Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 SOI IV APG Giovanna Jansen 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC Semana 9, Problema 1 – 04/04/23 {problema) João, 19 anos de idade, residente do Estado do Amazo- nas, foi picado por uma cobra Crotalus sp na face lateral da perna direita. Procurou atendimento médico no Hospital do Município, por apresentar ptose bipalpebral, parestesia no local da picada, sem dor ou edema, sonolência, com fá- cies neurotóxica. Observou-se colúria logo após a picada, evoluindo com anúria. Assim, o acidente foi considerado de grau moderado e iniciou-se a hidratação endovenosa. <objetivos} • Descrever a epidemiologia etiologia e pa- togenia quadro clínico, complicações de diagnós- tico e tratamento da lesão renal aguda; • Analisar o manejo de acidentes por animais peçonhentos. (injúria renal aguda> É uma síndrome clínica caracterizada pela rá- pida deterioração da taxa de filtração glomerular (TFG), com acúmulo de produtos nitrogenados, inca- pacidade de manter os equilíbrios hidreletrolítico e acidobásico, e que cursa com diurese de volume va- riável. • Formas Clínicas • Pré-renal: Comprometimento da perfusão re- nal com diminuição do suprimento sanguí- neo, sem lesão parenquimatosa estabelecida (quadro potencialmente reversível se ces- sada a causa) o Causas: hipovolemia (traumatismos, hemorragias, queimaduras, grandes cirurgias), congestão circulatória, sepse, vasoconstrição renal, insufici- ência cardíaca, insuficiência hepá- tica • Renal: Decorre de lesões no parênquima re- nal, incluindo: o Nefrite intersticial aguda (NIA): me- dicamentos, infecção, neoplasia, idi- opática (causa desconhecida); o Necrose tubular aguda (NTA): nefro- toxina endógena ou exógena, ofi- dismo, isquemia, sepse; o Necrose cortical: acidentes peço- nhentos, intercorrências obstétricas o Glomerulonefrite difusa aguda/glo- merulonefrite rapidamente progres- siva (GNDA/GNRP); o Lúpus eritematoso sistêmico (LES); o Distúrbios vasculares: nefropatia is- quêmica, dissecção aórtica aguda. • Pós-renal: Obstrução bilateral das vias uri- nárias ou unilateral no caso de rim único anatômico ou funcional, por cálculos, neo- plasias, fibrose retroperitoneal, hiperplasia prostática, ligadura de ureter. Observação: na maioria dos casos de IRA, existe superposição de fatores fisiopatológicos com mais de um mecanismo de agressão renal. Quando iden- tificadas precocemente, as disfunções pré-renal e pós-renal são potencialmente reversíveis antes de comprometerem o parênquima renal, se corrigidas as causas determinantes. • Fatores de Risco • Depleção de volume • Congestão circulatória • Estenose da artéria renal • Insuficiência cardíaca • Arritmias cardíacas • Sepse • Rabdomiólise • Hiperuricemia • Hipotireoidismo • Síndrome compartimental abdominal • Diabetes e hipertensão arterial SOI IV APG 2 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC Giovanna Jansen • Doença renal crônica (DRC) • Medicamentos: antibióticos, ciclosporina, quimioterápicos, paracetamol, inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), estatinas, entre outros • Contrastes iodados • Cirurgia em pacientes com DRC • Cirurgias cardíacas. • Manifestações Clínicas • Oligúria; • Edema; • Fadiga, fraqueza; • Anorexia, náuseas, vômitos, diarreia; • Dispnéia, taquipneia; • Soluços; • Taquicardia, hipertensão arterial; • Letargia, fasciculações, mioclonias, câim- bras; • Convulsões, coma; • Petéquias, púrpura (vasculite), equimoses; • Hemorragia gastrointestinal; • Estertores pulmonares; • Arritmia cardíaca. • Exames complementares • Exame simples de urina (urina tipo I): protei- núria, hematúria (hemácias dismórficas su- gerem doença glomerular), cilindros granu- losos, células epiteliais tubulares renais, eo- sinofilúria (NIA), cilindros hemáticos, crista- lúria; • Eletrólitos na urina: sódio (> 20 mEq/ℓ) e ex- creção fracionada de sódio elevada (> 1%) sugerem NTA; • Hemograma: anemia; • Ureia e creatinina séricas: aumentadas; • Eletrólitos séricos: hiponatremia, hipocalce- mia ou hipercalcemia, hiperfosfatemia, hi- perpotassemia, hipermagnesemia; • Acidemia (acidose metabólica); • Ácido úrico: aumentado; • Tempo de sangramento: aumentado; • Diminuição da depuração da creatinina; • Ultrassonografia dos rins: causa renal – rins de tamanho normal (auxilia na diferenciação de injúria renal aguda e crônica); causa pós- renal – hidronefrose, obstrução de vias uri- nárias; • Biópsia renal: indicada quando há suspeita de IRA decorrente de doença sistêmica (vas- culite, LES); na NIA; quando houver suspeita de necrose cortical bilateral, de GNRP; ou na ausência de diagnóstico clínico provável, anúria ou oligúria grave por mais de 2 a 3 semanas. Não se justifica na NTA de causa determinada. Atenção! O uso de diuréticos pode alterar a fração de ex- creção de sódio, dificultando sua interpretação na diferenciação de IRA renal e pré-renal. Novos biomarcadores como cistatina C e NGAL, Kim-1, TIMP-2 e IGFBP-7 mostram-se promissores para a identificação da IRA e sua caracterização. Nos pacientes com TFG < 30 mℓ/min, a realização de ressonância magnética com gadolínio deve ser evitada pelo risco de fibrose sistêmica nefrogênica. • Diagnóstico Dados clínicos + exames complementares 3 SOI IV APG Giovanna Jansen 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC • Tratamento • Monitorar a diurese • Determinação diária do peso corporal • Correção das anormalidades hemodinâmicas (hipovolemia ou congestão) • Se a IRA for induzida por medicamentos, sus- pender o agente responsável. Evitar medica- mentos nefrotóxicos • Reajustar as doses dos medicamentos indis- pensáveis de acordo com a depuração de creatinina • Em formas oligúricas, realizar teste de es- tresse de furosemida • Tratar hiperpotassemia > 6 mEq/ℓ: gluco- nato de cálcio por via intravenosa (IV) em caso de alteração eletrocardiográfica; gli- coinsulinoterapia: 1 unidade de insulina sim- ples para cada 5 g de glicose; se houver aci- dose, administrar bicarbonato de sódio; re- sinas de troca de potássio intestinal • Terapia de substituição renal o Os métodos de terapia de substituição renal na IRA incluem: hemodiálise, hemo- filtração e diálise peritoneal o O momento para início de terapia de substituição renal, assim como a modali- dade a ser empregada, deve ser avali- ado em conjunto com o nefrologista o A terapia de substituição renal é indi- cada com urgência se houver hiperpo- tassemia e acidose metabólica refratá- rias, edema agudo de pulmão ou compli- cações sistêmicas da uremia. • Prevenção • Identificar pacientes de risco; • Manter estabilidade hemodinâmica; • Hidratação adequada; • Evitar sobrecarga volêmica; • Evitar medicamentos nefrotóxicos; • Administração criteriosa de meios de con- traste iodado; • Tratar obstrução de vias urinárias precoce- mente; • Monitorar pressão intra-abdominal quando indicado. • Complicações • Distúrbios eletrolíticos; • Acidose metabólica; • Arritmias cardíacas; • Edema pulmonar; • Insuficiência cardíaca; • Hemorragia; • Convulsões; • Pericardite. • Evolução e Prognóstico • As IRA comunitárias têm menor mortalidade que as IRA hospitalares; • IRA tem taxa de mortalidade elevada, po- dendo alcançar 80% nos doentes críticos, com falência de múltiplos órgãos; • Dados epidemiológicos mostram que a IRA é uma condição associada ao desenvolvimento de DRC tardia. SOI IV APG 4 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC Giovanna Jansen *ofidismo) Apresentam gravidade tanto pela morbidade, quanto pela mortalidade, além de poderem gerar sequelas físicas e