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CÓ PIA C ON TR OL AD A ■ INTRODUÇÃO A hipercolesterolemia familiar (HF) é um transtorno comum e hereditário do metabolismo do colesterol que leva à morbidade e mortalidade cardiovascular prematura. O tratamento precoce da HF modifica o curso da doença e de suas complicações, assim como reduz eventos cardiovasculares e casos de morte. Esse transtorno é uma das formas mais comuns de dislipidemia de base genética, cujo modo de herança é autossômico codominante e se caracteriza por níveis muito elevados de colesterol da lipoproteína de baixa densidade (em inglês, low-density lipoprotein cholesterol [LDL-c]) e por sinais clínicos característicos, como xantomas tendíneos e risco aumentado de doença arterial coronariana (DAC) prematura.1–3 A falta de diagnóstico cria uma barreira para a prevenção eficaz de DAC prematura, o que afeta a qualidade de vida e a contribuição econômica e social das pessoas e famílias com HF e provoca, também, enormes custos para a saúde. A detecção da HF deve ser realizada antes do desenvolvimento da doença cardiovascular (DCV), mas isso dificilmente ocorre nos atendimentos de rotina — estimam-se cerca de 2 milhões de pessoas com HF na região ibero-americana.4,5 Em um paciente com HF na forma heterozigótica (HFHe) não tratada, o risco de doença coronária ou morte cardiovascular chega a 50% nos homens e a 12% nas mulheres com 50 anos de idade, e o de DAC pode ser 13 vezes maior nos indivíduos com HF.2,4 Quando a HF é diagnosticada precocemente, recomenda-se a adoção de um estilo de vida saudável, que inclua dieta e prática de atividades físicas, que, na maioria das vezes, são insuficientes para reduzir os níveis de LDL-c. Estudos que avaliaram o tratamento farmacológico da HF mostraram benefícios com o uso de estatinas, porém o alcance de metas lipídicas requer, com frequência, a associação de dois ou mais fármacos, por isso há uma necessidade constante de pesquisa sobre novos tratamentos.2,4 MARIA CRISTINA DE OLIVEIRA IZAR JULIANA TIEKO KATO VALÉRIA ARRUDA MACHADO CELMA MUNIZ MARTINS TRATAMENTO NUTRICIONAL DA HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR 99 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A ■ OBJETIVOS Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de ■ identificar um indivíduo com HF e determinar seu nível de risco para garantir uma terapêutica eficaz; ■ diferenciar a epidemiologia e a etiologia da HF; ■ discorrer a respeito da importância da terapia farmacológica no tratamento da HF; ■ reconhecer o tratamento nutricional e discutir sobre seus diferenciais e suas peculiaridades na prevenção da doença cardíaca. ■ ESQUEMA CONCEITUAL Conclusão Caso clínico Colesterol alimentar Ácidos graxos saturados Ácidos graxos trans Ácidos graxos poli-insaturados — ômega 3 Fitosteróis Ácidos graxos monoinsaturados Fibra alimentar Óleo de coco Proteína de soja Etiologia Gene receptor de lipoproteína de baixa densidade Gene pró-proteína convertase subtilisina/kexina tipo 9 Gene da apolipoproteína B Expressão reduzida da proteína adaptadora do receptor de lipoproteína de baixa densidade Epidemiologia Hipercolesterolemia familiar homozigótica Hipercolesterolemia familiar heterozigótica Critérios diagnósticos Rastreamento em cascata Teste genético Padronização e formalização Tratamento Farmacológico Nutricional 100 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A ■ EPIDEMIOLOGIA A HF é considerada um problema de saúde pública mundial em razão da elevada prevalência de doença coronária precoce e da redução da expectativa de vida observada em várias famílias. Aproximadamente 85% dos homens e 50% das mulheres, se não tratados adequadamente, podem apresentar um evento coronário antes de completar 65 anos de idade. Estudos revelam que cerca de 200 mil pessoas no mundo morrem a cada ano por ataques cardíacos precoces causados pela HF, óbitos que poderiam ser evitados com tratamentos apropriados.2,5,6 A frequência da HFHe é de cerca de 1:200 a 1:300 indivíduos, enquanto na forma homozigótica (HFHo) a frequência estimada é de 1:1.000.000 de indivíduos afetados, podendo ser mais prevalente em algumas populações por conta de um efeito “fundador”:6 ■ sul-africanos — 1:100; ■ libaneses — 1:170; ■ franco-canadenses — 1:270; ■ finlandeses. Estima-se que no mundo todo existam entre 14 a 34 milhões de indivíduos com HF; no entanto, menos de 10% deles têm diagnóstico conhecido da doença, e um número inferior a 25% recebe tratamento hipolipemiante. No Brasil, estima-se que menos de 1% das pessoas com HF são diagnosticadas.2 Na Figura 1, apresentam-se dados referentes à epidemiologia da HF em diferentes países. México Brasil Chile Japão Canadá Estados Unidos da América Oman Itália Taiwan França Hong Kong Austrália África do Sul Dinamarca República Eslovaca Bélgica Espanha Reino Unido Suíça Islândia Noruega Holanda 0 10 20 30 40 50 60 70 Prevalência de HF com base na estimativa de 1:250 Prevalência de HF com base na estimativa de 1:500 HF: hipercolesterolemia familiar. Figura 1 — Prevalência de diagnóstico de HF. Fonte: Arquivo de imagens das autoras. 101 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR HETEROZIGÓTICA A forma mais comum da HF é a heterozigótica, com frequência de 1:200 a 1:300 indivíduos na maioria das populações. Pacientes com HFHe têm cerca de 50% de receptor de LDL (LDLR) não funcionais, o que provoca diminuição na remoção do LDL-c, que, dessa forma, acumula-se na corrente sanguínea desde a nascença, originando uma DCV prematura.7 A HFHe é o transtorno monogênico que apresenta mutações nos LDLRs, fato que contribui para a concentração de o dobro de LDL-c do considerado normal. Filhos de heterozigotos portadores do gene defeituoso têm 50% de chance de herdá-lo, sendo a HFHe transmitida de forma autossômica dominante. Altos valores de colesterol apresentados por questões hereditárias não se restringem somente à HF autossômica dominante, podem ser classificados como defeitos genéticos, além dos receptores de LDL, também nas apolipoproteínas B (ApoB) e na pró-proteína convertase subtilisina/kexina tipo 9 (PCSK9), gene que codifica uma protease que degrada os LDLRs.8 HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR HOMOZIGÓTICA A forma homozigótica da HF (HFHo), rara e grave, apresenta frequência de 1:1 milhão de casos e resulta da herança de dois alelos mutados, um de cada progenitor. Dados mais recentes mostram que sua prevalência pode ser ainda maior, e acredita-se que essa forma possa afetar 1:60.000 a 1:300.000 indivíduos. Pacientes com HFHo praticamente não produzem LDLRs funcionais, o que origina valores de LDL-c 3 a 5 vezes superiores ao índice normal e, como consequência, desenvolvem DCVs na infância. No entanto, mutações nos alelos de outros genes, incluindo a ApoB, a PCSK9 e a proteína adaptadora do receptor de LDL tipo 1 (em inglês, low density lipoprotein receptor adaptor protein 1 [LDLRAP1]), também podem estar presentes em alguns indivíduos com HFHo.9,10 A HFHo ainda se caracteriza por sinais como xantomas, tendíneos ou cutâneos, e arco corneano lipídico (halo esbranquiçado ao redor da córnea), além de níveis de colesterol superiores a 500mg/dL.11 Lesões valvares, como estenoses e calcificações aórticas, podem ser observadas com frequência.9 Quando não tratados, os pacientes HFHo podem manifestar sintomas cardiovasculares antes de atingirem 10 anos de idade. A maioria dos pacientes com níveis elevados de LDL-c desenvolve aterosclerose evidente antes dos 20 anos de idade e, em geral, não sobrevive após os 30 anos de idade. Infelizmente, a HFHo é tipicamente diagnosticada quando a aterosclerose coronariana já está desenvolvida, por isso enfatiza-se a necessidadedo início precoce do tratamento da doença ainda na infância.9 Além do tipo autossômico dominante de HF, a forma autossômica recessiva, descoberta em 1992, relaciona-se com mutações com perda de função da LDLRAP1 — reduzindo sua associação aos receptores de LDL com clatrina nas fendas revestidas da superfície celular — que causam a HFHo.10 Os valores de LDL-c podem variar nos indivíduos heterozigotos e mesmo nos homozigotos, dependendo do tipo de defeito genético encontrado. Assim, os níveis mais elevados de LDL-c são encontrados naqueles indivíduos homozigotos que apresentam mutações chamadas nulas, ou seja, em que não há atividade residual do LDLR, seguido por mutações em que há atividade residual no receptor de LDL. Níveis um pouco mais baixos de LDL-c são encontrados naqueles indivíduos heterozigotos compostos (por exemplo, naqueles que apresentam duas mutações em sítios distintos do gene LDLR, herdadas de ambos os genitores) e nos duplo heterozigotos (aqueles que apresentam duas mutações em genes distintos; por exemplo, uma no gene LDLR, outra no gene PCSK9 ou no gene APOB, herdadas de ambos os genitores). 102 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A Os heterozigotos verdadeiros, aqueles que apresentam uma mutação em um dos genes causadores de HF, também podem apresentar níveis variáveis de LDL-c, de acordo com a gravidade da mutação, mas em geral um pouco mais baixos do que nos homozigotos. Como regra simples, LDL-c a partir de 190mg/dL e até 499mg/dL, sem tratamento, sugere a forma heterozigótica; a partir de 500mg/dL em adultos sem tratamento ou de 300mg/dL, com tratamento, sugere a forma homozigótica. As formas poligênicas de hipercolesterolemia, podem se confundir com a HF heterozigótica, com relação aos níveis de LDL-c, resultam de pequeno efeito de múltiplos genes e não apresentam o mesmo modo de transmissão genética do que a HF clássica.12 ATIVIDADES 1. Sobre a epidemiologia da HF, assinale V (verdadeiro) ou F (falso). ( ) A HF é considerada um problema de saúde pública mundial. ( ) A HFHo é mais prevalente em algumas populações, como os franco-canadenses. ( ) No Brasil, estima-se que cerca de 15% dos pacientes com HF são diagnosticados. ( ) Se não tratados adequadamente, cerca de 50% dos homens com HF podem apresentar evento coronário antes de completar os 65 anos de idade. Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta. A) V — V — F — F B) V — F — V — F C) F — V — F — V D) F — F — V — V Resposta no final do artigo 2. Observe as afirmativas sobre a HFHe e a HFHo. I — A forma mais comum da HF é a HFHe, cuja frequência é de 1:200 a 1:300 na maioria das populações. II — Filhos de heterozigotos portadores do gene defeituoso têm 25% de chance de herdá-lo, sendo a HFHe transmitida de forma autossômica recessiva. III — Pacientes com HFHo desenvolvem DCVs já na infância (antes dos 10 anos de idade). IV — Nos casos de HFHo, o próprio defeito genético é o principal determinante do risco de DCV. Quais estão corretas? A) Apenas a I e a III. B) Apenas a II e a IV. C) Apenas a I, a II e a III. D) A I, a II, a III e a IV. Resposta no final do artigo 103 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A 3. Qual a frequência da HFHo? ........................................................................................................................................... ........................................................................................................................................... ........................................................................................................................................... ........................................................................................................................................... Resposta no final do artigo 4. Sobre os altos valores de colesterol apresentados por questões hereditárias, assinale a alternativa correta. A) Podem ser classificados como defeitos genéticos nos genes LDLRs, bem como na ApoB e na PCSK9. B) Restringem-se somente à HF autossômica recessiva. C) Podem ser classificados como defeitos genéticos nos genes LDLRAP1, na HFHe. D) Podem ser classificados como defeitos na ApoB. Resposta no final do artigo ■ ETIOLOGIA A HF é uma doença com modo de herança autossômico codominante, caracterizada por aumentos do colesterol total (CT) e do LDL-c.1 As mutações no gene LDLR são o defeito molecular mais frequentemente observado na HF. Localizado na superfície das células hepáticas e de outros tecidos, o receptor liga-se à LDL via ApoB e facilita sua captação, realizada por um mecanismo de internalização e endocitose do complexo LDL/LDLR — processo mediado pela LDLRAP1 presente nas depressões revestidas com clatrina (em inglês, clathrin-coated pits [CCPs]). Após a internalização, a partícula LDL e o LDLR separam-se no endossomo, e o LDLR pode sofrer degradação lisossomal, facilitada pela PCSK9, ou ser transferido de volta à superfície da célula. Nesse processo, o colesterol é utilizado pela célula para uso metabólico ou excreção. Alternativamente, o LDLR pode ser degradado via ligação da PCSK9 ao LDLR na superfície celular; durante a internalização desse complexo, ele direciona todo o complexo à degradação lisossomal.13,14 Quando os LDLRs possuem alguma mutação que altere sua estrutura ou leve à perda de função, o nível de remoção de LDL do plasma diminui, e o nível plasmático de LDL-c aumenta em proporção inversa ao número de receptores funcionais presentes.15 Assim, do ponto de vista genético, a HF pode ser causada por defeitos nos genes LDLR, ApoB, PCSK9 ou LDLRAP1. A maior frequência de mutações se situa no gene LDLR, mas elas também são encontradas nos genes codificadores da ApoB, da PCSK9 e da LDLRAP-1.13–15 Defeitos no complexo ABCG5/G8 podem ainda causar sitosterolemia, condição genética recessiva e muito rara, em que o acúmulo de fitosteróis promove um quadro clínico muitas vezes semelhante à HF.16 104 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A GENE RECEPTOR DE LIPOPROTEÍNA DE BAIXA DENSIDADE O gene que codifica o receptor humano para LDL compreende aproximadamente 45 mil pares de bases de ácido desoxirribonucleico (DNA), arranjados em 18 éxons e 17 íntrons, no braço curto do cromossomo 19. O LDLR é uma proteína com 839 aminoácidos, com um peptídeo sinal de 21 aminoácidos e vários domínios funcionais. A análise das mutações descritas no gene LDLR demonstra que não existem regiões principais na sequência do gene (hot spots) para o aparecimento de alterações.16,17 Apesar disso, mutações no éxon 4, responsável pela ligação à LDL via ApoB, parecem estar correlacionadas com fenótipos mais graves da doença.17,18 De forma interessante, parecem ser raras novas mutações no gene LDLR .19 Existe fino controle por um mecanismo de retroalimentação sofisticado, que controla a transcrição do gene LDLR em resposta a variações no conteúdo intracelular de esteróis e da demanda celular de colesterol.7 Até o momento, são descritas mais de 1.800 mutações do gene LDLR causadoras de HF,20 as quais representam 85 a 90% dos casos de HF. A HF é mais comumente atribuível a mutações no gene LDLR (incluindo deleções, missense, nonsense e inserções), resultando em LDLRs com reduções funcionais (parciais a completas) em sua capacidade de remover LDL da circulação. Dependendo do impacto da mutação sobre a proteína resultante, o indivíduo pode ser:17,20 ■ receptor-negativo — expressa pouco ou nenhum LDLR (atividade <2%); ■ receptor-defeituoso — expressa isoformas de LDLR com afinidade reduzida para LDL na superfície dos hepatócitos (atividade da LDLR entre 2 e 25%). Indivíduos heterozigotos herdam um alelo mutado para o LDLR de um dos pais e um alelo normal do outro. A ausência de um alelo funcional pode causar aumentono nível de LDL de aproximadamente duas vezes o normal desde a infância.7 Os indivíduos homozigotos herdam dois alelos mutados; consequentemente, os LDLRs não têm funcionalidade ou a têm muito reduzida, e os indivíduos afetados apresentam hipercolesterolemia muito grave (650 a 1.000mg/dL).7 GENE DA APOLIPOPROTEÍNA B O gene da ApoB possui 42kb, é formado por 29 éxons e 28 íntrons e dá origem a duas isoformas de proteínas: uma pequena e outra grande, ApoB-48 e ApoB-100, respectivamente. A ApoB-48, produzida no intestino, é um componente dos quilomícrons. Já ApoB-100, produzida no fígado, é um componente de várias lipoproteínas, como a lipoproteína da densidade muito baixa (em inglês, very low density lipoprotein [VLDL]), a lipoproteína de densidade intermediária (em inglês, intermediate-density lipoprotein [IDL]) e a LDL. A hipercolesterolemia causada pela mutação no gene ApoB resulta em um fenótipo clínico de HF semelhante ao produzido por mutações em outros genes, sendo referida como defeito familiar da ApoB (em inglês, familial defective ApoB [FDB]).21–23 Quando não for possível realizar o teste genético para correto diagnóstico, pacientes com FDB podem ser clinicamente confundidos com HF de outras etiologias. 105 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Em contraste com o gene LDLR, apenas 157 mutações patogênicas estão descritas para o gene ApoB,20 cuja maioria se encontra no éxon 26. A mutação mais comum no gene da ApoB é a substituição Arg3500Gln, que causa o rompimento da estrutura da proteína. Essa variante corresponde a 5 a 10% dos casos de HF nas populações do norte da Europa, mas é rara em outras populações. GENE PRÓ-PROTEÍNA CONVERTASE SUBTILISINA/KEXINA TIPO 9 Outra possível condição que leva a um fenótipo do tipo HF decorre de mutações com ganho de função no gene PCSK9, com consequente aumento da atividade da PCSK9, que também é chamada de HF3; nessa situação, mutações com ganho de função levam à maior degradação do LDLR.23,24 Essa causa representa 1 a 3% dos casos de HF clinicamente diagnosticados.24 O gene PCSK9 possui 25kb, contém 12 éxons e dá origem a uma proteína de 692 aminoácidos. EXPRESSÃO REDUZIDA DA PROTEÍNA ADAPTADORA DO RECEPTOR DE LIPOPROTEÍNA DE BAIXA DENSIDADE Além dos genes LDLR, ApoB e PCSK9, tem-se considerado a LDLRAP1 como possível causa de hipercolesterolemia autossômica recessiva (em inglês, autosomal recessive hypercholesterolemia [ARH]); ela facilita a associação de LDLR nas CCPs da superfície celular.25,26 O gene LDLRAP1 possui 25kb, é composto por 9 éxons e origina uma proteína de 308 aminoácidos. Apenas pacientes com mutações no gene LDLRAP1 em homozigose ou heterozigose composta são afetados; indivíduos heterozigotos simples são considerados somente portadores, pois, em geral, não apresentam hipercolesterolemia. Entretanto, existem casos descritos na literatura de portadores que possuem níveis de LDL-c mais altos do que outros membros da família que não têm alteração.27 ATIVIDADES 5. Assinale a alternativa correta quanto à dependência do impacto da mutação sobre a proteína resultante. A) O indivíduo pode ser receptor-negativo, que expressa pouco ou nenhum LDLR, ou receptor-defeituoso, que, por sua vez, expressa isoformas de LDLR com afinidade reduzida para LDL na superfície dos hepatócitos. B) Os defeitos podem ser encontrados na síntese do receptor, no processamento no complexo de Golgi, na migração para a membrana celular, na captação e na reciclagem do receptor. C) Os defeitos no receptor de LDL correspondem a menos de 5% das mutações causadoras de HF. D) A maioria das mutações genéticas causadoras de HF ocorre, no Brasil, por defeitos do gene PCSK9 (mais de 95%). Resposta no final do artigo 106 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A 6. O que ocorre quando os LDLRs possuem alguma mutação que altere sua estrutura ou leve à perda de