Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 1 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Apelante: RIO PLANETA AGUA S/A Apelante: LUCIANA JESUS DA SILVA Apelado: OS MESMOS Relatora: Desembargadora DENISE NICOLL SIMÕES APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. QUEDA EM PARQUE AQUÁTICO. FRATURA NO TORNOZELO REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. AGRAVAMENTO DO QUADRO. COMPLICAÇÃO PÓS-OPERATÓRIA. OSTEOMIELITE. AMPUTAÇÃO DE MEMBRO. EXTENSÃO DA RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR. Demanda indenizatória na qual a Autora pugna pela reparação moral, material e estética em razão de acidente sofrido nas dependências da Ré. Consumidora que foi atendida no local e encaminhada para diversos hospitais para tratamento médico, sendo necessária a realização de cirurgias em seu tornozelo esquerdo. Falha na prestação de serviços evidenciada pela falta de segurança no local. Controvérsia acerca da extensão da responsabilidade, uma vez que em razão de grave complicação pós-operatória tardia (osteomielite) constatada em cirurgia ortopédica, foi necessária a amputação de membro da Demandante. Amputação devida à osteomielite, que é, por definição, um quadro inflamatório que afeta um ou mais ossos. A eclosão do processo infeccioso pode ser considerada como um desdobramento eventualmente previsível de procedimento cirúrgico, denominado pela doutrina de “risco inerente”, ao tratar da responsabilidade civil médica. Demanda que não tem como finalidade discutir eventual falha ou erro médico. Responsabilidade que deve ser limitada a falha na prestação de serviços, qual seja, a falta de segurança em suas dependências. Danos materiais devidamente comprovados. Danos morais evidenciados que devem ser reduzidos em atenção ao rompimento do nexo causal. Restaram devidamente evidenciados os transtornos sofridos durantes anos, em verdadeira via crucis na qual a Demandante era encaminhada para diversos nosocômios, para tratar da fratura em seu tornozelo. Dano estético que deve ser reduzido, compatível com a com cicatriz que permaneceu durante anos em sua perna. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO UMA VEZ QUE NÃO REITERADO. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE PROVIDO. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 2 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 ACORDAM, por UNANIMIDADE de votos, os Desembargadores que compõem esta E. 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em NÃO CONHECER O AGRAVO RETIDO, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DA RÉ E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DA AUTORA, nos termos do voto que segue. RELATÓRIO Tratam-se de apelações cíveis interpostas da sentença de procedência prolatada nos autos da ação de obrigação de fazer proposta LUCIANA JESUS DA SILVA em face do RIO PLANETA AGUA S/A. Narra a Autora, em síntese, que em 07 de dezembro de 2003, planejou um dia de diversão com a família, através de excursão ao Rio Water Planet – Ré - oferecida pela Escola José de Moura, onde estudam suas duas filhas menores. Afirma que por volta das 16hs, ao circular no interior das dependências do parque aquático, sofreu de forma inesperada violenta queda, uma vez que o piso no local estava escorregadio sem qualquer tipo de isolamento, aviso ou sinalização. Afirma que a queda foi tão forte que permaneceu no chão por muito tempo, com muitas dores. Alega que sua cunhada foi ao seu encontro, solicitando ajuda às pessoas que ali se encontravam, acionando a equipe médica do local. Aduz que foi imediatamente encaminhada ao ambulatório da Ré, recebendo o primeiro atendimento no local, sendo posteriormente transferida para o nosocômio público mais próximo. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 3 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Sustenta que foi encaminhada ao Hospital Municipal Lourenço Jorge e conforme o Boletim de Emergência de n° 2198673, sendo constatada "fratura tornozelo esquerdo". Foi realizada imobilização com uma tala gessada, tipo "bota", e após a realização dos exames radiológicos, procedeu-se à internação para tratamento cirúrgico naquela unidade hospitalar. Alega que seu companheiro se dirigiu a 16ª Delegacia de Polícia, comunicando o ocorrido e requerendo a apuração dos fatos, sendo a Autora encaminhada ao Instituto Médico Legal. Aduz que em 12/12/2003, em razão da gravidade das lesões, foi transferida para o Hospital Ossocenter em Duque de Caxias, onde realizou o tratamento cirúrgico, de redução de fratura do tornozelo esquerdo e colocação de placa de platina e sete parafusos. Afirma que ao deixar o hospital, em 14/12/2003, começou a sentir fortes dores na região craniana, sendo informada pelo enfermeiro do Hospital que tal fato seria decorrente da anestesia. Já em sua residência, sentindo muitas dores, entrou em contato com prepostos da Ré, sendo receitado via telefone medicamentos. Em 22/12/2003 dirigiu-se ao Hospital Ossocenter para uma consulta de emergência, quando foi prescrita nova medicação. Em 26/12/2003 contatou novamente preposto da Ré, informando que seu estado havia piorado. Nesse momento, foi encaminhada à Clinica Qualimagem, da Ré, para realização de exames sendo em seguida, internada no Hospital Três Rios, recebendo alta apenas em 30/12/2003. Alega que a Ré após o acidente começou a custear as despesas da Autora, fornecendo quantia de R$ 135,00 por semana para a compra de medicamentos, o que ocorreu até fevereiro de 2004. Em março de 2004 começou a sentir fortes dores no membro inferior esquerdo, uma vez que os pontos cirúrgicos estavam inflamados. Nessa época, afirma que teve que arcar com as custas médicas. