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Indaial – 2022 Orgânica Prof. Alexsandro Nunes Colim 1a Edição FundamentOs da Química Copyright © UNIASSELVI 2022 Elaboração: Prof. Alexsandro Nunes Colim Revisão, Diagramação e Produção: Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI Impresso por: C696f Colim, Alexsandro Nunes Fundamentos da química orgânica. / Alexsandro Nunes Colim – Indaial: UNIASSELVI, 2022. 242 p.; il. ISBN 978-65-5663-774-7 ISBN Digital 978-65-5663-775-4 1. Química Orgânica. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 540 Prezado acadêmico, seja muito bem-vindo à disciplina de Fundamentos da Química Orgânica. Neste livro, veremos que, ao longo da evolução humana, buscamos entender sua própria existência. Por muitos anos, um dos nossos principais questionamentos foi direcionado à compreensão da formação do universo, da natureza, dos objetos e da matéria que nos cercam. Nessa jornada, filósofos e cientistas entrelaçaram seus questionamentos e conhecimentos. No século XVII, a química já despontava como uma importante área de investigação científica, mas foi no final do século XVIII que a química orgânica revelou grandes conhecimentos à humanidade. O objetivo deste livro é facilitar o entendimento dos principais conceitos que norteiam a química orgânica e elucidar seu papel no dia a dia. Para que os conteúdos sejam abordados de maneira clara, este material foi dividido em três unidades. Na Unidade 1, faremos um sobrevoo na história da química orgânica, entrando em contato com as personalidades que influenciaram e determinaram a base do conhecimento que, hoje, temos disponível. Além disso, estudaremos alguns aspectos gerais sobre o carbono, elemento central da química orgânica, e conceitos fundamentais para a compreensão estrutural das cadeias carbônicas. Será apresentada uma introdução da nomenclatura de compostos orgânicos e do estudo das funções orgânicas, com destaque aos compostos formados (exclusivamente) por átomos de carbono e hidrogênio, chamados de hidrocarbonetos. Na Unidade 2, estudaremos as funções orgânicas, porém, dando enfoque aos compostos oxigenados (álcoois, fenóis, éteres, ésteres, aldeídos, cetonas e ácidos carboxílicos). Além disso, veremos as funções orgânicas nitrogenadas: anina, amida, nitrila e nitro compostos. Ainda estudaremos os haletos orgânicos e os compostos sulfurados. Para facilitar o aprendizado, ao final de cada grupo de funções orgânicas, fizemos um resumo geral. Por fim, na Unidade 3, estudaremos algumas propriedades físicas, como geometria molecular, ponto de fusão, ebulição e densidade de compostos orgânicos. Além disso, estudaremos a isomeria (plana e espacial) e alguns tipos de reações químicas, comumente, utilizadas em química orgânica. Espero que você se comprometa nessa jornada pelo conhecimento. Bons estudos! Prof. Alexsandro Nunes Colim APRESENTAÇÃO Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, a UNIASSELVI disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos. GIO QR CODE Você lembra dos UNIs? Os UNIs eram blocos com informações adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento acadêmico como um todo. Agora, você conhecerá a GIO, que ajudará você a entender melhor o que são essas informações adicionais e por que poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações durante o estudo do livro. 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SUMÁRIO UNIDADE 1 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA ORGÂNICA ................................. 1 TÓPICO 1 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA DO CARBONO ...............................3 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................3 2 HISTÓRIA DA QUÍMICA: UM SOBREVOO SOBRE A EVOLUÇÃO DA QUÍMICA ORGÂNICA .......4 3 ASPECTOS GERAIS SOBRE O ÁTOMO DE CARBONO ........................................................6 3.1 A TETRAVALÊNCIA DO CARBONO ..................................................................................................... 6 3.2 HABILIDADE PARA FORMAR MÚLTIPLAS LIGAÇÕES ...................................................................7 3.3 HABILIDADE PARA FORMAR LONGAS CADEIAS CARBÔNICAS ................................................8 3.4 CLASSIFICAÇÃO DOS ÁTOMOS DE CARBONO DE UMA CADEIA CARBÔNICA ..................... 9 4 ESTRUTURA ATÔMICA: COMPREENDENDO AS LIGAÇÕES QUÍMICAS DO CARBONO ...........10 4.1 ORBITAIS ATÔMICOS ............................................................................................................................ 11 4.1.1 Número quântico principal (n)................................................................................................. 13 4.1.2 Número quântico secundário ou azimutal (l) ..................................................................... 13 4.1.3 Número quântico magnético (m ou ml) .............................................................................. 13 4.1.4 Número quântico spin (s ou ms) ............................................................................................ 15 4.2 HIBRIDIZAÇÃO: CARBONO SP3, SP2 E SP .....................................................................................16 4.2.1 Hibridização: carbono Sp3 ........................................................................................................17 4.2.2 Hibridização: carbono Sp2 ..................................................................................................... 18 4.2.3 Hibridização: carbono Sp ....................................................................................................... 18 RESUMO DO TÓPICO 1 ........................................................................................................ 20 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................. 21 TÓPICO 2 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE COMPOSTOS ORGÂNICOS ................ 25 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 25 2 REPRESENTAÇÃO ESTRUTURAL DAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS ............................... 25 2.1 FÓRMULA ELETRÔNICA ..................................................................................................................... 27 2.2 FÓRMULA ESTRUTURAL PLANA .................................................................................................... 27 2.3 FÓRMULA ESTRUTURAL SIMPLIFICADA ......................................................................................28 2.4 FÓRMULA CONDENSADA LINEAR ..................................................................................................28 3 CLASSIFICAÇÃO DE CADEIAS CARBÔNICAS ................................................................ 30 3.1 QUANTO AO FECHAMENTO DA CADEIA CARBÔNICA .................................................................30 3.2 QUANTO À DISPOSIÇÃO DOS ÁTOMOS NA CADEIA CARBÔNICA ...........................................32 3.3 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TIPO DE LIGAÇÃO ENTRE ÁTOMOS DE CARBONO ..............33 3.4 QUANTO À NATUREZA DOS ÁTOMOS PRESENTES NA CADEIA CARBÔNICA ......................34 4 RESUMO DA CLASSIFICAÇÃO DE CADEIA CARBÔNICA ................................................37 5 INTRODUÇÃO À NOMENCLATURA DE COMPOSTOS ORGÂNICOS ................................ 38 RESUMO DO TÓPICO 2 ........................................................................................................ 44 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 45 TÓPICO 3 - HIDROCARBONETOS ....................................................................................... 49 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 49 2 ALCANOS .......................................................................................................................... 49 2.1 A PRESENÇA DOS ALCANOS EM NOSSA VIDA .............................................................................50 2.2 NOMENCLATURA DOS ALCANOS ...................................................................................................50 3 ALCENOS E DIENOS ......................................................................................................... 55 3.1 A PRESENÇA DOS ALCENOS E DIENOS EM NOSSA VIDA..........................................................56 3.2 NOMENCLATURA DOS ALCENOS E DIENOS ................................................................................ 57 4 ALCINOS ........................................................................................................................... 60 4.1 A PRESENÇA DOS ALCINOS EM NOSSA VIDA ...............................................................................61 4.2 NOMENCLATURA DOS ALCINOS ......................................................................................................61 5 CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS ................................................................................ 62 5.1 A PRESENÇA DOS CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS EM NOSSA VIDA ...............................62 5.2 NOMENCLATURA DOS CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS ......................................................63 6 HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS ............................................................................... 64 6.1 A PRESENÇA DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS EM NOSSA VIDA ..............................65 6.2 NOMENCLATURA DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS..................................................... 67 6.3 CLASSIFICAÇÃO DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS ......................................................69 LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................................................. 71 RESUMO DO TÓPICO 3 ......................................................................................................... 77 AUTOATIVIDADE ..................................................................................................................78 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 80 UNIDADE 2 — CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA ORGÂNICA............................. 83 TÓPICO 1 — FUNÇÕES ORGÂNICAS OXIGENADAS ........................................................... 85 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 85 2 ÁLCOOIS ........................................................................................................................... 86 2.1 A PRESENÇA DOS ÁLCOOIS EM NOSSA VIDA ..............................................................................87 2.2 NOMENCLATURA DOS ÁLCOOIS .................................................................................................... 88 2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS ÁLCOOIS ......................................................................................................90 3 FENÓIS............................................................................................................................... 91 3.1 A PRESENÇA DOS FENÓIS EM NOSSA VIDA .................................................................................92 3.2 NOMENCLATURA DOS FENÓIS ........................................................................................................92 4 ÉTERES ............................................................................................................................. 94 4.1 A PRESENÇA DOS ÉTERES EM NOSSA VIDA ................................................................................94 4.2 NOMENCLATURA DOS ÉTERES .......................................................................................................95 5 ALDEÍDOS E CETONAS .....................................................................................................96 5.1 A PRESENÇA DOS ALDEÍDOS E CETONAS EM NOSSA VIDA ..................................................... 97 5.2 NOMENCLATURA DOS ALDEÍDOS E CETONAS ...........................................................................98 5.2.1 Nomenclatura IUPAC para aldeídos ......................................................................................98 5.2.2 Nomenclatura IUPAC para cetonas .....................................................................................99 6 ÁCIDOS CARBOXÍLICOS .................................................................................................102 6.1 A PRESENÇA DOS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS EM NOSSA VIDA .................................................103 6.2 NOMENCLATURA DOS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS ........................................................................104 7 RESUMO DAS FUNÇÕES OXIGENADAS .........................................................................107 RESUMO DO TÓPICO 1 .......................................................................................................108 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................110 TÓPICO 2 - DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS E FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS ............................................................................................. 115 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 115 2 DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS ...................................................................... 115 2.1 NOMENCLATURA DOS SAIS ORGÂNICOS .....................................................................................116 2.2 NOMENCLATURA DOS ÉSTERES ................................................................................................... 117 2.3 NOMENCLATURA DOS ANIDRIDOS ...............................................................................................119 2.4 NOMENCLATURA DOS CLORETOS DE ACILA ............................................................................120 2.5 RESUMO DA NOMENCLATURA DOS DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS ..................121 3 FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS ......................................................................122 3.1 AMINAS ................................................................................................................................................ 122 3.1.1 A presença das aminas em nossa vida ............................................................................... 124 3.1.2 Nomenclatura das aminas .................................................................................................... 124 3.2 AMIDAS ............................................................................................................................................... 127 3.2.1 A presença das amidas em nossa vida .............................................................................. 127 3.2.2 Nomenclatura das amidas ...................................................................................................128 3.3 NITRILAS ............................................................................................................................................. 129 3.3.1 A presença das nitrilas em nossa vida ...............................................................................130 3.3.2 Nomenclatura das nitrilas .....................................................................................................131 3.4 NITROCOMPOSTOS ...........................................................................................................................131 3.4.1 A presença dos nitrocompostos em nossa vida ............................................................. 132 3.4.2 Nomenclatura dos nitrocompostos ................................................................................... 132 3.5 RESUMO DAS FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS .........................................................134 RESUMO DO TÓPICO 2 .......................................................................................................135 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................ 137 TÓPICO 3 - HALETOS ORGÂNICOS E COMPOSTOS SULFURADOS ................................ 141 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 141 2 HALETOS ORGÂNICOS ...................................................................................................142 2.1 A PRESENÇA DOS HALETOS ORGÂNICOS EM NOSSA VIDA ...................................................143 2.2 NOMENCLATURA DOS HALETOS ORGÂNICOS ..........................................................................144 3 COMPOSTOS SULFURADOS ...........................................................................................145 3.1 A PRESENÇA DOS COMPOSTOS SULFURADOS EM NOSSA VIDA .........................................146 3.2 NOMENCLATURA DE COMPOSTOS SULFURADOS ................................................................... 147 LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................150 RESUMO DO TÓPICO 3 .......................................................................................................156 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................ 157 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................159 UNIDADE 3 — PROPRIEDADES FÍSICAS, ISOMERIA E REAÇÕES QUÍMICAS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS ................................................................. 161 TÓPICO 1 — PROPRIEDADES FÍSICAS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS ..........................163 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................163 2 ASPECTOS GERAIS SOBRE A ESTRUTURA DAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS ...............163 2.1 GEOMETRIA MOLECULAR ................................................................................................................164 2.1.1 Modelo da repulsão dos pares eletrônicos da camada de valência (VSEPR) ........... 165 2.1.2 Geometria dos átomos de carbono .....................................................................................167 2.2 POLARIDADE DAS LIGAÇÕES COVALENTES .............................................................................168 2.3 INTERAÇÕES INTERMOLECULARES ............................................................................................. 171 2.3.1 Interações dipolo-dipolo permanente .............................................................................. 172 2.3.2 Ligação de hidrogênio ........................................................................................................... 173 2.3.3 Interações dipolos instantâneo-dipolo induzido ............................................................ 174 3 ESTADOS FÍSICOS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS ...................................................... 176 3.1 PONTO DE EBULIÇÃO E PONTO DE FUSÃO DE COMPOSTOS ORGÂNICOS .........................177 3.1.1 Ponto de ebulição e fusão de compostos orgânicos polares ........................................177 3.1.2 Ponto de ebulição e fusão de compostos orgânicos polares ......................................180 3.1.3 Ponto de fusão e ponto de ebulição dos compostos orgânicos com ligação de hidrogênio ............................................................................................................................181 3.2 SOLUBILIDADE DE COMPOSTOS ORGÂNICOS ..........................................................................183 RESUMO DO TÓPICO 1 .......................................................................................................185 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................187 TÓPICO 2 - ISOMERIA EM QUÍMICA ORGÂNICA ...............................................................189 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................189 2 ISOMERIA PLANA ............................................................................................................189 2.1 ISOMERIA DE CADEIA .......................................................................................................................190 2.2 ISOMERIA DE POSIÇÃO ...................................................................................................................190 2.3 ISOMERIA DE COMPENSAÇÃO .......................................................................................................191 2.4 ISOMERIA DE FUNÇÃO .....................................................................................................................191 2.5 TAUTOMERIA ......................................................................................................................................192 3 ISOMERIA ESPACIAL ......................................................................................................193 3.1 ISOMERIA GEOMÉTRICA .................................................................................................................. 194 3.1.1 Isomeria geométrica em compostos com ligação dupla ............................................... 194 3.1.2 Isomeria geométrica em compostos cíclicos ...................................................................198 3.2 ISOMERIA ÓPTICA ............................................................................................................................198 3.2.1 Luz natural e luz polarizada ..................................................................................................198 3.2.2 Luz polarizada e compostos (isômeros) orgânicos ....................................................... 199 3.2.3 Compostos quirais na natureza e efeitos fisiológicos dos enantiômeros............... 202 RESUMO DO TÓPICO 2 ...................................................................................................... 204 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 205 TÓPICO 3 - REAÇÕES QUÍMICAS EM QUÍMICA ORGÂNICA ............................................ 209 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 209 2 REAÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO ....................................................................................... 209 2.1 SUBSTITUIÇÃO EM ALCANOS ........................................................................................................210 2.1.1 Halogenação ...............................................................................................................................211 2.1.2 Nitração ...................................................................................................................................... 212 2.1.3 Sulfonação ................................................................................................................................ 213 2.2 SUBSTITUIÇÃO EM COMPOSTOS AROMÁTICOS .......................................................................214 2.2.1 Halogenação aromática .........................................................................................................214 2.2.2 Nitração aromática ................................................................................................................. 215 2.2.3 Sulfonação aromática .......................................................................................................... 215 2.2.4 Alquilação e acilação de Friedel-Crafts ........................................................................... 216 3 REAÇÕES DE ADIÇÃO .....................................................................................................218 3.1 HIDROGENAÇÃO CATALÍTICA ......................................................................................................... 219 3.2 HALOGENAÇÃO ................................................................................................................................. 221 3.3 HIDRO-HALOGENAÇÃO ..................................................................................................................222 3.4 HIDRATAÇÃO..................................................................................................................................... 223 3.5 REAÇÕES DE ADIÇÃO EM COMPOSTOS AROMÁTICOS .......................................................... 224 3.6 REAÇÕES DE ADIÇÃO À CARBONILA .......................................................................................... 226 4 REAÇÕES DE ELIMINAÇÃO ........................................................................................... 229 4.1 DESIDROGENAÇÃO .......................................................................................................................... 229 4.2 DE-HALOGENAÇÃO ........................................................................................................................ 229 4.3 DESIDRO-HALOGENAÇÃO ............................................................................................................ 230 4.4 DESIDRATAÇÃO ................................................................................................................................. 231 4.4.1 Desidratação em álcoois ....................................................................................................... 231 4.4.2 Desidratação em ácidos carboxílicos ............................................................................... 232 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................. 234 RESUMO DO TÓPICO 3 ...................................................................................................... 237 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 240 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 242 1 UNIDADE 1 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA ORGÂNICA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • conhecer a evolução histórica e o desenvolvimento da química orgânica; • compreender o papel central do elemento carbono na química orgânica e das ligações covalentes, assim como identificar e classificar os diferentes tipos de cadeias carbônicas; • identificar o que são hidrocarbonetos, reconhecer a ocorrência, a produção e as aplicações em nosso cotidiano dos hidrocarbonetos; • nomear corretamente os compostos orgânicos: alcanos, alcenos, dienos, alcinos, ciclanos e hidrocarbonetos aromáticos. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA DO CARBONO TÓPICO 2 – CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE COMPOSTOS ORGÂNICOS TÓPICO 3 – HIDROCARBONETOS Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 CONFIRA A TRILHA DA UNIDADE 1! Acesse o QR Code abaixo: 3 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA DO CARBONO 1 INTRODUÇÃO No decorrer de anos de investigações científicas, a química tem realizado impor- tantes contribuições para o avanço da humanidade. Os cientistas descobriram que, na natureza, são encontrados muitos elementos químicos e que é a partir da combinação deles que se tem a origem e a formação dos diferentes materiais e objetos disponíveis no dia a dia. Há cerca de 200 anos, o despontar da química orgânica aguçou a mente de uma importante parcela dos cientistas da época, embora tenha sido somente no final do século XIX que a química orgânica obteve grande destaque, influenciando a economia global. Atualmente, estima-se a existência de cerca de 20 milhões de compostos orgânicos, que participam de inúmeras funções vitais aos organismos animal e vegetal, além de comporem diversos materiais presentes no cotidiano, como medicamentos, corantes, cosméticos, produtos de higiene pessoal e limpeza doméstica, tintas, borrachas e produtos derivados do refino do petróleo (plástico, combustíveis e asfalto), entre outros. Todos possuem uma característica comum: são formados por átomos de carbono. No entanto, existem compostos (de origem mineral) que, apesar de possuírem o elemento carbono em sua constituição, são considerados inorgânicos, como o carbonato de cálcio (CaCO3), o dióxido de carbono (CO2), o hidrogeno-carbonato de sódio (NaHCO3), entre outros. Para facilitar o estudo de tantos elementos, elas foram divididas em funções orgânicas, agrupando substâncias similares de acordocom os átomos em suas estruturas, o que resulta em um comportamento químico semelhante. Algumas dessas funções orgânicas são: hidrocarbonetos, álcoois, aldeídos, cetonas, ácidos carboxílicos, aminas, amidas, entre outros. Como é possível notar, a química orgânica oferece uma infinidade de substâncias, mas, mais do que isso, oferece as condições necessárias à compreensão das estruturas dos compostos orgânicos, o que permite entender seu comportamento químico e as reações químicas em que estão envolvidas, ou seja, um vasto conhecimento que pode ser utilizado em benefício do ser humano. Neste tópico, faremos um sobrevoo na história da química orgânica, entrando em contato com as personalidades que influenciaram e determinaram a base do conhecimento que, hoje, temos disponível. Estudaremos alguns aspectos gerais do átomo de carbono, elemento central da química orgânica, e aprofundaremos os orbitais atômicos, com a finalidade de compreendermos melhor como são originados os diferentes tipos de ligações realizadas pelo átomo de carbono. TÓPICO 1 - UNIDADE 1 4 A professora Lucia Helena Galvão é uma ilustre filósofa brasileira, que ministra palestras (disponíveis no YouTube, no canal Nova Acrópole Brasil) que nos convidam à reflexão, a revisitar o passado e a olhá-lo sob uma nova perspectiva. Para aprofundar o seu conhecimento sobre alquimia, assista à palestra A alquimia na Idade Média, disponível em: https://bit.ly/3Jw1ufI. DICAS 2 HISTÓRIA DA QUÍMICA: UM SOBREVOO SOBRE A EVOLUÇÃO DA QUÍMICA ORGÂNICA Há quem diga que a história da química teve início com o homem primitivo, ao dominar o fogo e modificar sua forma de alimentação. Naquele tempo, provavelmente, as descobertas eram feitas ao acaso e o conhecimento era lentamente repassado de geração em geração. Com o passar dos séculos e a sofisticação do intelecto, o ser humano começou a questionar sua existência e a formação da natureza, dos objetos e da matéria que o cercam. Nessa jornada, filósofos e cientistas entrelaçaram seus questionamentos e conhecimentos para cunhar o termo átomo. Durante a Idade Média, difundiu-se entre diversos povos (chineses, hindus, egípcios, árabes e europeus) o conhecimento da alquimia. Uma forma de pensar originária da arte egípcia (de mistérios e ocultismo) praticada em Alexandria (Egito), a khemeia, raiz da palavra Química. A isso tudo, somou-se o conhecimento de diversos sábios, como Aristóteles (um renomado filósofo grego) que acreditava na combinação de quatro “elementos” básicos: fogo, terra, ar e água, para a geração de todas as coisas. Por muito tempo, os alquimistas buscaram a “pedra filosofal”, para transformar o chumbo (homem) em ouro (um sábio detentor do conhecimento) e encontrar o elixir da vida eterna. Apesar de (até onde se sabe) não terem alcançado esse objetivo, os alquimistas foram os pioneiros no desenvolvimento de técnicas de laboratório, como a destilação e a sublimação, que são usadas até hoje na química moderna (CORREIA; COSTA; FERREIRA, 2002; BROCK, 2012; GREENBERG, 2017). Com o surgimento do Renascimento (início do século XV até XVI), nomes importantes, como Francis Bacon, René Descartes, Nicolau Copérnico, Giordano Bruno, Galileu Galilei e Johannes Kepler, contribuíram muito para separar a astrologia da astronomia e a alquimia da química, substituindo o pensamento alquímico por um pensamento “racional”, científico, baseado na experimentação e na segmentação de informações para a construção do conhecimento. Dois cientistas merecem destaque nessa transição alquimia-química: Robert Boyle e Antoine Laurent Lavoisier. Boyle é considerado o “pai da química”, pois introduziu o “método científico” como regra de experimentação laboratorial. Já Lavoisier (no início 5 do século XVII – Iluminismo) adotou o uso da balança como ferramenta de precisão quali e quantitativa. Em seus estudos, Lavoisier comprovou que muitos compostos originados dos seres vivos apresentavam uma característica em comum: eram formados por carbono (CORREIA; COSTA; FERREIRA, 2002; BROCK, 2012; GREENBERG, 2017). Em 1777, Torbern Olof Bergman propôs a divisão da Química em duas áreas: Química Inorgânica, dedicada ao estudo de compostos extraídos do reino mineral, e Química Orgânica, dedicada ao estudo de compostos extraídos (produzidos) por seres vivos. Em 1807, Jöns Jacob Berzelius propôs a “Teoria do Vitalismo”, na qual afirmava que, nos organismos vivos, há uma força especial (divina) indispensável à síntese dos compostos orgânicos e, assim, não poderiam ser sintetizados fora dos organismos vivos. Ainda segundo Berzelius, os seres humanos carregariam em si essa “força vital”, capaz de transformar tudo o que é inorgânico em orgânico, não sendo possível criá-la em laboratório (CORREIA; COSTA; FERREIRA, 2002; BROCK, 2012; GREENBERG, 2017). Em 1828, Friedrich Wöhler (aluno de Berzelius) provou que compostos orgânicos poderiam ser produzidos em laboratório. De forma acidental, Wöhler sintetizou um composto orgânico chamado ureia, até então só encontrada na urina humana (CORREIA; COSTA; FERREIRA, 2002; BROCK, 2012; GREENBERG, 2017). A reação química produzida por Wöhler pode ser descrita pela seguinte equação química: Em 1858, o conceito de química Orgânica foi reformulado. O químico Friedrich August Kekulé propôs uma nova definição, aceita até os dias atuais. Segundo Kekulé, a química orgânica é o ramo da química que estuda os compostos do carbono (CORREIA; COSTA; FERREIRA, 2002; BROCK, 2012; GREENBERG, 2017). É importante destacar que todos os compostos orgânicos contêm carbono, porém, nem todo composto que contém carbono é orgânico, como no caso de dióxido de carbono (CO2) e ácido carbônico (H2CO3). Inicialmente, a curiosidade sobre os compostos presentes nos seres vivos e (talvez) a busca por medicamentos, corantes e tinturas foram os impulsionadores para o desenvolvimento da química orgânica. Até o surgimento da Segunda Guerra Mundial, a principal matéria-prima da indústria química era o carvão, porém, ao final da guerra e com o despontar dos Estados Unidos no cenário econômico (político e científico), a química voltou-se para o estudo e o aprimoramento da petroquímica. O desenvolvimento de combustíveis e a produção de derivados de petróleo, principalmente o desenvolvimento dos plásticos, catalisaram profundas transformações sociais, trazendo-nos ao cenário atual (CORREIA; COSTA; FERREIRA, 2002; BROCK, 2012; GREENBERG, 2017). 