um espaço plenamente belo, também é certo que um espaço satisfatório não resultará em um ambiente artístico de relevante valor, se não for completado por um adequado projeto de interiores (ZEVI, 1996). Princípios estéticos da Antiguidade Clássica Na Grécia Antiga, as relações estabelecidas pelas pro- porções eram um importante meio de comunicação, frente à visão unificada que o povo grego possuía do mundo. Essa concepção foi ilustrada por uma história que abrange as descobertas do matemático grego Pitágoras. Inicialmente, seu trabalho era com harmonias musicais, mas logo Pitágoras passou para as dimensões e suas razões (proporções) no universo visual (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Proporção A proporção é um tipo de relação comparativa, coerente ou harmônica, que se estabelece entre duas partes de um objeto ou entre uma parte e o todo (Figura 1), com respeito à sua grandeza, à quantidade ou ao grau (CHING, 2010). Figura 1 – Esquema ilustrativo de figuras em proporção Os termos “edifício” e “edificação”, no meio arquitetônico, podem ser empregados como sinônimos. Nessa acepção, portanto, edifício também pode ser utilizado para representar edificação térrea. 20 A Essência da Arquitetura Secção áurea Os sistemas de proporção têm origem no conceito matemático de Pitágoras e na crença de que de- terminadas relações numéricas são responsáveis por estruturar harmonicamente elementos no universo (CHING, 2002). Desde os tempos da Antiguidade, uma dessas relações, a Secção Áurea, é enfatizada em vários segmentos da experiência humana e, por isso, amplamente utilizada desde então (CHING, 2002). Ela representa a divisão de um segmento em duas partes, de acordo com um parâmetro definido por proporções presentes nas medi- das corporais, consideradas de harmonia ideal (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Matematicamente, ela pode ser entendida como a razão entre duas seções de uma linha ou duas dimensões de uma figura plana, em que a menor está para a maior, assim como a maior está para a soma de ambas (Figura 2) (CHING, 2002). Figura 2 – Relação matemática que representa a Secção Áurea A secção áurea possui propriedades geométricas e algébricas notáveis que justificam sua aplicabilida- de no campo da arquitetura (CHING, 2002). Ela serve de base na definição de uma proporção ou retângulo áureo, suscetível de ser usado no traçado de edificações, englobando todo o seu conjunto construtivo ou apenas algumas partes específicas da composição (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). O re- flexo da importância da secção áurea pôde ser sentido ao longo da história da humanidade e, até nos dias atuais, o seu uso perdura em vários segmentos, sobretudo, no artístico. Equilíbrio entre os componentes da tríade vitruviana Para que uma obra tenha concepção harmônica, é essencial que a tríade vitruviana esteja presente em uma relação equilibrada (PEREIRA, 2010): • Projetar uma arquitetura sem considerar efetivamente o seu processo construtivo significa pensá-la de forma superficial e puramente formalista (ZEVI, 1979). Uma concepção que desconsidera o aspecto firmitas, certamente, não passará de uma ideia no papel (PEREIRA, 2010). • Já uma edificação carente de utilitas po- derá até ser entendida como um objeto es- cultórico, mas não poderemos nos referir a ela como uma arquitetura propriamente dita (PEREIRA, 2010), pois, para Gregotti (2010), o que caracteriza o princípio da existência arquitetônica é justamente a sua função. • E, por último, uma obra que não valorize o caráter venustas poderá até ser uma cons- trução, mas não, necessariamente, uma arquitetura apreciável (PEREIRA, 2010). Portanto, é o equilíbrio correto e a prudência entre tais componentes que resultam em uma arquite- tura de qualidade (PEREIRA, 2010). Tipologia arquitetônica Ao analisarmos a obra arquitetônica como re- sultado da integração da tríade vitruviana, pode- mos definir a tipologia arquitetônica, de modo empírico e elementar, como um conjunto desses três componentes. Assim, será considerado tipo arquitetônico toda combinação de certa utilitas 21UNIDADE I e firmitas, manifestada segundo determinada venustas (PEREIRA, 2010). A ideia de tipo opõe-se ao conceito demodelo arquitetônico, pois tipo não representa uma ima- gem a ser copiada fielmente, mas uma regra ideal. O modelo é um objeto que pode ser reproduzido conforme é; já o tipo é um objeto segundo o qual se pode conceber obras distintas entre si (PEREI- RA, 2010). Portanto, o tipo deve conservar certos aspectos de generalidade e se estruturar segundo um esquema de classificação, ou seja, como um modelo abstrato, de onde se possam extrair su- gestões válidas acerca da natureza de categorias específicas (GREGOTTI, 2010). Para ordenar o objeto arquitetônico em ti- pos, podemos individualizá-lo e o classificar do ponto de vista de sua complexidade funcional ou estrutural (GREGOTTI, 2010). A tipologia de essência funcional é a mais característica dos tempos modernos (ZEVI, 1979). Ela trata de um conjunto de funções delimitadas que constituem atividades unidas por relações de continuidade espacial (GREGOTTI, 2010). Desse modo, a ti- pologia funcional enquadra a diversidade dos edifícios segundo seus aspectos utilitários em seg- mentos de mercados, escritórios, escolas, edifícios industriais, laboratórios, centros comunitários etc. (ZEVI, 1979). A tipologia envolve uma dinâmica que está mudando a prática projetiva. Atualmente, não há apenas distinção entre arquitetos e engenhei- ros, mas também entre os próprios arquitetos: hoje, fala-se, por exemplo, em arquitetos espe- cializados em clínicas, museus, hotéis etc. As exigências utilitárias, sempre mais complexas, também fizeram com que surgissem manuais a respeito de cada tipologia arquitetônica. Com isso, cada vez mais, multiplicam-se publicações destinadas a temas específicos, como hospitais, complexos desportivos, restaurantes, entre ou- tros (ZEVI, 1979). Outra abordagem tipológica relaciona-se com a configuração da arquitetura em relação à adoção de uma tendência orgânica ou racionalista (con- forme mencionado na Unidade II). Elas seguem a ideologia vigente de cada época e representam visões distintas do mundo: uma mais prática, do- minada pelos sistemas geométricos (racionalista) e outra se referenciando nos modelos naturais (organicismo) (ZEVI, 1979). 22 A Essência da Arquitetura Formação Profissional Do ponto de vista relacionado ao desempenho profissional, a arquitetura é uma prática de atua- ção, que caracteriza um curso de nível superior, responsável pela qualificação de um arquiteto e urbanista. Ao longo da história, sua metodologia didática passou por vários níveis de aprimora- mento, até chegar aos atuais parâmetros de abor- dagem curricular. 23UNIDADE I Interdisciplinaridade da arquitetura A arquitetura, em sua essência, aborda diversos temas que influen- ciam a maneira como vivemos (CHING; ECKLER, 2014). A multi- plicidade de aspectos que ela engloba - como arte, técnica, estética, sociologia, história e teoria - faz com que assuma o caráter de ser interdisciplinar. O processo de sua formação possibilita o desen- volvimento de amplas reflexões sobre seu relacionamento e com- prometimento com tais disciplinas (DORFMAN, 2014). Conforme cita Colin (2000), o seu currículo de graduação cons- titui-se de componentes curriculares referentes a três grandes áreas de conhecimento: a) Área técnica: como a arquitetura é uma ciência relacionada com a construção civil, que utiliza o conhecimento das formas e dos materiais para criar edifícios e prever seu comportamento frente aos esforços mecânicos, ela se vincu- la a diversos componentes curriculares da prática constru- tiva e da física (CHING; ECKLER, 2014), como resistência dos materiais, cálculo estrutural, instalações prediais, entre outras disciplinas relacionadas (COLIN, 2000). b) Área de humanas e ciências sociais: a arquitetura também atua com saberes referentes ao comportamento, percepção e cultura dos indivíduos de uma sociedade para criar espaços adequados aos hábitos vigentes (CHING; ECKLER, 2014). Desse modo, a arquitetura possui componentes curriculares referentes à história, à teoria da arte e da arquitetura, à sociologia aplicada à arquitetura e ao urbanismo, à antropologia etc. (COLIN, 2000). A antropologia é entendida como ciência que estuda o homem, capaz de resumir elementos sociológicos, etnológicos e psicológicos em suas diversas acepções e embasar uma te- mática sobre o comportamento humano (GREGOTTI, 2010). c) Área de projetos: a terceira área destina-se ao treinamento da prática projetiva, incluindo os componentes relacionados com a representação e composição de projetos, os quais englobam a geometria descritiva, desenho técnico, desenho de observação, desenho arquitetônico e de interiores, composição de projetos de arquitetura e prática de maquete (COLIN, 2000). Embora a denominação dos componentes curriculares possa variar de uma universidade para a outra, em síntese, a maioria aborda tais conteúdos dentro da sua prática didática. 24 A Essência da Arquitetura Linguagem Arquitetônica A linguagem da arquitetura, no seu processo proje- tivo, está dividida em dois níveis essenciais: de um lado, a representação gráfica que constitui os dese- nhos técnicos e, por outro lado, o aspecto estético que revela o caráter da edificação. Esse último é res- ponsável por comunicar a mensagem arquitetônica, isto é, a intenção que o arquiteto quer transmitir ao público por meio da sua obra, a qual pode repre- sentar um manifesto formal de toda uma época (TRICHEZ; AFONSO; GOMES [s. d]). Essa última característica da linguagem permite distinguir os edifícios entre si, possibilitando o seu agrupamento em estilos e tipologias (MALARD, 2006). As duas classificações são importantes para a prática projetiva, cada qual com sua respectiva finalidade. A primeira, que representa o projeto propriamente dito, é o modo pelo qual os elemen- tos arquitetônicos, que resolvem um determinado problema construtivo, vêm organizados, segundo normas de desenho técnico (GREGOTTI, 2010). A segunda é capaz de revelar mensagens aos usuários, por meio de seus aspectos formais (TRI- CHEZ; AFONSO; GOMES [s. d]). Um exemplo disso é a Figura 3, que mostra o edifício exclusivo da empresa Longaberger Company, atuante no ramo de cestas personalizadas e artesanais, as quais se assemelham ao edifício concebido. 25UNIDADE I No curso do tempo, a história revela mudanças na linguagem arquitetônica, confirmando que ela é o reflexo de um pensamento sócio-cultural, de uma tradição técnica em construir, das necessidades e dos anseios de um grupo social e de um estilo específico (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s.d]). Por vezes, é comum confundirmos os termos estilo e linguagem arquitetônica. O primeiro é um modo particular de expressão artística, representando um repertório formal característico de determinada época, por meio do qual se distingue de outros períodos do ponto de vista formal e de conteúdo (CHING, 2010). Essa classificação está relacionada a uma série de regras de composição de projeto, que seguem a ideologia vigente da época (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s.d]). Dentre os estilos arquitetônicos mais representativos da história, podemos des- tacar: a Antiguidade Clássica, Românico, Gótico, Renascimento, Neoclassicismo, Historicismo, Ex- pressionismo, Art-Nouveau, Movimento Moder- no e Pós-Modernismo. Já a expressão linguagem arquitetônica é o uso de certos elementos que visam chegar a uma composição, seja ela de qual tipo for (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s. d]). Por meio desse cenário, percebemos que com- preender arquitetura não é simplesmente estar apto a definir o estilo de uma determinada edi- ficação, por meio de suas características externas (RASMUSSEN, 1998). Vai além e envolve a carac- terização da arquitetura na essência do seu existir. Dimensão semântica da arquitetura Como a arquitetura é imposta à sociedade e assu- me caráter público e permanente, ela é dotada de características que lhe conferem a possibilidade de representar um meio de comunicação de massa (COLIN, 2000). Nesse panorama, oarquiteto tem a chance de descrever a sua visão sobre a socieda- de a que pertence, pela da configuração da matéria física que, por meio da sua atuação, é moldada em forma arquitetônica (SILVA, 1994). Figura 3 – Edifício da Longaberger Company, Ohio, USA 26 A Essência da Arquitetura O termo “forma” traz implícito sentidos variados, sendo útil evidenciá-los de um modo abrangente. A forma arquitetônica é, por um lado, o modo como os elementos e a estrutura de um edifício estão associados, garantindo a sua presença física no espaço, mas também representa o poder de comunicação desse arranjo. Esses dois aspectos estão sempre presentes na arquitetura, já que não existe objeto sem forma – mas a possibilidade de comunicação assume níveis diferenciados. É a partir da segunda abordagem que podemos efeti- vamente compreender o sentido da arquitetura. Fonte: Gregotti (2010). Desse modo, além de servir a um propósito fun- cional, a forma arquitetônica também tem a capa- cidade de ser um signo (PEREIRA, 2010). Signo é uma unidade de um sistema de comunicação que representa alguma mensagem a uma pessoa, em algum momento e em condições determinadas. A estrutura do signo é constituída por duas partes: o significante, que compõe o seu elemento material, e o significado, que é a ideia a ser transmitida. Como possuem significados convencionados, só podem ser entendidos por convenção ou senso comum. (Silvio Colin; Francis D. K. Ching e Steven P. Juroszek) Com perfil variável, o signo arquitetônico sem- pre se relaciona a uma circunstância e, por isso, consegue traduzir os sentimentos do seu período histórico às outras sociedades que dele se apro- priam (PEREIRA, 2010). Nem sempre os símbolos arquitetônicos são fá- ceis de interpretar: muitas vezes congregam uma grande diversidade de conteúdos sedimentados ao longo dos tempos. Fonte: Nieto (1992). Conteúdo e forma são elementos básicos de qualquer expressão artística e sempre devem estar juntos na comunicação visual. O primeiro representa a própria mensagem, que surge para demonstrar um objetivo. Nessa busca, fazem-se escolhas para intensificar as intenções prede- finidas, visando obter maior controle sobre as respostas. A mensagem e o significado não estão na substância física, mas na composição, que é o meio para controlar a interpretação da men- sagem pelo receptor. Assim, a forma expressa o conteúdo, e ambos constituem o mecanismo para que o receptor entenda a mensagem. Fonte: Dondis (2007). O arquiteto é, portanto, o criador e o emissor da mensagem arquitetônica. O público, na qualida- de de receptor, pode compreender a mensagem por meio do seu uso efetivo (PIGNATARI, 2004). A mensagem, originalmente concebida, tem duas formas de ser interpretada: a primeira vincula-se à destinação prática dos signos que constituem o edifício, ou seja, à maneira pela qual este edifício será usado para cumprir sua função utilitária; e a segun- da relaciona-se à dimensão semântica da obra, em outras palavras, aquilo que ela pretende significar com sua proposta projetiva (GREGOTTI, 2010). 27UNIDADE I Semântica é a ciência que estuda a evolução do significado das unidades linguísticas (pa- lavras, signos e símbolos) que estão a serviço da comunicação. (Dicionário Michaelis) Em contrapartida, a mensagem emitida é respon- dida pelo receptor (usuários), por meio de uma contra mensagem (PIGNATARI, 2004) que, dire- ta ou indiretamente, pode surgir de várias manei- ras: por meio de críticas ou elogios à obra; recusa da sua utilização, por julgarem-na não adequada ao vigente estilo de vida da sociedade; plena acei- tação dessa arquitetura, muitas vezes, transfor- mando-a em ícone do contexto local (Figura 4), entre outras possibilidades. A resposta da sociedade pode, inclusive, in- fluenciar a elaboração da próxima mensagem produzida pelo arquiteto (PIGNATARI, 2004). A maior ou menor aceitação do objeto arquitetô- nico (inicialmente proposto) pode caracterizar um sinal de alerta ao arquiteto, indicando se ele está, ou não, no caminho certo para represen- tar determinado grupo social, por meio da sua arquitetura. Caso suas concepções não estejam sendo satisfatoriamente compreendidas ou acei- tas, ele precisa repensar o seu modo de atuação. Figura 4 – Museu do Amanhã, Rio de Janeiro, Brasil (2015), Santiago Calatrava 28 A Essência da Arquitetura Relação entre semântica e uso da edificação A arquitetura é uma representação espacial que per- dura pelo tempo e, por isso, é suscetível de mutações no decorrer de sua existência (DORFMAN, 2014). Ao longo da história, percebemos que algumas obras são utilizáveis sem serem realmente signi- ficantes, como também vemos arquitetura que mantém a capacidade de ser significativa, ainda que tenha perdido o seu uso prático, ou que este não seja conhecido por nós na época atual. É o caso de monumentos históricos, por exemplo. Às vezes, a própria incerteza de destinação original da obra pode aumentar o fascínio por tal arquitetura (GREGOTTI, 2010). Além disso, algumas obras sofrem mutação de uso no decorrer do tempo. Sendo assim, a sociedade vigente atribui uma nova destinação àquela construção que, no pas- sado, tinha uma função específica (GREGOTTI, 2010). Isso decorre, muitas vezes, por aquele de- terminado uso ter sido extinto pelos progressos da nova era, ou pelo fato de a sociedade julgar que o edifício será melhor aproveitado em outra finalidade funcional. Ao conceber a sua obra, portanto, o arquiteto precisa ter consciência de todo esse cenário e com- preender que uma arquitetura considerada adequa- da no momento atual pode não ser satisfatória para as gerações futuras, já que os gostos, os hábitos e as aspirações podem mudar (RASMUSSEN, 1998). Como as civilizações modificam-se em cons- tante evolução, precisam, igualmente, de novas possibilidades e soluções arquitetônicas. É papel do arquiteto estar atento às transformações sociais e culturais de sua época, tentando adequar, coeren- temente, a sua arquitetura tanto ao padrão vigente como a uma possível apreciação positiva no futuro. Linguagem semântica da arquitetura atual Nos tempos modernos, é difícil identificar clara- mente uma linguagem característica da arquitetura, pois, em grande medida, ela depende das particu- laridades de cada arquiteto, variando conforme sua formação, sua cultura, sua experiência profissional e seu repertório referencial. Além disso, outros fatores externos ao processo projetivo podem influenciar a linguagem adotada, como fatores sociais, econô- micos, físicos, técnicos, entre outros (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s. d]). Composição projetiva como forma de linguagem arquitetônica Para o início da produção arquitetônica, é neces- sária a caracterização da atividade que será de- senvolvida no edifício. Tal necessidade funcional será exposta por meio de uma lista de solicitações, denominada programa de necessidades. Programa de necessidades é a lista das exigên- cias espaciais que um determinado edifício pre- cisa ter para cumprir sua finalidade prática de utilização. Tais solicitações caracterizam a desti- nação de cada espaço interno da obra, incluindo diretrizes que nortearão seu dimensionamento e sua interligação espacial. É fundamental sua definição já no início da encomenda, pois ele é um dos principais norteadores da estruturação do projeto arquitetônico. 29UNIDADE I O desenvolvimento do projeto começa com a fi- gura do arquiteto que, por meio das intenções apresentadas pelo cliente, consegue estruturar o programa de necessidades. A partir de então, ele deve dispor de várias informações pertinentes à encomenda, para que possa iniciar seu projeto. Tais dados incluem: as necessidades do cliente (aliadas ao seu estilo de vida e cultura), os recur- sos financeiros disponíveis, a análise do sítio e do contexto local, a disponibilidade de fornecedores e de mão de obra, diretrizes legislativas (plano diretor de cada município) etc. Coma interpretação e a organização de tais in- formações, o arquiteto pode hierarquizar os dados da encomenda, formulando o problema a ser resol- vido. Em síntese, toda a criação projetiva parte de um problema colocado em evidência (FABRÍCIO, 2002). Essa primeira etapa representa uma fase de diagnóstico, que assume um caráter mais objetivo (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s. d]). Na próxima fase da produção arquitetônica – considerada de criação − o arquiteto tem o desafio de solucionar o problema apresentado, avaliando alternativas e possibilidades, frente aos diversos fatores que devem ser considerados na concep- ção. Nessa etapa, o processo transita para o lado da subjetividade, em que a ideia é a ferramenta primordial na busca de alternativas viáveis. As ideias podem surgir por intermédio de pesquisas, repertório pessoal, experiências adquiridas em situações semelhantes e conhecimento técnico (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s. d]). Segundo Fabrício (2002), neste momento, a criatividade e o raciocínio são essenciais, pois ex- pressam a capacidade de propor soluções originais e, ao mesmo tempo, coerentes com o problema. A participação do cliente também se faz necessária, caracterizando uma parceria fundamental para o encontro da solução mais adequada às necessidades impostas (TRICHEZ; AFONSO; GOMES, [s. d]). O exercício da invenção é um pressuposto cen- tral do processo criativo, pois parte da percepção e da memória do projetista em direção ao que ainda não existe. Esse processo caracteriza uma busca contínua de novas possibilidades conceptivas que possam ser materializadas no mundo físico. A dinâmica que envolve a abordagem da in- venção deve recorrer a técnicas que lhe auxiliem na produção compositiva. Desse modo, ela pode aproveitar alguns princípios da psicologia da expressão como modo de alçar autenticidade. Tais técnicas - já experimentadas na tradição do design - podem ser utilmente ampliadas por meio de experiências que as ciências hu- manas realizam nessas áreas. O intuito é que cada vez mais a arquitetura seja uma entidade transmissora de propriedades comunicativas (GREGOTTI, 2010). Já o conhecimento técnico baseia-se nas ex- periências e na formação profissional de cada arquiteto. É responsável por mediar a criação e o desenvolvimento das soluções projetivas. Aliada ao conhecimento está a cultura construtiva, que demarca repertórios de cunho projetivo e cons- trutivo, associada aos hábitos e às necessidades de uma determinada sociedade ou contexto (FA- BRÍCIO, 2002). Com base nesses parâmetros, o arquiteto pode operar em um processo cíclico de interações men- tais que transitam entre o surgimento das ideias, seu desenvolvimento intelectual e a análise proje- tiva, capaz de elencar a proposta mais apropriada à situação. É difícil manter essas ideias firmes na memória durante o tempo necessário para esclarecê-las e avaliá-las. Por isso, é importante que elas assumam forma física por meio de representação gráfica. Em um primeiro momento, tais pensa- mentos são traduzidos por meio de croquis ou diagramas (CHING; JUROSZEK, 2012). 30 A Essência da Arquitetura Croqui é um esquema gráfico de um projeto, na sua fase inicial, apresentado na forma de um esboço que indica o caráter conceitual da arqui- tetura pretendida. Permite o estudo da concep- ção e o seu desenvolvimento por meio de novas possibilidades. (Francis D. K. Ching) A representação gráfica é capaz de retratar o pen- samento de modo tangível, para que ele possa ser desenvolvido com mais tranquilidade. Esses desenhos iniciais - despreocupados com as nor- mas técnicas - servem para análise do conceito arquitetônico e comparação de alternativas de projeto (CHING; JUROSZEK, 2012). Conceito de projeto é um conceito relacionado à forma, à estrutura e às características de um edifício, representado, graficamente, por meio de diagramas, plantas baixas ou outros desenhos. (Francis D. K. Ching) Quando exploramos ideias e procuramos possi- bilidades compositivas, cada desenho pode passar por várias transformações e ir se desenvolvendo sucessivamente, conforme respondemos às ideias emergentes (CHING; JUROSZEK, 2012). Muitas vezes, o arquiteto cria diversas versões a partir de uma mesma ideia, buscando aprimorá-la. Esse pro- cesso pode gerar novas ideias à medida que as des- cobertas vão surgindo (CHING; ECKLER, 2014). No entanto, além dos desenhos, o arquiteto também pode recorrer aos diagramas para explo- rar possibilidades projetivas. A natureza abstrata da diagramação nos permite analisar e compreen- der melhor a natureza essencial dos elementos que compõem um projeto. Assim, podemos conside- rar suas possíveis relações e gerar de modo mais ágil uma série de alternativas para o problema evidenciado (CHING, 2011). Diagrama: é qualquer esquema capaz de explicar ou elucidar as partes, a combinação ou a operação de algo. Ele consegue descrever a intenção do projeto sem representá-lo por meio de desenhos fiéis, podendo simplificar um conceito complexo em elementos e relações essenciais. Os diagramas têm um papel muito especial no esclarecimento das relações funcionais de uma composição. (Francis D. K. Ching e Steven P. Juroszek) Após a etapa do conceito diagramático, o ar- quiteto vai se aproximando dos elementos pro- jetivos e pode começar a vislumbrar a solução do problema. Para atravessar esse processo até o desenvolvimento de uma proposta mais evo- luída em termos de conceito projetivo, ele pode recorrer a formas de representação, as quais o auxiliarão na tomada de decisão. É possível utilizar vários recursos de representação, tais como: maquete física ou eletrônica, simulação digital, desenhos tradicionais convencionados, fotografias, técnicas de colagem etc. (CHING; JUROSZEK, 2012). À medida que o conceito é esclarecido e desenvolvido, os desenhos vão se tornando mais consistentes, passando pela adoção do partido arquitetônico até a cristalização definitiva da proposta compositiva (CHING; JUROSZEK, 2012). 31UNIDADE I A adoção de um partido refere-se às diretrizes gerais empregadas no projeto arquitetônico, manifestadas pela concepção formal, em linhas genéricas, da edificação a ser construída. O par- tido se relaciona à configuração dos elementos construídos no terreno, à volumetria da edifi- cação, à proporção entre cheios e vazios, bem como aos materiais e técnicas construtivas a se- rem utilizadas na obra. Ele resulta do programa de necessidades, particularidades do terreno, clima, materiais e técnicas disponíveis, recursos financeiros, legislação dos órgãos competentes e intenção plástica do arquiteto. Fonte: Albernaz e Lima (1998b). No final do processo de composição arquitetôni- ca, temos a transformação das ideias e soluções em linguagem técnica, ou seja, na representação do projeto arquitetônico propriamente dito (TRI- CHEZ; AFONSO; GOMES, [s. d]). Não podemos esquecer que, do ponto de vis- ta histórico, o projeto arquitetônico ainda não é arquitetura (ZEVI, 1979), é apenas um conjunto de convenções e símbolos institucionalizado e reconhecível universalmente, capaz de comunicar nossa intenção arquitetônica. Os padrões de representação instaurados tradi- cionalmente estão vinculados ao sistema euclidia- no de estruturação do espaço e à sua representação geométrica mediante projeções e secções. Eles ca- racterizam várias possibilidades de desenho, como plantas, cortes, elevações, detalhes e perspectivas. Além disso, o projeto arquitetônico pode conter elementos adicionais, como gráficos, tabelas e itens similares, visando facilitar o entendimento dos respectivos desenhos (GREGOTTI, 2010). Em certas circunstâncias, esse sistema de re- presentação técnica apresenta limitações (prin- cipalmente em relação a propostas arquitetô- nicas mais ousadas do ponto de vista formal). Nesse caso, a utilização de técnicas de desenho assistido e modelagem computadorizada pode- rá trazer benefícios reais à concepção projetiva(DORFMAN, 2014). Porém, ressaltar que a expressão arquitetônica somente se completa quando a edificação é cons- truída não significa que os projetos não sejam importantes para a compreensão da arquitetura (ZEVI, 1979). O projeto produzido tecnicamente em sua forma final dirige-se, essencialmente, a uma finalidade específica: comunicar, de for- ma unívoca, um conjunto de dados necessários à correta execução da obra. Com o passar do tempo, à medida que a produção arquitetônica instituiu-se conforme fases distintas, pelas quais a operação projetiva se separou efetivamente da execução física, esta última passou a exigir indi- cações mais precisas para a sua materialização (GREGOTTI, 2010). O ato de projetar arquitetura, portanto, corres- ponde a uma função produtiva do arquiteto que, em nosso contexto socioeconômico, não produz efetivamente edifícios, mas os projetos que per- mitem a sua execução. Seu papel fundamental concentra-se, então, na maneira mais adequada para conseguir dar pleno sentido à forma da ar- quitetura (GREGOTTI, 2010). 32 A Essência da Arquitetura A figura do arquiteto no cenário da arquitetura Evidentemente, as disciplinas que envolvem nosso contexto, tanto social como natural, são muitas e de diversas esferas, incluindo os parâmetros econômicos, políticos, ideológicos, sociológicos, pro- dutivos e tecnológicos. Diante dessa complexidade, o arquiteto precisa entrar em contato com tais parâmetros e tomar consciência de como pode atuar a partir da suas influências, para que consiga produzir uma arquitetura mais adequada e engajada ao contexto vigente (GREGOTTI, 2010). A missão do arquiteto não é exclusivamente de natureza antro- pológica ou sociológica; porém, sua atuação profissional em meio à sociedade, estabelece várias possibilidades em relação aos com- portamentos que são desenvolvidos nos ambientes que o homem atua (GREGOTTI, 2010). Naturalmente, é o arquiteto que acolhe e interpreta os anseios da sociedade, imprimindo, a cada nova produção compositiva, o timbre da sua vocação; é ele que absorve os conhecimentos técnicos neces- sários à prática arquitetônica, mas que não se submete integralmente a eles, usando-os e renovando-os em prol de seus objetivos e desejos espaciais; que participa da cultura linguística da época, não de forma passiva, mas intervindo com uma atuação que a enriquece e modifica. O arquiteto também opera entre algumas dificuldades: desenha edifícios que, às vezes, não são executados fielmente conforme o seu desejo; produz edificações que depois são reformadas e, às vezes, até descaracterizadas de sua aparência original; tem propostas utópicas que não são aceitas; enfrenta a apreciação das classes dirigentes e das comissões construtivas; é condicionado a cada novo estilo pelo contexto que o circunda, pela legislação e planos urbanísticos, por im- posições de diversos caráter; além de outras dificuldades (ZEVI, 1996). No entanto, apesar de tudo isso, ele vê a possibilidade de pro- duzir um cenário melhor para sociedade vigente e também para as próximas que virão. Gregotti (2010) ressalta que o arquiteto não conseguirá revolucionar a sociedade por meio da arquitetura, mas poderá revolucionar a arquitetura, e é essa prática que ele deve adotar. 33UNIDADE I A importância da equipe multidisciplinar na composição arquitetônica Uma das principais características dos projetos atuais é a crescente complexidade dos empreendimentos construtivos, que evidenciam cada vez mais a discrepância entre os conhecimentos técnicos ne- cessários à sua produção e as limitações individuais apresentadas pelos projetistas envolvidos. Isso exige a montagem de equipes maiores para a prática projetiva, além da mobilização de conhe- cimentos mais especializados, subsidiados por saberes de áreas correlatas - é o que caracteriza um processo multidisciplinar de projeto (FABRÍCIO, 2002). Habitualmente, o processo projetivo é liderado pelo arquiteto que transforma os requisitos abstratos do cliente em um estudo preliminar, que posteriormente será disponibilizado aos demais projetistas da equipe multidisciplinar, para que estes possam desenvolver seus projetos específicos (estrutural, elétrico, hi- drossanitário, de prevenção contra incêndio, entre outros) (FA- BRÍCIO, 2002). Visando a qualidade do processo, seria importante uma in- tegração das informações necessárias à construção, já na gênese do projeto, em que as lacunas de conhecimentos específicos, as quais o arquiteto pudesse apresentar, fossem sanadas por proje- tistas especialistas, antes da conclusão do conceito arquitetônico (FABRÍCIO, 2002). Estudo preliminar: caracteriza uma etapa do projeto arquitetônico que consiste em uma configuração inicial da edificação proposta, a partir da avaliação dos condicionantes que influenciarão o projeto a ser realizado. (Maria Paula Albernaz e Cecília Modesto Lima) 34 A Essência da Arquitetura Neste sentido, apresenta-se o Projeto Simultâ- neo, que para Fabrício (2002), caracteriza a ên- fase às questões de gestão do processo projetivo e a realização em paralelo das diversas tipolo- gias de projeto que permeiam uma construção – projeto arquitetônico, estrutural, elétrico etc. Nessa dinâmica, há uma colaboração simultâ- nea de todas as especialidades projetivas, para que haja o desenvolvimento de uma arquitetura mais engajada com a complexidade da demanda (FABRÍCIO, 2002). Tradicionalmente, a concepção e o desenvol- vimento integrado do sistema projetivo - carac- terizado pelas equipes multidisciplinares - não é a forma usual de organização do processo nos escritórios e construtoras. Na maioria das vezes, a produção projetiva é desenvolvida por meio de um sistema unidirecional de especialidades, em que o término do projeto de uma tipologia espe- cífica possibilita o início do próximo. Esse pro- cesso dificulta a interação efetiva da equipe e, por vezes, representa retrabalhos e perda de tempo e dinheiro na produção do projeto. Em alternativa, o processo simultâneo privilegia o paralelismo entre as etapas de projeto e a interatividade entre os profissionais, visando compor soluções mais consolidadas com a vigente complexidade cons- trutiva (FABRÍCIO, 2002). 35UNIDADE I História, Teoria e Crítica da Arquitetura Quando atribuímos à arquitetura o seu valor de arte, reconhecemos a importância que a sua visibi- lidade produz. Isso significa que a análise estética considera as formas construtivas tais como são percebidas pelo indivíduo que, com elas, estabe- lece uma relação familiar (BRANDÃO, 2006). É mais fácil perceber um objeto quando já pos- suímos, de antemão, algum conhecimento so- bre ele: na verdade, conseguimos identificar o que nos é familiar. Dessa maneira, recriamos o observado, convertendo-o em algo mais com- preensível. Fonte: Rasmussen (1998). 36 A Essência da Arquitetura Daí resulta a nossa comoção em relação à arquite- tura. E quando a observamos com um olhar mais definido, também somos capazes de perceber a totalidade histórico-cultural dessa obra: a arquite- tura permite que resgatemos a dimensão original da sociedade que a concebeu (BRANDÃO, 2006). Aquela análise estética, que num primeiro mo- mento admitia o edifício apenas em seu estado de realidade física, ganha uma nova dimensão - o pensamento filosófico - que nos permite enten- der diversas características do contexto no qual o edifício se insere (BRANDÃO, 2006). O esforço filosófico se estabelece na possibili- dade de perceber, no espaço construído, o espaço vivido (BRANDÃO, 2006). A arquitetura é uma importante ferramenta para alcançar a essência desse espaço vivido. Por isso, analisar a história e suas teorias significa reencontrar o próprio senti- do da arquitetura e os valores que o ato de projetar e erigir construções produz (BRANDÃO, 2006). A busca pelo sentido da arquitetura conduz ao pensamento filosófico, e a configuração formal caracteriza uma de suas múltiplas expressões. Mas a estéticaarquitetônica não se restringe aos aspectos formais, ela também tece sua trama em elementos funcionais, construtivos e contextuais. Fonte: Dorfman (2014). 37UNIDADE I História Sob o ponto de vista antropológico, a arquitetura é uma das manifestações mais aptas a traduzir a concepção de mundo de uma determinada época. Ela pode ser classificada como um tipo de produto cultural, capaz de testemunhar vários aspectos de uma sociedade, como grau de desenvolvimento técnico, poder político e econômico, caracterís- ticas sociais, ideologia dominante e preferências estéticas. Essa característica se embasa, principal- mente, na capacidade que muitas obras têm de resistir à ação do tempo (COLIN, 2000). Segundo Colin (2000), o componente histórico de uma edificação pode surgir a partir de três principais níveis de interpretação: a) Pelo próprio edifício que, concebido para servir à determinada sociedade, consegue, por si só, refletir suas múltiplas caracterís- ticas (COLIN, 2000). b) A edificação pode assimilar um simbolis- mo extra-arquitetônico por ter sido pro- tagonista de marcantes acontecimentos históricos (COLIN, 2000). c) O elemento arquitetônico pode ter sido concebido intencionalmente para ressal- tar feitos históricos, políticos ou comemo- rativos, como é o caso dos monumentos e memoriais (COLIN, 2000). Independentemente do tipo de relação que o edi- fício tem com a história, Nieto (1992) ressalta que, quando uma arquitetura consegue fundir valores estéticos e históricos no mesmo elemento, a me- mória torna-se coletiva, gerando uma represen- tação do sistema de vida de determinado grupo social e da sua respectiva época. 38 A Essência da Arquitetura Fatores que condicionam a história arquitetônica A arquitetura engloba aspectos tão distintos que re- latar adequadamente o seu desenvolvimento impli- ca entender o curso da história das civilizações e dos fatores envolvidos. Ao abordar o desenvolvimento de um povo, a história permite abranger vários pa- râmetros importantes que caracterizam cada época, dentre os quais podemos destacar (ZEVI, 1996): a) Pressupostos sociais: a arquitetura é um meio em que as relações sociais tornam-se possíveis. Ela se expressa, portanto, na sua interação com o indivíduo e com o contexto (MALARD, 2006). b) Pressupostos intelectuais: esta abordagem inclui os desejos de uma sociedade frente às possibilidades arquitetônicas vigentes, as quais podem ser influenciadas por mitos sociais, crenças religiosas ou ideologia dominante (ZEVI, 1996). Para Netto (1979), as possibilidades arquitetônicas de cada época dependem diretamente da ideologia que orienta a sociedade onde a arquitetura se insere. c) Pressupostos técnicos: este fator envolve o progresso industrial do período, especialmente considerando os avanços relacionados à construção civil (ZEVI, 1996). d) Propriedades estéticas e simbólicas: o objeto arquitetônico, ao associar forma e espaço na essência de um mesmo elemento, tem por característica intrínseca a transmissão de mensagens e valores simbólicos que são interpretados, individual ou coletivamente, pela sociedade para a qual ele é produzido. Inevitavelmente, esse significado pode assumir conotações específicas, de acordo com a cultura e os valores do grupo que o interpreta, além de poder ser alterado com a transição das épocas históricas. Para Netto (1979), o real valor de uma obra não está necessariamente no seu caráter de originalidade, mas reside na sua capacidade de expor determinada mensagem de forma clara. A associação desses fatores molda o palco em que a arquitetura surge e segue influenciando a vida humana. As obras são resultados da coexistência dos aspectos que formam a sociedade, refletindo a supremacia determinante de cada época: de uma classe política, mito religioso, objetivo co- letivo, descoberta técnica ou modismo regional (ZEVI, 1996). 39UNIDADE I Teoria da arquitetura A possibilidade de servir-nos dos ensinamentos passados pela história da arquitetura consiste em compreendermos a tradição dos povos ao longo do tempo, da qual podemos extrair as direções das possíveis transformações da projeção arqui- tetônica (GREGOTTI, 2010). Para Ching e Eckler (2014), qualquer aplica- ção atual de um princípio projetivo, geralmente, passa por um precedente histórico, ao qual pode ser associado de modo genérico. É por isso que o estudo da história, além de ser uma ferramen- ta valiosa para o entendimento de uma época, é primordial para a concepção de uma arquitetura bem-sucedida. A teoria da arquitetura surge nessa premissa, sendo considerada uma síntese entre história e morfologia (ZEVI, 1979). Morfologia é o estudo da influência dos determinan- tes em relação à aparência final dos edifícios – forma arquitetônica. Estes determinantes são de naturezas diversas, como fatores estéticos, econômicos, fun- cionais, políticos, legislativos, entre outros. (Silvio Colin) Com conceitos cientificamente adquiridos, a mor- fologia deve se relacionar à história da arquitetura, visando reconhecer a variedade das figurações ar- quitetônicas – servindo, inclusive, como base para experiências praticadas na arquitetura atual. Desse modo, o estudo morfológico almeja definir os con- ceitos que se referem à formação arquitetônica, sem uma análise mais profunda da sua posição histórica, no curso dos acontecimentos arquitetônicos. Nesse contexto, cabe à história delinear as relações histó- ricas entre os princípios morfológicos (ZEVI, 1979). Para distinguir entre os termos “história” e “teoria” da arquitetura, podemos admitir que o primeiro aborda a história da consciência estética que é expressa nos fenômenos concretos da obra. Já a teoria arquitetônica é a análise de cunho filosófico dessa consciência (ZEVI, 1979). Ao longo da história, diversas “teorias” busca- ram leis determinantes da expressão arquitetônica que pudessem servir de referencial aos princípios de composição (ZEVI, 1979). A intenção era que a experiência arquitetônica precedente pudesse ser racionalizada em esquemas-padrão que pu- dessem comunicar formas, tipologias e técnicas como regras gerais de projeto, enquanto represen- tavam noções culturais pré-elaboradas, por meio das quais se procurava garantir previamente um resultado harmonioso (GREGOTTI, 2010). O período histórico do Renascimento repre- sentou para a humanidade a época dos tratados técnicos sobre a forma arquitetônica. Ele elaborou seus próprios princípios projetivos por meio de (GREGOTTI, 2010): • Princípios arqueológicos-historiográficos, de acordo com estudos do monumento clássico utilizado como parâmetro meto- dológico (GREGOTTI, 2010). • Instrumentos de medição espacial, me- diante a invenção da perspectiva (GRE- GOTTI, 2010). • Instrumentos simbólicos por meio de várias teorias - simetria, proporção mate- mática, secção áurea, traçado regulador e ajuste das medidas humanas em relação à harmonia universal (GREGOTTI, 2010). Para a crítica, as ideologias precedentes tiveram como mérito o enriquecimento da pesquisa sobre as relações entre arquitetura e sociedade, indican- do onde se manifestavam as conotações políticas, religiosas e linguísticas de determinada sociedade (ZEVI, 1979). 40 A Essência da Arquitetura Crítica Segundo Montaner (2007 apud DORFMAN, 2014) a crítica surgiu, na segunda metade do século XVIII, com a estética. Seu papel tem por finalidade tornar as obras compreensíveis à sociedade no geral. Ao se situar entre a obra e o público, o crítico assume um compro- misso ético perante a sociedade. Ao longo do século XX, sua atuação cresceu em relevância, sobretudo, pelo surgimento das posturas de vanguardas e da expansão das linguagens artísticas (MONTANER, 2007 apud DORFMAN, 2014). A crítica envolve um juízo estético que associa conhecimento, intuição e sensibilidade. Ela observa as relações estabelecidas entre a funcionalidade, as características de articulação espacial, o caráter formale as linguagens expressivas, englobando uma variedade de aspectos intrínsecos à obra. Muitas vezes, utiliza análises compa- rativas para esclarecer alguns feitos artísticos. Os fatores analisados são investigados conforme algumas cate- gorias predefinidas de parâmetros, tais como: simetria e assime- tria, centralidade ou dispersão, espaços definidos por elementos horizontais e verticais, relações de configuração formal entre aspectos racionais e orgânicos da obra e as relações entre volumes e vazios que emergem entre a forma edificada e o seu contexto espacial. A análise da arquitetura ainda contempla seus princípios e sua ideologia, além da dimensão ética e política do seu período vigente e sua relação com o meio social (MONTANER, 2007 apud DORFMAN, 2014). Com análise das relações entre crítica e teoria da Arquitetura, Montaner (2007 apud DORFMAN, 2014) descobriu que ambas possuem forte ligação entre si, e a ausência de uma acarreta na invia- bilidade da outra: não é possível haver crítica sem um embasamento teórico que lhe dê fundamento. Por meio de um estudo histórico, a crítica permite que a realidade seja analisada sob novos pontos de vista (MONTANER, 2007 apud DORFMAN, 2014). Caro(a) aluno(a), assim, encerramos esta unidade inicial. Na próxima unidade, iniciaremos um breve percurso pela história da ar- quitetura, buscando entender como ela se firmou ao longo dos anos. 41 1. O arquiteto e engenheiro romano Marcus Vitruvius Pollio é, até os dias atuais, uma importante referência no estudo e na conceituação da arquitetura. Para Vitrúvio, a essência da arquitetura consiste em firmitas, utilitas e venustas. Sobre isso, relacione a primeira com a segunda coluna. 1. Firmitas 2. Utilitas 3. Venustas ) ( Este componente relaciona-se aos fatores que se refletem na busca do ideal estético. ) ( Este componente revela-se por meio da associação dos sistemas estruturais com os materiais construtivos, por meio de técnicas específicas que garantam a estabilidade da obra. ) ( Este componente consiste na adaptação da arquitetura para atender às ne- cessidades das variadas atividades que envolvem o cotidiano humano. 