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Unidade 2

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Unidade 2 - Aula 1 
O surgimento da proteção internacional ao meio ambiente no âmbito das Nações Unidas
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O arcabouço da proteção e da governança ambiental tem os seus aspectos mais importantes nas instâncias internacionais, pois as questões ambientais não estão limitadas às definições de fronteiras entre países, ou seja, os desafios são transfronteiriços ou transnacionais e discuti-los e enfrentá-los exige a cooperação comum entre os Estados. As deliberações são estabelecidas nos arranjos das organizações supranacionais. 
A temática ambiental entrou na agenda global na década de 1960, a partir das preocupações com os efeitos da explosão demográfica mundial e do aumento da poluição. Em um período de forte expansão do comércio e das atividades econômicas, houve a constatação dos limites desse crescimento, que se tornou um assunto de debates entre pesquisadores e atores das instâncias internacionais. 
O sistema internacional contemporâneo é relativamente recente, com origem no final da Segunda Guerra Mundial, com a Conferência de São Francisco, de 1945, que aprovou a Carta de São Francisco, de criação da Organização das Nações Unidas (ONU). O propósito primordial da ONU é o de garantir a paz mundial, mas também o de “conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário [...]” e de
“ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns” (BRASIL, 1945, [s. p.]).
Nota-se, pois, que a ONU se tornou, assim, o centro das discussões globais, atuando por meio de seus conselhos – Segurança; Econômico e Social; outros –, de suas comissões – Direitos Humanos (que desde 2006 se transformou em Conselho) e outras – e de suas agências especializadas – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco); Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO); Fundo Monetário Internacional (FMI). 
Além da ONU, organizações foram criadas em âmbito regional, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1948, pelos países das Américas. Na Europa, foram criados o Conselho da Europa, em 1949, e a Comissão Europeia, em 1951. Esses compõem, hoje, o arcabouço da União Europeia, a qual, por sua vez, foi criada em 1993. 
No que se refere ao direito internacional, em que os principais sujeitos são os Estados, é preciso destacar o papel da ONU, que se tornou o lócus de formação de um arcabouço de normas e instituições em várias áreas, como direitos humanos, educação, cultura e meio ambiente. Com essa perspectiva, a discussão entre Estados é fundamental para a formação de normas ambientais internacionais, com o objetivo comum de proteção ao meio ambiente em todas as suas dimensões. Vários problemas ambientais são de caráter transnacional e exigem ações multilaterais e cooperativas (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). 
A formalização da proteção ambiental no âmbito internacional se dá essencialmente por meio de dois tipos de atos: tratados e declarações. Os tratados são firmados entre Estados e podem ser bilaterais (dois Estados) ou multilaterais (vários Estados). Um tratado possui força jurídica vinculante, assim, é chamado de hard law. Os tratados podem ser globais, quando estabelecidos em organizações de abrangência mundial (por exemplo, ONU), ou regionais, quando firmados por países de uma determinada região do mundo ou em uma organização delimitada geograficamente (por exemplo, OEA). Os tratados de direito ambiental frequentemente recebem a denominação de convenção, porque costumam ser oriundos de conferências específicas para debater temáticas ambientais. Já as declarações, no direito ambiental, não têm força jurídica vinculante, são chamadas de soft law, ou seja, não são normas impositivas, mas formam os princípios do direito internacional. Esses são gradativamente reconhecidos nas instâncias internacionais e nacionais. Portanto, ao estudar o direito ambiental, esses dois tipos de atos são os mais frequentes. 
Os tratados em matéria ambiental costumam ter algumas características, como: (i) os países signatários se submetem às regras comuns; (ii) os países adotam uma cooperação interestatal, por meio de agências internacionais ou órgãos específicos que são criados; (iii) o conteúdo dos tratados depende do estágio atual do conhecimento científico; (iv) os tratados podem comportar obrigações diferenciadas entre países (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). Os tratados ambientais são compromissos para enfrentar questões, como poluição, diversidade biológica, mudança do clima, florestas, entre outros, que são reveladores de como as dinâmicas ambientais não respeitam fronteiras de Estados. Exige-se deles a cooperação e a articulação comum para o enfrentamento dos desafios ambientais. 
Por evidente, esse é um processo complexo, com dificuldades, porque a estrutura do direito internacional foi construída em observância a um dos pressupostos do Estado moderno, a soberania. E isso significa a autodeterminação sobre os seus territórios para dispor livremente de suas riquezas e de seus recursos naturais. Além disso, a autodeterminação está diretamente ligada ao desenvolvimento, que é um argumento presente entre os países, em especial, os emergentes, marcados pela desigualdade em múltiplas dimensões – econômica, social, ambiental. A cooperação para lidar com os problemas ambientais deve equacionar esses desafios. Isso demonstra a complexidade dos debates nas instâncias internacionais. 
A partir da década de 1970, há o franco desenvolvimento do direito internacional do meio ambiente, que ocorreu com as conferências no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), como veremos a seguir.
As principais conferências internacionais de proteção ao meio ambiente
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Entender o processo de constituição das instâncias de governança ambiental internacional passa pela compreensão das conferências das Nações Unidas sobre a temática. Da primeira conferência em 1972 até os dias atuais, a ONU promoveu quatro conferências mundiais, que foram decisivas para que assuntos, como meio ambiente equilibrado, desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas, entre outros, assumissem centralidade na agenda global. São elas: 
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (1972). 
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992). 
Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+10 (2002). 
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+20 (2012). 
Em 1968, a Assembleia-Geral das Nações Unidas, por meio da Resolução nº 2.398 (XXIII), decidiu pela realização de uma conferência mundial para discutir as questões ambientais. Dessa forma, ocorreu, de 5 a 16 de junho de 1972, na cidade de Estocolmo, Suécia, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, que é considerada um marco do direito ambiental internacional. 
No curso dos trabalhos da Conferência, os países participantes dividiram-se em duas correntes de interpretação sobre os problemas ambientais (MELO, 2017): de um lado, os preservacionistas, liderados pelos países desenvolvidos, que defenderam a mitigação nas intervenções antrópicas sobre o meio ambiente; de outro, os desenvolvimentistas, composta pelos países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil, que defendiam a aceitação da poluição e que a preocupação deveria ser com o crescimento econômico. 
Ao término dos trabalhos foi editada a Declaração de Estocolmo sobre Meio Ambiente Humano, com 26 princípios. O Princípio 1 da Declaração reconhece o meio ambiente com qualidade como direito fundamental: 
O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar e é portador solene de obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente, para as gerações presentes e futuras. (ONU, 1972, p. 2) 
No quadro de governança internacional,em dezembro de 1972, foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), com sede em Nairóbi, Quênia, responsável por promover a proteção ao meio ambiente e o uso eficiente de recursos naturais no contexto do desenvolvimento sustentável. O PNUMA é uma agência do Sistema das Nações Unidas e a principal autoridade global em meio ambiente (MELO, 2017). 
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), realizada em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, também conhecida como a Cúpula da Terra, representou o momento máximo da preocupação ambiental global. Foram produzidos cinco documentos internacionais: (i) Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento; (ii) Agenda 21; (iii) Convenção-Quadro sobre Mudanças do Clima; (iv) Convenção sobre Diversidade Biológica ou da Biodiversidade; (v) Declaração de Princípios sobre Florestas. Desses, somente a Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima e a Convenção sobre Diversidade Biológica possuem força jurídica vinculante, obrigatória, denominados no direito internacional de hard law. Os demais são declarações, destituídas de caráter vinculante, chamadas de soft law. 