função? ........................................................................................................................................... ........................................................................................................................................... ........................................................................................................................................... ........................................................................................................................................... Resposta no final do artigo ■ CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS Deve-se pensar em HF a partir de concentrações de LDL-c iguais ou superiores a 190mg/dL em adultos. Sinais clínicos, como algum grau de arco corneano, ocorrem em 50% dos pacientes com HF com idade entre 31 e 35 anos. O arco corneano completo está presente em 50% dos indivíduos com HF aos 50 anos de idade.4,28 Não parece haver correlação entre o grau do arco corneano e as manifestações de DAC. Graus variáveis de espessamento dos tendões podem ser observados em pacientes com HF (espessamento tendíneo em 63%, alterações na ecogenicidade dos tendões em 90% e xantomas em 68%) em comparação àqueles que apresentam mutações do gene LDLR.6 Os sinais clínicos da HF (xantomas, xantelasmas e arco corneano) não são muito sensíveis, mas bastante específicos, ou seja, sua presença sugere fortemente o diagnóstico da doença. Os xantomas tendinosos são mais comumente observados no tendão de Aquiles (Figura 2) e nos tendões extensores dos dedos (Figura 3), mas também podem ser encontrados nos tendões patelar e do tríceps. Eles devem ser investigados não só por inspeção visual, mas também pela palpação.3,4,6,29 Figura 2 — Xantoma no tendão de Aquiles em paciente com HF. Fonte: Arquivo de imagens das autoras. 107 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Figura 3 — Xantoma nos tendões extensores dos dedos em paciente com HF. Fonte: Arquivo de imagens das autoras. A presença de arco corneano, parcial ou total, sugere HF quando observada antes dos 45 anos de idade; o xantelasma (Figura 4) também deve ser observado.4,6,29 Figura 4 — Xantelasma em paciente com HF. Fonte: Arquivo de imagens das autoras. Causas secundárias de hipercolesterolemia, incluindo o hipotireoidismo e a síndrome nefrótica, devem ser afastadas antes de se firmar o diagnóstico de HF. A hipertrigliceridemia não exclui o diagnóstico de HF.4,29 108 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A PADRONIZAÇÃO E FORMALIZAÇÃO Alguns critérios diagnósticos têm sido utilizados na tentativa de uniformizar e formalizar o diagnóstico de HF,30–32 como os do US Make Early Diagnosis Prevent Early Death Program (US MEDPED), da Dutch Lipid Clinic Network (Dutch MEDPED), e os do Simon Broome Register Group. A Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Aterosclerose orienta que, para padronização do diagnóstico de HF, seja utilizado o critério de Dutch MEDPED.33 US MEDPED Na Tabela 1, apresentam-se os valores de corte de CT e LDL-c, em mg/dL, para indivíduos com HF e seus parentes de 1º, 2º e 3º graus, de acordo com o US MEDPED. Considera-se positividade para esse critério quando se identifica no paciente ou em um parente de 1º, 2º ou 3º graus valores de CT e LDL-c superiores aos de corte. Tabela 1 VALORES DE CORTE PARA O COLESTEROL TOTAL E O COLESTEROL DA LIPOPROTEÍNA DE BAIXA DENSIDADE DE ACORDO COM O PROGRAMA US MEDPED Idade (anos) Grau de parentesco com o indivíduo com HF População geral 1º grau 2º grau 3º grau <20 220 (155) 230 (165) 240 (170) 270 (200) 20–29 240 (170) 250 (180) 260 (185) 290 (220) 30–39 270 (190) 280 (200) 290 (210) 340 (240) ≥40 290 (205) 300 (215) 310 (225) 360 (260) HF: hipercolesterolemia familiar. Fonte: Santos e colaboradores (2012).4 Dutch MEDPED O diagnóstico de HF baseado no critério do Dutch MEDPEDinclui dados de história pessoal e familiar de dislipidemia, aterosclerose prematura e sinais clínicos de dislipidemia e dados laboratoriais, análise de mutações funcionais no gene que codifica o LDLR, APoB ou PCSK9. Como demonstrado na Tabela 2, cada uma dessas variáveis recebe uma pontuação, e a soma dos pontos considera como diagnóstico ■ de certeza — ≥8 pontos; ■ provável — 6 a 7 pontos; ■ possível — 3 a 5 pontos. 109 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Tabela 2 DIAGNÓSTICO CLÍNICO DE HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR HETEROZIGÓTICA UTILIZADO PELO ESCORE DO DUTCH MEDPED História familiar Escore I. Parente de 1º grau com história de DAC ou doença vascular prematura 1 II. Parente de 1º grau com LDL-c >percentil 95 1 I. Parente de 1º grau com xantomas tendíneos e/ou arco corneano 2 II. Crianças e adolescentes com idade inferior a 18 anos com LDL-c >percentil 95 2 História pessoal I. DAC 2 II. DVP ou doença cerebrovascular 1 Sinais físicos I. Xantomas 6 II. Arco corneano em indivíduos com idade inferior a 45 anos 4 Laboratório (para Tg <200mg/dL) I. LDL-c >330mg/dL 8 II. LDL-c 250–329mg/dL 5 III. LDL-c 190–249mg/dL 3 IV. LDL-c 155–189mg/dL 1 Análise do DNA Presença de mutações funcionais no LDLR 8 DAC: doença arterial coronariana; LDL-c: colesterol da lipoproteína de baixa densidade; DVP: doença vascular periférica; Tg: triglicérides; DNA: ácido desoxirribonucleico; LDLR: receptor de lipoproteína de baixa densidade. Fonte: Steinberg (2005).29 Simon Broome Register Group O critério de Simon Broome Register Group também considera a história pessoal e familiar de dislipidemia, a presença de aterosclerose prematura e de sinais clínicos de dislipidemia, dados laboratoriais, análise de mutações funcionais no gene que codifica o LDLR, APoB ou PCSK9. Sua pontuação se dá em forma de letras (A, B, C, D, E), sendo considerado diagnóstico certo quando os critérios A e B ou C estão presentes e diagnóstico provável na presença dos critérios A e D ou A e E (Tabela 3). 110 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A Tabela 3 DIAGNÓSTICO CLÍNICO DE HIPERCOLESTEROLEMIA FAMILIAR HETEROZIGÓTICA PELOS CRITÉRIOS DO SIMON BROOME REGISTER GROUP Critério Descrição A Concentrações de CT >290mg/dL em adultos ou >260mg/dL em crianças com idade igual ou inferior a 16 anos, ou LDL-c >190mg/dL em adultos, ou >155mg/dL em crianças. B Presença de xantomas tendinosos no paciente ou em algum parente de 1º grau. C Mutação no gene do LDLR ou da ApoB. D História familiar de IAM antes dos 50 anos de idade em parente de 2º grau ou antes dos 60 anos de idade em parente de 1º grau. E História familiar de colesterol elevado (>290mg/dL) em parentes de 1º ou 2º graus. Diagnóstico ( ) Certo — requer os critérios A e B ou o critério C ( ) Provável — requer os critérios A e D ou os critérios A e E CT: colesterol total; LDL-c: colesterol da lipoproteína de baixa densidade; LDLR: receptor de LDL; APoB: alipoproteína B; IAM: infarto agudo do miocárdio. Fonte: Santos e colaboradores (2012).4 TESTE GENÉTICO A identificação de mutação causal em um paciente com suspeita de HF pode fornecer motivação para pacientes iniciarem um tratamento adequado. Para certificar-se do diagnóstico da doença, o teste genético é o padrão-ouro, assim como é útil para pacientes com diagnóstico duvidoso ou quando alguns critérios não são conhecidos ou não estão disponíveis. Testes genéticos também podem ser importantes para a confirmação de famílias recém-identificadas ou com forte suspeita de HF. Quando encontrada a mutação, o teste fornece uma resposta simples e definitiva para o diagnóstico da doença.34 É recomendado que o diagnóstico clínico seja confirmado com a análise genética, quando disponível.35 Apesar dos aspectos positivos, os testes genéticos apresentam algumas limitações. Entre os pacientes hipercolesterolêmicos com diagnóstico de HF possível, a taxa de identificação de mutação causal por meio do teste genético é igual ou inferior a 50%, enquanto naqueles com HF definitiva segundo critérios clínicos a taxa de identificação da mutação pode chegar a 86%.36,37 Um teste genético negativo não exclui a HF. Pacientes com LDL-c elevado permanecem em alto risco e devem ser tratados de acordo com diretrizes aceitas, independentemente dos resultados dos testes genéticos. As manifestações clínicas não são capazes de identificar o tipo de mutação, por isso o teste genético é necessário para verificação. Em razão da variabilidade de genes e do grande número de mutações possíveis, o método de diagnóstico genético deve incluir o sequenciamento da região codificadora de todos os genes ligados à etiologia da doença.37 111 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Para que seja possível o sequenciamento em grande escala de um grupo de genes (painel de genes-alvo), utiliza-se o sequenciamento de nova geração (em inglês, next generation sequencing [NGS]). Por meio dessa técnica, desenvolve-se um painel com todos os genes a serem sequenciados, os quais são colocados em um chip. Pode-se, ainda, utilizar o sequenciamento de exomas, que permite determinar a sequência da região codificante de praticamente todos os genes presentes no genoma humano. Apesar de fornecer extensa cobertura do genoma, muitos genes podem não ser sequenciados perfeitamente. Em casos específicos de doenças monogenéticas, como a HF, painéis contendo os genes-alvo configuram-se como alternativa mais custo-efetiva, além de mais precisa. A tecnologia de NGS apresenta vantagens em relação ao sequenciamento tradicional (Sanger), que é considerado padrão-ouro para tal. Entre elas, podem ser citados: ■ velocidade de obtenção de resultados; ■ quantidade de material necessário utilizado na reação; ■ custo do sequenciamento por base; ■ quantidade de informação gerada; ■ precisão dos resultados obtidos. Etapas Para o estudo genético, é efetuada a coleta de sangue periférico em tubo com ácido etilenodiaminotetracético (EDTA), do qual se obtém o DNA genômico de leucócitos. A primeira etapa na preparação do material consiste na geração de uma biblioteca de fragmentos de DNA flanqueados por adaptadores específicos. As regiões de interesse dos genes em estudo são amplificadas por meio da reação em cadeia da polimerase (em inglês, polymerase chain reaction [PCR]) em larga escala, em reações multiplexadas, com centenas de pares de oligonucleotídeos em um mesmo tubo de reação. A partir dessas reações, são construídas bibliotecas com códigos de barras para identificar cada paciente analisado. Os fragmentos gerados são amplificados por clonagem em esferas por PCR em emulsão. Essas esferas com os fragmentos são aplicadas em um chip e inseridas no equipamento de NGS. Uma vez gerados, os dados são transferidos para uma plataforma, na qual as leituras são mapeadas com o genoma humano (hg19/GRCh37), e é realizada a interpretação das variantes encontradas. Além da NGS, realiza-se também a pesquisa do número de cópias de variantes com a técnica de multiplex ligation-dependent probe amplification (MLPA). 