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UMA NOVA POTÊNCIA REGION L NA ECONOMIA- MUNDO Bertha K. Becker Claudio A. G. Egler • Brasil Uma Nova Potência Regional na Economia-Mundo Bertha K. Becker e Claudio A. G. Egler Brasil Uma Nova Potência Regional na Economia-Mundo s• EDIÇÃO • URTIANDBRASIL • Copyri!J)1r C> C.mbridgc Univcnlcy Ptc:t~ 1992 Clp2: prQjero gr.Sfico de Fel1pe Tuborda 2006 lmp~ no Rr:~gl rrinr~.d ;n Br.u:i/ 9-1-1$37 Inclui bibtiotnfU ISIIN IS-116 0171-1 TodO$ 06 dirtiros: rescrvldos pela: EOrrORA BERTI\AND BRASIL LTDA. COD - Jl0.12098l COU - JUtl.t Ru:a Argtntina, 17 1 - 1• ;mdlr-Slo Crl$tóv1o _20921-380- Rio de J•nciro- RJ Tcl.: (OXXl l) 2585-2010 F••' (0XX21) 2585-2087 Não 6: pcrmit.idn a 1't1JMduç.1o COtál 01t ~rcl"l dc:,trl obrca, por quai~quc:r meios, l't:m a prévia ouroriuç!lo por eliCJi'o da. Editoro. SuMARJO LN ~ DE fiGURAS I.J\TA DE T A8fLAS l'lu:rioetO 11 A AMIRVAI.&ICIA De UMA PoTEI<CIA RiGtONAI. Um continente des.:onhecido Capitalismo histórico, economia-mundo e semiperiferia Uma via autoritária para a modernidade Este livro A INCORI'OIIAc;.\0 oo BRASIL NA EcoNO~tv.·MUNOO: DA CoLONIA A INOU!imlAUU.Ç.-10 NACCIONAl. O periodo colonial O impêrio mercantil O Estado e 11 indusuializaçilo nacional 7 11 13 17 18 24 29 36 37 ~o 53 67 m A EcoNOMIA·MuNOO e: AS ReGtOES BRI\SILE!RAS 89 O espaço de produçao colonial 91 O arquipélago merc:mlll 102 Centro e periferia 111 I LV A EMERGfNOA DO BltASILCO>IO Poml'ICIA R&itONAl NA EcONOMIA·MUNOO 123 O projeto geopolítico para a modernidade 124 FIGURAS A modernização conservadora 136 A projeção do Brasil no Cénárlo internacional 153 v 0 LEGADO DA MODt:Jl"ZAÇ,\0 Coi<S!:RVAEIORA E A RErn-Rt!IURAÇ!.O 00 TERRITO~IO 169 2.1 Controle d1> território no perlodo colonial "" A modernidade da pobreza 170 2.2 Exportações coloniais brasileiras -1650·1820 48 23 Exportações brasileiras durante o Império - O novo signiflcado da urbanlzi1çao 181 1821-1890 63 Complexos e redes: a armaduro do terrilório 186 2.4 Imigração para o Estado de São Paulo - O espaço rrnnsDgumdo 199 1870.1940 72 2.5 Produção e preços do caf~ -1880-1946 75 O domínio agromcxcantil com frentes de 2.6 Investimentos de capital estrangeiro por model'nidade 208 setores da economia -1920·1980 84 A grande frontei~a 211 2.7 Brasil: Pffi por setores da economia - 1948-1960 85 VI CRISE t DESAFIOS DA POTl!NCI.I REGIONAL 215 3.1 Brasil: vegetação original 93 3.1 O espaço de produção colonial 101 A dimensão Lerritorial da crise 217 3.3 A região mercanlil de Recife no inicio do A componente autoritária da crise 227 século XX 105 O caráler tardio da crise 236 3.4 Expansao das ferrovias no llrasil-1854·1929 108 3.5 Tipos de regtao em função das interaçoes vu CoNcwsl.o 247 espaciais -1960 115 3.6 Regionalização olkial -1975 116 BIBUOGltAflA 255 3.7 A. marcha do caft -1975 118 3.8 Densidades demográficas do Brasll - (I I AmazOnia: parques nacionais, reservas 1900-1970 121 indigenas e OorrSllllS 220 '1.1 A Doutrina da Segurança Nacional como r. 1 O projeto "Calha Norte· 221 uma estratégia 129 ft I A cidadela de Caraj:ls t seu ciruur!o '1.2 Concentração tspacial da indústria bélica de segurança 222 ' • no Brasil 135 b~ Percentagem de depuU1clos federais eleitos 4.3 Gastos do Fundo Nnclonal de Desenvoh·~ pelos partidos conservadores e mento Cientffico e TecnolOglco (FNDCT) crescimento do eleitorado no Brasil - em P &: D -1970-1988 136 1945-1982 232 4.1 Investimentos públicos no Brasil-1973-1987 140 IHl A escalada da dlvldu brasileira -1967-1988 238 4.5 Politica de desenvolvimento urba.no 147 n 7 Divida externa: n panicipaç~o do setor 4.6 PoUUca regional - 1975-1979 149 público -1982-1988 242 47 AmazOnia legal: pollrica de ocupaçâo 152 4.8 Os dez maiorts ímponadores de vtlculos brasileiros - 1986-1987 160 4.9 Incremento das exportações brasileiras por d~ino -1967-1985 162 5.1 Transiçao dcrnogr:lflca no Brasil 172 5.2 Fluxos rnigratôrios no Brasil-1970-1980 179 5.3 Urbnniuçao brasileira por mcsorregiao 183 5.'1 Produçllo industrial e força de trobalho por mr.sorregiao -1970-1980 189 5.5 Evolução da área cultivada com soja 196 56 Redes nacionais 197 5.7 O espaço 1rans6gurado 203 5.8 Denstdade populacional por mesorregiao 205 5.9 Expansao da área mttropolitana de Stlo Paulo -1930·1980 206 5.10 Expansão industrial no l!stado de Sao Paulo -1975 ·1986 207 5. 1 I Drosllla e ddades-sat~litcs 209 5.12 Sistema logistico global do programa Grande Carajás 213 6.1 Dtstribuiçllo dos acampamentos dos "sem-terra" no Brasil 218 TABELAS 1.1 Crescimento mtdJo do PIB a preços constanle.s 19 1 2 Distrlbulçlio de renda = 1"1lst• !.<lecionados 23 1.3 Situaçao ttnlca 23 2 l Matriz espaço-temporal da economhrmundo 38-39 2 2 Esúmallw dos escravos africanos chegados ao Brasil 49 2.3 Esumativa da populaçto colonial brasUeua -1789 51 l.4 Total de investimentos britfinlcos na América Latina e no llrasil - 1825·1913 64 31 Produçto de açúcar no Brasil - 17l0 95 32 Rio de janeiro; comércio de mercadorias 100 33 Indicadores eeonOtnicos e demogtificos das regiOes brasolelras - 1841·1850 101 •1.1 ComposiçM do mercado de armamentos - 1971-1985 132 i2 Número de empresas públiCliS crlnclas - 1941-1976 1'11 -13 Evotuçaodos setoresttonõtnicos -1960-J 980 142 • • 4.4 Exportações brasileiras por destino - 1969-197~ 4.5 Produto interno bruto percapira -1950·1980 4.6A Mudança estrutural das exportaçoes brasileiras -1965-1982 4.6B Estrutura das exportaçOes brasileiras- 1981-1989 4.7 Percentagem do total de investimentos e reinvestimentos no Brasll, por pais de origem -1970-1982 5.1 Taxas mtdias de alfabetismo no Brasil por região e sexo -1970-1989 5.2 DlsuibuiÇJ!o da renda no Brasil -1970-1988 5.3A Desigualdades de relida por sexo - 1981· 1989 53a Desigualdades regionais de renda -1989 5.4 Abastecinltnto de água e esgoto por regiões -1970-1986 5.5 Taxa de urbanização no Brasil - 195().1989 5.6 Taxas de crescimento das categorias mdustrials no Brasil -1966·1980 5.7 Perfol de efkltncia dos complexos Industriais no Brasil - 1984 5.8 Empréstimos do sistema bancário nacionil a agricultura -1973-1980 5.9A Ptrttntagem do tora! de área penmcen~ As 5% maiores propriedades rurais no Brasil -1960-1980 5.9a Posse da terra no Brastl-1985 6.1 Número de sindicatos dos trabalhadores no Brasil -1956-198~ 6.2 Endividamento do setOr publico - 1982-1987 6.3 Divida extema: total e proporçao do PJB 156 159 161 163 161 174 175 175 176 177 182 187 190 193 194 195 231 239 240 • PREFACIO Inquirido recenrementl!sobrequais as transformações mais marcantesqueteStemunhoudesdeasuaprimelravisitaaoBrasU ran l958,John Kenneth Galbraith rtspondeu: foi a sua emer· nt ncia, apesar do todas as dificuldades, como uma das grandes )IOtênclas do mundo (Veja. 20 de junho de 1990). Esta decla· ro~Çlo pode J)O!ectrestranha para um pais que, após o carnaval r o futebol, ~upa hoje as manchetes da midia internacional JlOr possuir uma das maiores dividas externas e assimetrias na illstribuiçAo de renda do planeta, rem como pela polemica eco· lógica em torno da desuuiçAo da lloresa &INZO<lica. Na verdade o Brasil é uma pottncb regional emergeme com !<>das estas dificuldades e. sobretudo, com a pobreza de mais tb metade de sua populaçao agravada pelos efeatos de uma profunda crise econOmica. O ritmo aalerado das transforma- \Oes num pais de dímensõu continentais gerando mt'Jhiplos tempos e espaços, estatlstlcas oficiais obsoletas no momento mesmo de sua publlcaçloeo fechamento das informaçOes que vigorou no nglmc autoritário slo fatons que dificultam o conhecimento sobre a realidade do Brasil e sua poslçto no mundo, manifestAndo-se em poswras polarizadas e progn6~ doos multo dispares sobre seu futuro. Este f um livro de Geografia Regio.W e rem uma proposa muito clara delniUr uma visao doBrasil enquanto parte Inte- grante e diferenciada de um conjunto maior: a economla-mun· do 01phalista O conceito de região está associado ao trabalho do geógrafo. Deld·lo de lado é abandortar um signo que lden· tifica a geograrta perante as demais ci~ncias. Repensar a regiOo hoje significa uma maneira de conlTibuir para a superaç~o da crise dns clenclas sociais c colaborar, enquanto geovafQ. na compreensão das contradições e impasses do mundo comem· pon\nco. No entanto. a rcnovaçto critica da geografialdcnttft· cou o conceito de rq:iao com a tradição empirista da cseola clássica, r<neg~~ndo-o como um estigma do mftodo ideogrAfl· eo, acabando por jogar fora a criança junto com a aguado banho. A tarefa deste livro t relacionar espaço e tempo, Isto t escre- ver uma geografia regional na perspectiva da eeonomla·mun- do, arra\'é.< do <XJome do processo de inserçM do Brasil no sistema cnpotal151a mundoal. o que simultaneamentecorrespon- de i sua lndlvlduallzaçJo como regiao. t uma tentativa de participar do esforco de construir uma nova vb para a geogra· fia regional. bem como de desenvoh·er uma perspecuva da economia-mundo ma os senstvel aos lugares. V4rlas pcssoes col~boraram para viabilizar este livro e a elas o nooso agradecimento. Peter Taylor iniciou c estimulou o em· preendhnento. Maria Helenalacorte e Rodolfo Berwnoello 1\:e- ram úteis comenUirlos crftJcos. O Conselho Nacional de ~sen· volvlmento ClcnoiOco c Tecnológico (CNPq) e a Financladora de Esrudos e l'mjetos (FINEP) apoiaram nossas pesquisas por vários anos. Por Ultimo. rnas não menos itnport.ante. nossos companheiros e nlhos que deram a tolert!ocia e o carlnhoessen· • c&ais parasuporwos longos mt$<$ de elaboraÇio do texto, tU® pela qual a eles dedicamos o Uvro. ' Benha K. Beclcu Oaudio A. Egler junho de 1990 1 A AMBIVALENCIA DE UMA POTI:.'IOA btERGENTE • Os cade1es da Real Força Aérea Britânica estão sendo treit1a- o.loscom os EMJl.3l2Tucano, um turbO<! !ice desenvolvido pela empresa Brasileira de Aeronáutica (EMBRAER) c momado sob contrato de cessão de tecnologia, na Gra-Bretanha. lsto ilustra o sucesso de umã nascente indúsU'ia bélica, que colocao BrasU como um dos 10 maiores produtores de armas do. mundo, ' ituaçJto que não encontra sim1lar em nenhum outro pais lati- no-americano. Entretanto, se na_guerr3 ele se faz presente na modernidade, na paz apresenta-se apenas no seu llmiar. A es perança media de vida do br-dSileiro f de 65 anos, ioferior:l M seus vizinhos do Paraguai (67 anos), Argemina (70 anos)e Uruguai (71 anos). O Brasil é pouco conhecido, mesmo por aqueles que nele vivem e trabalham. A rapidez com que se processaram trans.