6 Para aprofundar seu conhecimento sobre a história da química orgânica, leia o artigo Vinte e cinco anos de reações, estratégias e metodologias em química orgânica, disponível em: https://bit.ly/3Bp5NXa. DICAS 3 ASPECTOS GERAIS SOBRE O ÁTOMO DE CARBONO Como é possível notar, a química orgânica é uma área que estuda, profundamente, os compostos de carbono. Mais adiante, veremos que esses compostos não são formados única e exclusivamente por átomos de carbono, mas a “espinha dorsal”, o “esqueleto” de sua molécula, é constituído por carbono. Você já se perguntou por que o carbono é tão importante a ponto de existir uma área de estudo (focada) nas propriedades desse elemento? A curiosidade sobre o comportamento químico do átomo de carbono não é algo recente; na verdade, vem de muito tempo antes de nós. Na metade do século XIX, Kekulé já se debruçava sobre estudos a respeito desse elemento, pois havia percebido que ele apresentava comportamentos distintos dos demais elementos químicos. NOTA Entre as principais características do átomo de carbono, devemos citar: tetravalência do carbono, habilidade para formar múltiplas ligações e habilidade para formar longas cadeias carbônicas. 3.1 A TETRAVALÊNCIA DO CARBONO O átomo de carbono, pertencente à família 14 (ou 4A), possui em sua constituição seis prótons e seis elétrons, garantindo uma configuração eletrônica com dois elétrons na camada K e quatro elétrons na camada L. Observa-se que, nessa condição (Figura 1A), os átomos de carbono apresentam em sua camadade valência (camada mais externa contendo elétrons) com apenas quatro elétrons (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). Segundo a Teoria do Octeto, todo e qualquer átomo busca uma forma estável de existir na natureza, devendo, para isso, apresentar oito elétrons na camada de valência, ou seja, um comportamento semelhante ao de um gás nobre (SOLOMONS, 2002). Aprofundaremos 7 nosso conhecimento sobre esse tema mais adiante, ao tratar da hibridização. Por ora, é importante entender que a tetravalência do carbono lhe garante a capacidade de realizar quatro ligações covalentes, além de essa característica ser considerada o primeiro postulado de Kekulé (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Na Figura 1 (B e C), podemos observar detalhadamente o compartilhamento de elétrons entre os átomos (carbono e hidrogênio) presentes na estrutura molecular do composto orgânico chamado metano (CH4). FIGURA 1 – DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA DO ÁTOMO DE CARBONO (A), FÓRMULA ELETRÔNICA DE LEWIS (B) E FÓRMULA ESTRUTURAL DE BARRA (C) DO COMPOSTO ORGÂNICO DA MOLÉCULA METANO A Distribuição eletrônica carbono (z = 6) B Fórmula eletrônica de Lewis, do metano C Fórmula estrutural de Kekulé, do metano FONTE: Adaptada de Feltre (2004) 3.2 HABILIDADE PARA FORMAR MÚLTIPLAS LIGAÇÕES Para garantir a sua estabilidade eletrônica, o átomo de carbono realiza ligações covalentes com átomos vizinhos, que podem ser eletropositivos ou eletronegativos. Quando um átomo de carbono faz ligação com quatro átomos, dizemos que ele estabeleceu quatro ligações simples, idênticas em comprimento e energia. Nessa condição, um único composto pode ser representado (estruturalmente) de quatro formas diferentes, como é o caso do composto orgânico chamado clorofórmio, CHCl3, representado na Figura 2 (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). FIGURA 2 – FORMAS ESTRUTURAIS DA MOLÉCULA DO CLOROFÓRMIO, CHCL3 FONTE: O autor Além de ligações simples, um átomo de carbono pode estabelecer mais de uma ligação covalente com outro átomo, formando ligações duplas ou triplas (Figura 3). 8 FIGURA 3 – A REPRESENTAÇÃO DE LIGAÇÕES DUPLAS E TRIPLAS FORMADAS PELO ÁTOMO DE CARBONO FONTE: O autor LIGAÇÕES DUPLAS Ligação dupla entre dois átomos de carbono Ligação dupla entre um carbono e um oxigênio LIGAÇÕES TRIPLAS Ligação tripla entre dois átomos de carbono Ligação tripla entre um carbono e um nitrogênio Apesar de Kekulé colocar o carbono como elemento central da química orgânica, atualmente, sabe-se que há outros elementos inseridos na estrutura dos inúmeros compostos orgânicos existentes, sendo os principais elementos: oxigênio, nitrogênio, enxofre, fósforo e halogênios (flúor, cloro, bromo iodo). Naturalmente, ainda, podem ser encontrados alguns elementos metálicos, como ferro, cobre, manganês e zinco. DICA 3.3 HABILIDADE PARA FORMAR LONGAS CADEIAS CARBÔNICAS Outra característica importante sobre o átomo de carbono é sua capacidade (extraordinária) de se ligar a diferentes átomos, formando estruturas moleculares com elevada estabilidade química (Figura 4). O encadeamento de seus átomos pode levar à formação de estruturas curtas, médias e longas, e mais de inúmeras disposições espaciais. Essa característica é considerada o terceiro postulado de Kekulé (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). É importante destacar que são essas cadeias (originadas do entrelaçamento de orbitais carbono-carbono) as responsáveis pela “espinha dorsal” das moléculas orgânicas. A tetravalência do carbono o coloca numa posição intermediária do segundo período da tabela periódica. Ao realizar uma ligação química, é mais “vantajoso” realizar o compartilhamento de seus elétrons de valência do que doá-los; assim, o carbono apresenta a tendência de formar ligações covalentes, sejam elas entre átomos de carbono (formando as cadeias carbônicas), ou ainda, com outros átomos de elementos mais eletropositivo (como o hidrogênio) ou mais eletronegativos (por exemplo, nitrogênio, oxigênio e flúor) (SOLOMONS, 2002). 9 FIGURA 4 – EXEMPLOS DE ALGUMAS CADEIAS CARBÔNICAS EXISTENTES FONTE: O autor Apesar de existirem outros elementos químicos com habilidade para formar encadeamento de átomos (por exemplo, o enxofre e o fósforo), nenhum possui habilidade de formar cadeias tão longas, variadas e quimicamente estáveis como o carbono. A soma dessas (extraordinárias) habilidades (quatro elétrons de valência; formação de ligações covalentes: simples, duplas e triplas entre átomos de carbono e átomos de outros elementos eletropositivo ou eletronegativos; e formação de longas cadeias quimicamente estáveis) possibilitam o carbono formar uma ampla gama de compostos. 3.4 CLASSIFICAÇÃO DOS ÁTOMOS DE CARBONO DE UMA CADEIA CARBÔNICA Ao observarmos a estrutura de uma cadeia carbônica, muitas vezes, notamos que um átomo de carbono pode estar ligado a outros átomos de carbono. A partir do número de átomos de carbono a que um carbono está ligado, podemos classificá-lo em: primário, secundário, terciário e quaternário (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). Para facilitar a compreensão, o Quadro 1 apresenta detalhadamente essa classificação e exemplos de cada caso. QUADRO 1 – CLASSIFICAÇÃO DOS ÁTOMOS DE CARBONO DE UMA CADEIA CARBÔNICA FONTE: Adaptado de Feltre (2004) Carbono primário: ocorre quando o átomo de carbono (em questão) está ligado a apenas um ou nenhum átomo de carbono. Carbono secundário: ocorre quando o átomo de carbono (em questão) está ligado a dois átomos de carbono. Carbono terciário: ocorre quando o átomo de carbono (em questão) está ligado a três átomos de carbono. Carbono quaternário: ocorre quando o átomo de carbono (em questão) está ligado a quatro átomos de carbono. 10 FIGURA 5 – EXEMPLOS DOS ÁTOMOS DE CARBONO DE UMA CADEIA CARBÔNICA: CARBONO PRIMÁRIO (A); CARBONO SECUNDÁRIO (B); CARBONO TERCIÁRIO (C); E CARBONO QUARTENÁRIO (D) D C A B FONTE: Adaptada de Feltre (2004) FIGURA 6 – CLASSIFICAÇÃO DOS ÁTOMOS DE CARBONO DE UMA CADEIA CARBÔNICA FONTE: <https://bit.ly/3gPQgX1>. Acesso em: 18 out. 2021. A classificação de cada carbono presente na cadeia carbônica é apresentada na Figura 6. Na Figura 6, observamos que todos os átomos de carbonos grifados em vermelho (CH3) são primários, pois cada um deles está ligado a somente um átomo de carbono. Já um carbono secundário é grifado em azul (CH2), mostrando um carbono que está ligado a dois outros átomos de carbono. Um carbono terciário é grifado em verde (CH), mostrando um carbono que está ligado a outros três átomos de carbono. Por fim, um carbono quaternário é grifado em amarelo (C), mostrando um carbono que está ligado a outros quatro átomos de carbono. 4 ESTRUTURA ATÔMICA: COMPREENDENDO AS LIGAÇÕES QUÍMICAS DO CARBONO Para compreendermos como ocorrem as ligações químicas realizadas pelo carbono, precisamos aprofundar o estudo na estrutura atômica desse elemento. 11 FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO MODELO NUCLEAR PARA O ÁTOMO DE CARBONO FONTE: O autor De acordo com os modelos atômicos existentes, consideramos que todos os átomos são formados por um núcleo e uma eletrosfera. É necessário entender que o núcleo é formado por partículas atômicas positivas e neutras, chamadas, respectivamente, de prótons e nêutrons. Já a eletrosfera apresenta partículas subatômicas de carga elétrica negativa, chamadas de elétrons. Durante o século XX, muitos cientistas tentavam compreender as propriedades atômicas e, em 1911, Ernest Rutherford descobriu que o núcleo dos átomos é uma pequena e densa região central e que a eletrosfera é uma região extremamente volumosa (e vazia). É importante lembrar que os prótons e nêutrons possuem massas (relativamente) iguais, que são 1.836 vezes maiores que a massa do elétron. A Figura 7 mostra a representação do modelo nuclear para o átomo de carbono, sendo possível observar um pequeno centro ocupado por seis prótons e seis nêutrons (núcleo de carga elétrica positiva), rodeados por seis elétrons dispersosem uma nuvem volumosa (nuvem eletrônica de carga negativa). É importante destacar que essa representação é apenas um modelo didático, utilizado para facilitar a visualização das partículas subatômicas. Em geral, o núcleo atômico possui um diâmetro de aproximadamente 10 –14 a 10 –15 metros, enquanto a eletrosfera ocupa um volume muito maior, cerca de 10 mil a 100 mil vezes, que o núcleo atômico. 4.1 ORBITAIS ATÔMICOS Certamente, é possível encontrar, em algum livro didático ou outro material disponível na internet, a representação do modelo atômico, conforme demonstrado na Figura 7, porém é necessário cuidado, pois os elétrons não apresentam trajetórias bem definidas (circulares – como os planetas orbitando o sol, como descrito pelo modelo atômico de Bohr – ou por elipse, como descrito pelo modelo de Sommerfeld). 12 Em 1924, Louis de Broglie propôs a hipótese de que as partículas subatômicas possuem comportamento dual, ou seja, em determinados momentos, elas se comportam como partícula e, em outros, como onda, não sendo possível descrevê-las através das leis da mecânica clássica. A explicação para a dualidade onda-partícula (também chamada de dualidade onda-corpúsculo ou dualidade matéria-energia) somente foi possível com o avanço da mecânica quântica. Em 1927, Werner Heinseberg propôs que todos os sistemas quânticos são regidos por um “Princípio da Incerteza”, no qual as propriedades de uma partícula atômica não podem ser determinadas simultaneamente. De acordo com Heinseberg, não podemos afirmar (com exatidão) a localização (no espaço) e sua velocidade (no tempo) de um elétron em um mesmo instante, ou seja, quanto maior for a precisão da posição do elétron, menor será a precisão da medida de sua velocidade e vice-versa (ORCHIN et al., 2005). Antes de observarmos um sistema quântico, suas informações são indeterminadas, mas, ao serem observadas, é possível localizá-las e medi-las. Assim, podemos dizer que a função de onda sofreu um colapso, mostrando um de seus possíveis estados – em outras palavras, o que determina se uma entidade quântica é uma onda ou uma partícula é o próprio ato da observação. ATENÇÃO Em 1926, Erwin Schrödinger publicou uma série de equações matemáticas, em que associava a natureza corpuscular do elétron (sua natureza como partícula), a sua energia, a sua carga e a sua massa. Através das equações de Schrödinger, foi possível estabelecer um volume tridimensional, no eixo cartesiano “x, y e z”, para os elétrons, a que os cientistas denominaram de “orbital”. Dessa forma, um orbital atômico se refere à região (ao redor do núcleo) com maior probabilidade para se encontrar um elétron durante sua trajetória ao redor do núcleo. Nesse modelo, leva-se em conta o comportamento dual (onda-partícula) de um elétron que se movimenta no espaço atômico, mas que está dentro de uma dada região (um orbital) ao redor do núcleo, uma nuvem eletrônica (ORCHIN et al., 2005). É importante destacar que o elétron pode assumir diferentes energias e, desse modo, ocupar diferentes orbitais atômicos. No decorrer do processo algébrico da resolução de suas equações, Schrödinger descreveu códigos matemáticos relacionados com a energia do elétron, os quais foram denominados de números quânticos. Existem quatro números quânticos possíveis: o número quântico principal (n), número quântico secundário ou azimutal (l), o número quântico magnético (m ou ml) e o número quântico spin (s ou ms). É importante destacar que esse conjunto de números quânticos nunca se repete para dois elétrons em um átomo; assim, cada elétron presente na eletrosfera de um determinado átomo possui identidade única. A seguir, veremos como se determina cada um deles. 13 4.1.1 Número quântico principal (n) O número quântico principal (n) define o nível (ou camada) de energia ocupado pelo elétron. De acordo com o modelo atômico de Rutherford-Bohr, os elétrons presentes em um átomo movimentam-se ao redor do núcleo em órbitas circulares, com quantidades de energia bem definidas, as quais são chamadas de níveis de energia ou camadas eletrônicas. Para os elementos conhecidos até o momento, existem sete níveis de níveis de energia, que podem ser representados pelas letras K, L, M, N, O, P e Q, indo da camada mais próxima ao núcleo para a mais distante. Numericamente, essas camadas podem ser representadas por 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; ORCHIN et al., 2005). Assim, os valores de n variam de 1 a 7, de acordo com o nível de energia do elétron. Quanto maior o número quântico principal, mais distante do núcleo estará o elétron, ocupando orbitais atômicos mais energéticos, já que possui maior energia. 4.1.2 Número quântico secundário ou azimutal (l) O número quântico azimutal (l) indica a subcamada ocupada pelo elétron e define a forma do orbital atômico. De acordo com o diagrama para distribuição eletrônica, proposto por Linus Pauling, os elétrons, de um átomo qualquer, distribuem-se nas camadas eletrônicas de acordo com subníveis de energia (orbitais), identificados pelas letras s, p, d, f. Cada nível comporta uma quantidade máxima de elétrons; além disso, é importante destacar que os elétrons preenchem os subníveis de energia (dois a dois), seguindo a ordem crescente de energia, portanto, primeiramente o subnível s seguido pelo p, d e f (SOLOMONS, 2002; ORCHIN et al., 2005). Por convenção, os orbitais do tipo s são representados por l = 0, do tipo p por l = 1, do tipo d por l = 2 e os orbitais do tipo f são representados por l = 3. 4.1.3 Número quântico magnético (m ou ml) O número quântico magnético (m ou ml) informa a orientação dos orbitais no espaço, indicando a orientação cartesiana “x, y e z” dos diferentes orbitais s, p, d e f (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; ORCHIN et al., 2005). Assim, temos: • O orbital do tipo s possui forma esférica, assim, é possível uma única orientação espacial, originando um único valor possível para o número quântico magnético, que será igual a 0. • Orbitais do tipo p possuem a forma de um duplo “ovoide”, apresentando três orientações espaciais possíveis, originando três números magnéticos, dados por -1, 0 e +1. • Orbitais do tipo d apresentam cinco orientações espaciais possíveis, originando os 14 números magnéticos, dados por -2, -1, 0 +1 e +2. • Orbitais do tipo f apresentam sete orientações espaciais possíveis, originando os números magnéticos: -3, -2, -1, 0 +1, +2 e +3. A Tabela 1 faz um pequeno resumo sobre o número quântico magnético. Já na Figura 8, é possível visualizar a forma dos diferentes tipos de orbitais (s, p, d e f) e a indicação de sua orientação no plano cartesiano “x, y e z”. TABELA 1 – RESUMO DE NÚMERO QUÂNTICO MAGNÉTICO FONTE: O autor FIGURA 8 – REPRESENTAÇÃO DOS DIFERENTES TIPOS DE ORBITAIS (S, P, D E F) E INDICAÇÃO DE SUA ORIENTAÇÃO NO PLANO CARTESIANO FONTE: <https://bit.ly/3GRI4jp>. Acesso em: 19 out. 2021. 15 4.1.4 Número quântico spin (s ou ms) O número atômico magnético de spin (ms) indica o sentido da rotação do elétron no orbital. De acordo com o Princípio da Exclusão de Pauli, os orbitais atômicos conseguem comportar um máximo de dois elétrons, porque giram em sentidos opostos, o que causa uma força magnética de atração (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; ORCHIN et al., 2005). Assim, o magnetismo em razão do spin de um elétron é anulado pelo magnetismo do spin oposto, gerando um sistema estável. Por convenção, adota-se o seguinte esquema de representação: • Seta para cima (↑) corresponde a ms = -1/2. • Seta para baixo (↓) corresponde a ms = +1/2. É importante destacar que, segundo regra de máxima multiplicidade (Regra de Hund), o preenchimento dos orbitais de um subnível deve ser feito de uma forma que contenha o maior número possível de elétrons isolados, ou seja, desemparelhados. Assim, ao fazer a distribuição eletrônica nos orbitais de cada subnível (quadradinhos), primeiramente, devemos colocar um elétron (seta para cima) em cada orbital e, somenteapós isso, os demais elétrons serão inseridos (seta para baixo) nos orbitais semipreenchidos. Para compreender os números quânticos, podemos observar, a seguir, a determinação dos quatro números quânticos (principal, azimutal, magnético e spin) para o átomo de carbono. Sabemos que o carbono possui número atômico (Z) igual a seis, indicando que possui seis elétrons para serem distribuídos nas camadas eletrônicas. É importante entender que cada camada comporta um número máximo de elétrons (K = 2, L = 8, M = 18, N = 32, O = 32, P = 18 e Q = 8). Somente ao completar uma camada, a distribuição segue para o nível subsequente. Tendo isso em mente, a distribuição eletrônica do carbono pode ser descrita da seguinte forma: DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA DO CARBONO Diagrama Linus Pauling 1 s2 2 s2 2 p2 3 s 3 p 3 d 4 s 4 p 4 d 4 f 5 s 5 p 5 d 5 f 6 s 6 p 3 d 7 s 7 p Número quântico principal e azimutal: • Camada de valência: 2s2, 2p2 n = 2; l = 1 Número quântico magnético e spin: ml = 0; ms = -1/2 16 Para determinarmos os quatro números quânticos (de qualquer elemento químico), primeiramente, devemos realizar a sua distribuição eletrônica segundo o Diagrama de Linus Pauling. Dessa forma, encontraremos o nível energético e os tipos de orbitais presentes na camada de valência. No exemplo anterior, podemos observar que o átomo de carbono apresenta os elétrons mais energéticos, distribuídos no nível dois e, por isso, possui número quântico principal dado por n = 2. Na forma elementar, seus dois elétrons mais energéticos estão inseridos num orbital do tipo p, gerando um número azimutal dado por l = 1. Para descobrir o número quântico magnético e o spin, precisamos observar como ocorre a distribuição dos elétrons mais energéticos (2p2) nos orbitais p. Assim, fica fácil concluir que o número quântico magnético é dado por ml = 0 e que, por possuir spin voltado para cima, ms é igual a -1/2. 4.2 HIBRIDIZAÇÃO: CARBONO SP3, SP2 E SP De acordo com a teoria de ligação de valência, as ligações covalentes, formadas pelo compartilhamento de elétrons entre dois átomos, são originadas através da sobreposição de orbitais atômicos. Assim, ao sobreporem seus orbitais, os elétrons participantes da ligação são atraídos pelos dois núcleos atômicos, ocupando simultaneamente os orbitais de ambos os átomos. É importante destacar que o número de ligações covalentes que um átomo realiza está diretamente relacionado com o número de orbitais incompletos que ele apresenta em sua camada de valência. No entanto, os carbonos berílio e boro só realizam ligações covalentes após passarem pelo fenômeno da hibridização (SOLOMONS, 2002; ORCHIN et al., 2005). Você sabe o que é hibridização e por que esse fenômeno é tão importante para o carbono? Define-se a hibridização como a união de orbitais atômicos incompletos. Na prática, a hibridização é um fenômeno que ocorre quando um elétron, presente num orbital semipreenchido, recebe energia do meio externo, passa para um estado de maior energia (excitado) e desloca-se para um orbital vazio. Esse processo de “migração eletrônica” leva à fusão (mistura) dos orbitais atômicos, originando novos orbitais chamados de orbitais híbridos ou hibridizados (SOLOMONS, 2002). NOTA Para facilitar a sua compreensão, observamos como os orbitais híbridos do carbono são formados. De acordo com a distribuição eletrônica (de Linus Pauling), no estado fundamental, o carbono possui o primeiro nível completo (1s2, com dois elétrons), enquanto o segundo nível possui quatro elétrons distribuídos nos orbitais s (2s2) e p (2p2). 17 Na Figura 9, o orbital p comporta seis elétrons, mas há somente dois, ou seja, dois deles estão incompletos e um está vazio. Segundo Linus Pauling, o número de orbitais incompletos determina o número de ligações covalentes necessárias para a estabilidade elétrica do átomo. Assim, poderíamos dizer que o carbono realiza somente duas ligações covalentes, mas não é isso o que ocorre, pois sabemos que o carbono é tetravalente. Então, ao receber energia do meio externo, os elétrons de valência do carbono são excitados, tornando-se energeticamente capazes de migrarem (saltarem) do orbital s (2s2) para o orbital p vazio, do mesmo subnível, originando quatro orbitais semipreenchidos. A união do orbital s com os três orbitais p, configura o fenômeno de hibridização (SOLOMONS, 2002). FIGURA 9 – ETAPAS DA HIBRIDIZAÇÃO DO ÁTOMO DE CARBONO FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3HX4AZx>. Acesso em: 19 out. 2021. Existem três tipos possíveis de hibridização para o átomo de carbono: Sp3, Sp2 e Sp, as quais dão origem a ligações sigma (σ) e pi (π). Ligações sigma são originadas quando os orbitais atômicos se interpenetram no mesmo eixo, como ocorre nas ligações simples. Já as ligações pi são originadas quando os orbitais atômicos se interpenetram em eixos paralelos, como ocorre nas ligações duplas e triplas (SOLOMONS, 2002). 4.2.1 Hibridização: carbono Sp3 Um carbono com hibridização Sp3 é formado quando o orbital 2s une-se aos três orbitais 2p da camada de valência, originando quatro orbitais híbridos com energia igual entre si (degenerados). Esses orbitais hibridizados dão origem a quatro ligações simples do tipo sigma (σ). (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). A Figura 10 mostra um esquema das etapas para a hibridização de um carbono Sp3. 18 FIGURA 10 – ESQUEMA DAS ETAPAS PARA A HIBRIDIZAÇÃO DE UM CARBONO Sp3 FONTE: Adaptada de Hilário (2014) 4.2.2 Hibridização: carbono Sp2 Um carbono com hibridização Sp2 é formado quando apenas dois dos orbitais 2p unem-se com o orbital 2s, gerando três orbitais Sp2, degenerados entre si. No entanto, um orbital 2p permanece inalterado, chamado de orbital p “puro”. Ao conservar suas características originais, o orbital p “puro” apresenta maior energia que os orbitais híbridos Sp2 (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). A Figura 11 mostra um esquema das etapas para a hibridização de um carbono Sp2. FIGURA 11 – ESQUEMA DAS ETAPAS PARA A HIBRIDIZAÇÃO DE UM CARBONO SP2 FONTE: Adaptada de Hilário (2014) No final desse processo, os orbitais degenerados Sp2 dão origem a três ligações simples do tipo sigma (σ), enquanto o orbital p “puro” origina uma ligação do tipo pi (π). É importante destacar que as ligações duplas são formadas por uma ligação σ e uma π; assim, a hibridização Sp2 torna o carbono apto a fazer uma ligação dupla e duas ligações simples (SOLOMONS, 2002). 4.2.3 Hibridização: carbono Sp Um carbono com hibridização Sp é formado quando apenas um dos orbitais 2p une-se com o orbital 2s, gerando dois orbitais Sp, degenerados entre si. Além disso, dois orbitais 2p permanecem inalterados, “puros”. Ao conservarem suas características originais, os orbitais p “puros” apresentam maior energia que os orbitais híbridos Sp (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). A Figura 12 mostra um esquema das etapas para a hibridização de um carbono Sp. 19 FIGURA 12 – ESQUEMA DAS ETAPAS PARA A HIBRIDIZAÇÃO DE UM CARBONO SP FONTE: Adaptada de Hilário (2014) No final desse processo, os orbitais degenerados Sp dão origem a duas ligações simples (do tipo σ), ao passo que os orbitais p “puro” originam outras duas ligações do tipo pi (π). É importante destacar que, semelhantemente às ligações duplas que apresentam uma ligação π (e uma ligação σ), as ligações triplas são formadas pela combinação de duas π e uma σ; assim, a hibridização Sp torna o carbono apto a fazer uma ligação tripla (e uma simples) ou duas ligações duplas (SOLOMONS, 2002). Cada elétron integrante de uma ligação covalente, inicialmente atraído apenas pelo seu próprio núcleo, passa a ser atraído pelo núcleo do outro átomo que participa da ligação. Esse processo diminui os efeitos de repulsão eletrostática, tornando o sistema mais estável e menos energético. No entanto, para que a sobreposição dos orbitais (e, consequentemente, a ligação covalente) ocorra, os dois átomos envolvidos precisam estar a uma determinada distância entre si. Se estiveremmuito distantes, dificilmente ocorrerá a sobreposição de seus orbitais; já a aproximação extrema leva à repulsão entre os núcleos positivos dos dois átomos. Assim, uma distância ideal é definida para que seja possível sobrepor os orbitais atômicos dos átomos e para que a energia do sistema seja mínima (não havendo problemas de repulsão). Essa distância específica ideal é definida como comprimento de ligação e é característica de cada ligação covalente (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Na tabela a seguir, podemos observar alguns valores do comprimento de ligação comumente encontrados em compostos orgânicos. INTERESSANTE TABELA – VALORES DO COMPRIMENTO DE LIGAÇÃO COMUMENTE ENCONTRADOS EM COMPOSTOS ORGÂNICOS Ligação Comprimento picômetro (10-12 m) Ligação Comprimento picômetro (10-12 m) Ligação Comprimento picômetro (10-12 m) C–C 154 H–C 107 C–N 147 C=C 133 C–O 143 C=N 138 C≡C 120 C=O 121 C≡N 116 FONTE: Adaptado de Bruice (2006) 20 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • A química orgânica é a parte dedicada ao estudo dos compostos formados por carbono; além do átomo de carbono, outros elementos, como hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, podem ser encontrados em moléculas orgânicas. • O carbono é um elemento químico que está localizado na família 4A da tabela periódica, possui quatro elétrons na camada de valência (tetravalente), o que lhe permite realizar quatro ligações covalentes com outros átomos (de carbono ou demais elementos eletropositivos e eletronegativos), possibilitando formar longas cadeias carbônicas. • Segundo os modelos atômicos existentes, podemos dizer que o átomo apresenta duas regiões distintas: um núcleo pequeno e denso, no qual são encontradas partículas de carga neutra (nêutrons) e positiva (prótons), e uma eletrosfera volumosa e “vazia”, em que são encontradas partículas de carga negativa (elétrons). • As ligações realizadas pelo carbono podem ser: ligações simples, duplas e triplas, as quais são explicadas pelo fenômeno da hibridização, ou seja, pela formação de orbitais híbridos do tipo Sp3, Sp2 e Sp. RESUMO DO TÓPICO 1 21 1 Atualmente, estima-se a existência de cerca de 20 milhões de compostos orgânicos que participam de inúmeras funções vitais aos organismos animal e vegetal, além de comporem diversos materiais presentes no cotidiano, como medicamentos, corantes, cosméticos, produtos de higiene pessoal e limpeza doméstica, tintas, borrachas e produtos derivados do refino do petróleo (plástico, combustíveis e asfalto), entre outros. Todos eles possuem uma característica comum: são formados por átomos de carbono. Disserte sobre as razões que possibilitam essa diversidade de compostos orgânicos. 2 Por muitos anos, um dos principais questionamentos foi direcionado à compreensão da formação do universo, da natureza, dos objetos e da matéria que nos cercam. Nessa jornada, filósofos e cientistas entrelaçaram seus questionamentos e conhecimentos. No século XVII, a química já despontava como uma importante área de investigação científica, mas foi, no final do século XVIII, que a química orgânica revelou grandes conhecimentos à humanidade. Sobre a história da química orgânica, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Kekulé é considerado o “pai da química”. ( ) Segundo a “Teoria do Vitalismo”, os seres humanos carregariam em si uma “força vital”, a qual é capaz de transformar tudo o que é inorgânico em orgânico, o que era facilmente criado em laboratório. ( ) Os alquimistas foram os pioneiros no desenvolvimento de técnicas de laboratório, como a destilação e a sublimação que são usadas até hoje na química moderna. ( ) Atualmente, a química é dividida em duas grandes áreas: a química inorgânica, dedicada ao estudo de compostos extraídos do reino mineral, e a química orgânica, dedicada ao estudo de compostos extraídos (produzidos) por seres vivos. ( ) Em seu postulado, Kekulé afirmava que o carbono é tetravalente e possui habilidade de formar longas cadeias carbônicas. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – V – V – F – F. b) ( ) V – F – V – F – V. c) ( ) V – F – V – V – V. d) ( ) F – V – F – F – F. e) ( ) F – F – V – F – V. AUTOATIVIDADE 22 3 O ácido etilenodiamino tetra-acético (EDTA) é um composto orgânico, que age como agente quelante, formando complexos muito estáveis com diversos íons metálicos. Observando a estrutura do EDTA da figura a seguir, são encontradas quantas unidades de carbono Sp3, Sp2 e Sp? FONTE: <https://bit.ly/350AhTt>. Acesso em: 20 de out. 2021. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) 5 carbonos Sp3, 5 carbonos Sp2 e 2 carbonos Sp. b) ( ) 6 carbonos Sp3, 4 carbonos Sp2 e nenhum carbono Sp. c) ( ) 4 carbonos Sp3, 0 carbonos Sp2 e 6 carbonos Sp. d) ( ) Nenhum carbono Sp3, 4 carbonos Sp2 e 6 carbonos Sp. e) ( ) 3 carbonos Sp3, 5 carbonos Sp2 e 5 carbonos Sp. 4 Os hidrocarbonetos são compostos químicos formados unicamente por átomos de carbono e hidrogênio, unidos por ligações saturadas ou insaturadas. No composto apresentado na figura a seguir, os átomos de carbono estão numerados de 1 a 7. FONTE: O autor Com base nas ligações covalentes existentes na estrutura do composto orgânico em questão, analise as sentenças a seguir: I- O átomo de carbono 5 forma três ligações σ (sigma) e uma ligação π (pi). II- O átomo de carbono 1 forma quatro ligações σ (sigma). III- O átomo de carbono 2 forma três ligações π (pi) e uma ligação σ (sigma). IV- O total de ligações π (pi) na estrutura é igual a três. 23 Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e III estão corretas. b) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. c) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas. d) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas. e) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. 5 As moléculas de nanoputians lembram figuras humanas e foram criadas para estimular o interesse de jovens na compreensão da linguagem expressa em fórmulas estruturais, muito usadas em química orgânica. Um exemplo é o nanokid, representado na figura a seguir. FONTE: <https://bit.ly/3gOgdGe>. Acesso em: 10 out. 2021. Observando a estrutura do Nanokid, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) 10 carbonos primários; 12 carbonos secundários; 8 carbonos terciários; 4 carbonos quaternários. b) ( ) 18 carbonos primários; 5 carbonos secundários; 7 carbonos terciários; 3 carbonos quaternários. c) ( ) 11 carbonos primários; 10 carbonos secundários; 5 carbonos terciários; 2 carbonos quaternários. d) ( ) 18 carbonos primários; 12 carbonos secundários; 5 carbonos terciários; nenhum carbono quaternário. e) ( ) 11 carbonos primários; 14 carbonos secundários; 7 carbonos terciários; 2 carbonos quaternários. 24 25 CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE COMPOSTOS ORGÂNICOS 1 INTRODUÇÃO No estudo da química orgânica, assim como o na química como um todo, muitas vezes, nos deparamos com conceitos e assuntos abstratos, e outras tantas situações difíceis de serem naturalmente visualizadas. Por exemplo, os átomos e as moléculas são estruturas que fogem a nossa capacidade de percepção visual, pois estão numa escala de tamanho muito diminuto (na ordem de angstrom, 1x10–10 metros). Para facilitar o nosso aprendizado, os cientistas criaram inúmeras estratégias para representar visualmente esses fenômenos e, assim, surgiram os modelos atômicos, as estruturas moleculares e as equações que descrevem as reações de transformação da matéria. Como foi possível perceber anteriormente, a química orgânica oferece uma in- finidade de substâncias, além das ferramentas necessárias para que o nosso conheci- mento possa ser utilizado em benefício da humanidade. Neste tópico, utilizaremos as representações moleculares para visualizar como as moléculas dos compostos orgâni- cos são rearranjadas na natureza. Desse modo, abordaremos alguns conceitos funda- mentais para a compreensão estrutural dos inúmeros compostos orgânicosexistentes, bem como para a classificação de cadeias carbônicas. Atualmente, sabe-se que há mais de 19 milhões de compostos orgânicos inseridos no dia a dia, os quais apresentam estruturas e propriedades (físicas e químicas) semelhantes, o que torna essencial a sua correta identificação. Ao final deste tópico, veremos uma introdução da nomenclatura de compostos orgânicos. UNIDADE 1 TÓPICO 2 - 2 REPRESENTAÇÃO ESTRUTURAL DAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS Anteriormente, vimos que o átomo de carbono possui grande habilidade para se ligar a diferentes átomos (de outros elementos ou de carbono) através de ligações covalentes, formando uma infinidade de cadeias carbônicas. A maneira mais simples de representar qualquer molécula é através de sua fórmula molecular, em que são descritos os elementos e o número exato de átomos de cada elemento presente em sua constituição. Por exemplo, numa equação química, podemos encontrar as seguintes substâncias: CH4, C3H8, C3H6O, C2H4O2, entre outras. Contudo, precisamos entender o tipo de ligação realizada entre os átomos presentes nessas moléculas e como os átomos estão distribuídos ao longo da cadeia carbônica. A fórmula estrutural nos indicará isso e poderemos descobrir realmente de qual composto se trata. 