2. A arquitetura e o urbanismo têm uma formação de caráter interdisciplinar, pois engloba uma multiplicidade de aspectos, como arte, técnica, estética, sociologia, história e teoria. Nesse sentido, o seu currículo de graduação constitui-se de com- ponentes curriculares referentes a três grandes áreas do conhecimento, a saber: I) Área técnica: vinculada a componentes curriculares da prática construtiva e da física que permitem utilizar o conhecimento das formas e dos materiais para criar edifícios e prever seu comportamento frente aos esforços mecânicos. II) Área de humanas e ciências sociais: vinculada a saberes referentes ao com- portamento, à percepção e à cultura dos indivíduos de uma sociedade, que permitem criar espaços adequados aos hábitos vigentes. III) Área de projetos: vinculada ao treinamento da prática projetiva, incluindo os componentes relacionados com a representação e a composição de projetos. Assinale a alternativa correta: a) Somente a afirmativa II está correta. b) A afirmativa I está incorreta. c) Somente as afirmativas II e III estão corretas. d) As afirmativas I, II e III estão corretas. e) Todas as afirmativas estão incorretas. 42 3. Sob o ponto de vista antropológico, a arquitetura é uma das manifestações mais aptas a traduzir a concepção de mundo de uma determinada época, pois: ) ( Permite que resgatemos a dimensão original da sociedade que a concebeu. ) ( É capaz de testemunhar diversos aspectos de um povo, como o nível de religião, o grau de desenvolvimento técnico e as preferências estéticas. ) ( Possui um grande valor enquanto representante dos hábitos e da organização social dos povos, ao longo das diversas épocas. ) ( Pode assimilar um simbolismo extra-arquitetônico, por ter sido protagonista de marcantes acontecimentos históricos. 43 Tratado de Arquitetura Autor: Vitrúvio Editora: Martins Fontes Sinopse: único texto sobre arquitetura datado da Antiguidade clássica que se conservou até os dias de hoje, o Tratado De architectura, de Vitrúvio, es- crito em 27 a.C. e supostamente dedicado ao imperador Augusto, tornou-se referência já durante a Antiguidade e, séculos mais tarde, redescoberto numa abadia italiana, viria a influenciar as concepções estéticas renascentistas. LIVRO 44 ALBERNAZ, M. P.; LIMA, C. M. Dicionário ilustrado de arquitetura. v. 1, verbetes da letra A até I. São Paulo: ProEditores, 1998a. ______. Dicionário ilustrado de arquitetura. v. 2, verbetes da letra J até Z. São Paulo: ProEditores, 1998b. BRANDÃO, C. A. L. A formação do homem moderno vista através da arquitetura. Belo Horizonte: UFMG, 2006. CASTELNOU, A. M. N. Sentindo o espaço arquitetônico. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 7, jan./jun., 2003. Disponível em: < http://revistas.ufpr.br/made/article/view/3050/2441>. Acesso em: 9 out. 2017. CHING, F. D. K. Arquitetura: forma, espaço e ordem. Trad. Alvamar Helena Lamparelli. São Paulo: Martins Fontes, 2002. ______. Dicionário Visual de Arquitetura. Trad. Julio Fischer. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010. ______. Representação gráfica em arquitetura. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2011. CHING, F. D. K.; JUROSZEK, S. P. Desenho para arquitetos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2012. CHING, F. D. K.; ECKLER, J. F. Introdução à Arquitetura. Trad. Alexandre Salvaterra. São Paulo: Bookman, 2014. COLIN, S. Uma introdução à arquitetura. 3. ed. São Paulo: Uape, 2000. DONDIS, D. A. Sintaxe da linguagem visual. Trad. Jefferson Luiz Camargo. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. DONICI, M. Aesthetics of the main types of structures. Buletinul institutului politehnic din Iaşi, Publicat de Universitatea Tehnică, Gheorghe Asachi din Iaşi Tomul LIV (LVIII), fasc. 4, p. 9-15, 2011. DORFMAN, B. R. A arquitetura e a diferença: uma leitura de desconstrução. Dados eletrônicos. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2014. Disponível em: <http://www.pucrs.br/edipucrs>. Acesso em: 20 dez. 2017. FABRÍCIO, M. M. Projeto simultâneo na construção de edifícios. 2002. 350 f. Tese (Doutorado em Enge- nharia) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002. Disponível em: <https://globalconstroi. com/images/stories/Manuais_tecnicos/2010/projecto_simultaneo_const_edificios/Projeto_Simultaneo_TESE1. pdf>. 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Maia Isabel Gaspar, Gaetan Martins de Oliveira. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. REFERÊNCIAS ON-LINE 1Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/6201288571/0cb95c39ed/>. Acesso em: 27 dez. 2017. 46 1. 3, 1, 2. 2. D. 3. V, V, V, V. 47 48 PLANO DE ESTUDOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM • Compreender os princípios de composição na Arquitetura Antiga e Clássica. • Compreender os princípios de composição na Arquitetura Medieval. • Compreender as linhas projetuais e formas de composição na arquitetura do Renascimento, Maneirismo e Barroco. • Compreender as linhas projetuais e formas de composição na arquitetura do período eclético. • Compreender as linhas projetuais e formas de com- posição nos primórdios da arquitetura do Movimento Moderno. Arquitetura Antiga e Clássica Arquitetura Medieval Arquitetura Eclética Arquitetura Moderna Arquitetura entre o século XIV e XVIII Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla História da Arquitetura Arquitetura Antiga e Clássica Caro(a) aluno(a), antes de iniciarmos uma carac- terização mais específica da gama de fatores que a arquitetura envolve, identificamos a eminente ne- cessidade de destinar esta unidade a um breve relato dos principais acontecimentos e estilos da história da humanidade, principalmente, em relação aos aspectos que tangem ao universo da arquitetura e urbanismo. O objetivo é abordar tratados, princípios e conceitos que são recorrentes à arquitetura atual, buscando suas origens. Iniciaremos nossa trajetória pela arquitetura antiga do Egito. Arquitetura do Egito Antigo O Egito teve dois mil anos de civilização (500 a 3.000 a.C.) antes de atingir sua primeira unidade política, quando o faraó Menes unificou o Alto e o Baixo Egito. Ao todo, a história egípcia desenvolveu-se em trinta dinastias, Impérios Antigo, Médio e Novo e períodos de transição (PEREIRA, 2010). Situado no nordeste da África, a civilização egípcia desenvolveu-se ao longo do Rio Nilo e suas inundações, mantendo-se estável e isolada, principalmente, em virtude de seus limites geo- 51UNIDADE II gráficos, que faziam do Egito um território linear. Somente no Império Novo, o povo egípcio saiu, esporadicamente, da sua base geográfica e avançou (PEREIRA, 2010). Em termos arquitetônicos, os antigos egípcios criaram uma arquitetura espetacular, unindo forças de toda uma civilização em prol de valores cultu- rais bem difundidos. Os egípcios acreditavam na continuidade da vida após a morte, por isso, de- dicaram-se ao desenvolvimento de construções representativas que demonstrassem a importância da pós-vida (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Com isso, túmulos e templos funerários ca- racterizam suas obras arquitetônicas mais relevantes (PEREIRA, 2010). A essência da eternidade era um conceito tão primordial desta civilização que o Egito possuía um território demarcado para os vivos e outro para os mortos. Essa dualidade emergiu de eixos que a civi- lização definiu em relação à trajetória do Rio Nilo e ao ritmo cíclico da relação dia-noite. O eixo caracterizado pelo curso anual do Nilo abrangia o fluxo unidirecional e assumiu maior im- portância, já que se relacionava ao processo vital que o rio proporcionava ao seu povo. Junto dele, o orde- namento do tempo em quantidade de dias, possibi- litou o surgimento de um eixo menor, estabelecido pelo curso diário do Sol. O leste — representando o nascer do sol — possuía ligação com a vida, e o oeste — onde ele era encoberto — estava relacionado à morte. O simbolismo, fruto dessa analogia, esta- beleceu que a civilização egípcia, então, reservasse a margem oriental do território aos vivos e a parte ocidental aos mortos (PEREIRA, 2010). Ainda que a dedicação dessa civilização tenha sido para preparar a pós-vida de personagens ilus- tres (faraó), toda a população egípcia compartilha- va da esperança na vida eterna e, por isso, estava interessada na criação de uma arquitetura voltada à morte e ao renascimento. Isso incluía das tumbas modestas até as construções monumentais reser- vadas aos soberanos (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). A mastaba representa uma espécie de túmulo primitivo, construída para ser a habitação eterna dos mortos. Era costume do povo egípcio realizar rituais dentro dessas câmaras mortuárias, visando o sucesso da transformação da vida em morte. Conforme esse ritual religioso (prescrito pelos sacerdotes) evoluiu e iniciou-se um processo de ênfase à figura do faraó, a mastaba foi ampliada, proporcionando a produção da pirâmide que, simbolicamente, representava a possibilidade do renascimento diário e anual do faraó, ao longo da eternidade (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Desde o seu surgimento, em Saqqara, a concep- ção de pirâmide verdadeira passou por um estágio de, pelo menos, três grandes projetos, até alcançar Mastaba – Túmulo primitivo egípcio 52 História da Arquitetura seu esplendor nas três grandes pirâmides em Gisé. Tais pirâmides (2550-2460 a.C.) são destinadas aos faraós da Quarta Dinastia, conhecidos como Quéops, Quéfren e Miquerinos. A maior delas é a de Quéops, possuindo uma base de 230,1 x 230,1 m e uma altura de 146,6 m. Ela foi a primeira a ser construída e possui calcário na maior parte da sua composição — embora a câmara do faraó seja con- feccionada em granito (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). Embora possamos perceber a pirâmide como forma arquitetônica perfeita e representante do Im- pério Antigo, razões sociais fizeram que sua constru- ção fosse substituída, no Império Novo, por templos funerários enterrados ou incrustados nas monta- nhas egípcias (PEREIRA, 2010). O traçado dos grandes templos baseava-se nos complexos de pirâmides do Império Antigo, sendo definido pelo conceito de sequência, que abrangia uma sucessão ordenada de elementos relacionados, que indicavam o percurso entre a cidade dos vivos e a dos mortos (PEREIRA, 2010). Arquitetura Clássica A Arquitetura Clássica caracteriza as arquiteturas da Grécia e Roma antigas e o revivescimento de seus princípios, expressos, principalmente, nas or- dens clássicas. Em vários períodos posteriores da História, sua influência caracterizou alguns estilos arquitetônicos, como o Renascimento, o Neoclássico e o Pós-modernismo (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Arquitetura da Grécia Antiga A arquitetura grega pertence a uma civilização que floresceu na península grega, na Ásia Menor, na costa setentrional da África e no lado oeste do Mediterrâneo, até ser dominada por Roma, em 146 d.C. É evidenciada por um sistema cons- trutivo que se baseia em regras específicas de forma e proporção (CHING, 2010). Na Grécia, a civilização exprimiu-se de forma mais efetiva no espaço externo, o qual engloba os recintos sagrados, acrópoles e teatros descober- tos (ZEVI, 1996). Deste modo, a Grécia Antiga instituiu uma arquitetura em que as condições internas podiam ser reveladas pelas aparências externas de suas obras, e as questões de cunho moral e ético estavam inerentemente ligadas à arte (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). O padrão de beleza grego A busca pela beleza era um consenso impor- tante instaurado na civilização grega. Na arqui- tetura, vários atributos associados à estética ex- terna de um edifício eram fruto das dimensões e inter-relações de suas formas, por meio dos sistemas de proporção (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Como os gregos reconheceram o poder da secção áurea na obtenção de harmonia arquite- tônica, utilizaram-na largamente em suas con- cepções, principalmente na edificação de seus imponentes templos (CHING, 2002).Além disso, empregaram o mais completo uso do equilíbrio axial e simétrico e recorreram a artifícios de ilusão ótica para corrigir certas imperfeições de nosso aparelho visual. Esses re- cursos eram expressos em deformações mínimas impostas aos elementos construtivos. Uma delas imprimia ligeira curva convexa na região central das colunas gregas, visando compensar o aspecto visual côncavo que um elemento linear assume quando é visto de longe (DONDIS, 2007). Como efeito final, os gregos obtiveram uma arquitetura de qualidade, alcançando o que realmente almejavam: um efeito de harmonia e equilíbrio completo, onde todos os requisitos formais são supridos (DONDIS, 2007). 53UNIDADE II As ordens clássicas Os gregos desenvolveram um tratamento estilizado para alguns elementos construtivos que caracteri- zavam suas edificações. Tais sistemas deram nome às ordens clássicas, que se firmaram como a base da linguagem da Arquitetura Clássica (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Para a civilização antiga da Grécia e Roma, as ordens eram a expressão perfeita dos conceitos de beleza e harmonia, fundamentados na pro- porcionalidade que seus elementos apresentavam (CHING, 2002). Entende-se por ordem cada um dos cinco estilos da Arquitetura Clássica, definidos pelo tipo e disposição das colunas e entablamentos adotados. As ordens recebem o nome de dórica, jônica, coríntia, toscana e compósita (Figura 1) (CHING, 2010). Cada ordem apresenta uma com- binação específica de elementos (FAZIO; MOF- FETT; WODEHOUSE, 2011). A unidade básica de dimensão vincula-se ao diâmetro da coluna cujo módulo propicia as di- mensões dos outros elementos do conjunto. Como as colunas variavam de tamanho conforme a ex- tensão do edifício, as ordens não se restringiam a uma dimensão fixa, ao contrário, representavam uma possibilidade projetiva que se ajustava con- forme a particularidade da situação. Intencional- mente, isso permitia que todas as partes de um edifício fossem proporcionais e harmônicas entre si (CHING, 2002). O arquiteto romano Vitrúvio, após estudos so- bre as ordens clássicas, apresentou suas proporções “ideais” para cada uma delas em seu tratado — “Os dez livros da Arquitetura” — no século V a. C. Suas regras foram traduzidas para a Renascença italiana, e sua codificação das ordens arquitetônicas é, pos- sivelmente, a que mais conhecemos na atualidade (CHING, 2002). Figura 1 – Ordens clássicas Toscana Jônica TIPOS DE COLUNA Dórica Coríntia Compósita Configuração axial: arranjo sistemático de partes interdependentes ou coordenadas em uma uni- dade coerente que é relativa a um eixo. Ela tem sido a base da arquitetura monumental, desde a Antiguidade. Configuração simétrica: simetria resultante do arranjo de partes semelhantes de uma compo- sição nos lados opostos de um eixo mediano. Elemento convexo: arredondado, como o exte- rior de uma forma esférica. Elemento côncavo: que apresenta superfície li- geiramente escavada. (Francis D. K Ching, Dicionário Michaelis e Geof- frey Baker) 54 História da Arquitetura O templo grego Além dos traçados urbanos em formato de grelha, outra contribuição importante que os arquitetos gregos forneceram à história da arquitetura, du- rante o período arcaico (cerca de 700-500 a.C.) foi a figura do templo, criado com a intenção de ser o lar dos deuses (FAZIO; MOFFETT; WODEHOU- SE, 2011). Os primeiros templos eram edificações simples que possuíam uma sala retangular (cela) de dimensões médias como núcleo principal, onde se guardava a estátua da divindade. O altar ficava no exterior, e cada templo era circundado, de forma total ou parcial, por fileiras de colunas (PEREIRA, 2010). Os elementos característicos de um templo grego englobam uma plataforma elevada que sustenta uma sequência de colunas e um en- tablamento contínuo que sustenta o teto. Suas dimensões abrangem a qualidade da escala humana. Como os ritos realizavam-se do lado externo e ao redor desses recintos, o esforço dos projetistas era transformar as colunas e demais elementos em obras-primas sublimes de plasticidade (ZEVI, 1996). De uma forma geral, o templo grego era con- tinuamente refinado, em busca de um ideal de perfeição e beleza, e seu projeto influenciou uma ampla gama de edificações seculares de caráter cívico (CHING, 2010). Além do caráter religioso, o templo era um edifício político e prestava-se a cerimônias, ser- vindo como local para festas solenes da nação. Seu significado político era tão importante quanto o religioso (PEREIRA, 2010). Ele representava, também, importantes formas de divulgação, que reforçavam os valores comuns entre os cidadãos, refletindo as grandes conquistas e as elevadas inspirações da cultura grega (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Os principais templos foram erigidos na Acró- pole, uma espécie de recinto murado de uma cidade grega, que se localizava nas zonas mais altas do ter- ritório (PEREIRA, 2010). De todas, a mais ilustre é Atenas, que emergiu como a principal cidade do Período Clássico (479-323 a.C.). Nesse contexto, foi construído o Partenon (Figura 2), um célebre tem- plo dedicado à Atena Polias, a deusa que protegia a cidade (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Figura 2 – Partenon, Grécia (448 – 432 a.C.), Fídias, Ictinos e Calícrates 55UNIDADE II As cidades gregas Os gregos geravam sua cidade como área de di- mensões finitas, com abrangência ótica e política. Entendida como local relativamente sagrado, a cidade era inserida sobre uma topografia irregular e edificada como uma série de blocos que, juntos, unificam o conjunto urbano, sempre limitada de modo natural pela ladeira íngreme de uma colina ou pelo litoral. Deste modo, as cidades da Grécia clássica — com exceção das acrópoles e ágoras — eram como um enxame de células irregulares (PEREIRA, 2010). Ao longo do tempo, no entanto, a civilização grega produziu um conceito urbano cujos prin- cípios projetivos foram firmados por Hipódamo de Mileto, arquiteto e filósofo de Atenas, no século V a.C. Citado por Aristóteles como o criador do urbanismo, ele foi o primeiro a considerar que o plano da cidade deve representar e conceder forma à organização social. Suas diretrizes propu- nham que as ruas fossem traçadas regularmente, ao longo de padrões reticulados. Praças abertas seriam intercaladas nessa disposição e, no centro da malha, estaria a ágora, um espaço vetado ao tráfego de veículos. No séc. V a.C., o caráter de malha ortogonal converteu-se em uma norma di- retriz para a concepção do planejamento urbano (PEREIRA, 2010). O Urbanismo é uma ciência que se relaciona com o ordenamento, construção e remodelagem de um espaço urbano, podendo ser aplicado em nível macro de uma cidade ou região, bem como na escala de um bairro ou loteamento. (Maria Paula Albernaz e Cecília Modesto Lima) Helenismo O período helenístico refere-se à história, cul- tura e arte gregas, desde a morte de Alexandre Magno (323 a.C.) até o século I a.C., em que as dinastias gregas firmaram-se no Egito, Síria e Pérsia (CHING, 2010). A tradição da Gré- cia clássica acolheu as influências do Oriente, visando criar uma cultura de nível “mundial” (KOCH, 2008). Entre os principais elementos da sua lingua- gem formal estão: a vocação à monumentalidade (representada pelos templos), a disposição dos edifícios em grupo e a planificação metódica, o relevo das fachadas, a rica decoração de formas, as fileiras de colunas, o frontão interrompido e o naturalismo da escultura. Tais elementos são retomados pelo Barroco europeu, no século XVIII (KOCH, 2008). Frontão é um elemento característico da Arqui- tetura Clássica, que apresenta forma triangular e situa-se na extremidade superior da fachada de um edifício, impondo-lhe acabamento frontal e posterior ao acomodar um telhado de duas águas. (Sílvio Colin) Arquitetura Romana As concepções artísticas em Roma, princi- palmente em relação à arquitetura e às artes plásticas, alcançaram uma apreciávelunidade, fruto da autoridade política que se estendia pelo vasto império. Ao longo da sua história, a civilização romana fez surgir grandes cidades (GUIA, 2016, on-line). 56 História da Arquitetura O repertório arquitetônico de Roma, no declí- nio do século I d.C., identificava-se com o dicio- nário das civilizações europeias e mediterrâneas. Com a inclusão de cunho político das civilizações da Ásia Menor e das costas africanas, Roma seguiu assimilando todas as suas conquistas arquitetôni- cas (ZEVI, 1996). Se boa parte da história da arquitetura romana, no entanto, é resultado do seu crescente domínio das formas orientais sobre a tradição grega (PE- REIRA, 2010), não há razão para negar a efetiva competência romana na construção de sua pró- pria arquitetura (GUIA, 2016, on-line). O destaque da sua arte, sem dúvida, é a gran- diosidade de suas edificações. Embora muitas construções tenham assumido um caráter es- sencialmente funcional — para responder ao processo de expansão e colonização —, o poder que Roma exercia no seu período histórico foi transferido para as imponentes edificações que criava, sobretudo, na capital do Império (GUIA, 2016, on-line). Fundamentalmente, a arquitetura romana se manifestava no sentido de afirmar sua supre- macia, representando um simbolismo capaz de impor seu domínio à civilização: além de procla- mar a existência do Império, reafirmava-o como potência e razão de vida. Desta forma, a escala utilizada na arquitetura foi fruto desse mito e não esteve preocupada em corresponder à escala hu- mana (ZEVI, 1996). Como as obras eram executadas de acordo com o desenvolvimento das cidades, a praticida- de sobressaia em relação ao efeito arquitetônico, e a beleza das construções precisava resultar dessa solução utilitária (GUIA, 2016, on-line). Embora as formas gregas fossem usadas nas cons- truções em geral, a escala monumental (almejada pelo Império) solicitava um aperfeiçoamento dos procedimentos técnicos. Isso impulsionou os roma- nos a criarem novas técnicas construtivas. A utiliza- ção do concreto também proporcionou a concepção de projetos mais flexíveis, como o teto abobadado e as áreas grandes de formato circular que possuíam teto elevado por domo (GUIA, 2016, on-line). Paralelamente a essa necessidade técnica, a ba- sílica surgiu como o tema social de Roma, onde os cidadãos podiam agir conforme uma filosofia e cultura que fosse além da contemplação abstrata — a qual caracterizava o equilíbrio perfeito do pensamento grego (ZEVI, 1996). A basílica cons- tituía um edifício público com funções variadas, dedicada, sobretudo, à justiça e ao comércio. Por meio de suas colunas internas, possuía natureza correspondente a um templo grego, com a dife- rença de ser concebida para o ambiente interno, o qual abrigava todo o seu potencial artístico. Fundamentalmente, esse caráter espacial, assim como de toda concepção romana, foi pensado de maneira estática (PEREIRA, 2010). Os fóruns imperiais também foram destaques da arquitetura romana, em especial o de Trajano, o mais suntuoso de todos, que englobava predo- minantemente “mercados” em sua composição (GUIA, 2016, on-line). De todos os edifícios para o público romano, contudo, certamente o mais característico foi o destinado às termas, um complexo para banhos públicos, que, além de exercerem finalidade de higiene, desempenhavam um importante papel na sociedade, por meio de seus estabelecimen- tos desportivos e sociais (PEREIRA, 2010). Para os espetáculos, os principais edifícios fo- ram os teatros, anfiteatros e os circos (PEREIRA, 2010). O Coliseu é um dos edifícios mais fa- mosos da arquitetura romana. Constituído por uma enorme arena para 50 mil espectadores, ele possibilitava que a população fosse distraída pelos imperadores com diversões em larga escala (GUIA, 2016, on-line). Outra edificação romana de destaque é o Panteão, um templo dedicado aos deuses, que 57UNIDADE II simboliza um dos maiores marcos da arquitetura universal. Ele possui uma cúpula de 43 m de diâmetro que é iluminada por um óculo central de 9 m de diâmetro, simbolizando o Sol (Figura 3) (GUIA, 2016, on-line). Por outro lado, as construções de caráter de- fensivo (fortaleza e muralhas) e obras públicas (estradas, aquedutos e pontes) foram favoreci- das pela estrutura militar do Império (GUIA, 2016, on-line). A infraestrutura urbana foi grande contribuinte para a projeção do urbanismo romano na Idade Média (PEREIRA, 2010). Em um panorama geral, o alto grau de organização social e o fun- cionalismo dominante no modo de vida do povo romano foram os principais fatores que caracteriza- ram a produção artística de Roma (GUIA, 2016, on-line). Figura 3 – Vista externa e interna do Panteão, Roma, Apolodoro de Damasco 58 História da Arquitetura Arquitetura Paleocristã Quando Constantino (306-37 d.C.) transferiu a capital do Império Romano para Bizâncio (que passou a se chamar Constantinopla), o seu Edito de Tolerância (313 d.C.) garantiu liberdade às práticas religiosas (KOCH, 2008). Como a preferência foi pelo cristianis- mo, esta se tornou a religião oficial do Estado, iniciando a fase arquitetônica do cristianismo primitivo, que se manteve até a coroação de Carlos Magno (800 d.C.) como imperador do Sacro Império Romano (CHING, 2010). Com base no vocabulário da arquitetura Helenística e Roma- na, os cristãos precisaram escolher quais formas seriam as mais adequadas à construção dos seus novos templos (ZEVI, 1996). Essa liberdade em relação às novas possibilidades conceptivas coincidiu com o auge do conceito técnico da arquitetura roma- na. Neste contexto, os cristãos fundamentaram-se na herança de Roma, mas reelaboraram o seu repertório técnico clássico, com um espírito desprovido de preconceitos (PEREIRA, 2010). Libertos do ideal contemplativo grego e da cenografia que imperava no interior dos ambientes romanos, os cristãos selecio- naram o que julgavam primordial de ambas as tradições e os as- sociaram na igreja cristã: de um lado, a escala humana empregada pelos gregos e, de outro, a consciência do espaço interior romano. Assim, a igreja surgiu inspirada na basílica — já que esta representava a experiência social da civilização anterior —, mas suas dimensões foram reduzidas, e a edificação se compôs em respeito à escala humana. Ao contrário do caráter estático da arquitetura romana, o novo projeto cristão estimulava o dina- mismo do homem, construindo e orientando o espaço ao longo do seu caminhar. Por isso, tais edificações foram concebidas com predominância do eixo longitudinal (ZEVI, 1996). Em um contexto histórico, a Arquitetura Paleocristã coin- cidiu e se relacionou com a ascensão da arquitetura bizantina (CHING, 2010). 59UNIDADE II Com a denominação de Arquitetura Medieval, caracteriza-se a arquitetura praticada na Idade Média europeia, compreendendo as edificações dos períodos bizantino, pré-românico, românico e gótico (CHING, 2010). Idade Média é o período histórico da Europa, compreendido entre a Antiguidade clássica e a Renascença, geralmente, datada de 476 d.C., quando Rômulo Augústulo (último imperador do Império Romano do Ocidente) foi deposto, até cerca de 1.500. O período medieval engloba séculos bárbaros, cheios de invasões, lutas e dita- duras. Seu período inicial é conhecido como Ida- de das Trevas (aproximadamente 476 a 1.100). (Bruno Zevi e Francis D. K. Ching) Arquitetura Medieval 60 História da Arquitetura Arquitetura Bizantina Geralmente, a distinção entre os períodos pa- leocristão e bizantino é realizada no reinado de Justiniano (527-565), o imperador instalado em Constantinopla que, entre seus feitos, finalizou as disputas entre as facções, reforçou a influência imperial em parte do norte da África e da Itália e começou um forte esquema de construção de igrejas. A mais famosa delas é a Santa Sofia (Figura 4), uma das mais magníficas edificações do mun- do (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011).Em nível de identificação, as edificações cons- truídas, efetiva ou tradicionalmente outorgadas à Constantinopla, são denominadas bizantinas. Uma característica primordial da Arquitetura Bizantina é o uso das cúpulas tanto em igrejas em forma de basílica como em igrejas com planta baixa centra- lizada (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Outra característica marcante é o emprego de exu- berantes afrescos, mosaicos coloridos e revesti- mentos internos com mármore (CHING, 2010). Figura 4 – Basílica de Santa Sofia, Turquia (532-537) Isidoro de Mileto e Antêmio de Trales 61UNIDADE II Arquitetura Românica A Arquitetura Românica é um estilo que se desen- volveu na Itália e na Europa Ocidental, no século IX, cuja duração estendeu-se até o início do pe- ríodo Gótico, no século XII. Suas principais ca- racterísticas são: construções pesadas e articuladas de alvenaria, aberturas estreitas, desenvolvimento da abóbada de nervuras e do pilar de abóbada, introdução de torres central e ocidental nas igrejas (CHING, 2010) e utilização da abóbada cilíndrica e do arco circular — referência da Roma Antiga, da qual provém o nome desse período (KOCH, 2008). O desenvolvimento da Arquitetura Românica envolveu uma variedade de estilos regionais rela- cionados entre si, os quais englobam a Arquitetura Carolíngea, Lombarda, Ottoniana e Anglo-saxô- nica (CHING, 2010). Neste período, a igreja continuava exercendo forte supremacia tanto na cidade como na rotina dos cidadãos. A vida espiritual era regida pela es- colástica, o que possivelmente justifica a existência de ilustres personagens históricos nesse período, como São Francisco, Alberto Magno e São Tomás de Aquino (KOCH, 2008). Escolástica: é um pensamento de cunho teológico- -filosófico com orientação cristã, da Idade Medieval, que busca a conciliação entre fé e razão, baseando- -se na tradição grega de Platão e Aristóteles. (Dicionário Michaelis) Neste contexto, a Arquitetura Gótica envolveu a concretização do desejo espiritual da Idade Média e representou a melhor concepção que o homem do período evidenciou a respeito de Deus, do mundo e de si próprio, expressando-se em estilo de cunho religioso (BRANDÃO, 2006). Mais do que qualquer período precedente, o século XIII foi crucial para a história, simbo- lizando o século “clássico” da Idade Média. Isso pode ser compreendido, inclusive, pela análise do edifício mais imponente do estilo Gótico, a cate- dral. Concentrando as potencialidades espaciais dos estilos medievais anteriores, ela foi capaz de conciliar o eixo longitudinal do Paleocristão, a espiritualidade e o misticismo Bizantino com a verticalidade e a comunicação urbana revelados no estilo Românico. No estilo Gótico, a catedral ressaltava um espírito de verticalidade que pre- tendia despertar no fiel um duplo sentimento de transcendência e proteção. Enquanto o Românico trazia essa verticalidade apenas nas torres isoladas, o Gótico elevava toda a sua igreja, por meio do seu Arquitetura Normanda é o nome dado à Arquite- tura Românica, inserida na Inglaterra a partir da Normandia, antes da conquista normanda e que floresceu até a ascensão do período gótico (1200). Suas características envolvem edificações de gran- des abadias beneditinas, a fachada de duas torres a complementar a torre central acima do cruza- mento e a utilização de ornamentos geométricos. Fonte: Ching (2010). Arquitetura Gótica Após o fim do Império, a França se impôs de for- ma política e cultural à Europa (KOCH, 2008) e criou um estilo arquitetônico, no século XII, que perdurou na Europa Ocidental até o século XVI (CHING, 2010). 62 História da Arquitetura padrão arquitetônico (BRANDÃO, 2006). Em sua pedagogia, o papel estruturador da Igreja era exaltado pelos vitrais que circundavam a catedral, possibilitados graças ao novo sistema es- trutural permitindo que o peso — antes descarre- gado nas paredes — fosse transferido ao esqueleto de contrafortes. Deste modo, as paredes puderam ser manipuladas como painéis transparentes, que narravam os episódios religiosos, servindo como uma espécie de catequese aos fiéis. Neste sentido, a luz — sempre relacionada à origem divina das coisas — exerceu um efeito essencial na edificação, possibilitando que os desenhos da Sagrada Escritura (presentes nos vitrais) fossem claramente revelados. Benefica- mente, esse sistema de fenestração colorida per- mitiu que o interior da catedral fosse interligado ao exterior, para que a mensagem religiosa fosse amplamente propagada à comunidade (BRAN- DÃO, 2006). Além das catedrais, o Gótico também influen- ciou a construção de castelos que se propagaram na era medieval (GLANCEY, 2001). Ao longo do período Gótico, o estilo assumiu marca própria em cada país que penetrou. Na França, as caracte- rísticas principais foram as fachadas de duas tor- res ornadas por rosáceas — uma espécie de janela circular decorada que possuía traçado radial —, o trifório e a estatuária. Na Alemanha, o cenário foi diferente: até o final do século XIII, construiu-se, basicamente, no estilo Românico, e a inserção do Gótico caracterizou-se por construções de torre central pontiaguda e coruchéu rendilhado. Na Es- panha, algumas igrejas — em parte edificadas sobre os conceitos de mesquitas do estilo Mourisco — voltaram-se a estruturas demasiadamente amplas. No Gótico tardio, houve grande distinção entre a basílica, a igreja-salão e a igreja de nave única. Apenas a Itália impôs rejeição ao estilo Gótico, não o compreendendo em sua essência, possivelmente por causa da sua herança classicista (KOCH, 2008). Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo. Para acessar, use seu leitor de QR Code. O traçado urbano do período medieval As pequenas cidades criadas a partir do século XI possuíam a Igreja Românica como ponto cen- tral da área urbana. No século XIII, tais cidades já haviam se desenvolvido e conquistado certa autonomia, tendo como base a prática do comér- cio. O ideal da época era que a ordenação urbana tivesse a catedral no centro e dela se irradiasse dois eixos perpendiculares (Norte-Sul e Leste- -Oeste), simbolizando a cruz, que delimitavam a cidade em quatro quadrantes. Organizando deste modo, acreditava-se que a cidade reprodu- zia a mesma ordem cósmica da imaginação me- dieval, cujo universo era planejado em respeito aos quatro pontos cardeais. Além disso, conferia para Roma e para Jerusalém — símbolos e berços da cristandade —, um papel de duplo centro. A função essencial da catedral era, portanto, orga- nizar o espaço urbano, simbolizando o caráter central que a Igreja transmitia como instituição governante das civilizações (BRANDÃO, 2006). 63UNIDADE II No século XIV, surgiu, na Itália, o Renascimento, um período de transição entre o mundo medieval e o moderno. Ele envolveu um revivescimento humanístico da arte, das letras e da cultura clássi- cas que durou até o século XVII (CHING, 2010). Ele marcou a abertura de rotas comerciais e de bancos, além da absorção de conhecimentos novos ou redescobertos. A invenção da imprensa possibi- litou a rápida disseminação dos novos conhecimen- tos. Nesse momento, a população pôde ter acesso a livros e às informações que antes eram reservadas apenas ao clero. Isso representou um grande pro- blema ao dogma católico, culminando na Reforma e na Igreja Protestante (GLANCEY, 2001). Arquitetura Renascentista O Renascimento representou para a arquitetura, as- sim como para outras áreas, uma época de grande desenvolvimento tecnológico e científico (ADDIS, 2009). Para a história da arquitetura, particular- mente, representou um marco: pintores, cientistas e arquitetos começaram a se enxergar como medida de todas as coisas e tiveram consciência de que eles próprios — e não mais a figura de um Deus Arquitetura entre o Século XIV e XVIII 64 História da Arquitetura onipotente — podiam dar forma às suas cidades e edificações. Esse ideal racionalista foi associado a umaredescoberta da arquitetura romana, um fascínio pelas leis da perspectiva (que acabavam de ser implantadas) e um anseio de recriar as glórias do mundo antigo (GLANCEY, 2001). Embora o seu início seja atribuído à obra de Brunelleschi (cúpula da Catedral de Florença, entre 1420-1436), a Arquitetura Renascentista enraizou-se e se espalhou rapidamente pela Eu- ropa com a publicação dos primeiros tratados arquitetônicos desde a Roma Antiga. O primeiro deles, De re aedificatoria, de Leon Battista Alberti (1452), adaptou os princípios da Roma imperial aos projetos da Florença do século XV e foi muito influente. Depois houve a primeira publicação de Vitrúvio (GLANCEY, 2001). Períodos do Renascimento O Renascimento denominado primitivo foi de- senvolvido durante o século XV, caracterizado pelo advento da perspectiva e pela utilização cria- tiva dos detalhes clássicos (CHING, 2010). Com o desenho, o arquiteto podia antever o resultado estético de sua criação, e isso possibilitava a re- dução da sua permanência no canteiro de obras, que, até então, representava a aprendizagem do ofício arquitetônico, sendo sua verdadeira escola de formação (GRAEFF, 1995). A Alta Renascença caracteriza o estilo da arte e arquitetura desenvolvida no final do século XV e princípio do XVI. No campo da arquitetura, esse período foi marcado pelo uso imitativo das ordens e arranjos do Classicismo, com grande respeito às formulações de normas compositivas ditadas pelos preceitos vitruvianos (CHING, 2010). Os arquitetos fizeram longos estudos sobre as ruínas romanas e também sobre os textos de Vitrúvio (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). O ideal de beleza do Renascimento No segmento artístico, a tradição romana era o modelo que servia de estímulo para a “idade de ouro” com a qual os humanistas sonhavam e que colocava o homem em posição de destaque. Por isso, os artistas buscavam, na figura humana, as proporções ideais e, em oposição ao anonimato do período Gótico, assinavam, orgulhosamente, suas obras. A Renascença reuniu figuras ilustres mundialmente reconhecidas, como Leonardo da Vinci, Michelângelo e Bramante (KOCH, 2008). Na arquitetura, a proporção era um ideal de beleza que influenciava o imaginário dos arquitetos renascentistas, por isso, eles almeja- vam que suas edificações pertencessem a uma composição de ordem mais elevada. Nesta bus- ca, retomaram o sistema matemático grego a respeito das proporções. Aplicando a teoria de Pitágoras em relação às razões matemáticas, eles desenvolveram uma progressão de razões que servia como base para as proporções da sua arquitetura. As séries dessas razões reve- lavam-se não apenas no dimensionamento de um ambiente ou de uma fachada, mas também na sequência de espaços ou em todo o projeto. Andrea Palladio (1508-1580) foi um influen- te arquiteto da Renascença italiana que, seguin- do os passos de seus antecessores (como Alber- ti), publicou Os quatro livros da Arquitetura (Veneza, 1570), no qual aborda possibilidades conceptivas de ambientes mais belos e propor- cionais. Seus princípios eram embasados em uma dada relação entre largura/comprimento e altura do recinto (CHING, 2002). Em relação aos edifícios eclesiásticos, a es- sência artística se impôs às necessidades funcio- nais dos rituais religiosos, já que era priorida- de das obras renascentistas refletirem os ideais platônicos de beleza. Dessa forma, a dimensão 65UNIDADE II tecnológica foi aplicada no sentido de erigir as suntuosas cúpulas que marcaram presença significativa ao longo de todo o estilo (MA- LARD, 2006). Maneirismo O maneirismo representa o estilo de transição da arquitetura europeia, no final do século XVI (alto Renascimento) e o Barroco, existindo essen- cialmente na Itália (CHING, 2010). Sua principal característica é a transgressão dos princípios clás- sicos de harmonia e proporcionalidade canônica, substituindo-os por efeitos dramáticos e fortes contrastes (COLIN, 2000). Arquitetura Barroca Na reta final do Renascimento, a Igreja Católica ainda possuía muito poder secular, mas seus prin- cípios morais haviam se deteriorado, em parte pela vida luxuosa que seus representantes manti- nham, tratando os recursos provenientes dos fiéis como verba pessoal. Inevitavelmente, a corrupção instaurada resultou em pedidos de uma reforma religiosa — alguns ainda no século XIII. Houve, então, o movimento conhecido como Reforma Protestante, sob influência de Lutero (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Por conta disso, no século XVI, a Igreja Cató- lica juntou seu vigor e iniciou os movimentos de uma Contra-Reforma, a partir da Itália (KOCH, 2008). Esse programa consistia em empregar uma nova roupagem artística (principalmente da expressão arquitetônica) ao interior das igre- jas que representasse o poder católico, com a finalidade de atrair novamente a população aos seus dogmas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOU- SE, 2011). Esse estilo ficou conhecido pelo nome pe- jorativo de Barroco (KOCH, 2008). Seu início foi na Itália (início do século XVII), mas, pre- dominantemente, atuou, de forma variada, na Europa e no Novo Mundo, por cerca de 150 anos (CHING, 2010). No geral, a Arquitetura Barroca é caracterizada, essencialmente, pelo uso livre e escultural tanto das ordens como dos ornamentos clássicos (CHING, 2010), além da complexidade e do drama espa- ciais provenientes de fontes ocultas de luz cujos efeitos eram conseguidos por meio de um traba- lho dinâmico de formas côncavas e convexas. No campo espacial, a preferência é por espaços axiais e centralizados, representados, essencialmente, por elementos elípticos ou ovais. O barroco também se distingue pela combinação criativa entre pin- tura, escultura e arquitetura para criar ilusões e dissolver fronteiras físicas, almejando um resulta- do emocional que apelasse aos sentidos humanos (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). No Barroco, a dimensão utilitária foi subesti- mada, pois a primeira função dos palácios e igrejas era a essência estética — para reafirmar a glória divina, por meio do Papa, e a honra humana, por meio do soberano absoluto. Embora o progresso científico do período fosse significativo, ele não influenciou tal tendência, que estava mais inte- ressada na propaganda da supremacia católica, à medida que anunciava a “aparência” do poder (MALARD, 2006). 66 História da Arquitetura Abrangência do século XVIII na expressão artística No século XVIII, os avanços arquitetônicos foram complexos e incluíram elementos e temas divergentes, alguns caracterizando novas descobertas, e outros, revivendo o passado (FAZIO; MOF- FETT; WODEHOUSE, 2011). Durante o Barroco tardio, o poder monárquico de Luís XV e Luís XVI esteve bem enfraquecido e, em igual medida, o glamour do Barroco dissipou-se tanto na França como nas cortes e igrejas de principados europeus, na esmerada graça do Rococó (KOCH, 2008). O Rococó é uma manifestação artística, correspondente ao florescimento tardio do Barroco, que se originou na França, por volta de 1720 (CHING, 2010). Essencialmente, expressa-se por uma peculiar ornamentação que associa delicadeza e elegância, normalmente, sendo assimétrica e abstrata (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Também apresenta exuberantes formas curvilíneas e de- senhos bem elaborados, com motivos de conchas e folhagem (de onde decorre a sua denominação), que objetivam um efeito global delicado (CHING, 2010). O movimento racionalista reacionário ao Barroco foi o Iluminis- mo, que proporcionou grandes avanços em várias áreas de atuação (KOCH, 2008). Nele, cientistas e matemáticos produziram as bases para as conquistas modernas em seus segmentos, e filósofos apre- sentaram formas racionais de governo (postas em prática após as Revoluções Norte-Americana e Francesa). Os historiadores fizeram a primeira cronologia escrita de eventos mundiais, o que ajudou na compreensão das conquistas arquitetônicas de diversas civili- zações ocidentais, sobretudo, da Grécia e Roma antigas(FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). A atitude intelectual e um tanto objetiva do Iluminismo encontrou correspondência — em nível artístico — no Neoclassicismo (KOCH, 2008). Esse estilo é uma espécie de Classicismo (principalmente de caráter arquitetônico) que atuou na Europa, na América e suas várias colônias europeias, no final do século XVIII (CHING, 2010). O Neoclássico simboliza uma reação e uma relativa simplicidade aos excessos formais e decorativos do Barroco e Rococó e corres- ponde a um revivescimento de formas e composições arquitetônicas da Antiguidade (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). Esse retorno ao Clás- sico foi encarado como uma forma de estudo que utilizou método científico na investigação, propiciando às regras aproximadas da 67UNIDADE II tradição uma transformação em referências precisas (BENEVOLO, 2011). Assim, houve um estudo cauteloso dos princípios de propor- ção e releitura das ordens clássicas (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). Na França, o Neoclassicismo caracterizou-se, sobretudo, pela utilização de formas geométricas primárias (como o cubo, a esfera e a pirâmide). Os arquitetos iluministas interessaram por essas figuras, julgando-as adequadas à expressão arquitetônica, a tal ponto de proporem edificações inteiras na predominância geométrica desses volumes regulares (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Os historiadores, frequentemente, classificam a história da civiliza- ção ocidental em três períodos definidos: Antiguidade, Idade Média e Idade Moderna. Nesta acepção, o Renascimento representa o início da Era Moderna. Ainda que essa demarcação seja válida em termos abrangentes, foi o Iluminismo — com sua ênfase no empirismo científico, a crescente secularização, o início do pen- samento democrático e as inovações que a Revolução Industrial proporcionou — que contribuiu, efetivamente, para a aurora do Modernismo. Fonte: adaptado de Fazio, Moffett e Wodehouse (2011). O Neopalladianismo foi uma vertente do estilo Neoclássico, sur- gido na Inglaterra, no início do século XVIII. Pelo seu período de atuação, antecipou o Iluminismo e o próprio Neoclassicismo. O movimento não buscou inspiração direta na Grécia ou Roma an- tiga, mas baseou-se na interpretação artística do arquiteto renas- centista Andrea Palladio. Fonte: adaptado de Fazio, Moffett e Wodehouse (2011). 