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5 Modificacoes Fisiologicas da Gravidez

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Obstetrícia - Prof. Dr. Ailton Marchi 
04/2020 
 
Modificações Fisiológicas da Gravidez 
O entendimento dos mecanismos de adaptação da gravidez constitui uma parte importante do cuidado 
obstétrico. Essa compreensão fundamenta a correta avaliação das principais queixas e achados clínicos 
característicos do período, dessa maneira, é possível distinguir o que é ​comum/fisiológico​ do que é ​patológico​. 
As modificações são temporárias e envolvem todos os sistemas da mãe. 
 
Postura e deambulação 
As mudanças ocorrem de acordo com o crescimento do útero (e do feto) e das 
mamas. 
Desvio do centro de gravidade da frente. Para que isso não faça que a paciente caia, 
ocorrem as seguintes alterações: 
● lordose acentuada 
● aumento da base de sustentação afastando os pés 
Maior mobilidade articular: sacroilíaca e sínfise púbica devido ao fenômeno de 
embebição articular. 
Esses fenômenos conferem à mulher, principalmente no final da gravidez, um andar 
muito típica, com os pés afastados e “balançando”, chamada de ​marcha anserina​. 
 
Metabolismo glicídico 
O feto precisa de glicose de uma maneira contínua e constante, extraindo-a independente do jejum materno. É 
um dos únicos substratos que o feto consegue retirar e usar. 
A grávida preserva a glicose à custa da utilização de lipídios e de ácidos graxos - ocorre desde o início da 
gravidez. No final da gravidez, ocorre um aumento da resistência à insulina nos tecidos periféricos para 
preservar a glicose para o concepto (pode ocorrer um hiperinsulinismo pós prandial). 
● níveis glicêmicos 15-20 mg/dL inferiores aos observados antes da gravidez - em qualquer período da 
gravidez 
O gradiente de concentração entre a mãe e o feto é pequeno, a glicose é transportada da mãe para o feto por 
difusão facilitada. 
 
Metabolismo lipídico 
O acúmulo lipídico na gordura corpórea da grávida está associado à hiperfagia. Ela precisa de mais calorias e 
lipídios para manter o aporte de glicose do feto. 
A placenta é impermeável aos lipídios, exceto aos AGL e aos corpos cetônicos (jejum materno prolongado 
grave - feto pode usar corpo cetônicos). 
⅔ iniciais da gravidez​: Aumento nos depósitos de gordura maternos decorrente da lipogênese aumentada. 
➔ hiperfagia e aumento dos depósitos de gordura 
⅓ final da gravidez​: Aumento da atividade lipídica do tecido adiposo eleva a liberação de AGL e glicerol. 
Ocorrendo uma​ hiperlipidemia gestacional​ (aumento da fração VLDL - lipoproteína de baixa densidade). 
➔ lipólise das lipases teciduais e quebra da gordura 
➔ Metabolismo hepático: glicerídeos e AGL da lipólise são utilizados para gliconeogênese. 
 
Metabolismo hidroeletrolítico 
Aumento da taxa de filtração glomerular em torno de 50% → faz com que haja ​depleção de sódio​. Dessa 
maneira, será necessário um mecanismo de conservação de sódio, aí entra a ​ativação do sistema 
 
 
renina-angiotensina-aldosterona​ [ocorre por meio de ativação do aparelho justaglomerular]→ maior secreção 
de aldosterona pela supra renal. 
● hiperaldosteronismo secundário da gravidez 
O aumento da aldosterona e a consequente retenção de sódio gera aumento da retenção hídrica. 
 
 
Consequências da retenção hídrica​: 
● redução da Hb e hematócrito 
● diminuição da concentração de albumina - diminui um pouco a osmolaridade do plasma 
● > aumento do débito cardíaco < (devido ao aumento do volume sistólico) 
● elevação do fluxo plasmático renal 
● edema periférico, principalmente MMII 
 
Alterações hemodinâmicas 
Desde o começo da gravidez, ocorre um aumento 
do volume plasmático. esse aumento atinge o 
pico em torno da 28ª semana. Depois, este se 
mantém estável até o fim da gestação. 
O volume de hemácias só começa a aumentar em 
torno da 10ª e não é tão intenso, atingindo seu 
ápice em torno da 32ª semana e se mantém 
estável. 
O aumento do volume plasmático é rápido e 
acentuado, enquanto que o aumento do volume 
de hemácias é lento e menos abrupto. Ambos 
aumentos levam ao aumento do volume de 
sangue total, o que leva a aumento do débito 
cardíaco - pico em torno da 30ª semana e depois se mantém estável. Ao final da gestação, o DC é cerca de 50% 
maior do que no início/antes da gravidez. 
No puerpério imediato (primeiras horas após o parto) tem um aumento abrupto, em torno de 70-80% do valor 
basal - pela contração uterina, esse sangue é deslocado para o compartimento sistêmico. Isso é importante para 
paciente que não têm bom trabalho vascular, pois há 2 momentos de possível descompensação: em torno da 
28ª/30ª semana e no puerpério imediato. Se a grávida não descompensou no primeiro momento, provavelmente 
 
ela não vai descompensar nas próximas semanas, mesmo tendo cardiopatia, mas ela corre risco novamente no 
puerpério imediato. 
 
