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O CONTADOR E A ÉTICA PROFISSIONAL AULA 1 Profª Daiane Lolatto 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula, será estudada a definição de ética, moral e direito, suas diferenças e semelhanças. Serão abordadas ainda a tomada de decisões na relação entre o legal e o moral, a formação moral de uma entidade corporativa, a entidade e a disseminação da cultura ética e a relação ética da entidade com os seus stakeholders. Mas, por que estudar ética na contabilidade? A ética é uma condição necessária para a sobrevivência em sociedade. Inúmeros são os casos noticiados pelos meios de comunicação de corrupção, fraudes, subornos, nepotismo. Essas práticas afetam a todos, a Administração Pública, a empresa privada e a sociedade em geral. Arruda, Whitaker e Ramos (2017, p. 3) mencionam que a falta de valores morais é o pior dos males que podem afetar uma sociedade. Segundo os autores, ela é como o câncer que se dissemina por um organismo. A ausência de moral destrói o clima de confiança que deve integrar o relacionamento social, tornando insustentável o convívio em sociedade. Matos (2017, p. 11) afirma que “Ser ético, no contexto atual, não é mais uma opção tanto para as pessoas quanto para as organizações, é questão de sobrevivência”. Assim, faz-se necessário compreender o comportamento ético nas relações empresariais e, principalmente, no caso, a ética profissional do contador. CONTEXTUALIZANDO Suponha-se que um profissional contábil realize consultoria na área de custos e esteja negociando uma prestação de serviços com um grande cliente. Durante a negociação, obteve informações sigilosas a respeito da estrutura de custos de produção do cliente. No entanto, o contrato não foi firmado, isto é, os serviços do profissional não foram contratados. Então, o profissional contábil considerou-se desobrigado de guardar sigilo das informações obtidas na negociação com o grande cliente e comentou a situação com um amigo que estava planejando empreender no mesmo ramo daquele cliente. Nesse contexto, a atitude do contador foi ética? Qual o seu impacto social? 3 Saiba mais • Sobre os desafios éticos do trabalho contábil, consulte Nunes et al. (2019). TEMA 1 – ÉTICA, MORAL E DIREITO: DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS A palavra ética significa a forma de ser de uma pessoa sem que esta prejudique outros indivíduos. A ética compreende o conjunto de valores morais e princípios que conduzem a conduta humana na sociedade e serve para equilibrar o relacionamento social. A ética acompanha as mudanças da sociedade, as transformações de cada época e varia de acordo com um grupo de indivíduos. Uma das transformações éticas notáveis foi decorrente da evolução tecnológica, pela qual o indivíduo passou a ter acesso mais rápido às informações e maior facilidade de divulgar aquilo que lhe interessa. Dessa forma, surge a necessidade de se estabelecer limites éticos para o uso da tecnologia, por exemplo, impondo-se restrições à divulgação de fake news. Assim como a ética envolve o caráter pessoal de um indivíduo, ela também está presente no meio corporativo. É por isso que as empresas elaboram códigos de ética, para que sua equipe possa trabalhar em harmonia. Logo, tem-se a ética empresarial. Santos (2019, p. 4) expõe que a ética corporativa ou empresarial “[...] varia conforme a empresa ou o ambiente em que uma empresa está inserida, pois é reflexo da sociedade, dos produtos que comercializa, da cultura interna e de outros fatores que compõem este ambiente”. Para determinada empresa, o uso do celular durante o horário de trabalho pode ser considerado uma conduta ética, enquanto para outra empresa a sua utilização pode ser proibida, em virtude de atrapalhar o andamento das atividades. Outra situação que envolve a ética empresarial é a prática do preço predatório, que se refere à redução do preço de venda de um produto ou serviço abaixo do preço de custo, utilizada pelas empresas que visam a eliminar os concorrentes ou conquistar mercado. Do ponto de vista da empresa que realiza essa operação, ela pode ser apenas uma estratégia de negócio, considerada ética. No entanto, diante dos concorrentes, a prática é lesiva, afeta seus negócios e, então, conclui-se que há na prática uma atitude antiética. 4 No meio empresarial, surge a figura do profissional contábil. As práticas empresariais éticas ou antiéticas se refletem no trabalho do contador, pois as operações realizadas serão escrituradas. Entretanto, esse não é o único tipo de envolvimento ético entre empresa e profissional contábil. Suponha que, na busca por melhores resultados, os empresários ou gestores solicitem ao contador que sejam feitos ajustes nos lançamentos contábeis, a fim de se reduzir a carga tributária da organização. Ao se reduzir a carga tributária de forma ilícita, manipulando-se as informações contábeis, há uma atitude antiética tanto por parte da empresa quanto por parte do contador. Consequentemente, a fraude tributária poderia resultar em um passivo para a empresa, levando-a à falência e até a um possível suicídio do empreendedor ou investidor. Saiba mais • Sobre o enfoque ético da busca por resultados, consulte Oliveira et al. (2012). A palavra ética tem origem grega: ethos, que significa a forma de um indivíduo ou um grupo agir. Com o desenvolvimento humano, o conceito de ética evoluiu, sendo ela considerada um conjunto de princípios e valores morais que guiam a conduta humana na sociedade. A moral compreende os costumes, regras, limites e convenções estabelecidos pela sociedade. Sendo assim, a moral é uma convenção social e a ética, a postura de um indivíduo. Nesse contexto, tem-se o direito como sistema de normas de conduta e princípios estabelecidos para regular as relações sociais. Isso quer dizer que a moral engloba a ética e o direito, conforme se observa na Figura 1. 5 Figura 1 – Relação entre ética, moral e direito A ética permite uma melhor vida em sociedade, pelo respeito mútuo dos indivíduos. Considerando que a ética se refere à forma como um indivíduo ou um grupo de indivíduos (em uma empresa, por exemplo) entende ser correto se posicionar e agir perante outros indivíduos e a sociedade como um todo. E, sabendo-se que uma organização é formada por indivíduos oriundos de diferentes contextos culturais e sociais, é fundamental estabelecer um padrão ético para o grupo social de uma empresa, demonstrando qual é a postura que se espera de todos os integrantes desse grupo (colaboradores, sócios etc.). Essa definição de conduta, em nível institucional, se dá por meio de políticas institucionais. Essas, por sua vez, são definidas por normativos, códigos de ética e códigos de conduta. Considerando os modelos de gestão contemporâneos e as boas práticas de governança recomendadas, segundo Santos (2019, p. 5), as políticas institucionais devem ser construídas levando em consideração as cinco dimensões da ética empresarial e de pesquisas: sustentabilidade, respeito à multicultura, aprendizado contínuo, inovação e governança corporativa. Nesse sentido, serão abordadas, na sequência, as dimensões éticas que norteiam a conduta humana, na sociedade. 1.1 Dimensões da ética empresarial Conforme mencionado por Santos (2019, p. 6), dentre as dimensões da ética empresarial consideradas na construção das políticas institucionais, a dimensão da sustentabilidade consiste em gerar condições para um processo ser executado ou para um indivíduo ou objeto existir. Sendo assim, para uma Moral Relativa aos costumes Ética Princípios e valores morais Direito Conforme a lei, o sistema de normas 6 empresa operar, basicamente, deve haver recursos humanos, bens de uso e consumo, matérias-primas e tecnologias, além de recursos econômicos e financeiros que propiciem a produção de produtose serviços. A sustentabilidade abrange os aspectos econômico, social e ambiental, o que é denominado de triple botton line (linha de três pilastras), conceito criado em 1990 pelo inglês John Elkington (1990, citado por Santos, 2019, p. 5). As intersecções entre esses aspectos são chamadas de socioeconômica, socioambiental e ecoeficiente, conforme se pode observar na Figura 2 a seguir. Figura 2 – Intersecções do triple botton line na sustentabilidade organizacional O aspecto ambiental envolve ações que diminuem o impacto ambiental como forma de garantir o bem-estar social. Por exemplo, uma indústria que produz papel e celulose deveria analisar seu consumo de insumos utilizados na produção e que impactam negativamente o meio ambiente e, assim, tomar medidas de recuperação ambiental. Outra preocupação que as empresas deveriam ter, com a finalidade de garantir o bem-estar da comunidade, seria com buscar melhorias no processo de produção, evitando desperdícios, como na produção de garrafas plásticas em que as sobras pudessem ser reaproveitadas na produção de copos. Assim, é necessário desenvolver métodos para calcular o impacto causado no meio ambiente, com o objetivo de compensar o dano provocado, por exemplo: uma empresa que é altamente poluidora precisa medir o nível de emissão de poluentes para compensar isso com reflorestamento de algumas áreas. A empresa precisa elaborar políticas institucionais éticas, orientando os Ambiental SocialEconômica Socioambiental Socioeconômica Ecoeficiente 7 colaboradores com propostas preventivas ou corretivas do seu processo de produção. Quanto ao aspecto econômico, uma empresa não existe ou sobrevive sem ele, por isso ele é um dos tripés da sustentabilidade. Há dois erros críticos que podem ocorrer: o primeiro seria o de focar exclusivamente no aspecto econômico e desprezar os demais; e o segundo