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SUMÁRIO 1. Introdução e Fisiopatologia .................................... 3 2. Epidemiologia ............................................................12 3. Fatores de risco ........................................................12 4. Quadro clínico ............................................................14 5. Seguimento ................................................................17 6. Diagnóstico ................................................................27 7. Medidas iniciais e tratamento precoce ............32 8. Tratamento da Síndrome Coronariana Aguda com supra de ST ...........................................34 9. Tratamento da Síndrome Coronariana Aguda sem Supra de ST ............................................47 10. Complicações mecânicas pós-infarto ...........51 11. Cuidados pós-tratamento e pré-alta .............56 Referências Bibliográficas ........................................58 3SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 1. INTRODUÇÃO E FISIOPATOLOGIA A síndrome coronariana aguda con- siste em uma das faces da doença aterosclerótica, a qual é oriunda da presença de placas ateromatosas na circulação arterial do coração. Ela se evidencia como um quadro instá- vel, que se apresenta com sintomas anginosos que surgem aos mínimos esforços e até mesmo em repouso, estando associada a altos índices de morbidade e mortalidade. A síndrome coronariana aguda ocu- pa o segundo lugar no quesito de mortalidade global no Brasil, sendo a principal causa do óbito em doenças cardiovasculares, sendo estimados cerca de 300 a 400 mil casos a cada ano. Não é difícil inferir também que essa doença traz consigo um enorme ônus financeiro ao sistema de saúde, dada a necessidade de internação, bem como de procedimentos, medi- camentos e cuidados emergenciais. Para compreender a Síndrome Coro- nariana Aguda (SCA), faz-se neces- sário compreender o processo desen- cadeante da doença aterosclerótica. Diante dos fatores de risco para essa doença, que serão elucidados a se- guir, ao longo dos anos ocorre o de- pósito de colesterol do tipo LDL no subendotélio de vasos arteriais. Em associação com macrófagos, formam as chamadas células espumosas, quadro esse que configura a forma- ção de um ateroma, o qual consiste em uma estrutura com core lipídico localizada na região subendotelial do vaso, recoberta por uma capa fibrosa. Os fatores de risco para a doença aterosclerótica se relacionam com a presença de um endotélio mais in- flamado, o qual acaba por expressar moléculas de adesão, como VCAM- 1. Tais moléculas atraem elementos presentes no plasma, com ênfase nos monócitos, os quais, ao entrarem em contato com essas proteínas de ade- são, se internalizam na camada su- bendotelial, local onde essas células se diferencial em macrófagos. Uma vez instalados, os macrófagos subendoteliais fagocitam moléculas de gordura, principalmente coleste- rol do tipo LDL, de modo a gerar as chamadas de células espumosas, os quais se acumulam na camada su- bendotelial ao longo do tempo, com- primindo o endotélio contra a luz do vaso. Toda essa lesão gera uma capa fibrótica que recobre essas células, em decorrência da migração de célu- las da camada muscular lisa do vaso, que pode se calcificar ao longo do tempo. 4SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Figura 1. Mecanismo de formação da placa I. Evolução das alterações da parede arterial na hipótese da resposta à lesão. 1, Normal. 2, Lesão endotelial com adesão de monóci- tos e plaquetas (as últimas a locais onde se perdeu o endotélio). 3, Migração de monóci- tos e células musculares lisas para a íntima. 4, Proliferação das células musculares lisas na íntima com produção de matriz extra celular. 5, Placa bem desenvolvida. (Robbins & Cotran, Bases Patológicas das Doenças, 8ª edição, Elsevier) 5SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Figua 2. Mecanismo de formação da placa II. Sequência hipotética de interações celulares na aterosclerose. Pensa-se que a hiperlipidemia e outros fatores de risco causem lesão endotelial, resultando em adesão de plaquetas e monóci- tos e liberação de fatores de crescimento, incluindo fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), que levam à migração e proliferação de células musculares lisas. As células espumosas das placas ateromatosas são derivadas de macrófagos e células musculares lisas – de macrófagos através do receptor de lipoproteína com densidade muito baixa (VLDL) e modificações da lipoproteína de baixa densidade (LDL) reconhecidas pelos receptores depuradores (p. ex., LDL oxidado) e de células musculares lisas por mecanismos menos certos. O lipídio extracelular é derivado da insudação da luz do vaso, particularmente na presença de hipercolesterolemia, e também de células espumosas em degeneração. O acúmulo de colesterol na placa reflete um desequilíbrio entre influxo e efluxo, e a lipoproteína de alta densidade (HDL) provavelmente ajuda a remover o colesterol desses acúmulos. As células musculares lisas migram para a íntima, proliferam e produzem matriz extracelular (MEC), incluindo colágeno e proteoglicanos. IL-1, interleuci- na-1; MCP-1, proteína quimioatraente de monócitos-1. (Robbins & Cotran, Bases Patológicas das Doenças, Elsevier). Figua 3. Placa consolidada (Robbins & Cotran, Bases Patológicas das Doenças, Elsevier) 6SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SE LIGA! É importante saber em linhas gerais as características das placas ate- romatosas quanto à sua classificação. Basicamente, tem-se a placa estável, que possui capa fibrótica mais espessa e menor core lipídico, e a placa vulnerá- vel ou instável, a qual possui maior core lipídico e uma capa fibrótica mais delga- da. Essa última é mais suscetível à ocor- rência de rotura e erosão de sua capa, o que pode levar a um processo inicial de agregação plaquetária pela exposi- ção do core lipídico, processo esse que gera o chamado trombo branco, o qual pode evoluir para um acúmulo de trom- bina e por consequência, de eritrócitos, o chamado trombo vermelho, que leva à trombose. Figua 4. Tipos de placas ateroscleróticas. Esquema comparando placa aterosclerótica vulnerável e estável. Embora as placas estáveis tenham cápsulas fibrosas densamente colagenosas e espessadas com mínima inflamação e centro ateromatoso subjacente desprezível, as placas vulneráveis (propensas à ruptura) se caracterizam por cápsulas fibrosas finas, grandes centros lipídicos e aumento da inflamação. (Adaptada de Libby P: Circulation 91:2844, 1995.) (Robbins & Cotran, Bases Patológicas das Doenças) 7SÍNDROME CORONARIANA AGUDA O quadro em questão é desencadea- do pelo instabilização aguda de placa aterosclerótica localizada em campos coronarianos, propiciando a agrega- ção plaquetária, de modo a formar um trombo na luz arterial, o que gera um agravamento agudo da obstru- ção vascular. O grau de obstrução determinará o aparecimento de dife- rentes sintomas clínicos, bem como o grau de isquemia ao qual o miocár- dio for submetido. Nos casos em que o trombo promover uma obstrução parcial, com fluxo sanguíneo residu- al (seja pela porção ainda não ocluída ou por circulação colateral), ou com a ocorrência de uma oclusão transitória da luz vascular, temos dois quadros possíveis mais brandos da doença: o infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST (IAMSSST) e a angina instável. Já quando ocorre a obstrução total da luz arterial, sem o suprimento por circulação colateral, ocorre uma pri- vação completa da irrigação do mio- cárdio, levando ao infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMSST). Sendo assim, esses três quadros fazem par- te da Síndrome Coronariana Aguda, sendo o grau de obstrução o determi- nante da gravidade e da intensidade do quadro clínico desencadeado. Figua 5. Rotura de placa. Ruptura de placa aterosclerótica. A, Ruptura da placa sem trombo superposto em um pa- ciente que teve morte súbita. B, Trombose coronária aguda superposta a uma placa aterosclerótica comruptura focal da cápsula fibrosa, desencadeando infarto do miocárdio fatal. Em A e B, uma seta aponta para o local de ruptura da placa. (B, Reproduzida de Schoen FJ: Interventional and Surgical Cardiovascular Pathology: Clinical Correlations and Basic Principles. Philadelphia, WB Saunders, 1989, p 61.)(Robbins & Cotran, Bases Patológicas das doenças, Elsevier) 8SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SAIBA MAIS! A síndrome coronariana aguda pode ser caracterizada também pelas regiões do miocárdio atingidas pela isquemia ou pelas modificações tardias que surgem ao ECG. Infartos sem su- pra de ST costuma provocar necrose do miocárdio restrita à região subendocárdica, daí serem denominados de infartos subendocárdicos. Esse tipo de acometimento não costuma gerar cicatrizes eletrocardiográficas, de modo a também serem chamados infartos sem onda Q ou não-Q. Nos casos de isquemia severa e persistente, a necrose é mais extensa, atingindo toda a espessura do miocárdio, classificando esse evento como infarto transmural. Nesse caso, temos o desenvolvimento de uma onda Q ao ECG, de modo que esse evento pode ser deno- minado também como infarto com onda Q, ou infarto Q. Figua 6. Tipos de infarto I. Progressão da necrose do miocárdio apos oclusão da artéria coronária. A necrose come- ça em uma pequena zona de miocárdio abaixo da superfície do endocárdio no centro da zona isquêmica. A área que depende do vaso ocluído para perfusão e o miocárdio “em risco” (sombreada). Note que uma zona muito estreita do miocárdio imediatamente abaixo do endocárdio e poupada da necrose, pois pode ser oxigenada por difusão a partir do ventrículo. (Robbins & Cotran, Bases Patológicas das Doenças, Elsevier) 9SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SE LIGA! Se você ficou confuso quanto à progressão da isquemia no músculo cardíaco, devemos lembrar que o cora- ção possui irrigação arterial