26 É importante destacar que existem vários tipos de fórmulas químicas, porém, não existe uma maneira mais correta do que a outra para representar a estrutura das moléculas, mas uma que (melhor) se ajusta à proposta do estudo. A seguir, trataremos das principais formas de representação usadas para descrever os compostos moleculares formados por ligações covalentes. Quando os átomos de dois elementos interagem por meio desse tipo de ligação, realizam o compartilhamento de pares de elétrons. Na Figura 13, estão destacados os elementos que formam ligações covalentes quando presentes em compostos orgânicos. FIGURA 13 – ELEMENTOS QUÍMICOS QUE REALIZAM LIGAÇÕES COVALENTES FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3GRK2jV>. Acesso em: 13 out. 2021. FONTE: O autor TABELA 2 – NECESSIDADE DE ELÉTRONS PARA ELEMENTOS QUÍMICOS QUE REALIZAM LIGAÇÕES COVALENTES Para conseguirmos realizar a representação estrutural de uma molécula orgânica, antes de tudo, devemos saber quantos elétrons são necessários para estabilizar cada um dos elementos presentes na molécula, segundo a teoria do octeto. A Tabela 2 mostra a necessidade de elétrons para os elementos formarem ligações covalentes, de acordo com o grupo (família) a que pertence na tabela periódica. Grupo da tabela periódica Número de elétrons de valência Necessidade de elétrons Número de ligações covalentes 13 (Família IIIA) 3 Receber 3 elétrons 3 14 (Família IVA) 4 Receber 4 elétrons 4 15 (Família VA) 5 Receber 3 elétrons 3 16 (Família VIA) 6 Receber 2 elétrons 2 17 (Família VIIA) 7 Receber 1 elétrons 1 27 FIGURA 14 – FÓRMULA ELETRÔNICA FONTE: O autor Conhecendo a necessidade de elétrons para cada elemento presente na molécula, devemos lembrar que os átomos interagem entre si através de ligações simples (−, com- partilhamento de dois elétrons), duplas (=, compartilhamento de quatro elétrons) e triplas (≡, compartilhamento de seis elétrons). A seguir, estudaremos algumas formas de represen- tação estrutural das moléculas orgânicas, também chamada de fórmula estrutural. 2.1 FÓRMULA ELETRÔNICA A fórmula eletrônica (Figura 14), também chamada de fórmula de Lewis, mostra os elementos com seus respectivos elétrons de valência. Os elétrons são sinalizados por meio de “pontinhos” (•) ao redor do símbolo do elemento. Já as ligações são identificadas através de círculos, contendo os elétrons compartilhados entre dois elementos (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). Pentano Buteno Propanona (acetona) Podemos notar que, na fórmula de Lewis, todos os elétrons de valência são repre- sentados na estrutura, porém, somente os elétrons compartilhados (entre dois átomos) são sinalizados por círculos indicando a formação de uma ligação covalente. Os demais elétrons são agrupados, dois a dois, indicando os pares de elétrons livres presentes no elemento. Apesar de descrever satisfatoriamente as estruturas de compostos orgânicos, a fórmula de Lewis é usualmente utilizada para a representação de compostos inorgânicos. 2.2 FÓRMULA ESTRUTURAL PLANA A fórmula estrutural plana, ou fórmula de Kekulé, também mostra os elementos e o número de átomos envolvidos, mas o par de elétrons compartilhado é sinalizado por um traço (—) (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). Para compreendermos me- lhor, na Figura 15, são apresentadas fórmulas de Kekulé para alguns compostos orgânicos. 28 FIGURA 15 – FÓRMULA DE KEKULÉ FONTE: O autor Pentano Buteno Propanona (acetona) Nas fórmulas estruturais planas, todos os elementos e todas as ligações aparecem desenhados no plano do papel. Esse tipo de representação é facilmente aplicado a moléculas pequenas, porém, cadeias carbônicas muito grandes ou complexas dificultam a sua usabilidade. 2.3 FÓRMULA ESTRUTURAL SIMPLIFICADA A fórmula estrutural simplificada (Figura 16), também chamada de fórmula condensada, apresenta a quantidade de átomos de hidrogênios ligados a cada carbono de forma abreviada; para isso, quando o hidrogênio estiver ligado ao carbono, coloca- se o seu símbolo (H) uma única vez e adiciona-se (no canto inferior direito) um índice, indicando quantos hidrogênios estão ligados àquele átomo de carbono (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). FIGURA 16 – FÓRMULA ESTRUTURAL SIMPLIFICADA FONTE: O autor Pentano Buteno Propanona (acetona) No entanto, se algum índice se repetir, devemos colocá-lo entre colchetes e indicar quantas vezes ele aparece na fórmula; assim, a fórmula estrutural simplificada pode ser reduzida para: CH3 [CH2]3 CH3. 2.4 FÓRMULA CONDENSADA LINEAR Sabendo que os átomos de carbono sempre realizam quatro ligações covalentes e que o hidrogênio forma unicamente ligações simples, uma forma ainda mais simples de representação é a fórmula condensada linear, na qual as ligações carbono- hidrogênio ficam subentendidas, os grupos CH, CH2 e CH3 são omitidos e as ligações carbono-carbono, da cadeia principal, são representadas por traços ligados em zigue- 29 FIGURA 17 – FÓRMULA CONDENSADA LINEAR FONTE: O autor zague. Caso exista algum heteroátomo (átomo diferente de carbono e hidrogênio), ele deverá ser escrito (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). Para compreender melhor, a Figura 17 apresenta algumas fórmulas condensadas lineares. Pentano Buteno Propanona (acetona) É importante destacar que, todos os tipos de representação mencionados até aqui permitem a visão em duas dimensões (2D), no entanto as inúmeras moléculas raramente são encontradas na forma espacial plana. Por isso, você pode se deparar com representações distintas para as ligações químicas, na qual se busca a ideia de uma visão espacial tridimensional (3D). Assim, são escritas fórmulas em perspectiva, onde as ligações indicam se o átomo está no plano do papel (traço normal), à frente do plano (cunha cheia) ou atrás do plano (cunha tracejada) (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). IMPORTANTE A Figura 18A mostra as diferentes formas de representação de uma ligação química e a Figura 18B, a fórmula em perspectiva do estanozolol, um esteroide anabolizante sintético derivado da testosterona. FIGURA 18 – REPRESENTAÇÃO DAS LIGAÇÕES QUÍMICAS EM FÓRMULAS EM PERSPECTIVA (A) E FÓRMULA EM PERSPECTIVA DO ESTANOZOLOL (B) A B FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3sEnluk>. Acesso em: 14 out. 2021. 30 3 CLASSIFICAÇÃO DE CADEIAS CARBÔNICAS Anteriormente, vimos que os compostos orgânicos podem conter átomos diferentes de carbono e hidrogênio, embora sua estrutura principal, seu “esqueleto”, seja formada pelo encadeamento de átomos de carbono. Na química, denominamos essa estrutura de cadeia carbônica (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Por existirem inúmeras moléculas orgânicas, existem inúmeros tipos, formas e formatos de cadeiascarbônicas, as quais são classificadas de acordo alguns critérios, conforme descrito a seguir. 3.1 QUANTO AO FECHAMENTO DA CADEIA CARBÔNICA Observando a configuração estrutural das moléculas orgânicas, podemos classificar as cadeias carbônicas em: acíclica (aberta), cíclica (fechada) e aromática (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). O Quadro 2 apresenta detalhes e exemplos de cada caso. QUADRO 2 – CADEIAS CARBÔNICAS ALIFÁTICAS, CÍCLICAS E AROMÁTICAS Cadeia alifática: ocorre quando a cadeia carbônica possui duas ou mais extremida- des livres. Nessa estrutura, o encadeamento dos átomos não sofre fechamento, por isso também são chamadas de cadeia aberta ou, ainda, acíclica. Cadeia cíclica: ocorre quando a cadeia carbônica apresenta fechamento da sua es- trutura, levando à formação de um ciclo, também chamado de anel. Essas estruturas também são chamadas de cadeia carbônica fechada. Aromática: ocorre quando o ciclo de carbonos possui ligações duplas alternadas com ligações simples, chamado de anel aromático ou anel benzênico. Aromático mononuclear Aromático polinuclear FONTE: O autor 31 FIGURA 19 – AS FORMAS POSSÍVEIS DE REPRESENTAR A ESTRUTURA DO BENZENO FONTE: Adaptada de <https://bit.ly/3514guv>. Acesso em: 9 out. 2021. É importante destacar que as cadeias aromáticas podem, ainda, ser divididas em mononucleares (contêm um único anel) ou polinucleares (contêm dois ou mais anéis). As polinucleares podem ainda ser subdivididas em isoladas (quando os anéis não possuem átomos de carbono compartilhados) ou condensadas (quando os anéis compartilham átomos de carbono). Entre os inúmeros compostos aromáticos existentes, o benzeno (Figura 19) é o mais simples e considerado a estrutura base de todos os compostos orgânicos aromáticos. O benzeno foi descoberto, em 1825, pelo cientista Michael Faraday ao estudar a composição química do gás de iluminação usado (na época) em Londres. Em 1834, o cientista Eilhardt Mitscherlich conseguiu determinar que a molécula era formada por seis átomos de carbono e seis de hidrogênio (C6H6). No entanto, não conseguiam determinar a fórmula estrutural do benzeno. Somente em 1866, inspirado por um sonho com Ouroboros (símbolo místico da eternidade, em que uma serpente morde a própria cauda), August Kekulé propôs a estrutura química que, hoje, conhecemos como benzeno. O texto a seguir foi extraído de um discurso feito por ele, em 1890, em comemoração ao 25º aniversário do anúncio da fórmula do benzeno: Eu estava sentado à mesa a escrever o meu compêndio, mas o trabalho não rendia; os meus pensamentos estavam noutro sítio. Virei a cadeira para a lareira e comecei a dormitar. Outra vez começaram os átomos às cambalhotas em frente dos meus olhos. Desta vez, os grupos menores mantinham-se modestamente a distância. A minha visão mental, aguçada por repetidas visões desta espécie, podia distinguir agora estruturas maiores com variadas conformações; longas filas, por vezes alinhadas e muito juntas; todas torcendo-se e voltando-se em movimentos serpenteantes. Mas olha! O que é aquilo? Uma das serpentes tinha filado a própria cauda e a forma que fazia rodopiava trocistamente diante dos meus olhos. Como se se tivesse produzido um relâmpago, acordei; [...] passei o resto da noite a verificar as consequências da hipótese. Senhores, aprendamos a sonhar e então talvez possamos encontrar a verdade [...] mas evitemos publicá-los antes de colocar os sonhos à prova do mundo real. INTERESSANTE 32 FIGURA – ANEL HEXAGONAL, SEMELHANTE A UMA SERPENTE FONTE:<https://bit.ly/3HURbl1>. Acesso em: 21 out. 2021. Assim, Kekulé propôs que o benzeno apresentava os seis átomos de carbono (junto aos seis átomos de hidrogênio), que se uniam formando um anel hexagonal, semelhante à serpente mordendo a própria cauda. Na hipótese original, os átomos de carbono faziam ligações simples entre si. Pouco tempo depois, essa hipótese foi aperfeiçoada adicionando-se a alternância das ligações duplas e simples carbono-carbono – antecipando a ideia da ressonância do anel benzênico, que surgiria somente em 1930. FONTE: BOYD, E.; MORRISON, R. Mol. In: BOYD, E.; MORRISON, R. Química orgâni- ca. 12. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995. p. 701. 3.2 QUANTO À DISPOSIÇÃO DOS ÁTOMOS NA CADEIA CARBÔNICA Outra forma possível de realizar a classificação das cadeias carbônicas é através da análise de sua configuração espacial. Dessa forma, podemos classificá-las em cadeias lineares e ramificadas, conforme apresentado no Quadro 3 (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). QUADRO 3 – CADEIAS CARBÔNICAS LINEARES E RAMIFICADAS Cadeia linear ou normal: ocorre quando conseguimos visualizar somente duas extremidades. Nessa estrutura, o encadeamento dos átomos de carbono segue uma sequência linear, formada (exclusivamente) por carbonos primários e secundários. 33 Cadeia ramificada: ocorre quando conseguimos visualizar mais de duas extremidades. Nessa estrutura, surgem ramificações (ramos que bifurcam a cadeia principal) facilmente identificadas pela presença de carbonos terciários ou quaternários. FONTE: O autor Nas moléculas que apresentam cadeia carbônica ramificada, a estrutura formada pelo maior número de carbonos ligados entre si é denominada de cadeia principal. É dessa estrutura principal que partem os ramos, ou seja, as estruturas menores. DICAS 3.3 CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TIPO DE LIGAÇÃO ENTRE ÁTOMOS DE CARBONO De acordo com o tipo de ligação estabelecida entre os átomos de carbono, é possível classificar as cadeias carbônicas em saturadas e insaturadas (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). O Quadro 4 apresenta detalhes e exemplos de cada caso. QUADRO 4 – CADEIAS CARBÔNICAS SATURADAS E INSATURADAS Cadeia saturada: ocorre quando a cadeia carbônica apresenta apenas ligações simples entre os átomos de carbono. 34 Cadeia insaturada: ocorre quando a cadeia carbônica apresenta ao menos uma ligação dupla ou tripla (chamadas de insaturação) entre átomos de carbono. FONTE: O autor A classificação “cadeia insaturada” somente deve ser atribuída às moléculas que apresentam ligações duplas (ou triplas) entre átomos de carbono. Se a insaturação for realizada com outros elementos (por exemplo, nitrogênio e oxigênio), a cadeia carbônica deve ser classificada como saturada. DICAS 3.4 QUANTO À NATUREZA DOS ÁTOMOS PRESENTES NA CADEIA CARBÔNICA Observando os elementos presentes na estrutura molecular, as cadeias carbônicas podem ser classificadas em homogêneas e heterogêneas, conforme apresentado no Quadro 5 (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). QUADRO 5 – CADEIAS CARBÔNICAS HOMOGÊNEAS E HETEROGÊNEAS Cadeia homogênea: ocorre quando a cadeia carbônica (principal) é formada somente por átomos de carbono e hidrogênio. 35 Cadeia heterogênea: ocorre quando outros elementos (além de carbono e hidrogênio) estão presentes na cadeia carbônica principal. Os heteroátomos comumente encontrados são oxigênio, nitrogênio e fósforo. FONTE: O autor Algo muito importante que precisamos entender é que as quatro classificações descritas anteriormente são independentes, ou seja, uma não exclui a outra. Dessa forma, uma molécula pode ser classificada como cadeia aberta, normal, insaturada e homogênea. Para facilitar a sua compreensão, observe os exemplos a seguir: ATENÇÃO FIGURA – EXEMPLOS DE CADEIA ABERTA, NORMAL, INSATURADA E HOMOGÊNEA Cadeia aberta, ramificada, saturada e homogênea. Cadeia aberta, normal, insaturada e heterogênea Cadeia fechada, ramificada, insaturada e homogênea. FONTE: O autor 36 Para compreender como é realizada a classificação de uma cadeia carbônica, utilizaremos um exercício prático. Para isso, observe a estrutura química da molécula orgânica a seguir: FIGURA – ESTRUTURA QUÍMICA DE UMA MOLÉCULA ORGÂNICA FIGURA – MOLÉCULA ORGÂNICA FONTE: O autor FONTE: O autor O que você deve observar? 1. A cadeia carbônica possui alguma estrutura fechada? 2. Possui algum carbono terciário (ouquaternário)? 3. Quais os tipos de ligações presentes na estrutura? Somente simples ou há ligações duplas e/ou triplas? 4. Caso haja ligações dupla (ou tripla) ela está entre dois átomos de carbono? 5. Há algum átomo diferente de carbono e hidrogênio? Se sim, ele está entre dois átomos de carbono? Ao responder (corretamente) essas perguntas, você conseguirá fazer a classificação da molécula e determinar que ela apresenta: cadeia aberta (pois não apresenta nenhuma estrutura fechada), ramificada (pois apresenta um carbono quaternário), insaturada (pois apresenta uma ligação tripla entre dois átomos de carbono) e homogênea (pois é formada única e exclusivamente por átomos de carbono e hidrogênio). Em outro exemplo, como devemos classificar a molécula orgânica a seguir? Então, é preciso observar as seguintes questões: 1. A cadeia carbônica possui alguma estrutura fechada? Sim, então ela pode ser uma estrutura cíclica ou aromática. 2. A estrutura fechada possui ligações duplas alternadas com ligações simples? Sim, lembre-se de que a presença de ligações duplas sucessivas e alternadas com ligações simples numa estrutura cíclica forma um anel aromático. Então, trata-se de uma molécula aromática. 3. Apresenta um único anel aromático ou mais? Dois anéis. Então, trata-se de uma molécula aromática polinuclear. Lembre-se de que as moléculas polinucleares são subdivididas em núcleos isolados e condensados! 4. Os anéis aromáticos estão separados ou unidos através do compartilhamento de átomos de carbono comuns aos seus núcleos? Separados. Os anéis não possuem átomos de carbono em comum. Então, trata-se de uma molécula aromática polinuclear com núcleos isolados. 37 4 RESUMO DA CLASSIFICAÇÃO DE CADEIA CARBÔNICA A Figura 20 apresenta um resumo sobre a classificação de cadeias carbônicas. FI GU RA 2 0 – C LA SS IF IC AÇ ÃO D E CA D EI AS C A RB Ô N IC AS FO N TE : O a ut or 38 5 INTRODUÇÃO À NOMENCLATURA DE COMPOSTOS ORGÂNICOS Atualmente, sabe-se que existem mais de 19 milhões de compostos orgânicos inseridos no dia a dia. Além disso, muitos desses compostos têm estruturas e proprie- dades (físicas e químicas) semelhantes, tornando essencial a sua correta identificação (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Isso é feito através do uso de uma nomencla- tura. No entanto, não basta estabelecer uma nomenclatura de uso local. Seria desafiador se cada país definisse um nome diferente para um mesmo composto orgânico, certo? Nesse sentido, na publicação das pesquisas científicas, é preciso estabelecer uma linguagem acessível a todo e qualquer cientista, independen- temente de sua nacionalidade. Ao produzir um princípio ativo de um medicamento, é necessário atribuir um único nome, para que ele possa ser (igualmente) estudado e produzido no Brasil, no Japão, na Alemanha, nos Estados Unidos, ou seja, independen- temente do país. Além disso, outro aspecto importante é determinar a nomenclatura do composto através de sua fórmula estrutural, e vice-versa. Até meados do século XIX, os compostos orgânicos eram nomeados de acordo com sua origem. Para se ter uma ideia, a ureia recebeu esse nome por ter sido obtida através da urina; o ácido láctico, por ser oriundo do leite; e o ácido fórmico, da destilação de formigas vermelhas. INTERESSANTE Desde 1892, a União Internacional da Química Pura e Aplicada (IUPAC, sigla do inglês International Union of Pure na Applied Chemistry) realiza reuniões com químicos do mundo inteiro para estabelecer um sistema de nomenclatura comum a toda comunidade científica (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Assim, de acordo com a nomenclatura oficial IUPAC, o nome de um composto orgânico é formado por três partes principais: prefixo, infixo e sufixo (Quadro 6). 39 QUADRO 6 – NOMENCLATURA IUPAC COMPOSTOS ORGÂNICOS PREFIXO Quantidade de átomos de carbono presentes na cadeia carbônica principal + INFIXO Tipo de ligação entre átomos de carbono da cadeia carbônica principal + SUFIXO Função orgânica presente na molécula (terminação) 1 = MET 2 = ET 3 = PROP 4 = BUT 5 = PENT 6 = HEX 7 = HEPT 8 = OCT 9 = NON 10 = DEC AN Somente ligações simples EN Uma ligação dupla IN Uma ligação tripla DIEN Duas ligações duplas TRIEN Três ligações duplas O Hidrocarboneto OL Álcool AL Aldeído ONA Cetona ÓICO Ácido carboxílico FONTE: O autor De acordo com a nomenclatura oficial IUPAC, o prefixo informa a quantidade de átomos de carbono presentes na cadeia principal; o infixo, o tipo de ligação existente entre os átomos de carbono (atenção ao fato de que o infixo mudará sua nomenclatura de acordo com a presença de ligações duplas e triplas presentes na molécula, porém essas insaturações devem ser, exclusivamente, entre átomos de carbono); e, por fim, o sufixo informa a função orgânica presente na estrutura (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Para facilitar a classificação dos inúmeros compostos orgânicos, a química orgânica os dividiu em funções orgânicas, sendo cada uma delas caracterizada por um grupo funcional. Por exemplo, se o composto é formado apenas por átomos de carbono e hidrogênio, significa que ele pertence ao grupo dos hidrocarbonetos. Se apresentar o grupo funcional OH ligado a um átomo de carbono, dizemos que ele é um álcool, e assim por diante. Cabe ainda destacar que os compostos pertencentes ao mesmo grupo possuem propriedades físico-químicas semelhantes. A fórmula estrutural do composto orgânico pode ser observada a seguir: CH3 — CH2 — CH2 — CH3 ATENÇÃO 40 Como determinamos a nomenclatura? • O primeiro passo é contar o número de átomos de carbono presentes na estrutura. Nessa fórmula, há quatro átomos de carbono na cadeia; assim, o seu prefixo é BUT. • Agora, analisamos os tipos de ligações existentes entre os carbonos. Nesse caso, todos os átomos de carbono fazem ligações simples entre si, ou seja, há somente carbonos saturados e, portanto, o infixo é AN. • Por último, determinamos a qual função orgânica o composto pertence. Observa-se que a estrutura é formada, única e exclusivamente, por átomos de carbono e hidrogênio, o que significa que esse composto pertence ao grupo dos hidrocarbonetos e, portanto, seu sufixo será a terminação O. Ao unirmos as três partes, obtemos a nomenclatura IUPAC do composto que se chama BUTANO. À medida que nos aprofundarmos no estudo sobre compostos orgânicos, serão apresentados novos grupos funcionais e suas respectivas nomenclaturas. No momento, cabe destacar duas informações básicas: • Existem dois casos (excepcionais) que possuem uma palavra antes do prefixo: os compostos de cadeia fechada, em que devemos escrever primeiro a palavra “ciclo”, e os compostos do grupo dos ácidos carboxílicos, em que devemos escrevemos primeiro a palavra “ácido” (Figura 21). FIGURA 21 – EXEMPLOS DE PREFIXO: CICLOPENTANO E ÁCIDO METANOICO FONTE: O autor Ciclopentano Ácido metanoico • Quando a estrutura apresentar alguma instauração (ligação dupla ou tripla) ou alguma ramificação (indicado pela presença de, ao menos, um carbono terciário ou quaternário) na cadeia carbônica, é necessário numerar os carbonos da cadeia principal, para que seja possível indicar no seu nome a localização (em qual átomo de carbono) da insaturação ou da ramificação. A nomenclatura de compostos ramificados é realizada seguindo quatro etapas principais, utilizando como exemplo, o composto orgânico da fórmula da Figura 22: º Identificar a cadeia principal: identificar o encadeamento de átomos de carbono mais longo e contínuo, usando-o como referência para nomear a cadeia principal, conforme observado na Figura 23. 41 FIGURA 22 – EXEMPLO DE ESTRUTURA COM RAMIFICAÇÃO FONTE: O autor FIGURA 23 – IDENTIFICAÇÃO DA CADEIA CARBÔNICA PRINCIPAL FONTE: O autor A B C º Enumerar os átomos da cadeia principal: iniciando pela extremidade mais próxima da primeira ramificação, enumerar cada átomo de carbono na cadeia principal. Caso a estrutura apresente função orgânica diferente dehidrocarbonetos, a numeração deve iniciar pelo carbono imediatamente ligado ao grupo funcional (Figura 24). 42 FIGURA 24 – ENUMERAÇÃO DA CADEIA CARBÔNICA PRINCIPAL FONTE: O autor A B - Antes de iniciar a numeração da cadeia principal, é importante que você verifi- que e destaque as ramificações presentes na molécula, além das insaturações. No composto orgânico em questão (Figura 24A), podemos observar a presen- ça de três carbonos terciários, o que sinaliza a presença de três ramificações (círculos pontilhados); além disso, encontraremos uma ligação dupla C=C (ins- tauração) e o grupo funcional OH (indicando a função orgânica álcool). Dessa forma, a numeração correta é apresentada na Figura 24B. º Identificar e enumerar as ramificações (radicais): após identificar a presença de ramificações (comumente chamadas de radicais), é preciso informar sua existência na molécula. Para isso, basta contar o número de átomos de carbono presentes na ramificação, atribuir o prefixo correspondente (como mostrado anteriormente no Quadro 6) e adicionar a terminação “IL”. Assim, uma ramificação com dois átomos de carbono é chamada de metil (2C = MET + terminação IL, indicativo de ramificação). A Figura 25 mostra algumas das principais ramificações comumente encontradas em compostos orgânicos e sua respectiva nomenclatura. 43 FIGURA 25 – ALGUMAS RAMIFICAÇÕES COMUMENTE ENCONTRADAS EM COMPOSTOS ORGÂNICOS E SUA RESPECTIVA NOMENCLATURA FONTE: O autor - Na Figura 24A, a molécula possui uma ramificação com dois carbonos em C2 e C4, e uma ramificação com um único carbono em C5. Além disso, possui uma ligação dupla entre os carbonos 3 e 4. É importante saber que tanto as ramificações quanto as insaturações precisam ser facilmente identificadas na nomenclatura; assim, indicamos um “localizador”, ou seja, informamos o número em que elas ocorrem. No entanto, para as insaturações, indicamos somente o menor dos números. Por exemplo, na molécula em questão, a ligação dupla é indicada pelo infixo EN, antecedido pelo número 3. Por se tratar de um composto orgânico da função álcool, acrescentamos o sufixo OL em sua nomenclatura (como mostrado anteriormente no Quadro 6). o Escrever o nome do composto com uma única palavra: use os hífenes para separar os diferentes prefixos e utilize vírgulas para números. Se dois ou mais substituintes diferentes estiverem presentes no mesmo carbono, devem ser colocados em ordem alfabética. Se forem iguais, usa-se um dos prefixos múltiplos “di”, “tri”, “tetra”, e assim por diante, embora não devam ser usados para colocar na ordem alfabética. É importante destacar que, independentemente do composto orgânico a ser nomeado, inicia-se a nomenclatura considerando a seguinte ordem de importância: Grupo Funcional > Insaturação > Ramificação Assim, o composto orgânico (Figura 22) recebe o nome de 2,4-dietil-5-metil- hepet-3-enol. Quando o grupo funcional estiver ligado ao C1, o localizador da função orgânica fica subentendido, não sendo necessário colocar o número 1. 44 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Uma cadeia carbônica é formada pelo encadeamento de átomos de carbono (ligados entre si), podendo (ou não) apresentar heteroátomos. • Os átomos de carbono podem ser classificados em primários, secundários, terciários ou quaternários. • A configuração espacial das inúmeras moléculas orgânicas existentes pode ser classificada quanto: ao fechamento da cadeia carbônica, à disposição dos átomos na cadeia carbônica, ao tipo de ligação entre átomos de carbono e, ainda, à natureza dos átomos presentes na cadeia carbônica. • A nomenclatura dos compostos orgânicos difere para cada composto e segue as regras estabelecidas pela IUPAC. De acordo com ela, a nomenclatura oficial de um composto orgânico é formada por um prefixo, um infixo e finalizado por um sufixo. • Prefixo indica a quantidade de átomos de carbonos presentes na cadeia carbônica principal; infixo indica o tipo de ligações presentes entre os átomos de carbono na cadeia principal; e sufixo indica a função orgânica a que o composto pertence. • A cadeia principal de uma cadeia ramificada é aquela que apresenta: maior número possível de carbonos; maior número possível de radicais; insaturação (ligação dupla ou tripla) e carbono ligado ao grupo funcional. • A numeração de uma cadeia principal de uma estrutura ramificada deve iniciar a partir do carbono presente em uma extremidade, e seguir a ordem de prioridade: grupo funcional > insaturação > radical. • Quando a cadeia apresentar um mesmo tipo de ramificação em carbonos diferentes, devemos escrever as posições antes do nome da ramificação separadas por vírgula. Sempre que a cadeia apresentar mais de uma ramificação igual, é necessário utilizar prefixos (“di” para dois, “tri” para três, e “tetra” para quatro) antes do nome da ramificação, mas não utilizar esses prefixos para colocar na ordem alfabética. 45 1 Durante a fabricação de tecidos de algodão, a adição de compostos do tipo N-haloamina lhes confere propriedades biocidas, inativando bactérias que produzem mau cheiro. O principal responsável por efeito é o cloro presente nesses compostos. Observando a estrutura molecular da N-haloamina, apresentada na figura a seguir, pode-se classificá-la como: AUTOATIVIDADE FONTE: O autor ( ) Homogênea. ( ) Saturada. ( ) Aromática. ( ) Cíclica. ( ) Heterogênea. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) F – F – V – F – F. b) ( ) V – V – F – V – F. c) ( ) V – F – V – F – V. d) ( ) F – V – F – V – V. e) ( ) F – V – V – F – V. 2 A nomenclatura dos compostos orgânicos difere para cada composto e segue as regras estabelecidas pela IUPAC. De acordo com ela, a nomenclatura oficial de um composto orgânico é formada por um prefixo, um infixo e finalizado por um sufixo. Sobre a cadeia principal de um composto orgânico ramificado, analise as sentenças a seguir: I- É formada pelo maior número possível de átomos de carbono. II- Apresenta o menor número possível de radicais. III- As insaturações (C=C e C≡C) e o grupo funcional são indicados pelo menor número possível. IV- O grupo funcional não consta na cadeia principal. 46 Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A sentença I está correta. b) ( ) A sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. e) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. 3 A cafeína é um estimulante comumente encontrado em bebidas, como café, chás e refrigerantes. Sua fórmula estrutural pode ser representada da seguinte forma: FONTE: O autor FONTE: O autor Para a fórmula molecular da cafeína, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) C3H5N4O2. b) ( ) C6H8N4O2. c) ( ) C7H10N4O2. d) ( ) C8H12N4O2. e) ( ) C8H10N4O2. 4 De acordo com a nomenclatura proposta pela IUPAC, analise o composto apresentado na figura a seguir: Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) 4-dimetil-2-etil-4-etil-1,5-heptadieno. b) ( ) 4,2-metil-4-alil-1-hexeno. 47 c) ( ) 2,4-dimetil-4-etil-1,5-heptadieno. d) ( ) 2-metil-4-metil-4-etil-heptadieno. e) ( ) 4-etil-2,4-dimetil-hept-1,5-dieno. 5 Atualmente, existem mais de 19 milhões de compostos orgânicos inseridos no dia a dia, com estruturas e propriedades físico-químicas semelhantes, tornando essencial a sua correta identificação. De acordo com a IUPAC, órgão responsável por estabelecer um sistema de nomenclatura comum a toda comunidade científica, quais são as etapas para nomear um composto orgânico e evitar que não sejam atribuídos nomes diferentes a ele? 48 49 TÓPICO 3 - HIDROCARBONETOS 1 INTRODUÇÃO No dia a dia, os hidrocarbonetos são corriqueiramente encontrados e exercem grande importância na economia global, já que eles são as principais substâncias formadoras do petróleo e de todos os seus subprodutos, como os combustíveis automotivos (gás natural veicular – GNV –e gasolina), gás decozinha, velas e, até mesmo, os plásticos. Contudo, os hidrocarbonetos também podem ser encontrados nas borrachas, nos corantes e em óleos vegetais essenciais e numa infinidade de outros produtos. Sem dúvida, os hidrocarbonetos constituem a função mais simples entre os compostos orgânicos, por serem formados apenas de carbono (C) e hidrogênio (H), unidos através de ligações simples, duplas ou triplas. Uma das maiores importâncias que podemos destacar para os hidrocarbonetos se deve ao fato de suas moléculas servirem como “esqueleto” de todas as demais funções orgânicas, formando a cadeia carbônica principal. Por serem formados única e exclusivamente por átomos de carbono e hidrogênio, os hidrocarbonetos obedecem à fórmula geral , embora isso não tenha relação com a versatilidade e a diversidade dessa classe de compostos. Neste tópico, veremos que os diferentes tipos de ligação carbono-carbono dão origem a diferentes nomenclaturas (alcanos, alcenos e alcinos), além de as moléculas poderem se apresentar na forma linear ou formando ciclos, originando outras subclasses, como ciclanos, ciclenos e hidrocarbonetos atomáticos. UNIDADE 1 2 ALCANOS Os alcanos são hidrocarbonetos de cadeia aberta (acíclicos), formados exclusiva- mente por átomos de carbono com hibridização Sp3 e, portanto, saturados. Assim, podemos dizer que são compostos formados apenas por átomos de carbono e hidrogênio, em que há somente ligações simples entre seus carbonos (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Generalizando, a fórmula molecular dos alcanos é dada por: (FELTRE, 2004), em que “n” sempre será um número inteiro e positivo. Para facilitar a compreensão, pode-se imaginar um alcano formado por três átomos de carbono; para saber quantos átomos de hidrogênio estão presentes nessa molécula, basta aplicar a fórmula geral dos alcanos. Se a molécula possuir três carbonos, temos n = 3; assim, para determinar o número de hidrogênios, basta inserir essa informação em “2n + 2”: 50 Assim, um alcano formado por três átomos de carbono apresenta 8 átomos de hidrogênio. Outros exemplos podem ser observados na Tabela 3. TABELA 3 – EXEMPLOS DE ALCANOS E SUA RESPECTIVA FÓRMULA MOLECULAR FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Fórmula molecular Fórmula estrutural condensada CH4 CH4 C2H6 CH3 ─ CH3 C3H8 CH3 ─ CH2 ─ CH3 C4H10 CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 C5H12 CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 2.1 A PRESENÇA DOS ALCANOS EM NOSSA VIDA Os alcanos são conhecidos como hidrocarbonetos parafínicos, ou simplesmente parafinas, amplamente utilizados na fabricação de velas e objetos decorativos. No entan- to, sua principal aplicação está diretamente associada à produção (e o refino) do petróleo. Os alcanos são muito importantes na fabricação de combustíveis para automóveis, como GNV (uma mistura de metano, etano e propano), gasolina, querosene e óleo diesel. Além disso, um dos principais alcanos diariamente presentes em nossas vidas é o butano, que, junto ao propano, compõe a mistura presente no gás liquefeito de petróleo (GLP), comu- mente chamado de gás de cozinha (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 2.2 NOMENCLATURA DOS ALCANOS Como todos os compostos orgânicos, os alcanos seguem as regras oficiais determinadas pela IUPAC. Desse modo, a nomenclatura de todos os alcanos deve possuir a estrutura básica: prefixo + infixo + sufixo, como visto anteriormente. Assim, a nomenclatura dos alcanos de cadeia não ramificada é dada pela união do prefixo (que indica o número de átomos de carbono presente na molécula) + infixo “AN” (já que a molécula é formada unicamente por ligações simples carbono- carbono) + o sufixo O (terminação indicando a função hidrocarboneto) (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). Na Tabela 4, temos alguns exemplos de alcanos não ramificados e sua nomenclatura correspondente. 