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Segunda Seção RECURSO ESPECIAL N. 1.833.722-SP (2019/0013070-2) Relator: Ministro Raul Araújo Recorrente: M T R V Advogados: Mariana de Carvalho Sobral - SP162668 Marcelo Rodrigues Barreto Júnior - SP213448 Rafael Henrique de Souza - SP346085 Recorrido: Companhia Paulista de Trens Metropolitanos - CPTM Advogado: Luciana Pinheiro Gonçalves e outro(s) - SP134498 EMENTA Civil e Consumidor. Responsabilidade civil do transportador. Recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Ato libidinoso praticado por usuário contra passageira no interior de estação de trem metropolitano. Ausência de responsabilidade do transportador. Fato exclusivo de terceiro e estranho ao contrato de transporte. Fortuito externo. Negado provimento ao recurso especial. 1. A responsabilidade decorrente do contrato de transporte de pessoas é objetiva (CC, arts. 734 e 735), sendo obrigação do transportador a reparação do dano causado ao passageiro quando demonstrado o nexo causal entre a lesão e a prestação do serviço, pois o contrato de transporte acarreta para o transportador a assunção de obrigação de resultado, impondo ao concessionário ou permissionário do serviço público o ônus de levar o passageiro incólume ao seu destino. É a chamada cláusula de incolumidade, que garante que o transportador irá empregar todos os expedientes que são próprios da atividade para preservar a integridade física do passageiro contra os riscos inerentes ao negócio, durante todo o trajeto, até o destino fi nal da viagem. Essa responsabilidade, entretanto, não é por risco integral. 2. A teor da Súmula 187 do Supremo Tribunal Federal: “a responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”. Compreende-se na responsabilidade objetiva do transportador “pelo acidente com o passageiro”, qualquer acontecimento casual, fortuito, REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 476 inesperado inerente à prestação do serviço de transporte de pessoas, ou seja, acidente que tenha nexo causal com o serviço prestado, ainda que causado por terceiro, desde que caracterize o denominado fortuito interno. A expressão “acidente com o passageiro” não atrai a responsabilidade do transportador quanto a eventos, causados por terceiro, sem que tenham mínima relação direta com os serviços de transporte, isto é, por ocorrências estranhas ao serviço de transporte, provocadas por terceiro, as quais fujam completamente ao alcance preventivo do transportador, pois caracterizam o chamado fortuito externo. 3. O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, estatui: “o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços”, não sendo responsabilizado quando provar “a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro” (art. 14, caput e § 3º). 4. Portanto, o ato, doloso ou culposo, estranho à prestação do serviço de transporte, causado por terceiro, não guarda nexo de causalidade com o serviço prestado e, por isso, exonera a responsabilidade objetiva do transportador, caracterizando fortuito externo. Noutro giro, o ato, doloso ou culposo de terceiro, conexo com a atividade do transportador e relacionado com os riscos próprios da atividade econômica explorada, caracteriza o chamado fortuito interno, atraindo a responsabilidade do transportador. 5. Assim, nos contratos onerosos de transporte de pessoas, desempenhados no âmbito de uma relação de consumo, o fornecedor de serviços não será responsabilizado por assédio sexual ou ato libidinoso praticado por usuário do serviço de transporte contra passageira, por caracterizar fortuito externo, afastando o nexo de causalidade. 6. Recurso especial a que se nega provimento. ACÓRDÃO Após o voto do Sr. Ministro Relator negando provimento ao recurso especial e o voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi abrindo a divergência e dando provimento ao recurso especial, a Segunda Seção, por maioria, decide negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 477 Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator. Vencidos os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Luis Felipe Salomão. Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti. Sustentou oralmente, pela recorrida, o Dr. Nelson Takeo Yamazaki. Brasília (DF), 03 de dezembro de 2020 (data do julgamento). Ministro Raul Araújo, Relator DJe 15.3.2021 RELATÓRIO O Sr. Ministro Raul Araújo: Trata-se de recurso especial interposto por M T R V com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, manejado frente a acórdão do eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Relata a r. sentença que a autora “promoveu ação com pedido de indenização por danos morais contra Companhia Paulista de Trens Metropolitanos - CPTM, narrando, em breve síntese, que no dia 18 de dezembro de 2016, por volta das 19h00, estava subindo a rampa da estação Guaianases da CPTM, quando foi surpreendida por três indivíduos andando em sua direção, tendo um deles apertado seus seios”; que a autora seguiu “o indivíduo até encontrar um agente da CPTM, que deteve o molestador e encaminhou todos para a realização da lavratura do boletim de ocorrência”; que a autora alega “ter sofrido forte abalo psicológico em razão do ocorrido”, requerendo, então, “a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais em valor não inferior a R$ 20.000,00, carreando-lhe os ônus da sucumbência” (fl . 150; grifou-se). A sentença julgou o pedido improcedente, porque: a) não constatada “a existência de qualquer conduta que confi gure defeito no serviço prestado”, pois, “assim que obteve ciência do ocorrido, o agente da CPTM deteve o indivíduo, prestando o auxílio necessário e tomando as providências cabíveis, encaminhando todos para a lavratura do boletim de ocorrência”, demonstrando “a conduta que evidencia a prestação de auxílio da ré quando acionada diante dos fatos”; b) “não há dano moral indenizável pela ré”, pois, “embora a autora tenha passado por situação de assédio e afl ição de ordem psicológica e moral, o ocorrido não deve ser imputado à ré”, pois “os danos sofridos e descritos seriam imputáveis ao causador do dano, de todo identifi cado” (fl s. 152/153). REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 478 Manejada apelação, o eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou-lhe provimento em acórdão ementado da seguinte maneira: Improcedência. Apelo. Cerceamento de defesa afastado. Mérito. Decisão que merece confi rmação. Argumentos dela que são adotados nos moldes do art. 252 do RITJ. Autora que sofreu assédio nas dependências da ré. Requerida que tomou as providências que lhe cabiam. Ofensor detido e encaminhado à polícia. Auxílio prestado à vítima pelos agentes da ré. Ausência de falha na prestação do serviço. Responsabilidade da transportadora afastada. Precedentes TJSP. Sentença mantida. Recurso desprovido (nas fl s. 216/231; grifou-se). No presente recurso especial, a recorrente reitera que a hipótese cuida de ação de indenização por danos morais, ocorridos durante a prestação de serviço público de transporte de passageiros, quando a autora, na condição de usuária do serviço, ao caminhar por rampa de acesso de estação (Guaianases) do Metrô de São Paulo, “foi vítima de molestação sexual por terceiros, sendo assim defi ciente o serviço no aspecto de segurança devida e esperada, como determina o CDC e quebrada a causa (sic) de incolumidade inerente ao contrato tácito de transporte” (grifou-se, na fl . 236). Desse modo, sustenta que, “não havendo controvérsia quantoà ocorrência do evento que vitimou a autora, sendo a recorrida operadora do veiculo de transporte público de passageiros, caracterizada está a responsabilidade pelos danos sofridos pela recorrente, nos termos dos artigos 734, 735, 932, III, 949, todos do Código Civil, legislação que restou negada a vigência e foi contrariada pelo V. Acórdão ora atacado” (na fl . 237). Noutro passo, alega, também, que o acórdão recorrido diverge da jurisprudência do próprio eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no tocante à caracterização de caso de fortuito externo, excludente da responsabilidade do transportador (nas fl s. 237/238). Foram apresentadas contrarrazões (fl s. 291/301). O recurso especial foi inadmitido na origem (nas fl s. 302/303). Manejado agravo em recurso especial, a eg. Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo interno para converter o agravo em recurso especial e afetar o julgamento à Segunda Seção, nos termos do voto desta relatoria. É o relatório. Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 479 VOTO O Sr. Ministro Raul Araújo (Relator): De início, registre-se que a solução do presente recurso está ligada ao imperativo lógico de que as coisas iguais devem ser tratadas igualmente, com objetividade, não importando, senão para a fi xação do quantum indenizatório a ser suportado pelo responsável (CC, art. 944: A indenização mede-se pela extensão do dano.), o alcance da repulsa moral despertada pelo ato delituoso considerado. No presente caso, como se viu, as instâncias ordinárias afastaram a responsabilidade da transportadora pelo repulsivo evento danoso, assim como a obrigação reparatória dos danos morais demandados, consignando que a importunação sexual no transporte coletivo metroviário de passageiros confi gura fato de terceiro, que rompe o nexo de causalidade e exclui o dever de indenizar do transportador, conforme se depreende da leitura dos seguintes excertos do v. acórdão recorrido: Cabe ressaltar, contudo, os pontos relevantes do ‘decisum’ apelado e que se circunscrevem aos seguintes: 1. A prática de infração delituosa por terceiro no interior de trens é fato que extrapola o serviço de transporte prestado pela ré, motivo pelo qual não há que se falar em responsabilidade objetiva. Fato de terceiro confi gura causa de exclusão da responsabilidade da ré, fugindo dos deveres concernentes ao prestador de serviço de transporte. Não obstante, o fato ocorrido é imprevisível e, portanto, confi gura a excludente de responsabilidade de caso fortuito. A propósito, veja-se o decidido nos autos da Apelação n. 1012150- 65.2015.8.26.0100, 17ª Câmara de Direito Privado, Rel. Desembargador Afonso Braz, julgado em 15 de setembro de 2016, com a seguinte ementa: Indenização. Transporte ferroviário. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Julgamento antecipado da lide que não caracteriza cerceamento de defesa. Ilegitimidade passiva da CPTM não caracterizada. Dano material. Ausências de provas documentais das consequências patrimoniais e da descrição delas na petição inicial. Dano moral. Ausência de nexo causal entre os serviços prestados pela empresa de transportes e os alegados danos sofridos pela autora. Responsabilidade do transportador não caracterizada. Pretensão indenizatória indevida. Sentença reformada. Ação improcedente. Recurso da ré provido e recurso adesivo da autora desprovido na parte conhecida. [fl s. 151/152]. REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 480 ........................................................................... 2. No caso em tela, segundo o auto circunstanciado (fl s. 23/24), não consta a existência de qualquer conduta que confi gure defeito no serviço prestado. Ao contrário, assim que obteve ciência do ocorrido, o agente da CPTM deteve o indivíduo, prestando o auxílio necessário e tomando as providências cabíveis, encaminhando todos para a lavratura do boletim de ocorrência. Assim, restou demonstrada a conduta que evidencia a prestação de auxílio da ré quando acionada diante dos fatos. Por fi m, não há dano moral indenizável pela ré. Embora a autora tenha passado por situação de assédio e aflição de ordem psicológica e moral, o ocorrido não deve ser imputado à ré. Os danos sofridos e descritos seriam imputáveis ao causador do dano, de todo identifi cado. [fl s. 152/153]. Com efeito, as providências que cabiam à CPTM foram tomadas. O indivíduo foi detido e encaminhado à polícia, e o auxílio à vítima foi prestado pelos agentes da ré. Não há como se falar em falha na prestação do serviço de transporte, pois não tem a ré o poder de impedir a ação de terceiro dentro de suas dependências. ................................................................. Assim, mantém-se integralmente a r. sentença de Primeiro grau. (nas fls. 220/221) Em contraponto, a recorrente defende no especial a tese de que “o contrato de transporte não foi cumprido, o que especialmente deve ser considerado também para a indenização do dano moral. Pois, ao invés de transportá-lo ao seu destino, a empresa, que deixou de providenciar a segurança e a tranquilidade que deveria no transporte de sua passageira, ora recorrente, incorrendo na aplicação dos dispositivos legais que restaram contrariados, ou seja, nos artigos 734 e 735 do Código Civil” (na fl . 245). Logo, a controvérsia é estabelecida acerca da caracterização de ato de terceiro como excludente da responsabilidade do transportador de pessoas pela reparação civil. Desse modo, convém transcrever relevantes disposições normativas e sumular para o deslinde da presente controvérsia: - Constituição Federal: Art. 37........................................ Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 481 § 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. - Código Civil/2002: Art. 593. A prestação de serviço, que não estiver sujeita às leis trabalhistas ou a lei especial, reger-se-á pelas disposições deste Capítulo. Art. 731. O transporte exercido em virtude de autorização, permissão ou concessão, rege-se pelas normas regulamentares e pelo que for estabelecido naqueles atos, sem prejuízo do disposto neste Código. Art. 732. Aos contratos de transporte, em geral, são aplicáveis, quando couber, desde que não contrariem as disposições deste Código, os preceitos constantes da legislação especial e de tratados e convenções internacionais. Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade. Parágrafo único. É lícito ao transportador exigir a declaração do valor da bagagem a fi m de fi xar o limite da indenização. Art. 735. A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fi ca obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especifi cados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos fi lhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ouestabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fi ns de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 482 V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia. Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos. Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização. Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fi m da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido. - Decreto n. 2.681/1912, que regula a responsabilidade civil das estradas de ferro: Art. 17. As estradas de ferro responderão pelos desastres que nas suas linhas sucederem aos viajantes e de que resulte a morte, ferimento ou lesão corpórea. A culpa será sempre presumida, só se admitindo em contrário alguma das seguintes provas: 1ª - Caso fortuito ou força maior; 2ª - Culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada. - Código de Defesa do Consumidor: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insufi cientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. .............................................................................................. § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, efi cientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 483 Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código. - Súmula n. 187 do Supremo Tribunal Federal: A responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva. De destacar, conforme a doutrina e a jurisprudência, a responsabilidade decorrente do contrato de transporte de pessoas é objetiva, sendo obrigação do transportador a reparação de dano causado ao passageiro quando demonstrado o nexo causal entre a lesão e a prestação do serviço, pois o contrato de transporte acarreta para o transportador a assunção de obrigação de resultado, impondo ao prestador do serviço público de transporte o ônus de levar o passageiro incólume ao seu destino. É a chamada cláusula de incolumidade, que garante que o transportador irá empregar todos os expedientes próprios da atividade para preservar a integridade física do passageiro contra os riscos inerentes ao negócio, durante todo o trajeto, até o destino fi nal da viagem. Nessa linha, Carlos Roberto Gonçalves, afi rmando ser “a responsabilidade do transportador (é) objetiva”, salienta: No direito brasileiro, a fonte dessa responsabilidade encontra-se no Decreto n. 2.681, de 7 de dezembro de 1912, que regula a responsabilidade civil das estradas de ferro. Tal diploma, considerado avançado para a época em que foi promulgado, destinava-se a regular tão somente a responsabilidade civil das ferrovias. Entretanto, por uma ampliação jurisprudencial, teve sua aplicabilidade estendida a qualquer outro tipo de transporte: ônibus, lotações, automóveis etc. (...). O Decreto n. 2.681 contém em si, conforme observa Wilson Melo da Silva (Da responsabilidade, cit., p. 68, n. 22), implícita, a obrigação de o transportador levar, são e salvo, o passageiro até o local de seu destino, obrigação essa apenas elidível pelo caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva (não concorrente) da vítima. (in Responsabilidade Civil, 15a. ed., S. P., Saraiva, 2014, pp. 267/268, grifou-se,). Na mesma linha de entendimento, Carlos Maldonado de Carvalho assevera: REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 484 Destaca-se, portanto, como característica mais importante do contrato de transporte, a cláusula de incolumidade do passageiro, que nele se encontra implícita. Por certo, e sem qualquer dúvida, tem o transportador o dever de zelar pela integridade física e psíquica do passageiro, após o seu embarque e durante todo o trajeto contratado. A cláusula de incolumidade é, como aduz JOSÉ DE AGUIAR DIAS, inerente ao contrato de transporte de pessoas, pois quem utiliza um meio de transporte regular celebra com o transportador uma convenção cujo elemento essencial é a sua incolumidade, isto é, a obrigação, que assume o transportador, de levá-lo são e salvo ao lugar do destino. Daí porque, fácil é concluir, a obrigação assumida pelo transportador, além de objetiva, é também de resultado, não se exigindo do passageiro, em caso de dano, a prova sobre quem, culposa ou dolosamente, deu causa ao evento danoso; basta que seja provado pelo vitimado o contrato de transporte, o dano e o nexo de causalidade. (in A Responsabilidade Civil do Transportador Rodoviário Urbano, Revista da EMERJ, Número Especial 2004. Anais dos Seminários EMERJ Debate o Novo Código Civil, parte 11, julho/2002 a abril/2003, grifou-se, p. 88) A propósito da natureza objetiva da responsabilidade civil do prestador de serviços públicos, incluído o transportador de pessoas, é categórica a Constituição Federal ao estabelecer tal responsabilidade quanto aos danos causados a terceiros pelos agentes do prestador, atuando nessa qualidade, sem cogitar de causas de exclusão da obrigação reparatória, somente ressalvando “o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa” (art. 37, § 6º, grifou-se). Não está ai abrangida, portanto, a lesão causada por terceiro, pessoa estranha aos serviços prestados. Por sua vez, a vetusta norma reguladora da responsabilidade civil das estradas de ferro (Decreto n. 2.681/1912), aplicável analogicamente ao transporte rodoviário de pessoas, explicita a responsabilidade do transportador pelos desastres (acidentes) cuja “culpa será sempre presumida”, somente sendo excluída nas hipóteses de “caso fortuito ou força maior” e “culpa do viajante, não concorrendo culpa da estrada”, ou seja, culpa exclusiva da própria vítima ou de terceiro, ambos na qualidade de viajantes (grifou-se, art. 17). Mais rigoroso, o Código Civil (2002), conquanto tenha previsto o “motivo de força maior” (art. 734) como excludente da responsabilidade, peremptoriamente afi rma que “a responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva” (grifou-se, art. 735). Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 485 Vem na mesma toada, o teor da Súmula 187 do colendo Supremo Tribunal Federal ao estatuir: “a responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente com o passageiro, não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva”. Não obstante os termos taxativos das disposições acima referidas, percebe- se, sem difi culdade, que referem a responsabilidade objetiva do transportador “pelo acidente com o passageiro”, compreendendo-se na expressão acidente qualquer acontecimento casual, fortuito, inesperado inerente à prestação do serviço de transporte de pessoas, ou seja, acidente que tenha nexo causalcom o serviço prestado, como, p. ex.: um abalroamento causado por outro veículo; a queda de volume pesado, mal acomodado na prateleira superior da cabine do carro, sobre um passageiro por culpa (descuido) de outro viajante; enfi m, qualquer outro acidente pertinente ao serviço de transporte, mesmo quando provocado por terceiro, desde que caracterize o denominado fortuito interno. Mas, por óbvio, a expressão “acidente com o passageiro” não atrai a responsabilidade do transportador quanto a eventos, causados por terceiro, sem mínima relação direta com os serviços de transporte, isto é, ocorrências estranhas ao serviço de transporte, provocadas por terceiro, as quais fujam completamente ao alcance preventivo do transportador, pois caracterizam o chamado fortuito externo. Afi nal, a responsabilidade objetiva, prevista na lei, não tem a natureza de responsabilidade objetiva por risco integral. Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor estatui “o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços”, não sendo responsabilizado quando provar “a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro” (art. 14, caput e § 3º). Assim, nos contratos onerosos de transporte de pessoas, desempenhados no âmbito de uma relação de consumo, o fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar a culpa exclusiva do próprio consumidor lesado ou de terceiro (art. 14, § 3º), por serem causas de afastamento, eliminação do nexo de causalidade. O ato, doloso ou culposo, estranho à prestação do serviço de transporte, causado por terceiro, não guarda nexo de causalidade com o serviço prestado e, por isso, exonera a responsabilidade objetiva do transportador. Por outro lado, o ato, doloso ou culposo de terceiro, conexo com a atividade do transportador e REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 486 relacionado com os riscos próprios da atividade econômica explorada, caracteriza o chamado fortuito interno, atraindo a responsabilidade do transportador. Como se vê de toda a legislação acima transcrita e analisada, inclusive do próprio Código de Defesa do Consumidor, embora as prescrições normativas reforcem a natureza objetiva da responsabilidade civil do transportador, todas preveem, expressa ou implicitamente, como causas excludentes da responsabilidade eventos decorrentes de caso fortuito, de força maior ou de culpa exclusiva de terceiro. E é assim, porque esses eventos não têm nexo, vínculo, ligação com o serviço de transporte de passageiros. Essas compreensões acham-se consagradas na mais prestigiada doutrina e na jurisprudência dominante. Acerca da compatibilização das regras supra transcritas, Carlos Roberto Gonçalves, na obra citada, esclarece: A incidência do Código de Defesa do Consumidor nos casos de acidentes ocorridos por ocasião do transporte de passageiros não fi cou prejudicada com a entrada em vigor do novo Código Civil. Dispõe este, no art. 731, que “o transporte exercido em virtude de autorização, permissão ou concessão, rege-se pelas normas regulamentares e pelo que for estabelecido naqueles atos, sem prejuízo do disposto neste Código”. E o art. 732 ressalva a aplicabilidade da legislação especial aos contratos de transporte, em geral, desde que não contrarie as disposições do estatuto civil. Da mesma forma, dispõe o art. 593 do mesmo diploma que “a prestação de serviço, que não estiver sujeita às leis trabalhistas ou à lei especial, reger-se-á pelas disposições deste Capítulo” (grifos nossos). Não há incompatibilidade entre o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor, visto que ambos adotam a responsabilidade objetiva do transportador, só elidível mediante a prova de culpa exclusiva da vítima, do caso fortuito e da força maior, ou do fato exclusivo de terceiro, porque tais excludentes rompem o nexo de causalidade. Malgrado não sejam todas mencionadas expressamente nos referidos diplomas, não podem deixar de ser aceitas como excludentes da responsabilidade do transportador, por afastarem, como mencionado, o nexo causal. (grifou-se, ob. cit., pp. 271 e 266). A mesma opinião é compartilha por José Carlos Maldonado de Carvalho (ob. cit., p. 88). A doutrina a seguir transcrita, corrobora o entendimento de que: a) o ato doloso ou culposo de terceiro, quando guarda conexão com a atividade do transportador, relaciona-se com o risco do próprio negócio, e, assim, caracteriza o fortuito interno, ensejando a responsabilidade objetiva; e b) o ato doloso ou Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 487 culposo de terceiro, quando alheio à atividade explorada pelo fornecedor, por não guardar conexão com os riscos do negócio, é fato estranho à atividade do transportador, caracterizando fortuito externo, equiparável à força maior, excludente da responsabilidade civil do transportador, como nos casos, p. ex., de: roubo ou assalto a mão armada no interior de veículo de passageiros ou em estação de metrô, resultando na morte de passageiro; pedra arremessada contra o carro de transporte, ferindo passageiro; viajante atingido por bala perdida. Veja-se: - de Sérgio Cavalieri Filho: E assim se tem entendido porque o fato culposo de terceiro se liga ao risco do transportador, relaciona-se com a organização do seu negócio, caracterizando o fortuito interno, que não afasta a sua responsabilidade, conforme vimos ainda há pouco. Tal já não ocorre, entretanto, com o fato doloso de terceiro, conforme temos sustentado. Este não pode ser considerado fortuito interno porque, além de absolutamente irresistível e inevitável, não guarda nenhuma ligação com os riscos do transportador; é fato estranho à organização do seu negócio, pelo qual não pode responder. Por isso, a melhor doutrina caracteriza o fato doloso de terceiro, vale dizer, o fato exclusivo de terceiro, como fortuito externo, com o que estamos de pleno acordo. Ele exclui o próprio nexo causal, equiparável à força maior, e, por via de consequência, exonera de responsabilidade o transportador. O transporte, em casos tais, não é causa do evento; é apenas a sua ocasião. E mais: após a vigência do Código do Consumidor, esse entendimento passou a ter base legal, porquanto, entre as causas exonerativas da responsabilidade do prestador de serviços, o § 3º, II, do art. 14 daquele Código incluiu o fato exclusivo de terceiro. ........................................................................................... O fato de terceiro que não exonera de responsabilidade o transportador é aquele que com o transporte guarde conexidade, inserindo-se nos riscos próprios do deslocamento. Assim, os precedentes que deram origem ao enunciado em exame (Súmula 187 do Supremo Tribunal Federal), referentes a choques com outros veículos. Não haverá exclusão da responsabilidade em virtude de o dano haver ocorrido por culpa do outro envolvido no acidente. A mesma solução não se há de emprestar quando intervenha um fato inteiramente estranho. É o que sucede havendo, por exemplo, um atentado ou um assalto. O dano deve-se à causa alheia ao transporte em si. Tem-se hipótese que se deve equiparar ao fortuito, excluindo-se a responsabilidade. (Programa de Responsabilidade Civil - 12. ed. - São Paulo: Atlas, 2015. pp. 408/409) REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 488 - de José Carlos Maldonado de Carvalho: Também o fato exclusivo de