de fora para dentro, de modo que as artérias coroná- rias nutrem primeiramente o epicárdio, logo após, o miocárdio e, por último, o endocárdio. Logo, caso haja uma isque- mia, faz sentido que o último a receber o suprimento sanguíneo seja o mais pre- judicado, não? Sendo assim, podemos completar o raciocínio inferindo que a isquemia progrida no sentido contrário à irrigação. Dessa forma, primeiramente o endocárdio é acometido, depois o mio- cárdio e o epicárdio logo após ele. A instabilização de uma placa ate- romatosa enraizada na luz de algum ramo coronariano ocorre por meio de rotura dessa placa, erosão superficial e hemorragia intraplaca. Em termos gerais, a rotura da placa consiste na forma mais grave de instabilização, sendo preponderante entre os casos de infarto agudo do miocárdio (IAM) fatais. Isso ocorre porque a placa rota faz com que o sangue seja exposto às substâncias trombogênicas que se encontram no interior da placa, pro- piciando a formação de um coágulo no local da rotura. Enquanto isso, a erosão da placa está relacionada às formas mais brandas da síndrome coronariana aguda, na qual ocorre a remoção de placas endoteliais vascu- lares, ocorrendo a exposição de colá- geno da membrana basal, que esti- mula plaquetas circulantes, ativando a Figua 7. Tipos de infarto II. Distribuição da necrose isquêmica do miocárdio correlacionada com a localização e nature- za da perfusão reduzida. A esquerda, as posições dos infartos agudos transmurais resultando de oclusões das artérias coronárias principais; de cima para baixo, artérias descendente anterior esquerda, circunflexa esquerda e coronária direita. A direita, os tipos de infarto que resultam de uma oclusão parcial ou temporária, hipotensão global ou oclusões de pequenos vasos intramurais. (Robbins & Cotran, Bases Patológicas das Doenças, Elsevier) 10SÍNDROME CORONARIANA AGUDA cascata de coagulação. Essa ativação geralmente é mais tênue, de modo que produz um coágulo mais friável do que aquele da rotura, mas ainda assim, esse mecanismo corresponde a cerca de 20% dos óbitos fatais por IAM. A hemorragia da placa é mais rara e atua rompendo a placa, uma vez que provoca uma rápida expan- são da lesão. Figua 8. Imagem anatomopatológica mecanismos de instabilização de placa. Alterações anatomopatológicas na instabili- zação da placa de ateroma, precipitando a síndrome coronariana aguda. Em (A), há rotura da capa fibrótica (seta vermelha) com formação de trombo intraluminal oclusivo. Em (B), verifica-se erosão do endotélio sobre a placa (seta preta), e formação de trombo suboclusivo. Em (C), pontos de hemorragia intraplaca (setas menores) expandem agudamente a placa, levando a lesão endotelial. Imagens cedidas por Dra. Maria de Lourdes Higuchi, InCor – HCFMUSP. (Clínica médica Usp, vol. 2) Uma vez que a placa tenha sofrido uma erosão superficial com extensão pequena, a trombose costuma ser autolimitada, sem gerar repercussões sintomáticas para o paciente, sendo que na maioria das vezes, o coágulo pode ser dissolvido pelo próprio sis- tema fibrinolítico endógeno ou pode também ser incorporado pela placa, de modo a contribuir para o aumen- to dessa. Caso ocorra uma trombose mais extensa, normalmente associa- da a rotura da placa com exposição de seu núcleo lipídico, pode ocorrer obstrução da luz mais severa ou até completa, gerando o aparecimento de sintomas. Nos casos de oclusão parcial, o fluxo residual impede a pri- vação completa de oxigênio para as células miocárdicas, preservando a integridade dessas e evitando a ne- crose celular, consistindo no quadro característico da angina instável. Caso ocorra oclusão completa tem- porária, tem-se, a princípio um even- to que não gera supradesnivelamen- to do segmento ST, característico do infarto subendocárdico, que também não gera cicatrizes eletrocardiográfi- cas. Podemos dizer que tanto o infarto 11SÍNDROME CORONARIANA AGUDA de modo que a falta de suprimento sanguíneo atinge toda a espessura miocárdica, gerando o IAM transmu- ral, o qual gera o aparecimento do su- pradesnivelamento do segmento ST, bem como o aparecimento de cicatri- zes observáveis ao ECG por meio da presença de ondas Q. subendocárdico quanto a angina ins- tável são bem semelhantes do ponto de vista fisiopatológico, motivo esse pelo qual recebem tratamento muito semelhante, como veremos adiante. Quando ocorre a obstrução comple- ta sustentada, a onda de isquemia se prolonga para além do endocárdio, MAPA MENTAL FISIOPATOLOGIA DA SCA DOENÇA ATEROSCLERÓTICA Macrófagos Placa de ateroma Células espumosas Capa fibrótica Células musculares lisas Inflamação endotelial Depósito de LDL no subendotélio Instabilização da placa Agregação plaquetária Trombo Obstrução arterial Total Parcial Infarto transmural Infarto subendocárdico IAMSST IAMSSST 12SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 2. EPIDEMIOLOGIA Apesar da queda da taxa de hospita- lização decorrente de síndrome coro- nariana aguda ter caído cerca de 4 a 5% a cada ano nos Estados Unidos, são contabilizados ainda cerca de 550 mil eventos cardiovasculares co- ronarianos primários e cerca de 200 mil reincidentes a cada ano. Logo, faz sentido o fato de que as doenças is- quêmicas do miocárdio tenham se tornado as principais responsáveis por gastos no sistema de saúde, dado o seu impacto quanto aos anos de vida perdidos por incapacidade (do inglês disability-adjusted life-years ou DALY). O infarto agudo do miocárdio é res- ponsável por cerca de 8,8% dos óbi- tos no Brasil, sendo a mortalidade mais alta no sistema público do que no privado, decorrente de dificuldade de acesso ao serviço de terapia inten- siva precocemente. Nos Estados Unidos, a doença co- ronariana por si só (quadro esse que inclui a síndrome coronariana aguda) atinge cerca de 17 milhões de pes- soa, sendo que cerca de 10 milhões sofrem de sintomas anginosos, ocor- rendo cerca de 380 mil mortes decor- rentes de infarto agudo do miocárdio a cada ano por meio de morte súbita. É importante ressaltarmos que a in- cidência da doença coronariana au- menta conforme a idadedo paciente, sendo que a ocorrência do evento, como já mencionado, é responsável por limitações na qualidade de vida do indivíduo ao restringir suas atividades em decorrência de incapacidade ad- quirida após o evento, a sua maioria decorrente de quadros de angina ins- tável e déficits do ventrículo esquerdo. Os impactos econômicos da doença, compilando tanto os gastos relacio- nados aos cuidados com a saúde do paciente, bem como aos decorrentes da perda de produtividade giram em torno de 156 milhões de dólares ao ano, sendo uma das doenças com maior impacto socioeconômico. 3. FATORES DE RISCO Uma vez que já mencionamos breve- mente o mecanismo pelo qual ocor- re a síndrome coronariana aguda, faz sentido que os fatores de risco para ela sejam aqueles relacionados à ocorrência de aterosclerose, sendo que alguns desses são modificáveis e outros não. Apesar do fato de mulhe- res possuírem uma carga ateroscleró- tica significativa, os homens são mais propensos a desenvolverem doenças coronarianas mais precocemente, sendo a prevalência dessa cada vez maior conforme a idade do paciente aumenta. Como em várias doenças, um potente fator de risco para o de- senvolvimento de doenças coronaria- nas consiste em quadros familiares prévios dessa, o que sugere um me- canismo genético de predisposição, 13SÍNDROME CORONARIANA AGUDA o qual, obviamente, não pode ser al- terado. Os riscos são acumulativos, de modo que é de suma importân- cia a avaliação dos fatores de ris- co modificáveis, como dislipidemia, hipertensão, diabetes mellitus, sín- drome metabólica, tabagismo, obe- sidade, sedentarismo e etilismo, os quais devem ser mitigados e, dentro do possível, eliminados. SAIBA MAIS! Para diagnosticar a presença de síndrome metabólica são necessários ao menos três dos cinco critérios a seguir: circunferência abdominal > 102 cm em homens ou 88 cm em mu- lheres, triglicérides ≥ 150 mg/dL, HDL < 40 mg/dL em homens ou < 50 mg/dL em mulheres, pressão arterial ≥ 130/85 mmHg e glicemia de jejum ≥ 100 mg/dL. FATORES DE RISCO E MARCADORES PARA DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA Fatores de risco não modificáveis Idade Sexo masculino História familiar prévia de doença arterial coronariana Fatores de risco modificáveis independentes Dislipidemia Hipertensão Diabetes Mellitus Síndrome Metabólica Tabagismo Obesidade Sedentarismo Etilismo Marcadores Lipoproteínas séricas elevadas Hiperhomocisteinemia Proteína C-reativa de elevada sensibilidade aumentada Calcificação de artérias coronárias detectadas por tomografia Tabela 1. Fatores de risco e marcadores para doença arterial coronariana (Cecil, Essentials of Medicine, 9th Ed., Elsevier, 2016) SE LIGA! Existem causas não ateros- cleróticas que desencadeiam síndrome coronariana aguda, mas elas são muito raras. Apesar disso, vamos listá-las aqui para você ter uma noção quando alguém mencionar: vasoespasmo, embolia coro- nária, vasculites, causas não coronaria- nas como anemia e sepse. 14SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 4. QUADRO CLÍNICO Os sintomas decorrentes da síndro- me coronariana aguda decorrem do desbalanço entre oferta e demanda de oxigênio quanto ao miocárdio, ge- rando um cenário propício para a is- quemia, uma vez que diante da do- ença aterosclerótica, ocorre disfunção endotelial, reduzindo a vasodilatação que ocorreria para compensar o au- mento da demando por oxigênio, dada a obstrução ocorrida. Diante disso, o sintoma preponderante des- se quadro consiste na dor precor- dial, também chamada de angina, geralmente descrita como sensação em aperto no tórax, restroesternal, de início súbito, aos mínimos esforços ou MAPA MENTAL EPIDEMIOLOGIA E FATORES DE RISCO SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Modificáveis: Dislipidemia Hipertensão Diabetes Síndrome metabólica Tabagismo Sedentarismo Obesidade Etilismo 550 mil eventos por ano Impacto econômico Perda de qualidade de vida Grandes gastos no Sistema de Saúde Lesões incapacitantes Fatores de risco Não modificáveis: Sexo masculino Idade Histórico familiar de Doença Aterosclerótica 15SÍNDROME CORONARIANA AGUDA em repouso, sem relação com esfor- ço prévio, piorando em situações de exercício e estresse e melhorando um pouco ao repouso e, como vere- mos adiante, com a administração de nitrato. Pode ser descrita a irradia- ção dessa para o epigástrio, cérvice, mandíbula, dorso e membro supe- rior esquerdo, sendo que é comum a sensação de parestesia nesse último. O paciente geralmente não associará a dor aos movimentos respiratórios e não indicará um ponto específico do- loroso. Isso porque a dor isquêmica consiste em uma dor visceral, a qual não envia sinais neurológicos de dor localizada, mas sim de dor difusa. SAIBA MAIS: Muitas vezes o paciente se apresentará com claro desconforto corporal, podendo estar leve- mente curvado devido à dor anginosa e com o punho na região do coração. Essa condição postural do paciente configura o chamado sinal de Levine. SE LIGA! É importante que a dor seja bem investigada, uma vez que a angi- na decorrente da síndrome coronariana aguda é, como o próprio nome diz, agu- da. Diante disso, o paciente não relatará dor recorrente, mas episódio que ocorrer há um curto espaço de tempo, geral- mente entre 20 e 30 minutos. SE LIGA! Pacientes mais velho e dia- béticos podem não apresentar qua- dro típico da doença, sem a presença de desconforto torácico, uma vez que, principalmente nos diabéticos, ocorre um quadro de denervação, decorrente da neuropatia diabética. Tais pacientes apresentarão o chamado equivalente anginoso ou isquêmico, que consis- te na apresentação de sintomas como sudorese, mal-estar súbito, dispneia, náusea etc (sintomas que podem es- tar presentes com a angina em outros pacientes com síndrome coronariana aguda), sendo mais comum em mulhe- res, idosos e diabéticos, como já men- cionado. Desse modo, deve-se ter aten- ção redobrada caso esses pacientes se apresentem na emergência com queixa de vertigem, dispneia, sudorese, náuse- as, vômitos, arritmias ventriculares e até mesmo hipotensão. 16SÍNDROME CORONARIANA AGUDA B4, pela diminuição da complacência do ventrículo esquerdo, ou ainda B3, caso haja disfunção ventricular. So- pros serão auscultados somente nos casos em que a isquemia acometer os músculos papilares, que será evi- denciado pela presença de sopro ca- racterístico de insuficiência mitral. O paciente com esse quadro pode- rá se apresentar claramente ansioso e desconfortável, podendo também sofrer de taquicardia, dispneia, vômi- tos ou náuseas, bem como elevação da pressão arterial sistêmica. A aus- culta cardíaca pode variar, podendo estar dentro dos índices de normali- dade, ou ainda revelar a presença de SAIBA MAIS! Pacientes que chegam na emergência com quadro de SCA, podem apresentar sinais e sinto- mas típicos de insuficiência cardíaca, sendo que a estratificação e classificação desses é feita por meio da Escala de Killip, cujo grau aumenta conforme pior for o prognóstico. A classifica- ção de Killip segue na tabela abaixo: PARÂMETROS CLASSE RISCO DE ÓBITO (%) Sem sinais de insuficiência cardíaca I 2-3 Insuficiência cardíaca discreta (estertores nas bases e presença de terceira bulha) II 8-10 Edema agudo e pulmão III 20-25 Choque cardiogênico IV 45-70 Tabela 2. Escala de Killip (Diretriz IAM com supra, SBC) que causam dor torácica poderem ser benignos, existem doenças que se manifestam com quadros de do- res no peito que podem culminar na morte do paciente, sendo que o tra- tamento de uma pode ser o inverso do utilizado em um diagnóstico dife- rencial. Um exemplo disso, é a dis- secção aguda de aorta, que consiste em um dos diagnósticos diferenciais de dor torácica, sendo que, se o pa- ciente for tratado para SCA, aumen- ta-se a possibilidade de óbito, dado É muito importante que a história e o raciocínio clínico sejam feitos de ma- neira coerente (não só nesse caso, como na vida!), mas especifica-se isso no caso daSCA, pois, como é de conhecimento de todos, a dor to- rácica não é patognomônica de Sín- drome Coronariana Aguda. Desse modo, deve-se rastrear achados e dados da anamnese e do exame fí- sico que guiem o raciocínio clínico na direção certa. Isso porque, apesar de muitos acometimentos patológicos 17SÍNDROME CORONARIANA AGUDA que o risco de sangramento desse aumentará exponencialmente. Justa- mente por isso, a dor e a história clíni- ca do paciente devem ser claramente analisadas. Para auxiliar na hora do raciocínio, tenham em mente os pos- síveis diagnósticos diferenciais de dor torácica, bem como a correspondente etiologia, os quais estão evidenciados na tabela a seguir: DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DA DOR TORÁCICA CARDIOVASCULARES PULMONAR E MEDIASTINAL MUSCULOESQUELÉTICA E NEUROLÓGICA TRATO GASTROINTESTINAL Insuficiência coronária (crônica e aguda) Tromboembolismo pulmonar Síndrome do desfiladeiro torácico Espasmo esofagiano Pericardite Pneumonia Costocondrite aguda Doença do refluxo gastroesofágico Miocardite Pleurite Trauma Gastrite Valvopatia aórtica Pneumotórax Herpes Zoster Doença ulcerosa Dissecção aguda de aorta Mediastinite Ansiedade Distensão hepática Timite Pancreatite Cólica biliar Infarto esplênico Tabela 3. Diagnósticos diferenciais da dor torácica (Clínica Médica, USP) Os sinais vitais do paciente devem ser monitorados com atenção, obser- vando o surgimento de hipo ou hi- pertensão, uma vez que em casos de acometimento extenso do miocárdio, pode ocorrer a manifestação de sinais e sintomas de insuficiência cardíaca, como dispneia, pressão venosa cen- tral elevada, bem como a evolução para choque cardiogênico aliado à hipotensão e vasoconstrição, que po- derá ser suspeitada pelas extremida- des frias ao toque. 5. SEGUIMENTO Uma vez iniciados os sintomas do paciente, o tempo entre a tomada de decisão de procurar o serviço de emergência e a chegada nesse ge- ralmente é demorado, especialmen- te no que concerne pacientes idosos, do sexo feminino e de baixa condição socioeconômica. Havendo a possibi- lidade e a disponibilidade da realiza- ção de um eletrocardiograma (ECG) anteriormente à chegada ao serviço de emergência, esse deve ser feito de imediato, uma vez que a identifi- cação do supradesnivelamento do 18SÍNDROME CORONARIANA AGUDA segmento ST poderá ser utilizado para encaminhar o paciente para o atendimento prioritário. SE LIGA! Uma coisa muito importante quanto ao seguimento e ao tratamento da SCA é que podemos estar diante de uma artéria ocluída, a qual está geran- do necrose miocárdica. Sendo assim, o atendimento, bem como os exames essenciais devem ser feitos o quanto antes. Por isso, a frase mais importante que se deve ter quando se fala de SCA, é: TEMPO É MÚSCULO! Chegando ao serviço, todo paciente que levante suspeita para SCA deve realizar um ECG em até dez minu- tos desde a sua chegada. A realiza- ção desse é fundamental, pois, além de ser um divisor de águas quanto à classificação, revela a situação da perfusão cardíaca, bem como iden- tifica maior ou menor gravidade do quadro, podendo configurar situação de urgência. Ao realizar o exame, de- verá ser observado se existe supra de ST em alguma derivação e, na ausência desse, procura-se achados diferenciais como o infra do mesmo segmento eletrocardiográfico. Re- lembrando, o supra de ST é tão grave porque ele consiste no sinal elétrico de um coração cujo ramo coronário esteja obstruído por completo (ge- ralmente), configurando o chamado infarto com supra de ST. A ausên- cia desse, mesmo que a presença de infra de ST, quando compatível com a SCA, configura dois possíveis qua- dros: o infarto sem supra de ST e a angina instável. SAIBA MAIS! As alterações eletrocardiográficas que podem estar presentes diante de um IAMSST consis- tem na presença de onda T apiculada, em segundos ou minutos após o início do quadro. Em até trinta minutos, ocorre o supradesnivelamento do segmento ST, com a elevação do ponto J, evidenciando oclusão arterial total. A partir de 6 horas, o segmento ST começa a cair, junto com o aparecimento da onda Q patológica, revelando uma área eletricamente inativa, repre- sentativa de necrose. Para além de 24 horas, o segmento ST continua caindo, cursando com inversão de onda T. Cerca de após uma semana do evento, observa-se a permanência da onda Q, a qual não irá desaparecer, configurando uma “cicatriz eletrocardiográfica” da necro- se, e da onda T invertida, a qual pode desaparecer após alguns meses. Segundos ou minutos Até 30 minutos A partir de 6 horas > 24 horas Após 1 semana aproximadamente FIgura 9. Evolução do ECG no IAMSST (Sanarflix) 19SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SE LIGA! É importante ter em men- te que, devido aos campos do coração evidenciados pelas derivações do ECG, existem imagens recíprocas ou em es- pelho. Isso pode ser explicado por meio de um exemplo. Supondo que um ele- trocardiograma de um paciente eviden- cie um infarto por meio do supra de ST de derivações anteriores, as derivações que se localizam no extremo oposto en- xergarão esse evento como um infra de ST, como pode ser observado da ima- gem abaixo: FIgura 10. Relações entre as derivações no IAMSST (Sanarflix) Ainda falando sobre o ECG no caso de IAMSST, o supradesnivelamen- to de ST pode ser caracterizado pela elevação do ponto J em ao menos 1 mm em derivações contíguas (deriva- ções sequenciais). A exceção a essa regra são as derivações V2 e V3, cujo critério para a identificação de supra de ST é um pouco diferente. Nelas, o supradesnivelamento do segmen- to ST se dá por meio da elevação do segmento J acima de 1,5 mm para mulheres, e para homens esse valor aumenta para 2 mm, naqueles com mais de 40 anos, e para 2,5 mm para aqueles com menos de 40 anos. É importante frisar que a ocorrência de bloqueio de ramo esquerdo novo ou considerado novo deve ser caracteri- zado como supradesnivelamento do segmento ST. 20SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Figura 11. ECG evidenciando supra de ST. ECG evidenciando IAM em parede anterolateral. As derivações DI, aVL, V2 a V6 demonstram o supradesnivelamento do segmento ST, com o recíproco infradesnivelamento pelas “visão espelha- da” das derivações II, III e aVF.