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Comércio Internacional 2ºAula Questões de poder nas Relações Internacionais Objetivos de aprendizagem Ao término desta aula, vocês serão capazes de: • verificar as questões de poder nas Relações Internacionais. Figura 2 Disponível em: https://www.forte.jor.br/wp-content/uploads/2018/07/world-politics.jpg. Acesso em: ago. 2020. Olá, Alunos e Alunas! Poder é um objeto central nas Relações Internacionais. A compreensão sobre a natureza do poder e suas implicações para os atores que se relacionam no SI é objeto de apreciação de muitas abordagens teóricas da área. Nesta aula, vamos conversar um pouco sobre o poder nas Relações Internacionais. Desse modo, vamos responder aos seguintes questionamentos: o que é poder? Quais os tipos de poder? Qual a relevância do poder no SI? Quais as transformações no conceito de poder? Etc. A partir desses questionamentos, espero que vocês consigam compreender como as relações internacionais e, por conseguinte, o comércio internacional está inserido em lógicas muito específicas de poder e como, a depender da posição de diferentes atores, o poder interfere nas relações econômicas internacionais. Espero que a aula seja proveitosa! Bons estudos! 11 1 – O conceito de Poder 2 – O poder nas Relações Internacionais 1 - O conceito de poder O poder é um objeto de ampla apreciação nos estudos das Ciências Sociais, porque ele está entremeado em todos os níveis das relações sociais que se processam em nosso cotidiano. Compreender a natureza, a tipologia e as formas pelas quais o poder se manifesta é tarefa fundamental para o cientista social e, por conseguinte, para o profissional de Relações Internacionais. Quando falamos em poder, devemos ter em mente que esse termo, ligado estritamente às relações sociais, indica a capacidade de ação e da produção de efeitos sobre outrem. Em outras palavras, o poder é capacidade do indivíduo de moldar o comportamento de outro, isto é, refere-se à condição de submeter outrem à sua vontade (BOBBIO, 1998). O poder está, portanto, inserido em todos os tipos de sociedades. Mas, diante disso, vocês podem estar se perguntando: como podemos ver as dinâmicas do poder na sociedade? Isso requer que, primeiro, conversemos um pouco sobre a noção de sociedade. 1.1 - Sociedades Por conceito, Sociedade constitui-se como uma forma de coordenação das atividades humanas. Essa coordenação das atividades humanas visa um objetivo e é regulada por um arcabouço normativo, isto é, um conjunto de normas regulatórias das relações (DALLARI, 1998). Nesse sentido, a pergunta que se coloca é se a sociedade é fruto da vontade humana, ou uma condição natural e, portanto, sobreposta às aspirações dos indivíduos. A esta problemática, alguns autores respondem que a sociedade constitui-se como algo além da vontade humana, sendo, pois, algo natural. Os pensadores que defendem essa ideia são chamados de naturalistas. Por outro lado, há pensadores que teorizaram que a vida em sociedade é fruto da vontade humana, e, por isso, produto da razão humana. Esses pensadores são conhecidos como contratualistas. Enquanto estrutura de coordenação das atividades humanas, as sociedades se fundamentam em três elementos básicos. Vejamos: 1. Os elementos Naturais: esses elementos são constituídos pelos indivíduos e pela base física, isto é, o lugar em que a sociedade se organiza. 2. Os elementos formais: Neste caso, estes elementos são constituídos por normas ou leis jurídicas, pela administração (governo) e pelo poder, o qual se manifesta nas hierarquias dentro de determinada sociedade. 3. Os elementos Finais: estes referem-se aos Seções de estudo objetivos de uma sociedade, isto é, os motivos de sua existência. Nesse sentido, as sociedades têm como fins o bem comum, o progresso e a cultura. Sem um destes elementos, a sociedade perderia suas características. Portanto, se algum destes elementos fosse retirado, a sociedade não se constituiria como tal. Assim, caso se retirassem, por exemplo, os elementos naturais, a sociedade não teria indivíduos, logo, obviamente, não haveria sociedade. Ainda, ao se se retirassem o espaço físico, onde a sociedade iria se fixar? Não haveria, desse modo, sociedade. Caso se retirassem os elementos formais, a sociedade se desregraria, de modo que, sem organização de base jurídica regulatória, a sociedade não seria capaz de se coordenar. Por fim, caso faltassem os elementos finais, não haveria sentido para existência da sociedade. À vista disso, vocês possivelmente estão se questionando: Mas por que os indivíduos buscam uma organização que coordene suas atividades, isto é, por que vivem em sociedade? A resposta para essa pergunta está nos objetivos que compõem as sociedades. Vejamos: 1. A sociedade nasce da necessidade do homem em se proteger, ou seja, a formação da sociedade visa proteger os indivíduos; 2. Garantir seus direitos e bens, ou