68 História da Arquitetura Revolução Industrial: qualificação e avanços na construção civil Várias áreas do conhecimento foram beneficia- das pelas inovações desenvolvidas na Revolução Industrial, na França, em 1789. Entre os avanços no campo da construção, destacam-se os novos métodos para a manufatura dos materiais cons- trutivos, além dos progressos científicos que am- pliaram a compreensão das premissas e necessida- des do projeto estrutural. Isso possibilitou prever o comportamento dos elementos estruturais sob carregamento, previsão que antes era realizada de forma empírica, com base em situações passadas que foram bem sucedidas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). A geometria descritiva foi outra invenção significativa, propiciada por Gaspard Monge, que generalizou os métodos inseridos pelos tratadistas do Renascimento, dando uma for- ma mais precisa à abrangência dos sistemas de representação. Desta forma, os projetistas pos- suíam um procedimento universal e unívoco para representar um objeto tridimensional sobre a superfície do papel (BENEVOLO, 2011). Isso libertou ainda mais o arquiteto da necessidade de visitas regulares ao canteiro de obras. A triste consequência foi a distância cada vez mais acen- tuada entre a concepção arquitetônica e a prática construtiva. Desde a Idade Média, o arquiteto (que antes era apto a projetar todas as coisas) estava sendo liberado, gradualmente, de certas responsabilidades projetivas. Em um primeiro momento, algumas de suas atribuições foram transferidas à engenharia mecânica e militar. Depois, a engenharia civil foi beneficiada pelo crescente conhecimento científico a respeito dos materiais construtivos, o qual era transmitido em escolas fora das academias de arquitetura. Cada vez mais, os engenheiros civis ficavam en- carregados das obras utilitárias, como pontes, estradas, faróis, canais e galpões. Aos arquitetos, eram reservados os trabalhos em que a dimen- são estética e o caráter simbólico da obra eram mais importantes que o pragmatismo (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Em termos acadêmicos, a França despontava, sendo o primeiro país europeu a criar escolas de arquitetura, que possibilitavam ensino or- ganizado e fundamentado em uma codificação teórica da atividade arquitetônica. Blondel foi um dos mais influentes teóricos-professores que atuou na França (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). Com o passar do tempo, o sistema francês evoluiu e se transformou na École dês Beaux- Arts, uma respeitada escola de arquitetura. Sob suas responsabilidades, os alunos eram orienta- dos por um imponente quadro de professores e seguiam trabalhando em ateliês de projeto, nos quais desenvolviam um projeto construtivo ao longo de meses. Basicamente, o foco didático não era defender um estilo arquitetônico específico, mas ressaltar a adequação do processo conceptivo (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Os métodos utilizados na École, entretanto, passaram a conflitar com as inovações tecnológi- cas trazidas pela Revolução Industrial e a urgente necessidade de novos tipos de edificações que o momento instigava (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). 69UNIDADE II O ecletismo é uma tendência da arquitetura e das artes decorativas que visa mesclar diversos estilos históricos, almejando combinar as virtudes de diferentes fontes inspiradoras, épocas ou regiões (CHING, 2010). O ecletismo arquitetônico surgiu na Europa, no final do século XVIII, e predo- minou até o início do século XX (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Para ser eclética, uma edificação deve em- pregar, simultaneamente, elementos construti- vos oriundos de dois ou mais estilos históricos, visando, principalmente, obter efeitos artísticos (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). A eleição de de- terminado estilo deve considerar vários parâme- tros — como peculiaridades do terreno, cultura ou tradições locais — julgando qual movimen- to arquitetônico é mais apropriado à situação (CHING, 2010). No geral, o ecletismo expressa-se por meio de modelos classicistas, historicistas, de con- cepções baseadas em tendências de renovação artística ou de características regionais (AL- BERNAZ; LIMA, 1998a). Arquitetura Eclética 70 História da Arquitetura Arquitetura Romântica Enquanto os arquitetos neoclássicos e os estudiosos da Antiguidade reavaliavam, intelectualmente, o passado (por meio da arqueologia e erudição), uma orientação paralela e, um tanto sobreposta, começou a despontar no campo artístico. Sua origem remete ao movimento paisagista inglês que seguiu os neopalladianos, durante a primeira metade do século XVIII. Ele foi melhor elaborado e se voltou à es- fera do imaginário e da emoção, transformando-se no Romantismo (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Com surgimento na Inglaterra, Alemanha e Suíça, no final do século XVIII, o Romantismo representou uma reação à regula- ridade expressa no Neoclassicismo (KOCH, 2008). Nesta época, muitos consideravam o estilo Neoclássico extremamente austero, previsível e desprovido de emoção, afirmando que a Revolução Industrial só havia contribuído para reforçar esse caráter de bru- talidade. Neste cenário, o Romantismo floresceu no campo das artes como uma forma de alívio visual e emocional (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Imprimia à pintura, música e poesia novas possibilidades estilísticas, partindo de uma concepção que envolvia a natureza e a história. No segmento da arquitetura, não originou um estilo propriamente novo, mas, ao contrário, ressaltou as formas arquitetônicas de correntes anteriores. Em uma gama de manipula- ção, extraía elementos de certas construções e os reposicionava em novos edifícios, oracomo um estilo “puro”, ora como uma mescla eclética de estilos (KOCH, 2008). Além disso, os românticos adora- vam a assimetria e a irregularidade formal, fruto de suas convicções pitorescas (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Embora pareça contraditório em relação à ideologia neoclássica, Fazio, Moffett e Wodehouse (2011) ressaltam que o Romantismo pode ser considerado um movimento complementar ao Neoclas- sicismo, inclusive, pelo fato de vários neoclássicos convictos terem desenvolvido obras de essência efetivamente romântica. 71UNIDADE II Historicismo A arquitetura desenvolvida no século XIX, possivelmente, foi a mais diversificada até então. A ideologia libertadora do Neoclas- sicismo, aliada ao Movimento Romântico, despertou a possibi- lidade de uso de vários estilos históricos (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Nesta abrangência, o Historicismo surgiu como o revivescimento de manifestações históricas da arquitetura na Europa, sobretudo, no século XIX. Originou-se da análise de estilos precedentes que proporcionavam múltiplas possibilidades projetivas, por meio do estudo de suas regras e da relativa imitação de seus elementos or- namentais. Vários estilos — como o gótico, românico, renascentista, egípcio entre outros — foram reinterpretados e serviram como base conceptiva, geralmente, sendo escolhidos de acordo com a tipologia da edificação (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Muitas vezes, os estilos arquitetônicos eram eleitos em função de associações relacionadas ao tema do projeto. A arquitetura egípcia, por exemplo, relacionava-se às edificações destinadas à medicina — por se acreditar que ela surgiu no Vale do Rio Nilo — e à morte, re- metendo ao estilo arquitetônico que fez da esperança na vida eterna seu ideal construtivo (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Os avanços dos materiais e das técnicas construtivas também representaram um estímulo para que arquitetos e engenheiros de- frontassem problemas construtivos de modo inovador, cooperando ainda mais para a diversidade arquitetônica apresentada no período. Se analisarmos, por exemplo, as obras do Reino Unido e dos Estados Unidos, ditas “vitorianas”, acharemos pouca semelhança entre elas, a não ser o fato de terem sido edificadas durante o longo reinado da Ra- inha Vitória (1837-1901) (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Entre os estilos de caráter historicista e os avanços construtivos, surgiram novas tendência de projeto que influenciaram significa- tivamente a arquitetura do século XX (FAZIO; MOFFETT; WO- DEHOUSE, 2011). 72 História da Arquitetura Arquitetura Neogótica O Neogótico é um movimento artístico que flo- resceu, principalmente, no século XIX, em países, como a França, Alemanha, Inglaterra e, em menor abrangência, nos Estados Unidos. Ele visa revi- ver o espírito e as formas da arquitetura Gótica (CHING, 2010), e seu êxito coincidiu com um período marcado por reformas sociais e urbanís- ticas (BENEVOLO, 2011). Basicamente, o revivescimento gótico contra- pôs-se ao movimento neoclássico, não o substi- tuindo, mas coexistindo ao seu lado, ambos como hipóteses parciais (BENEVOLO, 2011). Reflexo dos Progressos Tecnológicos em meados e fim do século XIX Enquanto o mundo — impulsionado pelos avan- ços promovidos por vários eventos (Revolução Industrial, Iluminismo etc.) — se transformava técnica, social e politicamente, a arquitetura ain- da via-se enraizada às formas e procedimentos antigos (COLIN, 2000). A rejeição pelas formas arquitetônicas que vi- goravam no século XIX foi crucial para a busca de novas possibilidades que pudessem ser expres- sivas e caracterizassem um novo estilo artístico (TIETZ, 1998). Movimento “Arts-and-Crafts” O movimento Arts-and-Crafts surgiu na Ingla- terra, em meados do século XIX, em uma época assinalada pela crescente industrialização, cren- ça ilimitada no progresso e expansão urbana (TIETZ, 1998). Influenciado, sobretudo, por William Morris, o movimento defendia uma retomada às tradi- ções das artes e dos ofícios de caráter medie- val. Desejava modelar o ambiente que servia às pessoas cotidianamente com produtos de qualidade, proveniente de manufatura artesa- nal, para que a produção em massa não fosse predominantes e destruísse a estética dos pro- dutos (TIETZ, 1998). Art-Nouveau Já que a história clássica não oferecia um estilo artístico que fosse apropriado à expressão da nova era, a inspiração de um novo movimento foi bus- car referências na natureza. Para um repertório arquitetônico, as formas vegetais foram transpos- tas para os materiais construtivos que estavam sendo desenvolvidos, formando uma linguagem delicadamente estilizada. Foi Victor Horta que propriamente iniciou o novo estilo denominado Art-Nouveau, em Bruxelas (1893), com a obra hoje conhecida como Hotel Tassel. Ele foi um grande expoente do movimento (TIETZ, 2008). O Art-Nouveau representou a primeira reação internacional contra o historicismo então vigente, no entanto, não teve muitas obras inteiramente edificadas em seus princípios. Suas principais ca- racterísticas incluem: emprego de linhas suaves e ondulantes; predomínio de hastes de plantas na de- coração, em vez de flores; continuidade dos espaços internos (ALBERNAZ; LIMA, 1998a) e acentuada ornamentação no edifício — da volumetria externa ao projeto de interiores (KOCH, 1998). Esse estilo também possui denominações dis- tintas em vários países em que se instalou: Stile Liberty (Itália); Sezession (Austrália); Jugendstil (Alemanha) e Modernismo (Espanha – Catalão) (CHING, 2010). 73UNIDADE II Em Barcelona, Gaudí foi o representante prin- cipal da vertente espanhola. Sem grande preocu- pação à dimensão utilitária, ele desenvolveu sua arquitetura como uma expressão formal suntuosa, de concepção particular, com inclusão de elemen- tos góticos e mouriscos. Suas principais obras são a Casa Batló, Casa Milá e a Catedral da Sagrada Família (1882) (TIETZ, 1998). Exposições Universais Na arquitetura que era erigida por materiais con- vencionais há milhares de anos (como a madeira, o tijolo e a pedra), foram acrescentados, ao longo do século XIX, outros materiais construtivos de recente desenvolvimento, como o ferro, o aço e o vidro. No entanto, questões culturais enraizadas na sociedade da época, possivelmente, fizeram que tais materiais não fossem empregados de forma tão visível no cotidiano das edificações (TIETZ, 1998). Em alternativa, os progressos que a engenharia atingiu na segunda metade do século XIX, pude- ram ser acompanhados por meio das Exposições Universais, a partir de 1851. Tais exposições es- tabeleciam uma relação direta entre produtores, comerciantes e consumidores, sendo uma im- portante ferramenta de visibilidade dos produ- tos industriais, depois que as corporações foram extintas (BENEVOLO, 2011). Destas mostras, podemos destacar duas realizações que ficaram bem conhecidas: o Palácio de Cristal e a Torre Eiffel (BENEVOLO, 2011). O Palácio de Cristal foi erigido em Londres, por Joseph Paxton, no âmbito da primeira exposi- ção mundial. Ele serviu como semente inovadora frente aos estilos dominantes, sendo constituído apenas por uma estrutura em ferro e revestimen- to de placas de vidro (TIETZ, 1998). O sucesso da construção, bem como os elogios recebidos, contribuíram para que a sociedade começasse a aceitar melhor as edificações que estavam sendo erigidas com os novos materiais (FAZIO; MOF- FETT; WODEHOUSE, 2011). Por sua vez, a Torre Eiffel, construída por Gus- tave Eiffel e Maurice Koechlin para a Exposição Internacional de Paris, em 1889, atingiu o apogeu da arquitetura do ferro, tendo se tornado um mar- co arquitetônico da cidade de Paris, embora, no início, tenha sofrido duras críticas (TIETZ, 1998). Caracterização Eclética do início do século XX Embora o repertório de soluções ecléticas se mos- trasse inadequado para os primórdios do século XX (BENEVOLO, 2011), as cidades ainda eram constituídas por uma grande mescla de estilos, na qualas edificações associavam formas de várias procedências em uma desordenada roupagem arquitetônica (TIETZ, 1998). As novas tendên- cias eram expostas em intervalos de tempo cada vez menores e se desgastavam, igualmente, com a mesma velocidade (BENEVOLO, 2011). Por volta de 1910, uma das vertentes arquitetô- nicas mais influentes ainda era o neoclassicismo monumental, com suas formas rigorosas e seu efeito grandioso, constituindo um contraponto às movimentadas formas idealizadas pelo Art-Nou- veau (TIETZ, 1998). Percebeu-se, assim, que o início do século XX precisava de um estilo arquitetônico que realmen- te correspondesse à era que abrangia, caracteri- zando uma tendência que pudesse indicar um caminho a ser seguido por um período maior de tempo. Foi nesse cenário que os primórdios do movimento moderno começaram a se instaurar (TIETZ, 1998). 74 História da Arquitetura O reencontro do objeto arquitetônico com o ho- mem da nova era ocorreu no Movimento Moder- no, no qual se gerou uma nova postura, visando reunificar em um discurso totalizador a arte, a funcionalidade e a técnica, ou seja, o fruir, o usu- fruir e o construir, criando a influente narrativa da arquitetura no século XX (MALARD, 2006). Efetivamente, a definição de vigência do Movi- mento Moderno é suscetível de questionamento, em função de como cada indivíduo fixa o período em que aconteceram determinadas ocorrências, considerando-as como ainda ativas no contexto em que se trabalha. Fonte: adaptado de Gregotti (2010). Assim como qualquer transformação histórica re- levante, o Modernismo também é construído por várias contribuições individuais e coletivas, sendo difícil atribuir-lhe um único local de origem ou ambiente cultural (BENEVOLO, 2011). No entan- to, podemos perceber que sua atuação representa Arquitetura Moderna 75UNIDADE II uma deliberada ruptura filosófica e prática com o passado — tanto no campo das artes e arquitetura como no segmento da literatura (CHING, 2010). Deste modo, o Movimento Moderno possui expressão em qualquer movimento surgido ao longo do século XX, que, por meio de seus prin- cípios, caracteriza um estilo de caráter inovador (CHING, 2010). Hilberseimer (1927 apud BENEVOLO, 2011, p. 466) possui uma caracterização muito abran- gente da arquitetura modernista: “Os pressupostos e os fundamentos da nova arquitetura são de natureza diversa. As exi-gências utilitárias definem o caráter fun-cional do edifício. Os materiais e a estática são os meios de sua construção. Por meio da técnica de construção, os caracteres de distribuição, os fatos científicos e socioló- gicos exercem uma influência considerável. Acima de tudo, entretanto, domina a vonta- de criadora do arquiteto. Ele define o peso recíproco dos elementos singulares e realiza, através de sua justaposição, a unidade for- mal do edifício. O procedimento pelo qual a forma é realizada determina o caráter da nova arquitetura. Esta não se resolve em um decorativismo exterior, mas é expressão da compenetração vital de todos os elementos. O fator estético, assim, não é mais dominan- te, um fim em si mesmo, como a arquitetura das fachadas que ignora o organismo arqui- tetônico, mas é como os outros elementos, ordenados unitariamente dentro do todo e conserva, em relação a essa totalidade, seu valor e sua importância. A superestimação de um elemento sempre produz perturba- ções. Por isso a nova arquitetura pesquisa o equilíbrio de todos os elementos, a harmo- nia. Esta, contudo, não é uma coisa externa, esquemática; pelo contrário, é diversa para cada nova tarefa. Não comporta nenhum esquema estilístico predeterminado, mas é a expressão da compenetração mútua de todos os elementos, sob o domínio de uma vontade formadora. A nova arquitetura, por conseguinte, não coloca problemas estilísti- cos, mas problemas de construção. Assim, torna-se compreensível até mesmo a surpreendente concordância da aparência formal na nova arquitetura internacional. De fato, não se trata de uma aspiração for- mal que está em moda, como frequente- mente se diz, mas da expressão elementar de uma nova concepção arquitetônica. Ainda que frequentemente diferenciada de acordo com as particularidades locais e nacionais e com a personalidade dos projetistas, em seu conjunto é, todavia, o produto de pressupos- tos constantes; daí a unidade dos resultados formais. Essa concordância ideal ultrapassa todos os confins. Filosofias projetivas do Movimento Moderno A arquitetura de essência funcional está estreita- mente interligada à racional (BENEVOLO, 2011) e ambas caracterizam a base primordial do Mo- vimento Moderno, sendo largamente utilizadas por arquitetos de todo o mundo. Entre as principais características do Mo- dernismo encontra-se a insistente tentativa de eliminar as formas construtivas e decorações tradicionais e históricas das edificações. O em- prego de novos materiais de construção (como o concreto armado, aço e vidro) possibilitou que os edifícios tivessem uma expressão artística mais coerente com o espírito da época, em oposição às construções dominadas pelos ornamentos historicistas. Deste modo, o movimento seguiu 76 História da Arquitetura produzindo uma arquitetura com formas geomé- tricas, erigidas, basicamente, em concreto armado e delimitadas por coberturas planas (no lugar dos clássicos frontões). As fachadas não possuem ne- nhum ornamento e são constituídas por um jogo de volumes regulares de cor branca ou revestidas por grandes áreas envidraçadas (TIETZ, 1998). Alguns arquitetos, no entanto, seguiram outra vertente do Modernismo e caracterizam suas con- cepções pela arquitetura orgânica, que, segundo Montaner (2002), busca, essencialmente, imitar a capacidade de adaptação e desenvolvimento das formas encontradas na natureza. Independentemente da vertente seguida, o Movimento Moderno — na ânsia de conduzir a arquitetura para o campo que lhe é próprio — ba- niu a ornamentação clássica dos edifícios, acon- selhando os arquitetos de que os valores arquite- tônicos legítimos são os de caráter volumétrico e espacial. Deste modo, a arquitetura racionalista voltou-se para os valores volumétricos, enquanto o movimento orgânico apegou-se nos espaciais (ZEVI, 1996). Funcionalismo O funcionalismo representa uma influente ten- dência para arquitetos e projetistas modernos, que foi derivado de movimentos europeus an- teriores, tendo início nos primórdios do século XX. Ele reúne concepções projetivas de edifícios, mobiliário ou elementos similares que atendam diretamente às necessidades funcionais do ho- mem, com emprego de materiais construtivos e utilizações, claramente expressos na forma arqui- tetônica (CHING, 2010). A ideologia do funcionalismo transcorre da tese do importante arquiteto modernista Louis Sullivan de que a “forma segue a função,” e esse lema perdurou até o princípio da arquitetura con- temporânea (TIETZ, 1998). Sua dimensão estética procede, essencial- mente, das proporções e do acabamento das superfícies, em detrimento ou por meio da su- bordinação dos efeitos estritamente decorativos (CHING, 2010). Racionalismo O racionalismo corresponde a uma prática pro- jetiva que conduz a uma arquitetura expres- siva de sua funcionalidade, sendo dominada pelo uso de formas geométricas e regularidade no conjunto de seus elementos (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). Geralmente, manifesta-se pelo uso de sistemas matemáticos, de acordo com eixos cartesianos ou malhas ortogonais (CO- LIN, 2000). Foi introduzido, no início do século XX, na Europa, opondo-se à ideologia do historicismo. Entre seus nomes influentes, encontram-se La- brouste, Durand, Choisy e Viollet-le-Duc (COLIN, 2000), além de Walter Gropius e Le Corbusier, dois de seus principais propagadores (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). 77UNIDADE II Arquitetura Orgânica O organicismo é uma tendência arquitetônica do movimento mo- derno que tomou forma na Europa e Estados Unidos, no início do século XX. Elese contrapõe à arquitetura baseada na razão abstrata e na geometria (ALBERNAZ; LIMA, 1998b) e, por isso, se apresenta como um método subjetivo de composição arquitetônica (CO- LIN, 2000) que se inspira, metaforicamente, nas formas da natureza para propor projetos que sejam adaptados ao entorno circundante (MONTANER, 2009). Segundo essa prática, a forma do edifício, geralmente, apresenta formato irregular e não é considerada um pressuposto, mas surge como consequência do ajuste dos elementos espaciais e volumé- tricos, que se harmonizam na inserção ao terreno (COLIN, 2000). A filosofia projetiva considera orgânicas as obras produzidas por arquitetos, como Antoni Gaudí, Josep Maria Jujol e Frank Lloyd Wright — seu maior propagador (MONTANER, 2009). Figura 5 – Frederick C. Robie House, USA (1908-09), F. L. Wright Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)1. 78 História da Arquitetura Frank Lloyd Wright Frank Lloyd Wright (1869-1959) foi, simulta- neamente, um precursor, protagonista, seguidor e executor da evolução da arquitetura modernista do século XX, trilhando, essencialmente pelo con- ceito da arquitetura orgânica, do qual foi o grande expoente (TIETZ, 1998). Por meio de suas obras e escritos, Wright es- tabeleceu grande sintonia entre o universo da “máquina” e o da natureza. Sua obra expressou-se como uma crítica à obsolescência da arquitetura e da cidade convencionais que ainda se faziam presentes na sociedade da época. A arquitetura foi formulada com formas, essencialmente, horizon- tais e serenas, que se harmonizavam ao perfil do terreno, a exemplo da série de casas de pradaria (Figura 5) (MONTANER, 2002). Wright marcou a arquitetura americana e eu- ropeia, influenciando inúmeros arquitetos jovens durante a sua longa atuação. Ele concebeu mais de quatrocentos projetos e obras, muitos dos quais alçaram à categoria de ícones mundiais, como a Casa da Cascata, na Pensilvânia (1936-1939), o edifício fabril da Johnson Wax Company, em Wisconsin (1936-1939) e o Museu Guggenheim, em Nova Iorque, finalizado em 1959, após sua morte (TIETZ, 1998). Tipologia das edificações no início do século XX O século XX abrangeu várias tipologias arquite- tônicas, já que a sociedade encontrava-se em um período de expansão em diversos segmentos — do caráter intelectual ao industrial. Dentre tais edificações, ilustraremos três tipos que se desta- caram neste período: o primeiro relaciona-se à simbologia do poder, transmitida pelas empresas capitalistas — os arranha-céus americanos —; o segundo caracteriza uma resposta a um problema de utilidade pública — a demanda por habitação —; e o último, um tributo aos mortos da 1ª Guerra Mundial (TIETZ, 1998). Os primeiros arranha-céus americanos No final do século XIX, toda uma variedade de inovações técnicas — incluindo elementos estru- turais produzidos em série, técnicas de proteção contra incêndio e sistema de travamento lateral contra o vento — criaram as condições apropria- das para que uma nova tipologia arquitetônica fosse produzida nos Estados Unidos — a cons- trução de edifícios de vários pavimentos, denomi- nados arranha-céus. Tais edifícios representaram uma resposta aos preços dos terrenos que estavam em ascensão na América e ao propósito das em- presas de permanecerem nas proximidades dos centros comerciais que já estavam estabelecidos (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011). Como a sociedade americana é orientada para o consumo capitalista, os arranha-céus não constituíam apenas um sinal de progresso técnico e social, mas serviram, com o passar do tempo, como importantes símbolos de status e suporte publicitário para as empresas (TIETZ, 1998). Além de Nova Iorque, Chicago também foi um grande centro onde esta nova tipologia de- senvolveu-se. Em virtude do grande incêndio que arrasou boa parte da cidade, em 1871, Chicago precisou ser reconstruída, aproveitando as cir- cunstâncias para ressurgir de forma nova e mo- derna, na qual os arranha-céus compuseram-se como relevantes elementos da paisagem urbana. Louis Sullivan tornou-se o protagonista da cul- tura dos arranha-céus, bem como da Escola de Chicago (TIETZ, 1998). 79UNIDADE II Embora Sullivan tenha formulado um dos mo- tivos imprescindíveis da arquitetura moderna — a estruturação quadriculada das fachadas dos arranha-céus — muitos arquitetos americanos continuaram a revestir seus edifícios em altura (tão inovadores em relação à técnica construti- va) com fachadas historicistas, misturando os ele- mentos do Art-Nouveau, com outros neoclássicos, neorromânicos e, sobretudo, com uma linguagem formal neogótica. Isso porque grande parte dos influentes arquitetos americanos não se interes- sava plenamente pelos debates reformistas da arquitetura que aconteciam na Europa — por os considerarem de cunho intelectual. Assim, entre 1900 e 1925, a arquitetura americana foi desenvol- vida, salvo raras exceções, conforme sua própria essência. Deste modo, em vez de referenciarem-se no Movimento Moderno europeu, os arranha- -céus americanos eram caracterizados por uma arquitetura eclética, que perdurou por vários anos. Nesse período, a arquitetura dos arranha-céus foi dominada por Raymond Hood, que só no final dos anos 20 despediu-se da linguagem formal neogótica para incorporar o estilo arquitetôni- co europeu. Nessa altura, dois jovens arquitetos imigrantes austríacos — Rudolph Schindler e Richard Neutra — foram responsáveis pelo len- to estabelecimento do Modernismo na América do Norte. Schindler não preferiu a tipologia dos arranha-céus e, influenciado pelas casas de cam- po de Frank Lloyd Wright, teve uma arquitetura assinalada por experiências de novos materiais e novas formas. Em suma, ambos os arquitetos con- seguiram abrir a arquitetura americana à evolução europeia modernista (TIETZ, 1998). Arquitetura habitacional A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) findou no século XIX, que surgiu sob influência dos avanços promovidos pela Revolução Industrial. Essa guerra foi um acontecimento que assinalou toda uma época, promovendo uma insegurança política e econômica em vários países europeus (TIETZ, 1998). Esse cenário agravou a problemática da crise habitacional, do desemprego, da fome e da ineren- te miséria social que atingia os países europeus e que, principalmente neste momento, precisava de solução emergencial (TIETZ, 1998). A deficiência de moradia foi decorrente de vários aspectos. Inicialmente, o século XIX pre- senciou um êxodo rural que resultou na crescente concentração de habitantes nas cidades europeias, fazendo-se necessária uma reflexão mais profun- da sobre várias questões urbanas, sobretudo, com relação ao setor social e de higiene (TIETZ, 1998). A Escola de Chicago representou um conceito coletivo que reuniu arquitetos americanos (como W. Le Baron Jenney e L. Sullivan), no final do século XIX, para a reconstrução de Chicago. Sua fama é resultado da inovação na construção dos arranha-céus paradigmáticos e no desenvolvimento do traço moderno na arquitetura comercial. Fonte: adaptado de Tietz (1998) e Ching (2010). 80 História da Arquitetura Em um segundo momento, a guerra provocou da- nos às edificações existentes e também paralisou boa parte das atividades construtivas durante os conflitos. Aliado a esse problema, abriu-se cami- nho para o aumento no custo das construções, já que a demanda por habitação estava crescendo (BENEVOLO, 2011). A pressão produzida por estas condições so- licitou a intervenção do Estado, a fim de garantir moradia às categorias menos favorecidas. A con- tribuição do Estado apresentou-se por meio de duas possibilidades: em primeiro lugar, por meio de créditos e facilidades às associações particu- lares — procedimento adotado, principalmente, na Inglaterra —, ou por meio de construção de alojamentos por iniciativa direta das entidades públicas (BENEVOLO, 2011). Considerando a última abordagem, surgiu uma nova dinâmica na atuação dos arquitetos: a prática projetivamigrou dos projetos particulares para as encomendas do Estado e das entidades públicas, fortalecendo a construção de bairros residenciais, principalmente de baixa renda (BE- NEVOLO, 2011). Os inovadores métodos cons- trutivos também foram fundamentais na solução habitacional, já que proporcionavam mais agili- dade às obras (TIETZ, 1998). Nas primeiras décadas do século XX, surgi- ram vários programas artísticos e políticos, o que representou uma fase de importante orientação para os movimentos da arquitetura moderna. A exaltação do pós-guerra marcou a possibilida- de de uma arquitetura nova e mais comprome- tida, associando-se ao caráter social das nações (TIETZ, 1998). Neste cenário, a importância do urbanismo cresceu rapidamente (BENEVOLO, 2011). As utopias desenvolvidas no início do século XX al- mejavam abandonar a cidade antiga e amenizar a contradição entre cidade industrial e campo (TIETZ, 1998). Com o intuito de trazer as qualidades da natu- reza para a cidade moderna, o britânico Ebenezer Howard desenvolveu a ideia de uma cidade-jar- dim, em 1898. Sua proposta partia da criação de cidades menores, novas e modernas que fossem independentes e afastadas da metrópole, cujos habitantes fossem autossuficientes por meio da agricultura e da criação de gado. Tais cidades se- riam dispostas em coroa, ao redor de um parque central (TIETZ, 1998). Por certo, a visão de Howard não teve reali- zação adequada e plena, mas viu seus princípios serem incorporados à Letchworth, a primeira ci- dade-jardim, projetada por Barry Parker e Ray- mond Unwin, em 1903. Em virtude do ideal de comunidade agrícola, as cidades-jardins fracas- saram como sistema de cidade independente — sobretudo, por recusarem o sistema econômico vigente —, mas foram aproveitadas como modelo de habitação (TIETZ, 1998). As ideias antiurbanas de Frank Lloyd Wright, denominadas “Usonias,” tiveram mais sucesso, pois almejavam associar homem e paisagem em uma unidade vital orgânica. Foram traduzidas nos planos da Broadacre City (1935), onde a casa, ao mesmo tempo em que servia de moradia, era o local de trabalho. A intenção era que cada família desen- volvesse sua prática agrícola e vendesse as merca- dorias produzidas em casa. Esta nova tipologia de edificação originou os atuais centros comerciais. Contudo, o princípio individualista demonstrou, na prática, ser inconciliável com as intenções de pla- nejamento centralizado e, hoje, percebemos que o ideal de Wright materializou-se apenas sob a forma de subúrbios americanos (TIETZ, 1998). 81UNIDADE II Arquitetura das memórias Além das tipologias de arranha-céus e tantas ou- tras de caráter utilitário à sociedade moderna, os anos pós-guerra caracterizaram uma época assi- nalada pelos seus reflexos. Para os países partici- pantes do conflito, o enaltecimento da memória dos mortos tornou-se, também, uma necessidade de Estado. Por isso, após o final da guerra, a maio- ria dos povoados da Europa Ocidental presenciou o surgimento de numerosos monumentos que referenciavam os combatidos na guerra, os quais se misturavam à linguagem arquitetônica vigente (TIETZ, 1998). Embora fossem destinados ao culto dos mor- tos, os monumentos simbolizavam a glorificação da morte no campo de batalha e, portanto, pro- porcionavam a mitificação nacionalista do Estado (TIETZ, 1998). Eclosão de movimentos no início do Modernismo Nos primórdios do Modernismo, alguns movi- mentos artísticos surgiram caracterizando sua ideologia e fazendo com que sua atuação fosse crescendo em influência mundial, ao longo do tempo (TIETZ, 1998). Deutscher Werkbund Enquanto o movimento Arts-and-Crafts buscava uma renovação da arte, por meio de um retorno às tradições medievais, as forças reformadoras ale- mãs (antes da 1ª Guerra) desejavam outros objeti- vos: conseguir produtos de qualidade na esfera das artes aplicadas e um novo estilo para a arquitetura, servindo-se da industrialização e da mecanização. Esses esforços foram conciliados, em 1907, por industriais, artistas e artífices na criação de uma agremiação denominada Deutscher Werkbund cujo objetivo era melhorar a concepção de pro- dutos de utilidade cotidiana e reformar as artes e ofícios alemães (TIETZ, 1998). Essa corporação foi influente no amadure- cimento de uma geração de arquitetos alemães, como Walter Gropius, Mies van der Rohe e Bruno Taut (BENEVOLO, 2011). Ao longo de sua existência, o Deutscher Wer- kbund promoveu exposições e orientou empreen- dimentos marcantes, como a construção do bair- ro em Stuttgart — o Weissenhof Siedlung —, em 1927. Por questões políticas, o grupo dissolveu-se em 1934 (COLIN, 2000). De Stijl De Stijl é um movimento artístico que abrange pintura, escultura, arquitetura, mobiliário e ar- tes decorativas, com início na Holanda, em 1917 (CHING, 2010), que resultou em uma revista com publicação até 1931 (COLIN, 2000). O propósito do movimento era criar um estilo coerente e válido à “nova consciência da época”, substituindo o aspecto individual pelo universal (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). Suas principais características envolvem a utilização de cores — uso de branco e preto com as cores primárias — e o emprego de formas retangulares e assimétricas (CHING, 2010), isentas de ornamentação carac- terística da arquitetura tradicional (TIETZ, 1998). Na pintura, o expoente máximo foi Piet Mon- drian cuja ideologia baseava-se na rejeição às re- ferências representativas, como o cubismo (GOS- SEL; LEUTHAUSER, 1996). Na arquitetura, uma das raras obras que re- presentam o estilo é a Casa Schröder, edificada em Utrecht, por Gerrit Rietveld (1925) (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). 82 História da Arquitetura Construtivismo O construtivismo caracteriza uma atitude proje- tiva que privilegia as técnicas e o adequado rela- cionamento dos elementos construtivos sobre as considerações estéticas (COLIN, 2000). Na União Soviética, esse movimento teve du- ração entre 1917 e, aproximadamente, 1930, com inspiração em práticas futuristas. Sua ideologia ar- quitetônica abrange certa ousadia estrutural (com utilização de grandes balanços e vãos); emprego de estruturas tensionadas e exposição de itens simbó- licos da vida moderna, como elevadores, antenas de rádio e refletores; além da exteriorização dos sistemas técnicos do edifício (COLIN, 2000). Expressionismo O expressionismo refere-se a uma corrente ar- tística que se difundiu, principalmente, na Euro- pa Ocidental e Central, no início do século XX, com domínio na pintura e na arquitetura (TIETZ, 1998). De natureza romântica, essa tendência ca- racteriza-se por formas fortemente movimen- tadas, emprego de figuras orgânicas, esponta- neidade no desenho e valorização da expressão individual. O objetivo era transcender a atitude simplista e pragmática do funcionalismo pelas proporções surpreendentes e efeitos irreais, sendo um de seus maiores arquitetos Erich Mendelsohn (COLIN, 2000). Encerramos, aqui, a primeira parte da história da Arquitetura, englobando o período da Arqui- tetura Egípcia até os primórdios do Movimento Moderno. A próxima unidade trará abordagens referentes à efetivação da Arquitetura Moderna (propiciada, sobretudo, pela adoção do Estilo In- ternacional, em nível mundial) e a Arquitetura Pós-Modernista, além das possíveis tendências futuras que a produção arquitetônica assumirá. 83 1. A Arquitetura Gótica envolveu a concretização do desejo espiritual da Idade Mé- dia e representou a melhor concepção que o homem do período evidenciou a respeito de Deus, do mundo e de si próprio, expressando-se em estilo de cunho religioso. Sobre isso, é correto afirmar que: ) ( Ela foi capaz de conciliar o eixo longitudinal do Paleocristão, a espiritualidade e o misticismo Bizantino com a verticalidade e a comunicação urbana revelados no estilo Românico. ) ( A catedral ressaltava um espírito de verticalidade que pretendia despertar no fiel um duplo sentimento de transcendência e proteção.) ( O Gótico elevava toda a sua igreja, por meio do seu padrão arquitetônico. ) ( A luz — sempre relacionada à origem divina das coisas — exerceu um efeito essencial na edificação, possibilitando que os desenhos da Sagrada Escritura (presentes nos vitrais) fossem claramente revelados. 84 2. O ecletismo arquitetônico surgiu na Europa, no final do século XVIII, e predo- minou até o início do século XX. O Teatro municipal do Rio de Janeiro é uma obra eclética. Com base na imagem e nos conceitos trabalhados nesta unidade, responda por quais motivos a obra a seguir pode ser considerada uma obra do estilo eclético. 85 3. As imagens a seguir representam obras de estilo Art-Nouveau. Como podemos observar, este estilo caracterizou-se por: I) Ter inspiração e referências nas formas da natureza. II) Ter as formas vegetais reproduzidas nos materiais construtivos. III) Ter acentuada ornamentação de partes estruturais e de vedação dos edifícios. IV) Ter linhas suaves e ondulantes em contraste com linhas retas e volumes cúbicos. Assinale a alternativa correta: a) Somente a alternativa I está correta. b) As afirmativa I e II estão incorretas. c) As afirmativas III e IV estão corretas. d) As afirmativas I, II, III, estão corretas. e) As afirmativas II, III e IV estão corretas. 86 História da arquitetura moderna Autor: Leonardo Benevolo Editora: Perspectiva Ano: 1998 Sinopse: este livro aborda as raízes e o desenvolvimento da Arquitetura Mo- derna, abordando suas experiências fundamentais, seu relacionamento com o público, os problemas urbanísticos e suas maiores expressões: Le Corbusier, Mies Van der Rohe, Wright e outros. LIVRO 87 ADDIS, B. Edificação: 3000 anos de projeto, engenharia e construção. Porto Alegre: Bookman, 2009. ALBERNAZ, M. P.; LIMA, C. M. Dicionário ilustrado de arquitetura. v. 1, verbetes da letra A até I. São Paulo: ProEditores, 1998a. ______. Dicionário ilustrado de arquitetura. v. 2, verbetes da letra J até Z. São Paulo: ProEditores, 1998b. BAKER, G. H. Le Corbusier: uma análise da forma. São Paulo: Martins Fontes, 1998. BENEVOLO, L. História da arquitetura moderna. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2011. BRANDÃO, C. A. L. A formação do homem moderno vista através da arquitetura. Belo Horizonte: UFMG, 2006. CHING, F. D. K. Arquitetura: forma, espaço e ordem. Trad. Alvamar Helena Lamparelli. São Paulo: Martins Fontes, 2002. ______. Dicionário Visual de Arquitetura. Trad. Julio Fischer. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010. COLIN, S. Uma introdução à arquitetura. 3. ed. Uape, 2000. DONDIS, D. A. Sintaxe da linguagem visual. Trad. Jefferson Luiz Camargo. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. FAZIO, M.; MOFFETT, M.; WODEHOUSE, L. A História da Arquitetura Mundial. Trad. Alexandre Salvaterra. 3. ed. Porto Alegre: AMGH, Bookman, 2011. GLANCEY, J. A história da arquitetura. Trad. Luis Carlos Borges. Marcos Marcionilo. São Paulo: Edições Loyola, 2001. GOSSEL, P.; LEUTHAUSER, G. Arquitectura no Século XX. São Paulo: Taschen, 1996. GRAEFF, E. A. Arte e técnica na formação do arquiteto. São Paulo: Studio Nobel, 1995. GREGOTTI, V. Território da Arquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva, 2010. GUIA conheça a história: Roma. 3. ed. São Paulo: 2016. Disponível em: <https://books.google.com.br/ books?id=lv5nDQAAQBAJ&pg=PA5&lpg=PA5&dq=Guia+conhe%C3%A7a+a+hist%C3%B3ria:+Ro- ma.+3+ed.+S%C3%A3o+Paulo:+On+Line,+2016.&source=bl&ots=7wAt4XqJxK&sig=HHYPCNC63kybF- noK3H7evQZML-0&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwjfivS82ofYAhUMEpAKHXAVDakQ6AEIPjAC#v=o- nepage&q&f=false>. Acesso em: 14 dez. 2017. KOCH, W. Dicionário dos estilos arquitetônicos. Trad. Neide Luzia de Rezende. São Paulo: Martins Fontes, 2008. 88 MALARD, M. L. As aparências em arquitetura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. MONTANER, J. M. As formas do século XX. Trad. Maria Luiza Tristão de Araújo. Barcelona: Editora Gustavo Gili, 2002. ______. Sistemas arquitetônicos contemporâneos. Barcelona: Editora Gustavo Gili, 2009. PEREIRA, J. R. A. Introdução à História da Arquitetura: das origens ao século XXI. Trad. Alexandre Salva- terra. São Paulo: Bookman, 2010. TIETZ, J. História da Arquitectura do século XX. Trad. Virgínia Blanc de Sousa. Alemanha: Könemann, 1998. ZEVI, B. Saber ver a arquitetura. Trad. Maria Isabel Gaspar e Gaetan Martins de Oliveira. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. REFERÊNCIA ON-LINE 1Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/7373081606/609de6a34d/>. Acesso em: 29 dez. 2017. 89 1. V, V, V, V. 2. O ecletismo é uma tendência da arquitetura e das artes decorativas que visa mesclar diversos estilos históricos, almejando combinar as virtudes de diferentes fontes inspiradoras, épocas ou regiões. Assim, para ser eclética, uma edificação deve empregar, simultaneamente, elementos construtivos oriundos de dois ou mais estilos históricos, visando, principalmente, obter efeitos artísticos. É o que acontece no Teatro Municipal, que apresenta o equilíbrio das linhas clássicas com a profusão da decoração no estilo Barroco. 3. D. 90 PLANO DE ESTUDOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM • Compreender como se deu o processo de consolidação do movimento moderno. • Compreender as linhas projetuais e formas de composi- ção decorrentes da arquitetura do pós-Guerra. • Compreender o processo de declínio do pensamento mo- derno e suas decorrências. • Compreender as primeiras linhas projetuais e formas de composição na arquitetura do período Pós-moderno. • Entender o processo de produção e evolução da arquite- tura atual e sua interferência na composição. Formação Efetiva do Modernismo Arquitetura Mundial Pós-Segunda Guerra Ascensão da Arquitetura Contemporânea Panorama Atual da Arquitetura Crise no Modernismo Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla Arquitetura Moderna e Contemporânea Formação Efetiva do Modernismo Apesar de um início não unânime, o modernismo se firmou ao longo dos anos como um movimento influente, a ponto de, em certo momento, ser pos- sível definir uma linha de trabalho comum entre arquitetos de várias nações (BENEVOLO, 2011). Algumas de suas contribuições são experiên- cias que se relacionam aos movimentos culturais que ocorreram tanto no período bélico como no anterior à guerra (BENEVOLO, 2011). Contudo, entre os expoentes que auxiliaram na formação efetiva do movimento, podemos destacar duas abordagens fundamentais, que embora sejam independentes entre si, se rela- cionam sob alguns aspectos. Uma representa a metodologia didática de Walter Gropius e seus colaboradores na Bauhaus, e a outra caracteriza a obra e a ideologia do arquiteto Le Corbusier (BENEVOLO, 2011). 