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1. Introdução Nos ciclos anteriores, pudemos perceber que, no decorrer da história, algumas teorias e algumas maneiras de viver e conceber a sociedade influenciaram a forma de entender e viver a realidade humana. Neste ciclo, vamos estudar temas que estão intimamente ligados ao humano, tais como liberdade, alteridade e multiculturalidade. Quando falamos do ser humano, precisamos entender as suas características, como ele foi entendido e tratado no decorrer da história, quais são suas dimensões e, enfim, vê-lo como um todo. O ser humano está inserido no mundo e, por isso mesmo, é um ser com características de finitude, ou seja, ele possui suas limitações. Apesar de ser aberto a si mesmo, aos outros seres humanos, à natureza e ao transcendente, ele é capaz de sair de si mesmo para ir ao encontro daquilo que está além de si. Heidegger (1965 apud DETTONI et al., 2016) atesta que o ser humano não é uma "coisa" entre outras coisas – ou um ente entre outros entes –, mas o único do qual se pode dizer que realmente é "ser", que "existe" plenamente, já que é o único a se interrogar sobre o sentido de sua própria existência, o único a tomar nas mãos o próprio destino. Para ele, é preciso, antes de mais nada, perguntar pelo "sentido do ser" ou, mais propriamente, pelo "sentido de ser", de "existir". A pessoa é um ser de relação, não é fechada em si mesma. Quando analisamos que ela é aberta a si mesma, aos outros, à natureza e ao transcendente, percebemos que é um ser único, indivisível, com dimensões que dão sentido ao seu ser e à sua existência. É isso que dá sentido à sua razão de ser no mundo. No decorrer do estudo deste ciclo, vamos nos aprofundar nesses temas, mais antes, acompanhe no vídeo a seguir alguns aspectos importantes deste debate. 2. Liberdade, alteridade e multiculturalidade Vimos, anteriormente, que há muitas maneiras de se olhar a vida humana, e muitas são as formas como o ser humano é encarado e explicado durante a história, em que o ser humano foi visto e discutido a partir de diversos pontos de vista. No decorrer deste estudo, vamos olhar essa realidade humana, percebendo que o humano está inserido no mundo e que não vive de maneira solitária, pelo contrário, vive rodeado de outros humanos, semelhantes, e de outros seres que não são humanos, e é nessa relação com os seres humanos e não humanos, com a natureza e com o transcendente, que a pessoa se desenvolve e se projeta. Existir com os outros humanos e existir com os outros seres é fundamental para mostrar o que é o ser humano e qual é seu caráter nesse mundo. Sua existência implica a presença do outro, da mesma forma que é semelhante na cultura, na linguagem, em aspectos físicos e compartilha as preocupações encontradas na convivência com os demais. http://repositorio.pucrs.br/dspace/bitstream/10923/3407/1/000433190-Texto%2bCompleto-0.pdf Segundo Heidegger (1965), o mundo do ser humano é o mundo com os outros seres humanos e com os outros seres e coisas. Por isso, não existe meu mundo, existe nosso mundo. O autor chama isso de mundo ao seu redor, e afirma que o ser humano precisa estar atento ao mundo que o circula e ao próximo como tal. Contudo, a rotina pode levar o ser humano a viver na indiferença ou, de outra maneira, as solicitudes do mundo e as preocupações do cotidiano podem torná-lo mais humano ou não. Na relação com o outro e com a sociedade, o eu pode comportar-se de maneira irresponsável e não autêntica. Mas essa relação também pode gerar atitudes de colaboração e companheirismo (DETONI et al., 2016). Na convivência com seus semelhantes e nos seus afazeres, o ser humano faz cultura. Dependendo da realidade em que vive, ele se adapta e produz cultura; isso depende do meio ambiente onde está inserido. Por isso, o ser humano é, ao mesmo tempo, sujeito e objeto da cultura. Liberdade Quando tratamos do assunto da liberdade, no sentido em que abordamos nesta disciplina, é mais adequado tratar de liberdade de (escolha) e de liberdade para (atuar). É complicado falar em liberdade total, pois em todo ato há um limite. Contudo, isso não tira da liberdade aquela característica que permite ao ser humano que ele não esmoreça diante de sua situação de vida. Para viver livremente, é preciso levar em consideração a ética e a responsabilidade, enfrentando os desafios. Não é possível viver livremente sem ética e sem responsabilidade. Como vimos, o ser humano é sempre um eu no mundo, vivendo em relação com os outros. Essa relação exige reciprocidade na maneira de viver e na maneira de ser. Por isso, o ser humano possui suas responsabilidades ao mesmo tempo em que possui seus direitos. No final das contas, você é livre para escolher se quer ser responsável ou não. Sem liberdade, não há condição de o ser humano viver racionalmente e com vontade. Só ele pode escolher entre agir e não agir, escolher entre fazer uma coisa ou outra, pensar antes de escolher agir. Ele tem capacidade de mudar, de transformar sua vida e de transformar a forma de ver e de viver no mundo em que está inserido. Cada ser humano é livre para atuar. Esse caminho pode levar à plenitude da humanidade e pode ajudar na construção de uma sociedade justa e igualitária. Frankl (1978), ao tratar da liberdade, demonstra que o ser humano pode forjar seu destino sem estabelecer um mundo arbitrário. O ser humano adquire a dignidade por meio da liberdade. Liberdade e dignidade fazem parte da essência da pessoa humana. Vamos estudar mais adiante a dimensão espiritual e veremos que o ser humano é livre e pode libertar-se de todo determinismo. Isso, porém, como já vimos anteriormente, não o livra dos condicionamentos apresentados pelo mundo. E é aí que vivencia sua responsabilidade. Quer saber mais sobre resiliência segundo Viktor Frankl? Clique aqui e realize a leitura do artigo: Contribuições de Viktor Emil Frankl ao conceito de resiliência. Pelo fato de ser humano, ele é livre, pois a liberdade faz parte da constituição do ser humano. A liberdade é anterior à ação. O ser humano é um ser de liberdade, ele pode transcender o egocentrismo, viver com autonomia e tomar decisões em sua vida. Segundo Daniel e Scopinho (2013, p. 163-166): http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v25n4/a11v25n4.pdf Na liberdade, está radicada a possibilidade de realização ou de fracasso do projeto pessoal. A pessoa, pela liberdade, sente-se capaz do progresso, da realização do humanismo, de ser mais do que ela sempre foi. Mesmo depois do mais terrível fracasso, da mais completa alienação, continuamos a ter uma consciência livre palpitando dentro de nós. Mesmo ante tal cenário de onipotência e império, variados são os impedimentos da liberdade: há os impedimentos psíquicos e, também, a possibilidade de que indivíduos que não estejam enfermos careçam de liberdade – são aqueles que se deixaram alienar. Por que acontece isso? Porque, em qualquer desses casos, o espírito não consegue expressar-se, fica impedido de se atualizar. Octavio Derisi (1985) explica que a liberdade no sentido estrito consiste no autodomínio da vontade sobre sua própria atividade, em poder querer ou não alguma coisa, em poder escolher entre esta ou outra coisa. O termo liberdade acompanha o termo homem, é uma condição considerada por praticamente todas as correntes de pensadores que estudam o homem: Os kantianos veem na liberdade a ideia suprema para alcançar a perfeição. Para eles a liberdade é iluminada pelos ditados da razão prática. Nessa concepção, a vontade fica