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DESCRIÇÃO Fatores determinantes do desempenho físico em condições ambientais, como grandes altitudes, calor/frio e mergulho em profundidade. PROPÓSITO O domínio dos fatores determinantes do desempenho físico em altitudes elevadas, estresse térmico (calor e frio) e durante mergulho em profundidade é importante para o delineamento de programas de treinamento e fundamental para a atuação do profissional que prescreve exercícios físicos. OBJETIVOS MÓDULO 1 Identificar os efeitos da altitude, aclimatação, adaptações metabólicas e fisiológicas relacionadas à prescrição de exercícios MÓDULO 2 Descrever os mecanismos de regulação da temperatura corporal e aclimatação ao calor e frio, e complicações nos exercícios em temperaturas extremas MÓDULO 3 Reconhecer as relações volume-pressão e profundidade, e as características do mergulho livre e autônomo INTRODUÇÃO O meio ambiente é um fator importante para a programação de atividades físicas, influenciando no desempenho físico e cognitivo, particularmente, em provas atléticas. O corpo humano adapta-se às mais variadas condições ambientais de forma aguda ou crônica e o conhecimento da resposta fisiológica a ambientes diversos faz-se importante para o profissional que prescreve exercício físico, uma vez que pode ser exigido adaptar a intervenção às variações ambientais. Neste conteúdo, serão descritas as respostas fisiológicas principais a ambientes diversos, bem como o seu impacto sobre o desempenho físico e integridade do praticante. Adicionalmente, discutiremos como estratégias de compensação podem ser aplicadas para aumentar a segurança e otimizar o desempenho no contexto de programas de treinamento físico. As seguintes condições serão abordadas: exercício físico em grandes altitudes; estresse térmico e exercício (calor e frio); exercício durante mergulho em profundidade. MÓDULO 1 Identificar os efeitos da altitude, aclimatação, adaptações metabólicas e fisiológicas relacionadas à prescrição de exercícios EFEITOS FISIOLÓGICOS DA EXPOSIÇÃO A GRANDES ALTITUDES Vamos começar estudando as alterações fisiológicas agudas e crônicas pelas quais passa o organismo em grandes altitudes. Com base nisso, o impacto no desempenho físico será discutido, bem como estratégias para reduzi-lo em curto prazo. O processo de aclimatação à altitude e as suas consequências para o treinamento físico serão analisados. O estresse fisiológico relacionado à altitude decorre da redução da pressão parcial de oxigênio (pO2) no ar. Uma vez que a proporção de O2 no ar atmosférico (cerca de 21%) não se altera em função da altitude, a pO2 diminui proporcionalmente com o declínio da pressão barométrica. Ou seja, a composição relativa do ar permanece a mesma, mas como a pressão barométrica (ou atmosférica) diminui, em termos absolutos, a pO2 fica menor. Se, ao nível do mar, a pressão atmosférica é de 760mmHg, esse valor aos 3.000m é de 523mmHg, chegando a 200mmHg em altitudes de aproximadamente 9.000m. Imagem: Shutterstock.com ATENÇÃO Até a altitude de 3.000m, apesar da diminuição, a pO2 alveolar revela-se suficiente para uma saturação arterial de 90%. A partir desse limite, a saturação de O2 no sangue declina rapidamente, chegando a 70% aos 6.000m e a 24% aos 9.000m, o que impossibilita a vida em curtíssimo prazo. O limite máximo para residência permanente de seres humanos situa-se em aproximadamente 5.000m. À medida que a altitude se eleva, a difusão do O2 para o sangue torna-se mais difícil, com saturação insuficiente da hemoglobina, caracteriza-se a hipóxia. Em linhas gerais, a difusão de O2 dos alvéolos para os tecidos é determinada por gradientes de pressão. Uma menor pO2 alveolar repercute negativamente sobre a sua taxa de difusão para o sangue, resultando em uma menor saturação da hemoglobina, diminuindo o transporte de O2 para os tecidos. A hipóxia representa o principal obstáculo a vencer e consiste na condição que estimula as adaptações fisiológicas agudas e crônicas que ocorrem para compensar os efeitos da exposição à altitude. Em termos de desempenho físico, a principal consequência da hipóxia é a diminuição no consumo máximo de oxigênio (VO2máx). Em altitudes moderadas (2500-3000m), a redução do VO2máx é de cerca de 12-15%. Aos 7.000-8.000m, essa redução pode chegar à ordem de 80% em comparação ao nível do mar (MCARDLE et al., 2016). Dentre as respostas fisiológicas agudas à altitude, destacam-se as ventilatórias e cardiocirculatórias. Uma das primeiras consequências da exposição à altitude é o aumento da frequência respiratória e do volume corrente, com consequente elevação da ventilação pulmonar. Isso ocorre, principalmente, pela redução da pO2 arterial, que estimula os quimiorreceptores periféricos localizados nos seios carotídeos e arco aórtico. Esse processo inicial é rápido, elevando imediatamente em 65% a ventilação alveolar e compensando a exposição à altitude, ocorrendo assim que chegamos a locais elevados. Ao longo dos dias, a ação dos quimiorreceptores periféricos pode aumentar a ventilação pulmonar em até cinco vezes, com impacto favorável na pO2 alveolar (MAGALHÃES et al., 2002). Com o aumento do gradiente de pressão de O2 nos pulmões, melhora-se a taxa de saturação arterial e o transporte de O2 para os tecidos. Outra consequência do aumento da ventilação é a maior eliminação do dióxido de carbono (CO2), promovendo o que se chama de alcalose respiratória, ou seja, um aumento do pH arterial com desvio da curva de saturação da hemoglobina para a esquerda. A figura abaixo ilustra esses mecanismos iniciais de compensação da hipóxia. Imagem: Shutterstock.com Efeitos da hipóxia mediados pelos quimiorreceptores periféricos. Quanto às adaptações cardiovasculares, a hipóxia aguda provoca uma adaptação no Sistema Nervoso Autônomo, com aumento da atividade simpática. Isso leva à aceleração da frequência cardíaca e ao maior volume de ejeção, portanto, elevação do débito cardíaco em repouso e durante atividades físicas submáximas. DÉBITO CARDÍACO Quantidade de sangue colocada em circulação a cada minuto. EXEMPLO Estima-se que o débito cardíaco aumente em até 30-50% quando se chega a altitudes elevadas e que isso ajude a compensar a menor saturação de O2 no sangue arterial e a carência de sua distribuição aos tecidos. Um aumento de 10% no débito cardíaco durante esforços de intensidade moderada compensaria uma redução de 10% na saturação de oxigênio arterial. A hipóxia a partir dos 3.000m de altitude provoca efeitos agudos que contribuem para o comprometimento físico e cognitivo de pessoas não aclimatadas, por exemplo: Sonolência Fadiga Cefaleia Vertigens Náuseas javascript:void(0) Em altitudes extremas, entre 5.000 e 7.000m, isso pode evoluir para convulsões, contrações musculares espásticas e coma, seguido de morte. A exacerbação desses sintomas caracteriza condições conhecidas, como o edema cerebral agudo e edema pulmonar da altitude. Nesses casos, os indivíduos expostos agudamente a grandes altitudes devem ser rapidamente removidos para menores altitudes ou receber terapia de oxigênio, pois podem rapidamente evoluir ao óbito. Ambas as condições, costumam ocorrer de algumas horas a até dois dias da chegada à altitude. EDEMA CEREBRAL AGUDO A hipóxia pode causar dilatação nos vasos cerebrais, principalmente, as arteríolas, o que aumenta o fluxo de sangue aos capilares. A maior pressão pode fazer com que haja extravasamento de sangue, com sintomas bastante parecidos com os que se observa em acidentes cerebrovasculares. Os primeiros sinais são desorientação e dores de cabeça graves, acompanhados frequentemente de enjoo e náusea (JOHNSON; LUKS, 2016). EDEMA PULMONAR DA ALTITUDE A hipóxia causa efeito contrário nas arteríolas pulmonares, fazendo com que contraiam de maneira não uniforme no tecido pulmonar. Com isso, volumes excessivos de sangue são desviados para os vasos não contraídos, aumentando a pressão hidrostática exercida sobre eles.No caso dos vasos mais frágeis, como os capilares, há extravasamento de sangue com edema, condição que disseminada precipita disfunção pulmonar fatal. Terapia imediata com oxigênio é mandatória nesses casos (JENSEN; VINCENT, 2020). Uma condição menos agressiva da exposição aguda à altitude é conhecida como mal das montanhas. Muitas pessoas experimentam certo desconforto nos primeiros dias de permanência a altitudes superiores a 2.500m, incluindo cefaleia, náuseas, vertigem, enjoo, fadiga, insônia, perda de apetite, flatulência, constipação (Prisão de ventre.) e edema periférico. As chances de ocorrerem esses sintomas dependem não apenas da suscetibilidade individual, mas também da velocidade com que a altitude foi atingida – quão maior a altitude, mais indicadas são etapas intermediárias na ascensão. Outro aspecto que favorece o seu aparecimento é a realização de atividades físicas nas primeiras horas da chegada à altitude, provavelmente, em virtude da exacerbação da hipóxia cerebral (MCARDLE et al., 2016). Os sintomas do mal das montanhas manifestam-se nas primeiras 4-12h da exposição à altitude, agravando-se até 24h e regredindo progressivamente ao longo da primeira semana (MAGALHÃES et al., 2002). Para contrapor-se a esses efeitos, aconselha-se o repouso, principalmente, o sono adequado, acompanhado de hidratação permanente. A figura abaixo mostra um alerta para o mal das montanhas, encontrado em trilha nas Montanhas Rochosas (Colorado, EUA). ATENÇÃO Esteja alerta para esses perigos da altitude: MAL DAS MONTANHAS Independentemente do seu nível de aptidão física, tontura e desorientação, com frequência, ocorrem nessa altitude. Você pode desmaiar ou subestimar outros perigos. Se você sentir qualquer um desses sintomas, evite exercício físico e evite respirar devagar em espaços curtos. Cuidado com o exercício físico, retorne para altitudes mais baixas. Se os sintomas não diminuírem, procure por assistência médica. RELÂMPAGOS Se uma