Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Criminologia | Criminologia e as Ciências Criminais www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA CRIMINOLOGIA CONTEÚDO Aspectos Penais e Políticas do Estado Criminologia | Criminologia e as Ciências Criminais www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Atualizações e erratas: este material é disponibilizado na forma como se apresenta na data de publicação. Atualizações são definidas a critério exclusivo da Faculdade Focus, sob análise da direção pedagógica e de revisão técnica, sendo as erratas disponibilizadas na área do aluno do site www.cenes.com.br. É missão desta instituição oferecer ao acadêmico uma obra sem a incidência de erros técnicos ou disparidades de conteúdo. Caso ocorra alguma incorreção, solicitamos que, atenciosamente, colabore enviando críticas e sugestões, por meio do setor de atendimento através do e-mail secretaria@cenes.com.br. © 2021, by Faculdade Focus Rua Maranhão, 924 - Ed. Coliseo - Centro Cascavel - PR, 85801-050 Tel: (45) 3040-1010 www.faculdadefocus.com.br Este documento possui recursos de interatividade através da navegação por marcadores. Acesse a barra de marcadores do seu leitor de PDF e navegue de maneira RÁPIDA e DESCOMPLICADA pelo conteúdo. http://www.cenes.com.br/ secretaria@cenes.com.br. http://www.faculdadefocus.com.br/ Criminologia | Criminologia e as Ciências Criminais www.cenes.com.br | 3 Sumário Sumário ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 3 1 Criminologia e as Ciências Criminais ----------------------------------------------------------------- 4 2 Mecanismos institucionais de criminalização: lei penal, justiça criminal e prisão ------ 5 3 Criminologia e o papel da polícia judiciária -------------------------------------------------------- 6 4 Criminologia e política criminal ---------------------------------------------------------------------- 10 5 Políticas de segurança pública no Estado Democrático de Direito ------------------------- 13 5.1 Estado Democrático de Direito e a criminologia prevencionista ----------------------------------------- 14 5.1.1 Princípios básicos da criminologia prevencionista ----------------------------------------------------------------------- 15 6 Mídia e Criminalidade ----------------------------------------------------------------------------------- 16 7 Referências Bibliográficas ------------------------------------------------------------------------------ 20 Criminologia | Criminologia e as Ciências Criminais www.cenes.com.br | 4 1 Criminologia e as Ciências Criminais Inicialmente, podemos definir a criminologia como sendo uma ciência autônoma e empírica, que estrutura suas análises com base na observação e não na indução. Contudo, embora seja uma ciência empírica que utiliza os métodos experimental, naturalístico e indutivo para analisar o delinquente, também teve de buscar guarida nos métodos estatísticos, históricos, sociológicos e biológicos, pois os meios utilizados não foram suficientes para concluir os estudos criminológicos. Assim, dizemos que o estudo da criminologia se trata de uma matéria interdisciplinar, pois dialoga de forma direta com outras ciências, como, por exemplo, a psicologia, a sociologia, a estatística, o direito, a medicina legal e tantas outras. Inclusive, analisando pelo viés da criminologia moderna, o crime não pode ser examinado unicamente sob o aspecto do delinquente, pois, o real motivo vai muito além disso, por isso devem ser considerados os objetos sociológicos, por exemplo, que são capazes de coletar as informações que podem ter influenciado na prática do delito. No entanto, considerando que a criminologia possui um caráter autônomo, ela não se inclui em outras ciências, vez que não faz parte da política criminal, do direito penal, e, tampouco, do processo penal. Porém, não é incomum encontrarmos algumas noções criminológicas nessas matérias, ou seja, ela não faz parte de uma ciência em específico, mas sim de todas elas, mesmo que de forma indireta. Desta forma, é possível afirmar que um dos principais objetivos da criminologia é a prevenção do delito, de modo que o diagnóstico do crime é feito através da tipologia do criminoso, analisando, entre outros fatores, as condições do meio em que ele vive, a chamada ecologia criminal. Isto é, a criminologia busca conhecer