terceiro, desde que comprovadamente doloso, é causa de exclusão da responsabilidade civil do transportador de passageiros urbanos. ................................................................................................. Os modernos doutrinadores, em razão da responsabilidade objetiva do transportador e da obrigação de resultado que se reconhece como ínsita em todo contrato de transporte, fazem adivisão do caso fortuito em fortuito interno e fortuito externo. Apregoam, com a nossa adesão, que, sendo o fato causador do dano imprevisível e, por conseguinte, inevitável, ligado, porém, à organização da empresa transportadora e relacionado aos riscos com a atividade por ela desenvolvida, como, por exemplo, o rompimento de um pneu ou a pane do veículo transportador que dê causa a um incêndio por problemas elétricos, caracteriza o fortuito interno que, ligado ao risco do empreendimento, não afasta a responsabilidade civil pelos danos daí decorrentes. Já o fortuito externo, por não guardar qualquer relação com a atividade da empresa transportadora, afasta a obrigação de cunho reparatório, já que, como conclui SERGIO CAVALIERI FILHO, citando AGOSTINHO ALVIM, se aproxima da força maior. Logo, o fato doloso e exclusivo de terceiro, por se tratar de fortuito externo, rompe o nexo de causalidade, exonerando, assim, a responsabilidade civil do transportador urbano. ................................................................................................. Em diversas oportunidades, o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado no mesmo sentido, consolidando o entendimento de que “o transportador só responde pelos danos resultantes de fatos conexos com o serviço que presta” (REsp 468.900/RJ). Ainda sobre o tema, convém remarcar, equipara-se o roubo com arma de fogo, como afi rmado pela Corte Superior, ao fortuito externo, que, por ser equiparado à força maior, se apresenta como fato totalmente estranho ao serviço de transporte (REsps 286.11 O/RJ e 435.865/RJ). Daí a conclusão de que a força maior, por ser produzida por terceiro, é inevitável, ainda que previsível. Da mesma forma, o arremesso de qualquer objeto por transeunte contra ônibus no curso da viagem, também confi gura fortuito externo, o que também exclui a responsabilidade do transportador rodoviário. (ob. cit. pp. 88/89 e 91/92). Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 489 - de Arnaldo Marmitt: Em outros termos, o fato de terceiro só exime do dever de indenizar o causador direto do dano quando se constituir em “causa estranha” ao trânsito, revestido da roupagem do imprevisível e do inevitável. Não merecem a qualificação de “causa estranha” fatos inerentes ao trânsito, como a colisão com outro veículo, que trafega em sentido oposto, em via de intenso movimento; o desvio do carro contra outro veículo para evitar atropelamento de pedestre; a freagem brusca, originária de derrapagem e choque contra outro automóvel, etc. Entretanto, o tiro de revólver desferido em pneu de veículo, em via expressa ou local de velocidade alta, pode constituir-se em “causa estranha”, se com as características de inesperado, imprevisível e inevitável. Exemplo clássico de “causa estranha” que se costuma apresentar é o da pedra jogada de repente contra o pára-brisa do veículo, neutralizando a visão do motorista e motivando a colisão contra outro veículo. Tal fato súbito e imprevisível, alheio às preocupações normais do motorista e aos perigos correntios do trânsito, é juridicamente apto a exonerar de responsabilidade o autor da colisão. De conseguinte, toda vez que o fato de terceiro não for causa estranha ao trânsito e não tiver as características de imprevisível e inevitável não servirá para afastar ou excluir a obrigação de indenizar. (Responsabilidade civil nos acidentes de automóvel/Arnaldo Marmitt - 4ª ed., Rio de Janeiro. AIDE Editora, 2004. p. 60). - de Carlos Roberto Gonçalves: A jurisprudência, inclusive a do Superior Tribunal de Justiça, tem considerado causa estranha ao transporte, equiparável ao fortuito, disparos efetuados por terceiros contra os trens, ou pedras que são atiradas nas janelas, ferindo passageiros (RT, 642: 150, 643:219; RSTJ 781:176), ou ainda disparos efetuados no interior de ônibus inclusive durante assaltos aos viajantes ‘176 (RT, 429:260; RTJ, 96:1201) (ob. cit., pp. 270/271). - de Arnaldo Rizzardo: A responsabilidade objetiva do transportador decorre de desastres acontecidos entre veículos. A culpa presumida pressupõe um acidente com o veículo, mesmo que seja por culpa de terceiro, e não emana de elementos ou causas estranhas ao trânsito. O contrário seria admitir a responsabilidade por REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 490 tudo que sucedesse no interior da condução, sem qualquer participação dos que a dirigem. (A reparação nos acidentes de trânsito / Arnaldo Rizzardo. 13. ed. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 115). Passando ao entendimento jurisprudencial prevalente, traz-se os seguintes precedentes desta Corte, os dois primeiros da Segunda Seção, harmônicos com a compreensão doutrinária invocada: Embargos de divergência. Recurso especial. Responsabilidade civil. Processual Civil. Transporte oneroso de passageiros. Excludentes da obrigação reparatória. Aresto embargado: acidente de trânsito provocado por ato culposo de terceiro. Fortuito interno. Responsabilidade do transportador configurada. Acórdão paradigma: pedra arremessada contra ônibus. Ato doloso de terceiro. Força maior. Fortuito externo. Responsabilidade afastada. Divergência jurisprudencial não demonstrada. Ausência de similitude fática entre os acórdãos confrontados. Embargos de divergência não conhecidos. 1. Conforme concordam doutrina e jurisprudência, a responsabilidade decorrente do contrato de transporte de pessoas é objetiva, sendo obrigação do transportador a reparação do dano causado ao passageiro quando demonstrado o nexo causal entre a lesão e a prestação do serviço, pois o contrato de transporte acarreta para o transportador a assunção de obrigação de resultado, impondo ao concessionário ou permissionário do serviço público o ônus de levar o passageiro incólume ao seu destino. É a chamada cláusula de incolumidade, que garante que o transportador irá empregar todos os expedientes que são próprios da atividade para preservar a integridade física do passageiro, contra os riscos inerentes ao negócio, durante todo o trajeto, até o destino fi nal da viagem. 2. Nos moldes do entendimento uníssono desta Corte, com suporte na doutrina, o ato culposo de terceiro, conexo com a atividade do transportador e relacionado com os riscos próprios do negócio, caracteriza o fortuito interno, inapto a excluir a responsabilidade do transportador. Por sua vez, o ato de terceiro que seja doloso ou alheio aos riscos próprios da atividade explorada, é fato estranho à atividade do transportador, caracterizando-se como fortuito externo, equiparável à força maior, rompendo o nexo causal e excluindo a responsabilidade civil do fornecedor. 3. O conhecimento dos embargos de divergência pressupõe a existência de similitude das circunstâncias fáticas e a diversidade das soluções jurídicas aplicadas nos acórdãos recorrido e paradigma, circunstâncias inexistentes no caso vertente, em que as hipóteses fáticas confrontadas são díspares. 4. O acórdão embargado assevera que os corriqueiros acidentes automotivos, mesmo que causados exclusivamente por ato culposo de terceiro, são considerados fortuitos internos, incapazes de excluir a responsabilidade civil do transportador quanto à incolumidade do passageiro. Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 491 5. Por sua vez, o aresto paradigma afi rma que o arremesso de pedra contra ônibus, fato doloso atribuído a terceiro que não se encontrava no veículo de transporte coletivo, constitui fortuito externo, caracterizando motivo de força maior que exclui a responsabilidade do transportador pela reparação dos danos causados ao passageiro. 6. Embargos de divergência não conhecidos. (EREsp 1.318.095/MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 22/02/2017, DJe de 14/03/2017) Processual Civil. Civil. Agravo interno nos embargos dedivergência em recurso especial apreciação à luz do CPC/73. Responsabilidade civil. Transporte de passageiros. Arremesso de pedra de fora da composição férrea. Lesão em passageiro. Fato de terceiro. Excludente de responsabilidade. Precedentes. Acórdão paradigma que excepciona a jurisprudência desta Corte. Peculiaridade encontrada no paradigma que não se verifi ca no caso dos autos. Dissídio jurisprudencial não caracterizado. Súmula 168/STJ. Agravo interno improvido. 1. A orientação harmonicamente fi rmada em ambas as Turmas que compõem a Segunda Seção é no sentido de que, por se tratar de fortuito externo, não se incluindo nos riscos normais da atividade de transporte, não pode a transportadora ser responsabilizada pelo dano causado ao passageiro que é atingido por objeto arremessado por terceiro, fora da composição ferroviária, havendo, pois, exclusão do nexo de causalidade nessa hipótese. 2. O acórdão paradigma expressamente excepciona a jurisprudência consagrada por esta Corte de Justiça, considerando a peculiaridade de o dano causado ao passageiro haver ocorrido em razão da entrada de pedra arremessada por terceiro através de porta que estava aberta enquanto o trem trafegava. No acórdão embargado, tal questão de ordem fática não foi examinada na decisão monocrática, tampouco levada à deliberação da Quarta Turma, quando da prolação do aresto embargado. 