- fl>rmaçOcs nos últimos trinta anos. aliada ao controle sistcmá· tlco das informações por parte do Estado autorilário dillcul- tom a compreensão de suas reais dimensões. Ele ni!o é a grande 17 potcnda. ulmcjada como destino manifesto pelos mititares. nem tampouco um dos membros do chamado •terceiro mundo", como pregam seus crtucos mats simpll5las. t um <xemplo de pot~da emergeme de dmbito regional, marcada por felçOes conlnldatOnas. 1\ ambivolend• de uma potfncia regional diz rcspdto a ttés e.<ealas d< poder A primeira significa cresttr em um espaço !tubmctidu J hegemonia de um cemro mund1al. no caso a Americ.' Latin• sob a influencia dominante dos Estados Um dos. A scgund• rtpresentnum deslocamento das pretensoes de concorrente< no ambuo regional, no caso a Argenl.lna. que att reoentemen1e em a mais Importante economia da Amerlca ao sul do Equador A terceira ""pressa o controle polltko do ter· ritOrio c ti~ so~terlode que no llrnsll assumiu a forma ele um projeto nndonnl nutorlt:lrio. Este capllulo n·tmto ns fciçocs conuad.itórlas do 6ra•ll no contexto mund lnl.l!xpôeosconceitosde capitalismo histórico e. sls1.en1a mundiJI, de.c;envolvidos originalmente por lmm:lnu- el Wnllcr>tctn, que permitem slluar o Brasd na sennpcrifenn do sl~tema mundial capitalista Por Rm, uliliza alguns elemtn· Los do pensamento ~ia I latino--americano e brasileiro, para c.rnacu:n:.·u suas espe:c:tflcicbdes como uma regl.lo da ttono- mt;t-mundo. Um continente dtsconhecido O Brastl ~um pnis de múiliplos tempos e multJplos~paço>. A velocidnde de lncorporaç~o de inovações t.ecnolOgic~ts ~ cxi i'C11ltlmcntc n\plda em purccltts loca!IL3das de seu tcrrltOrlo e. sillc:ronicanlCIIIC, vh~c~~c~ t 1n condições pdmltivas, com rlt· mo• dctcnnlnndos pela natureza em ítncnsas cxtcnsocs Grun· dcs t•eclc•n•cionais de tclcvls.\o, •cmclllllnu:s ao pudl'llo norte· americano. estabelecem diariameme a ponte entre passado e 18 futuro, entre garimpeiros isolados na selva em busca do Eldo- rado e gerentes de grandes corporoçOes multlnacionais lnslll- ladas da Avenida PauliSia, a •wau Street" brasileira Um tempo acdaado O Brasil enquanto parcda da economiB mundial constitui um dos segmentos mais dinllmicos, do ponto de vista dos in· dicadores econOmicos. Suas taxas históricas de crescimento do PIB s:!o compardvels :!s economias avançadas desde o nnal d() século passado. 4 panlr de 1940, o crescimento do PIB manteve-se em uma média de 7% no o no, chcgandoall %entre 1967 e 1973, os anos do "milagre econOmlco", quando ores- t;tnte do mundo dava sinais evidentes de arrefecimento no seu ritmo de crescimento. (Tabela I L) TABELA t.l • Cresdmento mtdw de P/8 a preços constanres P.at-ses t870/191J 191)/SO 1950m 1973183 l"'liJõS Umd.os 1.2 2.11 3.7 t ,9 Alrmanha 2,8 1.) 5.9 1,6 , ...... 2,5 2,1 9,1 3.7 Mrxlco 2,0 2.7 6.6 4,6 llra'il1 2.) 1.9 7.J 4,5 l.wme Adaptado de t.biddison.I982.19&!J A acelerada urbanlzaçGo to expressao mais flagrante deste llTocesso no espaço. Ao conll'llrlo da moi orlo dns economias 111 mo-americanas. o Brasil nao apresenta umatolevndn concen- 19 tração em apenas umagrandemcrropole nacional, mas sim uma constelação de nove âreas meLropoliranas com mais de 1 mi· lhao de habitantes e um grande numero de cidades médias e pequenas di$J>ersas em seu território. A Industrialização recente distinguiu o Brasil na América Latina; suplantou largamente a Argentina e [oi acompanhado com menor intensidade pelo México. A associação com o capi- tallntemacional foi traço comum no desenvolvimento da re- gi~o mas, no Bt·asil. o Est:tdo teve papel decístvo na aceleração do riuno de crescimentó, avançando a frente do setor privado e mantendo elevadas taxas de investimento. Em contraparllda, o Brasil está presente Lambem como um dos maiores devedo- res, em termos absolutos, do sistema flnanceiro mundiat com um paSSivo to~.al da ordem de cerca de 112 bilhões de dólares em 1988, d[ra equivnleme a um pouco mais do que um terço de seu Produto Nacional Bruto (PNB}. O modelo de industriaUzaç<'\O latlno·americano. fundado na substituição de importaçoes. procurou administrar o mercado domesticocomo principal atrnlivo para as grandes corporações traosnactonaís. O Brasil atingiu etapas mais avançadas oeste processo, chegando a consolidar um parque industrial diver- sificado -em gn>1tde parte devido ao p01encial de stta econo- mia -cuja capacidade de atração de capitais foi viabirtzada e ampliada pela atuação do Estado. lhna Jrot~teíra mõvel O Brasil é um continente. Isto t! uma diferença fundameni.al em relação aos seus vizinhos latino-americanos. Sua exte.nsilo territórial o coloca na quinta posição entre os maiores países do globo, com uma ãrea de 8,5 milhões de km' e uma popula- Ção de H 6 núlhóes de habitantes em 1991. Uma densidade 20 dt.mográfica de 17). habitantes por km' significa grande poten- cialidade de crescimento, pois a ocupação do territ.órlo é inferior a dos Estados Unldoseprõxima ã situação da União Soviética. A potencialidade de recursos se amplia pela disponibilidade de espaço útil, decorrente de sua posição geográfica. O Brasil corresponde a dois terços da América L:tlina, e t seguramente o maior pais situado na faixa imeruopical. A grande reserva de L.euas do Brasil é a maior florestapluvial do planeta - a Ama- zônia - com uma imensa variedade de espédes. Apesar disso, o seu delicado equillbrio ecolõgico constitui alnda um desafio ,I sociedade brasileira e á citncia mundial na busca de [onnas upropriadas de ocupação. As condiçõesnan.trais são importantes, mas oãodctcrrn!nnn- tes. Enquanto a Argentina manteve orieruaçào agrop:IStoril su- plementar ao centro mundial, o Brasil. que historicamente teve papel complementar, hoje diversillcou sua pauta de exporta· çào de produtos agrtcolas. Originalmente .grande fornecedor de café, é atualmente o segundo maior exportador de soja e derivados, com a vantagem de colocar sua produÇão no mer- ~o.:-ldO no pe.rlodo da entressafra norte~americana. A soja. pouco ~onhec!da no Brasil há 15 anos, graças a investimemosem me- lhorias genéticas e no desenvolvimento de tTatos culturais, venceu a bamim ecológieados"cerrados· e espraiou-se no Planlll- oo Brasileiro. Em 1975, os "cerrados· eram responsáveis pela produÇão de cerca de 6% da soja brasileira; em 1982 este número mlngia 22% e, com a grande safra de 1987/88, responderam por fi milhoes de toneladas de soja. is«> t, 44,5% do toi.al nacionru. A economia brasileira cresceu, e conlinua crescendo. atra~ v~s de uma impressionante capacidade de incorporar rapida- mente novas terras. A área moa! dos estabelecimentos agrfcolas rrn de 198 milhOes de hectares em 1940, saltando para 365 milhões em 1980, que representam ainda cerca da metade da tlrea liquida disponlvel para a agropecuária. O papel da fronteira e do acesso à terra ê fundamen~1l para diferenciar o Brasil de seus parceiros latino-americanos, con- 21 lico e a crise atual oetntua sua ambivaJencia, expondo a vulne- rab.Udadeda poltnctae a fragllidade da naçao. Paracomprttn- der o slgnlflcado do Brasil e necessdrio dtflnir sua posicno na econoiiÚa-ntundo tapitalisu. Capitalismo histórico, ttonomJa-mundo e semiperiferia Para Wallerstein ( 1983), o capitalismo é antes de tudo unt sistema social hi~tórko. Parn compreender suas origens. fun- cionamento e petSpectivas atuais, precisamos olhar pora a re- ahdade presente. A prem1ssat fundamental para prcds:lra his- toricidade do fato gcogrdflcoeasua intel'j>retaÇ3.0. Nao se trota aqui de buscar exphc;tç()es universats e a temporais, mas pelo contràrio, ddlnlr e rcnfLrmar o cnrO.Lcr hlsl6rico, n!Jo npcnns dos processos sociais, mas umbem das formasgeograflcas por eles criadas. O Urnsu que aqui senl descrito t uma regi ao his- loricamentt inscrita na economia-mundo. Resgatando a /llstória O conce~to de capitalismo histórico baseia-se nas concep- ç()es de Braudel (1979) acerca da "longa duração" do tempo histOrico, rompendo com os limites impostos pela divisAo em pcrtodos estanqu~ e isolados. O capitalismo hislOrlco tem a sua prOpria din4mlca que, de inicio, se contrapOc à vtsao po- sllivista de progressoSOC:ial. t'iào se trata de "historlcismo",l.~ .• de visão determinista da história, mas de bistorlcldade. Nada exlst~ de peculiar no modo capilalista de produzir mercador!- u que o identifique como um "progresso socbl• em relaçaoaos 111udos de produÇllo an~riores, nem mullo menos que ele se r •!llllc por si próprio. A dtnamica do capilulismo histórico se faz attavés de ciclos •I• longa du.-..çao de crescimento e recessao. As causas desse 1••clrilo são objeto de controvérsia. Mas h~ hoje consldcnlvd • • odencia de que. pelo menos desde o final do stctdo XVIII, a •umoaua-mundo passou porquatrogrand~ Cocfos, com [ases olr crescimento (A) e estagnaÇllo {B) denominados ciclo• ou • •tttl.ts longas KondrJLiefT( 1935), historiodor russo que pnmel- ''''" ldemiOcou. Suas datas aproximadO$ sao: I 11 111 I v 178~ t8H-51 1890.96 19+M5 A 181().17 1870.75 t91+20 1~67-73 8 Uma explicação amplommtc aceita, embora niio dellniuva, r.,, Jloza a conttadtçlo entre interesses Imediatos de firmas ltttllvlduai~, de um lado, e as necessidades gerais dos negõcu.