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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE E DESENVOLIMENTO REGIONAL BACHARELADO EM CIÊNCIA ECONÔMICAS ALEXYA COSTA MORAES O MERCADO DE CRÉDITO DE CARBONO NO BRASIL: Uma análise das propostas de implementação. CAMPOS DOS GOYTACAZES, RJ 2022 ALEXYA COSTA MORAES O MERCADO DE CRÉDITO DE CARBONO NO BRASIL: Uma análise das propostas de implementação Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvol- vimento Regional, da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para conclusão curso de Bacharelado em Ciências Econômicas. Orientador: Profa Dra. Vanessa Lopes Teixeira Coorientador: Guilherme Rodrigues Lima CAMPOS DOS GOYTACAZES, RJ 2022 ALEXYA COSTA MORAES O MERCADO DE CRÉDITO DE CARBONO NO BRASIL: Uma análise das propostas de implementação Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvol- vimento Regional, da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para conclusão curso de Bacharelado em Ciências Econômicas. Orientador: Profa Dra. Vanessa Lopes Teixeira Coorientador: Guilherme Rodrigues Lima Aprovada em 16 de Dezembro de 2022 BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Profa Dra. Vanessa Lopes Teixeira – UFF ___________________________________________ Prof. Guilherme Rodrigues Lima – UFRJ ___________________________________________ Prof. Saulo Jardim de Araújo – UFF _______________________________________ Prof. Dr. Samuel Alex Coelho Campos - UFF CAMPOS DOS GOYTACAZES, RJ 2022 AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço à minha família, em especial à minha mãe, Verônica Costa, e à minha avó, Suely Costa, por todo suporte e cuidado na criação do meu filho para que eu nunca precisasse parar de estudar. Não chegaria aqui se não fosse por vocês. Ao meu filho, Benjamin, por todo aprendizado, mesmo que através de muitos desafios, e pelo amor que ser sua mãe me proporcionou ao longo desses anos. Agradeço à ProfessoraVanessa Lopes Teixeira, não só por toda paciência, suporte e orientação na presente monografia, mas também durante o projeto de Desenvolvimento Acadêmico do qual fiz parte como bolsista. Agradeço ao Professor Guilherme Rodrigues Lima por toda paciência, suporte e orientação durante o árduo processo de elaboração dessa monografia. Agradeço também a todo o corpo docente da Universidade Federal Fluminense por toda troca e aprendizado proporcionados ao longo dos anos. A todos meus colegas de graduação, mas em especial à minha amiga Brenda Guimarães, que sempre viu em mim potenciais para além do que eu era capaz de ver, sempre me incentivando. Ao meu companheiro, Christian Graf por toda parceria e incentivo, sempre acreditando e torcendo pelo meu sucesso. Por fim, agradeço à banca aqui presente por terem aceitado fazer parte de um momento tão importante e especial na minha vida. RESUMO Diante de um cenário climático alarmante e que exige comprometimento de todo o mundo no combate às mudanças climáticas, o Brasil assumiu metas de redução das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) através de sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) no âmbito do Acordo de Paris. No entanto, a implementação das ações necessárias para que as metas sejam alcançadas demanda recursos expressivos dos quais o país ainda não dispõe. Um dos instrumentos que pode contribuir para viabilizar a implementação das ações de redução das emissões é o mercado de carbono, através do qual essas reduções geram créditos que podem ser negociados. O objetivo deste trabalho é analisar as bases teóricas do mercado de carbono, as propostas de regulamentação do instrumento no Brasil e os impactos de sua adoção sobre a economia para o cumprimento das metas assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris. A elaboração deste trabalho se deu através de pesquisa bibliográfica sobre o surgimento do mercado de carbono na teoria econômica, e da análise descritiva das principais propostas para o instrumento no país e de estudos que avaliaram os impactos da sua implementação. Como principal resultado, observou-se que o mercado de carbono é um instrumento com potencial de contribuir para que as metas da NDC brasileira sejam atingidas, mas que ainda enfrenta muitos desafios para a sua plena implementação, dado que o arcabouço regulatório encontra-se em construção, ao mesmo tempo em que o país sofre com uma crise ambiental que vem se agravando no atual governo. Palavras-chaves: Mudanças Climáticas; Crédito de Carbono; Mercado de Carbono; Contribuição Nacionalmente Determinada; Externalidades. ABSTRACT Faced with an alarming climate scenario that requires the commitment of the whole world to combat climate change, Brazil has assumed goals to reduce greenhouse gas (GHG) emissions through its Nationally Determined Contribution (NDC) under the Paris Agreement. However, the implementation of the necessary actions for the goals to be reached demands significant resources that the country still does not have. One of the instruments that can contribute to enabling the implementation of emission reduction actions is the carbon market, through which these reductions generate credits that can be traded. The objective of this study is to analyze the theoretical bases of the carbon market, the proposals for regulating the instrument in Brazil and the impacts of its adoption on the economy for the fulfillment of the goals assumed by Brazil under the Paris Agreement. The elaboration of this study took place through bibliographic research on the emergence of the carbon market in economic theory, and through a descriptive analysis of the main proposals for the instrument in the country and studies that evaluated the impacts of its implementation. As a main result, it was observed that the carbon market is an instrument with the potential to contribute to achieving the goals of the Brazilian NDC, but it still faces many challenges to its implementation, considering that the regulatory framework is still under construction, whilst the country has been facing an environmental crises that has been getting worse under the current government. Keywords: Climate changes; Carbon Credit; Carbon Market; Nationally Determined Contribution; Externalities. LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS AFOLU - Agriculture, Forestryand Land Use AR6 - Sexto Relatório de Avaliação do IPCC ASCEMA - Associação dos Servidores da Carreira Especialista em Meio Ambiente BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento BNDES- Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social CBEDS - Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável COP - Conferência das Partes CO2 - Dióxido de Carbono CH4 - Metano CQNUMC - Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima GEE - Gases de Efeito Estufa GLP - Gás liquefeito de petróleo INSS - Instituto Nacional do Seguro Social IPCC - Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima MDL - Mecanismo de Desenvolvimento Limpo NDC - Contribuição NacionalmenteDeterminada ONU - Organização das Nações Unidas OVN - Offsets de Vegetação Nativa PIB - Produto Interno Bruto PL - Projeto de Lei PMR - Partnership for Market Readiness PNMC - Política Nacional sobre Mudança do Clima RCE - ReduçãoCertificada de Emissões UNFCCC - United Nations Framework Convention on Climate Change WG - Work Group LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Funcionamento do Mercado de emissão de licenças 22 Figura 2 - Emissões brutas de GEE no Brasil por setor (2000 - 2020) 29 Figura 3 - Lógica de Comparação dos Cenários 34 Figura 4 - Cenários e Emissões 38 Figura 5 - Emissões Evitadas Acumuladas (MtCO2e) por Setor entre 2021-2030 48 Figura 6 - Indicadores Macroeconômicos 50 Figura 7 - Poder de Compra por Classe. 51 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Cenários simulados no PMR e principais características 34 Tabela 2 - Evolução do PIB por cenário (em bilhões de Reais) 42 Tabela 3 - Evolução da renda disponível classe 4 (20% mais pobres) 44 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................................................9 1 -AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O MERCADO DE CARBONO.......................... 12 1.1 As mudanças climáticas no Brasil e no mundo..................................................... 12 1.2 Análise teórica do mercado de carbono................................................................. 17 2 -PROPOSTAS PARA UM MERCADO DE CARBONO NO BRASIL ........................26 2.1 Projeto de Lei 528/2021.......................................................................................... 27 2.2 Projeto Partnership for Market Readiness........................................................... 30 2.3 Clima e Desenvolvimento: Visões para o Brasil 2030........................................... 36 2.4 Decreto nº 11.075 de 2022........................................................................................ 39 2.5 Discussão................................................................................................................... 39 3 -IMPACTOS DE UM MERCADO DE CARBONO NO BRASIL.............................. 41 3.1 Projeto Partnership for Market Readiness........................................................... 41 3.2 Estudo Clima e Desenvolvimento: Visões para o Brasil 2030.............................. 47 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 53 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................... 