RESUMINHOS 
● Aumento do volume sanguíneo 
○ eleva-se precocemente e de forma contínua 
○ cerca de 40% acima dos valores pré-gravídicos 
○ pico 28-32 semanas 
○ estabiliza até termo 
● Débito cardíaco 
○ eleva-se 30-50% 
○ pico 28-32 sem 
○ no puerpério ocorre aumento do DC decorrente do fenômeno de autotransfusão (= decorrente da 
diminuição rápida do tamanho do útero, o volume sanguíneo que ali continha é despejado quase 
que imediatamente para o volume circulatório, o que vai aumentar o DC) 
○ fatores fisiológicos para que isso ocorra: 
■ aumento do VS cerca de 40% 
■ FC aumenta 10-20% 
■ melhor performance do VE (relacionado à produção hormonal) 
● Pressão arterial 
○ relacionado a resistência vascular periférica 
■ efeito vasodilatador da progesterona 
■ circulação placentária de baixa resistência 
■ refratariedade a ação da angiotensina (ação da prostaciclina e dos fatores de crescimento 
endotelial) !! fator mais importante 
○ no ​primeiro trimestre​, assemelha-se aos valores pré-gravídicos 
○ no​ segundo trimestre​, ocorre uma queda acentuada 
■ queda leve da PA sistólica e acentuada da PA diastólica 
○ no ​terceiro trimestre​, volta aos valores pré-gravídicos 
○ posição do útero (ou seja, do corpo da grávida) altera PA: 
■ decúbito dorsal horizontal - compressão da VCI = Síndrome da Hipotensão Supina 
● pode sofrer sensação de desmaio, lipotímia 
● pode ocorrer até em pé 
■ decúbito lateral esquerdo - o útero vai para a esquerda e a VCI sofre menor pressão 
uterina, melhorando o retorno venoso 
● durante o trabalho de parto ou em repouso pode ser orientada essa posição 
○ aumento da pressão venosa - sobrecarga do útero sobre a VCI → aumento de 3x em MMII 
■ aumento de estase que favore fenômenos tromboembólicos, principalmente em mulheres 
com varizes prévias 
■ orientar essas mulheres a fazer exercícios físicos para que a panturrilha faça papel de 
bomba 
■ esse aumento da pressão favorece o aparecimento de varizes e hemorróida. 
 
Fatores responsáveis pelas alterações hemodinâmicas 
● retenção hídrica e aumento do volume globular; 
● aumento do volume sanguíneo total; 
○ aumento do volume sanguíneo total > aumento do volume globular = grávida fica hemodiluída 
 
● derivação de baixa resistência criada pela placenta; 
○ o desvio do sangue para a placenta é caracterizado por um regime de baixa pressão 
● diminuição da resistência vascular periférica - mecanismo de contrapartida para compensar o aumento 
do volume (DC = RVP x VS) 
○ ação de hormônios vasodilatadores → produzidos pela placenta (prostaciclinas - antagonizam a 
ação da angiotensina) 
○ vasos com refratariedade da ação da angiotensina 
● aumento do DC; 
● compressão da VCI pelo útero gravídico - alterações de retorno venoso pelo aumento da pressão venosa. 
 
Sistema circulatório: ​sintomas gerais 
● sensação de dispnéia (devido ao maior consumo de oxigênio e discreta taquicardia) 
○ dispnéia discreta é normal, mas no caso de dispnéia acentuada, como a dispnéia paroxística 
noturna, associada a ganho de peso, edema generalizado, investiga 
● diminuição da tolerância aos exercícios 
○ manter a prática de exercícios físicos, mas de maneira mais leve 
● taquicardia 
● 
● alterações na ausculta cardíaca - sopro fisiológicos 
 