A Declaração do Rio é um documento que contém 27 princípios, norteadores do direito ambiental na esfera internacional e fonte para o desenvolvimento principiológico na legislação ambiental dos países. A Declaração do Rio traz preceitos fundamentais para o desenvolvimento de uma agenda internacional de proteção ao meio ambiente, que conjugue compromissos e obrigações para os Estados. 
No que se refere à Agenda 21, trata-se de um documento programático, com 40 capítulos, em que se estabelecem diretrizes para a implementação do desenvolvimento sustentável, do espaço global ao local. 
Já a Convenção sobre Diversidade Biológica é o mais importante instrumento internacional de proteção da biodiversidade. Os objetivos da Convenção sobre Diversidade Biológica são: (i) a conservação da diversidade biológica; (ii) a utilização sustentável de seus componentes; (iii) a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias e mediante financiamento adequado (MELO, 2017). 
Por fim, a Declaração de Princípios sobre Florestas é um documento sem força jurídica vinculativa. Em seu conteúdo, ela exprime que os países, em especial os desenvolvidos, devem empreender esforços para recuperar a Terra por meio de reflorestamento, arborização e conservação florestal. 
Em 2002, a ONU promoveu, em Johanesburgo, África do Sul, a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, também conhecida como Rio+10. Em seus debates, emergiu a necessidade de adoção de medidas concretas para executar os objetivos da Agenda 21 até então não suficientemente implementados, além do enfoque na importância da concretização de políticas públicas para um crescimento com sustentabilidade. Dois foram os documentos oficiais da Cúpula Mundial: a Declaração Política e o Plano de Implementação. 
A Declaração Política, denominada “O Compromisso de Johanesburgo sobre Desenvolvimento Sustentável”, reafirma os princípios das duas conferências anteriores e faz uma análise da pobreza e da má distribuição de renda no mundo. O Plano de Implementação é o documento das metas, assentadas em três objetivos: (i) a erradicação da pobreza; (ii) a alteração nos padrões insustentáveis de produção e consumo; (iii) a proteção dos recursos naturais para o desenvolvimento econômico e social. A partir deles, o Plano de Implementação relaciona as medidas de desenvolvimento sustentável para cada região do planeta. 
Em junho de 2012, a cidade do Rio de Janeiro foi palco da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). A Rio+20 teve dois temas principais: (i) a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza; (ii) a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável (MELO, 2017). A Rio+20 não teve a mesma representatividade das conferências anteriores. Os países desenvolvidos, diante da crise econômica global de 2008, optaram por não se comprometer com medidas vinculantes ou mesmo metas específicas para as diversas temáticas com pertinência ambiental. O documento final da Conferência é denominado “O Futuro que Queremos”, contendo 283 tópicos que, em linhas gerais, relaciona a renovação dos compromissos políticos das conferências anteriores (Estocolmo/1972, Rio/1992 e Johanesburgo/2002) e consigna proposições genéricas sobre a economia verde e o quadro institucional para o desenvolvimento sustentável (MELO, 2017). 
Por fim, em 28 de julho de 2022, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução declarando que todas as pessoas têm direito a um meio ambiente limpo e saudável (ONU, 2022). Apesar de não ser vinculante, a resolução é um importante indicativo para a proteção ambiental em todo o planeta.
A interface da proteção internacional e o direito nacional
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As decisões proclamadas nas conferências das Nações Unidas e nos acordos internacionais têm influência direta na estrutura jurídica e nos órgãos de governança ambiental nacional. Há uma simbiose entre direito internacional e nacional na proteção ambiental. Isso se dá tanto pela incorporação dos tratados ambientais na ordem jurídica brasileira quanto pela inspiração na elaboração de diplomas legais na legislação brasileira. 
Inicialmente, a aprovação de um tratado pelo Brasil passa por estágios, como a negociação; a assinatura pelo representante do Estado, no caso do Brasil, o Presidente da República; a aprovação pelas duas casas do Congresso Nacional – Câmara dos Deputados e Senado Federal; a ratificação, ato pelo qual o país assume a obrigação de cumpri-lo no plano internacional. Com essas etapas, o tratado é válido em nível internacional. Contudo, para concluir a incorporação do tratado, o Presidente da República edita um decreto com a sua promulgação na ordem jurídica brasileira. Com isso, o Brasil assume uma série de obrigações para a implementação correspondente, de acordo com as disposições específicas de cada convenção. Para exemplificar, no caso da Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima, o Brasil assumiu o compromisso de reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa, o que implica uma série de medidas e instrumentos para observar as prescrições da Convenção-Quadro, o que afeta todos os setores do país, como o poder público, a esfera empresarial e a sociedade civil. O Acordo de Paris, decorrência da Convenção-Quadro, também foi incorporado à ordem jurídica brasileira. A propósito, o Supremo Tribunal Federal reconheceu recentemente o Acordo de Paris como um tratado de direitos humanos, ou seja, possui um status especial, de supralegalidade, estando acima da legislação brasileira, mas abaixo da Constituição (BRASIL, 2022). Isso significa que a legislação ordinária terá que observar as normas do Acordo de Paris para a redução dos gases de efeito estufa. 
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Figura 1 | Status dos Tratados de Direitos Humanos.
Outro exemplo de aplicabilidade dessa sistemática é Convenção sobre Diversidade Biológica, que, além de incorporada internamente, proporcionou a edição do Decreto nº 4.339/2002, com os princípios e as diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade. Esses são somente alguns exemplos da dinâmica de relação entre as esferas nacional e internacional. Portanto, os compromissos no âmbito internacional têm implicações diretas no direito brasileiro. Ser signatário de um tratado em matéria ambiental é assumir obrigações perante a comunidade internacional e conferir a sua observância na ordem jurídica doméstica. 
A partir da normatização internacional, temos reflexos na ordem jurídica brasileira, inclusive em nível constitucional. Até mesmo instrumentos sem força jurídica vinculante,como as declarações, têm influência. A Declaração de Estocolmo, de 1972, inseriu o meio ambiente no rol dos direitos humanos, enquanto o Relatório Nosso Futuro Comum, de 1987, consignou que o meio ambiente deve ser protegido para as presentes e futuras gerações. O art. 225 da Constituição de 1988, que é o coração da proteção ambiental em nível constitucional, dispôs que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental e que deve ser protegido para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988). Essa passagem demonstra a influência das discussões da ONU. Em nível infraconstitucional, o exemplo mais significativo é a Declaração do Rio de Janeiro, de 1992, que trouxe princípios internacionais de proteção ao meio ambiente, que são atualmente previstos na legislação brasileira, como os princípios da precaução, poluidor-pagador, participação comunitária, informação e análogos. No mesmo sentido, a Agenda 21, elaborada em 1992, que apesar de não ser obrigatória, serviu de parâmetro para muitas iniciativas nos órgãos da Administração Pública brasileira e no setor empresarial. 
Com relação à legislação propriamente dita, o Brasil editou leis a partir das discussões originárias nos documentos e acordos das organizações supranacionais. Como exemplos, a Lei nº 12.187/2009, que instituiu a Política Nacional de Mudanças do Clima, e a Lei nº 13.123/2015, que disciplina conteúdo atinente à biodiversidade e ao patrimônio genético. 