112 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A RASTREAMENTO EM CASCATA A estratégia mais custo-efetiva para o diagnóstico de HF é o rastreamento de mutações em parentes de 1º grau de pacientes nos quais uma mutação causal para HF tenha sido identificada.38,39 Os indivíduos diagnosticados com HF por meio de teste genético passam a ser os casos-índice e, a partir deles, devem ser rastreados os parentes de 1º, 2º e 3º graus, em uma abordagem genética combinada à análise do perfil lipídico dos familiares suspeitos e de anamnese dirigida, exame físico, pesquisando-se arco corneano precoce, xantomas tendíneos e xantelasmas. Essa ação é referida como rastreamento genético em cascata.40 A probabilidadede detecção de HF é de1 ■ 50% — em parentes de 1º grau; ■ 25% — em parentes de 2º grau; ■ 12,5% — em parentes de 3º grau. Como primeira abordagem para diagnóstico de HF, pode-se realizar o teste genético, no qual se busca a mesma alteração do caso-índice. Estudos mostram que pouquíssimos indivíduos com HF são diagnosticados. Estima-se que aproximadamente 20% desses pacientes têm diagnóstico, dos quais menos de 10% recebem tratamento adequado.1 O rastreamento em cascata colabora para o aumento do número de diagnósticos e para a redução da idade com que o indivíduo é diagnosticado; dessa forma, há mais chances de tratamento precoce e de diminuição do risco cardiovascular global. O rastreamento clínico/bioquímico deve ser realizado mesmo quando a realização de teste genético não é possível.41,42 Alguns critérios podem ser utilizados para identificar os casos-índice:2 ■ colesterol plasmático total igual ou superior a 310mg/dL em um adulto ou membro da família adulto; ■ doença coronariana prematura em um indivíduo ou membro da família (antes dos 55 anos de idade para homens e dos 60 anos de idade para as mulheres); ■ xantomas tendíneos em um indivíduo ou membro da família; ■ morte cardíaca súbita e prematura de um membro da família. 113 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A ATIVIDADES 7. Assinale a alternativa correta sobre os critérios diagnósticos de HF. A) Há forte correlação entre a presença de arco corneano e manifestações de DAC. B) A presença de arco corneano, parcial ou total, sugere HF quando observada antes dos 60 anos de idade. C) A presença de hipertrigliceridemia afasta a possibilidade de diagnóstico de HF. D) Concentrações de LDL-c iguais ou superiores a 190mg/dL em adultos levantam a suspeita de HF. Resposta no final do artigo 8. Observe as afirmativas sobre os sinais clínicos da HF. I — Arco corneano. II — Catarata. III — Xantomas. IV — Xantelasmas. Quais estão corretas? A) Apenas a I e a II. B) Apenas a III e a IV. C) Apenas a I, a III e a IV. D) A I, a II, a III e a IV. Resposta no final do artigo 9. Assinale a alternativa correta quanto aos critérios utilizados para uniformizar e formalizar o diagnóstico de HF. A) O US MEDPED inclui dados de história pessoal e familiar de dislipidemia, aterosclerose prematura e sinais clínicos de dislipidemia e dados laboratoriais. B) O diagnóstico de HF com base no critério do Dutch MEDPED considera a análise de mutações funcionais no gene que codifica o LDLR, APoB ou PCSK9. C) O critério A do Simon Broome Register Group inclui concentrações de CT >240mg/dL em adultos ou >200mg/dL em crianças com idade igual ou inferior a 16 anos; ou LDL-c >190mg/dL em adultos ou >155mg/dL em crianças. D) A Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Aterosclerose orienta que seja utilizado o critério de US MEDPED. Resposta no final do artigo 114 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A 10. Sobre o teste genético e outros critérios de identificação do tipo de mutação na HF, assinale a alternativa correta. A) Os critérios do MEDPED são suficientes para o diagnóstico. B) O diagnóstico clínico é suficiente para identificar a doença e as mutações. C) O tipo de mutação não pode ser determinado clinicamente, por isso é necessário o teste genético para verificação. D) O critério de Simon Broome e o MEDPED não incluem mutação. Resposta no final do artigo 11. Sobre a importância do teste genético para o diagnóstico de HF, assinale V (verdadeiro) ou F (falso). ( ) O teste genético é o padrão-ouro para diagnóstico de certeza da doença. ( ) Um teste genético negativo exclui a possibilidade de diagnóstico de HF. ( ) A tecnologia de NGS, considerada padrão-ouro, permite sequenciar todos os genes perfeitamente. ( ) A quantidade de informação gerada e a precisão dos resultados obtidos são algumas vantagens do NGS. Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta. A) V — V — F — F B) V — F — F — V C) F — V — V — F D) F — F — V — V Resposta no final do artigo 12. Quanto à ordem lógica dos acontecimentos do diagnóstico em cascata, assinale a alternativa correta. A) Rastreamento familiar, identificação do caso-índice, tratamento, prevenção. B) Tratamento, identificação do caso-índice, prevenção, rastreamento familiar. C) Rastreamento familiar, tratamento, identificação do caso-índice, prevenção. D) Diagnóstico do caso-índice, tratamento, rastreamento familiar e prevenção. Resposta no final do artigo 115 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A 13. Observe as afirmativas sobre critérios que podem ser utilizados para a identificação dos casos-índice de HF. I — Colesterol plasmático total igual ou superior a 310mg/dL em um adulto ou membro da família adulto. II — Doença coronariana em um indivíduo da família antes dos 60 anos de idade (homem ou mulher). III — Xantomas tendíneos em um indivíduo ou membro da família. IV — Morte cardíaca súbita e prematura em um membro da família. Quais estão corretas? A) Apenas a I e a II. B) Apenas a III e a IV. C) Apenas a I, a III e a IV. D) A I, a II, a III e a IV. Resposta no final do artigo ■ TRATAMENTO Nesta seção, serão abordadas considerações sobre os tratamentos farmacológico e nutricional da HF. FARMACOLÓGICO Embora não existam ensaios clínicos randomizados (ECRs) controlados para permitir recomendações de tratamento baseadas em evidências para HF, visto que tais estudos não são eticamente justificáveis, pode-se considerar o tratamento farmacológico para diminuir os valores de LDL-c da seguinte forma para a população adulta:32,33 ■ prevenção primária — redução superior a 50% de LDL-c ou a níveis inferiores a 70mg/dL; ■ prevenção secundária — redução superior a 50% de LDL-c ou a níveis inferiores a 50mg/dL. No caso da população pediátrica, sugerem-se níveis de LDL-c inferiores a 135mg/dL.32,33 Pacientes com HF que apresentam maior risco de DAC requerem tratamento medicamentoso mais intensivo e possuem meta de LDL-c <50mg/dL ou <70mg/dL. O Quadro 1 apresenta os critérios da classificação dos indivíduos com DAC em pacientes de muito alto risco e de alto risco. 116 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A Quadro 1 CLASSIFICAÇÃO DOS PACIENTES COM DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA Risco Características Muito alto ■■ DAC clinicamente evidente ou outra DCV aterosclerótica Alto ■■ Diabetes ■■ História familiar de DAC muito precoce (<45 anos de idade em homens e <55 anos de idade em mulheres) ■■ Tabagismo atual ■■ Dois ou mais fatores de risco para doença coronariana ■■ Elevação dos níveis de Lp(a) (≥50mg/dL) DAC: doença arterial coronariana; DCV: doença cardiovascular; Lp(a): lipoproteína (a). Fonte: Santos e colaboradores (2012);4 Faludi e colaboradores (2017).18 No momento da escolha terapêutica, ao abordar o paciente com HF, é essencial que o profissional da saúde esclareça que o tratamento será crônico e vitalício. No caso de pacientes pediátricos e jovens adultos, recomenda-se manter diálogo com o paciente ou cuidadores/responsáveis sobre medicações concomitantes, comorbidades e segurança.43 Estatinas Até o presente momento, a redução do LDL-c por inibidores da 3-hidroxi-3-methyl-glutaril-CoA redutase (HMG-CoA redutase) ou estatinas permanece como a terapia mais validada por estudos clínicos para diminuir a incidência de eventos cardiovasculares. A depleção intracelular de colesterol estimula a liberação de fatores transcricionais e, como consequência, ocorrem a síntese e a expressão na membrana celular de receptores para a captação do colesterol circulante, como o LDLR. Assim, a ação das estatinas pode potencialmente influenciar em todo o conjunto das lipoproteínas circulantes que interagem com o LDLR, como a LDL, a VLDL, IDL e os remanescentes de quilomícrons. Em metanálise dedados individuais de 170 mil pacientes e 26 ECRs controlados duplo-cegos, para cada 40mg/dL de redução do LDL-c com estatinas, ocorreu diminuição relativa