>s, o lo• uutro. Em [ases de crescimento os lucros sdO maiores c:.; l1!111a< tendem a sobrclnvestir na produçlo, gerando criStl de •HI><f]>nodUÇ<lO. AcorrelaÇãOcomamudaoçatecnológkatall.l.Omsctn><IIIO IM~ r~ A nos SUtts.)JVOS ciclos corrtspondc. respccuv:. mel .. I• ,llllcvoluçao Lndustrtnl (l),àexpoosoodns ferrovias c do slde- llll~ln (11), da qulmicn e da eletricidade (111), e do setor 1tcro- ,. I>.IC'ial e da eleL~Onlco no ciclo atuo L Mos h:i também lmpoo·~11nes corrclat()es polltJcas e espncl- ol• De acordo com Wallerstein (1979), os quatro ciclos Kon- do•uerr, quando coloc:ldos em um contexto político, podem 25 ser descritos como "dois pares Kondratleffs". O primeiro, c"' brindo o ~cuJo XIX. envolve a ascensão e o declfnio da dom~ naçJ.o inglesa. e o segundo dtsett\·e wna teruiencla súnilarpara os EUA no s«ulo atual, sem que isto represente formas Iguais de domlnaçao. Quanto oo perlodo amerlor • 1780,1ul pouca evldendo de ciclos Mas t posstvd idenliftcar"ondas log!sllcas", de cuca de 300 :mos. Wallcrstcm reconhece duas: c. 10$0 c. li50 A c. 1~50 c. 1600 B A pt·imclrn correspondeã ascens.~o e declínio da Europa l'eu· dai, e • srgunda cobre a emergencla e crise do cnpltallsmo ogr1· colo e mei'CIInttl europeu. de onde emergiu a moderna econc>- mta mundo. A concepção da e-conomia-mundo capJt.atlsl3., enquanto unlvtr>O de an:lli>e hlstOrlca e geogranca~mnte determinado, rompe com tmpredsOes espaetais de origem poshJVÍ$ta, l.lJS como superflde da terra ou espaço terrestre. O ponto de par· tida para a conSlruÇllodeste modelo é que a economia-mundo consiste essenci.llmtnte tm um único mercado mundial capi- talista Isto slgnillca nllo apenas que as mert~doruJs são produ- zidas primordialmente para o mercado e nao pal'l uso, masque o desenvolvtmcnto dàS trocas com o exterior e n extstencia de um mercado mundial saocondiçOes inerentes aosurgtmento e desenvolvimento do modo de produção capilallsta. Wallersteln ~ cateAórl~oqtJando afirn>J~ que 'o capitalismo foi desde o Inicio un1o questM de econornia mundial e nao ele Estlldos-nnçOes" (1979:1 9). O vetor dinâmico da economia-mundo esul justa• mente: na formaçao e desenvolvimento deste mercado mun· dlal, origem e produto do prOprlo capitalismo. 26 EnrreLaruo, se existe: apenas um C.mlco mercado mundial~ ele <''-IJ assentado em uma muhtplicldode de estados naçionais. "Como estrururn forma~ uma economia· mundo é definida J><>r uma única divisão do trabalho dentro da qual estão loca- h<odas múltiplas eutturas• (Wallmttln. 1979:159). Este é um segundo elemento na concepçto de Walkrstem, l"''tscasocontr.irio ocorre:na um •mptfio.mundo, ou seja. um tn1cnso terrltOrlo Sltbmcttdo • um anlco controle polltico. O papel do Estado nacional t de disiDrcer, no interesse de <IJsscs ou grupos sociais, o functonamcnto do mercado mun- dial. Quamo mais fone for a motqulnn tStatal, maior a sua ca- l>.tcldade de influtr no funcionamento do tnercado, em uma ~-.cola geográfica slgnirtcatlva, que pode extrapolar os limit.es <lu .eu território. Assim o Estado moçâo e um Instrumento JHtlltkoecconõmlco utilizo cio prlo' dosse~e setorc<dominan· 1••.,., regionais ou nacionais, part:l monte r parcelas do mercado 111undíal sob seu con1role, nllo apenns o m<.'rcado de bens e pto>dutos,mastambém,e princ•p.tlmcntc,odc força de trah,lho F xcetuando a ind uSt rl~lizatAo originAria, onde ns vantagea< 11 unõmicasdaGra+Breu:anha.em rt'Jaçloastu.st\'eotuaLScom+ 1•·1tdorcs. permitiam n:latlviz.1r o papel do ESiado. todas as tl..-mais industrialt2açoes dHa~ .. tardaas·. como os [srados llmdos. Alemanha ejapio, contaram com uma auva polltk:l r ..._atai e territonal de supone a çuas empresas '"nacionais• O resultado de.stn auva partictp•tAo do Estado na luta entre munopóhos Só poden~ ter dcscmboClldo em conllitos abertos. ·nmo ocorreu nas duas grande~ guerras. de onde emerge a t1cgemonia norte-americana ~bre a economia· mundo. A gl~ hultzaç:!ododólar,enquantomoeda internacioMI.edospàdrocs dr produçao e gestãonone-omcricanos, c.•pressos no rordisn10e no wylonsmo, levou n um duplo movimento na economia· tnundo. De um lado, o rApido Ct'Cl>timento c expansão da gran- •lr .:orporaçlo multlnaclonul, cujos interesses definiam um ••11aço planellirio de atuatllo; de outro a Imensa prollferaç~o oh• botados-nacionais, oriundos do processo de dtseolonlução, 27 que reronava o t<rrltbrlo em porç<)cs cada wz menores e nda vtz malsdlsl:lnt<Sdoconceito "dãssico" de oaÇllo (Hobsbawn, 1977). A dimens4o tcrrlr.orlal da economia-mundo Esl:l complexn rode de relações molda uma esll\lrura espa- Cial que, na conccpçaode Wallers1e10, niloseesgota no modelo clássico cenrro/pcriferla porque n econom•a·mundo cnpilolis- Ul necessita de um setor scmip<rif~rlco. A semiperlfert• ussu· me um papel fundamental no funcionamento do economia· mundo, nilo tanto econOmico, mas sobretudo politico, favore- cendo a estabilidade do sistema muncllôll "Aexlstencla do terceira categoria significa precisamente que o estrnto superior ndo enfrenta a oposiç~o unificada de todos os outros porque o estrato intermediário é tanto explorado quanto explorador. ~por isto que o papel especlneamente econOmico nlo t w Importante, e tem mudado •o longo dos dl'ersos estllg•os históricos do sistema mundial moderno• (Wallerstein, 1979 21/3). Há no conceito de semipelifcrio um aspecto imporwntc: o papel do Estado na politluçao do economia ·o Interesse Imediato e direto do Estado como uma máquioa polllica no controle do mercado (interno ou Internacional) t maiQr do que nos Estados do core e nos da petiferia,jâ que os Es~<~dos semipenftrlcos não podem depender do me r<::~ do pura mru<lmízar, a curto prazo. a sua margem de lucro" (Wallerstein, 1979:72). O papel dos fundos públicos em uma economia semlperift- rica assume papel pecultu, pois o Estado t um instrUmento 28 lundamemal no processo de acumulaçao e está presente dire- t•tncnte tamo como motor do crescimento econômico, como ''*' !lllvidacte produliV"..t, Mas, o reverso desta moeda também t IIIII>Urtante; ao assumir o papel de grande nnandador, o 13sta· ,j,, ucaba por arca•· com o passivo da economia, comando·se o ~ 11 \·f'tlor po·rexcelfnclft, cumprindo um pnpcl quehistoricnmen-. 11 fn1 dos bancos de lnveslime.nw. Na reversdo do odo. \ •tm ll I· IM o CMãterambavalente dasemipt.n(er~. poisac:rtseecon6- tt1lt•' .\S.Su.me o caráter de uma profunda crise. politia A -.em i periferia é o slnll!se dns contrudiçôes do capilull•mo hi,.Htr-ico dentro de umn mesma cconomlu naciomtl. E o loclt.S • l11 ptol'unda heterogeneidade cstn.tural uctunul:>da pelo copi· • •ll,mo na sua long3 histbria, do qual o Dmsil é um magntrlco nuplo. \loL• a ~ria de semiperiferia nao esgou. a especillc.d.•tle llmsU como potenda regional É prtclso lustonciLi·la I hun via autoritária para a modernld,.dc 1\ Amêcic.a Lanna t a mais antiga penferia da economJ.:t '"""do. Ela é part< <v•ISiitulntt do processo de form>ç3o < ·I· a.nwolvimemo do sistema capitalista mundial, orientad:l do ""'o Inicio da colonlzaçiio, para a pruduçilo t.lc mercadoria• ''' .1hu valor p:lrll n l'uropa. Partilhncln enu•c Porlugal r r;,p.l· "I"' '""formação econOmica foi marcada pelo mercan1illsmo 1 ·• <ociedade moldada i imagem da lbtria. Seu desenvolvi 11 ••'tHo ulterior estt'\'C tntlrnameme associado ã din1mica dos · • 1'\ttos de ecumuloçno da e.conomta*mundo - pnmcaro a ' • "' llrcl:lnho e po>teriormente os Es~<~dos Unidos - pM lei· l'•llldo da divisAo lnternnclooal do trnbalho como economlus '{I'..,IIJdoras de mntélio.s~pri.mas. Nu cnLanto, o movimento geral d•economln-mundo n:lodevc I· urecer a impon3ncia que tiveram os fatores imemos na 29 foonaçao da América Latina. Esta é um produto de uma com· plexa interação em que o contexto internacionaJ e a situação interna tlveram papéis significativos, cuja import:incio variou ao longo do tempo. Ê nes..e semi do que a tarefa de repensar a História daAmerica Latinaten1avançado nos1ilumos anos. Sua História n3o pode ser descri ~a como um estágio atrasado de desenvolvimento, nem como mera extensão dBs met:rópoles imperialistas, mas sbn como pane integrante, inseparável e espc.cifica do capitalismo. Um cato capiwlismo O Est11dio Economlco deAmêril;a !.atina (CEPAL, 1951) de 19t9 marca o nascimento da economia pobtica cepalina, bem representada no Brasil por Celso Furtado, delineando com clareza a problemática ela especificidade do capitalismo pe1i · férlco. O Est11dio, coordenado por Raul Prebisch, pancdacons- Uittu;.ao de que o cre.c;cimemo da América Latina dependia di- retamente do setor e.xportudor. que fornecia as divisas nece-s- sitrias para :t impor•ação de rnanufawrados. Esta estrutura cemro-periferta tenderia a se perpetuar, à medida que sua di- rtâmica era controlada por de.clsõcs tomadas no centro e se ace.ntuaria com a deterioração dos termos de troca. Nesse con- ll:xLo, somem e a indusu·ializaçõ.o nacional conseguiria romper o drculo vicioso do subdesenvolvimento. A incapacidade da indusulali•açao por substituição de imponações dt s~ ~nsLilu-lr como redenção nacional levou à fónnulaçáo de teorias quebuscnvaru compre•oMr as raizes do atraso nas relações de dependéncía enue centro e pcdfcria. Uma ctestas visões e o conceito de Fraok (196 7) de "desenvolvimen- to do subdesenvolvimento~ que, tratando a questão num nive.l geral. não soluciona a problem~Lica lnlino-americana e, nem, multo menos, a braslleira. como ele próprio reconheceu alguns 30 •H•os mais tarde. Por outro Indo, a formulaçao de F.H. Cardoso r E. Falleuo (1970) contribuiu para o aprofundamento cntíco 1ln conceito de dependência. Ela coloca a quest~o no campo da lorn1ação c do desenvolvimento do modo de produção capito· lista na América latina e imroduz a ideia de que •:o dlni!Jnica ~'ciallatin~americana é detenninada., em primeira lnsutncia, 1m r fatOres imeotos e, em Oltitnn instância, por ftnores exter- nos, a parlir do momento em que se estabeleceu o Estado N~1cional". Ernbora aceitando as coíocaÇócs de Cardoso e Falletto, um Ml upo de econo1nistas brasileiros critica a sua