51 TABELA 4 – EXEMPLOS DE ALCANOS NÃO RAMIFICADOS E SUA NOMENCLATURA FONTE: O autor Fórmula molecular Prefixo Nomenclatura IUPAC CH4 MET Metano C2H6 ET Etano C3H8 PROP Propano C4H10 BUT Butano C5H12 PENT Pentano C7H16 HEPT Heptano C8H18 OCT Octano C10H22 DEC Decano Quando o alcano possuir um carbono terciário ou quaternário inserido na sua cadeia principal, dizemos que ele possui ramificações. Nesses casos, para a nomenclatura de alcanos ramificados, além do nome atribuído à cadeia carbônica, é necessário nomear as ramificações. No Quadro 7, temos algumas ramificações comumente encontradas em compostos orgânicos, observando-se que essas ramificações são derivadas dos próprios alcanos, através da “perda” de um átomo de hidrogênio. Por isso, seus nomes derivam do alcano correspondente, mas, para diferenciá-los e indicar que se trata de uma ramificação (e não de um hidrocarboneto), a terminação “ANO” deve ser substituída por “IL”. As ramificações derivadas dos alcanos são chamadas (genericamente) de grupo alquil ou alquilas. QUADRO 7 – RAMIFICAÇÕES (DERIVADAS DE ALCANOS) COMUMENTE ENCONTRADAS EM COMPOSTOS ORGÂNICOS FONTE: O autor Alcano original Ramificação Nomenclatura Metano, CH4 ─ CH3 Metil Etano, CH3 ─ CH3 ─ CH2 ─ CH3 Etil Propano, CH3 ─ CH2 ─ CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 Propil Butano, CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 Butil Outras ramificações, comumente encontradas em compostos orgânicos e no estudo da química orgânica, são apresentadas na Figura 26, em que podemos observar que a nomenclatura (IUPAC) considera “iso” toda a ramificação que se liga à cadeia principal, por meio de um átomo de carbono central do grupo alquil, enquanto a nomenclatura “sec” e “terc” correspondem, respectivamente, as ramificações que se ligam à cadeia principal, por meio de um carbono secundário e terciário do grupo alquil (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 52 FIGURA 26 – RAMIFICAÇÕES (DERIVADAS DE ALCANOS) COMUMENTE ENCONTRADAS EM COMPOSTOS ORGÂNICOS FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Isopropil Isobutil Sec-butil ou s-butil Terc-butil ou t-butil No entanto, como escrevemos corretamente o nome de um hidrocarboneto ramificado sabendo que ele também possui o nome dos substituintes orgânicos (ramificações)? De acordo com a IUPAC, podemos escrever nomenclatura de um alcano ramificado de acordo com a seguinte regra: Localização do RADICAL + nome do radical + PREFIXO + AN (infixo) + O (sufixo) Em que a localização significa a posição, o número do carbono da cadeia principal que a ramificação (também chamada de radical) está ligada (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). A nomenclatura de qualquer composto orgânico sempre é realizada em quatro etapas: • determinar a cadeia principal; • enumerar os átomos da cadeia principal; • identificar os radicais ligados à cadeia principal; • escrever o nome do composto com uma única palavra. ATENÇÃO Para facilitar a compreensão, podemos observar a Figura 27. Qual o nome (IUPAC) do alcano com a fórmula estrutural? FIGURA 27 – EXEMPLO DE FÓRMULA ESTRUTURAL FONTE: Adaptada de Peruzzo; Canto (2006) 53 FIGURA 28 – ETAPAS NECESSÁRIAS PARA A NOMENCLATURA DE UM ALCANO FONTE: O autor Na Figura 28, estão representadas as quatro etapas, necessárias para determinar o nome do alcano em questão. 2-metilbutano Na primeira etapa, está representada a identificação da cadeia principal, em que podemos começar pela ramificação que, nesse caso, também estaria correto. Em seguida, devemos fazer a numeração dos carbonos presentes na cadeia principal, observando-se que estão representadas duas possíveis sequências de numeração, mas por que só uma delas está correta? A ramificação sempre deve apresentar o menor número possível. Na etapa seguinte, identificamos as ramificações presentes e sinalizamos o número do carbono a que estão ligadas. Observa-se que, no exemplo em questão, há somente uma única ramificação, formada por um átomo de carbono (portanto, 1C = MET mais a terminação IL), temos um radical metil no carbono 2. Por fim, sabendo que a cadeia principal possui quatro átomos de carbono (4C = BUT) e que os alcanos têm a terminaçãoANO (infixo NA + sufixo O), podemos determinar sua nomenclatura, seguindo a regra IUPAC dada por: Localização do RADICAL + nome do radical + PREFIXO + AN (infixo) + O (sufixo) 2 + metil + BUT + AN + O 2-metilbutano Iniciamos com um alcano “simples”, para praticarmos e nos familiarizarmos com as etapas necessárias à nomenclatura de qualquer composto orgânico, mas nem sempre será assim. Na infinidade de compostos orgânicos existentes, há alcanos com diferentes estruturas muito mais complexas, como podemos observar no próximo exemplo. Qual o nome (IUPAC) do alcano com a fórmula estrutural da Figura 29? 54 FIGURA 29 – FÓRMULA ESTRUTURAL DO EXEMPLO FONTE: O autor FONTE: O autor FIGURA 30 – NOMENCLATURA IUPAC DE UM ALCANO COMPLEXO 3,4,8,8-tetrametil-5-propildecano Nesse exemplo, podemos observar que, inicialmente, está representada a identificação da cadeia principal, ou seja, o maior número (n) de átomos de carbono ligados entre si (n = 10). Em seguida, fazemos a numeração dos carbonos da cadeia principal. Estão representadas duas possíveis sequências de numeração, mas optamos pelo caminho em que a ramificação formada por três átomos de carbono permanece ligada ao carbono 5, em vez de 6. Na etapa seguinte, identificamos as ramificações presentes e sinalizamos o número do carbono a que estão ligadas. Observa-se que, no exemplo em questão, há quatro ramificações formadas por um átomo de carbono (1C = MET mais a terminação IL, radical metil) nos carbonos 3, 4 e 8 (duas vezes) e uma ramificação formada por três átomos de carbono (3C = PROP + IL, radical propil) no carbono 5. Por fim, sabendo que a cadeia principal possui dez átomos de carbono (10C = DEC) e que os alcanos têm a terminação ANO (infixo NA + sufixo O), determinamos sua nomenclatura seguindo a regra IUPAC dada por: 55 Localização do RADICAL + nome do radical + PREFIXO + AN (infixo) + O (sufixo) 3,4,8,8 + tetrametil + 5 + propil + DEC + AN + O 3,4,8,8-tetrametil-5-propildecano É importante lembrar que, quando o composto orgânico apresentar: • Mais de um tipo de ramificação: elas devem ser numeradas e colocadas em ordem alfabética. Assim, temos: butil, etil, metil, propril. • Ramificações iguais em carbonos diferentes: devemos escrever as posições antes do nome da ramificação separadas por vírgula. • Mais de uma ramificação igual: é necessário utilizar prefixos (“di” para dois, “tri” para três e “tetra” para quatro) antes do nome da ramificação, mas não utilizar esses prefixos para colocar na ordem alfabética. 3 ALCENOS E DIENOS Os alcenos são hidrocarbonetos de cadeia aberta (acíclicos), que possuem um átomo de carbono com hibridização Sp2. Assim, podemos dizer que são compostos formados por átomos de carbono e hidrogênio, em que há uma ligação dupla (insaturação) na sua cadeia carbônica (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005) Generalizando, a fórmula molecular dos alcenos é dada pela fórmula geral: , em que “n” sempre será um número inteiro e positivo (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Para facilitar a compreensão, podemos imaginar um alceno formado por cinco átomos de carbono. Para determinar quantos átomos de hidrogênio estão presentes nessa molécula, basta aplicar a fórmula geral dos alcenos. Sabendo que a molécula possui cinco carbonos, temos n = 5, portanto, para determinar o número de hidrogênios, basta inserir essa informação em “2n”: Assim, o alceno formado por cinco átomos de carbono apresenta 10 átomos de hidrogênio. Outros exemplos podem ser observados na Tabela 5. TABELA 5 – EXEMPLOS DE ALCENOS E SUA RESPECTIVA FÓRMULA MOLECULAR Fórmula molecular Fórmula estrutural condensada C2H4 CH2 = CH2 C3H6 CH3 ─ CH = CH2 C4H8 CH2 = CH ─ CH2 ─ CH3 C5H10 CH3 ─ CH2 ─ CH = CH ─ CH3 FONTE: Adaptada de Feltre (2004) 56 Quando os alcenos apresentam duas ligações duplas em sua cadeia carbônica, são chamados de alcadienos ou simplesmente dienos. É importante ressaltar que todo átomo de carbono sempre realiza quatro ligações para alcançar a estabilidade (regra do octeto); assim, há formação de uma ligação dupla carbono-carbono (C=C), que elimina a necessidade de dois átomos de hidrogênio. Portanto, a fórmula molecular dos dienos é dada pela fórmula geral: . Alguns exemplos de dienos podem ser observados na Tabela 6. TABELA 6 – EXEMPLOS DE DIENOS E SUA RESPECTIVA FÓRMULA MOLECULAR FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Fórmula molecular Fórmula estrutural condensada C3H4 CH2 = C = CH2 C4H6 CH2 = C = CH ─ CH3 C5H8 CH2 = CH ─ CH = CH ─ CH3 3.1 A PRESENÇA DOS ALCENOS E DIENOS EM NOSSA VIDA Diferentemente dos alcanos, que são amplamente encontrados na natureza, os alcenos em geral são sintéticos. Sua principal fonte de obtenção é através do craqueamento do petróleo, no qual se obtém o eteno, ou etileno, o composto mais simples da família dos alcenos. Do ponto de vista econômico, o etileno é um dos mais importantes compostos químicos já fabricados pela indústria petroquímica, pois ele dá origem ao polímero mais utilizado no mundo, o polietileno (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). A polimerização é o nome do processo químico que leva à formação de macromoléculas (moléculas grandes) chamadas de polímeros, originadas pela união de sucessivas e repetidas moléculas menores, chamadas dos monômeros. Na figura a seguir, é apresentada a polimerização do etileno (monômero), levando à formação do polietileno (polímero). É importante saber que essa reação requer condições específicas de temperatura, pressão e adição de outros reagentes químicos, para que ela, de fato, possa ocorrer. DICAS FIGURA – POLIMERIZAÇÃO DO ETILENO FONTE: Adaptada de <https://professor.bio.br/imagens/qu%C3%ADmica/2712.jpg>. Acesso em: 27 out. 2021. 57 O polietileno (PE) é mundialmente utilizado, devido ao seu baixo custo de produção associado à alta resistência à umidade, ao ataque de substâncias químicas e também por ser versátil do produto formado. Dependendo das condições reacionais utilizadas na sua fabricação, o polietileno pode apresentar cadeias retas, gerando um polímero de alta densidade (PEAD), mais rígido, usado na produção de garrafas, brinquedos e outros objetos. Por outro lado, quando sua polimerização apresenta cadeias ramificadas, gera um polímero de baixa densidade (PEBD), maleável, que é usado na produção de sacolas, revestimentos de fios elétricos, películas plásticas, embalagens de alimentos, entre outros produtos. Leia o artigo Polietileno: principais tipos, propriedades e aplicações, disponível em: https://bit.ly/3sRkE8O. DICAS No cotidiano, os dienos simples não existem na natureza. Entretanto, são produzidos em grande escala pela indústria petroquímica, para a produção de polímeros utilizados na fabricação de borracha sintética, como luvas cirúrgicas e preservativos. Um exemplo de dieno muito importante é o 2-metil-buta-1,3-dieno, comumente chamado de isopreno. Na natureza, a união de várias moléculas de isopreno da origem aos terpenos, uma classe de compostos químicos formadores dos óleos essenciais (produzidos pelos vegetais e extraídos de suas folhas, flores, frutos e raízes) amplamente usados na produção de perfumes e cosméticos (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 3.2 NOMENCLATURA DOS ALCENOS E DIENOS De acordo com a IUPAC, a nomenclatura dos alcenos é muito semelhante à dos alcanos, porém, deve-se usar a terminação “ENO”, já que tem a presença de uma ligação dupla (infixo/“EN”) e a função hidrocarboneto (sufixo “O”). A cadeia principal, além de apresentar o maior número de átomos de carbono ligados entre si, deve conter a ligação dupla. Além disso, a nomenclatura IUPAC exige a indicação da localização da insaturação (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). A nomenclatura de alcenos não ramificados, seguindo a regra IUPAC dada por: PREFIXO + Localização da insaturação + EN (infixo) + O (sufixo) Para compreendermos melhor a nomenclatura do composto orgânico de fórmula molecular C4H8, é necessário determinar a nomenclatura dos seguintes hidrocarbonetos: 58 • CH2= CH ─ CH2 ─ CH3. • CH3 ─ CH = CH2 ─ CH3. • CH3 ─ CH2 ─ CH = CH2. A fórmula molecular C4H8 pode ser representada de três maneiras diferentes, porém as moléculas A e B são diferentes (e recebem nomes diferentes), pois possuem a ligação dupla em posição diferente, já as moléculas C e A são idênticas (portanto, possuem nomes iguais). A regra da IUPAC pede para informar o número de carbonos presentes na cadeia principal (prefixo), indicar a localização da insaturação (infixo “EM”) e a função orgânica (sufixo “O”). Assim, temos: FIGURA 31 – IDENTIFICAÇÃO DA LOCALIZAÇÃO DA INSATURAÇÃO DO BUTENO FONTE: O autor But-1-eno But-2-eno É importante destacar que a localização da ligação dupla sempre deve ocorrer através de um número, que deve corresponder o menor número possível. Dessa forma, a numeração da cadeia principal dos alcenos deve iniciar na extremidade mais próxima à insaturação. A nomenclatura de alcenos ramificados é realizada seguindo a regra IUPAC dada por: Localização do RADICAL + nome do radical + PREFIXO + Localização da insaturação + EN (infixo) + O (sufixo) Para facilitar a compreensão, a Figura 32 apresenta a nomenclatura de alguns alcenos ramificados. FIGURA 32 – NOMENCLATURA IUPAC DE ALCENOS RAMIFICADOS Fórmula estrutural do alceno e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura 2,3,4-trimetil-pent-1-eno 59 5-metil-3-propil-hex-2-eno 5-metil-4-isopropil-hex-2-eno FONTE: O autor É importante destacar que, para a nomenclatura de alcenos ramificados: • a cadeia principal é a maior porção de átomos de carbono, ligados entre si, que contêm a ligação dupla; • a numeração da cadeia principal dos alcenos deve iniciar na extremidade mais próxima a insaturação, independentemente das ramificações presentes na molécula. • na nomenclatura final, a localização da ligação dupla sempre deve ocorrer através de um número, que deve corresponder ao menor número possível, escrito antes da terminação ENO. Para a nomenclatura dos dienos, de acordo com a IUPAC, deve-se usar a terminação “DIENO”, já que tem a presença de duas (“di”) ligações duplas (infixo “EN”) e a função hidrocarboneto (sufixo “O”). Além disso, a nomenclatura IUPAC também exige a indicação da localização da insaturação (FELTRE, 2004). Para compreendermos melhor, a Figura 33 apresenta a nomenclatura alguns dienos. 60 FIGURA 33 – NOMENCLATURA IUPAC DE DIENOS FONTE: O autor 4 ALCINOS Os alcinos são hidrocarbonetos de cadeia aberta (acíclicos), que possuem um átomo de carbono com hibridização Sp. Assim, podemos dizer que são compostos formados por átomos de carbono e hidrogênio, em que há uma ligação tripla (insaturação) na sua cadeia carbônica (SOLOMONS, 2002; CANTO; PERUZZO, 2006). Generalizando, a fórmula molecular dos alcinos é dada por: , em que “n” sempre será um número inteiro e positivo. Podemos imaginar um alcino formado por quatro átomos de carbono. Para determinar quantos átomos de hidrogênio estão presentes nessa molécula, basta aplicar a fórmula geral dos alcinos (SOLOMONS, 2002; CANTO; PERUZZO, 2006). Assim, sabendo que a molécula possui quatro carbonos, temos n = 4, para determinar o número de hidrogênios, basta inserir essa informação em “2n – 2”: Assim, o alcino, formado por quatro átomos de carbono, possui seis átomos de hidrogênio. Outros exemplos podem ser observados na Tabela 7. 2-etil-4-metil-penta-1,3-dieno 3-tercbutil-hepeta-1,4-dieno Etapas para nomenclaturaFórmula estrutural do alceno e nomenclatura IUPAC 61 TABELA 7 – EXEMPLOS DE ALCINOS E SUA RESPECTIVA FÓRMULA MOLECULAR FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Fórmula molecular Fórmula estrutural condensada C2H2 H ─ C ≡ C ─ H C3H4 CH3 ─ C ≡ CH C5H8 CH3 ─ C ≡ C ─ CH2 ─ CH3 C7H12 CH3 ─ CH2 ─ C ≡ C ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 4.1 A PRESENÇA DOS ALCINOS EM NOSSA VIDA De modo semelhante aos alcenos, os alcinos são compostos orgânicos artificiais. Sua principal fonte de obtenção é através da fragmentação (craqueamento) do petróleo. O exemplo mais conhecido (e importante) de alcino é o etino (HC≡CH), também chamado de acetileno, utilizado comercialmente como combustível gasoso para maçaricos e máquinas de soldar e cortar metais (ao entrar em combustão, produz uma chama azul que chega a 3.000 °C). Além disso, é utilizado como monômero para obtenção diferentes polímeros, como o poliacetato de vinila (PVA – usado na produção de cola e gomas de mascar) e o policloreto de vinila (PVC – usado na fabricação de tubos para encanamento de água e esgoto, fraldas, cortinas, toalhas de mesa, entre outros produtos sintéticos) (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 4.2 NOMENCLATURA DOS ALCINOS De acordo com a IUPAC, a nomenclatura dos alcinos é muito semelhante à dos alcanos e alcenos, porém se deve usar a terminação “INO”, já que tem a presença de uma ligação tripla (infixo “IN”) e a função hidrocarboneto (sufixo “O”). A cadeia principal, além de apresentar o maior número de átomos de carbono ligados entre si, deve conter a ligação tripla com a menor numeração possível. Para facilitar a compreensão, a Figura 34 mostra a nomenclatura alguns alcinos (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). FIGURA 32 – NOMENCLATURA IUPAC PARA ALCINOS But-1-ino 2,3,5-trimetil-hepet-3-ino Fórmula estrutural do alceno e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura 62 5-etil-4,5-dimetil-4-isopropil-non-2-ino FONTE: O autor 5 CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS Os hidrocarbonetos cíclicos são estruturas que apresentam uma porção fe- chada, um ciclo de carbonos. Como todo hidrocarboneto, são formados única e ex- clusivamente por átomos de carbono (C) e hidrogênio (H). Quando a porção cíclica é formada por átomos de carbono unidos unicamente por ligações simples, recebem a denominação de cicloalcano ou ciclano; quando possuem uma ligação dupla, são chamados de cicloalcenos ou ciclenos; e, quando apresentam uma ligação tripla, são denominados de cicloalcinos ou ciclinos (SOLOMONS, 2002). 5.1 A PRESENÇA DOS CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS EM NOSSA VIDA Os ciclanos são também chamados de hidrocarbonetos naftênicos, em virtude da sua principal fonte de obtenção ser o petróleo de base naftênica. O ciclopropano e o ciclopentano são usados como anestésicos em cirurgias. Na indústria, o clico-hexano é usado como solvente e removedor de tintas e vernizes e como combustível, além de atuar como matéria-prima para a fabricação de alguns produtos importantes, como o náilon (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Os ciclenos são encontrados, geralmente, em petróleo, solventes, biocombustí- veis, ceras, gás natural e óleos. Alguns ciclenos são encontrados em óleos essenciais e apresentam aroma agradável, como no caso do pineno (composto bicíclico derivado do ter- peno, presente no alecrim – é utilizado em tratamentos fitoterápicos no combate ao estres- se e à falta de apetite) e do alfapineno (que está presente em pinheiros e é muito utilizado como solvente para tintas à base de óleos) (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 63 Para saber mais sobre compostos terpênicos e óleos essenciais, sugerimos a leitura do artigo Aromas e a química dos compostos naturais, de Felipe e Bicas, disponível em: https://bit.ly/3LKzfvt. DICAS Devido à instabilidade de sua molécula, os ciclinos não são encontrados livres na natureza, existindo apenas na forma sintética (produção artificial em laboratório), porém, ainda não há aplicações viáveis para esses compostos. 5.2 NOMENCLATURA DOS CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS As regras da IUPAC atribuem aos ciclanos o prefixo CICLO e a terminação ANO (para os ciclanos), ENO (para os ciclenos) e INO (para os ciclinos). Alguns exemplos são apresentados na Figura 35 (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). FIGURA 35 – EXEMPLOS DE CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS FONTE: O autor Fórmula estrutural Nomenclatura IUPAC Ciclobutano Ciclopropeno Ciclopentino Para os compostos cíclicos ramificados, a regra IUPAC determina que: • existindo apenas uma ramificação no ciclo, devemos citá-la antes do nomedo composto; • existindo duas ou mais ramificações, devemos numerar os carbonos do ciclo, iniciando com o carbono próximo a ramificação mais simples e percorrer o ciclo (no sentido horário ou anti-horário), de modo que as demais ramificações fiquem com a menor numeração possível. Alguns exemplos são apresentados no Figura 36. 64 FIGURA 36 – EXEMPLOS DE CICLANOS, CICLENOS E CICLINOS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS FONTE: O autor Isopropil-ciclopentano 4-etil-1,4-dimetil-ciclobut-1-eno 3-metil-cicloprop-1-ino 6 HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS Quando os compostos orgânicos apresentam em sua molécula uma estrutura cíclica, formada por seis átomos de carbono unidos entre si, através de ligações duplas alternadas com ligações simples, dizemos que eles apresentam um anel (núcleo) aromático e os classificamos como hidrocarbonetos aromáticos (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). O composto aromático mais simples é o benzeno, formado por apenas um anel aromático (Figura 37), por isso, os anéis aromáticos são também chamados de anéis benzênicos. FIGURA 37 – REPRESENTAÇÃO ESTRUTURAL DO BENZENO FONTE: O autor C6H6 Fórmula molecular Fórmula estrutural 65 Na Figura 37, o anel benzênico é formado por seis átomos de carbono, unidos entre si, formando uma cadeia fechada com três ligações duplas (formada por uma ligação do tipo pi e outra sigma), intercaladas com três ligações simples (tipo sigma). Essa alternância entre as ligações duplas resulta em um efeito chamado de ressonância, em que ocorre a mudança dos elétrons presentes nas ligações pi, sem que haja alteração na posição de seus átomos. Geralmente, esse efeito é representado por um círculo no interior do anel aromático. É importante destacar que esse efeito proporciona grande estabilidade à estrutura da molécula, tornando-a reativa apenas em condições extremamente energéticas. Os hidrocarbonetos aromáticos constituem uma família extremamente numerosa de compostos orgânicos, de modo que não é possível representá-los por uma única fórmula geral. Muitas vezes, a “química dos aromáticos” é considerada um ramo especial dentro da química orgânica. 6.1 A PRESENÇA DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS EM NOSSA VIDA A principal fonte de obtenção natural dos hidrocarbonetos aromáticos é o alcatrão de hulha. A hulha é um tipo especial de carvão mineral, originado pela fossilização de madeiras soterradas, ao longo de milhares de anos, nas camadas profundas da Terra. Esse tipo de carvão é altamente rico em carbono. Durante as etapas de beneficiamento da hulha, são originadas três frações de importante para uso comercial, sendo a mais interessante a fração líquida, gerada a partir de sua destilação, na qual contém águas amoniacais e alcatrão de hulha (um líquido preto composto por uma mistura de hidrocarbonetos aromáticos, como benzeno, tolueno, fenol, naftaleno, entre outros) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Além disso, os compostos aromáticos participam de várias aplicações na área farmacêutica, alimentícia, química, entre outros. Atuam como matéria-prima na fabricação de diversos produtos. Por exemplo, o tolueno é usado como solvente em vernizes, tintas, adesivos, borrachas e resinas. O naftaleno pode ser utilizado como repelente de insetos e os xilenos, na obtenção de produtos de limpeza, ou ainda como solvente na produção de tintas e vernizes. No entanto, é preciso destacar que, apesar de suas inúmeras aplicações, os compostos aromáticos podem apresentar alta toxicidade, principalmente os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs), que, devido a sua capacidade lipofílica (solúvel em gorduras), são facilmente absorvidos pela pele. 66 Os HPAs compõem uma classe de mais de 100 substâncias químicas, naturalmente encontradas no carvão, no petróleo bruto, na gasolina, entre outros produtos. Além disso, são gerados durante a combustão incompleta ou pirólise de matéria orgânica e em vários processos industriais. São considerados contaminantes ambientais, o que significa que, além de estarem presentes no ar, na água, no solo e nos alimentos, se degradam lentamente no ambiente e causam malefícios à saúde de seres humanos e outros organismos. O benzo(a)pireno é o HPA mais bem estudado, e já é comprovadamente cancerígeno. Com o desenvolvimento da indústria petrolífera (ao longo do século XIX) e o domínio de técnicas de refino, o petróleo tornou-se não apenas uma das principais fontes energéticas utilizadas pela humanidade, mas, junto aos seus subprodutos, uma importante matéria- prima utilizada para a confecção de inúmeros bens de consumo, inserindo-o definitivamente na vida cotidiana das pessoas. Um dos derivados oriundos do refino do petróleo, com grande empregabilidade no cotidiano urbano, é o ligante asfáltico (fração mais pesada – resíduo da destilação – do petróleo), muito utilizado na impermeabilização e na pavimentação de estradas. Para ser aplicado, o betumem precisa ser aquecido a altas temperatura, levando à formação de uma nuvem de compostos químicos, entre os quais se encontram os HPAs. A exposição ocupacional a misturas contendo HPA está associada a diversos tipos de câncer, como câncer de pulmão (produção de coque, gaseificação de carvão, cobertura e pavimentação que envolva piche de carvão, produção de alumínio e fuligem); câncer de pele (destilação de alcatrão de hulha e fuligem); câncer de bexiga (queima de carvão e produção de alumínio); câncer de esôfago e sistema hematopoiético (fuligem). Para saber mais a respeito dos HPAS e sua toxicidade, sugerimos a leitura dos seguintes materiais: • Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos – HPA, disponível no site do Instituto Nacional de Câncer (Inca): https://bit.ly/3sGW7Dy. • Avaliação da presença, toxicidade e da possível biomagnificação de HPAs, disponível em: https://bit.ly/3LFK1mM. • Avaliação de adsorventes sólidos para a remoção de derivados de HPAs em solução, disponível em: https://bit.ly/3oVZ2qG. INTERESSANTE Outro composto que merece destaque é o benzeno, um líquido incolor, volátil e inflamável, amplamente utilizado como matéria-prima para produção de plásticos, corantes, medicamentos, detergentes, loções, adesivos, borrachas e tintas. Ao longo do desenvolvimento da química, muitos reagentes foram utilizados sem o total conhecimento de sua periculosidade. Por muito tempo, o benzeno foi um desses reagentes amplamente utilizado como solvente orgânico. Atualmente, sabe-se que ele é um composto extremamente tóxico, cuja inalação pode causar náusea, parada respiratória e cardíaca. Em casos de exposição prolongada aos vapores do benzeno, pode ocorrer uma doença chamada benzenismo, uma intoxicação crônica que afeta o sistema nervoso central e a medula óssea, levando a alterações sanguíneas, como a leucemia. 67 6.2 NOMENCLATURA DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS Os hidrocarbonetos aromáticos não seguem as regras gerais de nomenclatura IUPAC, mas possuem uma nomenclatura particular, conforme pode ser observado nos exemplos da Figura 38 (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005; FELTRE, 2004). FIGURA 38 – EXEMPLOS DE HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS E SUA NOMENCLATURA PARTICULAR FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Naftaleno Antraceno Fenantreno Benzopireno No entanto, os compostos aromáticos são nomeados seguindo duas regras específicas: • Compostos que apresentam somente uma ramificação (chamada de substituinte), ligada ao anel benzênico, são nomeados colocando-se o nome da ramificação seguido da terminação benzeno. • Compostos que apresentam duas (ou mais) ramificações, ligadas ao anel benzênico, são igualmente nomeados pela palavra benzeno, precedidos pelos nomes das ramificações; no entanto, deve-se indicar a localização de cada ramificação – assim, a numeração dos carbonos do anel deve partir da ramificação mais simples e prosseguir no sentido que resultem os menores números possíveis. Para facilitar a compreensão, podemos observar a nomenclatura dos hidrocar- bonetos aromáticos apresentada na Figura 39.FIGURA 39 – NOMENCLATURA (PARTICULAR) DE HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS RAMIFICADOS Metil-benzeno (Tolueno) Etil-benzeno Isopropil-benzeno 68 Fórmula estrutural do composto e Nomenclatura particular Etapas para nomenclatura 1,2-dimetil-3-isopropil-benzeno 1,3-dietil-benzeno FONTE: O autor FONTE: O autor FIGURA 40 – NOMENCLATURA RAMIFICAÇÃO: ORTO, META E PARA DIRIGENTES Quando os compostos aromáticos apresentam duas ramificações, preferencialmen- te, usamos os prefixos “orto” (o), “meta” (m) e “para” (p) na nomenclatura, para indicar a orien- tação das ramificações, conforme podemos observar nas posições indicadas na Figura 40. A nomenclatura (orto, meta e para dirigentes) é utilizada para indicar a posição de duas ramificações (chamadas aqui de R e R2) presentes no mesmo anel aromático, levando-se em conta a posição da ramificação mais simples (R), considerando que esta sempre ocupará a posição de número um, temos as seguintes nomenclaturas: • Orto: R na posição 1 e R2 na posição 2 ou 6. • Meta: R na posição 1 e R2 na posição 3 ou 5. • Para: R na posição 1 e R2 na posição 4. Alguns exemplos podem ser vistos na Figura 41. 69 FIGURA 41 – NOMENCLATURA DE HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS COM RAMIFICAÇÃO: ORTO, META E PARA DIRIGENTES 1,2-dimetil-benzeno ou o-dimetil-benzeno ou o-xileno 1,3-dimetil-benzeno ou m-dimetil-benzeno ou m-xileno 1,4-dimetil-benzeno ou p-dimetil-benzeno ou p-xileno FONTE: Adaptada de Feltre (2004) FIGURA 42 – CLASSIFICAÇÃO DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS RAMIFICADOS 6.3 CLASSIFICAÇÃO DOS HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS Os hidrocarbonetos aromáticos podem classificados em: • mononucleares (contêm um único anel benzênico) com ramificações saturadas (somente ligações simples) ou insaturadas (a ramificação deve apresentar ao menos uma ligação dupla ou tripla); • polinucleares (contêm dois ou mais anéis). As polinucleares podem ainda ser sub- divididas em isoladas (quando os anéis não possuem átomos de carbono compar- tilhados) ou condensadas (quando os anéis compartilham átomos de carbono). Dessa forma, podemos observar os exemplos apresentados no Figura 42. 70 FONTE: O autor 71 A HISTÓRIA SOB O OLHAR DA QUÍMICA: AS ESPECIARIAS E SUA IMPORTÂNCIA NA ALIMENTAÇÃO HUMANA Ronaldo da Silva Rodrigues Roberto Ribeiro da Silva O processo de efetiva ocupação da América pelos europeus a partir do século XVI foi ocasionado, inicialmente, pela necessidade desses povos em traçar novas rotas para tornar mais acessível o comércio das especiarias, termo atribuído a mercadorias caras e difíceis de serem obtidas e usadas para temperar comida. Em 1453, o império turco-otomano tomou Constantinopla e colocou sob seu jugo todo o comércio dos principais condimentos utilizados na alimentação europeia bem como as rotas para alcançá-los. No velho continente, as especiarias eram imprescindíveis por comporem os conservantes de alimentos e por serem utilizadas como remédios, afrodisíacos, temperos, perfumes, incensos etc. Praticamente todos necessitavam dessas “dádivas” da natureza (NEPOMUCENO, 2005). Não apenas o ouro e a prata, mas também os sabores e odores d’além mar fizeram parte das motivações que impeliram homens a lançarem-se rumo ao oceano desconhecido em busca de fortuna. Os metais preciosos sempre foram alvo da cobiça dos seres humanos, mas por qual motivo as especiarias eram tão importantes? Para se ter uma ideia do valor que era conferido a esses produtos, basta dizer que o primeiro mapa que incluiu o novo mundo e lhe atribuiu o nome de América, feito pelo monge alemão Martin Waldseemüller, em 1507 (MENEZES; SANTOS, 2006), identificava determinadas regiões do globo com pequenos textos nos quais constavam comentários a respeito desses alimentos. As quatro mais valorizadas naquele tempo eram a pimenta-do-reino, o cravo, a canela e a noz-moscada. De acordo com Nepomuceno (2005), essas especiarias “eram moedas de troca, dotes, heranças, reservas de capital, divisas de um reino. Pagavam serviços, impostos, dívidas, acordos e obrigações religiosas” (p. 25). Segundo essa autora, as principais especiarias comercializadas na época das grandes navegações eram nativas da Ásia Tropical, das florestas quentes e úmidas, e não podiam ser produzidas na Europa. Assim, [...] eram compradas secas e dessa forma utilizadas. Sua grande durabilidade, resistência a mofos e pragas nos longos tempos de estocagem, tornara possível e próspero seu comércio: suportavam por meses e até anos as travessias por mar ou terra sem perder as qualidades aromáticas e medicinais (p. 25). LEITURA COMPLEMENTAR 72 O comércio com os produtos advindos do Oriente era tão lucrativo que deu origem a homens extremamente ricos na Europa. Eduardo Galeano (1992), na obra As veias abertas da América Latina, registra que Karl Marx, no livro I do segundo volume de O Capital, destacou que “o descobrimento das jazidas de ouro e prata da América, [...] o começo da conquista e saqueio das Índias Orientais, a conversão do continente africano em local de caça de escravos negros: são todos feitos que assinalam os alvores da era de produção capitalista” (p. 39). Muitos desses abastados negociantes ergueram ou prejudicaram reis somente com o poder do capital que detinham e das negociatas lucrativas que articulavam. Os navegadores saíram em direção ao oeste (o que ocasionou a posterior ocupação das Américas pelos europeus) e ao sul, contornando a África. Segundo Huberman (1986), em sua primeira viagem à Índia, Vasco da Gama obteve um lucro de 6.000%! Como essa oportunidade comercialmente lucrativa não poderia ser explorada por uma única pessoa nem mesmo por um pequeno grupo delas devido aos altos custos envolvidos, surgiram, a essa época, as sociedades por ações, capazes de levantar os enormes capitais necessários ao gigantesco empreendimento de comércio com a Ásia, África e, posteriormente, América. Foram criadas, então, sete companhias das “Índias Orientais” (as mais famosas eram a inglesa e a holandesa) e quatro companhias das “Índias Ocidentais” – como era chamado o continente americano. O importante era saber que mesmo algumas expedições realizadas por corsários foram organizações com base na sociedade por ações. A própria rainha da Inglaterra possuía ações de uma das campanhas do famoso pirata Francis Drake (HUBERMAN, 1986). A descoberta de novas rotas em busca de especiarias do Oriente não ocasionou a diminuição do preço desses artigos na Europa. Pelo contrário, a busca por riqueza desmedida aumentou o preço dessas mercadorias, e esse fator aliado a outros (por exemplo, a guerra) foi mais que suficiente para espalhar a miséria entre uma boa parte da população da Europa, África, Ásia, Oceania e América. Vasco da Gama (em 1503), ao retornar cinco anos após a sua primeira e “amigável” visita à Calicute – na costa oeste da Índia –, não teve a intenção de realizar qualquer tipo de negócio com os governantes da região. Segundo Le Couteur e Burreson (2006), lá desembarcou com os soldados a seu comando e tomou à força a cidade, garantindo o controle português sobre o comércio da pimenta e o início do que viria a ser o império português que se estendeu por parte da África, da Índia, da Indonésia e do Brasil. Da mesma forma que os portugueses, espanhóis, holandeses e ingleses cobiçavam praticar o comércio das especiarias. No século XVII, os holandeses dominaram essa atividade garantindo o seu monopólio depois que expulsaram das Molucas os últimos espanhóis e portugueses. Para consolidarem o comércio de noz- moscada produzida nas ilhas de Banda (na Indonésia), massacraram a população local, escravizando os que sobraram, além de destruírem as árvores de noz-moscada que não estavam situadas em torno de suas construções fortificadas (LE COUTEUR; BURRESON, 2006). Além disso, negociaram, em 1667, a saída dos britânicos da região, cedendo-lhes a Nova Amsterdã (atual Nova York). 