56 9 INTRODUÇÃO Em um cenário mundial em que se faz necessário de maneira urgente uma conscientização sobre as mudanças climáticas e combate ao aquecimento global, o mercado de crédito de carbono vem surgindo cada vez mais no debate como uma estratégia para mitigar as emissões de Gases de Efeito Estufa. Nas décadas de 1990 à 2020, os debates quanto às mudanças climáticas e principalmente sobre a influência das ações humanas nessas mudanças vêm se intensificando. No ano de 2021, o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) apontou em seu 6° Relatório de Avaliação (AR6, na sigla em inglês) que é inequívoco o peso das ações humanas no aumento da temperatura da atmosfera, dos oceanos e da superfície terrestre, através principalmente da emissão de Gases de Efeito Estufa. Essas emissões são responsáveis por externalidades negativas para o meio ambiente e consequentemente para a sociedade, que além de necessitar dos recursos naturais ameaçados para a subsistência, sofre de maneira cada vez mais recorrente e intensa com os efeitos do aquecimento global em forma de catástrofes socioambientais. Diante da importância que o tema veio ganhando ao longo do tempo, nos anos 1990 surgiu o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente em conjunto com a Organização Meteorológica Mundial. Trata-se de um organismo intergovernamental com finalidade de debater as questões ambientais e criar um tratado global (uma governança mundial) para cuidar deste tema. Dentre os feitos desta governança, destacam-se a criação do Painel Intergovernamental em Mudanças Climáticas e da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), promulgada em 9 de maio de 1992, na cidade de Nova Iorque. A partir do surgimento da UNFCCC foram realizadas diversas Conferências das Partes (COP), que têm como objetivo principal promover e revisar a implementação da própria UNFCCC, além de também revisar os compromissos assumidos pelas partes envolvidas. Entre as Conferências das Partes já realizadas, merecem destaque por sua relevância especial para o presente trabalho a COP 3, realizada em Quioto (Japão) em 1997, e a COP 21, realizada em 2015 na cidade de Paris (França). O destaque da COP de Quioto se dá pelo fato de que é nessa conferência que surge o Protocolo de Quioto, considerado um dos acordos de 10 maior importância, pois além de firmar compromissos quanto às reduções de GEE por parte dos países industrializados, é também considerado o marco inicial do Mercado de Crédito de Carbono (CENAMO, 2004). Quanto à COP 21, é nela que surge o chamado "Acordo de Paris", onde foi firmado um compromisso mundial, no qual mais de 195 países assumiram metas com o principal objetivo de conter o aumento da temperatura em até 2ºC em relação aos níveis pré-industriais. O Brasil assinou o Acordo de Paris se comprometendo, através da sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), com a meta de redução das emissões de GEE em 37% até 2025 e de 43% até 2030, ambas em relação ao nível de emissões de 2005. Posteriormente houve uma atualização e foi estabelecido um novo patamar de redução de emissões em 50% até 2030, além da intenção de alcançar a neutralidade climática (zero emissões líquidas) até 2050. Diferentes estudos estimaram o dispêndio que seria necessário para o alcance das metas da NDC brasileira. O estudo IES-Brasil (La Rovere et al, 2016) calculou que seriam necessários entre R$ 99 bilhões e R$ 372 bilhões (em valores de 2005), a depender das ações de mitigação adotadas. Já o “Documento-base para subsidiar os diálogos estruturados sobre a elaboração de uma estratégia de implementação e financiamento da Contribuição Nacionalmente Determinada do Brasil ao Acordo de Paris”, do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), sugeriu investimentos entre R$ 890 bilhões e R$ 950 bilhões (em valores de 2017). A elevada necessidade de recursos para a implementação das ações de mitigação, aliada à indisponibilidade desses recursos pelo poder público, faz com que alternativas através de instrumentos econômicos, como é o caso do mercado de carbono, assumam grande importância para o cumprimento do compromisso assumido pelo país. O mercado de crédito de carbono pode ser entendido como um mercado de compra e venda de títulos, que permite a comercialização de uma parcela da redução de emissões de GEE. Isto é, aquele que conseguir manter suas emissões de carbono abaixo de um nível estabelecido pode vender os títulos que receber com esse feito para um terceiro cujas emissões excederam o nível permitido. Desta forma, o mercado de crédito de carbono é um instrumento de mitigação com grande potencial no cumprimento das metas de redução assumidas durante as Conferências das Partes, como o Acordo de Paris, visto que flexibiliza 11 as regras e permite que países com custos de abatimento das emissões mais elevados financiem a redução em regiões onde o custo é mais baixo. Para compreender o funcionamento deste mercado no Brasil e o seu impacto para as metas de redução assumidas pelo país recorreu-se à pesquisa bibliográfica sobre as bases teóricas do mercado de crédito de carbono, propostas para a implementação do instrumento nopaís e dois estudos que analisaram os impactos da sua adoção sobre a economia e as emissões de GEE. Esta monografia será composta por três capítulos, além da introdução e considerações finais. No primeiro capítulo, “As mudanças climáticas e o mercado de carbono”, são analisados os principais resultados dos relatórios mais recentes do IPCC e o embasamento para o mercado de carbono na teoria econômica. O segundo capítulo, "Propostas para um mercado de carbono no Brasil", apresenta as principais características das propostas para a regulamentação do mercado de carbono no Brasil. No terceiro capítulo, "Impactos de um mercado de carbono no Brasil", são apresentados os resultados encontrados em dois estudos sobre a implementação do instrumento no país. 12 1. AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O MERCADO DE CARBONO Este capítulo tem como objetivo apresentar uma análise sobre as mudanças climáticas e seus impactos no Brasil e no mundo e sobre como o mercado de carbono surge como um instrumento que pode contribuir para a solução do problema. A primeira parte do capítulo analisará os achados mais recentes da ciência sobre as mudanças climáticas, tendo como principal referência os relatórios publicados pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas publicados nos anos de 2014, 2021 e 2022. Na segunda parte serão abordados os fundamentos existentes na teoria econômica que estão na base das propostas sobre mercados de carbono. Ao final do capítulo serão feitas algumas considerações finais sobre os temas analisados. 1.1 As mudanças climáticas no Brasil e no mundo É inequívoco que a influência humana aumentou a temperatura da atmosfera, dos oceanos e da superfície terrestre (IPCC, 2021). Esta é uma das principais conclusões do sexto relatório de avaliação do Grupo de Trabalho 1 do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). O IPCC é um órgão da Organização das Nações Unidas (ONU) responsável por avaliar aspectos científicos relacionados às mudanças climáticas. Assim, o IPCC realiza avaliações sobre as bases científicas das mudanças climáticas, seus impactos e riscos futuros, as opções de mitigação e adaptação, entre outros temas. O IPCC possui em sua estrutura três grupos de trabalho (workinggroups - WG) que avaliam esses diferentes aspectos. O Grupo de Trabalho 1 (WG1) é responsável pelos aspectos físicos, como níveis de concentração de gases do efeito estufa (GEE), aumento da temperatura, elevação do nível dos oceanos, entre outros. O Grupo de Trabalho 2 (WG2) se dedica a avaliar os impactos, necessidade de adaptação e vulnerabilidades às mudanças climáticas. Já o Grupo de Trabalho 3 (WG3) estuda principalmente as opções de mitigação, ou seja, as medidas que podem ser adotadas para reduzir as emissões de GEE nos diferentes setores ou capturar o carbono da atmosfera. 13 Desde 1990 o IPCC já publicou seis Relatórios de Avaliação (Assessment Reports - AR), sendo que o último (AR6) foi publicado entre 2021 e 2022 (a contribuição do WG1 foi publicada em 2021 e as contribuições do WG2 e WG3 em 2022). Entre os as conclusões do WG1 no 6º relatório, pode-se destacar que pela primeira vez foi afirmado que não há dúvidas com relação à influência sobre as mudanças climáticas. Nos relatórios anteriores utilizavam- se expressões como “é atribuível”, “provável” ou “extremamente provável”, as quais denotam diferentes gradações com relação à responsabilidade humana e que foram evoluindo ao longo das publicações. Ainda de acordo com o relatório, as ações antrópicas causaram um aquecimento a uma taxa sem precedentes nos últimos 2.000 anos, e as mudanças climáticas já provocam eventos extremos em todas as partes do globo, tais como ondas de calor, inundações, secas e ciclones (IPCC, 2021). Com relação às previsões futuras, o relatório indica que a temperatura da superfície global continuará aumentando pelo menos até a metade do século de acordo com todos os cenários considerados. Além disso, a meta de limitar o aquecimento global entre 1,5º e 2º C em relação aos níveis pré-industriais, conforme estabelecido no Acordo de Paris, não será possível a não ser que profundas reduções nas emissões de gás carbônico (CO2) e outros gases do efeito estufa ocorram nas próximas décadas. Limitar o aquecimento global induzido pelo homem requer que se limite as emissões, alcançando emissões líquidas nulas do gás (net- zero), além de reduções significativas nas emissões de outros gases do efeito estufa (GEE), em especial o metano (CH4). Com relação ao Brasil, entre as mudanças já observadas, o relatório indica o aumento na ocorrência de extremos de calor, de fortes precipitações e de secas. O país também poderá sofrer no futuro, dependendo do cenário, aumentos de temperatura (em especial na região central e norte), redução na precipitação (principalmente na Amazônia), perda de umidade do solo, entre outros impactos (IPCC, 2021). A contribuição do Grupo de Trabalho 2, conforme explicado, apresenta as avaliações relativas aos impactos, necessidades de adaptação e vulnerabilidades. O documento adota uma escala para o grau de confiança de cada uma das conclusões apresentadas que possui cinco níveis: muito baixo, baixo, médio, alto e muito alto. Esse grau de confiança é determinado pelo quão consistentes são as evidências existentes e pelo grau de concordância sobre cada uma das conclusões. 