Modificaçõeshematológicas 
Aumento da massa eritrocitária 
● eleva-se 20-30%elevação mais lenta que o aumento volume plasmático 
● hemodiluição fisiológica 
○ anemia quando Hb <10 mg/dL 
Leucócitos 
● aumentados na gestação, parto e pós-parto 
● 12.000-25.000 mL → no extremo superior suspeitar, mas até 15 mil é tolerável 
● desvio à esquerda é patológico !! 
● discreta leucocitose é tolerável 
Plaquetas 
● trombocitopenia fisiológica durante a gravidez, principalmente no final 
○ se no início tem 200.00 cél/mL, no final pode haver 80.000 cél/mL sem causar fenômeno 
hemorrágico 
● hipercoagulabilidade intrínseca 
○ aumento de fatores de coagulação e, principalmente, de fibrinogênio 
○ fator protetor para hemorragia, principalmente, pós parto 
○ fator de risco para fenômenos tromboembólicos - principalmente em grávidas, acamadas, 
sedentárias 
 
Sistema digestivo: ​ganho de peso 
● aumento da massa corporal (lipogênese, aumento do número de adipócitos) 
● expansão volêmica 
● aporte calórico adicional (+200-300 Kcal/dia) 
● aumento de 20% do peso ideal para a altura 
● ganho de peso ideal: + 6-12 kg 
 
○ um ganho de peso menor que o ideal (dieta/ restrição alimentar) - disponibilização de corpos 
cetônicos para o feto (cérebro só usa glicose, desenvolvimento neurológico afetado) 
○ um ganho muito grande de peso dificulta o parto. 
 
Sistema respiratório 
Trato respiratório superior 
● hiperemia 
● congestão [nasal, principalmente] 
● tendência a epistaxe espontânea devido à rica vascularização 
● predisposição de infecções (sinusite) - devido a congestão local, tratamento com ATB 
Aumento geral do trabalho respiratório​: dispnéia - tolerável quando leve 
Trato respiratório inferior 
● aumento da pressão abdominal 
● diafragma dica 4 cm empurrado superiormente 
○ devido ao aumento da pressão intra abdominal e do útero gravídico 
○ a incursão diafragmática, apesar desse descolamento pra cima, melhora durante a gravidez 
devido ao aumento do perímetro torácico em 5-7 cm 
● diâmetro transverso do tórax aumenta 2 cm 
● diminui: 
○ capacidade residual funcional (ar que fica dentro do pulmão em expiração profunda) 
■ paciente tabagista importante, asmática, tem risco de descompensação, pois já tem 
capacidade residual funcional prévia (crise asmática em obstetrícia é emergência) 
○ volume expiratório de reserva (ar que é expirado quando é forçada a expiração) 
● capacidade vital é mantida, pois a o volume corrente aumenta 30-40% (compensando as diminuições 
acima) 
● hiperventilação causado pela progesterona 
○ aumento do volume corrente - faz com que a capacidade vital fique mantida 
● FR não se altera 
 
 
 
 
Sistema renal 
● rins 
● aumentam de volume 
○ aumento do volume intersticial 
○ aumento do fluxo sanguíneo 
● deslocamento dos rins pelo crescimento uterino - colabora para aumento da pressão abdominal 
● dilatação calicial pélvica e ureteral devido a: 
○ compressão uterina extrínseca mais no ureter direito que esquerda 
○ ação da progesterona gera hipomotilidade e hipotonia sobre a musculatura lisa do ureter 
● os fenômenos acima causam estase urinária 
○ facilita ITU (infecção do trato urinário) e mobilização de cálculos renais 
● bexiga 
○ incontinência urinária na gravidez 
■ inicialmente, o útero gravídico faz uma compressão direta no teto da bexiga 
■ redução da resposta contrátil do colo vesical durante a gravidez 
■ diminuição do suporte pélvico da parede anterior e da uretra 
 
Sistema endócrino 
Tireóide 
● aumenta de tamanho 
● elevação de HCG acentuado no início da gestação 
○ ação tireotrófica imediata do HCG atua no 
aumento de T4 total e na produção de TBG 
● elevação de tireoglobulina e de T4 total 
● discreto aumento de T4 livre no início da gestação 
○ como há aumento de T4 e da proteína carreadora 
junto, o aumento de T4 livre é discreto 
● TSH 
○ decréscimo no início da gravidez - devido ao 
aumento de T4 livre 
○ após o período de ação do HCG/T4 livre, o TSH 
volta aos valores normais 
○ melhor marcador da função tireoidiana durante a gestação ! 
○ se o TSH estiver > 2,5 mg/dL (1º trimestre), > 4 mg/dL (2º, 3º trimestre), investigar 
hipotireoidismo → causa de muitas malformações fetais. 
 