No que se refere à estrutura administrativa brasileira, ela é igualmente influenciada pelas conferências das Nações Unidas. Após a realização da Conferência de Estocolmo, o Brasil criou, em 1973, no âmbito do Ministério do Interior, a Secretaria Especial de Meio Ambiente da Presidência da República, como primeiro órgão nacional de proteção ao meio ambiente, tendo como secretário o Sr. Paulo Nogueira Neto. Em 1992, após a Cúpula da Terra (Rio-92), a Secretaria de Meio Ambiente se transformou no Ministério do Meio Ambiente e Amazônia Legal, integrando a estrutura diretamente vinculada à Presidência da República (MELO, 2017). Por todos esses elementos, evidencia-se a influência do domínio internacional em face da legislação brasileira. 
Aula 2 – Desenvolvimento sustentável 
A concepção de desenvolvimento sustentável
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As ocorrências das expressões sustentabilidade e desenvolvimento sustentável encontram-se associadas nos documentos oficiais, sejam internacionais ou nacionais. Contudo, deve-se apontar que sustentabilidade é uma expressão mais antiga e com significado singular. Sustentabilidade é uma palavra de origem latina, sustentare, e significa sustentar, manter algo. O conceito de sustentabilidade surgiu nas províncias da Saxônia e da Prússia, nos primórdios da modernidade, nos processos de manejo das florestas (BOFF, 2016) e se consolidou na Alemanha do século XIX, dando origem à prática da silvicultura (restauração de florestas). 
Na primeira metade do século XX, a sustentabilidade esteve majoritariamente ligada aos domínios da biologia e, em especial, da ecologia. Ao longo da segunda metade do século XX, o termo se estende para a problemática da explosão demográfica e da poluição na sociedade global, como alertou o zoólogo Eugene Odum (2001, p. 812):
“chegou o momento de o homem administrar tanto a sua própria população com os recursos de que depende, dado que pela primeira vez na sua breve história se encontra perante limitações definitivas, e não puramente locais”.
Tal estado de coisas se deve à intensidade das intervenções antropogênicas que afetaram decisivamente
“[...] o frágil e complexo equilíbrio entre componentes e acontecimentos que determinam a organização do ecossistema no Planeta Terra ao longo de milhões de anos” (ALMEIDA, 2016, p. 58). 
A noção de sustentabilidade, em sentido amplo, é primordialmente a manutenção dos sistemas de suporte à vida. Portanto, a sustentabilidade é um conceito sistêmico, visto que conjuga saberes interdisciplinares, especificamente aqueles de sustentação da vida no planeta e, no caso da vida humana, os processos econômicos, sociais, culturais e, claro, ambientais. 
A partir dos domínios da ecologia, com as suas preocupações com a superpopulação, uso dos recursos naturais e a poluição e seus resíduos, houve a transposição de suas análises para outros domínios, notadamente através dos relatórios patrocinados pelo Clube de Roma, grupo de empresários e pensadores formado no final da década de 1960 e que patrocinou uma série de discussões sobre o futuro do planeta. Um dos estudos foi particularmente importante, o denominado Os limites do crescimento, do ano de 1972, elaborado por cientistas do Massachusetts Institute of Technology (MIT), também conhecido como Relatório Meadows, por ter sido liderado por Dennis Meadows e Donella Meadows. A principal conclusão desse estudo científico foi de que: 
Se se mantiverem as tendências actuais de crescimento da população mundial, da industrialização, da poluição, da produção de alimentos e de esgotamento de recursos, os limites de crescimento do nosso planeta serão atingidos nos próximos cem anos. O resultado mais provável vai ser um declínio súbito e incontrolável da população e da capacidade produtiva. (TAMARES,1983, p. 151) 
Contudo, o relatório científico apontou: 
É possível alterar essas tendências de crescimento e criar condições de estabilidade ecológica e económica que podem ser mantidas a longo prazo. O estado de equilíbrio global pode ser concebido de forma a garantir, a cada habitante da Terra, a satisfação das necessidades materiais básicas e a igualdade de oportunidades por forma que cada pessoa possa atingir a sua plena realização humana. (TAMARES, 1983, p. 151) 
Apesar das críticas que recebeu, diante de suas projeções pouco otimistas sobre o futuro da humanidade, deixando clara a finitude de recursos naturais em uma sociedade de consumo acelerado, o Relatório Meadows contribuiu para que as discussões ambientais adentrassem definitivamente no tabuleiro global. Afinal, ele tocou num ponto central para o sistema econômico global: a necessidade de limitações nos padrões de produção e consumo. 
É a partir desse momento que entra em debate uma série de termos e teorias para equacionar as premissas do crescimento econômico em um mundo finito, limitado. Por isso, a ideia de crescimento, central para o pensamento moderno e intensificada após o término da Segunda Guerra Mundial, precisará ser sustentada, razão pela qual se iniciam as formulações teóricas para uma concepção de desenvolvimento, que deverá ser sustentável. Isto é, um desenvolvimento em que a economia seja sustentada pelo uso racional dos recursos naturais; o que é preciso reconhecer, trata-se de um dos grandes desafios da contemporaneidade. Gradativamente, como veremos, as expressões desenvolvimento e sustentabilidade serão associadas, com o surgimento da compreensão de desenvolvimento sustentável e de uma multiplicidade de sentidos para a palavra sustentabilidade.
A evolução do conceito de desenvolvimento sustentável e de sustentabilidade
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Em 1972, a Organização das Nações Unidas (ONU) realizou a Conferência sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, Suécia. Nesse período, deu-se o delineamento dos contornos da expressão ecodesenvolvimento por Maurice Strong – Secretário-Geral dessa Convenção –, cabendo a Ignacy Sachs a popularização do conceito como um projeto de desenvolvimento socialmente inclusivo, ecologicamente viável e economicamente sustentado, o qual se converteu com o passar dos anos no conceito de desenvolvimento sustentável. 
A expressão desenvolvimento sustentável apareceu pela primeira vez no ano de 1980 no documento intitulado Estratégia de Conservação Mundial (World Conservation Strategy), que foi editado pelas organizações ambientalistas União Internacional para a Conservação da Natureza (IUNC) e World Wildlife Fund (WWF), a pedido das Nações Unidas (BARBIERI, 2020). 
Em 1983, a ONU criou a Comissão Mundial sobre Meio Ambientee Desenvolvimento, cujo longo ciclo de audiências e debates com líderes políticos e organizações em todo o planeta resultou, em 1987, como conclusão de suas atividades, no Relatório Nosso Futuro Comum, também conhecido como Relatório Brundtland, nome dado em homenagem à senhora Gro Harlen Brundtland, a ex-primeira-ministra da Noruega, que havia presidido os trabalhos (MELO, 2017). Esse documento definiu os contornos clássicos do desenvolvimento sustentável, que passou a ser considerado como aquele
“[...] que atende às necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade de as futuras gerações terem suas próprias necessidades atendidas” (ONU, 1991).
O Relatório Nosso Futuro Comum é um manifesto essencialmente ético, de conjugação da economia com os propósitos de justiça social e ambiental. A partir de sua elaboração, expressões como desenvolvimento sustentável e sustentabilidade passam a ser associadas como sinônimos. 
Em 1992, a ONU realizou a Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) e o conceito de desenvolvimento sustentável cristalizou-se por meio de um dos seus principais documentos: a Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, cujas principais proposições seguem: 
Os seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza (princípio 01). 
O direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas equitativamente as necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras (princípio 03). 
Para alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental constituirá parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente deste (princípio 04). 
