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Teoria e Pratica em Sociologia Classica (Pons Aula_6) (1)

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TEORIA E PRÁTICA EM 
SOCIOLOGIA CLÁSSICA 
AULA 06 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Dr. Rafael Pons Reis 
 
 
CONVERSA INICIAL 
 
O objetivo do presente texto consiste em apresentar brevemente os 
conteúdos da sexta vídeo-aula ministrada pela Professora Maria Izabel 
Machado, da disciplina de Teoria e Prática em Sociologia Clássica. Para tanto, 
veremos na primeira seção examinaremos algumas características acerca da 
transição entre o sistema de corporações e o trabalho na fábrica. Na segunda 
seção, por sua vez, examinaremos sobre como ocorreu a divisão manufatureira 
do trabalho, a fim de entendermos, na seção seguinte, sobre a emergência dos 
Princípios de Administração Científica, de Taylor, e o fordismo de Henry Ford. 
Por fim, na última seção explanaremos algumas características do cenário do 
pós-fordismo e o da acumulação flexível e os seus impactos no mundo do 
trabalho no ambiente da globalização. 
Bons estudos! 
 
 
TEMA 1 – O TRABALHO NA FÁBRICA 
 
 O advento das duas grandes revoluções, a Revolução Industrial na 
Inglaterra a partir da metade do século XVIII, que se disseminou por toda a 
Europa no século seguinte, e a Revolução Francesa, em 1789 permitiu que a 
ocorrência de um grande número de transformações econômicas, políticas e 
sociais, por sua vez, intimamente ligadas às inovações tecnológicas. Por meio 
do desenvolvimento da ciência e do progresso científico, a descoberta de 
novas fontes de energia e a mecanização dos processo de produção permitiu o 
surgimento de novas formas de organização do trabalho, impactando, com 
isso, o modo de vida das pessoas. 
 O argumento que queremos defender aqui é que a Revolução Industrial 
representou não apenas a adoção e o desenvolvimento de novas tecnologias, 
mas, sobretudo, o processo de industrialização. Este processo permitiu fazer 
com que os artesãos, que antes produziam em suas casas com suas 
ferramentas, pasassem a executar ordens a partir do empresário capitalista e 
se sujeitaram a novas relações de trabalho. Se antes a produção era feita de 
forma artesanal pelos respectivos mestres artesãos, com o início das 
 
 
 
atividades industriais, a produção passou a ocorrer num ritmo acelerado a partir 
do uso de soluções tecnológicas e de máquinas. 
Isso significa dizer que o lar, como unidade de produção, foi substituído 
pela fábrica. Se nas oficinas, os mestres artesãos tinham o controle da 
produção e de sua jornada de trabalho, nas fábricas eles passaram a ser 
submetidos à longas jornadas de trabalho, sob os olhos atentos de um patrão, 
provocando com isso, uma radical mudança nas condições de trabalho e de 
vida. 
Se no período de funcionamento do chamado sistema de corporações1 
os artesãos dispunham do domínio das técnicas de produção e controle sobre 
todo o processo de trabalho, com a emergência do capitalismo industrial, 
segundo Decca, “(...) a produção não poderia repousar sobre motivações de 
indivíduos que detinham o saber-fazer de determinadas atividades e que 
poderiam produzir mais ou menos rápido ou mais ou menos bem de acordo 
com a sua vontade. (...) Dessa forma, o sistema de fábricas foi concebido mais 
por necessidades organizativas do que técnicas, inaugurando para o 
trabalhador toda uma nova ordem de disciplina durante o transcorrrer do 
processo de trabalho” (Decca, 1993, apud Paixão, 2012, p. 176). 
Em face da lógica de acumulação do capitalismo, o trabalho na fábrica 
passou a exigir uma exaustiva jornada de cerca de quartoze, dezesseis horas 
de atividades sob as ordens e a disciplina fabris. Por serem mais dóceis e 
fáceis de serem comandadas, mulheres e crianças passaram a compor o 
quadro de funcionários nas fábricas, um local em que se produziam novas 
relações sociais, um local de apropriação do saber do trabalhador e de 
dominação social. 
 