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 4 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Em 01/06/2004, com os pontos cirúrgicos abertos, entrou em contato com a Ré, sendo então encaminhada à Casa de Saúde Nossa Senhora de Nazaré, e após novos exames radiológicos, constatou-se a rejeição dos pontos e que consolidação da fratura, sendo necessária nova intervenção cirúrgica para a retirada da platina e dos parafusos. Defende que a partir de agosto de 2004 a Ré parou de prestar qualquer assistência financeira, e em setembro de 2004 como os pontos não tinham cicatrizados, foi encaminhada a um especialista em angiologia, passando a receber tratamento adequado. Afirma que as despesas totalizaram o valor de R$ 2.203,41 (dois mil duzentos e três reais e quarenta e um centavos). Pugna pela concessão da gratuidade de justiça e inversão do ônus da prova. Requer a condenação da Ré emdanos materiais, morais e estéticos, ao pagamento de todo o tratamento médico que venha a ser indicado em perícia médica, ao pagamento do período de incapacidade total temporária e pensionamento com constituição de capital garantidor. Dos documentos acostados aos autos destacam-se, especialmente, laudo médico do dia do acidente (index 000028, fls. 10), prontuário médico (index 000028, fls. 11/45), recibos com remédios e fotos da Autora com a lesão (index 000028, fls. 132). Decisão deferindo a gratuidade de justiça (index 000166). Em sua defesa, a Ré preliminarmente requer a denunciação da lide da Real Previdência e Seguros S/A. No mérito, alega que ao contrário do alegado pela Autora, o evento ocorreu quando a mesma se dirigia para os vestiários centrais, localizados em frente da pisca com ondas, em um local com gramado. Afirma que havia um guardião da piscina próximo ao local, que presenciou o evento e se recorda que a Autora tropeçou e foi socorrida por ele Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 5 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB logo depois, devidamente transportada em cadeira de rodas para o posto médico e posteriormente transferida para hospital, quando foi constatada fratura em seu tornozelo. Aduz que desde o início deu toda a assistência necessária ao tratamento e recuperação da Autora, mas por se tratar de pessoa obesa, pesando em torno de 120 kgs, sua recuperação ficou prejudicada, não sendo razoável que a Ré arque eternamente com as despesas médicas com as quais não deu casa e que são agravadas por circunstancias pessoais da Demandante. Defende não ser verossímil a alegação de que o acidente ocorreu por suposto piso molhado no parque, uma vez que o local em que a Autora tropeçou é revestido de grama natural, não colocando em risco a vida de nenhum usuário. Esclarece que o parque, por explorar o ramo de diversões em piscinas e atrações com água, usa material antiderrapante, garantindo a segurança dos usuários. Defende que não são devidos danos materiais uma vez que arcou com todas as despesas relativas à recuperação da Autora, concedendo inclusive acompanhante 24 horas para auxiliá-la neste período. Sustenta que arcou com gastos referentes a duas intervenções cirúrgicas, fisioterapia, medicamentos em geral. Afirma ausência de nexo causal, não sendo devidos quaisquer danos. Pugna pela improcedência dos pedidos (index 000174). Dos documentos acostados pela Ré destacam-se os gastos arcados pelo parque com a Autora (index 000214). Em provas (index 000306). Petição da Ré requerendo a produção de prova oral, depoimento pessoal da Autora, documentação superveniente, prova pericial médica, de engenharia e inspeção judicial, manifestando-se favorável à audiência de conciliação (index 000312). Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 6 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Petição da Autora entendendo desnecessária a audiência de conciliação, requerendo a inversão do ônus da prova, pugnando pela produção de prova oral, pericial médica e juntada superveniente de documentos (index 000318). Decisão deferindo a denunciação da lide (index 000325). Autora que ingressou com Agravo de instrumento dessa decisão (index 000342), que restou provido. Saneador (index 000359): “DECLARO saneado o feito. Defiro a prova pericial médica requerida pela Ré e a seu cargo, nomeando perito do Juizo o Dr. Mouses Parseghian, telefones 2293-4193 e 9641-0978, que deverá ser intimado para oferecer sua proposta de honorários. Faculto às partes a indicação de assistentes técnicos e apresentação de quesitos, no prazo de 10 dias. O laudo deverá vir aos autos em vinte dias após a homologação, devendo o Dr. Perito apresentá-lo no formato indicado pelo cartório. Desde já fica o cartório autorizado a expedir o mandado de pagamento em favor do Dr. Perito, tão logo apresente este o laudo, abrindo-se vista do mesmo, a seguir, às partes. Defiro a prova oral requerida pela Ré, consubstanciada no depoimento pessoal da Autora, vendo vir aos autos o recolhimento das custas para a intimação no prazo de dez dias. Indefiro a prova pericial de engenharia e a inspeção judicial, por entendê-las desnecessárias para o deslinde da questão. Defiro a prova oral requerida pela autora, consubstanciada na oitiva das testemunhas por ela arroladas às fis. 206/207 devendo o cartório promover as intimações por Oficial de Justiça, quando da designação da AI J, observada a gratuidade de justiça deferida. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 7 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Defiro, ainda, a prova documental superveniente requerida pelas partes, devendo os aludidos documentos virem aos autos em até vinte dias antes da realização da AI J. que será oportunamente designada.” Embargos de Declaração da Ré (index 000362) do saneador, insurgindo-se contra o indeferimento das provas requeridas. Petição da Autora indicando assistente técnico (index 000365). Embargos de Declaração da Autora (index 000367) insurgindo-se contra o deferindo da prova pericial médica e contra omissão acerca da inversão do ônus da prova e produção de prova testemunhal. Decisão do juízo a quo acolhendo os embargos tão somente para deferir a produção de prova testemunhal. (index 000386). Formulação de quesitos pela Ré (index 000368). Agravo de instrumento da Ré contra decisão saneadora (index 000370), que foi desprovido (index 000390). Decisão homologando os honorários periciais médicos em R$ 3.800,00 (três mil e oitocentos reais). Agravo de Instrumento da decisão que homologou os honorários periciais (index 000414) que foi parcialmente provido (index 000425). Laudo pericial (index 000458). Impugnação ao laudo pela Ré (index 000483) Petição da Ré requerendo a juntada de parecer de seu assistente técnico (index 00486). Audiência de instrução e julgamento (index 000584). Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 8 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Depoimento de testemunha da Ré (index 000702, fls. 12). Depoimento de testemunha da Autora (index 000739, fls. 14). Petição da Autora informando que seu quadro vem se agravando, evoluindo para uma “osteomielite por osteossintese de tornozelo esquerdo" e, atualmente, para uma "úlcera de estase", sendo-lhe indicada a "amputação no 1/3 proximal da perna esquerda” requerendo a realização de perícia médica complementar (index 000755). Fotos da situação do tornozelo da Autora (index 000757). Despacho (index 000771): “Considerando a gravidade do estado em que se encontraa Autora na iminência de ter sua perna amputada, conforme comprovado às fis. 577, defiro nova perícia complementar de imediato (...)”