14 Com relação aos impactos já observados, podem-se destacar os impactos negativos sobre a produtividade agrícola mais comuns do que os impactos positivos (alta confiança), as alterações na localização, atividades sazonais, padrões migratórios e abundância de espécies terrestres e aquáticas (alta confiança) e impactos sobre a quantidade e qualidade de recursos hídricos devido às mudanças na precipitação e o derretimento de neve e gelo, os quais alteram os sistemas hidrológicos (média confiança). O relatório aponta ainda que o peso das mudanças climáticas sobre a ocorrência de doenças humanas é pequeno quando comparado a outros fatores, embora tenha ocorrido um aumento na mortalidade associada a altas temperaturas e redução daquelas causadas por baixas temperaturas devido ao aquecimento, além de que alterações na temperatura e regime de chuvas em alguns locais mudaram a distribuição de vetores de doenças (média confiança) (IPCC, 2022). Maiores graus de confiança podem ser encontrados quando se trata das conclusões sobre a vulnerabilidade às mudanças climáticas. Por exemplo, o Painel tem confiança muito alta de que as desigualdades causadas pelos diferentes níveis de desenvolvimento causam diferenças no nível de vulnerabilidade. Comunidades que são marginalizadas social, cultural, política, institucional ou economicamente são especialmente vulneráveis, como resultado de um processo social que resulta em desigualdades de status socioeconômico e de renda, o qual inclui a discriminação de gênero, classe, etnia, idade e de necessidades especiais. Também há confiança muito alta de que eventos extremos recentes relacionados às mudanças climáticas (ex.: ondas de calor, secas, inundações, ciclones e incêndios) revelaram significativa vulnerabilidade dos ecossistemas e de sistemas humanos à variabilidade climática, como problemas com produção de alimentos e fornecimento de água, danos sobre infraestruturas, mortalidade, entre outros (IPCC, 2022). A questão da adaptação, também abordada pelo Grupo de Trabalho 2, trata-se da redução de riscos e vulnerabilidade principalmente através de ajustes nos sistemas já existentes. São inúmeras as possibilidades de adaptação, mas a implementação depende da capacidade e eficiência da tomada de decisão das governanças (IPCC, 2022). De acordo com o relatório, no cenário atual, o processo de planejamento e adaptação tem sido crescente ao redor de diversas regiões (alta confiança), e isso tem ocorrido através da geraçãode conhecimento sobre impactos climáticos. A partir disso, as governanças de pelo menos 170 países têm buscado se planejar além de adaptar políticas quanto às questões climáticas, iniciativas essas que têm gerado diversos benefícios para a população em geral, 15 principalmente nos setores voltados à agricultura, inovação, saúde e bem-estar, segurança alimentar e preservação e conservação da biodiversidade. Apesar do progresso, ainda existe um longo caminho a percorrer entre os níveis de adaptação atuais e os níveis que de fato podem levar à redução dos impactos e riscos das questões climáticas. Portanto, é necessário cada vez mais conhecimento quanto ao cenário mundial a respeito das mudanças climáticas, buscando mecanismos de mitigação de maneira urgente, com foco na implementação, mais do que em somente traçar um planejamento, com o intuito de criar um desenvolvimento resiliente e igualitário em relação ao clima. O relatório do WG2 conclui enfatizando a importância da próxima década para o fechamento das lacunas que ainda se encontram abertas quanto às medidas de adaptação e mitigação. O Grupo de Trabalho 3 analisa a evolução recente das emissões e as tendências atuais para o futuro, as opções de mitigação compatíveis com diferentes cenários de aquecimento global, as relações entre mitigação, adaptação e desenvolvimento sustentável, e as condições necessárias para a mitigação, como arranjos institucionais, políticas, financiamento, inovação e governança. O relatório aponta que as emissões líquidas continuaram a crescer na última década (2010 a 2019) em todos os setores, com uma média anual maior que em qualquer outra década, embora a taxa de crescimento tenha sido menor que na década anterior (2000 a 2009). Entretanto, há uma grande diferença na contribuição de cada região para as emissões. A população com 10% mais altos níveis de emissões per capita é responsável por algo entre 34% e 45% das emissões totais. Também é destacado que as emissões nessa década foram provenientes principalmente de áreas urbanas, mas também de atividades no âmbito global nos níveis industriais, fornecimento de energia, transporte, agricultura e construção. Sobre as tendências futuras, o relatório concluiu que com os compromissos assumidos pelos países através de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) antes da COP 26 (realizada em Glasgow, Escócia, em 2021) as emissões de GEE deverão fazer com que o aquecimento global supere 1,5ºC, e que para atingir a meta de limitar o aumento de temperatura a 2ºC deverá ocorrer uma rápida aceleração de dos esforços de mitigação após 2030. É interessante notar que os as opções de mitigação que custam menos que US $100 por tonelada de CO2 equivalente (tCO2e) podem reduzir as emissões ao menos pela metade até 16 2030 (em comparação com o nível de 2019). Além disso, o PIB mundial continuaria crescendo e inclusive os ganhos econômicos com os esforços para limitar o aumento de temperatura a 2ºC superariam os custos de implementação das medidas. Como mencionado anteriormente, o relatório do ano de 2022 conta também com aspectos mais sociais quanto à mitigação, e enfatiza a importância da mudança no comportamento humano e no estilo de vida, pois o padrão de consumo de famílias que se encontram no topo da pirâmide representa grande parte das emissões total de GEE. Portanto, uma mudança no padrão do consumo entre os mais ricos poderia reduzir as emissões de GEE em até 70% no ano de 2050 em comparação às políticas climáticas vigentes. O relatório deixa claro que ainda é possível manter a temperatura global em 1,5ºC, mas somente com ação imediata, com foco na remoção do carbono, em níveis que dependem da rapidez em que conseguiremos reduzir as emissões de GEE de outros sistemas e até que ponto os limites de emissões estabelecidos serão ultrapassados. Outro ponto considerado muito importante para atingir as metas é o aumento do financiamento público e privado anual para as mitigações a adaptações a mudanças climáticas, que apesar de crescente com o passar dos anos, vem sofrendo uma desaceleração no período mais recente. Entre os setores em que o déficit de investimentos é mais acentuado está o de agricultura, florestas e outros usos do solo (AFOLU na sigla em inglês), com um déficit ainda maior em países em desenvolvimento. De maneira resumida, a conclusão do relatório do WG3 é de que é necessário um movimento urgente não só de conscientização, mas também de ações efetivas para aumentar subsídios para a mitigação, precificar as emissões de carbono e eliminar de maneira gradual o financiamento público em combustíveis não renováveis, além de também a criação de leis que regulam, incentive e até torne obrigatória a transição para modelos e estilo de vida de baixo carbono. Neste sentido, o mercado de carbono vem despontando como um instrumento relevante para o alcance das metas do Acordo de Paris. A partir das principais análises e conclusões do sexto relatório de avaliação do IPCC, a próxima seção se dedica a explicar como surge o mercado de carbono dentro da teoria econômica, para então entender se o mercado de carbono é de fato um instrumento relevante e que pode contribuir para que o Brasil assuma as metas e objetivos assumidos em sua NDC, no âmbito do Acordo de Paris. 