93UNIDADE III Bauhaus A Bauhaus é uma escola de artes, desenho indus- trial e arquitetura, fundada em 1919, em Weimar (Alemanha), sob direção de Walter Gropius (CHING, 2010). Em seu corpo docente, reuniu importantes nomes das vanguardas artísticas. No campo da arquitetura, abrangeu figuras, como Mies van der Rohe, Hannes Meyer e Marcel Bre- uner (COLIN, 2000). Em suma, seu currículo representou um rom- pimento radical com a formação desenvolvida na Beaux-Arts (FAZIO; MOFFETT; WODEHOUSE, 2011), já que sua ênfase se convergiu no projeto funcional tanto das artes aplicadas como do ob- jeto arquitetônico (CHING, 2010). Seu foco era realizar uma arquitetura de essência moderna que, assim como a natureza do homem, envolvesse a vida em sua totalidade. Deste modo, a Bauhaus propôs o desenvolvimento de objetos e edifica- ções que fossem elaborados em conformidade com a produção industrial (GROPIUS, 1997). Embora não fosse uma convicção explícita, foi sob seus princípios que o funcionalismo se tornou uma prática dominante da organização espacial arquitetônica do século XX (TIETZ, 1998). Essencialmente, a ideologia da Bauhaus se preocupava em impedir a escravização huma- na pela máquina e eliminar as desvantagens da mecanização, concentrando-se apenas em seus reais benefícios (GROPIUS, 1997). Seu ensino foi estruturado sob essapostura e suas características se fundem na síntese entre ofício, estética projetiva e tecnologia (CHING, 2010). Segundo Benevolo (2011), o conflito existente entre a produção artesanal e a industrial é instau- rado porque se confronta a essência qualitativa do artesanato com a oportunidade quantitativa da indústria. Ao invés disso, no entanto, é preciso saber como buscar as possibilidades qualitativas que a indústria pode fornecer e que, possivel- mente, são correspondentes às suas vantagens quantitativas. Como a produção seriada amplia a quantidade de itens produzidos (inclusive pela modificação do sistema organizacional), pode- mos constatar que esse processo também fornece um aumento de tempo e dinheiro que, neste caso, pode ser redistribuído para uma preparação mais adequada dos projetos dos protótipos (BENE- VOLO, 2011). Ao longo de sua existência, a Bauhaus foi alvo de muitas controvérsias e crises político-i- deológicas (COLIN, 2000). Em 1926, foi trans- ferida para Dessau, encerrando suas atividades em 1933, em decorrência da hostilidade nazista (CHING, 2010). Protótipo pode ser caracterizado como algo que é modelo ou padrão a ser seguido. Também repre- senta o primeiro exemplar de um produto. (Dicionário Michaelis) 94 Arquitetura Moderna e Contemporânea Obras e Princípios de Le Corbusier O arquiteto suíço Le Corbusier foi possivelmente o mais significativo do séc. XX, além de ser um grande urbanista, teórico e líder de vanguarda. Sua produção arquitetônica se centrou no movimento moderno, passando de um aspecto purista — no início da carreira — para um Brutalismo, já na sua fase madura como arquiteto (TIETZ, 1998). Para Le Corbusier, a residência correspondia a uma máquina de morar, com dispositivos que possibilitavam tal função. Deste modo, ele res- saltava que a adequada base para conceber uma arquitetura equivalente ao mundo das máqui- nas se inspirava na geometria regular: primas, cubos, cilindros, pirâmides e esferas. O conceito e o ritmo também eram questões importantes na composição e deveriam obedecer a equações — assim como ocorre na matemática — enquanto funcionavam como reguladores dimensionais da arquitetura (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). Os “Cinco pontos da nova arquitetura” Em 1927 — em conjunto com os dois edifícios que projetou para a Exposição Werkbund, em Es- tugarda — Le Corbusier expôs o seu programa de “Cinco pontos da nova arquitetura”, reunindo elementos que julgava essenciais para caracterizar uma tendência arquitetônica a ser seguida: pilo- tis, jardim na cobertura, planta livre, fenestração (abertura) horizontal e fachada independente (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). Os pilotis eram pilares delgados que podiam ser dispostos a intervalos específicos, sem con- siderar a organização das paredes no interior da edificação. Assim, o ambiente interno poderia ser concebido de acordo com as suas necessidades de uso, sem a imposição das paredes estruturais. A liberdade da planta livre era limitada apenas pelas restrições do que tecnicamente era possível na época. Os pilotis erguiam-se diretamente do solo e permitiam que o terreno da construção continuasse a caracterizar um jardim. Essa área era, de fato, recuperada na cobertura plana, por meio de um jardim que substituía o telhado. As rampas substituíram as escadas, pos- sibilitando a oportunidade do homem perceber a edificação por meio do movimento. A parede externa perdeu o significado como elemento es- tático e recebeu longas faixas horizontais de ja- nelas — no lugar das tradicionais e altas janelas francesas. A destruição da fachada típica também foi influenciada pelo aspecto de fachada indepen- dente, que agora podia se estender para além do esqueleto estrutural do edifício (GOSSEL; LEU- THAUSER, 1996). A ideologia desse discurso fez que com os ar- quitetos modernistas reconhecessem a existência de um campo autônomo na arquitetura. Evita- vam-se, assim, as tendências esquemáticas, não no sentido de renúncia aos padrões, mas na percep- ção que era possível obter uma evolução contínua na arquitetura, desde que houvesse empenho para isso (BENEVOLO, 2011). Obras e livros principais A respeito das publicações de Le Corbusier, po- demos ilustrar “Por uma arquitetura”, de 1923, que é uma importante coletânea de seus artigos (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996) e o livro La Ville radieuse, de 1935, que trata da habitação coletiva e questões urbanísticas (TIETZ, 1998). 95UNIDADE III Ao longo de sua carreira, o arquiteto desen- volveu várias obras memoráveis. Entre suas edificações mais precoces, podemos destacar as casas da série “Dominó”, provenientes de um sis- tema seriado de produção industrial, fabricado em concreto armado, entre 1914-15 (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). A Villa Savoye, na França (1929-32), foi consi- derada um expoente da arquitetura moderna, em- bora a sua exclusividade requintada dificilmente pudesse servir de modelo projetivo a um período assinalado pela depressão econômica (Figura 1) (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). Em outros destaques, podemos apresentar a Cité de Refuge, em Paris (1929-1932) e a Uni- té d’Habitation, em Marselha (1945-1952), um complexo de arranha-céus com 337 unidades habitacionais (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). A obra tardia de Le Corbusier demonstrou certo afastamento da linguagem formal do Mo- dernismo tradicional, a qual, nesse momento, já estava normalizada a nível mundial. Deste modo, como suas obras não precisavam mais preencher o requisito de protótipos modernistas, Le Cor- busier assumiu uma postura arquitetônica de evolução constante, vindo a impulsionar o de- senvolvimento de outros arquitetos, como Kenzo Tange e Louis Kahn. Basicamente, a arquitetura da fase madura de Le Corbusier centrou-se na manipulação do concreto bruto em edifícios com formas escultóricas, efetivando-se na abordagem perceptível do material construtivo, defendida pela corrente do Brutalismo. Essa evolução for- mal pode ser percebida na Capela Notre-Dame- -du-Haut, em Ronchamp, França (1950-1955) — que se tornou uma das construções de igrejas mais relevantes do século XX (TIETZ, 1998) —, no Palácio da Justiça, na Índia (1950-1956) e no mosteiro dominicano de Sainte-Marie-de- Figura 2 – Mosteiro Sainte-Marie-de-la-Tourette, França (1957-1960), Le Corbusier Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)2. -la-Tourette (Figura 2), na França (1957-1960) (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). No final de sua carreira, o arquiteto pode reali- zar a sua almejada idealização de uma cidade nova, a Chandigarh, na Índia. Entre 1951 e 1965 (ano de sua morte), Le Corbusier acompanhou sua cons- trução, na qual se deixou inspirar pela arquitetura indiana e mundial, associando-as em um vocabu- lário específico do Modernismo (TIETZ, 1998). Figura 1 - Villa Savoye, em Poissy, na França (1929-32), Le Corbusier Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)1. 96 Arquitetura Moderna e Contemporânea El Modulor El Modulor caracteriza um sistema de medidas base que visa adequar mobiliário e ha- bitação às funções e dimen- sões humanas, baseando-se na secção áurea e nas proporções do corpo humano (NIETO, 1992). Seu estudo preliminar começou em 1942, quando Le Corbusier estabeleceu a medida de 175 cm como estatura média do homem comum. Ele, então, dividiu essa figura conforme a proporção áurea e obteve 108 cm, descobrindo que esta medida coincidia com a altura do chão até o umbigo do ho- mem (assim como os mestres do Renascimento já o haviam feito). Novamente, o arquite- to dividiu a altura do umbigo do mesmo modo e prosseguiu com as subdivisões até obter uma completa série harmôni- ca de medições decrescentes. Ele também identificou que a altura humana com braço le- vantado era o dobro da altura até o umbigo. E isso foi o pon- to de partida para derivar toda uma série de medições da seção áurea (RASMUSSEN, 1998). 97UNIDADE III Contudo, por volta de 1947, Le Corbusier descobriu que a altura média dos ingleses era maior (cercade 183 cm) e que, no geral, a estatura das pessoas estava aumentando a nível mundial. Assim, teve receio de que a sua proposta de dimensões fosse insuficiente para a adequação dos ambientes. Portanto, estabeleceu 183 cm definitivamente como medida padrão a ser utilizada para a derivação das demais. Calculou, portanto, duas séries finais de figuras, que resultou em um diagrama com numerosas variações de medidas (RASMUSSEN, 1998), dentre as quais, Nieto (1992) destaca: 183 cm – altura do homem médio; 226 cm – altura do homem com o braço levantado; 86 cm – altura do chão à mão posicionada ao lado do corpo; 113 cm – altura do chão ao umbigo; 43 cm – altura do homem sentado. Le Corbusier utilizou o Modulor como referência em várias obras de sua autoria, assim como na Unité d’Habitation, em Marselha (RASMUSSEN, 1998). Figura 3 - Edifício Chrysler, Nova Ior- que (1930), William van Alen Exposições Significativas do Modernismo Nos primeiros decênios do século XX, várias exposições permitiram a visualização do Movimento Moderno, fazendo que sua influência aumentasse no campo da arquitetura mundial (TIETZ,1998). Exposição de Paris em 1925: Art Decó Em 1925, Paris sediou a “Exposition internationale dês arts décoratifs et industriels modernes”, uma mostra internacional que reuniu vários desenvolvimentos modernos no campo das artes, ofícios, design e arquitetura. A influência que a arts décoratifs exerceu nos anos 20 e início dos 30 foi tão significativa que a exposição deu seu nome à nova tendência artística que se instaurava: a Art Decó. A essência do seu sucesso foi capturar o espírito da época (TIETZ, 1998): o estilo visava compatibilizar as técnicas e os formalismos da Antiguidade com a industrialização crescente do momento vigente (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Isso foi impulsionado pelo fato dos governos totalitários (União Soviética, Alemanha e Itália) não serem simpatizantes das formas sim- ples e diretas da arquitetura moderna, os quais preferiam o discurso monumental oferecido pelo repertório clássico (COLIN, 2000). 98 Arquitetura Moderna e Contemporânea Deste modo, o estilo surgiu como uma solução intermediária entre as concepções geométricas da vanguarda modernista e a pompa da decora- ção tradicional, que o modernismo tanto queria esconder (COLIN, 2000). Suas características en- globam motivos geométricos, formas curvilíneas, contornos nitidamente definidos, predominância de cores fortes e emprego de materiais pesados, como o aço inoxidável e a prata (CHING, 2010). Nos Estados Unidos, a Art Decó simbolizou a recuperação econômica e tornou-se o estilo ofi- cial de Hollywood, que serviu para popularizá-la (COLIN, 2000). Seu exemplar mais relevante é o Edifício Chrysler, projetado por William van Alen, em Nova Iorque, 1930, que, por meio de seus 319 m de altura, constituiu o arranha-céu mais alto do mundo, na época de sua conclusão (Figura 3) (TIETZ,1998). Exposição de Estugarda em 1927: bairro Weissenhofsiedlung Quando ainda estava em atividade, a corporação Deutscher Werkbund organizou sua 2ª Exposi- ção em Estugarda, em 1927, na qual Mies van der Rohe teve a responsabilidade de organizar, além dos tradicionais pavilhões provisórios, um bairro de habitação na periferia da cidade, o Weisse- nhofsiedlung. Esta empreitada contou com os melhores arquitetos europeus para as obras re- sidenciais, envolvendo Behrens, J. Frank, Docker, Walter Gropius, Bruno Taut, Le Corbusier entre outros (BENEVOLO, 2011). Como os modelos edificados eram de arquite- tos com pesquisas e origens distintas, não houve uma arquitetura em conjunto que traduzisse o caráter coletivo do Modernismo. De qualquer for- ma, tal exposição apresentou à sociedade, pela pri- meira vez, um panorama unitário da concepção modernista, na qual as contribuições individuais puderam representar figurativamente a essência da cidade moderna (BENEVOLO, 2011). A habitação moderna continuou sendo tema recorrente — e quase que exclusivo — de várias outras exposições entre o período do pós-guerra e a recessão imposta pela crise econômica de 1929 (BENEVOLO, 2011). Estratégias da vanguarda modernista A vanguarda dos arquitetos modernistas euro- peus almejava convencer a sociedade que a nova arquitetura funcionava melhor que a antiga, pro- curando situações que concretamente pudessem demonstrar as qualidades dos novos princípios. Por isso, além de projetos teóricos, discursos, ma- nifestos e mostras o intuito era erigir edifícios que trouxessem o público efetivamente para as graças do modernismo (BENEVOLO, 2011). Vanguarda representa a vertente mais evoluída em qualquer segmento, sobretudo o artístico, cujas obras caracterizam-se principalmente pela adoção de métodos não ortodoxos e experimen- tais. A vanguarda de arquitetos europeus, espe- cificamente, abrangeu o período entre o Histo- ricismo e o fim dos anos 60. (Francis D. K. Ching e Jurgen Tietz) 99UNIDADE III Nesta acepção, a preferência nas exposições era apresentar objetos já fabricados para o mercado formal e edificações que fossem permanentes, em oposição aos modelos demonstrativos e pavilhões provisórios que eram concebidos no passado. Os concursos também eram situações propícias para o realce do Modernismo, já que permitiam o confronto de várias alternativas para o mesmo tema de projeto (BENEVOLO, 2011). As publicações representaram um recurso crucial para elucidar os princípios e ideais da arquitetura Moderna. Entre elas, destacam-se os livros de Walter Gropius (1925), Hilberseimer (1926), Platz (1927), Hitchcock e Taut (1929); Le Corbusier (1923 e 1935), entre outros (BENEVOLO, 2011). CIAM: Congressos Internacionais da Arquitetura Moderna Motivados pela repercussão do bairro Weissenhof (caracterizado como obra de urbanização global), bem como pela maneira como ele foi concebido — por meio da contribuição de um grupo influente de arquitetos internacionais —, Le Corbusier e Siegfried Giedeon organizaram o I Congresso Internacional da Arquitetura Moderna (CIAM), em 1928, na Suíça (TIETZ, 1998). O objetivo era que os arquitetos pudessem se reunir em fóruns anuais para discutir a diversidade das tendências arquitetônicas do Modernismo e normalizar sua prática. Essa associação englobava representantes de vários países e reuniu-se em dez ocasiões (COLIN, 2000). Os congressos eram fortemente ideológicos e temáticos, abrangendo assuntos importantes do ponto de vista social, urbanístico e arquitetônico (TIETZ, 1998). A sucessão dos temas indicou a progressiva ampliação do campo de estudo que os congressos assumiram ao longo do tempo (BENEVOLO, 2011). Seu produto mais relevante e, ao mesmo tempo, criticado foi a Carta de Atenas, resultado dos debates discutidos no IV CIAM, em 1933 (COLIN, 2000). Com uma forte influência das ideias de Le Corbusier, essa carta demarcou as bases ideológicas do urbanismo funcional, partindo de uma divisão da cidade em zonas específicas em relação às suas principais finalidades: habitação, trabalho, lazer e tráfego (TIETZ, 1998). Com o passar dos anos e o tom cada vez mais pragmático e formalista dos congressos, a sua dissolução aconteceu em 1956, na ocasião do CIAM X (COLIN, 2000). Auge do Movimento Moderno Com o passar do tempo, o Movimento Moderno deixou de ser rotulado como uma possível tendên- cia passível de ser substituída em um curto intervalo de tempo, para representar uma mudança em um nível mais abrangente. O Modernismo se expressava atuante sobre um conjunto de tendências, assinalando-lhes um novo caminho a seguir, em resposta às necessidades de um mundo que havia se transformado em vários aspectos (BENEVOLO, 2011). 100 Arquitetura Moderna e Contemporânea Estilo Internacional O Estilo internacional reflete a maturidade do Movimento Moderno (COLIN, 2000), reportan- do à arquitetura de caráter racional e funcional, destituída de características regionais e elementos decorativos. Seu auge aconteceu entre as décadas de 20 e 30, na Europa ocidentale nos Estados Uni- dos, embora tenha sido adotada em quase todo o mundo (CHING, 2010). O termo — utilizado pelos críticos de arquite- tura Henry-Russel Hitchcook e Philip Johnson — foi cunhado em uma exposição no Museu de Arte Moderna, em Nova Iorque, 1932, para designar obras modernistas de arquitetos internacionais que estavam em evidência desde a urbanização do bairro Weissenhof (TIETZ, 1998). Para Hitchcook e Johnson, o Estilo Internacio- nal apresentava-se basicamente em três princípios estéticos (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996): a) O primeiro vê a arquitetura como um es- paço fechado, que apresenta liberdade in- terna para dispor seus espaços conforme a necessidade de cada ambiente, compondo uma planta de caráter flexível. A edificação é composta por um esqueleto estrutural, em que o envoltório externo caracteriza sua proteção climática, sendo, geralmente, feito por painéis de vidro. Com uma fachada que rejeita elementos decorativos, a abertura dos vãos assumiu um novo significado: sempre que possível, o vidro é incorporado na superfície para acentuar o seu caráter de revestimento. Isso pode ser evidenciado nos belos edifícios de Mies van der Rohe (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). b) Depois vem a tentativa de uma regularidade modular. As grelhas da estrutura construtiva derivaram, consequentemente, da padro- nização dos elementos do edifício, sendo prática adotada nos arranha-céus ameri- canos — já que a variação dos intervalos estruturais aumentavam os custos da obra. Esse princípio foi responsável por substituir a simetria axial como ordem estética (pre- sente desde a arquitetura antiga) e era asso- ciado com um padrão de linhas horizontais que correspondiam às lajes de piso com parapeitos e fileiras de janelas intercaladas, assim como a cobertura plana dominante (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). c) O terceiro princípio tem relação com a ausência de decoração sobreposta à edifi- cação e do papel da cor nesse contexto. Em- bora a Arquitetura Moderna tenha adotado as superfícies brancas como sua principal característica, cabe ressaltar que a cor exer- ce um papel substancial e decorativo nos pormenores (GOSSEL; LEUTHAUSER, 1996). Por outro lado, na abordagem do desprezo pelo ornamento, podemos cons- tatar que o receio que os arquitetos mo- dernistas tinham com relação à decoração é por acharem que ela insere na essência primordial do edifício algo que é alheio à sua natureza intrínseca (CONNOR, 1993). Em suma, a arquitetura do Estilo Internacional — com seus volumes geometricamente regulares em concreto armado, estruturas independentes de aço e fachadas revestidas por vidro — unificou a imagem dos grandes centros urbanos, vindo a dominar, até o final dos anos 60, praticamente quase todo o desen- volvimento arquitetônico mundial (TIETZ, 1998). Com esta caracterização, ela impunha que os princípios desse movimento fossem iguais em todos os países, independentes das tradições lo- cais e das diferenças climáticas presenciadas em cada região. O desprezo pelo regionalismo, com o passar do tempo, foi culminando em críticas que começaram a perturbar a hegemonia dessa corrente arquitetônica (BENEVOLO, 2011). 101UNIDADE III Se as devastações da Primeira Guerra Mundial produziram grande alteração nas relações polí- ticas, econômicas e sociais nos países em âmbito mundial, a situação no final da Segunda Guerra (1945) era bem mais drástica (TIETZ, 1998). Enquanto algumas cidades — sobretudo na Europa, como Japão e URSS —, ainda estavam sob os escombros, surgiram gigantescas migra- ções de vários povos, por causa de expulsões e migrações. Deste modo, o mundo foi dividido em dois blocos políticos. De um lado, o bloco Ocidental de cunho capitalista, composto por países democráticos, em que os Estados Unidos assumiram o papel dominante em termos eco- nômicos em nível mundial. De outro, o bloco de Leste, caracterizado pela ideologia comunista e controlado pela URSS (que até 1953 foi domi- nada pela ditadura de José Estaline). A fronteira dessa divisão passava no meio da Alemanha, que foi separada em dois estados. Até o final do regime comunista, em 1989, o bloco Ocidental e de Leste estiveram em constante con- fronto irreconciliável — a denominada Guerra Fria (TIETZ, 1998). A arquitetura praticada no bloco de Leste e suas fases distintas só começou a ter visibilidade pública, aos olhos do mundo ocidental, a partir Arquitetura Mundial Pós-Segunda Guerra 102 Arquitetura Moderna e Contemporânea da abertura dos países de Leste, no início dos anos 90. Os problemas econômicos deste bloco se refletiram na arquitetura, fazendo que as tentativas para o desenvolvimento de uma arquitetura visionária e funcional fossem restringidas a um curto período de tempo (TIETZ, 1998). Por sua vez, nos Estados Unidos, este período foi marcado pelo revivescimento do Estilo Inter- nacional, o qual não possuía conotações políticas, sendo impulsionado por obras de arquitetos ale- mães emigrados por motivos políticos — princi- palmente Walter Gropius e Mies van der Rohe. Por terem atuado como docentes nas universidades americanas, tais arquitetos tornaram-se um mo- delo para toda uma geração de jovens arquitetos, fazendo que a linguagem formal do Estilo Inter- nacional continuasse a vigorar e ser significativa para a arquitetura vigente (TIETZ, 1998). Deste modo, e não somente nos locais que pre- cisavam ser reconstruídos pelos abalos da guerra, as características dessa corrente arquitetônica tor- naram-se a imagem dos novos tempos. Da Améri- ca do Sul ao Sudoeste Asiático, os centros urbanos foram quase que uniformizados por uma essência de construções em concreto armado e edifícios em estrutura metálica com fachadas envidraçadas (TIETZ, 1998). E nesse contexto, Mies van der Rohe teve atua- ção fundamental, adaptando as necessidades ame- ricanas aos seus princípios arquitetônicos, que empregavam o aço e o vidro, na concepção de inigualáveis arranha-céus (Figura 4). Seu lendário lema “menos é mais”, tornou-se uma espécie de profissão de fé para toda uma geração de arqui- tetos (TIETZ, 1998). Seus edifícios homogêneos, compostos por fachada em reticulada envidraçada, tornaram-se sinônimos da arquitetura de edifícios empresa- riais dos anos 50 e 60. E embora tenham evoluído por sofisticadas técnicas de climatização e demais avanços tecnológicos, ainda se mantêm atuais e influentes nos dias de hoje (TIETZ, 1998). Figura 4 – Seagram Building, Nova Iorque (1954-1958), Mies van der Rohe Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)3. Niemeyer (1993) enfatiza que a fachada de vidro, decorrente da estrutura independente, quando bem utilizada, ainda constitui um dos elementos mais belos e nobres da arquitetura atual, embora também defenda o uso de superfícies cegas em determinadas situações. O importante, no geral, é que o ambiente interno e a fachada se harmo- nizem dentro da modulação que a flexibilidade do projeto exige. 103UNIDADE III A arquitetura de Brasília como expressão de um novo mundo No Brasil, onde após 1945 foi possível estabelecer-se um caráter democrático, o surgimento de uma nova era — do ponto de vista arquitetônico, também deveria assumir uma forma simbólica que fosse especial. E isso pôde ser concretizado na arquitetura da nova capital Brasília, edificada nos anos 50 pelo importante arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer e pelo urbanista Lúcio Costa. Sua configuração formou-se segundo os contornos de um avião, como expressão de progresso e modernidade. Nesta concepção, cada área específica recebeu uma finalidade que foi demarcada entre governo, adminis- tração e habitação. As obras foram concebidas exclusivamente por Niemeyer, que garantiu uma forma extremamente expressiva a cada uma delas (TIETZ, 1998). Contexto político-cultural das décadas de 50 e 60 O mundo vivia um período complexo entre as décadas de 50 e 60. No setor político, a Guerra Fria estava claramente instaurada. No plano social, a revolução doscostumes culminava no movimento hippie. E no aspecto econômico era estabelecida definitivamente a sociedade pós-industrial, que caracteri- zava-se pela produção e consumo essencialmente de serviços, controle tecnológico da informação e concentração do capital. Acrescentava-se a este cenário todo o progresso tecnológico que, atendendo às necessidades da guerra, agora eram disponibilizados à sociedade civil (COLIN, 2000). Diante desse panorama, nos anos 60, ideias socialistas começaram a despontar em abrangência mun- dial, opondo-se ao sistema econômico capitalista. A ideologia pregava a concepção de uma sociedade referenciada na igualdade, solidariedade e justiça, que também influenciou a prática arquitetônica e as formas de habitar. Nesse momento, a arte passou a ser popular, tornando-se “Pop Art” (TIETZ, 1998). Brutalismo Entre as vertentes que atravessaram o século XX, o Brutalismo marcou um novo período arquitetôni- co, que teve abrangência entre as décadas de 50 e 70. Ele representou a tentativa de expor as práticas construtivas, tornando o funcionamento do edifício perceptível ao observador (TIETZ, 1998). O Brutalismo caracteriza-se pela combinação da aparência rústica com a racionalidade técnica, utilizando-se da expressividade, sobretudo do concreto aparente e das formas pesadas, para conferir à obra um aspecto de austeridade (ALBERNAZ; LIMA, 1998a). Neste estilo, não há preocupação em conferir um acabamento adicional aos materiais cons- trutivos, portanto, o concreto aparente exibe a rusticidade de sua execução, a alvenaria de tijolos apresenta as suas variações cromáticas e dimensionais, assim como as instalações do edifício são deixadas à mostra (COLIN, 2000). 104 Arquitetura Moderna e Contemporânea Inicialmente, essa tendência arquitetônica se expressou mais como um conceito ético do que estético, principalmente por privilegiar o modo como a construção é desenvolvida. Por trás desse princípio encontra-se, em última análise, a essência de uma arquitetura verdadeira, que não esconde suas estru- turas com uma fachada que segue o modismo dominante (TIETZ, 1998). Le Corbusier pôs em prática esse princípio de construção na sua obra tardia, opondo-se à atitude purista que assumiu no período de vanguarda europeia (COLIN, 2000). Minimalismo A busca pela expressão emotiva com o uso de poucos elementos fundamentais é uma das grandes características de uma parcela da arte do século XX e que pode ser encontrada no minimalismo. Sua abrangência encontra-se nas obras de autores de várias e distintas disciplinas (MONTANER, 2002). Devido ao seu caráter pluridimensional, o minimalismo não é caracterizado como um estilo ou corrente definida, mas pode ser encarado como um princípio operacional, que busca atingir uma considerável emoção estética e impacto intelectual usando recursos mínimos — o que, muitas vezes, dificulta o pleno alcance de seus objetivos (MONTANER, 2002). A formulação precedente do lema “Menos é mais”, realizada por Mies van der Rohe, constitui uma boa definição da categoria que o minimalismo impõe no campo da arquitetura. Neste segmento, o minimalismo propõe o reaparecimento da tradição racionalista e abstrata, propagada inicialmente pela vanguarda europeia no Movimento Moderno (MONTANER, 2002). A diferença é que o universo do minimalismo, mesmo dentro da lógica do pensamento racional, aborda um polo extremo, explorando os limites do imprescindível que conduz à retirada de elementos irrelevantes (MONTANER, 2009). Deste modo, podemos definir que os objetos minimalistas são aqueles cuja simplicidade evoca as formas geométricas puras, com realce no sistema repetitivo, além da característica de esconder qual- quer indício que revele o processo construtivo da obra, ideologia bem diferente do que acontece no brutalismo (MONTANER, 2009). Devido à sua autonomia pretendida, a grande barreira que as obras minimalistas encontram está no aspecto da sua contextualização, ou seja, na capacidade para converter-se em um sistema de objetos que se relacione com o entorno imediato (MONTANER, 2009). 105UNIDADE III Com o passar do tempo, a arquitetura do Estilo Internacional começou a enfrentar críticas sob vários aspectos. Tal arquitetura havia se torna- do multifacetada e as suas expressões iam de um requintado expressionismo em curvas até a uni- formidade dos edifícios em retículas rigorosas impostas pelos mestres da Bauhaus, como Walter Gropius e Mies van der Rohe (TIETZ, 1998). Críticas ao funcionalismo As práticas arquitetônicas orientadas pelos CIAM — com seu excessivo racionalismo e funcionalis- mo — estavam desagradando alguns setores da sociedade e começaram a gerar reações contun- dentes de intelectuais, arquitetos opositores e até de usuários (COLIN, 2000). Além disso, os problemas apresentados nos conjuntos habitacionais de Pruitt-Igoe (Missouri) e Les Minguettes (França) abriram caminho para uma reorientação dos princípios modernistas. As abordagens visavam enfraquecer a relevância do funcionalismo e instigar preocupações nos arqui- tetos quanto ao aspecto simbólico dos espaços pro- jetados, às solicitações psicológicas que deveriam atender ao grupo considerado e aos fatores cultu- rais relacionados à tradição local (COLIN, 2000). Crise no Modernismo 106 Arquitetura Moderna e Contemporânea As críticas ao funcionalismo se fundavam em vários aspectos, como no fato dele privilegiar a dimensão utilitária da edificação em demasia, fa- zendo que a arquitetura assumisse uma posição de serviço mais do que de arte propriamente dita (BRANDÃO, 2006). Na visão de Netto (1979), a supremacia do uso, pregada pela prática funcional, na verdade, tinha o papel de mascarar o seu real intuito: o de prover uma composição formal que, ao mesmo tempo que agradasse o usuário, fosse a mais rentável ao produtor. Isso vinha de encontro com o contex- to em que o funcionalismo surgiu, ou seja, uma época assinalada pela base da sociedade industrial moderna, com uma prática avançada de capita- lismo, imperalismo econômico, concentração da produção e da renda e direção do consumo das massas. Desta maneira, pode se entender que a essência do funcionalismo era mais voltada para o produtor, que pretendia se beneficiar por meio de uma arquitetura desenvolvida de modo mais rápido (já que não tinha ornamentos) e que podia ser reproduzida em série pela padronização das suas formas geométricas. A sociedade, então, era induzida a se agradar dessas formas puras, no ar- gumento de que tais composições se adequavam melhor às suas necessidades utilitárias (NETTO, 1979). O problema, segundo Netto (1979), é que todo o funcionalismo “voltado às necessidade do consumidor” era, na realidade, um funcionalismo pensado para o produtor: ao usuário era dado a morfologia arquitetônica como isca para que ele se envolvesse no sistema. Na concepção de Netto (1979), a maneira mais coerente de resolver esse impasse e estabelecer a união plena entre forma e função é conceber uma arquitetura que seja encomendada por um produtor, que, simultaneamente, seja o seu próprio usuário. Isso é evidente em habitações privadas, onde quem solicita o projeto tem os recursos necessários para a sua construção e, por isso, reúne o aspecto de produtor e consumidor simultaneamente. Neste caso, é possível encontrar uma forma adequada que exprima a sua função e, assim, uma se adapte à outra de maneira equi- librada (NETTO, 1979). Críticas à falta de identidade histórica Para Connor (1993), o rompimento do Movimen- to Moderno com as referências históricas pode ser caracterizado como um modo de restauração da identidade essencial da arquitetura. Por outro lado, tal ruptura, aliada ao caráter abstrato da prá- tica modernista, não corresponde às expectativas de identidade cultural do usuário para com seu habitat (BRANDÃO, 2006). O fato do Moder- nismo impor que sua morfologia fosse abstrata, ou seja, que suas formas não se parecessem com outras anteriormenteconcebidas, fazia que elas se privassem de seus conteúdos tradicionais. Vários elementos construtivos passaram por adaptações que lhes tiraram o aspecto familiar de uso: as janelas, por exemplo, passaram da ex- pressão à francesa (janelas individuais e altas) para uma faixa contínua e horizontal, proposta por Le Corbusier. Os telhados também foram des- caracterizados e substituídos por lajes planas e impermeabilizadas, além de várias outras novida- des acrescentadas à prática construtiva da época. Embora esses novos sistemas caracterizassem uma atmosfera de avanço técnico, é preciso considerar que o elemento arquitetônico, além de cumprir sua finalidade, deve ir além em termos semióticos, preocupando-se com a qualidade representativa. Por isso, quando os telhados foram suprimidos das residências, nenhum outro elemento foi posto em seu lugar simbolizando proteção (COLIN, 2000). Nem todos os usuários aceitaram essa impo- sição com facilidade. Muitos não assimilaram 107UNIDADE III prontamente o novo código construtivo e a sua ausência de ornamentos. Eles se viam privados de sua simbologia tradicional e isso culminou na crise da comunicabilidade construtiva, que chegou ao seu limite por volta da década de 60 (COLIN, 2000). Cenário para a escola de Tessin e o Neo-racionalismo Em paralelo à crise do Modernismo tradicional, surgiu uma nova corrente arquitetônica de cará- ter próprio: a denominada Escola de Tessin, cujo expoente centrava na figura do arquiteto suíço Mario Botta. Tal tendência propôs uma arquitetu- ra relativamente monumental, com preocupação às características da paisagem e consideração às necessidades particulares dos usuários. Isso em substituição às edificações massificadas que até o momento estavam sendo construídas pela prática modernista (TIETZ, 1998). É neste panorama que o Neo-racionalismo ou Tendenza surgiu na Itália nos anos 60, sendo encabeçado pelo arquiteto Aldo Rossi. Apesar do nome sugestivo, o que realmente o movi- mento desejava era substituir a postura funcio- nalista e pragmática da Arquitetura Moderna por uma orientação mais regionalista, feno- menológica e historicista, que assumisse um caráter pioneiro. De certa forma, essa ideologia contribuiu para o surgimento do Pós-Moder- nismo (COLIN, 2000). O início de uma nova visão arquitetônica Nos anos 1960, a discussão de que o Movimen- to Moderno não era o único estilo salvador ganhou força entre a sociedade vigente (TIETZ, 1998). Foi neste contexto que novas tendências ar- quitetônicas manifestaram interesse novamente pelas formas históricas, com seu rico vocabulá- rio decorativo. Essas ideias caracterizavam uma oposição às práticas rigorosas do funcionalismo modernista, consideradas de natureza monótona (TIETZ, 1998). As figuras históricas ressurgiram na arqui- tetura, envoltas por dois propósitos principais. O primeiro trazia a restauração dos centros europeus históricos que haviam sofrido im- pacto com a Segunda Guerra Mundial, sendo reconstruídos sob os novos princípios de con- servação e defesa do patrimônio histórico. A outra abordagem representava fielmente uma oposição à austeridade plástica imposta pela ideologia modernista, repensando soluções projetivas que marcaram o século XIX. A este cenário, acrescentou-se o sentimento de frustração da sociedade, em relação às promessas iniciais da vanguarda modernista, que não soa- ram plenos resultados. Assim, isso caracterizou os primórdios da Arquitetura Contemporânea e sua explícita crítica ao Movimento Moderno (COLIN, 2000). A fenomenologia é um sistema filosófico desen- volvido por Edmund Husserl, que combate o ob- jetivismo cientificista, segundo o qual o objeto deve compor-se de fatos puros e simples. Na arquitetura, a sua adoção visa reconsiderar o pa- pel do cidadão em relação ao edifício e à cidade. Fonte: Colin (2000). 108 Arquitetura Moderna e Contemporânea O Pós-Modernismo ou Arquitetura Contemporâ- nea é um termo que se refere às diversas atitudes projetivas que estabeleceram confronto ideoló- gico aos princípios do Modernismo, a partir da década de 70. Ele se constitui no amadurecimento das tendências críticas das décadas anteriores, que rejeitavam as concepções extremamente funcio- nais, à alienação social e ecológica, além do caráter internacionalista e anti-histórico do Movimento Moderno (COLIN, 2000). Caracteriza-se tanto pelo retorno ao vasto re- pertório da história arquitetônica e sua reinterpre- tação (COLIN, 2000) — encorajando o emprego de elementos dos estilos vernáculos históricos (CHING, 2010) — como pelo prestígio do pen- samento regionalista e dos elementos da cultura popular e de massa (COLIN, 2000). A Arquitetu- ra Contemporânea visa resistir à tendência que desconsidera as diferenças culturais em prol da uniformidade de uma prática arquitetônica uni- versal, assim como foi idealizado pelo Modernis- mo (CONNOR, 1993). Ascensão da Arquitetura Contemporânea 109UNIDADE III Para os críticos do Modernismo, o estilo racio- nalista é dominado pela univalência, ou seja, pe- las formas geométricas simples, tipificadas pe- las “caixas de aço e vidro” propagadas por Mies van der Rohe e seus seguidores. A Arquitetura Pós-Moderna se opõem a esse princípio de vá- rios modos. Em primeiro lugar, pelo retorno ao sentido de função referencial ou significativa da arquitetura, reavendo a dimensão conotativa que os modernistas suprimiram do ato arquitetônico (CONNOR, 1993). Por isso, a Arquitetura Con- temporânea incorpora o simbólico na dimensão formal, influenciando-se por aspectos decorati- vos, cenográficos (ALBERNAZ; LIMA, 1998b), de ilusão lúdica e certa dose de humor e ironia (COLIN, 2000). A univalência também é substituída pelo ca- ráter de pluralidade da tendência contemporânea (CONNOR, 1993). O pluralismo se transformou no conceito primordial de uma ideologia que se define a partir do parâmetro de diversidade. As teorias linguísticas e semióticas fundamentaram a consciência dessa diversidade, estabelecendo plu- ralismo de culturas, línguas e novas possibilidades de interpretação dos signos (MONTANER, 2002). A Arquitetura Contemporânea, portanto, foi influenciada pela integração consciente de méto- dos de reflexão com desenvolvimento recente na arquitetura, como a fenomenologia e a semiótica, tanto na prática projetiva como na abordagem crí- tica. Além disso, sua cultura é fruto de uma união de conceitos relacionados à história tradicional e à cultura Pop (COLIN, 2000). Entre alguns dos arquitetos contemporâneos estão: Robert Venturi, Charles Moore, Robert Stern, Ricardo Bofil, Aldo Rossi, Rob e Leo Krier e Christian de Portzamparc (COLIN, 2000). Ao lado de Venturi, podemos destacar Charles Moore como um dos fundadores do Pós-Modernismo. Seu projeto mais conhecido é a Piazza d’Itália, em Nova Orleans (Figura 5) (TIETZ, 1998). Influência de Robert Venturi no Pós-Modernismo Nos Estados Unidos, o Movimento Contempo- râneo teve origem na “Escola da Filadélfia”, que relaciona o arquiteto Louis Kahn (de orientação tradicionalista) à atuação do arquiteto americano Robert Venturi, que propôs ideias pós-modernis- tas influenciado pelo seu período de estudos em Roma (COLIN, 2000). Venturi foi um influente participante da von- tade contemporânea dos anos 60 de superar a homogeneidade e a incapacidade comunicativa da Arquitetura Moderna (MONTANER, 2002). Com tais princípios, Venturi almejava con- seguir uma arquitetura mais versátil, capaz de representar alternativas às práticas modernistas Arquitetura vernácula: estilo arquitetônico que exemplifica as técnicas construtivas mais sim- ples, baseadas nas formas e materiais de um período histórico, região ou grupo de pessoas em particular. (Francis D. K. Ching) Figura 5 - Piazza d’Itália, USA (1974-1978), Charles Moore 110 Arquitetura Moderna e Contemporânea que estavam em declínio. Seu foco não era regressar, de fato, a um período anterior ao Movimento Moderno,mas recuperar a memória do cânon da arquitetura, respeitado e validado por toda a História. Deste modo, Venturi representou um ponto de partida para ultrapassar o Modernismo, caracterizando o início da Arquitetura Contemporânea (TIETZ, 1998). Suas primeiras obras representam a base desse novo estilo, cujos princípios foram formulados em livros de sua autoria, como Complexidade e Contradição na Arquitetura, de 1966 e Aprendendo com Las Vegas, de 1972 (TIETZ, 1998). A teoria propagada por Venturi significava a introdução dos con- ceitos de complexidade, diversidade e contradição na interpretação da história arquitetônica, além de caracterizar o projeto contemporâneo (MONTANER, 2002). Em Aprendendo com Las Vegas, Venturi estimula os arquitetos a recuperarem o sentido pelo qual as edificações são traduzidas por seus contextos, encontrando uma demonstração análoga nas ruas de Las Vegas, onde elementos incompatíveis são dispostos lado a lado e operam em colaboração (CONNOR, 1993). O intervalo de tempo entre as duas publicações assinala a transição da atuação de Venturi entre a tradição histórica e a cultura popular: de um lado, ele abordou o princípio maneirista da Arquitetura Romana Pós-Renascentista e, de outro, o recurso do “galpão decorado” e o emprego da arquitetura como suporte publicitário — com seus letreiros em néon (TIETZ, 1998). Os elementos primordiais que Venturi propôs em seus livros já se faziam presentes no marco inicial da Arquitetura Contemporânea: a casa de sua mãe, Vanna Venturi, em 1962-1964. Ela representa uma espécie de formulação da casa suburbana americana, com a fachada caracterizando a imagem simbó- lica de uma residência, a qual retoma a arquitetura do período de Revolução do século XVIII. Como esta edificação foi um das primeiras obras pós-modernas, ela se tornou um clássico, representando a tentativa de se voltar a conceber “arte” depois do Movimento Moderno (TIETZ, 1998). Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo. Para acessar, use seu leitor de QR Code. O “galpão decorado” é um conceito de projeto que se refere a edificações cujas fachadas são destina- das a elevar sua importância arquitetônica ou enunciar suas funções. Nele, há uma divisão conceitual, em que por um lado estão a função e o programa de necessidades e, no outro, o significado que é criado na fachada, a partir da decoração ou de rótulos. (Francis D. K. Ching e Josep Maria Montaner) 111UNIDADE III Em outra abordagem, Venturi e outros autores se admiravam com os recursos da comunicação, fruto da sintonia entre a Pop Art e a consciência de viverem em uma sociedade de contexto comu- nicativo (MONTANER, 2002). Após duas décadas caracterizadas por uma arquitetura versátil e, às vezes, eclética — de cunho Neo-Racionalista, conceitual e de “galpões decora- dos” —, Venturi realizou sua obra mais represen- tativa na década de 80, a ampliação da National Gallery, em Londres (MONTANER, 2002). De qualquer forma, Robert Venturi assinalou a ar- quitetura mais sob um aspecto teórico do que propriamente por meio das suas obras constru- tivas (TIETZ, 1998). Um revivescimento eclético da arquitetura No Pós-Modernismo, a arquitetura reviveu um período eclético, em uma alternância estética ma- nifestada por várias tendências. Em um primei- ro momento, a arquitetura foi caracterizada pelo Pós-Modernismo Historicista, com o revivesci- mento da estética do passado e representação de simulacros (MALARD, 2006). Simulacro é uma representação artificial da rea- lidade, uma imitação. (Dicionário Michaelis) Depois surgiu uma caracterização tardia do Movimento Moderno, sob o rótulo de Arqui- tetura High-Tech, que representa uma tentativa de estetizar o ato construtivo. Por outro lado, o Desconstrutivismo surgiu como uma prática alternativa, visando dar autonomia ao repertó- rio formal modernista (MALARD, 2006). Esse Neo-Ecletismo visava compreender a arquitetu- ra na complexidade de suas naturezas distintas (MALARD, 2006). Pós-Modernismo Historicista O que na década de 60 representou o início dos protestos contra o funcionalismo modernista tornou-se em uma pluralidade desmedida nos anos 70. O regresso aos estilos históricos dividiu não apenas a classe dos arquitetos, mas também toda a sociedade, tendo reflexos até os anos 80 (TIETZ, 1998). Em 1980, com a Primeira Bienal de Arquite- tura, iniciada por Paolo Portoghesi, em Veneza, a Arquitetura Contemporânea se instaurou defini- tivamente também na Europa. E, aos poucos, foi perdendo o seu caráter irônico que Charles Moore e outros arquitetos do período haviam introdu- zido em suas obras. A arquitetura se voltou para um aspecto mais dogmático, que usava a citação clássica para expressar um vocabulário arquite- tônico aleatório (TIETZ, 1998). A Arquitetura Contemporânea também en- volveu o setor de arranha-céus, que regressou às formas carregadas da Art Déco. Nesse momen- to, em vez da supremacia do funcionalismo e da transparência, o aspecto mais importante, nova- mente, era a sua representação. O principal ele- mento construtivo que regressou da Antiguidade Clássica para a vertente do Pós-Modernismo foi a coluna, além dos tradicionais frontões. No en- tanto, apesar desses elementos terem ressurgido por poucos anos, conseguiram originar campos de tensão na arquitetura até então vigente. Assim, o domínio exercido pelo Modernismo tradicional deu passagem a um horizonte de novas possibili- dades conceptivas (TIETZ, 1998). 