seria o de a empresa não se atentar a esse aspecto e desperdiçar insumos, por exemplo. Diferentemente do desperdício de insumos mencionado no aspecto ambiental, que envolve o dano causado ao meio ambiente, no sentido econômico tem-se o desperdício como fator de prejuízo econômico-financeiro. O aspecto social compreende as relações internas (de colaboradores, gestores etc.) e externas (com clientes, fornecedores, investidores etc.) da empresa, ou seja, a empresa deve manter relações morais com os interessados no negócio. Por exemplo, quando uma empresa é sustentável, sua relação com o cliente tende a ser favorável com aquele que está preocupado com o meio ambiente e isso ainda melhora sua reputação no mercado, pois estará beneficiando a sociedade como um todo. Atitudes antiéticas relacionadas ao aspecto social envolvem suborno na venda de mercadorias, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, entre outras. Nesse sentido, os aspectos social, ambiental e econômico estão interligados, como demonstrado na Figura 2, socioeconômica, socioambientalmente e em termos de ecoeficiência. O aspecto socioeconômico, nas políticas institucionais, tem como objetivo garantir que o interesse social não se sobreponha ao interesse econômico ou vice-versa – é o caso do aumento da capacidade produtiva que beneficiaria tanto a empresa quanto a sociedade que consome o produto. Quanto ao aspecto socioambiental, tem-se o caso do desperdício de insumos, que afeta a situação econômica e ambiental da empresa, devendo ser evitado. A ecoeficiência, por sua vez, visa fornecer bens e serviços por preços competitivos, sem impactar o meio ambiente. A dimensão da multicultura se refere ao respeito empresarial diante das diferenças individuais dos cidadãos que estão ligados à empresa. Segundo Santos (2019, p. 13), ao considerar essa dimensão nas suas políticas institucionais, a empresa estará oportunizando relações internas e externas mais 8 saudáveis, pois minimizará as diferenças culturais, religiosas, étnico-raciais e outras. A dimensão do aprendizado contínuo é de suma importância para o desenvolvimento ético, pois as mudanças sociais precisam ser acompanhadas, estudadas para criação de novas políticas institucionais. Isso quer dizer que as políticas institucionais demandam atualizações em virtude das transformações sociais. Por exemplo, as políticas institucionais criadas antes da existência da tecnologia podem não ser as mesmas após a evolução tecnológica, pois é necessário, sempre, se compreender um novo contexto social e adaptar as políticas então vigentes. A dimensão da inovação é consequência do aprendizado contínuo, ou seja, ela está presente no desenvolvimento de novas tecnologias e processos. A inovação precisa ser realizada de forma organizada, a fim de atender às necessidades da instituição e da sociedade. Por exemplo, visando inovar de forma ética, a empresa pode desenvolver carros autônomos voltados a reduzir os acidentes causados em rodovias. A empresa que desenvolve ou produz esses veículos precisa incluir na sua programação uma série de situações decisórias. Outro exemplo de ética na inovação está na garantia de sigilo no acesso a informações pessoais pelas empresas que desenvolvem redes sociais. Por fim, a dimensão da governança corporativa, conforme o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC, 2015, p. 20-21) envolve transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa nas ações organizacionais. Transparência tem relação com a confiança interna e externa da organização e com ela fornecer informações aos stakeholders além das que já são uma obrigação legal. A transparência proporciona maior confiança entre a empresa e os stakeholders, pois, com todos tendo acesso às informações econômico-financeiras da organização, a tomada de decisões tende a ser mais assertiva. Quando a empresa oculta informações como perdas com créditos de liquidação duvidosa, os investidores acabam mantendo relação com a empresa sem saber que os recursos investidos podem ser perdidos. Equidade refere-se ao equilíbrio de interesses de diferentes stakeholders. Ou seja, as informações disponibilizadas para tomadas de decisão devem colocar os stakeholders no mesmo patamar, isto é, os usuários internos não devem se valer de informações privilegiadas em relação às informações 9 prestadas aos usuários externos. Nesse caso, os investidores precisam ter acesso às informações da empresa para que consigam analisar o retorno dos seus investimentos. Se a empresa restringir esse acesso, não estará sendo ética com os investidores, que podem vir a tomar decisões equivocadas. Prestação de contas refere-se a responsabilidades e deveres do gestor do negócio: em caso de ocorrer uma fraude ou qualquer situação ilegal ou de má conduta, se responsabilizará diretamente quem está na gestão do negócio. Por isso, se faz necessária a prestação de contas de todos os atos e decisões tomadas em nome da empresa. Responsabilidade corporativa está relacionada à perenidade do negócio e considera aspectos de ordem ambiental e social. O meio ambiente tem sido preocupação constante para a maioria dos cidadãos e, quando a empresa desempenha um bom papel na preservação ambiental, ela está demonstrando sua responsabilidade corporativa. TEMA 2 – TOMADA DE DECISÕES: RELAÇÕES ENTRE O LEGAL E O MORAL A palavra moral tem origem no latim mor, moris, que significa usos e costumes. Há diversos conceitos para moral, mas, em suma, ela compreende o respeito do indivíduo às regras morais estabelecidas na sociedade. Logo, a moral é uma espécie de limite da conduta dos indivíduos. Mesmo sem o indivíduo conhecer as regras, ele se sente bem ao realizar ações morais. Embora envolva o direito e a ética, a moral é uma norma estabelecida pela sociedade por consentimento de um grupo de pessoas. Há a preocupação do indivíduo personificada na sociedade em geral. O conceito de moral muitasvezes se confunde com o de legalidade. A legalidade é constituída mediante lei. Uma ação pode ser moral e ilegal ao mesmo tempo, como é o caso de se ultrapassar o sinal vermelho após a meia- noite, que, apesar de ser ilegal, é uma atitude moral, pois evita assalto ou qualquer risco oriundo da espera pelo sinal verde. Uma ação pode ser, ainda, legal, mas imoral, como é o caso do uso de determinados pesticidas. E a ação pode ser legal e moral quando por exemplo uma empresa produz materiais biodegradáveis. Sendo assim, é necessário refletir: o que afeta o meio externo? Quais os efeitos negativos gerados por uma atitude tomada? Quem é beneficiado e quem será prejudicado por essa atitude? 10 Saiba mais • Leia o artigo A ética aplicada para o sucesso nos negócios (Godinho; Cambaúva; Mak, 2006), para compreender melhor o assunto. TEMA 3 – FORMAÇÃO MORAL DE UMA ENTIDADE CORPORATIVA Impasses no comportamento moral ocorrem até nas situações mais simples da vida, assim como nas mais complexas e de extrema responsabilidade; ocorrem tanto nas relações sociais comuns como nas relações empresariais e profissionais (Camello; Ribeiro, 2019, p. 248). Na situação hipotética a seguir, observa-se um dilema no comportamento moral, em uma relação entre empresa e um de seus funcionários: • Pedro é contador na empresa Lunar há dez anos e dedica-se ao máximo para manter a confiança da empresa. A Lunar tem significativa representatividade no mercado de materiais de construção e busca por resultados cada vez mais desafiadores. Ainda assim, Pedro recebia um salário mediano e sustentava uma família de três filhos com dificuldade, pois se tratava da única renda dessa família; • Em determinado dia, ao final do expediente, Pedro foi chamado à sala da diretoria para receber a notícia de que seu salário iria aumentar, assim como receberia uma bolsa de estudos para os filhos, em razão do seu comprometimento com a empresa. Entretanto, o diretor financeiro apresentou uma condição. Pedro teria que superfaturar notas fiscais por motivos desconhecidos. Ele sabia que, se não fizesse o solicitado, seria desligado da empresa. Nesse contexto, qual o dilema moral? De um lado, Pedro perde o emprego ao não atender à solicitação do diretor e, de outro, teria que aceitar superfaturar as notas fiscais e contrariar o seu caráter e consciência. Então, surgem as seguintes inquietações: como sustentar a família? Como ficar com a consciência tranquila? Pedro está diante de um dilema moral comum, de extrema responsabilidade. Camello e Ribeiro (2019, p. 252) afirmam que “Em todas as situações sempre estará em jogo um valor moral a preservar ou a corromper para benefício pessoal ou do grupo”. A empresa em questão agiu de má-fé, de forma imoral; mas, o que forma a moral de uma entidade corporativa? Segundo Thiry-Cherques (2003, p. 31-50), 11 a responsabilidade moral das empresas limita-se ao direito, à obrigação de responder perante a lei. A empresa, por ser uma pessoa artificial, jurídica, não tem consciência, é amoral. As pessoas que formam a empresa constituem a sua moralidade, como o caso do diretor financeiro, no exemplo supracitado. Portanto, a responsabilidade moral pertence aos seres humanos. Se o contador é conivente com a proposta de superfaturar nota fiscal, ele também responderá pelo crime. O superfaturamento pode caracterizar lavagem de dinheiro, por exemplo. De acordo com o art. 172 do Código Penal, “emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado” gera pena de dois a quatro anos de prisão e multa (Brasil, 1940). No caso do contador, pode haver cassação do seu registro profissional. Para Thiry-Cherques (2003, p. 31-50), a dificuldade de agir de forma moral no plano empresarial é maior do que no plano individual, “pela quantidade de instâncias com as quais as pessoas têm deveres e pela contradição entre os interesses de umas e de outras”. O autor ainda questiona: “um dirigente é mais responsável perante os empregados ou perante os acionistas? Um empregado deve ser fiel aos colegas ou a sua família?”