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Superinteressante Ed 453 - Junho 2023

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9 - E 
P. 08 
O MAGNATA 
DOS GENOMAS 
DA COVID. 
BAIA 
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tecnologia, espiritualidade. 
E estão dentro de nós. 
EE
E 
EUR! 
 
POR BRUNO GARATTONI 
O aparelho de realidade virtual da Apple é o primeiro 
capaz de gerar imagens perfeitas. Trata-se de um salto 
tecnológico, protegido por 5 mil patentes. Mas ele tem 
um dilema crucial a enfrentar. Saiba qual - e veja como 
é a experiência de usar o headset. P.20 
P. 54 P. 40 P. 46 
DA TERRA A ETIMOLOGIA UMA ARMA 
À XÍCARA: DA TABELA INUSITADA CONTRA 
O GUIA DO CAFÉ. PERIÓDICA. SUPERBACTÉRIAS.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Não há 
tempo perdido. 
O que vale 
é seu tempo. 
De tempos em tempos, 
o mundo muda o ritmo. 
E, a cada mudança, parece 
que tudo corre mais rápido. 
Tentar seguir esse tempo 
faz parecer que estamos 
sempre perdendo algo. 
Por isso, a Vivo convida 
você a olhar para o tempo 
de uma nova forma: 
HTemTempoPraTudo. 
Para criar um equilíbrio 
loud EPA IM RI a A =| 4] 
Re Tola Roo (ig MR Te ATOR 
aço que torne 
de lado outras foi 
(E) ar 
- EIS eae] 
 
 
 
2 
ARDAPID -— JULHO DE 2023 
ego 
Epis 
reescrevem 
Tosca Re es 
[oe pe q E 
20 Capa 
TESTAMOS 
O VISION PRO 
O aparelho da Apple representa um salto 
quântico no mundo da RV: é o primeiro a 
gerar imagens indiscerníveis da realidade. 
Saiba como é a experiência de utilizá-lo, 
e veja qual é seu calcanhar de Aquiles. 
 
 
28 Sofisticação neandertal 
Eles não eram brutamontes: tinham um 
gene associado à linguagem, vida espiritual 
e até um princípio de indústria química. 
 
40 Elementar, meu caro Watson 
Explicamos a origem dos nomes dos 118 
elementos da tabela periódica - que vão de 
deuses gregos a demônios alemães. 
 
46 Virus bacteriófagos 
Uma tecnologia de 1920 mantida viva pelos 
soviéticos por cem anos é a nova esperança 
contra bactérias resistentes a antibióticos. 
 
54 O almanaque da cafeina 
A história, as espécies, as torras, os dados 
de comércio exterior e os métodos de pre- 
paro da bebida que faz o mundo acordar. 
 
5 CARTA AO LEITOR 
E 
ESSENCIAL 
Duma IMAGEM... 
Agricultores chineses 
colhem soja protegidos 
por sombrinhas coloridas. 
 
 
8 ... uma oPINIÃO 
O magnata fantas- 
ma que guarda a 
história da Covid. 
[o T 
SUPERNOVAS 
10 suicívio DE suício 
IAs como o ChatGPT 
podem dar bug se lerem de- 
mais seus próprios textos. 
Capa | Foto Divulgação/Apple 
 
Tirrês não É DEMAIS 
DNA tripla-hélice, que existe 
na natureza, foi feito de ma- 
neira inédita em laboratório. 
Vs / 
, 
16 | AM BECOME DEATH 
Entrevistamos Christopher 
Nolan sobre Oppenheimer. 
Spoiler: a explosão da bom- 
ba atômica não é CGI. 
 
 
18 ABRAÇO AURICULAR 
Os fones da Logitech que 
se moldam ao formato da 
sua orelha em um minuto. 
 
12 ENQUANTO ISSO... 
14 3 NOTÍCIAS SOBRE 
16 PÉROLAS DO STREAMING 
19 VOCÊ DECIDE 
NUMERO 
INCRIVEL 
200 
qnd 
litros 
FOI A QUANTIDA- 
DE DE VÍRUS EM 
BACTERIÓFAGOS 
QUE A URSS 
USOU COMO 
ANTIBIÓTICO 
DURANTE A 2* 
GUERRA. 
P.46 
 
ORÁCULO 
Bl Lisas ou FELPUDAS 
Por que jogadores de tênis 
ficam escolhendo bolinha? 
 
65 MANUAL 
Como ler poesia (não, 
não precisa ser chato). 
 
61 pá pum 
63 só acreDITO VENDO 
64 conexões 
64 Lost in TRANSLATION 
 
 
63 QUE VIAGEM 
Os aeroportos mais dis- 
tantes de suas cidades. 
ÚLTIMA PÁGINA 
66 CAÇA-CLIQUES 
Os 25 sites mais 
acessados da internet. 
ARTA AO LEITOR — EDITORIAL 
Realidade virtual: 
do paleolítico até 2023 
À FORÇA DA MORDIDA de um leão 
equivale a ço quilos por centímetro 
quadrado. Um guepardo perseguin- 
do uma presa chega a 130 km/h. Já 
um atlatl, artefato manual asteca, 
propele uma lança a 150 km/h. No 
alvo, a pressão chega a 75 quilos por 
centimetro quadrado. Trata-se de 
uma estrutura simples, mas que 
mesmo assim transforma seu porta- 
dor em algo mais letal que um leão, e 
mais veloz que um guepardo. 
À cultura asteca floresceu há rela- 
tivamente pouco tempo. Mas essa 
arma existe desde a Idade da Pedra. 
O atlatl mais antigo, encontrado na 
França, tem 17,5 mil anos. Ele pode 
ser feito de madeira ou osso, e serve 
para encaixar a parte traseira de 
uma lança. Na hora do arremesso, a 
coisa dá um impulso brutal ao pro- 
jétil. Graças a essa ferramenta, o 
Homo sapiens se tornou o maior pre- 
dador da Terra. 
Mas não foi esse status que nos 
fez humanos de fato. Foi outra cria- 
ção do paleolítico: a realidade virtu- 
al. Não na acepção moderna do 
termo, lógico, mas no significado es- 
sencial: a capacidade de criar am- 
bientes que não existem na natureza. 
Às pinturas rupestres já eram isso. 
Ao “decorar” paredes de cavernas 
com imagens de bichos, nossos an- 
cestrais traziam um pouco do cená- 
rio externo para dentro de um 
espaço inóspito. A música cumpre 
um papel semelhante. O que é um 
instrumento, afinal, se não um arte- 
fato capaz de dar vida a sons que, an- 
tes de ganhar forma, só existiam nas 
nossas cabeças? 
Por volta de 3.500 a.C. surgiria a 
forma mais poderosa de realidade 
virtual: a escrita, que transformava o 
registro oral, fugidio, em algo con- 
creto, capaz de durar para sempre — 
que o digam as histórias de Homero 
e do Velho Testamento; elas foram 
para o papiro há quase 3 mil anos e 
seguem firmes no pool cultural da hu- 
manidade. Muito mais tarde, o cinema 
uniria todas as pontas, adicionando 
imagens e sons às histórias. 
Em 1957, veio a primeira tentativa de 
criar uma realidade virtual no sentido 
contemporâneo da coisa. Não por aca- 
so, foi pelas mãos de um cineasta: O 
americano Morton Heilig. Ele criou 
uma espécie de capacete de RV. Na ver- 
dade, era uma caixa na qual você colo- 
cava a cabeça dentro. Mas a intenção ali 
era a mesma dos dispositivos que vi- 
riam mais tarde: apresentar conteúdo 
audiovisual de forma completamente 
imersiva, indiscernível da realidade. 
De lá para cá, porém, nenhum equi- 
pamento de RV atingiu esse objetivo. 
Mas isso está mudando a passos lar- 
gos. O Vision Pro, apresentado pela 
Apple em junho, dá um salto quântico 
na realidade virtual. Nas palavras do 
editor Bruno Garattoni, que testou o 
headset na Califórnia e narra a experi- 
ência de forma brilhante nesta edição: 
“Surge uma borboleta, que voa lenta e 
delicadamente pelo recinto. Estendo 
o braço, e ela pousa nas costas da mi- 
nha mão. Não sinto seu toque, pois ela 
não existe; fora isso, é uma borboleta 
de verdade”. 
À real é que ainda somos os mes- 
mos, e vivemos como nossos ances- 
trais. Nos deleitamos com imitações 
da vida. A diferença é que agora elas 
começam a ficar maiores que a vida. 
Boa leitura. 
 
Alexandre Versignassi 
DIRETOR DE REDAÇÃO 
ALEXANDRE .VERSIGNASSIGABRIL.COM.BR 
eDITORA À Abril 
Fundada em 1950 
VICTOR CIVITA ROBERTO CIVITA 
(1907-1990) (1956-2013) 
Publisher: Fábio Carvalho 
 
 
Diretor de Redação: Alexandre Versignassi Editores: Bruno 
Garattoni, Bruno Vaiano Editora de arte: Juliana Krauss 
Repórteres: Maria Clara Rossini. Rafael Baltaglia Designers: 
Luana Pilimann, Caroline Aranha Estagiários: Leonardo Caparroz 
(Lexto), Cristielle Luisi Rodrigues (arte) Colaboração: Lia Fugita 
(revisão) 
www.superinteressante.com.br / superteitorGabril.com.br 
 
DIRETORIA EXECUTIVA DE PUBLICIDADE Jack Blanc DIRETORIA 
EXECUTIVA DE DESENVOLVIMENTO EDITORIAL E AUDIÊNCIA 
Andrea Abelleira DIRETORIA EXECUTIVA DE OPERAÇÕES 
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RELACIONAMENTO COM CLIENTES Erik Carvalho 
 
Redação e Correspondêenda: Rua Cerro Corá, 2175, Vila 
Romana CEP 05061-450. São Paulo, SP Publicidade São Paulo 
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SUPERINTERESSANTE edição nº 453 (ISSN 0104-1789), ano 37. 
nº7, é uma publicação da Editora Abril 1987 G+] Espafia S.A. “Muy 
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 ESSENCIAL 
- 
NA PÁGINA ANTERIOR: Agricultores chineses colhem edamame - grãos de soja ainda 
verdes, vendidos dentro ou fora de suas vagens, usados em receitas do leste da Ásia. 
Os pequenos círculos coloridos são sombrinhas para protegê-los do sol. Apesar da 
produção local, a China é a maior compradora da soja brasileira. Nossa produção, 
em 2023, será recorde, mas as importações chinesas estão em níveis historicamente 
baixos com a desaceleração econômica do país, o que preocupa os produtores. 
— ...UMA OPINIÃO 
 
 
O Gisaid, um banco O magnata ss: sem fins lucrativos, 
armazena 15 
milhões de genomas 
de coronavirus e 
foi essencial na 
pandemia. Mas 
seu futuro está 
ameaçado pelo que guarda =: filantropo alemão 
de passado obscuro 
a F ) que costuma 
bloquear, sem a historia Pr de pesquisadores à 
plataforma. 
da Covid a e l POR BRUNO VAIANO 
 