Para todos os Estados e todos os indivíduos, como requisito indispensável para o desenvolvimento sustentável, irão cooperar na tarefa essencial de erradicar a pobreza, a fim de reduzir as disparidades de padrões de vida e melhor atender às necessidades da maioria da população do mundo (princípio 05). 
Para alcançar o desenvolvimento sustentável e uma qualidade de vida mais elevada para todos, os Estados devem reduzir e eliminar os padrões insustentáveis de produção e consumo, e promover políticas demográficas adequadas (princípio 08). (ONU, 1992, [s. p.]) 
A Declaração do Rio Janeiro pretendeu, através de suas proposições, conciliar os pleitos do mercado capitalista com as carências dos países em desenvolvimento e pobres, o que terminou por elencar princípios contraditórios. De qualquer forma, por meio de uma declaração flexível – soft law –, foi possível articular o desenvolvimento sustentável em escalas e esferas, do global ao local, dos mercados à sociedade civil, apesar de tal abrangência se reduzir ao plano discursivo. 
Outro documento representativo dessas conjugações foi igualmente editado ao término dos trabalhos da Rio-92, a ambiciosa Agenda 21. Trata-se de um documento programático, com 40 capítulos, com as diretrizes para a implementação do desenvolvimento sustentável em todas as escalas, do global ao local, para o século XXI (MELO, 2017). Apesar de festejada em sua edição, a Agenda 21 foi perdendo força com os passar dos anos. 
A interpretação sobre desenvolvimento sustentável foi consolidada com a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+10), realizada em Johannesburgo, África do Sul, em 2002. A conferência admitiu as limitações e as dificuldades na implementação da Agenda 21, mas reafirmou o significado de desenvolvimento sustentável da Rio-92. A Declaração de Johannesburgo sobre o Desenvolvimento Sustentável defendeu o capitalismo verde, diante da globalização e que
“[...] a rápida integração de mercados, a mobilidade do capital e os significativos aumentos nos fluxos de investimento mundo afora trouxeram novos desafios e oportunidades para a busca do desenvolvimento sustentável” (MELO, 2017, p. 29).
Contudo,
“[...] os benefícios e custos da globalização são distribuídos desigualmente, e os países em desenvolvimento enfrentam especiais dificuldades para encarar esse desafio” (MELO, 2017, p. 29). 
Da edição do Relatório Brundtland, passando pela Agenda 21 até chegar aos dias atuais, a esfera internacional reforçou o aspecto de multiplicidade de significados de desenvolvimento sustentável e da expressão sustentabilidade, que, inclusive, foi apropriada por adjetivações, tais como sustentabilidade ambiental, econômica, social, cultural e tantas outras digressões. Apesar dessas perspectivas, as expressões desenvolvimento sustentáveis e sustentabilidade conjugam a abordagem preferencial dos documentos oficiais e diplomas legais.
A aplicação do desenvolvimento sustentável no âmbito estatal e corporativo
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O desenvolvimento sustentável é um princípio no direito brasileiro. A Constituição de 1988, em seu art. 170, disciplina que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho e na livre-iniciativa e visa assegurar uma existência digna para todos conforme os ditames da justiça social, com a observância, entre outros, dos princípios da função social da propriedade e da defesa do meio ambiente (BRASIL, 1988). Por função social entende-se que o exercício do direito de propriedade impõe o respeito pelas normas ambientais (MELO, 2017). A defesa do meio ambiente nas atividades econômicas ocorre igualmente por meio do tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação (BRASIL, 1988). 
Na ordem constitucional brasileira, o desenvolvimento sustentável encontra-se na conjugação do art. 170 – ordem econômica – com o art. 225 – proteção ao meio ambiente –, ambos da Constituição Federal (MELO, 2017). Apesar disso, há uma constante tensão na implementação das atividades econômicas com as normas jurídicas de proteção ambiental. Daí surge a indagação: em caso de confronto entre uma atividade econômica e a proteção ao meio ambiente, qual é a interpretação que deverá prevalecer? Embora sejamos uma economia de livre mercado, nenhuma atividade pode ser exercida em desconformidade com a proteção ao meio ambiente. Afinal, só é possível uma existência com dignidade se as pessoas possam viver em um meio ambiente ecologicamente equilibrado, sem poluição, com salubridade. E se não temos o ambiente saudável, como falar em saúde e qualidade de vida? Apesar dessas afirmações serem reconhecidas por todos, sabemos que a questão é bem mais complexa. Por isso, o Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a disciplinar a matéria, decidindo que é necessária a compatibilização entre atividades econômicas e proteção ao meio ambiente. Contudo, consignou que as atividades econômicas não podem ser exercidas em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente (MELO, 2017). Nos termos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.540,
“[...] a atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente”.
E conclui que:
“A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica [...]” (BRASIL, 2005, [s. p.]). 
Portanto, é necessário sempre buscar a compatibilização entre atividades econômicas e proteção ao meio ambiente; na impossibilidade, é preciso atentar para as questões ambientais. E isso porque a preocupação somente na dimensão econômica tem ocasionado os danos e desastres ambientais que são constantemente relatados nos meios de comunicação, em que pessoas, populações ou cidades são afetadas. Afinal, ao se privilegiar somente os argumentos econômicos, continuamos somente como crescimento econômico, e a sustentabilidade torna-se meramente retórica, sem qualquer efetividade. 
Em meados da década de 1990, o britânico John Elkington propõe o termo Triple Bottom Line (TBL), no âmbito corporativo norte-americano, o qualfica conhecido no Brasil como o tripé da sustentabilidade, conjugando as dimensões econômica, social e ambiental. Esse conceito possui como elementos constitutivos os três Ps da sustentabilidade (people, planet, profit; ou em português, pessoas, planeta e lucro). Em suma, as empresas devem buscar o lucro corporativo, mas com responsabilidade social em suas operações, que devem estar alinhadas no compromisso ambiental com o planeta (MELO, 2017). O TBL é utilizado atualmente como um dos indicadores de mensuração da sustentabilidade para governos, setor empresarial e organizações sem fins lucrativos. 
O tripé da sustentabilidade associa os aspectos econômicos, sociais e ambientais. Por sustentabilidade econômica, o uso racional e eficiente dos recursos naturais, com o uso de tecnologias que diminuam os impactos ambientais e as externalidades negativas. A sustentabilidade social envolve uma distribuição de renda justa, de modo a reduzir as desigualdades e promover os valores de uma sociedade inclusiva. Por sustentabilidade ambiental, respeitar e proteger os ciclos de regulação dos processos ecológicos essenciais, de modo a garantir recursos para as presentes e futuras gerações, em uma concepção que as variáveis ambientais sejam integradas aos ciclos econômicos. 
No âmbito governamental, um exemplo de aplicação do tripé da sustentabilidade é a Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), que articula a promoção da sustentabilidade nas entidades da Administração Pública Direta e Indireta em nível federal, estadual e municipal, nos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Apesar da adesão ser voluntária, a A3P é um relevante programa de práticas governamentais sustentáveis. 