112 Arquitetura Moderna e Contemporânea Tardo-Modernismo O Modernismo tardio representa a produção ar- quitetônica que aconteceu após a introdução dos princípios do Pós-Modernismo, ignorando-os e mantendo-se alinhada com a ideologia do Esti- lo Internacional. É o caso, por exemplo, da obra relativamente recente de arquitetos importantes, como Oscar Niemeyer, Leoh M. Pei, Arata Isozaki, Jean Nouvel, entre outros (COLIN, 2000). Esta expressão também pode caracterizar algumas tendências arquitetônicas que, embora apresentem evolução formal frente ao Moder- nismo de vanguarda, permanecem relacionadas a ele — pelo menos a nível ideologicamente. Esse é o caso da Arquitetura High-tech (COLIN, 2000). Arquitetura High-tech High Tech é o termo que define uma arquitetura que expressa sua aparência estética por meio do tecnicismo de sua construção (TIETZ, 1998). A tendência tecnicista evoluiu de uma fase que sim- plesmente almejava o melhor desempenho para o edifício para uma fase simbólica (COLIN, 2000), na qual procura seduzir o expectador, exibindo abertamente em sua fachada, o que tradicional- mente algumas doutrinas procuram esconder nas entranhas dos seus edifícios (TIETZ, 1998). Essa tendência foi difundida a partir da década de 70, e inclui na sua concepção projetiva a expo- sição de sistemas técnicos construtivos (elétrico, hidráulico, de climatização e circulação), uso cons- tante de cores vivas e acabamentos metálicos, veda- ções com painéis industrializados e vidro, grandes vãos e estruturas tensionadas. O intuito da arqui- tetura High-tech é propor aos usuários espaços de máxima eficiência tecnológica (COLIN, 2000). Um de seus projetos mais característicos é o Centro Pompidou (Figura 6), em Paris, projetado por Richard Rogers e Renzo Piano. Embora sua imagem intimidasse alguns expectadores, ele tor- nou-se paradigma da arquitetura dos anos 1970, en- volvido pela influência da Pop Art (TIETZ, 1998). Além dos respectivos arquitetos, Norman Fos- ter é outro inglês que faz parte das figuras mais relevantes da arquitetura tecnicista (TIETZ, 1998). Na vertente das estruturas tensionadas, o arqui- teto e engenheiro alemão Frei Otto e sua equipe expressam notoriedade, principalmente na cons- trução tipo tenda. Entre suas obras, despontam a cobertura do Estádio Olímpico de Munique (Figura 7) (TIETZ, 1998). Figura 6 - Centro Pompidou, França (1971-77), Richard Rogers e Renzo Piano Figura 7 - Estádio Olímpico de Munique, Alemanha (1968-72), Günter Behnische Frei Otto 113UNIDADE III Arquitetura da década de 80 A arquitetura dos anos 80 possui alguns perso- nagens importantes em seu campo de atuação, como Aldo Rossi, Mario Botta, Vittorio Gregotti e Tadao Ando (TIETZ, 1998). O primeiro citado assumiu relevância, inclusi- ve no âmbito de escritos teóricos, os quais enfati- zam a importância das cidades e as possibilidades de um desenvolvimento funcional — com respei- to às questões fenomenológicas (TIETZ, 1998). Por sua vez, Mario Botta (com suas residências de campo no Tessin), bem como Vittorio Gregot- ti (e sua relevante urbanização no Canareggio veneziano), introduziram aspectos históricos e contemporâneos em suas obras da década de 80, obtendo soluções arquitetônicas de elevada qua- lidade (TIETZ, 1998). O arquiteto Tadao Ando trilhou caminho si- milar com suas obras. Ele fez que as dimensões e formas de suas residências japonesas respon- dessem a exigências distintas das equivalentes europeias e americanas e que, ao mesmo tempo, permanecessem modernas ao introduzirem a ex- pressão de Mies van der Rohe de que “Menos é mais”. Sua arquitetura é marcada pela redução dos materiais construtivos ao concreto, assim como pelo emprego intencional da iluminação natural para a ampliação do espaço (TIETZ, 1998). Museu: a cultura como evento No início do século XIX, os museus europeus re- presentavam os templos da cultura burguesa. Um século depois, não só simbolizavam tal papel de transmissores culturais, mas também passaram a incorporar o objetivo de conduzir ao prazer pela fruição da arte (TIETZ, 1998). Neste contexto, nenhuma outra tipologia ar- quitetônica expressou a cultura de eventos de modo tão evidente, como os novos edifícios des- tinados a museus, que seguiam sendo erigidos em vários países. Em âmbito mundial, eles atraiam milhares de visitantes para suas significativas ex- posições, por isso, além de refletirem as necessida- des pragmáticas de seus programas construtivos, eles próprios se tornavam verdadeiras obras de arte (TIETZ, 1998). Desconstrutivismo A desconstrução atingiu várias áreas culturais, mas foi na arquitetura que alçou maior visibilida- de, inclusive a nível mundial (DORFMAN, 2014). O fenômeno conhecido por Arquitetura Des- construtivista foi designado por Philip Johnson e Mark Wigley, na exposição que organizaram no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, em 1988. O termo remete à abstração formal das obras do construtivismo russo. Essa relação restringe-se apenas ao aspecto morfológico das obras, não se relacionando efetivamente com a filosofia que possui tal denominação (DORFMAN, 2014). A desconstrução não é propriamente um es- tilo, nem deve ser confundida com destruição; pelo contrário: ela caracteriza uma ideia cons- trutiva, ou seja, uma maneira libertadora de criar arquitetura como construção do imaginário, com raízes que se ligam à vida urbana moderna (DOR- FMAN, 2014). Embora a atuação efetiva da Arquitetura Des- construtivista tenha durado pouco mais de uma década, seu maior feito foi a ampliação das estru- turas do pensamento arquitetônico e também das categorias conceituais. O significado que a des- construção teve para a arquitetura ainda se mani- festa nos dias atuais, e sua ideologia é considerada a base do ressurgimento artístico da arquitetura. Essa prática arquitetônica celebrou a diversidade e redescobriu a cidade (DORFMAN, 2014). 114 Arquitetura Moderna e Contemporânea Sua intenção de transpor o Modernismo clássi- co não remeteu a um regresso histórico, como fez o Pós-Modernismo, na mesma época, mas buscou uma caracterização nova, com formas que pudes- sem exprimir uma sensação de desestabilização e quase impossibilidade técnica (TIETZ, 1998). Distinguindo-se do Movimento Moderno tra- dicional e do Pós-Modernismo, as obras descons- trutivistas caracterizam-se por formas que são intersectadas entre si, fragmentadas e, geralmente, inclinadas (TIETZ, 1998). A função da obra, além de ser submetida à forma e, também, descarac- terizada por ela, resultando em espaços amorfos (COLIN, 2000), muitas vezes, criam superfícies indefinidas que não sabemos distinguir, efetiva- mente, se pertencem ao interior ou ao exterior da volumetria (DORFMAN, 2014). Em relação às figuras importantes da Arquite- tura Desconstrutivista, podemos ilustrar o arqui- teto americano Peter Eisenman: um personagem- -chave no estudo da desconstrução, que teve um influente trabalho teórico, relacionado ao desen- volvimento de novas geometrias (DORFMAN, 2014). Além dele, o canadense Frank Gehry é o grande artista desta prática arquitetônica, pos- suindo obras notáveis pelo mundo todo. Um ex- poente de sua arquitetura é o Museu Guggenheim, em Bilbao (Figura 8) (TIETZ, 1998). Figura 8 – Museu Guggenheim, Bilbao, Espanha (1997), Frank Gehry O Desconstrutivismo, contudo, também é repre- sentado por arquitetos, como Bernard Tschumi, Daniel Libeskind, o grupo Coop e Zaha Hadid (TIETZ, 1998). Arquitetura da década de 90 A queda do muro de Berlim, em 1989, repre- sentou o fim da bipolarização mundial entre Bloco de Leste e Bloco Ocidental e, consequen- temente, o início de uma nova ordem política. Com a extinção da União Soviética, começou um processo moroso de democratização aos paí- ses que representavam as Repúblicas Populares (TIETZ, 1998). Assim, os anos 90 representaram um período de mudanças e o início de novas possibilidades projetivas que pudessem abrandar os problemas sociais e os numerosos conflitos étnicos. Edifí- cios de habitação, escritórios, fábricas e museus continuaram a ser importantes tipologias arqui- tetônicas, embora a crescente pressão dos custos financeiros, em nível mundial, refletissem conse- quências em suas imagens e concepções. Foi tam- bém a década de uma cultura mais contemplativa da memória, isso em decorrência de várias razões, sobretudo, do aniversário de 50 anos do fim da Segunda Guerra Mundial (TIETZ, 1998). A partir dessa década, a arquitetura começou a incorporar obras que também podiam ser en- tendidas como esculturas monumentais. Esse é o caso válido para os edifícios de Daniel Libeskind, que se expressam na complexidade de uma lingua- gem formal que, entre vários adjetivos, também respeitam a história do lugar no qual são inseridos (TIETZ, 1998). Outro arquiteto relevante é o português Álvaro Siza Vieira. Uma das suas principais obras é o Pa- vilhão de Portugal da Expo de 98 (TIETZ, 1998). 115UNIDADE III Diferentemente do passado, quando a expressão arquitetônica era submetida a um inquestionável padrão técnico, hoje, notamos que a arquitetura não sofre tantas restrições e, praticamente, tudo o que é pensado, dentro de um limite razoável, pode ser projetado e executado (COLIN, 2000). Na prática atual, até a arquitetura condizente ao credo modernista não se limita apenas aos seus princípios rígidos, admitindo incursões históricas, linguísticas e de outras disciplinas pertinentes, almejando o enriquecimento do seu produto final (COLIN, 2000). Os softwares projetivos e os avanços tec- nológicos têm contribuído, significantemente, nesse aspecto, conferindo à arquitetura um novo patamar de desenvolvimento. A arquite- tura High-tech também tem sido um importante recurso no palco da arquitetura global das últimas décadas (TIETZ, 1998). Em outra vertente, porém, ainda temos uma produção arquitetônica que, voltada aos ideais consumistas e mercadológicos, se afasta das ver- dadeiras raízes do fazer arquitetônico. Está mais voltada à prática mimética, buscando uma “imita- ção fácil” da arquitetura que é realizada por todo o planeta. Panorama Atual da Arquitetura 116 Arquitetura Moderna e Contemporânea Deste modo, alguns projetistas seguem dispon- do protótipos consagrados em nível mundial, em qualquer contexto, de maneira imprudente. Tal situação é alimentada pela rapidez com que os meios de comunicação divulgam as obras reali- zadas mundo afora, por meio de revistas, livros e sites (COLIN,2000). Desde os tempos antigos, contudo, quando a arquitetura quer se desenvolver com qualidade, ela deve se manifestar como uma experiência que observamos em vários níveis e com a qual se pode achar soluções coerentes às imposições de cada época e entorno regional. O Palácio de Cris- tal, a Torre Eiffel e as primeiras construções em concreto armado são experiências deste tipo, que transportaram suas consequências para o século XX (TIETZ, 1998). Poesia em vidro Com o Palácio de Cristal, de Joseph Paxton (1851), foi iniciada a marcha promissora do vidro pela História. Do Pavilhão de Vidro, de Bruno Taut — concebido para a exposição da Werkbund, na Colônia, em 1914 — até as concepções dos arra- nha-céus, as possibilidades multifacetadas que as fachadas em vidro oferecem ainda fascinam a sociedade global. Na atualidade, um grande ex- poente da arquitetura do vidro é o arquiteto fran- cês Jean Nouvel, que apresenta obras imponentes em vários países (TIETZ, 1998). Arquitetura do ferro Se em um primeiro momento histórico, face à construção da Torre Eiffel e dos primeiros arra- nha-céus americanos, ainda se discutia se a arqui- tetura em ferro pertenceria à verdadeira arte ar- quitetônica, nos dias atuais, esse questionamento não é mais necessário. Isso porque, sem o efeito funcional e estético da arquitetura concebida em aço, a história arquitetônica do século XX, fun- damentalmente, seria impensável (TIETZ, 1998). Hoje, percebemos que a essência da engenha- ria aliada à arte moderna pode, inclusive, formar obras excepcionais de caráter simbiótico, como acontece nas obras esculturais de tantos arquite- tos, sobretudo, do espanhol Santiago Calatrava. Sua arquitetura fortemente expressiva, além de provocar associação visual com seres vivos, tam- bém desperta em nós grande excitação perceptiva (Figura 9) (TIETZ, 1998). Figura 9 - Museu de Arte de Milwaukee, USA, Santiago Calatrava Relação da arquitetura atual com o contexto urbano Quando nos referimos ao espaço cultural mo- dificado, tratamos, substancialmente, da malha urbana. É na cidade que as questões culturais são mais explícitas, pois ela absorve a acumu- lação cultural de várias épocas, sobrepondo, em camadas, os produtos das diversas estruturas e conjunturas políticas e sociais, que adotaram o seu campo espacial como ambiente de atuação (COLIN, 2000). 117UNIDADE III Em nossa época, percebemos os problemas re- lacionados à contextualização quando verificamos que os modos de compreensão e de execução da arquitetura multiplicaram-se ao longo do tempo. Muitas cidades, principalmente as mais antigas, estão repletas de monumentos e sítios históricos, convivendo, no mesmo contexto, com edifícios atuais, além de os próprios edifícios contemporâ- neos apresentarem diversidade entre si em razão do método ou da ideologia que seguiram na sua concepção. Tal panorama expõe nossa atenção visual a resultados estéticos que, nem sempre, são os mais satisfatórios (COLIN, 2000). Se uma das funções expressivas do arquiteto e urbanista é ordenar o espaço em que vivemos, é possível constatar que boa parte dos atuais centros urbanos não manifesta o melhor cumprimento dessa tarefa. Trata-se de um problema apresen- tado pelo século XX, em parte, ocasionado pelas práticas arquitetônicas modernistas. Em tempos anteriores, quando as cidades estavam em ple- na expansão, os métodos projetivos definiam a unidade formal dos espaços urbanos, sobretudo, pelas limitações técnicas que proporcionavam se- melhança no porte dos edifícios (COLIN, 2000). Por outro lado, a arquitetura recente estruturou- -se para responder ao constante desenvolvimento da sociedade, mas não se preparou para harmonizar-se adequadamente à arquitetura antiga. As grandes soluções modernistas, muitas vezes, desconsideram as referências do passado e as particularidades de outros contextos: geralmente, privilegiam a edifica- ção como objeto isolado, por vezes, em detrimento do todo urbano. A Arquitetura Moderna foi pensa- da para a renovação, e esse aspecto é visível na sua expressão característica, referente a edifícios, con- juntos ou cidades. As construções foram concebidas segundo discursos autocentrados que revelam suas próprias qualidades, mas, frequentemente, omitem o zelo pela integridade e harmonia dos contextos preexistentes (COLIN, 2000). Abordagem fenomenológica O método fenomenológico aplicado à arquitetura baseia-se na constatação de que, apesar de o ato arquitetônico subentender um processo racional que o oriente, o edifício mostra-se aos nossos sentidos por meio de sua aparência e de seu jogo de planos, cor, textura, ordenamento de elemen- tos, relação entre cheios e vazios, ritmo etc. Por isso, uma maneira de organizarmos os contextos, principalmente nos grandes centros urbanos, é procurar entender a arquitetura não apenas sob a sua roupagem estilística e conceitual (edifícios ecléticos, góticos etc.), mas no que tange ao seu aspecto atemporal, sendo capaz de entendê-la por meio da decomposição de suas formas, de seus contornos, de seus planos e suas relações de es- cala relativa. Assim, começaremos a perceber as suas qualidades e as dos complexos urbanos, que não precisam, necessariamente, relacionar-se a nenhum estilo dominante para demonstrarem tal relevância. Às vezes, uma edificação que, aparente- mente, não se enquadra nos tradicionais padrões de beleza preestabelecidos, pode ser importante em determinado meio, em razão de diversos fato- res envolvidos: ela pode ser expressiva pelo sistema estrutural ou material construtivo com o qual foi erigida, ou simplesmente pelo seu posicionamento privilegiado em relação a outros edifícios do con- texto, tornando-se uma volumetria importante na definição do seu campo espacial (COLIN, 2000). Podemos considerar, assim, que o fruir estético da arquitetura está intimamente relacionado às questões de apreensão e percepção que os objetos arquitetônicos oferecem à sociedade. A fenomeno- logia, portanto, auxilia nesse processo perceptivo, realçando a importância do nosso entendimento em relação às evidências arquitetônicas. Isso de- corre de uma reorientação metodológica, que visa estabelecer relação harmônica entre população, cidade e objeto arquitetônico (COLIN, 2000). 118 Arquitetura Moderna e Contemporânea Importância de considerações regionais Em séculos passados, a qualidade e o conforto das edificações eram respaldados em uma tra- dição cultural, adaptada às particularidades do lugar e da região, com o desenvolvimento de uma arquitetura que respeitava a topografia e o clima local, além dos materiais disponíveis no entorno. No século XX, a produção indus- trial e as inovações tecnológicas impulsiona- ram a prática projetiva da internacionalização e levaram à uniformização da arquitetura em todo o mundo (GAUZIN-MÜLLER, 2011). O Movimento Moderno foi o grande motivador dessa dinâmica, apresentando uma ideologia que não se preocupava com as questões regio- nais de onde suas obras seriam implantadas (CONNOR, 1993). A arquitetura, contudo, — mais do que qual- quer outra expressão artística — relaciona-se diretamente com as condições materiais do seu entorno. E, portanto, excluir aspectos históricos e geográficos, dentro dos quais ela se desenvolve, prejudica a compreensão plena do seu significado e da sua razão de ser (YVES, 2012). O caráter regional, segundo Gropius (1997), não pode ser obtido por meio de projetos que imitam despreocupadamente formas consagradas de outros contextos ou mesmo que empreguem modismos locais — que, muitas vezes, desapare- cem com a mesma velocidade com que surgem. Quando a concepção arquitetônica desenvolve-se com a identificação do contraste entre o modelo e a realidade na qual a obra será construída — em razão das diferenças climáticas e culturais, por exemplo — torna-se clara a diversidade que pode surgir na expressão projetiva, desde que o arquiteto compreenda-a e configure os dadoscorretamente em respeito aos fatores relevantes (GROPIUS, 1997). Regionalismo O Regionalismo é uma tendência arquitetônica que caracteriza seus projetos por meio da obser- vação e do respeito às condições naturais e sociais da região onde a arquitetura é concebida. Conse- quentemente, por isso se contrapõe ao internacio- nalismo desenvolvido pelo Movimento Moderno. Esta prática arquitetônica prioriza o terreno, o cli- ma, os costumes e os materiais construtivos locais, além de tentar harmonizar o edifício à escala e ao contexto imediato (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). Regionalismo Crítico Com uma ideologia similar, o Regionalismo Crí- tico também denominado Modernidade Apro- priada é uma tendência essencialmente presente na arquitetura latino-americana e que se refere à busca de soluções atuais aos mais variados desa- fios de seus países. É um movimento que objetiva reafirmar os valores tradicionais de uma deter- minada nação, utilizando, para isso, a linguagem A visão fenomenológica foi responsável por vá- rios trabalhos teóricos influentes, como os de Ke- vin Lynch e Aldo Rossi, representando um ponto inicial para um novo entendimento da cidade e de sua arquitetura. Tal abordagem influenciou uma das tendências mais responsáveis do pen- samento arquitetônico atual: o “Pós-Modernismo Contextualista”. Fonte: Colin (2000). 119UNIDADE III arquitetônica moderna. Esta prática apropria-se de materiais construtivos e de técnicas recentemente desenvolvidas, adaptando-os ao contexto físico, so- cial e cultural do lugar. Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy são grandes representantes dessa arquitetura, no Brasil (ALBERNAZ; LIMA, 1998b). Importância da abordagem ambiental A procura pela qualidade ambiental é uma ati- tude que remete aos nossos ancestrais, visando a um equilíbrio harmonioso entre homem e na- tureza circundante. Realizada durante séculos, sobretudo, na arquitetura doméstica e vernacular, esta preocupação foi deixada de lado depois da Revolução Industrial, período em que o homem começou a explorar os recursos do planeta de maneira desordenada, provocando degradação na natureza e, consequentemente, modificações climáticas (GAUZIN-MÜLLER, 2011). A cada dia que passa, tais danos tornam-se mais evidentes. Eles são resultados de quatro principais fenômenos: a expansão populacio- nal dos últimos anos; o desperdício de matérias- -primas e de fontes de energia; a degradação da água, do ar e do solo e a grande quantidade de resíduos produzidos. Em contrapartida, é pre- ciso encontrar soluções coerentes que possam garantir qualidade de vida às futuras gerações. Por isso, nos últimos anos, tornou-se primordial a abordagem do desenvolvimento sustentável dos recursos naturais. Sua aplicação na arqui- tetura e urbanismo envolve a competência de vários setores da sociedade, como dirigentes po- líticos, empreendedores, arquitetos e urbanistas, paisagistas, órgãos de fiscalização, industriais, construtores e operários da construção, além, é claro, da responsabilidade de cada usuário (GAUZIN-MÜLLER, 2011). A busca por alternativas ecológicas que aten- dam o setor da construção civil é tema recorrente nos debates que vêm ocorrendo em escala mun- dial, ao longo dos últimos anos. Desde a “Rio 92”, essa abordagem que prega o respeito ambiental vem sendo instituída nos parâmetros arquite- tônicos e urbanísticos de vários países. A União Europeia tem um papel ativo nessas aplicações, por meio de sua normalização comunitária e de alguns programas experimentais que propiciam o desenvolvimento de métodos comuns de concep- ção e facilitam o intercâmbio entre os profissionais de países distintos (GAUZIN-MÜLLER, 2011). A qualidade ambiental relaciona o conforto do homem ao desenvolvimento sustentável dos recursos naturais e ao controle dos resíduos. Apli- cado à arquitetura, tal conceito presume a inclusão de novas exigências no processo global da constru- ção e requer mudanças no comportamento de pro- fissionais e usuários (GAUZIN-MÜLLER, 2011). As respostas da arquitetura às diversas reivindi- cações ecológicas são variadas e não se atém ape- nas à economia de energia, à utilização consciente da água e ao emprego de materiais renováveis. A qualidade das obras sustentáveis também está pela diversidade de materiais construtivos utilizados, de modo a favorecer a eficiência de cada um e re- duzir ao estritamente necessário a quantidade de seu uso. A associação de madeira, concreto, aço e vidro, em uma edificação, atende tanto a sua neces- sidade construtiva quanto a valorização das qua- lidades de cada elemento, proporcionando uma construção mais adequada em relação a vários fatores (GAUZIN-MÜLLER, 2011). Não é possível avaliar efetivamente a respon- sabilidade da arquitetura em relação ao futuro do nosso planeta (TIETZ, 1998). O que podemos analisar é que o impacto da nossa arquitetura, no contexto de implantação, varia de acordo com a inserção da obra, com a sua morfologia, com o seu sistema estrutural, com suas necessidades energé- 120 Arquitetura Moderna e Contemporânea ticas e materiais utilizados (GAUZIN-MÜLLER, 2011). Por isso, temos o dever de pensarmos, cons- cientemente, nas nossas proposições arquitetô- nicas e urbanísticas, fazendo que a preocupação ambiental conduza a novas e adequadas possibi- lidades no século XXI. Tendências Futuras para a Prática Arquitetônica Na opinião de Gropius (1997), os estilos artísticos só deveriam ser caracterizados por historiadores de arte com respeito ao passado, pois não pos- suímos, no presente, o distanciamento necessário para medir os fatos objetivamente. Isso, muitas vezes, decorre da própria vaidade humana e por ciúmes que podem, de certo modo, distorcer a visão real dos acontecimentos. Por isso, é difícil delimitar hoje o que, possivelmente, será tendên- cia relevante da arquitetura no futuro, já que, para esse apontamento, precisaríamos de maior distân- cia temporal (TIETZ, 1998). De qualquer forma, Dorfman (2014) ressalta que a arquitetura não deve se engajar, constante- mente, em um processo de revolução permanente. Assim, é possível enumerar alguns movimentos arquitetônicos que podem marcar presença em um futuro próximo. As próprias tendências dos anos 80, como o Desconstrutivismo de Frank Gehry e o Racionalismo de Aldo Rossi, ainda con- tinuam a se desenvolver e evoluir, em permanente mutação, seguindo as exigências constantes que são impostas à arquitetura (TIETZ, 1998). Em um contexto recente, a arquitetura e a es- cultura, ao voltarem sua atenção aos acontecimen- tos históricos ou a personalidades ilustres, estão assumindo uma posição de natureza contemporâ- nea, que se orienta segundo um novo rumo para o futuro dessas categorias artísticas (TIETZ, 1998). Ademais, os tempos modernos permitem que os arquitetos influenciem-se mutuamente, fruto do progresso dos meios de comunicação e do in- tercâmbio cultural. Esse fato, ao mesmo tempo em que enriquece o desenvolvimento arquitetônico e permite uma base comum para o entendimento construtivo (GROPIUS, 1997), também preocupa alguns estudiosos, sobretudo, em relação ao des- caso que certos projetistas têm ao contexto de in- serção de suas obras. Muitas vezes, eles estão mais engajados em reproduzir protótipos universais, do que preocupados em respeitar a cultura, a tradição e os fatores climáticos e regionais das sociedades que receberão e utilizarão a sua arquitetura. Gropius (1997), na sua atuação como docente, sempre tentou estimular seus alunos no sentido de se deixarem influenciar pelas boas ideias alheias, enquanto se sentissem capazes de aceitá-las e as reelaborar interiormente. Contudo, advertia que depois era preciso enquadrá-las em um contexto que correspondesse às suas próprias convicções e à realidade construtiva. Assim, a arquitetura do século XX segue vigen- te para ser interpretada, explorada e recriada no século XXI (MONTANER, 2002). Essa concep- ção, porém, precisa ser acompanhadapor uma atitude consciente em relação a vários aspectos que envolvem o ato construtivo, sobretudo, no que tange a questões ambientais, regionais e culturais das sociedades envolvidas. A liberdade que nossa época presencia de po- der conceber uma arquitetura envolta pela prática da diversidade também evidencia um futuro pro- missor para a arquitetura, a qual deve ser explora- da de modo adequado, para não corrermos o risco de ter o futuro assinalado por uma arquitetura mediana, em que as ideias notáveis ficam, cada vez mais, em segundo plano. Além disso, vários outros caminhos podem conduzir a uma arquitetura melhor, dentre os quais, podemos destacar: 121UNIDADE III • maior integração entre os vários sistemas que envolvem o edifício, em especial a relação que deve existir entre estrutura e forma arquitetônica, preferencialmente, já nos primórdios da concepção projetiva; • adoção da prática denominada por Fabrí- cio (2002) como Projeto Simultâneo, que permita a integração precoce da equipe multidisciplinar em todas as fases de de- senvolvimento projetivo dos empreendi- mentos da construção civil; • busca por práticas construtivas que se re- lacionem com as questões de preservação ambiental e de sustentabilidade; • pesquisa constante que permita maiores avanços técnicos e tecnológicos, que pos- sam contribuir em vários aspectos para o aperfeiçoamento do setor construtivo, além de sinalizarem novas possibilidades de concepções arquitetônicas; • utilização mais frequente da tecnologia da informação como beneficiadora do pro- cesso projetivo; • uso cada vez mais efetivo de softwares que facilitam etapas projetivas das mais variadas disciplinas que atuam em con- junto, frente a possibilidades de inovadoras composições arquitetônicas. Em um panorama geral, cabe ao arquiteto, pelo menos na parcela que compete à sua atuação, conscientizar-se da sua responsabilidade e bus- car propostas que, cada vez mais, se consolidem na construção de uma sociedade e de um mundo melhor. Desta forma, caro(a) aluno(a), nesta unidade, pudemos fazer um mergulho na produção arqui- tetônica do século XX, entendendo melhor seu desenvolvimento e os desafios para os arquitetos do presente e do futuro. 122 1. A imagem a seguir ilustra a escola Bauhaus, escola de arquitetura do período moderno. Nela, podemos identificar as formas geométricas puras que compu- nham o edifício. Sobre o modernismo, é correto afirmar que: ) ( Teve como objetivo eliminar as formas construtivas e decorações tradicionais. ) ( O emprego de novos materiais de construção, como o concreto armado, aço e vidro, possibilitou que os edifícios tivessem expressão artística mais coerente com o espírito da época. ) ( Propunha uma aproximação com as construções dominadas pelos ornamentos historicistas. ) ( Os valores arquitetônicos considerados legítimos eram os de caráter volumé- trico e espacial. Assinale a alternativa correta: a) V,V,V,V. b) V,F,V,F. c) F,F,F,F. d) V,V,F,V. e) F,F,V,V. 123 2. Devido ao seu caráter pluridimensional, o minimalismo não é caracterizado um estilo ou corrente definida, mas pode ser encarado como um princípio opera- cional, que busca atingir considerável emoção estética e um impacto intelectual, usando recursos mínimos — o que, muitas vezes, dificulta o pleno alcance de seus objetivos (MONTANER, 2002). Sobre o minimalismo, observe as imagens a seguir: 1. Pavilhão de Barcelona – Mies van der Rohe 2. Museu do amanhã – Santiago Calatrava 3. MAAT Lisboa – Amanda Levete 124 São consideradas obras minimalistas: a) Apenas a 1. b) Apenas a 2. c) Apenas a 3. d) As obras 1 e 2. e) As obras 2 e 3. 3. A desconstrução não é propriamente um estilo, nem tão pouco deve ser confun- dida com destruição: pelo contrário, ela caracteriza uma ideia construtiva, ou seja, uma maneira libertadora de criar arquitetura como construção do imaginário, com raízes que se ligam à vida urbana moderna. Observe a imagem a seguir: I) O desconstrutivismo buscava formas que pudessem exprimir sensação de desestabilização e quase impossibilidade técnica. II) As obras desconstrutivistas caracterizam-se por formas que são intersectadas entre si, fragmentadas e, geralmente, inclinadas. III) O desconstrutivismo tinha como objetivo ressaltar o Modernismo clássico, buscando a caracterização nas formas do movimento moderno. IV) A obra é submetida à forma e descaracterizada por ela, resultando em espaços amorfos, onde não fica claro a divisão entre interior e exterior. Assinale a alternativa correta: a) Somente a afirmativa I está correta. b) Somente as afirmativas I e II estão corretas. c) Somente as afirmativas I, II e III estão corretas. d) Somente as afirmativas II, III e IV estão corretas. e) Somente as afirmativas I, II e IV estão corretas. 125 As formas do século XX Autor: Josep Maria Montaner Editora: Gustavo Gili Sinopse: o livro busca afrontar de maneira aberta a questão da forma na arqui- tetura do século XX, entendendo que os repertórios utilizáveis estão intimamente relacionados com a arte, a filosofia, a ciência e a contínua evolução da sociedade. Consciente ou inconscientemente, os autores analisados neste livro recorrem a diversos tipos de formas que, em cada caso, pertencem a posturas e lógicas muito diferentes e possuem raízes, mecanismos combinatórios e implicações científicas, filosóficas e sociais variadas. LIVRO 126 ALBERNAZ, M. P.; LIMA, C. M. Dicionário ilustrado de arquitetura. v. 1, verbetes da letra A até I. São Paulo: ProEditores, 1998a. ______. Dicionário ilustrado de arquitetura. v. 2, verbetes da letra J até Z. São Paulo: ProEditores, 1998b. BENEVOLO, L. História da arquitetura moderna. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2011. BRANDÃO, C. A. L. A formação do homem moderno vista através da arquitetura. Belo Horizonte: UFMG, 2006. CHING, F. D. K. Dicionário Visual de Arquitetura. Trad. Julio Fischer. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010. COLIN, S. Uma introdução à arquitetura. 3. ed. Uape, 2000. CONNOR, S. Cultura Pós-Moderna: introdução às teorias do contemporâneo. Trad. Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Edições Loyola, 1993. DORFMAN, B. R. A arquitetura e a diferença: uma leitura de desconstrução. Dados eletrônicos. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2014. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=mRiuDQAAQBAJ&print- sec=frontcover&dq=DORFMAN,+Beatriz+Regina.+A+arquitetura+e+a+diferen%C3%A7a:+uma+leitu- ra+de+desconstru%C3%A7%C3%A3o.&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwiMx8LgsIfYAhWxRN8KHdO- pAx4Q6AEIKDAA#v=onepage&q=DORFMAN%2C%20Beatriz%20Regina.%20A%20arquitetura%20e%20 a%20diferen%C3%A7a%3A%20uma%20leitura%20de%20desconstru%C3%A7%C3%A3o.&f=false>. Acesso em: 22 dez. 2017. FABRÍCIO, M. M. Projeto simultâneo na construção de edifícios. 2002. 350f. Tese (Doutorado em Engenha- ria) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002. Disponível em: <https://globalconstroi. com/images/stories/Manuais_tecnicos/2010/projecto_simultaneo_const_edificios/Projeto_Simultaneo_TESE1. pdf>. Acesso em: 5 dez. 2017. 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E. 129 130 PLANO DE ESTUDOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM • Reconhecer a importância que o desenho possui na prá- tica projetiva. • Conhecer a terminologia forma, relacionada com o seg- mento da arquitetura e diferenciar do termo formato. • Conhecer os elementos gráficos básicos para uma repre- sentação em superfície bidimensional, com abordagem de elementos visuais, conceituais e relacionais. • Conhecer as figuras primárias e as relacionar com as com- posições arquitetônicas. • Conhecer os sólidos regulares e suas inserções na con- cepção de formas arquitetônicas. • Reconhecer as diferenças entre as formas regulares e irregulares. Premissa em expressão gráfica Forma enquanto conceito Influência das figuras geométricas primárias na composição formal Influência dos sólidos regulares na composição formal e tipos de forma Elementos gráficos: visuais, conceituais e relacionais Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Premissa em Expressão Gráfica É pelo nosso olhar que o mundo bidimensional é instituído de significado, já que ele é fruto de uma criação essencialmente humana. A junção da largura e do comprimento define uma superfície plana que permite nos expressarmos graficamente por meio de um desenho. O desenho é um processo de criação visual que tem como propósito a trans- missão de uma determinada mensagem (WONG, 2010). Ele é um excelente meio com o qual pode- mos organizar e exprimir nossos pensamentos e as percepções visuais da nossa realidade tridimen- sional, além de possibilitar a representação de um objeto por meio dos sistemas de projeções, que englobam os sistemas de coordenadas cartesianas e os princípios da geometria descritiva (CHING; JUROSZEK, 2012). A linguagem da arquitetura também passa pelo processo de expressão gráfica, caracterizando uma gramática elementar da representação es- paço-formal por meio da linguagem do desenho (PIGNATARI, 2004). 133UNIDADE IV A conceituação do termo forma está, por vezes, relacionada com o contexto do segmento no qual se insere (COLIN, 2000). No sentido mais amplo, forma caracteriza os limites exteriores da matéria que constitui um corpo, conferindo a ele uma determinada configuração. Ela nos in- forma sobre a natureza da aparência externa de um objeto, sendo a imagem visível do conteúdo (FILHO, 2009). Considerando a acepção do termo para a abrangência arquitetônica, Colin (2000) apresen- ta dois conceitos que são contíguos ao da forma: um que lhe é precursor, a matéria; e outro que lhe segue, o conteúdo. Com relação à primeira conceituação, podemos entender forma como a configuração fornecida à matéria, visando pro- porcionar um objeto individualizado. O conteú- do da forma é aquilo que se mostra aos nossos sentidos de imediato, antes da reflexão que pos- samos ter sobre o objeto em questão. A forma de uma edificação é, portanto, uma junção entre seu contorno, massa, cor e textura, reunida sob um jogo de luz e sombra, além da relação e disposição de seus cheios e vazios. Forma enquanto Conceito 135UNIDADE IV Normalmente, a forma é apreendida como ocupando um espaço, embora também possa ser percebida como um espaço vazio, rodeada por um espaço ocupado. Ela é denominada forma positiva, quando é percebida como ocupante de um espaço, e negativa, no segundo caso (WONG, 2010). Baseada no mundo real, uma forma apresen- ta qualidade tangível e permite experiências tri- dimensionais, nas quais podemos caminhar em sua direção, aproximarmo-nos ou percorrer o seu perímetro, podendo ser visualizada de diferentes ângulos e distâncias (WONG, 2010). Os termos forma e formato, frequentemente, são utilizados como sinônimos, mas isso representa um grande equívoco. Formato caracteriza a configuração dos contornos que delimitam uma área. Quando se atribui volume ou espessura a um formato, podendo ser visto de diferentes ângulos, este elemento se transforma em uma forma (WONG, 2010). Forma, portanto, aborda tanto as estruturas internas quanto os contornos exter- nos de um objeto, sendo atribuída de um sentido de massa tridimensional ou volume. Ela também se relaciona ao princípio que fornece unidade ao conjunto como um todo (CHING; JUROSZEK, 2012). Neste panorama, forma pode ser caracteriza- da como a maneira de arranjar e coordenar os ele- mentos e partes de uma composição, de modo que produza uma imagem coerente (CHING, 2002). É importante que você consiga distinguir cla- ramente o que caracteriza uma forma. Como a arquitetura é um segmento cuja essência se compõe com volumes de massa, o termo forma será largamente utilizado neste suporte didático. Segundo Wong (2010), a representação gráfica possui três conjuntos de elementos que norteiam o seu desenvolvimento: elementos conceituais, visuais e relacionais. Elementos conceituais Os elementos conceituais não existem fisicamen- te, mas podem ter sua presença sentida por meio da representação de um ponto, linha, plano ou volume (Figura 1) (WONG, 2010). Ponto Como gerador elementar da forma, o ponto marca uma posição em um campo espacial (CHING, 2002). É a mais simples unidade de uma comu- nicação visual e, conceitualmente, não possui di- mensão, sendo, portanto, fixo e sem direção (FI- LHO, 2009). Toda representação de um ponto exerce uma forte atração visual, seja ela de existên- cia natural, seja quando é produzida em resposta a algum objetivo (Figura 2) (DONDIS, 2007). Elementos Gráficos: Visuais, Conceituais e Relacionais 137UNIDADE IV Um ponto pode servir para demarcar duas ex- tremidades de uma linha, a intersecção de duas linhas, o encontro de linhas na extremidade de um plano ou volume, ou mesmo o centro de um campo visual (CHING, 2002). Quando o ponto assume a posição central de um campo, é considerado estável, capaz de orga- nizar outros elementos ao seu redor. Ao assumir uma posição descentralizada, ele se torna mais dinâmico, embora ainda conserve sua qualidade centralizadora. Formas que são geradas por pontos, como o círculo e a esfera, compartilham essa ca- racterística de natureza estável (CHING; BINGGE- LI, 2013). Em grande quantidade e justapostos, os pontos são capazes de criar a ilusão de tom ou cor (DONDIS, 2007). Figura 2 – Exemplo da atração visual que um ponto exerce em um ambiente Figura 1 – Demonstração de elementos conceituais Fonte: a autora. Ponto Plano Volume Linha 138 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Linha Em termos conceituais, a linha é um elemento unidimensional que possui apenas extensão contí- nua (comprimento) (CHING; JUROSZEK, 2012). É originada por um ponto estendido (Figura 3) que, por meio da sua trajetória de deslocamento, pode conferir à linha um caráter visual de direção, movimento e crescimento (CHING, 2002). Como função primordial, a linha delimita ares- tas e contornos, definindo as bordas das figuras planas (Figura 4a), além de poder ser usada para unir, sustentar ou interseccionar outros elementos (Figura 4b), marcar o local de união ou interseção de dois planos ou criar texturas e padrões nas super- fícies bidimensionais(Figura 4c) (CHING, 2002). O caráter visual de uma reta é estabelecido pela percepção entre a sua relação de comprimento e largura, além do seu contorno e grau de continui- dade (CHING; BINGGELI, 2013). Na estrutura visual, abre-se em alternativas informacionais, cuja função é influenciada pela orientação. En- quanto uma linha horizontal pode expressar es- tabilidade, o plano do solo, o horizonte ou mesmo um corpo repousando; a reta vertical representa um estado de equilíbrio com a força gravitacional, representando a condição humana ou demarcan- do uma posição no campo espacial. Já a linha oblíqua é visualmente ativa e dinâ- mica, denotando movimento de subida ou des- cida. Quando uma linha assume formato curvo, representa um movimento defletido por forças laterais e tende a expressar movimentos suaves. Em relação à orientação, pode ser ascendente ou representar solidez e afeição à terra. Se as curvas forem pequenas, a linha curva pode represen- tar energia ou padrões de crescimento biológico (CHING; BINGGELI, 2013). Figura 3 – Representação gráfica de um ponto em movimento originando uma linha Fonte: a autora. Figura 4 – Esquemas de utilização da linha Fonte: adaptada de Ching (2002). 139UNIDADE IV Elementos lineares na arquitetura Dentro do processo projetivo, as linhas são usadas como meios reguladores, visando expressar relacio- namentos e estabelecer padrões entre os elementos do projeto. Tradicionalmente, as formas de elemen- tos lineares têm sido empregadas para vencer vãos construtivos, proporcionar suporte vertical de es- truturas, expressar movimento por meio do espaço (Figura 5) e delimitar as arestas de volumes tridi- mensionais (CHING; BINGGELI, 2013). Aresta: corresponde a linha que forma a extremi- dade de uma superfície ou na qual duas superfí- cies de um sólido se encontram (CHING, 2010). Superfície ou face: qualquer figura geométrica que possui duas dimensões: largura e compri- mento (CHING, 2010). Em termos arquitetônicos, uma linha pode ser um elemento imaginável, assim como acontece com o eixo, uma linha reguladora definida por dois pontos distantes no espaço, divisor de uma figura por igual. Embora o espaço arquitetônico seja tridimensional, ele pode ter uma configu- ração de caráter linear, na qual uma edificação visa acomodar uma trajetória de deslocamento e relacionar seus espaços entre si. Além dessa dinâmica, os edifícios também po- dem assumir formatos lineares, adaptando-se às condições impostas pelo terreno ou necessidades pragmáticas. Os elementos retilíneos verticais, ca- racterizados pelas colunas, torres e obeliscos, têm sido empregados ao longo da história humana para comemorar eventos significativos (Figura 6) ou de- terminar pontos no campo espacial (CHING, 2002). Figura 5 – Templo de Luxor, Egito, 1392 a.C. Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)1. Obelisco: monumento alto de pedra, de aspecto quadrangular, que vai diminuin- do de espessura à medida que se eleva até atingir um ponto piramidal (CHING, 2010). Em escala menor, os elementos retilíneos podem articular as arestas e superfícies de planos e volumes (Figura 7). O modo como eles afetam a textura de uma superfície depende do seu peso visual, espaça- mento e direção (CHING, 2002). Plano A trajetória de uma linha em movimento (que siga uma direção que não seja a sua própria intrínseca) transforma-se em um plano. Conceitualmente, um plano possui comprimento e largura, além de posição e direção. É limitado por linhas e define os limites externos de um volume (WONG, 2010). Na Figura 8, vemos uma ilustração demonstrando que uma linha em movimento transforma-se em um plano e que a junção de planos constitui as fronteiras de um volume. Intrínseco: que constitui a natureza ou a essência de algo; que é próprio de algo; inerente. Fonte: Dicionário Michaelis. Figura 6 – Unity memorial, Frankfurt, Alemanha, 1903 Figura 7 – Catedral de Cristal, Califórnia (década de 1970), Philip Johnson 141UNIDADE IV O formato constitui a característica primária na identificação de uma figura plana. É definido como o contorno das linhas que estabelecem as arestas de um plano (CHING; BINGGELI, 2013). Além do formato, os planos têm relevantes características superficiais de materiais, cores, texturas e padrões (Figura 9). Segundo Ching e Binggeli (2013), essas propriedades suplementares são responsáveis por afetar uma forma plana em relação: • ao peso visual e à estabilidade. • ao tamanho percebido, à proporção e à posição no espaço. • à refletividade da luz. • à características táteis. Planos na arquitetura Como a arquitetura engloba a formação de volu- mes de massa e espaços tridimensionais, o plano pode ser considerado um elemento-chave no seu vocabulário de projeto, uma vez que delimita as fronteiras de um volume (CHING, 2002). As propriedades do plano (tamanho, for- mato, cor e textura) e o seu relacionamento no espaço definem os atributos visuais da forma e a característica do espaço que eles demarcam. No projeto arquitetônico, são manipulados três tipos genéricos de planos: de base, das paredes e superior (CHING, 2002), conforme pode ser visto na Figura 10. Figura 8 – Linha em movimento resultando em plano que constitui a fronteira de um volume Fonte: adaptada de Wong (2010). Figura 9 – Figuras planas sendo representadas por formato e características superficiais Fonte: Ching (2002). 