submetida à moral decorrente dessa razão prática, e os princípios da razão prática devem ser de plena realização, sem esperar nenhuma recompensa. Esse momento é reconhecido pelo pensamento kantiano como "de total liberdade". Os materialistas são rígidos ao extremo na defesa da liberdade do homem. Nesse ponto, coincidem com os existencialistas, que são ainda mais radicais na hora de conceber a liberdade. Sartre, que, olhando Nietzsche, adere à não existência de valores absolutos, vê na própria liberdade o fundamento para o sentido e o valor. O ponto máximoda liberdade é, para o existencialismo, possibilitar a liberdade dos demais. Para Sartre, os valores são projetos que o homem propõe baseados no que ele quer ser sem poder pensar que exista um futuro e sem necessidade de um princípio caracterizador. Diferentemente dos materialistas, ele rejeita qualquer princípio naturalista. Para ele, o homem transcende as estruturas naturais e as verdades anteriores, tudo deve ser produto de sua liberdade (SARTRE, 2003). Assim como Sartre, as posturas mais radicais a respeito da liberdade, argumentam que não existem determinismos no homem, sempre é possível agir de outra maneira. Na perspectiva antropológica, Sartre não crê em determinismo teológico, biológico ou social. Como escreve na obra O existencialismo é um humanismo, que contém as principais ideias da conferência que deu em Paris em 20 de outubro de 1945: nela expressa as ideias de que nem Deus, nem a natureza, nem a sociedade determina absolutamente nossas possibilidades, predispomos nossa conduta na mediação da liberdade (SARTRE, 2009, ps. 31,36, 43, 55, 77). Esse autor considera que o homem é um ser "para-si", ou seja, que não tem uma essência definida antecipadamente, nunca é resultado de uma ideia preexistente; o homem é um fazer-se contínuo, "Somos o que temos querido ser e sempre poderemos deixar de ser o que somos" (2009, p. 61). Segundo Sartre, só o homem é o responsável pelo que é. Essa responsabilidade não está restrita ao âmbito individual, e, sim, corresponde à totalidade da humanidade. Quando decidimos pelo casamento, aceitamos seguir a monogamia. Sempre que aderimos a uma ideia política ou a um ideal, estamos tomando partido de uma forma de humanidade. Sartre explica: "Se Deus não existe, não há valores ou ordens que modelem nossa conduta. Estamos sós, o homem é o ser condenado a ser livre" (2009, p. 42-43). No mundo (na existência), o homem é responsável por tudo o que faz ou deixa de fazer; ele é o único responsável por suas paixões, pela moral que adota. "Não há signos no mundo que digam ou indiquem o que devemos fazer" (2009, p. 50). Para esse pensador, os fins que perseguimos não são dados nem do exterior nem do interior, não existe nenhuma suposta natureza, é na liberdade que cada um se escolhe; cada "Para-si" tem a liberdade de fazer de si o que quiser. [...] o homem está condenado a ser livre. Condenado porque não se criou a si próprio e no entanto é livre pelo fato de estar no mundo. Assim o homem começa a existir para logo, na sua existência, definir-se (2009, p. 42-43). O primeiro princípio do existencialismo sartreano é: o homem é o único ser que pode ser tal como ele se quer. Segundo o autor como não temos uma natureza ou essência, não estamos determinados; como não escolhemos ser livres, não somos livres de deixar de ser livres (2009, p. 60-63). A liberdade é tão importante nesta antropologia porque ela é o fundamento de todos os valores. Também é princípio de responsabilidade: "Querer a liberdade é respeitar a liberdade do outro" (SARTRE, 2009, p. 77). O homem de boa fé procura a liberdade pela liberdade. Mesmo defendendo que o homem deve obrar de forma humana em relação à humanidade, que está representada por ele próprio e pelos outros homens, para executar sua liberdade, essa "liberdade" proposta por Sartre é totalmente autônoma. Nesse ponto, é criticável, já que a verdadeira liberdade não existe se não está orientada à perfeição, à humanização e à plenitude do próprio ser humano – caso contrário, pode ser uma "libertação". Liberdade está sempre acompanhada pelo vocábulo "responsabilidade". 3. Alteridade Como é próprio de sua natureza humana, o ser humano necessita de relacionamento interpessoal, e a alteridade caracteriza-se dessa necessidade de relacionar-se. Essa necessidade está presente em todas as etapas da vida humana. A relação íntima do ser humano demonstra a disposição de si mesmo enquanto necessita do amor recebido do outro. A relação “eu – tu” faz parte da dimensão essencial do ser humano e faz parte da autotranscendência. O ser humano é um ser social. Como vimos, o ser é um ser de relação, inserido no mundo, por isso, é aberto à realidade social. Trata-se de uma relação amorosa de semelhantes que necessitam um do outro. Para Frei Betto (2020): “Todo ser humano, dentro da perspectiva judaica ou cristã, é dotado de dignidade pelo simples fato de ser vivo. Não só o ser humano, todo o Universo”. Essa visão judaico-cristã mostra bem a realidade daquilo que estamos apresentando em nossos estudos. Tudo o que já vimos e veremos até o final deste ciclo nos remete a uma realidade que abrange todos os seres humanos e que os coloca em lugar de dignidade, seja quem for esse ser humano. Todos merecem viver dignamente. O mesmo autor aponta para os pilares que sustentam a sociedade: família, escola, Estado, Igreja e trabalho. Neles é possível resgatar a cidadania, com a possibilidade de exercício da alteridade. O desafio, segundo ele, “[...] é transformar essas instituições naquilo que elas deveriam ser sempre: comunidades. E comunidades de alteridade” (FREI BETTO, 2020). Na base de nosso relacionamento está o outro. Ele é o ponto de referência para a construção da generosidade. Para Frei Betto (2020): “Só existe generosidade na medida em que percebo o outro como outro e a diferença do outro em relação a mim”. O autor afirma que, pela alteridade, a pessoa “[...] é capaz de apreender o outro na plenitude da sua dignidade, dos seus direitos e, sobretudo, da sua diferença. Quanto menos alteridade existe nas relações pessoais e sociais, mais conflitos ocorrem”. Frei Betto (2020) destaca que: “Só existe generosidade na medida em que percebo o outro como outro e a diferença do outro em relação a mim”. A única via possível para manter essa relação é a via do amor, que pressupõe o respeito, o reconhecimento dos seus direitos, a sua dignidade como ser humano. E completa: “[...] isso supõe a via mais curta da comunicação humana, que é o diálogo e a capacidade de entender o outro a partir da sua experiência de vida e da sua interioridade”. Se utilizarmos o entendimento ético, vamos nos lançar “[...] na reflexão sobre a condição humana deste outro, partindo do pressuposto que o outro não é um inimigo desumanizado, mas que deve ser visto como um ser humano ao mesmo tempo igual e diferente de mim (FREI BETTO, 2020)”. Burckhart (2016) expressa, de forma mais contundente, que: “Num contexto marcado pela ‘falta de ética’, ou seja, a falta de uma reflexão sobre nossas ações, hábitos e costumes, a alteridade enquanto proposta torna-se difícil de concretizar-se.” Ao entender alteridade no sentido de colocar-se no lugar do outro e com ele manter uma relação interpessoal, colaboramos para que aconteça um diálogo entre as culturas, as religiões e as crenças. Nesse diálogo é possível aprender com o outro ao mesmo tempo em que se aprende a respeitar as convicções diferentes. Multiculturalidade De acordo com o que nossos estudos apontam – e