. Saiba mais • Para mais informações sobre a moral empresarial, leia em sua íntegra o artigo de Thiry-Cherques (2003), intitulado Responsabilidade moral e identidade empresarial. TEMA 4 – A ENTIDADE E A DISSEMINAÇÃO DA CULTURA ÉTICA As obrigações éticas são estabelecidas por meio do direito, que é um sistema de normas de conduta e princípios estabelecidos para regular as relações sociais. Com base no direito, são criados os códigos de ética. No entanto, o código de ética não é o único meio de instaurar a ética na empresa, ou seja, a empresa pode desenvolver outros meios de conscientização de valores morais especificados em diretrizes de ética. A ética empresarial ganhou notoriedade com escândalos mundiais que demonstraram comportamentos imorais praticados pela administração dos negócios. Muitos casos abalaram a sociedade civil e geraram também novas maneiras de gerir um negócio, em um mundo cada vez mais competitivo. 12 Arruda, Whitaker e Ramos (2017, p. 213) afirmam que, quando a administração adota princípios éticos, claramente definidos, “[...] os padrões morais são respeitados, as energias dos empregados se concentram e o resultado é um ganho de produtividade”. Quando a empresa não adota os princípios éticos, “as práticas pouco éticas são conhecidas e por vezes se tornam o modus operandi da organização. O ritmo dos negócios sofre um impacto negativo”. Segundo Santos (2019, p. 21), para desenvolver um código de ética ou de normas de conduta não há uma fórmula, porém alguns aspectos devem ser considerados: • Missão, valores e objetivos: devem ser éticos e se refletirem no código de ética. A missão, os valores e os objetivos compreendem um conjunto de ideais que ajudam a determinar as estratégias de negócio de uma empresa, ou seja, o passo a passo adotado pela empresa para atingir os resultados desejados; • Realidade e contexto empresarial: para a elaboração e implantação do código de ética, devem ser analisados o porte da empresa, a atividade desenvolvida, a política interna e inclusive os aspectos externos a ela. Por exemplo, se a empresa é de pequeno porte e não possui relação com investidores externos, não tem motivo para abordar, no seu código de ética, aspectos sobre sua relação com investidores; • Aspectos legais: o código de ética deve atender à legislação vigente no país; • Comunidade interna: a elaboração do código demanda a participação de todos os envolvidos com a empresa. Em casos de empresas de grande porte, deve-se avaliar o envolvimento de alguém que represente de fato a sociedade; • Comunidade externa: recomenda-se a participação da comunidade externa no desenvolvimento e revisão do código com a finalidade de aumentar a transparência. A participação pode ser pequena, mas será contributiva; • Multicultura, aspectos étnicos e religiosos: para proporcionar um ambiente ético e incentivar o progresso do grupo, é importante o respeito à multicultura, aos aspectos étnicos e religiosos de todos os envolvidos 13 com a empresa, como colaboradores, clientes, fornecedores, entre outros; • Tratamento equitativo de todos, considerando-se as desigualdades: as empresas devem tratar a todos de forma equitativa, buscando minimizar as desigualdades, ou seja: independentemente da cultura, etnia ou religião das pessoas ligadas à empresa, o tratamento dispensado a elas deve ser o mesmo, sem privilegiar ninguém. O código de ética é uma ferramenta de gestão educativa, pois estabelece regras a serem seguidas por aqueles que têm relação com a empresa. Assim, com ele é possível obter uma conduta adequada no desenvolvimento das atividades empresariais. Por outro lado, o código de ética, comoqualquer ferramenta de gestão educativa, deve estar em contínua renovação, com complemento de aprendizagens vindouras sobre as relações sociais, a busca de harmonia, pontos de afinidade e foco, elementos essenciais no meio empresarial (Matos, 2017, p. 177). De acordo com Matos (2017, p. 179), há três dimensões fundamentais a serem contempladas num código de ética: dimensões preventiva, corretiva e educativo‐saneadora. A dimensão preventiva expressa as normas éticas no sentido educativo, para prevenir situações críticas. Por exemplo, o código de ética pode determinar políticas de restrição de uso de computadores da empresa para atividades pessoais. Assim, a empresa pode coibir que suas informações sigilosas sejam repassadas a terceiros e, consequentemente, nenhuma sanção será aplicada aos colaboradores. A dimensão corretiva contempla as normas éticas no sentido educativo- diagnóstico de problemas detectados e para orientação e auxílio em prol de suas correções. Nesse caso, a empresa, em caso de ter infringido o Código de Defesa do Consumidor, mas houver estabelecido em seu código de ética que qualquer dano causado a terceiros deve ser reparado, isso pode estimular a troca de mercadorias danificadas como prática corretiva. A dimensão educativo-saneadora tem como objetivo garantir a qualidade e excelência, por meio de punições. Essa situação é mais grave e deve ser contemplada no código de ética para que as atitudes antiéticas sejam 14 punidas. Por exemplo, quando um colaborador desvia recursos da empresa, deve haver uma abordagem prevista para que tal prática não se repita. Sendo assim, observa-se a amplitude e importância do código de ética para o mundo corporativo. TEMA 5 – A RELAÇÃO ÉTICA DA ENTIDADE COM OS SEUS STAKEHOLDERS Os stakeholders são os interessados na empresa. Eles podem ser pessoas físicas ou jurídicas, representantes da sociedade, concorrentes, investidores, governos, entre outros. As relações da empresa com os stakeholders podem ser visualizadas na Figura 3 a seguir. Figura 3 – Empresa e seus stakeholders As empresas, muitas vezes, estão mais focadas na obtenção de lucros do que no impacto que causam no meio ambiente, privilegiando, nesse caso, os investidores e não a comunidade em geral. A questão ética da entidade com todos os stakeholders precisa ser estudada para não prejudicar nenhum dos envolvidos. O papel da empresa é buscar o ponto ideal entre os custos implícitos e explícitos e os benefícios implícitos e explícitos das ações tomadas e informações disponibilizadas. A questão implícita ocorre quando há um jogo de interesses éticos nas atividades da empresa. Por exemplo, quando a empresa investe na prevenção de impacto ambiental, mas não com o interesse de garantir que o meio ambiente Empresa Clientes Fornecedores Concorrentes ComunidadeInvestidores Parceiros Governos 15 não seja degradado e sim com o interesse de captar novos investidores que tenham como premissa garantir o desenvolvimento sustentável. Quanto aos custos e benefícios explícitos, há o conhecimento de o que se quer com a adoção de determinada prática. Pode-se observar essa situação quando a empresa expõe aos colaboradores os resultados alcançados e distribui a eles parte dos lucros, a fim de motivar a equipe. Atender aos interesses econômico, social e ambiental dos diversos stakeholders requer da gestão habilidade e prudência, pois não se deve atender a um grupo específico, em detrimento de outro. Os gestores são intermediadores da relação entre acionistas e stakeholders. O conhecimento amplo da empresa direciona à dimensão moral o que os gestores devem considerar em suas tomadas de decisão (Arruda; Whitaker; Ramos, 2017, p. 215). Silva et al. (2017, p. 21) fizeram uma revisão bibliográfica a fim de apresentar um método de como identificar e classificar os stakeholders, demonstrando o tipo de influência que cada um exerce sobre a empresa, e chegaram à conclusão de que os funcionários e os clientes são os mais importantes stakeholders e os menos influentes são os fornecedores e a comunidade. Para os autores, a atenção dada à comunidade é entendida como algo que pode atrasar os projetos. Nesse sentido, presume-se que haja um conflito de interesses significativo entre o que a empresa quer e o que a comunidade deseja. Por exemplo, pode acontecer de a empresa desenvolver projetos de educação na comunidade, esporadicamente, e a comunidade demandar constantemente esse tipo de investimento. A empresa tende a estar mais interessada no retorno que esse investimento gerará do que especificadamente no desenvolvimento do cidadão. Dessa forma, pode-se dizer que algumas relações entre empresa e stakeholders realmente são mais intensas que outras. Saiba mais • A respeito da relação entre stakeholders e empresa, não deixe de consultar o artigo de Silva et al. (2017). Enfim, o profissional contábil precisa compreender as relações sociais da empresa para nela atuar de forma ética; e deve conhecer o seu código de Conduta, para não ser conivente com operações fraudulentas, por exemplo. 