tempestade se aproximar, abrigue-se imediatamente ou se agache e mantenha somente seus pés em contato com o solo. Um dos lugares mais seguros é dentro de um veículo. HIPOTERMIA Mantenha-se seco, agasalhado e use uma touca. Foto: Shadowlink1014 / Wikimedia Commons / Domínio público Foto: Shadowlink1014 / Wikimedia Commons / Domínio público ATENÇÃO Esteja alerta para esses perigos da altitude: MAL DAS MONTANHAS Independentemente do seu nível de aptidão física, tontura e desorientação, com frequência, ocorrem nessa altitude. Você pode desmaiar ou subestimar outros perigos. Se você sentir qualquer um desses sintomas, evite exercício físico e evite respirar devagar em espaços curtos. Cuidado com o exercício físico, retorne para altitudes mais baixas. Se os sintomas não diminuírem, procure por assistência médica. RELÂMPAGOS Se uma tempestade se aproximar, abrigue-se imediatamente ou se agache e mantenha somente seus pés em contato com o solo. Um dos lugares mais seguros é dentro de um veículo. HIPOTERMIA Mantenha-se seco, agasalhado e use uma touca. ACLIMATAÇÃO À ALTITUDE Define-se aclimatação como as adaptações produzidas por mudanças no meio ambiente natural. Algumas respostas fisiológicas compensatórias à altitude ocorrem quase imediatamente, enquanto outras podem levar semanas ou até meses. Uma vez que se permaneça em altitudes elevadas durante vários dias, adaptações ocorrem no sentido de compensar os efeitos negativos da pO2 reduzida. Para tanto, a aclimatação envolve mudanças que concorrem para aumentar a pO2 alveolar e a saturação de O2 no sangue arterial. Com isso, recupera-se a capacidade de desempenho físico e cognitivo, em patamares similares ao que se exibiria ao nível do mar. Principais adaptações relacionadas à aclimatação A) Aumento da ventilação e capacidade de difusão pulmonares. B) Aumento na quantidade de hemácias. C) Aumento da vascularização dos tecidos e de sua capacidade de consumo de O2 para compensar a pO2 reduzida (JOHNSON; LUKS, 2016). O aumento da ventilação pulmonar se dá em duas fases, em um sistema de pesos e contrapesos. Em um primeiro momento, a baixa pO2 sanguínea estimula os quimiorreceptores periféricos da aorta e carótidas, levando a um aumento transitório da ventilação. Por outro lado, esse aumento da ventilação provoca um excesso de eliminação de dióxido de carbono (CO2), provocando a alcalose respiratória. ATENÇÃO Apesar de isso favorecer a liberação de O2 pela hemoglobina, esse estado prolongado não é compatível com um meio interno que permita uma homeostase ótima, devendo ser corrigido. Sabe-se que os quimiorreceptores centrais do centro respiratório são sensíveis à variação do pH decorrente do acúmulo do CO2, ou seja, a presença de CO2 induz um aumento da ventilação pulmonar com vistas a eliminá-lo, enquanto o contrário ocorre quando suas concentrações se encontram abaixo do normal. Logo, em curto prazo, esse efeito contrapõe-se àquele mediado pelos quimiorreceptores periféricos. Felizmente, essa “frenagem” diminui ao longo da primeira semana de exposição à altitude, o que permite com que os quimiorreceptores periféricos exerçam com plenitude sua estimulação. A principal causa dessa adaptação é atribuída aos rins, que aumentam a excreção de bicarbonato. O bicarbonato é uma das principais substâncias tampão que regulam a acidez metabólica. Desse modo, o pH do plasma e líquido cefalorraquidiano voltam progressivamente aos níveis normais, ainda que a excreção de CO2 se encontre aumentada (BISGARD; FORSTER, 1996). javascript:void(0) SUBSTÂNCIAS TAMPÃO Substâncias que reagem aos ácidos a fim de normalizar o pH. Em termos técnicos, admite-se que os rins compensam a alcalose respiratória, desencadeada pelo aumento da ventilação inicialmente mediada pelos quimiorreceptores periféricos, normalizando a ação dos quimiorreceptores centrais, permitindo uma maior elevação da ventilação pulmonar. O aumento da ventilação é acompanhado de uma melhoria na capacidade de difusão do O2 nos pulmões. Estima-se que em altitude essa capacidade possa aumentar cerca de três vezes ao observado ao nível do mar. Uma das razões para essa adaptação é o próprio aumento da ventilação pulmonar, com expansão do volume de ar nos pulmões. Isso estende a área de contato entre os alvéolos e os capilares, facilitando a difusão de O2. Foto: Shutterstock.com Paralelamente, temos uma elevação do volume de sangue nos capilares pulmonares, o que também concorre para aumentar a área de contato entre alvéolos e sangue. Enfim, a maior quantidade de sangue nos pulmões contribui para elevar a pressão arterial pulmonar, o que “empurra” mais sangue para os capilares e facilita o carregamento da hemoglobina. No que tange ao sistema de transporte de O2, a principal característica da aclimatação à altitude é o aumento na quantidade de hemácias e da concentração de hemoglobina. Na verdade, o principal estímulo para a produção de glóbulos vermelhos é a própria hipóxia, que estimula a secreção de eritropoietina (EPO) pelos rins e fígado. Após algumas horas de exposição à hipóxia, já se detecta aumento na secreção de eritropoietina, o que pode ser considerado um efeito agudo da altitude. O impacto sobre a concentração de hemoglobina é observado em aproximadamente uma semana (CAMPOS; COSTA, 1999). Somam-se ao hematócrito aumentado mudanças no sistema cardiocirculatório. A exposição aguda à altitude resulta em um aumento no débito cardíaco e isso tende a compensar parcialmente a menor saturação de O2 no sangue arterial. Por outro lado, à medida que o hematócrito aumenta, os valores de frequência cardíaca e volume sistólico retornam ao normal, ou seja, a sobrecarga aguda no sistema cardiocirculatório representada por elevação do débito cardíaco vai paulatinamente diminuindo à medida que sobrevêm os efeitos da aclimatação. SAIBA MAIS Outra adaptação importante em longo prazo é o aumento na quantidade de capilares nos tecidos, em processo denominado angiogênese. A maiordensidade capilar aproxima as superfícies de trocas gasosas, tornando mais fácil a difusão de O2 para os tecidos metabolicamente ativos. Enfim, a exposição crônica à hipóxia provoca adaptações na capacidade de consumo de O2 pelas células, com maior quantidade de mitocôndrias e atividade mais elevada das enzimas oxidativas (GUYTON; HALL, 2011). IMPACTO DA ALTITUDE NO DESEMPENHO FÍSICO O principal estresse fisiológico das grandes altitudes decorre da redução na pO2 atmosférica e alveolar. Se, em altitudes moderadas, a redução no transporte de O2 pode significar pouco para quem realiza atividades do dia a dia, diferenças mínimas na saturação arterial podem ter forte impacto na capacidade de desempenho em competições de alto rendimento, principalmente, em provas de predominância aeróbia. Foto: Shutterstock.com O custo fisiológico de qualquer atividade submáxima realizada em altitude é o mesmo que ao nível do mar, mas o impacto relativo é diferente quanto maior a altitude observada. Se a capacidade máxima de consumo de O2 (VO2max) diminui, qualquer esforço passa a representar um percentual maior desse máximo. Nos Jogos Olímpicos do México, por exemplo, a 2.300m, nenhum recorde foi estabelecido para provas com duração superior a 2,5min (imagem abaixo). Por outro lado, a altitude não exerce efeitos negativos sobre provas em que se predomina o sistema energético anaeróbio, conquanto o atleta não esteja sob os efeitos desconfortáveis do mal das montanhas. Isto é, quando um nível mínimo de aclimatação foi permitido, podendo favorecer modalidades para as quais a resistência do ar é um obstáculo, caso dos arremessos, corridas de velocidade, ciclismo ou saltos em distância. Foto: tompagenet / Wikimedia Commons / CC BY S.A 2.0 Prova de 1.500m rasos nos Jogos Olímpicos do México. Atividades intermitentes com participação aparentemente grande do metabolismo anaeróbio também são muito prejudicadas, uma vez que a recuperação entre estímulos fortes (corridas de velocidade) depende do metabolismo aeróbio. Esse é o caso dos desportos coletivos, como é sempre aventado por ocasião de competições de futebol em nosso continente. As partidas de longa duração e a capacidade de recuperação reduzida impõe aos jogadores um estresse fisiológico muito mais intenso do que ao que seriam submetidos ao nível do mar. Reduções no VO2max já podem ser detectadas por testes máximos realizados em altitudes de 600m. A partir daí, estima-se uma redução de 2% para cada 300m acima de 1.500m, ou aproximadamente 10% para cada 1000m de ascensão até os 6.000m, quando então a diminuição se dá rapidamente e em progressão exponencial. O impacto da pO2 atmosférica reduzida na saturação arterial compromete o desempenho em atividades aeróbias intensas a partir de altitudes de 2.000m. Acima dos 3.000m, patamar considerado de transição entre altitudes médias e elevadas, mesmo provas aeróbias de curta duração se veem comprometidas. Aos 4.000m, a redução do VO2máx é de aproximadamente 1/3, o que significa que indivíduos de 40 anos passam a exibir capacidade máxima compatível àquela encontrada em pessoas com 70 anos ou mais. A vida permanente acima dos 5.000m torna-se praticamente impossível. Por isso, alpinistas que se aventuram em altitudes superiores a esse patamar, frequentemente, contam com o apoio de cilindros com misturas gasosas contendo percentual elevado de O2. Com a aclimatação, as adaptações no sistema respiratório e circulatório voltam a permitir um adequado carreamento de O2 para a musculatura esquelética e a capacidade de trabalho que se exibia ao nível do mar é retomada. As pessoas aclimatadas são capazes de realizar um trabalho diário, mesmo em altitudes elevadas, equivalente ao de um habitante ao nível do mar. Por outro lado, deve-se desmitificar a premissa de que atletas que vivem em altitude teriam vantagem ao desempenharem suas provas ao nível do mar. Apesar de, realmente, contarem com uma contagem maior de hemácias ou densidade capilar tecidual