 
EM JANEIRO DE 2004, UMa mutação do virus da gripe aviária HgN1 
se espalhou por dez países asiáticos a partir de granjas no Vietnã e 
na Tailândia. O patógeno, especialista em galinhas e afins, raramente 
salta para humanos. Mas, quando consegue, mata 60% dos infecta- 
dos (dos 861 pacientes registrados pela OMS entre 2003 e 2020, 455 
morreram). Pode haver uma grande subnotificação, o que reduziria a 
taxa. De qualquer forma, há o risco de que ele desenvolva, por seleção 
natural, a capacidade de se transmitir de pessoa para pessoa — o que 
renderia uma pandemia potencialmente mais letal que a de Covid. 
Na época, a colaboração internacional para estudar o HçN1 em- 
pacou. Os biólogos de alguns países no epicentro da epidemia, que 
tinham acesso privilegiado ao vírus, estavam com medo de divulgar 
 8 SUPER JULHO 2023
o material genético do HsN1 em estado 
bruto — já que laboratórios europeus e 
americanos, com equipes e verbas maio- 
res, conseguiriam analisar as sequências 
de RNA muito mais rápido e publicar 
suas conclusões na frente. 
Esse tipo de preocupação rola por cau- 
sa do seguinte: a ciência contemporânea 
é um ambiente competitivo. Agências 
de fomento concedem bolsas para pes- 
quisadores com base em métricas como 
o número de artigos que eles publicam, 
a quantidade de vezes que esses artigos 
são citados e a relevância dos periódi- 
cos em que os textos saem. O problema, 
óbvio, é que blindar sua carreira não é a 
coisa mais ética a se fazer durante uma 
emergência sanitária global. 
“A maioria de nós é paga para prote- 
ger a saúde humana e animal”, disse, na 
época, a bióloga italiana Ilaria Capua. “Se 
publicar mais um paper for mais impor- 
tante do que isso, estamos confundindo 
nossas prioridades.” Ela se tornou uma 
ativista pró-acesso aberto, e denunciou 
um grupo de quinze laboratórios que 
compartilhavam genomas virais em um 
banco de dados fechado com senha. Seu 
ativismo atraiu o interesse de um per- 
sonagem que não tinha envolvimento 
prévio com o mundo científico: um 
ricaço alemão chamado Peter Bogner. 
Em 2008, esse filantropo misterioso 
investiu milhões na criação da Iniciativa 
Global de Compartilhamento de Dados 
de Gripe Aviária — conhecida pela sigla 
em inglês Gisaid. Essa plataforma online 
mediava as relações entre os cientistas 
e impunha condições razoáveis (como 
dar os devidos créditos) a quem quisesse 
usar sequências de DNA e RNA dispo- 
nibilizadas em sua base de dados. 
O site foi um caso de amor à primei- 
ra vista com a comunidade acadêmica: 
até hoje, laboratórios de todo o mundo 
fizeram o upload de 400 mil genomas 
de influenza no Gisaid. Em 2010, Bogner 
percebeu que podia expandir o monopó- 
lio para outros virus — e trocou o avian 
(“aviário”) da sigla por all (“todos”), pronto 
para pescar uma oportunidade. 
Ela veio dez anos depois. Quando a 
Covid-19 estourou, o Gisaid se tornou 
o grande hub de compartilhamento de 
dados sobre coronavirus. 15 milhões de 
genomas de Sars-CoV-2 apareceram na 
 
O alemão Peter Bogner não tem 
data de nascimento ou historico 
acadêmico comprovados - e repe- 
le críticas em tom combativo. 
plataforma em três anos — mais de trinta 
vezes todo o material sobre gripe publi- 
cado lá em quase duas décadas. 
Passado o auge da pandemia, porém, 
alguns cientistas começaram a perder 
acesso (parcial ou totalmente) à plata- 
forma, aparentemente como retaliação 
silenciosa por fazerem críticas constru- 
tivas ao Gisaid ou desmentirem publica- 
mente informações erradas fornecidas 
por Bogner e sua pequena equipe. 
Por exemplo: um grupo do renomado 
Instituto Scripps, na Califórnia, levou 
block após escrever — corretamente — que 
a primeiro RNA de coronavírus da pan- 
demia, em 2020, não havia sido postado 
no Gisaid, e sim em um outro fórum 
online de virologia. Bogner reivindica 
para si esse crédito simbólico. 
Em 2020, Duncan McCannel, um figu- 
rão do Centro de Controle de Doenças 
(CDC) dos EUA, pediu aos funcionários 
do órgão que subissem os genomas não 
só no Gisaid, mas também em uma ba- 
se alternativa chamada GenBank. Em 
agosto, recebeu um e-mail anônimo 
dramático: “Uma rápida olhada em suas 
mídias sociais é tudo que é preciso para 
observar seus esforços desmedidos para 
perpetuar alegações infundadas que bus- 
cam destruir a credibilidade do Gisaid.” 
A polêmica mais grave foi a remo- 
ção temporária, em março, de dados 
sobre a possível origem da pandemia 
no mercado de animais vivos da cidade 
de Wuhan. Os genomas de vários ma- 
miferos, coletados no mercado após a 
eclosão da pandemia, saíram do ar pouco 
após a publicação, sob o pretexto de que 
os cientistas responsáveispelo upload 
haviam violado as condições de uso da 
plataforma (agora, já estão de volta no ar). 
Currículo? Que currículo? 
Em abril deste ano, motivados por rela- 
tos como esses, dois repórteres da revista 
Science tentaram investigar a biografia 
de Bogner. Eles entrevistaram mais de 
70 pessoas que tiveram algum problema 
para acessar a plataforma, leram centenas 
de e-mails e mensagens (algumas em 
que Bogner e outras pessoas ameaçavam 
cientistas abertamente), foram atrás do 
currículo do magnata e descobriram que, 
bem: não há nada para descobrir. 
Seus documentos mostram datas de 
nascimento diferentes, entre 1957 e 1964. 
A Universidade de Nova Gales do Sul, na 
Austrália, não tem registro de um aluno 
com seu nome, ainda que ele afirme ter 
estudado psicologia e feito um mestrado 
em administração por lá. Ele se mudou 
para os EUA, supostamente com 22 
anos, para trabalhar na produção de um 
programa de auditório gravado em Los 
Angeles — e passou dois meses na cadeia 
por crimes contra o mercado financeiro. 
Os maiores doadores da plataforma 
são bem conhecidos (a Fundação Rocke- 
feller e até a União Europeia já puseram 
grana lá), mas as contas de Bogner são 
uma caixa preta: ninguém sabe quanto 
dinheiro entra nem como ele é gasto. 
E uma história ainda sem desfecho, 
com muitas morais para o ecossistema 
da ciência. Os filantropos aprenderam 
que é uma boa analisar melhor o back- 
ground das iniciativas que ajudam. As 
agências de fomento recebem o lembre- 
te de sempre: é preciso pensar critérios 
de distribuição de verba que estimulem 
mais a colaboração do que a competição. 
E todos os envolvidos nos esforços 
contra a Covid-19 precisam repensar se a 
praticidade do Gisaid justifica ter subido 
o set de dados genômicos mais relevante 
do século 21 majoritariamente em uma 
plataforma privada, ainda que sem fins 
lucrativos. Essa reflexão não era viável 
durante a emergência sanitária. Mas é 
fundamental para que a humanidade lide 
melhor com as próximas. & 
JULHO 2023 SUPER Q
 
PER JULH O 2023
Sh. 
20h 
É O ALARGAMENTO 
máximo dos ventri- 
culos cerebrais em 
astronautas (trata-se 
de cavidades que 
armazenam fluido 
cefalorraquidiano, um 
líquido que serve para 
nutrir e limpar o cére- 
bro). A descoberta é 
de cientistas da Uni- 
versidade da Flórida, 
que escanearam(?) os 
cérebros de 30 deles. 
A mudança, que é 
causada pela micro- 
gravidade do espaço, 
persiste por pelo 
menos 3 anos após 
a volta à Terra. As 
consequências disso, 
se houver, ainda não 
são conhecidas. (BG) 
 
Voos estão 
ficando mais 
turbulentos 
A CHAMADA "turbu- 
lência de ar claro", que 
se manifesta quando 
não está chovendo e o 
céu parece limpo, ficou 
55% mais frequente 
nas últimas quatro 
décadas, segundo um 
estudo(3) publicado 
por pesquisadores da 
Universidade de 
Reading (Reino Unido), 
que analisaram 
dados atmosféricos e 
de satélite. A região 
mais afetada é o 
Atlântico norte, entre 
os EUA e a Europa. 
Acredita-se que a 
mudança seja causada 
pelo aquecimento 
global. (BG) 
EDIÇÃO BRUNO GARATTONI 
 
CIENTISTAS SINTETIZAM DNA GOM TRÊS HÉLICES 
Ele existe naturalmente — mas, agora, também pode ser feito em laboratório. 
CADA CÉLULA DO SEU CORPO contém apro- 
ximadamente dois metros de DNA: são du- 
as longas fileiras de nucleotídeos (as “letras 
genéticas”). Elas são chamadas de “hélices” 
porque juntas desenham um formato espi- 
ral, que lembra uma hélice. As duas ficam 
enroladas, ocupando pouquíssimo espaço, 
e são complementares — uma serve como 
backup natural da outra. Mas o organismo 
também tem outro tipo de fita: o DNA de 
hélice tripla. Ele surge quando pequenas ca- 
deias de nucleotídeos se acoplam ao DNA 
normal, que naquele trecho passa a ter três 
fileiras — e não apenas duas. A ação do DNA 
triplo ainda não é plenamente compreen- 
dida, mas ele parece controlar a atividade 
de certos genes. À novidade é que, agora, a 
ciência também é capaz de gerá-lo artificial- 
mente: pesquisadores da Universidade de 
Aarhus, na Dinamarca, anunciaram a cria- 
ção de um método para fazer isso. Ele foi 
batizado de triplex origami, e consiste em 
dobrar pedaços de DNA para gerar hélices 
com três fitas. Os cientistas conseguiram 
gerar segmentos de DNA triplo com até 
9.000 “letras”. Segundo eles, a técnica po- 
derá ajudar na criação de tratamentos contra 
doenças genéticas. (BG) 
 “A Amazon batizou o processo de “Iliada”, DIZ UM RELATÓRIO DA FEDERAL TRADE COMMISSION (FTC), Órgão do governo dos EUA, que acusa a empresa de dificultar o cancelamento do serviço Amazon Prime. Segundo a FTC, que cita documentos internos da companhia, ela teria nomeado seu fluxo de cancelamento em referência à Ilíada: um poema extremamente longo, com quase 16 milversos, que foi escrito pelo grego Homero e narra as durezas da Guerra de Troia. (BG) 
Ilustrações (A) Mariana Andrello £ Leticia Kamioka. (8) Yasmin Ayumi. Fonte (1) The curse of recursion: training on generated data makes modeis forget. | Shumailov e outras, 2023. 
(D Impacts of spaceflight experience on human brain structure RD Seidier e outros, 2023. (3) Evidence for Large Increases in Clear-Air Turbulence Over the Past Four Decades. M Prosser 
e outros, 2023. (4) Folding Double-Stranded DNA into Designed Shapes with Triplex-Forming Oligonucieotides. K Cothelf e outros, 2023. 
JULHO 2023 SUPER 11
Sn. 
 
Em julho, a Terra passou pelos 
três dias mais quentes já registra- 
dos, com a temperatura média 
no planeta alcançando 17,23 *€. 
do 
Yy “tu, 
a 
+ 
Veterinários dos EUA criaram 
uma injeção que permite 
castrar gatas sem cirurgia (8. 
 
Em experiências com ratos, 
cientistas chineses identificaram 
qual região do cérebro está 
relacionada ao medo de altura (B). 
 