para o que nos desafiam – quando analisamos a questão da relação com o outro, é possível conviver pacificamente em um ambiente multicultural. Esse fenômeno cultural relaciona-se diretamente com a globalização das sociedades pós-modernas. Quando falamos em multiculturalidade, precisamos levar em consideração que os grupos culturais estão interligados e que as culturas estão em constante relação e em contato entre si. Vale ressaltar que, para que haja multiculturalidade, é preciso estabelecer uma convivência entre várias culturas em uma cidade, região ou país. Não há possibilidade de haver predominância de uma cultura sobre a outra. Com a constante imigração, percebemos que várias pessoas, de várias culturas diferentes, convivem entre si. Essa diversidade cultural é que se caracteriza como culturalidade. Nesse contexto, pode acontecer a marginalização de algum grupo social, como geralmente ocorre com os imigrantes. Amplie seus conhecimentos sobre justiça, liberdade e alteridade! Clique aqui e realize a leitura do artigo Justiça, liberdadee alteridade ética. Sobre a questão da radicalidade da justiça desde o pensamento de E. Levinas, de Ricardo Timm de Souza. http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/veritas/article/view/35008/18345 Veremos, a seguir, que todo ser é um ser de relação. Essa relação se dá no contato com o outro, com a sociedade, com os vários grupos culturais e com o mundo. É nessa relação interpessoal que a pessoa aprende e ensina: aprende a viver livremente, aprende a viver a culturalidade e aprende a ser. 4. Ser humano como ser de relação A Antropologia sempre investigou as questões que envolvem o ser. As análises das formas como o ser foi e é encarado evidenciam que, apesar de a humanidade ter vivenciado inúmeras situações nas quais o ser foi relegado à própria sorte, humilhado, execrado, selecionado, ainda não aprendemos a conviver com o outro e, por isso, vemos, em pleno século 21, o ser perder a sua dignidade devido ao desrespeito. É nesse sentido que o filósofo Martin Buber (1878-1965), ao estudar a importância de respeitarmos a dignidade do ser, nos apresenta, em seu texto Eu e Tu, publicado no ano de 1923, uma análise pormenorizada das palavras “Eu-Tu” e “Eu-Isso”, que, para ele, são “palavras-princípio” que se referem ao “entre-dois”. Para Buber (2006), uma relação só pode se dar por meio do compromisso com a vida – não só a nossa vida, mas a vida do outro. As “palavras-princípio”, de acordo com Buber (2006, p. 53): [...] são proferidas pelo ser. Se se diz Tu profere-se também o Eu da palavra-princípio Eu-Tu. Se se diz Isso profere-se também o Eu da palavra princípio Eu-Isso. A palavra-princípio Eu-Tu só pode ser proferida pelo ser na sua totalidade. A palavra-princípio Eu-Isso não pode jamais ser proferida pelo ser em sua totalidade. Em suas reflexões sobre as relações que podemos estabelecer com o outro, Buber (2006) deixa claro que o ser pode ser enfocado pela experienciação, pela exploração superficial, que nos permite apenas apreender este ser como um objeto. Contudo, essa apreensão nos distancia da essência de relações efetivas. Algumas das reflexões a respeito desse tema expostas pelo autor são: “O mundo como experiência diz respeito à palavra-princípio Eu-Isso. A palavra- princípio Eu-Tu fundamenta o mundo da relação (2006, p. 55-59).” Logo após, o autor enobrece o ser humano ao afirmar que: “O homem não é uma coisa entre coisas ou formado por coisas quando, estando eu presente diante dele, que já é meu Tu, endereço-lhe a palavra-princípio” [...], demonstrando, claramente, que o ser humano precisa receber um lugar de destaque na relação com o outro. “Ele não é uma qualidade, um modo de ser, experienciável, descritível, um feixe flácido de qualidades definidas. Ele é Tu, sem limites, sem costuras, preenchendo todo o horizonte. Isto não significa que nada mais existe a não ser ele, mas que tudo o mais vive em sua luz” (BUBER, 2006, p. 55-59). Por essa razão, https://novaescola.org.br/conteudo/1938/martin-buber-um-teologo-que-prega-o-dialogo o relacionamento existente entre o Eu e o Tu envolve a totalidade do ser e não somente parte do todo: Entre o Eu e o Tu não se interpõe nenhum jogo de conceitos, nenhum esquema, nenhuma fantasia; e a própria memória se transforma no momento em que passa dos detalhes à totalidade. Entre Eu e Tu não há fim algum, nenhuma avidez ou antecipação; e a própria aspiração se transforma no momento em que passa do sonho à realidade. Todo meio é obstáculo. Somente na medida em que todos os meios são abolidos, acontece o encontro (BUBER, 2006, p. 55-59). O ser humano, apreendido pela ótica do “Isso”, perde suas características pessoais, uma vez que é tratado como objeto, e aquilo que era particular, único, irrepetível, passa a ser universal. Nesse contexto, leis universais são formuladas para designar o particular e, para Buber (2006), não devemos nos contentar com relações baseadas no mundo das coisas e sim no mundo do ser. Por isso, adverte: “Sem dúvida, alguém que se contenta, no mundo das coisas, em experienciá-las e utilizá-las erigiu um anexo e uma superestrutura de ideias, nos quais encontra um refúgio e uma tranquilidade diante da tentação do nada” (p. 60). Assim, se a humanidade for reduzida ao “Isso”, perde sua razão de ser. Precisamos enfrentar o desafio de vivermos e nos distanciarmos desse mundo ditado pelas regras das conceituações e das experienciações para primarmos por relações que valorizem a subjetividade, a autonomia e a liberdade do ser se não quisermos experimentar a grande melancolia de nosso destino, na qual, se não tomarmos o devido cuidado, o Tu se torna um objeto entre os objetos. Assim, para Buber (2006), estabelecemos a relação Eu-Isso, pois utilizamos a representação de palavras convencionadas para expressarmos as características do ser que, nessa situação, se torna o nosso objeto. Por meio de palavras, usamos formulações indiscriminadas de conceitos. Mas o ser deve ser valorizado enquanto ser, não como conceito. Para Heidegger (1984, p. 158), “Ele é ele mesmo” e, sendo assim, único, singular, irrepetível. Portanto, o relacionamento entre os seres deve ser um evento permeado pela reciprocidade, pelo velar e desvelar do ser. Não devemos compactuar com ações que tenham o ser como uma coisa, um “Isso”. Nesse aspecto, Buber (2006, p. 74 e 77) chega ao ponto de afirmar que: “[...] o homem não pode viver sem o Isso, mas aquele que vive somente com o Isso não é homem” e continua: “O homem que se conformou com o mundo do Isso, como algo a ser experimentado e a ser utilizado, faz malograr a realização deste destino: em lugar de liberar o que está ligado a este mundo ele o reprime; em lugar de contemplá-lo ele o observa, em lugar de acolhê-lo serve-se dele”. Nossas relações com o ser dentro do espaço e do tempo podem deixar marcas: se tratado como “Tu”, certamente as marcas serão positivas; contudo, se tratado como “Isso”, certamente essas marcas serão danosas. O ser vive e convive com outros seres no espaço que nos acolhe e no tempo cronometrado. Contudo, não é somente de batidas de relógio que a vida do ser é permeada pelo tempo, pois sua vida também é marcada pelo sentido que só a pessoa humana pode atribuir às suas vivências. Ende (apud HOYUELOS, 2008, p. 4, tradução nossa), ao falar sobre o tempo, pondera que: “Há uma coisa muito misteriosa, mas muito comum. Todos participam nela, todo mundo sabe disso, mas poucos param para pensar sobre isso. Quase todos somos limitados a tomá-la como se trata, sem fazer perguntas. Essa coisa é o tempo”. Guimarães Rosa (1986, p. 92), em sua obra Grande Sertão: Veredas, por meio de seu personagem Riobaldo, afirma que: O que vale, são outras coisas. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não misturam. Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa importância. De cada vivimento que eu real tive, de alegria forte ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é que eu conto. O senhor é bondoso de me ouvir. Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de recente data. O senhor mesmo sabe. É dessa forma, encarando o ser como inédito, único, irrepetível, que o Claretiano – Rede de Educação prima pelo encontro efetivo, pela efetivação de um tempo marcado pelo relógio, mas também marcado pelas batidas do coração. Tempo no qual o ser se desvelará e se velará a todo o momento, pois não será encarado como um “Isso” e sim como um “Tu” que compartilha conosco a sua vida, e esta reside no coração. Nessa mesma linha de pensamento, a essência do ser humano está ligada ao fato de ele estar no mundo, existir. Dentro do pensamento de Heidegger, o ser humano se diferencia fundamentalmente dos outros entes por ser o único capaz de se perguntar sobre si e sobre os outros. Pela consciência, o ser humano está aberto a si mesmo, aos outros seres humanos, aos outros entes, ao ser. Essas característicaso tornam diferente de todos os outros seres, humanos ou não. Ele possui a essência humana de uma forma plena. Contudo, não perde suas características próprias que, como veremos mais adiante, são talhadas por sua essência própria, pela vivência em sua família e pelo grupo social do qual ele faz parte. Por isso ele é único e irrepetível. A liberdade do ser humano se caracteriza, também, por ele não estar preso ao seu ambiente. Já que ele tem o mundo diante de si, ele é capaz de transcender seu ambiente, embora ele se perceba como parte infinitamente pequena desse mundo. O mais bonito de tudo isso é que a estrutura eu-mundo dá ao ser humano a capacidade de encontrar-se a si mesmo. Tillich (2005, p. 113) afirma que “[...] sem o mundo, o eu seria uma forma vazia. A autoconsciência careceria de conteúdo, pois o conteúdo, psíquico e corporal, encontra-se no interior do universo”. Da mesma forma, para o mesmo autor, não existe consciência de si mesmo sem um mundo. Sem ele o eu seria vazio. Todavia, pode-se afirmar que o ser humano só existe inserido no mundo. É claro que, nem por isso, ele é igual ao mundo, pois o “[...] ser humano deve estar completamente separado de seu mundo para poder olhá-lo. Caso contrário, ele permaneceria simplesmente preso ao ambiente”. É inserido no mundo que o ser humano percebe que é capaz de transcender o seu ambiente. Estar inserido no mundo é fundamental para o ser humano adquirir conhecimento. “O eu sem o mundo é vazio; o mundo sem o eu é morto” (TILLICH, 2005, p. 180-181). Essa realidade do Eu e suas relações sempre preocuparam pensadores interessados em responder aos questionamentos referentes ao ser humano. A relação consigo mesmo, com o mundo e com o transcendente, mas, principalmente, a sua relação com o outro, sempre intrigaram o ser humano de maneira geral. Atenção! Sobre a transcendência, transcendente e transcendental, é importante considerar que se refere ao encontro com o outro. Em nosso estudo, foi tratado que, ao relacionar-se com os outros de maneira ética, ultrapassamos os limites individuais e estabelecemos uma conexão que nos possibilita o alcance teológico, ou seja, é feita uma abertura do indivíduo para ter conhecimento de Deus. Vaz (2002 apud SILVA, 2016, p. 532) afirma que “[...] o sujeito está situado na tríplice dimensão da realidade: o mundo, a sociedade e o próprio Eu. Isso implica que a construção do discurso antropológico sistemático começa pelo Eu enquanto exprime a sua situação nas formas de presença corporal, psíquica e espiritual”. E acrescenta que: “[...] o ser humano, por ser capaz de efetivar a realização da própria vida, encontra como desafio e tarefa, nunca acabada, o domínio do sentido da vida, no qual a sua existência está lançada como existência propriamente humana na relação com o outro”. Dessa forma, pudemos perceber, sem esgotar o assunto, que o ser humano sempre se questionou a respeito de si mesmo e de seu relacionamento com o outro. Isso implica em compromisso consigo mesmo e, principalmente, o seu compromisso com o outro. Essa relação é conflitante às vezes, mas aberta para uma dimensão que abrange a vida, de uma maneira complexa, mas comprometedora. Tendo em vista o conteúdo estudado até o momento, sugerimos que você teste o seu aprendizado, respondendo à questão a seguir. Depois de estudarmos todas essas situações que envolvem o ser humano e que marcam sua razão de ser e de estar no mundo (mundo de relações múltiplas, mas exigentes e carentes de sentido), vamos nos ocupar agora em entender o que tudo isso significa para o ser humano, olhando-o de uma forma totalizante. 5. Dimensões biológica, psicológica, social e espiritual do ser humano Quando olhamos o ser humano como unidade e como totalidade, não podemos deixar de perceber que esse ser não é fragmentado, mas é um ser completo e complexo. Contudo, quando analisamos as dimensões do ser humano, percebemos que ele é uma unidade constituída das dimensões biológica, psicológica, social e espiritual. Antes de analisarmos essas dimensões, vamos estudar alguns detalhes importantes para o bom entendimento dessa realidade que envolve o ser humano e para entendermos qual é a proposta de ser humano do Claretiano – Rede de Educação. Esses detalhes nos ajudarão, ainda, a considerar as diversas implicações dessa maneira de encarar o ser humano para a vida e para a prática profissional. Afinal, dependendo da maneira como nós nos encaramos enquanto humanos e da maneira como encaramos os outros humanos, semelhantes a nós, agiremos de uma forma ou de outra. Podemos dizer o mesmo com relação ao mundo, à natureza e aos outros seres. Nossa responsabilidade no mundo é grande. Não basta ser um profissional qualificado, pois o compromisso ultrapassa o campo profissional, seja qual for a profissão. Dito isso, vamos estudar alguns elementos necessários para podermos entender o ser humano e a proposta humanista que queremos dispensar em nossa prática humana e profissional. Espírito Vamos começar apresentando o que Santo Tomás (2002) descreve sobre o ser humano. De acordo com ele, o ser humano não pode ser explicado como a união de duas partes: a orgânica e a espiritual. Quando se trata de “espírito”, geralmente as pessoas interpretam no sentido teológico-religioso. Não queremos ter essa interpretação. O ser humano é a unificação das dimensões corpo e espírito. Não são elementos superpostos. As duas dimensões estão unidas no mesmo núcleo. É comum atribuir ao termo “espírito” um sentido religioso. Para Gevaert (1995), o termo “espírito” é um termo vago e impreciso. Muitas vezes, expressa um fenômeno vital concreto: hálito (sopro de vida); e, outras vezes, um princípio exclusivamente humano. Porém, esse termo é empregado, também, para simbolizar aquilo que é humano e que não pode ser reduzido a fenômenos materiais definidos pela causalidade ou pela realidade espaço- temporal. Conseguir compreender o sentido, fixar metas, fixar fins, ideais e possuir capacidade de atuar lidando conscientemente com os condicionamentos são manifestações próprias do ser humano, e isso caracteriza manifestações espirituais. Por isso, Scheler (2003) destaca que o