Uma outra leitura de sustentabilidade procura dividi-la em duas abordagens: sustentabilidade fraca e sustentabilidade forte (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). A sustentabilidade fraca é aquela que se baseia na economia clássica, em que o capital natural pode ser substituído pelo capital produzido e que, por consequência, não há limites para o crescimento econômico. Nesse pensamento, é possível adotar soluções tecnológicas para solucionar os problemas ambientais. Já a sustentabilidade forte assenta-se na economia ecológica, isto é, a ausência do capital natural impõe limites para o crescimento econômico. Essa compreensão tem como fundamento a preservação dos componentes ecológicos, de forma que será preciso conter os fatores de pressão, ou seja, limites para uma economia de crescimento contínuo. Em qualquer dessas perspectivas, é importante compreender a importância que a sustentabilidade assume na contemporaneidade, como elemento essencial para as nossas sociedades.
Aula 3 – Politicas públicas e ambientais
O conceito de políticas públicas
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O que é uma política pública? Quando ela deve ser elaborada? Quem participa da sua elaboração? Qual o conteúdo de uma política pública? Essas são perguntas necessárias para a compreensão da importância das políticas públicas de responsabilidade social e ambiental. São múltiplas as interpretações para essas indagações, mas vamos nos ater às respostas que dialogam com a nossa atuação profissional. 
Quando um problema público é identificado, surge a necessidade de ofertar respostas e alternativas para resolvê-lo. Situações socialmente sensíveis exigem do poder público uma diretriz. Essa diretriz é o que chamamos de políticas públicas (SECCHI; COELHO; PIRES, 2019), isto é, o mecanismo de atuação estatal para a resolução de problemas públicos. Portanto, esses, socialmente reconhecidos por atores estatais e não estatais, entram na agenda de discussões do poder público e, como tal, exigem a formulação de políticas públicas para as mudanças possíveis e pretendidas
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Figura 1 | A formação da política pública. Fonte: elaborada pelo autor.
A pergunta seguinte é: a quem cabe a elaboração de políticas públicas? Há duas interpretações para essa indagação (SECCHI; COELHO; PIRES, 2019). De um lado, há os que defendem a centralidade dos atores estatais na elaboração dessas – por exemplo, agentes políticos e técnicos dos poderes Executivo e Legislativo –, pela legitimidade e pela capacidade de alocar recursos financeiros para equacionar os problemas públicos. Do outro lado, há os que advogam uma compreensão multicêntrica, de que a elaboração das políticas públicas é uma conjugação da atuação de atores estatais com os atores não estatais, como empresas, sindicatos, organizações religiosas, organizações não governamentais etc. No caso brasileiro, as dinâmicas das políticas públicas estão diretamente ligadas ao Estado pela sua centralidade e intervencionismo histórico. Isto é: o Estado brasileiro é o responsável pela elaboração de políticas públicas. Mas o fato de ser o responsável não impede a participação dos grupos de interesse, como o setor empresarial e a sociedade civil. 
É importante destacar que o Brasil é uma Federação, em que o Estado divide suas atribuições com competências atribuídas aos seus entes federativos União, estados-membros, Distrito Federal e municípios. Assim, políticas públicas são formuladas em termos espaciais ou territoriais, isto é, aquelas que interessam a todo o país são políticas nacionais, como é o caso do meio ambiente, da educação, da saúde e de outras áreas. Em articulação com as políticas nacionais, as políticas estaduais e municipais são estabelecidas atendendo às especificidades e singularidades de cada recorte territorial. 
Mas, qual o conteúdo de uma política pública? Como já mencionamos, uma política pública parte de um problema público, uma situação que a sociedade exige um conjunto de ações para a resolução do problema. A política pública abrange o reconhecimento do problema e o nível de mudança pretendido, ou seja, as transformações desejadas. É nesse ponto que temos o conteúdo de uma política pública. Essa é composta de princípios, objetivos e instrumentos para a sua concretização. Os princípios são os elementos estruturantes que balizarão a política pública; é por meio deles que são definidas as estratégias. Quanto aos objetivos, eles articulam as mudanças pretendidas, os estágios de implementação de uma política pública e, por vezes, o tempo necessário. Já os instrumentos são as ações, os meios e os mecanismos que permitem que a política pública alcance os seus objetivos. 
Uma outra forma de compreender as políticas públicas é por meio dos níveis operacionais. Nesse sentido, temos três níveis: plano, programa e projetos. No plano, temos os princípios, objetivos e instrumentos, como já estudamos no parágrafo anterior. O plano deve ser aplicado por meio de programas, que são os recortes ou desdobramentos dele. Para exemplificar, os programas podem ser aplicados no âmbito dos estados ou dos municípios e podem ser divididos em projetos, que são a menor unidade de planejamento ou de ação. Portanto, políticas públicas possuem níveis operacionais na articulação e operacionalização por meio de um plano, que é um nível estruturante e de longo prazo; com os programas, em um nível intermediário e de médio prazo; com os projetos, de curto prazo e em um nível operacional (SECCHI; COELHO; PIRES, 2019). A imagem a seguir expõe os níveis operacionais de uma política pública.
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Pois bem, feitas essas considerações, estudaremos agora as políticas públicas em matéria ambiental.
As principais políticas públicas de proteção ao meio ambiente no Brasil
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Uma política pública ambiental é uma diretriz de planejamento e intervenção estatal, com a participação do setor produtivo e dos atores não governamentais, para a proteção do meio ambiente. Uma política pública ambiental condiciona e disciplina as atividades econômicas e sociais em compatibilização com a proteção ambiental. 
No Brasil, as políticas públicas ambientais existem desde a década de 1930, com a aprovação do Código Florestal de 1934, do Código de Águas de 1934 e outros diplomas legais (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). Na décadade 1970, teve início a estruturação dos órgãos administrativos de proteção ao meio ambiente, mas de forma fragmentada. Esse quadro mudaria na década seguinte. 
A efetiva concepção de proteção ao meio ambiente ocorreu somente em 1981, quando foi editada a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela Lei nº 6.938. Essa é a lei estruturante da proteção ambiental brasileira e traz os princípios, objetivos e instrumentos para uma política ambiental para o Brasil. 
Em primeiro plano, é preciso mencionar a importância dos princípios, uma vez que toda política ambiental ocorre pela observância deles. No contexto das nossas discussões, dois merecem destaque: o princípio da prevenção e o princípio da precaução. O princípio da prevenção significa agir antecipadamente para evitar os possíveis danos ambientais, que costumam ser irreversíveis. Assim, as políticas ambientais são formuladas de forma a prevenir os impactos ambientais negativos. Por meio do princípio da precaução, deve-se observar que, em situações que predominem a incerteza científica, com a ausência de pesquisas e estudos científicos sobre as possíveis consequências de atividades econômicas sobre a saúde das pessoas e o meio ambiente, não se façam as intervenções pretendidas. Esses dois princípios são balizadores das políticas públicas no Brasil. 
A Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) estabeleceu como objetivo geral
“[...] a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana [...]” (BRASIL, 1981, [s. p.]).
Nota-se que a PNMA conjuga o desenvolvimento das atividades sociais e econômicas com a proteção ambiental, de forma a assegurar a dignidade humana. 
O art. 4º da Lei nº 6.938 (BRASIL, 1981) elenca os seus objetivos específicos. Destacaremos os três mais relevantes para a nossa discussão. O primeiro deles é a
“[...] compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico” (BRASIL, 1981, [s. p.]).
Esse objetivo é o que chamamos atualmente de desenvolvimento sustentável, ou seja, compatibilizar as atividades econômicas com a proteção ao meio ambiente. O segundo objetivo é o
“[...] estabelecimento de critérios e padrões da qualidade ambiental e de normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais” (BRASIL, 1981, [s. p.]).