16 TROCANDO IDEIAS Um contador com mais de 20 anos de experiência foi convidado a emitir um parecer a respeito da situação econômico-financeira de uma empresa, aos seus proprietários. Depois de analisar as demonstrações contábeis, o contador verificou que a empresa apresentava significativos indícios de descontinuidade. Entretanto, por conhecer a empresa e ter vínculo de amizade com os gestores, atestou, em seu parecer, que a empresa irá continuar em operação por tempo indeterminado. Com base nessas informações, para você, o contador agiu de forma correta? NA PRÁTICA Um profissional contábil, ao prestar serviços de assessoria para a recuperação de uma empresa, obteve informações sigilosas sobre o processo de fabricação de um produto com baixa rentabilidade. Um investidor, especialista no produto, que tem plano de instalar uma nova indústria, o questionou sobre o segredo do processo de fabricação. O profissional contábil se opôs a repassar as informações solicitadas sobre o produto, ao investidor. No entanto, comentou com os amigos sobre o investidor e sobre o produto. Nessa situação, o contador agiu de forma moral e ética? Resposta esperada: o contador, perante a empresa, agiu de forma imoral e antiética, pois, mesmo com a informação sendo sigilosa, ela foi repassada pelo contador para os seus amigos. FINALIZANDO Existe uma forte relação entre ética, moral e direito. Enquanto a ética estuda os valores morais que fundamentam o comportamento humano em sociedade, a moral está relacionada aos costumes, regras, limites e convenções estabelecidas por cada sociedade. O direito, por sua vez, é aquele que normatiza as atitudes éticas, seja numa empresa, seja na sociedade ou de forma pessoal. Um indivíduo pode enfrentar dilemas éticos na sua tomada de decisões. Manter em sigilo uma informação para não prejudicar uma empresa pode ser ético, porém pode ser imoral num caso de fraude. Cada situação deve ser analisada individualmente. 17 As pessoas que formam a empresa constituem a sua moralidade; elas constroem a ética empresarial, fundamentada no direito, nas leis. É imprescindível que cada profissão mantenha uma conduta ética, que cumpra o seu código de conduta, visto que ele possibilita uma harmonia social. 18 REFERÊNCIAS ARRUDA, M. C. C. de; WHITAKER, M. do C.; RAMOS, J. M. R. Fundamentos de ética empresarial e econômica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2017. BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, p. 2.391, 31 dez. 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 10 abr. 2020. CAMELLO, M.; RIBEIRO, O. M. Ética na contabilidade. São Paulo: Saraiva Educação,2019. GODINHO, H. D.; CAMBAÚVA, G. F.; MAK, A. P. A ética aplicada para o sucesso nos negócios. In: SEMINÁRIOS EM ADMINISTRAÇÃO, 9., 2006, São Paulo. Anais... São Paulo: FEA-USP, 2006. Disponível em: <http://sistema.semead.com.br/9semead/resultado_semead/trabalhosPDF/436. pdf>. Acesso em: 10 abr. 2020. IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Código das melhores práticas de governança corporativa. 5. ed. São Paulo, 2015. Disponível em: <https://conhecimento.ibgc.org.br/Paginas/Publicacao.aspx?PubId=21138>. Acesso em: 10 abr. 2020. MATOS, F. G. de. Ética na gestão empresarial: da conscientização à ação. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. NUNES, V. L. D. et al. Desafios éticos no exercício da profissão contábil: uma análise da percepção dos profissionais de contabilidade. Id on Line: Revista Multidisciplinar e de Psicologia, v. 13, n. 46, 2019. Disponível em: <https://idonline.emnuvens.com.br/id/article/view/1898>. Acesso em: 10 abr. 2020. OLIVEIRA, M. C. de et al. O enfoque ético no gerenciamento de resultados. Revista Contemporânea de Contabilidade, v. 9, n. 18, p. 119-136, 2012. Disponível em: <http://www.spell.org.br/documentos/ver/35451/o-enfoque-etico- no-gerenciamento-de-resultados/i/pt-br>. Acesso em: 10 abr. 2020. SANTOS, F. de A. Ética empresarial. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2019. SILVA, L. G. da et al. Stakeholders organizacionais: Identificação, classificação e um modelo estratégico de tomadas de decisões. Revista Espacios, v. 38, n. 19 17, 2017. Disponível em: <https://www.revistaespacios.com/a17v38n17/a17v38n17p21.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2020. THIRY-CHERQUES, H. R. Responsabilidade moral e identidade empresarial. Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v. 7, p. 31-50, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415- 65552003000500003>. Acesso em: 10 abr. 2020. https://www.revistaespacios.com/a17v38n17/a17v38n17p21.pdf O CONTADOR E A ÉTICA PROFISSIONAL AULA 2 Profª Daiane Lolatto CONVERSA INICIAL Prezado estudante, seja bem-vindo. Nesta aula, estudaremos a nova Norma Brasileira de Contabilidade Profissional Geral, NBC PG 100 (R1), que dispõe sobre o cumprimento do código, dos princípios fundamentais e da estrutura conceitual. Esta norma foi publicada em 21 de novembro de 2019 e entrou em vigor em 1 de janeiro de 2020, assim como a NBC PG 200 (R1) e a NBC PG 300 (R1). Trata-se de uma revisão ao Código de Ética Profissional do Contador, fundamentado no Código Internacional de Ética para Contadores Profissionais, emitido pela Federação Internacional de Contadores (Ifac – International Federation of Accountants). A publicação das NBCs faz parte do processo de convergência aos padrões internacionais. A Federação Internacional de Contadores atribuiu os direitos de realizar a tradução, publicação e distribuição das normas internacionais ao Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e ao Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon). Assim, as normas foram convergidas de acordo com a realidade brasileira. O Código de Ética Internacional para Profissionais da Contabilidade da Ifac está dividido em cinco partes: NBC PG 100 (R1) – Cumprimento do Código, dos Princípios Fundamentais e da Estrutura Conceitual que é a Parte 1 e suas seções de 100 a 199, mais o Glossário; NBC PG 200 (R1) – Contadores Empregados (Contadores Internos) que é a Parte 2 e suas seções de 200 a 299, mais o Glossário; NBC PG 300 (R1) – Contadores que Prestam Serviços (Contadores Externos) que é a Parte 3 e suas seções de 300 a 399, mais o Glossário; NBC PA 400 – Independência para Trabalho de Auditoria e Revisão que é a Parte 4A e suas seções de 400 a 899, mais o Glossário; NBC PO 900 – Independência para Trabalho de Asseguração Diferente de Auditoria e Revisão que é a Parte 5B e suas seções de 900 a 999, mais o Glossário. (NBC PG 100 (R1)). Os princípios fundamentais e a estrutura conceitual serão detalhados na sequência. CONTEXTUALIZANDO Os princípios fundamentais de ética instituem o padrão de comportamento esperado do contador. Considere que determinada empresa entre em contato 3 com um profissional contábil que está no início da carreira. A empresa oferece cinco vezes mais para o contador omitir informações contábeis. O contador precisa angariar clientes para sobreviver no mercado. Assumir a contabilidade da empresa seria uma atitude ética? Que princípio contábil ético está relacionado a esta situação? Saiba mais BARBOZA, E. L.; ROA, M. M. Fluxo de informação no contexto contábil. Revista de Ciência da Informação e Documentação, v. 9, n. 2, 2018. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/incid/article/view/141456>. Acesso em: 16 abr. 2020. TEMA 1 – NBC PG 100 (R1): PRINCÍPIOS ÉTICOS A NBC PG 100 (R1) contempla os princípios fundamentais de ética e a estrutura conceitual aplicável a todos os profissionais da contabilidade. Os princípios éticos estabelecem padrões de comportamento, sendo eles: integridade, objetividade, competência profissional e zelo, confidencialidade e comportamento profissional, que serão tratadas com profundidade ao longo desta aula. A estrutura conceitual, segundo NBC PG 100 (R1), deve ser aplicada pelos profissionais da contabilidade para “identificar, avaliar e tratar as ameaças ao cumprimento dos princípios fundamentais”. Tais ameaças compreendem condutas do profissional que podem interferir no desenvolvimento de seu trabalho, por exemplo, quando o profissional aceita algum incentivo (presente) para manipular as informações contábeis, dentre outros tipos de ameaça que serão estudadas na sequência. A norma aborda os requisitos e o material de aplicação para que o profissional da contabilidade exerça o julgamento profissional. É com base no julgamento do profissional que a continuidade do trabalho poderá ser realizada ou não, como quando o profissional contábil tem competência e experiência suficientes para concluir o trabalho. Outro aspecto tratado na norma diz respeito ao profissional manter-se vigilante a novas informações e mudanças em fatos e circunstâncias e utilize o teste do terceiro informado e prudente. Neste sentido, pode haver o envolvimento de um terceiro no trabalho, a fim de verificar se a informação é consistente, sendo, então, uma atitude prudente do profissional. 4 1.1 Estrutura Conceitual As ameaças ao cumprimento dos princípios fundamentais decorrem das condições de trabalho do profissional da contabilidade. Neste sentido, a seção 120 da NBC PG 100 (R1) descreve os requisitos e o material de aplicação e a estrutura conceitual para auxiliar o exercício da profissão. Assim, o profissional poderá identificar, avaliar e tratar as ameaças de maneira a eliminá-las ou reduzi- las a um nível aceitável. O exercício do julgamento profissional é um requisito importante na execução do trabalho, pois envolve conhecimento, habilidade e experiência para saber se as decisões tomadas são apropriadas às circunstâncias. Para isso, a norma recomenda que o profissional considere os seguintes pontos: Existe razão para se preocupar com informações faltantes nos fatos e circunstâncias conhecidos? Por exemplo, quando o profissional contábil está realizando uma análise da conta estoque da empresa e não dispõe de um relatório de entradas e saídas de mercadorias, a conclusão do trabalho poderá ser prejudicada, pois para apurar o saldo da conta é preciso conhecer as entradas e saídas de mercadorias e, então, calcular o montante final do estoque. Assim, o contador deve julgar se é viável continuar o trabalho mesmo com a falta de informações, ou seja, ele precisará estudar alternativas para não prejudicar a continuidade do trabalho ou finalizar o contrato com o seu cliente explicando os motivos. Os fatos e circunstânciaspossuem inconsistências? Isto é, o profissional contábil deve julgar se as informações fornecidas pela empresa são consistentes para que o trabalho seja concluído. Não havendo consistência, o contador precisa comunicar os responsáveis e avaliar a sua permanência com o cliente. É o caso de os documentos fiscais serem ocultados pelos gestores da empresa com intuito de manipular os relatórios contábeis. O profissional contábil tem competência e experiência suficientes para concluir o trabalho? Existe a necessidade de consultar um terceiro que tenha competência ou experiência relevante (teste do terceiro informado e prudente)? As informações são suficientes para concluir o trabalho? 