espírito é uma potência que complementa e direciona as outras potências do ser humano, que nós, neste trabalho, chamamos de dimensões. Para Frankl (1978), corpo-espírito não podem se reduzir um a outro, nem podem derivar-se um do outro. Na pessoa, há uma unidade, ou núcleo, que é comum a toda pessoa humana. No entanto, cada pessoa é única. Há uma maneira dinâmica de vivenciar a existência. Cada indivíduo humano constrói a sua própria realidade em sua existência, transformando-se continuamente. Mas sua existência, sua maneira de ser e de viver são únicas. São realidades particulares, que cada um vive. Hume (2003) admoesta que falar em espírito é falar em fenômenos psíquicos impessoais. Já para Santo Tomás (2002) o espírito concede a perfeição ao ser humano, relacionando-o com seu ser. É ele que caracteriza o ser humano. Assim, o ser humano é composto de corpo e espírito numa unidade integrativa, substancial. Coreth (1998) explica por que cada um de nós se sente um eu. O eu é o ponto central do ser humano. O eu é o centro do mundo do ser humano. Contudo, Frankl (2003) afirma que é o espírito que individualiza o ser humano. Por isso, podemos considerar que o ser humano é uma unidade e, também, uma totalidade. Portanto, por ser espiritual, o ser humano é um ser de liberdade aberto ao mundo e atua como uma unidade indissolúvel. Cada indivíduo possui uma alma individual, que constitui a intimidade pessoal. A noção de pessoa diferencia o ser humano dos outros seres individuais, e seu conceito está baseado na unicidade, na racionalidade e na vontade livre. O homem é um ser social Para Mondin (1998), o ser humano é um ser cultural. O ser humano não é um composto pré- fabricado, não há como montá-lo. Ele deve se construir com suas próprias mãos, cultivando a si mesmo. O objetivo primário da cultura é promover a realização da pessoa. Mas, ao mesmotempo em que o ser humano produz cultura, ele é produzido por ela. Desde o início da vida, a pessoa é influenciada, pois necessita de alguém que cuide dela para sobreviver. Assim começa a participação social e cultural na vida de cada ser humano. Nenhum ser humano é autossuficiente, pois ninguém chega ao mundo pronto. Todos nós estamos em permanente construção. Enquanto ser social, o indivíduo precisa das outras pessoas, da relação com o outro, com o tu, para levar adiante a existência pessoal. Assim, podemos considerar que somos seres de alteridade, já que a vida de cada um de nós se desenvolve em comunhão com os outros sujeitos (outros eus) no mundo. O ser humano é, também, um ser inserido na História. Ele vivencia os acontecimentos de sua existência pessoal diante dos eventos da existência coletiva. Nenhum de nós é autossuficiente: necessitamos de elementos da natureza para sobreviver, da mesma forma que precisamos das outras pessoas, pois ninguém vive sozinho. Essa relação com as pessoas forja a personalidade, pois vivemos em relação com os outros, numa atitude de troca constante. Troca de afeto, de pensamento, de projeto de vida. É nessa relação que definimos o que o outro é para nós. E o outro não é um ser invisível ou uma coisa que nos serve quando precisamos. Por sua complexidade, ele exige um comportamento ético. Estabelecido tal compromisso ético na relação com o outro, somos transportados para a relação com o divino, transcendente, pois desenvolvemos cada qual o seu ser enquanto ser de relação mútua. Nessa situação, percebemos que o ser não está sozinho, ele é um ser de relação. Buber (1976) explica que, até quando o ser humano está só, a dimensão dialogal é mantida, devido ao seu caráter transcendental. A vivência com o outro faz com que o ser humano perceba que ele é capaz de compreender- se, de determinar sua própria existência e que isso o faz único e irrepetível. De outro lado, o ser humano sofre a influência da sociedade em que está inserido. É importante lembrar, conforme vimos no Ciclo 2, quando estudamos as concepções de humano ao longo da História Ocidental (Quadro 2), que, na sociedade pós-moderna, com o mundo globalizado economicamente, vivemos uma crise de valores (acredito, logo é verdade), em que predominam os parâmetros políticos e econômicos que concebem as pessoas como seres que produzem e que consomem (consumo, logo sou). Assim, de maneira contraditória, o progresso tecnológico comumente é considerado mais importante que a pessoa humana, que os próprios seres humanos. Continuando, o ser humano é um ser inserido na História, vivendo-a e construindo-a o tempo todo, em cada gesto e decisão que toma. Como o ser humano é um ser aberto ao mundo, ele vai desenvolver seu projeto pessoal e pode organizar sua existência a partir de valores espirituais. Valor espiritual é aquele que se refere à realidade, a uma relação pessoal, a uma programação de uma ação, à intervenção racional na natureza. Significa escolher algo para comer ou beber, que cada situação existencial vivida está revestida de um valor, que há um sentido por trás da realidade que se apresenta. É claro que isso não acontece de forma idêntica para todas as pessoas. Nem todos percebem o sentido da mesma maneira, pois cada um é um ser único. Estudos reforçados? Então é hora de testar seus conhecimentos, realizando a questão a seguir. Dimensões da pessoa Depois de entendermos alguns conceitos importantes, podemos compreender o ser humano e suas dimensões. Faremos um estudo com todos os conceitos que vimos anteriormente, mas, agora, de acordo com cada dimensão. Entendendo a particularidade de cada dimensão, poderemos compreender melhor a relação entre elas e o ser humano como um todo. Acompanhe uma descrição geral do entendimento que o Claretiano tem a respeito da pessoa. Dimensão biológica Ao referir-se à dimensão biológica, refere-se, naturalmente, a tudo que se relaciona ao corpo da pessoa. Sem dúvida, é por meio do corpo que o ser humano faz contato com os outros seres, com o mundo e com Deus, seu Criador. [...] não se pode deixar de perceber que a sociedade está inserida em um contexto social capitalista, neoliberal. Nesse ambiente, envolvidos pela lógica tecnicista, como é próprio do sistema neoliberal vigente, o homem acaba sendo reduzido a um ser que produz e que consome. Diante desse enfoque, o que acaba tendo valor específico é essa parte do ser humano que está em contato com o mundo e que possui a força produtiva e consumidora. Um dos problemas fundamentais que aparece com relação ao corpo é apontado por Scheler (2003, p. 73), quando ele analisa a questão do Dualismo: “O fosso erigido por Descartes entre o corpo e a alma através de seu dualismo de extensão e consciência como substâncias fechou- se hoje quase até a palpabilidade a unidade da vida”. No entanto, apesar da distorção imposta pela atual sociedade, não se pode negar que o corpo tem seu valor e que este deve ser considerado. É por meio dele que o homem constrói o mundo, adquire conhecimento, transforma a realidade e consegue dar sentido à sua existência. Portanto, é importante frisar que é necessário cuidar bem do corpo. Leloup faz um relato interessante sobre a atenção e o cuidado que é preciso dispensar a ele e o respeito que se deve ter com o ser humano quando comenta que: “O corpo, o imaginal, o desejo, o outro – estamos na presença de um quatérnio para o qual os Terapeutas no tempo de Filon de Alexandria dirigiam sua atenção e os seus cuidados. Esse quatérnio depende de uma antropologia em que as diferentes dimensões do ser humano – corpo, alma, espírito – parecem respeitadas. Os cuidados do corpo não excluem os cuidados da alma, os cuidados da alma não dispensam que se leve em consideração a dimensão ontológica e espiritual do homem” (1998, p. 32). E acrescenta: “Para o terapeuta, o corpo não deve ser visto somente como um objeto, uma coisa ou uma máquina funcionando com defeito, que seria mister ‘consertar’. Não; o corpo é corpo ‘animado’. Não há corpo sem alma, não sendo mais ‘animado’, não merece o nome de corpo, mas de cadáver” (1988, p. 70). Falar do corpo é falar da necessidade de cuidado, cuidado esse que requer um olhar diferenciado para si, mas que leva na direção do outro que, para Boff (2004, p. 33-34), significa “mais que um ato; é uma atitude... Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilidade e de envolvimento afetivo com o outro", pois "sem o cuidado ele deixa de ser humano". Esse é o ideal, mas é notório que as coisas não acontecem dessa forma no ambiente social capitalista da atual sociedade. É possível perceber uma realidade que explora e expõe o corpo e as pessoas de modo ultrajante. Não é difícil perceber que a mídia impõe uma exploração total da realidade corpórea em diversos níveis. Aliás, a mídia criou padrões de beleza e de biotipo. Quem não se adapta aos padrões fica relegado ao segundo plano. Os padrões de beleza e do corpo estão expostos na moda, nas novelas, nos programas de televisão, nas revistas, nos filmes etc. São padrões criados e valorizados, forçando as pessoas a se adequarem a eles. Quem, por uma razão ou por outra, não se sente enquadrado nesse padrão gasta muito dinheiro para se adequar a ele ou se sente excluído da convivência geral da sociedade. É só notar que os tipos de roupas produzidos pelas grifes (pelo menos, pelas grandes grifes) não são feitos para qualquer pessoa ou qualquer corpo. Quem desejar precisa adaptar o próprio corpo para vestir aquele tipo de roupa. Aliás, as grandes grifes não querem qualquer tipo de corpo vestindo as suas roupas. Elas são feitas para físicos “esculturais”, pois é uma forma de fazer propaganda da marca. As pessoas tornam-se “etiquetas ambulantes”, como diz o poeta Carlos Drummond de Andrade (1984). Do mesmo modo, é impressionante a corrida atrás dos bisturis, dos “botox” e de toda espécie de cirurgia para mudanças na estética facial e corporal. Há uma supervalorização da dimensão corporal em detrimento das demais.Para uma sociedade assim, a pessoa vale pelo que aparenta fisicamente. E só em função disso. Tudo visando à possibilidade de aumentar o lucro daqueles que possuem os meios de produção em suas mãos. Dimensão psíquica A dimensão psíquica remete àquilo que os filósofos gregos chamam de anima – no Português, “alma”, “o que dá vida”. O que faz a vida da pessoa acontecer é sua interioridade; remetendo ao pensamento filosófico, é deparar-se com o conceito de essência. A alma da pessoa é sua essência. Mas o que vem a ser essência? Por essência, entende-se aquilo que faz o ser ser ele mesmo. Ou seja, o ser é aquilo que ele é por causa da sua essência. É a essência que o torna um ser único. Só eu sou eu. Só você é você. E o que me faz ser eu e você ser você é a essência. Não existe outro igual. Eu sou único. Você é único(a). Cada um possui um corpo, mas não é o seu corpo. Do mesmo modo, o indivíduo possui emoções, mas não é nenhuma dessas emoções. O indivíduo tem desejos, mas não são esses desejos. O indivíduo pensa, estuda e sabe muita coisa, mas não são as coisas que sabe. Como costumava afirmar Sócrates, o indivíduo é um centro de autoconsciência e vontade; por isso, é dotado de um poder dinâmico, capaz de observar, dominar e dirigir todos os seus processos psicológicos. Entendendo melhor, tomemos como exemplo os perfumes. Sabemos que, em todos eles, há elementos químicos, tais como o álcool e a substância que fixa o perfume. Porém, o que diferencia um do outro é a essência, usada em pouca quantidade, mas que o diferencia e o torna único. Aliás, quem não ouviu a expressão popular que diz: “nos pequenos frascos, os grandes perfumes”? Hoje em dia, há alguns cientistas que querem dimensionar o homem de maneira fracionada, afirmando que ele possui de 2% a 5% de essência. O resto é hereditário e influência social. Alguns até afirmam que próprio da pessoa não existe nada, ela é 100% influência do meio social e da herança genética. Mas, ao olhar a pessoa como um todo, não se pode entendê-la assim. Ela não pode ser reduzida a frações percentuais, pois é única e irrepetível. E aqui fica a interrogação: como é que a pessoa conhece e entra em contato com essa essência? A resposta vem de forma simples: quem tem a chave de seu interior é a própria pessoa. Para conhecer seu interior, é preciso que entre em contato consigo mesma através da reflexão e da meditação. É um constante prestar atenção em si mesmo, no seu modo de ser, de pensar e de agir. Pensando nisso, cabe perguntar: quanto tempo você gasta consigo mesmo? Cinco minutos por dia? Cinco por semana? Cinco por mês? É por meio desse tempo que se ocupa consigo mesmo que se consegue perceber e entender quem se é de fato. Mas há um segundo passo; além de se conhecer, é preciso aceitar-se como você é na sua essência. Tem erros? Como e o que fazer para corrigi-los? Tem defeitos? Claro que sim. Mas quando percebe sua essência na profundidade, percebe a beleza daquilo que é. Aceitar-se como é define o passo adiante. Mas não é tudo, há mais pela frente, é hora de gostar de si como você é. Se não conseguir dar esses passos, não poderá perceber que os semelhantes são tão importantes como você e merecem seu carinho, sua atenção, seu apreço, seu amor. Assim é possível entender as palavras de Cristo: “amarás teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22,39). Quem consegue amar-se na essência ama o outro, o mundo, a natureza e o Criador, porque se percebe parte desse todo. O eu do indivíduo é a sua individualidade, é o seu ser pessoa. É essa a marca indelével do eu sou. E a consciência disso é que faz o indivíduo perceber que ninguém vai ocupar seu lugar no mundo; sua missão no mundo é única. Entrar em contato com o seu núcleo, isto é, com o seu ser interior, é abrir as portas para descobrir sua individualidade, sua importância, para encontrar o caminho para a autorrealização, a felicidade. Quanto mais profundo for esse contato com o seu próprio eu, mais profundo será seu conceito de pertença do todo; mais profunda será a percepção de seu papel na melhora do meio em que vive, do mundo onde habita. Não é possível ser feliz sozinho. Quanto mais o indivíduo busca a realização pessoal, mais ele percebe que essa realização só acontece à medida que se abre para o outro, para o todo, para que todos tenham vida em abundância, como ensina o Cristianismo. Essa busca do próprio eu não significa fechar-se em si mesmo, mas, sim, perceber e sentir um intenso amor e respeito por si e por seu corpo e, ao mesmo tempo, uma abertura e um profundo amor pelo outro, pela natureza, pelo meio ambiente, pelo universo, pelo todo. É isso que nos une aos outros, é isso que une ao Criador. Entrar em sintonia consigo, com seu próprio núcleo, é entrar em sintonia com o outro, é entrar em sintonia com Deus. Essa unidade é quebrada quando o indivíduo se fecha em si mesmo, em uma atitude egoísta, egocêntrica, como ensina e propõe a lógica tecnicista. Fechar-se em si mesmo é causar morte, não vida. Contribuir para que haja vida significa estar centralizado, mas aberto, sem deixar que o meio tire a possibilidade de autorrealização, a qual abrirá as portas para que os outros também se realizem e