Cabe ao poder público estabelecer padrões de qualidade ambiental para o ar, os recursos hídricos e o solo. O terceiro objetivo é a
“[...] imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos” (BRASIL, 1981, [s. p.]).
Esse último objetivo articula dois aspectos que convergem para o conteúdo de princípios ambientais. O primeiro é o princípio do poluidor-pagador, que estabelece a obrigação do poluidor de reparar os danos causados ao meio ambiente. O segundo é o princípio do usuário-pagador, que impõe o pagamento pelo uso de recursos ambientais com fins econômicos, como no caso da cobrança pelo uso de recursos hídricos. Por exemplo, uma empresa ou uma atividade agropecuária que faça a captação de água em um rio – em níveis que afetem a qualidade ou a quantidade desse curso d’água – deve pagar por esse uso. 
Outro ponto fundamental da Lei nº 6.938/1981 foi a criação do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), que é o conjunto de órgãos da União, estados, Distrito Federal, municípios e suas respectivas administrações indiretas, responsáveis pela proteção, pelo controle, pelo monitoramento e pela melhoria da qualidade e da política ambiental no país. Trata-se da estrutura responsável pela administração ambiental no Brasil. O Sisnama é regulamentado pelo Decreto nº 99.274/1990 (BRASIL, 1990) e estrutura-se em seis recortes fundamentais: 
Órgão superior: o Conselho de Governo, com a finalidade de assessor o Presidente da República nas questões ambientais. 
Órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), com a função de assessor o Conselho de Governo e, especialmente, de deliberar sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente. 
Órgão central: o Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de coordenar a política nacional e as diretrizes para a proteção ambiental. 
Órgão executor: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que são autarquias federais responsáveis por executar e fazer executar as diretrizes governamentais para o meio ambiente. 
Órgãos seccionais: os órgãos ou as entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental. 
Órgãos locais: os órgãos ou as entidades municipais responsáveis pelo controle e pela fiscalização dessas atividades nas suas respectivas jurisdições. 
Por fim, é preciso evidenciar que a partir da PNMA surgiram outras políticas públicas em áreas específicas em matéria ambiental, como a Política Nacional de Recursos Hídricos; a Política Nacional de Resíduos Sólidos; a Política Nacional de Biodiversidade; a Política Nacional Educação Ambiental; a Política Nacional de Mudança do Clima e outras. O fato de termos políticas em nível nacional mostra a preocupação da articulação entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios.
As políticas públicas e a regulação das atividades econômicas
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As políticas públicas ambientais possuem uma interface imediata com as atividades econômicas, especificamente por meio de programas e procedimentos para disciplinar e condicionar empreendimentos e atividades potencialmente poluidores ou causadores de degradação. No caso da Política Nacional do Meio Ambiente, dois de seus instrumentos, previstos em seu art. 9º (BRASIL, 1981), são fundamentais para a regulação das atividades econômicas: a avaliação de impactos ambientais e o licenciamento ambiental. 
A avaliação de impactos ambientais é um instrumento de gestão ambiental que dispõe sobre a obrigatoriedade de estudos sobre os impactos ambientais de atividades e empreendimento potencialmente causadores de poluição ou degradação ambiental. A avaliação de impactos ambientais é a análise técnica sobre os possíveis impactos, que se dá por meio dos estudos ambientais. Um exemplo é o Estudo Prévio de Impacto Ambiental, conhecido pela sigla Eia/Rima, com previsão constitucional e obrigatório para as atividades e empreendimento potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente (BRASIL, 1988). Note que o Eia/Rima não é para todos os empreendimentos; o pressuposto é que a obra ou atividade seja potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, como é o caso de rodovias, ferrovias, atividades de mineração e outras (CONAMA, 1986). O Eia/Rima é um estudo público, complexo, elaborado pelo empreendedor, que será analisado pelo órgão ambiental competente. Agora, quando o empreendimento não for causador de significativa degradação ambiental, os estudos ambientais serão simplificados, como é o caso do Relatório Ambiental Preliminar (RAP), aplicável para obras e atividades poluidoras e degradadoras, mas não de forma significativa. 
A avaliação de impactos ambientais está diretamente ligada a outro importante instrumento da PNMA: o licenciamento ambiental. Isso porque, no curso de um licenciamento ambiental, teremos a necessidade de elaboração de estudos ambientais por parte dos empreendedores. O licenciamento ambiental, segundo Melo (2017, p. 221), é um procedimento administrativo com a
“[...] finalidade de avaliar os possíveis impactos e riscos de uma atividade ou empreendimento potencialmente causador de degradação ambiental ou poluição”.
Esse instrumento é uma manifestação do princípio da prevenção, ou seja,tem como objetivo antecipar e mitigar os impactos negativos de uma empresa ou atividade potencialmente causadora de poluição ou degradação ambiental. Enquanto procedimento, o licenciamento ambiental passa por etapas, em que o empreendedor deverá observar as prescrições do órgão ambiental para a obtenção das licenças ambientais do seu negócio. No licenciamento ambiental trifásico, que é o mais completo, é necessária a obtenção de três licenças ambientais. São elas (MELO, 2017): (i) licença prévia, obtida com a aprovação do projeto e de sua localização; (ii) licença de instalação, em que o projeto é implementado e ganha materialidade; (iii) licença de operação, que permite o funcionamento da empresa. Caso o empreendimento seja potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente, o empreendedor deverá elaborar o Eia/Rima, cuja aprovação pelo órgão ambiental enseja a concessão da licença prévia, prosseguindo, depois, com as demais etapas. A propósito, nos casos de exigência de Eia/Rima, será possível a realização de audiência pública, na garantia do princípio da participação comunitária. Podem requerer a audiência pública o próprio órgão ambiental licenciador, o Ministério Público, uma entidade da sociedade civil ou cinquenta ou mais cidadãos (CONAMA, 1987). 
O licenciamento ambiental pode ser realizado por qualquer ente federativo – União, estados-membros, Distrito Federal e municípios –, desde que tenha órgão ambiental capacitado e conselho de meio ambiente. Para exemplificar, no âmbito federal temos o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) – órgão ambiental – e o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). Esses dois requisitos são obrigatórios para que um ente federativo proceda ao licenciamento ambiental. A divisão de atribuições entre os entes federativos encontra-se na Lei Complementar nº 140/2011, que divide as ações administrativas entre os entes federativos. 
Em uma síntese, a União licenciará os empreendimentos localizados e desenvolvidos (i) no Brasil e em país limítrofe; (ii) no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; (iii) em terras indígenas; (iv) em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs); (v) em dois ou mais Estados; (vi) de caráter militar; (vii) destinados a material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN); entre outras atribuições (BRASIL, 2011). Os estados-membros promoverão o licenciamento de atividades ou empreendimento efetivos ou potencialmente poluidores ou capazes de causar degradação, ressalvada as atribuições dos demais entes; ou de atividades ou empreendimentos em unidades de conservação instituídas pelo Estado, exceto em APAs (BRASIL, 2011). Por fim, os municípios licenciarão os empreendimentos que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local, ou em unidades de conservação instituídas pelo município, exceto em APAs (BRASIL, 2011). 
O licenciamento ambiental é, portanto, um instrumento de grande centralidade para as atividades econômicas em nosso país.
Aula 4 – Responsabilidade em matéria ambiental
O conceito de dano ambiental
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O arcabouço jurídico de proteção ao meio ambiente tem como objetivo a prevenção aos impactos ambientais que causem poluição ou degradação, notadamente em casos de dano ambiental. Com a ocorrência de um dano ambiental, adentra-se nas discussões sobre a responsabilidade em matéria ambiental (MELO, 2017). 