pcdodização que 1 onsidera presa às hipóteses cepallnas. Para superar estallmi· lillv~io hâ que pensar a li.istória latlno-aroerlcana como :1 forma· \f\O e o desenvolvimento de um cena capitalismo, um cnpltn- h·.mo que nasceu tardiamente (Mello,l982). Sua origem <:SI á no nntlgo slstelna colonial, cresceu como economia mercanul 11ucional e a generalização posterior de relações de trabalho llt,~alariadas no setor agn'irio·exportador foi desacompanhada • k forças produtivas especificas do capitalismo, sõ consolida· 1 hlS mais tarde. corn a industrialização. Esta, por sua vez, teve d1 1.15 restrições básicas. Primeiro. dependia diretamente doscLor •xportador para sua acumulação e, segundo, t1 América l.atllla ln~ressa no mercado mundial no momentO em que esse j:l em dominado por grandes empresas. A história do capitalismo tardio ru1 América Latina, cuja t•~prcssão mais elaborada e o Brasil, rulo t um caso ônico, nem l••mpouco a realítaçao mecanlca de etapas pré-fixadas. ~a hhtôria do capitalismo na América Latina que, reversamentc, f t:unbém a história da própria economia-mundo, como uma «l1· suas parcelas e fonnns de sustcntaç_~o. 31 Um urto autoricnrlsmo A tentativa de comprttnder o populismo, como forma de ex e releio do poderesUltal, parece constituir um morco na análise do carát.er autOriU\rio docaptutUsmo tardio na Amtrica latina. A lnduwializat;<lo e a emerg~ncia do proletariado urbano co- locaram em ><tque as estruturas pollticas herdadas do passado agr.lri<K.xportsdor, alribulndo ao Estado novo papel na rego- laçao das relações entre capat.al e trabalho. O Estado cng;apu amplos oroegmentos soct .. is em sua proposta de dcsenvolvimmto MC!ona~ ab'avts de uma rdaÇ<Io d!rela entre Uderes carismáticos e o •povo•, sem a imermtdaaçAo de estruturas pollticas de repre- sem ação (O'Donnell, 1973; Germnni, 1977; WeiTort, 1978). Acrise da alternativa populista desnudou ro e~ncla coercl- tlv!l do sistema poluico e a natureza do Estado-nnçtlo latino- amer1cano.lnúmerosestudos revelaram que seus atributos não se restringem à delimilllç~ de um mercado lntemo para a burguesia nascente, mas avnoçam na dire~ de Impor ll50d- edade a sua Imagem de nnçao. Nesse proce550 Oca Oagrante uma componente basalar da hlstóna politica da Amtriea Lati- no: a construção do E>tado à frente da cons~ao da nação. Mas o nutoritarismo n.o continem.e tem ra1zes onLtgas. En~ <tmanto na maioria dos patses europeus a oa·g.anl>~açno do Esta· do foi posterior à exlstencla de uma sociedade mais ou menos organizada, na Amtrlca Latina sucedeu o contrArio. A presença do aparato mdit.ar·relf&toso-burocrático, por um lodo.gllraolia o monopóUo do comtrcio; por outrO, corurolava a con«SSàO de terras e ltgitimavao trabalho=·oeselVIL bases do poder locnl dos grnndcs senhores nas coiOnias A consUtulçao de Estudos independentes,ntravtsda conquist.a deste aparato por interesses oligárquicos e merc::rn~is autóCLones, noo buscava a deOnlçM de mercados nacionais e sim viabiliur a anltulação com a C r~· Bretanha, sem romper com a estrutuno social hierár· quica e autoritária que lhe dava suswttaç~o. 32 No Brasil, .sta sltuaçOo assumiu contornos peculÍJIRS. E& •lll>nto o restante da Amtrlca Latina foi [~tado pela cfis. put> entre "caudilhos·. no Brasil foi mantida a unidade polilica .. u.wes do pacto escrnvocrata. que superou asdlvergenclasenue "' diversas oligarquias locais e definiu um papel original ao )11aptrio: gara11t1r a reproduçfto do escnovlsmo, o despeito das 111 "'soes britilnlcas para cllmin:l·lo. A manutençlo do prec~rlo equilibno entre "' forÇAs do mercado mundial e os Interesses dos grupos dornanantes na- 'aunalS conferiu alribulç6e• crescentes ao Estado, quea:.sumiu 11m papel decisivo no momento da mdustrialu:aç3o. Ao longo al.-te processo, cresceu e consolidou·se uma podereS<~ buro- ' , .ttla estatal, exercendo o dominat;<lo poliúeasobrt! osotieda- •k civil pouco organizada e desprovida de canais de aepa esen· hlçl'to. Nesta burocracia, ns forças Armadas tl!m pape) marcon· u·. embora com nlveis diferentes de profaS!.IonBhz:açao A mo- • I~: mização conservadora t a via lnlincramericom.l po•ta a mo- ti• midade, onde o Estado negocia com grupo> pravados a ma· nntcnÇ<Io de pnvlltgios e a sua lndusao ou e~duS)o na •pro- I"'·'Ç<Io da roisa púbhc:a, em troca do apoio ao projeto tle mo- ai r rniz.aÇào de clma pau baixo. O Brasil é tmpar pano e>cemplificar eslll via, tendo Inclusive j>Osto em prática um proJeto para a modemldadeg~rldo ~los uuhtarcs. Sua bandc~ra traz o lema posUivisltl - Ordfm e l'rogrcsso -que trnduz o defe.<a de uma organilaçAo haerár· quica da sociedade. acenando com a construçtlo futura da na- ~;lO. Aconsuu't;<!o da naÇ<Io, como ideolog~a polltica do Esllldo- n.1Ç<IO moderno, histot1eamente construid:o e que envolve Ulll3 tmagem idt31 de mmo a sociedade deve se organlz.ar, moslnt " predomlnio idcolôgico do "individuo coletivo• sobre o da ·coleção de indlviduos·, e favore~e a autoridade ncl111n da SOo lldaliedade (Reis, 1983), O reverso da moeda se manifesta na distancia entre as ins- tlluações oficiais e a soclednde que busca seus próprios camí· nhos, muitas vezes 11 sombra da legalidade. O ecleusmo sobre· 33 pOe-se a uma Ideologia consistente, o pragmatismo orlenUI a oomadá de decisões pohticas, e os antecedentes históricos llbe- rnlss~o pondcr~veis, resultando em poderosos constrangimen· tos, tanto para o pleno autoritarismo, como para a democracia (Lrunounlcr, 1988). Em suma, ~.ambtm no pl•no poUUco e Ideológico se configura a ombivali!ncia da semtpen!eria Uma cer!a territorialidade O discurso daomegraçao nocional, que assume fonna elabo- rado no onlclo dos anos 70, ajudo a desvendar o papcl da ter- ntorialidade nn construç!o do autoritarismo br~~sile>ro. A In· corporaçao de "espaços v~zios" ao domlnlo da naç~o foi pane essencial do projeto gtopolltico de modemlzaçAo e de ascen· ~o a pot~ncia regional, e revela um novo significado do terrl· tório na med~'ç!o entre Estado e sociedade. Ele é um recurso slmbóbco de formaç!o do ondoviduo coletivo, eon detrimenlo de un1a comunidade nacional de cidadaos A integraçao, como ideologia territorial, substituiu o di<cur· soda unidade nacional qut historicamente serviu para forUI· lecer a consrruçoo do Estado. O rowlo de separatismo, como forma de sufocar movlmtntoS de corues1açJo pollóCll, foi ut> Uzado largamente no Brasil. até os pnmOrdlos da indusuioll· zaÇj!o. Na verdade. a pollllca do território pt·eccdeu o território dn polillca nu origem do Es1udo brasileiro, que herdou o~ en· cargos de manttr os ext<n<Os limites eswbeltcidos pelo colo- nizador por1uguts. No indef)(ndfncia, ao con1n1.no da Amtrlca espanhola que se fragmentou em uma multiplicidade de n:pflblicas, a mona r· quiahrasllelra nl!O só manteve a unidade polltlcn como gnran- du a integrldadeterritonol da nntlga colOnia. O lrnpfrio do Brasil herdou e reproduziu os trnçosconstituintesdoeslado patnmo- nial portugues, onde o rei, <ltt>ado aoma de todos os sudilos, era senhor do maior patrimOnlo de terras do reino, governando 34 , ""'um corpo de funcionãrios recrutados segundo sua exdu· 1ivn escolha e encarregados de manter e ampliar os seus dom!· '""'• Domínios em que mal se distinguia o bem publico do bem I' lfllcular, privauvo do rei (Faoro, 1959). O controle de posições eslr.lltglcas como ln.strumento de •i•«>priaç!o do terrtt6rlo esú na rai% da fonnaçAo do geopoll· ti<,, brasileira. Geopolitica de lógtca sempre milHar, que esteve !'"''ente na estmttgla de conqulsla e defesa do território da , ••lt1nia pela Coroa portuguesa por tn!s stcuiO!ó, teve contlnui- 1 "'''nas disputas f)(IO controle das gnndes b.tcia~ do Pnlta e I<> Amazonas dura me o Império. aptlmorou-.c com a defini- 'ti'll) dos limites territoriais na virada do século t:, finalmente. se , o\ll<Oiidou na cons1 ruç!o de Bmsllla como base logisoicn par~~ " n~upação definlllvn do interior 1\o contrãno d.' concepçlo de Tumcr, que via n grande froll- t<'lr:l como um elemen1o cluve nn constro~ dJ democrocia omrri<:llna, no Brasil, da foi assoctada ao au1on1ao ,;mo (V <lho, I '179). A disponibilidade de terra> favoreceu os pano<enlre"' "ll~tnrqulas, permitindo que novos lntifímdios fo\srm criados 1·m ameaçar o Lerritório dos antigos. incorpornndo novns á r cus '" domiolo agro mercantil (&ckcr, 1982). A conquista do ser· uu se constltutu como s!mbolo paro esaender •ordem e Pro- l, ,.,o;o• às "terras sem lei e unprodutms",justifiC3ndo os for "'"'violentas e predatórias de ~un ocupaçao. Em c0 ntrnpartlda, o sertao t palco histórico de lulas tlc rc· •hl~ncia de aldeamentos indígenas, quilombos de escravos luy,ldos e territórios da pobreza. Forom dizimados. Noen1an1o, • ce>nsciencia de que a terrltoriahdadet peça fundamental para • < onquista da odadania e a construç!o da nação perpassa os tuovimentos soclnls e polilicos do Brasil alua!. Fm suma, a construção do estado e do território li frente da '''"struç!o da naçao t marca da via autoriu\ria brasileira paro ,, tnodemidade. O Brasil não me dentro de si apen•soconlron- 1<1 mtte o None e o Sul; ttazalgo mois: umalnc6gnila rep~ l.•<la pcla AmazOnia, urna das OlLimas fronteiras do planeta. 35 EsTE LIVRO Este livro tem uma tarefacumaambição. A tarefa ~descrever e aoaJisar o processo de inserção do Brasil na economia-mun- do cap!talis<a, desde suas origens como colônia portuguesa alé sua condi.