3. Fazendo uma incursão no conteúdo das decisões proferidas nas instâncias ordinárias, verifi ca-se que o caso dos autos não traz exatamente essa peculiaridade, de maneira que há de ser aplicada a jurisprudência tradicional desta Corte de Justiça e não a exceção estabelecida no paradigma. 4. “Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do Tribunal se fi rmou no mesmo sentido do acórdão embargado” (Súmula 168/STJ). 5. Agravo interno improvido. (AgInt nos EREsp 1.325.225/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, DJe de 19/09/2016) Recurso especial. Administrativo. Responsabilidade civil. Transporte público metropolitano. Queda de passageiro no momento do embarque. Dano moral. Responsabilidade objetiva. Fato de terceiro. Fortuito interno. REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 492 1. “Conforme concordam doutrina e jurisprudência, a responsabilidade decorrente do contrato de transporte de pessoas é objetiva, sendo obrigação do transportador a reparação do dano causado ao passageiro quando demonstrado o nexo causal entre a lesão e a prestação do serviço, pois o contrato de transporte acarreta para o transportador a assunção de obrigação de resultado, impondo ao concessionário ou permissionário do serviço público o ônus de levar o passageiro incólume ao seu destino. É a chamada cláusula de incolumidade, que garante que o transportador irá empregar todos os expedientes que são próprios da atividade para preservar a integridade física do passageiro, contra os riscos inerentes ao negócio, durante todo o trajeto, até o destino fi nal da viagem” (EREsp 1.318.095/MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 22/2/2017, DJe 14/3/2017) 2. “O fato de terceiro, conforme se apresente, pode ou não romper o nexo de causalidade. Exclui-se a responsabilidade do transportador quando a conduta praticada por terceiro, sendo causa única do evento danoso, não guarda relação com a organização do negócio e os riscos da atividade de transporte, equiparando-se a fortuito externo. De outro turno, a culpa de terceiro não é apta a romper o nexo causal quando se mostra conexa à atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração, caracterizando fortuito interno” (REsp 1.747.637/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1/7/2019). 3. In casu, a situação descrita pelo acórdão recorrido, na qual o passageiro restou empurrado por aglomeração de pessoas no momento do embarque, vindo a sofrer severos danos físicos, constitui típico exemplo de fortuito interno, o qual é incapaz de romper o nexo de causalidade e de eximir a concessionária de sua responsabilidade civil. 4. Recurso especial provido. (REsp 1.715.816/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 02/06/2020, DJe 09/06/2020) Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos morais e materiais. Assalto na estação de metrô. Ausência de responsabilidade da transportadora. Fato exclusivo de terceiro e estranho ao contrato de transporte. Agravo interno não provido. 1. Nos termos da jurisprudência firmada nesta Corte Superior, a responsabilidade do transportador em relação aos passageiros é objetiva, podendo, portanto, ser elidida por fortuito externo, força maior, fato exclusivo da vítima ou por fato doloso e exclusivo de terceiro - quando este não guardar conexidade com a atividade de transporte. 2. “Assalto ocorrido nas escadas de acesso ao metrô não pode ser considerado como falta do serviço, equiparando-se a assalto ocorrido em transporte coletivo” (REsp 402.708/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 24/08/2004, DJ de 28/02/2005). Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 493 3. Na hipótese, afasta-se a responsabilidade da concessionária pelo dano material sofrido em decorrência de roubo cometido por terceiros, na modalidade conhecida como “saidinha de banco”, contra vítima que saiu de agência bancária com grande quantia em dinheiro e foi abordada pelos assaltantes na escada de acesso à estação metroviária. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1.491.619/RJ, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 06/02/2020, DJe de 18/02/2020) Agravo interno no recurso especial. Transporte oneroso de passageiros. Excludentes da obrigação reparatória. Acidente de trânsito. Ato culposo de terceiro. Fortuito interno. Responsabilidade do transportador. Confi guração. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos n. 2 e 3/STJ). 2. A responsabilidade do transportador em relação aos passageiros é contratual e objetiva, somente podendo ser elidida por fortuito externo, força maior, fato exclusivo da vítima ou por fato doloso e exclusivo de terceiro - quando este não guardar conexão com a atividade de transporte. Precedentes. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1.768.074/CE, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 02/12/2019, DJe 06/12/2019) Agravo interno no agravo em recurso especial. Responsabilidade civil. Contrato de transporte de pessoas. Morte de passageiro após acidente automobilístico. Responsabilidade comprovada na origem. Culpa concorrente ou de terceiro afastada. Incidência da Súmula 7 do STJ. Indenização por danos morais. Exorbitância. Não ocorrência. Recurso desprovido. 1. Segundo jurisprudência deste Tribunal Superior, “a responsabilidade decorrente do contrato de transporte de pessoas é objetiva, sendo obrigação do transportador a reparação do dano causado ao passageiro quando demonstrado o nexo causal entre a lesão e a prestação do serviço, pois o contrato de transporte acarreta para o transportador a assunção de obrigação de resultado, impondo ao concessionário ou permissionário do serviço público o ônus de levar o passageiro incólume ao seu destino. É a chamada cláusula de incolumidade, que garante que o transportador irá empregar todos os expedientes que são próprios da atividade para preservar a integridade física do passageiro, contra os riscos inerentes ao negócio, durante todo o trajeto, até o destino fi nal da viagem” (EREsp 1.318.095/ MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 22/02/2017, DJe de 14/03/2017). 2. Logo, a responsabilidade do transportador em relação aos passageiros é contratual e objetiva, nos termos dos arts. 734, caput, 735 e 738, parágrafo único, do REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 494 Código Civil de 2002, somente podendo ser elidida por fortuito externo, força maior, fato exclusivo da vítima ou por fato doloso e exclusivo de terceiro - quando este não guardar conexidade com a atividade de transporte. 3. O Tribunal local, ao apreciar as provas produzidas nos autos, foi categórico em reconhecer os requisitos ensejadores da obrigação de indenizar, notadamente diante do descumprimento do seu dever de garantir a incolumidade do passageiro. Nestas circunstâncias, afi gura-se inviável rever o substrato fático- probatório diante do óbice da Súmula 7/STJ. 4. O valor da indenização por danos morais, arbitrado em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), para cada autor, não é exorbitante, considerado falecimento do passageiro, companheiro e pai dos ora agravados. 5. Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp 1.401.928/MA, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 15/08/2019, DJe 04/09/2019) Processual Civil. Agravo interno nos embargos de declaração no agravo em recurso especial. Recurso manejado sob a égide do NCPC. Ação indenizatória. Dano moral. Morte de passageiro em decorrência de discussão entre o motorista do coletivo e terceira pessoa. Parcial procedência. Prescrição. Matéria de ordem pública. Prequestionamento. Necessidade. Precedentes. Mérito. Tribunal local que reconheceu a responsabilidade objetiva da transportadora. Aplicação da Súmula n. 568 do STJ. Recurso protelatório. Incidência da multa do art. 1.021, § 4º, do NCPC. Agravo interno não provido, com imposição de multa. 1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo n. 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. As questões de ordem pública, embora passíveis de conhecimento de ofício nas instâncias ordinárias, não prescindem, no estreito âmbito do recurso especial, do requisito do prequestionamento. Precedentes. 3. A orientação firmada nesta Corte é de que o fato de terceiro que exclui a responsabilidade do transportador é aquele imprevisto e inevitável, que nenhuma relação guarda com a atividade inerente à transportadora. 