. Embargos de Declaração da Autora alegando omissão uma vez que o juízo deixou de nomear perito em angiologia, especialista na área de cirurgia vascular (index 000777). Decisão do juízo a quo acolhendo os embargos (index 000787): “Recebo os embargos porque tempestivos. No mérito dou-lhes provimento, assiste razão a embargante, considerando que o fato noticiado se alterou reconsidero o despacho de fls. 583 e 587, devendo a nova perícia ser realizada pelo Sr. Marcus Humberto Tavares Gress, devendo ser intimado na Divisão de Perícias do Tribunal de Justiça. No mais mantenho a despacho”. Petição da Autora indicando assistente e apresentando quesitos (index 000794). Petição da Ré anexando diversas sentenças de outros processos judiciais que julgaram improcedente os pedidos de falha na prestação de Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 9 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB serviço. Alega, novamente, que os acidentes ocorrem por conduta descuidada e desatenta das próprias pessoas (index 00800/801). Petição da Ré anexando aos autos laudo de exame em local da atração “Rio Selvagem” realizado pelo instituto de criminalística Carlos Éboli bem como o laudo pericial referente a outro processo judicial (index 000844/849). Petição da Autora retificando a indicação anterior para indicar como assistente técnico, o angiologista Dr. Julius Cesar Anchieta Mattos (index 000923). Petição da Autora informando que foi indicado o tratamento de 40 (quarenta) sessões de oxigenoterapia hiperbárica como última opção terapêutica disponível para evitar a amputação de parte do membro inferior esquerdo. Como o tratamento não está sendo realizado pela rede pública, requer que a Ré seja condenada a custear o tratamento. (index 000924). Decisão do juízo a quo (index 000930): “Trata-se de ação de indenização em razão de queda sofrida pela autora no parque da ré, o que ocasionou lesões, sendo certo que no curso do tratamento houve agravamento do quadro da autora, a qual encontra-se atualmente com o risco de amputação da perna esquerda. Consta laudo pericial médico às fls. 3341344, concluindo que a autora foi vítima de no acidente narrado. O feito encontra-se em fase de complementação da perícia. Considerando os documentos de fls. 7301733, a indicar a necessidade da autora a realizar tratamento hiperbárico o mais breve possível, a fim de se evitar a amputação da perna esquerda, e considerando ainda que o referido tratamento não se encontra disponível no SUS, entendo presentes os requisitos legais e defiro a tutela antecipada para determinar que o réu arque com o tratamento hiperbárico da autora, o qual é estimado em R$ Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 10 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB 11.080,00, conforme orçamento de fis. 733, devendo efetuar o pagamento das sessões de que necessita a autora, em até 48 horas, mediante depósito nos autos da quantia supra referida, sob pena de multa diária de R$ 300,00. Intime-se a parte ré pelo OJA de plantão. ” Petição da Ré formulando novos quesitos para a perícia médica (index 000936). Agravo de instrumento pela Ré (index 000938), que foi desprovido (index 000998). Petição da Autora informando que o tratamento não surtiu o efeito esperado, sendo agendada a cirurgia de amputação para o dia 25/03/2012 (index 001056). Laudo pericial (index 001071). Agravo retido da Ré contra a decisão que fixou os honorários periciais (index 001128). Contrarrazões (index 001140). Petição da Autora informando que teve que amputar seu membro inferior esquerdo (index 001144). Despacho juízo a quo (index 001157): “Considerando fls. 922/925, a situação fática da Autora atualmente mudou, uma vez que foi submetida à amputação do membro inferior esquerdo. Com isso, nomeio em substituição o perito Dr° DAVID PASSY cadastro em relação deperito do SEJUD, com telefone n° 2267-8809 e 99368-0312, que deverá ser intimado para dizer se aceita o encargo e orçar seus honorários. ” Laudo pericial (index 001169). Autos remetidos ao Grupo de Sentença (index 001210). Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 11 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Sentença de procedência prolatada pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Barra da Tijuca, cujo dispositivo ora transcrevo (index 001215): “Diante do exposto, na forma do art. 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na inicial, para: (1) Condenar o réu a pagar à autora, a pensão mensal vitalícia, à ordem de um salário mínimo nacional vigente, a partir do evento danoso, corrigido monetariamente, segundo os índices oficiais da CGJ- RJ, a partir da publicação da presente e acrescido de juros de mora de 1 % (um por cento) ao mês, a contar da citação; (2) Condenar o réu a pagar à autora, a título de indenização por danos materiais, o valor de R$ 2.376,06 (dois mil, trezentos setenta seis reais e seis centavos), acrescida de correção monetária, segundo os índices oficiais da CGJ-RJ, a contar das datas dos respectivos pagamentos e juros moratórios legais, a partir da citação; (3) Condenar o réu a custear todo o tratamento médico decorrente do evento ocorrido nas dependências do réu, sob pena de multa a ser fixada em sede de execução; (4) Condenar o réu a pagar à autora, a título de dano estético, o valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), corrigido monetariamente, segundo os índices oficiais da CGJ-RJ, a partir da publicação da presente e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação; (5) Condenar o réu a pagar à autora, a título de compensação por dano moral, o valor de R$ 250.000,00 (duzentos cinquenta mil reais), corrigido monetariamente, segundo os índices oficiais da CGJ- RJ, a partir da publicação da presente e acrescido de juros de mora de 1 % (um por cento) ao mês, a contar da citação. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 12 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Condeno, ainda, o réu ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), na forma do art. 85, §8º do novo CPC. Publique-se. Intimem-se. Transitada em julgado, dê-se baixa e arquivem-se, após cumpridas as formalidades legais. A Ré interpõe recurso de apelação arguindo cerceamento de defesa uma vez que a prova testemunhal não é a espécie probatória mais adequada para atestar a aderência do piso que revesteo chão. Afirma que não foi permitida a produção de prova técnica ou a inspeção judicial no local, não sendo permitido que a Ré demonstrasse a segurança do serviço prestado. Afirma que todo o parque tem o chão revestido por material poroso, que atua como antiderrapante, proporcionando segurança aos usuários. A ausência de prova técnica inviabilizou a defesa da Ré. Defende a necessidade de decretação de nulidade da sentença com a conversão do processo em diligencia para a produção de prova técnica ou inspeção judicial, que foi requerida em momento oportuno pela Demandada, porem indeferido pelo juízo a quo. Anexa aos autos 05 (cinco) laudos periciais realizados em outras demandas judiciais que atestam a segurança do local. No mérito, alega que a Autora levou um tombo porque escorregou na grama, inexistindo qualquer falha imputável às atrações, equipamentos ou funcionários da Ré. Sustenta que a Autora só escorregou porque andava apressadamente sobre a grama e não sobre o caminho com antiderrapante. Afirma que a queda resultou em lesão no tornozelo esquerdo da Autora e, depois de prestada a devida assistência ambulatorial no local com o tratamento adequado, não restaram quaisquer sequelas. Ressalta que o evento ocorreu em 2003, sendo que a Autora anexou aos autos em 26/04/2011 laudo médico indicando necessidade de amputação do membro inferior esquerdo, no entanto, não restou demonstrado relação direta e imediata com o evento danoso. Sustenta que “o presente laudo pericial de fls. 858/866, expõe com clareza as diferenças entre as consequências diretas do tombo ocorrido e as consequências diretas do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 13 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB tratamento ortopédico recebido, de responsabilidade dos médicos e clinicas que a receberam. ” (textual) Caso não seja reconhecida a culpa exclusiva da vítima, impõe-se o reconhecimento da concorrência de causas, sendo imperiosa a redução da vernas indenizatórias (index 001225). Por sua vez, a Autora interpõe recurso de apelação no qual afirma que após o procedimento cirúrgico, passou a apresentar fortes dores na região craniana, solicitando auxilio junto a Ré, sendo internada duas vezes. Afirma que a Ré passou a custear o fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento do Autora, assim como sessões de fisioterapia. No entanto, foi constatado que os pontos cirúrgicos da Autora estavam inflamados, sendo necessário novo atendimento de março de 2004. Após, foi diagnosticada a rejeição dos pontos, tendo a fratura se consolidada, sendo necessário novo procedimento cirúrgico, em 08/06/2004. Aduz que a Ré, ciente de sua responsabilidade, arcou com as consultas, procedimentos cirúrgicos, medicamentos e sessões de fisioterapia até agosto de 2004, no entanto, parou de prestar auxilio a Autora nessa época, o que fez com que a mesma arcasse com as despesas médicas decorrentes do acidente. Defende que realizada a prova pericial médica, restou demonstrado o nexo de causalidade entre o evento danoso e a lesão sofrida, sendo atestado sua incapacidade total temporária pelo período de 45 dias. Pugna pela majoração da verba indenizatória fixada referente ao dano estético, uma vez que o valor de R$ 200.000,00 não se mostra compatível com o consignado pelo perito, que atestou ser dano estético de grau máximo com imputação de membro. Ademais, sustenta que não foi fixada a constituição de capital garantidor necessário para assegurar o pagamento das prestações vincendas. Requer, ainda, a majoração dos honorários de sucumbência, ao argumento de que o valor de R$ 10.000,00 fixado pelo juízo a quo é inaplicável ao caso Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 14 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB concreto, devendo ser observada a fixação entre 10 a 20% do valor da condenação (index 001253). Despacho nos seguintes termos (index 001274): “1- Considerando a decisão de fls. 946, determinando que os honorários periciais sejam arcados pelo vencido ao final, tendo sido o Réu condenado, desentranhe-se fi. 1003 e autue-se como cumprimento provisório de sentença; 2- Ao apelado. Após, com ou sem contrarrazões devidamente certificadas, subam ao E TJ, com as nossas homenagens. ” Contrarrazões da Autora (index 001275). Petição da Ré requerendo a juntada de laudo elaborado por assistente técnico, demonstrando que o piso do parque aquático é composto de material antiderrapante (index 001301). Laudo (index 001303). VOTO Em juízo de admissibilidade, reconheço a presença dos requisitos extrínsecos e intrínsecos, imprescindíveis à interposição dos recursos de apelação. Deixo de conhecer o Agravo Retido da Ré acerca da decisão que fixou os honorários periciais uma vez que não foi reiterado em apelação. Inicialmente, rejeita-se o pedido de juntada de novos documentos pela parte Ré. Trata-se de requerimento em momento processual totalmente inoportuno, uma vez que os documentos que a Recorrente pretende anexar aos autos poderiam ter sido apresentados ao longo da instrução processual. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 15 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Ademais, depreende-se que a documentação não se mostra necessária para o deslinde da causa, tendo em vista que se trata de perícia realizada no local anos após o acidente que ora se analisa. Do mesmo modo, rejeita-se o pedido de conversão do feito em diligência. Isso porque, passados quase 15 (dez) anos da data do acidente e 13 (treze) anos da propositura da demanda, não se revela razoável a anulação da sentença e a determinação de realização de perícia ou inspeção judicial, devido à provável alteração do local após o fato ora examinado. Afasta-se, também, a alegação de cerceamento de defesa. A questão acerca da instrução probatória foi objeto de análise ao longo do processo, tendo o assunto transitado em julgado. A alegação de que não foi possível a defesa da Ré ao argumento de que foi negada a produção de prova pericial não merece acolhimento, haja vista que os fatos alegados pela Demandada poderiam ter sido provados por outros meios, como provas do local à época, filmagens e depoimentos de funcionários e pessoas que estavam no parque na hora do acidente. A presente demanda foi instruída ao longo de mais de 13 anos, estando madura para julgamento. Passa-se à análise do mérito. Cinge-se a controvérsia acerca da responsabilidade civil em decorrência de queda sofrida por consumidora durante visita ao parque aquático Rio Water Planet. Trata-se de demanda indenizatória na qual a Autora pugna pela reparação moral, material e estética da Ré em razão de acidente sofrido em suas dependências. Após realizar algumas cirurgias em seu tornozelo em razão de queda de sua própria altura, foi necessária a amputação de membro da Autora. Prolatada sentença de procedência, insurgem-se ambasas partes da decisão. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 16 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Inicialmente, cumpre asseverar que a relação mantida entre as partes é de consumo, razão pela qual aplicam-se à hipótese as normas e princípios do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, em se tratando de relação de consumo, o fornecedor do serviço responde pelos danos causados ao consumidor de forma objetiva, nos moldes do art. 14 do CDC, somente excluindo sua responsabilidade nos casos previstos no § 3º do mesmo dispositivo legal: Art. 14 O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Preenchidos os requisitos necessários para reconhecer a responsabilidade civil objetiva e não demonstrando o fornecedor culpa exclusiva da vítima ou de terceiro ou inexistência de defeito, existirá o dever de reparar os danos. Nessa esteira, relembre-se que a responsabilidade civil objetiva caracteriza-se pela demonstração de três requisitos: conduta (ação ou omissão), dano e nexo de causalidade, não sendo exigido, portanto, a demonstração da culpa do agente. No caso dos autos, é incontroverso que a Autora se acidentou enquanto estava nas dependências da Ré, recebendo atendimento médico dentro e fora do parque. Por certo, a Autora encontrava-se no estabelecimento da Ré com a intenção de usufruir um dia de diversão e descanso com seus familiares. No entanto, devido à falha na prestação do serviço, sofreu fratura em seu Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 17 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB tornozelo esquerdo e necessitou ser internada, a fim de se submeter à intervenção cirúrgica. Assim, em decorrência de sua atividade e dos riscos a ela inerentes, a Ré está obrigada a prover a segurança de seus clientes, tanto em relação aos serviços que disponibiliza, quanto à preservação da incolumidade física de seus consumidores. Destarte, cabe à Ré o dever de adotar todas as providências de fiscalização regular para que o ambiente e instalações de seu parque não coloquem em risco a integridade física dos clientes. Não tendo a fornecedora logrado êxito em demonstrar culpa exclusiva da consumidora ou de terceiro, persiste a responsabilidade da Ré em reparar os danos no caso em análise. Ocorre que persiste a controvérsia acerca da extensão da responsabilidade da Ré, impondo-se a análise de possível rompimento de nexo causal em razão de grave complicação pós-operatória tardia em cirurgia (osteomielite). Para tanto, faz-se necessária uma breve análise acerca das teorias ventiladas em nosso ordenamento jurídico. Por certo, o nexo de causalidade ou nexo causal constitui o elemento imaterial ou virtual da responsabilidade civil, constituindo a relação de causa e efeito entre a conduta culposa ou o risco criado e o dano suportado por alguém. De acordo com a doutrina de Sérgio Cavalieri Filho1: “trata-se de noção aparentemente fácil, mas que, na prática, enseja algumas perplexidades (...). O conceito de nexo causal não é jurídico; decorre das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado” Inicialmente, tem-se a teoria da equivalência das condições, elaborada por Von Buri para o direito penal. Segundo essa teoria, o intérprete 1 CAVALIERI FILHO, Sérgio – Programa de Responsabilidade Civil, editora Atlas, 2014, p. 61). Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 18 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB deve perquirir todas as situações que tenham colaborado para o dano, incluindo-as no âmbito da relação de causalidade. Por sua vez, na teoria da causalidade adequada, a investigação do nexo que liga o resultado danoso ao agente infrator é indispensável para que se possa concluir pela responsabilidade jurídica. Somente será possível responsabilizar alguém cujo comportamento houvesse dado causa ao prejuízo. Aqui, há que se perquirir qual a causa que se mostrou mais relevante para a efetivação do dano. O ponto central para o correto entendimento desta teoria consiste no fato de que somente o antecedente abstratamente apto à determinação do resultado, segundo um juízo razoável de probabilidade, em que conta a experiência do julgador, será considerado causa. Na causalidade adequada, não se considera causa “toda e qualquer condição que haja contribuído para a efetivação do resultado”, mas apenas o antecedente abstratamente idôneo à produção do efeito danoso. De acordo com Sergio Cavalieri, “causa, para ela, é o antecedente, não só necessário, mas, também adequado à produção do resultado. Logo, nem todas as condições serão causa, mas apenas aquela que for mais apropriada para produzir o evento”: “ (...) se alguém retém ilicitamente uma pessoa que se apressava para tomar certo avião, e teve, afinal, de pegar um outro, que caiu e provocou a morte de todos os passageiros, enquanto o primeiro chegou sem incidente ao aeroporto de destino, não se poderá considerar a retenção ilícita do indivíduo como causa (jurídica) do dano ocorrido, porque, em abstrato, não era adequada a produzir tal efeito, embora se possa asseverar que este (nas condições em que se verificou) não se teria dado se não fora o ilícito. A ideia fundamental da doutrina é a de que só há uma relação de causalidade adequada entre o fato e o dano quando o ato ilícito praticado pelo agente seja de molde a Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 19 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB provocar o dano sofrido pela vítima, segundo o curso normal das coisas e a experiência comum da vida”.2 Por fim, pela teoria da causalidade direta ou imediata3 desenvolvida no Brasil pelo professor Agostinho Alvim, “causa” seria o antecedente fático que, ligado por um vínculo de necessariedade ao resultado danoso, determina este último como uma consequência sua, direta e imediata. A teoria do dano direto e imediato esclarece que somente é passível de reparação o dano que for direta e imediatamente causado pelo comportamento do ofensor, afastando situações de prejuízos remotos, assim como fatos posteriores que interrompam a relação de causalidade, advindo daí a concepção de teoria da interrupção do nexocausal. Em que pese sejam as duas últimas teorias extremamente semelhantes, filio-me à teoria da causalidade direta ou imediata, adotada pelo Código Civil de 2002: “Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.” Feitas essas ponderações, passo à análise das provas dos autos. O primeiro laudo pericial realizado em dezembro de 2007 concluiu que (index 000458): “(...) Periciada comparece ao exame mostrando-se lúcida e orientada no tempo e no espaço, respondendo coerentemente ao que lhe é perguntado, não evidenciando sinais e/ou sintomas de natureza neuro psíquicos relacionados com o acidente. 