Buscar

Os contextos tradicional e social da romance Niketche uma história da poligamia

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 3 páginas

Prévia do material em texto

TEMA – CONTEXTO HISTÓRICO E SOCIAL NA OBRA “NIKETCHE: UMA HISTÓRIA DE POLIGAMIA ”
INTRODUÇÃO 
Paulina Chiziane, a primeira mulher a publicar romance em Moçambique, marcou presença na conquista pela independência nacional como militante. A escritora faz da sua narrativa um meio para apresentar ao mundo, de forma inovadora, temas e acontecimentos polêmicos que fazem parte da tradição de seu país. Com sua prosa, entra com força no universo da literatura moçambicana, que antes era composto apenas por homens. 
As restrições do sistema patriarcal, que tornam a vida difícil para as mulheres da cidade, foram combatidas pela narradora Rami. Embora a posição subserviente de Rami e as suas emoções de solidão e dor estejam ligadas ao sistema patriarcal da sociedade tradicional moçambicana, também reflectem a situação das mulheres em todo o lado.
“Em todo o caso, a nossa sociedade sempre foi polígama. Desde tempos imemoriais, os homens sempre tiveram várias mulheres e filhos. É tradição, é cultura, é nossa identidade como moçambicanos” (Chiziane, 2002, p. 17).
CONTEXTO HISTÓRICO
 “Niketche: uma história da poligamia ” é um romance de uma autora moçambicana publicado em 2002. O romance se passa no Moçambique pós-colonial e explora temas como relações de gênero, desigualdade social e identidade cultural.
 Falando sobre o contexto histórico do romance, o romance se passa no rescaldo da luta de Moçambique pela independência do domínio colonial português, que durou de 1964 a 1974.
 Em 1964, para tentar acabar com a colonização portuguesa, em Moçambique existia a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique, que era um movimento armado que criava zonas francas, onde essas áreas ficavam for a do controle e administração de Portugal (ISSUFO, 2021). Esta luta da FRELIMO contra a dominação portuguesa durou dez anos, terminando após o acordo de Lusaka em setembro de 1974. E em 25 de junho de 1975, a independência nacional de Moçambique foi oficialmente proclamada. Naquela época, o país tinha 90% de analfabetos.
 A partir de 1977, eclodiu no país uma guerra civil, onde a RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana) contestou o governo da FRELINO. Em 1984, com o objetivo de acabar com a guerra, foi assinado o Acordo de Inkomati, mas esse acordo ficou apenas no papel. Em 1992, após 16 anos de Guerra Civil, com o Acordo Geral de Paz de Roma, o ex-presidente de Moçambique e o líder da RENAMO assinaram o acordo de paz, que viu um país completamente devastado pela guerra. A guerra teve um impacto profundo na sociedade moçambicana e deixou uma marca duradoura nas estruturas sociais, políticas e económicas do país. O romance reflete as complexidades e tensões que surgiram durante o período pós-colonial, quando o país procurou se redefinir e navegar pelos legados do colonialismo.
 “Depois da independência, muitos moçambicanos pegaram em armas e aderiram à luta armada. Eles foram heróis da independência, lutando contra a opressão colonial e conquistando a liberdade para o nosso povo. Mas quando voltaram para casa, trouxeram consigo um novo tipo de opressão, um novo tipo de exploração: a poligamia” (Chiziane, 2004, p. 18).
CONTEXTO SOCIAL
 Chiziane utiliza a história de Rami, a protagonista do romance, para realçar as lutas sociais e económicas enfrentadas pelas mulheres em Moçambique durante o período pós-colonial. Durante o período colonial, as mulheres sujeitavam-se abertamente às suas práticas culturais, incluindo a poligamia, pois acreditavam que assim mantinham vivas as suas tradições. Mas com o fim do domínio colonial, muitas mulheres lutaram contra algumas destas tradições que não lhes eram tão favoráveis.