seja, visa conceder o que é de direito dos indivíduos, como a propriedade privada, por exemplo; 3. Visa a garantia da liberdade e da obediência. Em síntese, a sociedade se pauta em objetivos que são, assim como os elementos, base fundamental para o desenvolvimento e manutenção de tal sociedade. Por fim, podemos pontuar que, desde os primórdios das relações humanas, a sociedade esteve presente, ainda que não nos moldes como a concebemos atualmente. Ocorre que as organizações sociais passaram por evoluções. Nesse sentido, podemos dizer que as sociedades evoluem, dado que partem de organizações menos complexas para formas de organização mais complexas. Vejamos a seguir essa característica da evolução das sociedades: 1. Sociedade familiar: tal sociedade independe da vontade humana. Tem por finalidade reproduzir a espécie. Tem por ordem um fim afetivo, assistencial e educativo. Detém a célula mater, ou seja, um fundamento primordial. 2. Sociedades religiosas: São sociedades que sempre estiveram presentes na vida do homem. Esse tipo de sociedade põe o homem em busca do seu aprofundamento e aperfeiçoamento espiritual. 3. Sociedades contingentes: são sociedades não permanentes, dado que podem deixar de existir a qualquer momento. Nascem de um ato voluntário do homem, ou seja, é produto da vontade humana. Exemplos: sociedades esportivas, filantrópicas e econômicas. 4. Sociedades políticas: por conceito, sociedade política é aquela que tem por objetivo a realização 12Comércio Internacional dos fins daquelas organizações mais amplas que o homem teve necessidade de criar para enfrentar o desafio da natureza e de outras sociedades rivais. São todas aquelas que, “visando criar condições para a consecução dos fins particulares de seus membros, ocupam-se da totalidade das ações humanas coordenando-as.” (DALLARI, 1998, n.p) Para que essas estruturas que constituem as sociedades funcionem, faz-se necessário a presença de um elemento que é indispensável para a vida em sociedade: o poder. 1.2 – Retomando o conceito de poder Como dissemos anteriormente, o poder é fruto de todas as formas de organização. Caracteriza-se por ser um fenômeno social e bilateral, ou seja, decorre da união de duas vontades em que uma prevalece sobre a outra. Para caracterizarmos a inerência do poder em todas as formas de organização, vamos pensar na família: um pai e uma mãe têm poder sobre seus filhos, isto é, a partir de suas vontades, eles são capazes de moldar o comportamento dos filhos. Em vista disso, podemos dizer que o poder é indispensável para a sociedade na medida em que, no seio de uma organização social, se estabelecem conflitos entre vontades de indivíduos diferentes, de maneira que se faz necessário que uma vontade superior intervenha, a fim de preservar a ordem da própria sociedade e a sua finalidade social, a manutenção do bem comum. Nesses termos, a noção de poder que aqui estamos estabelecendo refere-se ao Poder Social, isto é, um poder que se estabelece nas relações sociais e, por assimser, é exercido em uma relação na qual o grupo que exerce o poder depende da recepção e da indução de comportamento dos demais grupos. Em outras palavras, só existe poder se os grupos que exercem poder encontram obediência nos demais grupos. Nesse sentido, Bobbio (1998, p. 934) esclarece que “[...] não existe Poder, se não existe, ao lado do indivíduo ou grupo que o exerce, outro indivíduo ou grupo que é induzido a comportar-se tal como aquele deseja.” Em face desta perspectiva relativa de poder, na qual para que o exercício do poder seja concretizado, depende-se da aceitação dos demais grupos – o chamado poder social -, coloca-se outra perspectiva de poder, a qual entende que tal poder depende da posse de instrumentos para se atingir determinado fim. Nesses termos, o poder é exercido através de instrumentos que garantem ao detentor do poder atingir seus objetivos. O dinheiro é um bom exemplo dessa perspectiva de poder: aquele que possui dinheiro (instrumento) pode induzir outros a adotarem o comportamento que se deseja. Essa noção de poder está presente em Hobbes, por exemplo, para quem o poder é um meio para atingir uma vantagem. Ocorre que essa ideia de poder ligada a um instrumento esbarra em um problema específico: e se os outros indivíduos ou grupos não estiverem dispostos a acatar a tais instrumentos? Diante dessa questão, podemos dizer que essa noção instrumental de poder perde em potencial de análise. Ainda assim, essa perspectiva será bastante revisitada nos nossos estudos em teoria das Relações Internacionais. É importante destacar que a concepção de poder sofreu evoluções. Nas sociedades primitivas, o poder era exercido de forma física, ou seja, quem possuía condições de submeter outrem fisicamente era detentor do poder. Essa noção de poder, ligada a condições físicas, não foi uma exclusividade de sociedades primitivas, a sociedade moderna pautou suas