17 1.2 Análise teórica do mercado de carbono Por muito tempo a teoria econômica ignorou a existência de uma relação entre o sistema econômico e o meio ambiente, de modo que um dos principais objetos de estudo das ciências econômicas, a escassez, não era aplicada aos recursos naturais. Da mesma maneira, os resíduos e a poluição atmosférica causados pelos processos produtivos não eram levados em consideração nos modelos existentes. Sendo assim, as teorias em geral consideravam que o sistema econômico funcionava de modo independente do ecossistema no qual ele está inserido, como se existissem fontes inesgotáveis de insumos materiais e energia e que, para além disso, toda matéria prima era convertida em produto e, portanto, não existia a geração de resíduos indesejados. ( SANTOS; JUNIOR; LUCENA, 2018) No entanto, a partir da década de 1960 os danos causados por atividades industriais e pela agricultura começaram a se refletir de maneira mais intensa na qualidade de vida da população, assim como a disponibilidade de recursos passou a se apresentar como uma limitação ao crescimento econômico. Nesse momento começaram a surgir correntes que passaram a incorporar mais diretamente as questões ambientais na teoria econômica, formando as bases para o surgimento do campo da economia do meio ambiente e dos recursos naturais. ( SANTOS; JUNIOR; LUCENA, 2018) Segundo Fiane e Santos (2018), a economia clássica, que abrange as teorias econômicas desenvolvidas durante os séculos XVIII e XIX e que teve como principais autores Adam Smith, David Ricardo, Thomas Robert Malthus e Karl Marx, aborda de certa maneira as questões ambientais. Ricardo desenvolveu toda sua análise em cima da teoria de Smith, tratando principalmente de como as terras férteis eram um elemento escasso e como isso afetaria o desenvolvimento humano. Na mesma linha, Malthus elaborou a teoria de que a população cresce geometricamente, enquanto a produção de alimentos cresce em progressão aritmética, não acompanhando a expansão populacional, o que resultaria em um risco crescente de fome. Já Karl Marx se preocupava com a forma como o sistema capitalista crescia, degradando e contaminando o meio ambiente, e com como isso afetaria a humanidade, dado que o meio ambiente era um fator fundamental para a existência humana. Desta forma, pode-se notar que na teoria econômica clássica o meio econômico e o meio ambiente estavam relacionados, principalmente no que se refere à disponibilidade de recursos. 18 Entretanto, a partir de 1870 a teoria econômica tomou um novorumo com o surgimento da corrente neoclássica, que teve como principais nomes William Stanley Jevons, Carl Menger e Marie-Esprit-Léon Walras. Segundo essa corrente, são os preços de mercado que alocam os recursos produtivos de maneira eficiente. Isso é, em economias perfeitamente competitivas o mercado irá se regular até que o equilíbrio seja alcançado, de maneira que a oferta e demanda se igualem a longo prazo. A partir desse viés econômico, os problemas econômicos passaram a ser analisados pela óptica de maximização, onde o objetivo era encontrar o nível de funcionamento de uma economia que maximiza o ganho líquido. (FIANE; SANTOS, 2018) A teoria neoclássica, que atualmente é a base para as disciplinas de microeconomia em diversas escolas de economia ao redor do mundo, considera que os insumos do processo produtivo (também chamados de fatores de produção), em especial o capital, o trabalho, e a terra, podem ser substituídos um pelo outro indefinidamente, a chamada substitutibilidade dos fatores de produção. Esta substituição é feita sempre com o objetivo de maximizar o lucro e é determinada pela produtividade marginal e o custo de cada fator. No entanto, as hipóteses desse modelo se baseiam em diversas abstrações e, consequentemente, não condizem com a realidade econômica, principalmente pelo fato de não considerarem as falhas de mercado. As falhas de mercado são situações que ocorrem na prática e que contradizem as hipóteses adotadas no modelo, tais como o monopólio natural, a assimetria de informações, os bens públicos e as externalidades. Para o presente trabalho pode-se destacar os bens públicos e as externalidades devido à sua relevância no campo da economia do meio ambiente e dos recursos naturais. Os bens públicos são aqueles que têm como principais características ser não rivais e não exclusivos. Um bem é considerado não rival quando para qualquer nível de produção, o custo marginal de sua produção é zero para um consumidor adicional. Em outras palavras, o consumo por parte de um indivíduo não reduz a disponibilidade daquele bem para um outro indivíduo. Já um bem não exclusivo é aquele que as pessoas não podem ser impedidas de consumi-lo, o que inclusive torna possível consumir sem que se tenha que pagar por eles (PINDYCK, 2013) Os recursos naturais, como a água e o ar, são bens de propriedade comum, se assemelhando aos bens públicos, pois o consumo por um indivíduo não impossibilita o consumo de um outro indivíduos e, portanto, possuem características não disputável e 19 também não exclusivo. Outro ponto importante é que o recurso natural é considerado de todos, mas não tem um dono específico e, por esse fato, possui sempre mais consumidores do que o esperado, gerando um consumo irracional e muitas vezes excessivo. Quanto às externalidades, é necessário entender que elas ocorrem quando a ação de um ou mais agentes causa custos ou benefícios a uma terceira parte e que não eram o objetivo principal da ação, podendo ser classificadas como positivas ou negativas. Uma externalidade positiva é aquela em que a ação dos agentes gera um benefício para a terceira parte. Por exemplo, um proprietário que cultiva e mantém uma floresta na sua propriedade que fica situada em uma área importante para a provisão de água está beneficiando toda a sociedade com a provisão de recursos hídricos. Essa inclusive é a base do Programa Produtor de Água1, que usa o conceito de protetor-recebedor. Por outro lado, a externalidade negativa é quando a ação dos agentes gera um prejuízo ou custo a uma terceira parte. Um exemplo clássico é o caso de uma fábrica que no seu processo de produção causa poluição do ar (lembrando que o ar é um recurso natural que pertence a todos, mas não é propriedade de ninguém), afetando a qualidade do ar das pessoas que moram ao redor da fábrica. Esta situação pode gerar um aumento nos problemas respiratórios, entre outros que afetam o bem-estar geral daquela população, e os afetados pela ação não são compensados. Desta forma, quando externalidades estão presentes, o preço de um bem não necessariamente reflete seu valor social, dado que não tem embutido todos os custos associados à sua produção. No caso da fábrica, caso o produtor tivesse que “internalizar as externalidades”, isto é, arcar com os custos relacionados às doenças respiratórias causadas pela poluição, o preço do seu produto certamente seria mais elevado. Consequentemente, o nível de produção desta fábrica está acima do que seria considerado o “ótimo social”, que seria o nível caso todos os custos estivessem considerados no processo. (PINDYCK, 2013) Dois principais autores se destacam na discussão sobre a solução do problema da externalidade negativa. Pigou (1920), em seu trabalho "The Economicsofwelfare", que propôs que a solução para as externalidades negativas deve vir a partir da intervenção do Estado, por 1 Programa criado pela Agência Nacional de Águas (ANA) para estimular produtores a investir no cuidado com as águas, recebendo apoio técnico e financeiro para adoção de técnicas e medidas conservacionistas, gerando bem-estar econômico para os produtores e bem-estar social para a sociedade como um todo. (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2008) 20 exemplo através de uma cobrança com base na diferença entre o custo marginal privado2 e o custo marginal social3, podendo ser chamada de uma espécie de "taxa do poluidor". Assim, Pigou elaborou o que ficou conhecido como “taxa pigouviana”, que deveria ser aplicada do produto, elevando seu custo para incorporar as externalidades. Desta forma, a taxa levaria o nível de produção para o “ótimo social”. Em contrapartida com a teoria de Pigou, Coase (1960), em seu trabalho "The Problemof Social Cost", afirma que a solução do problema da externalidade negativa não se encontra na intervenção do Estado, pois seria impossível mapear e acompanhar as ações de todos os agentes e avaliar os resultados dessas ações. Além disso, segundo Coase, a proposta de tributação de Pigou geraria empecilhos à produção de um dos agentes. Portanto, a solução do problema da externalidade se daria a partir da livre negociação entre as partes envolvidas. No entanto, para que essa livre negociação ocorra é preciso definir os direitos de propriedade, pois são eles que delimitam a ação de cada agente, discriminando quem são o causador e o receptor da externalidade. No caso da fábrica, definir os direitos de propriedade equivale a determinar se o produtor tem o direito de poluir ou se a população do entorno tem o direito ao ar puro, de modo que a partir de então os dois lados pudessem negociar entre si. Por exemplo, caso fosse estabelecido que a população tem direito ao ar puro, o produtor poderia pagar um certo valor aos moradores pela poluição causada para que ele pudesse produzir. Cabe notar que seria possível ainda estabelecer um meio termo, no qual o produtor poderia poluir até um determinado nível, a partir do qual precisaria pagar à população. De modo análogo, caso ele poluísse abaixo desse nível poderia ser recompensado por isto. Em resumo, o Teorema de Coase disserta que, uma vez definidos os direitos de propriedade, o processo de negociação (monetária) entre as partes leva a uma racionalidade econômica. Desse modo, segundo o autor, em concorrência perfeita, com custos de transação nulos, os agentes (sem intervenção do Estado) chegam a uma solução eficiente para eliminar o problema da externalidade. É a partir da análise do Teorema de Coase que o economista J. H. Dales atribui as externalidades à ausência ou má definição dos direitos de propriedades sobre os bens, pois para que exista a troca mercantil os direitos sobre as propriedades devem ser exclusivos e transferíveis. Esse autor busca definir os direitos para permitir as trocas entre2 Custo direto gerado quando uma empresa produz uma unidade adicional de um bem. (PYNDICK, 2013) 3 Custo marginal privado + O custo adicional do processo de produção da empresa que recai sobre a sociedade (externalidade negativa) e que o causador não paga pelo mal estar gerado. (PYNDICK, 2013) 21 agentes, com o objetivo de atingir um equilíbrio com