142 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Plano de base: pode ser considerado como o plano do solo, que funciona como base para a construção do elemento arquitetônico, ou do piso, que delimita a superfície inferior de um ambiente. Em relação ao plano do solo, o seu caráter topo- gráfico, assim como o clima e as demais condições ambientais, pode influenciar o volume arquitetô- nico que será construído. Portanto, a edificação pode se fundir com o plano do solo, assentar-se sobre ele ou se elevar, considerando as intenções construtivas e/ou as particularidades do terreno. Por vezes, este plano pode ser manipulado, de modo que estabeleça uma base apropriada para receber a futura construção. Esta plataforma pode ser relativamente plana ou escalonada (Figura 11), permitindo que mudanças de nível sejam trans- postas (CHING, 2002). Plano das paredes: é importante para a molda- gem e definição do espaço arquitetônico e, devido à sua orientação vertical, é considerado de caráter ativo em nosso campo de visão (CHING, 2002). Os planos que representam as paredes externas se- param uma parte do espaço para criar um recinto que seja controlado, oferecendo-lhe privacidade e proteção contra os agentes climáticos. As aber- turas têm como missão restabelecer uma ligação com o exterior. À medida que as paredes limítro- fes moldam o interior, elas contornam o espaço externo e descrevem a forma, a massa e a imagem da edificação no campo espacial (CHING, 2002). Já as paredes internas são responsáveis pelo controle do tamanho e do formato dos am- bientes do edifício. Suas propriedades visuais, a inter-relação e o tamanho, além da distribui- ção das aberturas, determinam a qualidade dos ambientes construídos, assim como o grau de relacionamento entre os espaços contíguos (CHING, 2002). Como um elemento de projeto, um plano de parede pode ser tratado com um pano de fundo passivo ou de destaque, em virtude da sua cor, da forma, da textura ou do material (Figura 12) (CHING, 2002). Figura 10 – Três tipos de planos utilizados na arquitetura 143UNIDADE IV Figura 11 – Templo de Taktshang Goemba, Butão (1692) Figura 12 – Mesquita Sheikh Zayed, Abu Dhabi, Emirados Árabes Unidos Fonte: Pixabay ([2017], on-line)2. 144 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Plano superior: pode ser ca- racterizado tanto pela cober- tura que protege o interior de uma edificação dos elementos climáticos quanto pelo plano de teto, que demarca a super- fície superior de um cômodo (CHING, 2002). Diferentemente dos de- mais planos,o teto não nos permite um contato físico e, quase sempre, representa apenas um evento visual do espaço. Ele pode servir como um receptáculo para meios de expressão artística (Figura 13) ou ser tratado puramente como uma superfície passiva (CHING, 2002). Pode, ainda, ser rebaixado ou elevado para modificar a escala de um ambiente ou delimitar áreas especiais em um recinto. Sua forma tam- bém pode ser manipulada, a fim de incrementar a quali- dade acústica ou direcionar a incidência de luz dentro do compartimento (Figura 14) (CHING, 2002). Como elemento projetual, o plano de cobertura é signifi- cativo pelo impacto que pode desempenhar sobre a forma e o contorno de um edifício dentro do seu contexto local (Figura 15) (CHING, 2002). Figura 13 – Cúpula da Basílica de São Pedro, Itália (1506) Michelangelo Figura 14 – World Trade Center Transportation Hub, Nova Iorque, USA (2016), Santiago Calatrava Figura 15 – Capela Notre-Dame-du-Haut (Ronchamp), França (1950-55), Le Corbusier Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)3. 145UNIDADE IV Volume Conceitualmente, um volume pode ser definido como algo que se revela por projeção nas três di- mensões do espaço: comprimento, largura e pro- fundidade (FILHO, 2009). É resultante da trajetó- ria de um plano em movimento, que se dirige em uma direção que não seja a sua intrínseca (Figura 16) (WONG, 2010). A forma volumétrica abrange a aparência exter- na de um objeto em sua totalidade. A consideração inicial que se impõe sobre um volume é que ele seja considerado de dois modos: pode ser real ou físico, quando representa algo sólido como os planos de uma edificação; ou ser virtual, quando o perce- bemos como um volume por sugestão de alguns elementos (COLIN, 2000). Neste sentido, o volume representa uma situação ilusória, isto é, um efeito gráfico que pode ser criado por meio de artifícios sobre uma superfície plana (FILHO, 2009). Volumes arquitetônicos Como elemento tridimensional no quesito arqui- tetônico, um volume pode ser considerado vazio, caracterizado pela parte do espaço contido e defi- nido pelos seus planos (piso, paredes e teto/cober- tura) ou um sólido, representado pelo espaço que a massa de uma edificação ocupa. Essa dualidade de percepções de um volume é essencial, especial- mente para a leitura dos desenhos arquitetônicos – plantas ortográficas, cortes e elevações (CHING; BINGGELI, 2013). Considerando a primeira abrangência (volume vazio), fica evidente a afirmação de Sá (1982) de que é a forma, e não a dimensão, que define um espaço. Segundo Ching (2002), a forma é estabe- lecida pelos formatos e inter-relações dos planos que encerram os limites de um volume (Figura 17). A forma volumétrica pode se compor utili- zando como referência os sólidos regulares ou ser constituída por esquemas de associação de diversos volumes. O agrupamento mais comum é por justaposição, baseada na conjugação de ele- mentos formais (Figura 18). No entanto, a asso- ciação volumétrica também pode acontecer por articulação, quando um elemento intermediário faz a junção entre volumes, ou mesmo pela in- terseção, quando a sobreposição de dois volumes gera o surgimento de um elemento comum (CO- LIN, 2000). Os volumes arquitetônicos podem, também, ser relacionados de modo virtual, sem a presença de elementos físicos, por intermédio, por exem- plo, de formas semelhantes ou do uso do mesmo material de revestimento ou tratamento mural (Figura 19). O conjunto também pode compar- tilhar a mesma relação entre os elementos consti- tuintes, criando uma familiaridade entre dois ou mais volumes, de modo a integrá-los na mesma composição arquitetônica (COLIN, 2000). Figura 16 – Plano em movimento transformando-se em volume Fonte: adaptada de Wong (2010). Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo. Para acessar, use seu leitor de QR Code. 146 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Figura 17 – Bangkok University, Tailândia (1962), Architects 49 Figura 18 - Suntory Museum Tempo- zan, Osaka, Japão (1994), Tadao Ando Figura 19 – Edifícios com for- mas e materiais semelhantes 147UNIDADE IV Elementos visuais Em uma representação gráfica, desenhamos uma linha visível para simbolizar um elemento conceitual (WONG, 2010). Depois de es- tabelecidos os itens conceituais e eles se tornarem visíveis, variáveis podem lhes ser acrescentadas, visando à qualificação dos elementos e das articulações sistemáticas (PIGNATARI, 2004). Estas variáveis que englobam o formato, tamanho, cor e textura (Figura 20) re- presenta uma parte proeminente do desenho, já que constituem a aparência do que realmente pode ser visto (WONG, 2010). Formato O formato revela-nos a principal identificação de uma forma. Ele pode se referir ao contorno de uma linha, ao perfil de um plano ou ao limite de um volume tridimensional. Independentemente da situação, ele é identificado como a configuração das linhas ou planos que separa uma forma de seu fundo ou entorno (CHING; BINGGELI, 2013). A percepção de um formato acontece por intermédio da rela- ção com outros formatos ou do espaço no qual ele se encontra. No limiar da percepção visual, podemos distinguir que partes de uma composição se destacam contra um fundo menos evidente, carac- terizando a relação figura e fundo (CHING; JUROSZEK, 2012). Normalmente, as formas convexas são vistas como figuras, e as côncavas, como fundo (Figura 21) (RASMUSSEN, 1998). Há várias categorias de formato, como os na- turais, não figurativos e geométricos. Os primei- ros representam as for- mas e imagens do mun- do natural (Figura 22) e mesmo que sejam abs- traídos por um processo de simplificação, ainda conservam suas caracte- rísticas essenciais de ori- gem (CHING; BINGGE- LI, 2013). Figura 20 – Demonstra- ção de elementos visuais 148 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Já os formatos abstratos ou não figurativos não se referem de maneira óbvia a nenhuma matéria ou objeto específico: eles podem ser fruto de um processo convencional (como a cali- grafia), e ter significados como símbolos (Figura 23) (CHING; BINGGELI, 2013). Geralmente, o ambiente construído tem relação com os formatos geométricos, tanto os retilíneos (caracterizados por polígonos) como os curvilíneos (círculo) (CHING; BINGGELI, 2013). Na Figura 24 temos uma ilustração na qual, em primeiro plano, estão as formas de sólidos regulares e abaixo, o seu respectivo formato bidimensional. No segmento da arquitetura são considerados, em especial, os forma- tos dos planos de piso, paredes e teto (determinantes para a demarcação de um espaço); os vãos das esqua- drias que atendem aos ambientes e os contornos das formas arquitetô- nicas (Figura 25) (CHING, 2002). Figura 22 – Formato natural na Mesquita Sheikh Zayed, Abu Dhabi, Emirados Árabes Unidos Figura 23 – Formato abstrato repre- sentando símbolo de acessibilidade Figura 24 – Formas de sólidos regu- lares e seus formatos bidimensionais Fonte: Ching (2002). 149UNIDADE IV Tamanho A noção de medida é funda- mental para se compreender o campo espacial de um ambiente. Segundo Ching (2002), o tama- nho engloba as dimensões men- suráveis de comprimento, largu- ra e profundidade de uma forma. Embora essas dimensões possam identificar as proporções de um elemento, sua escala só é definida em comparação a outras formas relativas do contexto. Na Figura 26 vemos o Baku Flame Towers, que representa o arranha-céu mais alto de Baku, no Azerbaijão, com altura de 190 m. Figura 25 – Demonstração dos formatos utilizados na arquitetura Figura 26 – Baku Flame Towers, Azerbaijão (2007), HOK 150 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Cor A cor é considerada a parte mais emotiva do pro- cesso visual (FILHO, 2009). Como não possui existência material, é uma sensação provocada por certas organizações nervosas que são estimuladas pela ação da luz sobre o nosso aparelho visual (PEDROSA, 2010).A cor é impregnada de informação e signifi- cados simbólicos, constituindo uma das mais pe- netrantes experiências visuais compartilhada uni- versalmente (DONDIS, 2007). Por isso, ela pode ser entendida como uma linguagem e transmitir mensagens por intermédio de suas principais ca- racterísticas e tipos de contrastes. Na percepção visual, podemos identificar três dimensões que correspondem aos parâmetros básicos de uma cor: matiz, saturação e valor (DONDIS, 2007). Segundo Ching (2002), é por meio da impressão que temos em relação a estes parâmetros que conseguimos identificar uma cor como um fenômeno perceptivo por meio da luz. A primeira dimensão da cor é o matiz, que representa a cor em si. Existem três matizes pri- mários: amarelo, vermelho e azul, cada qual com Figura 27 - Casa Schröder, Utrecht, Holanda (1925) Gerrit Rietveld Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)4. suas qualidades fundamentais. O amarelo é a cor que consideramos mais próxima da luz e do ca- lor; o vermelho é mais ativa e emocional e o azul, representa a suavidade. Quando estas cores são associadas por misturas, novos significados são alcançados: o vermelho, por exemplo, é atenuado ao se misturar com o azul e intensificado com a associação ao amarelo (DONDIS, 2007). A Figu- ra 27 mostra a Casa Schröder, que representa o maior expoente do movimento artístico De Stijl, constituída por formas geométricas e cores pri- márias (ZORN, 2017). Em uma formulação simples, a estrutura da cor pode ser ensinada pelo círculo cromático, que engloba as cores primárias (amarelo, vermelho e azul) e as secundárias, que são criadas pela mis- tura das primeiras, resultando em laranja, verde e violeta. Neste diagrama, é comum serem inseridas misturas adicionais de cores de, pelo menos, doze matizes (Figura 28), originando múltiplas varia- ções de cores (DONDIS, 2007). A segunda dimensão da cor é a saturação, tam- bém chamada de intensidade, que se refere à pure- za relativa ou à vivacidade de um matiz (CHING, 2010). A cor saturada é simples e se compõe dos 151UNIDADE IV matizes primários e secundários. As cores menos saturadas conduzem a uma neutralidade cromáti- ca e, até mesmo, à ausência de cor. Portanto, os re- sultados informacionais fundamentam a escolha de uma cor mais ou menos saturada em virtude da intenção: quanto mais intensa for a coloração de um elemento, mais carregado de emoção ele estará (DONDIS, 2007). A terceira característica primordial de uma cor é acromática: é o brilho relativo, do claro ao es- curo, das gradações tonais ou de valor (DONDIS, 2007). O valor é o grau no qual uma cor aparenta refletir mais ou menos a luz incidente, e que cor- responde à claridade da cor percebida (CHING, 2010). Cabe ressaltar que a presença ou ausência de cor não atinge o tom, já que ele é constante. Portanto, cor e tom coexistem na percepção vi- sual, sem se modificarem entre si, mesmo com a variação da saturação. Como exemplo, podemos ilustrar o contraste simultâneo, presente na teoria da cor de Munsell, que instituiu as cores opostas no círculo cromático, baseando-se no fenômeno fisiológico humano da imagem posterior, isto é, da cor que vemos em um campo branco e vazio após termos fixado o olhar em alguma manifes- tação colorida por alguns segundos. A imagem posterior negativa de uma cor produz a cor com- plementar, que caracteriza cada uma dentre um par de cores opostas no círculo de cores (Figura 29) (DONDIS, 2007). Como a percepção da cor é um elemento emocional do processo de visão, ela possui gran- de força e pode ser largamente utilizada para expressar e intensificar uma informação visual (DONDIS, 2007). Em uma composição, a cor é o aspecto peculiar que mais claramente distingue uma forma de seu meio, além de afetar seu peso visual (CHING, 2002). No segmento do design, a utilização adequada de certos contrastes colo- ridos pode influenciar aspectos de um elemento (FILHO, 2009). Depois do contraste tonal estabelecido pela oposição de claro-escuro, o mais relevante talvez seja o quente-frio, que institui distinção entre as cores quentes, dominadas pelo amarelo e verme- lho, e as frias, representadas pelo azul e verde. O caráter recessivo da gama azul-verde pode ser uti- lizado para indicar distância, enquanto a natureza dominante da série amarelo-vermelho pode ser usada para sugerir expansão. Essas qualidades podem afetar a posição espa- cial, já que a temperatura da cor pode sugestionar distância ou proximidade (DONDIS, 2007). Além dessas, outras combinações de contrastes podem ser usadas para alterar a percepção de um elemento ou espaço. Essa percepção será criada em função da maneira na qual o contraste é organizado e se expressa de acordo com o contexto (FILHO, 2009). Efeito da cor na arquitetura Figura 28 – Círculo cromático com doze matizes Figura 29 – Exemplo de cor complementar em um círculo cromático 153UNIDADE IV Textura Podemos identificar a textura de um elemento pela objetividade do tato ou pela percepção visual. Em algumas situações, a textura é percebida pela combinação de ambos os sentidos. Na Figura 30, há um exemplo de obra que possui textura com qualidades táteis e visuais. No entanto, é possível que uma textura não possua qualidades táteis, apresentando apenas aspecto ótico. Inclusive, a maior parte da nossa experiência com a textura é de caráter visual (DONDIS, 2007). A textura aparente de uma superfície gráfica é fruto da combinação e inter-relação entre cores e valores tonais (CHING, 2010). Porém, sugerir visualmente o aspecto de uma textura também é possível em outros meios (que não sejam exclusivamente gráficos). A textura é falseada de modo bem convincente em certos padrões de tecidos, nos plásticos, em materiais impressos, nos pisos e revesti- mentos impressos em alta definição, nas pinturas etc. Ao tocarmos, por exemplo, a foto de um veludo sedoso, a experiência tátil não cor- responde à percepção visual. Assim, o significado baseia-se apenas naquilo que visualizamos. Quando há presença da textura real, as aparências táteis e óticas coe- xistem, não como tom e cor, que são unificados em um valor uniforme, mas de uma maneira específica, que possibilita uma sensação indivi- dual à mão e ao olho. A percepção visual costuma ser confirmada pelo toque (DONDIS, 2007). A textura estabelece relação com a composição de uma substância por meio de mínimas variações na superfície do material (DONDIS, 2007). Ela pode apresentar ou insinuar rugosidade, aspereza, brilho, opacidade e outras diferenciações possíveis de serem percebidas pelo tato e/ou visão. A escala, a distância de observação e a luz são fatores relevantes que alteram nossa percepção da textura e das superfícies que elas definem (CHING; BINGGELI, 2013). Embora todos os materiais apresentem algum grau de textura, quan- to menor for a escala de um padrão têxtil, mais suave será sua aparência. Até superfícies ásperas, quando visualizadas de certa distância, podem aparentar suavidade (CHING; BINGGELI, 2013). A escala relativa de uma textura pode, também, influenciar o for- mato e a posição aparentes de um plano no campo espacial. Textu- ras que possuem fibra direcionada podem acentuar a profundidade ou a largura de um plano, enquanto texturas ásperas podem sugerir que o plano está mais próximo e aumentar seu peso visual (CHING; BINGGELI, 2013). A luz é outro fator que influencia nossa percep- ção tátil. Quando é direta e incidente sobre uma su- perfície com textura real, a luz evidencia sua textura visual. Já a luz difusa retira a ênfase da textura física, podendo até obscurecer sua estrutura tridimensio- nal (CHING; BINGGELI, 2013). Superfícies polidas e lisas são capazes de refletir uma grande quantidade de luz, tornando-se bem visíveis e, consequentemente, atraem nossa atenção. Superfícies com rugosidade média ou que apresen- tam uma textura fosca absorvem e difundem a luz de forma desigual e, assim, parecem menos brilhantes(CHING; BINGGELI, 2013). É o caso do Walt Dis- ney Concert Hall, mostrado na Figura 31. Quando superfícies muito ásperas são ilumi- nadas com luz direta, acabam formando padrões distintos de luz e sombra (CHING; BINGGELI, 2013). A força ou a sutileza aparente de uma tex- tura também sofre influência de relações contras- tantes. Se uma textura é colocada contra um fundo liso e uniforme, aparenta mais legibilidade do que quando está justaposta a uma textura similar (Fi- gura 32). Quando uma textura é vista contra um fundo mais áspero, torna-se visualmente mais fina e de escala menor (CHING; BINGGELI, 2013). Figura 32 – Contraste influenciando o aspecto visual de uma textura Fonte: Ching e Binggeli (2013). Figura 30 – Praça da Federação, Belo Horizonte, Minas Gerais Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)5. Figura 31 – Walt Disney Concert Hall, Los Angeles, USA (concluída em 2003), Frank Gehry e sócios 155UNIDADE IV A textura também está intimamente relacionada com os padrões de elementos projetivos. Padrão é caracterizado como um tipo de desenho deco- rativo ou de ornamentação de uma superfície e, quase sempre, é baseado na repetição de um mo- tivo, seja ele de um formato, de forma ou de cor recorrente em um desenho. Frequentemente, o caráter repetitivo de um padrão também confere textura à superfície ornamentada. Quando os elementos constituintes de um padrão se tornam pequenos a ponto de perderem sua identida- de individual e se associarem, eles representam mais uma textura do que propriamente um padrão (CHING; BINGGELI, 2013). É o caso ilustrado na Figura 33. Em relação à configuração de um espaço interno, o modo como combinamos diferentes texturas é tão relevante quanto o tratamento estabelecido pela cor e luz. A escala de um padrão de textura deve se rela- cionar com a escala predominante do espaço e das principais superfícies, assim como deve considerar a dimensão dos elementos secundários da composi- Figura 33 – Mesquita da Cúpula da Rocha, no Monte do Templo, Jerusalém, Israel ção. Como a textura tende a preencher visualmente um ambiente, qualquer textura que for empregada em um recinto pequeno deve ser sutil. Já em um cômodo maior, a textura pode ser um artifício para reduzir a escala do espaço ou delimitar uma área íntima (CHING; BINGGELI, 2013). É possível combinar texturas duras e macias, regulares e irregulares, brilhantes ou foscas, desde que a sua distribuição seja coerente e moderada, considerando-se a sequência e a ordem (CHING; BINGGELI, 2013). A harmonia entre texturas contrastantes pode ser alcançada se elas possuírem uma característica em comum, como o grau de refletância da luz ou seu peso visual (CHING; BINGGELI, 2013). A Figura 34, por meio do recuso de Realidade Aumentada, nos mostrará, primeiramente, um ambiente bem texturizado, onde vários tipos de textura preenchem o espaço de maneira agradável. Em seguida, visualizaremos um ambiente que possui texturas concorrentes, que acabam poluindo visualmente o espaço. 156 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Figura 34 – Espaços internos com diferentes configurações têxteis Ilustração: Bruno Pardinho (2017). 157UNIDADE IV Elementos relacionais Os elementos relacionais governam a localização e as inter-relações das formas. Alguns podem ser percebidos, como é o caso da posição e direção, enquanto outros são apenas sentidos, como o espaço e a gravidade (Figura 35) (WONG, 2010). Posição A posição representa a situação de uma forma em relação ao ambiente ou campo visual dentro do qual ela é visualizada (Figura 36) (CHING, 2002). Figura 35 – Demonstração de elementos relacionais Direção A direção representa a orientação de uma forma em relação ao plano de solo, aos pontos cardeais, a outras formas ou à nossa observação (Figura 37) (CHING, 2002). Posição Direção Espaço Gravidade Figura 36 – Posição de um ponto dentro de um campo espacial Fonte: Wong (2010). Figura 37– Um cubo visto de vários ângulos 158 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Espaço Considerando o espaço real, ele pode ser visualizado como espaço ocupado positivamente, não ocupado ou internamente oco, como é ilustrado na Figura 38 (WONG, 2010). Gravidade A gravidade é um fenômeno real que influencia a estabilida- de de uma forma. Não é possível conceber formas suspensas no ar, sem apoiá-las ou as ancorar de alguma maneira. O material utilizado é responsável por es- tabelecer o peso da forma e a sua capacidade em suportar as cargas gravitacionais de outros elementos formais (WONG, 2010). A inércia visual de uma forma depende, também, da geometria e da sua orientação em relação ao plano de base, à atração da gravidade e a nossa linha de visão (CHING, 2002). Figura 38 – Área empresarial de La Defense - Paris, França 159UNIDADE IV A psicologia de Gestalt ressalta que o cérebro or- ganiza espontaneamente informações visuais em padrões simples para melhor compreendê-las: o ato de ver é, na verdade, um processo de ordena- ção (LUPTON; MILLER, 2008). Por meio desta teoria, independente da composição de formas apresentada, temos a vocação de reduzir o tema aos formatos mais simples. Por isso, quanto mais regular for o perfil de uma forma, mais fácil será percebê-la (CHING, 2002). Da geometria sabemos que as figuras regu- lares englobam o círculo e os polígonos regula- res. Destes polígonos, os mais significativos são o triângulo equilátero e o quadrado que, junto com o círculo, constituem as figuras primárias (CHING, 2002). A Figura 39 ilustra obras arqui- tetônicas inspiradas em figuras primárias: a 39(a) mostra a sede da Aldar, nos Emirados Árabes Unidos (2010), que é o edifício circular mais alto do mundo; na 39(b), temos a Catedral do Ártico, na Noruega (1965), de Jan Inge Hovig; e a 39(c) apresenta as janelas quadradas e retangulares do Edifício da CEPAL, em Santiago, no Chile (1966), de John Zacherle. Influência das Figuras Geométricas Primárias na Composição Formal 160 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica As formas básicas são figuras planas e simples, cada qual com características específicas e significados atribuídos. Essa simbologia é fruto de associações, vinculação arbitrária ou de nossa percepção de ordem psicológica ou fisiológica. Ao círculo se as- sociam proteção e infinitude; o quadrado assume caráter de honestidade e retidão, e o triângulo está relacionado com ação (DONDIS, 2007). A partir das possibilidades de combinação e variação dessas três figuras primárias, derivamos as demais formas físicas da natureza e também da nossa imaginação (DONDIS, 2007). Figura 39 – Obras inspiradas em figuras primárias Fonte: Shutterstock e Visualhunt ([2017], on-line)6. Gestalt: a “Psicologia da forma” é uma escola de psicologia que estuda os fundamentos da per- cepção humana e as bases de sua estrutura men- tal (COLIN, 2000). Considera-se que Christian von Ehrenfels foi o precursor, mas seu início efetivo aconteceu por volta de 1910, na Alemanha, por meio de Max Wertheim, Wolfgang Kohler e Kurt Koffk (FILHO, 2009). De acordo com as teorias gestálticas, o observador identifica e assimila mentalmente, de modo mais fácil, as formas mais simples, regulares e simétricas, segundo diversos princípios (MONTANER, 2002). 161UNIDADE IV Círculo O círculo é uma figura plana com formato linear, que separa o espaço que circunda do espaço circun- dante a ele (WONG, 2010). Um formato circular geralmente é estável e estacionário em seu ambien- te. Quando é associado a formas retas ou angulares (Figura 40) pode sugestionar um movimento de rotação aparente (CHING; BINGGELI, 2013). Os formatos curvilíneos são capazes de expri- mir fluidez de movimento, suavidade da forma ou a natureza do crescimento biológico (CHING; BINGGELI, 2013). Triângulo equilátero O triângulo equilátero é uma figura plana de três lados cujos ângulos e lados são todos iguais (DONDIS, 2007). Com frequência,os formatos e padrões triangulares são usados em sistemas estruturais construtivos, como é o caso das treli- ças espaciais utilizadas em coberturas (CHING; BINGGELI, 2013). Considerando a percepção visual, o formato triangular é estável quando apoiado sobre um dos seus lados, mas se torna dinâmico quando está sobre um dos seus vértices. Ele pode re- presentar um estado precário de equilíbrio ou sugerir movimento, já que tende a cair para um dos lados (CHING; BINGGELI, 2013). Figura 40 – Capitólio do Texas, USA (1885), Elijan Myers 162 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Quadrado O quadrado representa o puro e o racional e é com- posto por quatro lados com a mesma dimensão, que estabelecem ângulos retos nos cantos (DON- DIS, 2007). A igualdade de seus lados e ângulos contribui para sua regularidade e clareza visual, sendo considerada uma figura neutra e estática (CHING; BINGGELI, 2013). Quando se assenta em um dos seus lados, o quadrado é considerado estável, tornando-se dinâmico quando repousa sobre um dos seus vértices (CHING, 2002). Figura 41 – Pavilhão Filandês da Bienal de Veneza, Itália (1956), Alvar Aalto Fonte: Visuahunt ([2017], on-line)7. Ângulo reto: ângulo de 90º originado pela inter- secção perpendicular de duas linhas retas. Vértice: ponto em que os lados de um ângulo se interceptam. Em uma figura plana, representa o ponto oposto à base e o mais afastado dela. (Francis D. K. Ching). Na Figura 41, é possível ver o Pavilhão Fi- landês da Bienal de Veneza, de Alvar Aalto, um exemplo de arquitetura que referenciou sua composição no triângulo invertido, con- ferindo, assim, um caráter instável à forma. 163UNIDADE IV Quando as figuras primárias são colocadas em rotação, criam formas volumétricas ou sólidos regulares, que facilmente são reconhecíveis. Os círculos dão origem às esferas e aos cilindros, os triângulos originam os cones e as pirâmides, e os quadrados concebem os cubos (Figura 42). Neste contexto, o termo sólido caracteriza a fi- gura geométrica tridimensional que representa (CHING, 2002). Para Le Corbusier (1981), os sólidos regula- res são as grandes formas primárias que são bem reveladas pela ação da luz, por isso, considera-os como belas formas, capazes de nortear arranjos arquitetônicos. Influência dos Sólidos Regulares na Composição Formal 164 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Cilindro O cilindro é um sólido constituído por duas extre- midades circulares e paralelas de mesmo tamanho e um corpo formado por um plano contínuo e perpendicular à base e ao topo (WONG, 2010). Quando está apoiado sobre uma de suas extremi- dades, é considerado estável (Figura 43), mas se torna instável quando seu eixo central é inclinado (CHING, 2002). Esfera Esfera é um sólido gerado a partir da rotação de 360º de um semicírculo em torno de um eixo que possui o seu diâmetro (BENIGNO; BARRETO, 2000). Independentemente do ponto de vista, a esfera sempre conserva o seu formato circular e, assim como o círculo, é auto centralizadora e, normalmente, estável (Figura 44) (CHING, 2002). Cubo O cubo é um sólido prismático delimitado por seis faces, oito vértices e doze arestas. Cada face é um retângulo, e os seus ângulos são retos (WONG, 2010). Possui uma forma altamente reconhecível e é considerado estável, conforme mostra a Figura 45 (CHING, 2002). A Figura 46 traz outro exemplo arquitetônico de uma forma inspirada no cubo, só que, desta vez, como o cubo está apoiado em um vértice, a composição é dotada de um caráter dinâmico e instável. Figura 42 – Origem dos sólidos regulares CÍRCULO QUADRADO TRIÂNGULO 165UNIDADE IV Figura 43 – Proc. Geral da Rep., Bra- sília (1995-2002), Oscar Niemeyer Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)8. Figura 44 – Astana EXPO-2017, Cazaquistão Figura 45 – Biblioteca pública, Nice, França Figura 46 – Museu Nacional de Ciências (NSM), Tailândia Cone O cone é um sólido caracterizado por uma base circular e uma superfície lateral constituída por segmentos de reta de igual comprimento que, em uma extremidade, unem-se em um vértice e se amparam no outro extremo na circunferência da base (IEZZI; DOLCE; DEGENSZAJN; PÉRIGO, 2011). Segundo Ching (2002), é estável quando se apoia sobre sua extremidade circular mas instável quando seu eixo vertical é inclinado ou virado de cabeça para baixo, assim como mostra a Figura 47, com o Centro Nacional de Arte, em Tóquio, no Japão (2007), de Kisho Kurokawa e associados. Pirâmide A pirâmide é um poliedro de base poligonal cujas faces triangulares se encontram em um vértice (CHING, 2002). Na Figura 48, vemos um exem- plo de arquitetura referenciando-se na pirâmide como forma de composição. A pirâmide sugestiona um caráter instável quando se encontra apoiada sobre seu vértice (Figura 49) (CHING, 2002). A pirâmide engloba propriedades semelhantes as do cone, com dife- rença acentuada em relação à sua forma, que pode ser considerada dura e angular, ao contrário do cone, que é suave (CHING, 2002). Figura 47 – Obras inspiradas no sólido cone Figura 48 – Pirâmide do Louvre, Paris, França (1989), I. M. Pei Figura 49 – Monumento na Praça Rabin, Israel 167UNIDADE IV Tipos de formas Na arquitetura, a junção de elementos pode resul- tar em dois tipos de composição, caracterizados como formas regulares ou irregulares. Formas regulares As formas regulares são aquelas que possuem partes que se relacionam segundo um vínculo consistente e ordenado. Geralmente, as suas ca- racterísticas são estáveis, e suas formas simétri- cas, respeitando um ou mais eixos (Figura 50). Os principais exemplos deste tipo de forma são os sólidos primários (CHING, 2002). As formas regulares podem conservar sua re- gularidade visual mesmo com transformações di- mensional, aditiva ou subtrativa (CHING, 2002). Formas irregulares As formas irregulares são caracterizadas por pos- suírem partes desiguais, não apresentando víncu- los firmes que as unam entre si. Normalmente, são assimétricas e dinâmicas (Figura 51). Também podem apresentar-se como formas regulares das quais foram extraídos elementos ou como composição irregular de formas regulares (Figura 52) (CHING, 2002). Considerando que a arquitetura engloba mas- sas sólidas e superfícies espaciais vazias, é possível coexistir forma regular em uma irregular, ou vi- ce-versa (CHING, 2002). A Figura 53(a) mostra o Centre Pompidou-Metz, na França (2010), que de- monstra a coexistência de formas regulares den- tro de uma composição irregular e, a seguir, uma composição de elementos irregulares envoltos por uma forma regular, representada pela Biosfera de Montreal, no Canadá (1967), de Richard Fuller. Figura 50 – Massachusetts Institute of Technology in Cambridge, USA Figura 51 – Circuito de Yas Ma- rina, Emirados Árabes Unidos Figura 52 – Habitat 67, Montreal, Canadá (1967), Moshe Safdie 168 Princípios da Forma na Arquitetura e Expressão Gráfica Concluindo Por meio do exposto, podemos perceber que a gramática da arquitetura possui uma relação de estreita proximidade com a expressão gráfica, já que depende dos meios desta para se concretizar. Além disso, foram apresentadas várias possibilidades compositivas referenciadas na geometria de figuras primárias e sólidos regulares, que podem servir como inspiração para a prática projetiva. Figura 53 – Composições que englobam forma regular e irregular 169 Você pode utilizar seu diário de bordo para a resolução. 1. Relacione alternativa e sentença correspondente: I) Este conjunto de elementos não existe fisicamente, mas pode ter sua pre- sença sentida por meio da representação de um ponto, de uma linha, de um plano ou de um volume. II) Este conjunto de elementos governa a localização e as inter-relações das formas. Alguns podem ser percebidos, como a posição e a direção; enquanto outros são apenas sentidos, como é o caso do espaço e da gravidade. III) Estes elementos constituem a aparênciade um desenho e são representados pelo formato, pelo tamanho, pela cor e pela textura. a) Elementos Conceituais. b) Elementos Visuais. c) Elementos Relacionais. A correspondência certa é a seguinte: a) Ia, IIb, IIIc. b) Ia, IIc, IIIb. c) Ib, IIa, IIIc. d) Ic, IIb, IIIa. e) Ib, IIc, IIIa. 2. Os planos são elementos importantes na composição arquitetônica. Fale sobre os três tipos genéricos de planos utilizados na arquitetura: plano de base, plano das paredes e plano superior. 3. Na arquitetura, as composições podem resultar da junção de elementos, caracte- rizando formas regulares ou irregulares. Diferencie estes dois tipos de formas. 170 Princípios de forma e desenho Autor: Wucius Wong Editora: Editora WMF Martins Fontes Ano: 2010 Sinopse: Wong compôs um livro que representa um manual sobre os princípios e fundamentos práticos do desenho. Ele possibilita um conhecimento básico sobre os fundamentos do desenho, ressaltando as formas planas e abstratas e também demonstra possibilidades de criação de formas, enfatizando aspectos que ampliam o vocabulário visual do projetista. LIVRO 171 BENIGNO, B. F.; BARRETO, C. X. Matemática aula por aula: volume único – ensino médio. São Paulo: FTD, 2000. CHING, F. D. K. Arquitetura: forma, espaço e ordem. Trad. Alvamar Helena Lamparelli. São Paulo: Martins Fontes, 2002. CHING, F. D. K.; BINGGELI, C. Arquitetura de Interiores ilustrada. Trad. Alexandre Salvaterra. 3. ed. São Paulo: Bookman, 2013. ______. Dicionário Visual de Arquitetura. Trad. Julio Fischer. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010. CHING, F. D. K.; JUROSZEK, S. P. Desenho para arquitetos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2012. COLIN, S. Uma introdução à arquitetura. 3. ed. São Paulo: Uape, 2000. CORBUSIER, L. Por uma arquitetura. Trad. Ubirajara Rebouças. 3. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1981. DICIONÁRIO MICHAELIS. Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa. Intrínseco. On-line: Editora Me- lhoramento Ltda., 2018. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues- -brasileiro/Intr%C3%ADnseco/>. Acesso em: 23 jan. 2018. DONDIS, D. A. Sintaxe da linguagem visual. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. FILHO, J. G. Gestalt do objeto: sistema de leitura visual da forma. 9. ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2009. IEZZI, G.; DOLCE, O.; DEGENSZAJN, D.; PÉRIGO, R. Matemática Volume Único: ensino médio. 5. ed. São Paulo: Atual editora, 2011. LUPTON, E.; MILLER, J. A. (Orgs.). ABC DA BAUHAUS: a Bauhaus e a teoria do design. Trad. André Stolarski. São Paulo: Cosac Naify, 2008. MONTANER, J. M. As formas do século XX. Trad. Maria Luiza Tristão de Araújo. Barcelona: Gustavo Gili, 2002. PEDROSA, I. Da cor à cor inexistente. 10. ed. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2010. PIGNATARI, D. Semiótica da arte e arquitetura. 4. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004. RASMUSSEN, S. E. Arquitetura Vivenciada. Trad. Álvaro Cabral. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. SÁ, R. Edros. São Paulo: Projeto, 1982. WONG, W. Princípios de forma e desenho. 2. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010. ZORN, A. Diagramas da Casa Schröder revelam sua genialidade geométrica. Trad. Romullo Baratto. Arch Daily, 2017. Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/875475/diagramas-da-casa-s- chroder-relevam-sua-genialidade-geometrica>. Acesso em: 23 jan. 2017. 172 REFERÊNCIAS ON-LINE 1Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/19416597499/0735790d73/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 2Em: <https://pixabay.com/pt/mesquita-abu-dhabi-338809/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 3Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/10426264935/38fb5727a8/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 4Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/16036377622/fbd440a47b/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 5Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/5527910206/394547f911/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 6Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/4283217428/97143d4fd8/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 7Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/6432478975/a089d6b3b1/>. Acesso em: 3 nov. 2017. 8Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/18707881524/281cdde879/>. Acesso em: 3 nov. 2017 173 1. B. 2. O plano de base pode ser considerado como o plano do solo, que funciona como base para a construção do elemento arquitetônico ou do piso, que delimita a superfície inferior de um ambiente. No primeiro caso, pode responder a questões topográficas do terreno. O plano das paredes é importante para a moldagem e definição do espaço arquitetônico. As paredes externas delimitam um espaço interior e o protegem dos agentes climáticos. Já as paredes internas são responsáveis pelo controle do tamanho e do formato dos ambientes do edifício. Suas propriedades visuais, a inter-relação e o tamanho, além da distribuição das aberturas, determinam a qualidade dos ambientes construídos, assim como o grau de relacionamento entre os espaços contíguos. O plano superior pode ser caracterizado tanto pela cobertura que protege o interior de uma edificação dos elementos climáticos, quanto pelo plano de teto, que demarca a superfí- cie superior de um cômodo. Como elemento projetivo, o plano de cobertura pode impactar a forma da edificação. O plano de teto pode receber tratamento artístico ou ser manipulado, visando incrementar a qualidade acústica ou direcionar a incidência de luz dentro do compartimento. 3. As formas regulares são aquelas que possuem partes que se relacionam segundo um vínculo consistente e ordenado. Geralmente, as suas características são estáveis, e suas formas simétricas. As formas irregulares são caracterizadas por possuírem partes desiguais, não apresentando vínculos firmes que as unam entre si. Normalmente, são assimétricas e dinâmicas. 174 PLANO DE ESTUDOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM • Embasar sobre os temas que serão tratados nesta unidade. • Conhecer os princípios de transformação da forma ar- quitetônica, considerando o tratamento dimensional, subtrativo e aditivo. • Conhecer as possibilidades de agrupamento aditivo de formas. • Conhecer as possibilidades de esquemas de organização formal. • Saber sobre as ferramentas de articulação da forma ar- quitetônica, em relação à sua superfície, às suas arestas e aos seus cantos e conhecer os tipos perceptivos da forma arquitetônica. Premissa sobre a transforma- ção, organização e percepção da forma na arquitetura Transformação da forma arquitetônica Tipos de organização formal Articulação da forma e Ti- pos de percepção de uma forma arquitetônica Tipos de agrupamento formal Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Premissa Sobre a Trans- formação, Organização e Percepção da Forma na Arquitetura As composições formais que não são exclusiva- mente referenciadas nas figuras e sólidos primá- rios podem ser derivadas de suas transformações volumétricas e da articulação de suas superfícies, de suas arestas e de seus cantos. Essas transfor- mações são possíveis graças a um tratamento dimensional, subtrativo e aditivo dos sólidos arquitetônicos. Por meio da transformação adi- tiva, a configuração pode se desenvolver e se agru- par segundo diversos esquemas de organização que são responsáveis por dar à composição uma impressão de concepção unitária. Além da transformação formal, a percepção dos elementos construtivos é um parâmetro cru- cial para a análise da composição projetiva. Po- demos compreender a forma sobre o seu aspecto volumétrico, superficial ou espacial, por vezes, atribuindo maior valor a um destes quesitos. 177UNIDADE V Em certos tipos de edificações, o aspecto volumétrico da forma assume maior repre- sentatividade, em função de ressaltar uma utilidade social ou simbolizar feitos huma- nos. Independentemente do caráter da obra, vários fatores devem ser considerados na gênese construtiva, a fim de propiciar uma arquitetura adequada aos seus fins e anseios. Diversas composições da forma arquitetônica po- dem resultar da transformação de sólidosprimá- rios, quando estes são manipulados em relação às suas dimensões ou pelo acréscimo ou exclusão de elementos (CHING, 2002). Na Figura 1, temos al- gumas possibilidades de transformações formais. A Figura 1(a) mostra uma forma transformada por um tratamento dimensional, por meio do Grand Canal Square Hotel, em Dublin, Irlanda. A 1(b) mostra a Money-Shaped Building, na Chi- na, uma forma com tratamento subtrativo, e a 1(c) mostra um tipo aditivo de formas, representado pela Catedral Alexander Nevski, na Bulgária. Transformação da Forma Arquitetônica 179UNIDADE V Figura 1 – Possibilidades formais por meio de transformações Fonte: adaptada de Visualhunt ([2017], on-line)1,2 e Shutterstock. 180 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Transformação dimensional A transformação dimensional acontece quando uma forma se altera mediante a modificação de uma ou mais de suas dimensões, sem perder a iden- tidade à família geométrica à qual originalmente pertencia. Um cone, por exemplo, pode ser transfor- mado pela inclinação do seu eixo, assim como um cubo pode ser modificado em formas prismáticas semelhantes, por meio da alteração da sua altura, largura ou comprimento (CHING, 2002). Na Figura 2, vemos o Museu Nacional do Corpo de Marines: um exemplo de concepção arquitetônica gerada pela transformação formal. Neste caso, a obra inspirada em uma pirâmide teve seu eixo inclinado, fruto de uma transformação de caráter dimensional. Figura 2 – Museu N. do Corpo de Marines, USA (2006), C. Fentress Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)3. 181UNIDADE V Figura 3 – COEX, Seul, Coréia do Sul Figura 4 – Pauluskerk, Roterdã, Holanda (2013), Will Alsop Transformação subtrativa Uma forma pode ser alterada pela subtração de uma parte de seu volume (Figura 3). As formas geométricas simples (como os sólidos primários) se adaptam bem à trans- formação subtrativa, já que são facilmente re- conhecíveis. A forma manterá sua identidade formal se porções do seu volume forem re- movidas sem que sejam afetadas suas arestas, cantos e perfil geral. No entanto, se a extração remover uma parte significativa dos cantos, alterando o perfil do sólido, o resultado será ambíguo em relação à identidade original da forma (Figura 4) (CHING, 2002). 182 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Figura 5 – Museu da história dos judeus poloneses, Varsóvia, Polônia (2013), Lahdelma & Mahlamaki, Kurytowicz & Associados Porções de volumes podem ser retiradas com a intenção de criarmos entradas recuadas (Figura 5), espaço de pátios internos ou aberturas de janelas sombreadas pelas superfícies do recuo (CHING, 2002). 183UNIDADE V Figura 6 – Perot Museum of Nature and Science, Texas, USA (2012), Morphosis Architects Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)4. Transformação aditiva O tratamento aditivo é caracterizado pelo acréscimo de elementos ao volume do sólido (Figura 6). A natu- reza desse processo, juntamente com a quantidade e o tamanho dos elementos adicionados, é responsável pela alteração ou permanência da identidade original da forma (CHING, 2002). Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo. Para acessar, use seu leitor de QR Code. A configuração de uma forma aditiva é gerada pela relação ou acréscimo físico de uma ou mais formas subordinadas ao seu volume arquitetô- nico. As possibilidades básicas de agrupamento entre formas baseiam-se nas relações de tensão espacial, contato aresta com aresta, contato face a face e volumes interseccionais (CHING, 2002). Tensão espacial O agrupamento de tensão espacial baseia-se em uma relação de estreita aproximação entre as for- mas ou, ainda, no fato delas compartilharem uma característica visual comum, que pode ser referen- te ao seu formato, ao material ou à cor (CHING, 2002). A Catedral de São Basílio, na Rússia, apre- sentada na Figura 7, é um exemplo de composi- ção de agrupamento formal em tensão espacial. À esquerda, temos um esquema ilustrativo e, ao lado, a obra caracterizada neste arranjo formal, com proximidade de formas semelhantes. Contato aresta com aresta A composição formada aresta com aresta precisa de uma aresta comum às duas formas arquitetônicas para servir de eixo delimitante (Figura 8) (CHING, 2002). Tipos de Agrupamento Formal 185UNIDADE V Figura 7 – Esquema ilustrativo de tensão espacial e a Catedral de São Basílio, Moscou, Rússia Fonte: adaptada de Shutterstock. Figura 8 – Esquema ilustrativo e edifício com contato entre arestas Fonte: adaptada de Shutterstock. 