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Beatriz Machado de Almeida - Internato INTRODUÇÃO A doença mão-pé-boca é uma enterovirose. É bem comum no dia a dia dos pediatras, especialmente em crianças que frequentam creches. CARACTERÍSTICAS • Agente etiológico: Coxsackie A16 ou Enterovirus 71. • Benigna, autolimitada e altamente transmissível. • Modo de transmissão: Fecal oral ou por secreções respiratórias. • Período de incubação: entre 3 a 6 dias. • Período de transmissibilidade: antes do aparecimento dos sintomas até semanas após a infecção. QUADRO CLÍNICO • O pródromo é inespecífico, composto por febre baixa, irritabilidade e anorexia. O exantema é caracterizado, como o próprio nome diz, em lesões na boca, mãos e pés. • Após 3-5 dias há aparecimento de manchas vermelhas com vesículas branco acinzentadas centrais que podem evoluir para ulcerações dolorosas, em amígdalas, palato e mucosa jugal. O paciente tem dificuldade para se alimentar e muita irritabilidade. • Exantema maculopapular/vesicular nas palmas das mãos, plantas dos pés, região genital e nádegas. • Úlceras dolorosas em orofaringe: as úlceras podem ocorrer em lábios, língua, palato e gengivas. • Onicomadese: queda de parte das unhas. • Estomatite: quando há apenas lesões orais. • Herpangina: quando há apenas lesões amigdalianas. • Outros associados: inapetência, mal-estar, diarreia. • As formas extensas podem cursar com lesões vesicobolhosas disseminadas. • Desaparecem sem deixar manchas, mas pode haver descamação cutânea ou ungueal. • Duração de 5-7 dias. COMPLICAÇÕES Raramente ocorre disseminação grave da doença, como mioclonias, tremores, ataxia e paralisia de nervos cranianos, que evolui para falência cardiorrespiratória. PREVENÇÃO • Como a principal transmissão é a fecal-oral, a melhor prevenção é a higiene. Crianças afetadas devem ser afastadas da creche e do convívio de outras crianças. • Não há vacina ou imunoglobulina disponível. DIAGNÓSTICO • O diagnóstico é essencialmente clínico. • Cultura celular, detecção do RNA viral por PCR, sorologia: podem ser utilizados, mas geralmente não há necessidade. TRATAMENTO • Sintomáticos. • Isolamento de contato. • Higiene adequada das mãos. • e os pais devem ser orientados. • Oferecer alimentos pastosos e frios é uma medida útil para facilitar a aceitação oral. Doença Mão-Pé-Boca Beatriz Machado de Almeida - Internato • Considerar internação nos pacientes sem aceitação oral, com sinais de desidratação. Não é uma doença de notificação obrigatória! HERPANGINA DEFINIÇÃO • Doença infecciosa benigna caracterizada por febre, enantema e lesões vesiculares papulares e ulceradas na cavidade oral. • Seu pico de incidência ocorre entre os 5-7a. FISIOPATOLOGIA • Doença infecciosa viral causada por vários sorotipos de eneterovírus, mais frequentemente o vírus Coxsackie do tipo A. • A transmissão da doença ocorre via fecal-oral e pelo contato com secreções orais e respiratórias. APRESENTAÇÃO CLÍNICA ANAMNESE: • Hábitos de higiene. • Contato íntimo com outras crianças. • Frequência nas creches ou escolar. • Familiares com sintomas semelhantes. • Presença de febre alta, anorexia, vômitos, odinofagia, disfagia, dor abdominal ou irritabilidade. • Aceitação hídrica. • Sinais de desidratação. • Hipoatividade. ABORDAGEM DIAGNÓSTICA • Essencialmente clínico. • O isolamento viral não é recomendado de rotina. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS O diagnóstico é dado pela: • Presença de febre (geralmente alta – 39-41ºC). • Características típicas das lesões orais: geralmente menos de 10 lesões amareladas, acinzentadas ou esbranquiçadas, de base hiperemiada, papulares ou vesiculares, localizadas nos pilares anteriores das faces, nas amígdalas, na úvula e/ou no palato mole. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL • Estomatite aftosa. • Gengivoestomatite por herpes simples. • Candidíase oral. • Traumático. • Mucoceles. • Lesões orais por outros vírus: ex. HIV. ACOMPANHAMENTO • O tratamento é de suporte e o acompanhamento é, na maioria das vezes, ambulatorial. • A internação hospitalar só é indicada no caso de complicações, como: ❖ Incapacidade de manter ingesta hídrica adequada. ❖ Sinais de desidratação e hipovolemia. ❖ Complicações cardiológicas (miocardite). ❖ Complicações neurológicas (meningite e/ou encefalite viral, paralisia flácida aguda). ABORDAGEM TERAPÊUTICA • O tratamento é sintomático para controle da febre e da dor, usando analgésicos comuns. Anti-inflamatórios podem ser utilizados, mas Beatriz Machado de Almeida - Internato idealmente devem ser evitados devido aos efeitos colaterais potenciais. • Assegurar o aporte hídrico oral. • A alimentação deve ser mantida conforme aceitação da criança, respeitando seus limites. • Em casos muito graves, opioides podem ser necessários. • Não há ensaios clínicos evidenciando o benefício do uso de lidocaína ou outras medicações tópicas orais. • Na prática, o Isetionato de hexamidina + Cloridrato de tetracaína (medicação tópica usada em maiores de 3 anos de idade) parece ter bom resultado no alívio da dor. Não deve ser usada nos menores de 3 anos pelo risco de laringoespasmo. ESTOMATITE AFTOSA DEFINIÇÃO • Condição não contagiosa, caracterizada por úlceras orais rasas, dolorosas, com 3 a 5mm, geralmente de evolução autolimitada, com regressão em 7 a 14 dias. • Recorrência frequente de 3-6x ao ano. FISIOPATOLOGIA • Ainda não totalmente definida. • Acredita-se que haja fatores imunológicos, genéticos e microbiológicos envolvidos no processo. • As seguintes condições são apontadas como desencadeadores ou modificadoras da doença: ❖ Alterações hormonais. ❖ Estresse. ❖ Traumatismo local. ❖ Deficiências nutricionais de ácido fólico, ferro e vitamina B12. APRESENTAÇÃO CLÍNICA ANAMNESE: • Epidemiologia: acomete em média 2 a 10% da população, sendo mais frequente em pacientes do sexo feminino, crianças e adultos imunodeprimidos. Episódios tendem a reduzir com o envelhecimento. • Quadro clínico: os pacientes relatam o surgimento de úlceras orais dolorosas que dificultam a ingestão de alimentos. • Marcadores de gravidade: ❖ Lesões grandes. ❖ Regressão lenta. ❖ Bordas irregulares. ❖ Úlcera profunda. • Fatores de risco: ❖ História familiar positiva: 30 a 40% dos pacientes. ❖ Doença celíaca. ❖ Doença inflamatória intestinal. ❖ Infecção pelo HIV. ❖ Trauma: geralmente surge próximo aos sítios de oclusão dentária. Pode ser causado também por certos tipos de alimento, como batatas chips e alimentos quentes. ❖ Morsicatio labiorum ou morsicatio buccarum: hábito inconsciente de morder/mascar o lábio ou a mucosa bucal. Geralmente, associa-se à lesão hiperceratórica local. ❖ Fatores hormonais. ❖ Estresse emocional. ❖ Deficiência nutricionais: vitamina B12, ferro, ácido fólico, zinco, vitamina D. ❖ Uso de medicamentos: metrotexato, micofenolato, losartana, sulfametoxazol- trimetoprima ... ❖ Lesões químicas: ex. dissolver AAS na boca, bochechar com peróxido de hidrogênio. ❖ Neutropenia de qualquer causa. EXAME FÍSICO: A apresentação mais comum é a úlcera: • Pequena. • Bem delimitada. • Arredondada ou ovalada. • Dolorosa. • Que regride geralmente, em 7 a 14 dias, sem deixar cicatriz. Beatriz Machado de Almeida - Internato A base da lesão costuma ser rasa, coberta por membrana amarelada ou acinzentada (fibrina), com bordas eritematosas. Deve-se avaliar se há xerostomia, o que pode aumentar o risco de lesão da mucosa. ABORDAGEM DIAGNÓSTICA O diagnóstico é clínico. CLASSIFICAÇÃO QUANTO À MORFOLOGIA: • Aftas tipo minor (úlcera de Mikulicz): ❖ Correspondem a 80% dos casos. ❖ São circulares e, geralmente, medem entre 3- 10 mm. ❖ Afetam a mucosa oral não queratinizada. ❖ Usualmente melhoramapós 