a realidade do indivíduo para depois interpretá-la, criando soluções para prevenir o delito, visando o progresso social. Diferente do direito penal que, não dá o diagnóstico do fenômeno criminal como ocorre na criminologia, pois, considerando que se trata de uma ciência normativa e deôntica, o direito penal preocupa-se apenas com o crime enquanto fato descrito na norma, com o intuito de definir a adequação típica da conduta. Por fim, a política criminal, embora alguns autores defendam estar incorporada a Criminologia | Mecanismos institucionais de criminalização: lei penal, justiça criminal e prisão www.cenes.com.br | 5 criminologia, não pode ser confundida com esta. A política criminal é uma ciência que tem como objetivo reduzir a criminalidade, através das análises empíricas elaboradas pelos criminólogos. Neste aspecto, a criminologia oferece informações válidas sobre a origem, a dinâmica e as variáveis do crime, enquanto fenômeno individual e social possibilitando firmar parâmetros contra uma prevenção eficaz (política preventiva), bem como para delimitar as formas, técnicas e estratégicas da reação contra o fato criminoso (política criminal repressiva). Isto é, de forma sucinta a política criminal deve unir todas essas informações apresentadas pela criminologia, em prol da construção de um sistema normativo coerente, proporcionando o bom funcionamento da sociedade. 2 Mecanismos institucionais de criminalização: lei penal, justiça criminal e prisão Em determinadas situações, a criminalização pode ter como principal fato o próprio Estado, muitas vezes os mecanismos desenvolvidos justamente para controlar o crime podem se converter em sua matéria prima. De acordo com Sérgio Salomão (2020) não é de hoje que se questiona, nos estudos da criminologia, a possibilidade da justiça criminal ao invés de frear, promover a criminalidade. Um exemplo claro da ineficiência do Estado diante da crescente criminalidade é a própria legislação penal que, acaba por se tornar seletiva em seu nascedouro, ou seja, ao tipificar determinadas condutas a Lei escolhe quem receberá a pena, ainda que de forma velada, justificando a punição pelos bens juridicamente tutelados. Assim, a seletividade estigmatiza o indivíduo, trazendo à tona uma sensação de injustiça e revolta, que gera a opção de não seguir as regras formais, estabelecidas por quem detém o princípio da legalidade nas mãos. Neste sentido, Alessandro Baratta (2011) observa que existe uma tendência de manifestação punitiva em privilegiar os interesses das classes dominantes, imunizando-as do processo de criminalização, isso ocorre devido a influência de uma classe dominantesobre as outras. É o chamado processo de seletividade na criação primária das normas, quando os responsáveis pela força repressiva e punitiva do Criminologia | Criminologia e o papel da polícia judiciária www.cenes.com.br | 6 Estado não agem da mesma maneira com relação a todas as pessoas, sendo complacentes com os membros do meio social que integram e, extremamente positivistas e discriminatórios com as demais classes. Assim, além da lei penal, a justiça criminal como um todo também tem fomentado o processo de criminalização. Isto é, considerando que a lei penal engloba tanto a investigação preliminar (polícia judiciária, ministério público, CPI no congresso, entre outros), quanto o processo penal e a execução penal, o sujeito ao ser indiciado, processado criminalmente e condenado traz uma mácula social que posteriormente se transformará em preconceito, ausência de oportunidades e, até mesmo, na exclusão social do agente, contribuindo para o aumento no índice de reincidência. Neste sentido, destacam Newton e Valter Fernandes (2010, p. 305) que de um modo geral, os indivíduos reincidentes representam, ainda que de forma indireta, o fracasso da instituição com relação “aos mecanismos de controle social, em especial das unidades prisionais. É reflexo também da reincidência a insuficiência das medidas preventivas e repressivas utilizadas pelo Estado para combater a delinquência”. Inclusive, no Brasil a prisão é um dos fatores que mais estigmatiza o sujeito, pois, além de não ressocializar o indivíduo como determina a Lei de Execução Penal, ela impede na prática o retorno social do indivíduo para o plano profissional. Corroborando, Sérgio Salomão (2020, p. 323) afirma que “um grande número de criminologistas, por exemplo, notou que a prisão, uma das mais graves formas de reprovação penal, contribuía de alguma forma para a criminalização”. Isto é, embora tenha a função de reprimir um comportamento criminoso dentro do estabelecimento carcerário, punindo de forma mais severa os indivíduos, não é exatamente isso que ocorre, ao invés de se tornar mais sociável o indivíduo acaba se retraindo e age de forma individualista. 