relações sociais pelo poderio físico, vide a primazia do poder bélico ao longo das Guerras Mundiais e da Guerra Fria. Posteriormente, a capacidade econômica passou a ser um imperativo para o poder. Se pensarmos por essa ótica, muitos países que não possuem força física robusta, mas se destacam em setores economicamente relevantes, conseguem exercer poder sobre outrem, por exemplo. Outra dimensão do poder que se apresenta constantemente na história da humanidade é o poder por questões espirituais, ou seja, concessão de poder a um indivíduo ou instituição que se mostra mais íntimo dos meios de fé. É o exemplo das igrejas, de líderes espirituais etc. Por fim, podemos citar o poder por meio da legitimidade vigente. Neste caso, há um consentimento da sociedade em transferir o poder a um indivíduo ou a um governo específico. É o caso da organização do Estado Moderno Liberal, no qual o poder é concedido e legitimado pela vontade popular. Essas diferentes dimensões do poder também foram objeto de estudo de Max Weber, que esquematizou os Tipos de Dominação. O primeiro é o racional, em que a pessoa aceita que as que comandam seguem leis e, por isso, tem legitimidade para comandar. O segundo é de base tradicional, ou seja, quando os grupos dominados creem nas “sacralidades” da situação vigente, de modo que quem domina possui legitimidade enquanto detentor da tradicionalidade. O terceiro é de base carismática, ou seja, quando se venera uma pessoa por ela ser admirável em vários aspectos de sua vida, logo os indivíduos obedecem suas ordens, pois acreditam na legitimidade do que é falado por quem domina. Essa dominação de base carismática tem um caráter afetuoso e não racional. 2 - O poder nas Relações Internacionais Quando pensamos o poder nas Relações Internacionais, devemos levar em conta que os Estados possuem recursos de poder. Esses recursos de poder, entretanto, possuem duas dimensões: a posse de fato de recursos de poder e a conversão de potencialidades em recursos de poder. Isso quer dizer que um Estado possui poder potencial, que ainda está em sua forma bruta, e o poder real que é o poder potencial convertido para um poder de fato. Por exemplo, “[...] um Estado pode ser detentor das maiores reservas petrolíferas do mundo, mas se não possuir capacidade tecnológica para explorar este recurso, o seu potencial energético não se concretizará em recursos à disposição de sua população.” (PECEQUILO, 2012, p. 21). Para deixarmos essa noção ainda mais clara, vamos pensar no caso do Brasil: nosso país possui uma imensidão de recursos brutos à disposição, não é mesmo? Por aqui, temos recursos naturais que permitiriam que o Brasil fosse uma 13 potência mundial, todavia esse recurso de poder bruto não é transformado em poder de fato. Em vista destas características dos recursos de poder, temos nas relações internacionais outra distinção acerca do poder, que se refere à tipologia dos recursos, isto é, se os recursos de poder são marcadamente físicos, ou se são recursos de caráter não físico. Essa distinção entre recursos físicos e não físico é definida pelos termos Hard Power e Soft Power, respectivamente (PECEQUILO, 2004). O Hard Power faz menção ao poder “duro”, ou seja, esse poder é composto por recursos como dimensões territoriais, posição geográfica, clima, demografia, capacidade industrial, matérias-primas e força militar. Isto é, o poder duro (o Hard Power) refere-se ao que Waltz (1979) chamou de capacidades materiais. Sobre capacidades materiais, podemos pontuar que em teoria de Relações Internacionais, uma abordagem Realista entende que os Estados possuem capacidades materiais diferentes que se definem enquanto competência, coesão ou consistência política; tamanho da população; do território e força militar. Desse modo, alguns Estados apresentam mais poder que outros, sendo esse poder/recurso de poder a capacidade de manter a sobrevivência. Nesse sentido, alguns Estados têm mais condições de manter a sobrevivência do que outros, porque têm uma população maior, um território maior, uma posição geográfica melhor, força militar maior, competência e coesão política. Portanto, o que diferencia os Estados não é sua função no sistema, mas sim suas capacidades materiais, as quais aumentam as condições de sobrevivência (WALTZ, 1979). No que se refere ao Soft Power, o chamado poder brando, podemos dizer que esse tipo de poder faz menção a condição de cooptação de outros, ou seja, é a capacidade de influência sobre outros atores internacionais a partir de fontes não físicas de poder. Trata-se, portanto, de recursos econômicos, de influência ideológica, de tecnologias de ponta e de influência cultural, os quais dotam um Estado de capacidades de adaptação, flexibilidade e, principalmente, de convencimento sobre outros Estados ou demais atores. A partir deste poder brando, um Estado pode ter sua influência sobre outros Estados ampliada (PECEQUILO, 