73 Nesse contexto, a elite europeia financiou a viagem por mar de aventureiroscapazes de trazer, diretamente do Oriente, as tão desejadas mercadorias. Assim eles poderiam vende-las e garantir a entrada de metais preciosos via comércio exterior em seu território. Curiosamente, a utilização de dinheiro na atividade de compra e venda desses produtos levou para o dia a dia do europeu: [...] uma abstração própria de um tipo de raciocínio teórico, antes patrimônio exclusivo de intelectuais, no qual símbolos podiam representar objetos concretos. Além disso, a manipulação da moeda nas sociedades em franco desenvolvimento comercial gerou a necessidade do aprendizado do cálculo matemático pela gente simples das cidades e dos campos. [...] Em pouco tempo multiplicaram-se as escolas de cálculo, e a matemática passou a fazer parte da formação das populações urbanas (Braga et al., 2004, p. 18-19) Por conta dessa necessidade prática da matemática, outras áreas do conhecimento acabaram também se desenvolvendo. Nas discussões cotidianas, como já havia ocorrido há bem mais tempo nas rodas filosóficas, confirmava-se a capacidade que a racionalidade representada pelos números tinha para encontrar a solução de muitos problemas. A partir daí, “começaram a ser procurados novos caminhos, que utilizassem a linguagem matemática na busca da verdade” (BRAGA et al., 2004, p. 21). A avidez pelo comércio transformou a Holanda em uma potência na exploração de novas terras, impulsionando a tecnologia nessa nação. Em todos os países exploradores da Europa, os problemas impostos pelas navegações provocaram o desenvolvimento da engenharia (invenção de máquinas capazes de marcar melhor o tempo), da astronomia (definição de pontos de referência no céu tão importantes para a navegação noturna), enfim, de diversas áreas do conhecimento. Na Itália, os abastados comerciantes financiavam aqueles que detinham a técnica de manipular os materiais naturais disponíveis e promoveram a construção de palácios, catedrais e todo tipo de edificações e obras de arte capazes de tornar a vida nas cidades mais confortável e mais agradável. A metodologia prática necessária ao trabalho nas navegações suscitou, em alguns filósofos, a ideia de que o conhecimento deveria ser construído a partir da experiência, como já havia sido sugerido em textos da Antiguidade: “o progresso tecnológico requeria liberdade na busca do conhecimento. As aventuras em terras exóticas sacudiam a mesmice desafiando a sabedoria vigente e mostrando que ideias aceitas há anos poderiam estar erradas” (SAGAN; SOTER, 2000, s. p.). Nessa visão, identificam-se aspectos do que seria denominado para a ciência moderna como experimentação (BRAGA et al., 2004). Dessa forma, [...] as grandes navegações mudaram por completo a história da Europa. Além de serem fundamentais para o estabelecimento da ciência moderna, possibilitaram a queda de vários mitos medievais. Além disso, mostraram que a adoção de um planejamento para a investigação podia levar, não só a novos conhecimentos, mas à superação e correção dos antigos, dando vida a um novo ideal: o progresso (p. 32-33). 74 As especiarias, tão importantes quando analisadas sob o ponto de vista político e econômico, tiveram sua relevância social retratada também pela elite artística daquele período. Muitas pinturas registraram sua utilização na preparação de vários pratos e na composição de valorizados costumes como, por exemplo, o de consumir chá em reuniões sociais ou familiares. Assim, não podemos negar que esses alimentos possuem características intrínsecas que certamente os colocaram em situação de destaque e possibilitaram sua exploração comercialmente lucrativa. Nesse sentido, encontramos na literatura justificativas capazes de esclarecer o motivo da extrema valorização das especiarias na época das grandes navegações com base na forma como eram utilizadas. Uma dessas explicações diz respeito à capacidade de as especiarias servirem para conservar as carnes ou para mascarar o gosto infecto das mal conservadas. Entretanto, para Flandrin e Montanari (1998), essa explicação se revela insatisfatória. Em primeiro lugar, segundo eles, porque os agentes de conservação das carnes já conhecidos naquela época eram o sal, o vinagre, o óleo e não as especiarias. Em seguida, porque, com exceção das salgas, as carnes eram comidas muito mais frescas do que atualmente. Outra tese considera que muitos desses produtos importados do Oriente não tinham uma função culinária, mas terapêutica. Flandrin e Montanari (1998) revelam que em um livro intitulado Le thresor de santé (O tesouro da saúde), publicado em 1607, está registrado que a pimenta-do-reino: [...] mantém a saúde, conforta o estômago [...], dissipa os gases [...]. Cura os calafrios das febres intermitentes, cura também picada de cobras. Quando bebida, serve para tosse [...] mastigada com uvas passas purga o catarro, abre o apetite. O cravo-da-índia, por sua vez, serve para os olhos, para o fígado, para o coração, para o estômago. Seu óleo é excelente contra dor de dentes. Serve [...] para as doenças frias do estômago [...]. Ele ajuda muito na digestão, se for cozido num bom vinho com semente de funcho (p. 480-481). Dessa forma, imaginava-se que todas as especiarias tivessem propriedades semelhantes. Inclusive essa função medicinal precedia a utilização da especiaria como condimento, pois os temperos empregados na cozinha no fim da Idade Média foram importados, a princípio, como medicamento e só depois para temperar alimentos. Assim, do século XIII ao início do século XVII, os médicos não cessaram de recomendar o uso de especiarias no tempero das carnes para torná-las mais fáceis de digerir. Segundo Flandrin e Montanari (1998), Aldebrandin de Siena escreveu em seu Le régime du corps (1256) que a canela tem a capacidade “de reforçar a virtude do fígado e do estômago [...] [e de] fazer que a carne tenha um bom cozimento [...]; [os cravos- da-índia] reforçam a natureza do estômago e do corpo, [...] eliminam a ventosidade e os maus humores [...] engendrados pelo frio, e ajudam no cozimento da carne” etc. (p. 481). Naquele tempo, todos aqueles instruídos pela restrita educação elitista entendiam a digestão como um processo de cozimento. O mais importante agente desse processo era o calor animal, responsável pelo lento cozimento do alimento no estômago. 75 Segundo essa visão, as especiarias contrabalançavam a casual frieza dos alimentos, contribuindo assim para a sua cocção, uma vez que todas elas eram classificadas como quentes e, em sua maioria, secas (FLANDRIN; MONTANARI, 1998). Livros de cozinha franceses publicados entre o século XIV e meados do século XVI atestam que as especiarias eram utilizadas em 58 a 78% das receitas, e ácidos, em 48 a 65%. Nessa perspectiva, as especiarias (consideradas quentes e secas) eram “desmanchadas”, “diluídas” ou “neutralizadas” com ácidos (sempre frios e secos) antes de serem adicionadas ao prato. Supunha-se que os ácidos teriam a propriedade de se infiltrar nos canais mais estreitos e, assim, esperava-se que eles levassem o calor das especiarias para todas as partes do corpo. Dos materiais de caráter ácido utilizados pelos cozinheiros franceses, dois apareciam com maior frequência: o agraço (suco extraído de uvas verdes) e o vinagre. Dado que os conceitos de medicina antiga eram muito próximos da experiência vulgar, os princípios da dietética podiam ser difundidos por outros meios além dos livros. Todos, na sociedade medieval, os aprendiam comendo – como acontece ainda hoje com todos os tipos de sociedades que consomem especiarias. Os provérbios antigos testemunham a circulação oral de determinadas prescrições da dietética antiga. Acreditava-se, por exemplo, que as carnes salgadas provocavam o escorbuto, por isso sempre eram consumidas com um “antiescorbuto”: a mostarda. Daí os provérbios do século XVI: “De carne salgada sem mostarda/Libera nos Domine. Que Deus nos proteja: de mulher que se pinta, de criado que em frente ao espelho tarda,e de carne de boi sem mostarda” (FLANDRIN; MONTANARI, 1998, p. 494) Portanto, o uso dos temperos tinha pelo menos dois objetivos: tornar os alimentos mais apetitosos e de fácil digestão. Podemos dizer que cozinhar naquela época, assim como hoje, era dar aos alimentos os sabores mais agradáveis de acordo com as crenças dietéticas e os hábitos alimentares dos indivíduos de uma determinada cultura. Na América do Sul, antes da colonização, a população autóctone tinha a seu dispor muitas plantas adequadas para temperar seus alimentos, cujos sabores tiveram sua boa qualidade comprovada pelo paladar dos próprios exploradores, dos mais antigos aos mais contemporâneos. Conforme registrou o marechal Cândido Mariano Rondon, após suas viagens pelo interior do Brasil no início do século XX, certas tribos preparavam o peixe para suas refeições de forma incomparável (CASCUDO, 2004). Os nativos, diferentemente dos invasores, não temperavam seu alimento antes ou durante o seu cozimento. A carne que não fosse consumida ainda fresca, por exemplo, era conservada a partir de um processo denominado moquém (a carne era tostada ao calor). Nas palavras de Lery (apud CASCUDO, 2004), ao preparar seu tempero preferido, [...] os selvagens pilam (a pimenta) com sal, que sabem fabricar retendo a água do mar em valos. A essa mistura chamam Ionquet e a empregam como empregamos o sal; entretanto não salgam os 76 alimentos, carne, peixe etc., antes de pô-lo na boca. Tomam primeiro o bocado e engolem em seguida uma pitada de Ionquet para dar sabor à comida (p. 120). De acordo com os registros da época, muitos dos habitantes destas terras não gostavam do sal e sequer o usavam de forma isolada. Mesmo sendo bem reduzida a sua ingestão, esses indivíduos não apresentavam qualquer problema relacionado à sua falta. Para Cascudo (2004), a pele dos nativos sul-americanos era protegida da perda de sais minerais, considerando que sua cobertura com pigmentos naturais retirados do genipapo (Genipa americana) e do urucum (Bixa orellana), argila e pó de carvão reduzia a sudorese. Tanto os povos da África como boa parte dos povos americanos preteriam o sal em favor da pimenta: Ambos, indígena e negro, eram e são fanáticos pela pimenta cujos alcaloides da Capsicum encarregar-se-iam de estimular-lhes o apetite pela excitação digestiva. De Lagos, na Nigéria, Antonio Olinto falame, em janeiro de 1963, que a pimenta é empregada em nível inimaginável. As pimentas substituíam o sal e, depois reunidas a ele nas inquitaias e ijuquis, foram suficientes para a castidade gustativa dos dois grupos étnicos (p. 127). A pimenta brasileira (do gênero Capsicum), ou quiya, era um condimento largamente utilizado pelos primeiros habitantes das terras americanas. Quase todas as tribos conhecidas no século XVII tinham hortas das quais retiravam a pimenta para condimentar suas refeições. O mercenário alemão Hans Staden, no século XVI, foi testemunha do contrabando realizado pelos franceses na costa brasileira, de onde estes levavam enormes carregamentos de pau-brasil, algodão e pimenta, frutos de negociatas com os tupiniquins (CASCUDO, 2004). Podemos notar a relevância inegável de diferentes condimentos nas mais variadas culturas que estiveram e ainda estão relacionados e dependentes das sensações que podem proporcionar aos nossos sentidos. A busca pelos condimentos que davam alma às refeições forçou o alargamento dos horizontes geográficos e intelectuais das pessoas que viveram no período da expansão marítima. A Europa passou a ser considerada apenas como mais um lugar no vasto planeta Terra. Por conta dessas novas noções de mundo é que, no século XVI, Copérnico pôde inaugurar a nova astronomia, retirando, das mentes de seus contemporâneos, o próprio planeta do centro do universo. FONTE: RODRIGUES, R. da S.; da SILVA, R. R. A História sob o Olhar da Química: As Especiarias e sua Importân- cia na Alimentação Humana. Química Nova na Escola, v. 32, n. 2, 2010. Disponível em: http://qnesc.sbq. org.br/online/qnesc32_2/05-HQ-5609.pdf. Acesso em: 5 fev. 2022. 77 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Os hidrocarbonetos são compostos orgânicos, formados única e exclusivamente por átomos de carbono e hidrogênio. Sua função orgânica gera o sufixo “O” ao final da nomenclatura. • As estruturas com cadeia carbônica aberta (acíclicas) podem ser formadas unica- mente por ligações simples, recebendo a denominação alcano. Quando apresentam uma ligação dupla, são chamadas de alceno; ao apresentarem duas ligações duplas, recebem a denominação dieno; e, em uma ligação tripla, são chamadas de alcino. • A denominação ciclo é atribuída as estruturas que possuem uma porção da cadeia carbônica principal fechada, em forma cíclica. Assim, temos as nomenclaturas ciclano, cicleno e ciclino, em função do tipo de ligação (simples, dupla ou tripla) entre os átomos de carbono formadores do ciclo. • Hidrocarbonetos aromáticos são compostos orgânicos que possuem estrutura cíclica, formada por ligações duplas alternadas com ligações simples, chamadas de anéis aromáticos. O composto mais simples e mais comum é o benzeno (C5H6), o qual dá origem a todos os demais compostos aromáticos. • Apesar de existirem diversas fontes de obtenção dos inúmeros hidrocarbonetos (acíclicos, cíclicos e aromáticos), a principal delas, sem dúvida, é o petróleo e seus subprodutos. 78 1 De acordo com a nomenclatura IUPAC, os hidrocarbonetos são definidos como compostos orgânicos formados, única e exclusivamente, por átomos de carbono e hidrogênio, porém, por serem uma grande e diversificada família, são subdivididos em grupos com comportamentos químicos similares. Sobre a divisão dos hidrocarbonetos, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Acanos. II- Dienos. III- Alcinos. IV- Ciclenos. V- Aromáticos. ( ) Possuem estrutura cíclica com uma ligação π carbono-carbono. ( ) Apresentam uma ligação tripla na cadeia carbônica. ( ) Apresentam somente carbonos Sp3. ( ) Possuem ao menos uma estrutura cíclica com ressonância de ligações duplas. ( ) Apresentam duas ligações na cadeia carbônica. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – III – I – IV – II. b) ( ) II – III – I – V – II. c) ( ) III – II – V – IV – I. d) ( ) IV – III – I – V – II. e) ( ) V – IV – II – I – III. 2 A gasolina é um combustível comumente utilizado no dia a dia. Sua composição é formada pela mistura de hidrocarbonetos, com destaque para a presença majoritária de octano. Sobre a fórmula molecular do octano, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) C8H16. b) ( ) C8H18. c) ( ) C8H14. d) ( ) C12H24. e) ( ) C12H26. 3 Os hidrocarbonetos são corriqueiramente encontrados e exercem grande importância na economia global, já que são as principais substâncias formadoras do petróleo e de todos os seus subprodutos. Sobre hidrocarbonetos, analise as sentenças a seguir: AUTOATIVIDADE 79 I- Hidrocarbonetos são compostos orgânicos constituídos somente de carbono e hidrogênio. II- São chamados de alcenos somente os hidrocarbonetos insaturados de cadeia linear. III- Cicloalcanos são hidrocarbonetos alifáticos saturados de fórmula geral CnH2n. IV- São hidrocarbonetos aromáticos: bromobenzeno, p-nitrotolueno e naftaleno. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A sentença I está correta. b) ( ) A sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. e) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. 4 Os compostos aromáticos participam de várias aplicações nas áreas farmacêutica, alimentícia, química, entre outras, atuando como matéria-prima na fabricação de diversos produtos. Comente, em linhas gerais, a importância e os riscos dos compostos aromáticos para nossa sociedade atual. 5 Considere as estruturas dos dois hidrocarbonetos apresentados na figura a seguir: FONTE: O autor Assinale a alternativa que apresenta as nomenclaturasoficiais CORRETAS: a) ( ) Ciclo-heptadecano e 7-etil-1,4,5-trimetiltridecano. b) ( ) Heptadecano e 7-etil-1,4,5-trimetiltridecano. c) ( ) Heptadecano e I7-etil-4,5-dimetiltridecano. d) ( ) 1-metil-hexadecano e 7-etil-9,10-dimetiltridecano. e) ( ) Dimetil-pentadecano e 7-etil-9,10-dimetiltridecano. 80 REFERÊNCIAS BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos – HPA. Instituto Nacional de Câncer (Inca), 2021. Disponível em: https://bit.ly/3s- GW7Dy. Acesso em: 27 out. 2021. BROCK, W. The Fontana History of Chemistry. HarperCollins UK, 2012. BRUICE, P. Química Orgânica. 4 ed. São Paulo: Pearson, 2006. v. 1. CANTO, E. L. do; PERUZZO, T. Química na abordagem do cotidiano. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2006. CANTO, E. L. do; PERUZZO, T. Química na abordagem do cotidiano. 5. ed. São Paulo: Moderna, 2009. COLIM, A. N. Avaliação de adsorventes sólidos para a remoção de derivados de HPAs em solução. Dissertação (Mestrado em Química) – Universidade Fede- ral de Santa Maria, Santa Maria, 2014. Disponível em: https://repositorio.ufsm. br/handle/1/10565. Acesso em: 27 out. 2021. CORREIA, C. R. D.; COSTA, P. R. R.; FERREIRA, V. F. Vinte e cinco anos de reações, estratégias e metodologias em química orgânica. Quim. Nova, v. 25, Supl. 1, p. 74-81, 2002. Disponível em: https://bit.ly/3Bp5NXa. Acesso em: 5 out. 2021. COUTINHO, F. M. B. et al. Polietileno: Principais Tipos, Propriedades e Aplica- ções. Polímeros: Ciência e Tecnologia, v. 13, n. 1, p. 1-13, 2003. Disponível em: https://bit.ly/3IbnbkE. Acesso em: 21 out. 2021. CUNHA, S. et al. Craqueamento térmico de alcanos: uma aula prática de química orgânica para a graduação. Química Nova, v. 28, n. 2, p. 364-366, 2005. Disponí- vel em: http://www.scielo.br/pdf/qn/v28n2/23664.pdf. Acesso em: 23 out. 2021. FELTRE, R. Química: Química Orgânica. 6. ed. São Paulo: Moderna, 2004. v. 3. HILÁRIO, F. F. Estudo do átomo de carbono (Hibridização), Estrutura de Lewis, Carga formal. Universidade Federal de Ouro Preto, [2014?]. Disponível em: ht- tps://bit.ly/3I1hJB4. Acesso em: 12 out. 2021. GALVÃO, L. H. A alquimia na Idade Média (Palestra). Youtube – Nova Acrópole Brasil, 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8whFz7B-qDQ. Acesso em: 10 out. 2021. 81 GREENBERG, A. Uma breve história da química: da alquimia às ciências mole- culares modernas. Editora Edgard Blucher, 2017. MACENO, M. M. C. Avaliação da presença, toxicidade e da possível biomagnifica- ção de HPAs. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Recursos Hídricos e Ambien- tal) – Departamento de Hidráulica e Saneamento, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010. Disponível em https://bit.ly/3LFK1mM. Acesso em: 27 out. 2021. MCMURRY, J. Química orgânica. Tradução: Ana Flávia Nogueira; Izilda Apareci- da Begatin. São Paulo: Pioneira Learning, 2005. v. 1. ORCHIN, M. et al. The Vocabulary and Concepts of Organic Chemistry. 2. ed. John Wiley & Sons, Inc. 2005. Disponível em: https://bit.ly/3JzQhe6. Acesso em: 8 out. 2021. RODRIGUES, R. da S.; da SILVA, R. R. A História sob o Olhar da Química: As Espe- ciarias e sua Importância na Alimentação Humana. Química Nova na Escola, v. 32, n. 2, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3rTgoqd. Acesso em: 5 fev. 2022. SOLOMONS, T. W. Graham. Química orgânica. Livros técnicos e científicos. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora S.A., 2002. v. 1. v. 2. 82 83 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA QUÍMICA ORGÂNICA UNIDADE 2 — OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • compreender as inúmeras funções orgânicas existentes na química orgânica; • reconhecer as principais funções orgânicas oxigenadas e identificar seus respectivos grupos funcionais, compreendendo a importância e nomeando corretamente os compostos orgânicos álcoois, fenóis, éteres, cetonas, aldeídos, ácidos carboxílicos e seus derivados (sais orgânicos, ésteres, anidrido e cloretos de acila); • reconhecer as principais funções orgânicas nitrogenadas e identificar seus respectivos grupos funcionais, compreendendo a importância e nomeando corretamente os compostos orgânicos aminas, amidas, nitrilas e nitro; • reconhecer outras funções orgânicas existentes nos compostos orgânicos, bem como identificar seus respectivos grupos funcionais, compreendendo a importância e nome- ando corretamente os compostos orgânicos haletos orgânicos e compostos sulfurados. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – FUNÇÕES ORGÂNICAS OXIGENADAS TÓPICO 2 – DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS E FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS TÓPICO 3 – HALETOS ORGÂNICOS E COMPOSTOS SULFURADOS Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 84 CONFIRA A TRILHA DA UNIDADE 2! Acesse o QR Code abaixo: 85 TÓPICO 1 — FUNÇÕES ORGÂNICAS OXIGENADAS UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Ao longo da evolução da química e dos estudos de química orgânica, os cientistas realizaram várias experiências, aliando o ato de observar, registrar, repetir e confirmar seus apontamentos levou a inúmeras descobertas. Assim, foi observado que algumas substâncias continham semelhanças em suas fórmulas estruturais e, quando isso ocorria, apresentavam propriedades químicas muito semelhantes, dando origem às classes funcionais (também chamadas de função química ou função orgânica). Para facilitar e padronizar essa classificação, surgiu um conceito muito importante, chamado de “grupo funcional”. Os grupos funcionais identificam o conjunto de átomos característico de cada função orgânica. Apesar de existirem várias classes funcionais, direcionaremos nosso estudo para as funções orgânicas oxigenadas, nitrogenadas e sulfuradas e alguns haletos orgânicos. Depois do carbono e do hidrogênio, o oxigênio é o elemento químico mais abundante nas estruturas das moléculas orgânicas; esses átomos ligam-se entre si de diferentes maneiras, formando uma infinidade de cadeias carbônicas. Assim, as funções orgânicas oxigenadas compõem uma grande e diversificada família de compostos orgânicos. É importante saber que os compostos orgânicos oxigenados estão diariamente inseridos em nossa vida, nos processos metabólicos para o funcionamento do nosso corpo (na digestão dos açúcares, do amido e, até mesmo, na respiração celular), além de estarem presentes no amido dos cereais, nos óleos dos vegetais, na gordura dos animais e nas bebidas fermentadas. Ainda são facilmente identificados nas essências dos perfumes, nos combustíveis automotivos (como o etanol), na produção de plásticos e nos produtos têxteis, entre outros. Dessa forma, esses compostos representam bilhões de dólares para as indústrias e a economia global, mas, mais do que isso, representam peças-chaves para o funcionamento e manutenção da vida. Diante disso, neste tópico, estudaremos as funções orgânicas oxigenadas mais importantes, que são: álcoois, fenóis, éteres, aldeídos, cetonas e ácidos carboxílicos. Assim, poderemos entender melhor a constituição e realizar suas nomenclaturas, seguindo as regras estabelecidas pela União Internacional da Química Pura e Aplicada (IUPAC, sigla do inglês International Union of Pure na Applied Chemistry). 86 2 ÁLCOOIS Álcoois são compostos orgânicos que contêm em sua estrutura o grupo funcional hidroxila (OH), diretamente ligado a um átomo de carbono saturado (isto é, carbono com hibridização Sp3, que só faz ligações simples) da cadeia carbônica principal (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Assim, na Figura 1, são mostrados alguns exemplos de compostos que não devem ser classificados como álcoois. FIGURA 1 – COMPOSTOS ORGÂNICOS QUE NÃO SÃO EXEMPLOS DE ÁLCOOIS FONTE: O autor FIGURA 2 – COMPOSTOS ORGÂNICOS CLASSIFICADOS COMO ÁLCOOIS FONTE: O autor É possível perceber que todos os compostos apresentados naFigura 1 possuem o grupo funcional hidroxila (OH), porém não cumprem a regra básica para essa classe, ou seja, a hidroxila está ligada a átomos de carbono saturado (alifáticos ou aromático). Na Figura 2, são apresentados alguns exemplos de moléculas que são (corretamente) classificadas como álcoois. Dependendo do tipo de estrutura molecular, os álcoois podem ser classificados em alifáticos (cadeia aberta), cíclico ou aromático. Álcool alifático Álcool cíclico Álcool aromático A hidroxila (OH), também chamada de oxidrila, além de ser o grupo funcional dos álcoois, é responsável pelas propriedades químicas (semelhantes) desses compostos. ATENÇÃO 87 2.1 A PRESENÇA DOS ÁLCOOIS EM NOSSA VIDA Atualmente, os compostos orgânicos com o grupo funcional álcool estão corriqueiramente presentes em diferentes aplicações no nosso dia a dia. O etanol (CH3 ─ CH2 ─ OH), por exemplo, pode ser encontrado tanto no combustível automotivo quanto em bebidas alcoólicas. No Brasil, o etanol é obtido, principalmente, pela fermentação da cana-de-açúcar, sendo usado como combustível de automóveis em substituição à gasolina e ao óleo diesel, proporcionando uma queima limpa, já que não libera compostos de enxofre na atmosfera. Além disso, é utilizado como solvente na produção de perfumes, loções, desodorantes e medicamentos, sendo amplamente empregado em produtos de uso doméstico como o álcool em gel (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Com a pandemia da Covid-19 (em 2020/2021), a produção e o uso de álcool em gel 70% ganharam grande destaque no cenário mundial. Qual a principal característica do álcool em gel 70%? Sem dúvida, a principal aplicação desse tipo de álcool está associada a sua ação desinfetante de superfícies e objetos, sendo antisséptico sob a pele. O seu grau alcoólico (70%) indica a concentração de etanol, que pode expresso em volume (v/v) ou massa (m/m) do produto. Nessa concentração (70%), o etanol tem a capacidade de provocar a desnaturação de proteínas e de membranas celulares, promovendo a destruição de microrganismos e, como consequência, a apoptose. Além disso, também age rapidamente sobre diferentes bactérias e vírus, e, por isso, sua utilização é tão recomendada. INTERESSANTE Já o metanol (CH3 ─ OH) pode ser usado como combustível em motores a explosão, como os de certos carros de corrida e de aeromodelos. Sua principal aplicação é como solvente, na fabricação de plásticos, no preparo de vitaminas e também em hormônios (FELTRE, 2004). O metanol é um álcool tóxico que, ao ser ingerido, pode causar cegueira e até levar à morte. Na grande maioria das vezes, os casos mais graves de intoxicação por metanol estão associados à contaminação criminosa de bebidas alcoólicas. Por ser um álcool barato, com cheiro e características físicas similares ao etanol, e, ainda, não pagar os impostos que incidem sobre as bebidas alcoólicas, o metanol tem sido adicionado (criminosamente) em bebidas alcoólicas clandestinas, para aumentar, falsamente, os níveis de etanol. No entanto, cabe destacar que a legislação brasileira permite o nível máximo (seguro) de metanol nas bebidas destiladas de 0,25 mL/100 mL de álcool anidro, limite que geralmente é desrespeitado nas bebidas clandestinas. O efeito tóxico do metanol resulta na sua metabolização em aldeído fórmico e, deste, em ácido fórmico. ATENÇÃO 88 Para aprofundar o conhecimento sobre o metanol, sugerimos a leitura do artigo científico Uso do metanol e risco de exposição dos trabalhadores de uma usina de biodiesel, de autoria de Assis et al. (2017), disponível em: https://cdn.publisher.gn1.link/rbmt.org.br/pdf/v15n1a05.pdf. DICAS O colesterol (Figura 3) é um esteroide que compõe as membranas celulares de todos os mamíferos. É um álcool policíclico, formado por uma longa cadeia carbônica, o que o torna insolúvel em água e no sangue; assim, para ser transportado pelo plasma sanguíneo, deve se ligar à proteínas hidrossolúveis (FELTRE, 2004). FIGURA 3 – FÓRMULA ESTRUTURAL DO COLESTEROL FONTE: <https://bit.ly/3oRMot1>. Acesso em: 8 nov. 2021. 2.2 NOMENCLATURA DOS ÁLCOOIS Como todos os compostos orgânicos, os álcoois seguem as regras oficiais determinadas pela IUPAC. Desse modo, a nomenclatura de todos os álcoois deve conter a estrutura básica: prefixo (número de átomos de carbono na cadeia principal), mais infixo (tipo de ligação entre os átomos de carbono da cadeia principal) e sufixo (função orgânica), como já estudado na Unidade 1 (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Para a nomenclatura dos álcoois, a IUPAC determina o sufixo “OL”. Além disso: • a cadeia principal deve ser a mais longa possível, contendo o átomo de carbono (saturado) ligado ao grupo funcional (hidroxila, OH); • na existência de mais de uma possibilidade para ligação da hidroxila na cadeia principal, é necessário indicá-la por meio de sua numeração; 89 • a numeração da cadeia principal (sempre) deverá ser feita iniciando pela extremidade mais próxima do grupo OH, de modo que ele apresente o menor número possível; • quando a estrutura apresentar ramificações (indicada pela presença de carbonos terciários e quaternários), a prioridade da menor numeração sempre será do grupo funcional OH, seguido pelas ramificações; • por fim, o nome do álcool será o do hidrocarboneto correspondente à cadeia principal, substituindo terminação “O” (correspondente a função hidrocarboneto) por “OL”. Para melhor compreensão, a Figura 4 apresenta a nomenclatura de alguns álcoois. FIGURA 4 – EXEMPLOS DE ÁLCOOIS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS Fórmula estrutural do composto e Nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Propan-2-ol 4,5-dimetil-hexan-3-ol Pent-3-in-ol Ciclohexan-1-ol 3-metil-ciclopentan-1-ol FONTE: O autor Uma nomenclatura muito comum entre a comunidade científica e que também se popularizou na sociedade em geral é dada por: 90 No Quadro 2, podemos observar alguns exemplos de nomes atribuídos à alguns álcoois comumente encontrados no nosso cotidiano. QUADRO 2 – NOMENCLATURA USUAL E IUPAC DE ALGUNS ÁLCOOIS COMUMENTE ENCONTRADOS NO NOSSO COTIDIANO Fórmula estrutural Nomenclatura USUAL Nomenclatura IUPAC Álcool metílico Metanol Álcool etílico Etanol Álcool isopropílico Isopropanol Álcool benzílico Fenil-metanol FONTE: O autor 2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS ÁLCOOIS Como é possível observar, existe uma grande diversidade de estruturas mo- leculares classificadas como álcoois. Para tentar diferenciá-las, foram estabelecidas algumas classificações para auxiliar a subdividir e agrupar essas estruturas em conjun- tos “menores” com características ainda mais semelhantes (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004) Assim, os álcoois podem se classificados segundo alguns critérios, como: • de acordo com a cadeia carbônica: o álcool saturado: formado única e exclusivamente por átomos de carbono com hibridização Sp3, ou seja, que fazem somente ligações simples; o álcool insaturado: quando apresentar ao menos uma ligação dupla ou tripla entre os átomos de carbono; o álcool cíclico: quando a cadeia carbônica apresentar uma estrutura cíclica; o álcool aromático: quando a cadeia carbônica apresentar um anel aromático; o álcool ramificado: quando a cadeia carbônica apresentar ao menos um átomo de carbono terciário ou quaternário. 91 • de acordo com o número de hidroxilas na cadeia carbônica: o monoálcoois (ou monóis): quando apresentar somente uma hidroxila; o diálcoois (ou dióis): possui duas hidroxilas; o triálcoois (ou trióis): possui três hidroxilas; o e assim por diante: tetróis, pentóis, polióis etc. • de acordo com a posição da hidroxila na cadeia carbônica: o álcool primário: tem sua hidroxila ligada a um átomo de carbono primário; o álcool secundário: tem sua hidroxila ligada a um átomo de carbono secundário; o álcool terciário: tem sua hidroxila ligada a um átomo de carbono terciário; o álcool quaternário: tem sua hidroxila ligada a um átomo de carbono quaternário. 3 FENÓIS Os fenóis são um conjuntode compostos orgânicos identificados pela presença de uma hidroxila (OH) diretamente ligada a um carbono aromático, ou seja, a um carbono insaturado de um anel benzênico (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). O grupo funcional fenol é representado na Figura 5. FIGURA 5 – GRUPO FUNCIONAL FENOL FONTE: O autor Esse composto orgânico (Figura 5) representa, também, a fórmula estrutural do fenol mais simples, chamado de hidroxibenzeno ou simplesmente fenol. Ele é o fenol mais importante, pois é utilizado como matéria-prima para a produção de outros fenóis que agem como antissépticos fungicidas e desinfetantes. É importante destacar que o grupo funcional dos fenóis também é a hidroxila (OH), o mesmo grupo funcional dos álcoois. No entanto, nos álcoois, a hidroxila deve estar ligada a um átomo de carbono saturado (hibridização Sp3), enquanto, nos fenóis, a hidroxila deve estar ligada a um átomo de carbono de um anel aromático (carbono insaturado, com hibridização Sp2) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Para facilitar a compreensão, a Figura 6 mostra a comparação da estrutura de um fenol e um álcool. 