(Cecil, Essential of Medicine, Elsevier) Figura 12. ECG evidenciando infra de ST. Observa-se que o infradesnível se estende por toda a parede anterior (V2 a V6, DI e aVL) sugerindo a presença de uma obstrução crítica proximal em artéria descendente anterior. CONSIDERAR A TÉCNICA NORMALIZADA (Clínica Médica, USP) 21SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SE LIGA! Vale lembrar que o infarto sem supra de ST pode apresentar si- nais eletrocardiográficos característicos do infarto subendocárdico, que são o infradesnivelamento do segmento ST e inversão de onda T, que sinalizam alte- rações elétricas decorrentes da isque- mia subendocárdica. CONCEITO! A angina instável pode ser definida como uma dor precordial prolongada de início súbito, durando mais de vinte minutos em repouso, bem como ser a evolução de um quadro de episódios recentes e recorrentes de dor torácica aos mínimos esforços, podendo também ser decorrente da piora de uma angina estável prévia. É importante que, além da identifica- ção do supradesnivelamento de ST, saibamos também identificar a por- ção miocárdica acometida, de acordo com a derivação que apresenta o su- pra de ST. Identificada a derivação ou as derivações, passamos a observar os planos em que cada uma delas en- xerga a atividade elétrica do coração, de modo que possamos inferir a re- gião isquêmica. De um modo geral, a região inferior é registrada por DII, DIII e aVF; a região lateral, por DI, aVL, V5 e V6; e a anterior, pelas derivações de V1 a V4. Junto a isso, deve-se ter em mente a artéria responsável por irri- gar cada um dos campos, a fim de tra- çar uma possível anatomia da lesão. Como guia, podem ser utilizadas a imagem e a tabela a seguir, lembran- do que a compreensãoda localização das derivações e os campos por elas registrados é muito importante, a fim de evitarmos a simples memorização. Figura 13. Posicionamento das derivações do ECG (Sanarflix) DERIVAÇÕES LOCALIZAÇÃO ARTÉRIA DII, DIII, aVF Inferior Coronária Direita V1, V2, V3 e V4 Anterior Diagonal V1, V2, V3, V4, V5 e V6 Anterior Extenso Coronária Esquerda V5, V6, DI e aVL Lateral Circunflexa V3R, V4R, V1 Ventrículo Direito Coronária Direita V7, V8 Lateral Coronária Direita Tabela 4. Derivações e paredes acometidas 22SÍNDROME CORONARIANA AGUDA É importante colocarmos aqui que a identificação de supra de ST em pa- rede inferior requer derivações ele- trocardiográficas auxiliares, uma vez que faz-se necessária a investigação dos campos relativos, principalmente, à coronária direita, responsável ma- joritária pela irrigação do ventrículo direito. Assim, adiciona-se ao exame as derivações V3R e V4R, cujas po- sições são as mesmas de V3 e V4, porém à direita. Também são inse- ridas as derivações posteriores, V7, V8 e V9, à esquerda, cuja indicação é a mesma, sendo que a inserção de cada uma dessas derivações auxilia- res requer o registro na folha do exa- me, a fim de explicitar o que foi feito, evitando possíveis confusões. Além do eletrocardiograma, deve-se realizar um acesso venoso calibro- so no paciente. Isso porque medica- ções necessitarão ser administradas e exames deverão ser colhidos. No momento de sua chegada, devem ser dosados os níveis séricos dos mar- cadores de necrose do miocárdio. O mais específico utilizado é a tro- ponina, que consiste em um marca- dor biológico de lesão e de necrose miocárdica, tendo os seus níveis san- guíneos aumentados quando de um acometimento ao músculo cardíaco. Essa substância possui uma cinéti- ca quanto à sua elevação, sendo que o início do aumento é percebido no sangue após 3 horas do início da dor anginosa, com um pico atingido entre Figura 14. IAMSST de parede anterior extensa. Observa-se a presença de supradesnivelamento do segmento ST nas derivações de V2 a V6, bem como em DI e aVL, configurando um IAMSST de parede anterior extensa. Observe tam- bém a visão espelhada das derivações inferiores, como visto DII, DIII e aVF. Diante disso, a provável artéria acometida, é a descendente anterior, responsável pela irrigação da parede citada. (Sanarflix) 23SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 18 e 24 horas, podendo persistir por até 10 dias em níveis elevados na corrente sanguínea do paciente. Figura 15. Marcadores de necrose miocárdica. Cinética dos marcadores de lesão miocárdica no sangue periférico. Após um infarto agudo do miocárdio, a detecção periférica da CKMB e troponina é quase simultânea. O decaimento da CKMB, no entanto, é bem mais rápido, principalmente quando há reperfusão do miocárdio. A troponina tende a manter-se elevada por até 10 dias nas lesões mais extensas do músculo cardíaco. A mioglobina é o mais precoce dos marcadores cardíacos, porém, sua baixa especificidade limita sua utilização na prática clínica. (Clínica Médica, USP) Desde 2010, os ensaios ultrassensí- veis aumentaram a confiabilidade da dosagem de troponinas para iden- tificar quadros de IAM, mas ao cus- to de, como consequência, ocorrer a redução da sua especificidade, au- mentando o número de falsos posi- tivos. Diante disso, é importante que para refinar a busca, ao buscar pelos níveis de troponina no sangue, esses devem ser explicitamente quantitati- vos e não categóricos, de modo que o valor possa ser avaliado, sendo con- siderado indicativo de infarto quan- do esse estiver acima do percentil 99. Ou seja, quando comparado com uma população sem patologias rela- cionadas ao IAM, 99% dessa popu- lação apresentará níveis de troponina menores que o os que são evidencia- dos pelos pacientes com infarto. Jus- tamente por isso, é importante que a mensuração da troponina seja re- alizada juntamente com uma clínica sugestiva ou característica de doença isquêmica miocárdica, dado que às vezes essa dosagem pode vir dentro de valores limítrofes, os quais podem ser confundidos com os diagnósti- cos diferenciais para a elevação da troponina. 24SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SE LIGA! Cabe ressaltar que a troponi- na consiste em um marcador específi- co para o coração, mas deve-se ter em mente que a sua elevação não é espe- cífica do IAM, uma vez que outras pa- tologias podem causar elevação dos ní- veis séricos dessa proteína, dentre eles, temos os principais diagnósticos dife- renciais: insuficiência cardíaca, doença real crônica, taquiarritmias, miocardites, tromboembolismo pulmonar, sepse e dissecção de aorta. No cenário de níveis de troponina du- vidosos, bem como nos quais o pa- ciente chega antes de três horas do início do quadro, pode-se realizar a dosagem seriada de troponina, ou simplesmente o que se chama de colher a troponina em tempo há- bil. O motivo do uso da expressão “tempo hábil” consiste no fato de que, como já vimos, a elevação da troponi- na não ocorre de imediato, podendo demorar até três horas após o início do quadro de isquemia para que isso ocorra. Diante disso, deve-se colher a dosagem de troponina do paciente a cada uma ou duas horas, observando a curva da concentração dessa prote- ína. A elevação da dosagem maior do que 20% do valor inicialmente colhido é altamente sugestiva de infarto, indi- cando o chamado valor em crescen- te, configurando quadro compatível com a síndrome coronariana aguda. Figura 16. Gráfico evolução da troponina (Sanarflix) 25SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Outra possibilidade consiste no pa- drão de elevação do tipo platô, o qual é caracterizado por um aumento me- nor do que 20% do inicial quando da segunda coleta de troponina, o qual está relacionado aos diagnósticos di- ferenciais que podem cursar com ele- vação dos níveis séricos de troponina já listados anteriormente. Figura 16. Gráfico Troponinas em platô (Sanarflix) 26SÍNDROME CORONARIANA AGUDA MAPA MENTAL: SEGUIMENTO SCA ECG em até 10min PACIENTE COM DOR TIPICAMENTE ANGINOSA Buscar causas secundáriasIAMSSST PlatôCrescente Dosagem seriada DuvidosoElevadaNormal após tempo hábil Angina instável Dosagem de troponina Inversão de onda TInfra de ST Sem supra de STCom supra de ST Identificar parede e artéria possivelmente acometidas Possível acometimento de VD? Realizar V3R, V4R, V7, V8 e V9 IAMSST 27SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 6. DIAGNÓSTICO O diagnóstico da Síndrome Corona- riana Aguda é feito diante de um ce- nário clínico compatível. As suas sub- divisões, como já discutimos, incluem os infartos com e sem supra e a angi- na instável. Logo, para o diagnóstico é fundamental que esses três sejam di- ferenciados, dado que o prognóstico e a gravidade de cada um desses dife- rem. O IAM é definido pela presença de lesão miocárdica, a qual é eviden- ciada por níveis séricos de troponina acima do percentil 99, acompanha- da de isquemia miocárdica aguda, e é caracterizada pela presença de ao menos um dos seguintes fatores: sintomas característicos de isquemia (angina ou equivalente isquêmico), alterações eletrocardiográficas típi- cas (supra ou infra de ST, inversão de onda T ou onda Q patológica), altera- ção de imagem, como ecocardiogra- ma ou ressonância magnética, reve- lando área hipocinética (diminuição da mobilidade segmentar) nova ou cateterismo cardíaco com evidência de trombose coronariana. Ainda pode ser utilizado como critério o achado de trombo coronário quando da rea- lização da autópsia. 