Uma espada de bronze com 3 
milanos foi encontrada na Ale- 
manha - e ela ainda brilha (0). 
Fontes (A) Zoológico de Cincinnati. 
* (8) East China Normal University. 
(€) Bavarian State Office for Monument 
Protection. 
12 SUPER JULHO 2023 
 
 
EMPRESA CRIA CARNE GENETIGAMENTE MODIFICADA 
Método promete baratear a produção em laboratório desse alimento. 
O CULTIVO DE “CARNE DE LABORATÓRIO” 
existe desde 2013. Cientistas coletam cé- 
lulas de boi ou de frango e as multiplicam 
em biorreatores (grandes tanques cheios 
de aminoácidos e nutrientes) para gerar 
pedaços de carne — sem precisar matar 
nenhum animal. Mas esse processo é ine- 
ficiente, usa reagentes especificos, e por 
isso é caro: mesmo após uma década de 
aperfeiçoamentos, a carne sintética ainda 
custa 10 vezes mais do que a natural (e isso 
na melhor das hipóteses, supondo uma 
produção em grande escala(5); nas quanti- 
dades fabricadas hoje, o custo é ainda mais 
alto). Ela é comercialmente inviável. Mas a 
companhia americana SciFi Foods diz ter 
a solução: ela modificou o DNA da carne 
bovina com a técnica CRISPR (que usa 
enzimas de bactéria para cortar e alterar 
sequências genéticas de forma precisa, e 
tem sido bastante explorada em pesqui- 
sas da indústria farmacêutica). A Super 
conversou com a bióloga Kasia Gora, co- 
fundadora e diretora técnica da empresa. 
Qual é a diferença da carne editada 
geneticamente? 
Essa abordagem nos permite cultivar cé- 
lulas em laboratório sem a necessidade de 
microtransportadores [materiais que funcio- 
nam como estruturas de suporte, permitindo 
a multiplicação das células nos biorreatores]. 
Isso eliminou o uso de ingredientes caros, 
e reduziu nossos custos de produção em 
mil vezes. O maior desafio das carnes cul- 
tivadas é o custo. Achamos que será difícil 
baratear esse tipo de produto sem o uso da 
técnica CRISPR. 
Por que usar o CRISPR e não outro método? 
À técnica CRISPR nos permitiu fazer 
edições precisas e de pequena escala em 
células animais. Nós somos capazes de de- 
senvolver centenas de linhagens celulares 
todos os meses. Existem outros métodos 
de edição genética, mas o CRISPR nos 
oferece precisão, rapidez e custo-benefício. 
Não revelamos quaisgenes [do DNA bovi- 
no/ nós alteramos. No entanto, podemos 
revelar que as modificações geralmente 
envolvem pequenos ajustes, para aumen- 
tar a eficiência do crescimento de células 
dentro do biorreator. 
A carne já está pronta para lançamento? 
Não. No momento, Singapura é o único 
pais que legalizou totalmente a venda de 
carne cultivada. Nos Estados Unidos, a 
FDA [agência reguladora americana] já deu 
essa permissão a duas empresas, e nós 
estamos buscando o mesmo. Acreditamos 
que deverá haver mais algumas etapas 
regulatórias antes que o nosso produto 
seja introduzido no mercado, o que deve 
ocorrer no final do ano que vem. (Maria 
Clara Rossini e Bruno Garattoni) 
Fontes (5) How much will large-scale production of cell-culturad meat cost? BW Brorsen e outros, 2022. (6) Drift of Earth's Pole Confirms 
Croundwater Depletion as a Significant Contributor to Global Sea Level Rise 1993-2070. K Seo e outros, 2023.
 
Faturamento da soja dispara no Brasil 
Vendas quase dobraram em 4 anos - e ela já responde por 42% da agricultura. 
 
VALOR DA PRODUÇÃO, EM BILHÕES DE REAIS: 
 
 
TOTAL DO AGRONEGÓCIO: R$ 1,2 TRILHÃO 
 
 
 
 
 
TOTAL AGRÍCOLA: 
au R$ 868,9 bi 
MILHO () ez 
CANA-DE- 
“AÇÚCAR O sa O ess 
CAFÉ O 29,9 O 42,8 
TOTAL PECUÁRIO: 
R$ 347,9 bi 
ALGODÃO 025,7 Q 277 
 
 
LARANJA 9204 q 18,2 
CARNE :10/a: | 
BOVINA 133,4 (ns) 1561 151,5 140,6 O Mato Grosso: Ro O"; 
R$ 202,9 bl ço : 
Vo | 
: OQ Paraná: O / 
CARNE : la 288 0337 331 18 344 | R$AST OI dd ; 
Q São Paulo: O Mato Grosso do Sul: | 
FRANGO 852 E) 839 98,3 = 89,2 R$ 145,9 bl R$ 73,2 bl | 
OQ Minas Gerais: OQ Santa Catarina: 
R$ 129,8 bi R$ 48,6 bi 
LEITE 5 (Ds 53 57,7 811 
Q Goiás: Q Bahia: 
R$ 101,6 bl R$ 48,5 bi 
ovos 18 19,8 18,5 201 22,7 
mem | Q RioGrande do Sul: q Pará: 
: R$ 99,3 bi R$ 28,2 bl 
*Projeção baseada nos dados de janeiro a abril aa É 
Fonte Valor Bruto da Produção (VBP) Abril/2023. Ministério da Agricultura e Pecuária. 
FOI QUANTO A HUMANIDADE deslocou o eixo rotacional da Terra entre 
1993 e 2010, segundo um novo estudo(6) publicado por cientistas da Uni- 
versidade Nacional de Seul (Coreia do Sul). Segundo eles, isso aconteceu 
por causa da extração de água do subsolo. Nas duas décadas analisadas, 
a humanidade extraiu 2,1 trilhões de toneladas de água, e a maior parte 
dela foi parar nos oceanos — o que redistribuiu a massa do planeta, e 
) empurrou o eixo da Terra 80 cm na direção leste. (BG) 
Ilustração Yasmin Ayumi. 
 
JULHO 2023 SUPER 13
Sh. 
 
| 
Substância causa dano 
reprodutivo em ratas 
Em um estudo publicado por 
Ee pe ço [pas o 
Ee] aca Bol ije co ua) A pi 
TCE ee Ap Tod q 
pede De TS A 
tipo de célula do útero) e dila- 
tação do corpo lúteo, estrutura 
uterina que fabrica progestero- 
GRE ee re Mec 
doses bem pequenas, de 0,0003 
a 0,03 miligrama, ministradas 
Ee A ur pe ES 
mente curto (28 dias). (BG) 
3 NOTÍCIAS SOBRE 
Site 
ae go po CR ORE DSR Doo OR TS Ce OD 
 
 
Bayer é acusada de 
propaganda enganosa 
Pat is RE RO 
ge TRA Do go de ata Te Tn 
fez acordo com o governo do 
estado de Nova York e irá pagar 
uma multa de US$ 6,9 milhões. 
atas AS ESA pos e RE Tiro ie e 
ERC LS E rei 
Roundup, cujo ingrediente ativo 
é o glifosato, como se ele fosse 
Dois aro CER Eu O 
menos nocivo para o meio am- 
biente que sabão ou 
de lavar louça(S). (BG) 
 
gs 
ERR n res do gosto 
Pra Tr seo 
Tecido Via o diga 
e od ge [Epa Ee) 
ee gi RE Dog o 
2023 (ele só poderia ser usado 
em agricultura profissional). 
Isso ainda não ocorreu. Mas a 
empresa começou a oferecer 
uma nova versão, o Roundup NL, 
Cep see puro Bali pe (ro a 
feito de ácido pelargônico, natu- 
E TC ES 
Feridas pres (O) 
Estresse 
aumenta 
desejo 
por Junk 
food 
E não é um efeito 
 
 
puramente psico- 
lógico: também 
há um mecanismo 
neurológico envol- 
vido. A descoberta 
é de cientistas 
australianos(D), 
que submeteram 
ratos de labora- 
tório a situações 
estressantes - e 
constataram que 
nesses animais a 
habênula lateral, 
uma região do cé- 
rebro que também 
existe em humanos 
e tem a função de 
controlar a "busca 
por recompensas”, 
simplesmente não 
funcionava (não 
freava o apetite de- 
pois que o animal 
já havia comido 
o suficiente). A 
habênula era de- 
sativada por uma 
substância, chama- 
da neuropeptideo 
Y (NPY), que o 
cérebro produz sob 
estresse. (BG) 
 
 
 
Inglês O O RT 
- E 4% 49% 1% 1% 
domina a pp a : DENT AE 
io 
metade da ini es is 
internet rr 
i á ç pc pana EE 
ope Re DA 
Idioma é 10 vezes 48%. 2,9% à ÉS us 
mais usado do Afaste 
que na vida offline. 55,6% 3,8
% E X da mtemet que é 
gti.) 
14 SUPER JULHO 2023 Fonte RestofWorld.org, sobre dados Ethnologue e W3Techs.
O GLIOBLASTOMA é um tumor que surge 
nas células gliais, responsáveis por fornecer 
nutrientes e suporte aos neurônios. Ele é 
especialmente terrível: a média de sobre- 
vivência pós-diagnóstico se resume a oito 
meses(9 (cinco anos mais tarde, só 6,9% dos 
pacientes estão vivos). Mas, agora, um novo 
estudo revelou uma possível explicação pa- 
ra essa agressividade: o glioblastoma altera 
a estrutura do cérebro, para se conectar a 
redes neuraisú)D. Cientistas da Universidade 
da Califórnia em São Francisco analisaram 
 o. 
CÂNCER AFETA AS CONEXÕES ENTRE NEURÔNIOS 
Tumor cerebral consegue se conectar a células distantes, mostra estudo. 
a atividade cerebral de 19 pacientes que têm 
esse tipo de câncer. Exibiram figuras para 
os pacientes, que deveriam dizer os nomes 
dos objetos. Isso ativou áreas relacionadas 
ao processamento de linguagem, como seria 
normal — mas também acionou os tumores, 
que estavam em regiões distantes do cére- 
bro, demonstrando que havia uma conexão 
elétrica com eles. Os cientistas acreditam 
que o tumor se conecte a neurônios sau- 
dáveis por necessitar de alguma substância 
produzida por eles. (BG) 
 
Polvo parece ter pesadelos com predador 
O POLVO COSTELLO, que foi capturado na Flórida e desde 2021 é estudado por pesquisadores da 
Universidade Rockefeller, em Nova York, teve um passado traumático: um predador arrancou um de 
seus tentáculos quando ele vivia no mar. Agora, OS cientistas dizem ter presenciado um fenômeno 
intrigante. Eles flagraram quatro episódios, com duração entre 44 e 290 segundos, em que Costello 
aparentemente teve pesadelos(3: o polvo, que dormia em seu tanque, subitamente assumiu um com- 
portamento antipredador, soltando tinta e tentando parecer maior. Em 2021, um estudo brasileiro(3 
encontrou outro indício de que os polvos talvez sonhem: eles mudam de cor enquanto dormem. (BG) 
 