 
TEMA 2 – A DIVISÃO MANUFATUREIRA DO TRABALHO 
 
A divisão manufatureira do trabalho significa o fracionamento das 
atividades laborais, isto é, o trabalho é dividido em várias etapas, por sua vez, 
executadas por trabalhadores diferentes. Esta divisão é sobremaneira diferente 
 
1 Surgido na Idade Média, o sistema de corporações (também conhecido como corporações de 
ofício, ou guildas) consistia em uma unidade de produção composta por conjunto de pessoas 
qualificadas que trabalhavam em uma determinada função, reunidas com o objetivo de 
regulamentar as técnicas de produção e o processo produtivo artesanal. 
 
 
 
daquela que se dá na sociedade, conhecida por divisão social do trabalho, em 
que cada trabalhador se ocupa em sua respectiva profissão ou ofício, momento 
em que, segundo Paixão, “(...) os homens ainda podiam exercer e construir sua 
individualidade, criatividade e humanidade no ato de trabalho” (2012, p. 178). 
A divisão manufatureira do trabalho abriu caminho para a 
‘despecialização’ do trabalhador, entendida como a perda da qualificação, de 
uma especialidade em uma função ou profissão. O resultado prático disso fez 
com que o capitalista, ao dividir o trabalho em etapas, retirasse o processo do 
controle do trabalhador e o reconstruiu sob seu poder (Paixão, 2012). Neste 
sentido, o proprietário da fábrica não precisava mais contratar um mestre-
artesão para fazer o trabalho, pois precisava apenas de um trabalhador para 
cortar o couro, outro que o costurasse, e um terceiro para pregar a sola. 
Em tese, podemos afirmar que a emergência do capitalismo industrial 
fez com que uma o trabalho passasse a ser submetido a outra lógica, qual seja, 
uma lógica racional. Quando Weber analisa o ‘espírito do capitalismo’ moderno 
 Ele faz menção a essa separação entre a casa e o local de trabalho e sua 
relação com a racionalidade econômica. 
A organização industrial racional, orientada para um mercado 
real, e não para oportunidades políticas ou especulativas de 
lucro, não é, entretanto, a única criação particular do 
capitalismo ocidental. A moderna organização racional da 
empresa capitalista não teria sido viável sem a presença de 
dois importantes fatores de seu desenvolvimento: a separação 
da empresa da economia doméstica, que hodiernamente 
domina por completo a vida econômica, e, associado de perto 
a este, a criação de uma contabilidade racional” (Weber, 1999, 
p. 7-8 apud Paixão, 2012, p. 180). 
 
Assim sendo, o capitalismo industrial impingiu aos trabalhadores 
reunidos na fábrica, uma lógica de produção a partir da divisão manufatureira 
do trabalho, tendo suas atividades laborais submetidas a uma racionalidade até 
então desconhecida. Entretanto, mesmo diante desse novo quadro, o controle 
ainda era aplicado apenas ao trabalhador, uma vez que ainda não existia o 
controle sobre o trabalho, que passou a existir com a gerência científica, que 
veremos na próxima seção. 
 
 
 
 
 
 
 