Em que pese a sua importância, o ordenamento jurídico brasileiro não confere uma definição de dano ambiental. Por essa razão, a sua compreensão passa por elementos doutrinários e pela interpretação dos tribunais superiores, especialmente o Superior Tribunal de Justiça (MELO, 2017). Antes de adentrar nos aspectos doutrinários e jurisprudenciais, é importante conhecer dois conceitos legais e que estão associados ao entendimento do dano ambiental. São eles: degradação da qualidade ambiental e poluição. 
Considera-se degradação da qualidade ambiental a “[...] alteração adversa das características do meio ambiente”, conforme o art. 3º, II, da Lei nº 6.938/1981 (BRASIL, 1981, [s. p.]). A degradação da qualidade ambiental ocorre tanto pela ação antrópica (humana) quanto por um evento natural, como um abalo sísmico ou uma erupção vulcânica. 
Já o conceito de poluição possui amparo legal no art. 3º, III, da Lei nº 6.938/1981, considerada 
[...] a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. (BRASIL, 1981, [s. p.]) 
 A poluição é a degradação da qualidade ambiental provocada por uma atividade antropogênica, isto é, promovida pelo homem. A poluição é sempre negativa, e no ordenamento jurídico brasileiro é um ilícito penal, conforme o art. 54 da Lei nº 9.605/1998 (BRASIL, 1998), e administrativo, ao teor do art. 61 do Decreto nº 6.514/2008 (BRASIL, 2008). 
Quanto ao dano ambiental, Benjamin (2011, p. 132) vai defini-lo
“[...] como a alteração, deterioração ou destruição, parcial ou total, de qualquer dos recursos naturais, afetando adversamente o homem e/ou a natureza”. 
Leite e Ayala (2010, p. 102), após análise da legislação brasileira, apresentam o seguinte conceito: 
Dano ambiental deve ser compreendido como toda lesão intolerável causada por qualquer ação humana (culposa ou não) ao meio ambiente, diretamente, como macrobem de interesse da coletividade, em uma concepção totalizante, e, indiretamente, a terceiros, tendo em vista interesses próprios e individualizáveis e que refletem no macrobem. 
Por essa leitura, o dano ambiental pode atingir o macrobem ambiental, esse que é o meio ambiente em uma visão global e integrada, como bem de uso comum do povo, e os microbens, que são a parte corpórea do meio ambiente (fauna, flora etc.). Ademais, o dano ambiental pode afetar interesses individualizáveis, patrimoniais ou extrapatrimoniais. 
De comum entre esses conceitos é a caracterização, em regra, da dupla face do dano ambiental, afetando a natureza e o homem. O dano ambiental possui
“[...] feição multifacetária, com implicações no macrobem ambiental, nos microbens ambientais (florestas, rios, fauna etc.), no patrimônio material e moral de pessoas e da coletividade” (MELO, 2017, [s.p.]). 
Nesse sentido, diante das várias dimensões jurídicas, apresentaremos duas das principais classificações doutrinárias e jurisprudenciais sobre o dano ambiental: quanto à extensão do bem protegido e quanto à extensão do dano ambiental (LEITE; AYALA, 2010). 
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Figura 1 | Classificação de dano ambiental. Fonte: elaborada pelo autor.
Quanto à extensão do bem protegido, é possível configurar como: (i) dano ambiental lato sensu; (ii) dano individual, reflexo ou em ricochete. 
Compreende-se como
“[...] dano ambiental lato sensu (em sentido amplo) o que afeta os interesses difusos da coletividade e, como tal, todos os componentes do meio ambiente (meio ambiente natural, cultural, artificial)” (MELO, 2017, p. 374). 
Dano ambiental individual, reflexo ou em ricochete é
“[...] o dano individual, que afeta interesses próprios, e somente de forma indireta ou reflexa protege o bem ambiental” (MELO, 2017, p. 374).
Para exemplificar, as lesões à saúde, ao patrimônio e à atividade econômica de uma ou de um grupo de pessoas. 
Quanto à extensão do dano, a divisão em: (i) dano patrimonial; (ii) dano extrapatrimonial. Dano ambiental patrimonial
“[...] é o que diz respeito à perda material do bem atingido. É o dano físico, material” (MELO, 2017, p. 375).
Quanto ao dano extrapatrimonial ou moral ambiental, é aquele que ofendevalores imateriais, reduzindo o bem-estar, a qualidade de vida do indivíduo ou da coletividade ou atingindo o valor intrínseco do bem. O dano extrapatrimonial pode ser dividido em individual e coletivo. O dano moral ambiental individual é aquele que acarreta dor ou sofrimento psíquico para uma pessoa, como no caso de um pescador impedido de exercer sua atividade econômica por causa de um dano ambiental. O dano moral ambiental coletivo, por sua vez, se dá pelo prejuízo à imagem e moral coletiva dos indivíduos. Com esses apontamentos, fica evidenciado o caráter multifacetário do dano ambiental no ordenamento jurídico brasileiro.
A responsabilidade nas esferas civil, penal e administrativa
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Entende-se por responsabilidade a obrigação de responder pela ação ou omissão que seja lesiva a uma pessoa, patrimônio ou em face de uma obrigação legal. Na esfera ambiental, a responsabilidade surge com a conduta considerada lesiva ao meio ambiente. Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 disciplina a responsabilidade em matéria ambiental nos seguintes termos:
“as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados” (BRASIL, 1988, [s. p.]).
Essa norma estabelece a tríplice responsabilidade em matéria ambiental: civil, penal e administrativa. Cada uma delas dispõe de um regime jurídico próprio que, apesar de disciplinarem a aplicação de sanções aos responsáveis, a preocupação central está em reparar os danos causados ao meio ambiente. 
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Figura 2 | Natureza jurídica da responsabilidade ambiental. Fonte: elaborada pelo autor.
A responsabilidade penal ambiental é disciplinada pela Lei nº 9.605/1998, também conhecida como Lei de Crimes Ambientais. No caso de cometimento de um crime ambiental, conforme os tipos penais, teremos a imputação da pessoa física ou jurídica. Essa responsabilidade é sempre subjetiva, com a necessidade de comprovação da culpabilidade – dolo ou culpa – do autor do crime. Uma das novidades da Lei nº 9.605/1998 foi instituir a responsabilidade penal da pessoa jurídica,
“[...] nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade” (BRASIL, 1998, [s. p.]).
Dois são os requisitos para configurar a responsabilidade penal da pessoa jurídica: (i) a decisão deve ser praticada pelo representante legal ou pelo órgão colegiado da empresa; (ii) a conduta deve satisfazer ou beneficiar os interesses da pessoa jurídica. Assim, uma decisão do representante legal/contratual ou de um órgão colegiado, que beneficie a empresa, enseja a discussão do cometimento de um ilícito penal e, caso se confirme, ela poderá ser condenada isolada, cumulativa ou alternativamente às penas de multa, restritivas de direitos e prestação de serviços à comunidade (BRASIL, 1998). Registra-se que não é obrigatório a dupla imputação, isto é, a persecução penal simultânea da pessoa jurídica e da pessoa física responsável no âmbito da empresa. Já as pessoas físicas que cometem crimes ambientais poderão sofrer as penas restritivas de liberdade, restritivas de direitos e multa, de acordo com o crime ambiental cometido. 