92 FIGURA 6 – COMPARAÇÃO DA ESTRUTURA DE UM FENOL E UM ÁLCOOL FONTE: O autor ÁLCOOL Álcool cíclico Álcool aromático FENOL Monofenol Difenol 3.1 A PRESENÇA DOS FENÓIS EM NOSSA VIDA Apesar de serem compostos altamente tóxicos, os fenóis podem ser facilmente encontrados no nosso dia a dia, sendo alguns exemplos: • Creolina: uma mistura dos isômeros metil-fenóis (orto, meta e para-cresol), comumente conhecidos como cresóis, são amplamente usados como desinfetante doméstico. Quando obtidos de forma isolada, são sólidos brancos, mas, na mistura dos três isômeros, a composição apresenta-se na forma líquida. Podem, ainda, ser usados na fabricação de resinas sintéticas ou modificados para aplicação em eletrônica (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). • Eugenol: é um óleo extraído do cravo, que possui propriedades antissépticas, anestésicas, medicinais e bactericidas, por isso é muito utilizado pela indústria de cosméticos. Apesar de ser largamente produzido pela destilação do cravo, o eugenol também está presente na canela e na mirra (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). • Hidroquinona ou quinol: esse fenol tem sido muito utilizado em clínicas de estética para os tratamentos de pele, como o peeling. Além disso, a hidroquinona é usada na produção de polímeros, herbicidas e antioxidantes (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). • Baquelite: uma resina sintética, obtida por polimerização de fenol com formaldeído; devido a sua estabilidade química e resistência ao calor, é utilizada na fabricação de cabos de facas, tomadas, interruptores, cabos de panelas, telefones, bolas de bilhar, câmeras fotográficas, revestimentos de móveis, entre outros (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Os fenóis também são usados na produção de corantes e resinas, na fabricação do indicador ácido-base fenolftaleína e da aspirina. 3.2 NOMENCLATURA DOS FENÓIS A nomenclatura IUPAC dá aos fenóis o sufixo “OL” ou o prefixo “HIDRÓXI”. No entanto, assim como ocorre com os compostos aromáticos, os fenóis mais simples possuem nomes comuns, que são aceitos pela IUPAC (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Podemos observar a nomenclatura de alguns fenóis na Figura 7. 93 FONTE: O autor FIGURA 8 – NOMENCLATURA DE FENÓIS RAMIFICADOS FIGURA 7 – NOMENCLATURA DE ALGUNS FENÓIS MAIS SIMPLES 1-hidróxi-benzeno ou benzenol ou fenol comum 1-hidróxi-naftaleno ou α-naftol Para moléculas mais complexas, devemos usar (prioritariamente) o prefixo “HIDRÓ- XI”. Além disso, quando existirem ramificações no anel aromático, devemos informar tanto a localização da hidroxila (OH) quanto a localização da ramificação presente na molécula. Para isso, a numeração da cadeia carbônica sempre deverá iniciar no carbono ligado à hidroxila e prosseguir no sentido de onde se obtenha o(s) menor(es) número(s) para a(s) ramificação(ões) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Alguns exemplos são apresentados na Figura 8. Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC 2-metil-hidroxibenzeno 2-isopropil-5-metil-hidroxibenzeno 3,5-dimetil-1-hidroxinaftaleno Etapas para nomenclatura Os átomos de carbonos (setas) que unem os anéis aromáticos nunca são numerados FONTE: O autor 94 4 ÉTERES Os éteres são compostos orgânicos caracterizados pela presença de um átomo de oxigênio (O), inserido no meio da cadeia carbônica de uma determinada molécula, ou seja, tem-se um heteroátomo (nomenclatura comumente utilizada para indicar átomos diferentes de carbono e hidrogênio presentes num hidrocarboneto) de oxigênio ligado a dois radicais monovalentes alquila ou arila (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Dessa forma, os éteres podem ser representados pela fórmula geral: R ─ O ─ R’ ou Ar ─ O ─ Ar ou Ar ─ O ─ R Em que R e R’ representam radicais (geralmente hidrocarbonetos) alifáticas (abertas ou fechadas) e Ar grupos arila (aromáticos); em qualquer dos casos, os grupos podem ser iguais ou diferentes entre si. 4.1 A PRESENÇA DOS ÉTERES EM NOSSA VIDA O éter etílico (CH3 ─ CH2 ─ O ─ CH2 ─ CH3), também chamado etoxietano, éter dietílico ou, simplesmente, éter comum, é um composto orgânico amplamente utilizado como solvente (apolar), em laboratórios e nas indústrias químicas, sendo empregado, sobretudo, na extração de óleos, gorduras, essências e perfumes, sejam eles de origem vegetal ou, até mesmo, animal. Por ser considerado um dos solventes utilizados no refino da cocaína das folhas de coca, tem sua comercialização e distribuição controlada pela Polícia Federal (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Durante o século XIX, o éter etílico foi utilizado como anestésico por inalação, proporcionando que cirurgias mais invasivas pudessem ser realizadas. No entanto, seu uso apresentava alguns riscos e perigos, tanto para a saúde do paciente quanto da equipe médica presente no local, pois, além de ser tóxico, causar irritação no trato respiratório e mal-estar pós-operatório no paciente, os vapores do éter etílico são muito inflamáveis, a ponto de provocar incêndios na sala de cirurgia, uma vez que ele reage com o oxigênio presente no ar (atmosférico), formando um peróxido de hidrogênio, o que, provavelmente, atua detonando a explosão. Assim, com a descoberta de novos compostos, o éter etílico foi substituído por outros anestésicos mais seguros. INTERESSANTE Outro éter de grande importância é o metóxi-terciobutano (MTBE), usado como antidetonante na gasolina. Além disso, a função éter está presente também em muitos compostos naturais com função mista (compostos que apresentam mais de uma classe de grupo funcional), como a vanilina e o eugenol (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 95 4.2 NOMENCLATURA DOS ÉTERES A nomenclatura oficial para os éteres segue uma regra fixa, estabelecida pela IUPAC, na qual se determina que eles devam conter a palavra “ÓXI” intercalada pelo nome dos respectivos radicais (menor e maior) presentes na sua estrutura (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Assim, temos: __________________ + ÓXI + __________________ MENOR RAICAL Quantos carbonos têm? MAIOR RADICAL Quantos carbonos têm? Há também outra nomenclatura muito comum entre a comunidade científica aceita para os éteres, na qual os nomes dos radicais são apresentados em ordem alfabé- tica, acrescidos da terminação “ÍLICO” (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Assim, temos: Éter __________________ – __________________ + ílico 1º RADICAL Quantos carbonos têm? 2º RADICAL Quantos carbonos têm? Ordem alfabética Na Figura 9, temos a nomenclatura de alguns éteres. FIGURA 9 – NOMENCLATURA IUPAC E USUAL DE ALGUNS ÉTERES COMUMENTE ENCONTRADOS NO NOSSO COTIDIANO Etapas para nomenclaturaFórmula estrutural do composto eNomenclatura IUPAC Nomenclatura IUPAC e usual Metoxietano ou éter etil-metílico Etóxi-isopropano ou éter etil-isopropílico Metóxi-benzeno ou éter fenil-metílico FONTE: O autor 96 5 ALDEÍDOS E CETONAS Aldeídos ecetonas são chamados de compostos carbonílicos, pois contêm, em sua fórmula estrutural, o grupo funcional carbonila (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005), representado na Figura 10. FIGURA 10 – GRUPO FUNCIONAL CARBONILA FONTE: O autor FIGURA 11 – ALGUNS EXEMPLOS DE ALDEÍDOS FONTE: O autor ou ou Em que R e R’ representam radicais (geralmente hidrocarbonetos) alifáticas (abertas ou fechadas) ou o átomo de hidrogênio, e Ar representa os grupos arila (aro- máticos); em qualquer dos casos, os grupos podem ser iguais ou diferentes entre si. No entanto, há uma diferença muito importante entre eles e, por isso, são divididos em duas classes distintas. Nos aldeídos, o grupo carbonila está em um carbono primá- rio, ao passo que, nas cetonas, o grupo carbonila está em um carbono secundário (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Um aldeído pode ser definido como todo composto orgânico que apresenta, em sua fórmula estrutural, o grupo carbonila (C = O) ligado a um átomo de hidrogênio e, portanto, sempre localizado em uma das extremidades da cadeia principal. O grupo funcional dos aldeídos costuma ser representado por: CHO (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Podemos observar na Figura 11 alguns exemplos de aldeídos. Aldeído alifático Aldeído cíclico Aldeído aromático Se a cadeia carbônica apresentar apenas um grupo funcional CHO, o composto é classificado como monoaldeído, porém, se apresentar dois ou mais desse grupo, ele é classificado como polialdeído. 97 Já uma cetona pode ser definida como todo composto orgânico que apresente, em sua fórmula estrutural, o grupo carbonila (C = O) inserido no meio da cadeia principal, ou seja, entre dois átomos de carbono (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). A Figura 12 apresenta alguns exemplos de cetonas. FIGURA 12 – ALGUNS EXEMPLOS DE CETONAS FONTE: O autor Cetona alifática Cetona cíclica Cetona aromática As cetonas podem ser classificadas de acordo com a quantidade de carbonilas. Dessa forma, se houver apenas um grupo carbonila na cadeia, trata-se de uma monocetona; se houver duas, uma dicetona; se houver três, uma tricetona. Outra forma de classificação é atribuída quando os dois radicais ligados ao carbono da carbonila são iguais, diz-se que é uma cetona simétrica; caso sejam diferentes, denomina-se de cetona assimétrica (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). 5.1 A PRESENÇA DOS ALDEÍDOS E CETONAS EM NOSSA VIDA Os aldeídos mais simples (como o metanal e o etanal) possuem cheiro forte e irritante, já os de elevada massa molar possuem aromas agradáveis, sendo responsáveis pelo odor e pelo sabor de vários vegetais. Por exemplo, o cheiro e o sabor característicos da canela se devem ao aldeído cinâmico ou cinamaldeído, enquanto a vanilina (4-hidróxi- 3-metoxibenzaldeído) extraída da orquídea Vanilla planifolia é o principal componente da essência ou aroma de baunilha (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). O metanal, também chamado de formol, em condições ambientes, é um gás de cheiro característico e irritante. Quando em solução possui diferentes aplicações, dependendo de seu teor – por exemplo, na concentração de até 2%, pode ser utilizado como conservante, pois impede a proliferação de micro-organismos; na porcentagem máxima de 5%, é empregado em cosméticos para fortalecimento de unhas; já na concentração de 40% (m/m), é usado para a conservação de tecidos animais (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). As cetonas são facilmente encontradas na natureza, na constituição de flores e frutos. Em geral, apresentam odor agradável, por isso, são utilizadas na produção de perfumes e aromatizantes alimentícios. A jasmona é o principal componente do óleo essencial de jasmim; as iononas são compostos aromáticos encontrados em uma variedade de óleos essenciais, incluindo o óleo de rosa e no odor de violetas. As quinonas 98 são dicetonas cíclicas que possuem grande importância industrial. Por exemplo, a quinona comum (p-benzoquinona) é usada em revelação fotográfica, e a antraquinona é usada na fabricação de corantes (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). No entanto, a propanona, mais conhecida como acetona, é a cetona de maior importância comercial, amplamente utilizada como solvente de esmaltes de unha, mas seu uso pode ser ampliado, pois tem capacidade para dissolver graxas, vernizes e resinas. Além disso, é empregada na extração de óleos de sementes vegetais, na fabricação de anidrido acético e medicamentos (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 5.2 NOMENCLATURA DOS ALDEÍDOS E CETONAS Assim como os demais compostos orgânicos, os aldeídos e as cetonas seguem as regras oficiais determinadas pela IUPAC. Portanto, ambas as nomenclaturas devem a estrutura básica: prefixo (número de átomos de carbono na cadeia principal), mais infixo (tipo de ligação entre os átomos de carbono da cadeia principal) e sufixo (função orgânica). Além disso: • a cadeia principal deve ser a estrutura carbono-carbono mais longa possível, que contenha o grupo funcional carbonila (C=O); • as cetonas possuem diferentes possibilidades para a localização da carbonila na cadeia principal, sendo necessário indicá-la através de numeração; • tanto em aldeídos como em cetonas, a numeração da cadeia principal (sempre) deverá ser feita iniciando pela extremidade mais próxima da carbonila, de modo que ele apresente o menor número possível; é importante destacar que, nos aldeídos, o carbono 1 sempre será o próprio carbono do grupo funcional; • quando a estrutura apresentar ramificações (indicada pela presença de carbonos terciários e quaternários), a prioridade da menor numeração sempre será do grupo funcional (C=O), seguido pelas ramificações. 5.2.1 Nomenclatura IUPAC para aldeídos A IUPAC determina que, na nomenclatura dos aldeídos, seja adicionando o sufixo “AL” na estrutura básica de nomenclatura (prefixo + infixo + sufixo). É importante lembrar que a cadeia principal é a mais longa, que inclui o grupo funcional (CHO), e a numeração sempre iniciará a partir do carbono presente nesse grupo (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Para facilitar a compreensão, a Figura 13 exibe a nomenclatura de alguns aldeídos. 99 FIGURA 13 – EXEMPLOS DE ALDEÍDOS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS FONTE: O autor 5.2.2 Nomenclatura IUPAC para cetonas A IUPAC determina que, na nomenclatura das cetonas, seja adicionado o sufixo “ONA” na estrutura básica de nomenclatura (prefixo + infixo + sufixo). A cadeia principal é a mais longa, que inclui o grupo funcional (C=O), o qual deverá ter sua localização indicada, já que possuem diferentes possibilidades para a localização da carbonila (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). A Figura 14 traz alguns exemplos de cetonas que podem ser encontradas na natureza, mas elas representam somente uma pequena porção das inúmeras estruturas moleculares existentes, ou seja, nem sempre elas terão estruturas simples. Fórmula estrutural do composto e Nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Etanal 3-metil-butanal Pentanodial Pent-3-enal Benzaldeído Alguns aldeídos possuem nomenclatura própria, o benzaldeído é um exemplo 100 FIGURA 14 – EXEMPLOS DE CETONAS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Propa-2-ona 2,2-dimetil-penta-3-ona 3-metil-buta-2-ona 2,4-dimetil-ciclohexanona FONTE: O autor FIGURA 15 – FÓRMULA ESTRUTURAL DE UMA CETONA FONTE: O autor A seguir, veremos um exemplo de como se dá a nomenclatura de uma cetona com estruturas mais complexas. Qual o nome (IUPAC) da cetona com a fórmula estrutural da Figura 15? Para entendermos melhor, as etapas estão descritas na Figura 16. 101 FIGURA 16 – ETAPAS PARA NOMENCLATURA IUPAC DE UMA CETONA COMPLEXA FONTE: O autor 5-etil-4,4-dimetil-hept-6-en-2-ona Para compreender todas as etapas descritas, observa-se que, na primeira etapa, está representada a identificação da cadeia principal, ou seja, o maior número (n) de átomos de carbono ligados entre si (n = 7). É importante perceber queessa molécula contém, além do grupo funcional carbonila, uma insaturação (ligação dupla). Ambas as informações são importantes para a nomenclatura, logo, a cadeia principal deve conter tanto o grupo funcional quanto a insaturação. Em seguida, fazemos a numeração dos carbonos da cadeia principal. Também estão indicadas duas possíveis sequências de numeração, mas sempre optamos pelo caminho onde o grupo funcional permaneça com a menor numeração possível. Na etapa seguinte, identificamos as ramificações presentes e sinalizamos o número do carbono que estão ligadas. Observa-se que existem três ramificação, duas formadas por um átomo de carbono (1C = MET mais a terminação IL, radical metil) e que estão ligadas ao carbono 4, e uma ramificação formada por dois átomos de carbono (2C = ET + IL, radical etil), que está ligada ao carbono 5. Por fim, sabendo que a cadeia principal possui sete átomos de carbono (7C = HEPT), com uma ligação dupla nos carbonos 6 e 7 (infixo “EN”), e que todas as cetonas possuem a terminação “ONA” (sufixo), determinamos sua nomenclatura IUPAC. Seguindo as quatro etapas (Figura 16), descobrimos que a fórmula estrutural representa uma cetona denominada, pela IUPAC, como 5-etil-4,4-dimetil-hept-6-en-2-ona. O infixo informa a presença ou ausência de insaturações na molécula. Quando a molécula apresentar insaturação, deve-se informar sua localização, sempre indicada pelo menor número possível. Já o sufixo informa o grupo funcional e, como as cetonas possuem diferentes possibilidades para localização da carbonila, teremos que indicá-lo sempre pela menor numeração possível. DICA 102 6 ÁCIDOS CARBOXÍLICOS Os compostos orgânicos denominados ácidos carboxílicos apresentam em sua fórmula estrutural o grupo funcional carboxila (Figura 17), formado pela união de uma carbonila (C=O) e uma hidroxila (OH) (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Observa-se que esse grupo funcional apresenta um carbono primário e, assim, sempre o encontraremos em uma das extremidades da molécula. FIGURA 17 – GRUPO FUNCIONAL CARBOXILA FONTE: O autor FIGURA 18 – ALGUNS EXEMPLOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Em que R e Ar representam radicais alifáticas (abertas ou fechadas) e grupos arila (aromáticos), respectivamente. Em qualquer dos casos, os grupos podem ser iguais ou diferentes entre si. Dependendo das características estruturais de sua molécula, os ácidos carboxílicos podem ser classificados em alifáticos e aromáticos; quanto ao número de carboxilas presentes na molécula, são classificados em monocarboxílicos (ou monoácidos), dicarboxílicos (ou diácidos), entre outros (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). A Figura 18 apresenta alguns exemplos de ácidos carboxílicos. Ácido acético (alifático) Ácido ciclopentanoico (cíclico) Ácido fórmico (monoácido) Ácido propanoico (alifático) Ácido benzoico (aromático) Ácido oxálico (diácido) Forma abreviada 103 6.1 A PRESENÇA DOS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS EM NOSSA VIDA Os ácidos carboxílicos estão corriqueiramente presentes no nosso dia a dia. Historicamente, o ácido carboxílico mais antigo é o ácido acético, que dá origem ao vinagre utilizado diariamente como tempero de saladas e demais produções culinárias. O vinagre consiste em uma solução aquosa com 4% a 7% de ácido acético, ou seja, em 1 litro de vinagre, tem-se uma massa de 40 g a 70 g de ácido acético. O ácido acético é produzido pela fermentação aeróbica (na presença de oxigênio) de algumas bebidas alcoólicas por ação de bactérias do gênero Acetobacter (fermentação acética), normalmente já presentes em frutos, sucos e vinhos. Em geral, bebidas alcoólicas que contenham menos que 7% de álcool “azedam” em contato com o ar, ou seja, sofrem fermentação alcoólica. O ácido acético também é usado como matéria-prima para a produção de polímeros e essências artificiais (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Contudo, não é apenas o ácido acético que é produzido através de fermentação. Alguns outros ácidos são originados na decomposição de alimentos, por meio da ação de micro-organismos. O ácido butanoico é encontrado na manteiga rançosa (quando a manteiga fica velha, forma-se esse ácido, originando o cheiro característico de manteiga rançosa). O aroma de alguns queijos (roquefort) é originado pelo ácido pentanoico, mesmo ele estando presente em pequenas quantidades (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Outro ácido carboxílico muito presente em nosso dia a dia é o ácido metanoico, presente na secreção expelida na picada de uma formiga, por isso composto é conhecido com ácido fórmico. Além disso, ele é utilizado como fixador de pigmentos e corantes em tecidos. A grande maioria dos ácidos carboxílicos possui odor desagradável, pois possuem um ou dois carbonos que têm cheiro irritante (ácido/azedo), ao passo que os que possuem de 3 a 12 carbonos na cadeia têm cheiro mais pungente e rançoso. Os caprinos (bodes, cabras e ovelhas), por exemplo, exalam um odor forte e característico em função da evaporação de ácidos carboxílicos de 6, 8 e 10 carbonos, que são chamados, respectivamente, de ácidos caproico, caprílico e cáprico (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). De modo geral, os ácidos monocarboxílicos, de cadeia longa e não ramificada, saturados ou insaturados, são chamados de ácidos graxos, pois são encontrados em óleos e gorduras. O odor da transpiração – o chamado “cheiro de corpo” – é também devido, em parte, aos ácidos carboxílicos. De fato, o suor elimina muitas substâncias orgânicas, decompostas por bactérias existentes em nossa pele em compostos de odor desagradável, como o ácido 3-metil-2- hexenoico (FELTRE, 2004). INTERESSANTE 104 6.2 NOMENCLATURA DOS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS A IUPAC determina que, na nomenclatura dos ácidos carboxílicos, seja iniciada com o termo “ácido” e que seja adicionado o sufixo “oico” na estrutura básica de nomenclatura (prefixo + infixo + sufixo). No entanto, assim como ocorre na nomenclatura de outros compostos orgânicos, os ácidos carboxílicos mais simples possuem nomes comuns, que também são aceitos pela IUPAC (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Para facilitar sua compreensão, a nomenclatura de alguns ácidos carboxílicos é apresentada na Figura 19. FIGURA 19 – NOMENCLATURA DE ALGUNS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS MAIS SIMPLES FONTE: Adaptada de Feltre (2004) FIGURA 20 – EXEMPLOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS IUPAC: Ácido pentanoico Usual: Ácido valérico IUPAC: Ácido decanoico Usual: Ácido cáprico IUPAC: Ácido dodecanoico Usual: Ácido láurico IUPAC: Ácido tetradecanoico Usual: Ácido mirístico IUPAC: Ácido hexadecanoico Usual: Ácido palmítico IUPAC: Ácido octadecanoico Usual: Ácido esteárico IUPAC: Ácido etanoico Usual: Ácido acético IUPAC: Ácido butanoico Usual: Ácido butírico IUPAC: Ácido metanoico Usual: Ácido fórmico Para moléculas mais complexas, devemos usar (prioritariamente) a nomenclatura IUPAC. Quando a molécula apresentar alguma insaturação (dupla ou tripla ligação), ou ramificação, é necessário informar a qual carbono está ligado; para isso, a cadeia principal deverá ser numerada (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). É importante lembrarmos que a cadeia principal sempre contém a maior porção de átomos carbono ligada entre si inclui o grupo funcional (COOH). A numeração dos carbonos inicia a partir do grupo carboxila e prossegue no sentido que se obtenha o(s) menor(es) número(s) para a(s) insaturação(ões) e ramificação(ões). A Figura 20 mostra a nomenclatura de alguns aldeídos. Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Ácido 2,2-dimetil-propanoico 105 Ácido butanodioico Ácido 3-etil-benzoico Ácido 3,3-dimetil-pent-3-enoico FONTE: O autor Como é possível perceber, existe uma ampla variedade de estruturas orgânicas que podem ser classificadas como ácidos carboxílicos. Na Figura 20, foi apresentada uma pequena porção desses compostos, porém, na natureza, os ácidos carboxílicos nem sempre terão estruturas molecularessimples. A seguir, temos mais um exemplo prático da nomenclatura de ácidos carboxílicos. Qual o nome (IUPAC) do ácido carboxílico com a fórmula estrutural da Figura 21? FIGURA 21 – FÓRMULA ESTRUTURAL DE UM ÁCIDO CARBOXÍLICO FONTE: O autor FIGURA 22 – NOMENCLATURA IUPAC DE UM ÁCIDO CARBOXÍLICO COMPLEXO Para facilitar a compreensão, as etapas apresentadas na Figura 22. 106 FONTE: O autor Para compreender todas as etapas descritas nesse exemplo, inicialmente, está representada a identificação da cadeia principal. Ela sempre representará o maior número (n) de átomos de carbono ligados entre si e, na molécula em questão, temos cinco carbonos na cadeia principal (n = 5). A seta azul apresenta uma escolha possível de cadeia principal, porém ela está errada, pois, além do grupo funcional carbonila, é importante perceber que essa molécula contém uma insaturação (ligação dupla). Ambas as informação são importantes para a nomenclatura – assim, a cadeia principal deve conter tanto o grupo funcional quanto a insaturação. Na etapa a seguir, fazemos a numeração dos carbonos da cadeia principal. Observa-se que estão indicadas duas possíveis sequências de numeração, mas sempre optamos pelo caminho onde o grupo funcional permaneça com a menor numeração possível. Nos ácidos carboxílicos, o carbono do grupo funcional sempre terá o número 1. Na etapa posterior, identificamos as ramificações presentes e sinalizamos o número do carbono que estão ligadas. Existem duas ramificações, uma formada por um átomo de carbono (1C = MET mais a terminação IL, radical metil), ligada ao carbono 2, e uma ramificação formada por três átomos de carbono (3C = PROP + IL, radical etil) – como ela está ligada ao seu átomo de carbono central, recebe o prefixo “iso”, por isso temos uma ramificação isopropil ligada ao carbono 3. Por fim, sabendo que a cadeia principal possui cinco átomos de carbono (5C = PENT), com uma ligação dupla entre os carbonos 4 e 5 (infixo “EN”), e que todas os ácidos carboxílicos recebem o termo “ácido” sucedido pela nomenclatura da molécula com a terminação “OICO”, determinamos sua nomenclatura IUPAC: ácido 2-metil-3-isopropil-Pent-4-enoico. Na determinação da cadeia principal, de qualquer composto orgânico, devemos observar três quesitos principais: o maior número de átomos de carbono ligados entre si; a localização do grupo funcional; e a presença de insaturações (ligações duplas e triplas). Assim, toda e qualquer cadeia principal deve conter o grupo funcional e a insaturação, mesmo que, para isso, ela fique como um número menor de carbonos ligados entre si. Além disso, a numeração dos átomos da cadeia principal deve ter como prioridade a menor numeração possível (1º) do grupo funcional, (2º) da insaturação e (3º) da ramificação. DICAS Ácido 2-metil-3-isopropil-Pent-4-enoico 107 7 RESUMO DAS FUNÇÕES OXIGENADAS Para facilitar a compreensão, a Tabela 1 apresenta um resumo das funções orgânicas oxigenadas. TABELA 1 – RESUMO DAS FUNÇÕES ORGÂNICAS OXIGENADAS Funções orgânicas (FO) Grupo funcional (GF) Nomenclatura Observação Álcool Sufixo “OL” (indicar localização OH) Hidroxíla (OH) ligada a um carbono saturado Fenol HIDROXI + localização OH + nome do composto aromático Hidroxíla (OH) ligada a um carbono aromático Éter MENOR hidrocarboneto + terminação “OXI” + MAIOR hidrocarboneto Heteroátomo (oxigênio) inserido no meio da cadeia carbônica, entre dois átomos de carbono C om p os to s ca rb on íli co s Aldeído Prefixo + Infixo + Sufixo “AL” Grupo funcional terminal. Carbonila ligada a um hidrogênio. Cetona Prefixo + Infixo + Sufixo “ONA” (indicar localização GF) Carbonila inserida no meio da cadeia carbônica, entre dois átomos de carbono Ácido carboxílico ÁCIDO + prefixo + infixo + Sufixo “OICO” Grupo funcional terminal. Carbonila ligada a uma hidroxila FONTE: O autor 108 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Para facilitar e padronizar, na classificação dos inúmeros compostos orgânicos existentes, os cientistas criaram as classes funcionais (funções orgânicas) e o conceito de “grupo funcional”, separando as substâncias de acordo com semelhanças estruturais e propriedades químicas. Os grupos funcionais representam o conjunto de átomos característico de cada função orgânica. • Os compostos orgânicos oxigenados representam uma grande família, porém, os mais importantes são: os álcoois, fenóis, éteres, cetonas, aldeídos, ácidos carboxílicos e seus derivados (sais orgânicos, ésteres, anidrido e cloretos de acila). • Os álcoois apresentam o grupo funcional OH (hidroxila), ligado diretamente a um átomo de carbono saturado. • Os álcoois podem ser classificados: de acordo com a cadeia carbônica, em saturados, insaturados, ramificados, cíclicos e aromáticos; de acordo com o número de hidroxilas na cadeia carbônica, em monoálcoois (ou monóis), diálcoois (ou dióis), triálcoois (ou trióis) e polióis; e de acordo com a posição da hidroxila na cadeia carbônica, em primários, secundários, terciários e quaternários. • Segundo a IUPAC, na nomenclatura dos álcoois, deve-se unir o prefixo e o infixo à terminação “OL”. Além disso, quando apresentar insaturações, ramificações e/ou mais de uma localização do seu grupo funcional, as respectivas localizações devem ser informadas. • A denominação fenol deve ser atribuída a todo composto que apresente uma hidroxila (grupo funcional OH) diretamente ligada a um carbono aromático, ou seja, um átomo de carbono pertencente a um anel benzênico. • A denominação éter deve ser atribuída a todo composto que apresente um átomo de oxigênio inserido no meio da cadeia carbônica, ou seja, entre dois átomos de carbono. • De acordo com a IUPAC, a nomenclatura dos éteres é dividida em duas partes: ini- cia-se com a nomenclatura do menor hidrocarboneto acrescido do sufixo “ÓXI” e finaliza-se com a nomenclatura hidrocarboneto maior. Além disso, quando apre- sentar insaturações e ramificações, deve-se informar suas respectivas localizações. • Aldeídos, cetonas e ácidos carboxílicos são compostos que apresentam o grupo carbonila (C=O) em sua estrutura, porém são classificações distintas. 109 RESUMO DO TÓPICO 1 • A denominação aldeído deve ser atribuída a todo composto que apresente uma carbonila ligada a um átomo de hidrogênio; portanto, o grupo funcional –CHO sempre estará em uma das extremidades da cadeia carbônica principal. • De acordo com a IUPAC, na nomenclatura dos aldeídos, deve-se unir o prefixo e o infixo à terminação “AL”. Além disso, as insaturações e as ramificações devem ter suas respectivas localizações informadas; para isso, a numeração da cadeia principal sempre iniciará pelo carbono do próprio grupo funcional. • A denominação cetona deve ser atribuída a todo composto que apresente uma carbonila inserida no meio da cadeia carbônica, ou seja, entre dois átomos de carbono. • De acordo com a IUPAC, na nomenclatura das cetonas, deve-se unir o prefixo e o infixo à terminação “ONA”. As insaturações e ramificações devem ter suas respectivas localizações informadas, de modo que o grupo funcional (as insaturações e, posteriormente, as ramificações) apresente a menor numeração possível. • A denominação ácido carboxílico deve ser atribuída a todo composto que apresente uma carbonila diretamente ligada a uma hidroxila, levando à formação do grupo funcional (terminal) carboxila (–COOH). • De acordo com a IUPAC, na nomenclatura dos ácidos carboxílicos, deve iniciar com o termo “ÁCIDO”, seguido do prefixo, infixo e da terminação “OICO”. As insaturações e ramificações devem ter suas respectivas localizações informadas; para isso, a nume- ração da cadeia principal sempre iniciará pelo carbono do próprio grupo funcional. 110 1 Os compostos orgânicos oxigenados representam uma importante família de substâncias químicas. Para treinar a identificação dessas estruturas moleculares, escreva as fórmulasestruturais para os compostos orgânicos indicados a seguir: a) Ácido 3-etil-hexanoico. b) Ciclo-hexanona. c) Octanol. d) Feniletanal. e) 2-isopropil-5-metil-hidroxibenzeno. 2 Observando a fórmula estrutural dos compostos orgânicos listados a seguir, indique qual deles apresenta um carbono terciário e uma insaturação em sua molécula, e pertence à função álcool. AUTOATIVIDADE 3 Depois do carbono e do hidrogênio, o oxigênio é o elemento químico mais abundante nas estruturas das moléculas orgânicas. Esses átomos ligam-se entre si de diferentes maneiras, formando uma infinidade de cadeias carbônicas. Assim, as funções orgânicas oxigenadas compõem uma grande e diversificada família de composto orgânicos. Com base nas fórmulas estruturais condensadas e na função orgânica a que pertencem, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Ácido carboxílico. II- Álcool. III- Aldeído. IV- Cetona. V- Éter. VI- Fenol. a) ( ) . b) ( ) . d) ( ) . e) ( ) . c) ( ) . 111 ( ) CH3 ─ CH = CH ─ OH. ( ) C6H5 ─ O ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3. ( ) CH3 ─ CH2 ─ COOH. ( ) CH3 ─ CO ─ CH2 ─ CH3. ( ) C6H5 ─ OH. ( ) CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ CHO. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) III – VI – IV – I – II – V. b) ( ) II – V – I – IV – VI – III. c) ( ) I – VI – IV – V – II – III. d) ( ) II – V – I – III – VI – IV. e) ( ) IV – I – V – III – VI – II. 3 A vanilina (cuja fórmula estrutural está reproduzida na figura a seguir), extraída da orquídea Vanilla planifolia, é o principal componente da essência ou do aroma de baunilha. Seu aroma natural é amplamente utilizado na produção de doces e sorvetes. FONTE: O autor Em relação à molécula da vanilina, é correto afirmar que ela possui as funções químicas de: a) ( ) Aldeído, álcool e éter. b) ( ) Álcool, ácido carboxílico e fenol. c) ( ) Cetona, éter e ácido carboxílico. d) ( ) Álcool, éter e éster. e) ( ) Aldeído, éter e fenol. 4 Com base nas estruturas dos compostos orgânicos, analise as sentenças a seguir: 112 A B C D FONTE: O autor I- Quanto ao tipo de cadeia carbônica, C é insaturada, A e D são saturadas e B é aromática. II- Quanto ao tipo de função orgânica, A é uma cetona, B é um álcool, C é um éter e D é um ácido carboxílico. III- De acordo com a IUPAC, o composto A é chamado de butanal. IV- De acordo com a IUPAC, o composto D é chamado de 4-metil-pentanoico. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Somente a sentença I está correta. b) ( ) Somente a sentença II está correta. c) ( ) Somente a sentença III está correta. d) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. e) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas. 5 Os grupos funcionais identificam o conjunto de átomos característico de cada função orgânica. Além disso, eles são utilizados para classificar e agrupar os compostos orgânicos que apresentam similaridades estruturais e propriedades químicas. Considerando os grupos funcionais oxigenados e a função orgânica que representam, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- II- III- IV- V- ( ) Álcool. ( ) Éter. ( ) Aldeído. ( ) Fenol. ( ) Ácido carboxílico. 