3 Criminologia e o papel da polícia judiciária Nas palavras de Aury Lopes Jr. (2020, p. 184) “a polícia judiciária está encarregada da investigação preliminar, sendo desempenhada nos estados pela Polícia Civil e, no Criminologia | Criminologia e o papel da polícia judiciária www.cenes.com.br | 7 âmbito federal, pela Polícia Federal”, ou seja, essa polícia está encarregada de realizar a investigação criminal através de processos autônomos de investigação e de instrução cartorária do inquérito policial (pré-policial). Além disso, o próprio Código de Processo Penal brasileiro, em seu art. 4º, conceitua a polícia judiciária como sendo agência de política pública, cuja atividade será exercida por autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições, tendo por fim qualquer finalidade de investigação, apuração das infrações, autoria e materialidade. Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá, por fim, a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. Assim, logo que tiver conhecimento da prática de uma infração, a autoridade policial, deverá tomar uma série de medidas. Essas medidas são diligências que visam à constatação e apuração do fato investigado, cuja formalização deve ocorrer obrigatoriamente por meio do inquérito policial, para facilitar o controle do Ministério Público e subsidiar uma possível ação penal, podendo servir para auxiliar na condenação do sujeito (art. 6º, CPP). Figura 1 – Polícia judiciária. Fonte: Núcleo Editorial Focus. O objeto da investigação preliminar e, essencialmente, do inquérito policial é averiguar a veracidade das informações relatadas na notitia criminis, toda a investigação é baseada na tentativa de esclarecer os fatos, o grau de verossimilhança Criminologia | Criminologia e o papel da polícia judiciária www.cenes.com.br | 8 e a autoria do crime, sendo, este último, dispensável no início do procedimento, dado que para iniciar a investigação basta a mera possibilidade de que exista um fato punível. Conforme destaca Aury Lopes (2020, p. 224) “o inquérito policial nasce da mera possibilidade, mas almeja a probabilidade”. Figura 2 – Persecução penal e autoria. Fonte: Núcleo Editorial Focus. Dessa forma, as informações sobre a materialidade do delito e os indícios de autoria, são obtidas, em regra, pela polícia judiciária, pois, esta atua como titular da investigação, possuindo autonomia, poder de decisão e determinando a linha de investigação, os objetos a serem apreendidos e as testemunhas a serem inquiridas. Além disso, nesse sistema não existe uma subordinação funcional e nem interferências externas, pois, assim que formalizado, o resultado das investigações deve ser submetido ao poder judiciário. Figura 3 – Investigação preliminar. Fonte: Núcleo Editorial Focus. Em outras palavras, o inquérito policial pode ser definido como uma ação inquisitorial, Criminologia | Criminologia e o papel da polícia judiciária www.cenes.com.br | 9 conduzida pela polícia judiciária, que interfere na intimidade e na liberdade das pessoas com um grau de seletividade e discricionariedade, na busca de esclarecer os fatos relatados na notitia criminis. No entanto, é válido destacar que, embora possa auxiliar na condenação do indivíduo, o inquérito policial jamais poderá ser o único elemento utilizado no convencimento do magistrado. Contudo, no âmbito da criminologia crítica a polícia judiciária se mostra de forma diferente, por meio de um enquadramento nas agências de criminalização. Neste sentido, afirmam os criminólogos Zaffaroni, Batista, Alagia e Slokar (2011) que, o sistema penal é formado por três diferentes agencias de criminalização, ao passo que a primária é exercida pelo poder legislativo, no momento em que os parlamentares sancionam as leis e tipificam determinadas condutas como criminosas, atribuindo a elas uma pena. Já a criminalização secundária é aquela realizada através da ação punitiva da