da mortalidade por todas as causas em 10%, refletindo, em grande parte, a redução no número de mortes por DAC (−20%). Estudos também mostram redução dos eventos isquêmicos coronários agudos e da necessidade de revascularização do miocárdio e do acidente vascular cerebral (AVC) em cerca de 22%.33 Com base nas evidências, o uso de estatina está indicado em terapias de prevenção primária e secundária como primeira opção (grau de recomendação: I; nível de evidência: A). A redução do LDL-c varia entre as estatinas, e essa diferença está fundamentalmente relacionada com a dose inicial. A cada vez que se dobra a dose de qualquer uma dessas estatinas, a redução média adicional do LDL-c é de 6 a 7%.33 117 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Embora estudos mostrem diferenças na potência das estatinas quanto a sua capacidade de levar à redução do LDL-c, todas foram capazes, em ECRs, de reduzir eventos e mortes cardiovasculares. Assim, recomenda-se que seja empregada a estatina que estiver disponível no serviço de saúde, procurando-se atingir as metas terapêuticas recomendadas, com o ajuste de doses e eventual associação de fármacos. As estatinas reduzem os Tg, em geral, tanto mais quanto maior sua capacidade de reduzir o LDL-c. Quanto ao HDL-c, elas podem elevar suas taxas, mas, em geral, com pequeno aumento porcentual. No entanto, nos estudos de prevenção primária ou secundária com estatinas, a variação do HDL-c ou dos Tg não influenciou a redução de eventos cardiovasculares.33 Embora as estatinas sejam fármacos bastante seguros, ocorrências de toxicidade muscular foram relatadas em 10 a 20% dos casos. Miosite grave, com aumento da creatinofosfoquinase sérica (CPK), e até rabdomiólise com mioglobinuria e elevação da creatinina sérica têm sido descritas. Em caso de intolerância à estatina, são necessários medicamentos redutores lipídicos alternativos.44 A dosagem de CPK deve ser avaliada no início do tratamento, principalmente em indivíduos de alto risco de eventos adversos musculares, como pacientes com antecedentes de intolerância à estatina, com antecedentes familiares de miopatia ou em uso concomitante de fármacos que aumentem o risco de miopatia. A dosagem rotineira de CPK não é recomendada em pacientes já em uso de estatina, exceto se ocorrerem sintomas musculares (dor, sensibilidade, rigidez, câimbras, fraqueza e fadiga localizada ou generalizada) ou se forem introduzidos fármacos que possam interagir com a estatina ou quando se eleva sua dose (grau de recomendação: IIa; nível de evidência: B). A avaliação basal das enzimas hepáticas (alanina aminotransferase [ALT] e aspartato aminotransferase [AST]) deve ser realizada antes do início da terapia com estatina. Durante o tratamento, deve-se avaliar a função hepática quando ocorrerem sintomas ou sinais sugestivos de hepatotoxicidade, como33 ■ fadiga ou fraqueza; ■ perda de apetite; ■ dor abdominal; ■ urina escura; ■ aparecimento de icterícia (grau de recomendação: IIa; nível de evidência: B). Para o início do tratamento de pacientes adultos com HF, recomenda-se que seja utilizada a estatina de alta intensidade com menor custo de aquisição, com o objetivo de reduzir pelo menos 50% a concentração plasmática de LDL-c basal.33,35 Para se atingir essa meta, a dose de estatina deve ser otimizada e aumentada até a dose máxima tolerada permitida por bula.33,35 Recomenda-se que pacientes tratados com estatinas tenham suas funções renal e hepática monitoradas.33,35 Para pacientes pediátricos, deve ser feita orientação quanto à dieta adequada, e o tratamento com estatinas deve ser oferecido entre os 8 e 10 anos de idade, com meta de atingimento de LDL-c de 135mg/dL, sendo prescrito apenas por meio de centros de referência em lípides.43 A decisão de iniciar o tratamento com estatinas deve considerar os seguintes fatores:33,43 ■ idade da criança; ■ idade do início da doença coronariana na família; ■ presença de fatores de risco adicionais, incluindo os níveis de LDL-c basais. 118 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A Embora as estatinas sejam a terapia de primeira linha para a HFHe, os pacientes com HFHo, por sua vez, têm menor ou nenhuma resposta a esse tratamento, pois a HFHo tem como principal causa a mutação em ambos os alelos do receptor da LDL. Isso faz com que eles sejam praticamente nulos em indivíduos homozigóticos; assim, as estatinas, por aumentarem os LDLRs, não teriam tanto efeito nesses pacientes. Dados mostram que indivíduos com LDLR negativo e LDLR defeituoso apresentam redução média de LDL-c de 15 e 26%, respectivamente. As diretrizes recomendam o uso das estatinas mais potentes na dose mais alta tolerada pelo paciente.32 A adição de ezetimiba ao tratamento pode reduzir mais 10 a 15% os níveis de LDL-c, proporcionando, assim, a diminuição total de 30 a 40% do LDL-c, com eventos adversos mínimos e custos baixos.9 Ezetimiba A ezetimiba inibe a absorção de colesterol na borda em escova do intestino delgado, atuando seletivamente nos receptores niemann-pick C1-like1 (NPC1-L1) e inibindo o transporte intestinal de colesterol. A inibição da absorção de colesterol (em grande parte, do colesterol biliar) leva à diminuição dos níveis de colesterol hepático e ao estímulo à síntese de LDLR, com consequente redução do nível plasmático de LDL-c de 10 a 25%. Em comparação com o placebo, a ezetimiba associada à estatina reduziu eventos cardiovasculares em pacientes com estenose aórtica degenerativa e doença renal crônica (DRC). Em comparação com a monoterapia com sinvastatina, o estudo The Improved Reduction of Outcomes: Vytorin Efficacy International Trial (IMPROVE-IT)45 mostrou redução significativa de eventos cardiovasculares após síndrome coronária aguda com o uso da associação de estatina e ezetimiba. A ezetimiba isolada constitui opção terapêutica em pacientes que apresentam intolerância às estatinas. A ezetimiba associada a doses toleradas de estatina é uma alternativa para pacientes que apresentam efeitos adversos com doses elevadas de estatina (grau de recomendação: IIa; nível de evidência: C).44 Em pequenos estudos, o tratamento com ezetimiba reduziu a esteatose hepática não alcoólica; no entanto, o benefício clínico desse efeito ainda requer investigação em ensaios dimensionados para avaliar os desfechos clínicos (grau de recomendação: IIb; nível de evidência: C). A ezetimiba é empregada na dose única de 10mg/dia e pode ser administrada a qualquer hora do dia, com ou sem alimentação, pois não interfere na absorção de gorduras e vitaminas lipossolúveis. Raros efeitos colaterais têm sido apontados e estão, em geral, relacionados com o trânsito intestinal. Por precaução, recomenda-se que a ezetimiba não seja utilizada em casos de dislipidemia com doença hepática aguda.33 A administração de ezetimiba em combinação com estatinas é recomendada quando os níveis de LDL-c não são adequadamente controlados apenas com estatinas.35,44–47 A monoterapia com ezetimiba é uma alternativa somente quando a terapia inicial com estatinas é contraindicada ou não tolerada.43 119 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Sequestradores de ácidos biliares Os sequestradores de ácidos biliares são fármacos hipolipemiantes não absorvíveis, que atuam no intestino inibindo a recaptação entero-hepática e aumentando a perda fecal de sais biliares. Isso resulta em depleção de sais biliares no fígado e em um sinal para a produção adicional. A quantidade de colesterol diminui à medida que os novos ácidos biliares são sintetizados, o que desencadeia um aumento na atividade dos LDLRs, com consequente diminuição do LDL-c.33 Dependendo da dosagem, os sequestradores deácidos biliares diminuem 10 a 20% o LDL-c. Por não serem absorvidos sistemicamente, são considerados mais seguros quando usados com outros medicamentos redutores do colesterol. Assim como a ezetimiba, o efeito sobre a redução do LDL-c pode ser aditivo com as estatinas e até com a ezetimiba. Os efeitos colaterais, como constipação, inchaço, náusea e dor abdominal, além de múltiplas interações medicamentosas, limitam a adesão e o uso do paciente. Os medicamentos mais antigos, como a colestiramina e o colestipol, têm mais efeitos colaterais do que o colesevelam, além de ter menor número de interações medicamentosas. O colesevelam é o sequestrante de ácidos biliares recomendado para pacientes com HF.1 Ácido nicotínico — niacina A niacina pertence à família da vitamina B, solúvel em água, e vem sendo utilizada há décadas para diminuir o LDL-c. Esse fármaco (500mg a 2g) reduz a ação da lipase tecidual nos adipócitos, diminuindo a liberação de ácidos graxos livres para a corrente sanguínea, processo que reduz a síntese de triacilgliceróis pelos hepatócitos. A niacina pode reduzir aproximadamente 5 a 25% o LDL-c, aumentá-lo 15 a 35% e diminuir os triacilgliceróis cerca de 20 a 50%. Por conta de seus efeitos colaterais, como flushing, miopatia, hiperuricemia e disfunção hepática, entre outros, seu uso em pacientes com HFHe pode ser eficaz, mas requer monitoramento muito estrito, sendo utilizada com pouca frequência.34,47 Aférese do colesterol de lipoproteína de baixa densidade O emprego de estatinas potentes associadas a outros tratamentos hipolipemiantes em pacientes com HFHo reduz o risco relacionado à morte prematura por DAC e proporciona maior sobrevida (30 ou 40 anos de idade). O risco de pacientes com HF depende dos níveis elevados de LDL-c desde o nascimento, por isso estratégias para detecção precoce e tratamento da doença que vise à redução desses níveis e ao gerenciamento de outros fatores de risco são mandatórios. As estatinas, isoladamente ou em combinação com outras terapias hipolipemiantes, reduzem o LDL-c, em média, 25% em pacientes com