sejam felizes. Contribuir para que haja vida é lutar contra tudo o que impede a vida de estar ao alcance de todos. O que caracteriza o indivíduo diante da comunidade é saber que homem algum é uma ilha, e que um necessita do outro para ser o que é. No contato com as outras pessoas, o indivíduo percebe-se. Ao perceber-se, compreende que é na relação com o outro que ele próprio se identifica. Contudo, nem sempre isso acontece de forma consciente e clara. Scheler (2003, p. 75) afirma que “a vida psicofísica é una – e esta unidade é um fato que vale para todos os seres vivos; portanto, também para os homens”. Fazendo uma crítica a Descartes, o autor ainda afirma, categoricamente, que este: [...] introduziu na consciência ocidental todo um exército de equívocos da pior espécie acerca da natureza humana (ele dividiu todas as substâncias em "pensantes" e "extensas")... Para Descartes o mundo não consiste senão em pontos "pensantes" e em um mecanismo violento a ser investigado matematicamente (2003, p. 69). E acrescenta: [...] os filósofos, os médicos, os pesquisadores da natureza que se ocupam hoje com o problema do corpo e da alma convergem cada vez mais para a intuição fundamental: é uma e a mesma vida que possui uma configuração formal psíquica em seu íntimo, corpórea em seu ser para os outros (2003, p. 71). Dimensão social Conforme alguns pensadores, o ser humano é produto do meio em que nasce e vive. Ele recebe uma carga genética muito grande. Alguns dizem que essa carga e essa influência do meio chegam a 95%, outros falam em 98%. Há até alguns que dizem que a influência do meio é de 100%. Se fosse assim, não haveria individualidade. O meio influencia os que vivem nesse ambiente, levando-os a adquirir os modos da família, do bairro onde vivem, da cidade etc. Existe grande influência dos amigos que, ao mesmo tempo, é transmitida ao ambiente. Não se pode esquecer, ainda, que a ideologia do sistema capitalista influencia a pessoa no seu pensar, seu sentir e seu agir. Portanto, essa carga de influência que diariamente é recebida por meio da família, da mídia, da escola, do grupo de amigos etc. confere à pessoa uma maneira própria de ser. Apesar da carga genética e da influência do meio, o ser humano possui algo que o identifica consigo mesmo e o torna diferente. Portanto, o que vai mostrar essa diferença é a forma como ele olha para si e como ele se identifica com seu interior. Assim, pode-se distinguir o que é identidade própria e o que é influência do meio em que vive. É nesse âmbito que a pessoa humana se encontra. Cada ser humano é um ser único. No entanto, está inserido num contexto mais complexo, bem mais amplo do que seu próprio ser. Cada pessoa humana tem necessidade dos outros: para vir ao mundo, para crescer, para nutrir- se, para educar-se, para programar-se a si mesma e para realizar seu próprioprojeto de humanidade. [...] Cada ser humano nasce, vive e cresce no interior de um grupo social... (MONDIN, 1998, p. 27). A pessoa vive em sociedade. Ela não pode e não deve ficar isolada em sua existência, pois é um ser em relação. Não é apropriado restringir a análise e a concepção da pessoa humana, como popularmente se fala e se ouve pela vida afora: o homem é um ser que nasce, cresce, reproduz, envelhece e morre. Muitas vezes, crianças e adolescentes fazem esse tipo de brincadeira, e, na atitude, muitas pessoas adultas também agem como se esse fosse o sentido da vida, fazendo, simplesmente, uma leitura biológica. Assim, valorizam uma parte do ser em detrimento do restante. É comum valorizar uma dimensão em detrimento das demais. Dimensão espiritual O significado etimológico da palavra "espiritual" apresenta um problema de terminologia específico da língua portuguesa. O termo estóico para espírito é pneuma, e o latino, spirtus, com suas derivações nas línguas modernas – no alemão é Geist, em hebraico ru’ach. Não existe problema semântico nessas línguas, mas existe um problema no português, por causa do uso da palavra "espírito" equivocadamente, com um "e" minúsculo. As palavras "Espírito" e "Espiritual" só são usadas para o Espírito divino e seus efeitos no homem, e são escritos com "E" maiúsculo. A questão agora é então: pode ser restaurada a palavra "espírito", designando uma dimensão particular da vida humana? (TILLICH, 1984, p. 401). Essa preocupação remete a uma questão fundamental para o entendimento dessa dimensão da pessoa. O mesmo autor afirma mais adiante, quando aponta o espírito como poder de vida: [...] espírito é o próprio poder de animar e não uma parte acrescentada ao sistema orgânico. Contudo, alguns desenvolvimentos filosóficos, aliados a tendências místicas e ascéticas no mundo antigo tardio, separaram espírito e corpo. Nos tempos modernos essa tendência chegou ao seu auge em Descartes e no empirismo inglês. A palavra recebeu a conotação de "mente" e a própria "mente" recebeu a conotação de "intelecto". O elemento de poder no sentido original de espírito desapareceu, e finalmente a própria palavra foi descartada. Martins (2009, p. 37) dimensiona o entendimento sobre a espiritualidade afirmando que: [...] quando falamos de espiritualidade, falamos de uma relação com algo superior à própria materialidade. Não necessariamente estamos falando da relação com Deus, tampouco com o Deus cristão... Se não estamos no terreno religioso, então, onde se situa o entendimento da questão em pauta? O mesmo autor afirma que: [...] entramos no terreno da filosofia, precisamos considerar a espiritualidade com base na questão da transcendência, uma questão genuinamente filosófica... No ser humano há uma abertura para as coisas existentes e uma abertura para seu semelhante, portanto, um ser-para-as-coisas e um ser- para-o-outro. A relação estabelecida com as coisas se dá no plano da objetividade e a relação com o outro se dá no plano da intersubjetividade. Contudo, há um terceiro nível de abertura, que ocorre no plano da transcendência. Uma abertura para o Absoluto... (MARTINS, 2009, p. 37). A vida em si possui um significado próprio e dá ao ser humano uma expressão de totalidade. O ser humano tem um significado especial e deve ser visto na sua totalidade. A questão fundamental que devemos analisar é como ajudar a pessoa a se descobrir e a se perceber dessa forma. Quando se trata de totalidade do ser humano, trata-se das dimensões biológica, psicológica, social e espiritual. Sua existência não está isolada, pois o ser humano é um ser de relação. Relação essa que abrange o seu eu, o outro, o mundo e a transcendência, ocorrendo uma inter-relação Leonardo Boff (2003), teólogo e escritor, quando fala a respeito da vida que envolve o ser humano, especifica as características próprias da pessoa que começa com a auto-organização, passa pela autonomia, pela adaptabilidade ao meio e pela reprodução e culmina na autotranscendência. Por isso, constantemente, ele chama a atenção para o cuidado, o respeito, a veneração e a ternura que devemos ter para com a vida de maneira geral e a pessoa em particular. É a vida que garante a todos os seres a razão de seu existir, do seu ser-no-mundo. Respeitar a vida, cuidar dela, tratá-la com veneração e ternura são requisitos inerentes a todos nós que estamos em busca de um sentido. Entretanto, é preciso entrar em contato com algo que está implícito no homem: o espírito. Isso não elimina a importância dos outros aspectos da pessoa, que estão subentendidos no ser como um todo. Mas o que evidencia essa espiritualidade? Quem nos dá essa resposta é Mondin (1998, p. 