características de ótimo de Pareto. (SANTOS; JUNIOR; LUCENA, 2018) As análises de Dales deram origem em 1968 a um instrumento de internalização das externalidades chamado de mercado de licenças de emissão, no qual o Estado ou órgão de controle decide a quantidade aceitável de poluição e são emitidos títulos ou postos à venda no mercado de títulos os direitos de poluir. Desta forma, um agente terá o direito de emitir uma quantidade de poluição que é determinada no título que detém. Caso venha a poluir mais do que o permitido em seu título, esse agente deverá despoluir, o que pode ocorrer através da compra de licença daquele outro agente que poluiu abaixo do nível permitido, para que exista uma compensação da externalidade que excedeu o limite aceitável ( SANTOS; JUNIOR; LUCENA, 2018) Esse mercado de licenças de emissão funciona no formato “cap-and-trade”. Isto é, existe um “cap” (limite), que é dividido em licenças que conferem direitos de poluir, e um “trade” (comércio), que cria a possibilidade de compra e venda dessas licenças. Os preços das licenças variam de acordo com a oferta e demanda, mas com quantidades de licenças totais definidas de acordo com um limite de emissões considerado "seguro" para serem lançadas no meio ambiente, possibilitando os indivíduos de atuarem no mercado de acordo com seus interesses privados. Para ilustrar como funciona esse mercado, na Figura 1 é considerado um mercado composto por duas empresas (Empresa 1 e Empresa 2). Nesse mercado, o Estado determina o nível máximo de poluição permitido (Stotal), que para as empresas representam as metas S1 e S2, respectivamente. O nível de poluição é representado pela letra W, onde para representar o nível de poluição de cada empresa são utilizados W1 e W2. Neste gráfico, a CMgA1 e CMgA2 são as curvas da demanda por licença de cada uma das empresas. Em uma situação sem a possibilidade de comércio de emissões, ambas as empresas deveriam reduzir suas emissões até atingir o nível estabelecido, que é igual para ambas. Entretanto, pode-se observar que a Empresa 2 terá um custo maior para alcançar esse limite, pois sua curva de demanda por licenças é maior, e no gráfico é possível ver que não atingiu sua meta (S2). Sendo assim, para atingir sua meta, a empresa 2 pode comprar o excedente da empresa 1 (região entre W1 e W1*), de forma a atingir a sua meta. Figura 1 - Funcionamento do Mercado de emissão de licenças Este raciocínio é a base para as Um primeiro exemplo em nível internacional foi o Protocolo de Quioto, estabelecido em 1997 durante a COP 3 no Japão. O Protocolo de Quioto é um tratado internacional que surge com o objetivo de firmar compromissos de maneira mais rígida quanto à redução das emissões de GEE e que pela primeira vez estabeleceu limites de emissões. De acordo com o Protocolo, os países desenvolvidos, em conjunto, deveriam reduzir suas emissões de GEE em pelo menos 5% até 2012 em relação aos níveis de 1990. Para contribuir para o alcance dessa meta, o Protocolo de Quioto estabeleceu três instrumentos, conhecidos como mecanismos de flexibilização: o Comércio de Emissões; a Implementação Conjunta; e o Mecanismo de Desenvolvimento os dois primeiros envolvem somente os países desenvolvidos, enquanto o terceiro envolve países desenvolvidos e em desenvolvimento. O comércio de emissões foi proposto de forma que os países que superassem as suas metas de redução de emissões pudessem comercializar o excedente de sua redução para aqueles países que não conseguiram atingir suas metas. O objeto da transação seria um crédito de carbono, que é um certificado eletrônico emitido quando existe uma redução das emissões de GEE, sendo um crédito equivalente a uma tonelada de na atmosfera (MENEGUIN, 2012). Funcionamento do Mercado de emissão de licenças Fonte: SANTOS et al. (2018). Este raciocínio é a base para as propostas de implementação de mercados de carbono. Um primeiro exemplo em nível internacional foi o Protocolo de Quioto, estabelecido em 1997 durante a COP 3 no Japão. O Protocolo de Quioto é um tratado internacional que surge com o romissos de maneira mais rígida quanto à redução das emissões de GEE e que pela primeira vez estabeleceu limites de emissões. De acordo com o Protocolo, os países desenvolvidos, em conjunto, deveriam reduzir suas emissões de GEE em pelo menos m relação aos níveis de 1990. Para contribuir para o alcance dessa meta, o Protocolo de Quioto estabeleceu três instrumentos, conhecidos como mecanismos de flexibilização: o Comércio de Emissões; a Implementação Conjunta; e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Dentre estes, os dois primeiros envolvem somente os países desenvolvidos, enquanto o terceiro envolve países desenvolvidos e em desenvolvimento. O comércio de emissões foi proposto de forma que os países que superassem as suas de emissões pudessem comercializar o excedente de sua redução para aqueles países que não conseguiram atingir suas metas. O objeto da transação seria um crédito de carbono, que é um certificado eletrônico emitido quando existe uma redução das emissões GEE, sendo um crédito equivalente a uma tonelada de carbono que deixou de ser emitido na atmosfera (MENEGUIN, 2012). 22 Funcionamento do Mercado de emissão de licenças propostas de implementação de mercados de carbono. Um primeiro exemplo em nível internacional foi o Protocolo de Quioto, estabelecido em 1997 durante a COP 3 no Japão. O Protocolo de Quioto é um tratado internacional que surge com o romissos de maneira mais rígida quanto à redução das emissões de GEE e que pela primeira vez estabeleceu limites de emissões. De acordo com o Protocolo, os países desenvolvidos, em conjunto, deveriam reduzir suas emissões de GEE em pelo menos Para contribuir para o alcance dessa meta, o Protocolo de Quioto estabeleceu três instrumentos, conhecidos como mecanismos de flexibilização: o Comércio de Emissões; a Limpo (MDL). Dentre estes, os dois primeiros envolvem somente os países desenvolvidos, enquanto o terceiro envolve O comércio de emissões foi proposto de forma que os países que superassem as suas de emissões pudessem comercializar o excedente de sua redução para aqueles países que não conseguiram atingir suas metas. O objeto da transação seria um crédito de carbono, que é um certificado eletrônico emitido quando existe uma redução das emissões que deixou de ser emitido 23 A implementação conjunta é um mecanismo que permite que um país desenvolvido, que tem metas a cumprir de acordo com o estabelecido no Protocolo de Quioto, possa implementar um projeto de redução em países que também possuem metas, mas que eram considerados “em transição econômica”. A lógica desse mecanismo é que um país possa desenvolver um projeto em outro onde o custo de redução seja menor, conforme explicado acima, e desse modo podem utilizar as Reduções Certificadas de Emissões (RCE), ou crédito de carbono, geradas por esses projetos para atingir suas metas. Com isso, os países que estão sendo hospedeiros do projeto também acabam se beneficiando, principalmente através de investimento de capital estrangeiro e com a transferência de tecnologia trazida pelos projetos. O Mecanismos de Desenvolvimento Limpo, definido no artigo 12 do Protocolo de Quioto, é um instrumento semelhante à implementação conjunta, mas que ocorre entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. O MDL tem o objetivo de incentivar um desenvolvimento sustentável dos países em desenvolvimento ao mesmo tempo que incentivaos países desenvolvidos a cumprirem suas metas de redução. Os projetos de MDL, ao entrar em vigor, também geram a Redução Certificada de Emissões, na qual é estabelecida uma quantidade de crédito de carbono alcançada pelo projeto. Os interesses em projetos de MDL ocorrem justamente pelos créditos de carbono que são emitidos assim que o projeto entra em vigor, devido a possibilidade de comercializar esses créditos, já que os demais países devem estar alinhados com as políticas de desenvolvimento sustentável do país hospedeiro. Para que os projetos de MDL sejam certificados, é necessário seguir algumas normas, como por exemplo gerar um benefício real, mensurável e de longo prazo quanto à mitigação das mudanças climáticas e que as reduções geradas por esses projetos sejam adicionais as geradas sem a adoção do mesmo (critério da adicionalidade). Isso é, só é possível considerar as reduções geradas por um projeto se elas forem menores do que a base de referência em um cenário que o projeto não existe (DUARTE; TUPIASSU; NOBRE, 2020). Como existe um grupo de países com metas de redução e um outro grupo sem metas de redução, há também diferentes formas de cálculo das reduções. Para países desenvolvidos, o cálculo é a soma das emissões nacionais de todos os gases em todos os setores industriais, em relação com a base de emissões de 1990, gerando uma meta percentual a ser atingida. Já para os países em desenvolvimento, o cálculo é individual de cada projeto e, como mencionado anteriormente, é considerado como base o cenário de emissões que ocorreriam sem a adoção dos projetos. 