HFHo e 45 a 60% em pacientes com HFHe. Entretanto, quase todos aqueles com HFHo e uma parte dos com HFHe continuam com níveis elevados de LDL-c (entre eles, os que são intolerantes a estatinas podem se beneficiar da aférese do LDL-c, assim como de novos potentes fármacos redutores dessa lipoproteína).48 120 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A A aférese do LDL-c é um método extracorpóreo de remoção de lipoproteínas contendo ApoB da circulação (LDL, IDL, VLDL, Lp(a)). Existem vários métodos de aférese, e, em todos eles, após um único tratamento, a redução de LDL-c média é de 50 a 70%. Ainda que a aférese seja repetida a cada 1 a 2 semanas, os níveis de LDL-c não são mantidos de modo consistente dentro de limites aceitáveis. Os níveis de LDL-c se recuperam rapidamente após o tratamento, retornando para 50 e 90% dos níveis de pré-aférese após 4 e 14 dias, respectivamente. Foi relatado que o uso de aférese em longo prazo promove a regressão de xantomas, diminui a progressão da aterosclerose e medeia redução acentuada na inflamação das paredes arteriais característica da HF. Embora seja demorada e não esteja facilmente disponível para todos os pacientes com HFHo, a aférese pode ser uma opção econômica para o tratamento da HF.49 De acordo com a National Lipid Association Expert Panel on Familial Hypercholesterolemia, dos Estados Unidos, a aférese do LDL-c é recomendada se8 ■ a redução da meta de LDL não foi alcançada apesar da dieta e da terapia medicamentosa máxima (após 6 meses); ■ a terapia medicamentosa adequada não é tolerada ou é contraindicada; ■ o paciente com HFHo apresenta valores de LDL-c ≥300mg/dL (ou não HDL-c ≥330mg/dL); ■ o paciente com HFHe apresenta valores de LDL-c ≥300mg/dL (ou não HDL-c ≥330mg/dL) e um ou nenhum fator de risco; ■ o paciente com HFHe apresenta valores de LDL-c ≥200mg/dL (ou não HDL-c ≥230mg/dL) e 2 ou mais fatores de risco ou Lp(a) ≥50mg/dL; ■ o paciente com HFHe apresenta valores de LDL-c ≥160mg/dL (ou não HDL-c ≥190mg/dL) e risco muito alto (DAC estabelecida, outras DCVs ou diabetes). Inibidores da pró-proteína convertase subtilisina/kexina tipo 9 — alirocumabe e evolucumabe A funcionalidade e o número de LDLRs expressos na superfície dos hepatócitos são fatores determinantes dos níveis plasmáticos de LDL. A LDL circulante se liga aos LDLRs na superfície do hepatócito, libera seu conteúdo para o endossomo e, posteriormente, o receptor é reciclado de volta à superfície do hepatócito, para captar mais partículas de LDL do plasma. Em condições normais, o LDLR refaz esse ciclo aproximadamente 150 vezes, até que seja degradado. A PCSK9, enzima que desempenha papel importante no metabolismo lipídico e modula a densidade de LDLR, quando sintetizada no núcleo celular e secretada pelos hepatócitos, se liga aos LDLRs na circulação, favorecendo sua degradação.33 Estudos realizados em animais e mutações em seres humanos demonstraram que o ganho de função da PCSK9 ocasiona aumento da degradação dos LDLRs com elevações dramáticas nas concentrações de LDL. Em contrapartida, mutações com perda de função da PCSK9 apresentam o efeito oposto: elevam a densidade do LDLR na superfície dos hepatócitos, com consequente aumento da remoção de partículas de LDL e redução do LDL-c. Assim, a inibição da PCSK9 previne a ligação do LDLR à PCSK9 e a subsequente degradação lisossomal do LDLR, elevando a densidade do receptor na superfície do hepatócito e a depuração das partículas circulantes de LDL.33 121 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A Em 2016, dois inibidores da PCSK9 totalmente humanos foram aprovados no Brasil para comercialização; ambos são aplicados por meio de injeção subcutânea: ■ alirocumabe — 75mg ou 150mg, a cada 2 semanas; ■ evolucumabe — 140mg, a cada 2 semanas, ou 420mg, 1 vez ao mês. Os inibidores da PCSK9 reduzem de forma bastante intensa as concentrações de LDL-c em comparação ao placebo (redução média de 50–60%). Um estudo realizado com evolucumabe demonstrou benefícios significativos também em outras lipoproteínas pró-aterogênicas, com redução de 52% na fração não HDL-c, 47,3% na ApoB, 12,6% nos Tg, 25,5% na Lp(a), e aumento do HDL-c e da ApoA1 de 7,0 e 4,2%, respectivamente.50 O alirocumabe apresentou resposta semelhante no perfil lipídico, com (p <0,001 para todas as comparações):51 ■ redução significativa: • não HDL-c — 52,3%; • ApoB — 54%; • Lp(a) — 25,6%; • Tg — 17,3%; ■ elevação de HDL-c — 4,6%; ■ elevação de ApoA1 — 2,9%. Quanto à indicação dos inibidores da PCSK9 no tratamento das dislipidemias, recomenda-se a utilização somente em pacientes com risco cardiovascular elevado, em tratamento otimizado com estatinas na maior dose tolerada, associado ou não à ezetimiba, e que não tenham alcançado as metas de LDL-c ou não HDL-c recomendadas. Em geral, o uso dos inibidores da PCSK9 é seguro e bem-tolerado. É descrita a ocorrência de nasofaringite, náuseas, fadiga e aumento da incidência de reações no local da injeção (vermelhidão, prurido, edema ou sensibilidade/dor).52 Adicionalmente ao alirocumabe e ao evolucumabe, existem alternativas farmacológicas não registradas no Brasil, como a lomitapida e o mipomerseno, fármacos aprovados apenas para o tratamento da HFHo por conta de seus eventos adversos. Further cardiovascular Outcomes Research with PCSK9 Inhibition in subjects with Elevated Risk trial O estudo Further cardiovascular Outcomes Research with PCSK9 Inhibition in subjects with Elevated Risk trial (FOURIER)53 avaliou mais de 27.500 pacientes de muito alto risco (infarto agudo do miocárdio [IAM] prévio, AVC, ou doença arterial periférica sintomática) em tratamento hipolipemiante de alta ou moderada intensidade, com estatinas e/ou ezetimiba, aleatorizados para receber evolucumabe(em regime de 140mg, a cada 15 dias, ou 420mg, 1 vez por mês) ou placebo (a cada 15 dias, ou 1 vez por mês). O FOURIER teve como objetivo primário avaliar os índices de mortalidade cardiovascular, IAM, AVC, angina instável requerendo hospitalização ou revascularização coronária e, como secundário-chave, avaliar a ocorrência de morte cardiovascular, IAM ou AVC. Os pacientes foram acompanhados por 2,2 anos (mediana) e se observou redução de 59% no LDL-c comparado ao placebo (partiu-se de um LDL-c de 92mg/dL no período basal, alcançando-se a mediana de 30mg/dL aos 48 meses [p <0,001]). 122 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A Com relação ao placebo, o evolucumabe reduziu o desfecho primário 15% (1.344 pacientes: 9,8% vs. 1.563 pacientes: 11,3%; hazard ratio [HR]: 0,85; intervalo de confiança [IC] 95%: 0,79–0,92; p <0,001) e o desfecho secundário-chave 20% (816 pacientes: 5,9% vs. 1.013 pacientes: 7,4%; HR: 0,80; IC95%: 0,73–0,88; p <0,001). Os resultados foram consistentes entre os subgrupos, incluindo aqueles nos quartis inferiores dos valores basais de LDL-c (mediana, 74mg/dL). Não houve diferenças entre os grupos quanto à ocorrência de eventos adversos (incluindo novos casos de diabetes e eventos neurocognitivos), com exceção de reações no local de injeção, mais frequentes com o evolucumabe (2,1% vs. 1,6%).53 Inibidores da proteína de transferência microssomal A proteína de transferência microssomal (em inglês, microsomal triglyceride transfer protein [MTP]) é responsável por transferir Tg, fosfolipídios e colesterol para a ApoB, processo essencial na formação e secreção de lipoproteínas contendo ApoB no fígado (VLDL) e intestino (quilomícron). O inibidor da MTP (IMTP), lomitapida, impede a incorporação de Tg aos quilomícrons e VLDLs, reduzindo, assim, a secreção de lipoproteínas no sangue, o que resulta em níveis mais baixos de LDL-c e Tg.9,33 Como a MTP está envolvida na absorção de vitaminas lipossolúveis, a lomitapida pode reduzir os níveis plasmáticos de vitamina E, que é transportada principalmente por LDL. Porém, pacientes com HF têm níveis altos dessa vitamina, e estudos mostram que, após o tratamento com tal fármaco, esses níveis mantiveram-se dentro ou acima do normal. A lomitapida foi aprovada nos Estados Unidos para pacientes com HFHo como terapia adjuvante aos medicamentos clássicos.9,33 A eficácia e a segurança do lomitapida foi estudada em 29 pacientes com HFHo. A substância foi administrada nas doses crescentes de 5 a 60mg/dia, por 26 semanas, e acompanhada até 78 semanas para avaliação de segurança. Vinte e três pacientes completaram 78 semanas de estudo, com dose mediana de 40mg/dia junto com estatina e outros fármacos. O LDL-cc médio diminuiu de 336 para 166mg/dL na 26ª semana, mas aumentou para 208mg/dL em 78 semanas. Os eventos adversos mais comuns são náusea, diarreia e transaminases elevadas.9,33 Oligonucleotídeo antissenso — mipomersen O mipomersen é um oligonucleotídeo antissenso de segunda geração que se liga a uma sequência específica de bases do ácido ribonucleico mensageiro (mRNA) da ApoB, o principal componente proteico da LDL e da VLDL. Ao induzir a degradação do mRNA da ApoB, o mipomersen bloqueia a síntese da proteína ApoB, reduzindo a produção de VLDL e, consequentemente, da LDL e de outras lipoproteínas aterogênicas.9,33 Em estudo duplo-cego controlado por placebo em pacientes com HFHo, 200mg de mipomersen aplicados por injeção subcutânea foram adicionados à terapia hipolipemiante padrão, o que resultou em reduções adicionais em 26 semanas nos níveis plasmáticos de LDL-c (média de 25%), ApoB (27%) e Lp(a) (31%) versus placebo.54 Os eventos adversos comuns com o mipomersen incluíram reações semelhantes à gripe, reações no local da injeção e elevações nos níveis de ALT. A gordura hepática não foi medida nesse estudo, mas o aumento de seu conteúdo foi observado em outros estudos de pacientes com hipercolesterolemia e HFHe. O aumento da gordura hepática observado durante