çM atual de pottncia regionaL Trata·se de um proce.s- soque manifesta um duplo movimento: de um lado os eft.ltos da dinâmica do siSIC.ma capitalista mundíal sobre. sua forma· çllo só<:io-espacial e de out.ro as componentes locais <[Ue infiu· em nes1.a fonnação e no deserilio das suas regiOes. A ambiçao é contribuir teoricamente para elucidar o papel do setor semi· periférico. onde os fatores politicos são dec.isivos, nõ'lestabili- dade e trnjctóriada e.o;u:·uturação triâdica da economia-mundo. A evoluç~o histórica elo BrnsH e a construção do território e do estado à frente da nação são tral.ados Inicialmente (Cap. 2). A seguir detalha .. se his10ricamcnte o pi'OCCSSO de constituição das regHles brasileiras como resultado da expansilO seletiva da economia-mund<> (Cap. 3). A ascensão do Brasil à potência rcgiorud é analisada como produto das transformaç~ recen· LeS do sistema capibtlisUt combinad.ls com um projeto geopo- lítico nacional (Cap. 4). O legado da modernizaÇão conserva· dora e examinado • segoir(Cap. 5) e as dimensões de sua crise c os dilemas atuais do Brasil na economiá·mundosãoobjeto de renexao no c~pitulo final (Cap. 6). Em un1a curta conclusão indaga-se como os desafios ' 'lvidos pelo Brasil, enquanto semi· periferia e pot!ncia regional, podem afetar a crise/reestrur:ura- ç.ãa do sistema capitalista m<tndial. 36 2 A INCORPORAÇÃO DO BRASIL NA EcoNOMJA·MUNDo: DA COLONIA A INDUSTRIAUZAÇÃO NACIONAL Ao longa das diferentes fases da incorporação do Brasil na rt:onomia·mundo, a sua economia po11tica apresentou uts t>adtões: o de coJOnia, o de impéclo mercantil e ode capitalismo industrial periférico. Estes tres padrões se estendem desde os primeiros assentamentos portugueses ate a fonnaçao do Esta· do moderno e a industrialização. 56 no final dos anos 60, o Brasil emergiu como semiperiferla na economia· mundo, trall.Y formando-s<> numo potência regional na América do SuL O <1uadro de referência utilizado para examinar a evoluç.llo lús· tõrtca brasileira c<>m relaç~o à economi•·mundo é o dos ondas longas da economia·mundo proposto por l<.ondrollell, com modificações face às condições internas. {Tabdn 1.1) O perlodo colonial foi camcteri:ado pela implnntaçao de rmnas merranüs européias bnscad"-' no uubolho escr.wo c na grande extensão terrhor1al. Foi seguido por l'"' longo j>erlodo de mercantilismo escravocrata nacional (1822·1800) sob n forma politica de um ltnp~rio. Esta forma polttica conseguiu manter unidas sob uma autoridade ünlca as diversas c frdgeis economias regionais. Império, Cllfé c escravidão foram traços 37 TABElA 2.1 Matrtt tSpaÇ(>-!tmporal da tconomia·mundo (Md(.ai 1<.41ftdJ r.Urfl I A·l71l0190· 1810117 • · 1810117 dii'Mt'l CORE Gr:..Omulu como • 'Vhtin.&domunJu· tum• m de: L=vrc O)lotn:ic ~-~....-... -- l.'wdo6 t- dl Akllurll» Coon1lb •nnr -Dtm!tada!Jenunha,~dolml*"'olkid- nlc:o. CocJ"Jllmlc;io dll 1•~ «<nnOIIK• llO\C f3t;~dos Uoldos. Es•~os Unidos como a tmlor pottnc't11. mv.ndial, tanto m1liU!r, q1.1••n.to ro:K~Om.k11. Nov111 era de livre cumt:rdo. Decllmo dos brados Lltlld~ ctn rl.lbi,'IIQ i Euro- pa e ao japdO. Comcb atnaaUld\lbla n~.~~:lrc:ar 38 TABELA 2.1(conL) Ma!Tix espaço-umparal dil economla·mundil lnldo d11 I.:ICC!ttJ;So ~letlv11 n11 "•t~trlca do Nonc. c na Europa Cmtr.l Rtafpntu<*) <b Klldpcr1Cmoa.. 1urm~ <MJ dos &&aOOs Uni- doia. undic.ç~o cb Altm.lnh..A e ·--·-Drdno da t11s:sa ~:tb &topa - A.cen~ d.l e..,~ do lole.., "t,utn.a (r.~".lngll$.W da OP'f.P l8:lptrlo lbtnco QO "Ncwo Mundo ... Ci!loob(M ~ 8tMiU, pbnta(OtStsaamttidt RtcNcou de pile~ tSe c:.na na Amérlc:;ll.atj. na e erudmtiMO 1t0 Caribc. fOfulccirncn~a do connolc ponu.ptl. conidl do ouro no Bl'tiiL Ocn->lonluc;to e comrole lnformlll na Alntrlel l.annll Abn1ut1 dos ponos no Bttill. Elcf*!•MO dlllnOiltncta btltinica 11~ Ammc.a Lati• 1111. lnd'-'llltlldtndD do lmpetio Bmildro.as.c:al- 110 d,. cconoml• mcrantlkscnvocr.n~ btier da nooft ·~· ftC111......Vrbu n.a Annb Utltu (riK b KOftolllll& ~ C' rmmordD do OadtkOIO ntuwn.al "o ftni,;( \~.ib\IIIU ... att ckt 1•*'1"''"'1./ln na Amttla l.IIUn• "o llt11~1l, l)()lt,rt <x.-l•l•udot inkwcb pLanll,. 4:11'-ikl C'M+IIIi) CKI( lmt 1110 "' illlbll~w d.a ,f\llltllc.a l..111\t1.t No 61-.1'\1 ,(11'~1!1\1'11\il dllllllhl\11 illlltU\'fll) ltô1'll!lld.i 11!1) 11111t 11 CI li< (k~ dNICrl\<cll\'"htW-nllt l'.aduaal 39 marcant~ da ronnação do Estado brastleiro. A era da indusul- al~o nacional começou no Rnal do stculo XIX com a <eo- nomla exportadora-capitalista. eresultandonodcsmvoMmento nacional do Segundo Pós-Guem. Es!e opltulo descreve~ processo. A posição do Brasil como pottncla regional str4 analisada em ourro capllulo. O JICrlod o colonial A ocupaÇio e o povoamento do ~em til rio que constitwria o Brosll n2o t seru\o wn eplsodto do amplo processo devcpanSllo maritlmo resuhan1<: do desenvolvimento das empresas comer- coaiseuroptias. Comodecorrtndada busca de novas rotas paro o Oriente pelos países ibéricos - o Espanha atravts do Oci· dente e Portugal contornando a Ar rica -o territllrio que cons- lltul hoje o Brasil precedeu a cria1·ao da prOprla coiOnia. O Tra· tudo de Tordcsllhas, firmado emre os dois palses em 1494, dividia todo o mundo a ser descoberto entre as coroas de Por· tugal e Espanha, e eSiabeleeia que todas as terras a leste do Meridiano de 50 graus oeste pemncerbm a Portugal. Ddlniio·se. assim, o pnari, a coiOnlll por um lerrilóno corres- pondente a apenas '10% da stU ttta attUI e, amda assim, imen· so. A deresa do ltrritOrio e sua expanSllo nao decorreu de con- quista milhar. Foi um processo de posse lento e complexo em qut pesou a estra~gia portuguesa, rovorecida pela lulll pelo poder hegemOnico entre holande.<es, frnnetsese Ingleses, e pela uni~o com a Espanha entre 1580 e IMO. 40 I mprundimento mercantil e defesa da costa atlDntlca Inicialmente os porwguests comcrciamm madeiras coran- lt' -o pau-brasU. por ex~mplo, que posreriormcntc daria o 1111me à nova colonia e peles com os lndlos em mode<tn< fcloo- l lu., ao longo do litoral. A colonização do Ornsll se nprc.senlou ;~os ITH)nnrra.:; porcu- fltlcses a post<rlol'l, devido 11 prusao dal iolandn, Gr~ lll'ctonhn o• I rança sobre o território, logo depois da perda pnru o> hol11n· dC'~5 da maioria dos posloS comercJats que Portug.ll unhll na A"a e no Afnca; ao contrário do que acontecia nos temtor1M r •panhoos, a populaçto nauva era rtlatovaomnt< t.<e~<<.1 O, l"'nugueses ru1o podoam, ponanto. se bosou no trJb.olho no uvo, e no inicio também nâo admm.m metais. Fot tnt~o ncu::\oo !llltto organizar a produçlo. t a.s plantalions dt cama--de ,tçucdr turnaram-sea basedaeconomlaeddes.colonials. Es~cnoprc rudimento, ate entOO intdito, dtveu•St â experi~ndJ prtvlol do l'ortugal nas ilhas de Sdo Tom~ e Mudei ta, que fomenmu um.o lndUstria de equipamentos paro engenhos açuCilrtlmo., bl•m 'lllno à orgamzaçMconoerclal dos Oamengos quecontrolnvonn uon mercado expressivo na Europa Conúnental. O Brasil colonial foi. assim, organiz.ado como uma emp1 t\J mmercial result:~nlt da aliança entre a burgutso~ mercanul (onclusivebolandesa) e a nobreza No Inicio da colonio.çd<> ,, lrg151açao rdativa à propritdade da terra esmva b>.<ta<l.l na politica rural de Portugal A tem era vista como parte do p.1 tromonio pessoal do rei, como domlnío da Coroa, e"" aqui· •Içao decorria de umn doaçto pessoal. segundo os mérllo' dos pretendentes e os servi~os por eles prestados â Coroa Uma esrraotgia de distrlbuoçno controlada da term envolveu cmprrendedores privlldos na colonização do terrMrlo >cno ônus Jl.ll'a a Coroa, as.<egurnndo a ocupaçao e o comrok dl fach:odn costeira oriental Através da dlvos:.\o gcomtnica da costa atL\n~ca tm Capitanias Hereduirias ( 1530). a colonizaç;Jo foi micoada sJ. 41 multaneamente em vã rios pontos do território. A terra foi doada a do nau! rios com o objetivo de promover a agricultura, sobre- tudo a da cana-de-açucar. Eles tinham direitossobcr•nos e po- diam repartiras terras a moradores capazes de explorá-ias (ses- marias). A divisão respeitou a Unhado Tratado de Tordesilhas, embora os limites entre as capitanias fossem desconhecidos. Colocou-se, entflo, o problema da mão-de-obra e do tndio, foco de uma poiltica amblgua (ace ao conflito eorre a p<>swra dn Coroa. de cristiani:zaçâo dos Lndios para integrá-los no p<>voameruo. e os interesses dos colonosem escravlú-los. A Carta Rtgia de 1570 estabclecéu então que os lndios só podiam seraprisionados por"guerra justa". e face á dificuldade de mao- de-obra recorreu-se ao trafico de escravos africanos, financia- do em grande J><lne pelos holandeses. Pclo fato de a terra não ser toda utilizada para fins comere~ ais, os próprietâriospodiam manter um certo nílmerodeacren· datA rios e meeiros que moravam nas áreas menos fê.rLeis de suas propriedodes dedicando-se à economia desubsislénda e eventualmente trabalhando na pllllltation. Assim, apesar de ser o lucro o motivo princjpal da econotnia. o conLro1e sobre os escravos e homens livres e sobre a terra era. mais importante parn dennir o starus social do proier:lrio do que a acumulaçtlo de riqueza (Viottl da Costa, 1977). O desenvolvimento de outros setores da economia. não hn· plicou a modi~ca~o da polltica agrária c do trabalho, rlpica das áreas C<tnavicirns. Os pressupostos que guiaram essa poll- ticn no stculo XVI sobreviveram até o se.cu[o XIX. Se essa es- tratégia nilo r.rouxe a ptOS!X'ridade econômica almejada, em contrapartida ela lançou as bases da estrutura econ()mica. social e polltiea da eolõnia, da ocupa~o efetiva do território contra ameaças externas, t da interiorizaçao do povoamento. As plantalions litorâneas eram as células fundameruais da estrutura econômica e social da colOnia. Dal parou a exp;lns!l.o gradativa das fazendas de gado !"'lO sertão para abastecer em couro e animais de trabalho as zonas canavieiras. No Litoral 42 none, o RioAmazoms foi estratégico. por sua extensão c ampla nnvegabilidade, atê 2.000 km no interior em meio :1 lloresta equatorial. Duran~e a união das Coroas de Porwgai e Espanhll ( 15B0-1640), holandeses, franceses e ingleses trataram de ocu- par mill1armente esta área (1580-1640). Para defender a Bacia Amazônica, as formas iniciJlis de ocupação foram pequenos for- rcs,sendo o prbneitodelesna foz do Amazonas. en> Belém(l616). Para assegurar a ocupação a longo prazo, bem como • paci- r.caç,;o e leal<.lade das tribos abongenes conna os hol•ndcses, Ingleses e franceses, os portugLLcses resolveram dlvidír a bacia entre ordens religiosas catOllcas. Seguiram assim os jesultas espanhóis, que jã b.aviam est;>belecido um verdadeiro cordão estratégico ininlcrrupto de tnissões jesuisticas no coraçJo do continente. do Prata ao AhoAmazonas. no stculo XVI e primei· ra metade do XVU (Pradojr., 1945a). (Fig. 2.1) E.xpansão territorial para além de Tordesilhas Após a separação das duas Coroas (16'lil), a colonização ponuguesa em pouco mais de um stcL~O inv~diu áreas que pertenciam :i Espanha e ocupou o lcrrilórloqueé hoje o llrus1l. O rompimento da linha deTordesilhas Lornou-se. para o me- trópole, um objetivo, e n!lo apenas uma conseqüencia da dc.fesa do llmitório. A expulsAo dos holandeses do nordeste, onde permanece- ram de 1630- l65q ,levou a quebra do monopOlio ponugues na produção de cana-de-aç(•car, n11 medlda cn1 que<>< hlli.tndi:bCS desenvolveram alavourn nas Antilhas. Arruinado c desfalcado nas suas colônias no Oriente t de !