mais rica, essas adaptações se dão para oferecer à musculatura esquelética uma quantidade de O2 similar ao que se observa em atletas que vivem ao nível do mar. EXEMPLO Os habitantes do Rio de Janeiro oferecem à musculatura um aporte de O2 similar àqueles que vivem em La Paz (3.600m), pelo simples fato de a pO2 atmosférica ser maior na primeira do que na segunda cidade (figura abaixo). Foto: Shutterstock.com Estádio Nacional em La Paz, Bolívia (3.600m). A capacidade de consumo de O2 da musculatura de indivíduos adaptados à altitude, uma vez que realizam atividades físicas no nível do mar, não se altera em função da mudança de ambiente. Esses atletas, efetivamente, oferecerão mais O2 que o necessário aos músculos em atividade quando se encontram ao nível do mar, mas esse excedente não conseguirá ser aproveitado pelo metabolismo. Assim, vantagens de desempenho não seriam auferidas por conta de fatores adaptativos, como maior hematócrito ou facilidade de liberação de O2 pela hemoglobina. Simplesmente, a quantidade de O2 no ar expirado será provavelmente maior do que o exibido pelos atletas que habitam no nível do mar. Uma questão que aparece quando se fala em treinamento em altitude é a possibilidade de se contribuir para o desempenho quando se retorna ao nível do mar. Pelo exposto, depreende-se que haja sérias dúvidas quanto à eficácia dessa estratégia. Além disso, há evidências de que a exposição à altitude possa reduzir a massa corporal magra, com atrofia das fibras musculares. Dentre as razões para o declínio da massa corporal e da massa magra, destacam-se o aumento da taxa metabólica basal, desidratação, menor capacidade de absorção dos nutrientes pelo trato intestinal e perda de apetite (anorexia da altitude) (MAGALHÃES et al., 2002). O menor aporte calórico decorrente da falta de apetite e a diminuição da carga de treinamento justificam as perdas musculares observadas em altitude. Em patamares superiores a 2.000m, é praticamente impossível administrar cargas de treinamento similares ao que se aplica ao nível do mar. Nas primeiras semanas, no caso de sintomas do mal das montanhas, as sessões de treino podem ser suspensas. A redução na carga de trabalho pode diminuir tanto que as condições gerais de desempenho na realidade declinam em comparação ao que se teria se o treinamento tivesse sido realizado ao nível do mar. Há evidências indicando que a intensidade do treinamento a 2.300m seria de aproximadamente 60% do VO2máx usualmente atingido ao nível do mar, percentual que se reduziria a 55% a 3.100m e 40% a 4.000m de altitude (CAMPOS; COSTA, 1999). Em suma, nenhum benefício em termos de adaptações hematológicas à altitude compensa os prejuízos decorrentes da diminuição das cargas de treino ao longo do período de aclimatação. As desvantagens podem ser sumarizadas A) Redução na intensidade e volume de treino. B) Desidratação, com redução do volume plasmático e sanguíneo. C) Mal das montanhas. D) Maiores períodos de recuperação necessários entre sessões de treinamento, favorecendo a ocorrência de sobretreinamento (overtraining). RECOMENDAÇÃO DE PROTOCOLOS E PRÁTICAS Em geral, o treinamento em altitude é aconselhado quando as competições ocorrerão naquele ambiente e o planejamento deve levar em conta as semanas necessárias para uma aclimatação fisiológica segura. Duas semanas parece ser um período adequado para a aclimatação a altitudes de até 2.300m. Acima disso, a cada 600m deve-se acrescentar uma semana, até uma altitude de aproximadamente 4.500m (JOHNSON; LUKS, 2016). Um aumento gradual no volume e na intensidade dos estímulos, até que se alcance o nível que se praticava ao nível do mar. Apenas a partir daí, pode-se falar em melhoria do desempenho em função do treinamento. A velocidade da aclimatação depende da própria altitude. Melhorias perceptíveis, principalmente, no que tange aos sintomas do mal das montanhas, dar-se-ão em alguns dias. Todavia, as adaptações principais,que permitem a retomada de níveis de atividades compatíveis ao que se tinha ao nível do mar, podem levar de duas a 3 semanas; acima dos 3.000m, esse período pode chegar a 6 semanas. Em montanhistas, cuja atividade caracteriza-se por longas ascensões em altitudes superiores a 3.000 m, aconselha-se que o desnível entre duas etapas consecutivas não exceda 300m, com duas noites devendo ser despendidas na mesma altitude a cada três dias (CAMPOS; COSTA, 1999). Foto: Shutterstock.com Uma alternativa à permanência em altitude para a aclimatação é o uso de câmaras hiperbáricas para criar artificialmente um ambiente de “altitude” (MCARDLE et al., 2016). Isso pode reduzir o tempo que o atleta deve permanecer em altitude para que os ajustes fisiológicos da aclimatação ocorram. Para atletas cuja previsão de treinamento não permite que se fique em altitude por tempo suficiente para a aclimatação, outra estratégia comumente aplicada é chegar ao local pouco tempo antes da competição. Com isso, tenta-se diminuir os efeitos do mal das montanhas, que se manifestam de algumas horas até poucos dias depois da chegada. Isso é arriscado e depende da individualidade do atleta, já que atividades físicas, mesmo moderadas, tornam-se intoleráveis para aqueles que sofrem os efeitos dessa condição. Para minorar os riscos e acelerar a recuperação, nos intervalos das competições, os atletas costumam fazer uso de misturas gasosas hiperóxicas (em cilindros). Deve-se notar que uma providência importante para a preservação do desempenho físico em altitude é a hidratação. O ar nas regiões montanhosas é, em geral, frio e seco, predispondo a uma maior perda de água corporal do que ao nível do mar, para que seja aquecido e umedecido nas vias áreas. ATENÇÃO Sinais como secura nos lábios, boca, nariz e garganta são comuns em altitude. Se a isso soma-se a perda de água por meio do suor e ventilação exacerbada durante as atividades físicas, tem-se um risco maior de desidratação (GUYTON; HALL, 2011). É importante que indivíduos que realizam atividades físicas em altitude sejam reidratados com frequência, mesmo que não sintam sede. Recomenda-se, para reduzir os riscos de desidratação, a ingestão de 3-5 litros de líquidos ao dia, bem como uma alimentação rica em carboidratos, que liberam maior energia do que as gorduras e são de mais fácil digestão (CAMPOS; COSTA, 1999). EXERCÍCIO FÍSICO EM GRANDES ALTITUDES O especialista Paulo de Tarso Veras Farinatti apresenta um resumo do módulo, aplicando os conceitos à situação de exercício. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. SÃO RESPOSTAS FISIOLÓGICAS AGUDAS À ALTITUDE: A) Aumento do hematócrito, alcalose respiratória e redução da frequência cardíaca em repouso B) Aumento do débito cardíaco, aumento do volume corrente e redução da atividade simpática C) Aumento da atividade simpática, alcalose respiratória e aumento da secreção de eritropoietina D) Aumento do hematócrito, excreção de íons bicarbonato e redução do volume sistólico E) Aumento da atividade parassimpática, redução do débito cardíaco e desvio da curva de dissociação da hemoglobina para a direita 2. PODE-SE AFIRMAR QUE O TREINAMENTO EM ALTITUDE: A) Favorece o desempenho ao nível do mar, pelo aperfeiçoamento do sistema de transporte de oxigênio. B) Melhora a capacidade de consumo de oxigênio da musculatura do atleta em virtude de cargas de treinamento com intensidade relativa maior. C) Ajuda na aclimatação, pois os sintomas do mal das montanhas são atenuados pela prática de atividades físicas. D) Revela-se útil para o atleta que competirá em altitude, com pouco ou nenhum efeito sobre o seu desempenho ao nível do mar. E) Deve ser feito antes da aclimatação, para acelerar as respostas fisiológicas que adaptam o atleta a altitudes elevadas. GABARITO 1. São respostas fisiológicas agudas à altitude: A alternativa "C " está correta. A exposição aguda à altitude aumenta a atividade simpática, com elevação do débito cardíaco. Paralelamente, a hipóxia estimula os quimiorreceptores periféricos, com aumento da ventilação pulmonar e maior eliminação de CO2. Isso eleva o pH plasmático, caracterizando alcalose respiratória. Enfim, a hipóxia estimula a secreção de eritropoietina, de maneira a estimular a produção de hemácias com incremento do hematócrito em médio prazo. 2. Pode-se afirmar que o treinamento em altitude: A alternativa "D " está correta. Os efeitos deletérios da altitude limitam a intensidade e o volume do treinamento, o que é contraproducente. Além disso, possíveis adaptações no hematócrito não se refletem em desempenho ao nível do mar, já que a mudança de ambiente não interfere na capacidade de consumo da musculatura esquelética. MÓDULO 2 Descrever os mecanismos de regulação da temperatura corporal e aclimatação ao calor e frio, e complicações nos exercícios em temperaturas extremas MECANISMOS DE REGULAÇÃO DA TEMPERATURA CORPORAL Agora, discutiremos os efeitos das variações da temperatura ambiente sobre o desempenho físico. As respostas adaptativas agudas e crônicas ao calor e frio serão detalhadas, bem como a forma pela qual influenciam na capacidade de realização de esforços físicos de diferentes tipos. Estratégias para otimizar o desempenho em condições extremas de calor e frio serão apresentadas, visando diminuir o risco de intercorrências que possam comprometer a integridade do praticante. O corpo humano conta com mecanismos de regulação da temperatura corporal complexos e eficientes, que operam para aumentar ou reduzir a troca de calor com o meio ambiente. Isso é importante para a sobrevivência, pois estima-se que os seres humanos possam tolerar um declínio profundo da temperatura corporal de 10°C, mas um aumento de temperatura de apenas metade desse valor. Em condições normais, a temperatura pouco varia, mantendo-se relativamente constante entre 36,5 e 37°C. A temperatura central sobe quando os mecanismos biológicos que produzem calor ultrapassam aqueles que o dissipam e vice-versa. Os