o tratamento com lomitapida e mipomersen pode estar correlacionado com o grau de eficácia. Dados disponíveis limitados sugerem que esse efeito é reversível após a suspensão do tratamento. Em razão do risco potencial de toxicidade hepática, ambos os agentes foram aprovados em outros países para uso restrito.9 123 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A NUTRICIONAL Medidas dietoterápicas e mudanças de estilo de vida devem ser sempre recomendadas para a prevenção da DCV.9,33 No entanto, em geral, por conta de concentrações elevadas de LDL-c decorrentes dos defeitos genéticos que caracterizam a HF, elas têm menor impacto sobre os lípides — e possivelmente sobre a evolução da aterosclerose — do que na população em geral.55 Embora as recomendações dietéticas possam produzir benefícios apenas discretos sobre a colesterolemia, os Tgs também podem permitir o controle de peso e de outras doenças concomitantes, como o diabetes melito (DM) e a hipertensão arterial, e devem ser incentivadas a todos indivíduos com hipercolesterolemia, especialmente as crianças.56 Apesar da associação entre consumo de colesterol e doença coronariana no tratamento da hipercolesterolemia, sabe-se que o colesterol alimentar exerce pouca influência sobre a concentração plasmática de colesterol e aterosclerose precoce, já que 56% do colesterol da dieta é absorvido.55 Os ácidos graxos (saturados [SFAs] e trans [AGTs]) exercem maior influência sobre a colesterolemia; os AGTs ainda reduzem o HDL-c.57,58 Em razão da controvérsia sobre o efeito hipercolesterolemiante do colesterol alimentar, não se recomenda a restrição de gorduras totais e do colesterol da dieta, objetivando a redução e o controle do colesterol e de LDL-c plasmáticos. As recomendações para indivíduos com LDL-c acima da meta são apresentadas na Tabela 4.33 Tabela 4 RECOMENDAÇÕES DIETÉTICAS PARA O TRATAMENTO DA HIPERCOLESTEROLEMIA Recomendação LDL-c acima da meta ou presença de comorbidades*(%) Perda de peso 5–10 Carboidratos (% VCT) 45–60 Açúcares de adição (% VCT) <10 Proteínas (% VCT) 15 Gorduras (% VCT) 25–35 AGTs (% VCT) Excluir da dieta SFAs (% VCT) <7 MUFAs (% VCT) 15 PUFAs (% VCT) 5–10 EPA e DHA (em gramas) — *Hipertensão arterial sistêmica, diabetes, sobrepeso ou obesidade, circunferência da cintura aumentada, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia, síndrome metabólica, intolerância à glicose ou aterosclerose significativa. LDL-c: colesterol da lipoproteína de baixa densidade; VCT: valor calórico total; AGTs: ácidos graxos trans; SFAs: ácidos graxos saturados; MUFAs: ácidos graxos monoinsaturados; PUFAs: ácidos graxos poli-insaturados; EPA: ácido eicosapentaenoico; DHA: ácido decosa-hexaenoico. Fonte: Adaptada de Faludi e colaboradores (2017).33 124 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A A alimentação saudável pode ser incentivada por meio de resgates do padrão alimentar de cada indivíduo. As orientações dietéticas devem preconizar a seleção dos alimentos, o modo de preparo, a quantidade e as substituições alimentares, em sintonia com a mudança de estilo de vida.34 População infantil Para crianças e adolescentes com HF, recomenda-se que uma alimentação equilibrada seja iniciada após os 2 anos de idade, com o objetivo de alcançar os níveis lipídicos conforme preconizado pelas diretrizes, mesmo sabendo que a resposta à orientação dietética será baixa, contudo fundamental para o crescimento e desenvolvimento, pois mantém a distribuição adequada de macro e micronutrientes e calorias. Assim, é valiosa a colaboração do nutricionista.59 ATIVIDADES 14. Sobre o objetivo do tratamento farmacológico na HF, assinale a alternativa correta. A) Diminuir 20% os valores de Tg e 50% os do LDL-c. B) Controlar as comorbidades associadas à doença. C) Reduzir mais de 50% os valoresde LDL-c ou a níveis inferiores a 70mg/dL, na prevenção primária, e a 50mg/dL na prevenção secundária. D) Reduzir os valores de LDL-c para menos de 70mg/dL. Resposta no final do artigo 15. Sobre as características dos pacientes com HF com alto risco de DAC, observe as afirmativas. I — Tabagismo atual. II — Diabetes. III — História familiar de DAC muito precoce. IV — DAC clinicamente evidente. Quais estão corretas? A) Apenas a I e a II. B) Apenas a III e a IV. C) Apenas a I, a II e a III. D) A I, a II, a III e a IV. Resposta no final do artigo 125 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A 16. Quanto ao tratamento farmacológico da HF com estatinas, assinale V (verdadeiro) ou F (falso). ( ) Até o presente momento, essa é a terapia mais validada por estudos clínicos para diminuir a incidência de eventos cardiovasculares — como prevenção primária e secundária. ( ) Apesar da segurança da medicação, foram relatados casos de toxicidade muscular em 10 a 20% dos pacientes estudados. ( ) A redução do LDL-C varia entre as estatinas, e essa diferença está relacionada com o tipo de substância utilizado. ( ) Nem todas as estatinas são capazes de reduzir eventos e mortes cardiovasculares. Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta. A) V — F — F — V B) V — V — F — F C) F — F — V — V D) F — V — V — F Resposta no final do artigo 17. Observe as afirmativas sobre o tratamento farmacológico da HF. I — A ezetimiba isolada constitui opção terapêutica para pacientes que apresentam intolerância às estatinas. II — O colesevelam é o sequestrante de ácidos biliares recomendado para pacientes com HF. III — A niacina é o medicamento mais frequentemente recomendado para pacientes com HFHe. IV — O tratamento da HF com aférese de LDL-c pode ser indicado quando a terapia medicamentosa adequada não é tolerada ou é contraindicada. Quais estão corretas? A) Apenas a I e a II. B) Apenas a III e a IV. C) Apenas a I, a II e a IV. D) A I, a II, a III e a IV. Resposta no final do artigo 126 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A ■ COLESTEROL ALIMENTAR Estudos recentes demonstraram que o colesterol alimentar exerce pouca influência sobre a mortalidade cardiovascular.60 Por conta disso, as atuais diretrizes internacionais referentes à prevenção cardiovascular e a Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Aterosclerose33 mostram que não há evidências suficientes para estabelecimento de valor de corte para o consumo de colesterol. De acordo com a metanálise de Berger e colaboradores, que reuniu 40 estudos, o colesterol dietético não foi estatisticamente associado com qualquer DAC ou AVC. Apesar de demonstrar linearidade entre o consumo de colesterol alimentar e a concentração plasmática de LDL-c, essa relação deixou de ser linear quando o consumo de colesterol excedeu 900mg/dia. Deve-se, no entanto, orientar o paciente para o consumo racional de colesterol, evitando a interpretação de que sua ingestão pode ser liberada.60 ÁCIDOS GRAXOS SATURADOS Os SFAs apresentam importante função biológica, mas são deletérios à saúde cardiovascular quando seu consumo é elevado, pois aumentam o colesterol plasmático e têm ação pró-inflamatória.61 Os AGTs são os que mais aumentam as concentrações de LDL-c, seguidos dos SFAs, que também elevam o HDL-c e não alteram a relação CT/HDL, se comparados ao consumo de carboidratos.62 Diferentes estudos demonstraram que, se forem comparados os diferentes tipos de SFAs, o ácido graxo láurico (C12:0) é o que mais aumenta o LDL-c, seguido do mirístico (C14:0) e do palmítico (C16:0); já o esteárico pode provocar pequena redução no LDL-c.62,63 A recomendação de SFAs para indivíduos com hipercolesterolemia é de menos de 7% do valor calórico total (VCT). Orienta-se a substituição parcial de SFAs por ácidos graxos poli-insaturados (PUFAs), que estão associados à diminuição do CT e do LDL-c, assim como à redução de eventos e mortes por DCVs (grau de recomendação: I; nível de evidência: A).33 Evidências O importante estudo de coorte Prospective Urban and Rural Epidemiological Study (PURE), publicado na The Lancet, em 2017, avaliou a ingestão dietética de mais de 135 mil indivíduos de 18 países diferentes e a correlacionou com o risco de morte total e por DCVs. Os resultados foram conflitantes com as recomendações das diretrizes brasileiras.64 O estudo PURE encontrou associação inversa entre a ingestão de SFAs e a mortalidade total, mortalidade por doenças não cardiovasculares e o risco de AVC, sem qualquer evidência de aumento de DCVs importantes, como IAM e a mortalidade por DCV.64 127 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A O PURE argumenta que outros estudos que correlacionaram a ingestão de gordura total, tipos de gordura e carboidratos com lipídeos sanguíneos foram consistentes com estudos anteriores, nos quais, por exemplo, a maior ingestão de SFAs está associada a níveis mais elevados de LDL-c, mas também a maior HDL-c, Tg mais baixos e menor relação CT/HDL-c e ApoB/ApoA1.64 O aumento da ingestão de carboidratos está associado a menores níveis de LDL-c e HDL-c e a maiores níveis de Tg e à relação CT/HDL-c e ApoB/ApoA1, com destaque para esta última relação, pois é o mais forte preditor lipídico de infarto do miocárdio e AVC isquêmico, o que pode fornecer uma explicação mecanicista para maior risco de eventos observados com alta ingestão de carboidratos e risco geralmente menor de DCV com maior ingestão de SFAs.64 ÁCIDOS GRAXOS MONOINSATURADOS O azeite de oliva apresenta grandes concentrações de ácidos graxos monoinsaturados (MUFAs). Dados epidemiológicos mostram menor risco de desenvolvimento de DCVs em populações que vivem no Mediterrâneo, em razão do tipo de alimentação adotada, em que a principal fonte de gordura é o azeite de oliva associado ao alto consumo de cereais, vegetais e frutas.65 A substituição de gorduras saturadas por monoinsaturadas, como o azeite de oliva e as