>U:l marit\1\~1, PortugaJ tor- nou-se potencia secundária, lnrga•ncnte dependente d<J Ingla- terra que se afinnava no contexto imemacional. O Urustl pas· sou a ser sua última possessão ulu·amarin:1 vaUosa, e a cxtens!o 43 I I • : • •• ,. •• ." .. "' ,. ... -... ,:. ..... ... • •!•~n ..ona"".u • fottn.......,. .. , - iloii.S,. ··-·lllltU.I ·- l.t.o iMo M •111'1 ' -+- 1'111'U.0 H '- IUII'OIIIto Fig•ra 2.1 Controle do território no perlodo colonial. (Fome: Adaptado de Albuquerque er alli, 1980) e o controle terrilorial da coiOnia tornaram-se decisivos para a recupernçao econOrnlca e a afinnaçao do Estado portugues centralizado. A ocupação da terra corno base do direito sobre sua posse, isto é, o direito de facto, foi a prãtlca estratégíca bãsica na apro- priaç1o do tt.rrltorio para além dos linlitcs jurtdicos do Tratado 44 de TordesUhas, sendo posteriormente reconhecida como um l>rinciplo legal. Essa prâtlca se lezsobv~rtas formas, sobretudo no interior e nas bacias do Amazonas c do Prara, estratégkas pd a navegaçao e por sua posiçao nos extremos da colônia. O maior impulso para a expansão territorial decorreu sobre- I udo da de-scoberta do 011ro ( 1690) no phwaho do 1J1nsil Cen- 1 ml. O ouro se tomou a base econômica da coiOnia nté meados do século XVUl, * medida que a economia nçucarcira decola r"ce à concorrencia das Antilhas. A descoberta <l<> ouro provo- cou um afluxo de imigramcs da metrópole, grande mobilidade In tema e wn msl> gigan1escoem alguns decênios, cobrindo unta ~\rea imensa no centroeoesledo :~ tua) lerrilôrio bmslldm(~Unas < óerais, Goi*s e Mato Grosso). Caminhos de gado c tropn> de mulas estabeleceram-se para 3.báSltt.."Cr os J>l'imdros cC:nti'OS mineradores, constituindo-se nos prinwlros eixo~ dti ltltcgra· 11>0 interna da colônia. Em conseqüência da mineraç.ão, deslocou~se o eixo econó· mico parao centro-sul e com ele setranslerlu n cnpllal dn llnhla para o Rio d~Janeiro (1763). Entrewnto, o ddo do ouro e diamantes, embora Intenso, foi breve. Esgotou-se no Ollln>n quartel do século XVJJI, inclusive pela pressão do, impo~tos robrados pela Coroa, que resultou no primcil·o, mas fmcassn • lo, movimento pela independência: a lnconOdéncb de Mm1os GeraiS em 1792. No vale do Amazonas, a Coroa estimulou a ação das missões. que se torMraln as maiores exportadoras das "drog~s" (cone- In, cravo, snlsa-parrilha, C<\C<1U nnlivo), além deproduiirern :lll- mcntos para asubsistencia e deterem o monopólio sobre a m~o dc-obra indtgena. Fort.esemissionários penetraram pror>IIIJn- Jnente no terrilôrio amazõnicoasse:gur-.rndoa futurasobC111 1\la de Portugal numa área imensa~ ainda que com fmca busc cco- llômica e esparsamente povoada. No extremo sul.em fins do século XVII. um grande v~wode 1>oder existia enlre os espanhóis sediados em Buenos Aires, na ~mbocadura do Rio do Prata, e a ocupação portuguesa que se 45 <stcndia até o pantlelo de 26• S. A esuntêgla lusa Leve dupla face. A fuce agressiva, correspondente~ implantaçAo de uma guarnição militar na mttrgem norte do Rio da Prata, bem de- fronte do porto de Duenos Aires, criando a Colônia do Sacra- mento, em 1689, que foi causa de mais de um sl!culo de guerra. Tratava-se de interesses sobretudo ingleses com vistas ao con- trole do comércio de prata. couro o g.tdo na Bacia do Pr.wL A fase pactlka corrospondeu à colonizaçao dirigida peb metr~ pole que transferiu excedentes populacionais pobres dos Açe>- rcs, instalando cerc• de 1.000 casais em tomo de Porto Alegre e em Santa Caminn (1747). Após o paz {1777), a terra foi dJsuibUida em larga escala a militares e cavaleiros no atual Rh> Grande do Sul como forma de consolidar a posse portuguesa dando origem a gntndos latiftindtos pastoris: as ~nelas. F~r mou~se. assim, ~tmultaneament.e.. a soberania ponuguc:sa e a base cconOmico dn região que, já em 1780. exportava charque para o Rio de j aneiro e para Havana. O rápido movimento da mincraçM c a lema c.xpanSJ\o das fazendas e dos caminhos de gado, a pos>e de jacw ao longo das bacias consolidaram e expand1ram a ocupação do temtOrlo multo altm dos hmu.es dt JIIT<Iixados pelo Tmado de Torde- •illtns. Ageopolitica da metrópole mo.rrou·se. assim, acenado .. Em 1750, o Tratado de Madti tslllbcleccndo pela primeira vez as linhas divisõl'ias entre os dominios de Portugal e Esponha, adotando como cri tê do o urls possidttls,lsto é, o reconhecimen- to do direito de posse a partir do efetivo povoamento e c.xplo- nrçao da terra. legh•mou-se, ass1m, a apropdaçao do território CUJOS limites perroanecemgrosseuumcnte os mesmos de hOJ<- 46 r omtrcio colonial Acxponaçao de produtos tropicais e metais preciosos para " mercado internacional, bem como o tr~Oco de escravos, por \1'"' mar1tima, cons.thulram elementos essenciais do comércio , nlonial. Emboro Portugal e negociantes portugueses preten oi•· >Sem dominar o comtrdoextenor, na verdade. a metrópolt l<>t ~empre um entreposto dos produtos brasileiros para outras pmenclas europl!ias A produção em surto>. comandado$ ~la "'cllação do merendo mundial, era totalmente exportada • •lgmncou uma contrlbuiç;lo substancial do Bras1l para a ncu- mulaç;lo no centro hegemOnico da economia-mundo. Aú mt.1dosdo século XVIl, o Norde<te, a r<gJAoem tomo da t ·•Pil4lnia de: Pernambuco -se wmou o ma1or prochuor mun-- tltal de açúcar O comtrc10 do açúcar, contudo. era dominado pelos lwlandeses ql.le controlavam o seu I ransponc, recolhiam ,, produto em Usbon, o reHnavam e o comcrda.liz~1Vl1n\ nn Eu· "'1'3· N;\ segunda meto de do século XVII, race :i ascen!><lo da t•rodução de cana-de-açC!car nas Antilhas, as plantaftons cano- vu:lraS no Brasiltnl.mnam numa longac:riseque.sees~endtu :lllt n stculo XIX. Our.Jme o sêculo XVU, o B111Sil foi também o maior produtor mundial de ouro. A exportaçGo alcançou seu pon10 mAximo em •orno de 1760, quando aUngiu 2,5 milhoes de libl-as, mas tlr dl110u nlpido, e em 1780 não alcançava um milhão de llbr.•s (I· urtado, 1959). O ciclo do ouro contnbuiu, em eSSénc1a, para u desenvolvimento manufature.iro e financeiro da lnglatcrnt, uma vez que Ponugal constituía ment anlculaçào, embora a lundnmental, da expansao da economia inglesa (Manchester, 1973). Acordos comcrcinis(l642-51-6 1) estabeleceram privi- léQtOS para a Grâ Brewnha que. em troca, dcfendia as pOS>O" ...Xs lusas,garanundo a sobreviv!nciade Portugal como pottn- c•• colonial O m~ado de Methuen (1703) deu continmdade á •= aliança, permitindo à Gil\-Bretanha o controle do comtr- Um pequeno comercio Interno também se desenvolvia, en- volvendo dois setores. Um setor, estreitamente dependente do comércio exterior, redistribufa as mercadorias locais e impor- tadas. O outro garantia o abastecimento dos grandes centros urbanos Utontneos em gado, por via terrestre, e produtos agrl- colas, por uma navega~o de cabolagcm, que conectava os n(l. cleosdispersos ao longo da COSia. O comercio exremoe Interno foram essenciais parao desenvolvimento da burguesia mercantil urbana -pequenos comerciantes luso-brasileiros, grandes comerciante.s e traficantes portugueses -e o surgimento de um interesse local, genne de um interesse nacional. Estrutura fundiària, social e espada! A propriedade mono produtora escravista de grande escala roi a célula de todaaestrutumcolonial determinando o conjun- to das rt!laç6es sociais e a exploração exLC:nsivn e especuladora dos recursos naturais. neproduzlndo-se no tempo e no espaço, a grande propriedade teve seus traços mais acentuados naplan- tat.lon tlçucareilll, mas estes eslavam presentes tambêm na fa- zenda de gado, na mineraÇão e mesmo no se1or e><Lnttívo do Vale Amazônico, embora ai nâo tivesse por base a propriedade da rerra. Duas unidades báSicas de produÇão se mantiveram naco)!). nia: o 11enge:nho" e o "'cu.rral'., O .. engenho .. , a manufutura de preparo do açúcar, roi o elemento cenw~ da organizaÇão de plantatwn e eventualmente pass(lu a designara propriedade toda_ Era um estabelecimento complexo, quase auto-suficiente_ Con· tinha normalmente8().1 00 escravos, mas alg11mas chegavam a poss11ir mais de 1.000. O "curral" em • fazenda de gado, ünico produto que teve alguma Importância alem daqueles destina- dos a exportllção. Ocupava grandes extensões não demarcadas 50 nas áreas de campo impróprias !I agrlcultum, cs1abelecendo uma separaç~o básica entre a lavoura e a pecuária. O gado. variando de 200 a 1.000 cabeças. era criltdo á sol1t1 pelo vaquei- ro e dois a qualtO auxiliares. A prlncipalcaracterfstlca da sociedade colonial acima<ic tudo era a escravidao de indios e sobretude\ de negros. Uma escra .. vidao original, que revlveu uma forma de trabalho historica- mente extima. proporcionando um recurso paro. explorar co-- mercialmente acolOnia Embora não se1enham dados comple- tos e seguros, em 1798, a panicipaç:lo dos escravos no to1al da população correspondia ã me111de. (Tabela 2.3) TABELA 2.;3 Estimativa da populaçé!o colonial bmsilcira - I 789 Ot.mcos NcgTOJ livre$ lndios CondiçAo Total da popul:lçlo llvrc Negros escravos Mulatos ~~ravos T ot~l de escravos TOTAl footciContad, 1971. 