mecanismos de termorregulação permitem com que se dissipe calor quando a temperatura corporal sobe e haja retenção quando ela desce, de maneira a se manter a temperatura tecidual dentro dos limites compatíveis com os processos celulares. Imagem: Shutterstock.com A produção de calor pelo organismo deve-se ao metabolismo, no qual há certo grau de ineficiência, fazendo com que nem toda a energia metabólica produzida seja efetivamente utilizada pelas células. Quanto maior a taxa metabólica, maior a produção de calor, logo, ao realizarmos exercícios físicos, mais calor será gerado em relação ao repouso. Para Guyton e Hall (2011), os seguintes fatores estariam relacionados a uma maior ou menor produção de calor pelo corpo humano: A) Intensidade do metabolismo, inclusive a atividade muscular acima da basal. B) Efeito de hormônios que alteram as taxas metabólicas (como tiroxina, hormônio do crescimento, testosterona ou catecolaminas). C) Efeito termogênico dos alimentos, associado à energia gasta para a sua digestão, absorção e armazenamento. O excesso de calor produzido pelas variações nas taxas metabólicas deve ser constantemente dissipado. Uma das estratégias é a variação da temperatura cutânea, para facilitar a dissipação de calor dependendo das condições ambientais. Assim, o calor produzido pelos órgãos mais profundos é transferido pela circulação para a pele, onde há melhores condições de troca com o meio ambiente. Portanto, a dissipação de calor é definida pela velocidade com que é conduzido de regiões centrais do corpo para a pele, bem como pela capacidade de o tecido cutâneo transferir calor para o ambiente. ATENÇÃO É importante mencionar que o tecido cutâneo é extensamente vascularizado e tem grande capacidade de acomodar sangue. A velocidade e o montante do fluxo venoso para a pele podem variar de quase nenhum a aproximadamente 30% do débito cardíaco total. A variação de fluxo de sangue para a pele é controlada por mecanismos nervosos ehumorais, levando a uma maior ou menor vasoconstrição. Deve-se notar que, para as células sobreviverem, é tão importante reter quanto eliminar calor. Quando a temperatura ambiental é baixa, estruturas responsáveis pelo isolamento térmico do organismo desempenham papel fundamental. A pele e os tecidos subcutâneos, particularmente, os adipócitos, representam a primeira defesa contra a perda de calor. A gordura subcutânea tem menor capacidade de condução de calor que os demais tecidos. Desse modo, quando não há canalização de maior aporte sanguíneo para a pele, essa barreira adiposa-epitelial ajuda a reter calor, mantendo a temperatura central em níveis normais, mesmo que a temperatura cutânea diminua bastante. Em suma, a pele consiste em um sistema “regulador” das trocas de calor com o ambiente. Em caso de excesso de calor central, aumenta-se o fluxo sanguíneo cutâneo para sua dissipação. Quando a temperatura ambiente é muito baixa, para evitar perdas de calor, há redução do fluxo sanguíneo periférico, passando a pele e a gordura subcutânea a desempenharem papel de “isolantes térmicos”. MECANISMOS FÍSICOS DAS TROCAS DE CALOR Agora, vamos descrever alguns dos mecanismos físicos pelos quais a troca de calor é realizada. Na verdade, a superfície corporal perde calor para o ambiente por trocas secas, como a radiação, condução e convecção, bem como através de trocas úmidas, ou seja, a evaporação da água. RADIAÇÃO O corpo emite calor por meio de raios infravermelhos; quanto maior a diferença de temperatura entre o corpo e o ambiente, maior a perda por radiação. CONDUÇÃO A troca se dá pelo contato entre as moléculas adjacentes de corpos físicos. Esse mecanismo responde por um pequeno percentual (< 5%) das trocas de calor com o ambiente. SAIBA MAIS Apesar de poder haver trocas entre o corpo e o ar mais frio que o circunda, uma vez que as temperaturas se igualam não há mais troca, a não ser que o ar seja substituído. Nesse caso, estamos falando do mecanismo de convecção, em que as trocas de calor se dão em virtude do movimento de fluidos (ar ou água) que circundam o corpo. Uma vez que sempre há movimento de ar aquecido por camadas de ar mais frio, sempre há dissipação de calor por convecção (~15% do total). No entanto, isso pode ser maximizado em condições de vento, pois a renovação de ar é muito mais rápida. A perda de calor por convecção em ambiente aquático é muito maior que a observada no ar, devido ao fato de a água possuir maior condutividade e armazenar centenas de vezes mais calor que o ar atmosférico (maior calor específico). Dependendo da temperatura da água, torna-se impossível aquecer o corpo por meio de contrações musculares, com a perda intensa de calor levando rapidamente à hipotermia. A evaporação da água consiste em importante mecanismo de perda de calor, ocorrendo através de pele e vias respiratórias. As moléculas de água têm grande capacidade de armazenar calor e, para que passe ao estado gasoso, grande quantidade de energia é necessária. Assim, sempre que há evaporação na superfície da pele, o calor necessário para essa transformação é removido, diminuindo sua temperatura e facilitando a transferência de calor do centro do corpo. O mecanismo da evaporação é extremamente importante em temperaturas elevadas. De fato, os mecanismos de radiação, condução e convecção só se revelam eficazes quando a temperatura ambiente for menor que a cutânea. Quando as condições forem inversas, a tendência do corpo é ganhar, e não perder, calor e a única forma pela qual pode eliminá-lo é a evaporação. A taxa de perda de calor pela evaporação dependerá da umidade do meio ambiente. Quando a umidade relativa do ar ultrapassa os 60%, a evaporação é dificultada. Elevações perigosas na temperatura central podem se dar em indivíduos que realizam atividades de intensidade vigorosa durante mais de 30 minutos em ambientes com temperaturas acima dos 35°C e umidade relativa do ar de 60%, condições tipicamente encontradas em boa parte do território brasileiro. Os mecanismos das trocas de calor são ilustrados na figura abaixo. Imagem: BruceBlaus / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 Mecanismos de troca de calor. Qualquer obstáculo adicional à evaporação tenderá a elevar a temperatura central em ambientes quentes e úmidos. Esse é o caso de vestimentas inadequadas. Idealmente, deve-se proporcionar a maior superfície de contato possível da pele com o meio ambiente, favorecendo as perdas de calor por evaporação e convecção. O uso de agasalhos ou outras vestimentas que fazem “aumentar a transpiração” são contraindicadas nesse tipo de condição ambiental. Deve-se notar que isso é comum, principalmente, entre aqueles que imaginam que essa estratégia poderia favorecer o emagrecimento (água não é gordura!). ATENÇÃO Em temperaturas frias, as roupas ajudam a criar uma camada de ar aquecido em contato com a pele, dificultando as perdas de calor por condução e convecção. Deve-se notar que a eficiência na retenção do calor é perdida se as vestimentas ficam úmidas. Lembre-se de que a condutividade da água ao calor é elevada, podendo aumentar a velocidade de transmissão de calor através dos tecidos das roupas em mais de 20 vezes. A evaporação ocorre constantemente a partir da pele e do sistema respiratório, mesmo que não a percebamos, podendo ser regulada pelo mecanismo da sudorese, que é o mecanismo pelo qual o corpo perde calor quando se excede a capacidade de a vasodilatação cutânea dissipá-lo na mesma velocidade com que é produzido. As glândulas sudoríparas secretam suor em resposta à estimulação do hipotálamo pelo excesso de calor. Esses impulsos nervosos são transmitidos por meio do Sistema Nervoso Simpático para toda a pele, ativando as glândulas sudoríparas inervadas por fibras colinérgicas. A resposta de sudorese é sistêmica e não localizada, essas glândulas são sensíveis às catecolaminas circulantes, o que é fundamental para o aumento da sudorese durante o exercício. O suor é composto principalmente de água, mas pode conter outras substâncias retiradas do sangue, como ureia, ácido úrico e cloreto de sódio. Ao ser liberado, o suor inicia um processo de evaporação, durante o qual calorias são transferidas para a água e se resfria a superfície da pele. Logo, não é a produção de suor em si que dissipa calor, mas a sua evaporação. É importante manter isso em mente, pois o resfriamento através da evaporação é prejudicado por manobras como o enxugamento contínuo da pele com toalhas durante a transpiração. Uma maior sudorese aumenta a perda de água e eletrólitos, desencadeando ajustes hormonais para conservá-los. Em ambientes quentes, a urina torna-se mais concentrada, enquanto o débito urinário em climas frios aumenta em virtude da menor eliminação de água pelo suor. A secreção de aldosterona também se eleva, para que haja maior retenção de sódio nos túbulos renais. A ação da aldosterona leva a uma redução na concentração de sódio no suor após repetidas exposições a estresse térmico. No caso de hipoidratação há maior liberação de vasopressina, cuja ação é antidiurética. Atividades físicas intensas e desempenhadas por longo tempo têm efeito similar à hipoidratação sobre a secreção de aldosterona e vasopressina (MCARDLE et al., 2016). CONTROLE NERVOSO DA TERMORREGULAÇÃO: O HIPOTÁLAMO As respostas às variações na temperatura central, temperatura ambiente e mecanismos de retroalimentação nervosa concorrem para regular a temperatura corporal e praticamente todos esses mecanismos são mediados por centros nervosos no hipotálamo. Imagem: Shutterstock.com Pode-se dizer que o hipotálamo atua como uma espécie de termostato, regulado para manter a temperatura central em torno de um nível crítico denominado ponto de ajuste (37 ± 1°C). Para tanto, integra mensagens provenientes de receptores responsáveis pela detecção de mudanças na temperatura corporal. Os principais receptores de temperatura localizam-se em região denominadapré-ótica