 A tradição moçambicana deste período baseava-se na tradição patrilinear no Sul e na tradição matrilinear no Norte e Centro do país. Estes dois sistemas ditavam as formas de socialização das mulheres e dos homens e, consequentemente, as suas posições na sociedade. No romance , Rami é uma mulher do Norte que se casou muito jovem e foi abandonada pelo marido. De acordo do costume, ela se tornou uma das mulheres do irmão do marido, após da sua morte presumida. O romance explora as complexas dinâmicas de poder que surgem nesta relação, como o estigma social associado às mulheres envolvidas em tais relações. O romance também menciona aspectos culturais relevantes, como a tradição “lobolo”, a poligamia, os casamentos precoces, os ritos de iniciação e os rituais de purificação das viúvas em todo o país. (Maúnga, 2021).
 Nas regiões onde a sociedade é matrilinear, a posição das mulheres é um pouco mais favorecida, mas elas não detêm muito poder. O irmão da mãe tem o direito de administrar e distribuir os bens da família, enquanto as outras mulheres da família não têm esse direito. Apesar de o divórcio ser uma prática permitida, as mulheres são as mais afectadas, uma vez que os bens e os filhos ficam com o marido e, mesmo em caso de morte do marido, a mulher fica sem nada. Os costumes continuam a ser uma forma de controlo social que privilegia o colectivo em detrimento do individual. (Maúnga,2021).
 O “lobolo” é uma prática mais comum nas sociedades patrilineares e significa o dote da noiva. Este ritual acentua o domínio do homem sobre a mulher, tornando a mulher inferior em propriedade do homem. Este acordo entre a família dos noivos mantém-se em vigor e os tios dos noivos, variando de família para família o montante monetário, fruto da troca.
 A poligamia, embora seja uma prática que não está na lei em Moçambique, é uma prática cultural de organização familiar, que permite a um homem ter várias esposas ao mesmo tempo. Os ritos de iniciação educam as mulheres para serem obedientes, submissas e como agradar os maridos ou homens (Maúnga, 2021) e em muitos ritos de iniciação há também a mutilação genital, onde as mulheres aprendem a fazer o estiramento dos órgãos genitais. O ritual de viuvez, chamado Kutchinga, “obriga a viúva a ter relações sexuais com o irmão mais novo do seu falecido marido” (Maúnga, 2021). O ritual é ordenado para purificar a viúva e a sua casa.
 Essa cultura e esses rituais, embora estranhos, é o que o protagonista Rami (Chiziane, 2004) vivencia, descreve e discute ao longo de sua narrativa, mostrando os dois lados, o lado favorecido (homens) e o lado menos favorecido com os costumes (mulheres).
 No seu conjunto, "Niketche: uma história da poligamia" oferece um comentário poderoso sobre os contextos social e histórico de Moçambique na era pós-colonial. Através da vida de Rami, Chiziane oferece um retrato matizado das complexidades das relações de género, da identidade cultural e da desigualdade social na sociedade moçambicana contemporânea. As restrições do sistema patriarcal, que dificultavam a vida das mulheres na cidade, foram combatidas pelo narrador Rami. Embora a posição subserviente de Rami e as emoções de solidão e dor estejam ligadas ao sistema patriarcal da sociedade tradicional moçambicana, também refletem a situação difícil das mulheres em todos os lugares.
BIBLIOGRÁFIA 
CHIZIANE, Paulina. “Niketche: Uma história de poligamia”. Caminho,2004.
MAÚNGUE, Hélio Bento. “Mulher moçambicana: cultura, tradição e questões de género na feminização do HIV/SIDA”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 28, n. 1, e68328, 2020
ARAÚJO, Erika Tonelli de.”Um olhar sobre a cultura e sociedade em Moçambique: a ficção e a realidade. In: Niketche: uma história de Poligamia, de Paulina Chiziane. Dissertação (Mestrado em Sociologia) Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho,” UNESP, 2009.
BONNICI, Thomas. “O pós-colonialismo e a literatura: estratégias de leitura.” Maringá: EDUEM, 2000.
LEITE, Ana Mafalda. “Literaturas africanas e formulações pós-coloniais.” Lisboa: Colibri,2003.

Continue navegando