A NOTÍCIA 
Exercício é 
mais eficaz que 
antidepressivos, 
diz estudo 
O QUE ELA DIZIA 
Fazer atividades físicas 
regularmente é até 
50% mais eficaz contra 
a depressão do que os 
medicamentos, afirma 
um estudo que avaliou 
128 mil pessoas. 
A VERDADE 
O trabalho (9, 
que foi publicado 
por cientistas da 
Universidade do Sul 
da Austrália, é um 
“metaestudo”": ele 
juntou e analisou os 
resultados de 1.039 
testes clínicos. Con- 
cluiu que a prática de 
exercícios pode ser 
benéfica, sim, contra 
ansiedade e depres- 
são. Só que o estudo, 
eis aqui o pulo do 
gato, não comparou 
o efeito da atividade 
física com o de 
remédios antide- 
pressivos. Os autores 
decidiram não incluir 
testes que fizessem 
essa comparação, e 
explicaram o motivo 
no próprio estudo: 
“isso limitaria nossa 
capacidade de 
avaliar a efetividade 
dos exercícios 
em si”. (BG) 
Ilustrações Yzsmin Ayumi. Fontes (7) Subacute exposure to Roundup* changes steroidogenesis and gene expression of the glutathione-giutaredoxin system in rat ovaries. L Zanatta e outros, 
2023. (8) Attomey General james Secures 36.5 Million from Bayer and Monsanto for False Advertising. Neve York State Attomey Ceneral, 15/6/2023. (9) Critical role of lateral habenula circuits in 
the control of stress-induced palatable food consumption. K Ip e outros, 2023. National BrainTumor Society, 2023. 
S Hervey-Jumper e outros, 2023. (3 Abnormai behavioral episodes associated vath sleep and quiescence in Octopus insularis. M Magnasco 2 outros, 2023. 
active sleep states in the octopus. S Ribeiro e outros, 2021. (9 Efectiveness of physical activity interventions for improving depression, anxiety and distress. E Singh e outros, 2023. 
Clioblastoma remodeiling of human neural circufts decreases survival. 
(3 Cyeiic aitemation of quiet and JULHO 2023 SUPER 15
SN. | PLAYLIST 
Essa é a visão de Christopher Nolan sobre o pai 
da bomba atômica, personagem central de seu 
novo fime. Batemos um papo com o diretor de 
Oppenheimer, que estreia dia 20 de julho. Texto 
“O homem mais 
importante de todos” 
 
Maria Clora Rossini « Design Cristielle Luise 
 
 
[6 E E 
ES” Para você, o que 
é mais fascinante sobre 
a história de Oppenheimer? 
 
P rimeiramente, eu sempre 
estou procurando por uma 
história dramática, algo que 
realmente te envolve. já faz 
alguns anos que eu conheço a 
história de Oppenheimer. E o que 
mais me fisgou foi o momento 
em que ele e outros cientistas do 
Projeto Manhattan imaginaram 
a possibilidade de que a primeira 
bomba atômica causasse uma 
reação em cadeia com a atmosfera 
- O que destruiria o mundo. Mesmo 
assim, eles foram lá e apertaram 
o botão. Esse me pareceu um 
momento singular e dramático 
da história da humanidade que 
IL 
16 SUPER JULHO 2022 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
merecia ser explorado em um filme. 
 
E =" Qualéa 
relevância do filme 
no momento presente? 
 
uando se trata de armas 
O nucleares, há momentos 
na história em que esquecemos da 
ameaça delas. Elas não foram em- 
bora, elas não se tornaram menos 
perigosas. Essa é uma das razões 
pelas quais eu fiz esse filme. É algo 
que me toca emocionalmente, e 
quetorna a história tão poderosa. 
CcaNaL 
Great Art Explained 
YouTube 
Você sabia que em O Grito, de 
Edvard Munch, na verdade a 
pessoa não está gritando? Que 
as bolinhas vermelhas, marca 
da japonesa Yayoi Kusama, vêm 
de uma alucinação? Que a 
estátua O Pensador, de Rodin, 
tem 28 cópias - todas originais? 
Veja essas e outras curiosidades 
sobre grandes obras (canalem 
inglês; ative as legendas). (BG) 
 
 
a 7 
 ” 
ms” Você escolheu não 
usar computação gráfica 
na cena de detonação da 
primeira bomba atômica. 
Como ela foi gravada? 
 
segunda pessoa para quem 
mostrei o roteiro do filme 
[depois da produtora Emma Tho- 
mas] foi Andrew Jackson, meu 
supervisor de efeitos visuais - que 
também fez Tenet e Dunkirk comigo. 
Eu disse logo que não queria usar 
imagens geradas por computador 
(CGI). Apesar de ser uma técnica 
versátil e flexível, ela parece mais 
segura. Para o espectador, é difícil 
sentir a ameaça real na imagem. 
Então, começamos a experimentar 
com técnicas analógicas [Nolan não 
revela quais, para não comprome- 
ter a experiência os espectadores]. 
Além disso, acho que muito da ten- 
são dessa cena está no rigor dos 
detalhes - a maneira que a bomba 
foi montada e transportada. Cons- 
truímos esse clímax baseado em 
precauções da vida real. 
 
Foto Divulgação. Ícones Getty Images. 
 
 
 
DOCUMENTÁRIO 
= Fantasmas do 
Abismo (2003) Netflix 
Vinte anos antes da tra- 
gédia do OceanGate, o 
cineasta James Cameron 
visitou os destroços do Titanic. 
A bordo dos submersíveis russos 
MIR-1 e MIR-2, ele e sua equipe 
desceram 4 mil metros - e aí 
usaram dois rovers aquáticos, de 
controle remoto, para explorar os 
destroços por dentro e capturar 
imagens incríveis. (BG) 
Imagens Reprodução/Divulgação.
ROGER 
PENROSE 
A mente 
“ nova do 
imperador 
rd CNM TARA 
deEsIrS A sa GE4S DA FINA 
 
Os 
limites 
da IA 
O INGLÊS ROGER PENROSE 
é um físico importante, 
vencedor do Prêmio Nobel 
de 2020 por suas pesquisas 
sobre buracos negros. Tam- 
bém é um pensador ousado, 
famoso por uma teoria nada 
ortodoxa sobre a consciên- 
cia (que, para ele, deriva 
de um fenômeno quântico 
dentro dos neurônios). 
Neste livro, Penrose junta 
matemática e filosofia para 
investigar a inteligência 
humana - e suas diferenças, 
incluindo algumas que ele 
considera intransponíveis, 
em relação à artificial. (BG) 
A Mente Nova do 
Imperador. R$ 108,80. 
FILME 
 
UMA MENINA E OS ALIENS 
O PLANETA FOI INVADIDO, só resta fugir. A única arma de Lana é a 
inteligência, que ela usa para resolver puzzles e atravessar o mundo 
sem ser notada. E que mundo: este game, do estúdio sueco Wishfully, 
foi totalmente pintado à mão, com resultados belíssimos. Ele é para 
Xbox e PC, mas também pode ser jogado em smartphone ou Mac, por 
meio do serviço de nuvem Xbox Game Pass. (BG) 
Planet of Lana. R$ 75 (grátis para assinantes do Game Pass). 
 
 
Mixed by Erry 
(2023) Netflix 
A história real de Enrico 
Frattasio, garoto pobre que 
trabalhava varrendo o chão de 
uma loja de discos em Nápoles, 
no sul da Itália. Ele amava 
música e sonhava em ser DJ. 
Acabou virando um magnata: 
dono da maior gravadora do 
país, com mais de 180 milhões 
de fitase CDs vendidos. Todos 
falsificados. (BG) 
 
Estratégia no jardim 
Os PIKMIN SÃO BICHINHOS estranhos, com cabeça de planta e pernas 
de inseto. Neste jogo, criado pelo japonês Shigeru Miyamoto (o genial 
autor das franquias Mario e Zelda), você deve ajudá-los a realizar tare- 
fas, levando em conta as características e limitações de cada um. Ou 
seja: sob a aparência fofinha, há um sofisticado game de lógica - que 
está ganhando seu quarto episódio. (BC) 
Pikmin 4. Lançamento dia 21, para Nintendo Switch. R$ 299. 
FILME 
O Canto do Cisne 
(2021) Apple TV+ 
Cameron tem uma doença 
terminal, mas não conta para 
a família. Vai a uma clínica 
que gera um clone idêntico, 
incluindo suas memórias. 
A ideia é que o clone assuma 
a vida dele. Mas isso levanta 
questões filosóficas - que o 
protagonista Mahershala Ali 
desenvolve numa atuação 
espetacular. (BG) 
| EDIÇÃO BRUNO GARATTONI 
CONTA KRISTIN, pacien- 
te do médico americano 
Dale Bredesen - que diz 
ter criado um tratamen- 
to capaz de reverter o 
Alzheimer. O método 
ainda foi pouco testado, 
e está longe de ser um 
consenso científico. Mas 
o livro vale pelas histó- 
rias impressionantes, 
de Kristin e seis outras 
pessoas que dizem ter 
superado a doença. (BG) 
Os Primeiros Sobrevi- 
ventes do Alzheimer. 
R$ 55.90. 
 
 
AS RAÍZES 
DO MUNDO 
O SuL DA EUROPA é mais 
machista que o Norte. 
É que as terras do Sul 
exigiam o uso de arado 
puxado por animais, 
que só homens tinham 
força para controlar. Já 
no Norte, a agricultura 
usava enxada e rastelo, 
mais leves - e por isso as 
mulheres participavam 
em pé de igualdade. 
Essa é uma das teorias 
desenvolvidas pelo isra- 
elense Oded Galor neste 
ambicioso livro, que 
tenta explicar a história 
humana através de seus 
fatores econômicos. (BG) 
AJornada da Humanidade. 
RS 56,60. 
JULHO 2023 SUPER 17
cejefjnag/ce3nposday soj03 ETOT OHTINÍ VadNS 8r 
 
Epp RU 
 
 
 
Na era do lítio 
EM 2021, um executivo da Duracellinsinuou que 
o controle do Xbox ainda usa pilhas devido a um 
acordo comercial com a Microsoft - que negou. 
Seja como for, agora finalmente a empresa está 
lançando um controle com bateria de lítio: ele se 
chama Remix, e é feito de plástico parcialmente 
reciclado. Sua bateria dura até 30h, o dobro das 
pilhas comuns (e quase o triplo das recarregáveis 
de NiMH, que muitos donos de Xbox usam hoje). 
O porém é que o Remix custa R$ 800 - quase o 
dobro do controle normal. 
 
 
CAFÉ 
COADO ESTÁ 
NA MODA 
E À MÁQUINA XBLOOM 
promete torná-lo quase 
tão fácil de fazer quanto os 
cafés em cápsula. Ela usa 
xPods, que são minicoadores 
descartáveis com café dentro 
(o fabricante oferece dezenas 
de opções, com grãos de 
várias partes do mundo). 
A máquina mói os grãos e aí 
passa o café - girando o jato 
d'água e dando batidinhas 
nocoador, como um barista 
faria. O aparelho é vendido 
por US$ 800, e cada xPod 
(que rende duas xicrinhas 
de café) sai por USS 2. 
 
99,965% da luz 
EssE É O COEFICIENTE de absorção do Vantablack, que foi criado em 
2014 pela empresa inglesa Surrey NanoSystems - e é o material mais 
preto que existe. Ele já foi usado para pintar paredes e carros, eagora 
está presente numa TV: a Philips OLED+908, que tem uma camada 
de Vantablack dentro. A película deixa passar os raios luminosos 
emitidos pela TV, mas absorve toda a luz vinda do ambiente - o que 
torna a tela imune a reflexos. Ela será lançada na Europa nos próximos 
meses, a partir de 2.300 euros (para a versão de ss polegadas). 
 