21), quando fala que há: [...] muitos indícios: a autoconsciência, a reflexão, a contemplação, o colóquio, a autotranscedência etc. Mas o indício mais certo, porém, é a liberdade. Esta é a condição própria do espírito. O espírito, e somente o espírito é essencialmente livre. [...] o homem possui uma dimensão interior de natureza espiritual: a alma, a mente e o espírito. Completando essa afirmação, Betto e Boff acrescentam que "Espírito é o ser humano na sua totalidade enquanto ser que pensa, que decide, que tem identidade, que tem subjetividade, é sujeito. [...] espírito é o modo de ser" (2005, p. 76), pois "espiritualidade é a transformação que a mística produz nas pessoas, na forma de olhar a vida, no jeito de encarar os problemas e de encontrar soluções" (2005, p. 28). Para aprofundar um pouco mais o que significa essa dimensão espiritual, é importante verificar o que Mandrioni (1964, p. 53) escreve quando se refere a ela: [...] capacidade de reflexão; a plena consciência de si mesmo; a capacidade de separar a essência universal da existência concreta e particular; o poder universalizador; o fator da liberdade e o âmbito indefinido de possibilidades aberto aos atos humanos; o poder de controlar seus impulsos mais poderosos a fim de ajustar sua conduta à norma de um ideal percebido e valorizado; o poder de conceitualizar, julgar e raciocinar; a capacidade de captar a ordem [...] o poder de transcender a relatividade dos atos humanos e alcançar um conteúdo permanente, necessário e estável [...] o fato de poder perguntar-se sobre o sentido do "Todo"; a capacidade de construir a ciência; o sucesso da cultura com a imensidade de valores que concentra... Max Scheler (2003, p. 35) aponta o espírito como princípio ao mostrar a diferença entre o homem e o animal: O espírito é um princípio novo e ele abarca a razão, utilizada pelos gregos, abarca um determinado tipo de intuição, que ele chama de intuição dos fenômenos originários ou dos conteúdos essenciais e abarca os atos volutivos e emocionais (a bondade, o amor, o remorso, a veneração, a ferida espiritual, a bem-aventurança, o desespero e a decisão livre), além disso, designa pessoa como sendo o centro ativo no qual o espírito aparece no interior das esferas finitas do ser. No entanto, Scheler ainda acrescenta que o ser "espiritual" está aberto para o mundo. "Espírito é com isso objetividade... Somente um ser capaz de levar a termo tal pertinência às coisas "tem" espírito" (2003, p. 36). E acrescenta: O ato espiritual, como o homem pode realizá-lo... leva ao "recolhimento em si", "consciência de si mesmo por parte do centro espiritual do ato" ou autoconsciência. Isso dá ao homem a possibilidade de "modelar livremente sua vida" (2003, p. 39). Por força do espírito o homem é dado a si na autoconsciência e na objetividade de seus processos psíquicos e de seu aparato senoriomotor (2003, p. 41). O espírito envolve o ser humano no seu todo. A autoconsciência e a liberdade representam para a pessoa a capacidade de entender seu papel no mundo. O homem, e só ele, é capaz de conhecer seu passado e entendê-lo; de perceber-se no presente e projetar seu futuro. Mas nessa dinâmica da vida pode fazer escolhas tornando-se pessoa na plenitude. Como espírito, o homem goza de uma abertura sem limites, infinita. Ele está em busca da plena realização porqueparticipa dessa esfera espiritual que o coloca em contato com o infinito. Como pessoa, é ser finito se relacionando finitamente com os outros seres, pois são seus semelhantes. Por isso, sua existência e sua autorrealização ocorrem enquanto se relaciona com os outros, seus semelhantes. Cada pessoa é o princípio de suas ações, de sua capacidade de governar-se tendo em vista sua liberdade. Fundamentalmente, o ser humano é livre para se realizar como pessoa e, por isso, responsável pelo seu projeto pessoal e social de vida (CLARETIANO, 2005, p. 23). A pessoa que consegue olhar para si mesma se percebe como pessoa humana, una e única, capaz de criar e dar respostas positivas a seus anseios e de conquistar todas as chances de fazer uma opção livre e consciente. A evolução técnica experimentada nos últimos séculos desumanizou o ser humano. É importante que ele perceba que é coautor na construção do mundo; por isso, deve agir com liberdade, responsabilidade e justiça. No entanto, ele entenderá essa responsabilidade quando adquirir a liberdade de pensamento, quando aguçar a capacidade de discernimento e puder compreender seus sentimentos e sua imaginação (DANIEL; SCOPINHO (2013, p. 72-82). Vertendo-se para esse nível de compromisso, o Claretiano – Centro Universitário, tendo em vista o ensino confessional, coloca como centro de suas preocupações o desenvolvimento integral da pessoa humana. Dessa maneira, sua Missão é identificada da seguinte forma: Capacitar a pessoa humana para o exercício profissional e para o compromisso com a vida, mediante a sua formação integral; missão essa que se caracteriza pela investigação da verdade, pelo ensino e pela difusão da cultura, inspirada nos valores éticos e cristãos e no carisma Claretiano que dão pleno significado à vida humana (AÇÃO EDUCACIONAL CLARETIANA, 2012, p. 17). Dito de outro modo, as pessoas são a primeira grandeza a ser considerada. Com esse intuito, foram definidos 7 princípios institucionais, a saber: • Princípio da Singularidade: cada pessoa merece atenção, respeito e valorização na comunidade educativa. • Princípio da Abertura: a comunidade educativa está aberta ao diálogo e deseja servir às pessoas, à sociedade e ao mundo. • Princípio da Integralidade: a comunidade educativa é profética e facilitadora da construção responsável de si e da investigação da verdade. • Princípio da Transcendência: queremos melhorar o que somos e fazemos. • Princípio da Autonomia: na comunidade educativa cada um deve responder com empenho pelo bem de todos. • Princípio da Criatividade: queremos ser criativos e proativos no cumprimento de nossa missão. • Princípio da Sustentabilidade: queremos que a instituição viva e faça viver com passos firmes e de forma sustentável no presente e no futuro (AÇÃO EDUCACONAL CLARETIANA, 2012). Conheça na integra os princípios institucionais do Claretiano - Rede de Educação. Assim, em conformidade com tais princípios, têm sido estruturadas as iniciativas da Instituição, visando contribuir para o desenvolvimento humano necessário a todos nós. Pronto para testar seus conhecimentos? Responda à questão a seguir e identifique se o seu aprendizado está eficiente. 6. Considerações Ao chegar no final deste ciclo, pudemos perceber que o entendimento que o Claretiano possui a respeito da pessoa se distingue daquele predominante na atualidade e de inúmeras correntes filosóficas, antropológicas, sociais etc. Vimos que o Claretiano entende a pessoa como um ser único e irrepetível, considerando todas as pessoas, sem distinção nenhuma, visto que todas são importantes e merecem nosso respeito e atenção. Estamos inseridos em uma sociedade que faz distinção entre as pessoas e que valoriza a pessoa que “possui mais”. O poder e o dinheiro acabam dando à pessoa uma importância que não corresponde à realidade, mas que é imposta pela sociedade em que vivemos. Nesse sentido, cabe a nós perceber essa situação e lutarmos para que o entendimento a respeito da pessoa seja adequado à realidade que nos faz mais humanos e humanizados. Não basta só conhecermos, é preciso vivenciar o aprendizado. https://dev.redeclaretiano.edu.br/dev/res/emkt/2018/faculdaderco/credenciamento/principios.pdf