hipotalâmica. Nessa área, localizam-se neurônios sensíveis ao calor (2/3 do total) e ao frio (1/3 do total), cuja atividade aumenta ou diminui em função de variações da temperatura central abaixo ou acima dos limites de normalidade. Quando os neurônios pré-hipotalâmicos sensíveis ao calor são estimulados, aumenta-se a sudorese e é processada a vasodilatação cutânea via ativação simpática. Além da área pré-ótica, há receptores em outras regiões do corpo, notadamente, o tecido cutâneo (temperatura periférica) e outros mais profundos (temperatura central). A pele é principalmente sensível ao frio, contando com cerca de 10 vezes mais receptores desse tipo do que receptores de calor. Quando a temperatura da pele diminui, reações nervosas reflexas ocorrem no sentido de preservar e produzir mais calor, como a geração de contrações musculares sob a forma de calafrios, vasoconstrição cutânea e inibição da sudorese. Os receptores profundos de temperatura são mais sensíveis ao frio, localizando-se majoritariamente na medula, nas vísceras e em torno das veias abdominais e torácicas. Detectam variações na temperatura central no sentido de prevenir situações de hipotermia. Sinais advindos de todos esses receptores de temperatura são integrados no hipotálamo posterior, desencadeando as reações de termorregulação. Duas vias ativam esse centro nervoso: A perfusão sanguínea estimula diretamente o hipotálamo, que detecta as variações de temperatura do sangue. Informações aferentes dos receptores cutâneos e dos órgãos profundos. As respostas mediadas pelo hipotálamo, através das quais se aumenta a dissipação do calor, são: Vasodilatação dos vasos da pele, através da inibição da atividade simpática. Aumento da sudorese – aumentos de 1°C na temperatura corporal provocam sudorese suficiente para elevar 10 vezes a dissipação de calor. Diminuição da produção de calor, inclusive termogênese relacionada ao metabolismo. Por oposição, os mecanismos principais de retenção do calor face ao frio são: Vasoconstrição cutânea por ativação simpática. Piloereção. PILOEREÇÃO Elevação dos pelos, pouco importante nos seres humanos, mas importante nos animais. Aumento da termogênese, com elevação do tônus muscular e calafrios. Apenas a ocorrência de calafrios é capaz de elevar o metabolismo em 3 a 5 vezes. O incremento do metabolismo celular é também estimulado por uma maior secreção de catecolaminas e tiroxina. A figura abaixo apresenta uma ilustração esquemática dos mecanismos de termorregulação. Imagem: Shutterstock.com Mecanismos homeostáticos da termorregulação. TERMORREGULAÇÃO DURANTE O EXERCÍCIO FÍSICO A temperatura corporal eleva-se durante o exercício e varia com as temperaturas extremas do ambiente, uma vez que os mecanismos de termorregulação não conseguem normalizá-la. Quando calor excessivo é produzido durante exercício intenso e prolongado, a temperatura corporal pode se elevar, temporariamente, para até 38,3 a 40°C. Por outro lado, em situações de frio intenso, a temperatura pode cair até valores abaixo de 36,6°C. Durante o exercício em climas quentes, duas demandas circulatórias competem entre si: A) Provimento de aporte sanguíneo adequado à musculatura em atividade. B) Maior aporte de sangue aos vasos cutâneos para a dissipação do calor. javascript:void(0) Para uma mesma intensidade submáxima de exercício, a sobrecarga cardiovascular tende a aumentar em ambientes com temperatura elevada. No caso de sudorese intensa, a redução do volume plasmático faz com que a preservação de um débito cardíaco adequado ao esforço seja feita através do aumento da frequência cardíaca. Para que se mantenham os fluxos sanguíneos exigidos pelo nível de vasodilatação cutânea e demandas metabólicas dos músculos, o suprimento a outros órgãos é sacrificado. Dentre os locais mais comprometidos, destacam-se a circulação esplâncnica, fígado e rins. A limitação de aporte sanguíneo para esses órgãos por períodos relativamente longos pode resultar em complicações hepáticas e renais tipicamente observadas durante exercícios realizados no calor. O aumento da temperatura central durante os exercícios físicos predispõe à fadiga precoce, mesmo em indivíduos treinados que toleram níveis mais altos de hipertermia. Um dos fatores que contribuem para a fadiga em ambientes quentes é uma maior concentração de lactato durante atividades submáximas. Isso ocorre em virtude do desvio de sangue para a pele, com menor circulação de lactato para as células musculares inativas e fígado. ATENÇÃO Outra variável é a maior predisposição à fadiga central, que se instala quando a temperatura central atinge 39-40°C. Nesse patamar, a própria ativação muscular via córtex cerebral torna-se comprometida. Temperaturas próximas a esses valores são observadas em atividades contínuas com intensidades moderadas a vigorosas (75% da capacidade máxima) realizadas em ambiente confortável, independentemente do consumo absoluto de oxigênio. A fadiga gerada pelo estresse térmico relaciona-se mais à intensidade relativa do exercício do que à intensidade absoluta. Em temperaturas ambientais elevadas, ela pode ocorrer em intensidades baixas ou moderadas. Por outro lado, indivíduos mais bem condicionados podem realizar trabalhos absolutos maiores do que aqueles com condição física inferior, exibindo níveis equivalentes de temperatura central. Além disso, para uma mesma intensidade relativa de esforço, indivíduos treinados exercitam-se com temperatura central menor. A incapacidade de se exercitar devido ao calor caracteriza a exaustão térmica, condição patológica mais comum entre praticantes de atividades extenuantes em climas quentes. A exaustão térmica decorre da sudorese excessiva, que leva à falência cardiovascular em virtude das demandas concorrentes de aumentar o fluxo de sangue para a pele e músculos. A interrupção do exercício resulta de uma combinação de efeitos deletérios da hipertermia, como redução da ativação muscular periférica devido à diminuição da ativação central (fadiga cerebral), desidratação, fadiga muscular, esgotamento dos estoques de energia e desequilíbrio eletrolítico. Foto: Shutterstock.com Os sintomas mais frequentes são as dores de cabeça, mal-estar, taquicardia, ansiedade, tontura, náusea e hipotensão. Em geral, a recuperação é imediata diante da ingestão de líquidos, resfriamento e repouso. Outro acometimento comum é a insolação. Nesse caso, temos uma emergência médica, identificada quando a temperatura central ultrapassa os 41°C, causada pela temperatura ambiente elevada e diminuição do fluxo de sangue para a pele, que se apresenta quente e ressecada. Na insolação por exercício, esse quadro ocorre em paralelo à manutenção da sudorese, com comprometimento do sistema nervoso central caracterizado por vertigens, enjoo, desorientação e perda da consciência. O aumento demasiado da temperatura central ainda pode provocar rabdomiólise, lesões hepáticas e renais (ACSM, 2007). RABDOMIÓLISE Destruição das fibras musculares, com extravasamento de componentes proteicos na circulação. javascript:void(0) A principal consequência da termorregulação durante o exercício físico realizado em ambientes quentes e úmidos é a perda hídrica e eletrolítica, com risco de hipoidratação. Em casos extremos, a redução do volume plasmático pode causar insuficiência circulatória, com a temperatura central elevando-se a valores que colocam a vida em risco. Atividades físicas de intensidade moderadas realizadas por 60 minutos podem causar uma perda de suor da ordem de 0,5 a 1L (ACSM, 2007). Em indivíduos aclimatados, as perdas líquidas podem chegar a 3L/h durante atividades intensas. A perda de líquido dentro e fora das células diminui a capacidade de eliminar calor, com perda de volume plasmático e redução da transpiração, em um ciclo vicioso que contribui para elevar cada vez mais a temperatura central. A sobrecarga cardiovascular também se eleva, com dependência maior dafrequência cardíaca para preservação do débito cardíaco e manutenção do fluxo sanguíneo cutâneo. Para cada litro de perda hídrica, a frequência cardíaca durante o exercício aumenta 8bpm, enquanto o débito cardíaco decresce 1L. Esses efeitos combinados diminuem a tolerância ao esforço, principalmente, em atividades aeróbias prolongadas. De forma geral, os mecanismos que concorrem para diminuir o desempenho físico em função da desidratação incluem hipertermia, maior sobrecarga cardiovascular, menor eficiência das funções metabólicas e maior percepção do esforço. Desequilíbrios hidroeletrolíticos têm sido associados às cãibras musculares associadas ao exercício. Trata-se de contrações musculares espasmódicas e dolorosas, em geral, observadas após exercício prolongado e extenuante em temperaturas elevadas (imagem a seguir). A probabilidade de ocorrência das cãibras do calor é acentuada quando há grandes perdas de sódio e água, sem hidratação adequada. Sua prevalência é maior na musculatura de pernas, abdômen a braços. Imagem: Shutterstock.com Cãibra. Alguns indivíduos têm maior propensão às cãibras, o que, provavelmente, relaciona-se a características genéticas, mas em todos os casos o calor associado à deficiência de sódio aumenta essa predisposição. É interessante notar que quantidades significativas de cálcio, magnésio e potássio intracelular não são perdidas durante atividades físicas, mesmo que exaustivas. Logo, a ocorrência das cãibras de calor parece não estar associada com alterações na concentração desses eletrólitos, como às vezes se imagina (ACSM, 2007b). Outra consequência da perda hidroeletrolítica é a hiponatremia associada ao exercício físico. Essa condição corresponde a uma alteração significativa da concentração de sódio no plasma durante a prática de exercícios físicos. Essa redução se dá através da sudorese, mas pode ser agravada por uma ingestão líquida em volumes superiores à perda de sódio. Isso pode levar a uma diluição ainda maior da concentração plasmática