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POTENCIAL ZOONÓTICO DA PSITACOSE (CLAMIDIOSE AVIÁRIA)

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POTENCIAL ZOONÓTICO DA PSITACOSE (CLAMIDIOSE AVIÁRIA) EM 
HUMANOS 
Marcus Vinicius Lopes Abelha 
Graduação em Medicina Veterinária - Faculdade de Americana (FAM) 
 
Patrícia Biegelmeyer 
Docente na Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) 
 
mvabelha@gmail.com 
 
RESUMO 
A clamidiose aviária é uma doença infecciosa endêmica no Brasil, que tem predileção na 
afecção de psitacídeos dentro da ordem de aves e possui como agente etiológico a bactéria 
Chlamydophila psittaci. Conhecida também como febre do papagaio ou ornitose quando 
acomete outras espécies de aves, ou psitacose quando atinge o homem, é apontada como 
a principal zoonose transmitida por aves silvestres, e tem seu crescimento paralelo ao 
mercado de compra de psitacídeos como pets no Brasil, seja de forma legal ou através do 
tráfico. Diante do exposto, este trabalho objetivou realizar uma revisão bibliográfica 
sobre aspectos da psitacose e o crescimento da transmissão zoonótica da clamidiose 
aviária para seres humanos. As pesquisas foram realizadas utilizando-se bases de dados 
como SCIELO e Google Acadêmico, buscando-se trabalhos científicos relacionados ao 
tema. A C. psittaci apresenta nove sorovariedades, sendo duas mais conhecidas por afetar 
psitacídeos e raramente podendo afetar diversos mamíferos, incluindo os humanos: os 
sorotipos A e F. No ser humano a psitacose é transmitida principalmente através da 
inalação da bactéria em poeira com resquícios de secreções ou fezes de animais 
contaminados. A falta de estudos e, consequentemente, conhecimento na área, ainda 
dificulta a detecção de sintomas característicos nas pessoas, tendo como norte uma 
mailto:mvabelha@gmail.com
 
 
 
pneumonia severa e atípica. A adoção de uma abordagem multiprofissional, envolvendo 
médicos veterinários e profissionais da saúde em geral, para o diagnóstico é essencial. 
Nesse sentido, torna-se de extrema importância o investimento em pesquisas, na 
capacitação de profissionais e no sistema multiprofissional, além do desenvolvimento de 
programas de sanidade animal específicos. 
 
Palavras-chave: animais de companhia; aves silvestres; Chlamydophila psittaci; 
psitacídeos; zoonoses. 
 
INTRODUÇÃO 
 
A busca por psitaformes como animais de estimação é crescente no Brasil. Boa 
parte destes animais são oriundos do tráfico, o que os posiciona como uma das ordens 
mais afetadas pelo comportamento humano e se torna um constante problema enfrentado 
pelas organizações de proteção (GODOY, 2007; LOPES, 2016). Atualmente existem 
1919 espécies de aves catalogadas no país, sendo assim um dos mais ricos do mundo em 
fauna de aves (COMITÊ BRASILEIRO DE REGISTROS ORNITOLÓGICOS, 2021). 
De acordo com estudos, cerca de 800 mil pássaros dessa ordem são traficados anualmente 
(ACOSTA, 2004). Esse estreitamento na convivência entre humanos e aves silvestres, 
não só coloca em perigo a sobrevivência das espécies, como também serve de 
potencializador para o desenvolvimento e transmissão de novas doenças zoonóticas 
(SCHERER et al., 2021). 
A clamidiose é uma enfermidade zoonótica e infectocontagiosa, causada pela 
bactéria Chlamydophila psittaci, que afeta não apenas aves, mas também mamíferos, 
incluindo o ser humano. No caso dos humanos, essa patologia é conhecida como Psitacose 
(RASO, 1999; DIAS, 2021) e é a principal zoonose proveniente destes animais 
(CARVALHO, 2012). A prática cultural da criação de aves silvestres, muitas vezes sem 
 
 
 
procedência legal, é uma porta de entrada para a disseminação dessa doença (GRESPAN, 
2007). Parte das aves tidas como pets no Brasil não são de origem nacional, como é o 
caso da calopsita (Nymphicus hollandicus) que, pela facilidade na aquisição e baixo custo, 
se popularizou como animal de companhia (GRESPAN, 2007), e faz parte da ordem 
Psittaformes, principal vetor da doença (CUBAS et al., 2014). 
Diante do exposto, este trabalho objetivou realizar uma revisão bibliográfica sobre 
aspectos da psitacose e o crescimento da transmissão zoonótica da clamidiose aviária para 
seres humanos. 
 