28SÍNDROME CORONARIANA AGUDA DOR ANGINOSA APRESENTAÇÃO MECANISMO DA DOENÇA Diminuição do suprimento sanguíneo (Predominantemente não trombótico) Síndrome Coronariana Aguda ECG TROPONINA MANIFESTAÇÃO TARDIA AO ECG DIAGNÓSTICO Placa não trombótica Trombo parcialmente oclusivo Trombo totalmente oclusivo PLACA PLACA PLACA Ausência de supra de ST Ausência de supra de ST Presença de supra de ST Sem elevação Angina instável IAMSSST Comelevação Sem elevação Angina instável Mediada por trombo IAMSSST IAMSST Com elevação Com elevação Sem supra de ST na Síndrome Coronariana Aguda Sem onda Q Sem onda Q Com onda Q Espectro patológico e clínico quanto à elevação (IAMSST) ou não (IAMSSST) do segmento ST na Síndrome Coronariana aguda Adaptação New England Journal of Medicine, 2017 ARTÉRIA ARTÉRIA ARTÉRIA TROMBO TROMBO Figura 17. Classificação da SCA (New England Journal of Medicine, 2017) 29SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Dada a heterogeneidade dos grupos que se enquadram em síndromes is- quêmicas sem supra de ST (IAM sem supra e angina instável), faz-se ne- cessária a estratificação de risco des- ses pacientes, a qual pode ser realiza- da principalmente pelos escores TIMI, que pontuará o paciente de acordo com os seus critérios, classificando-o como de risco baixo (0 a 2 pontos), in- termediário (3 a 4 pontos) e alto (5 a 7 pontos). ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO – ESCORE DE TIMI Idade > 65 anos 1 ≥ 3 fatores de risco 1 Lesão coronariana ≥ 50% 1 Uso de AAS < 7 dias 1 2 crises de angina < 24 horas 1 Desvio de ST ≥ 0,5 mm 1 marcador de necrose 1 0-7 Figura 18. Escore TIMI (Diretriz IAM, SBC) O diagnóstico do IAMSST é, aliado à clínica compatível, eminentemente eletrocardiográfico, não necessitando que seja aguardada a dosagem sérica da troponina, uma vez que essa pode demorar a se elevar (lembre-se de que TEMPO É MÚSCULO!). Sendo assim, a presença do supradesnive- lamento do segmento ST é suficien- te para que o paciente seja elencado como de tratamento urgente. SE LIGA! Apesar do supra de ST ser critério diagnóstico para IAMSST, nem todo supradesnivelamento é caracte- rístico de infarto com supra, sendo ne- cessária a observação dos diagnósticos diferenciais para tal achado ao ECG, os quais podem ser observados na tabela a seguir: DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS QUANTO AO SUPRA DE ST PATOLOGIA ACHADO AO ECG Pericardite Aguda Supra difuso + Infra de PR + Complexos de baixa voltagem Sobrecargas do ventrículo esquerdo Sinal de Sokolov + Padrão de Strain + desvio do eixo cardíaco para esquerda e para cima Bloqueio de ramo esquerdo (não considerado novo) QRS largo (> 120 ms) + QRS negativo em V1 Repolarização precoce Paciente com menos de 50 anos sem + ST/T < 0,25 + ausência de imagem elé- trica espelhada + ausência de evolução temporal Dissecção aguda de aorta (Com dissecção de óstio coronariano) Assimetria de pulso e de PA + Sopro diastólico aspirativo (insuficiência aórtica) + déficit neuroló- gico agudo Tabela 4. Tabela diagnósticos diferenciais do supra de ST 30SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Pode também ser utilizado o score de GRACE, o qual é mais complexo, pon- tuando em mais quesitos e de forma mais refinada. O seu uso pode ser fei- to a partir de calculadoras facilmente disponíveis para dispositivos eletrôni- cos, sendo que ao utilizá-la, os pontos atribuídos ao paciente o classificação em faixas de risco que influenciarão quanto ao tratamento do paciente, sendo baixo risco (menor do que 108 pontos), médio risco (109 a 140 pon- tos) e alto risco (maior ou igual a 141 pontos). ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO - GRACE Idade (anos) 0-100 Frequência cardíaca 0-46 PA sistólica (mmHg) 58-0 Creatinina (mg/dl) 1-28 ICC (Killip) 0-59 PCR da admissão 39 Desvio de ST 28 Elevação dos marcadores de necrose 1-327 Risco Pontos % Morte hospitalar Baixo 1-108 < 1 Intermediário 109-140 1-3 Alto > 140 > 3 Tabela 5. Escore GRACE (Diretriz IAM, SBC) 31SÍNDROME CORONARIANA AGUDA MAPA MENTAL: DIAGNÓSTICO SCA IAMSST PACIENTE COM DOR TIPICAMENTE ANGINOSA Eletrocardiograma Infra de ST Inversão de onda T Com supra de ST Paciente urgente Terapia de reperfusão Sem supra de ST Troponina Colhida em tempo hábil Elevadas Sem elevação IAMSSST Angina instável Estratificação de risco TIMI GRACE 32SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 7. MEDIDAS INICIAIS E TRATAMENTO PRECOCE O tratamento inicial da síndrome co- ronariana aguda inclui repouso com monitoramento via ECG e pronta te- rapia antitrombótica. A dor anginosa deve ser tratada com morfina, salvo nos casos de hipotensão, sendo que administração de nitroglicerina su- blingual é indicada inicialmente para o alívio do desconforto isquêmico, por meio da dilatação arterial coronaria- na, podendo ser seguido por terapia intravenosa para o desconforto is- quêmico em curso, insuficiência car- díaca congestiva ou hipertensão não controlada. A abordagem com betabloqueado- res é controversa, mas de modo ge- ral é favorável, com início do trata- mento nas primeiras 24 horas após a admissão. A administração via oral costuma ser segura, sendo a terapia intravenosa preconizada para os ca- sos não controlados de hipertensão. O uso dessa classe de fármacos deve ser evitado em casos de risco de cho- que cardiogênico, evidenciados por hipotensão e déficits do ventrículo di- reito, associados principalmente com queda do retorno venoso, o que dimi- nui a pré-carga do ventrículo direito. O início ou a continuação de terapia com estatinas leva a efeitos pleiotró- picos, bem como à redução dos ní- veis séricos de colesterol, resultando em melhorias nos desfechos cardio- vasculares a longo prazo. Essas de- vem ser iniciadas em até 24 horas do início do quadro, devendo ser toma- das pelo paciente continuamente, em dose máxima. O uso de IECA e de BRA possuem um papel relevante no tratamento da síndrome coronariana aguda, es- pecialmente nos casos em que o pa- ciente possui IAM prévio, disfunção ventricular ou insuficiência cardíaca. Na ausência de contraindicações, a terapia deve ter início dentro de 24 horas após a admissão. Uma vez realizada essas medidas ge- rais, deve-se ter em mente os princi- pais passos a serem seguidos diante de um paciente com dor torácica com clínica sugestiva de Síndrome Coro- nariana, os quais são resumidos por meio do quadro abaixo: 33SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SEIS PASSOS INICIAIS NO MANEJO DE PACIENTES COM DOR TORÁCICA E COM SUSPEITA DE SCA 1. Triagem diagnóstica de SCA por meio da anamnese, exame físico, ECG e teste de marcadores de necrose miocárdica; 2. Classificação quanto ao risco de morte cardiovascular ou de isquemia recorrente por meio dos achados ao ECG, troponina e escores GRACE ou TIMI; 3. Iniciar cuidados gerais: repouso, ácido acetilsalicílico, nitroglicerina e estatinas, considerando a administra- ção de oxigênio, betabloqueadores e morfina; 4. Escolher a estratégia terapêutica adequada para o quadro e a situação na qual o paciente se encontra; 5. Escolher um segundo agente antiplaquetário para ser administrado junto do AAS, como um inibidor de P2Y12, de acordo com o risco de trombose do paciente, tempo até a realização da terapia de reperfusão, possível necessidade de cirurgia posterior e risco de sangramento; 6. Escolher um agente anticoagulante (enoxaparina, heparina não fracionada ou fondaparinux) de acordo com a estratégia de reperfusão e risco de sangramento. Tabela 6: Seis passos iniciais no manejo de pacientes com dor torácica sugestiva de SCA (Adaptado de New England Journal of Medicine, 2017) MAPA MENTAL: MEDIDAS GERAIS SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Dor anginosa Estatinas BetabloqueadoresIECA/BRA Doses máximas Em até 24h Contínuo Em até 24h Maior benefício se: IAM prévio Disfunção ventricular Insuficiência Cardíaca Evitar se: Acometimento de VD Choque Hipotensão Morfina Nitroglicerina Salvo se sinais de choque ou acometimento de VD Sublingual Intravenosa Hipotensão não controlada Insuficiência cardíaca Em até 24h 34SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 8. TRATAMENTO DA SÍNDROME CORONARIANA AGUDA COM SUPRA DE ST A identificação de um IAMSST requer, como necessidade urgente, a terapia de reperfusão, caso os sintomas te- nham começado a menos de 12 horas. É importante que a decisão seja toma- da rapidamente, a fim de evitar a pro- gressão da isquemia miocárdica (lem- bre-se de que TEMPO É MÚSCULO!). A reperfusãomiocárdica pode ser feita por meio do procedimento per- cutâneo, via cateterismo, ou por via farmacológica, fazendo o uso de fi- brinolíticos. E para decidir entre essas duas opções da melhor forma possí- vel, deve-se ter em mente o conceito de tempo porta-balão. CONCEITO! O tempo porta-balão con- siste no tempo da entrada do paciente no serviço até o balonamento via cateter da artéria coronariana. Caso o paciente consiga ser encami- nhado para a sala de hemodinâmica do hospital para realizar o cateteris- mo em até 90 minutos após a sua chegada no serviço de emergência, deve-se optar pela realização da an- gioplastia primária. Caso o hospital em questão não pos- sua serviço de hemodinâmica, mas o paciente pode ser transferido para um outro centro de saúde que o tenha, deve-se optar pela angioplastia no caso de o tempo porta-balão para esse paciente, incluindo a sua trans- ferência para o serviço especializado, for de até 120 minutos. Caso não haja a possibilidade de cumprir com esses intervalos temporais, é recomendada a terapia fibrinolítica para o paciente, devendo ser seguida a consideração de transferência em um período de 3 a 24 horas para um centro com servi- ço de hemodinâmica. SE LIGA! Essa tomada de decisão não é algo que deve ser feito no momento. De- ve-se já ter em mente as condições do local em que se trabalha para avaliar se um paciente, ao ser diagnosticado com IAMSST deve ser transferido do pronto ou não. A angioplastia primária consiste em um tratamento superior à terapia fibri- nolítica, uma vez que estudos demons- tram que ela traz consigo menores ín- dices de mortalidade, reinfarto e AVC. É a melhor opção para aqueles que cumprem os critérios quanto ao tempo porta-balão, bem como para aqueles que sofreram choque cardiogênico, independentemente de critérios tem- porais. O procedimento consiste na in- serção de um cateter por meio de uma entrada arterial. Guia-se o dispositivo até o ponto coronariano acometido, in- fla-se um balão, a fim de desobstruir a artéria, e firma-se a abertura do vaso com um stent, que impede a retração elástica do vaso pós-balonamento. 35SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SAIBA MAIS! Stents são basicamente malhas metálicas que são inseridas na luz arterial e que permitem a patência do vaso. Artéria Femoral Cateter guia Artéria Radial Artéria Braquial Fio guia no interior da artéria coronária esquerda Figura 19. Acesso percutâneo (Netter’s Cardiology, 2nd ed., Elsevier, 2010) 36SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Primeiramente, o fio guia coronariano avança para além da placa aterosclerótica que obstrui o fluxo coronariano Passa-se um cateter de duplo lúmen sobre o fio guia. Esse balão é inflado, de modo a comprimir a placa e desobstruir a artéria Um cateter balão contendo o stent é colocado na região previamente dilatada Infla-se o balão, de modo a instalar o stent Uma vez instalado o stent, o cateter e o fio guia são removidos Figura 20. Procedimento percutâneo de reperfusão (Netter’s Cardiology, 2nd ed., Elsevier, 2010) 37SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SAIBA MAIS! Para acessar a rede arterial do paciente, existem as opções de entrada pela artéria femoral ou pela artéria radial. Esse último é considerado prioritário, uma vez que está relacionado a menores índices de sangramento local e, por consequência, a menor tempo de procedimento. Ele é preconizado para ambos os tipos de IAM, sendo associado à redução dos índices de eventos adversos em até 30 dias, uma vez que há a diminuição do número de mortes e de sangramentos mais graves. Para a colocação do stent, existem opções quanto ao tipo farmacológi- co e não farmacológico. O stent far- macológico é recoberto por drogas anti-proliferativas, como paclitaxel, reduzindo a possibilidade de prolife- ração endotelial no interior do stent, de modo a reduzir as taxas de rees- tenose (nova aterosclerose no inte- rior do stent) e, por consequência, diminui a necessidade de novas in- tervenções posteriores. Porém, essa classe está associada ao aumento do risco de trombose, principalmen- te quanto aos stents farmacológicos de primeira geração. Por outro lado, o stent convencional tem como benefí- cio a diminuição do tempo requerido de anti-agregação plaquetária, dado que o risco de trombose é menor. Logo, deve-se avaliar a condição do paciente, seu prognóstico e sua his- tória prévia para, dentro das possibi- lidades, escolher entre o melhor stent para ele. Apesar dessas caracterís- ticas, ressalta-se que em termos de mortalidade, ambos os dispositivos são equivalentes. SAIBA MAIS! Os stents farmacológicos de segunda geração possuem um papel dominante na angioplas- tia coronariana primária, com sólida melhora quanto aos desfechos cardiovasculares quando comparados com os de primeira geração, reduzindo as chances de trombose. Stents farma- cológicos de cromo e de cobalto possuem maior segurança e eficácia, apresentando redução quanto aos índices de mortes por causas cardiovasculares, IAM e trombose quando compa- rados com os puramente metálicos. Quando da realização do cateterismo, ao se localizar lesões arteriais além daquela relacionada à artéria culpada pelo evento, essas também podem ser reparadas, caso o paciente esteja estável hemodinamicamente, poden- do também as lesões acessórias se- rem corrigidas futuramente. 38SÍNDROME CORONARIANA AGUDA A aspiração do trombo não possui efeitos significantes quanto ao risco de morte por causas cardiovascu- lares, IAM ou insuficiência cardíaca severa dentro de 180 dias quando comparada à angioplastia convencio- nal. Junto a isso, ensaios clínicos de- monstraram que o uso dessa técnica aumentou o risco de AVC dentro de 30 dias nos pacientes que a ela são submetidos. Nos casos em que não seja possível cumprir os requisitos do tempo por- ta-balão, deve-se proceder com a terapia fibrinolítica. O ideal é que o tempo de chegada até a punção ve- nosa para iniciar o tratamento (tempo porta-agulha) seja menor do que 30 minutos, sendo o ideal em até 10 mi- nutos. Reiterando a necessidade de urgência do tratamento, o benefício é maior quando a terapia tem o seu início em até 2 horas a partir do iní- cio do quadro (quanto mais precoce, melhor), uma vez que com o passar do tempo, a organização do trombo, bem como a sua firmação, reduz a capacidade do agente fibrinolítico de dissolver esse trombo. A fibrinólise pode ser feita com o uso da streptoquinase (SK), administran- do-se 1,5 milhões de UI entre 30 e 60 minutos. Ela possui efeitos colaterais alérgicos, como urticária e hipotensão e, além disso, ela já não é mais tão utilizada. O tratamento é feito majoritariamente com os novos fibrinolíticos, que apre- sentam melhores resultados, dado que são fibrinoespecíficos. Um deles é a alteplase (Tpa), que deve ser ad- ministrada em uma dose de 15 mg em bolus, seguida de manutenção de 0,75 mg/kg após 30 minutos e de 0,5 mg/kg após 60 minutos da primeira dose de manutenção, de modo que o tratamento dura uma hora e meia. É Figura 21. Resultado de cateterismo de IAM inferior. Cinecoronariografia de artéria coronária direita de um IAMSST inferior. A imagem à direita revela oclusão total da artéria coronária direita. A imagem à esquerda demonstra a reper- fusão do fluxo sanguíneo após 90 minutos da realização do cateterismo. (Cecil Essentials of Medicine, 9th ed., Elsevier, 2016) 39SÍNDROME CORONARIANA AGUDA importante ressaltar que a dose total não pode ultrapassar o valor de 100 mg. Pode-se utilizar também a tenec- teplase (TNK), sendo administrada em uma dose única de 0,5 mg/kg em bolus, que não deve ultrapassar 50 mg no total. No caso do paciente pos- suir mais de 75 anos, a dose deve ser reduzida pela metade. SE LIGA! Uma vez que a TNK não pre- cisa de uma dose de manutenção, tem- -se que a sua administração é mais fácil. Isso é relevante na medida em que for possível realizar a fibrinólise no meio ex- tra-hospitalar, como ocorreem alguns países da Europa, em que, diante da presença de um supra de ST, no próprio transporte de emergência é administra- do o fibrinolítico durante o caminho até o hospital. SE LIGA! Diante dos melhores resulta- dos, é recomendado que sejam utiliza- dos os fibrinolíticos fibrinoespecíficos. Ou seja: preconiza-se o uso de tPA e de TNK. Devemos nos atentar para as con- traindicações quanto à terapia fibri- nolítica, as quais possuem enfoque principalmente no tocante a AVCs hemorrágicos. As contraindicações absolutas e relativas são listadas na tabela a seguir: TERAPIA FIBRINOLÍTICA CONTRAINDICAÇÃO ABSOLUTA CONTRAINDICAÇÃO RELATIVA Qualquer hemorragia cerebral prévia História de Hipertensão crônica grave e não controlada Lesão vascular cerebral conhecida PAS > 180 / PAD > 110 mmHg apesar do alívio da dor Neoplasia intracraniana (primária ou metastática) AVC isquêmico > 3 meses e outras doenças cerebrais sem contraindicação absoluta AVC isquêmico < 3 meses (exceto < 3 horas) Uso de anticoagulantes cumarínicos Traumatismo craniano ou facial significativo < 3 meses Trauma recente ou cirurgia de grande porte nas últi- mas 3 semanas Sangramento interno ativo (exceto menstruação) Reanimação cardiopulmonar traumática ou prolonga- da (> 10 minutos) Suspeita de dissecção de aorta Punção vascular não compressível Doenças da coagulação Sangramento interno recente (2 a 4 semanas) Redução da expectativa de vida (coma, sepse, neoplasia) Úlcera péptica ativa Tabela 7. Tabela de contraindicações à fibrinólise (Clínica Médica, USP, 2ª ed., Manole, 2014) 40SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Uma vez realizada uma das terapias fibrinolíticas, deve-se ficar atento para o aparecimento dos Critérios de Reperfusão entre 60 a 90 minutos após o tratamento. O primeiro critério é eletrocardiográfico, consistindo na redução de, pelo menos, 30 a 50% do supra de ST, devendo ter como referência a derivação que apresen- tava a maior elevação do segmento ST. O segundo critério é sintomático e consiste na melhora da dor referida pelo paciente. Em caso positivo, ado- ta-se a estratégia farmacoinvasiva, na qual, após a fibrinólise, o paciente deve ser encaminhado para o catete- rismo dentre 2 a 24 horas, uma vez que se sabe que o fibrinolítico pode não ser capaz de desobstruir com- pletamente a artéria do paciente, de modo que esse necessitará de uma angioplastia. Nos casos em que não forem satisfeitos os critérios de reper- fusão, o paciente é classificado como urgente, devendo ser submetido a uma angioplastia de resgate. SE LIGA! É importante lembrar que, nos casos em que o paciente não responder à terapia fibrinolítica, essa NÃO deve ser repetida em hipótese alguma, dado o alto risco de sangramento. Ou seja: o tratamento fibrinolítico não funcionou? O paciente DEVE ir para o serviço de he- modinâmica o quanto antes (lembre-se de que TEMPO É MÚSCULO!). SAIBA MAIS! Um possível achado eletrocardiográfico quando da reperfusão miocárdica pós-fibrinólise é o ritmo idioventricular acelerado (RIVA), que consiste na observação de um complexo QRS largo, com frequência mais alta do que a observada nos escapes ventriculares e menor do que a que ocorre nos casos de taquicardia ventricular. A sua identificação é um indicativo de possível sucesso da terapia fibrinolítica, sendo transitório. Assim, não fazem-se necessárias intervenções para reverter a situação do achado (nem cardioversão e nem amiodarona), uma vez que esse sinal desaparecerá em alguns minutos, sem repercussões hemodinâmicas para o paciente. 41SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Junto a todo esse tratamento de re- perfusão, como medida inicial, a dor anginosa deve ser tratada, a fim de diminuir o tônus simpático, o qual é capaz de gerar mais estresse ao co- ração que já está acometido. Para isso, administra-se dinitrato de isos- sorbida sublingual (Isordil) na dose de 5mg para alívio do desconforto isquêmico, uma vez que esse fárma- co atuará proporcionando a dilatação dos vasos coronarianos, de modo a dar certo alívio à dor causada pela isquemia. Pode-se utilizar também a nitroglicerina, 10 mcg/min, por via endovenosa em bomba de infusão contínua. Junto a isso, deve ser ad- ministrada morfina como analgésico para controle adicional da dor, de 2 a 8 mg, via endovenosa, podendo ser Figura 22. ECG evidenciando RIVA repetida em 5 a 15 minutos, salvo a existência de contraindicações. SE LIGA! Os nitratos são contraindica- dos nos casos em que o paciente apre- sentar hipotensão, infarto de ventrículo direito e quando esse faz uso de inibido- res de fosfodiesterase, como sildenafila e tadafila, nas últimas 48 horas. SE LIGA! ATENÇÃO! Cuidado para não se confundir com os nomes! Não se deve utilizar o nitroprussiato de sódio, uma vez que ele causa uma vasodilata- ção difusa, que pode causar o fenômeno chamado de “roubo de fluxo” por meio da dilatação de vasos arteriais que não precisariam ser dilatados, não priorizan- do as regiões acometidas. 42SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SE LIGA! A morfina NÃO deve ser utili- zada nos casos de IAMSST relacionados ao ventrículo direito, uma vez que a hi- potensão que esse fármaco pode gerar acabaria por colapsar a ação do coração direito, o qual depende de volume (re- torno venoso) para o seu funcionamen- to, podendo levar o paciente ao choque cardiogênico, dada a hipotensão profun- da. Além disso, deve-se atentar para o uso de inibidores de P2Y12, uma vez que ela pode reduzir os efeitos desses fármacos em alguns pacientes. Além da terapia de reperfusão, os pa- cientes com IAMSST requerem tam- bém terapias adicionais que auxiliam na abertura das artérias. Para isso, são prescritos antiagregantes pla- quetários, cujo objetivo consiste na diminuição da formação do trombo branco, bem como na diminuição do risco de trombose no stent. Adminis- tra-se, portanto, ácido acetilsalicílico (AAS) pelo resto da vida do paciente. Inicialmente, dá-se uma dose de ata- que entre 162 e 325 mg mastigados, com manutenção diária de 75 a 100 mg/dia. É importante que todos os pacientes com IAMSST façam o uso da aspirina, uma vez que ele possui significativo efeito quanto ao des- fecho de morte. A única exceção ao uso de AAS consiste na presença de úlcera gástrica ativa e histórico de reação anafilática prévia quando do uso desse fármaco. Casos de alergia leve, como urticária, não contraindi- cam o seu uso, devendo ser prescrita medicação anti-histamínica para o controle de sintomas adversos. A dupla anti-agregação plaquetária é completada pelo uso de inibidores do receptor de P2Y12, cujo uso deve ser feito por um ano. Uma das opções de escolha é o clopidogrel, sendo que pacientes que passaram pela angio- plastia primária devem receber dose de ataque de 600 mg, com manu- tenção de 75 mg/dia via oral. Caso o paciente tenha passado pela fibrinóli- se, a dose diminui pelo risco de san- gramento. O ataque é feito com 300 mg, com manutenção de 75 mg/dia. Porém, caso o paciente tenha mais de 75 anos, não se deve realizar a dose de ataque, pelo risco elevado de sangramento. Uma outra opção é o ticagrelor, que possui uma melhor estabilidade quanto fármaco em com- paração com o clopidogrel, no tocante à anti-agregação plena. Porém, esse fármaco só deve ser utilizado nos ca- sos em que o paciente foi submetido à angioplastia primária, não devendo ser utilizado nos casos após a tera- pia fibrinolítica. Realiza-se a dose de ataque de 180 mg, com manutenção de 90 mg, a cada 12 horas, via oral. Tem-se ainda a opção do prasugrel, que, assim como o ticagrelor, só deve ser utilizado nos casos de angioplas- tia primária. Nesse caso, a dose de ataque é de 60 mg, com manutenção de 10 mg/dia, via oral. Caso o pacien- te possua mais de 75 anos ou me- nos de 60 kg, a manutenção deve ser 43SÍNDROME CORONARIANA AGUDA de 5 mg ao dia. Cabe ressaltar que o prasugrel possui maior risco de san- gramento intracraniano, sendo o seu uso contraindicado noscasos de AVC prévio. Como opção de anti-agregantes pla- quetários, pode-se fazer o uso de inibidores da glicoproteína IIb/IIIa, cujo uso é mais restrito e infrequente. São administradas por via endoveno- sa, em bomba de infusão contínua. A prescrição dessas drogas é geral- mente feita pelo próprio hemodinami- cista, que irá indicar o uso nos casos de identificação de grande quanti- dade de trombos no cateterismo, ou ainda quando não há fluxo arterial coronariano, mesmo quando o balão é insuflado na coronária obliterada. Os fármacos geralmente utilizados nesses casos são o tirofibana e o abciximab. SE LIGA! Vamos deixar bem claro que a terapia de anti-agregação plaquetária é geralmente dupla, sendo feita de prefe- rência com AAS junto a um inibidor de P2Y12. Os inibidores da glicoproteína IIb/IIIa não devem ser a primeira escolha de uso. Junto a isso, deve ser feita a terapia anticoagulante, cujo objetivo é preve- nir a formação do trombo vermelho, dissolvendo a trombina. O fármaco mais utilizado é a enoxaparina, que tem usos distintos a depender da te- rapia de reperfusão realizada, mas em ambos os casos a administração de ataque é feita por via endovenosa e a de manutenção, por via subcutâ- nea. Nos casos de fibrinólise, admi- nistra-se uma dose de ataque de 30 UI, com manutenção de 1 mg/kg a cada 12 horas. Caso o paciente pos- sua mais de 75 anos, não deve ser realizada dose de ataque. Agora, se o paciente passou pela angioplastia primária, realiza-se o ataque de 0,5 mg/kg, sendo geralmente realizada pelo próprio hemodinamicista, com manutenção semelhante à situação de fibrinólise. A terapia anticoagulan- te deve ser realizada por um período de até oito dias, até a alta do paciente, ou até a realização da angioplastia, o que ocorrer primeiro. SE LIGA! Algumas correções quanto à posologia devem ser feitas em casos especiais, relacionados às condições do paciente. Caso esse possua um ritmo de filtração glomerular menor do que 30 ml/ min, a manutenção deve ser de 1 mg/kg, via subcutânea, uma vez ao dia. Caso o paciente possua mais de 75 anos, a manutenção deve ser de 0,75mg/kg, via subcutânea, a cada 12 horas. A segunda opção de anticoagulante é a heparina não fracionada (HNF), que é mais complicada quanto à sua utilização, pois é administrada em bomba de infusão contínua. Uma vez que o paciente tenha passado pela fibrinólise, realiza-se o ataque de 60 UI/kg via endovenosa, sendo 44SÍNDROME CORONARIANA AGUDA o máximo de 4000 UI administradas. A manutenção é feita com 12 UI/kg, com o TTPa mantido entre 50 e 70 segundos. Na angioplastia primária, o ataque é realizado pelo hemodi- namicista, administrando-se de 70 a 100 UI/kg, via endovenosa, sendo a manutenção igual aos casos de fibri- nólise. A HNF deve ser utilizada até a angioplastia ou por até 48 horas, o que ocorrer primeiro. SE LIGA! Se o paciente passou por fi- brinólise com SK, deve-se utilizar o fon- daparinux como anticoagulante. Assim, realiza-se o ataque de 2,5 mg, por via subcutânea, com manutenção igual, uma vez ao dia, pela mesma via. O uso de oxigenoterapia só se mostra benéfico para pacientes cuja satura- ção se encontra abaixo de 90%, ou para aqueles cuja gasometria arterial acusou pressão parcial de oxigênio menor do que 60 mmHg. Betabloqueadores podem ser utiliza- dos, possuindo benefício de médio a longo prazo, devendo ser iniciados em até 24 horas. Caso o paciente possua fração de ejeção do ventrículo direito reduzida (menor do que 40%), pre- conizam-se betabloqueadores com benefícios quanto à mortalidade, que são: carvedilol, bisoprolol e succinato de metoprolol. Esses fármacos são contraindicados nos casos de choque cardiogênico, insuficiência cardíaca descompensada e bradiarritmias. SE LIGA! É bem intuitivo pensar que no caso de um paciente com SCA chegar no pronto atendimento com taquicardia sinusal, que o ideal nessa situação seja o uso de betabloqueadores para abaixar a frequência cardíaca. Porém, deve-se lembrar que a taquicardia pode consis- tir em uma resposta fisiológica a alguma situação, dentre elas, o choque cardio- gênico. Sendo assim, caso seja adminis- trado um betabloqueador, pode ser que o paciente fique demasiadamente hipo- tenso, agravando mais ainda o seu qua- dro hemodinâmico. Por isso, é importan- te ter em mente que não há necessidade de uso imediato de betabloqueadores, podendo aguardar a estabilização do quadro para o início de sua administra- ção, em até 24 horas. IECA e BRA também podem ser uti- lizados, sendo que, caso seja ade- quado, a terapia com esses fármacos deve ser iniciada em até 24 horas. Os pacientes que se beneficiam do uso dessa classe de drogas não aqueles com fração de ejeção do ventrículo esquerdo menor do que 40%, diabé- ticos ou hipertensos. SE LIGA! Dado o mecanismo de atuação desses fármacos, IECA e BRA NUNCA devem ser administrados em conjunto! Ou é um, ou é outro. Os antagonistas de aldosterona, como a espironolactona, devem ser utilizados quando já se faz o uso de IECA ou BRA junto com um betablo- queador, diante do cenário de fração 45SÍNDROME CORONARIANA AGUDA de ejeção do ventrículo esquerdo me- nor do que 40%, com apresentação de insuficiência cardíaca ou diabetes mellitus. Porém, esses fármacos não são utilizados no tratamento inicial, sendo avaliada a necessidade do seu uso em momentos oportunos. É importante o uso de estatinas de alta potência, dado o seu benefício de re- duzir infartos, por meio da estabiliza- ção das placas ateromatosas. Sendo assim, faz-se o uso de atorvastatina de 40 a 80 mg, ou de rosuvastatina de 20 a 40 mg. É importante que seja observado o alvo de LDL do pacien- te diante do uso desses fármacos, o qual deve ser menor do que 50 mg/ dL. 46SÍNDROME CORONARIANA AGUDA TRATAMENTO IAMSST Cateterismo se tempo porta-balão < 90 min IAMSST Se tempo para transferência para centro capacitado < 120 min Se tempo para transferência