5 A preconcepção ou o comportamento tendencioso do próprio profissional da contabilidade pode interferir no julgamento. Neste caso, por exemplo, quando o contador tiver qualquer tipo de relação próxima com a empresa, deve julgar sua permanência no trabalho, visto que o contato próximo do contador com a empresa pode induzi-lo a atender as exigências da empresa mesmo que sejam indevidas. Existem outras conclusões plausíveis que poderiam ser obtidas com base nas informações disponíveis? Presume-se que as conclusões do julgamento profissional seriam as mesmas obtidas por um terceiro, denominada terceiro informado e prudente. Isso quer dizer que, quando o trabalho do profissional contábil for revisado por outro profissional competente, as conclusões serão as mesmas. Por exemplo, ao analisar a vida útil de um bem ao final do exercício social, o contador conclui que o bem gerará benefícios econômicos futuros por mais três anos. Essa mesma conclusão deve ser obtida por outro profissional contábil. Segundo a NBC PG 100 (R1), o terceiro informado e prudente “não precisa ser profissional da contabilidade, mas ter o conhecimento e a experiência pertinentes para entender e avaliar a adequação das conclusões do profissional da contabilidade de forma imparcial”. A norma evidencia, na fase de identificação das ameaças, as possíveis situações que poderiam ameaçar o cumprimento dos princípios fundamentais, como: interesse próprio, autorrevisão, defesa de interesse do cliente, familiaridade e intimidação. A seguir, algumas situações práticas de ameaça. a) Interesse próprio: manipulação do resultado para redução da tributação. b) Autorrevisão: o julgamento do profissional contábil é realizado sem qualquer revisão, por exemplo, o contador assina as demonstrações elaboradas por um terceiro. c) Defesa de interesse ao cliente: o profissional da contabilidade atua em defesa do cliente mesmo que a conduta da empresa seja incoerente com as normas fiscais ou contábeis. d) Familiaridade: por exemplo, quando a empresa solicita o superfaturamento de notas fiscais e o profissional contábil devido à familiaridade, ou seja, tanto em virtude de laços familiares quanto de proximidade amigável com a empresa, executa o serviço. 6 e) Intimidação: por exemplo, o profissional contábil aceita qualquer imposição da empresa em virtude de não receber seus honorários. Na fase de avaliação das ameaças, é necessário avaliar se a ameaça é aceitável ou não. Considera-se nível aceitável de ameaça quando o profissional usa o teste do terceiro informado e os resultados são os mesmos. Tanto os fatores quantitativos (por exemplo, montante financeiro de perdas possíveis) quanto qualitativos (por exemplo, perda do direito de exercer a atividade profissional) devem ser analisados. Por fim, a fase de tratamento das ameaças compreende o tratamento de ameaças que não estão em nível aceitável. Por exemplo, quando o gestor oferece um incentivo com o propósito de persuadir o contador a manipular as informações contábeis, o contador pode tratar esta ameaça não aceitando o incentivo. Conforme a NBC PG 100 (R1), R120.10, o profissional da contabilidade deve assim proceder, mediante: a) a eliminação das circunstâncias, incluindo interesses ou relacionamentos, que estão gerando as ameaças; b) a aplicação de salvaguardas, quando disponíveis e que possam ser aplicadas, para reduzir as ameaças a um nível aceitável; ou c) a recusa ou o término da atividade profissional específica. Todas essas análises e tratamentos apresentados até esse ponto da aula se devem ao fato de que o profissional contábil deve ser responsável pelas informações geradas, tanto para os usuários internos quanto externos. Nesse sentido, a postura profissional e as decisões devem ser baseadas em determinados princípios, que serão abordados nos próximos temas, ao longo dessa aula. Saiba mais BATISTA, S. Um olhar para a contabilidade, viés da essencialidade e da ética. CFC, 8 mar. 2019. Disponível em: <https://cfc.org.br/destaque/um-olhar-para-a- contabilidade-vies-da-essencialidade-e-da-etica/>. Acesso em: 16 abr. 2020. TEMA 2 – NBC PG 100 (R1): INTEGRIDADE O princípio da integridade estabelece que o profissional da contabilidade deve ser direto e honesto em todas as relações profissionais e comerciais, o que implica em uma negociação justa e verdadeira (NBC PG 100 [R1]). 7 Para isso, o profissional contábil não deve estar vinculado, de maneira consciente, a qualquer informação que: envolva informações substancialmente falsas ou enganosas. Neste caso, por exemplo, o contador não pode ser conivente com o registro contábil de fatos que não apresentam documentos comprovatórios; envolva informações fornecidas de maneira superficial, como estimar as perdas com clientes sem analisar o histórico de perdas da empresa; ou omita ou oculte informações essenciais que levariam a declarações enganosas. Por exemplo, o contador sabendo da possível descontinuidade da empresa, ludibria os usuários da informação com a ocultação de despesas ocorridas. Caso o profissional não tenha conhecimento de que a informação é falsa, enganosa, superficial ou que haja omissão de informações, ele não está violando o Código de Ética. Em contrapartida, se tiver conhecimento, deve tomar providências para se desvincular dessas informações. Caso o contador não tome as providencias necessárias, pode perder seu registro profissional ou prejudicar sua imagem no mercado. O ano de 2001 foi marcado por um dos maiores casos de fraude do mundo, o caso Enron, que nitidamente envolveu a inobservância de integridade por parte dos profissionais envolvidos. A empresa Enron Corporation, fundada em 1985, era uma empresa de energia, commodities e serviços dos EUA. Em 2001, foi descoberto que a empresa ocultava bilhões de dólares (US$) de dívidas incobráveis enquanto inflacionava os ganhos da empresa. Essa prática resultou na queda das ações de aproximadamente US$ 90 para menos de US$ 1 em um ano. Os investidores (acionistas) perderam mais de US $ 74 bilhões. Uma investigação da SEC (Securities and Exchange Commission) detectou que o CEO (Chief Executive Officer) da Enron, Jeff Skillings, e o ex-CEO da Ken Lay manipulavam as informações contábeis e pressionavam a empresa de auditoria, Arthur Andersen, a ignorar o fato. Houve a condenação dos envolvidos Jeff Skillings e Ken Lay e a empresa de auditoria foi dissolvida e a Enron foi a falência (Fenacon, 2017). Os casos envolvendo a falta de integridade do profissional contábil são inúmeros, como reconhecer perda estimada com crédito de liquidação duvidosa (PECLD) a menor, inflar o valor do estoque, desconsiderar possíveis 8 contingências, gerenciar o resultado utilizando taxas de depreciação que não correspondem à realidade, inserir registros falsos para manobrar os resultados, realizar lançamentos fora do sistema contábil de forma manual dentre outros. A ACFE – Association of Certified Fraud Examiners (2016, p. 11) desmembra a fraude nos negócios empresariais em superavaliação e subavaliação do lucro líquido e do patrimônio líquido. As práticasmais comuns abrangem a ocultação de passivos e despesas, reconhecimento de receitas fictícias e a divulgação de ativos inexistentes. O princípio ético da integridade tem forte relação com o exercício de julgamento profissional, pois a responsabilidade de analisar o registro de cada fato contábil é do contador. O profissional contábil, não tendo conhecimento suficiente sobre o assunto, pode consultar outros profissionais ou até mesmo se desvincular dessas informações caso sejam superficiais. 2.1 Caso prático A Fortaleza S.A. é uma indústria que atua no ramo de produção de papel e celulose. Os troncos de madeira são a principal matéria-prima. Depois de os troncos serem cortados, eles passam por um descascador e picador e transformam-se em cavacos. Os cavacos são cozidos por um digestor com líquido, composto de água e agentes químicos, e o produto desse cozimento é a polpa. A polpa passa pelo processo de lavagem e centrifugação, e os resíduos são eliminados. Na sequência, a polpa fica em repouso para separar a celulose de outros resíduos, etapa denominada branqueamento. Ainda em estado aquoso, a polpa da celulose passa por uma mesa plana que transforma a polpa úmida em uma folha contínua e lisa sobre uma esteira rolante. Então, a folha passa pela prensagem, secagem e rebobinagem formando os rolos para corte, empacotamento e distribuição. O processo produtivo envolve questões ambientais que preocupam a administração da empresa. Assim, foram contratados serviços contábeis de um profissional com experiência em registros dessa natureza. O contador, ao acompanhar o processo produtivo da empresa, constatou que realmente os riscos ambientais eram altos e recomendou a administração que reconhecesse em seu passivo uma provisão para contingências ambientais. 