2 CAVALIERI FILHO, Sérgio - Programa de Responsabilidade Civil, 2. ed., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 51 3 ou teoria da causalidade necessária ou teoria do dano direto e imediato. – DE MELO, Marco Aurélio Bezerra – DIREITO CIVIL – RESPONSABILIDADE CIVIL. 2017, ed. Forense. Pagina 20 Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 20 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB No momento queixa-se de dores na região lesionada. Seu Exame Físico revela: Membro Inferior Esquerdo, Sinais de insuficiência venosa crônica. Presença de zona de retração cicatricial medindo cerca de 8 cm x 5 cm, localizada na face lateral externa da perna em terço inferior, hipercromica e dolorosa ao toque; Não há saída de secreções. Ausência de mioatrofias, encurtamentos, desvios ósseos ou abaulamentos a ectoscopia. Musculatura do membro preservada. Movimentos articulares do tornozelo são realizados sem limitações. Força muscular e capacidade funcional mantidos. Marcha normal. PERÍODO DE INCAPACIDADE TOTAL TEMPORÁRIA Este período é estimado em 45 ( quarenta e cinco ) meses e corresponde ao tempo que a Autora permaneceu em tratamento face as lesões sofridas no acidente em questão até a sua alta em 06/09/07. VII - CONCLUSÃO E AVALIAÇÃO Tendo em vista o que foi apurado no Exame Pericial realizado; conclui-se que a Autora foi vítima no acidente narrado na Inicial, tendo sofrido lesões já definidas nos itens anteriores do presente laudo pericial que mereceram tratamento ortopédico e fisioterápico bem aplicados que tiveram boa evolução, não restando a mesma sequelas que a tornem incapacitada para suas atividades habituais e/ou laborativas. (...) Deverá fazer parte da indenização verba relacionada ao Dano estético apresentado pela Autora que na opinião deste signatário situa-se em grau mínimo, cabendo a quantificação do referido dano ser apreciada pela M. M. Julgadora conforme o seu entendimento e no momento oportuno. (...) 03 - Tais lesões guardam correspondência com os fatos narrados na Inicial, sendo possível estabelecer-se o nexo causal entre ambos? R. Sim. (...) 06 - Tais lesões são de caráter permanente? R.: A Autora apresenta seqüelas cicatriciais a nível do membro Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 21 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB inferior esquerdo, estando preservadas as funções do membro.” (grifos nossos) No entanto, passado os anos e com o agravamento da perna da Autora, foi determinada nova perícia médica que concluiu que a piora significativa no quadro de saúde da Autora foi indiretamente causado pela queda de sua própria altura, tendo em vista o quadro de osteomielite crônica do tornozelo esquerdo, caracterizando-a como grave complicação pós-operatória tardia da cirurgia ortopédica (index 001071): “ (...) 2. Queira o ilustre perito descrever o atual estado do membro inferior esquerdo da autora, esclarecendo se tal fato foi causado e/ou agravado pela fratura e lesões sofridas em dezembro de 2003. O atual estado do membro inferior esquerdo da autora (tecnicamente pormenorizado no item EXAME FÍSICO, na 2a e 3a páginas do presente laudo pericial, e ilustrado pelas fotos anexas) foi indiretamente causado pela queda da própria altura e fratura sofridos em 07/12/2003, tendo em vista que o quadro atual de osteomielite crônica do tornozelo esquerdo com fístula cutânea (CID M86.4) é uma grave complicação pós- operatória tardia da cirurgia ortopédica realizada para a correção da referida fratura. (...) QUESITOS FORMULADOS ÀS FLS. 738 1739 PELO RÉU: 1. Queiram os Drs. Peritos esclarecer se a lesão física informada pela Autora às fls. 572/573 decorre de doença vascular crônica que foi constatada e confirmada pelo perito quando responde ao quesito n° 7 (formulado pela autora) às fl. 341 dos autos. Não. A lesão informada pela autora decorre da presença de osteomielite crônica do tornozelo esquerdo com fístula cutânea (CID M86.4), grave complicação infecciosa pós- operatória tardia da cirurgia ortopédica realizada para a correção da fratura ocorrida em dezembro de 2003. (...) CONSIDERAÇÕES FINAIS: Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 22 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB 1. O aspecto atual do ferimento da perna esquerda da autora é semelhante ao ilustrado nas fls. 574 e 575 do processo (0412011). 2. O extenso ferimento que a autora apresenta no seu membro inferior esquerdo foi indiretamente causado pela queda da própria altura e fratura fechada bimaleolar do tornozelo esquerdo (CID I82. 5 e I82.6) sofridos em 07/12/2003, tendo em vista que o quadro atual de osteomielite crônica do tornozelo esquerdo com fístula cutânea (CID M86.4) é uma grave complicação pós- operatória tardia da cirurgia ortopédica realizada para a correção da referida fratura. 3. De maneira coadjuvante, também conspira para a persistência da ferida a insuficiência venosa crônica secundária (CID I83.2) que a autora apresenta, sendo ela conseqüência da anquilose (rigidez articular) do tornozelo também causada pela grave fratura prévia e pela osteomielite atual. 4. A autora não apresentava afecção vascular venosa antes da fratura do tornozelo esquerdo e seu tratamento cirúrgico.” (grifos nossos) Em que pese a realização de tratamento de oxigenação hiperbárica, foi necessária a amputação do membro inferior da Autora em 14/05/2013, sendo então, realizada nova perícia (index 001169): “(...) V- O EXAME FÍSICO DIRECIONADO DEMONSTROU: Membro superior esquerdo: Cicatriz com marcas de pontos localizada na face ventral, medindo 240mm de comprimento apresenta uma área de 70x90 mm compatível com enxertia cutânea. Sequela decorrente de retirada de retalho microcirúrgico para reconstrução do membro inferior esquerdo. Membro inferior esquerdo: Amputação transtibial ao nível do 1/3 superior da perna esquerda. V- CONCLUSÃO DO EXAME CLÍNICO: O Autor apresenta uma debilidade funcional em grau elevado na função da marcha do membro inferior Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 23 ApelaçãoCível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB esquerdo (amputação) e deformidades cicatriciais, decorrentes do acidente descrito na inicial. VIII- CONCLUSÃO. Há caracterização do nexo causal, informando que houve lesão no autor. O Autor apresenta uma debilidade funcional em grau elevado na função da marcha do membro inferior esquerdo e deformidades cicatriciais, decorrentes do acidente descrito na inicial. Apresenta dano estético de grau máximo. De acordo com o disposto na tabela portaria N°4 de 11/06/ 1959, a Autora tem um percentual permanente de invalidez de 95%. Perda do terço médio da coxa ao terço superior da perna inclusive=65%. Prejuízo estético em grau máximo: 30% a) Das