 
Astronomia urbana 
NAS CIDADES GRANDES, e até nas médias, 
está cada vez mais dificilver estrelas e corpos 
celestes. Consequência da vida moderna e sua 
abundância de luz, mesmo de madrugada. 
Mas o telescópio Unistellar eQuinox 2 (US$ 
2.500) promete resolver: ele captura várias 
imagens, com vários graus de exposição, e aí 
combina numa só, perfeita (que é exibida na 
tela do seu smartphone ou tablet). O teles- 
cópio gira automaticamente para encontrar 
os pontos de interesse no céu, e explica - por 
meio de um app - o que é cada um deles. 
 
 
 
| EDIÇÃO BRUNO GARATTONI 
Un gUán: 
OT CU SID UE 
interessantes 
(e surpreendentes) 
do mundo do 
crowdfunding 
Xó, aproximação 
iIndiegogo.com 
Projeto VoidScan 2.0 
O que é Um cartão que prote- 
ge os seus outros cartões. Nos 
últimos anos, surgiram cartei- 
ras que prometem resguardar 
os cartões contra tentativas 
não-autorizadas de leitura 
por aproximação. Este cartão 
adiciona a proteção a qualquer 
carteira: basta colocá-lo 
dentro da sua. Ao detectar 
tentativas de leitura, ele envia 
um sinalembaralhado, im- 
pedindo a captura dos dados. 
Não usa bateria (é alimentado 
pela própria energia do leitor). 
Quanto já arrecadou 
USS zo mil 
Chance de rolar 66660 
 
Sem desviar o olhar 
kickstarter.com 
Projeto Motoeye E6 
O que é Um gadget que pro- 
jeta informações, como rotas 
de GPS, no campo de visão 
do motociclista - evitando 
que ele tenha de olhar para 
a tela do celular enquanto 
pilota. É um microprojetor, 
de 2 cm, que fica dentro 
do capacete. O produto 
precisará de permissão das 
autoridades de trânsito. 
Quanto já arrecadou 
Uss so mil 
Chance 66000 
JULHO 2023 SUPER 19
 
 
ZO SUPER JULHO 2023 
 O Vision Pro 
projeta pontos 
UFA nie 
a ES TS 
os olhos. Você 
não os vê, mas 
[odor 6 Loo RS E 
ele para 
rastrear, com 
precisão, os 
ESTAIS 
Eee a TFT ÇIA 
 
 
+ rt 
estamos o 
ANT 
 
 
a 4 
" 
 
 
 
O aparelho de realidade virtual da 
Apple é o primeiro capaz de gerar 
imagens perfeitas, que realmente 
parecem de verdade. Ele é um salto 
ecnológico impressionante, protegido 
” rd DER RS [RR ER =] ES EE 
pela frente um dilema crucial, que até 
Cie hoje ninguém conseguiu resolver. Saiba 
- “AM o “AT r J 8" 4 
o EMA " qual - e veja como é a experiência 
A a . , a CARTE RED 
" . a" 
4 o R Texto Bruno Garattoni, de Cupertino (Califórnia) 
E a 
 
Design Juliana Krauss 
JULHO 2023 SUPER 21
 
O PRÉDIO DA APPLE é 
um pouco maior do que 
o Pentágono: sua circun- 
ferência externa, com 1,6 
km, comportaria todo o 
centro militar dos EUA. 
Mas nem parece. Enquan- 
to o Pentágono é uma 
presença dominante em 
Washington DC (a cida- 
de tem até um bairro cha- 
mado Pentagon City), o 
quartel-general da Apple é 
surpreendentemente pou- 
co visível para quem anda 
por Cupertino, a 1h30 de 
carro de São Francisco. 
Porque ele, que se chama 
Apple Park, é cercado por 
verde: são ao todo mais de 
9.000 árvores e plantas, 
de 309 espécies nativas. 
Do lado de fora, você só 
enxerga pedaços do teto e 
um aviso dizendo que ali é 
proibido voar com drones. 
Mas estamos do la- 
do de dentro. É meu 
segundo dia no Apple 
Park, e chegou a hora de 
experimentar o Vision 
Pro — aquele headset de 
realidade virtual, do qual 
você deve ter ouvido fa- 
lar, que vai custar US$ 
3.500 e será lançado nos 
EUA ano que vem. O cli- 
ma aqui é bem diferente 
da véspera, quando o 
CEO Tim Cook revelou o 
produto a uma multidão 
de funcionários, jorna- 
listas e programadores. 
À apresentação foi no 
anel interno da sede, 
aonde você chega depois 
de passar por fileiras de 
escritórios, atravessar O 
refeitório com capacida- 
de para 4.000 pessoas, e 
cruzar dois grandes por- 
tais de vidro, com incri- 
veis 16 metros de altura — 
eles pesam 180 toneladas 
cada, e foram fabricados 
pela empresa alemã Seele. 
Nos corredores, um avi- 
so curioso: “Cuidado ao 
abrir as portas externas: 
vida selvagem presente”, 
e o desenho de uma fa- 
mília de patinhos. 
Hoje os visitantes já 
foram embora e está tu- 
do tranquilo, com fun- 
cionários trabalhando e 
circulando (não todos; a 
imprensa dos EUA tem 
noticiado que os empre- 
gados da Apple relutam 
a voltar ao trabalho pre- 
sencial). Restaram alguns 
poucos jornalistas, convi- 
dados para testar o Vision 
Pro. Com certo atraso, 
um funcionário aparece 
dirigindo um carrinho 
de golfe. Embarco, atra- 
vesso o parque e começo 
a subir uma leve colina, 
deixando o prédio cen- 
tral para trás. Passo por 
quadras de basquete e um 
enorme gramado. Chego 
a uma construção retan- 
gular, erguida para as 
demonstrações do Vision 
Pro. Daqui para a frente, 
 
 
 
não é permitido fotogra- 
far nem filmar. 
Se você já viu algum 
vídeo das apresentações 
de produtos da Apple, 
talvez tenha reparado 
no seguinte: a aparência 
dos funcionários, que não 
têm um fio de cabelo fo- 
ra do lugar. Suas roupas, 
gestos, pronúncia, tudo 
parece minuciosamente 
ajustado — tanto quanto 
o design dos produtos. 
Aqui no local da demo 
também é assim, só que 
elevado à décima po- 
tência: as pessoas falam 
baixinho e devagar, com 
os olhos brilhando e uma 
vibe propositalmente zen 
— só faltava vestirem ba- 
tas brancas. Na hora me 
lembro do “campo de 
distorção da realidade”: 
expressão criada em 1981 
pelo engenheiro Bud 
Tribble, um dos pais do 
Macintosh, para definir 
de forma bem humorada 
a enorme capacidade de 
persuasão de Steve Jobs. 
Me entregam um 
iPhone para que eu esca- 
neie meu rosto e orelhas. 
Essas informações serão 
usadas para medir a dis- 
tância entre meus olhos, e 
ajustar automaticamente 
a posição das lentes do 
Vision Pro (o que em 
outros headsets precisa 
ser feito manualmente, 
girando um botão), e 
também para algo bem 
impressionante — mais 
sobre isso daqui a pouco. 
Depois do escanea- 
mento, que leva poucos 
segundos, entro numa 
salinha para falar com a 
optometrista de plantão. 
Ela me pergunta se tenho 
miopia ou astigmatismo. 
Não. Mas, para quem tem, 
o Vision Pro será vendido 
com lentes personaliza- 
das, que “grudam” mag- 
neticamente no headset 
e serão fabricadas pela 
empresa alemã Zeiss. 
Volto ao ambiente 
principal, onde há dois 
Vision Pro expostos — e 
ninguém mexendo ne- 
les. A parede do fundo, 
com uns 20 metros de 
largura e o símbolo da 
Apple no meio, é fei- 
ta de um material bem 
estranho, entre o metal 
e o cimento queimado. 
O que será? Assim que 
penso nisso, alguém me 
chama; e numa das late- 
rais, que pareciam placas 
inteiriças de madeira, 
vejo uma fresta se abrir. 
Do outro lado, está o 
gadget mais sofisticado 
de todos os tempos — cujo 
desenvolvimento, segun- 
do a Apple, rendeu mais 
de 5 mil patentes. 
Imagine a sala de uma 
casa, só que desenhada 
pela Apple. Tem sofá, 
plantas, quadros, objetos 
de decoração, foi monta- 
da para parecer casual e 
realista - mas também 
dá para perceber que foi 
projetada com exatidão, 
com iluminação calcu- 
lada e posições precisas. 
O Vision Pro está na 
mesinha de centro. En- 
quanto uma funcionária 
me apresenta o aparelho, 
e antes que me autorize 
a pegá-lo, fico pensando 
se a Apple teria consegui- 
do fazer um milagre de 
engenharia e criar o pri- 
meiro headset de RV que 
não seja nada pesado. Um 
minuto depois,descubro. 
O Vision Pro é bem 
menor do que aparenta 
nas fotos, e muito mais 
compacto do que qual- 
quer outro capacete de 
realidade virtual — tanto 
que nem seria adequado 
chamá-lo de “capacete”. 
Mas não é exatamente le- 
ve. Para mantê-lo preso e 
estável, tenho que apertar
 
/——————— câmeraslaterals —————+ 
Rag 
 
=— câmeras Inferiores — 
 Headset tem dois processadores, qua- 
tro tipos de câmera, sensor laser e 
telas com resolução de 23 megapixels. 
—————— 
FR = 
, 
l câmeras oculares 
— câmeras 3D (TrueDepth) —— 
e LEDs Infravermelhos externos — 
[EPs 
cap 
EA IE Last REA) 
São doze: oito do lado externo, para 
capturar imagens do ambiente e das suas 
mãos, e quatro internas, para monitorar 
os seus olhos. Um sensor LIDAR (light 
detection and ranging), como o presente 
em carros autônomos, usa feixes de luz 
São do tipo micro-OLED (ou OLEDoS), esculpi- 
das em silício. São produzidas com as mesmas 
técnicas usadas em chips de computador; por 
isso, comportam muito mais pixels do que as 
telas OLED comuns, de plástico. Somadas, 
as duas têm 23 milhões de pontos - quase 
O headset tem um processador M2, o 
mesmo usado nos Macs, e o novo chip R1, 
que processa os sinais das câmeras e do 
sensor LIDAR. Eles geram um certo calor: 
o Vision Pro esquenta um pouco durante o 
uso, e solta ar morno por duas aberturas, 
para escanear a sala. o triplo da resolução dos headsets comuns. na parte de baixo. 
ada héli 
É gerado por dois micro- calcula as reflexões que “ 
falantes, um decadalado. as ondas sonoras fazem 
Ossons parecem emanar ao bater nelas. Aí ele si- cimba 
de pontos específicos do mula isso, gerando sons cruz 
ambiente, inclusive atrás “pré-reverberados” que trago 
de você. O Vision Pro es- enganam o cérebro (leia 
caneia as suas orelhas e 
ENS 
Basta girar esse botão para apertar ou afrou- 
xar a banda que prende o Vision Pro à sua 
cabeça. O headset do teste tinha também 
uma segunda fita, que passa por cima da 
cabeça (e não aparece nas fotos). A banda 
e a peça da frente, que se encaixa ao rosto, 
são de tecido — e removiveis para limpeza. 
 E: /o pi) São dois: o Top, à esquerda, que é usado para tirar fotos e capturar vídeos 3D usando o headset, e o Digital Crown, que tem duas funções. Se você apertá-lo, volta para a tela inicial do Vision Pro (e, se girá-lo, dá zoom nas telas flutuantes e nos ambientes virtuais mostrados pelo headset). 
mais na pág. 26). 
concha 
lóbulo 
 
 
Menor e mais grossa que um iPhone, fica 
conectada ao headset por um cabo.Promete 
autonomia de 2 horas. O Vision Pro também 
pode ser utilizado por tempo ilimitado, ligado 
à tomada - mas isso sempre é feito através da 
bateria (ela tem uma entrada USB-C, à qual 
você pluga um carregador Apple). 
 