polícia, exercida sobre pessoas concretas, de modo que a terciária é a estigmatização realizada pelo sistema prisional durante a execução da pena. Assim, embora a polícia judiciária seja considerada um instrumento da política de Criminalização Primária Legislador Secundária Identificação do criminoso Terciária Sistema penitenciário No Brasil, ninguém pode ser condenado apenas com base no inquérito policial, é preciso ter a ratificação das informações obtidas na persecução penal em juízo, através do depoimento dos envolvidos ou da produção de outras provas. Criminologia | Criminologia e política criminal www.cenes.com.br | 10 segurança pública do Estado, também pode ser vista como uma anomalia se analisada pela ótica da criminologia crítica, pois, a sua atração repressiva incide diretamente nas pessoas estigmatizadas. Mudar essa concepção é uma tarefa Copernicana, visto que, na criminalização secundária e terciária é necessário desconstruir paradigmas de pensamento e implementar ações dentro de uma nova concepção. É justamente nesse sentido que surge a ideia de uma prevenção da criminalidade nas esferas primária, secundária e terciária. O criminólogo Nestor Sampaio (2020, p. 136) afirma que, a prevenção no âmbito primário deve ser realizada pelo Estado, garantindo os direitos básicos a população (educação, saúde, segurança pública, qualidade de vida, entre outros). Já, na esfera secundária, a prevenção “destina-se a setores da sociedade quepodem vir a padecer do problema criminal e não ao indivíduo”. Por fim, a prevenção terciária está relacionada a população carcerária, implementando medidas voltadas a recuperação do indivíduo, evitando a reincidência. 4 Criminologia e política criminal A proposta de criminologia sempre esteve ancorada na ideia de que é possível fornecer subsídios, relatórios, estatísticas e/ou elementos para permitir que a sociedade trate a questão do crime, adotando medidas realmente capazes de reduzir a criminalidade e o seu equacionamento. Criminologia | Criminologia e política criminal www.cenes.com.br | 11 Figura 4 – Relatório criminológico. Fonte: Núcleo Editorial Focus. Nesse sentido, em 1889, Franz von Liszt, Gerardo van Hammel, Adolphe Prins e Carlos Stoos, fundaram a União Internacional de Direito Penal, que serviu como base para o movimento da política criminal. Esse movimento tinha o intuito de fornecer estratégias eficazes para a proteção da sociedade contra a criminalidade, pautado nos seguintes ideais: a) O crime deve ser enfrentado pelo Direito Penal, partindo sempre da premissa de que se trata de um fenômeno social; b) Para enfrentar o problema criminal, é necessário encontrar medidas substitutivas da pena; c) A pena tem finalidade de correção, não podendo ser puramente retributiva; d) A compreensão do autor do fato delitivo depende do entendimento do meio social de qual ele provém. Criminologia | Criminologia e política criminal www.cenes.com.br | 12 O desenvolvimento da política criminal, fez com que se atrelasse ao pensamento do jurista no Direito Penal uma nova ideia e o sistema é estruturado por outra perspectiva, não visando somente questões técnicas das estruturas jurídicas, mas também os objetivos políticos criminais existentes em cada construção. Ao passo que, manifestou-se, notadamente, após os anos 1990, um forte crescimento da confusão entre política criminal e adoção de medidas punitivas mais severas, com a redução da margem de liberdade. Assim, a problemática decorre da utilização do termo “impunidade”, que, após o término da Guerra Fria, foi empregado com o intuito de manter a dominação sobre grande maioria da população, devido ao constante estado de pânico que foram submetidos, ou seja, o medo fez com que a população renunciasse a sua liberdade em busca de um bem maior. Influenciada pelo movimento da época, os novos ideais incitados pela política criminal foram rapidamente incorporados em diferentes grupos sociais. A América Latina, por exemplo, sofria com a ideia da existência de um mal imaginário, conhecido pelo nome de impunidade e acreditava que deveria combatê-lo a todo custo, com isso, de maneira pouco refletida, passaram a ser continuamente adotadas medidas de endurecimento da Legislação Penal, com o pretexto de enfrentar esse “inimigo” abstrato, através da política criminal. Desta forma, sob a justificativa de tratar