4. No caso dos autos, o Tribunal a quo reconheceu que o fato (disparo de arma de fogo que vitimou o fi lho dos agravados) foi desencadeado dentro da atividade de transporte e em razão do risco/situação gerada pelo motorista da transportadora, não podendo ser afastada a responsabilidade da ré. Acórdão em conformidade com a orientação fi rmada nesta Corte. Incidência da Súmula n. 568 do STJ. 5. Em virtude de anterior advertência em relação a aplicabilidade do NCPC, aplica-se ao caso a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do referido Código, no percentual de 3% sobre o valor atualizado da causa, fi cando a interposição de Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 495 qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º daquele artigo de lei. 6. Agravo interno não provido, com imposição de multa. (AgInt nos EDcl no AREsp 1.299.138/MG, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 08/04/2019, DJe 10/04/2019) Recurso especial. Ação condenatória. Acessibilidade em transporte aéreo. Cadeirante submetido a tratamento indigno ao embarcar em aeronave. Ausência dos meios materiais necessários ao ingresso desembaraçado no avião do dependente de tratamento especial. Responsabilidade da prestadora de serviços confi gurada. Redução do quantum indenizatório improcedente. Recurso especial desprovido. Hipótese: Trata-se de ação condenatória cuja pretensão é o reconhecimento da responsabilidade civil da companhia aérea por não promover condições dignas de acessibilidade de pessoa cadeirante ao interior da aeronave. 1. Recurso sujeito aos requisitos de admissibilidade do Código de Processo Civil de 1973, conforme Enunciado Administrativo 2/2016 do STJ. 2. Não há violação ao art. 535 do CPC/73 quando não indicada a omissão e a demonstrada a importância da análise da matéria para a resolução da controvérsia. Na hipótese de fundamentação genérica incide a regra da Súmula 284 do STF. 3. O Brasil assumiu no plano internacional compromissos destinados à concretização do convívio social de forma independente da pessoa portadora de defi ciência, sobretudo por meio da garantia da acessibilidade, imprescindível à autodeterminação do indivíduo com difi culdade de locomoção. 3.1. A Resolução n. 9/2007 da Agência Nacional de Aviação Civil, cuja vigência perdurou de 14/6/2007 até 12/1/2014, atribuiu às empresas aéreas a obrigação de assegurar os meios para o acesso desembaraçado da pessoa com defi ciência no interior da aeronave, aplicando-se, portanto, aos fatos versados na demanda. 4. Nos termos do art. 14, caput, da Lei n. 8.078/90, o fornecedor de serviços responde, objetivamente, pela reparação dos danos causados ao consumidor, em razão da incontroversa má-prestação do serviço por ela fornecido, o que ocorreu na hipótese. 4.1. O fato de terceiro, excludente da responsabilidade do transportador, é aquele imprevisto e que não tem relação com a atividade de transporte, não sendo o caso dos autos, uma vez que o constrangimento, previsível no deslocamento coletivo de pessoas, decorreu da própria relação contratual entre os envolvidos e, preponderantemente, da forma que o serviço foi prestado pela ora recorrente. 5. A indenização por danos morais fi xada em quantia sintonizada aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade não enseja a interposição do recurso especial, dada a necessidade de exame de elementos de ordem fática, cabendo REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 496 sua revisão apenas em casos de manifesta excessividade ou irrisoriedade do montante arbitrado. Incidência da Súmula 7 do STJ. Verba indenizatória mantida em R$ 15.000,00 (quinze mil reais). 6. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1.611.915/RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 06/12/2018, DJe 04/02/2019) Recurso especial. Responsabilidade civil. Transporte de passageiros. Concessionária de serviço público. Metropolitano. Roubo com arma branca seguido de morte. Escadaria de acesso à estação metroviária. Caso fortuito externo. Excludente de responsabilidade civil. Precedentes. Apelo provido. 1. Nos termos da jurisprudência firmada nesta Corte Superior, a responsabilidade do transportador em relação aos passageiros é objetiva, somente podendo ser elidida por fortuito externo, força maior, fato exclusivo da vítima ou por fato doloso e exclusivo de terceiro - quando este não guardar conexidade com a atividade de transporte. 2. Não está dentro da margem de previsibilidade e de risco da atividade de transporte metroviário o óbito de consumidor por equiparação (bystander) por golpes de arma branca desferidos por terceiro com a intenção de subtrair-lhe quantia em dinheiro, por se tratar de fortuito externo com aptidão de romper o nexo de causalidade entre o dano e a conduta da transportadora. 3. Recurso especial provido. (REsp 974.138/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 22/11/2016, DJe de 09/12/2016) Direito Civil e Processual Civil. Agravo regimental no recurso especial. Responsabilidade civil do transportador. Roubo em interior do transporte público. Ocorrência de fortuito externo. Decisão mantida. 1. A responsabilidade do transportador é objetiva, nos termos do art. 750 do CC/2002, podendo ser elidida tão somente pela ocorrência de força maior ou fortuito externo, isto é, estranho à organização da atividade. 2. Consoante jurisprudência pacifi cada na Segunda Seção desta Corte, o roubo com arma de fogo ocorrido no interior do transporte público, porser fato inteiramente alheio ao serviço prestado, constitui causa excludente da responsabilidade da empresa transportadora. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1.551.484/SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe de 29/02/2016) Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 497 Responsabilidade civil. Recurso especial. Transporte interestadual de passageiros. Usuário deixado em parada obrigatória. Culpa exclusiva do consumidor. 1. A responsabilidade decorrente do contrato de transporte é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição da República e dos arts. 14 e 22 do Código de Defesa do Consumidor, sendo atribuído ao transportador o dever reparatório quando demonstrado o nexo causal entre o defeito do serviço e o acidente de consumo, do qual somente é passível de isenção quando houver culpa exclusiva do consumidor ou uma das causas excludentes de responsabilidade genéricas (arts. 734 e 735 do Código Civil). 2. Defl ui do contrato de transporte uma obrigação de resultado que incumbe ao transportador levar o transportado incólume ao seu destino (art. 730 do CC), sendo certo que a cláusula de incolumidade se refere à garantia de que a concessionária de transporte irá empreender todos os esforços possíveis no sentido de isentar o consumidor de perigo e de dano à sua integridade física, mantendo-o em segurança durante todo o trajeto, até a chegada ao destino fi nal. 3. Ademais, ao lado do dever principal de transladar os passageiros e suas bagagens até o local de destino com cuidado, exatidão e presteza, há o transportador que observar os deveres secundários de cumprir o itinerário ajustado e o horário marcado, sob pena de responsabilização pelo atraso ou pela mudança de trajeto. 4. Assim, a mera partida do coletivo sem a presença do viajante não pode ser equiparada automaticamente à falha na prestação do serviço, decorrente da quebra da cláusula de incolumidade, devendo ser analisadas pelas instâncias ordinárias as circunstâncias fáticas que envolveram o evento, tais como, quanto tempo o coletivo permaneceu na parada; se ele partiu antes do tempo previsto ou não; qual o tempo de atraso do passageiro; e se houve por parte do motorista a chamada dos viajantes para reembarque de forma inequívoca. 5. O dever de o consumidor cooperar para a normal execução do contrato de transporte é essencial, impondo-se-lhe, entre outras responsabilidades, que também esteja atento às diretivas do motorista em relação ao tempo de parada para descanso, de modo a não prejudicar os demais passageiros (art. 738 do CC). 6. Recurso especial provido. (REsp 1.354.369/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 25/05/2015) Agravo regimental em recurso especial. Civil e Processual Civil. Preparo. Insufi ciência. Valor ínfi mo. Possibilidade de complementação. Art. 511, § 2º, do CPC. Deserção. Não ocorrência. Responsabilidade civil. Transporte de pessoas. Morte de passageiro. “Bala perdida”. Fato de terceiro. Fortuito externo. Excludente de responsabilidade. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é fi rme no sentido de que, diferentemente do que ocorre na total ausência de preparo, a mera insufi ciência não conduz necessariamente à deserção do recurso especial. Precedentes. REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 498 2. Afasta a responsabilidade objetiva da ré o fato de terceiro, equiparado a caso fortuito, que não guarda conexão com a exploração do transporte. 3. Não está dentro da margem de previsibilidade e de risco da atividade de transporte ferroviário o óbito de passageiro vitimado por disparos de arma de fogo praticados por terceiro (bala perdida). Referida situação constitui exemplo clássico de fortuito externo capaz de romper o nexo causal entre o dano e a conduta da transportadora ré. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1.049.090/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe de 19/08/2014) Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Processual Civil. Prequestionamento explícito dos dispositivos legais. Desnecessidade. Matéria impugnada examinada. Inviável a análise de questão constitucional em sede de recurso especial (CF, arts. 102, III, e 105, III). Responsabilidade civil. Danos morais. Roubo de passageiro em veículo de transporte coletivo. Força maior. Responsabilidade objetiva da empresa transportadora. Inexistência. Precedentes do STJ. Agravo regimental desprovido. 1 - Embargos de declaração recebidos como agravo regimental em face do nítido caráter infringente das razões recursais. Aplicação dos princípios da fungibilidade recursal e da economia processual. 