de sódio. Assim, ingerir líquidos pode ajudar a prevenir a desidratação, mas não a hiponatremia. Os sintomas mais comuns dessa condição são cefaleia, vertigens, náusea, enjoo, desorientação e confusão mental. A água ingerida em excesso pode infiltrar-se nas células cerebrais, aumentando a pressão intracraniana e produzindo as dores de cabeça e a confusão mental (ACSM, 2007). Um nível moderado de desidratação já acarreta prejuízo à termorregulação e degradação no desempenho durante atividades físicas. Logo, uma providência fundamental para a realização de atividades físicas no calor é a reposição hidroeletrolítica. Essa reposição deve ter como principal foco a manutenção do volume plasmático, para a preservação da circulação e transpiração. RECOMENDAÇÃO Em linhas gerais, recomenda-se que os indivíduos iniciem qualquer atividade em estado de euidratação e níveis normais de eletrólitos no plasma. A desidratação prévia às competições, prática muito observada em modalidades que estabelecem categorias de atletas em função do peso, aumenta os riscos de fadiga precoce e comprometimentos devidos à hipertermia. Durante as atividades, a ingestão de líquidos deve prevenir a desidratação, entendida como perda de líquidos superior a 2% da massa corporal e alterações eletrolíticas. A combinação de eletrólitos com água facilita a retenção de água intracelular, por isso entende-se que o consumo de bebidas contendo água, eletrólitos e carboidratos sejam mais efetivas que unicamente a água (ACSM, 2007). A taxa de ingestão de líquido depende de fatores como a temperatura ambiente e a própria modalidade da atividade. Contudo, deve-se manter em mente que o estômago é capaz de eliminar apenas 800 a 1.000ml por hora (GUYTON; HALL, 2011). Ingestões superiores a esse limite podem causar uma sensação desconfortável no praticante, com prejuízo ao seu desempenho. Não se deve confiar na sede como parâmetro indicador da necessidade de reidratação. As pausas periódicas para ingestão de água previnem a hipoidratação e sede é um marcador pouco preciso das necessidades hídricas do corpo. Na verdade, quando a sede se instala, as perdas líquidas já são suficientemente elevadas para comprometer o desempenho. Foto: Shutterstock.com Em pessoas idosas, isso é ainda mais grave, posto que os efeitos da reidratação levam mais tempo para se manifestar, tornando-as mais suscetíveis aos riscos de hiponatremia do exercício. Além disso, esses indivíduos têm menor sensibilidade à sede quando desidratados, fazendo com que sua reidratação voluntária seja menos frequente e que sintam menos sede que pessoas mais jovens para um mesmo grau de hipoidratação (ACSM, 2007). A exposição ao frio é mais facilmente compensável pelo aumento natural da temperatura corporal durante o exercício. No entanto, em condições extremas, o frio é considerado como um dos principais estressores ambientais. As consequências da hipotermia leve incluem: Calafrios Aumento da pressão arterial Amnésia Apatia Alterações do raciocínio e comportamento Foto: Shutterstock.com Calafrios. Níveis moderados a elevados de hipotermia acrescentam a esses sintomas o torpor, disfunções cardíacas, redução do fluxo de sangue para extremidades e cérebro, inconsciência e morte. O impacto do frio no Sistema Nervoso Central e a própria ocorrência dos calafrios dificulta a realização de tarefas que exigem coordenação (imagem ao lado). Além disso, os riscos de lesão muscular aumentam consideravelmente em modalidades que exigem velocidade ou potência. Por isso, a fase de aquecimento reveste-se de maior importância, devendo ser bem aplicada. Pode haver perda considerável de água pelas vias respiratórias durante atividades físicas realizada em climas frios, particularmente, quando a umidade relativa do ar é baixa. Apesar de isso não representar perigo de dano para as vias aéreas, cuja função é aquecer e umidificar o ar, o ressecamento de lábios, boca e garganta pode ser muito desconfortável e deveria ser prevenido. A realização de atividades físicas em ambientes aquáticos pode mimetizar as consequências da exposição ao frio extremo, uma vez que a condução de calor na água é mais de 20 vezes superior à do ar. A imersão na água a temperaturas de 28-30°C, situação comum em nossa realidade, pode provocar respostas fisiológicas similares ao que se observaria em ambientes terrestres muito mais frios. EXEMPLO Ao permanecermos imóveis em uma piscina ou no mar, calafrios costumam ocorrer em função da perda de calor para a água. Quando a temperatura da água é baixa, nem mesmo a atividade muscular é capaz de gerar calor suficiente para manter a temperatura corporal. Todo o calor produzido pelo metabolismo elevado é rapidamente transferido para a água, processo que pode ser ainda pior no caso da natação, em que as perdas adicionais ocorrem através do mecanismo da convecção. Isso é importante, pois, dependendo da temperatura da água, por mais que nos movimentemos, o aquecimento torna-se impossível, com evolução rápida à hipotermia (imagem abaixo). Em acidentes nos quais a vítima cai na água em frio extremo, o socorro imediato deve ser fornecido com aquecimento do corpo, sob risco de vida. Outro fator que induz maiores respostas de retenção de calor, independentemente da temperatura ambiente, é o vento. Em dias ventosos, a perda de calor por convecção é majorada, tornando mais difícil o aquecimento corporal durante as atividades físicas, o que deve ser considerado na organização das sessões de treinamento, dedicando-se mais tempo à fase de aquecimento. Foto: Dan Doherty / getarchive.net / Domínio Público Hipotermia na água. ACLIMATAÇÃO AO FRIO E AO CALOR Quando a exposição ao estresse térmico é frequente, adaptações crônicas contribuem para uma melhor tolerância ao frio ou ao calor. Em ambientes quentes, a maior parte da aclimatação ocorre durante a primeira semana. A adaptação será mais acelerada se a exposiçãoao calor for combinada à prática de exercícios, em virtude da maior elevação da temperatura central e estímulo à sudorese (RHOADES; TANNER, 2005). Por outro lado, a aclimatação é transitória, com reversão das adaptações após algumas semanas em temperaturas ambientais mais amenas. Dentre os principais ajustes fisiológicas associados à aclimatação ao calor, destacam-se: Aprimoramento do fluxo sanguíneo periférico, com maior quantidade de sangue direcionado para a pele. Paralelamente, ocorrem ajustes na distribuição do débito cardíaco, com normalização da frequência cardíaca e pressão arterial em repouso e durante o exercício. Redução do limiar para a transpiração, com maior eficiência no resfriamento para valores inferiores de temperatura central. Apesar de a pessoa normal não aclimatada raramente produzir mais de 1 litro de suor por hora, quando essa pessoa é exposta a tempo quente durante 1 a 6 semanas, ela começa a suar de modo mais profuso, em geral, aumentando a produção de suor para 2 a 3L/hora. A evaporação dessa quantidade de suor pode remover o calor do corpo com velocidade mais de 10 vezes superior à intensidade basal normal da produção de calor. O suor torna-se mais diluído e a perda de sódio pelos rins diminui, contribuindo com uma melhor retenção de eletrólitos de forma geral. Esse efeito deve-se em grande parte à maior secreção de aldosterona. A perda de sal pode passar de 15-30g de sal/dia em pessoas não aclimatadas a 3-5g/dia após 4 a 6 semanas. Após aclimatação, a temperatura central é menor durante qualquer sobrecarga de trabalho no calor e isso diminui a necessidade de se canalizar sangue para a pele. A menor sobrecarga cardiovascular resultante permite com que uma maior proporção do débito cardíaco seja enviada aos músculos em atividade, com o esforço sendo realizado com menor frequência cardíaca. A preservação do volume plasmático diminui as concentrações de lactato. Adicionalmente, a menor circulação de catecolaminas contribui para a preservação do glicogênio muscular, diminuindo-se as chances de fadiga precoce. As adaptações fisiológicas relacionadas à aclimatação às baixas temperaturas são menos evidentes que aquelas ocorridas em climas quentes, já que a principal defesa do ser humano reside em aquecer os ambientes e utilizar vestimentas adequadas. Além disso, a capacidade de adaptação ao frio é, efetivamente, menor que a de adaptação ao calor. ATENÇÃO De forma geral, aceita-se que a exposição prolongada ao frio faz com que as respostas tipicamente desencadeadas para reter calor sejam iniciadas em temperaturas mais baixas, como é o caso dos calafrios. Além disso, pode haver uma elevação na taxa metabólica de repouso, com maior produção de calor. Normalmente, o nível de ingestão calórica também aumenta, o que contribui para um maior efeito termogênico dos alimentos e para a adequação da própria produção de energia ao metabolismo de repouso elevado. É interessante mencionar que o fluxo sanguíneo para as extremidades tende a aumentar, principalmente, mãos e pés, ajudando a prevenir situações de enregelamento tecidual. EXERCÍCIO FÍSICO E ESTRESSE TÉRMICO O especialista Paulo de Tarso Veras Farinatti apresentará um resumo do módulo, aplicando os conceitos a situação de exercício. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. QUANTO AOS MECANISMOS DE TROCA DE CALOR, PODE-SE AFIRMAR QUE: A) O principal meio de troca de calor do ser humano com o meio ambiente é a radiação. B) De certa maneira, a convecção representa um processo de condução com camadas de fluido que são continuamente renovadas. C) A evaporação não ocorre quando a umidade do ar é muito baixa. D) O uso de vestimentas plásticas acelera a sudorese e, portanto, a evaporação via transpiração. E) Os mecanismos da sudorese e evaporação podem ser entendidos como sinônimos. 