Pele 
Pigmentação ​aumentada devido ao aumento de estrogênio e progesterona no(a): 
● mamilo (aréola primária e secundária) 
● axilas 
● períneo → fica vermelho arroxeado, se estende até o interior da vagina 
○ sinal de Jacquemier Kluge 
● linha mediana do abdome → linha nigra 
Vascularização​: eritema palmar e telangiectasias por ação do estrogênio (pode ocorrer em toda a pele) 
● em gravidez avançada, pode haver um dermografismo (pressiona a pele e a região fica clara, logo em 
seguida fica normal) 
 
Estrias​: ocorrem devido ao estiramento das fibras colágenas - relacionado ao ganho ponderal de peso, dieta 
pobre em proteína e rica em açúcar refinado, produtos ultraprocessados; gravidez gemelar, bebês 
macrossômicos. Ocorre no (a): 
● abdome 
● mamas 
● quadril 
Estria atual roxa e larga, estria antiga é perolada e estreita 
 
Sistema genital 
Útero 
● alterações mais acentuadas 
● o útero aumenta durante a gravidez cerca de 20 vezes 
○ hipertrofia da camada muscular 
○ hiperplasia do tecido conectivo 
● o volume da cavidade uterina aumenta cerca de 500x (início: 10 mL, 
final: 5L) 
● é difícil fazer o diagnóstico clínico de gravidez antes de 12 semanas, 
pois é quando é possível palpar o útero - não é mais muito usado 
● depois de 12 semanas, quando o útero já é palpável, usa-se a regra 
clínica: altura uterina (vai da sínfise púbica até o fundo uterino) deve 
aumentar 1 cm/ semana 
○ atinge cerca de 35 cm do fundo à sínfise púbica 
● para diagnosticar a gravidez nas 2 primeiras semanas: amolecimento do colo uterina (consistência de 
cartilagem nasal → consistência de lábio) = ​regra/ sinal de Goodell 
● o amolecimento ocorre em todo o útero, em torno da 10ª semana é possível perceber o amolecimento do 
istmo uterino no exame de toque = ​sinal de Hegar 
● assimetria do corpo uterino devido a nidação do feto em uma das paredes = ​sinal de Piskacek 
 
Corpo 
● aumento do número de fibras musculares inicialmente por hiperplasia, depois por hipertrofia 
● parte contrátil do útero - importante para a progressão do trabalho do parto 
 
Istmo 
● não é bem definida anatomicamente e durante a gravidez é chamado de segmento inferior - vai do 
orifício interno do colo uterino até transição entre istmo e o colo uterino (anel de Bandl) 
● fica muito visível porque se distende - permite o trânsito do concepto no canal do parto 
 
Colo uterino 
● vai do orifício interno até o externo 
● comprido (3cm durante a gestação) e resistente para conter o feto 
○ no trabalho de parto sofre encurtamento 
● durante a gestação ele sofre embebição gravídica e vai de 
dilatando - pontes de colágeno são destruídas pela ação da 
prostaglandina 
● processo de amolecimento é acentuado durante o trabalho de parto 
- contrações 
 
● contém um tampão mucoso que é desprendido durante o trabalho de parto (aspecto de clara de ovo) - 
impede a entrada de bactérias e espermatozóides 
● trabalho de parto em primigesta: 
○ 1º encurtamento: abertura do colo que começa no orifício interno que se desloca até o externo 
(promovido pelas contrações uterinas nas 2 semanas que antecedem o parto) 
○ 2º dilatação: afastamento das paredes do colo (do orifício externo) 
 
 Corpo uterino 
● a musculatura uterina tem formato helicoidal 
● quando ocorrem contrações, a intensidade é maior no fundo uterino que na região 
do segmento devido a conformação das fibras 
● hemostasia puerperal → realizada por um fenômeno de miotamponamento (as 
artérias radiadas passam por entre as fibras uterinas, no momento do parto, as 
fibras fazem um aprisionamento/obliteração desses vasos e o sangramento não é 
tão pronunciado) 
○ depois vem o trombotamponamento 
● a ​cesária ​deve ser feita na região segmentar do útero com um corte transversal 
para respeitar o sentido das fibras sem lesá-lasmuito - artérias uterinas ficam mais 
afastadas também, menor risco de sangramento. 
○ no fundo o útero é muito espesso e haveria maior lesão de fibras 
 
Mamas 
● aumento do tamanho e da vascularização (inclusive rede venosa superficial - rede de Haller) 
● escurecimento da aréola primitiva, inclusive ao redor desta em menor intensidade = aréola secundária, 
sinal de Hunter 
● proliferação de ductos e lóbulos 
○ lubrificação da aréola para facilitar a pega do RN 
○ produção de colostro a partir de 20 semanas 
● objetivo: preparar para amamentação 
maria
Realce

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