a questão criminal impulsionada pelo medo da impunidade, a política criminal propõe a adoção de algumas estratégias: ● A questão criminal faz parte da fenomenologia social; ● Ao tratar do crime, estamos protegendo a própria sociedade, logo se deve usar a política criminal para proteger a sociedade do crime; ● Como se proclama a existência da impunidade como causa do crime, para conter um crime, deve-se conter a impunidade; ● A política criminal se converte em mera habilitadora e justificadora do incremento crescente de medidas criminais. Criminologia | Políticas de segurança pública no Estado Democrático de Direito www.cenes.com.br | 13 Assim, a política criminal que era inicialmente utilizada para fornecimento de estratégias a partir da análise criminológica, se converteu numa justificativa para contínuas respostas penais mais duras. O discurso da impunidade transformou a política criminal, de uma medida preocupada com a melhoria das pessoas para uma política criminal vinculada ao punitivismo. 5 Políticas de segurança pública no Estado Democrático de Direito O Estado Democrático de Direito representa a instituição pública, constituída de forma democrática pelo sufrágio universal, tendo como principais fundamentos: a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e o pluralismo político. Ao passo que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos. No entanto, embora o Estado Democrático preze pela participação social, com relação as políticas públicas ela é realizada de forma indireta, pois, a sociedade, assim como definido no art. 1º da Constituição Federal, tem o direito de escolher e eleger seus representantes de forma democrática, os escolhidos comporão os poderes executivo e legislativo, sendo responsáveis por implementar medidas de segurança pública mais eficazes no combate à criminalidade. Assim, ainda que a visão técnico-jurídica do crime seja, até certo ponto, considerada suficiente para o trabalho de juízes, promotores, delegados de polícia, advogados criminais, defensores públicos e autoridades carcerárias, é considerada precária no âmbito da segurança pública, pois, como ela é encarregada de garantir a ordem e a tranquilidade pública evitando que os crimes ocorram, é necessário trabalhar a definição de crime em sentido amplo. O reconhecimento de que a criminalidade é um fenômeno inerente à convivência em sociedade, é crucial para que as autoridades e os operadores do sistema dimensionem Criminologia | Políticas de segurança pública no Estado Democrático de Direito www.cenes.com.br | 14 de forma adequada as possibilidades e os limites da polícia. Caso contrário, se as forças policiais assumirem uma postura negativa diante da continuidade do crime e da violência, sem considerar que são, sobretudo, fenômenos sociais, é muito provável que mantenham uma atitude condenável. Isto é, a compreensão da dinâmica que condiciona a manifestação da criminalidade, da sociedade em si e do próprio sistema penal, são fatores que permitem aos estudiosos propor mudanças racionais e menos inconsequentes no âmbito das políticas públicas. É justamente neste aspecto que se destacam estudos propostos pela criminologia crítica, pois, é uma área que procura conhecer o crime e a violência em todas as suas dimensões, apresentando ações mais efetivas no combate à criminalidade. 5.1 Estado Democrático de Direito e a criminologia prevencionista Considerando os fundamentos do Estado Democrático de Direito mencionados acima, é tarefa do Estado prezar, sobretudo, pela dignidade da pessoa humana, estando abrangidos neste preceito os direitos a liberdade e a segurança do indivíduo, criando formas de prevenção ao cometimento de infrações penais, é a partir de então que surge a criminologia prevencionista. De acordo com Natacha Alves (2020, p. 159) “a prevenção criminal representa o conjunto de medidas, públicas ou privadas, adotadas com o escopo de impedir a prática de delitos, abarcando tanto as políticas sociais para a redução da delinquência, quanto as políticas criminais com a formulação de respostas penais adequadas”. Isto é, a criminologia prevencionista pode ser definida como uma ciência humana e social que estuda o delinquente e os fatores criminógenos ou causas que contribuem para a formação do seu caráter perigoso ou antissocial. Além disso, essa ciência se dedica a análise da