7 a 14 dias de evolução, sem deixar cicatriz. • Aftas tipo major (úlcera de Sutton): ❖ Representam 10 a 15% dos casos. ❖ Geralmente ultrapassam 1 cm. ❖ Mais profundas. ❖ Podem acometer a mucosa oral queratinizada e não queratinizada. ❖ Tempo de cicatrização pode chegar a meses (em média, 4 a 6 semanas). ❖ Podem deixar cicatrizes. • Aftas herpetiformes: ❖ Forma mais rara (5%). ❖ Múltiplas lesões de 2 a 3 mm que podem coalescer e originar lesões grandes e irregulares. ❖ Geralmente melhoram entre 10 a 14 dias. ❖ Podem ser confundidas com infecção por Herpes simplex tipo I. ❖ As lesões de estomatite aftosa predominam em mucosa não queratinizada; já a estomatite herpética acomete palato duro e gengiva. QUANTO À COMPLEXIDADE: • Aftose simples: ❖ Forma mais comum, limitada ao acometimento de mucosa oral. ❖ Geralmente autolimitada. ❖ Duração de até 14 dias. ❖ Pode ser recorrente. • Aftose complexa: ❖ Acometimento de mucosas oral e genital. ❖ Aftas maiores, mais dolorosas e múltiplas. ❖ Duração geralmente maior que 4 a 6 semanas. ❖ Diagnóstico de doença de Behçet deve ser excluído. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL • Herpes-vírus simples. • Sífilis. • Coxsackievírus. • Varicella zoster. • Epstein-Barr, citomegalovírus. • Doença de Crohn. • Neoplasias: ex. carcinoma escamoso. • Queimadura química ou térmica. • Doença celíaca. ABORDAGEM TERAPÊUTICA • A maioria das lesões desaparece espontaneamente em alguns dias. • O manejo visa: ❖ Alívio sintomático. ❖ Aceleração do processo cicatricial. ❖ Redução do número de recorrências. O tratamento ainda é controverso na literatura médica. Entre outros fatores, contribuem para isso a incerteza quanto ao mecanismo etiológico exato da doença e a ausência de estudos controlados para comparação entre os medicamentos utilizados na terapêutica. MEDIDAS GERAIS: • Higiene oral adequada com escova ultrasoft. • Controle de fatores agravantes, como: ❖ Trauma por próteses orais. Beatriz Machado de Almeida - Internato ❖ Alimentos possivelmente associados: ácidos, muito salgados e bebidas gasosas. ❖ Lesões por mordedura. ❖ Corrigir xerostomia, se necessário lubrificantes orais. • Controle da dor: anestésicos ou anti- inflamatórios tópicos, como Cloridrato de tetracaína e Cloridrato de benzidamina. • Corrigir deficiências nutricionais. • Evitas pastas de dente contendo Laurilsulfato de sódio: pode prolongar o período de cicatrização. • Atentar para infecção secundária. • Sucrafilm: pode ser empregado para acelerar a cicatrização, podendo ser utilizados 5ml em bochecha, por 1 a 2 minutos, até 4x por dia. • Aftose simples – Corticoide tópico: ❖ A: Triancinolona acetonida, em orabase. Aplicar fina camada sobre as aftas, preferencialmente à noite, antes de dormir. Progredir até de 8/8 horas, se necessário; ❖ B: Dexametasona elixir 0,5 mg/5 mL, bochechar 5 mL da solução a cada 8 horas, por 5 minutos, e depois cuspir. • Aftose complexa: ❖ Primeira linha: Corticoterapia sistêmica: Prednisona 20 a 40 mg, VO, pela manhã, de 4 a 7 dias. Manter corticoterapia tópica; ❖ Segunda linha: Indicada para pacientes que não reagem à corticoterapia ou que apresentam contraindicação ao uso de corticoides. Opções: Colchicina: iniciar com 0,5 mg/dia, VO, e progredir para 1 mg/dia após 1 semana, caso o paciente tolere; Dapsona: iniciar com 0,5 comprimido de 100 mg/dia, VO, podendo a dose ser aumentada até 150 mg/dia; Outros: Talidomida (eficácia limitada pelos efeitos colaterais), Montelucaste, Pentoxifilina, Apremilaste, antagonistas de fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa) em casos extremos. A terapia com laser pode ser tentada para aceleração da cicatrização e alívio da dor. Hipovitaminoses e deficiência de minerais (ferro, vitamina B12, ácido fólico e zinco) devem ser corrigidas.
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