METODOLOGIA 
 
O presente trabalho foi realizado através de uma revisão bibliográfica, em caráter 
de pesquisa exploratória, por meio de buscas de materiais realizadas na Scientific 
Eletronic Library Online (SCIELO) e Google Acadêmico, nos quais foram escolhidos 
teses, dissertações, artigos científicos e outros materiais desenvolvidos até o momento 
sobre o tema pesquisado. A pesquisa dos materiais para a elaboração deste estudo ocorreu 
utilizando palavras-chaves como: “psitacose”, “clamidiose aviária”, “zoonose”, 
“Chlamydophila psittaci”, e “psitacídeos”. 
 
RESULTADOS E DISCUSSÕES 
 
O agente etiológico, Chlamydophila psittaci, é uma bactéria gram-negativa, 
intracelular obrigatória, possuindo sete sorovariedades que afetam aves e duas que afetam 
mamíferos (WC e M56) (RASO, 2014). A diferenciação de sorotipos com afinidades 
maiores para determinadas espécies foi realizada através da descoberta de anticorpos 
monoclonais específicos (VILELA, 2012). Na maioria dos casos, mais de um teste deve 
ser utilizado, graças às características específicas dessa bactéria e a lacunas no 
conhecimento dessa afecção (VILELA, 2012). 
 
 
 
A transmissão para humanos ocorre, principalmente, através de aerossóis, onde a 
bactéria está presente em secreções e fezes das aves e tem como principal acesso as vias 
respiratórias (DIAS, 2021). Existem casos de transmissão de uma pessoa para outra, mas 
não são comuns (HUGHES et al., 1997). Tutores de psitacídeos e profissionais que 
possuem contato direto com aves, tais como veterinários, biólogos, trabalhadores de 
granjas avícolas e abatedouros são evidenciados como população de risco para a 
contração da doença. A C. psittaci possui particularidades no período de incubação e, 
dependendo da cepa envolvida, a virulência também varia, podendo se desenvolver no 
homem com período de incubação de 5-15 dias (MOSCHIONI et al., 2001). 
Nas aves, os agentes podem ser encontrados no sangue, penas, vias respiratórias, 
cloaca e tecidos, e podem eliminar a bactéria de forma intermitente mesmo que não 
apresentem sintomatologia (SPRADA et al., 2008). Isso pode ocorrer por diversos 
fatores, sendo os principais a idade das aves ou a exposição destas a situações de estresse 
(RASO, 2014). Sem sintomas evidentes, as aves infectadas apresentam principalmente 
sonolência e facilidade de remoção de penas. Das quatro formas conhecidas (superaguda, 
aguda, crônica e inaparente), apenas a aguda e a crônica demonstram sintomas 
(SCHERER et al., 2021). 
A sintomatologia nos humanos, não é tão conhecida como nas aves. O principal 
sintoma conhecido é uma pneumonia mais rigorosa e que não age de forma usual 
(SCHERER et al., 2021). Outros sintomas como estado febril, calafrios, diarreia e 
anorexia, dentre outros, também já foram apresentados por pessoas positivadas 
(MOSCHIONI et al., 2001). 
Em casos suspeitos de psitacose, o sangue coletado irá apontar ou não para a 
presença de anticorpos anti-C. psittaci IgA, IgG e IgM (FERREIRA, 2016). Nestes casos, 
faz-se de grande valia, dentro das possibilidades, a análise molecular de C. psittaci nas 
aves com as quais a pessoa tenha contato. O tratamento de eleição em humanos é a base 
 
 
 
de tetraciclinas (oxitetraciclina ou doxiciclina), e as doses e frequência variam de acordo 
com o acometimento da bactéria no organismo (MOSCHIONI et al., 2001). 
Muitos dos animais silvestres resgatados oriundos do tráfico possuem doenças 
epizoóticas ou zoonóticas. Com o estreitamento da relação de humanos com espécies 
selvagens, a tendência é que haja também da transmissão de doenças de um para o outro 
(SCHERER et al., 2021). Apesar de ser uma zoonose de risco considerável, os órgãos 
governamentais ainda não possuemuma fiscalização recorrente ou um tratamento padrão 
para a situação. Ressalta-se, portanto, a importância do desenvolvimento de mais 
pesquisas e estudos para um adequado monitoramento da clamidiose em aves, e para 
elaboração de programas de controle e profilaxia e de protocolos de tratamento mais 
eficientes, como forma de minimizar suas possíveis complicações tanto sob o ponto de 
vista da saúde animal como da saúde humana (FERREIRA, 2016). 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
A psitacose é uma zoonose ainda pouco conhecida, mesmo entre os profissionais 
da saúde. Por se tratar de uma área com pouco investimento científico, muitas vezes não 
é possível a obtenção de um diagnóstico preciso. A patologia está cada vez mais presente 
na rotina de hospitais humanos e veterinários, fazendo-se necessário o investimento em 
pesquisas, na capacitação de profissionais e no sistema multiprofissional, que torna 
possível o trabalho em conjunto do médico veterinário com outros profissionais da área 
da saúde. O desenvolvimento de programas de sanidade animal voltados ao 
monitoramento da clamidiose em aves auxiliariam na detecção, prevenção e controle 
desta zoonose. 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
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