criminalidade como um conjunto, examinando os criminosos, as infrações penais cometidas, a região em que a conduta foi praticada, o grau de periculosidade que o indivíduo representa para a sociedade e Criminologia | Políticas de segurança pública no Estado Democrático de Direito www.cenes.com.br | 15 as oscilações de comportamento que ele apresenta diante das medidas que lhe são impostas. É através dessas análisesiniciais, com base nos resultados obtidos, que a criminologia prevencionista busca criar e implementar novas medidas de segurança pública, são as chamadas fases de pré-delinquência e pós-delinquência. A fase de pré-delinquência representa as medidas impostas através das políticas governamentais, são aquelas capazes de evitar os fatores criminógenos ou as causas do caráter criminoso do delinquente. Já, a fase chamada de pós-delinquência, são as ações implementadas com o intuito de prevenir a reincidência do sujeito, elas possuem o condão de recuperar ou socializar o delinquente, reintegrando-os a sociedade como cidadãos decentes. 5.1.1 Princípios básicos da criminologia prevencionista Assim como outras ciências, o estudo da criminologia prevencionista é pautado em alguns princípios básicos, quais sejam: • Existencialismo absoluto da relação, causa e efeito, ou seja, nada existe sem o fator criminógeno; • Os fatores criminógenos só serão neutralizados através da prevenção, se as causas forem evitadas, a criminalidade não se desenvolverá; • A solução, para o problema criminal, está em transformar o criminoso em uma pessoa sociável. Em outras palavras, a criminologia preventiva parte do princípio de que se o crime decorre da má formação do caráter do indivíduo, basta que os pais e educadores, formem bem o caráter das crianças e adolescentes, para que no futuro não se tornem delinquentes e antissociais. No entanto, se mesmo com uma boa base educacional, o indivíduo seguir o caminho do crime, basta que seu caráter seja aperfeiçoado através de um processo restaurador, que ressocializará o sujeito. Isto é, de forma suscinta, para a criminologia preventiva, os problemas com a criminalidade surgiam de uma má-formação no caráter do indivíduo. Criminologia | Mídia e Criminalidade www.cenes.com.br | 16 Contudo, o problema desta teoria surge quando o mau-caratismo do sujeito resulta de fatores endógenos, ou seja, quando o problema parte de fatores psicopatológicos, de modo que o indivíduo só pode ser recuperado por meios médico-psiquiátricos, desde que isso seja possível ou viável (5 a 10%). Diferente do que ocorre com o indivíduo que é mau-caráter por fatores exógenos ou sociais, onde o índice de recuperação é de 90 a 95%. 6 Mídia e Criminalidade O estudo da mídia e criminalidade é feita por uma análise técnica, que envolve tanto questões de direito humanos, quanto questões de distribuição de oportunidades. A sociedade se organiza a partir da formação de grupos de interesses e expectativas comuns, a qual apresenta uma estrutura de poder a partir de grupos que dominam e grupos que são dominados. Isto é, verifica-se a existência de um controle social na conduta dos homens que integram a sociedade, “controle que não só se exerce sobre os grupos mais distantes do centro do poder, como também sobre os grupos mais próximos a ele, aos quais se impõe controlar sua própria conduta para não debilitar- se” (ZAFFARONI e PIERANGELI, 1999, p. 60). Assim, percebe-se neste ponto que, à medida que o sistema penal integra o controle social, este se manifesta de forma punitiva e seletiva ao indicar as qualidades pessoais do indivíduo como indicadores de criminalidade em detrimento da ação praticada, ou seja, o sistema penal seleciona determinadas pessoas ou ações, classificando os indivíduos com base na sua classe e posição social. Inclusive, analisando o cenário brasileiro, verifica-se a difusão do medo do caos e da desordem como justificativa para detonar estratégias de neutralização e disciplinamento das pessoas, elas utilizam um cerimonial da morte como espetáculo de lei e ordem, valendo-se do medo para justificar as políticas genocidas de controle social (BATISTA, 2003). Outro fator que deve ser levado em consideração é a luta pela pureza moderna, que se expressa diariamente nas ações punitivas contra as classes perigosas, enquanto a pureza pós-moderna se revela através da ação punitiva contra