186 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Contato face a face No agrupamento face a face é preciso que ambas as formas tenham superfícies planas correspon- dentes, que sejam paralelas entre si (Figura 9) (CHING, 2002). Figura 10 – Esquema ilustrativo de volumes interseccionais e o Centro de Justiça Civil, Manchester (2007), Denton Corker Marshall Fonte: adaptada de Visualhunt ([2017], on-line)5. Figura 9 – Esquema ilustrativo de contato face a face e a Torre Asem, Samsung-Dong, Coréia Fonte: adaptada de Shutterstock. Volumes interseccionais O conjunto formado pelos volumes interseccio- nais caracteriza-se pela mescla de volumes, em que cada forma penetra no espaço da outra (Fi- gura 10). Não é necessário que as formas tenham característica visual comum (CHING, 2002). 187UNIDADE V As formas aditivas criadas pela junção de outros elementos distintos podem crescer e se fundir a outras formas. Para que identifiquemos esta configuração como uma composição unitária, as formas aditivas precisam se relacionar seguin- do determinados esquemas de organização. Es- ses esquemas classificam os elementos aditivos conforme a natureza da relação entre as formas constituintes, assim como as suas configurações globais (CHING, 2002). Organização formal centralizada A organização formal centralizada é uma com- posição de caráter estável e concentrada, baseada em várias formas secundárias que se agrupam em torno de uma forma matriz central, considerada dominante (CHING, ECKLER, 2014). Na Figura 11, temos a Villa La Rotonda, de Andrea Palladio, um exemplo clássico de organização formal de caráter centralizado, em que as formas secundá- rias são iguais. Tipos de Organização Formal 188 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Figura 11 – Esquema ilustrativo de organização centralizada e a Villa La Rotonda, Itália, século XVI, Andrea Palladio Fonte: adaptada de Shutterstock. 189UNIDADE V No núcleo unificador, é interessante que haja predomínio visual de uma forma geometrica- mente regular (como uma esfera, cone ou cilin- dro), com dimensão adequada para reunir as formas adjacentes ao redor do seu perímetro. Se os espaços secundários forem equivalentes entre si, em termos de função, forma e tamanho, é gerada uma configuração global de caráter re- gular e simétrico ao redor de dois ou mais eixos (CHING; ECKLER, 2014). No entanto, as formas secundárias também podem assumir forma ou tamanho distinto (Figura 12). Isso possibilita satisfazer os re- quisitos individuais de função, expressar sua importância como elemento formal ou respei- tar seu ambiente circundante, considerando, inclusive, as condições ambientais do terreno (CHING, 2002). Já que uma organização centralizada não é direcional pelo caráter da sua própria nature- za, o seu acesso deve ser visível no terreno e no tratamento dos espaços secundários. Isso pode ser evidenciado por meio de um portal ou ou- tro elemento de destaque, como uma marquise (CHING; ECKLER, 2014). O padrão de circulação e movimento no in- terior de uma organização centralizada pode ter forma radial ou espiral; contudo, o padrão, ge- ralmente, terminará no espaço central ou ao seu redor (CHING; ECKLER, 2014). As organizações centralizadas são ideais tanto como estruturas iso- ladas no seu contexto (destacando um ponto no espaço) quanto como ocupantes do centro de um campo.Por isso, são indicadas para a construção de locais sagrados ou erguidos em honra a pessoas ou eventos significativos (CHING, 2002). Figura 12 – Exemplo de organização centralizada com formas diferentes 190 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Organização formal linear A organização formal do tipo linear pode resultar de uma alte- ração proporcional nas dimensões de uma forma (Figura 13) ou se caracterizar por uma série de formas que se dispõem sequen- cialmente em fila (CHING, 2002). Uma forma linear é flexível por natureza e pode responder às condições do sítio, podendo atender a mudanças na topografia, desviar de uma vegetação fechada ou mudar de direção, visando orientar seus espaços internos para melhor ventilação ou vistas agradáveis (CHING; ECKLER, 2014). Figura 13 – MASP, São Paulo (1957), Lina Bo Bardi Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)6. Sítio: em arquitetura, a palavra sítio é relacionada com a represen- tação de um lugar, de um terreno apropriado para uma construção. 191UNIDADE V Uma concepção linear é capaz de assumir naturezas variadas, de acordo com a necessidade imposta. Portanto, ela pode ser reta, segmentada ou curvilínea (Figura 14), desenvolver-se horizon- talmente pelo terreno, descer um declive na diagonal ou se erguer verticalmente, como uma torre (CHING; ECKLER, 2014). A forma linear de uma composição pode se relacionar com outras formas edificadas do seu contexto, possibilitando co- nectá-las e organizá-las ao longo de sua extensão, representar uma barreira que delimita campos distintos ou circundar uma porção de espaço (CHING; ECKLER, 2014). Figura 14 – Edifício Copan, São Paulo (1951), Oscar Niemeyer 192 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Figura 15 – Vista panorâmica a partir da Torre Eiffel, Paris, França Figura 16 – Trellick Tower, Inglaterra (1972), Erno Goldfinger 193UNIDADE V As configurações lineares com formas curvas ou segmentadas demarcam um espaço externo em seus lados côncavos e norteiam seus espaços para o centro desse espaço (Figura 15). Em seus lados convexos, essas formas representam uma barreira e excluem o espaço externo de seu campo delimi- tado (CHING; ECKLER, 2014). Geralmente, a organização linear é constituí- da por espaços repetitivos similares em relação à forma, à função e ao tamanho, mas pode, também, consistir em um espaço linear único, capaz de conjugar formas secundárias que podem diferir na sua forma, na função ou no tamanho (Figura 16) (CHING; ECKLER, 2014). Figura 17 – Localização de espaços relevantes à configuração Fonte: adaptada de Visualhunt ([2017], on-line)7. No esquema linear, é possível que haja espa- ços funcionais ou simbolicamente relevantes à configuração, enfatizados pelo seu tamanho ou forma. Eles ainda podem ser ressaltados pela posição que assumem na organização, poden- do se localizar no final da sequência, desloca- dos da organização ou em pontos principais de uma forma linear segmentada (CHING; ECKLER, 2014). A Figura 17 ilustra um es- quema de espaços relevantes à configuração, inseridos em pontos de articulação da forma linear. A seguir é mostrada a Prudential Center, em Nova Jersey, um edifício caracterizado neste arranjo formal. 194 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Em virtude do seu comprimento caracterís- tico, uma configuração linear transmite ideia de movimento e crescimento. Para restringir a sua expansão, ela pode ser encerrada por um espaço ou forma dominante, por uma entrada elaborada, pela fusão com outra forma arqui- tetônica ou pela topografia local (Figura 18) (CHING; ECKLER, 2014). Organização formal radial Uma configuração radial consiste em um ele- mento central a partir do qual se estende uma série de formas lineares, de maneira radial (Figura 19). O núcleo, geralmente, constitui o centro funcional ou simbólico da organização e pode assumir uma forma visualmente domi- nante ou se fundir aos braços radiais, tornando- -se subordinado a eles. Por intermédio dos bra- ços, o ordenamento radial pode se prolongar e Figura 18 – O Templo de Galtaji, Jaipur, Índia Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)8. se conjugar com elementos ou características específicas do terreno (CHING, 2002). Normalmente, o centro de uma organiza- ção radial é composto por uma forma regular, enquanto os braços podem ser distintos ou semelhantes, satisfazendo as exigências indi- viduais de função e contexto (CHING, 2002). Uma variação específica da configuração radial é caracterizada pelo padrão cata-vento, no qual os braços lineares prolongam-se a partir dos lados de um núcleo de geometria quadrada ou retangular. Esta configuração representa dina- mismo, já que sugestiona um movimento de rotação ao redor do núcleo (CHING; ECKLER, 2014). A Figura 20 mostra uma obra de Frank Lloyd Wright, caracterizada no arranjo formal do padrão cata-vento. De modo geral, a organização de caráter ra- dial é melhor visualizada do ponto de vista aéreo, já que facilita a compreensão em relação ao nível do solo (CHING, 2002). 195UNIDADE V Figura 19 – Organização radial: Sede Unesco, França (1958), Marcel Breuer Fonte: adaptada de Wikimedia ([2017], on-line)9. Figura 20 – Casa Herbert F. Johnson (Wingspread) USA (1937), Frank Lloyd Wright Fonte: Frank... ([2017], on-line)10. 196 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Organização formal aglomerada A organização aglomerada apoia-se na proximida- de física para relacionar suas formas. Geralmente, o ordenamento consiste em formas parecidas em tamanho, formato e função, dispostas visualmente em uma organização coerente e não-hierárquica, aglomeradas não apenas pela estreita aproximação das formas, como pela semelhança de suas carac- terísticas (Figura 21). Uma configuração agrupada também pode ser composta por espaços distintos, desde que estejam relacionados entre si pela pro- ximidade ou por um recurso de ordenação, como um eixo ou simetria (CHING, 2002). Como seu padrão não é oriundo de um concei- to geometricamente rígido, a forma de uma orga- nização aglomerada é flexível, podendo ampliar- -se ou se alterar sem afetar seu caráter (CHING; ECKLER, 2014). Conforme ilustra a Figura 22, várias são as possibilidades de organização aglo- merada de espaços: em torno da entrada de uma edificação, no percurso de uma circulação que envolva seus espaços ou confinados a um campo espacial definido (CHING, 2002). Além disso, as formas podem ser acrescenta- das como apêndices a um volume principal ou ter seus volumes interseccionados e se fundir em uma única forma, com variadas faces (Figura 23) (CHING, 2002). Figura 21 – Ministério da Justiça e Agência do Reg. Civil, Geórgia Figura 22 – Possibilidades de organização aglomerada de espaços Fonte: adaptada de Ching (2002). 197UNIDADE V Figura 23 – Annie Pfeiffer Chapel, USA (1941-58) Frank L. Wright Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)11. Figura 24 – Exemplos de configuração axial e simétrica, respectivamente Fonte: adaptado de Visualhunt ([2017], on-line)12. No padrão de uma configura- ção aglomerada, não há local de relevância inerente, portanto, o destaque de um espaço deve ser articulado pelo seu tamanho, sua forma ou sua orientação. Neste sentido, recursos, como a simetria ou a configuração axial, podem ser utilizados para for- talecer e unificar partes de um esquema agrupado, articulando a importância de um espaço ou de um grupo dentro da compo- sição (CHING, 2002). Na Figu- ra 24, podemos identificar uma configuração axial na primeira imagem, representada pelo The Acres, nos Estados Unidos (1949), de Frank Lloyd Wright, e uma composição simétrica na segun- da imagem, ilustrada pela Ópera de Saigon, no Vietnã (1900). 198 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Organização formal em malha Uma organização em malha engloba formas cujas posições espaciais e relações entre si são regula- das por uma malha tridimensional.Esta malha é caracterizada por um sistema de dois ou mais conjuntos de retas paralelas que são regularmente espaçadas e se entrecruzam, formando um padrão regular de pontos em suas intersecções (CHING, 2002). Na Figura 25, temos um exemplo de orga- nização formal em malha. O padrão de malha mais comum é oriundo da geometria quadrada. Quando ele é tridimensional- mente projetado, gera uma rede espacial de pontos e linhas de referência (Figura 26). No interior dessa trama modular, formas e espaços podem ser organi- zados visualmente, mesmo que apresentem diferen- ças no tamanho, forma ou função (CHING, 2002). Figura 25 – Kulturhaus, Wolfsburg (1962), Alvar Aalto Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)13. Figura 26 – Esquema tridimen- sional de uma malha quadrada 199UNIDADE V Como uma malha tridimen- sional consiste em unidades modulares, é possível que parte dela seja subtraída, acrescenta- da ou disposta em camadas e, mesmo assim, mantenha sua identidade como trama, capaz de organizar espaços. Estas manipulações podem ser esta- belecidas para criar uma entra- da, permitir o crescimento da configuração ou como forma de adaptação ao terreno (CHING, 2002). A Figura 27 mostra um exemplo de composição formal em malha, com acréscimo de unidades modulares. Uma malha também pode ter seu padrão interrompido para demarcar um espaço em destaque (Figura 28) ou adaptar uma característica específica do terreno (CHING, 2002). Figura 27 – Torre Cápsula Nakagin, Japão (1972), Kisho Kurokawa Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)14. Figura 28 – Cabanas chinesas tradicionais de Tulou, Fujian, China Além das transformações formais que podem caracterizar uma composição, o recurso da ar- ticulação é outra ferramenta importante na con- figuração final de uma forma. A articulação for- mal caracteriza-se pelo modo como se reúnem as superfícies de uma forma, visando definir o seu formato e volume. Um sólido pode se articular pelas arestas, pelos cantos ou pelas superfícies (CHING, 2002). Uma forma articulada apresenta, distintamen- te, a natureza de suas partes, assim como suas relações individuais e com o todo. Suas superfí- cies aparecem como distintos planos e formatos, conferindo à composição global alta legibilidade (Figura 29). De modo semelhante, uma articula- ção em um grupo de formas realça as juntas entre as partes, visando representar visualmente sua individualidade (CHING, 2002). Segundo Ching (2002), em relação à articula- ção, uma forma pode: • Diferenciar os planos vizinhos pela altera- ção do material, da textura ou da cor. Articulação da Forma 201UNIDADE V • Reforçar uma condição de canto com a in- trodução de um elemento separado, que seja independente das superfícies unidas por ele (Figura 30). Este elemento articula o canto como uma condição linear, defi- nindo as arestas dos planos próximos. Figura 29 – Centro Aquático Nacional de Pequim, China (2003), John Pauline Figura 30 – Pilar circular inserido entre duas paredes Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)15. 202 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura • Estender o material (Figura 31), a cor ou a textura de um canto para as su- perfícies vizinhas, diminuindo, assim, o destaque dos planos superficiais para reforçar o volume de uma forma. Figura 31 – Edifício de escritórios, Polônia Figura 32 – Museu Soumaya, México (1994), Fernando Romero • Arredondar cantos, com a intenção de expressar a continuidade da superfície e a suavidade da forma (Figura 32). 203UNIDADE V Figura 33 – Jardim das Belas Artes, Kyoto, Japão, Tadao Ando Figura 34 – Residência Bobertz (1953), Richard Neutra Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)16. • Excluir cantos que, separando fisicamen- te os planos, deterioram o volume da for- ma e indicam claramente as superfícies como planos no espaço (Figura 33). • Inserir aberturas nos cantos, ressal- tando a definição dos planos sobre o volume (Figura 34). 204 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Tipos de percepção de uma forma arquitetônica Conforme Colin (2000), a observação de uma forma arquitetônica pode acontecer de várias maneiras. Se a visualizarmos pelo lado externo, observando as suas relações com o meio circun- dante, seu contorno característico e sua com- posição de massa, estamos considerando a sua forma volumétrica. Para Corbusier (1981), o volume é o elemento pelo qual nossos sentidos percebem e medem a forma arquitetônica. É por meio de um jogo sábio, correto e magnífico dos volumes reunidos sob a luz que a arquitetura revela-se aos nossos olhos. Ao penetrar na edificação, não percebemos mais as relações com o exterior e conseguimos con- siderar apenas o espaço do ambiente com seus elementos entre si. Nesta circunstância, estamos voltados para a forma espacial (COLIN, 2000). Figura 35 – Superfície com tratamento diferencial do seu entorno • Contrastar entre a cor ou o material da superfície de um plano e aquela do en- torno, esclarecendo seu formato (Figura 35). A alteração do valor tonal de uma su- perfície tem relação com seu peso visual. Quando passamos a perceber os elementos divisórios (paredes) que separam o espaço ex- terno do interno e que, neste, são responsáveis pela organização e divisão dos recintos, estamos considerando a forma mural ou superficial da edificação (COLIN, 2000). A superfície é o en- velope do volume, capaz de anular ou ampliar a sua sensação. É tarefa do arquiteto fazer com que as superfícies que envolvem a forma volumétrica vivam, sem que, tornadas parasitas, devorem o volume, absorvendo-o em seu próprio benefício (CORBUSIER, 1981). Geralmente, essas três formas de percepção da mesma forma arquitetônica podem variar em relação ao grau de importância. O comum é que uma delas seja ressaltada em detrimento das de- mais (COLIN, 2000). 205UNIDADE V Percepção da forma volumétrica Independentemente da configuração de um edifício, o certo é que não conseguimos uma compreensão total e imediata da sua forma volumétrica, isso por- que nossa percepção sobre o volume arquitetônico é parcial e distorcida em virtude das deformações impostas pelas vistas em perspectiva (COLIN, 2000). Esta situação é demonstrada nas figuras a seguir: na Figura 36(a), temos uma maquete mostrando a configuração radial do conjunto arquitetônico por meio de uma vista aérea; na Figura 36(b), uma foto de uma das vistas da edificação, da maneira como a visualizamos no plano do solo, ou seja, sem con- seguir compreender seu arranjo formal na íntegra. As propriedades da forma são afetadas pelas condições de observação: uma forma pode ter formatos distintos conforme nosso ângulo de visão; o tamanho aparente da forma é afetado pela distância de observação; o campo visual circundante influencia a identificação da forma. Fonte: Ching (2002). Figura 36 – Maquete e foto da sede da Unesco, França, Marcel Breuer Fonte: adaptada de Wikimedia ([2017], on-line)17 e Shutterstock. 206 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Percepção de objetos: o cérebro funciona como uma central de processamento, e os sistemas sensoriais têm a missão de levar as informações a ela, convertendo-as em impulsos nervosos. Por- tanto, a percepção depende de processos, como detecção, transdução, transmissão e processa- mento da informação. Para compreender um elemento, depois que fixamos a sua forma, não estamos mais subordinados à visão para iden- tificá-lo. Isso caracteriza a constância: o modo pelo qual objetos vistos por diferentes ângulos e distâncias podem ser percebidos com a mesma forma, mesma cor e mesmo tamanho. Fonte: Collaro. A. e Collaro. I. (2014). De modo geral, a impressão que temos em rela- ção ao entendimento de um volume real acontece por meio de um dispositivo mental denominado “constância da forma”. É por intermédio dele, por exemplo, que entendemos que uma mesa é redon- da, mesmo ela apresentando uma forma elíptica, em uma vista perspectivada.Esta consideração é relevante em relação ao projeto, pois revela que a atividade projetiva possui muito de abstrato, e que algumas exigências que permeiam os esquemas de associação de partes do edifício nunca terão a sua re- presentação fidedigna na realidade (COLIN, 2000). A forma volumétrica em relação aos aspectos estéticos, funcionais e tecnológicos Segundo Colin (2000), a forma arquitetônica sur- ge por intermédio de um conjunto de ideias que o arquiteto tem sobre a arquitetura em si, estabe- lecendo relação com: • O programa de necessidades que deve so- lucionar. • O contexto local. • Questões históricas e socioculturais. • Questões técnicas e de materiais constru- tivos. • Recursos financeiros disponíveis etc. Estas premissas podem ser expressas na arqui- tetura por meio de três instâncias fundamentais que englobam a dimensão estética (ou simbólica), funcional e tecnológica do objeto arquitetônico (MALARD, 2006). A primeira dimensão refere-se aos aspectos artísticos e simbólicos da edificação, sofrendo influência e mantendo estreita relação com as emoções e crenças culturais de uma determinada sociedade. A abordagem estética está presente nos aspectos visuais e perceptivos da arquitetura tanto em relação ao interior como ao exterior das for- mas. É definida pelas articulações dos volumes, dos planos, das texturas e das cores (MALARD, 2006). No entanto, além do caráter artístico, a arqui- tetura também possui uma dimensão utilitária, que trata da organização dos elementos no espaço, visando atender às necessidades funcionais que envolvem nosso cotidiano (MALARD, 2006). O terceiro parâmetro refere-se à possibilidade da concretização efetiva da arquitetura, relacio- nando-se à abordagem tecnológica, que se fun- damenta nas questões de conhecimento técnico e das habilidades imprescindíveis ao desenvolvi- mento arquitetônico (MALARD, 2006). Em síntese, podemos encarar a arquitetura como um objeto contemplado na sua dimensão artística, usufruído na sua dimensão funcional e construído na sua abordagem tecnológica, carac- terizando uma reinterpretação da tríade vitruvia- na - venustas, utilitas e firmitas (MALARD, 2006). Embora o ideal fosse que as três dimensões pudessem ser contempladas de forma equivalente 207UNIDADE V – envolvendo, inclusive, outros fatores importan- tes − muitas vezes, uma dessas abordagens é negli- genciada em destaque das demais. Em projetos de edifícios industriais, por exemplo, as dimensões tecnológicas e funcionais são parâmetros impres- cindíveis, deixando de lado as questões de caráter estético (MALARD, 2006). No início do século XX, a tendência arquite- tônica do funcionalismo propôs que cada novo material fosse expresso por uma forma ditada pela função de uso do edifício. Nesta premissa, a in- tenção era unir forma e função no mesmo objeto arquitetônico, em que a dimensão utilitária fosse a principal formadora conceptiva (NETTO, 1979). Porém, na maioria das vezes, o que se verifica é o atributo estético assumindo papel relevante na composição arquitetônica. No período histó- rico, por exemplo, podemos destacar a catedral gótica como expoente desta abordagem: nela, os elementos simbólicos eram primordiais, e a di- mensão tecnológica desenvolvia-se para garantir o destaque artístico. Já a questão utilitária ficava negligenciada e aparecia apenas com o intuito de reafirmar a primeira dimensão (MALARD, 2006). Nos tempos atuais, a relevância do caráter estéti- co, geralmente, ocorre quando o edifício é destina- do a representar marcos arquitetônico e comemora- tivo, como memoriais e monumentos, assim como edificações de representatividade social e religiosa, como prefeituras, fóruns, igrejas, museus etc. Nesta prática, a função simbólica do edifício solicita uma forma volumétrica de destaque e con- dições adjacentes que lhe permitam sobressair em relação ao entorno. Tais condições podem, inclusive, ser proporcionadas pelas inovações nos sistemas estruturais e materiais construtivos, que caracterizam os aspectos da dimensão tecnológica (COLIN, 2000). É o caso da Figura 37, em que o emprego excessivo do titânio realçou a volumetria do Museu, de Eric Kuhne. Figura 37 – Museu Titânico, Reino Unido (2012), Eric Kuhne 208 Estudo da Transformação e Organização Formal na Arquitetura Embora as características estéticas da arqui- tetura não englobem plenamente a complexi- dade do edifício, são elas que revelam a forma arquitetônica ao mundo, tornando-a conhecida, contemplada, discutida ou, até mesmo, criticada. Muitas vezes, o discurso crítico atribuído a certa edificação está relacionado apenas aos aspec- tos visuais, embora os críticos acreditem estar analisando a arquitetura de forma mais global (MALARD, 2006). Para uma compreensão da totalidade arqui- tetônica, o mais assertivo é ir além dos aspectos estéticos da forma, considerando a arquitetu- ra e a sua relação com a essência humana, o contexto local e outros fatores fundamentais para uma concepção equilibrada (MALARD, 2006). Na visão de Montaner (2002), já que a forma é o motivo central da arquitetura, ela deve propiciar o acesso aos aspectos relevantes da concepção: cada opção volumétrica deve conjugar-se com alternativas relacionadas ao emprego da materialidade, à importância do uso e à relação com o espaço circundante. Em um panorama abrangente, as formas arquitetônicas devem expressar valores éticos, transmitir significado, reportar a marcos his- tóricos e culturais, assim como compartilhar critérios sociais (MONTANER, 2002). E isso somente pode ser alcançado em sua plenitu- de quando o arquiteto se preocupa em buscar igualdade na relação simbiótica entre os fa- tores cruciais da arquitetura, caracterizando- -os como princípios norteadores de uma boa composição. 209UNIDADE V Concluindo Assim, concluímos nossa Unidade V. Nela, apren- demos que a concepção formal caracteriza a re- presentatividade arquitetônica de determinada obra e pode ser composta por analogia às figuras e sólidos primários, assim como por esquemas de agrupamento. Cada forma pode sofrer transformações em partes do seu volume, por meio de tratamentos dimensionais, subtrativos ou aditivos. Aos volumes arquitetônicos ainda é dada a possibilidade de se agruparem e organizarem conforme arranjos que lhes garantam identidade única, por meio de or- ganizações de natureza centralizada, linear, radial, aglomerada ou em malha. Além da mutação for- mal, ferramentas de articulação também podem ser importantes para evidenciar uma composição. E quando a composição está pronta, temos três tipos de percebê-la, seja pelo lado externo – pelo seu espaço criado – seja pela percepção dos seus elementos divisórios. É certo que a compreensão desta forma será parcial e, de certo modo, distor- cida pelo nosso ângulo de visão. No entanto, de maneira geral, conseguiremos entendê-la por me- canismos mentais como a “constância da forma”. Entre os quesitos da percepção formal, é comum um assumir relevância em detrimento dos ou- tros. Geralmente, em edificações de caráter social e marcos arquitetônicos, são os atributos estéticos da forma volumétrica que assumem tal papel. Nesta unidade, compreendemos a importância que a forma tem no universo arquitetônico e que a relação de equidade entre os fatores indispen- sáveis para a sua concepção deve referenciar as diretrizes de uma arquitetura de qualidade. 210 1. A respeito da transformação e organização da forma, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F): ) ( Uma forma pode ser alterada pela subtração de uma parte de seu volume, mas isso sempre transfigurará a forma, a ponto de ela perder sua identidade original. ) ( É a natureza do processo de transformação aditiva, juntamente com a quanti- dade e o tamanho dos elementos adicionados, que caracteriza a modificação ou a permanência da identidade original da forma arquitetônica. ) ( A organização radial consiste em um elemento central a partirdo qual se esten- de uma série de formas lineares, de maneira radial. Uma variação desse tipo de configuração é o padrão cata-vento, no qual os braços lineares prolongam-se a partir de um núcleo circular. Assinale a alternativa correta: a) F, V, F. b) V, F, F. c) F, F, V. d) V, F, V. e) F, V, V. 2. As composições arquitetônicas podem se derivar de transformações nos volumes formais. Fale sobre as possibilidades de uma forma ser modificada por um tratamento dimensional. 3. A percepção dos elementos construtivos é um importante parâmetro para a análise da composição projetiva. Podemos compreender a forma sobre o seu aspecto volumétrico, superficial ou espacial. Descreva sobre a importância da forma volumétrica. 211 Arquitetura: forma, espaço e ordem Autor: Francis D. K. Ching Editora: Martins Fontes Sinopse: o livro apresenta um material didático ilustrativo muito importante para a gênese construtiva, abordando temas como estudo da forma e do espaço, tipos de organização formal, princípios de ordem formal e proporção e escala. LIVRO 212 CHING, F. D. K. Arquitetura: forma, espaço e ordem. Trad. Alvamar Helena Lamparelli. São Paulo: Martins Fontes, 2002. CHING, F. D. K.; ECKLER, J. F. Introdução a Arquitetura. Trad. Alexandre Salvaterra. São Paulo: Bookman, 2014. COLIN, S. Uma introdução à arquitetura. 3. ed. São Paulo: Uape, 2000. COLLARO, A. C.; COLLARO, I. R. Criação de embalagens competitivas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. CORBUSIER, L. Por uma arquitetura. Trad. Ubirajara Rebouças. 3. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1981. MALARD, M. L. As aparências em arquitetura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. MONTANER, J. M. As formas do século XX. Trad. Maria Luiza Tristão de Araújo. Barcelona: Gustavo Gili, 2002. NETTO, T. C. A construção do sentido na arquitetura. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1979. REFERÊNCIAS ON-LINE 1Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/8199668827/ec5c8e9eaa/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 2Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/285670789/11825fc5de/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 3Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/7382399052/1c39d57c9e/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 4Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/8144918158/c352b931b3/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 213 5Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/5886737715/2faef90f8b/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 6Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/3407312147/60930dddb0/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 7Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/7237766724/3cd8d86e8f/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 8Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/16719353996/9516548229/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 9Em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Maqueta_sede_UNESCO.jpg>. Acesso em: 6 nov. 2017. 10Em: <http://franklloydwright.org/site/wingspread/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 11Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/19950251784/9c51c07fb0/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 12Em: (a) <https://visualhunt.com/f2/photo/4639887452/92ce13e168/>. (b) <https://visualhunt.com/f2/pho- to/35798560860/4a43296cc1/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 13Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/5249282938/ff060bf131/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 14Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/19679014631/8aa8be0b09/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 15Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/8269964920/b5d1b4f94c/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 16Em: <https://visualhunt.com/f2/photo/10374514845/76c809d7dd/>. Acesso em: 6 nov. 2017. 17Em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Maqueta_sede_UNESCO.jpg>. Acesso em: 6 nov. 2017. https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Maqueta_sede_UNESCO.jpg 214 1. A. 2. A transformação dimensional acontece quando uma forma altera-se mediante a modificação de uma ou mais de suas dimensões, sem perder a identidade à família geométrica à qual originalmente pertencia. Uma pirâmide, por exemplo, pode ser transformada pela inclinação do seu eixo, assim como um cubo pode ser modificado em formas prismáticas semelhantes, por meio da alteração da sua altura, da sua largura ou do seu comprimento. 3. Em certos tipos de edificações, o aspecto volumétrico da forma assume maior representatividade, em função de ressaltar uma utilidade social ou simbolizar feitos humanos, como é o caso de fóruns, prefei- turas e marcos arquitetônicos. Porém cabe ressaltar que, independentemente do caráter da obra, vários fatores devem ser considerados na gênese construtiva, além do aspecto estético, visando propiciar uma arquitetura de qualidade que atenda aos seus fins e anseios. 215 216 PLANO DE ESTUDOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM • Entender o processo de manipulação do espaço na arquite- tura e a sua diferenciação em relação ao conceito de lugar. • Conhecer os elementos básicos e modificadores da arqui- tetura que, por meio de arranjos compositivos, influenciam na identificação de um lugar, e entender como o processo perceptivo e sensorial interfere na compreensão espacial. • Entender o projeto e a organização do ambiente construí- do por meio do espaço, significado, comunicação e tempo. • Aprender a planejar adequadamente os ambientes em relação ao seu dimensionamento, considerando as parti- cularidades de seus formatos geométricos e possibilidade de articulação espacial, além de entender como as abertu- ras e os planos definidores do espaço afetam a percepção da delimitação espacial. • Entender a importância da transição espacial e compreen- der as várias escalas que englobam a relação simbiótica das formas de massa e espaço em uma composição projetiva. Intervenção no espaço, ca- racterização de um lugar Elementos que influenciam a caracterização do lugar e Percepção espacial Delimitação e Dimensões do espaço na arquitetura Caracterização, Transição e relação entre os espaços Organização conceitual de espaço, significado, comu- nicação e tempo Me. Grasielle Cristina dos Santos Lembi Gorla Organização Conceitual do Espaço em Lugar Intervenção no Espaço, Caracterização de um Lugar Os objetos edificados, assim como as cidades, caracterizam um modo de humanizar o mundo, impondo-lhe um sistema visível de ordenação (SNYDER; CATANESE, 1984). Neste contexto, humanizar significa conceder ao ambiente refe- rências produzidas pelo homem, que facilmente sejam identificáveis por indivíduos de cultura semelhante (SILVA, 1994). A capacidade de transformar e intervir nas características do espaço vazio está na essência da experiência arquitetônica e caracteriza um dos seus maiores desafios (COLIN, 2000). A interven- ção do homem no espaço se dá pela verificação de que o estado natural das coisas pode ser corrigido, satisfazendo as condições fundamentais para o pleno desenvolvimento de suas atividades. Essa alteração tem vários propósitos, os quais incluem (SILVA, 1994): • A criação de um abrigo artificial que pos- sibilite segurança e conforto às pessoas, atividades e seus pertences. • O estabelecimento de uma referência de lugar. • A descrição do status social etc. 219UNIDADE VI Na realidade, não se trata, necessariamente, de corrigir a natureza, mas de melhorar algumas de suas insuficiências, como a limitada capacidade de abrigo, que só é viável em situações muito restritas (SILVA, 1994). Para Malard (2006), o ato de modi- ficar espaços com propósitos sociais é um processo intencional, dinâmico e um tanto dialético. Para elucidar essa condição contraditória de princípios, Silva (1994) argumenta que o espaço estabelece uma condição de possibilidade para a arquitetura acontecer, mas não é dependente dela. Na verdade, o conceito de espaço está presente em toda a nossa experiência existencial e não apenas na arquitetura. Por isso, sugerir que o objeto arqui- tetônico organiza, manipula ou produz o espaço só é aceitável como figura de linguagem, ainda que seja uma concepção sugestiva. Na realidade, não é possível organizar algo sobre o qual não se possui poder de manipulação. Se considerássemos a ar- quitetura como força organizadora ou produtora de espaço, possivelmente teríamos que considerar que a música e a dançaorganizam o tempo. E sabemos que isso é inverídico (SILVA, 1994). Silva (1994), entretanto, não sugere que as ex- pressões espaço arquitetônico ou urbano sejam banidas do vocabulário dos projetistas - já que são largamente utilizadas - mas acha prudente recorrer ao termo ambiente ao invés de espaço. Desta forma, ambiente arquitetônico tem a pos- sibilidade de caracterizar uma porção do volume atmosférico que é envolta pela edificação, e am- biente urbano, de abranger o espaço que já foi edificado por obras artificiais. Para ele, em tais denominações se pode conferir um sentido cul- tural, estético e sensorial que talvez não exista no conceito de espaço. Zevi (1996) define o espaço como o principal meio de expressão da linguagem arquitetônica que, ao assumir o papel de seu protagonista, pos- sibilita o local no qual a arquitetura pode se ma- nifestar efetivamente e organizar seus elementos. Silva (1994), no entanto, tem um posicionamento controverso, ao afirmar que a espacialidade do objeto arquitetônico é uma particularidade in- trínseca, já que as formas se desenvolvem obri- gatoriamente no espaço (um espaço dito como existencial), mas isso não converte a natureza em matéria-prima, protagonista ou detentora do as- pecto exclusivo da arquitetura. Para Silva (1994), a arquitetura não se realiza na produção ou ordenação do espaço, mas simples- mente na reorganização da matéria. Esse posicio- namento traz ao espaço o significado de lugar: um ambiente físico definido por um significado psico- lógico, cultural e/ou histórico que lhe é concedido. No campo da arquitetura, a expressão espaço é mais utilizada que o termo lugar, talvez pela apa- rente banalidade terminológica que este termo assumiu. De qualquer forma, o conceito de lugar é mais consistente para a teorização da arquitetura, já que assume uma dimensão antropológica mais compreensível (SILVA, 1994). Para diferenciar espaço de lugar, precisamos entender que o primeiro é físico, possui dimensões, localiza-se em algum local e pode sofrer modificações ao longo do tempo. Já lugar é um espaço que tem memória e algum senso de identidade, onde ocorrem atividades e eventos que são significativos à experiência humana. Fonte: Farrelly (2014). 220 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Podemos utilizar a arquitetura em arranjos específicos para identificar lugares, com o intui- to de nos situarmos e compreendermos melhor o mundo de maneira espacial (UNWIN, 2013). Em geral, haverá lugares significativos que são su- gestionados pelo tratamento conceitual proposto pelo arquiteto, mas o significado também depen- derá da resposta dada pelo usuário, que interpreta o lugar por meio de seus critérios subjetivos. Muitos destes critérios estão relacionados com a experiência pessoal de cada um (UNWIN, 2013). As experiências vividas são elementos fundamen- tais, que agregaram significado ao espaço. Muitas vezes, podemos compreender que o significado não está propriamente no espaço, mas nas ex- periências que, de certo modo, ele proporcionou (Figura 1) (MALARD, 2006). Qualquer tipo de significado tem origem na relação entre a percepção de certo elemento e a ca- pacidade humana de relembrar a experiência que viveu (SILVA, 1994). Nesta acepção, a arquitetura pode representar uma imagem de semelhança que, incorporando lugares, une elementos em uma or- dem que remete ao significado (MALARD, 2006). Entre os aparatos que podem representar este papel, o ambiente físico se impõe de maneira pri- vilegiada. No caso da arquitetura, esse ambiente é identificado tanto pelas formas edificadas quan- to pelas repercussões que elas desempenham no comportamento humano, incluindo o aspecto sensorial (SILVA, 1994). É a noção de arquitetu- ra como promotora da identificação de lugar que enfatiza o papel indispensável que tanto usuário como projetista realizam nela (UNWIN, 2013). Figura 1 – O significado do lugar está nas experiências vividas 221UNIDADE VI A arquitetura, portanto, tem relação com as pessoas, já que é feita por e para elas. Seu relacionamento se dá na maneira como as pessoas vivem e desempenham suas atividades, e sua influência possibilita o reconhecimento de um lugar (UNWIN, 2013). A arquitetura se altera e evolui à medida em que novas formas são inventadas ou aprimoradas, de acordo com as demandas do mo- mento (UNWIN, 2013). As formas são resultantes de um processo de manipulação da matéria: no seu desenvolvimento, fica explícito o esforço criativo e físico para que a matéria seja reorganizada, a fim de servir a um objetivo predeterminado. O manejo da forma arqui- tetônica deriva de uma reinterpretação do entorno existente, sendo criativa na medida em que define uma nova configuração para a matéria que originalmente pertencia à natureza (SILVA, 1994). O espaço arquitetônico é, portanto, um tipo de concretização do ambiente significativo, representando a materialização do que se pode também denominar de espaço existencial. Este gênero de espa- ço não pertence a uma categoria física, mas constitui um fenômeno de percepção afetiva historicamente condicionada (SILVA, 1994). Silva (1994) resume essa abordagem, observando que a arquite- tura reflete um anseio de aperfeiçoar as condições humanas. Embora o espaço existencial do homem seja determinado pela estrutura da natureza, suas necessidades e desejos criam uma forma de realimen- tação. Esta realimentação é fruto da consciência de que o ambiente natural é insatisfatório para as necessidades, anseios e expectativas humanas e, portanto, é passivo de aperfeiçoamento. A consequência desse aprimoramento, aliada à forma tangível, resulta no significa- do, o qual representa um importante atributo das manifestações arquitetônicas (SILVA, 1994). Tenha sua dose extra de conhecimento assistindo ao vídeo. Para acessar, use seu leitor de QR Code. 222 Organização Conceitual do Espaço em Lugar As obras arquitetônicas são fruto de concepções que podem ser originadas simplesmente por ele- mentos compositivos considerados básicos, como também pela combinação entre eles, resultando em formas mais complexas. Esses elementos são caracterizados como ideias abstratas, que ofere- cem condições para a arquitetura se desenvolver. Entre eles estão o terreno, o espaço, a gravidade, a luz e o tempo. O sítio funciona como um dado – uma espé- cie de princípio de ordem – com o qual vários aspectos da arquitetura se relacionam; o espaço é o meio que a arquitetura utiliza para suprir as necessidades e aspirações humanas, se moldando em lugares. A gravidade é capaz de suportar as formas, e a luz nos permite identificá-las. O tempo se relaciona com a nossa vivência (UNWIN, 2013). Esses elementos compositivos funcionam como instrumentos capazes de transformar o espaço em lugares, e a prática arquitetônica resulta da manei- ra como eles são organizados (UNWIN, 2013). Elementos que Influenciam a Caracterização do Lugar 223UNIDADE VI Forças modificadoras Quando os elementos básicos assumem a for- ma física durante a construção, outros parâme- tros entram em cena. Pela sua materialização e possibilidade de vivência humana, os elementos compositivos da arquitetura e os lugares que eles estabelecem são alterados por: a) aspectos, como luz, cor, som, temperatura, ventilação e cheiro; b) propriedades específicas e texturas dos materiais empregados; c) escala; d) utilização e experiên- cias que acontecem ao longo do tempo, etc. São experiências que acontecem ao longo do tempo etc (UNWIN, 2013). Os possíveis arranjos conceptivos de elemen- tos básicos e modificadores são, provavelmente, infinitos, envolvendo nosso cotidiano em várias possibilidades de composições arquitetônicas. Embora os elementos básicos representem o principal instrumento para o arquiteto organizar conceitualmente o espaço em lugares, as forças modificadoras contribuem muito para reforçar a identidade desses ambientes (UNWIN, 2013). Luz A luz é a primeira e maisrelevante experiência visual do ser humano, portanto, tirar partido do seu uso é uma condição essencial da arquitetura (CASTELNOU, 2003). Ela é caracterizada como uma energia que irradia uniformemente em todas as direções, diminuindo de intensidade à medida que se espalha. Quando a luz se move, nos revela as superfícies e as formas dos objetos no espaço. Se houver algum objeto em seu percurso, ele po- derá refleti-la, absorvê-la ou permitir que a luz incidente o atravesse (CHING; ECKLER, 2014). A principal fonte natural da luz é o sol, que produz uma iluminação intensa, podendo variar de acordo com localização geográfica, a estação do ano, o período do dia e as condições atmosféricas (CASTELNOU, 2003). Entretanto, a iluminação também pode derivar de um céu claro ou enco- berto (BROWN; DEKAY, 2004). Ao longo de períodos definidos, a luz vai se alterando e pode ser intencionalmente modificada (UNWIN, 2013). Para seu controle, podemos re- correr ao uso de elementos de proteção solar, como beirais, brise-soleil (Figura 2) ou mesmo persianas, com os quais exploramos esteticamente os níveis desejados de iluminação em um ambiente, nas distintas estações do ano (CASTELNOU, 2003). Brise-soleil é um elemento arquitetônico cons- tituído por uma série de peças, geralmente compostas por placas relativamente estreitas e compridas, que podem ser fixas ou móveis e são instaladas na frente de janelas para reduzir a incidência direta dos raios solares. (Dicionário Michaelis) Figura 2 – Beckenham Beacon, Inglaterra (2009) Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)1. 