TEMA 3 – A GERÊNCIA CIENTÍFICA: TAYLORISMO E FORDISMO 
 
 Frederick W. Taylor foi um engenheiro mecânico norte-americano, autor 
da prestigiosa obra “Os Princípios da Administração Científica”, publicada em 
1911. Taylor foi o pioneiro na sistematização de organização do trabalho na 
fábrica, no estabelecimento de uma jornada de trabalho, na supervisão sobre 
os trabalhadores e na criação de normas de conduta rígidas ao trabalhador. 
Taylor estabeleceu medidas para a conduta do trabalhador, por exemplo, sobre 
a limpeza, assobiar, fumar e conversar no local do trabalho. A disciplina e as 
recomendações gerenciais de Taylor passaram a atura não apenas sobre a 
conduta do trabalhador, mas também nas atividades laborais. Trata-se, pois, 
segundo Braverman, do “(...) controle sobre o trabalho e não somente sobre o 
trabalhador” (1987, apud Paixão, 2012, p. 181). 
Em sua obra, Taylor estabelece as bases do taylorismo a partir da 
adoção de alguns princípios gerenciais no trabalho. O primeiro diz respeito com 
a necessária separação entre quem planeja o trabalho(gestor) e aquele que o 
executa (cabe ao trabalhador o papel de cumprir as ordens). O segundo 
princípio refere-se à seleção dos trabalhadores mais qualificados, competentes 
e adequados (trabalhadores que não questionam as regras) paras as 
atividades a serem executadas. Já o terceiro princípio versa sobre o controle 
do tempo e os movimentos dos trabalhadores, ou seja, tudo deve ser pensado 
pela gerência para que o trabalhador possa executar conforme previsto nos 
procedimentos e regulamentos (Paixão, 2012). 
 As contribuições do empreendedor norte-americano, Henry Ford, 
revolucionaram o mundo do trabalho. Autor das obras “Minha filosofia de 
indústria” e “Minha vida e minha obras”, aperfeiçoou os métodos tayloristas e 
ajudou a criar os fundamentos do atual modelo de desenvolvimento 
econômico-tecnológico baseado na produção em massa e no consumo em 
massa. 
O fordismo pode ser entendido a partir de cinco principais 
características: i-) produção em massa significava racionalizar as operações 
dos operários e combater os desperdícios, principalmente de tempo; ii-) com o 
parcelamento das tarefas na tradição taylorista, o trabalhador não precisa mais 
ser um especialista; iii-) criação da esteira fordista, controlável pela direção da 
 
 
 
empresa; iv-) padronização das peças, que implicava a integração vertical; e v-) 
automatização das fábricas (Gounet, 1999, p. 45 apud Paixão, 2012, p.184). 
Importante destacarmos que o modelo de produção fordista vigorou nas 
principais economias capitalistas até o fim da década de 1960 e início dos anos 
1970, momento que uma nova reestruturação econômico-produtiva estava em 
curso em nível mundial, qual seja, o pós-fordismo, também chamado de 
toyotismo ou acumulação flexível. 
 
 
TEMA 4 – O PÓS-FORDISMO E A GLOBALIZAÇÃO 
 
 A estagnação e a obsolescência do modelo de acumulação de capital 
fordista a partir da década de 1970, em grande medida por conta dos choques 
de petróleo, a ascensão de novas geometrias de poder (Alemanha e Japão), e 
o aumento dos custos, contribuíram por desencadear um processo de 
reorganização por parte do capital, a fim de criar um modelo mais arrojado de 
gestão para a geração de riqueza. Em outras palavras, segundo Harvey, “(...) 
era necessário mudar a forma de produzir. A grande fábrica de Ford, com um 
batalhão de trabalhadores produzindo em massa, já não era mais tão lucrativa” 
(1998, apud Paixão, 2012, p. 187). 
O fordismo deu lugar ao toyotismo, que consiste em um modelo de 
produção industrial surgido no Japão no final de década de 1970. Desenvolvido 
pelos engenheiros de produção Taiichi Ojno e Eiji Toyoda, e implementado nas 
fábricas japonesas da Toyota, o modelo tem como características: a 
flexibilização da produção, adoção do sistema just-in-time (que produz 
conforme a demanda), ausência de estoques, uso de tecnologia intensiva 
(robótica e microeletrônica), terceirização produtiva (redução dos postos de 
trabalho). Conforme apresentado pela professora Maria Izabel na vídeo-aula, 
no toyotismo, saem de cena as pirâmides hierárquicas e entram as redes, e sai 
o gerente e entram os colaboradores. 
Com a terceirização de serviços (vigilância, transporte de materiais e de 
funcionários, limpeza, alimentação) a empresa reduz o quadro de funcionários, 
diminuindo, com isso, o custo de produção. A partir da combinação de novas 
formas gerenciais e tecnológicas, as novas empresas passaram a produzir 
mais (maior eficiência) com cada vez menos trabalhadores). Um exemplo 
 
 
 
bastante ilustrativo nesse sentido é apontado por Alessandro Paixão (2012, p. 
188-189) sobre a relação entre produção e o número de empregos entre os 
anos de 1957 e 1987. 
 