para centro capacitado > 120 min, e tempo porta-agulha < 30 min Paciente em hospital com serviço de hemodinâmica Paciente em hospital sem serviço de hemodinâmica Iniciar dupla antiagregação plaquetária AAS 325mg 1x, 81mg diários. Inibidor de P2Y12 (clopidogrel, prasugrel ou ticagrelor). Anticoagulantes: enoxaparina ou HNF Transferência de urgência para serviço de hemodinâmica Administração de fibrinolítico: Streptoquinase, Alteplase, Ou Tecenteplase Angiografia confere com a terapia adotada Angioplastia: iniciar ou continuar antiplaquetários e anticoagulantes Alta e cuidados pós- hospitalares: AAS 81mg contínuo Inibidor de P2Y12 por 1 ano Após angioplastia: clopidogrel, ticagrelor ou prasugrel Pré ou pós-fibrinólise: clopidogrel Critérios de reperfusão: Diminuição do supra de ST. Melhora da dor anginosa. RIVA NÃO Encaminhar para o cateterismo entre 3 e 24 horas SIM 47SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 9. TRATAMENTO DA SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SEM SUPRA DE ST Uma vez diagnosticada a Síndrome Coronariana Aguda, o paciente deve receber de imediato antiagregantes plaquetários, a fim de inibir a forma- ção do trombo branco. Dessa forma, administra-se ácido acetilsalicílico (AAS) em dose de ataque (200 a 300 mg), devendo ser mastigados, com posterior dose de manutenção entre 75 e 100 mg ao dia, para o resto da vida do paciente. É realizada a dupla anti-agregação por meio da adminis- tração de um inibidor de P2Y12, ge- ralmente o clopidogrel, em dose de ataque de 300 mg, com manutenção de 75 mg por dia, durante um ano. Podem ser utilizados no lugar do clo- pidogrel, o ticagrelor (ataque de 180 mg e manutenção de 90 mg) e o pra- sugrel (ataque de 60 mg e manuten- ção de 10 mg). SE LIGA! O prasugrel só deve ser admi- nistrado após haver o conhecimento da anatomia da lesão do paciente. Ou seja, somente após o cateterismo. Isso porque o prasugrel possui melhor performance em pacientes que fazem angioplastia, com colocação de stent. Nos pacientesque não realizam tal procedimento ou naqueles que são submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio, esse fármaco aumenta o risco de sangramen- to, o qual supera os seus benefícios. SE LIGA! O ticagrelor, quando disponí- vel, pode ser preferido para administra- ção ao paciente em SCA sem supra, uma vez que há uma maior resposta desses a esse fármaco, diferente do que ocorre com o clopidogrel no tocante à farmaco- dinâmica (metabolização), prejudicando a anti-agregação. Como a principal queixa do paciente com SCA é a dor anginosa, o alívio dessa faz-se necessário para a tran- quilização e bem-estar do paciente, bem como para que a colaboração desse para com o tratamento seja adequada. Para tal, pode ser admi- nistrada morfina para o controle da dor e nitratos, cujas indicações e con- traindicações já foram vistas no trata- mento de IAMSST. Dado que um dos sintomas da SCA é a dispneia, a oxigenoterapia pode ser benéfica. A suplementação com oxigênio deve ser feita nos casos em que o paciente apresenta sinais de hipoxemia, seja com a saturação me- nor do que 90% ou pela pressão de oxigênio menor do que 60 mmHg na gasometria arterial. Os anticoagulantes devem ser admi- nistrados a fim de evitar a formação do trombo vermelho, resultante da agregação de hemácias. Nos casos de pacientes com SCA sem supra, a primeira opção consiste na enoxapa- rina, devendo ser aplicada por via subcutânea, 1 mg/kg a cada 12 horas. 48SÍNDROME CORONARIANA AGUDA Ela dever ser administrada até a reali- zação da angioplastia, ou até a alta do paciente ou por até oito dias (impor- tante frisar aqui a questão do “ou”, de modo que o evento que ocorrer pri- meiro é suficiente para a interrupção da administração do medicamento). SE LIGA! Existem certas situações que requerem a correção da posologia da heparina. Dentre elas, caso o paciente possua um ritmo de filtração glomeru- lar menor do que 30 ml/min, a posologia cai pela metade, indo para 1 mg/kg uma vez ao dia, somente. Nos casos em que o paciente possuir mais de 75 anos, de- ve-se administrar 0,75 mg/kg a cada 12 horas. Pode ser utilizada a heparina não fra- cionada, mas o seu manejo é mais complicado quando comparado à enoxaparina. Ela deve ser administra- da em bomba de infusão contínua, via endovenosa, com ataque de 60 UI/ kg sendo máximo de 5000 UI, com manutenção de 12 UI/kg, mantendo o TTPa (tempo de protrombina) en- tre 50 e 70 segundos. Esse fármaco pode ser utilizado até a angioplastia ou por até 48 horas, o que ocorrer primeiro. O fondaparinux é utilizado principal- mente para pacientes com alto risco de sangramento, devendo ser admi- nistrado por via subcutânea, 2,5 mg, uma vez ao dia. Em até 24 horas após o início do tra- tamento devem ser administrados fármacos que melhoram o desfecho quanto ao remodelamento e quan- to à sobrevida a longo prazo, como estatinas de alta potência em dose máxima, betabloqueadores e vasodi- latadores, como inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) e bloqueadores do receptor de angio- tensina (BRA), principalmente para aqueles cujas sequelas contemplam fração de ejeção reduzida (menor do que 40%). 49SÍNDROME CORONARIANA AGUDA ABORDAGENS FARMACOLÓGICAS NA SCA COM E SEM SUPRA DE ST ALVO TERAPÊUTICO INTERVENÇÃO Desbalanço entre oferta e demanda de oxigênio para o miocárdio Oxigenoterapia: administrar oxigênio somente se a satura do paciente for menor do que 90% Analgésicos: morfina intravenosa (de 1 a 5 mg, podendo ser repetida dentro de 5 a 30 minutos, se necessário) pode ser resolutiva para o quadro de dor isquêmica Nitrato: administração de nitroglicerina sublingual (0,3 a 0,4mg, podendo ser repetida em 5 minutos, por até duas vezes, se necessário) para a dor isquêmica e nitroglicerina parenteral para dor persistente, insuficiência cardíaca ou hipertensão Betabloqueadores: deve ser iniciada medicação via oral nas primeiras 24h, caso não haja insuficiência cardíaca, baixo débito, risco de choque ou outra contraindicação Bloqueadores de cal de cálcio: devem ser utilizados nos casos de isquemia persis- tente, quando os betabloqueadores não foram efetivos ou são contraindicados Trombo coronariano Terapia antiplaquetária: administração de ácido acetilsalicílico (162 a 325 mg em dose de ataque com posterior manutenção de 81 a 325 mg ao dia, indefinidamen- te) e inibidores de P2Y12 Terapia anticoagulante: administração de algum agente anticoagulante intravenoso (enoxaparina ou HNF) para todos os pacientes, independentemente da estratégia terapêutica Placa Instável ou doen- ça aterosclerótica em progressão Estatinas: iniciar ou continuar estatinas em alta dosagem (40 a 80 mg de atorvas- tatina ou 20 a 40 mg de rosuvastatina, da admissão e então, diariamente) para o manejo da colesterolemia IECA: devem ser iniciados em todos os pacientes com fração de ejeção do ventrí- culo esquerdo, bem como naqueles com hipertensão, diabetes mellitus ou doença renal crônica. Também podem ser resolutivos em outros pacientes com patologias cardiovasculares. Tabela 8. Abordagens farmacológicas na SCA com e sem supra de ST (New England Journal of Medicine, 2017) Pacientes classificados pelos escores mencionados como de alto risco, de- vem seguir para cateterismo cardía- co, enquanto os de baixo risco podem ser submetidos a exames para estra- tificação não invasivos, como o Eco estresse, cintilografia e teste ergomé- trico, podendo ser prescrito para esse paciente somente AAS e estatinas. Pacientes com risco intermediário podem seguir para ambas as estraté- gias, devendo ser internados, sendo que a escolha deverá partir do con- senso do médico com o paciente, avaliando qual desses se encaixará melhor para a correta avaliação do quadro do paciente. 50SÍNDROME CORONARIANA AGUDA SAIBA MAIS! Talvez lendo esse material você tenha ficado com dúvida, uma vez que tenha se lembrado das cirurgias de ponte de safena, ou revascularização do miocárdio, e não viu tal procedi- mento dentre as medidas de tratamento. Isso ocorre porque essa cirurgia não cabe para tra- tar pacientes urgentes, dado o seu grau de complexidade e relativa demora, a depender do grau de acometimento e da quantidade de pontes arteriais a serem colocadas. Diante disso, a cirurgia é indicada para pacientes estáveis, sendo que os mais beneficiados por ela são aqueles com acometimento obstrutivo com ao menos 70% de oclusão em pelo menos três ramos coronarianos (sendo chamados triarteriais), ou pacientes biarteriais e diabéticos, bem como aqueles com disfunção ventricular. Também podem ser encaminhados para a cirurgia aqueles pacientes que apresentam sintomatologia grave a despeito do máximo emprego de tratamento farmacológico. TRATAMENTO IAMSSST Cateterismo: Em até 2h: de alto risco Entre 12 e 24h: de risco intermediário Em até 72h: baixo risco IAMSSST Dupla antiagregação plaquetária: AAS 325mg 1x, 81mg diários Inibidor de P2Y12 (clopidogrel ou ticagrelor) Anticoagulantes: HNF, enoxaparina ou fondaparinux Angiografia condiz com a terapia adotada Angioplastia primária: iniciar ou continuar terapias antiplaquetárias e anticoagulantes Alta e cuidados pós-hospitalares: AAS 81mg ad eternum Inibidor de P2Y12 por 1 ano Após angioplastia: clopidogrel, ticagrelor ou prasugrel 51SÍNDROME CORONARIANA AGUDA 10. COMPLICAÇÕES MECÂNICAS PÓS-INFARTO As complicações mecânicas consis- tem em uma alteração da anatomia normal do coração, decorrentes dos déficits espaciais gerados pela necro- se. Essas complicações são sempre acompanhadas por choque cardiogê- nico, que consiste em um quadro de hipoperfusão gerado por baixo débi- to cardíaco, dado o acometimento da plena capacidade do coração em su- prir as demandas do organismo. Logo, é bem intuitivo que alterações graves como essas sejam mais relacionadas ao IAMSST (IAM transmural). Apesar dessa gravidade, felizmente somente cerca de 1% de todos os in- fartos evoluem para tal situação. Po- rém,
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