9 Pergunta-se: o reconhecimento da provisão para contingências ambientais pressupõe o cumprimento do princípio da integridade? Qual é a relevância da provisão evidenciada? Conforme o princípio da integridade, o processo produtivo foi acompanhado pelo contador, que constatou o risco ambiental e que recomendou o registro da provisão de forma completa, verdadeira. Logo, o lançamento contábil foi realizado de forma íntegra. TEMA 3 – NBC PG 100 (R1): OBJETIVIDADE Conforme dispõe a NBC PG 100 (R1), o profissional da contabilidade não deve comprometer seu julgamento em razão de comportamento tendencioso, por conflito de interesses ou por influência de outros. Isto quer dizer que deve ser objetivo, por exemplo, antecipar o registro de uma venda para que a meta do período seja batida e ocorra o pagamento de remuneração variável. A norma, ainda, estabelece que o profissional não deve realizar uma atividade em que uma circunstância ou relação possa influenciar seu julgamento de maneira inapropriada, por exemplo, efetuar o pagamento de colaboradores a fim de motivá-los sem a devida escrituração para pagar menos encargos trabalhistas. Sendo assim, o contador deve escolher um método mais objetivo baseado em evidências e documentos para que a informação possa ser verificada. A verificabilidade está associada ao teste do terceiro informado e prudente descrito na NBC PG 100 (R1), em que especifica: “as mesmas conclusões seriam provavelmente obtidas por outra parte”. Ludícibus, Marion e Faria (2018, p.109) afirmam que, para não haver distorções nas informações contábeis, o contador deve escolher o procedimento mais objetivo para descrever o fato contábil, sendo este fundamentado em documentos. Segundo os autores, na falta de documento, [...] poder-se-ia convocar peritos em avaliação que, por meio de laudos, forneceriam um valor objetivo para o contador desenvolver, de maneira imparcial, a sua Contabilidade. É importante a impessoalidade (neutralidade) do contador (em relação aos usuários dos informes contábeis) que, quanto mais objetivo for, mais imparciais (não enviesados) serão aqueles informes. Na prática, este princípio requer um consenso profissional, pois as crenças e os valores podem provocar distorções no resultado. Por exemplo, para apurar o valor do estoque, é necessário utilizar o mesmo método de avaliação, 10 pois os resultados obtidos pelos métodos (inventário periódico e permanente) são distintos. 3.1 Caso prático A empresa Bom Sucesso adquiriu uma máquina no valor de R$ 100.000,00, cujo preço tabelado no mercado era de R$ 120.000,00. O contador registrou a máquina no valor de R$ 100.000,00 com base na documentação gerada na transação (nota fiscal). O princípio da objetividade prevê que o registro contábil deve ocorrer pelo valor de aquisição, mesmo que a máquina tenha valor de mercado de R$ 120.000,00. Portanto, a opinião do contador sobre o preço mais adequado para registro não é válida. O contador deve ser objetivo, imparcial, neutro na escrituração dos fatos. TEMA 4 – NBC PG 100 (R1): COMPETÊNCIA E ZELO PROFISSIONAIS Outro princípio norteador da profissão contábil, conforme NBC PG 100 (R1), é o da competência profissional e devido zelo. A competência determina que o profissional contábil aperfeiçoe constantemente e conserve o conhecimento e a habilidade adquiridos a fim de garantir que o cliente ou a entidade empregadora obtenham um serviço apropriado, fundamentado em padrões técnicos e profissionais atuais e em conformidade com a legislação vigente. Neste caso, a incapacidade técnica e facilitação do exercício profissional aos não habilitados seriam infrações éticas, conforme exemplificado pelo Conselho Regional de Contabilidade de Santa Catarina (CRC SC). O profissional, inclusive, deve realizar o trabalho com zelo. A diligência na realização do serviço compreende a responsabilidade de atuar de maneira cuidadosa, árdua e oportuna. Segundo a norma, “atender aos clientes e às organizações empregadoras com competência profissional requer o exercício de julgamento sólido na aplicação do conhecimento profissional e habilidade na realização de atividades profissionais”. O aprendizado contínuo proporciona o desenvolvimento que o profissional precisa ter para exercer suas atividades e as habilidade exigidas pelo ambiente profissional. O CFC criou um programa de Educação Profissional Continuada (EPC) por meio da NBC PG 12 (R3), que objetiva atualizar e ampliar conhecimentos e 11 competências técnicas e profissionais, habilidades multidisciplinares e progressão do comportamento social, moral e ético dos profissionais da contabilidade. Profissionais da contabilidade que estejam inscritos no Cadastro Nacional de Auditores Independentes (CNAI), registrados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), exercem atividades de auditoria independente, sejam responsáveis técnicos pelas demonstrações contábeis e estejam inscritos no Cadastro Nacional de Peritos Contábeis (CNPC), de maneira geral, devem cumprir a pontuação exigida para cada categoria/habilitação. Além disso, o princípio estabelece que o profissional contábil que atribuir tarefas aos que estão trabalhando sob sua responsabilidade deve assegurar que estes receberão treinamento e supervisão adequada. E, quando oportuno, o profissional deve comunicar aos clientes, à entidade empregadora ou a outros usuários dos seus serviços, as restrições pertinentes às atividades (NBC PG 100 (R1)). 4.1 Caso prático Um profissional recém-formado em Ciências Contábeis e ainda não registrado no Conselho Regional de Contabilidade, em razão da reprovação no Exame de Suficiência, foi requisitado pelo seu primo, contador registrado no Conselho, para elaborar alguns demonstrativos contábeis. Seu primo o requisitou devido ao intenso volume de trabalho que estava atrasado. Logo, o recém-formado em Ciências Contábeis não recebeu qualquer orientação quanto à execução do trabalho, porém o realizou da melhor forma possível, atendendo ao conhecimento absorvido durante o curso. Ao concluiros demonstrativos, o contador, registrado no Conselho, assinou os documentos e repassou a informação aos seus clientes sem qualquer revisão. Pergunta-se: os profissionais cumpriram o princípio da competência e zelo? Ambos os profissionais não cumpriram com o princípio da competência e zelo. Apesar de o recém-formado ter realizado o trabalho da melhor forma possível, atendendo a todo o conhecimento absorvido no curso, ele não tem competência técnica, pois ainda não foi aprovado no Exame de Suficiência. Seu primo, contador, também não agiu de forma zelosa. Conforme dispõe a NBC PG 100 (R1), o profissional que atribuir tarefas aos que estão trabalhando sob sua 12 reponsabilidade deve assegurar que estes receberão treinamento e supervisão adequada. TEMA 5 – NBC PG 100 (R1): SIGILO PROFISSIONAL E COMPORTAMENTO PROFISSIONAL Determinadas informações contábeis são extremamente valiosas para a empresa, não devendo ser reveladas à concorrência. Entretanto, existem informações que devem ser evidenciadas aos usuários conforme estabelecido nos normas contábeis. As informações sigilosas que não devem ser relevadas à concorrência são aquelas de aspecto gerencial, por exemplo, o gerenciamento dos custos para obtenção de melhores resultados, pois refere-se a uma estratégia de mercado. Desta forma, tem-se o princípio da confidencialidade. De acordo com a NBC PG 100 (R1), o profissional da contabilidade deve: a) atentar-se para a divulgação inapropriada da informação no ambiente social e, principalmente, a parceiros de negócio ou familiares próximos, por exemplo, o contador em posse da informação não deve repassar a estratégia da empresa em que atua a um familiar que pretende abrir um negócio similar; b) manter o sigilo das informações nos limites da empresa ou da organização empregadora; c) manter o sigilo das informações apresentadas por clientes ou organização empregadora em potencial; d) não divulgar informações confidenciais fora da empresa ou da organização empregadora resultante de relações profissionais e comerciais sem a devida autorização específica, a não ser que a divulgação seja um direito ou dever legal do profissional da contabilidade; e) não fazer uso de informações confidenciais decorrentes de relações profissionais e comerciais para benefício próprio ou de terceiros, como foi o caso da empresa JBS S.A., grande empresa do setor alimentício e seus controladores, que fizeram uso de informações privilegiadas para obter vantagens ilícitas no mercado de valores mobiliários; 13 f) não fazer uso de informações confidenciais obtidas ou recebidas em razão da relação profissional ou comercial depois do término dessa relação; g) tomar medidas plausíveis para garantir que o pessoal, sob a supervisão do profissional contábil, e as pessoas que o assessoram e prestam assistência respeitem o dever de confidencialidade. Por exemplo, acesso ao banco de dados de cadastro de clientes. O fato de a divulgação de informações confidenciais ser um direito ou dever legal do profissional da contabilidade está relacionado à denúncia de irregularidades praticadas por clientes e empresas empregadoras. Isso ocorre quando o contador sabe que as informações são sigilosas, mas, em razão de serem informações fraudulentas, devem ser divulgadas às autoridades competentes. Por exemplo, o contador detecta que a empresa está superfaturando notas fiscais; é seu dever comunicar aos órgãos competentes, visto que há uma ameaça a sua profissão. A norma internacional Noclar (Responding to Non-Compliance with Laws and Regulations – Resposta ao Descumprimento de Leis e Regulamentos) entrou em vigor em 2017, em vários países, visando estabelecer procedimentos claros sobre atos ilícitos, como descobertas de fraudes ou descumprimento às normas. A