oleaginosas (castanha-do-pará, caju, amêndoa, macadâmia e amendoim), pode estar associada à redução do risco cardiovascular, porém as evidências são menos robustas do que aquelas em relação às PUFAs (grau de recomendação: IIa; nível de evidência: B).33 Entre as ações dos MUFAs, destacam-se seus efeitos na proteção ao diabetes, relevante comorbidade em pacientes com HF. Os MUFAs exercem efeito positivo sobre o metabolismo da glicose, por melhora na resistência à insulina e na resposta da célula β à produção de insulina, tanto com a substituição de PUFAs por MUFAs como pelo simples aumento de MUFAs na dieta. Evidências No Nurses’ Health Study, o consumo de castanhas, importante fonte de PUFAs e MUFAs, foi relacionado com menor risco de desenvolvimento de diabetes, após ajustes para o consumo de fibras e diversos fatores relacionados com o estilo de vida.66 Mais estudos são necessários, visto que não existem estudos randomizados controlados de longo prazo quanto à qualidade das gorduras dietéticas e ao risco de desenvolver diabetes. Dessa forma, os conceitos vigentes se baseiam em estudos de curto prazo, cujo desfecho é a mudança de indicadores associados à fisiopatologia do diabetes. ÁCIDOS GRAXOS POLI-INSATURADOS — ÔMEGA 3 Os PUFAs da série ômega 3 — ácidos decosa-hexaenoico (DHA) e eicosapentaenoico (EPA) — são reconhecidos pela atividade cardioprotetora, por conta de sua origem marinha e por exercerem inúmeros efeitos sobre diferentes aspectos fisiológicos e metabólicos, que podem influenciar a chance de desenvolvimento de DCVs, como:33,67 128 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A ■ melhora da função autonômica e endotelial; ■ diminuição da agregação plaquetária e da pressão arterial; ■ estabilização da placa de ateroma; ■ controle de Tg. Alimentos de origemvegetal considerados fontes de ácidos graxos ômega 3 são raros na natureza. Os representantes vegetais desses lipídeos são a soja (5 a 7%), a canola (7 a 10%) e a semente de linhaça (58 a 60%). O ômega 3 encontrado nesses vegetais é o ácido α-linolênico ([ALA] C18:3), que pode ser convertido nos principais representantes da classe, EPA (C20:5) e DHA (C22:6). Entre as fontes de ômega 3 de origem marinha, estão o salmão, o arenque, a sardinha e a cavala. No entanto, a maior parte dos ácidos graxos ômega 3 não se encontra em partes comestíveis, como o filé, e sim nas vísceras.67 O EPA e o DHA também podem ser obtidos por ação enzimática de dessaturases e elongases sobre o ALA, ácido graxo essencial que apresenta recomendação de consumo pelas Dietary Reference Intakes (DRIs), que pode ser alcançada pela ingestão moderada de óleo de soja ou de canola, não sendo necessária sua suplementação na dieta. A conversão de ALA em EPA e DHA é limitada e sofre interferência de fatores fisiológicos e externos. Em especial, o EPA e o DHA têm sido investigados quanto a seu potencial na redução do risco cardiovascular.68,69 Apesar das evidências, a recomendação de ômega 3 para a redução de DCVs ainda é muito controversa. Recente metanálise publicada na revista JAMA, de Aung e colaboradores, com 10 estudos e mais de 77 mil indivíduos, mostrou que a suplementação de ômega 3 de origem marinha em dose de 1g/dia por um período médio de 4 anos não teve associação significativa com doença coronariana fatal ou não fatal ou qualquer evento cardiovascular maior, como IAM, AVC e morte por DCV.70 A I Diretriz sobre o Consumo de Gorduras e Saúde Cardiovascular recomenda suplementação de EPA e DHA (2 a 4g) para hipertrigliceridemia grave (≥500mg/dL), na vigência do risco de pancreatite refratária a medidas não farmacológicas e tratamento medicamentoso (grau de recomendação: I, nível de evidência: A), e orienta o consumo de 2 porções ou mais de peixes ricos em EPA e DHA por semana para a redução do risco cardiovascular entre indivíduos em prevenção primária e secundária, com o mesmo nível de recomendação e evidência.4,33 A diretriz de HF e a Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose não indicam a suplementação de ômega 3, uma vez que seu consumo não se associa à redução do LDL-c.4,33 ÁCIDOS GRAXOS TRANS Diversos estudos bem-controlados já comprovaram a associação do consumo de AGTs com o aumento de risco cardiovascular, especialmente em razão de elevarem a concentração plasmática de colesterol e de LDL-c e reduzirem a concentração plasmática de HDL-c.58 Fontes de AGTs podem ser encontradas em gorduras parcialmente hidrogenadas, óleos refinados e uma pequena porção em carne, leite e derivados de animais ruminantes. Alimentos fontes de gordura parcialmente hidrogenada contribuem com cerca de 80 a 90% da ingestão diária de AGTs. Para alimentos provenientes de animais ruminantes, a contribuição é menor (em torno de 2 a 8%). Os óleos refinados apresentam níveis de AGTs mais baixos (1,0–1,5%), mas sua reutilização não é recomendada e pode tornar significativa a contribuição na ingestão diária de AGTs.71 129 | PR ON UT RI | Ci clo 7 | Vo lum e 2 | CÓ PIA C ON TR OL AD A FIBRA ALIMENTAR O consumo de fibra alimentar reduz a concentração de CT e LDL-c, além de estar associado à diminuição de fatores de risco de outras comorbidades, como hipertensão, diabetes e obesidade.72 O mecanismo para a redução de colesterol está relacionado com o consumo de fibras solúveis, pois sua ligação com a bile diminui a absorção de colesterol, visto que atingem intactas o cólon, são hidrolisadas e fermentadas pela flora intestinal, produzindo ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs) que podem inibir a síntese de colesterol. O consumo de fibras insolúveis, por sua vez, não mostra efeitos na redução do colesterol e do risco cardiovascular. Além disso, a ação das fibras solúveis é descrita pela formação de um gel que se liga aos ácidos biliares no lúmen intestinal, aumentando sua excreção nas fezes e diminuindo sua reabsorção durante o ciclo entero-hepático. Essa redução induz à síntese de novos ácidos biliares, diminuindo o colesterol disponível para a incorporação em lipoproteínas. Quanto maior o grau de viscosidade da fibra, maior o efeito de redução do colesterol.72,73 As maiores concentrações de fibras solúveis (β-glucanas) são encontradas no farelo de aveia. O Food and Drug Administration (FDA) recomenda o consumo de aproximadamente 25 a 35g de fibras, dos quais 3g/dia de β-glucanas, representados por 40g de farelo de aveia ou 60g de farinha de aveia.73 O Psyllium é a fibra solúvel que vem recebendo destaque em estudos na redução do colesterol, pois doses superiores a 7 a 8g/dia podem reduzir os níveis de LDL por volta de 5%. Seu consumo deve ser orientado em doses fracionadas, antes das principais refeições.74 FITOSTERÓIS Os fitosteróis e os fitostanóis (forma reduzida dos fitosteróis) são esteróis de origem vegetal cuja estrutura química é muito similar à do colesterol.75 Os fitosteróis são componentes bioativos presentes em alimentos vegetais, e não podem ser sintetizados pelo corpo humano.76 Existem diferentes tipos de fitosteróis; os mais abundantes são: ■ β-sitosterol; ■ campesterol; ■ estigmasterol; ■ 5-avenasterol; ■ 7-avenasterol; ■ ergosterol. O β-sitosterol é o principal fitosterol encontrado nos alimentos, e sua esterificação, formando o sitosterol-éster, melhora sua solubilidade, o que possibilita sua adição a alimentos.77 As principais fontes de fitosterol são os óleos vegetais (milho, canola, soja e girassol), as nozes, os cereais e os legumes.78 130 TR AT AM EN TO NU TR ICI ON AL DA HI PE RC OL ES TE RO LE MI A F AM ILI AR | CÓ PIA C ON TR OL AD A Em uma dieta ocidental típica, a ingestão diária média de fitosterol é de cerca de 300mg.78 Estudo realizado com a população da cidade de São Paulo verificou consumo diário de fitosterol de 100mg/dia.79 Quando comparada à do colesterol (em torno de 50%), a dos fitosteróis e dos fitostanóis é muito baixa, inferior a 2% e a 0,2%, respectivamente.75,77 Por possuírem eficiente excreção biliar após a captação hepática, seus níveis circulantes são muito baixos, com concentrações séricas de 500 a 10.000 vezes menor do que as de colesterol. Como o consumo dietético de fitosteróis e fitostanóis é muito baixo, para diminuir a concentração sérica de LDL-c, esses compostos são adicionados a alimentos ou consumidos em forma de suplementos alimentares, a fim de se obter redução não farmacológica significativa de colesterol sérico e de LDL-c.76 A Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Aterosclerose recomenda o uso de fitosteróis para adultos ou crianças (a partir dos 5 anos de idade) com HF (grau de recomendação: IIa e nível de evidência: A), a ser ingerido preferencialmente nas refeições. Eles podem ou não ser fracionados em várias tomadas, e seus efeitos são observados a partir de 3 a 4 semanas.33 Diretrizes nacionais e internacionais recomendam o consumo de 2g/dia de fitosteróis para que ocorra redução significava de colesterol e LDL-c, com diminuição média de 10% do LDL-c. Sua suplementação deve estar associada à mudança de estilo de vida, sobretudo a uma dieta com redução de gordura saturada e colesterol.33 Em pacientes com HF, os fitosteróis devem ser administrados em adição às estatinas e podem promover redução adicional de 10 a 15% no LDL-c — efeito superior ao dobro da dose da estatina, em geral, próximo de 6%. Em adição à ezetimiba, foi observada redução adicional de 8% no LDL-c com 2g/dia de fitosteróis.78 No Brasil, os fitosteróis são aprovados para uso pediátrico a partir dos 5 anos de idade. A I Diretriz de Brasileira de Hipercolesterolemia Familiar recomenda a ingestão de 1,2 a 1,5g/dia para crianças com HFHe.80 Importante metanálise que incluiu crianças com HF demonstrou redução do CT (7 a 11%) e
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