RS Ni D 
Reúne os ícones dos principais 
aplicativos e da App Store. Quando 
você olha para um dos ícones, ele 
Eur lap EE bico ÃO 
demais elementos da interface, 
como os botões, também respon- 
dem: adquirem um tom de cinza 
DS LE ns pita Efesa gafe TE eia) 
você fixa o olhar neles. 
 
LER 
Flutuam na sua frente e projetam 
sombras, como se fossem telas 
de verdade. Você pode ter várias 
ES ge of p oRrS ps rei ça 
Ce on pie pr AE go (Li Ed 
ou mover cada uma para qualquer 
ponto da sala, usando as mãos. Dá 
para navegar na web, ler mensa- 
gens etrabalhar em documentos. 
EA TA 
O headset roda o aplicativo 
FaceTime, do iPhone. A outra pes- 
soa aparece numa janela flutuante. 
Seo interlocutor também estiver 
usando um Vision Pro, o sistema 
operacional reconstrói a cabeça eo 
tronco dele - que aparecem em 3D. 
O resultado não é perfeito (lembra 
um game), mas surpreende. 
PERES 
Dá para filmar ou fotografar cenas 
do dia a dia usando o Vision Pro 
e depois assistir, em 3D, com o 
headset. Os vídeos são quadrados 
e têm resolução limitada, não 
preenchem todo o campo de 
LEE TO RE Ee Ra fo profis Ce PR 
AT Se TS pp MET pro 
registrar momentos familiares. 
: Duplo 
Clique clique Segurar Arrastar 
PSTU E 
Depois de olhar para algum ele- 
mento da interface, você usa as 
mãos para selecioná-lo ou fazer 
eltia e eo nfs p= (MO RTIET o OS 
reconhece seis gestos - mas, na 
maior parte do tempo, você usa 
apenas o clique simples e o arrastar. 
É bemintuitivo: parece uma versão 
“aérea” dos gestos que todo mundo 
OS OBJETOS 
O REI co Re] re RS diria 
objetos tridimensionais integrados 
ao ambiente. Eles têm profundida- 
de, relevo e sombras realísticas, e 
reagem aos seus gestos. Podem 
ser estáticos ou em movimento, 
e também aparecer combinados 
a telas virtuais (2D ou 3D). 
OS VÍDEOS 
O Vision Pro reproduz conteúdo 
de três formas: em um telão que 
flutua na sua sala, num ambiente 
virtual que simula um cinema, ou 
no modo de realidade virtual, que 
ocupa todo o seu campo de visão. 
Isso depende do formato em que 
cada vídeo foi gravado. 
 
a rodinha de ajuste, o que 
coloca certa pressão na 
testa. Ele também tem 
uma tira superior, que 
passa pela parte de cima 
da cabeça (e não aparece 
nas imagens divulgadas 
pela Apple). Então não, o 
Vision Pro não é milagro- 
samente confortável. Mas 
é muito melhor do que 
os headsets tradicionais 
— inclusive porque a parte 
que fica apoiada na testa 
não é de borracha, como 
neles, mas de tecido. 
Essa peça veda bem a 
luz ambiente: assim que 
coloco o Vision Pro, tu- 
do fica completamente 
escuro. Aperto o botão 
da direita para ligá-lo e a 
sala novamente “se acen- 
de”: agora, nas telinhas do 
headset. Aí, algo extraor- 
dinário acontece. 
Quando são ligados 
pela primeira vez, os pro- 
dutos da Apple exibem a 
mesma mensagem: hello, 
em letras manuscritas. 
O Vision Pro também 
— sÓ que essa palavra é 
um objeto, com aproxi- 
madamente 1,5 metro de 
largura. A palavra vai se 
formando, como se escri- 
ta por uma mão invisível, 
e fica flutuando na sala. 
E ela, eis a parte incrível, 
realmente parece um ob- 
jeto real: reflete perfeita- 
mente a luz do ambiente, 
que revela seu volume e 
textura (um plástico liso) 
e projeta sua sombra no 
chão. O objeto é estável, 
sólido, “analógico” — não 
parece algo gerado por 
computador. E tão realista 
que causa certa dissonân- 
cia cognitiva: numa fração 
de segundo, meu cérebro 
me pergunta como um 
objeto de plástico duro e 
opaco, que parece pesado, 
pode flutuar no ar. 
À palavra some e inicio 
o processo de calibração 
do Vision Pro, movendo 
os olhos e estendendo as 
mãos à frente do corpo. 
É rápido. Assim que ele 
termina, aparecem os ico- 
nes dos apps — e começo a 
explorá-los. Vejo algumas 
fotos, exibidas numa te- 
la virtual cujo tamanho 
e posição posso ajustar 
com as mãos. Abro uma 
imagem panorâmica, de 
um bosque, que se ex- 
pande até preencher todo 
o meu campo de visão. 
Acesso dois “vídeos es- 
paciais”, que foram grava- 
dos com o próprio Vision 
Pro, em 3D. Eles têm uma 
limitação de tamanho, e 
só ocupam o centro do 
campo de visão (o Vision 
Pro escurece automati- 
camente o entorno pa- 
ra destacá-los). Os dois 
vídeos — uma cena de 
jovens acampando e uma 
festinha infantil - revelam 
uma imperfeição curiosa. 
Movimentos rápidos, co- 
mo as chamas da fogueira 
Aperto um botão e a 
sala se acende, agora nas 
telas do headset. E algo 
extraordinário acontece. 
 
e as mãos das crianças, têm 
flicker: vibram um pouco, 
como se o vídeo não con- 
seguisse acompanhar sua 
velocidade. Mas o efeito é 
discreto — e o resultado 
geral impressiona. 
Começo a explorar as 
funções de trabalho. Para 
selecionar alguma coisa, 
simplesmente olho para 
ela; para clicar, toco o po- 
legar e o indicador. Posso 
aumentar ou diminuir as 
janelas, ou colocá-las em 
qualquer ponto da sala, 
com gestos das mãos [ve- 
ja no infográfico ao lado]. 
Todos os elementos, não 
importa onde estejam, 
sempre têm foco perfei- 
to. Isso pode parecer um 
detalhe banal, mas é uma 
proeza tecnológica: os ou- 
tros headsets de realidade 
virtual só conseguem dar 
foco total bem no meio do 
campo de visão (tudo em 
voltafica meio borrado). 
Abro o navegador Sa- 
fari, que flutua na minha 
frente. A imagem é impe- 
cável. Mesmo mexendo a 
cabeça e a tela virtual, os 
contornos das letrinhas 
dos textos continuam 
perfeitos, sem nenhum 
“serrilhamento” (aliasing): 
um efeito que é causado 
pela falta de resolução, e 
afeta todos os headsets 
comuns. É que eles têm 
O headset 
SR ro 
qt gp Rio 
exibe os olhos 
Fe RT T ET g o 
ERA 
não quis mos- 
trá-la no teste. 
 
7a 8 megapixels — muito 
aquém dos 23 megapixels 
do Vision Pro. 
Clico no app Mensa- 
gens e, enquanto leio al- 
gumas, recebo uma cha- 
mada de vídeo. Aparece 
a cabeça de uma moça, 
renderizada em 3D de um 
jeito estranho: parece um 
personagem de videoga- 
me, só que um pouco mais 
real. Deve ser uma demo 
gravada, penso. Mas ela 
começa a conversar co- 
migo: é uma pessoa da 
Apple, que está ligando 
de outro Vision Pro. Sua 
cabeça aparece em 3D 
porque foi escaneada, e 
recriada em tempo real, 
pelo aparelho. Simulamos 
uma chamada de traba- 
lho, em que a funcioná- 
ria me mostra a maquete 
3D de um apartamento. 
O Vision Pro roda sozi- 
nho, mas também pode 
ser conectado sem fios 
a um Mac (com mouse e 
teclado, se você quiser). 
Faço uma sessão de 
meditação. O Vision Pro 
escurece a imagem da sa- 
la e no meio dela aparece 
um objeto colorido, que 
vai crescendo conforme 
respiro, até se desfazer 
em pétalas coloridas. 
E legal, mas menos im- 
pressionante que a pala- 
vra hello (talvez porque ele
 seja desenhado “no escu- ro”, e não interaja com a 
luz da sala). Vejo um clipe 
de Avatar 2 em uma tela 
3D, que flutua na minha 
frente. Com um clique, a 
sala desaparece e agora 
estou vendo o filme num 
cinema virtual, num te- 
lão com 30 m de largura. 
O tamanho, a distância e 
o ângulo da tela são con- 
vincentes — o Vision Pro 
só não desenha as cadei- 
ras e as pessoas da plateia. 
Os sons do filme vêm 
de todas as direções, e 
consigo discernir com 
clareza cada uma. Mas 
como o Vision Pro ge- 
ra sons que parecem 
estar atrás de mim, por 
exemplo, se os alto-fa- 
lantes dele [veja no info- 
gráfico na pág. 23] ficam 
na frente das orelhas? 
Na natureza, quando 
algum som chega até 
você, as ondas sonoras 
reverberam nas estrutu- 
ras das suas orelhas an- 
tes de entrar no ouvido. 
Dependendo do ângulo 
de que cada onda veio, ela 
descreve uma trajetória 
diferente na “concha” das 
orelhas. Com isso, sua 
frequência sonora sofre 
uma alteração precisa — 
que o cérebro reconhece, 
e usa para determinar de 
qual direção aquele som 
veio. Um mecanismo ge- 
nial, resultado de milhões 
de anos de evolução — e 
que o Vision Pro ex- 
plora com inteligência. 
Ele gera ondas sonoras 
“pré-reverberadas”, que 
enganam o cérebro. Por 
ISSO precisei escanear 
minhas orelhas — é pa- 
ra que o headset saiba 
como as ondas sonoras 
refletem dentro delas, 
e consiga simular isso. 
O resultado é convin- 
cente, porque o Vision 
Pro também leva em 
conta o formato e os 
objetos da sala. Ele ana- 
lisa o ambiente, usando 
suas câmeras e o sensor 
LiDAR [veja no infogrdfi- 
co|, e simula as reflexões 
que sons “reais” teriam ao 
se propagar pelo recinto. 
Abro um clipe com 
cenas de realidade virtu- 
al gravadas em primeira 
pessoa: estou escalando 
uma montanha, assistindo 
a uma cerimônia religiosa, 
vendo um jogo de bas- 
quete a beira da quadra. 
Às cenas, gravadas com 
câmeras profissionais, 
impressionam: numa de- 
las, que se passa em um 
estúdio, a cantora Alicia 
Keys parece estar sentada 
a apenas 20 cm de mim. 
Fecho o app de vídeos, 
ea sala reaparece. Abro o 
último aplicativo, com o 
icone de um dinossauro. 
À parede da sala se trans- 
forma numa tela, perfeita, 
Com um clique, a sala 
some - e agora o filme 
roda num cinema 
virtual, em um telão 
com 30 m de largura. 
 