2. A TERMORREGULAÇÃO É CONTROLADA POR: A) Receptores exclusivamente periféricos, que enviam informações da pele ao Sistema Nervoso Central. B) Receptores exclusivamente centrais, localizados na área pré-ótica hipotalâmica. C) Receptores centrais e periféricos sensíveis à temperatura do sangue. D) Receptores localizados nas glândulas sudoríparas, que, por serem écrinas, detectam a maior ou menor produção suor. E) Receptores centrais e periféricos e pela área pré-ótica hipotalâmica, cujas informações são integradas pelo hipotálamo para produzir respostas coordenadas. GABARITO 1. Quanto aos mecanismos de troca de calor, pode-se afirmar que: A alternativa "B " está correta. Na convecção, as trocas de calor se dão em virtude do movimento de fluidos que circundam o corpo. 2. A termorregulação é controlada por: A alternativa "E " está correta. Para a termorregulação, o hipotálamo não apenas integra mensagens provenientes de receptores cutâneos e nos órgãos profundos, mas também promove uma estimulação via detecção da variação da temperatura do sangue que o perfunde. MÓDULO 3 Reconhecer as relações volume-pressão e profundidade, e as características do mergulho livre e autônomo FÍSICA DO MERGULHO Para uma melhor compreensão das respostas fisiológicas e dos riscos associados ao mergulho em profundidade, é importante o conhecimento de alguns princípios físicos relacionados à dinâmica dos gases e pressão exercida pela água. Tais princípios decorrem da composição, forma e pressão que o ar exerce em diferentes condições ambientais e, por outro lado, do peso da coluna d’água sobre o mergulhador. Esses aspectos determinam mudanças importantes no estado físico, na pressão e no volume dos gases que compõem o ar respirado, com impacto importante no desempenho e segurança do mergulhador. O entendimento dos princípios físicos que regem a dinâmica dos gases e líquidos ajuda a compreender e justificar determinados procedimentos aplicados para permitir com que as tarefas em profundidades sejam realizadas a contento e com risco mínimo. O ar atmosférico é composto por uma mistura de diversos gases em equilíbrio, principalmente o oxigênio e o nitrogênio. Ao nível do mar, a proporção desses gases é de 20,94% e 78,08%, respectivamente. Outros gases, como hidrogênio, argônio, dióxido de carbono, hélio e ozônio têm proporção inferior a 1%, havendo ainda a possibilidade de existirem indícios de criptônio, metano, xenônio ou radônio (TOLENTINO et al., 2004). Foto: Shutterstock.com Pode-se pensar, portanto, que o ar respirado contém 78% de nitrogênio, 21% de oxigênio e 1% de outros gases. A pressão exercida pela coluna de ar atmosférico sobre a superfície da terra ao nível do mar corresponde a 1kg/cm2 ou 760mmHg, valores que podem ser exprimidos como 1 atmosfera (atm). Foto: Shutterstock.com Por outro lado, uma coluna de água de aproximadamente 10m exerce pressão semelhante à atmosfera (1kg/cm2). Dessa forma, considera-se que a cada 10m de profundidade o mergulhador é submetido a uma pressão adicional de aproximadamente 1atm. EXEMPLO Ao mergulhar a uma profundidade de 20m, a pressão total exercida sobre o mergulhador é de 3atm ou 2.280mmHg. De acordo com a Teoria Geral dos Gases, todas as moléculas possuem movimento e deslocam-se com velocidades variadas em todas as direções, chocando-se umas com as outras e com as paredes (no corpo humano, membranas) dos recipientes em que estão contidas. Quão maior a velocidade de deslocamento das moléculas, maior a sua energia cinética e maior a pressão exercida pelos gases em um dado recipiente. Essa pressão é uniformemente distribuída pelas paredes do recipiente e constante em uma dada condição. Se mudanças no ambiente ocorrem, isso repercute sobre a energia cinética das moléculas dos gases, com alteração na pressão por eles exercida. Assim, mudanças no volume ou temperatura interna do recipiente podem aumentar ou diminuir a energia cinética. A redução do volume aumenta a quantidade de impactos com as paredes do recipiente, enquanto o aumento da temperatura acelera a movimentação molecular. Em ambos os casos, há aumento da pressão internaexercida pelos gases. A dinâmica dos gases é influenciada por variações na pressão, no volume ou na temperatura dos locais que os contêm, de maneira descrita por leis físicas, geralmente, batizadas com os nomes dos cientistas que as desenvolveram, como as Leis de Boyle, Charles, Gay-Lussac, Dalton e Henry. Passemos a descrevê-las: Imagem: Wellcome Collection gallery / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 Robert Boyle. A Lei de Boyle derivou das descobertas do irlandês Robert Boyle no século XVII, o qual constatou que, a uma temperatura constante, o volume de um gás é inversamente proporcional à pressão a ele imposta. Isso significa que, à medida que se atinge profundidades maiores, o volume ocupado pelos gases nos compartimentos corporais, principalmente, os pulmões, reduz-se progressivamente. Esse princípio é muito importante para a fisiologia do mergulho, uma vez que variações abruptas de pressão ocasionam alterações concomitantes do volume ocupado pelos gases, podendo causar lesões em diferentes órgãos ou precipitar situações de “apagamento” em profundidade (ROCHA, 2012). Imagem: Library of Congress's Prints and Photographs division / Wikimedia Commons / Domínio Público Jacques Charles. A Lei de Charles é também conhecida como a Lei dos Gases Perfeitos, tendo sido desenvolvida no século XVIII pelo físico francês Jacques Charles. Estabelece que o volume de uma massa fixa de gás mantido à pressão constante é diretamente proporcional à temperatura absoluta. Como todos os gases têm aproximadamente o mesmo coeficiente de dilatação volumétrica, ao aumentar a sua temperatura, ocorre aumento de volume e vice-versa (PETRUCCI et al., 2006). Por exemplo, tomando-se a escala Celsius como parâmetro, sabe-se que a temperatura de congelamento da água é de 0°C e a de ebulição é de 100°C, para uma pressão de 1atm. Imagem: Science Museum Group / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 Joseph Gay-Lussac. A Lei de Charles foi complementada posteriormente pelo físico e químico francês Joseph Louis Gay- Lussac, estabelecendo diversas leis físicas, como a Lei das Proporções Volumétricas – “gases nas mesmas condições de pressão e temperatura mantêm seus volumes em proporções fixas”; a Lei da Transformação Isovolumétrica – “para uma certa massa fixa de gás com volume constante, a pressão é diretamente proporcional à sua temperatura”; a Lei da Transformação Isobárica – “para uma certa massa gasosa, volume e temperatura são diretamente proporcionais”. A combinação das Leis de Boyle, Charles e Gay-Lussac conduz à chamada equação geral dos gases, a qual combina as três variáveis que determinam seu estado físico: Volume Temperatura Pressão Essas alterações pelas quais passam os gases são conhecidas, como isovolumétrica, isotérmica e isobárica (BRUNETTO; OLIVEIRA; FRANCO JUNIOR, 2005). A interação dessas três transformações permite o estabelecimento da equação: Atenção! Para visualização completa da equação utilize a rolagem horizontal = = = ConstanteP1.V 1 T1 P2.V 2 T2 (P3.V 3) T3 A equação estabelece que, ao sofrer uma transformação em que as três grandezas (pressão, temperatura e volume) sejam equivalentes, a relação PV/T de uma massa de gás permanece constante. Uma vez conhecido o volume de um gás em determinadas condições de temperatura e pressão, pode- se determinar o novo volume se as demais condições variarem; e similarmente para determinar a temperatura e a pressão. Isso permite calcular, por exemplo, o volume de um gás que passou por alterações de temperatura e pressão, tendo efeito direto sobre os procedimentos de recarga de cilindros de mergulho ou na operação de descompressão após mergulho em grandes profundidades (ROCHA, 2012). Outro princípio físico importante para o mergulho é a lei proposta pelo químico britânico John Dalton. A Lei de Dalton estabelece que, em uma mistura gasosa, cada componente comporta-se de maneira independente dos demais e que a pressão total da mistura corresponde ao somatório das pressões parciais dos gases que a constituem. Isso significa que gases em uma mistura não reagem entre si. Apesar de se comportar como um gás único, a pressão total da mistura equivalerá à soma das pressões dos gases independentes, já que cada um deles ocupará o volume que teria se estivesse isolado (PETRUCCI et al., 2006). Imagem: Science Museum Group / Wikimedia Commons / CC BY 4.0 John Dalton. Em uma mistura que contenha oxigênio a 21%, essa proporção se manterá independentemente da pressão total. Isso permite calcular a todo momento a pressão parcial do oxigênio em uma mistura gasosa, o que se faz importante no caso do mergulho com cilindros. Imagem: Science Museum Group/Wikimedia Commons/CC BY 4.0 William Henry. Temos a Lei de Henry, desenvolvida pelo químico inglês William Henry. Essa lei trata da solubilidade dos gases em meio líquido, estabelecendo que a solubilidade de um gás dissolvido em um líquido é diretamente proporcional à pressão parcial do gás na superfície da solução. Cada gás possui um coeficiente de solubilidade diferente para líquidos específicos. Mais ainda, a solubilidade diminui quando a temperatura da solução aumenta (PETRUCCI et al., 2006). EXEMPLO Pense em uma garrafa de refrigerante. Enquanto fechada, a pressão interna mantém o gás dissolvido. Quando aberta, a pressão na superfície do líquido diminui e o gás é liberado na forma de bolhas, o que é mais intenso se a bebida estiver quente. Por outro lado, se deixamos a tampa ligeiramente desatarraxada, o gás perde-se lentamente, sem que bolhas sejam formadas. Esse princípio é importante para compreendermos o mecanismo da descompressão em mergulhos de profundidade. A volta lenta à superfície e a permanência posterior em câmaras de descompressão visa liberar gases dissolvidos no sangue sem que bolhas sejam formadas, com prejuízo à integridade do mergulhador. Ainda temos o conceito de empuxo, que diz que a capacidade de um corpo flutuar depende de sua densidade e volume. Elementos mais densos flutuam