moderadores das ruas pobres e das áreas urbanas proibidas, vagabundos e indolentes (BAUMAN, 1999). É justamente nesse sentido que se sustentam as políticas de tolerância zero e as versões Criminologia | Mídia e Criminalidade www.cenes.com.br | 17 tupiniquins, como prova da busca por ordem urbana em face dos camelôs, flanelinhas e mendigos. Nesta senda, manifesta-se Vera Malaguti Batista, ao referir que: os estranhos “não se encaixam no mapa cognitivo, moral ou estético do mundo”, eles “poluem a alegria com angústia”, embaralham as fronteiras e por isso produzem mal-estar e insegurança. Na guerra contra os estranhos apresentam-se duas estratégias: uma é a antropofágica, que ao devorar assimila, a outra é a antropoêmica, que ao vomitar exclui (BATISTA, 2003, p. 80). Percebe-se, por conseguinte que, há uma tendência para criminalizar a precariedade, deslocando tudo que for público para o penal, bem como (re)institucionalizando o Direito Penal pós-moderno na estratégia de purificação e do sacrifício. Desta forma, compreende-se que o sistema penal não passa de um instrumento de controle fundado em uma política criminal, cujos valores se baseiam em determinada sociedade, com o escopo de garantir a ordem social. Por isso, pode-se afirmar que os valores escolhidos como vigentes são impostos por determinada classe social, a qual detém o controle das demais. Em complemento, afirma Baratta (2011) que o sistema penal, a partir do desenvolvimento da sociedade capitalista, solidificou-se como um sistema de controle de desvio ao possuir mecanismos seletivos destinados a determinado grupo social, de forma que o controle atinja dos desvios de grupos sociais marginalizados sociais e economicamente. No mesmo sentido, refere Zaffaroni (1999, p. 73) que não somos todos igualmente ‘vulneráveis’ ao sistema penal, que costuma orientar-se por ‘estereótipos’ que recolhem os caracteres dos setores marginalizados e humildes, que a criminalização gera fenômeno de rejeição do etiquetado como também daquele que se solidariza ou contrata com ele, de forma que a segregação se mantém na sociedade livre. O autor defende ainda que, assim como os sistemas penais selecionam um grupo de pessoas dos setores marginalizados como limites de seu ‘espaço social’, os setores que na estrutura de poder têm a decisão geral de determinar ou subtrair o sentido da Criminologia | Mídia e Criminalidade www.cenes.com.br | 18 criminalização (ZAFFARONI 1999, p. 74). Desta forma, destaca-se que a seletividade, a reprodução da violência, a corrupção institucionalizada, a verticalização social, a destruição das relações comunitárias não são características de determinado grupo social, pelo contrário, esses elementos fazem parte da estrutura do exercício de poder de todos os sistemas penais (ZAFFARONI, 2001). Assim, utilizam-se os meios de comunicação de massa – rádio, televisão e internet – como mecanismos de promoção de medidas emergenciais, ao elevar a função simbólica no sistema penal eminentemente repressivo, além de fomentar crenças, culturas e valores com o intuito de sustentar os interesses que representam. Sendo assim, conforme expõe Mário Rosa (2003), a mídia exerce dois papéis fundamentais no mundo moderno: [...] definir a pauta do cotidiano e expor os personagens que a encaram. A mídia funcionaria como uma espécie de espelho seletivo do ambiente social, pois, se concentra não sobre todos os temas do universo social, mas apenas sobre aqueles que são mais importantes ou surpreendentes. Logo, em sua essência, as mídias estão adaptadas a um certo grau de distorção, já que não refletem a realidade como um todo, mas apenas alguns aspectos. Ademais, percebe-se que os meios de comunicação criam a ilusão de um sistema penal ineficaz e, quando o poder das agências de segurança está ameaçado, as agências de comunicaçãoacabam por estimular, mesmo que de forma indireta, campanhas de “lei de ordem”, através da apresentação dos fatos a partir da distorção do espaço publicitário, fomentando a violência coletiva e a formação dos chamados “justiceiros da lei”. Portanto, verifica-se que os julgamentos antecipados carregam o etiquetamento social, estereótipos e rotulação de toda natureza, atribuídos, sobretudo, aos pobres, negros, desempregados, subempregados, criminoso ou aqueles que já estão presentes nos arquivos policiais, revelando a