NBC PG 100 (R1) regulamenta as circunstâncias nas quais os profissionais da contabilidade são ou podem ser requisitados a divulgar informações confidenciais ou nas quais essa divulgação pode ser adequada: a) a divulgação é exigida por lei, como, por exemplo: b) produção de documentos ou outra disponibilização de evidências no curso dos procedimentos legais; ou c) divulgação às autoridades públicas competentes de infrações da lei que são reveladas; d) A divulgação é permitida por lei e autorizada pelo cliente ou pela organização empregadora; e e) há o dever ou direito profissional de divulgação, quando não for proibido por lei, de: f) cumprir com a revisão de qualidade de órgão profissional; g) responder à indagação ou à investigação por órgão profissional ou regulador; h) proteger os interesses profissionais do profissional da contabilidade em procedimentos legais; ou i) cumprir com as normas técnicas e profissionais, incluindo as exigências éticas. As circunstâncias definidas para divulgação de informação confidencial, por exemplo, “divulgação às autoridades públicas competentes de infrações da 14 lei que são reveladas”, garantem que a sociedade não seja penalizada, pois este evento pode ser, por exemplo, resultado de sonegação fiscal, que impacta na destinação de recursos públicos, atitude antiética. Os fatores a serem considerados na divulgação das informações confidenciais, segundo a norma, são: se o cliente ou a organização empregadora concordar com a divulgação das informações pelo profissional da contabilidade, o interesse de terceiros e demais partes poderiam ser afetadas; considerando que todas as informações relevantes são conhecidas e comprovadas, os fatores que influenciam a decisão de divulgar informações sigilosas compreendem fatos não comprovados, informações incompletas e conclusões não certificadas; a forma de comunicação pretendida e a quem ela é destinada; os receptores da informação a quem a comunicação é dirigida são apropriados. O profissional deve cumprir o princípio da confidencialidade, de maneira que, mesmo que finalize o contrato com o cliente ou com a organização empregadora, as informações não podem ser divulgadas. As experiências adquiridas apenas estarão implícitas nos próximos trabalhos. 5.1 Comportamento Profissional O profissional contábil deve se comportar de acordo com os princípios. As leis e os regulamentos pertinentes à profissão devem ser obedecidos e qualquer conduta que deprecie a profissão deve ser evitada. O código de conduta do profissional contábil determina que não deve haver envolvimento, de forma consciente, com negócio, ocupação ou atividade que cause prejuízo à integridade, à objetividade ou à boa imagem da profissão, visto que seria contrário aos princípios fundamentais. O marketing pessoal não deve desprestigiar a profissão, fazendo declarações falsas, exageradas e depreciando o trabalho de outros profissionais. O contador deve ser sempre correto e sincero. E, caso existam dúvidas, deve- se consultar o órgão profissional competente. 15 5.2 Caso prático Determinado empresário decidiu cotar honorários contábeis antes de firmar contrato com um escritório de contabilidade. Em conversa com um dos escritórios, foram propostos honorários irrisórios comparados aos que o mercado costuma cobrar. O empresário, vislumbrado com a redução de custos contábeis, decidiu contratar o serviço do contador. O que não ficou claro na contratação foi que do contador não estava interessado no recebimento dos honorários, mas no conhecimento que adquiriria sobre o negócio do cliente. A informação obtida a respeito do negócio do empresário beneficiaria a toda a família do contador. Então, logo após o início da prestação dos serviços contábeis, a informação foi divulgada aos interessados. Pergunta-se: o profissional contábil cumpriu com o princípio da confidencialidade? O princípio não foi cumprido, pois, mesmo que os familiares fossem de confiança, a informação gerada é sigilosa e somente podeser divulgada quando exigida por lei. TROCANDO IDEIAS O profissional da contabilidade não deve comprometer seu julgamento em virtude de comportamento tendencioso, por conflito de interesses ou por influência de outros, ou seja, deve ser objetivo. A objetividade no serviço contábil pode ser fundamentada apenas em acordos verbais? NA PRÁTICA Suponha que a empresa Fortes esteja em busca de um profissional contábil que a oriente na redução da carga tributária. Sem conhecer do assunto, a Fortes confiou todo o processo de planejamento tributário ao contador. O contador, por sua vez, recomendou manipular o resultado reconhecendo uma perda estimada para crédito de liquidação duvidosa a maior. A perda estimada para crédito de liquidação duvidosa é realizada com base nos últimos três anos, mas foi superavaliada para reduzir o resultado e recolher menos tributos. 16 Neste contexto, a atitude do contador foi correta?1 FINALIZANDO O profissional da contabilidade deve cumprir os princípios éticos estabelecidos na NBC PG 100 (R1). O descumprimento desses princípios prejudica o exercício da profissão, tornando a informação falsa. Integridade, objetividade, competência e zelo profissional e confidencialidade da informação são atributos importantes na realização do trabalho do contador. É dever do contador conhecer as normas e aplicá-las de maneira adequada. Por fim, a educação continuidade é de suma importância para esta profissão, que está sempre acompanhado as mudanças socioeconômicas. 1 A resposta esperada para essa seção pode ser encontrada ao final deste material, logo após as referências. 17 REFERÊNCIAS ACFE – Association of Certified Fraud Examiners. Report to the nations on occupational fraud and abuse: 2016 Global Fraud Study. Disponível em: <https://www.acfe.com/rttn2016/resources/downloads.aspx>. Acesso em: 16 abr. 2020. BARBOZA, E. L.; ROA, M. M. Fluxo de informação no contexto contábil. Revista de Ciência da Informação e Documentação, v. 9, n. 2, 2018. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/incid/article/view/141456>. Acesso em: 16 abr. 2020. BATISTA, S. Um olhar para a contabilidade, viés da essencialidade e da ética. CFC, 8 mar. 2019. Disponível em: <https://cfc.org.br/destaque/um-olhar-para-a- contabilidade-vies-da-essencialidade-e-da-etica/>. Acesso em: 16 abr. 2020. CFC – Conselho Federal de Contabilidade. NBC PG 12 (R3): Educação profissional continuada. Disponível em: <https://cfc.org.br/tecnica/normas- brasileiras-de-contabilidade/nbc-pg-geral/>. Acesso em: 16 abr. 2020. _____. NBC PG 100 (R1): Cumprimento do Código, dos Princípios Fundamentais e da Estrutura Conceitual. Disponível em: <https://cfc.org.br/tecnica/normas-brasileiras-de-contabilidade/nbc-pg-geral/>. Acesso em: 16 abr. 2020. _____. NBC PG 200 (R1): Contadores Empregados (Contadores Internos). Disponível em: <https://cfc.org.br/tecnica/normas-brasileiras-de- contabilidade/nbc-pg-geral/>. Acesso em: 16 abr. 2020. _____. NBC PG 300 (R1): Contadores que Prestam Serviços (Contadores Externos). Disponível em: <https://cfc.org.br/tecnica/normas-brasileiras-de- contabilidade/nbc-pg-geral/>. Acesso em: 16 abr. 2020. CRCSC – Conselho Regional de Contabilidade de Santa Catarina. Ética Profissional. Disponível em: <http://www.crcsc.org.br/servico/view/5>. Acesso em: 16 abr. 2020. IUDÍCIBUS, S. de; MARION, J. C.; FARIA, A. C. de. Introdução à teoria da contabilidade: para graduação. 6. ed. [2. Reimpr.]. São Paulo: Atlas, 2018. OS 9 MAIORES escândalos contábeis do mundo. Fenacon, 23 out. 2017. Disponível em: <http://fenacon.org.br/noticias/os-9-maiores-escandalos- contabeis-do-mundo-2609/>. Acesso em: 16 abr. 2020. 18 GABARITO Não, pois, de acordo com o princípio da integridade, o profissional contábil não deve estar vinculado, de forma consciente, a qualquer informação que ele suponha que: envolva informações substancialmente falsa ou enganosa; envolva informações fornecidas de maneira superficial; ou omita ou oculte informações essenciais que levariam a declarações enganosas. O CONTADOR E A ÉTICA PROFISSIONAL AULA 3 Profª Daiane Lolatto CONVERSA INICIAL Nesta aula, será estudada a NBC PG 200 (R1) (CFC, 2019b), que trata dos contadores empregados (contadores internos). Assim como a NBC PG 100 (R1) (CFC, 2019a), ela também entrou em vigor em 1º de janeiro de 2020. Antes, esse assunto era tratado pela NBC PG 300 (CFC, 2019c), que foi revogada. A norma apresenta condições importantes para o exercício da profissão contábil, como requisitos e material de aplicação, fatos e circunstâncias que geram ou podem gerar ameaças ao cumprimento dos princípios fundamentais, conflitos de interesses existentes, elaboração e divulgação das informações, interesses financeiros, remuneração e incentivo relativo ao relatório financeiro e à tomada de decisões. Destaca-se a confiança que investidores, credores, organizações empregadoras, governos e público em geral podem ter em relação ao trabalho dos contadores internos. Esses profissionais da contabilidade, por sua vez, podem ser empregados, contratados, parceiros, diretores, proprietários ou voluntários. A denominação profissional da contabilidade refere o profissional de contabilidade em empresas e a pessoa física em si que atua na área contábil. É nesse contexto que serão abordados alguns temas específicos da norma em questão. CONTEXTUALIZANDO O contador pode ser o único responsável ou também ter a responsabilidade compartilhada pela elaboração e divulgação das demonstrações contábeis e demais informações econômico-financeiras necessárias aos investidores, credores, clientes, empregadores etc. Ele deve auxiliar a organização empregadora e se comprometer eticamente dentro da entidade. Nesse sentido, pode-se dizer que quanto mais alto o cargo do profissional contábil, maior será a capacidade de obter informações e de influenciar na tomada de decisões? 