A responsabilidade administrativa ambiental, por sua vez, surge quando a pessoa física ou jurídica pratica uma infração administrativa que, segundo definição legal, é
“[...] toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente” (BRASIL, 1998, [s. p.]).
Em nível federal, o Decreto nº 6.514/2008 disciplina as infrações administrativas e o processo administrativo ambiental. Na responsabilidade administrativa, que é subjetiva – há que demonstrar o dolo e a culpa do responsável –, ao se verificar o cometimento de uma infração ambiental, o fiscal do órgão ambiental – que pode ser federal, estadual ou municipal – lavra um auto de infração e aplica uma sanção à pessoa física ou jurídica, que pode ser uma multa, suspensão de atividades, demolição de obra e outras (BRASIL, 2008). Com isso, é instaurado o processo administrativo, em que o autuado poderá se defender dos fatos e fundamentos consignados no auto de infração e, ao final, a decisão da autoridade administrativa ambiental. 
Por fim, temos a responsabilidade civil ambiental. No caso da ocorrência de um dano ambiental, o responsável, pessoa física e jurídica, de direito público ou privado, é obrigado à reparação. O ordenamento jurídico brasileiro adota, desde a Lei nº 6.938/1981, a teoria da responsabilidade civil objetiva, em que é necessária somente a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta e o dano, sem discutir sobre a culpabilidade, isto é, não é preciso investigar a culpa ou o dolo do poluidor/degradador. Além disso, a adoção da teoria da responsabilidade objetiva implica a irrelevância da licitude ou ilicitude da atividade e que questões como caso fortuito e de força maior não são excludentes. 
A licitude de uma atividade ou um empreendimento, quer autorizado ou licenciado, não afasta ou atenua a responsabilidade do poluidor. Isso porque, nas palavras de Milaré (2011, p. 1257),
“[...] não raras vezes o poluidor se defendia alegando ser lícita a sua conduta, porque estava dentro dos padrões de emissão traçados pela autoridade administrativa e, ainda, tinha autorização ou licença para exercer aquela atividade”.
O fato do empreendimento ou da atividade ter se submetido ao licenciamento ambiental, por exemplo, não exime a empresa da obrigação de reparar as consequências de suas intervenções, especialmente em caso de dano ao meio ambiente. De forma direta, o argumento da licitude da atividade não afasta eventual responsabilidade do poluidor. Em paralelo, é tese do STJ que
“[...] não há direito adquirido à manutenção de situação que gere prejuízo ao meio ambiente” (BRASIL, 2018a, [s. p.]). 
Com relação ao caso fortuito e da força maior, que são clássicas excludentes de responsabilidade, elas não podem ser invocadas para elidir a obrigação de reparar os danos causados. Uma vez que o empreendedor assume a atividade, ele é integralmente responsável pelos danos decorrentes de sua atividade econômica. Isso porque o STJ adota a teoria do risco integral em matéria ambiental, que não admite excludentes e atenuantes na responsabilização do degradador (BRASIL, 2014).
A reparação do dano ambiental
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Ao se verificar a ocorrência de um dano ao meio ambiente, é necessário que se proceda à sua reparação, que deve ser integral. 
A primeira pergunta é: quem deve reparar? Por evidente, o causador do dano ambiental. Todavia, essa resposta precisa ser adequada com a figura do poluidor no sistema jurídico brasileiro. Conforme a Lei nº 6.938/1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, o poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou de direito privado, direta ou indiretamente responsável pela poluição ou degradação ambiental (BRASIL, 1981). Por esse conceito, tanto pessoas de direito privado – empresas – quanto as entidades da Administração Pública Direta – União, estados, Distrito Federal e municípios – e indireta – autarquias, fundações públicas e outras – podem ser consideradas como poluidoras. Mas, há um aspecto muito importante: o poluidor pode ser direto ou indireto. O poluidor direto é aquele que efetivamente causou a degradação, ao passo que o poluidor indireto é aquele que, de alguma forma, contribuiu para o dano ambiental. Como exemplo, instituições financeiras podem ser responsabilizadas por empréstimos a empresas que causem danos ambientais; a empresa como poluidora direta, a instituição financeira como poluidora indireta, porque sem o empréstimo não teria ocorrido o dano ambiental. E o último ponto a ser destacado é que pela jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) os poluidores direto e indireto sãosolidários, significa dizer que aqueles que participaram do dano ambiental ou que tiraram proveito da atividade são igualmente responsáveis pela reparação. Assim, uma ação civil pública – a principal ação de natureza ambiental – pode ser ajuizada em face de ambos, poluidor direto ou indireto, ou de qualquer um deles. 
A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (BRASIL, 1981) e a Lei da Ação Civil Pública (BRASIL, 1985) relacionam, basicamente, duas formas de reparação do dano ambiental: (i) a reparação/restauração e a (ii) indenização pecuniária. Uma outra modalidade de reparação é destacada pela doutrina: a compensação ecológica (MELO, 2017). Dessa forma, são três as modalidades de reparação do dano ambiental: (i) reparação específica (in natura); (ii) compensação ecológica; (iii) indenização pecuniária. Destaca-se, em um primeiro momento, que a ordem estabelecida deve ser observada, ou seja, deve ser priorizada a reparação específica sobre as demais modalidades, que são subsidiárias. 
A reparação específica, também chamada de in natura, é aquela no local em que ocorreu o dano ambiental e, assim, encontra-se na perspectiva de retorno do equilíbrio ecológico, ou pelo menos uma situação mais próxima (MELO, 2017). Nessa modalidade, é o próprio bem lesado que deve ser reparado. Por exemplo, se o dano é o desmatamento de dez hectares de vegetação primária, a reparação será no próprio local, com a obrigação de fazer, consistente na recomposição da área desmatada. 
Agora, se não for possível a reparação específica, adentra-se nas hipóteses de compensação ecológica ou de indenização pecuniária. A compensação ecológica é a substituição do bem lesado por outro equivalente (MELO, 2017). Para essa modalidade, além da impossibilidade da reparação específica, é preciso que a área a ser compensada seja do mesmo tamanho da área do dano e que tenha a mesma importância ecológica. A indenização pecuniária, por fim, é a forma clássica de reparação no direito civil, mas subsidiária no direito ambiental (MELO, 2017). Os valores arrecadados a título de indenização são destinados para o fundo para reconstituição dos bens lesados, criado pela Lei da Ação Civil Pública. 
Uma questão relevante é a cumulação de pedidos em uma ação civil pública ambiental, isto é, tanto a reparação específica – obrigação de fazer ou de não fazer – quanto a indenização pecuniária. O STJ entende por essa possibilidade. Segundo a Súmula 629,
“quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar” (BRASIL, 2018b, [s. p.]).
Portanto, aquele que cometer um dano ambiental poderá ser obrigado reciprocamente a reparar onde ocorreu o dano ambiental e destinar recursos financeiros para o fundo para reconstituição dos bens lesados. 
Por fim, a pretensão de reparação aos danos causados ao meio ambiente é imprescritível, conforme decidiu o STF (BRASIL, 2020). Por outras palavras, uma ação civil pública de reparação de danos causados ao meio ambiente não está sujeita ao instituto da prescrição, podendo ser ajuizada mesmo que tenha se passado vários anos da ocorrência do dano. Trata-se de demonstração da relevância do bem ambiental, cuja proteção é imprescindível para todas as atividades humanas.

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