224 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Além da natural, podemos utilizar iluminação artificial em nossos espaços edificados. A quan- tidade e a qualidade da luz artificialmente produ- zida diferem conforme o tipo específico de lâm- pada utilizada (CHING; ECKLER, 2014). Tanto a iluminação natural como a artificial podem ser manipulada no projeto, a fim de criar sensações variadas e contribuir com a ambiência de um lu- gar, concedendo-o um aspecto peculiar (Figura 3) (UNWIN, 2013). Figura 3 – Capela do Mosteiro Beneditino, Chile(1962) Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)2. Efeito da luz Dependendo do caráter desejado para o local, a luz pode incidir de forma direta, indireta ou di- fusa sobre os objetos (CASTELNOU, 2003). A luz também pode ter relação com a função do local, já que atividades distintas exigem tipos diferentes de iluminação (UNWIN, 2013). As decisões de iluminação são relevantes em relação à organização conceitual do espaço e in- fluenciam no modo como reunimos os elementos básicos da arquitetura. Podemos, inclusive, mudar um lugar simplesmente alterando a maneira como ele é iluminado (UNWIN, 2013). 225UNIDADE VI Cor Uma alteração aparente na cor de um objeto pode ser simplesmente fruto dos efeitos provocados pela luz ou pela justaposição de cores de fundo (CHING; ECKLER, 2014). Isso exemplifica como cor e luz se comunicam intimamente na arquite- tura e ambas podem constituir aspectos impor- tantes para a identificação de um lugar (Figura 4). Diversas cores e tipos de iluminação podem ser intencionalmente usados para sugerir atmosferas específicas de ambientes (UNWIN, 2013). Temperatura A temperatura também é um elemento importan- te para a identificação de lugares (UNWIN, 2013). Vários espaços precisam de certas temperaturas para que as pessoas vivam e desempenhem confortavel- mente suas atividades. Essa temperatura agradável pode derivar de projetos que considerem corre- tamente a orientação solar em sua diretriz, assim como ser garantida pela introdução de climatização artificial nos espaços. Segundo Unwin (2013), ex- periências interessantes também podem resultar ao transitarmos por ambientes ou espaços que apresen- tem temperaturas distintas, relacionadas a diferentes fins (UNWIN, 2013). Figura 4 – Aeroporto Internacional de Miami, USA, Christopher Janney 226 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Ventilação A temperatura mantém relação direta com a ven- tilação e a umidade local. Juntas, permitem iden- tificar lugares que podem ser quentes, secos e sem ventilação; e outros que são frios, úmidos e venti- lados (UNWIN, 2013). A ventilação é um processo que fornece ou re- move ar de um ambiente por meios naturais ou me- cânicos. Trata-se de uma infiltração natural de ar, realizada, principalmente, pelas aberturas intencio- nalmente criadas na edificação ou por acionamen- to mecânico (BUXTON, 2017). Cabe ao arquiteto tirar partido dessas possibilidades de ventilação, tanto natural como mecânica, propiciando um espaço adequado à sua função e caracterizando o lugar de acordo com a intenção preconcebida. Odor O odor também pode ser responsável por criar ou identificar um lugar: os templos chineses possuem perfume de incenso; uma peixaria tende a ter um cheiro específico de peixe fresco; já o ateliê de um artista, um odor de tinta a óleo, e assim por diante. Muitos desses cheiros característicos podem deri- var da atividade ou dos produtos que estão em de- terminado lugar, mas, em alguns casos, resultam do próprio acaso. O arquiteto pode influenciar inten- cionalmente os cheiros de um lugar, estabelecendo, para isso, o uso de certos materiais que apresentam perfumes específicos e marcantes (UNWIN, 2013). Textura Conforme abordado anteriormente, a textura é uma qualidade tátil e/ou visual que certos objetos apresentam. A primeira forma caracteriza uma textura física, que pode ser sentida pelo tato. A textura aparente é percebida pela visão e pode ser caracterizada como um aspecto real ou ilusório (CHING; BINGGELI, 2013). Nossos sentidos de visão e tato são interligados, por isso, ao lermos uma textura visual, geralmente respondemos ao seu aspecto tátil sem a necessidade de tocar a superfície. As reações que apresentamos às características têxteis dos objetos se baseiam em associações prévias que estabelecemos com materiais similares (CHING; BINGGELI, 2013). Tanto a textura física como a visual podem contribuir para o reconhecimento de um lugar. A textura não só pode ser adquirida pelo acabamen- to das superfícies, com tinta, papéis de parede ou tecido, mas também pode estar interligada com as características intrínsecas dos materiais e aos modos de tratamento e utilização (Figura 5) (UN- WIN, 2013). A textura pode ser intencionalmente utilizada para prover o ambiente de características específicas, realçando o objetivo da concepção. Som O som pode ser um elemento tão significativo como a luz para identificar um lugar. É possível reconhecer lugares tanto pelo som que produzem, como pelo modo como tratam os sons gerados. Algumas reli- giões utilizam o som (sinos, por exemplo), para co- municar os horários e lugares de culto. Uma biblio- teca ou sala de exames pode ser caracterizada pela sua prática de silêncio, assim como um restaurante pela sua habitual música de fundo (UNWIN, 2013). Os lugares também podem ser identificados pela forma como tratam os sons produzidos em seu interior. Em uma enorme catedral, percebemos o som de uma forma específica, com seus ecos e reverberações prolongadas, diferente de um pe- queno dormitório bem forrado, que possui mobília estofada, tapetes, cortinas e almofadas, no qual o som é mais contido (RASMUSSEN, 1998). 227UNIDADE VI Escala Segundo Zevi (1996), a escala é um elemento essencial que define o caráter de uma obra ar- quitetônica, tanto no seu espaço interior como na sua volumetria global. Seu conceito para a arquitetura é primordial, já que relaciona as dimensões do edifício com as dimensões hu- manas, possibilitando que espaços e ambientes sejam produzidos considerando o fator homem em sua concepção. Tempo Se a luz é o primeiro elemento modificador da arquitetura, o tempo pode ser considerado o úl- timo, o qual compartilha diversas abordagens na arquitetura. Ainda que a intenção projetiva seja de edificar obras duráveis, todas sofrerão, de um algum modo,os efeitos do tempo. Figura 5 – Shopping Center MM, Polônia Desta maneira, os elementos construtivos po- dem se deformar lentamente pela imposição das cargas, os materiais podem mudar e se deteriorar com o tempo, as funções originais das edificações podem ser alteradas, as pessoas podem reformar os espaços ou os modificarem para atender a no- vas demandas etc. (UNWIN, 2013). Em certas circunstâncias, os efeitos temporais são benéficos, mas podem ser negativos em ou- tras. Normalmente eles são considerados naturais, já que não são controlados por decisão humana; no entanto, isso não significa que não possam ser previstos e utilizados de forma positiva. Ao invés de projetar algo que tenha aparência de novo, por exemplo, podemos escolher materiais específicos que transmitam ao objeto um aspecto de enve- lhecido ou patinado (Figura 6) (UNWIN, 2013). Em outra abordagem, o tempo na arquitetura se relaciona com o período necessário para que a edificação seja apreciada em sua existência física, conceitual e estética (UNWIN, 2013). 228 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Percepção Espacial Para que os elementos básicos e modificadores das composições arquitetônicas possam ser compreen- didos como influenciadores de um lugar, é preciso que entendamos como a percepção humana atua. Segundo Castelnou (2003), a percepção sobre o espaço começa com a etapa da captação sensorial, que é bem similar entre os indivíduos e necessária para a sobrevivência humana. Depois vem a cogni- ção, uma espécie de descrição de como as pessoas estruturam e compreendem o seu meio. Esse é um parâmetro que varia de acordo com a cultura de cada um. Com a apreensão destes dois aspectos, a avalia- ção finaliza o processo, baseando-se nas preferências e definição de valores e qualidades do espaço. Estes três aspectos que estabelecem a relação entre homem e espaço – percepção, cognição e ava- liação – devem ser simbioticamente considerados e são influenciados por experiências vividas, níveis de adaptabilidade e questões culturais. Compreen- demos, portanto, o espaço na arquitetura por meio de vias subjetivas, que se relacionam com os cinco sentidos humanos (CASTELNOU, 2003). Por intermédio da visão – o sentido dominan- te – podemos perceber o espaço pelas distâncias, Figura 6 – Construção de aço oxidado do Centro Europeu de Solidariedade, Polônia (2014), Fort Architects dimensões, formas edificadas, texturas, luzes e cores. A audição é um sentido mais transitório, responsá- vel por reconhecer estímulos acústicos. O olfato é um sentido emotivo de natureza imediata, capaz de evocar épocas e experiências vividas no passado. O tato se relaciona com a textura, por meio do toque das mãos e dos pés. Aliados aos sentidos, as pessoas possuem nervos sensoriais que indicam a posição e o deslocamento do corpo em relação a um espaço. Esta sensação recebe o nome de cinestesia (CAS- TELNOU, 2003). Segundo Castelnou (2003), a cinestesia atua por meio de uma estrutura proprioceptiva que sintetiza a percepção de movimento e mudança de posição, rela- cionando-se com aspectos de forma, movimento, ve- locidade, sentido e direção. Tal sentido foi explorado na concepção de espaços religiosos, principalmente das catedrais góticas, cujo pé-direito alto contribuía para uma postura de respeito diante do poder divino. Ao auxiliar na transição de percepções luminosas e sonoras, o sentido cinestésico contribui para a per- cepção da escala de um espaço, provocando variadas relações entre o indivíduo e o respectivo espaço arqui- tetônico (BONTA, 1979 apud CASTELNOU, 2003). 229UNIDADE VI A espacialidade é uma concepção que pertence à natureza do ser. É na arquitetura que, natural- mente, ela assume papéis funcionais e simbólicos, satisfazendo as aspirações inerentes à essência humana. O processo de espacialização é carac- terizado pelas atividades que desenvolvemos no espaço vivido, quando espacializamos nossas in- tenções (MALARD, 2006). Desta forma, conceitos, como tempo, espaço e evento são fortemente relacionados e não devem ser considerados de modo separado na concepção projetiva (MALARD, 2006). Para Snyder e Cata- nese (1984), o projeto do ambiente construído organiza quatro elementos principais em sua es- sência: espaço, significado, comunicação e tempo. Nesta acepção, o espaço assume papel de media- dor preliminar para que as coisas sejam dispostas e associadas, tanto entre si como entre as pessoas (MALARD, 2006). Essas relações são organizadas e possuem forma e estrutura, já que o meio am- biente não é um mero agrupador de coisas ao aca- so (SNYDER; CATANESE, 1984). Há, então, uma relação de reciprocidade entre espaço e disposição de elementos: as coisas não podem ser plenamente compreendidas sem a noção de espacialidade, e esta Organização Conceitual de Espaço, Significado, Comunicação e Tempo 230 Organização Conceitual do Espaço em Lugar não possui sentido concreto fora do seu relaciona- mento com as coisas (MALARD, 2006). Conforme já abordado, as organizações espa- ciais também podem ser compreendidas segun- do um planejamento projetivo que visa alcançar determinadas finalidades. Elas seguem regras es- pecíficas que refletem as necessidades, valores e desejos dos grupos ou indivíduos que realizam a ordenação (SNYDER; CATANESE, 1984). Quan- do o homem espacializa seus anseios e altera o ambiente, normalmente lhe atribui significado, dispondo recintos e objetos conforme uma inten- ção predeterminada (MALARD, 2006). Ao organizar significado, tratamos também das propriedades comunicativas de um espaço, cujo significado é, muitas vezes, materializado por sinais, formas edificadas, materiais, cores, mo- biliários, paisagem etc. (SNYDER; CATANESE, 1984). Esses elementos podem ser decodificados e compreendidos por indivíduos de culturas si- milares (MALARD, 2006). Quando as pessoas percebem e compreendem os sinais do ambiente, são capazes de reconhecer a identidade de cada espaço e a maneira adequa- da de se comportar nele, estabelecendo-se no contexto social. Os fatores associados ao relacio- namento entre as pessoas são importantes em relação ao modo como o ambiente construído e a organização social são caracterizados e integrados (SNYDER; CATANESE, 1984). A articulação dos espaços e a forma de integra- ção entre eles também assume papel relevante na questão do relacionamento entre as pessoas. Uma articulação pode estabelecer zonas que irão seto- rizar indivíduos que praticam a mesma atividade no espaço. Se por um lado a articulação propor- ciona união entre as pessoas que compartilham usos comuns, por outro, as separa de grupos que desempenham atividades distintas. Dependendo da periodicidade e do horário dessas atividades, pode ser que grupos utilizem os mesmos espa- ços físicos sem estabelecerem nenhum tipo de contato. Essa é uma demonstração de que o meio am- biente também possui características temporais e pode ser entendido como o ordenamento do tempo ou como a organização que influencia e traduz o comportamento humano no tempo. Isso pode ser compreendido de duas maneiras. O primeiro modo se refere à estruturação do tem- po cognitivo em escala, que estabelece relação com o tempo cíclico de passado, presente e futuro, além da abordagem que trata de como o tempo é avaliado e subdividido em unidades. Este último desdobramento influencia a segunda vertente, na qual o ordenamento do tempo pode ser analisado sob os aspectos de tempo e ritmo. A primeira con- sideração se relaciona com o número de eventos por unidade de tempo, e o ritmo, com a distri- buição das funções no decorrer do tempo, como, por exemplo, dia e noite. Os tempos e ritmos podem ser congruentes ou incongruentes entre si, fazendo com que pessoas sejam separadas no tempo ou no espaço. Como os aspectos temporais e espaciais se influenciam e agem mutuamente, vivemos no binômio tempo-espaço (SNYDER; CATANESE, 1984). Em síntese, a finalidade de organizar oes- paço e o tempo se relaciona com o ato de orde- nar e estruturar a comunicação entre as pessoas (SNYDER; CATANESE, 1984). Com a caracteri- zação de um lugar, a partir da concepção espacial, podemos esclarecer o modo adequado para as pessoas se comportarem em um contexto social. Além disso, os lugares remetem às experiências vividas e são imbuídos de significado. Para Silva (1994), o significado passa pelos lugares que a arquitetura configura. 231UNIDADE VI Além da forma, as dimensões e delimitações espaciais são importantes para caracterizar um ambiente arquitetônico. Delimitação do espaço na arquitetura As qualidades espaciais que envolvem aspectos como forma, proporção, escala, luz e textura, de- pendem das propriedades de delimitação espacial. Normalmente, nossa percepção dessas qualidades é uma resposta aos efeitos combinados das pro- priedades do objeto arquitetônico, sendo condi- cionada pela cultura, conhecimentos adquiridos, interesse ou inclinação pessoal (CHING, 2002). Delimitação e Dimensões do Espaço na Arquitetura 232 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Aberturas nos planos de delimitação As aberturas dos planos que demarcam um campo permitem a continuidade visual e espacial entre os espaços adjacentes, sejam eles caracterizados pelos ambientes internos de uma edificação ou entre a obra e seu entorno. As portas são responsá- veis por determinarem os padrões de movimento e o uso do ambiente, assim como possibilitam o seu acesso. As janelas propiciam a entrada de luz, som e ventilação ao recinto, e o relacionam aos espaços circundantes, oferecendo vistas do entorno (CHING, 2002). Um elemento relativamente recente na con- figuração das aberturas é a parede (ou pele) de vidro, que representa uma barreira física, mas não visual, entre o edifício e seu espaço externo (UNWIN, 2013). Apesar do aspecto de conti- nuidade que as aberturas possibilitam entre es- paços adjacentes, alguns fatores, como tamanho, quantidade e localização, podem caracterizar um enfraquecimento na delimitação espacial. Elas também podem afetar a orientação e o padrão de movimento dentro do espaço, assim como a qualidade de luz e das vistas oferecidas (CHING, 2002). Grau de delimitação espacial Ao adentrar uma edificação, percebemos uma sensação de fechamento e proteção, característicos da delimitação imposta pelo plano base, plano de parede, assim como o plano de teto. Esses elemen- tos arquitetônicos ressaltam e definem as frontei- ras físicas dos ambientes, além de separá-los dos espaços adjacentes internos e do campo espacial externo (CHING; BINGGELI, 2013). O grau que estabelece a delimitação de um es- paço, tal como é revelado pelo arranjo dos elemen- tos definidores e a disposição das aberturas, exerce grande influência na nossa percepção em relação à forma e orientação espacial (CHING, 2002). Quanto às aberturas, há pelo menos três pos- sibilidades projetivas que podem alterar a nossa percepção do espaço (CHING, 2002). Quando as aberturas são dispostas totalmente nos planos delimitantes não enfraquecem a definição de aresta, nem o caráter de fechamento do ambien- te. Assim, a forma espacial se mantém perceptível. As aberturas que estão ao longo das arestas dos planos de fronteira enfraquecem visualmente os seus limites. A vantagem é que proporcionam a continuidade visual e a interação entre os espaços adjacentes (Figura 7) (CHING, 2002). Figura 7 – Ben Rose House, Illimois (1953), James Speyer e D. Haid Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)3. 233UNIDADE VI Já as aberturas que são dispostas entre os planos de delimitação de um espaço são responsáveis por isolar visualmente os planos e articular a sua individualidade. Conforme aumenta a quantidade e o tamanho dessas aberturas, o espaço vai perdendo sua natureza fechada e se torna mais difuso, asso- ciando-se aos espaços vizinhos. Nessa situação, o destaque visual recai sobre os planos de delimitação e não mais no volume de espaço que por eles é demarcado (Figura 8) (CHING, 2002). Figura 8 – Esquema de aberturas entre planos delimitantes Fonte: Ching (2002). As dimensões atribuídas a um espaço interno, as- sim como sua forma arquitetônica, relacionam-se com dois aspectos que são complementares: um se baseia nas atividades que serão desempenhadas no ambiente e outro na materialização construtiva que o processo técnico permite realizar. Em primeira instância, o tamanho do ambien- te está diretamente relacionado ao sistema estru- tural utilizado, considerando a resistência de seus materiais, bem como o tamanho e o espaçamen- to conveniente de seus elementos, com respeito às suas limitações (CHING; BINGGELI, 2013). Ainda que estas dimensões sejam limitadas por necessidades estruturais, elas devem ser estimadas pelas exigências funcionais de seus usuários, assim como pela necessidade de definir limites físicos à forma (CHING; BINGGELI, 2013). Independentemente do tipo de atividade, as dimensões devem ser convenientes para propiciar Dimensões do espaço na arquitetura um uso adequado do lugar. O dimensionamento correto deve considerar a distância e a proximi- dade exigida entre pessoas, mobiliário e demais elementos, dependendo da intenção projetiva. É importante também que a circulação absorva o ta- manho estritamente necessário, para que o espaço global seja utilizado de forma plena. As dimensões certas são aquelas que tornam o espaço tão ma- nuseável quanto possível, utilizando o equilíbrio como um recurso fundamental para uma concep- ção espacial adequada (HERTZBERGER, 1999). Embora espaços individuais possam ser ori- ginados para fins específicos, eles são reunidos em um edifício por estarem funcionalmente re- lacionados, serem usados por um grupo comum de indivíduos ou compartilharem o mesmo obje- tivo (CHING; BINGGELI, 2013). É nesse sentido que podemos entender o processo de articulação espacial na arquitetura, que caracteriza um impor- 234 Organização Conceitual do Espaço em Lugar tante conceito na composição de ambientes. Um espaço pode ser articulado para se tornar menor e mais administrável. O modo como acontece esse processo é capaz de estabelecer se o ambiente será conveniente para um grande número de pes- soas ou para uma setorização menor de usuários, de acordo com a particularidade do uso (HERTZBERGER, 1999). Com a articulação, aumen- ta-se a aplicabilidade do espaço e este se expande, englobando uma multiplicidade de compo- nentes menores que permitem diversidade na utilização es- pacial (Figura 9). Como o am- biente pode ser utilizado para tarefas multiusos, consequen- temente se torna mais rentável (HERTZBERGER, 1999). Outra vertente da articula- ção está no equilíbrio entre pos- sibilidade de visão e reclusão imposta pelo lugar (HERTZ- BERGER, 1999). Os objetos e as pessoas mantêm relação por meio de vários graus de separação dentro e pelo espaço (SNYDER; CATANESE, 1984). O grau com que os espaços são abertos ou separados é decisão do arquiteto; ele pode utilizar de artifícios para manipular o espaço conforme uma necessi- dade específica de privacidade ou integração visual (HERTZ- BERGER, 1999). Figura 9 – Aeroporto Internacional de Dubai, Emirados Árabes Unidos 235UNIDADE VI Dimensões espaciais horizontais Considerando as dimensões de largura e profundidade, os espaços podem derivar de formatos qua- drados, retangulares, curvilíneos ou pela associação entre eles, almejando se adequar às funções do ambiente ou às características do terreno. Espaços quadrados Um ambiente de planta quadrada apresenta natureza estática e, geralmente, tem caráter formal. A natureza igual dos lados enfatiza o centro como foco do espaço, ainda mais se o ambiente for coberto por um domo ou uma estrutura piramidal. Para descaracterizar essa qualidade intrínseca, a forma do teto pode ser assimétrica ou composta por várias águas. Em alternativa, podemos inserir elementos arquitetônicos no espaço (como uma es- cada),além de tratar um ou mais planos de paredes de modo diferente em relação aos demais (CHING; BINGGELI, 2013). Em termos de composição, um espaço que apresenta largura correspondente à profundidade apresenta benefícios em relação à disposição do mobiliário. Espaços retangulares Embora um espaço quadrado seja preferível em várias circunstâncias, a dimensão dos terrenos atuais limita essa possibilidade, fazendo com que, geralmente, tenhamos ambientes de formato retangular. A vantagem desse tipo de espaço está na sua maior flexibilidade. Além da relação entre largura e profundidade, seu caráter e utilização são influenciados pela disposição das aberturas, seu relaciona- mento com os espaços vizinhos e pela configuração do teto (CHING; BINGGELI, 2013). Em situações em que a profundidade do ambiente é maior que o dobro da largura, ela estabelece controle sobre a disposição dos móveis e domina a utilização do espaço. Se a largura for adequada, o recinto poderá ser subdividido em várias zonas interligadas. Ambientes que possuem profundidades que são bem superiores à largura sugerem movimento ao longo de seu eixo maior, por isso são indicados para galerias ou conectores que unem outros ambientes (CHING; BINGGELI, 2013). Espaços curvilíneos A prática construtiva e a natureza da maioria dos materiais se adequam melhor a espaços de formato retangular ou quadrado, por isso espaços curvilíneos normalmente são utilizados para composições especiais (CHING; BINGGELI, 2013). 236 Organização Conceitual do Espaço em Lugar O mais simples deles é o circular, que é compacto e centrado. Sua relação com o entorno acontece de forma igual em todas as direções, a menos que outros elementos sejam incorporados na sua con- cepção para demarcar a entrada ou atender a ou- tros fins (Figura 10) (CHING; BINGGELI, 2013). É possível criar vários tipos de espaços curvilíneos (Figura 11), a partir da trans- formação de espaços circulares ou elípti- cos que, muitas vezes, são combinados por sobreposição (CHING; BINGGELI, 2013). Figura 10 – Shanghai Circus World, China Figura 11 – Museu Canadense dos Direitos Humanos, Canadá 237UNIDADE VI Em um contexto retilíneo, um espaço de geo- metria circular assume destaque, podendo ser utilizado para ressaltar sua importância ou a pe- culiaridade da sua função. Ele pode ser inserido solto e dentro de um espaço envolvente, assim como servir de espaço conector de outros am- bientes (Figura 12) (CHING; BINGGELI, 2013). Figura 12 – British Museum, Londres, Reino Unido Ele também pode representar o limite de um campo espacial ou de uma condição externa do terreno. Neste último desdo- bramento, podemos perceber que as for- mas curvas são dinâmicas, conduzindo nossa visão pelo percurso da curvatura. O lado côncavo transmite a ideia de fe- chamento e conduz o foco para dentro do espaço, enquanto o aspecto convexo separa o espaço do entorno imediato (Figura 13) (CHING; BINGGELI, 2013). Figura 13 – City Hall, Toronto, Canadá (1960), Viljo Revell e B. Kuwabara Fonte: Visualhunt ([2017], on-line)4. 238 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Quando se projeta um espaço curvilíneo, deve ser dada atenção especial à disposição do mobiliário e de outros elementos constituintes do ambiente. Um modo adequado para compor geometrias que possam ser conflitantes é integrar os obje- tos e a mobília como elementos soltos dentro do espaço. Outra opção é embutir mobiliário e equipamentos nos limites curvos do recinto. Fonte: Ching e Binggeli (2013). Dimensões espaciais verticais A altura representa a dimensão vertical do espaço, sendo definida pelo plano de teto. Ela é tão su- gestiva na definição das características espaciais quanto as dimensões horizontais do ambiente. Muitas vezes, uma mudança na altura do pé di- reito de um cômodo parece ser mais influente na nossa percepção espacial do que alterações similares atribuídas à sua largura ou profundidade (CHING; BINGGELI, 2013). Frequentemente, pés-direitos altos são relacio- nados à sensação de imponência ou poder e os baixos representam intimidade e aconchego. En- tretanto, nossa percepção sobre o tamanho de um espaço não é afetada apenas pela altura do teto, ela também sofre influência das medidas horizontais do espaço (CHING; BINGGELI, 2013). Espaços apertados que possuem grande pé-direito, repre- sentam ser mais estreitos do que na realidade são. 239UNIDADE VI Além das caracterizações já abordadas, pode- mos descrever um espaço por meio de aspectos de polaridade que, além de possibilitar em uma classificação peculiar, abrem-se à possibilidade de uma intervenção intencional (COLIN, 2000). Colin (2000) aborda as principais polarida- des por meio das relações entre interior/exterior, público/privado, coberto/descoberto, aberto/ fechado, livre/restrito e amplo/confinado (CO- LIN, 2000). Netto (1979) compartilha algumas dessas combinações, estabelecendo-as por meio de eixos opostos. A cada tipo de polaridade são atribuídos aspectos específicos que, se forem configurados de forma distinta, mudarão a nossa percepção em relação ao espaço (COLIN, 2000). O ponto inicial para a análise dos eixos dialéticos parte da manipulação dos dados fornecidos pela antropologia. As implicações pertinentes são relacionadas de forma simbiótica, o que dificulta discorrer sobre os eixos em uma sequência de tópicos – o ideal seria relacioná-los em uma única forma de análise. De qualquer modo, abordar um eixo é tratar si- multaneamente de todos, sob aspectos específicos (NETTO, 1979). Caracterização dos espaços por eixos de polaridade 240 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Primeiro eixo: Espaço Interior X Exterior Netto (1979) ressalta que existe uma tendência acentuada no sentido de considerar o espaço in- terior como domínio da arquitetura, e o exterior pertencente ao urbanismo (NETTO, 1979). A equivalência entre interior e exterior co- meçou a se expressar na arquitetura a partir do período gótico, quando o exterior da catedral foi considerado um reflexo de seu interior - e esse foi o seu auge. Depois, poucas foram as ocasiões onde se verificou, de fato, a prática dessa simbiose: uma manifestação tímida na arquitetura renascentista e, nos tempos atuais, algumas produções isoladas, como a Sagrada Família de Gaudí, algumas pro- postas do Art-Nouveau e outras de nomes impor- tantes do movimento moderno, como as obras de Le Corbusier, Frank Lloyd Wright, Walter Gropius, entre outros (NETTO, 1979). Atualmente, conforme assinala Netto, o inte- resse arquitetônico se voltou para a fachada, co- locando em segundo plano a preocupação com o espaço interior. Entretanto, na verdade, não há exterior sem interior e quando se compara um em relação ao outro, a abordagem deveria equivaler a uma espécie de complemento, já que são duas faces de um mesmo elemento (NETTO, 1979). No entanto, a dialética continua existindo e apenas poderá ser superada por meio de um jogo combinatório adequado entre tais extremos. É um problema que pode começar a ser contornado por meio de uma concepção que elimine as barreiras desnecessárias entre edificação e cidade (NETTO, 1979). De certo modo, Netto (1979) julga interes- sante uma retomada ao Renascimento, para que os projetistas voltem a pensar a cidade, considerando que ela é composta por edificações que devem ser integradas harmoniosamente à malha coletiva. Segundo eixo: Espaço Privado X Comum A oposição entre espaço privado e comum deve ter seus sentidos delimitados pela época e cultura da sociedade envolvida. A questão imposta ao arquiteto é conhecer como, em certa civilização, acontece o reconhecimento do espaço privado ou comum e quais são os limites entre eles. Depois de saber em qual direção dos extremos tende a prática social do grupo, o arquiteto deve proceder da mesma forma como trata os outros eixos, ou seja, por meio de um jogo combinatório entre os polos considerados (NETTO, 1979). Em termos genéricos, o homem ocidentalpende mais para o recolhimento individual, valorizando o caráter privado. Já na sociedade oriental (sobretudo China e Japão), a noção do espaço comum exerce domínio sobre a essência do ambiente privado (NETTO, 1979). O usufruto de um espaço privativo também é reflexo de uma situação socioeconômica privile- giada, mas a preferência por um ou outro tipo de espaço não é estabelecida unicamente pela postura de determinada cultura: ela envolve vários outros fatores. Por isso, é primordial que o arquiteto conheça a cultura para a qual irá projetar, antes de sugerir qualquer solução projetiva - seja ela para uma finali- dade particular ou coletiva. Quando o arquiteto não se atenta às diferenças culturais entre o protótipo que está seguindo (por tendência arquitetônica ou como- dismo) e ao contexto no qual tenta colocá-lo, acaba sugerindo mudanças equivocadas na sociedade (no comportamento, expressões culturais etc.), além de possíveis perturbações de caráter psicológico nos usuários dos ambientes (NETTO, 1979). E há diferenças até na análise de uma única cultura em períodos distintos: na França, até o século XVII, por exemplo, os ambientes residenciais não tinham 241UNIDADE VI utilidades fixas e os membros de uma família não podiam se isolar individualmente como hoje. Assim, qualquer pessoa cruzava os ambientes de refeição e quartos sem grande cerimônia. Foi somente a partir do século XVIII que os recintos foram dispostos ao longo de um corredor para o qual abriam suas portas, assim como as residências em relação à rua (NETTO, 1979). Para o conhecimento desses aspectos culturais, os dados fornecidos pela antropologia podem aju- dar os arquitetos, embora não abranjam a essência humana em sua plenitude. Os estudos possibilitam uma primeira noção a respeito dos usos dos espaços e dos diferentes sentidos que são atribuídos a esses ambientes, conforme a cultura e a época considerada (NETTO, 1979). No entanto, não basta projetar a partir dessas ob- servações, fazendo delas um rigoroso molde para a prática arquitetônica. Pelo contrário, o arquiteto pode propor novas concepções de utilização espacial que mantenham um equilíbrio coerente na combi- nação dialética entre privado e comum. Um aspecto não deve ser negligenciado em razão do outro, mas sim utilizado como informador e formador dos indi- víduos na direção de uma mudança comportamen- tal que possa aperfeiçoar as relações inter-humanas (NETTO, 1979). Contraditoriamente ao processo de expansão demográfica, as civilizações humanas, no geral, con- tinuam a se voltar para um esquema de isolamento cada vez maior. Nesse contexto, o arquiteto e urba- nista possui uma grande responsabilidade de atuação (NETTO, 1979). Para conceber uma sociedade melhor, Netto (1979) sugere a parcial retirada de certos redutos do individualismo excessivo que ainda comandam as relações humanas. Entretanto, tais alterações so- mente poderão ser alcançadas se forem seguidas por uma mudança análoga no modo de relacionamento dos homens entre si e deles com o espaço. E é nesse aspecto que a prática arquitetura-urbanismo pode auxiliar efetivamente (NETTO, 1979). Terceiro eixo: Espaço construído X Não-construído A arquitetura engloba uma disposição de am- bientes e espaços, que pode ou não implicar em uma ocupação efetiva. O conceito de ocupação se relaciona com a noção de privado e ainda implica na conotação de exclusão e prisão. Isso porque, quando o indivíduo adentra um espaço construído – seja por livre escolha (residência própria) ou contra a sua vontade (penitenciária, por exemplo) – ele o percebe como uma forma de aprisionamento. Em lado oposto, está a caracterização do espaço não-construído, que representa a li- bertação do homem, haja vista como ele se comporta satisfatoriamente em tais lugares. Por isso, a observação do jogo constante en- tre espaços construídos e não-construídos é fundamental. Seria interessante que toda edi- ficação se firmasse no sentido de um espaço construído envolvendo um espaço livre de construção (NETTO, 1979). Assim, o espaço não ocupado participaria do primeiro como uma continuação unitária. E, nesta acepção, o homem não iria se sentir aprisiona- do, tendo a possibilidade do abrigo que o espaço construído fornece, aliada ao espírito de liberda- de proporcionado pelo outro espaço. Contudo, é preciso ser realista e encarar que, nas condições atuais, conceber tal proposta é uma missão difí- cil, principalmente por imposições do mercado imobiliário, que considera as “áreas livres” como espaços não rentáveis. Embora timidamente já estejamos percebendo que em determinados edifícios de apartamentos a prática de reunir efetivamente espaços construídos e livres aos poucos tem ganhado o seu merecido lugar. No entanto, infelizmente, tais concepções são mais usuais em classes mais abastadas da sociedade (NETTO, 1979). 242 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Outra abordagem sobre a dialética desse eixo envolve a dinâmica da história arquitetônica. Para as sociedades egípcias arcaicas e na Grécia antiga, o lugar do povo, por definição, era o exterior das edificações, ou seja, o espaço não-construído. No interior dos templos egípcios, somente os mem- bros da corte, sacerdotes e faraó podiam entrar, assim como os cidadãos gregos ficavam fora dos ofícios religiosos que aconteciam nos templos. Foi somente em Roma que aconteceu uma inversão relevante e o povo assumiu o lugar construído, por meio da basílica. Mais tarde, a religião cristã oficializou seus cultos no interior dessas basílicas e a possibi- lidade do povo assumir o espaço construído atravessou épocas seguintes, perdurando até o período gótico. Só na Renascença o espaço aberto foi novamente proposto em toda a sua extensão, onde o coletivo teve a possibilidade de se expressar, não sendo mais obrigado a ficar de fora (NETTO, 1979). Nos tempos atuais, Netto (1979) assinala a im- pressão de não haver um equilíbrio adequado en- tre os espaços comuns e os não-construídos. Cada vez mais, o que se verifica são propostas de grandes espaços comuns construídos, principalmente na tipologia de estádios ou clubes esportivos. Porém, as praças modernas não possuem mais o mesmo caráter de lugar livre ao homem para momentos de tranquilidade e lazer, como aconteceu em ou- tros períodos históricos (NETTO, 1979). Netto (1979) ressalta que os instantes de lazer parecem estar sendo coordenados e orientados para espaços fechados e delimitados, nos quais se desenvolve uma multiplicidade de atividades humanas que não se unem em conjunto. Essa tendência pode ser expressa, por exemplo, nos shopping centers das grandes cidades. Quarto eixo: Espaço artificial X Natural O eixo artificial x natural é uma polaridade sem- pre presente no pensamento arquitetônico, cuja importância em tempos de intensa divulgação em prol da ecologia nem é necessário destacar. Portanto, a sua análise se restringirá a aspectos sob os quais esse eixo é particularmente importante à concepção arquitetônica (NETTO, 1979). Logo de início, uma objeção deve ser devida- mente esclarecida. A arquitetura representa uma proposição de ambientes que é feita de forma in- tencional pela ação humana e, desse modo, mui- tos podem julgar inadequado tratá-la como um espaço natural - mas isso é um equívoco. Em pri- meiro lugar, porque antes de ser a construção de um espaço, a arquitetura é uma organização que acontece no espaço, seja ele criado pela própria arquitetura, ou um espaço que a ela é oferecido de imediato, como possibilidade para a sua existência (NETTO, 1979). Em um segundo momento, está o conceito equi- vocado que o homem ocidental incorpora sobre a natureza. Para ele, somente é natural o meio am- biente intocado e desordenado, da forma como foi concebido. Essa acepção se traduz em um ideal do espaço natural, mas, dessa forma, atua como algo inoperável, que o torna inútil às atividades humanas. Deste modo, o ocidentalpratica duas vertentes: de um lado, renuncia esse espaço natural, de ou- tro, tenta submetê-lo a um tratamento que julga adequado, muitas vezes o descaracterizando. Nesta última prática, se encontram os jardins franceses (Figura 14), nos quais a espontaneidade da natu- reza é restringida por meio de podas na vegetação, resultando em formas geométricas que se ajustam conforme o desejo humano (NETTO, 1979). 243UNIDADE VI Outra demonstração de que o ocidental encara as plantas na qualidade de “lembranças” da natureza se traduz na folhagem plástica. Isso porque, ele considera as plantas do seu jardim simplesmente como signos de uma coisa e não o próprio ele- mento. A esse respeito, o homem oriental (em par- ticular, o japonês) tem uma visão mais adequada, fazendo com que seu jardim seja uma redução da paisagem natural - já que não é possível conviver com a natureza em abundância e o homem tem necessidade de se manter em contato com o meio ambiente (NETTO, 1979). Para resolver esse impasse, Netto (1979) argu- menta que a natureza até admite alguma interven- ção humana (sem perder o seu aspecto natural), desde que essa ação não seja exagerada, como acontece nos jardins à francesa. Outro aspecto relativo à polaridade desse eixo trata dos espaços arquitetônicos não construídos sob duas formas: o artificial e o natural. O primeiro tem um excelente exemplo na Praça São Marcos, em Veneza (Figura 15) (NETTO, 1979). Já o espaço não-construído natural é nor- malmente mais fácil de ser concretizado. Vários são os exemplos bem sucedidos dessa tipologia: Palermo, em Buenos Aires; Central Park, em Nova Iorque; Hyde Park, em Londres (NETTO, 1979). Em princípio, Netto (1979) ressalta que não se deve privilegiar um desses espaços em detrimento do outro. Se, por um lado, o ideal seria uma concepção que respeitasse simultaneamente o caráter artificial e natural; por outro, é preciso reconhecer que um espaço integralmente artificial pode ser satisfatório na dependência de certos fatores (NETTO, 1979). Contudo, a solução ainda mais adequada con- siste na concepção de um espaço exterior não- -construído (independentemente do tipo) que se relacione plenamente com a malha urbana (sem se ressaltar dela), assim como foi proposto nos ideais das cidades-jardins (NETTO, 1979). Figura 14 – Jardim do Palácio de Versalhes, França Figura 15 – Praça São Marcos, Veneza 244 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Quinto eixo: Espaço vertical X Horizontal Nada mais natural que o desenvolvimento ar- quitetônico acontecer em torno do efeito prático da horizontalidade e da verticalidade (NETTO, 1979). Isso caracteriza uma oposição que, há anos, já se encontra instaurada na concepção de modernos arranha-céus de apartamentos e na construção de residências essencialmente horizontais. Não cabe aqui o julgamento – seja de que aspecto for – a respeito de qual prática projetiva é mais adequada, pois além dos muitos fatores envolvidos, isso dependerá, em grande instância, da situação que se apresenta. A abordagem desse eixo, então, irá focar nas possibilidades de circulação que são desenvolvi- das a partir da combinação entre os planos hori- zontal e vertical, que proporcionam a temporali- zação do espaço, um dos elementos programáticos fundamentais da arquitetura – principalmente a de essência modernista (NETTO, 1979). Essa temporalização é oferecida a partir de um jogo de associação entre os eixos vertical-horizon- tal – por meio de desníveis projetados em espaços abertos exteriores ou ambientes fechados - que impõe ao usuário a necessidade de subida ou descida para transitar entre os espaços. Isso, ao mesmo tempo em que rompe com a monotonia, confere ao homem a oportunidade de vivenciar o lugar, ao invés de simplesmente visualizá-lo (NETTO, 1979). É evidente que grande parte da tendência político-social da atualidade se volta no sentido de tornar o homem um espectador passivo, seja em qual domínio for: do ato de assistir televisão ao envolvimento político. E parece que a arquitetura caminha para o mesmo intuito, em que a cidade e a edificação são consideradas mais como elementos contemplativos do que para efetiva participação: os habitantes da periferia se deslocam nos fins de semana para ver o centro da cidade, assim como um morador vê a sala de estar de sua casa, mas não a usa, conservando-a intocável para as visitas (NETTO, 1979). No entanto, o ato de ver deve ser substituído pelo viver e essa prática, na arquitetura, pode ser expressa pelo ato de percorrer, experimentar e modificar o ambiente. O espaço estático precisa ser dinamizado para que a vida aconteça. E já que esse espaço não pode ser constantemente altera- do pelo próprio caráter do projeto arquitetônico, seria interessante temporalizá-lo, propondo uma arquitetura que se modifica por meio da possibi- lidade de vivenciá-la no seu percurso. Portanto, a ação simultânea entre horizon- talidade e verticalidade é um dos instrumentos básicos que pode iniciar uma mudança na prática projetiva, valorizando a vivência arquitetônica por meio do percurso oferecido por uma obra ou mesmo por uma cidade inteira (NETTO, 1979). Sexto eixo: Espaço geométrico X Não-geométrico Neste eixo, a abordagem focal está centrada no papel da geometria na prática arquitetônica e na polaridade entre arquitetura orgânica e a orto- gonal. No movimento moderno essa dialética foi representada pelas obras de Frank Lloyd Wright (organicismo) e Le Corbusier (racionalismo) (NETTO, 1979). Ao longo dos últimos tempos, o ângulo reto e as formas regulares exercem grande domínio na paisagem das cidades modernas. Netto (1979) assinala que praticar arquitetura passou a simbo- lizar a prática da geometria regular. E isso remete 245UNIDADE VI aos princípios da Renascença. A geometria, em parte, ofuscou outras disciplinas que compõem o campo da arquitetura e, assim, a arquitetura (que representava uma arte) passou a ser consi- derada uma disciplina de caráter exato e racional (NETTO, 1979). A geometria regular, quando é imposta na malha urbana, proporciona uma movimentação simples e fácil, embora, simultaneamente, já revele os encantos da cidade de forma direta, por meio de ruas e avenidas que se estendem em um per- curso linear (NETTO, 1979). Muitos atribuem um senso de liberdade à concepção ortogonal, mas Netto (1979) contradiz essa acepção, relembran- do que, em momentos históricos do urbanismo, a imposição de um traçado geométrico à malha viária serviu para reduzir a liberdade do cidadão, facilitando seu controle. Essa é uma das razões que justificam a configuração tortuosa das cidades medievais (NETTO, 1979). O princípio de propor intencionalmente o tra- çado tortuoso como tática de defesa a possíveis intrusos ainda é prática universal, mas geralmente está reservada a uma pequena parcela da popula- ção (a mais privilegiada), em específicos bairros residenciais (NETTO, 1979). Netto (1979) enfatiza que se o aspecto tortuoso e a aparente desordem não constituem em si a es- sência da beleza, pelo menos são importantes para a sua obtenção. Já no Renascimento, a observação do arranjo orgânico espacial e o respeito por esse valor nos novos projetos era prática comum nas grandes cidades. Em Roma ou Paris, por exemplo, os quartei- rões distintos permitem ao observador sempre descobrir ou conhecer algo diferente (NETTO, 1979). Desta forma, o traçado com certa informa- lidade pode representar um meio importante para a flexibilidade das cidades, sendo considerado também como um dos fomentadores da tempo- ralização do espaço (NETTO, 1979). 246 Organização Conceitual do Espaço em Lugar Transição e Relação entre os Espaços Tão importante quanto a caracterização da pola- ridade entre os eixos espaciais é a transição entre os espaços, um aspecto que o projeto arquitetô- nico deve considerar, já que possui relevância de cunho social e conceitual (SNYDER; CATANESE, 1984). Os modos