psicológicas. A maioria das picadas ocorre nas extremidades corporais (pé, perna ou mão) e são mais frequentes de dezembro a abril, coincidindo com o período de chuvas. O sexo masculino é o mais acometido, na faixaetária de 20 a 64 anos. Os quatro grupos de serpentes peçonhentas do Brasil são: • Botrópico (jararaca) • Crotálico (cascavel) • Laquético (surucucu) • Elapídico (coral) Quando o paciente não apresenta sinais e sinto- mas de envenenamento na admissão e, após obser- vação de 12 horas, com ou sem marca da picada, ou se houver dor e edema discretos ou ausentes decor- rentes apenas da lesão da picada, o caso é definido como picada seca (dry bite), e o paciente pode re- ceber alta sem administração de soro antiofídico. É o mais frequente no Brasil, correspondendo a 90% dos casos em São Paulo e 69,3% dos casos em todo o território nacional. A alta prevalência desse tipo de acidente se dá provavelmente devido à distribuição geográfica e à alta densidade populacional dessas serpentes em algumas regiões do país. As jararacas são encontradas em diversos habi- tats, incluindo florestas, campos, savanas e áreas urbanas, e têm uma ampla variedade de presas, o que lhes permite sobreviver em diferentes tipos de ambientes. Além disso, as jararacas têm hábitos noturnos e são frequentemente encontradas próximas a trilhas, rios, casas e áreas de acampamento, o que aumenta as chances de encontro com seres humanos. A ação do veneno está relacionada à idade da serpente, uma vez que sua composição é adequada para o tipo de presa das jararacas (adultas: peque- nos mamíferos; jovens: lagartos e lacraias): • Inflamatória (proteolítica): liberação de substâncias vasoativas e citocinas inflama- tórias; (Adultos) • Coagulante: ação semelhante à trombina com consumo de fibrinogênio; (Adultos) • Hemorrágica: degrada componentes do en- dotélio vascular e inibe a agregação plaque- tária. (Jovens). 5 SOI IV APG Giovanna Jansen 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC • Manifestações Clínicas Os sintomas mais precoces são dor e edema no local da picada. Para avaliar a gravidade, deve-se dividir o membro picado em três segmentos: • Membro superior: (1) mão e punho; (2) ante- braço e cotovelo; (3) braço; • Membro inferior: (1) pé e tornozelo; (2) perna e joelho; (3) coxa. • Exames Complementares • Tempo de coagulação normal ou prolongado; • TAP e TTPA normais ou prolongados; • Hemograma: inespecífico (pode ocorrer leu- cocitose com neutrofilia, plaquetopenia); • Ureia e creatinina normais ou elevadas; • CPK elevado; • Exame simples de urina pode estar normal ou alterado. • Tratamento Imobilização do paciente em posição funcional, alívio da dor, profilaxia antitetânica quando indi- cada e hidratação e aplicação de soro antibotró- pico (SAB) de acordo com a gravidade do acidente: • Leve: SAB 3 ampolas IV • Moderada: SAB 6 ampolas IV • Grave: SAB 12 ampolas IV No Brasil, os principais representantes deste grupo são conhecidos como cascavéis, serpentes que costumam habitar áreas abertas e secas e que têm como característica o guizo. O veneno crotálico tem ação: • Neurotóxica: inibe a liberação de acetilco- lina, promovendo bloqueio neuromuscular; • Miotóxica: liberação de mioglobina e pode evoluir para rabdomiólise coagulante. • Manifestações Clínicas Em geral, podem ocorrer mal-estar, prostração, sudorese, náuseas e vômitos, sonolência ou inquie- tação e xerostomia. As manifestações neurológicas aparecem logo nas primeiras horas após o acidente. As principais são ptose palpebral, oftalmoplegia e fácies miastê- nica. SOI IV APG 6 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC Giovanna Jansen • Exames Complementares • TC normal ou prolongado • TAP e TTPA normais ou prolongados • Exame simples de urina – mioglobinúria • Hemograma – normal ou leucocitose com neutrofilia, plaquetopenia é rara • Ureia e creatinina aumentados em vigência de IRA • CPK normal ou aumentada. • Tratamento Hidratação intravenosa visando manter diurese de 30 a 40 mℓ/hora, não se recomenda o uso roti- neiro de solução alcalinizante e manitol, soro anti- crotálico (SAC) conforme a gravidade: • Leve: SAC 5 ampolas IV • Moderado: SAC 10 ampolas IV • Grave: SAC 20 ampolas IV • Complicações • Parestesias locais (reversíveis); • Insuficiência renal aguda por necrose tubular; • Insuficiência respiratória pode ocorrer, princi- palmente em crianças. A surucucu é a maior das serpentes peçonhentas das Américas, chegando a medir até 3,5 m de com- primento. São encontradas principalmente na re- gião Amazônica e na Mata Atlântica. • Manifestações Clínicas • Manifestações locais semelhantes ao aci- dente botrópico • Manifestações sistêmicas por estimulação vagal: hipotensão arterial, vertigem, visão turva, bradicardia e diarreia • Tratamento Em caso de SAL indisponível, SAB pode ser utili- zado com quase a mesma potência. Administração de soro antilaquético (SAL): • Moderado: SAC 10 ampolas IV • Grave: SAC 20 ampolas IV O veneno das serpentes Micrurus tem ação neu- rotóxica: • Pré-sináptica: bloqueia a liberação de ace- tilcolina; • Pós-sináptica: compete com a acetilcolina pelos receptores colinérgicos. 7 SOI IV APG Giovanna Jansen 4 º Período — Medicina — UNIFIPMOC • Manifestações Clínicas • Manifestações locais: dor local discreta, pa- restesias • Manifestações sistêmicas: surgem poucas horas após a picada, incluem ptose palpe- bral, oftalmoplegia, fácies miastênicas, difi- culdade para manter a posição ereta, difi- culdade para deglutir e insuficiência respi- ratória • Exames Complementares • Hemograma: inespecífico; • Tempo de coagulação normal; • CPK pode estar aumentada. • Tratamento Anticolinesterásico (neostigmina): administrar atropina 0,6 mg imediatamente antes da dose de neostigmina (0,02 mg/kg em adultos para evitar os efeitos), soro antielapídico (SAE) em doses de acordo com a gravidade: • Leve: Medicamentos sintomáticos e observa- ção 24h; • Moderado: SAE 5 ampolas IV • Grave: SAE 10 ampolas IV e considerar neos- tigmina. O soro antiofídicos deve ser aplicado por via in- travenosa, de preferência puro. Havendo reações anafilactoides, recomenda-se diluir o volume do soro em igual volume de soro glicosado a 5% ou em soro fisiológico. Havendo choque anafilático, deve-se continuar aplicando o soro se o acidente for grave. Nesse caso, o paciente deve receber assistência ventilatória (p. ex., entubação, oxigênio) e medicamentosa (p. ex., epinefrina, corticoides, anti-histamínico). Anti-histamínicos como tratamento profilático de reações de hipersensibilidade podem ser indica- dos, embora tal conduta não seja consensual, prin- cipalmente por prejudicar a avaliação da sintoma- tologia de envenenamento pelas frações neurotóxi- cas. Os soros heterólogos devem ser administrados em locais onde o paciente possa ser socorrido de imediato, caso ocorra reação grave a esse soro. Recomenda-se usar botas para caminhadas, evi- tar colocar as mãos em buracos, manusear com cui- dado plantas e materiais de construção, não colocar os pés no leito de rios e, principalmente, de lagos, onde a existência de arraias é conhecida. <Referências* PORTO, Celmo C.; PORTO, Arnaldo L. Clínica Médica na Prática Diária. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2022. E-book. ISBN 9788527738903. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/bo- oks/9788527738903/. Acesso em: 04 abr. 2023. SOARES, A. M.; FONSECA, R. M.; ZAMPIERON, K. C.; QUEIROZ, M. L. S. Epidemiologia dos acidentes ofídi- cos no Brasil. Revista da Sociedade Brasileira de Me- dicina Tropical, v. 50, n. 1, p. 1-7, 2017.
Compartilhar