 
 
 
 
 
do) [o TRSR tao 
et g geo 
 
 
A resposta da Meta 
A empresa de Mark Zuckerberg correu para apresentar seu novo 
headset, o Quest 3, na antevéspera do anúncio da Apple. Mas o 
produto, cuja data de lançamento ainda não foi divulgada, não é 
um rival para o Vision Pro - sua resolução, 9 megapixels, é muito 
menor (e o preço, US$ 499, também). Só que além da linha Quest, 
que lidera o mercado de capacetes de realidade virtual nos EUA, a 
empresa também está desenvolvendo modelos muito mais avançados. 
Um deles, que ainda está na fase de protótipo (veja na foto acima), 
promete “resolução retinal”: seria capaz de exibir gráficos totalmente 
realistas, como o Vision Pro. E ir além. O headset, que deverá ser 
mostrado na feira de computação Siggraph 2023, marcada para 
agosto em Los Angeles, poderá ser o primeiro com lentes de “plano 
focal variável”, que ajustam o foco dos objetos virtuais de acordo 
com a distância em que eles estão. Isso reproduz o funcionamento 
normalda visão humana (que desfoca naturalmente os elementos 
mais distantes), e promete um grau de imersão ainda maior. 
Foto Divulgação/Meta 
 
OA [Saci e 
acesso aos serviços 
Pr ANE no 
Polos a MRE Do ço og 
área na Ste o 
[CR DRE ato 
vem falar com 
você durante um 
conteúdo imersivo, 
a imagem se abre 
automaticamente 
para mostrar a pes- 
soa (abaixo); na hora 
Cia E AT iE 
usar teclado real ou 
virtual (abaixo). 
 
Os objetos virtuais 
são sólidos, estáveis, 
“analógicos”. Não 
parecem criados 
em computador. 
e nela aparece um dino. 
Após alguns segundos, o 
bicho sai da tela e dá dois 
passos para dentro da sa- 
la. Levanto e vou até ele: 
que bate na altura do meu 
ombro e é perfeitamente 
sólido e real, de todos os 
ângulos. Volto para o sofá, 
e o dinossauro se vai. Sur- 
ge uma borboleta, que voa 
lenta e delicadamente pelo 
recinto. Estendo o braço, 
e ela pousa nas costas da 
minha mão. Não sinto seu 
toque, pois ela não existe; 
fora isso, é uma borboleta 
de verdade. Fim da demo. 
Usar o Vision Pro é 
uma experiência trans- 
formadora. O equivalente 
moderno ao que a plateia 
dos irmãos Lumiêre deve 
ter sentido ao ver a pri- 
meira projeção de cine- 
ma, na Paris de 1895. Mas, 
além de um dinossauro, o 
headset também tem 
um “elefante na sala” — 
um porém. E não é só 
seu preço. E o conteúdo. 
A Apple anunciou uma 
parceria com a Disney, 
que irá fazer produções 
para o Vision Pro (quais, 
ainda não se sabe). Ele 
Vai precisar de bastante 
conteúdo para que as 
pessoas se disponham a 
comprá-lo. Só os filmes 
dos serviços Apple TV+ 
e Disney+, e os games 
do Apple Arcade (títulos 
2D, mais simples), talvez 
não sejam suficientes. 
A Apple está apostando 
nos desenvolvedores de 
aplicativos, uma parceria 
que deu muito certo no 
iOS (a App Store movi- 
menta US$ 1,1 trilhão por 
ano, o equivalente à meta- 
de do PIB brasileiro). Mas 
fazer conteúdo de reali- 
dade virtual é bem mais 
difícil e caro do que criar 
apps de celular. Além dis- 
so, nos primeiros anos, a 
criação de apps e “expe- 
riências” para o Vision 
Pro deverá dar prejuízo, 
porque pouca gente terá o 
headset. Mas, se ninguém 
topar fazer, não haverá 
conteúdo - e a base de 
usuários não crescerá. 
Trata-se de um ciclo que 
se realimenta há tempos 
no mundo da realida- 
de virtual, impedindo 
a popularização dessa 
tecnologia; um proble- 
ma que a indústria nunca 
conseguiu superar. 
Meio século atrás, o 
escritor inglês Arthur 
Clarke (autor de 2001) 
cunhou uma frase lendá- 
ria: “Qualquer tecnologia 
suficientemente avançada 
é indistinguível da magia”. 
O Vision Pro tem mo- 
mentos assim. Mas seus 
truques virtuais não eli- 
minam um fato concreto: 
até a magia mais encanta- 
dora precisa de mágicos 
para executá-la. O 
JULHO 2023 SUPER 27
UR 
 
Texto Reinaldo José Lopes Ilustração Vinicius Capiotti 
e Bruno Garattoni Design Luana Pillmann 
Eles inventaram as próprias técnicas e ferramentas. Sabiam 
cozinhar, tinham rituais sociais, eram capazes de criatividade 
artística. Trocaram conosco genes importantes; e não foram 
extintos pelas nossas mãos. Conheça as descobertas cientificas 
que estão mudando a imagem dos neandertais— e revelando 
que eles não foram os brutamontes que se imagina. 
 
 
PAR JA ER IE 
o o E) a o [o] N Q ps pr, E 
 
POR QUASE UM SÉCULO, quando al- 
guém pronunciava a palavra “neandertal”, 
a imagem que vinha à cabeça da maio- 
ria das pessoas era muito semelhante à 
que apareceu pela primeira vez em um 
desenho publicado em 1909, no sema- 
nário francês LIlustration. Assinada pelo 
pintor tcheco Frantisek Kupka, que rece- 
beu consultoria do paleontólogo francês 
Marcelin Boule para o trabalho, a gravura 
mostra uma criatura que mais parece um 
chimpanzé bipede. As pernas curtas es- 
tão arqueadas; os dentes, arreganhados; 
um dos punhos está cerrado, enquanto 
a outra mão segura uma espécie de por- 
rete. Dá para ver um crânio no chão de 
pedra, a poucos metros do neandertal. 
Não há quase nada de humano nesse su- 
jeito. Boule e Kupka provavelmente iriam 
querer arrancar os cabelos se soubessem, 
como a ciência descobriria muito tempo 
depois, que a grande maioria das pessoas 
carrega um pouco de DNA desse trucu- 
lento homem-macaco. 
E a grande questão, claro, é que de 
homem-macaco os neandertais não ti- 
nham nada. Depois de passarem tanto 
tempo levando fama de brutamontes 
das cavernas, os membros da espécie 
Homo neanderthalensis finalmente estão 
sendo retratados com um pouco mais 
de empatia e consideração. Isso graças a 
uma avalanche de novas pesquisas, que 
têm encurtado cada vez mais o suposto 
abismo que separaria os seres humanos 
atuais dessa população da Era do Gelo. 
Está cada vez mais claro que, em mui- 
tos aspectos de seu comportamento e 
capacidades mentais, os neandertais 
eram basicamente gente como a gente, 
Ei SUPER JULHO 2023 
Mais Inte- 
ligentes 
e dotados 
de armas 
melhores, 
os saplens 
terlam var- 
rido os ne- 
andertals 
da Europa 
e da Ásia. 
Registros 
fósseis, 
eas 
primelras 
análises 
de DNA, 
pareciam 
confirmar 
Isso. 
eo 
apesar de uma separação 
evolutiva de algumas cen- 
tenas de milhares de anos. 
Foram alguns detalhes 
sutis (não um extermínio, 
como se acreditava) que 
os fizeram desaparecer. 
E não sem antes que acon- 
tecessem diversos epi- 
sódios de miscigenação 
entre as espécies, fazendo 
com que fragmentos do 
genoma deles continuem 
se multiplicando nos cor- 
pos humanos até hoje. 
A 
À primeira coisa que você 
precisa saber para entender 
a trajetória dos neandertais 
é que, no contexto geral da 
evolução humana, a sepa- 
ração entre o nosso ramo 
da árvore genealógica e o 
deles é muito recente. Tu- 
do indica que os primeiros 
hominínios surgiram entre 
6 e7 milhões de anos atrás 
(o termo hominídeos, mais 
tradicional, engloba tam- 
bém chimpanzés e outros 
grandes macacos). 
Durante a maior parte 
do tempo, os hominínios 
viveram na Africa. Há 
menos de 2 milhões de 
anos, quando já existia 
 
 
o gênero Homo, ao qual 
pertence a nossa espécie, 
alguns desses ancestrais 
começaram a se espalhar 
para fora do continente 
africano, colonizando boa 
parte do Velho Mundo, 
chegando à Europa e à 
Ásia. Esse processo iria 
se repetir pelo menos 
mais duas vezes. 
Na segunda grande on- 
da migratória dos homini- 
nios, uma espécie que os 
especialistas chamam de 
Homo heidelbergensis se 
dividiu em dois grandes 
ramos, um africano e 
outro “imigrante”. A hi- 
pótese mais aceita hoje é 
que os H. heidelbergensis 
que ficaram na Africa 
acabariam dando origem 
ao chamado Homo sapiens 
anatomicamente moder- 
no (ou seja, nós), enquanto 
os que se multiplicaram 
na Europa seriam os ta- 
taravôs dos neandertais. 
Estimativas feitas 
com base em fósseis e 
no padrão de mutações 
das “letras” químicas 
do DNA indicam que 
essa bifurcação (ou “di- 
vergência”, como dizem 
os biólogos) dos ramos 
da árvore genealógica 
teria acontecido entre 
Soo mil e 800 mil anos 
atrás. Em escala evoluti- 
va, é bem pouco tempo. 
E não é só isso que 
nos aproxima dos ne- 
andertais. Antes da se- 
paração das linhagens, o 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ancestral comum entre 
as duas espécies já tinha 
desenvolvido um cérebro 
quase tão grande quan- 
to o que temos hoje. Já 
havia dominado o uso 
do fogo, a confecção de 
instrumentos de pedra 
relativamente complexos 
e provavelmente alguma 
forma de fabricação de 
vestuário, levando em 
conta que o H. heidelber- 
gensis já tinha colonizado 
regiões de clima tempera- 
do. (Isso porque esses ho- 
minínios também já não 
eram mais peludos como 
os chimpanzés. Descul- 
pa aí, seu Kupka.) Não é 
pouca coisa — e tanto os 
primeiros H. sapiens quan- 
to os neandertais mais 
antigos carregavam essa 
mesma bagagem quan- 
do começaram a trilhar 
caminhos separados. 
Mas, se a separação 
é assim tão recente, e 
se as pesquisas sobre o 
nosso genoma demons- 
traram que neandertais 
e H. sapiens podiam ge- 
rar descendentes férteis 
(algo que normalmente 
não é possível em cru- 
zamentos interespécies), 
por que diabos se con- 
solidou a ideia de que 
são duas espécies dife- 
rentes? Grosso modo, 
porque a separação foi 
longa o suficiente para 
criar diferenças genéti- 
cas marcantes entre es- 
sas duas populações de — 
Tudo apontava para 
uma substituição 
abrupta - cm que Os 
sapiens teriam dizi- 
mado os neandertais. 
JULHO 2023 SUPER 31
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o A SUBSTÂNCIA 
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analisaram resíduos químicos encontrados em dois 
fragmentos de ferramentas neandertais. Detectaram 
4 miligramas de piche - ele era usado como cola, para 
Eee pira diogo up cair fo ape e Es Te 
 