24 Considerando os diferentes cálculos, metas e obrigações, surgem então dois mercados de crédito distintos, sendo um considerado regulado e o outro voluntário. A diferença entre eles é que no mercado regulado os créditos gerados servem para abater metas de redução assumidas no Protocolo, enquanto no mercado voluntário as metas são abatidas voluntariamente por empresas, por exemplo, sem serem regulamentadas pelo Protocolo. O Brasil, como é considerado um país em desenvolvimento, não teve metas obrigatórias de redução no âmbito do Protocolo de Quioto e, portanto, o seu mercado de crédito de carbono pode ser considerado voluntário. Entretanto, esta condição se alterou com o advento do Acordo de Paris. Em primeiro lugar, todos os países signatários passaram a ter metas de redução das emissões de GEE, ainda que essas metas sejam estabelecidas por cada país através de sua NDC. Além disso, um dos pontos do Acordo de Paris que mais tem sido discutido é seu Artigo 6º, que surge como uma espécie de nova versão dos mecanismos criados pelo Protocolo de Quioto, no sentido que também foram criadas modalidades com o objetivo de promover um desenvolvimento sustentável que garanta a integridade ambiental. As duas modalidades criadas possibilitam os países signatários do Acordo de cooperarem de maneira voluntária e transparente na implementação de suas NDCS, sendo elas: i) Comércio de certificados de redução de emissão entre países, chamados de Resultado de Mitigação Internacionalmente Transferidos (ITMO); ii) Mecanismo de transação dos créditos gerados por projetos de redução de emissão de GEE entre entidades públicas e privadas. No caso do Resultado de Mitigação Internacionalmente Transferidos é permitida a transação direta entre países dos certificados gerados pela redução de emissões. Isto é, os créditos gerados através de ações de mitigação em um país podem ser negociados com um outro país. O país comprador do crédito pode contabilizar o crédito comprado como parte da meta da sua NDC sem que tenha implementado diretamente a ação de mitigação que gerou o crédito. Um ponto importante a ser destacado é que após a transação, os créditos devem ser registrados de maneira transparente, assim como também os ajustes de acordo com sua NDC. No mecanismo de transação de créditos de redução por entidades públicas e privadas, uma empresa localizada em um determinado país que reduz a emissão de GEE e gera créditos por isso pode vender esses créditos para um outro país, que poderá usar o crédito para contribuir ao alcance das metas de sua NDC. 25 A plena implementação do Artigo 6º do Acordo de Paris ainda depende da regulamentação desses mecanismos, uma vez que é necessário que se estabeleça critérios rigorosos para que o mecanismo contribua de maneira efetiva para o alcance das metas do Acordo. Dois aspectos de maior destaque nas discussões sobre a sua regulamentação são a adicionalidade e a dupla contagem. O primeiro se refere à condição de que a geração de créditos ocorra apenas pela redução das emissões que não ocorreriam na ausência do projeto implementado, enquanto o segundo diz respeito à necessidade de evitar que dois ou mais países contabilizem ao mesmo tempo os créditos para o alcance da sua NDC. Em 2015 o Brasil assinou o Acordo de Paris se comprometendo, através da sua NDC, com a meta de redução das emissões de GEE em 37% até 2025 e uma meta indicativa de 43% até 2030, ambas em relação ao nível de emissões de 2005. No final de 2020 a NDC brasileira foi revisada (conforme preconizado pelo Acordo de Paris), com a nova versão reafirmando as metas anteriores e introduzindo uma meta indicativa de alcance da neutralidade climática, ou seja, emissões líquidas de GEE nulas, até 2060. Posteriormente houve uma nova atualização, inicialmente anunciada durante a COP 26, em novembro de 2021, e em seguida oficializada pelo governo. Nesta atualização foi estabelecida, entre outras coisas, uma nova meta de redução das emissões em 50% até 2030. Entretanto, enquanto essas propostas se desenvolvem em nível internacional, o Brasil ainda carece de um arcabouço regulatório para a implementação de um mercado de carbono doméstico, e sua implementação é considerada de grande importância para o alcance das metas da NDC. Os estudos Partnership for the Market Readiness e Clima e Desenvolvimento: Visões para o Brasil de 2030 analisaram como poderia se desenvolver o instrumento em ambiente nacional e quais seriam seus impactos, e algumas propostas foram apresentadas para a sua regulamentação, como um projeto de lei que tramita no Congresso e um decreto publicado pela presidência este ano. Estas iniciativas serão apresentadas no próximo capítulo. 26 2. PROPOSTAS PARA UM MERCADO DE CARBONO NO BRASIL De acordo com conclusões apresentadas através dos relatórios do IPCC, o cenário mundial quanto às mudanças climáticas tem sido crítico e exige ações imediatas. No caso específico do Brasil, desde 2019 o país sofre com uma crise ambiental que vem se agravando com o passar dos anos, devido principalmente a um desmonte das políticas ambientais, com flexibilização da legislação e redução de recursos. Nesse cenário, houve um aumento exacerbado nas queimadas, no desmatamento e um grande dano em reservatórios naturais de CO2 e sumidouros. No final do ano de 2019, o total de focos de fogo ativo, isto é, de queimadas, era de 19.763, enquanto no ano seguinte houve um aumento que levou a um total de 22.279. Já no ano de 2022, sem dados de novembro e dezembro, este valor já se encontra em 17.218 fogos ativos totais (INPE, 2022). Quanto ao desmatamento, somente na Amazônia, de acordo com dados do Sistema de Alerta de Desmatamento do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, no ano de 2019 o nível de desmatamento por km² era de 5.057 km². Já em 2021 este valor dobrou, resultando em uma área desmatada de 10.476 km². No ano de 2022, sem dados de novembro e dezembro, a área já ultrapassa o marco anterior, totalizando uma área de 10.781 km² desmatados, atingindo pela quarta vez consecutiva o pior índice de desmatamento desde 2008, quando o índice foi de 5.027 km². Para além de toda a problemática socioambiental gerada por este aumento nas queimadas e desmatamento, estes indicadorestambém contribuem para o aumento das emissões de GEE por parte do Brasil, que vem crescendo ao longo da última década e em 2020, de acordo com dados do SEEG (2022), resultou em 2,16 GtCO2e emitidas, o que contribui ainda mais para o afastamento do país de suas metas no âmbito do Acordo de Paris. O mercado de carbono emergiu como um instrumento que pode contribuir para a redução das emissões de GEE, conforme apresentado no capítulo anterior. Sendo assim, o presente capítulo tem como objetivo apresentar os aspectos presentes em diferentes propostas para um mercado de carbono já elaboradas para o Brasil. A primeira parte apresentará o caso da PL 528/2021, projeto de lei que se encontra em tramitação no Congresso para a regulamentação do mercado de carbono no Brasil. A segunda parte analisará a proposta do projeto Partnership for Market Readiness (PMR), cujo objetivo foi discutir a inclusão da 27 precificação do carbono no pacote de instrumentos da Política Nacional de Mudança do Clima (PNMC). Em seguida será apresentado o estudo conduzido pela iniciativa "Clima e Desenvolvimento: Visões para o Brasil 2030" (COPPE, 2021) e, por fim, será abordado o Decreto de número 11.075/2022, instituído pela presidência. Ao final do capítulo são tecidas algumas conclusões à luz das diferentes propostas e estudos analisados. 1.3 Projeto de Lei 528/2021 O Projeto de Lei nº 528 de 2021 (PL 528/2021) foi apresentado em fevereiro de 2021 pelo deputado Marcelo Ramos com a proposta de regulamentar o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) previsto pela Política Nacional de Mudança do Clima de 2009. Entre as justificativas para o projeto de lei está o desenvolvimento inteligente e estratégico da economia, respeitando o meio ambiente ao mesmo tempo que combate à pobreza, levando principalmente em conta as normas legais que preveem o mercado de carbono no âmbito nacional, como a PNMC. O projeto de lei também usa como justificativa a crise econômica desencadeada pela COVID-19, a qual gerou mudanças no consumo de energia e no comportamento do consumidor, além de ter desestabilizado economicamente muitos países e contribuído para o afastamento das metas de redução de emissões conforme o Acordo de Paris. Entretanto, apesar do cenário economicamente caótico, os países se encontram em fase de recuperação e retomada de estímulos, o que, segundo o projeto de lei, é propício para uma aceleração dos esforços e estímulos nas ações climáticas, sendo o mecanismo de precificação do carbono uma alternativa para reaquecer a economia brasileira. Diversos países ao redor do mundo têm aderido ao mercado de carbono ou expandido iniciativas de precificação de carbono e estima- se que o mercado de crédito de carbono movimentou 194 bilhões de euros em 2019, de acordo com análises do Refiniv4 A PNMC previu a compatibilidade entre o desenvolvimento econômico e a proteção climática, considerando o incentivo à redução de GEE, o reflorestamento e expansão de áreas de proteção e preservação ambiental. De acordo com a política, todas as ações e medidas 4 Refinitiv é um fornecedor global americano-britânico de informações de dados e infraestrutura do mercado financeiro (REFINITIV, 2022) 28 tomadas devem considerar os diferentes contextos socioeconômicos de sua aplicação, atuando principalmente em benefício das presentes e futuras gerações. A PNMC estabeleceu, em seu Artigo 9º, o desenvolvimento do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões, devendo este ser “operacionalizado em bolsas de mercadorias e futuros, bolsas de valores e entidades de balcão organizado, autorizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), onde se dará a negociação de títulos mobiliários representativos de emissões de gases de efeito estufa evitadas certificadas” (Lei nº 12.187/2009, Art. 9º). De acordo com o Artigo 3º do PL 528/2021, os objetivos do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões são: o fomento de