1789 1.010.000 40ó.OOO ~50.000 1.666000 1.361.000 221.000 1.582.000 3.248.000 O lrnbalho escravo afetou o conceiLo de tmbalho, que se tomou atividade desabonadora, e deixou pequena margem de ocupaçOc.s para os homens lh•rts rulo-propríeládos de terra. Distinguiam-se asslnt, na sociedade colonial, dois setores se- 51 gundo utilizaçlo de trabalho escravo ou livre. Ufn setor estru- turn.do pela escravldlo e o clã p3ttiarcal coeso, fonnado pelo COnJunto de individuas que particip3vam da grande proprieda- de rural, cujos proprietários conslitulam n classe priVIlegiada, nr~stocrâtka. Somente os comerciantes fnzinm frente aos pro- pnetános de terra con\O financiadores da grande lavoura. Art ... validade entre esses dois grupos era acenwadu pelo fato de os comerciantes serem pon_ugueses, nascidos no Reino, enquan· to que os proprietários rurais já eram, geralmente, nascidos na colonla. O outro setor nao estruturado corre.<p<>ndlo a uma massa de populaÇ>lo livre comprimida entre os dois vctremos da escala sodal, os propriet:lnos e os escravos (Franco. 1974). Eram "brancos pobres .. , 10lndtgcno.s". "dviltzados" c negr<t:. lwres com ocupaÇões incertas c alcntOrias, ou se1n ocupaçno alguma. A cada fase d~ndente de um surto eoonornico de58gregava.se o parte da soc1edade atingida pela crise, delxando grande nil· mero de indivíduos sem ocup•ção fixa que constitulam um rtstduo social desennuz.1do, móvel, fiutuando em torno da SOCiedade organl:u•da. A eslnltura econOmlca e social da agrovcportaçao se asso- dou uma cstruturn espacial especifico. Em fins do per1odo colonial, no inicio do seculo XIX, uma populaçao do 3,5 mi- lhOesde habitllntcs dls!rlbula·se muito lrrcgulanneme pelovusto tcrrltOrio, num padrao que perdurou a grosso modo até m.,.. dos do sêculo XX O primeiro traço marcante da estrutura espaoalera a profunda diversidade entre a "marinha" (litoral) e o •..,nao· (o interior). Cerco de 60'lbda populnç~..,concen U"Dvam na Faix.1 costeira, de uns 20 km de lnrgun, enquanto que o noslrulte se da~rsava pelo mterior. No "marinha", esta- volm a '"cwUizaç:to ... as plantatJons açucareiros, ns cidades, os porros. No "serldo", uma sociedade rude c um povoamento ra- refeito e disperso, que di Ocultava qt•alquer controle, uma ne- bulõsa de estabclcclmcnto.. isolados que sedls.emlnavam por uma área de mais de dois n1ilhoes de lan'. 52 Um segundo traço marcante da estrutura esp3cbl em a CO TI' «ntraçao da produçao e da organiuçao social na própria fal- •• costeira. O isolamento desses núcleos, cada q uni com ..,u •lstema de transporte Ouvia! c seu pono autonomos voltados p.orn o exterior e sem anlculoçao entre si, conOgurou uma es- trutura espacial em ·arqulpelngo'. A artlculaçdo do conjunto ,.,.mantida por friiCas conexoes comerclal.s voltadns para o mercado in~erno que, no entanto. foram capa.z.es de gerar as J>rime.mosadades expruslvasdacolõnia, particularmente o Rio ele janeiro. O Império mercantil No século XIX, o Brasil vtm a ..,r pam do cap1~1l ~mo lndus- 1 •ai, como um Esu.do pollucanxnlt indrpendrntc, na fonna olr um Império, que pennaneceu desde 1822 att 1889 A inde· t~·ndencia braslleir11 foi, na verdade, pan• da e~trottgoa bnt:l- tiiCa como nova pottnci.o mu.ndtal. para control11r 1od3 a Amt· ''"'do Sul atravê.s do llvrt comércio. O capitalismo Industrial 1\<'rou conuadições com o pacto colonial baseado no monopo- licJ metropoUtllno sobre o comtrcio, cuja destrulcno foi condi· \il<> necessária para que a periferia pudesse reallutr urnn pro- iluç.lo mercantil e constllulsse mercado para os produtos in· clllloltials. Os ricos lmptrios coloniais ibéricos, até entao pro- trgldos pela rivalidade entre G~BIWIIlha e flllnÇa. fragmcn- t.lmm·secom as dasguei'TnsnapoleOnic:ls. Os obst:lculosl nova urdem internacional ror:un então rcmovídos. emerglodo as n~1c;Oes iber<ramerlcanns livres. Na segunda mcladc do sOCulo XIX. estas nações fomm lncorporodas na ec0110mia·mundo •·umo pane do imperialismo infonnal da Gr1·1ltttllnha. Com o nascimento do Estado nacional, a hl>tOrla latino- lmtticans deixou de "'r meramente reOexlw. DtcisOes na· 53 tionals comec:amm_a influir na forma de fncorporaç~'lo doBra- >il ""economia-mundo. Esta foi seguida por uma longa era de economia mcrcantU~scravotrata baseada no caré. Fonnaçdo da economia mercantil-escravocrata nacional baseada no café (1790-1850) No momento da Independência, o BrasU era o mais extenso pais do Ocidente e únha apenas 4 milhões de habitantes. Por que o antigo tecritõrio brasileiro não se fragmentou politJca- mrote no momento da Independência, a semelhança da baita· nlzaçào que ocorreu com a formação das repúblicas na Amé· rica Espanhola? li por que não foi abolido o tl'llballlo escravo? Devido a forças internasespecil\cas, basicameme a allançacntre os grandes senhores locais, especialmente cafeicultores, para manter seus privilégios -a escravidão e o monopólio da pro- priedade da terra - e destes com os comerciantes, que respon· deu pela lndependénciadopais sob a forma monârquicae pela unidade terrotorlal. Mameve-se o crabalbo escravo porque, no momento, t lc e.m nada afetava a emradu de produ los lng1eses c porque sua lransformação em trabalho livre era agora uma decisão nacionaL lndepend~ncia e unidade pol!tico-territor!al A era colonial terminou para o pais em 1808, antes dalnde· pendência. A "abertura" dos portos brasileiros ao mercado irllemacional depois da transferência da corte portuguesa para n Urnsil, em fuga diance dos exercltos dcNapoleã.o, foi o marcó 54 do novo pertodo econOmico desenvolvido sob a hegemonia brilllnica. A estratégia inglesa foi clara: perdendo Portugal pnrn a Fl'ança, tratou de se compen~ar com a grande r:olonia porlu- guesa, o Brasil. O soberano porrugues preservava sua coroa e tltulos imigrando para o Rio de janeiro sob a guarda de uma divisao naval inglesa perm.anente, mas perdia suamdepend~n cja de nção. A partir da abermra dos portos. não somente se romp<m o monopólio comercial de Portugal: a dominação portuguesa ficou virtualmente extinta devido nos favores espe- ciais concedidos a Inglaterra no tratado comercial com elll fir. mado em 1810. Interesses da burguesia comercial e industrial inglesa tive- ram imporwnte papel n~ Independência do Brasil. A eles se sotnaram inLeresses locais decisivos. A crise das exportações na passagem do século e os impostos extorsivos estabelecidos pela metrópole parasitária provocaram uma Insatisfação entre os plantadores e comerciantes, bem como agltaçoes sociais. A Fixação da corte na colônia, a abenura ao mercado i.ntt.rnacio .. nal e a elevação do Brasil a Vice-Reino (1815) estimularam as atividades econOmicas, o crescimento urbano e a centralização da sociedade em 10mo do foco de poder sediado no Rio de janeiro. A burocracia imigrada do reino passou a ter interesses locais e se tomou senslvel i\ Ubertaçilo da co!Onia. Criaram-se, assim, condiçOes pata a lndepe1Jdênda, decla- rada pelo próprio prlnclpe herdeiro de PortugaL Entretanto, essas condições por si mesmas não explicam amanutenção da unidade polltico-terrltor!a~ tema até hoje controvertido entt·e os historiadores. A manutenção desta unidade interessava a Grll-llretanha porque o novo pal:>representava um amplo mercado potenclnl e uma base de operações para o domínio da Amêrittt du Sul, particularmente em sua disputa com a França pelo controle da navegação e do comércio de prata e couro na Bacia do Rio da Prata. Ainda em 1810, o Brasil se aliouáGrã-Bretanhanagutr· ra patil [tilgmentar o Vice-Reinado da Bacia do Prata contra o 55 interesse da franÇl! e de seus aliados espanhóis, numa disputa que perdurou até 1852. Mas apressao Inglesa contra o tráfico negreiro, queconstiluia um obstâculoao seu dom1nio do Atlan- tico Sul, iniciou um conflito entre aquele pais e os grupos dominantes na colônia. foi a manutenc,'âo do principio monárquico no processo de independência que determinou a preservação da unidade po- lltica do território. O principio monárquico cemralist<! foi a soluçao que os grandes proprietários e traficantes de escravos encontnram paradefenderseus prlvlltglos e manter seu poder local: no plano externo, garantir o tráfico d e escravos contra a pressão inglesa; no plano imerno, garantir o comercio inter· provincial de escravos e o monopólio da propriedade da terra (Saes, 1985). Os grupos domlnantes dasdiferemes áreas supe- r'J.romseu isolamentoeace'it:arom a forma monárquica do Estado para todo o território nacional. E, certamente, a presença do príncipe herdeiro e a prática sc.:ular de defesa da posse do tcrrltOrio infíutram também na implantação da monarquia e na manutençao da unidade territorial. Essa reraçâo enlre centralismo do Estado e int.eresses escra- vistas revela o caráter do bloco do poder. Era ele composto por todas as classes de proprietàrios mas sob.a hegemonia politita de um sub-bloco -a elite de plantadores escravista de CJ~ft, grupos de proprietários urba-nos, e comtrcianlts - estes ú ltimos agindo como vangu.arda e conquistando posto$-cha- ves no aparelho de Estado. Revela, tambem, o Inicio de interes· ses regionais direre.nciados. As lutasseparausw.s que se sucederam foram dídgídas prin· cipalmente por grupos de p roprietários não-escravistas alija- dos do bloco do poder. Entre 1831 e 1848, 20 movimentos provinciais atingiram quase todo o te.rritórlo nacional, e a of• cialidade Inglesa comandou tropas brasileiras que liquidaram esses movimentOs separatistas. A Constituiçao de 1824, que permaneceu até 18!)1, COI\Sagrou a preponderãncia do ExecUo tivo-Administrartvo sobre os demais ramos do aparelho de 56 t:stado e da esfera central ~bre as esferas regío""ís c locais, embora, na pratica, o poder local dos grandesproptietários de 1crra fosse mantido. A gestaçiiQ da cco11omia cafeeira A quebra do monopólio português e a fonnnç'o dn Estado- IMÇão marcam o final da crise d11 cconomi~ col<-m 11tl Mi1S O!