menos, mas, para uma mesma densidade, volumes maiores flutuam melhor e isso relaciona-se à força de empuxo. Quando um objeto é submerso, desloca um certo volume de líquido igual ao próprio volume (uma banheira cheia transborda quando nela entramos). A força do empuxo corresponde ao peso do fluido deslocado, ou seja, quanto maior o volume do corpo, maior a força de empuxo que resiste à submersão. Imagem: Domenico Fetti / Wikimedia Commons / Domínio Público Arquimedes. O matemático grego Arquimedes (287-212 a.C.) descreveu esse mecanismo, enunciando que: Todo corpo submerso desloca um volume de líquido exatamente igual ao próprio volume. O peso do corpo submerso diminui em quantidade igual ao peso do volume de líquido deslocado (ou seja, o empuxo diminui nosso peso quando estamos submersos). Em suma, quando a quantidade de água deslocada é menor que o peso (caso de corpos muito densos), a flutuabilidade é negativa, o contrário ocorre quando a quantidade de água deslocada é maior que o peso do objeto (caso de corpos pouco densos). FISIOLOGIA E RISCOS DO MERGULHO Falaremos agora de duas modalidades de mergulho: em apneia e autônomo. MERGULHO EM APNEIA Neste tipo de mergulho, o praticante inspira certo volume de ar e mergulha até que sobrevenha a vontade de respirar e ocorra o retorno à superfície. A duração e profundidade do mergulho são limitadas pela capacidade individual de se reter a respiração (apneia). Em geral, o mergulhador inspira ar atmosférico através de um snorkel, que deve ter tamanho adequado para otimizar a ventilação alveolar. Na verdade, nem todo o ar inspirado chega aos alvéolos, parte dele permanecendo nas vias áreas e outras porções do aparelho respiratório que não realizam hematose (espaço morto anatômico). Foto: Shutterstock.com Mergulho em apneia. O snorkel representa um prolongamento das vias aéreas, aumentando o espaço morto anatômico e dificultando as trocas gasosas pulmonares. As dimensões ideaisdesses respiradores são propostas por McArdle e colaboradores (2016), como tendo 38cm de comprimento com um diâmetro interno de 16 a 19mm para minimizar o impacto do espaço morto e a resistência à passagem do ar. Dito isso, temos dois fatores a considerar quanto à influência de fatores respiratórios no mergulho em apneia: A estimulação dos quimiorreceptores centrais por meio do acúmulo de dióxido de carbono (CO2), forçando o fim da apneia. Relação entre a capacidade pulmonar total (CPT) do mergulhador e o volume residual (VR). Vamos analisar cada um desses fatores individualmente? O acúmulo de CO2 forçando o fim da apneia: Sabe-se que uma inspiração profunda é capaz de insuflar cerca de 5-6 litros de ar, aproximadamente 1 litro de oxigênio nas vias aéreas e pulmões. Considerando o espaço morto, pode-se pensar que aproximadamente 650ml de oxigênio (O2) apoiam o metabolismo, antes de se sentir necessidade de respirar. A maior parte das pessoas consegue ficar em apneia por 1-2min. O fator mais importante para a retomada da respiração é a estimulação dos quimiorreceptores centrais pelo CO2 acumulado. Estima-se que pressões parciais de CO2 (pCO2) da ordem de 50mmHg sejam o ponto crítico para que a apneia seja interrompida. A realização de atividades físicas durante o mergulho reduz o tempo de apneia, em virtude da maior produção do CO2 em virtude da elevação do metabolismo. ATENÇÃO Por esse motivo, mergulhadores em apneia realizam frequentemente antes do mergulho a manobra da hiperventilação. Um aumento da ventilação sem elevação correspondente do metabolismo faz com que mais CO2 seja eliminado. Logo, prolonga-se o tempo para alcançar a pCO2 crítica de 50mmHg e aumenta-se o período de apneia. Apesar de a hiperventilação consistir em recurso para prolongar a apneia e melhorar o desempenho no mergulho, também representa um risco. Isso se dá como uma consequência da Lei de Boyle. ENTENDA O RISCO Se o mergulhador hiperventila, reduz a pCO2 de repouso (40mmHg para até 15mmHg) e permanece mais tempo em profundidade. Durante o mergulho, o O2 é continuamente utilizado, reduzindo-se a sua pressão parcial (pO2) nos pulmões. No entanto, como a pCO2 continua reduzida em virtude da hiperventilação prévia, o desejo de respirar não sobrevém. Enquanto o mergulhador se encontra em profundidades elevadas, isso não constitui problema, uma vez que a pressão externa da água comprime a caixa torácica, diminuindo o volume pulmonar, a pO2 permanece “artificialmente” adequada e as trocas gasosas continuam a se processar, apesar de a quantidade absoluta de O2 encontrar-se reduzida. Quando a pCO2 atinge o limite crítico, a vontade de respirar faz com que o mergulhador volte à superfície. Contudo, a pressão hidrostática diminui e o volume da caixa torácica amplia-se — pela Lei de Boyle, a expansão do volume pulmonar leva à redução da pO2, a um ponto que não seja mais possível realizar a difusão para o carregamento da hemoglobina. Quando o mergulho em apneia é prolongado, a pO2 nos pulmões e sangue pode atingir níveis criticamente baixos antes de a pCO2 aumentar o suficiente para estimular a respiração. Quando isso ocorre, a expansão pulmonar durante a subida reduz ainda mais a pO2 pulmonar, comprometendo a sua passagem para o sangue. Quão mais perto da superfície, mais grave a hipóxia, com maior chance de perda da consciência por um “apagamento”. Apesar de esse fenômeno ocorrer, principalmente, em mergulhadores desejosos de aumentar o tempo em apneia, acontece também em ambientes mais rasos, como piscinas – quem nunca viu crianças hiperventilando antes de brincar de quem fica mais tempo embaixo d’água? Deve-se notar que uma pCO2 muito reduzida reduz a vasodilatação dos vasos cerebrais, o que pode levar a vertigens ou mesmo perda de consciência (GUYTON; HALL, 2011). Para evitar acidentes, a manobra da hiperventilação deveria ser evitada por mergulhadores inexperientes e, mesmo para praticantes avançados que realizam o procedimento, mergulhar sozinho não é recomendável. Relação entre a Capacidade Pulmonar Total e Volume Residual (CPT/VR) A relação entre CPT e VR relaciona-se com o limite da profundidade que pode ser alcançada em mergulho livre. A redução do volume pulmonar pelas forças compressivas reduz a relação CPT/VR, e quando os valores se aproximam e a relação se aproxima da unidade, há risco de compressão do pulmão em função da não equalização das pressões internas e externas. Isso determina a profundidade crítica que pode ser alcançada. Nesse sentido, quanto maior a CPT em relação ao VR, maior a profundidade em que a compressão pulmonar ocorreria. Na superfície, essa relação é de 4:1 (MCARDLE et al., 2016). Enquanto a CPT for maior que o VR, o volume do pulmão permanece maior que o VR. Quando esses valores se igualam ou a razão torna-se inferior a 1,0, a pressão externa da água ultrapassa a pressão do ar nos pulmões e cria-se um vácuo que pode levar ao extravasamento de sangue nos capilares pulmonares. Como resultado, o mergulhador afoga-se em seu próprio sangue. Mergulhadores treinados possuem maior CPT que a média da população e menor VR, o que ajuda a explicar as altas profundidades que podem atingir. Imagem: Shutterstock.com Fatores limitantes adicionais ao mergulho em apneia referem-se ao equilíbrio das pressões no ouvido e seios da face. Por exemplo, barotrauma no ouvido médio pode ocorrer quando a crescente pressão hidrostática externa não é compensada, ou quando o ouvido médio se separa do ouvido externo pelo tímpano, cuja membrana tende a ser forçada para dentro pela diferença de pressões, podendo, inclusive, romper-se. O inverso se dá quando o mergulhador usa tampões de ouvidos ou toucas de Neoprene muito justas. Nesse caso, o vácuo se dá no ouvido externo, com abaulamento do tímpano para fora. Esses fenômenos podem ocorrer mesmo em pequenas profundidades e a qualquer sinal de dor nos ouvidos, o mergulho deve ser interrompido. BAROTRAUMA Trauma provocado pelo aumento da pressão. javascript:void(0) Imagem: Shutterstock.com Barotraumas também podem acontecer nos seios da face, sobretudo quando se encontram obstruídos por infecções ou má formação anatômica. O ar comprimido nas vias aéreas pela pressão hidrostática tende a penetrar nas cavidades paranasais. Quando a passagem é estreita, a diferença de pressão cria uma região de baixa pressão, com dor sinusal aguda. No limite, pode haver edema e sangramento, pois o sangue se desloca para a região, a fim de preencher o vácuo relativo instalado nos seios da face. A exemplo dos barotraumas de ouvido, deve-se interromper o mergulho. Recomenda-se não mergulhar com infecções nas vias aéreas ou seios da face. MERGULHO AUTÔNOMO No mergulho autônomo, são utilizados cilindros de O2 para auxiliar na respiração, permitindo com que o mergulhador permaneça mais tempo submerso e desça a profundidades maiores. VOCÊ SABIA Até 1940, mergulhos em grandes profundidades e por longos períodos, eram feitos em escafandros conectados a fontes de ar localizadas na superfície. Deve-se ao francês Jacques Cousteau a popularização do mergulho com cilindros de O2, denominados de “aparelhos autônomos de respiração subaquática” (self- contained underwater breathing apparatus - SCUBA). Nesse sistema, o mergulhador porta tanques de ar comprimido com válvulas que dispensam o ar com a pressão necessária a uma dada profundidade. Na maioria dos casos, vale-se de SCUBA em circuito aberto; ao respirar, o mergulhador gera uma leve pressão negativa que abre a válvula de demanda, liberando o ar a uma pressão similar àquela exercida pela água. Ao expirar, a pressão positiva fecha as válvulas e o ar é descarregado na água (KLOS, 2008). Tal sistema permite mergulhos mais profundos e prolongados. No entanto, a exposição a maiores pressões por mais tempo também se associa a riscos para a integridade do mergulhador. Os efeitos diretos da pressão excessiva decorrem da ação mecânica sobre as estruturas
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