incapacidades - A Autora está impossibilitada de exercer sua atividade laboral declarada. b) Dos tratamentos - A Autora foi corretamente tratada. A sequela está estabilizada e é definitiva. (...)” (grifos nossos) Feitas esses esclarecimentos, é importante ressaltar que a amputação do membro da Autora ocorreu devido à osteomielite4, que é, por definição, um quadro inflamatório que afeta um ou mais ossos, geralmente provocado por infecção bacteriana ou fúngica. A osteomielite pode permanecer localizada ou difundir-se pela corrente sanguínea, comprometendo outras partes do osso e tecidos do corpo. A contaminação bacteriana pode ocorrer se a pessoa quebrou um osso, principalmente quando o caso é de fratura exposta. Pode-se contrair a doença também durante cirurgias. Nesse ponto, tem-se que a eclosão do processo infeccioso (osteomielite) pode ser considerado como um desdobramento eventualmente previsível de procedimento cirúrgico, o que a doutrina convencionou chamar de 4 https://drauziovarella.uol.com.br/doencas-e-sintomas/osteomielite/ https://drauziovarella.uol.com.br/doencas-e-sintomas/osteomielite/ Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 24 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB risco inerente, ao tratar da responsabilidade civil médica. Conforme nos ensina Sérgio Cavalieri Filho: “Risco inerente ou periculosidade latente é o risco intrínseco, atado à sua própria natureza, qualidade da coisa, ou modo de funcionamento”5 Esta Corte Estadual já se manifestou nesse sentido, no julgamento da Apelacão Cível nº 0001008-64.2006.8.19.0012 de Relatoria do Des. Marcelo Buhatem: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - PLEITO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS - AUTOR APELANTE QUE ALEGA TER SIDO ACOMETIDO DE GRAVE PROCESSO INFECCIOSO, APÓS COLOCAÇÃO DE PRÓTESE DE MÁ-QUALIDADE EM SEU FÊMUR ESQUERDO EM HOSPITAL MUNICIPAL. LAUDO PERICIAL QUE DEIXOU ENTREVER QUE O FATO DE TER HAVIDO UMA FRATURA EXPOSTA, DE PER SI, JÁ POSSIBILITA, AINDA QUE TOMADOS OS DEVIDOS CUIDADOS E PRECAUÇÕES MÉDICAS, A INSTALAÇÃO DE INFECÇÃO ÓSSEA – PRESENÇA DE OSTEOMIELITE - RISCO INERENTE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO NEXO CAUSAL ENTRE A AÇÃO ESTATAL E O DANO ALEGADO PELO ADMINISTRADO - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA QUE SE MANTÉM. 1. Cinge-se a controvérsia quanto à responsabilidade civil do Estado, por danos materiais e morais, decorrente de processo infeccioso pós- cirúrgico, que acometeu o autor depois da colocação de uma prótese em seu fêmur esquerdo no Hospital Municipal Celso Martins. 2. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, §6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se severificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto. 3. Consoante doutrina José dos Santos Carvalho Filho: "A marca da responsabilidade objetiva é a 5 In Programa de Responsabilidade Civil, p. 387 Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 25 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB desnecessidade de o lesado pela conduta estatal provar a existência da culpa do agente ou do serviço. O fator culpa, então, fica desconsiderado com pressupostos da responsabilidade objetiva (...)", sendo certo que a caracterização da responsabilidade objetiva requer, apenas, a ocorrência de três pressupostos: a) fato administrativo: assim considerado qualquer forma de conduta comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público; b) ocorrência de dano: tendo em vista que a responsabilidade civil reclama a ocorrência de dano decorrente de ato estatal, latu sensu; c) nexo causal: também denominado nexo de causalidade entre o fato administrativo e o dano, consectariamente, incumbe ao lesado, apenas, demonstrar que o prejuízo sofrido adveio da conduta estatal, sendo despiciendo tecer considerações sobre o dolo ou a culpa. 4. Assim, caracterizada a hipótese de responsabilidade objetiva do estado, impõe-se ao lesado demonstrar: a ocorrência do fato administrativo (colocação de prótese infectada), a ocorrência do dano (osteomielite crônica em fêmur esquerdo com grave encurtamento de membro inferior) e, finalmente, o nexo causal (que o grave processo infeccioso decorreu da colocação de prótese infectada no hospital municipal), para só então ver responsabilidade o ente estatal. 5. Deveras, na hipótese vertente, o laudo pericial deixou entrever que o fato de ter havido fratura exposta, de per si, já permite, ainda que tomados os devidos cuidados e precauções médicas, seja instalada infecção óssea, no caso a osteomielite. 6. Há respeitáveis opiniões que sustentam que a eclosão do processo infeccioso (osteomielite) pode ser considerada como um desdobramento previsível do tratamento da fratura exposta, o que a doutrina convencionou chamar de risco inerente, ao tratar da responsabilidade civil médica. 7. Conforme nos ensina Sérgio Cavalieri Filho: “Risco inerente ou periculosidade latente é o risco intrínseco, atado à sua própria natureza, qualidade da coisa, ou modo de funcionamento” 8. Importando a doutrina do risco Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 26 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB inerente para o caso em exame, vê-se que este foi o motivo pelo qual o expert do Juízo concluiu o laudo pericial, afirmando que não ser possível definir se o resultado final das lesões suportadas pelo autor se deve a gravidade destas ou da conduta adotada pelos profissionais que o trataram, nem sequer se a qualidade inferior ou não do material empregado na cirurgia tenha sido causa exclusiva do resultado final, restando configurada situação de uma intercorrência, que nem sempre é resultado insatisfatório de uma intervenção médica, cirúrgica ou não. 9. Logo, não demonstrado o nexo causal entre o ato estatal e o dano alegado pelo administrado, corretaa sentença ao julgar improcedente o pedido, de modo a excluir a responsabilidade do Estado pelo evento danoso que acometeu o autor.” (grifos nossos) Destaca-se o seguinte trecho do referido acórdão: “ (...) Conforme nos ensina Sérgio Cavalieri Filho: “Risco inerente ou periculosidade latente é o risco intrínseco, atado à sua própria natureza, qualidade da coisa, ou modo de funcionamento”. Essa regra é perfeitamente aplicável aos serviços médico-hospitalares e própria para resolver os mais intrincados problemas que nessa área possam surgir. Não respondem os médicos, nem os hospitais, pelos riscos inerentes à sua atividade porque casos tais não haverá defeito no serviço. A cirurgia de uma pessoa idosa – ou mesmo outros tipos de cirurgia ou tratamentos –, por si só representa riscos que não podem ser eliminados; são riscos normais e previsíveis que não decorrem de nenhum defeito.” (grifos nossos) Nesse sentido, eventual infecção relacionada com os serviços de saúde não indica, necessariamente, que a equipe médica tenha cometido um erro na assistência prestada ao paciente. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 27 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB Por certo, nenhuma cirurgia é isenta de complicações. Ocorre que a osteomielite é hipótese de risco inerente da atividade médica, não podendo, portanto, ser fundamento para responsabilizar o parque aquático por falha na prestação de serviços. Lembre-se. A presente demanda não tem como finalidade discutir eventual falha ou erro médico. Busca-se aqui analisar a responsabilidade civil do parque aquático em decorrência de queda sofrida por uma de suas consumidoras dentro de suas dependências e os danos daí advindos. Em que pese a amputação de parte da perna esquerda da Autora seja uma fatalidade, não se mostra possível responsabilizar a Ré por este fato, sendo cabível a reparação material, moral e estética até a realização da cirurgia, quando da realização da primeira prova pericial em 2007, aplicando-se assim a teoria da causalidade direta ou imediata, segundo a qual é passível de reparação o dano que for direta e imediatamente causado pelo comportamento do ofensor, afastando situações de prejuízos indiretamente relacionadas ao fato danoso, como é o caso da osteomielite. Com efeito, a osteomielite, caracterizada como risco inerente da atividade médica, rompe o nexo de causalidade, não podendo ser a Ré responsabilizada pela amputação. Nessa esteira, são devidos danos morais à Autora, sendo evidente os transtornos sofridos durantes anos, em verdadeira via crucis na qual a Demandante era encaminhada para diversos e diferentes nosocômios, para tratar da fratura em seu tornozelo. Entendeu o juízo a quo pela fixação de danos morais no valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). No entanto, considerando o rompimento do nexo causal acima esclarecido, impõe-se sua redução para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), compatível com a extensão da responsabilidade da Ré. Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 28 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB O quantum indenizatório deve atentar para a extensão, gravidade e repercussão do sofrimento da vítima, e deve estar em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sem que ocorra na hipótese enriquecimento indevido. No que se refere a condenação em danos materiais, impõe-se a manutenção da sentença nessa parte, uma vez que a Autora demonstrou os gastos com seu tratamento no valor de R$ 2.376,06, tal como salientado pelo juízo a quo. Impõe-se reforma parcial na reparação por dano estético, uma vez que a amputação não pode ser atribuída como responsabilidade da Ré. Destarte, a cirurgia realizada após a queda da Autora, deixou-a com cicatriz visível em seu corpo, sendo cabível portanto a reparação equivalente ao dano estético naquele momento sofrido. Confira-se: “(...) VII - CONCLUSÃO E AVALIAÇÃO Tendo em vista o que foi apurado no Exame Pericial realizado; conclui-se que a Autora foi vítima no acidente narrado na Inicial, tendo sofrido lesões já definidas nos itens anteriores do presente laudo pericial que mereceram tratamento ortopédico e fisioterápico bem aplicados que tiveram boa evolução, não restando a mesma sequelas que a tornem incapacitada para suas atividades habituais e/ou laborativas. (...) Deverá fazer parte da indenização verba relacionada ao Dano estético apresentado pela Autora que na opinião deste signatário situa-se em grau mínimo, cabendo a quantificação do referido dano ser apreciada pela M. M. Julgadora conforme o seu entendimento e no momento oportuno. (...) (grifos nossos) (index 000458). In casu, em atenção as peculiaridades do caso, mostra-se adequada a fixação de condenação à título de dano estético o valor de R$ Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 29 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB 70.000,00 (setenta mil reais), compatível com a cicatriz mencionada na perícia médica. Reforma-se parcialmente a sentença no que se refere ao pensionamento concedido, já que afastada a responsabilidade da Ré quanto a amputação, impõe-se a sua limitação ao período que a Autora fixou incapacitada segundo a primeira pericia, incidindo à hipótese a súmula 490 STF6: “(...) VI - PERÍODO DE INCAPACIDADE TOTAL TEMPORÁRIA Este período é estimado em 45 (quarenta e cinco) meses e corresponde ao tempo que a Autora permaneceu em tratamento face as lesões sofridas no acidente em questão até a sua alta em 06/09/07. ” (index 000458, fls. 7). Por certo, não sendo devida o pensionamento vitalício, descabida a constituição de capital garantidor. Por fim, impõe-se a reforma da condenação em honorários advocatícios, incidindo à hipótese o disposto no art. 85, §2º do CPC7. Dessa forma, em atenção às regras estabelecidas no art. 85, § 2º do CPC, observando as peculiaridades do caso, o grau de zelo profissional, a natureza e importância da causa assim como o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, entendo razoável fixar os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação. Por tais fundamentos, VOTO NO SENTIDO DE 6 SUMULA 490 STF: A pensão correspondente à indenização oriunda de responsabilidade civil deve ser calculada com base no salário mínimo vigente ao tempo da sentença e ajustar-se-á às variações ulteriores. 7 “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. (...) § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigidopara o seu serviço.” Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Quinta Câmara Cível 30 Apelação Cível nº 0010740-94.2005.8.19.0209 Secretaria da Quinta Câmara Cível Rua Dom Manuel, nº 37, sala 434, Lâmina III Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-010 Tel.: + 55 21 3133-6295 – E-mail: 05cciv@tjrj.jus.br RVRGB - NÃO CONHECER O AGRAVO RETIDO; - DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DA AUTORA tão somente para reformar a condenação em honorários advocatícios, fixando-os em 10% sobre o valor da condenação na forma do art. 85, § 2º do CPC; -DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DA RÉ para: a) reduzir a reparação por dano moral para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais); b) reduzir a reparação por dano estético para R$ 70.000,00 (setenta mil reais) ; c) limitar o pensionamento devido para 45 meses. Rio de janeiro, 12 de fevereiro de 2019 Desembargadora DENISE NICOLL SIMÕES Relatora 2019-02-12T18:13:19-0200 GAB. DES(A) DENISE NICOLL SIMOES
Compartilhar