2 - No que toca à alegação de falta de prequestionamento explícito dos dispositivos legais tidos por violados, não assiste razão à agravante. Isso, porque, nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte, “é desnecessária a manifestação explícita da Corte de origem acerca das normas que envolvem a matéria debatida, uma vez que, para a satisfação do prequestionamento, basta a implícita discussão da matéria impugnada no apelo excepcional” (AgRg no REsp 760.404/RS, Relator o Ministro Felix Fischer, DJ de 6/2/2006). 3 - Quanto à imprescindibilidade do revolvimento de material fático-probatório como óbice à admissibilidade do recurso, a irresignação também não merece amparo, haja vista que a questão fática se encontra expressamente delineada no aresto recorrido. 4 - A suposta contrariedade ao art. 37, § 6º, da CF/88, e às Súmulas 187 e 161 do Supremo Tribunal Federal consiste em matéria a ser apreciada na suprema instância, pois não é viável a análise de matéria constitucional nesta via recursal, haja vista que tal providência implicaria usurpação da competência atribuída ao eg. Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102). Precedentes. 5 - “Assalto ocorrido no interior de veículo coletivo constitui causa excludente de responsabilidade da empresa transportadora, por confi gurar fato estranho ao contrato de transporte. Precedentes.” (AgRg no Ag 1.336.152/SP, Relator o Ministro João Otávio de Noronha, DJe de 20/6/2011) Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 499 6 - Agravo regimental a que se nega provimento. (EDcl no REsp 1.351.784/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 19/02/2013, DJe de 20/03/2013) Civil e Processual Civil. Responsabilidade civil. Transporte de pessoas. Caso fortuito. Culpa de terceiro. Limites. Aplicação do direito à espécie. Necessidade de reexame de prova. Impossibilidade. 1. A cláusula de incolumidade é ínsita ao contrato de transporte, implicando obrigação de resultado do transportador, consistente em levar o passageiro com conforto e segurança ao seu destino, excepcionando-se esse dever apenas nos casos em que fi car confi gurada alguma causa excludente da responsabilidade civil, notadamente o caso fortuito, a força maior ou a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. 2. O fato de um terceiro ser o causador do dano, por si só, não confi gura motivo sufi ciente para elidir a responsabilidade do transportador, sendo imprescindível aferir se a conduta danosa pode ser considerada independente (equiparando-se a caso fortuito externo) ou se é conexa à própria atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração. 3. A culpa de terceiro somente romperá o nexo causal entre o dano e a conduta do transportador quando o modo de agir daquele puder ser equiparado a caso fortuito, isto é, quando for imprevisível e autônomo, sem origem ou relação com o comportamento da própria empresa. 4. Na hipótese em que o comportamento do preposto da transportadora é determinante para o acidente, havendo clara participação sua na cadeia de acontecimentos que leva à morte da vítima - disparos de arma de fogo efetuados logo após os passageiros apartarembriga entre o cobrador e o atirador -, o evento não pode ser equiparado a caso fortuito. 5. Quando a aplicação do direito à espécie reclamar o exame do acervo probatório dos autos, convirá o retorno dos autos à Corte de origem para a ultimação do procedimento de subsunção do fato à norma. Precedentes. 6. Recurso especial provido. (REsp 1.136.885/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 28/02/2012, DJe de 07/03/2012) Agravo regimental. Agravo de instrumento. Responsabilidade civil. Transporte coletivo. Assalto. Caso fortuito. Súmula 83/STJ. Decisão agravada mantida. Improvimento. I. O entendimento desta Corte é fi rme no sentido de que, em caso de transporte coletivo de passageiros, “o transportador só responde pelos danos resultantes de fatos conexos com o serviço que presta” (REsp 468.900/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ 31.3.2003) e que havendo “assalto com arma de fogo no interior do ônibus, presente REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 500 o fortuito, os precedentes da Corte afastam a responsabilidade do transportador” (REsp 286.110/RJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 1.10.2001). Aplicável, portanto, à espécie, o óbice da Súmula 83 desta Corte. II. O Agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão alvitrada, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. III. Agravo Regimental improvido. (AgRg no Ag 1.348.966/RJ, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 14/12/2010, DJe de 03/02/2011) Agravo regimental. Recurso especial. Responsabilidade civil. Assalto a ônibus coletivo. Morte do cobrador. Fato estranho à atividade de transporte. Excludente de responsabilidade. Precedentes da Segunda Seção. Recurso provido. 1. A jurisprudência consolidada no âmbito da Segunda Seção do STJ considera assalto em interior de ônibus causa excludente da responsabilidade de empresa transportadora por tratar-se de fato de terceiro inteiramente estranho à atividade de transporte - fortuito externo. 2. Agravo regimental provido. (AgRg no REsp 620.259/MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, DJe de 26/10/2009) Civil. Ação indenizatória. Transporte de passageiros. Força maior. Fato de terceiros. Isenção de responsabilidade. I. Constitui motivo de força maior, a isentar de responsabilidade a empresa de transporte de passageiros, o fato de terceiro que arremessa pedra no ônibus e fere passageiro. II. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 247.349/MG, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, julgado em 05/02/2009, DJe de 26/02/2009) Agravo regimental no recurso especial. Responsabilidade civil. Assalto no interior de ônibus. Caso fortuito ou força maior. Excludente de responsabilidade. Agravo improvido. 1. O fato de terceiro, que não exime de responsabilidade a empresa transportadora, é aquele que guarda uma relação de conexidade com o transporte. 2. Segundo pacífi co entendimento fi rmado nesta Segunda Seção, a ocorrência de assalto no interior de composição ferroviária mostra-se fato inteiramente alheio à relação de transporte propriamente dita, excluindo a responsabilidade da empresa concessionária de transporte público. 3. Agravo improvido. (AgRg no REsp 960.578/SP, Rel. Ministro Hélio Quaglia Barbosa, Quarta Turma, DJ de 08/10/2007, p. 315) Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 501 Sucede que o salutar e uniformizador entendimento acima fartamente exemplifi cado, consagrado ao longo de anos, vem sendo abalado por recentes julgados proferidos pela eg. Terceira Turma, justamente no tema de assédio sexual no interior de trens, ônibus e estações de serviços públicos de transporte de pessoas, como é o caso destes autos. Com isso, passou a haver um nítido descompasso entre os entendimentos das duas Turmas da Segunda Seção, quanto à caracterização de fortuito interno e externo, para efeito de defi nição da ocorrência de responsabilidade civil objetiva do transportador de pessoas. Confi ram-se: I. Os arestos da Quarta Turma: Agravo interno. Recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Assédio sexual no metrô. Ato ilícito praticado por terceiro alheio à atividade de transporte. Ausência de responsabilidade da transportadora. 1. O ato ilícito praticado por terceiro, alheio e estranho à atividade de transporte, rompe o nexo de causalidade e exclui o dever da concessionária de indenizar. Precedente. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1.738.398/SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 11/02/2020, DJe 18/02/2020) Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Prática de ato libidinoso contra passageira no interior de uma composição de trem do Metrô Paulista. Ausência de responsabilidade da transportadora. Fato exclusivo de terceiro e estranho ao contrato de transporte. Agravo interno não provido. 1. Nos termos da jurisprudência firmada nesta Corte Superior, a responsabilidade do transportador em relação aos passageiros é objetiva, somente podendo ser elidida por fortuito externo, força maior, fato exclusivo da vítima ou por fato doloso e exclusivo de terceiro - quando este não guardar conexidade com a atividade de transporte. 2. Na hipótese, afasta-se a responsabilidade da concessionária por prática de ato libidinoso, cometido por terceiro contra usuária do serviço de transporte, ocorrido no interior do metrô. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1.333.394/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 21/11/2019, DJe 18/12/2019) Agravo interno nos embargos de declaração no recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Prática de ato libidinoso contra passageira REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 502 no interior de uma composição de trem do Metrô Paulista. Ausência de responsabilidade da transportadora. Fato exclusivo de terceiro e estranho ao contrato de transporte. Agravo interno provido para dar provimento ao recurso especial. 1. Nos termos da jurisprudência firmada nesta Corte Superior, a responsabilidade do transportador em relação aos passageiros é objetiva, somente podendo ser elidida por fortuito externo, força maior, fato exclusivo da vítima ou por fato doloso e exclusivo de terceiro - quando este não guardar conexidade com a atividade de transporte. 