Pros aee de Amostra 2 
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OS TESTES 
E Os pesquisadores analisaram quimicamente as amostras 
de piche. Em seguida, testaram cinco métodos de produzir 
esse material (veja abaixo). Descobriram que os neandertais 
usaram a mais complexa e eficiente, em que a madeira 
é parcialmente enterrada antes da queima - a restrição 
de oxigênio deixa o piche mais concentrado. 
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3ZSUPERJULHO2023 
hominínios, e também 
houve um isolamento 
reprodutivo conside- 
rável, com centenas de 
milhares de anos sem 
cruzamentos entre elas. 
Coisas assim aconte- 
cem o tempo todo na na- 
tureza. Veja, por exemplo, 
o caso dos ursos-polares 
e dos ursos-pardos. Ba- 
tendo o olho, eles pare- 
cem bem diferentes. São 
duas espécies separadas. 
Mas podem cruzar entre 
si e gerar descendentes 
férteis, ainda que isso 
não seja comum. E tudo 
indica que, assim como os 
neandertais e o H. sapiens, 
essas duas espécies de ur- 
so se separaram há rela- 
tivamente pouco tempo 
(cerca de çoo mil anos). 
Ou seja: duas popula- 
ções de animais podem 
ser de espécies separadas, 
e mesmo assim manter 
algum grau de vínculo 
genético — em certos ca- 
sos, O suficiente para ge- 
rar descendentes férteis. 
Vários elementos ex- 
plicam por que a repu- 
tação dos neandertais só 
começou a melhorar para 
valer nos últimos anos. 
O primeiro é a visão um 
tanto distorcida sobre 
a origem do próprio H. 
sapiens que prevaleceu 
até pouco tempo atrás. 
E isso não dependia só do 
preconceito do começo do 
século 20. Alguns estudos 
bem mais modernos tam- 
bém pareciam retratar o 
H. neanderthalensis como 
uma espécie “obsoleta”: 
muito inferior aos seres 
humanos de anatomia 
moderna no que diz 
respeito a inteligência e 
complexidade do com- 
portamento. Por um lon- 
go período, os neandertais 
Os neandertais 
criaram uma téeni- 
ca sofistie ada para 
produzir piche - que 
usavam na confecção 
de ferramentas. 
foram considerados an- 
cestrais dos sapiens. 
Mas a partir dos anos 
1980, quando os estudos 
sobre o genoma humano 
começaram a decolar, ga- 
nhou força a hipótese de 
que a nossa espécie teria 
tido uma origem recente, 
na África. Os dados de 
DNA foram combinados 
com análises defósseis, 
que mostraram duas coi- 
sas: 1) era fácil diferenciar 
esqueletos antigos de ne- 
andertais e de H. sapiens, 
pois eles tinham anatomia 
bem diferente um do ou- 
tro; 2) não havia qualquer 
indício de que, na Europa 
e na Ásia, os neandertais 
tivessem dado origem 
aos humanos modernos. 
Em vez disso, parecia ter 
acontecido uma substitui- 
ção meio abrupta de um 
grupo pelo outro. 
Tudo indicava que nos- 
sos ancestrais basicamente 
tinham varrido os nean- 
dertais do Velho Mun- 
do, sem deixar vestígios. 
Quando pesquisadores 
como o sueco Svante 
Pããbo começaram a do- 
minar técnicas para obter 
fragmentos de DNA nean- 
dertal, nos anos 1990, es- 
sa tese ganhou mais força. 
Pããbo, que hoje trabalha 
no Instituto Max Planck 
de Antropologia Evolutiva, 
na Alemanha, conseguiu 
“ler” trechos do mtD- 
NA (DNA mitocondrial) 
dos neandertais. 
Esse tipo de material 
genético só está presen- 
te nas mitocôndrias, as 
usinas de energia das 
células, e é transmitido 
apenas pelo lado materno. 
Ou seja, o seu mtDNA é 
igual (ou quase igual, caso 
venha a sofrer mutações) 
ao da sua mãe. Acontece 
que o mtDNA tipicamen- 
te neandertal não apare- 
cia em nenhuma pessoa 
A clência 
acreditava 
que os ne- 
andertals 
tivessem 
uma dieta 
bem menos 
varlada 
que a dos 
saplens. 
Mas novos 
estudos 
revelaram 
que a all- 
mentação 
deles era 
quase tão 
rica quanto 
a nossa. 
 
viva hoje — um dado que 
ainda se mantém. Aí o 
especialista sueco e seus 
colegas propuseram, com 
base nisso, que os nean- 
dertais não tinham deixa- 
do nenhum descendente. 
Além de todos esses 
dados, os estudos sobre 
a cultura dos primeiros 
H. sapiens europeus pa- 
reciam indicar que eles 
estavam anos-luz à fren- 
te dos neandertais em 
quase todos os aspectos. 
Enquanto os neandertais 
pareciam ser estritamen- 
te carnívoros caçadores 
de grandes animais, os 
primeiros humanos mo- 
dernos teriam uma dieta 
muito mais diversificada, 
capturando pequenos 
mamiferos, aves, peixes, 
coletando ovos e vegetais. 
As ferramentas dos 
H. sapiens seriam bem 
mais sofisticadas, incor- 
porando várias peque- 
nas lâminas de pedra e 
também aproveitando 
matérias-primas como 
osso, marfim, conchas e 
madeira. E, o que talvez 
fosse o mais importante, 
só os humanos de anato- 
mia moderna teriam de- 
senvolvido formas de arte 
e simbolismo, fazendo 
pinturas deslumbrantes 
em cavernas, esculpin- 
do pequenas estatuetas, 
marcando a rocha com o 
contorno de suas mãos, 
enfeitando-se com pin- 
tura corporal e colares 
e criando algo muito 
parecido com os rituais 
xamânicos dos povos 
indígenas de hoje. 
Surgiu a hipótese 
de que tudo isso teria 
aparecido de forma re- 
lativamente rápida na 
linhagem da nossa espé- 
cie, numa espécie de “Big 
Bang cognitivo” há cerca 
de ço mil anos. Segundo 
iai 
JULHO 2023 SUPER 33
34 SUPER JULHO 2023 
essa ideia, algum tipo de alteração ge- 
nética teria reorganizado o cérebro dos 
H. sapiens — enquanto os neandertais, 
sem um salto evolutivo similar, teriam 
ficado para trás. 
Muito mais criativos e versáteis, os H. 
sapiens teriam empurrado os neander- 
tais rumo à extinção, competindo por 
recursos com eles ou mesmo por meio 
do confronto direto. E isso, de acordo 
com a tese, explicaria a total ausência 
de mtDNA neandertal nas pessoas de 
hoje. No fundo, diziam os defensores 
da ideia, os neandertais seriam só 
uma espécie particularmente versátil 
e habilidosa de primata — e apenas os 
H. sapiens poderiam ser considerados 
plenamente humanos. 
M 
Mas alguns pesquisadores nunca en- 
goliram esse contraste tão forte entre 
as duas espécies. E, ironicamente, o 
jogo começou a virar graças, em parte, 
aos estudos sobre paleogenética — os 
mesmos que, de início, pareciam ter 
lançado uma pá de cal sobre a repu- 
tação dos neandertais. Ocorre que o 
DNA mitocondrial é, na verdade, um 
pedaço minúsculo de material genético 
perto do tamanho do genoma humano 
propriamente dito, que fica armazenado 
no núcleo das células. O genoma inteiro 
tem 3 bilhões de pares de “letras” de 
DNA, enquanto o mtDNA soma apenas 
16.500 pares (mais ou menos o equi- 
valente, em caracteres, a uma matéria 
de capa da Super). Isso significa que a 
informação presente no mtDNA conta 
uma parte muito pequena da história 
evolutiva de uma espécie. 
Com o avanço da tecnologia de 
obtenção e análise de DNA antigo, a 
equipe de Svante Pãábo, ao lado de co- 
legas americanos, finalmente conseguiu 
montar o primeiro rascunho O do ge- 
noma neandertal completo em 2010. E 
aí Veio a surpresa: a herança genética 
neandertal estava presente, de forma 
significativa, nas populações moder- 
nas de origem não africana — ou seja, 
todos os europeus, asiáticos, nativos da 
Oceania e das Américas carregam um 
pouco de DNA neandertal. 
Às estimativas mais recentes indicam 
que essa contribuição gire em torno de 
Um saplens 
que viveu 
há 40 mil 
anos tinha 
19% de DNA 
neandertal 
(cinco ve- 
zes mais do 
que hoje). 
Ou seja, 
o legado 
genético da 
espécie fol 
se diluindo 
ao longo do 
tempo. Mas 
ele ainda é 
perceptível. 
2% do DNA humano mo- 
derno, com alguma varia- 
ção entre grupos — acredi- 
ta-se que a “porcentagem 
neandertal” seja um tiqui- 
nho maior nos povos do 
leste da Ásia, por exemplo. 
Outro estudo, feito em 
2020, também mostrou 
que mesmo grupos africa- 
nos atuais, de países como 
Quênia, Gâmbia e Nigéria, 
carregam cerca de 0,5% 
de DNA neandertal O. 
Provavelmente, devido a 
fatores como migrações 
“de retorno”, com grupos 
da Eurásia que voltaram 
para a África, ao longo 
das últimas dezenas de 
milhares de anos. 
À análise genética dos 
neandertais e sua com- 
paração com o DNA dos 
humanos modernos suge- 
rem que as duas espécies 
cruzaram diversas vezes, 
mas nem sempre com os 
mesmos resultados. Os 
encontros mais antigos 
teriam ocorrido cerca de 
70 mil anos atrás, no atual 
Oriente Médio — antes de 
o Homo sapiens começar 
sua grande dispersão pe- 
lo mundo. E por isso que 
tantas etnias humanas 
carregam um pouco de 
DNA neandertal: ele foi 
inserido no nosso geno- 
ma antes mesmo que os 
grupos de sapiens se se- 
parassem e começassem 
a formar povos distintos. 
Os restos mortais de 
um Homo sapiens que 
viveu há cerca de 40 mil 
anos, na atual Romênia, 
revelaram que ele tinha 
10% de sequências gené- 
ticas vindas dos neander- 
tais. É bem mais do que 
hoje, e compativel com 
um “evento de hibridi- 
zação” de quatro a seis 
gerações antes — ou seja, 
o sujeito pode ter tido um 
bisavô ou tataravô que era 
H. neanderthalensis. 
Fontes (1) A draft sequence of the Neandertal genome. S Paabo e outros, 2010. O Identifying and big : 
Ancestry in African individuals. ) Akey e outros, 2020.
Cerca de 
2% do DNA 
humano 
PEDE Ti 
LEEDS 
tais. Isso 
Es TEC T: 
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TE 
caracte- 
Esc to 
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e negativas. 
 
A herança genética 
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oa Ti TD Te TT TO 
influenciam mais de 20 características do organismo. 
ra RU 
SE Os humanos modernos possuem um pouquinho de DNA 
neandertal: 2% do genoma, em média (os povos asiáticos e 
europeus são os que mais têm genes neandertais; os africanos 
são os que têm menos, cerca de 0,5%). Esses genes estão 
distribuídos por todos os cromossomos, e têm relação com 
certas características físicas. 
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de "hibridação - cruzamentos entre nós e eles, 
a partir de 70 mil anos atrás. Isso turbinou nosso sistema 
imunológico, mas também gerou propensão a certas doenças. 
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Caracteristica correspondente 
 
Propensão à anemia 
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Rosistôncio 
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Autodostruição celula 
 
 
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Altura e nível de 
laquetas no sangue 
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(a mutação pode causar artrite) 
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