atividades de projetos de redução e remoção de gases de efeito estufa; o incentivo econômico à conservação e proteção ambientais; a melhoria do ambiente e segurança do mercado de carbono no Brasil; a valorização dos ativos ambientais do Brasil; a geração de riqueza de maneira que incentive o combate à pobreza por meio de atração de investimentos e negociações com os créditos de carbono; e a redução dos custos de mitigação de GEE para a sociedade. Importante enfatizar que, de acordo com o PL, serão elegíveis ao MBRE somente os créditos de carbono originados do Brasil a partir de projetos ou programas de redução ou remoção de GEE, sendo que esses programas devem ser verificados e emitidos de acordo com os padrões de certificação da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Além disso, os créditos devem ser registrados no Sistema Nacional de Registro de Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SNRI-GEE), que seria criado a partir da aprovação e vigência da Lei e deve ser administrado pelo Instituto Nacional de Registro de Dados Climáticos (INRDC). O INRDC, por sua vez, tem a função de efetuar os registros dos projetos de redução ou remoção de GEE e crédito de carbono para, dessa forma, garantir a segurança e credibilidade das transações dos créditos de carbono, assim como também serve de ferramenta contábil nacional para as transações em âmbito nacional e internacional. O Instituto tem sua gestão e administração voltada estritamente ao incentivo do MBRE e outros ativos ambientais que possam vir a ser regulamentados, e deve ser fiscalizado e regulamentado pelo Ministério da Economia, devendo empregar os procedimentos necessários para a implementação do MBRE em até 180 dias a partir da publicação da Lei. Para além das regras já descritas, também são mencionadas regras específicas para o padrão de certificação, como o monitoramento das atividades do projeto e/ou programa, e a verificação periódica dos resultados aferidos pelo projeto, como também de dados gerais quanto ao monitoramento, verificação ou validação do mesmo. Um outro ponto destacado no projeto de lei a respeito dos padrões de certificação é que eles serão elaborados com base em metodologia e critérios compatíveis com as melhores práticas internacionais quanto ao mercado de carbono. A partir da publicação da Lei, o Ministério da Economia tem até 5 anos para regulamentar o programa nacional obrigatório de compensação de emissões de GEE, que deverá ser baseado em sistema de transação de crédito de carbono e utilizar dado Inventários Nacionais de Emissões e Remoções de GEE, com foco nos setores da economia com o maior índice de emissões de GEE e também nos setores com maior capacidade de remoção e compensação de GEE. Um ponto de destaque no programa nacional de compensação é a criação de metas setoriais e individuais de redução e compensação de forma progressiva através da NDC. Além disso, o programa deverá criar proventos financeiros e administrativos para pessoas jurídicas públicas ou privadas que adotarem medidas de compensação ou inventariação de suas emissões de gases de efeito estufa no MBRE. Na figura 2 é possível ter um maior índice de emissões de GEE e o comportamento dessas emissões por setor no período de 2000-2020. Figura 2 - Emissões brutas de GEE no Brasil por setor (2000 De acordo com a figura, é possível identificar o setor de "Mudança de Uso da Terra e Floresta" como o setor com o maior número de emissões brutas de GEE no Br amento, verificação ou validação do mesmo. Um outro ponto destacado no projeto de lei a respeito dos padrões de certificação é que eles serão elaborados com base em metodologia e critérios compatíveis com as melhores práticas internacionais quanto ao A partir da publicação da Lei, o Ministério da Economia tem até 5 anos para regulamentar o programa nacional obrigatório de compensação de emissõesde GEE, que deverá ser baseado em sistema de transação de crédito de carbono e utilizar dado Inventários Nacionais de Emissões e Remoções de GEE, com foco nos setores da economia com o maior índice de emissões de GEE e também nos setores com maior capacidade de remoção e compensação de GEE. Um ponto de destaque no programa nacional de sação é a criação de metas setoriais e individuais de redução e compensação de forma progressiva através da NDC. Além disso, o programa deverá criar proventos financeiros e administrativos para pessoas jurídicas públicas ou privadas que adotarem medidas de compensação ou inventariação de suas emissões de gases de efeito estufa no MBRE. Na figura 2 é possível ter um Overview dos setores da economia brasileira com o maior índice de emissões de GEE e o comportamento dessas emissões por setor no período de Emissões brutas de GEE no Brasil por setor (2000 Fonte: SEEG (2022) De acordo com a figura, é possível identificar o setor de "Mudança de Uso da Terra e Floresta" como o setor com o maior número de emissões brutas de GEE no Br 29 amento, verificação ou validação do mesmo. Um outro ponto destacado no projeto de lei a respeito dos padrões de certificação é que eles serão elaborados com base em metodologia e critérios compatíveis com as melhores práticas internacionais quanto ao A partir da publicação da Lei, o Ministério da Economia tem até 5 anos para regulamentar o programa nacional obrigatório de compensação de emissões de GEE, que deverá ser baseado em sistema de transação de crédito de carbono e utilizar dados dos Inventários Nacionais de Emissões e Remoções de GEE, com foco nos setores da economia com o maior índice de emissões de GEE e também nos setores com maior capacidade de remoção e compensação de GEE. Um ponto de destaque no programa nacional de sação é a criação de metas setoriais e individuais de redução e compensação de forma progressiva através da NDC. Além disso, o programa deverá criar proventos financeiros e administrativos para pessoas jurídicas públicas ou privadas que adotarem medidas de compensação ou inventariação de suas emissões de gases de efeito estufa no MBRE. dos setores da economia brasileira com o maior índice de emissões de GEE e o comportamento dessas emissões por setor no período de Emissões brutas de GEE no Brasil por setor (2000 - 2020) De acordo com a figura, é possível identificar o setor de "Mudança de Uso da Terra e Floresta" como o setor com o maior número de emissões brutas de GEE no Brasil. Em 2003, 30 ano que apresentou o maior nível de emissão, o setor emitiu 2,1 GtCO2e. No entanto, é possível observar que durante o período de 2009 à 2013 houve uma redução nas emissões por parte deste setor, que neste ano emitiu 0,73 GtCO2e. O setor se manteve estável até 2013, quando voltou a subir, emitindo 0,8 GtCO2e. Em 2020 é possível observar que as emissões voltaram a subir, representando cerca de 1 GtCO2e apenas nesse setor. Apesar do nível consideravelmente baixo quando comparado ao nível de 2003, a figura mostra uma tendência de aumento das emissões no setor nos últimos anos. Em seguida, observamos a Agropecuária e Energia, respectivamente, como setores cujas emissões de GEE também se apresentam significativamente altas. Ao longo dos anos, ambos setores não apresentaram aumento significativo no nível de emissões. Em 2020, respectivamente, o setor da Agropecuária e de Energia emitiram 577.022.998 e 393.705.259 toneladas de emissões de CO2. De maneira resumida, este projeto de lei tem como principal objetivo conceituar e determinar a natureza jurídica dos ativos de carbono, estabelecer um sistema de registro de inventariação das emissões e suas transações, a fim de contabilizar para efeitos do Artigo 6º do Acordo de Paris, fomento a projetos de redução e remoção de GEE, estabelecimento de um mercado nacional de redução de emissões através da nossa NDC, de maneira que contribua com a conservação e proteção ambiental, gerando riquezas e combatendo a pobreza por meio de atração de investimentos e negociações com o crédito de carbono. 1.4 Projeto Partnership for Market Readiness O projeto Partnership for Market Readiness (PMR), Parceria para Preparação para o Mercado em tradução livre, é um projeto idealizado pelo Banco Mundial e que no Brasil teve o apoio do então Ministério da Fazenda, tendo início em 2016 e finalizado em 2020. O projeto teve como objetivo discutir o processo de tomada de decisão, subsidiando o governo brasileiro quanto ao papel e conveniência dos instrumentos de precificação de carbono nas políticas de mitigação de emissões de GEE no país. A contribuição do projeto foi através de estudos detalhados e análise dos impactos de diversos instrumentos de mitigação na economia, sociedade e meio ambiente. O PMR Brasil buscou responder se seria viável a implementação de um instrumento de precificação de carbono como parte da política climática do Brasil no período pós-2020 e, 31 em caso afirmativo, quais as principais características o instrumento deveria ter para otimizar a relação entre o cumprimento de compromissos e objetivos climáticos e o desenvolvimento socioeconômico. Para isso, o projeto contou com a contribuição de mais de 80 especialistas, de diversas nacionalidades, além de também ter utilizado contribuições a partir de interações com membros do governo, do setor privado, pesquisadores e da sociedade como um todo. Um ponto destacado pelo projeto é que a adoção de precificação de emissões deve ser coordenada juntamente com o processo de melhoria regulatória e preparação da NDC brasileira, para que os papéis dos instrumentos sejam efetivos e comprováveis na esfera do alcance das metas de redução das emissões de GEE nacionais pós-2020. O projeto foi organizado em três