Tabela 1 – Indústria automobilística brasileira – produção e emprego no 
período de 1957 a 1987 
 
Fonte: Baseado em Anfavea, 2004 apud Paixão, 2012, p. 188. 
 
Na Tabela 1 acima podemos ver que à medida que a produção de 
veículos aumenta, aumenta também a número de trabalhadores necessários. 
Ou seja, quanto mais se produz, mais trabalhadores são necessários. Já na 
Tabela 2 abaixo, é possível verificar que o aumento da produção não é mais 
acompanhado do mesmo ritmo de crescimento pelo número de empregos. De 
forma mais clara, percebemos que, a partir de 1998, as empresas produzem 
cada vez mais veículos com menos trabalhadores. Os dados apresentados nas 
tabelas sugerem o aumento da eficiência da alocação de recursos na produção 
de veículos a partir da adoção do modelo flexível de produção. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Tabela 2 – Indústria automobilística brasileira – produção e emprego no 
período de 1990 a 2003. 
 
Fonte: Baseado em Anfavea, 2004 apud Paixão, 2012, p. 189. 
 
 Ainda que o modelo toyotista tenha se consolidado na Europa e nos 
Estados Unidos nos anos 1970 e 1980, por conta da globalização, é mister 
frisar que a tendência apresentada na indústria automobilística brasileira 
quanto a forma de organizar o trabalho só chegou no país a partir da abertura 
econômica adotada no início da década de 1990. 
 A aceleração dos processos de globalização econômica, produtiva e 
financeira a partir do fim da Guerra Fria permitiu que o “encurtamento” das 
distâncias entre as nações, fazendo com que pessoas, grupos e países se 
tornem cada vez mais interdependências e, por sua vez, mais conectados. Por 
meio da flexibilização, as empresas passaram a operar no mercado globalizado 
de forma a buscar novos mercados consumidores e de trabalho, procurando 
fontes de matérias-primas mais baratas, bem como lugares mais lucrativos 
para produzir e vender. 
 
 
 
 
 
 
SÍNTESE 
 
 Ao longo da presente aula vimos sobre como o trabalho tem sido 
estudado e analisado a partir do prisma da sociologia. Vimos também sobre 
como o desenvolvimento de novos modelos de produção industrial e, portanto, 
de acumulação de capital, geraram mudanças e consequências por toda a 
esfera social, seja ela nacional ou internacional. 
 Por meio da análise das transformações no mundo do trabalho é 
possível entender algumas das tendências que influenciam e organizam nossa 
sociedade. Da criação das primeiras fábricas, passando pelos Princípios da 
Administração Científica, de Taylor, pelo fordismo e pelo toyotismo, foi possível 
verificar sobre como a realidade é construída socialmente por determinados 
fatores, que acabam por influenciar nossa visão de mundo, bem como hábitos 
de consumo, valores culturais e comportamento. 
 
 
FINALIZANDO 
 
Ao longo do texto vimos como as duas grandes revoluções (Industrial e 
a Francesa) contribuíram por desencadear um conjunto de processos 
econômicas, políticas e sociais, disseminando por toda a Europa a partir do 
século XVIII. Vimos na primeira seção sobre as transformações sofridas pelo 
trabalho por conta do início da industrialização. Na seção seguinte foi a ver de 
estudar sobre a divisão manufatureira do trabalho e suas implicações sobre a 
divisão social do trabalho. Na terceira seção foi apresentada as principais 
características da gerência cientifica, a partir das contribuições de Taylor e 
Henry Ford. Por fim, na última seção apresentamos brevemente o cenário mais 
amplo do pós-fordismo e de como a globalização vem impactando o mundo do 
trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIAS 
 
BERGER, B; BERGER, P. L. Socialização: como ser um membro da 
sociedade. In: FORACCHI, M. M.; MARTINS, J. S. (Org.). Sociologia e 
sociedade: leituras de introdução à sociologia. Rio de Janeiro: LTC, 1977. 
BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de 
Brasília, 11ª ed., Volume I, 1998. 
PAIXÃO, Alessandro E. Sociologia Geral. Curitiba: Editora Intersaberes, 2012.

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