grande manipulação no sentido da perpetuação da cultura do medo. A sociedade distingue e julga comportamentos e pessoas consideradas como ‘desviantes’, por meio do poder de controle pelo qual é Criminologia | Mídia e Criminalidade www.cenes.com.br | 19 desempenhado formalmente, através de órgãos institucionalizados ou informalmente, no âmbito familiar, escolar e na mídia (REIS, 2008). Neste rumo, Glassner (2003) refere que os meios de comunicação de massa não criam a notícia, apenas direcionam-na a determinado grupo social, associando a prática delituosa ao homem negro e favelado. À medida que, a ‘imagem da criminalidade’ e o ‘alarme social’ encontram-se atrelados às imagens veiculadas do que ao concreto, razão pela qual “os efeitos dos meios de comunicação e da circulação massificada dessas imagens acrescentam à percepção real uma espécie de percepção imaginária da criminalidade de rua” (REIS, 2008). A capacidade reprodutora de violência dos meios de comunicação em massa é enorme, eis que se verifica a necessidade de uma criminalidade mais cruel para melhor explicitar a indignação moral, requerendo apenas o exagero da televisão ao veicular casos de violência gratuita para que “as demandas de papéis vinculados ao estereótipo assumam conteúdos de maior crueldade e, por conseguinte, os que assumem o papel correspondente ao estereótipo ajustem sua conduta a estes papéis” (ZAFFARONI, 2001, p. 131). Desta forma, ao veicular a notícia, a mídia o faz de tal maneira que possa atingir a todas as camadas sociais, fazendo com que a realidade cotidiana seja conceituada e confirmada como se fosse consenso. Percebe-se, portanto, que o sistema penal contemporâneo se fundamenta no poder e na proteção dos bens jurídicos de maior importância para a elite, ao mesmo tempo que direciona o foco punitivo naqueles indivíduos pertencentes às mazelas sociais, que têm maior probabilidade de colocar em risco a redoma de segurança das camadas superiores. A humanidade requer um sistema penal baseado na convivência, na harmonia e no pacto entre iguais, que permita a coexistência de valores e princípios norteadores da dignidade humana e igualdade social. Assim, por ser uma curiosidade humana, o crime é visto na mídia com frequência, transmitindo e criando uma realidade fictícia, com a cultura do medo e de insegurança. Criminologia | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 20 7 Referências Bibliográficas BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: introdução à sociologia do direito penal. 6 ed. Rio de Janeiro: Instituto Carioca de Criminologia, 2011. FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. 3 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 17 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. OLIVEIRA, Natacha Alves de. Criminologia. 2 ed. sinopses para concursos. Salvador: Editora JusPodivm, 2020. PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Manual esquemático de criminologia. 10 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. ROXIN, Claus. Política criminal e sistema jurídico penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. SANTOS, Juarez Cirino dos. A Criminologia da Repressão [recurso eletrônico]: crítica à criminologia positivista. 2 ed. São Paulo: Tirant Lo Blanch, 2019. SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 8 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020. VIANA, Eduardo. Criminologia. 6 ed. rev., atual. e ampl. Salvador: JusPodivm, 2018. ZAFFARONI, Eugenio Raul. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2001. ZAFFARONI, Eugênio Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro: teoria geral do delito. 4 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2011. ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal: parte geral. São Paulo: Revista dos, 1999. Criminologia | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 21 Sumário 1 Criminologia e as Ciências Criminais 2 Mecanismos institucionais de criminalização: lei penal, justiça criminal e prisão 3 Criminologia e o papel da polícia judiciária 4 Criminologia e política criminal 5 Políticas de segurança pública no Estado Democrático de Direito 5.1 Estado Democrático de Direito e a criminologia prevencionista 5.1.1 Princípios básicos da criminologia prevencionista 6 Mídia e Criminalidade 7 Referências Bibliográficas
Compartilhar