2004). A posse desses diferentes recursos de poder insere os Estados em algumas categorias específicas. Nesse sentido, Estados que possuem tanto recursos de Hard Power quanto de Soft Power são identificados como Superpotências. As superpotências exercem e projetam seu poder em muitas dimensões no cenário internacional, ou seja, essas superpotências são capazes de exercer o poder que possuem e de influenciar as dinâmicas dos demais atores no Sistema Internacional, mantendo seu status de Hegemonia. Tratando acerca das superpotências, Pecequilo (2012, p. 21) pontua que “o grau de autonomia é elevado, mesmo que estas nações eventualmente possuam vulnerabilidades específicas (como os EUA e o petróleo). Os recursos brando e duro são utilizados de forma alternada, ou simultânea, para a realização de seus interesses nas relações estatais e não estatais”. O conceito de Hegemonia Hegemonia significa em sentido estritamente etimológico liderança, derivada diretamente do termo grego hēgemonia (liderança), que por sua vez, vem do verbo hēgeisthai (liderar). O termo ganhou outra concepçãoa partir das formulações do teórico italiano Antonio Gramsci (1891 – 1937) ao utilizá-lo como forma de explicação de um determinado tipo de exploração. A noção de hegemonia, segundo Gramsci, é a maneira como o poder é exercido não só através de um conjunto de instituições políticas, mas através também da cultura. O conceito proposto pelo autor dialoga diretamente com a teoria marxista, pois, de acordo com Karl Marx, a base econômica seria controlada pela classe econômica que dominaria a classe trabalhadora através da criação da superestrutura com instituições e relações sociais. Gramsci propõe que a dominação de classe ocorre também culturalmente, pois a classe trabalhadora está sujeita às ilusões ideológicas perpetradas pela classe dominante. [...] A hegemonia é uma dominação consentida, baseando-se em um mecanismo invisível no qual posições de influência na sociedade são sempre ocupadas por membros de uma classe já dominante, e tem como resultado final a penetração das ideias da classe dominante por toda a sociedade. Através da exposição constante desse arsenal de concepções disseminadas pela elite, as ideias hegemônicas moldam o pensamento de todas as classes. Fonte: disponível em: https://www.infoescola.com/sociologia/hegemonia/. Acesso em: ago. 2020. Além das superpotências, também podemos identificar as chamadas potências regionais, que são os Estados com capacidade de ação e influência em nível regional, dado que possuem menor disponibilidade de recursos do que os Estados de projeção global. Essas potências regionais caracterizam-se por ter peso relevante no cenário regional que ocupam, podendo atuar para o equilíbrio ou desequilíbrio de poder em uma determinada região. Nesses termos, podemos dizer que essas nações possuem quantidade relevante de Hard e Soft Power, porém apresentam déficits de capacitação em determinadas áreas, o que as impede de terem uma maior projeção de influência (PECEQUILO, 2012). Também podemos citar as Pequenas e Médias Potências, ou Estados emergentes. Essas nações possuem características bastante peculiares e, até mesmo, paradoxais, porque muitas delas possuem grandes recursos de poder duro, mas não conseguem desenvolver capacitação de poder brando. Em outras palavras, esses Estados têm recursos interessantes como matéria-prima, demografia e extensão geográfica, todavia não são capazes de transformar esses recursos brutos em poder de fato. É o caso do Brasil, como já discutimos anteriormente. Por fim, há também os países de papel restrito. Esses países possuem baixa projeção global e que se posicionam marginalmente no Sistema Internacional, condicionando suas políticas externas de maneira associativa às grandes potências ou às potências regionais. Essas nações podem se caracterizar por serem, por um lado, países menores, porém estabilizados (caso de Paraguai e Chile, por exemplo); ou países menos desenvolvidos com ampla vulnerabilidade (caso de Haiti, Síria, Costa do Marfim etc.) 14Comércio Internacional Retomando a aula Nesta aula, estudamos aspectos centrais do conceito de poder. Nesse sentido, observamos como o poder se estrutura em diferentes tipos de sociedade e como ele tem dimensões distintas a depender das condições materiais dos atores. 1 – O conceito de Poder Aqui, estudamos o conceito de poder, passando por sua conceituação a partir do entendimento dos diferentes tipos de sociedade. 2 – O poder nas Relações Internacionais Nesta seção, estudamos o poder aplicado às relações internacionais. Nesse sentido, pudemos perceber como o conceito de poder pode influenciar diferentes dimensões das relações além-fronteira. Vale a pena PECEQUILO, C.S. Introdução às Relações Internacionais: temas, atores e visões. Petrópolis: Vozes, 2004. Vale a pena ler Minhas anotações
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