2. Na hipótese, afasta-se a responsabilidade da concessionária por prática de ato libidinoso, cometido por terceiro - preso em flagrante por agentes de segurança da transportadora -, contra usuária do serviço de transporte, ocorrido no interior do metrô. 3. Agravo interno provido para dar provimento ao recurso especial. (AgInt nos EDcl no REsp 1.738.470/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 11/06/2019, DJe 27/06/2019) Recurso especial. Direito Civil. Ação de indenização por danos morais. Ato libidinoso praticado contra passageira no interior de uma composição de trem do Metrô Paulista. Ausência de responsabilidade da transportadora. Fato exclusivo de terceiro e estranho ao contrato de transporte. Precedentes do STJ. Inconformismo da autora. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, não há responsabilidade da empresa de transporte coletivo em caso de ilícito alheio e estranho à atividade de transporte, pois o evento é considerado caso fortuito ou força maior, excluindo-se, portanto, a responsabilidade da empresa transportadora. Precedentes do STJ. 2. Não pode haver diferenciação quanto ao tratamento da questão apenas à luz da natureza dos delitos. 3. Na hipótese, sequer é possível imputar à transportadora eventual negligência pois, como restou consignado pela instância ordinária, o autor do ilícito foi identifi cado e detido pela equipe de segurança da concessionária de transporte coletivo, tendo sido, inclusive, conduzido à Delegacia de Polícia, estandoapto, portanto, a responder pelos seus atos penal e civilmente. 4. Recurso especial desprovido. (REsp 1.748.295/SP, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 13/12/2018, DJe 13/02/2019) II. Os acórdãos da Terceira Turma: Agravo interno no recurso especial. Direito Civil e Processual Civil (CPC/2015). Ação de indenização. Dano moral. Transporte coletivo. Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 503 Assédio sexual. Incolumidade do passageiro. Falha na prestação do serviço. Responsabilidade objetiva. Inexistência de quebra de nexo causal. Fortuito interno. Jurisprudência desta Terceira Turma. Termo inicial dos juros de mora. Ausência de impugnação sufi ciente. Parcial conhecimento do agravo. 1. Reconhecimento da responsabilidade do transportador quando a conduta praticada por terceiro constituta fortuito interno, guardando relação com a atividade econômica e os riscos inerentes à sua exploração. 2. A orientação presente no rotineiramente citado REsp 903.258/RS acerca do termo inicial dos juros de mora em sede de indenização por danos morais não fora endossada pela Colenda 2ª Seção. Ausência de devida impugnação dos fundamentos da decisão agravada. 3. Agravo interno em parte conhecido e desprovido. (AgInt no REsp 1.738.113/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020) Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de indenização. Assédio sexual em transporte coletivo. Conexidade com o serviço prestado. Responsabilidade objetiva do transportador. Juros de mora a partir da citação. 1. O fato de terceiro, conforme se apresente, pode ou não romper o nexo de causalidade. Exclui-se a responsabilidade do transportador quando a conduta praticada por terceiro, sendo causa única do evento danoso, não guarda relação com a organização do negócio e os riscos da atividade de transporte, equiparando-se a fortuito externo. De outro turno, a culpa de terceiro não é apta a romper o nexo causal quando se mostra conexa à atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração, caracterizando fortuito interno. (REsp 1.747.637/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/06/2019, DJe 01/07/2019) 2. Tratando-se de responsabilidade contratual, os juros de mora incidem a partir da citação. Precedentes. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1.349.061/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 14/10/2019, DJe 18/10/2019) Direito Civil. Recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Ato libidinoso praticado contra passageira no interior de uma composição de metrô na Cidade de São Paulo/SP (“assédio sexual”). Responsabilidade da transportadora. Nexo causal. Rompimento. Fato exclusivo de terceiro. Conexidade com a atividade de transporte. Responsabilidade da CPTM. 1. Ação ajuizada em 02/07/2014. Recurso especial interposto em 28/10/2015 e distribuído ao Gabinete em 31/03/2017. REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 504 2. O propósito recursal consiste em defi nir se a concessionária do metrô da cidade de São Paulo/SP deve responder pelos danos morais sofridos por passageira que foi vítima de ato libidinoso ou assédio sexual praticado por outro usuário, no interior de um vagão. 3. A cláusula de incolumidade é ínsita ao contrato de transporte, implicando obrigação de resultado do transportador, consistente em levar o passageiro com conforto e segurança ao seu destino, salvo se demonstrada causa de exclusão do nexo de causalidade, notadamente o caso fortuito, a força maior ou a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. 4. O fato de terceiro, conforme se apresente, pode ou não romper o nexo de causalidade. Exclui-se a responsabilidade do transportador quando a conduta praticada por terceiro, sendo causa única do evento danoso, não guarda relação com a organização do negócio e os riscos da atividade de transporte, equiparando-se a fortuito externo. De outro turno, a culpa de terceiro não é apta a romper o nexo causal quando se mostra conexa à atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração, caracterizando fortuito interno. 5. Na hipótese, conforme consta no acórdão recorrido, a recorrente foi vítima de ato libidinoso praticado por outro passageiro do trem durante a viagem, isto é, um conjunto de atos referidos como assédio sexual. 6. É evidente que ser exposta a assédio sexual viola a cláusula de incolumidade física e psíquica daquele que é passageiro de um serviço de transporte de pessoas. 7. Na hipótese em julgamento, a ocorrência do assédio sexual guarda conexidade com os serviços prestados pela recorrida CPTM e, por se tratar de fortuito interno, a transportadora de passageiros permanece objetivamente responsável pelos danos causados à recorrente. Precedente. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1.747.637/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/06/2019, DJe 01/07/2019) Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação indenizatória. 1. Transporte público. Passageiro vítima de ato libidinoso. Responsabilidade objetiva. Culpa de terceiro conexa com o risco da atividade econômica desenvolvida pela demandada. Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno desprovido. 1. A decisão proferida pelo Tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência fi rmada por esta Corte, segundo a qual o ato culposo de terceiro, conexo com a atividade do transportador e relacionado com os riscos próprios do negócio, caracteriza o fortuito interno, inapto a excluir a responsabilidade do transportador. Incidência, no ponto, da Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno desprovido. Jurisprudência da SEGUNDA SEÇÃO RSTJ, a. 33, (261): 473-611, Janeiro/Março 2021 505 (AgInt no AREsp 1.321.781/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 12/11/2018, DJe 16/11/2018) Na hipótese, o v. acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência da Quarta Turma, fi rmada no sentido de afastar a responsabilidade objetiva do transportador pela prática de ato libidinoso ou de assédio sexual por terceiro, pessoa estranha aos serviços, contra passageira, seja no interior de veículo, seja em estação de passageiros, por confi gurar furtuito externo, sem conexidade alguma com a atividade de transporte. A eg. Quarta Turma, por ocasião do julgamento do invocado REsp 1.748.295/SP, excluiu a responsabilidade da concessionária na específica hipótese de prática de ato libidinoso contra usuária do serviço de transporte, ocorrido no interior do metrô e cometido por terceiro, uma vez que “a prática de crime (ato ilícito) – seja ele roubo, furto, lesão corporal, por terceiro em veículo de transporte público, afasta a hipótese de indenização pela concessionária, por confi gurar fato de terceiro. Não pode haver diferenciação quanto ao tratamento da questão apenas à luz da natureza dos delitos. Todos são graves, de forma que o STJ dever manter ou afastar a excludente de responsabilidade contratual por delito praticado por terceiro em todos os casos, independentemente do alcance midiático do caso ou do peso da opinião pública, pois não lhe cabe criar exceções” (grifou-se). No caso, diz a sentença sobre o ocorrido: “que no dia 18 de dezembro de 2016, por volta das 19h00, estava (a promovente) subindo a rampa da estação Guaianases da CPTM, quando foi surpreendida por três indivíduos andando em sua direção, tendo um deles apertado seus seios”; tendo a vítima seguido “o indivíduo até encontrar um agente da CPTM, que deteve o molestador e encaminhou todos para a realização da lavratura do boletim de ocorrência”, alega a autora “ter sofrido forte abalo psicológico em razão do ocorrido”, requerendo, então, “a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais em valor não inferior a R$20.000,00, carreando-lhe os ônus da sucumbência.” Como se
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