3 TEMA 1 – NBC PG 200 (R1): CONFLITO DE INTERESSES O conflito de interesses refere-se aos interesses divergentes entre profissional contábil e empresa. Por exemplo: a empresa solicita ao contador que altere os dados contábeis com o objetivo de conseguir um empréstimo junto ao banco; o interesse da empresa conflita com o interesse do contador, pois este deve evidenciar as informações de forma objetiva e, por isso, não deve atender à solicitação da empresa, havendo um conflito de interesses. O contador, no desenvolvimento de suas atividades, deve respeitar ou cumprir os princípios dispostos na NBC PG 100 (R1) (CFC, 2019a), que são: integridade, objetividade, competência profissional e devido zelo, confidencialidade e comportamento profissional. No entanto, a atuação do profissional pode sofrer ameaças que, se não forem devidamente identificadas e tratadas, talvez influenciem a observância desses princípios. Essas ameaças estão reunidas na Figura 1: Figura 1 – Ameaças aos princípios fundamentais a. Ameaça de interesse próprio: a norma descreve que esse tipo de ameaça ocorre quando o contador interno tem interesse financeiro na entidade que o contratou (por exemplo, se a empresa fornece empréstimo para o contador durante sua atividade profissional), quando há participação de acordos de remuneração com base em incentivos (isto é, o contador está presente na tomada de decisões quanto à remuneração variável dos colaboradores), quando o profissional contábil usa os ativos da empresa a seu favor (o contador faz uso do notebook Ameças aos princípios fundamentais Interesse próprio Autorrevisão Defesa do interesse do cliente Familiaridade Intimidação 4 da empresa para suas atividades pessoais), quando o contador interno recebepresentes ou tratamento especial dos fornecedores com o intuito de garantir que a empresa continue operando-os. Também é possível que a empresa, por exemplo, solicite ao contador que sejam realizadas manobras fiscais para reduzir a carga tributária e, em razão do risco de ser desligado, ele execute o trabalho. b. Ameaça de autorrevisão: ameaça que pode ser verificada, por exemplo, quando o contador interno define o tratamento contábil referente à compra de outra empresa depois de ter participado do estudo de viabilidade econômica que contribuiu para a decisão de compra. Nesse caso, o ideal é que o cálculo de viabilidade econômica e contabilização da operação seja realizado por profissionais distintos para que não haja viés no registro, pois, se o cálculo e a contabilização forem realizados pelo mesmo profissional, a tendência é que qualquer inconformidade no processo seja desconsiderada. Essa operação tende a ser complexa em virtude da avaliação de ativos e passivos. c. Ameaça de defesa do interesse do cliente: segundo a norma contábil, os princípios fundamentais podem ser ameaçados quando o contador decidir manipular informações contábeis para a obtenção de um financiamento para o cliente, por exemplo. d. Ameaça de familiaridade: os princípios estarão ameaçados se houver proximidade familiar ou amigável entre contador e entidade empregadora, pois os relatórios podem conter informações tendenciosas, uma vez que o contador tende a atender às exigências da empresa. Essa proximidade pode ser decorrente de vínculo familiar ou resultado de vínculo prolongado com a empresa. e. Ameaça de intimidação: a intimidação pode existir quando uma pessoa influente tenta burlar a aplicação dos princípios contábeis ou quando o profissional contábil estiver sujeito à demissão ou substituição em decorrência de desentendimento sobre algum registro contábil. Após identificar as ameaças ao exercício da profissão do contador interno, é necessário avaliar seu nível e tratá-las. A NBC PG 200 (R1) determina que: Em situações extremas, se as circunstâncias que criaram as ameaças não podem ser eliminadas e as salvaguardas não estão disponíveis 5 ou não podem ser aplicadas para reduzir a ameaça a nível aceitável, o profissional da contabilidade pode considerar apropriado o seu desligamento da organização empregadora. (CFC, 2019b) Em consonância com a NBC PG 100 (R1) (CFC, 2019a), o contador deve realizar o exercício de julgamento profissional. 1.1 Conflito de interesse Um conflito de interesse gera ameaças ao cumprimento dos princípios, sobretudo ao princípio da objetividade. Pode acontecer, por exemplo, quando o contador interno realiza uma atividade específica em que há duas ou mais partes interessadas, ou quando o próprio contador tem interesse no assunto. Conforme disposto na NBC 200 (R1), “o profissional da contabilidade não deve permitir que conflito de interesses comprometa o julgamento profissional ou comercial” (CFC, 2019b). As circunstâncias que podem causar conflitos de interesse para o contador interno são: exercer a função de administração ou governança para duas ou mais instituições empregadoras usufruindo de informações sigilosas para beneficiar uma instituição em detrimento de outra; realizar a atividade profissional para ambas as partes da dissolução de uma sociedade; elaborar informações financeiras para membros da administração que estão tentando obter o controle da sociedade; selecionar fornecedor para a empresa que o contratou quando um familiar pode se beneficiar financeiramente da situação; atuar como membro de governança de uma instituição em que tenha investimentos ou que tenha familiar investindo. O profissional contábil deve estar atento a qualquer conflito de interesse, pois, conforme ilustrado na Figura 2, “[...] quanto mais direta for a conexão entre a atividade profissional e o assunto sobre o qual os interesses das partes estejam em conflito, maior é a probabilidade de que o nível da ameaça não seja aceitável” (CFC, 2019b). 6 Figura 2 – Conflito de interesse O contador pode eliminar o conflito de interesse afastando-se do processo de tomada de decisões ou proteger-se das ameaças de conflito reestruturando as funções ou subordinando-se a uma supervisão apropriada. Quanto à divulgação e ao consentimento das ameaças, é necessário divulgar a natureza do conflito e obter o consentimento das partes envolvidas no exercício da profissão. O contador deve documentar a natureza do fato que gerou o conflito, as prevenções aplicadas para tratar as ameaças e o consentimento obtido. TEMA 2 – NBC PG 200 (R1): ELABORAÇÃO E COMUNICAÇÃO DE INFORMAÇÕES Os contadores empregados ou internos estão constantemente comprometidos com a elaboração e a comunicação de informações aos usuários internos e externos das empresas. Essas informações devem ser apresentadas conforme as normas profissionais gerais de contabilidade. A NBC PG 200 (R1) (CFC, 2019b) pressupõe que as informações auxiliam os usuários a compreenderem e avaliarem a situação da empresa, bem como a tomarem decisões a respeito dela. As informações podem ser apresentadas por meio de: relatórios operacionais e de desempenho; análises de apoio a decisões; orçamentos e projeções; quanto mais direta a conexão entre a atividade profissional e o assunto sobre o qual os interesses das partes estejam em conflito maior o nível de ameaça. C o n ta d o r x I n te re s s e d a s p a rt e s N ív e l d e a m e a ç a 7 informações fornecidas para os auditores internos e externos; análises de risco; demonstrações contábeis para fins gerais e para propósitos específicos; declarações de impostos; relatórios protocolados junto a órgãos reguladores para fins legais e de conformidade. (CFC, 2019b) Os contadores internos devem considerar os seguintes aspectos ao elaborar e comunicar as informações: a. as informações precisam ser estruturadas de modo que sejam relevantes, isto é, a organização dos dados de acordo com as normas é primordial para a compreensão; b. as informações não podem ser tendenciosas; c. o julgamento profissional deve ser fundamentado em informações precisas, íntegras, descritas de forma clara e verdadeira e registradas tempestivamente; d. nenhuma informação pode ser omitida a fim de tornar o resultado enganoso (por exemplo, utilizando estimativas irreais para avaliar os ativos). O profissional contábil não deve utilizar procedimentos que distorçam o resultado, como aplicar o valor justo inadequadamente, alterar a política de avaliação contábil para forjar lucros, manipular as vendas, divulgar apenas informações que beneficiem a empresa, entre outros. Quando não houver uma estrutura predefinida para apresentação das informações, o contador deverá considerar a finalidade do relatório, o contexto para seu fornecimento e a quem ele será destinado. Sendo assim, quando for solicitada a elaboração de um relatório que contenha a projeção financeira da empresa para os próximos dez anos, ele poderá utilizar estimativas com base em suas experiências. O contador pode confiar no trabalho de terceiros, de dentro ou fora da empresa, mas terá que analisar a reputação, a competência e se a outra pessoa também está submetida às normas profissionais e éticas. Nesse caso, quando solicitar a um outro profissional a revisão dos relatórios, como a conciliação das contas contábeis com o sistema financeiro da empresa, é necessário que esse profissional também atenda aos princípios éticos de forma íntegra. Caso contrário, o trabalho não será confiável. 8 2.1 Informações enganosas e o devido tratamento O contador interno, ao tomar conhecimento de que está envolvido em informações enganosas, inicialmente deverá tentar solucionar o caso. Não havendo consenso,
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