componentes para responder às questões levantadas. O componente 1 corresponde a estudos setoriais, incluindo os setores de energia (eletricidade e combustíveis), indústria (química, papel e celulose, siderurgia, alumínio, cimento, cal, vidro, alimentos e bebidas, têxtil, mineração e cerâmica), e floresta e agropecuária (pecuária de corte). Com o objetivo de desenhar alternativas proeminentes de instrumentos de políticas climáticas, foram analisadas as estruturas econômicas e as tecnologias de mitigação de GEE, assim como todo o cenário institucional e regulatório de cada um desses setores. Em seguida foi feita uma revisão de experiências internacionais no tema, utilizando diferentes instrumentos para atingir as metas da NDC brasileira, mas com foco na implementação de instrumentos de precificação de carbono. Portanto, o foco do Componente 1 foi pesquisar e analisar as principais questões envolvidas na implementação de instrumentos de crédito de carbono nos principais setores da economia brasileira, bem como também questões relacionadas a opções de desenho para os instrumentos analisados. A partir dos resultados obtidos, o Componente 2 buscou fazer uma avaliação dos potenciais impactos da implementação dos instrumentos propostos. Esse componente foi dividido entre uma parte de modelagem macroeconômica para estimar os impactos (Componente 2A), e uma parte de análise do impacto regulatório (Componente 2B). Essas análises serão explanadas no Capítulo 3 "Impactos de um Mercado de Carbono no Brasil" desta monografia. Por fim, o Componente 3 teve como objetivo a comunicação e engajamento entre stakeholders, que se concentraram em compartilhar os resultados dos estudos realizados nos componentes que antecederam. Estes resultados foram compartilhados através de seminários públicos e workshops de acesso restrito. 32 Para além dos componentes técnicos, também foram feitas análises jurídicas e institucionais para analisar e criar o marco regulatório, a natureza jurídica dos direitos de emissões em um Sistema de Comércio de Emissões e o regulamentoinstitucional para o funcionamento desse sistema. A partir de análises do Componente 1, o projeto selecionou oito cenários, sendo um deles o cenário tendencial no qual são projetadas as emissões de GEE considerando a tendência atual de emissões de GEE e políticas de mitigação já existentes. Neste cenário não existe nenhum mecanismo de precificação, e não deve servir como cenário base de comparação de resultados, mas como base para implementação dos cenários de precificação propostos. Além desse cenário tendencial, foram elaborados sete cenários que envolvem algum tipo de regulação adicional, sendo que todos pressupõem o cumprimento das metas da NDC brasileira de maneira precisa, de modo que seja possível comparar os impactos socioeconômicos. O primeiro cenário a ser analisado foi o cenário considerado de referência, de maneira que os demais cenários o tiveram como base de comparação. Nesse primeiro cenário, o Brasil cumpre a NDC sem o auxílio de nenhum instrumento de precificação das emissões de carbono, tendo como referência medidas mencionadas no anexo da NDC brasileira, como políticas do comando e controle, que são políticas públicas que asseguram comportamentos socialmente aceitos através da implementação de leis, ou seja, através de fiscalização, regulamentação, etc. Os demais 6 cenários analisados envolveram a adoção de instrumentos de precificação de carbono de maneira diversificada, buscando justificar os diferentes cenários pela ótica da eficiência em relação ao cumprimento da NDC brasileira e o desenvolvimento econômico e da sociedade. Estes cenários são chamados de: i) cenário basal de precificação; ii) cenário distributivo; iii) cenário de ajuste de fronteira; iv) cenário de inclusão da pecuária; v) cenário de isenção de combustíveis sensíveis; e vi) cenário segmentado. O cenário basal de precificação analisa características de desenho que se adaptem à realidade nacional no âmbito econômico, regulatório, institucional e tecnológico. O instrumento utilizado nesse cenário é o Sistema de Comércio de Emissões, regulamentando os GEE, com foco na queima de combustíveis e processos industriais. O cenário também trata de alocação gratuita de 50% de direitos de emissões na primeira fase de todos setores , uso de 33 offsets5, isenção de exportação para não prejudicar a competitividade do produto brasileiro no mercado internacional e inibição de picos de preço, tudo isso com o principal objetivo de prevenir grandes impactos na competitividade dos agentes regulados. Um ponto de destaque quanto ao cenário basal é que nele a reciclagem das receitas geradas pela precificação seria uma redução na alíquota do INSS, gerando uma neutralidade fiscal. Os demais cenários tomam o cenário basal como base, adotando algumas especificidades em cada um dos casos: ● Cenário distributivo - as receitas geradas pela precificação se destinam crucialmente a compensações distributivas em transferências diretas às famílias de baixa renda ao invés de redução na alíquota do INSS, como proposto no cenário basal. ● Cenário de ajuste de fronteira - busca-se proteger a competitividade através de um tratamento justo entre produtos importados e nacionais, ao invés das alocações gratuitas das permissões. ● Cenário de inclusão da pecuária - o escopo regulatório é ampliado, contando com a inclusão da fermentação entérica da pecuária de corte. ● Cenário de isenção de combustíveis sensíveis - consiste em um escopo de regulação mais restrito, com a exclusão do diesel e do GLP dos combustíveis regulados, assim como também foi testada a exclusão da gasolina desse escopo. ● Cenário segmentado - modifica o escopo da regulação com instrumentos setoriais particulares, ao invés de instrumentos multissetoriais de maior amplitude. Nesse cenário, não existe a possibilidade de comercialização entre os setores, o que implicaria diferentes preços de carbono entre setores. Na figura 3 é possível compreender a lógica de comparação entre os diferentes cenários e como se correlacionam, clarificando de forma ilustrativa o que foi descrito acima. 5 Crédito de compensação que pode ser usado para conciliação de até 20% das emissões em projetos verificados em atividades não reguladas nesse cenário. Figura 3 Na tabela 1 é possível ter uma visão global, de maneira sucinta, das principais característica dos cenários e como se diferem entre si, dentro da lógica apresentada acima: Tabela 1 - Cenários simulados no PMR e principais características Cenários Setores com precificação Tendencial Nenhum Referência Nenhum Investimentos adicionais em Basal Indústria, combustíveis, geração e consumo de combustíveis e energia Precificação de Investimentos adicionais em Figura 3 - Lógica de Comparação dos Cenários Fonte: Centro Clima COPPE/UFRJ (2021) Na tabela 1 é possível ter uma visão global, de maneira sucinta, das principais característica dos cenários e como se diferem entre si, dentro da lógica apresentada acima: Cenários simulados no PMR e principais características Choques Simulados Isenções Proteção a Competitividade Nenhum - - Investimentos adicionais em medidas de mitigação - - Precificação de CO2e e Investimentos adicionais em medidas de mitigação 50% de alocação gratuita na primeira fase de todos setores e exportação 5% a 10% adicionais para setores vulneráveis 34 Lógica de Comparação dos Cenários Na tabela 1 é possível ter uma visão global, de maneira sucinta, das principais característica dos cenários e como se diferem entre si, dentro da lógica apresentada acima: Cenários simulados no PMR e principais características Proteção a Competitividade Limite de Emissões Reciclagem Receitas - - Atingir NDC com comando e controle - 5% a 10% adicionais para neráveis Relativo ao preço para atingir NDC Redução encargos trabalhistas 35 Distributivo Indústria, combustíveis, geração e consumo de combustíveis e energia Precificação de CO2e e Investimentos adicionais em medidas de mitigação 50% de alocação gratuita na primeira fase de todos setores e exportação 5% a 10% adicionais para setores vulneráveis Relativo ao preço para atingir NDC Transferência para a classe de renda mais pobre. Ajuste de Fronteira Indústria, combustíveis, geração e consumo de combustíveis e energia Precificação de CO2e e Investimentos adicionais em medidas de mitigação 50% de alocação gratuita na 1a fase para todos os setores Ajuste de fronteira com base no conteúdo de carbono nacional. Relativo ao preço para atingir NDC Redução encargos trabalhistas Precificação da Pecuária Indústria, combustíveis, geração e consumo de combustíveis e energia e precificação da pecuária Precificação de CO2e e Investimentos adicionais em medidas de mitigação 50% de alocação gratuita na primeira fase de todos setores e exportação 5% a 10% adicionais para setores vulneráveis Relativo ao preço para atingir NDC Redução encargos trabalhistas Segmentado Indústria, combustíveis, geração e consumo de combustíveis e energia Precificação de CO2e e Investimentos adicionais em medidas de mitigação 50% de alocação gratuita na primeira fase de todos setores e exportação 5% a 10% adicionais para setores vulneráveis Esforço de redução percentual igual entre os setores regulados para atingir a NDC. Redução encargos trabalhistas Isenção de Combustíveis Indústria, combustíveis, geração e consumo de combustíveis e energia, no entanto isentando gasolina, GLP e Diesel Precificação de CO2e e Investimentos adicionais em medidas de mitigação 50% de alocação gratuita na primeira fase de todos setores e exportação
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