{ rumos dn crise não estavam pré·fixados. A econon\ia poderia 1e1 regrcdido, mas, pelo contrário. seu caráter meN:antil c C..'io· ~ ravista foi revitalizado, -agora oos quadros de: umn economl~t 11ilélOnalmente controlada. O cilrt, novo prod~l<), vrrln con~lJ· lu ir a economia merrnntiJ escravista nacional e mudar os ru· mos da crise. A economia cafeeira foi obra do capit.aJ mercamiltulCIOna1 que vinha se desenvolvendo aos poucos c ganhou nOLdVcl l1npulso com a abenura dos ponos, a transferência dn corLc l i~ ta o Bmsil c, mais tarde. com a lndependencia. O caplral IUt.rcanttl captou ílS novas oportunidades de organlzação da uuncrcialização do café oo mercado ifltcmac-ional e invndlu n '" hita da produção. financiando a n1ontagem e o custeio dn l't'onomia cMecir..t através de um novo-alor, o "comissário•. O l mnissário substituiu o monopólio comercial com o mesmo u·sultado, prendendo OS razendeiros num .. cil'ClliO de ferro" ~ '-t1cin, 1961). Outros três eJementos favoreceram a economi:1 t .. reeira como em-J>resa: a orc.rlá de terras no Vale do Pnrniba, lllttximo aos pórLosde embarque, o cultivo predarório da rerm • u taxa exuaordllltlria de exploraçi\'0 de escr~nros. Foi assim posslvel ao Brasil produzir cafe em grande cscal• l' :1 baixos custos. A orerta brasileira baixou os preços ime.rna· 'lonois, expandindo a de•nanda exlerna (Mello. 1982) Entre 11!21 e .1.830, o a.fé j:\ representava quase 20% do valor das 57 exponaçoes brasileiras e deste pertodo a 1850 sua e.xportação cresceu cinco vezes (Furtado. 1959). J~ cll\ 1830 o Brasiltor· non .. se o primeiro produtor mundial de café:. e o caft tomou- se o primeiro produto de exportação brasileiro e sul-americano (Simonsen, 1937). Simultunetm•cntc c.rescc.rarl'•as importaçOe$ representadas sobreLudo pelo tr:\Oco de escravos, cerca de 50.000 por ano, avaliado no mcrc••doem aproxlmadameme8 milhOes de libras (Prado Jr., 1945b). O descquillbrio na balança comercial foi solucionado mcdlanle empt~tlrnos ingleses exlremamente onerosos, gerando um déficit orç-amentário permAnente. A.tô 1852, quatro gr•ndes empréstimos somaram 2,5 milhões de libras. A suspensão do tráfico de escravos e a l.ei de TI;,-,.~ Os grupos dominantes escravistas retardaram quanto pude· ram a abolição do comércio de escravos, só decretada sob pressão da dtplomacoa inglesa em 1850. No mesmo ano, uma nova pollticu de terras e de 1rabalho se estabelecia para regu· laritar a propriedade da terra e o foroedmento de trabalho, bem como o crédito: a Lei de Terras. Aterra tornou-se, então. dedom1nio público, patrimônio da Nação. só podendo ser adquirida mediante compra direta do governo. Eliminaram-se as fonn..strndlclonalsdeadquirlr terras através da ocupaÇão ("posse") e das doaç<>esda Coroa. Terras que não (ossem adcqua.da.ment.e utili%adas ou ocupad.'lS deve· riam voltar ao Estado como terras pUbllcas - '"terrasde.voltUas" -cuja venda fornw:ria fundos para sua demarcação e para subsidiar a imigraçêo de colonos europeus '1livres". Bloque.ou .. se., assim, a expansão do regime tradicional de propriedade territorial, bem como o desenvolvintento da pe- 58 quena produ~o independente, inclusive os imigrantes que não unham recursos financeiros para comprar t.e.rras. A Lei das Terras, assim, assegurou a manutenÇão dos int!grames como força de trabalho nas plantaÇões de café. Mesmo após a lei, a posse continuou sendo a via principal de acesso~ propriedade da terra. mas apenas por grandes fazendeiros dol~tdos de recur- sos. c\ terra passou a representar urna me.rcndorln e um poder c.conOmico. Perpetuava-se asociedade cscrrwtsta tXI>Ortadora-- lmportadora no mesmo momentohislórlcocm 4ue se promulga- va o HomesteadActnos Estados Unidos que (lumenuwn o PCeSSO à terra para os pequenos produtores (Vlotu J:~ Costa, 1977). O Estado cumpria, assim, o seu pnpcl pnr" com o bloco escravista. E este, dando ao goveo·no Pl rlbuiçOo de mc<liador entre o domlnio pCiblicoe os prov:'we:1S proprit;tt\rios utritv~de uma relaÇão Impessoal, atribuiu-lhe um Instrumento de poder sunbólico. O desano lniCI:JI pnrn conSQhdar um p<>der central num vasto terr1torio -sem 1mcgraç~o regional c csto.1ssa- meme povoado - fez o .. esl3lismo'', bn>eudllllll nllnn~o1 CQin os proprlctllrlosda terra. multo m•is relevonte do l[UC n "nndnna- hdade'•. O poder burocrático que se desenvolveu, ll pnHir de 1850 , foi fundamentalmente urna afirmaçao simbólica da or- dem ptlblica, na medida em que,"" pr.ltica, a populuçao- r.scravos e brancos livres - conLinuou devendo lt:tldudc aos "senhores locai.<" (Reis, 1 983). Apogeu da economia mercantil e dedfnio do tral.>allttl servil (lBJD-1888!89) Em meados do século XlX, o capitalismo mundial sob ltde- rança da Grã'Bretomha estimulou aexportaçaodecoplluls e bens de produção, configurando a clássica era do "imperialismo Informal". Nem todos os Sstados lalfno-americanos fomm alvo 59 dessas exportações de capíud, dependendo dos nlveis de orga- nizaçao economlca interna. Brasil e ArgenEinaabsorvenun 60% dos investimentos britânicos na América latina (Silva, 1976). O Estado brasileiro, do~ado de capacidade de sustentar uma economia exportadora, inclusive oferecendo garantia de juros a empréstimos estrangeiros, penniciu novos anuxos de capi- tais ingleses. no momento em que terminava o conOito pela abolição do tráfico de escravos. Mais uma vez, o Brasil se vinculou à potrncia tecnologica- mente avançada na fpoca, a Grã-Brewnha. Este fa to favoreceu sua inserçao na economia internacional e a utllfzação do pro- gresso técnico do século XIX, represenumdo a possibilidade de um suno econômico exportador, impossível de se dar no qua- dro colonial. A fase inicial de crise decorrente da suspensão do tràOcodeescravos foi superada. A economiacafccira avançou, do- minando a produção do pais atto primeiro quartel do século XX. Geopolítica im!Jcrial As dificuldades do governo do Brasil imperial não significa· ram que ele perdesse de vista a importância do controle terri- torial. No momento c:l~ Independência, os limlces do BrasiJ não estavam, nem de.flnidos, nem demarcados, e a sua definição ocorreu, em grande parte, como conseqü~ncia dadispma entre Grã-Bretanha e França pelo controle do comércio e da navega- ção das duas grandes bacias que delimitnm o território brasi- leiro, a do Rio da Prata e a do Amazonas. O próprio Estado mostrou um Interesse crescente nestas áreas na sua geopoUtica para estas bacias. Na Bacia do Prnta, desde o inicio do séculDXVIl se chocavam interesses ingleses e franceses aliados, respectivamente, a por- tugueses e espanhóis pelo controle da navegação e do com~rdo 60 de pmta e do couro. No século X VIl ampliaram-se os interesses brasileiros pela navegação do Rio da Praoa, enquamo passagem para sua longinqua provincia oddemal, Mato Grosso, apossa· dn durante. o ciclo do OUTO. Os conOitos rronl ç.iriços com a Argentina resultaram na formação do Uruguai ( 1828) como república independente entre as duas rorç-as riv:tls. A colonização dirigida, forma de controle do tCITitOrio nas 111 easde fronteira sul e norte utiliwdadesdco pcrlodo colonial, r,,; o artl[ido empregado pelo governo Imperial pam d<fesa das duas provlnclJ!s meridionais que, Isoladas por gm11dt> Oores- ws, est.avam SL~eitM a ataques dos argentinos pelo sul e dos l11dios pelo interior. O novo tipo de colono dc•crla s~r umto um "'!dado, como um agricultor, pam poder defender e cultivar <ua terra. Soldados desengajados dos exércitos de Napoleão e ramponeses pobres oprimidos da Europa Centml, princ1pal· mente alemães, r oram os novos colono$. isto ê, pequenos pro· príetári.os familiares (Waihel, 1958). Iniciada ainda na década de l820, 1ogo após a Independência, a colonizaçl\0 esLrangelra permaneceu fraca até a extinção do tráfico de escravos em l850, expandindo-se rapidamente a partir de então. A politica de auto-suficiência econômica e establlidnde po- htlca adotada pelo Paraguai, pais continenLnl dependente do porto de Buenos Aires, não interessou ao Brasn e ã Argentina. Quando Sol ano lópez pr.sslonou o Uruguai para abrir o aces· "'ao mar, desencadeou-se a maior guerra no con•lnentc su~ nmerlcano ( 1864/1868) ~ntre Brasil, Argentina e Uruguai, cn- rorajados e financiados pela lngLucrra, contra o Pamguai. O Orasil c seus aliados foram vitoriosos, mas à custa de 140.000 I cridos e 33.000 monos e de esvaziamento nnanceiro. O Para· guai foi mutilado, perdendo quase toda a sua popul.açao mas- culina na guerra e a partir de ent.ão jamais conseguiu se reer- ~uer. A viLOria sangrcma foi o úlllmo lance do Brasil para de- linir seus limites meridlon<tis. ParadoX11lmcmc:, a polltica imperial para a vasta e distante llacia Amazônica foi oposta :lqLiela empregada no Rio da Pmta. 61 O Brasil tentou barrar a livre navegação e as incursões externas, sendo capaz de reter ~ área grnças às dispu1as entre a< potên- cias estrnngelras. No século XVID. com a finalidade de excluir a França,a Grã-Bretanha apoiou as reivindicações portuguesas no Amazonas. Na segunda metade do seculo XIX, o desenvol- vimento da economh'l da bonacha lrouxe â ârea os interesses norte-americanos. Atravl!s da export<lção da borracha, a região velo a se integrar ao mercado internacional antes mesmo de se Integrar ao resto do Brasil. Nilo obsumtea rcsisU!nciasimbóUca do governo central, em 1867 o Rio Amazonas foi aberto à livre navegaçao. O fim da escravidão e do império Em meados do sé.culo, o mêdio e o aho curso do Vale do Paralba concenb-avam a produção cafcelra e a riqueza do pais- Os preços no merctdo internacional, apesar de oscilantes, man· tiveram a expans~o da produção, que era, contudo, limitada pelos crescentes custos do mmspone e dos escravos.