113 Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – III – II – I – IV. b) ( ) III – V – IV – I – II. c) ( ) III – V – II – IV – V. d) ( ) IV – I – III – V – II. e) ( ) III – IV – II – I – V. 114 115 DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS E FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS 1 INTRODUÇÃO Como visto anteriormente, os compostos orgânicos oxigenados estão amplamen- te inseridos no nosso cotidiano, influenciando não só a biologia (vegetal e animal), mas a economia global. Além dos álcoois, fenóis, éteres, aldeídos, cetonas e ácidos carboxílicos, outros compostos orgânicos derivados dos ácidos carboxílicos merecem destaque. Assim como o oxigênio, o nitrogênio é um elemento fundamental para o desenvolvi- mento da vida na Terra. Ao observarmos o ciclo do nitrogênio na natureza, podemos confirmar sua ocorrência no ar, nos vegetais, nos animais, nas bactérias, no solo e nos minerais. Seja na forma de substância simples (gás nitrogênio, N2), compostas (gás dióxido de nitrogênio, NO2) ou em moléculas complexas, como nas bases formadoras do código genético (adeni- na C5H5N5, citosina C4H5N3O, guanina C5H5N5O, e uracila, C4H4N2O2), ratificamos a importân- cia e a versatilidade desse elemento. Em nível celular, os compostos nitrogenados exercem importantes funções biológicas, sendo encontrados em aminoácidos, proteínas, hormônios, enzimas, entre outros componentes essenciais aos seres vivos. Já na esfera econômica, o nitrogênio é facilmente encontrado na indústria química, pois serve de matéria-prima na fa- bricação de corantes, plásticos, fertilizantes, medicamentos, cosméticos e até explosivos. Neste tópico, finalizaremos o estudo dos compostos oxigenados com os deri- vados dos ácidos carboxílicos: sais orgânicos, ésteres, anidridos de ácido e cloretos de acila. Por fim, estudaremos as funções orgânicas nitrogenadas mais simples, porém, mais importantes: aminas, amidas, nitrilas, isonitrilas e nitrocompostos. UNIDADE 2 TÓPICO 2 - 2 DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS Como vimos anteriormente, os ácidos carboxílicos são caracterizados por apresentarem, em sua estrutura molecular, o grupo funcional carboxila (COOH), um grupo terminal formado pela união de uma carbonila (C=O) e uma hidroxila (OH). No entanto, novos compostos podem ser formados a partir desses ácidos, ao reagirem com outras substâncias (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Nessas reações orgânicas, ocorre a substituição de algum elemento presente no grupo funcional, originando os derivados de ácidos carboxílicos (FELTRE, 2004). Por exemplo, quando o hidrogênio (do OH) é substituído por um metal (ou pelo íon amônio, NH4), temos a formação dos sais orgânicos. Quando o hidrogênio (do OH) é substituído por um radical orgânico (alquila ou arila), temos a formação dos ésteres. 116 Quando duas moléculas de ácidos carboxílicos reagem entre si, resultando na eliminação de uma molécula de água, temos a formação de um anidrido de ácido. Já quando a hidroxila (OH) é substituída por um átomo de halogênio, geralmente pelo elemento cloro (Cl), temos a formação dos cloretos de acila (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Esses são os quatro principais derivados dos ácidos carboxílicos e, por ora, nos deteremos a sua (respectiva) nomenclatura. Na Unidade 3, aprofundaremos os conhecimentos sobre cada um desses quatro derivados dos ácidos carboxílicos, quando for abordado o tema de reações orgânicas. ESTUDOS FUTUROS 2.1 NOMENCLATURA DOS SAIS ORGÂNICOS Nas reações químicas entre um ácido e uma base, sempre ocorre a neutralização, com a formação de um sal e água. Nas reações de neutralização em que se tem um ácido carboxílico e uma base inorgânica, o produto da reação será um sal orgânico e água (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). A Figura 23 apresenta o grupo funcional dos sais orgânicos. FIGURA 23 – GRUPO FUNCIONAL SAIS ORGÂNICOS FONTE: O autor A nomenclatura dos sais orgânicos é similar à nomenclatura dos sais inorgânicos. Assim temos a nomenclatura formada pelo nome do ânion (parte orgânica da molécula) seguido pela do cátion (íon metálico) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Para facilitar e padronizar essa nomenclatura desses compostos, a IUPAC estipulou algumas regras oficiais: PREFIXO + INFIXO + OATO DE + Nome do CÁTION Quantos carbonos têm? Qual o tipo de ligação entre os átomos de carbono? Sufixo: terminação característica de sais orgânicos Qual elemento metálico? 117 FONTE: O autor Para entendermos melhor, a Figura 24 mostra a nomenclatura de alguns sais orgânicos. FIGURA 24 – EXEMPLOS DE SAIS ORGÂNICOS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS Fórmula estrutural do composto e Nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Etanoato de cálcio Propanoato de sódio Metanoato de alumínio Pent-3-enoato de potássio 2-metil-propanoato desódio 2.2 NOMENCLATURA DOS ÉSTERES Os compostos orgânicos denominados de ésteres são formados através da substituição do hidrogênio da hidroxila (OH) de um ácido carboxílico por algum radical orgânico alquila (R) ou arila (Ar), ou seja, podem ser aromáticos ou não (FELTRE, 2004). A Figura 25 apresenta o grupo funcional dos ésteres. 118 FIGURA 25 – GRUPO FUNCIONAL ÉSTER FONTE: O autor A IUPAC estabelece que a nomenclatura oficial dos compostos pertencentes a esse grupo deve seguir a seguinte regra: Nome do ácido – ICO + ATO Nome do radical (final) + A Qual o nome do ácido carboxílico “precursor”? Substituir a terminação “ICO” do ác. carbox. por “ATO” Qual radical está ligada diretamen- te ao oxigênio do grupo funcional? Para melhor compreensão, a Figura 26 apresenta a nomenclatura de alguns ésteres. FIGURA 26 – EXEMPLOS DE ÉSTERES E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS Fórmula estrutural do composto e Nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Etanoato de etila Acetato de etila Etanoato de fenila Acetato de fenila 2-metil-butanoato de etila Benzenoato de isopropila 119 2,2-dimetil-prop-3-enoato de etila 2-metil-propanoato de isobutila FONTE: O autor Alguns produtos alimentícios apresentam em seus rótulos a informação de que contêm flavorizantes, substâncias que são responsáveis pelo sabor e pelo aroma característico, ou seja, o flavor. Existe uma infinidade de compostos orgânicos empregados como flavorizantes naturais e sintéticos. Entre os flavorizantes sintéticos, destacam-se os pertencentes ao grupo dos ésteres. Vários aromas de frutas podem ser razoavelmente imitados com baixos custos, usando-se um ou, no máximo, dois desses compostos (CANTO; PERUZZO, 2006). INTERESSANTE 2.3 NOMENCLATURA DOS ANIDRIDOS Os anidridos de ácidos carboxílicos são compostos orgânicos formados a partir da reação química de desidratação (eliminação de molécula de água) entre dois ácidos carboxílicos iguais ou diferentes, de modo que, para determinar sua nomenclatura, é necessário conhecer a nomenclatura de cada um dos dois ácidos carboxílicos que deram origem ao composto (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). A Figura 27 apresenta o grupo funcional dos anidridos. FIGURA 27 – GRUPO FUNCIONAL ANIDRIDO FONTE: O autor 120 Assim como a estrutura química dos anidridos está diretamente relacionada com as dos dois ácidos que o originam, o nome de cada um desses ácidos (precursores) é utilizado na nomenclatura dos anidridos. A IUPAC estabelece que a nomenclatura oficial dos compostos pertencentes a esse grupo deve seguir a regra: ANIDRIDO + nome dos ácidos carboxílicos precursores Os nomes devem ser separados por hífen e em ordem alfabética Desse modo, a Figura 28 mostra como exemplos a nomenclatura de alguns anidridos. FIGURA 28 – EXEMPLOS DE ÉSTERES E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Anidrido propanoico Anidrido etanoico-pentanoico Anidrido isobutanoico-butanoico FONTE: O autor 2.4 NOMENCLATURA DOS CLORETOS DE ACILA Os cloretos de ácido, também chamados de cloreto de acila, são originados através da reação química entre um ácido carboxílico e um haleto orgânico (contendo o átomo de cloro); assim, ocorrerá a troca do grupo carboxila do ácido pelo cloreto presente no haleto, levando à formação do cloreto de ácido (correspondente), e em uma molécula de álcool (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Dessa forma, todo cloreto de acila apresenta o grupo funcional mostrado na Figura 29. 121 FIGURA 29 – GRUPO FUNCIONAL CLORETO DE ACILA FONTE: O autor FIGURA 30 – EXEMPLOS DE CLORETOS DE ACILA E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS FONTE: O autor A IUPAC estabelece que a nomenclatura oficial dos cloretos de acila deve seguir como regra: CLORETO DE + PREFIXO + INFIXO + OÍLA Quantos carbonos têm? Qual o tipo de ligação entre os átomos de carbono? Sufixo: terminação característica dos cloretos de acila Assim, podemos observar a nomenclatura de alguns cloretos de acila na Figura 30. Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Cloreto de propanoíla Cloreto de 2-metil-but-2-noíla Cloreto de benzoíla 2.5 RESUMO DA NOMENCLATURA DOS DERIVADOS DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS Para facilitar a compreensão, a Tabela 2 apresenta um resumo das funções derivadas dos ácidos carboxílicos. 122 TABELA 2 – RESUMO DAS FUNÇÕES ORGÂNICAS OXIGENADAS Funções orgânicas (FO) Grupo funcional (GF) Nomenclatura Observação D er iv ad os d e ác . c ar b ox íli co s Sais orgânicos Prefixo + infixo + sufixo “OATO DE” + nome do cátion Grupo funcional terminal. Carbonila ligada a um átomo de metal alcalino (ou alcalino terroso). Éster Nome do 1º radical (ligado a carbonila) + sufixo “ATO” + nome do 2º radical + sufixo “ILA” Carbonila inserida no meio da cadeia carbônica ligada a um (hetero)átomo de oxigênio. Anidrido ANIDRIDO + nome dos ácidos carboxílicos precursores União de dois ácidos acéticos com abstração de uma molécula de água Cloreto de acila CLORETO DE + prefixo + infixo + sufixo “OILA” Substituição do OH do GF ác. carboxílico por um cloreto (Cl –) FONTE: O autor 3 FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS As funções nitrogenadas são aquelas que, além do carbono e do hidrogênio, possuem o elemento nitrogênio, embora algumas também possam ter o oxigênio. Os diversos arranjos entre os átomos desses elementos formam os grupos funcionais nitrogenados, originando um conjunto de compostos que apresentam características e propriedades químicas semelhantes (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). Os principais grupos funcionais que contêm o nitrogênio são: aminas, amidas, nitrilas e nitrocompostos. 3.1 AMINAS As aminas são compostos orgânicos derivados da amônia, NH3, através da substituição de seus átomos de hidrogênio por radicais orgânicos alquila (R) ou arila (Ar), os quais podem ser iguais ou diferentes entre si (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). A Figura 31 apresenta o grupo funcional dos sais orgânicos. 123 FIGURA 31 – GRUPO FUNCIONAL AMINA Ou Ou FONTE: O autor FONTE: O autor FIGURA 32 – EXEMPLOS DE AMINAS ALIFÁTICAS E AROMÁTICAS É importante lembrar que grupos alquilas são radicais derivados dos alcanos, enquanto arilas são derivados de um anel aromático; dessa forma, as aminas podem ser classificadas em alifáticas e aromáticas, conforme apresentado na Figura 32. Alifática saturada Alifática insaturada Aromática A amônia, NH3, possui três átomos de hidrogênio em sua constituição, por isso, em função do número de hidrogênios substituídos (por radicais alquila ou arila), podemos classificar as aminas em primárias (R-NH2), secundárias (R1R2NH) e terciárias (R1R2R3N), conforme podemos observar no Quadro 1. QUADRO 1 – CLASSIFICAÇÃO DE AMINAS EM PRIMÁRIAS, SECUNDÁRIAS E TERCIÁRIAS FONTE: O autor Definição Exemplos Aminas primárias são formadas quan- do apenas um dos hidrogênios (do NH3) é substituído por um radical orgânico (R ou Ar). Aminas secundárias são formadas quan- do dois átomos de hidrogênios, do NH3, são substituídos por radicais orgânicos, R1 e R2, que podem ser alquila (R) ou arila (Ar). Aminas terciárias são formadas quan- do os três átomos de hidrogênios, do NH3, são substituídos por radicais orgânicos alquila (R1, R2 e R3) ou arila (Ar1, Ar2 e Ar3). 124 3.1.1 A presença das aminas em nossa vida As aminas estão presentes em diversas situações da vida cotidiana, sendo possível encontrá-las na urina de animais (incluindo seres humanos) na forma de ureia. Além disso, os aminoácidos que formam nossas enzimas, proteínas e código genético (DNA e RNA) são formados por compostos contendo nitrogênio. Durante a decomposição de animais, são formadas substâncias que contêm o grupo amino, responsável pelo odor forte e característico, como a putrescina (1,4-diamino-butano) e cadaverina (1,5-diamino-pentano) (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO,2006). Outras aplicações de compostos orgânicos contendo o grupo amino que merecem destaque são: o ácido p-aminobenzoico (PABA), utilizado na produção de protetores solares, e os compostos usados na produção de medicamento, como morfina e fluoxetina. Em particular, as aminas aromáticas são importantíssimas na fabricação de corantes, como a anilina. Além disso, as aminas cíclicas são também muito importantes, pois dão origem a inúmeros compostos heterocíclicos, amplamente encontrados nos vegetais, como os chamados alcaloides, essenciais para o nosso organismo (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Na Figura 33, são apresentadas algumas aminas cíclicas. FIGURA 33 – EXEMPLOS DE AMINAS CÍCLICAS FONTE: Adaptado de Feltre (2004) Pirrol Piridina PiridinaPirrolidina 3.1.2 Nomenclatura das aminas Para nomear os compostos orgânicos com a função amina, de acordo com as regras preconizadas pela IUPAC, primeiramente, devemos atentar para a classificação primária, secundária e terciária, pois a nomenclatura modificará de acordo com os tipos de aminas (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Na nomenclatura das aminas primárias, podemos seguir o esquema básico: PREFIXO + INFIXO + AMINA Quantos carbonos têm? Qual o tipo de ligação entre os átomos de carbono? Sufixo: Terminação característica das Aminas 125 Dessa maneira, a Figura 34 traz exemplos e a respectiva nomenclatura de algumas aminas primárias. FIGURA 34 – NOMENCLATURA DE AMINAS PRIMÁRIAS FONTE: O autor Observa-se que, quando há insaturações ou ramificações na cadeia, é preciso deixar claro no nome suas posições na cadeia carbônica. No entanto, para a nomenclatura das aminas secundárias e terciárias, a regra (IUPAC) é diferente. Nesses casos, deve-se fazer a identificação da cadeia principal e dos radicais ligados exclusivamente ao átomo de nitrogênio. Para isso, consideramos a cadeia principal a maior porção de átomos de carbonos ligados entre si, devendo ser numerada para informar a presença de ramificações e insaturações; já a identificação dos radicais ligados ao nitrogênio é representada pela letra “N”, seguida do prefixo e da terminação “IL” (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Para compreendermos melhor, temos um exemplo prático. Qual o nome (IUPAC) da amina secundária com a fórmula estrutural da Figura 35? FIGURA 35 – FÓRMULA ESTRUTURAL DE UMA AMINA SECUNDÁRIA FONTE: O autor 126 FIGURA 36 – NOMENCLATURA IUPAC DE UMA AMINA SECUNDÁRIA FONTE: O autor As etapas para a determinação do nome da amina secundária são apresentadas na Figura 36. N-etil-N-metil-5-metil-hexan-3-amina Para compreender as etapas descritas, precisamos observar que, inicialmente, está representada a identificação da cadeia principal. Ela sempre representará o maior número (n) de átomos de carbono ligados entre si e, na molécula em questão, temos seis carbonos na cadeia principal (n = 6). Em seguida, fazemos a numeração dos carbonos da cadeia principal. Observa-se na Figura 36 uma possível sequência de numeração, mas sempre optamos pelo caminho onde o grupo funcional permaneça com a menor numeração possível. Na sequência, identificamos as ramificações presentes e sinalizamos o número do carbono que estão ligadas. Observa-se que existem uma ramificação na cadeia principal, formada por um átomo de carbono (1C = MET mais a terminação IL, radical metil) que está ligado ao carbono 5 e duas ramificações diretamente ligadas ao nitrogênio do grupo funcional amina, formadas por um e dois carbonos (1C = METIL, 2C = ETIL). Por fim, sabendo que a cadeia principal possui seis átomos de carbono (6C = HEXA), com uma única ramificação na cadeia principal e dois substituintes no grupo funcional, determinamos sua nomenclatura IUPAC: N-etil-N-metil-5-metil-hexan-3-amina. Sempre que a molécula de uma amina apresentar ramificações na cadeia principal e grupos substituintes no grupo funcional, ou seja, radicais aquila ou arila no lugar do átomo de hidrogênio (R─NH2, R1─ NH ─ R2, ou R1R2 ─ N ─ R3), a IUPAC exige que os radicais ligados ao nitrogênio sejam indicados pela letra “N”, seguida do prefixo e a terminação “IL” no início da nomenclatura. DICA 127 3.2 AMIDAS As amidas podem ser facilmente compreendidas como compostos orgânicos derivados dos ácidos carboxílicos, pela substituição da hidroxila (OH) por um grupamento amino (NH2) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Dessa forma, todas as amidas apresentam o grupo funcional mostrado na Figura 37. FIGURA 37 – GRUPO FUNCIONAL AMIDA FIGURA 38 – EXEMPLOS DE AMIDAS ALIFÁTICAS E AROMÁTICAS FONTE: O autor FONTE: O autor Assim, além do grupo ─ CONH2, as amidas possuem um radical orgânico alquila (R) ou arila (Ar), logo, esses compostos podem ser aromáticos ou não. A Figura 38 mostra alguns exemplos de amidas. Alifática Cíclica Aromática Assim como as aninas, as amidas também podem ser classificadas em primárias, secundárias e terciárias, de acordo com o número de carbonilas ligadas diretamente ao nitrogênio da molécula (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Dessa forma, temos: • Amidas primárias – apenas um grupo carbonila ligada ao nitrogênio: (R ─ CO) NH2. • Amidas secundárias – duas carbonilas ligadas ao nitrogênio: (R ─ CO)2 NH. • Amidas terciárias – três grupos carbonila ligadas ao nitrogênio: (R ─ CO)3 N. 3.2.1 A presença das amidas em nossa vida A amida mais importante no cotidiano é a ureia, (NH₂)₂CO, um sólido branco, cristalino, solúvel em água e que constitui um dos produtos finais do metabolismo dos animais, sendo eliminada pela urina. No entanto, sua importância está diretamente associada a sua utilização na agricultura, como fertilizante e na alimentação do gado (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 128 Além disso, as amidas são amplamente utilizadas como estabilizador de explosivos e na produção de resinas e medicamentos. Por exemplo, os barbitúricos são usados em remédios sedativos, principalmente em casos de ansiedade e distúrbios psicológicos (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 3.2.2 Nomenclatura das amidas Segundo as regras preconizadas pela IUPAC, a nomenclatura das amidas primárias segue a regra básica acrescida da terminação “AMIDA”, conforme mostrado a seguir: PREFIXO + INFIXO + AMIDA Quantos carbonos têm? Qual o tipo de ligação entre os átomos de carbono? Sufixo: terminação característica das Amidas Dessa forma, a Figura 39 traz exemplos e a respectiva nomenclatura de algumas amidas primárias. FIGURA 39 – NOMENCLATURA DE AMIDAS PRIMÁRIAS Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Etanamida Prop-2-enamida 2-metil-propanamida 4-fenil-pentanamida FONTE: O autor 129 Assim, quando há insaturações ou ramificações na estrutura molecular, é preciso deixar claras as suas respectivas localizações na nomenclatura. Pode acontecer de um radical orgânico ligar-se diretamente ao átomo de nitrogênio, substituindo um de seus hidrogênios. Nesse caso, dizemos que é uma amida “N substituída” e, por isso, coloca-se a letra “N” antes de informar (numericamente) a localização dos radicais diretamente ligados à cadeia carbônica (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Alguns exemplos de amidas substituídas com suas respectivas nomenclatura são apresentados na Figura 40. FIGURA 40 – NOMENCLATURA DE AMIDAS SUBSTITUÍDAS FONTE: O autor Fórmula estrutural do composto e Nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura N-etil-etanamida N,N-dimetil-prop-2-enamida N-fenil-N-metil-pentanamida 3.3 NITRILAS As nitrilas, também conhecidas como cianetos, são substâncias químicas que apresentam, em sua estrutura molecular, o grupo funcional ─C≡N (ciano). São geradas a partir da substituição do hidrogênio do ácido cianídrico, também chamado de gás cianeto ou ainda cianeto de hidrogênio (HCN), por um radical orgânico alquila (R) ou arila (Ar) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Na Figura 41, podemos observar alguns exemplos desses compostos.130 FIGURA 41 – EXEMPLO DE NITRILAS FONTE: O autor Cíclica AromáticaAlifática 3.3.1 A presença das nitrilas em nossa vida Entre as nitrilas mais importantes, podemos citar o próprio cianeto de hidrogênio, considerado a nitrila de estrutura mais simples e a mais tóxica. Conhecido com ácido cianídrico (ou ainda como ácido prússico, em homenagem a sua descoberta, em 1782, pelo químico Scheele, na Prússia, que o sintetizou a partir do azul da Prússia), é um ácido fraco de fórmula química HCN, líquido em temperatura ambiente, porém, devido ao seu ponto de ebulição muito baixo (26 °C), é extremamente volátil, tornando-se um gás com cheiro característico de amêndoas amargas (FELTRE, 2004; FOGAÇA, 2021). No grupo dos venenos mais letais já descobertos, o ácido cianídrico é um importante membro. Quando disperso em locais pouco ventilados, adere-se facilmente a tudo o que for úmido, mantendo seu efeito danoso por vários dias. Essa característica o tornou uma potente (e trágica) arma química durante a Segunda Guerra Mundial, tendo sido utilizado em câmaras de execução de inúmeros prisioneiros judeus em campos de extermínio na Alemanha nazista. O íon cianeto (CN–), proveniente da ionização do HCN, ao ser inalado, entra rapidamente na corrente sanguínea e estabelece ligações extremamente estáveis com o íon ferro, presente na hemoglobina, impedindo o transporte gasoso (de O2 e CO2), além de ter a capacidade de desativar enzimas responsáveis pelos processos de oxidação (chamadas de oxidases), tornando ineficaz a cadeia de transporte de elétrons, levando ao colapso do sistema e à morte celular (FELTRE, 2004; FOGAÇA, 2021). Apesar disso, o ácido cianídrico é muito utilizado na produção de plásticos, pesticidas, fertilizantes agrícolas e corantes. Na natureza, as nitrilas podem ser facilmente encontradas em sementes de frutas, como pêssego, uva, cereja e maçã, e contêm, em pequenas quantidades, uma nitrila chamada amigdalina, que também está presente em folhas e raízes da mandioca-brava. Além disso, as nitrilas são utilizadas como sistema de defesa de animais – o polidésmido é um animal (cego), decompositor de vegetais, frutas e carnes, que secreta ácido cianídrico como forma de defesa para afastar seus inimigos (FELTRE, 2004; FOGAÇA, 2021). 131 3.3.2 Nomenclatura das nitrilas Segundo as regras preconizadas pela IUPAC, as nitrilas seguem a regra básica de nomenclatura acrescida da terminação “NITRILA”, conforme mostrado a seguir: PREFIXO + INFIXO + NITRILA Quantos carbonos têm? Qual o tipo de ligação entre os átomos de carbono? Sufixo: Terminação característica das nitrilas No entanto, também é aceita uma nomenclatura “usual”, na qual se utiliza o nome do grupo funcional “CIANETO” no início da nomenclatura e considera-se a cadeia carbônica como um radical. Portanto, nessa nomenclatura, finalizamos o nome do composto orgânico com o nome do radical (prefixo que indica a quantidade de carbonos + terminação “ILA”). Para facilitar a compreensão, a Figura 42 traz exemplos de algumas nitrilas e suas respectivas nomenclaturas (IUPAC e usual). FIGURA 42 – NOMENCLATURA DE NITRILAS FONTE: O autor Fórmula estrutural do composto Nomenclatura IUPAC e usual IUPAC: 3-metil-pentanonitrila USUAL: Cianeto de 3-metil-pentanoila IUPAC: 2,2-dimetilpropanonitrila USUAL: Cianeto de terc-butila IUPAC: Isobutanonitrila USUAL: Cianeto de isobutila IUPAC: Benzonitrila USUAL: Cianeto de Benzila 3.4 NITROCOMPOSTOS Os nitrocompostos são substâncias orgânicas originadas através da reação química entre o ácido nitro (HNO3) e um hidrocarboneto; assim, todos os nitrocompostos apresentam o grupo funcional ─NO2 (nitro) como mostra a Figura 43 (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 132 FIGURA 43 – GRUPO FUNCIONAL NITRO FIGURA 44 – EXEMPLOS DE NITROCOMPOSTOS ALIFÁTICOS E AROMÁTICOS FONTE: O autor FONTE: O autor ou ou Observa-se que, além do grupo ─ NO2, os nitrocompostos possuem um radical orgânico alquila (R) ou arila (Ar); assim, esses compostos podem ser aromáticos ou não. A Figura 44 mostra alguns exemplos desses compostos. Alifática Cíclica Aromática Esses compostos podem apresentar mais de um grupo nitro em sua estrutura. 3.4.1 A presença dos nitrocompostos em nossa vida Entre os nitrocompostos existentes, o mais conhecido é o nitrobenzeno, um líquido amarelo, tóxico, insolúvel na água muito utilizado como solvente para substâncias orgânicas. Podemos citar, ainda, a trinitroglicerina (TNG), o 2,4,6-trinitrotolueno (TNT) e o 2,4,6-dinitrotolueno (DNG), compostos aromáticos largamente utilizados como explosivos. Uma curiosidade interessante é que, quanto maior a quantidade de grupamentos NO2, maior é a instabilidade e a reatividade da molécula orgânica, e, como consequência, mais explosiva ela será (FELTRE, 2004). 3.4.2 Nomenclatura dos nitrocompostos Segundo as regras preconizadas pela IUPAC, a nomenclatura dos nitrocompostos deve iniciar com o termo “NITRO”, seguido do nome correspondente ao grupo orgânico alifático (R) ou aromático (Ar) correspondente, conforme mostrado a seguir: 133 NITRO + Nome do grupo orgânico R ou Ar Regra básica: prefixo + infixo + sufixo “o” Para entendermos melhor, a Figura 45 traz exemplos e a respectiva nomenclatura de algumas amidas primárias. FIGURA 45 – NOMENCLATURA IUPAC DE NITROCOMPOSTOS Etapas para nomenclatura Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Nitropropano 2-metil-2-nitrobut-3-eno 2-metil-1,3,5-trinitrobenzeno ou 2,4,6-trinitrotolueno (TNT) 2-metil-1,3-dinitrobenzeno ou 1,3-dinitrotolueno (DNT) FONTE: O autor Quando há insaturações ou ramificações na estrutura molecular, é preciso deixar claras as suas respectivas localizações na nomenclatura (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 134 3.5 RESUMO DAS FUNÇÕES ORGÂNICAS NITROGENADAS Para facilitar a compreensão, a Tabela 3 apresenta um resumo das funções orgânicas nitrogenadas. TABELA 3 – RESUMO DAS FUNÇÕES ORGÂNICAS OXIGENADAS Funções orgânicas (FO) Grupo funcional (GF) Nomenclatura Observação Aminas Prefixo + infixo + terminação “AMINA” Ramificadas: nomenclatura inicia pelas ramificações da cadeia principal (indicadas por números), os substituintes do H do grupo funcional são indicados pela letra “N” Grupo funcional derivado da amônia NH3 Podem formar aminas 1ª, 2ª e 3ª Amidas Prefixo + infixo + terminação “AMIDA” Ramificadas: nomenclatura inicia pelas ramificações da cadeia principal (indicadas por números), os substituintes do H do grupo funcional são indicados pela letra “N”. Grupo funcional derivado dos ácidos carboxílicos, pela substituição da hidroxila (OH) por um grupamento amino (NH2). Pode formar amidas 1ª, 2ª e 3ª Nitrilas Prefixo + infixo + terminação “NITRILA” Grupo funcional ciano (C≡N) é gerado a partir do ácido cianídrico (HCN) Nitrocompostos Termo “NITRO” + prefixo + infixo + sufixo “O” Grupo funcional nitro (NO2) é originado através da reação química entre o ácido nitro (HNO3) e um hidrocarboneto. FONTE: O autor 135 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Sais orgânicos, ésteres, anidridos e cloretos de acila são compostos derivados dos ácidos carboxílicos; assim, apresentam, em sua estrutura, o grupo funcional carboxila com algumas modificações e, geralmente, há a substituição do átomo de hidrogênio da hidroxila. • A denominação sal orgânico deve ser atribuída a todo composto que apresente uma carboxila, cujo hidrogênio da hidroxila (OH) foi substituído pelo átomo de um elemento metálico; assim, esse grupo funcional sempre estará em uma das extremidades da molécula. • De acordo com a IUPAC, na nomenclatura dos sais orgânicos, deve-se adicionar ao prefixo e ao infixo a terminação “OATO DE”, informando o nome do elemento metálico (cátion) presente na estrutura. As insaturações e as ramificações devem ter suas respectivas localizações informadas; para isso, a numeração dacadeia principal sempre iniciará pelo carbono do próprio grupo funcional. • A denominação éster deve ser atribuída a todo composto que apresente uma carboxila, cujo hidrogênio da hidroxila (OH) foi substituído por um radical alquila ou arila; assim, esse grupo funcional sempre estará no meio da molécula. • De acordo com a IUPAC, a nomenclatura dos éteres é dividida em duas partes: inicia-se com a nomenclatura do radical diretamente ligado à carbonila (C=O), acrescida da terminação “ATO”, finalizando com a nomenclatura do radical ligado ao átomo de oxigênio, acrescido da terminação “ILA”. Além disso, quando apresentar insaturações e ramificações, deve-se informar suas respectivas localizações. • A denominação anidrido deve ser atribuída a todo composto que apresente duas carboxilas unidas entre si. Esses compostos são gerados através de reações químicas específicas, nas quais dois ácidos carboxílicos se unem, levando à formação do anidrido correspondente e água. • De acordo com a IUPAC, a nomenclatura dos anidridos deve iniciar com o termo “ANIDRIDO”, seguido do nome dos ácidos carboxílicos precursores. • A denominação cloreto de acila deve ser atribuída a todo composto que apresente uma carboxila, cujo hidrogênio da hidroxila (OH) foi substituído por um cloreto (Cl –); assim, esse grupo funcional sempre estará na extremidade da molécula; 136 • De acordo com a IUPAC, a nomenclatura dos cloretos de acila deve iniciar com o termo “CLORETO DE”, seguido por prefixo e infixo e a terminação “OILA”. As insaturações e as ramificações devem ter suas respectivas localizações informadas; para isso, a numeração da cadeia principal sempre iniciará pelo carbono do próprio grupo funcional. • Aminas, amida, nitrilas e nitrocompostos são substâncias químicas nitrogenadas com ampla utilização no cotidiano. Em nível celular, os compostos nitrogenados exercem importantes funções biológicas, sendo encontrados em aminoácidos, pro- teínas, hormônios, enzimas, entre outros componentes essenciais aos seres vivos. Já na esfera econômica, o nitrogênio é facilmente encontrado na indústria química, pois serve de matéria-prima na fabricação de corantes, plásticos, fertilizantes, me- dicamentos, cosméticos e até explosivos. • A denominação amina deve ser atribuída a todo composto que apresente o grupo amino (NH2), derivado da amônia (NH3). Em função do número de hidrogênios substituídos, as aminas podem ser primárias, secundárias ou terciárias. • De acordo com a IUPAC, a nomenclatura das aminas segue a regra básica “prefixo + infixo”, seguidos pela terminação “AMINA”. Quando apresentam ramificações, a nomenclatura deverá iniciar pelas ramificações presentes na cadeia principal (indicadas por números), seguidas dos substituintes do H do grupo funcional, que deverão ser indicados pela letra “N”. • A denominação amida deve ser atribuída a todo composto que contém um grupo carbonila imediatamente ligado a um grupo amino (NH2). Esse grupo funcional é derivado dos ácidos carboxílicos, pela substituição da hidroxila (OH) por um grupamento amino (NH2). Em função do número de hidrogênios substituídos, as aminas podem ser primárias, secundárias ou terciárias. • De acordo com a IUPAC, a nomenclatura das aminas segue a regra básica “prefixo + infixo”, seguidos pela terminação “AMIDA”. Quando apresentam ramificações, a nomenclatura deverá iniciar pelas ramificações presentes na cadeia principal (indicadas por números), seguida dos substituintes do H do grupo funcional, que deverão ser indicados pela letra “N”. • As nitrilas são substâncias que possuem o grupo ciano (C≡N) em sua estrutura molecular. De acordo com a IUPAC, sua nomenclatura segue a regra básica: “prefixo + infixo”, seguidos pela terminação “NITRILA”. • Os nitrocompostos são substâncias que possuem o grupo nitro (NO2) em sua estrutura molecular. De acordo com a IUPAC, sua nomenclatura é originada adicionando-se o termo “NITRO”, seguido do prefixo + infixo + sufixo “O”. 137 1 Tanto os compostos orgânicos oxigenados quanto os nitrogenados estão amplamente inseridos no nosso cotidiano. Para treinar a identificação dessas estruturas moleculares, escreva as fórmulas estruturais para os compostos orgânicos indicados a seguir: a) Benzoato de potássio. b) Hex-2-en-3-amina. c) Benzonitrila. d) N-etil-2,N-dimetilpropan-1-amina. e) Propanoato de isobutila. f) 4-etil-3-metil-2-nitro-hept-5-eno. g) N-metilpropanamida. h) Benzoato de metila. 2 Composto trinitrotolueno (TNT), também chamado de 2-metil-1,3,5-trinitrobenzeno, é um explosivo usado para fins militares e em demolições. Na sua forma refinada, o trinitrotolueno é completamente estável, e, ao contrário da nitroglicerina, é relativamente insensível à fricção, ao impacto ou à agitação, o que reduz os riscos de detonação acidental. Ademais, não reage com os metais nem absorve água, sendo muito estável e podendo ser armazenado por longos períodos, ao contrário da dinamite. Sobre a estrutura molecular desse composto, o número de átomos de nitrogênio, hidrogênio e oxigênio por molécula é: a) ( ) 3 átomos de nitrogênio, 5 átomos de hidrogênio e 9 átomos de oxigênio. b) ( ) 3 átomos de nitrogênio, 5 átomos de hidrogênio e 6 átomos de oxigênio. c) ( ) 3 átomos de nitrogênio, 7 átomos de hidrogênio e 6 átomos de oxigênio. d) ( ) 3 átomos de nitrogênio, 9 átomos de hidrogênio e 6 átomos de oxigênio. e) ( ) 3 átomos de nitrogênio, 6 átomos de hidrogênio e 7 átomos de oxigênio. 3 Os grupos funcionais são utilizados para classificar e agrupar os compostos orgânicos. Segundo os diferentes tipos de grupos funcionais e a função orgânica representam, associe os itens, utilizando o código a seguir: AUTOATIVIDADE I- II- III- IV- V- 138 ( ) Sal orgânico. ( ) Nitrila. ( ) Éster. ( ) Amida. ( ) Anidrido. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) IV – III – II – I – V. b) ( ) III – V – IV – I – II. c) ( ) III – V – II – IV – V. d) ( ) IV – III – V – I – II. e) ( ) III – IV – II – I – V. 4 Entre as inúmeras substâncias químicas que têm a capacidade de gerar o sabor doce ao paladar humano está o aspartame, estrutura representada a seguir. Pequenas quantidades dessa substância são suficientes para causar a doçura aos alimentos preparados, já que é cerca de 200 vezes mais doce que a sacarose. FONTE: O autor As funções orgânicas presentes na molécula desse adoçante são apenas: a) ( ) Aldeído, amida, amina e ácido carboxílico. b) ( ) Éter, amida, amina e ácido carboxílico. c) ( ) Éster, amida, amina e ácido carboxílico. d) ( ) Éster, amina, cetona e álcool. e) ( ) Éter, amida, amina e cetona. 5 Analisando as estruturas dos compostos orgânicos a seguir e as classificações corretas em relação as suas características, analise as sentenças a seguir: 139 FONTE: O autor I- Quanto ao tipo de cadeia carbônica, C é insaturada, A e B são saturadas e D é aromática. II- Quanto ao tipo de função orgânica, o composto orgânico A é classificado como um éster, B um cloreto de acila, C uma amida e D uma amina. III- De acordo com a IUPAC, o composto A é chamado de propanoato de butila. IV- De acordo com a IUPAC, o composto C é chamado de 5,6-dimetil-hept-3-en-2-amida. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A sentença I está correta. b) ( ) A sentença II está correta. c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. d) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. e) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. 140 141 TÓPICO 3 - HALETOS ORGÂNICOS E COMPOSTOS SULFURADOS 1 INTRODUÇÃO Por muito tempo, a alegria e o entusiasmo do nascimento de uma criança traziam, ao ato do parto, muita dor e sofrimento. Até início do século XIX, não importava a condição social, toda mulher que desejava dar à luz experimentava as dores do parto. A rainha Victoria (1819-1901), da Inglaterra, teve nove filhos – uma tortura para ela que achava a gestação insuportável, se sentia parecida com “uma vaca”, temia o partoe achava os recém-nascidos feios. Todavia, no parto de seus dois últimos herdeiros, ela conquistou um feito histórico para a medicina ao fazer uso de uma técnica revolucionária (para a época): o uso de anestesia com clorofórmio, que tirou das mulheres a torturante dor do parto. Esse haleto orgânico, usado pelo médico John Snow e sua equipe para o parto dos caçulas Leopold (1853) e Beatrice (1857), foi considerado um avanço da medicina. Em 1920, já era utilizado em 90% dos partos em países de língua inglesa e alemã (terra natal de seu marido, príncipe Albert) (HIBBERT, 2000; CORDEIRO, 2010; MEDEIROS, 2017). O clorofórmio era aplicado quando a gestante já estava em trabalho de parto; embebecia-se um tecido que era inalado para, assim, chegar ao sistema nervoso central, diminuindo a sensibilidade do corpo às dores. Neste tópico, estudaremos detalhadamente os haletos orgânicos. Além disso, é importante lembrar que, na tabela periódica, os elementos situados em uma mesma coluna têm propriedades químicas semelhantes e, dessa forma, são capazes de formar compostos químicos também semelhantes. Se observarmos a posição do elemento oxigênio (família 16 ou 6A), logo abaixo dele, vemos o elemento enxofre (S); então, é de se esperar que o enxofre tenha habilidade para formar inúmeros compostos orgânicos, tal qual o oxigênio. As funções sulfuradas são (muito) semelhantes aos grupos oxigenados (como álcool, fenóis, éter, cetona... Ésteres, entre outros), diferenciando-se unicamente pela substituição do átomo de oxigênio por um enxofre e a inclusão do termo “TIOL” na nomenclatura correspondente. Neste tópico, estudaremos detalhadamente os compostos sulfurados mais simples (tioálcoois e tioéteres). Desse modo, terminaremos a apresentação das principais funções orgânicas e como os compostos orgânicos são nomeados, segundo a IUPAC. Esse conhecimento será muito útil no estudo de propriedades físicas, isomeria e reações químicas dos compostos orgânicos – temas a serem abordados na Unidade 3. UNIDADE 2 142 2 HALETOS ORGÂNICOS Os haletos orgânicos são substâncias derivadas dos hidrocarbonetos pela troca de um ou mais átomos de hidrogênio (H) por átomos de halogênios (elementos da família 17, ou VII A, da tabela periódica) (SOLOMONS, 2002; MCMURRY, 2005). De modo geral, todo haleto orgânico é facilmente identificado, devido à presença do grupo funcional mostrado na Figura 46. FIGURA 46 – GRUPO FUNCIONAL HALETO ORGÂNICO FONTE: O autor Observa-se que esses compostos podem ser alifáticos (R), de cadeia aberta ou fechada, ou aromáticos (Ar). Além disso, os halogênios são (genericamente) representa- dos pela letra X. Apesar de o astato (At) pertencer a família dos halogênios, seu isótopo mais estável tem poucas horas de existência (tempo de meia-vida de pouco mais de 8 horas), dificultando sua utilização, por isso, os haletos orgânicos são frequentemente encontrados com os elementos flúor (F), cloro (Cl), bromo (Br) e iodo (I). Os haletos orgânicos podem ser classificados seguindo alguns critérios, como: • Quanto ao tipo de cadeia carbônica: o Alquila: - Saturado: formado única e exclusivamente por átomos de carbono com hibridização Sp3, ou seja, o halogênio está ligado diretamente a um átomo de carbono que fazem somente ligações simples. - Insaturado: quando apresentar ao menos uma ligação dupla ou tripla entre os átomos de carbono. - Cíclico: quando a cadeia carbônica apresentar uma estrutura cíclica. - Ramificado: quando a cadeia carbônica apresentar ao menos um átomo de carbono terciário ou quaternário. o Arila: - Aromático: quando o halogênio está diretamente ligado a um átomo de carbono pertencente a um anel aromático. • Quanto ao tipo de carbono a que o haleto está ligado: o Primário: diretamente ligado a um carbono primário. o Secundário: diretamente ligado a um carbono secundário. o Terciário: diretamente ligado a um carbono terciário. o Quaternário: diretamente ligado a um carbono quaternário. • Quanto ao número de halogênios ligados à cadeia carbônica: o Mono-haletos: há somente um átomo de halogênio na estrutura. o Di-haletos: há dois átomos de halogênio na estrutura. o Tri-haletos: há três átomos de halogênio na estrutura. 143 • Quanto ao tipo de halogênio presente na molécula: o Fluoretos orgânicos: quando apresentar um ou mais átomo de flúor (F). o Cloretos orgânicos: quando apresentar um ou mais átomo de cloro (Cl). o Brometos orgânicos: quando apresentar um ou mais átomo de bromo (Br). o Iodetos orgânicos: quando apresentar um ou mais átomo de iodo (I). o Mistos: quando houver mais de um tipo de halogênio. 2.1 A PRESENÇA DOS HALETOS ORGÂNICOS EM NOSSA VIDA Apesar da elevada toxicidade, os haletos orgânicos são corriqueiramente encontrados na vida diária. Entre os vários produtos (comerciais) existentes, podemos destacar o solvente tetracloreto de carbono (CCl4), os plásticos como o PVC (...─ CH2 ─ CHCl ─ ...)n e o teflon (...─ CF2 ─ CF2 ─ ...)n, os gases utilizados para refrigeração, como os fréons (CCl3F e CCl2F2) e, até mesmo, anestésicos (halotano, CF3 ─ CHBrCl) e medicamentos (cloromicetina, C11H12O5N2Cl2) (FELTRE, 2004). Por muito tempo, os haletos orgânicos foram amplamente utilizados, porém, com o desenvolvimento das pesquisas científicas e a crescente preocupação com o meio ambiente e com a saúde humana, muitas de suas aplicações foram abandonadas (FELTRE, 2004). A título de curiosidade e informação, destacaremos alguns desses produtos, como: • O clorofórmio, ou triclorometano (CHCl3), começou a ser usado como anestésico na Inglaterra, em 1847, mas, em virtude dos graves efeitos nos pacientes, foi gradativamente abandonado, devido a sua toxicidade. A droga conhecida como lança-perfume também contém clorofórmio. O uso frequente dessa substância psicoativa pode provocar lesões em fígado, medula óssea e rins, déficit de memória, arritmia e até infarto (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). • Os clorofluorcarbonetos (CFCs), também conhecidos como fréons, são formados pela substituição de átomos de hidrogênio, presente na molécula do metano ou etano, por átomos de cloro e flúor. Os principais CFCs são CCl3F (nome comercial CFC-11), CCl2F2 (CFC-12), CClF2CClF2 (CFC-114) e CClF2CF3 (CFC-115). Esses haletos orgânicos foram introduzidos na década de 1930, como gases de refrigeração e, na década de 1960, como propelentes para aerossóis de perfumes e inseticidas. Posteriormente, verificou-se que os CFCs lançados na atmosfera contribuem diretamente para a destruição da camada de ozônio (camada de proteção da terra), o que levou vários acordos internacionais a determinar a redução progressiva de sua produção e utilização (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). • O dicloro-difenil-tricloroetano, inseticida conhecido como DDT (C14H9Cl5), foi utilizado como arma química durante a Segunda Guerra Mundial, amplamente utilizado no combate a pernilongos transmissores de dengue e malária. No entanto, descobriu-se que o DDT é altamente prejudicial ao meio ambiente, acumulando-se em tecidos gordurosos dos organismos humanos e dos animais (como o fígado), e que aumenta as chances de desenvolver diferentes tipos de câncer (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 144 2.2 NOMENCLATURA DOS HALETOS ORGÂNICOS A nomenclatura oficial do haletos orgânico segue as regras preconizadas pela IUPAC, a qual considera o halogênio (presente na molécula) apenas como uma ramificação diretamente ligada à cadeia principal (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Assim, a nomenclatura oficial dos haletos de alquila e arila deve seguir a estrutura: __________________ + nome do halogênio + __________________ Quantidade de HALOGÊNIO (mono, di, tri...) Nome do HIDROCARBONETO Prefixo + infixo + sufixo “O” Para facilitar a compreensão, a Figura 47 mostra a nomenclatura oficial de alguns haletos orgânicos. FIGURA 47 – EXEMPLOS DE HALETOS ORGÂNICOS E SUA RESPECTIVA NOMENCLATURA IUPAC Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclaturaFluoretano 2-clorobutano 2-metil-2,4-dibromobutano 1-cloro-3-flúor-benzeno ou meta-cloro-flúor-benzeno FONTE: O autor 145 Na nomenclatura dos haletos orgânicos, continuam sendo obedecidas as regras gerais de nomenclatura apresentadas para os hidrocarbonetos (ver Unidade 1), ou seja, a cadeia carbônica deve ser sempre a mais longa possível e sua numeração deve seguir a regra dos menores números possíveis, tendo em mente que: • se a cadeia for saturada (somente ligações simples), a numeração dos carbonos deve iniciar na extremidade mais próxima ao halogênio; • se a cadeia for insaturada, a numeração dos carbonos começará o mais próximo da insaturação, e não do halogênio; • se houver uma ramificação, ela terá o mesmo peso que o halogênio no momento da numeração da cadeia. 3 COMPOSTOS SULFURADOS Os compostos sulfurados (do inglês sulphur) são substâncias orgânicas que apresentam em sua estrutura molecular um ou mais átomos de enxofre (S). Originário do grego theion, que significa enxofre, o termo “TIO” é frequentemente associado a esses compostos, daí a origem à nomenclatura tiocompostos (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Ao observamos a posição do enxofre na tabela periódica dos elementos químicos, facilmente identificamos que ele pertence à mesma família que o oxigênio (família 16), já que vem logo abaixo dele, ou seja, ambos possuem propriedades químicas semelhantes levando à formação de compostos semelhantes, como veremos mais adiante. Na natureza, existem inúmeros tiocompostos, como tióis ou tioálcoois, tioéteres tioésteres, tiocetonas e tiofenóis (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Nesse momento, daremos atenção aos mais conhecidos entre eles: tióis e tioétere. Os tióis ou tioálcoois são compostos orgânicos similares aos álcoois, ou seja, compostos que apresentam uma hidroxila (OH) ligada a um carbono saturado (com hibridização Sp3, que realiza quatro ligações simples). De modo muito semelhante, os tióis possuem um átomo de enxofre (S) no lugar do oxigênio (O) da hidroxila, levando à formação do grupo funcional sulfidrila (SH) diretamente ligado a um carbono saturado (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). No Quadro 2, podemos observar alguns exemplos de tioálcool. 146 FONTE: O autor FONTE: O autor QUADRO 3 – ALGUNS EXEMPLOS DE TIOÉTER Os tioéteres são compostos orgânicos similares aos éteres, ou seja, compos- tos que apresentam um átomo de oxigênio (O) inserido no meio da cadeia carbônica principal. De modo muito semelhante, os tioéteres possuem um átomo de enxofre (S) entre dois átomos de carbono (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). No Quadro 3, pode- mos observar alguns exemplos de tioéteres. Fórmula condensada Nomenclatura IUPAC CH3 ─ S ─ CH3 Sulfeto de dimetila CH3 ─ CH2 ─ S ─ CH3 Sulfeto de metiletila CH3 ─ CH2 ─ S ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 Sulfeto de etilpropila Os tioéteres também são conhecidos como sulfetos. Ao serem submetidos a uma oxidação branda, formam compostos chamados de dissulfetos: R — S — S — R, apresentando dois átomos de enxofre (ligados entre si), inseridos entre radicais orgânicos (aquila, R, ou arila, Ar). Esses compostos possuem grande importância biológica, pois a ligação enxofre-enxofre (chamada de ponte de dissulfeto, — S — S —) permite a união e a formação das longas estruturas moleculares de proteínas. ATENÇÃO 3.1 A PRESENÇA DOS COMPOSTOS SULFURADOS EM NOSSA VIDA Os compostos sulfurados estão diariamente presentes em nossa vida, sendo exemplos corriqueiros os aromas de cebola, alho e cebolinha (tempero verde), originados da evaporação de compostos que contêm enxofre. QUADRO 2 – ALGUNS EXEMPLOS DE TIOÁLCOOL Fórmula condensada Nomenclatura IUPAC CH3 ─ SH Metanotiol CH3 ─ CH2 ─ SH Etanotiol CH3 ─ CH2 ─ CH2 ─ SH Propanotiol HS ─ CH2 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 Butanotiol HS ─ CH2 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH2 ─ CH3 Pentanotiol 147 Um tioálcool facilmente encontrado na natureza é o 3-metilbutan-1-tiol, presente no líquido amarelo e malcheiroso que os cangambás (Mephitis mephitis) expelem para se proteger. Outro exemplo de tiol importante é o butan-1-tiol, um composto orgânico adicionado ao gás de cozinha. Na Unidade 1, vimos que o gás de cozinha é fundamentalmente formado pelos hidrocarbonetos butano e propano, que não possuem cheiro. Assim, como medida de prevenção e segurança, a presença do butan-1-tiol faz com que se sinta o cheiro quando há algum vazamento de gás (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Os tióis também são chamados de mercaptanas. Esse termo (originário do latim mercurium captans, que significa “capturador de mercúrio”) é associado aos tióis, pois eles têm a capacidade de reagir com o mercúrio, levando à formação de compostos insolúveis. INTERESSANTE Um tioéter importante é o 2-cloroetilsulfanil-2-cloroetano (Cl ─ CH2 ─ CH2 ─ S ─ CH2 ─ CH2 ─ Cl), mais conhecido como gás mostarda, substância que é extremamente tóxica, podendo causar cegueira, edema pulmonar, lesões na pele e asfixia. Isso acontece porque ele reage com a água presente na umidade do ar ou no organismo e libera HCl. Essas características fizeram do gás de mostarda uma arma química letal, utilizada em guerras. Ele tem esse nome porque possui um cheiro semelhante a alho com mostarda (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 3.2 NOMENCLATURA DE COMPOSTOS SULFURADOS Como todos os compostos orgânicos, os tiocompostos seguem as regras oficiais determinadas pela IUPAC. Desse modo, a nomenclatura de todo composto sulfurado deve conter a estrutura básica: prefixo (número de átomos de carbono na cadeia principal), mais infixo (tipo de ligação entre os átomos de carbono da cadeia principal) e sufixo (função orgânica), como já estudado na Unidade 1. Para a nomenclatura de um tioálcool (tiol), a IUPAC determina a adição do sufixo “TIOL” ao nome do hidrocarboneto ligado à sulfidrila (SH) (SOLOMONS, 2002; FELTRE, 2004). Para facilitar a compreensão, a Figura 48 mostra a nomenclatura de alguns tióis. 148 FIGURA 48 – EXEMPLOS DE TIÓIS E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS FONTE: O autor Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Propan-3-tiol 4,5-dimetil-hexan-3-tiol Ciclohexan-1-tiol Ao determinar a nomenclatura de qualquer composto sulfurado, devemos lembrar que: • A cadeia principal deve ser a mais longa possível, contendo o átomo de carbono (saturado) diretamente ligado a sulfidrila (SH). • Na existência de mais de uma possibilidade para ligação a sulfidrila (SH), na cadeia principal, é necessário indicar sua localização através de sua numeração. • A numeração da cadeia principal (sempre) deve iniciar pela extremidade mais próxima do grupo SH, de modo que ele apresente o menor número possível. • Quando a estrutura apresentar ramificações (indicada pela presença de carbonos terciários e quaternários), a prioridade da menor numeração sempre será d o grupo funcional SH seguido pelas ramificações. • Quando a estrutura apresentar insaturações (ligações duplas ou triplas) e ramificações, a prioridade da menor numeração sempre será do grupo funcional SH, seguido pelas insaturações e ramificações. ATENÇÃO Além de apresentarem estrutura e características químicas semelhantes aos ésteres, a nomenclatura dos tioéteres também é muito similar. De acordo com as regras preconizadas pela IUPAC, na nomenclatura oficial para os tioéteres, deve-se colocar o termo “TIO” intercalado pelo nome dos respectivos radicais (menor e maior) presentes na sua estrutura (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). Assim, temos: __________________ + TIO + __________________ MENOR RADICAL Quantos carbonos tem? MAIOR RADICAL Prefixo + infixo + sufixo “O” Assim, a Figura 49 apresenta exemplos de nomenclatura de alguns tioéteres. 149 FIGURA 49 – EXEMPLOS DE TIOÉTERES E SUAS RESPECTIVAS NOMENCLATURAS FONTE: O autor Fórmula estrutural do composto e nomenclatura IUPAC Etapas para nomenclatura Etil-tioisopropano Propil-tiociclopentano Metil-tiobenzeno Para aprofundar seus conhecimentos sobre os compostossulfurados, sugerimos a leitura dos trabalhos científicos: • Aferição da halitose pela concentração de compostos sulfurados voláteis após métodos de higienização lingual químico e mecânico, escrito por Cerri et al. (2003), disponível em: https://bit.ly/3sW4F9F. • Determinação de compostos sulfurados em amostras de asfalto de petróleo empregando cromatografia líquida com detecção pulso-amperométrica, escrito por Schmidt, disponível em: https://bit.ly/3I7OnRF. DICA 150 COMPOSTOS SULFURADOS NO AROMA DO CAFÉ: ORIGEM E DEGRADAÇÃO Thais M. Uekane Maria Helena M. Rocha-Leão Cláudia M. Rezende 1 Introdução Flavor é uma sensação fisiológica com a contribuição de todos os nossos sentidos, e é especialmente relacionado ao sabor e odor dos alimentos. O flavor é um dos principais fatores determinantes da qualidade dos alimentos e das bebidas, uma vez que as interações das substâncias aromáticas com receptores envolvidos no olfato e paladar geram respostas que podem levar à rejeição ou aceitação desses produtos pelos consumidores. O odor é geralmente designado como aroma, sendo corriqueiramente utilizados como sinônimos. Existem substâncias de várias classes químicas identificadas como flavores, a exemplo das lactonas, ésteres, cetonas, aldeídos, ácidos carboxílicos, álcoois, compostos nitrogenados (como pirazinas, piridinas, pirróis), fenólicos e compostos sulfurados, entre outras. Na área da perfumaria, a descrição do odor é um parâmetro importante (a exemplo de frutal, floral, verde, madeiroso etc.) e com frequência usado para classificar perfumes comerciais. Outros critérios de performance de um odorante (substância capaz de promover respostas olfativas), como limite de percepção (threshold), substantividade, potência, toxicidade e biodegradabilidade são igualmente importantes. Quanto menor o threshold de um composto, maior é sua percepção em pequenas quantidades, o que se reflete na força aromática perante a composição do produto. A substantividade se refere ao comportamento do constituinte aplicado em produtos diversos, como para a pele, cabelo, tecidos, entre outros, a exemplo de sua distribuição ou da quantidade residual remanescente em processos diversos, como a lavanderia, onde aspectos como a lipofilicidade do composto são importantes. A não toxicidade é uma condição essencial para seu uso e a biodegradabilidade deve ser preferencialmente alta. Quanto aos aromas, termo técnico mais usado para aditivos na área alimentícia, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) adota como procedimento para a liberação de uso de aromatizantes em alimentos a informação da estimativa de sua ingestão em um alimento, seu metabolismo e sua toxicidade. São aspectos importantes dos aromas a sua intensidade (potência), pureza, descrição, LEITURA COMPLEMENTAR 151 duração, frequência e, em alguns casos, a ofensividade, parcialmente relacionada ao termo inglês off-flavor. Muitos compostos dão contribuição ao aroma de alimentos na concentração de parte por milhão ou parte por trilhão. O aroma total percebido em um alimento é o conjunto de compostos voláteis que apresentam descrição, intensidade e concentração diferentes. O aroma mais característico de uma matriz pode ser influenciado pela presença de um número limitado de substâncias, a exemplo do café torrado, onde 2-furfuriltiol (1) (FFT), e substâncias do grupo das pirazinas (2) e furanonas (3), são de grande importância. No aroma de vinhos, destacam-se metanotiol (4), dimetil sulfeto (5) (DMS) e sulfeto de hidrogênio (6), em pequenas quantidades; 3-metilbutanal (7), fenilacetaldeído (8), 4-hidroxi-2,5-dimetil- 3(2H)-furanona (9), no cacau torrado; limoneno (10) em cítricos; 1-pmenteno-8-tiol (11) em suco de toranja (grapefruit); 2-metil-3-furfuriltiol (12), 2-furfuriltiol (1), 2-mercapto- 3-pentanona (13) e 3-mercapto-2-pentanona (14) no aroma artificial de carne cozida. Figura 1. Compostos de aroma encontrados em alimentos Uma classe importante de compostos voláteis nos alimentos que contém, em sua estrutura, o elemento enxofre em diferentes estados de oxidação. Os compostos sulfurados podem ser considerados como flavor de qualidade ou off-flavor, dependendo do tipo de alimento e da sua concentração. Em geral, 10% dos compostos voláteis detectados em alimentos e bebidas são sulfurados e seu impacto é notável nos diferentes produtos, incluindo queijos, peixes, frangos, carnes e cogumelos, além de bebidas como vinho, cerveja, café, uísque, entre outras. 152 Os compostos sulfurados encontrados nos alimentos podem ser classificados de acordo com seus grupos funcionais, sendo majoritariamente tióis (R-SH), como 2-furfuriltiol (1) (FFT), metanotiol (4) e 2-metil3-furfutiltiol (12); sulfetos (R-S-R), como dimetil sulfeto (5) (DMS) e dissulfetos (R-S-SR), como o dimetil dissulfeto (15) (DMDS). Podem ser classificados também com base em seu ponto de ebulição, como compostos voláteis leves, cujo ponto de ebulição é menor que 90 °C e como compostos voláteis pesados, acima de 90 °C. Os tiazóis (16), tiofenos (17), tritiolanos, como o 3,3'-dimetil4-oxo-1,2-ditiolano (18), tritianos, como o 1,3,5-tritiano (19) e outros compostos sulfurados heterocíclicos, como o caveofurano (20), representam importantes classes de flavores de alimentos cozidos (Figura 2). A bebida produzida a partir do grão de café torrado e moído, oriundo de arbustos do gênero Coffea (Rubiaceae), é considerada uma das mais populares no mundo. Sua qualidade é caracterizada pelo flavor produzido na torra do grão, etapa crucial na qualidade do café torrado, e é influenciada por fatores desde a origem botânica até a pós-colheita. Figura 2. Compostos sulfurados heterocíclicos encontrados em alimentos O mecanismo de formação do aroma do café torrado é complexo e envolve uma grande variedade de interações entre substâncias e rotas químicas que ocorrem ao longo da torra. Observam-se compostos voláteis de diversas classes químicas, intensidade e concentração diferentes, e mais de 800 constituintes já foram identificados no café torrado. Entre eles, mais de 100 compostos sulfurados já foram observados, destacando-se sulfetos, dissulfetos, tiofenos e tiazóis. Esses compostos apresentam thresholds muito baixos, aromas potentes e característicos, tendendo a dominar o aroma total do produto no qual estão presentes. Uma busca na literatura científica através da base SciFinder®, utilizando como palavras-chave coffee e sulphur aroma, permitiu identificar 46 compostos sulfurados voláteis citados no café torrado. O 2-furfuriltiol (FFT) é frequentemente destacado no aroma do café torrado, devido ao seu odor “torrado, com notas aromáticas de café” e ao baixo limite de detecção. O dimetil dissulfeto (DMDS) melhora significativamente o aroma do café torrado. Tiofenos estão presentes na fração volátil do café torrado, sendo que o tiofeno apresenta um odor adocicado semelhante ao benzeno. 153 A análise de compostos voláteis sulfurados, por sua vez, é um desafio devido à baixa concentração nos alimentos e a reduzida estabilidade química, pois são especialmente sensíveis a oxidação, rearranjo e isomerização sob condições de aquecimento/luz e por efeito da matriz, fornecendo produtos diversos. Com base no levantamento bibliográfico realizado na base de dados SciFinder®, este artigo tem como foco revisar aspectos gerais de constituintes sulfurados presen- tes no café, em especial o 2-furfuriltiol (2-FFT), dimetil sulfeto (DMS), dimetil dissulfeto (DMDS) e tiofeno (TIO), as quatro substâncias mais citadas no aroma do café torrado, incluindo sua formação e degradação. 2 Compostos voláteis no café Através de modelos artificiais elaborados para o estudo do aroma do café arábica torrado, uma mistura de 27 odorantes importantes foi avaliada por painel sensorial, onde foi observado que a omissão de 2-FFT, 4-vinilguaicol, algumas alquil pirazinas, furanonas, acetaldeído, propanal, metil propanal e 2- e 3-metilbutanal impactou o flavor do café torrado. Quanto à contribuição aromática específica destes constituintes, as alquilpirazinas, furanonas, fenóis, 2-FFT, metional e formato de 3-mercapto-3-metilbutila foram considerados os compostos de maior importância olfativa na qualidade da bebida. 2.1 Origem dos principais compostos sulfurados no café As quatro substâncias sulfuradas mais destacadas no aroma do café torrado, que são o 2-FFT, DMS, DMDS e TIO, estão descritas na Tabela 2 com seus dados físico- químicos e aspectos relacionados ao seu odor. A origem dos compostos sulfurados identificados no grão de café torrado e na bebida do café está geralmente relacionada aos mecanismos de degradação direta de aminoácidos sulfurados, como a cisteína (55), cistina (56) e metionina (57); à interação desses aminoácidos com açúcares redutores e intermediários da reação de Maillard; à degradação de Strecker e às interações entre produtos de decomposição intermediários (Figura 3). Estes mecanismos serão discutidos ao longo desta revisão. Figura 3. Aminoácidos sulfurados importantes na reação de Maillard 154 A formação de tiofenos está relacionada à reação entre a cisteína (55) e a ribose (58), à pirólise individual dos aminoácidos e à reação de Strecker. A reação de Strecker é importante na formação de compostos de aroma nos alimentos, onde ocorre a degradação de aminoácidos por compostos dicarbonilados, formados ao longo da reação de Maillard, levando à descarboxilação e desaminação dos aminoácidos e à formação de voláteis sulfurados como metional, tiofenos e ácido sulfídrico. Os dissulfetos são geralmente originados da de-hidrogenação dos furanotióis, tiofenotióis e α-mercaptocetonas presentes no café. Podem ainda ser provenientes da reação da tiamina (60), na forma tiol, com outros dissulfetos, gerando dissulfetos mistos. A cisteína (55), cistina (56) e a tiamina (60) (Figuras 3 e 7) podem ser fonte de sulfeto de hidrogênio (6), capaz de agir como intermediário na degradação da pentose para gerar compostos sulfurados de aroma. A degradação da tiamina (60) em reações tipo Maillard produz compostos já identificados como constituintes de café e carne de frango, como 2-metiltiofeno (42), 2-metilfurano e 4,5-dihidro-2-metiltiofeno. Figura 7. Estrutura da tiamina 3 Degradação dos compostos sulfurados O café torrado precisa ser protegido de influências externas por embalagens apropriadas, fim de manter sua qualidade e consequentemente prolongar a vida de prateleira. O aroma atraente da bebida do café recém preparada não é persistente e, em particular, a intensidade do aroma torrado-sulfurado diminui rapidamente. As principais alterações que ocorrem durante o armazenamento do café torrado são atribuídas à perda de voláteis por evaporação, à degradação de compostos de aroma e à oxidação dos constituintes do óleo de café (como os ácidos graxos), dependendo principalmente da temperatura, umidade e presença de oxigênio. Os compostos sulfurados possuem baixa estabilidade, e pequenas quantidades de oxidantes, metais ou a incidência de luz podem causar perdas significativas dessas substâncias durante as diferentes etapas de processamento. Os processos de extração e isolamento dos compostos sulfurados também podem afetar sua estabilidade. Diversos métodos de extração são empregados como, por exemplo, microextração em fase sólida (MEFS), destilação a vácuo, destilação/extração simultânea, evaporação de aroma assistida por solvente, entre outros. Cuidados devem ser tomados 155 para prevenir a formação de artefatos, especialmente observados como consequência da elevação de temperatura durante a concentração da amostra ou na análise cromatográfica, e neste último caso é recomendado o uso de vidro borossilicato e silanização de sua superfície para desativar os sítios ativos antes da análise cromatográfica por CG. O 2-FFT é o principal composto sulfurado do café estudado com relação à degradação. Observou-se que a concentração de 2-FFT no grão de café torrado é diferente da encontrada na bebida, devido a fatores como a limitada extração com água, às interações com outros compostos da matriz levando ao seu aprisionamento e mais especificamente à formação de ligações covalentes com melanoidinas, ácidos clorogênicos e seus produtos de degradação térmica. A presença de oxigênio atmosférico e peróxido de hidrogênio pode iniciar o processo oxidativo na bebida do café, ambos constituintes comuns na mesma. Juntamente com metais de transição com baixo número de oxidação, como o ferro (II) (observado com frequência em grãos alimentícios) o peróxido de hidrogênio produz o radical hidroxila pela reação de Fenton, capaz de atacar indiscriminadamente diversos metabólitos. O ferro (III) gerado produz outras espécies reativas, conforme apresentado na Figura 10. Na solução de café, uma parte do radical hidroxila é eliminada pela cafeína (62) com a formação de 8-oxocafeína (63) (Figura 11), enquanto outros atacam tióis como o 2-FFT (1), metil sulfeto, 3-metil-2-buteno-1-tiol (44), 2-metil-3-furfuriltiol (12) e formato de 3-metil-3-mercaptobutila, o que leva à alteração do aroma de café. Figura 10. Esquema da reação de Fenton FONTE: Adaptada de UEKANE, T. M.; ROCHA-LEÃO, M. H. M.; REZENDE, C. M. Compostos sulfurados no aroma do café: origem e degradação. Revista Virtual de Química, v. 5, n. 5, p. 891-911, 2013. Disponível em: http://static.sites.sbq.org.br/rvq.sbq.org.br/pdf/v5n5a09.pdf. Acesso em: 29 nov. 2021. 156 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Os haletos orgânicos são substâncias derivadas dos hidrocarbonetos pela troca de um ou mais átomos de hidrogênio (H) por átomos de halogênios (elementos da família 17, ou VII A, da tabela periódica). • A nomenclatura oficial dos haletos orgânico segue as regras preconizadas pela IUPAC, a qual considera o halogênio (presente na molécula) apenas uma ramificação diretamente ligada à cadeia principal. A cadeia carbônica deve ser sempre a mais longa possível e sua numeração deve seguir a regra dos menores números possíveis, lembrando que: se a cadeia for saturada (somente ligações simples), a numeração dos carbonos deve iniciar na extremidade mais próxima ao halogênio; se a cadeia for insaturada, a numeração dos carbonos começará o mais próximo da insaturação, e não do halogênio; se houver uma ramificação, ela terá o mesmo peso que o halogênio no momento da numeração da cadeia. • Os compostos sulfurados (do inglês sulphur) são substâncias orgânicas que apresentam em sua estrutura molecular um ou mais átomos de enxofre (S). Originário do grego theion, que significa enxofre, o termo “TIO” é frequentemente associado a esses compostos, originando a nomenclatura tiocompostos. • Os tióis ou tioálcoois são compostos orgânicos similares aos álcoois, porém, possuem um átomo de enxofre (S) no lugar do oxigênio (O) da hidroxila, levando à formação do grupo funcional sulfidrila (SH) diretamente ligado a um carbono saturado. • Os tioéteres são compostos orgânicos similares aos éteres, porém, possuem um átomo de enxofre (S) inserido no meio da cadeia carbônica, ou seja, está localizado entre dois átomos de carbono da cadeia principal. • Para a nomenclatura de um tioálcool (tiol), a IUPAC, determina a adição do sufixo “TIOL” ao nome do hidrocarboneto ligado a sulfidrila (SH). Já para o tioéter, deve- se colocar o termo “TIO” intercalado pelo nome dos respectivos radicais (menor e maior) presentes na sua estrutura do composto orgânico. 157 1 O gás liquefeito de petróleo (GLP), popularmente conhecido como gás de cozinha, é um produto obtido das frações mais leves do processo de refino do petróleo. Sua constituição é formada pela mistura de diferentes hidrocarbonetos – como propano (C3H8), propeno (C3H6), butano (C4H10) e buteno (C4H8), além de pequenas frações de outros hidrocarbone- tos – e apresenta grande aplicabilidade como combustível, por causa do alto poder calo- rífico,da excelente qualidade de queima, do fácil manuseio e do baixo impacto ambiental, além da facilidade de armazenamento e de transporte. Antes da distribuição comercial, pequenas quantidades de butan-1-tiol já eram adicionadas ao gás de cozinha. Explique, de maneira sucinta, por que os tióis são adicionados na versão comercial do GLP. 2 Considere as estruturas dos hidrocarbonetos apresentadas na figura a seguir: AUTOATIVIDADE FONTE: O autor Com base nessas figuras, assinale as nomenclaturas oficiais CORRETAS: a) ( ) 5-butil-3-meil-hexeno-2-tiol; benzoato de tiofenol. b) ( ) 3,5-dimetil-nonano-2-tiol; pentil-tiobenzeno. c) ( ) 1,2,4-trimetil-octanotiol; benzoato de tiofenol. d) ( ) 3,5-dimetil-octanotiol; pentil-tiobenzeno. e) ( ) 2,3,4-trimetil-heptano-2-tiol; butil-tiobenzeno. 3 Por muito tempo, os haletos orgânicos foram amplamente utilizados, porém, com o desenvolvimento das pesquisas científicas e a crescente preocupação com o meio ambiente e com a saúde humana, muitas de suas aplicações foram abandonadas. Comente sobre o uso e os motivos que levaram à proibição do inseticida dicloro- difenil-tricloroetano (DDT) e do clorofórmio como anestésico. 4 Um exemplo do odor desagradável que os tiocompostos possuem é facilmente percebido pela presença do 3-metilbutan-1-tiol no líquido que o cangambá utiliza como arma de defesa. Sobre a fórmula molecular do 3-metilbutan-1-tiol, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) C4H10S. b) ( ) C5H12S. 158 c) ( ) C4H11OH. d) ( ) C5H10OH. e) ( ) C4H12S. 5 Os haletos orgânicos são muito utilizados como solventes na fabricação de plásticos, inseticidas e gás de refrigeração. Com relação à fórmula estrutural do haleto orgânico e ao nome determinado pela IUPAC, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) H3C ─ CH2 ─ CHBr ─ CH3: 3-bromo-butano. b) ( ) C6H5 ─ CH2 ─ CH2 ─ Br: 1-bromo-2-fenil-etano. c) ( ) CH2 = CH ─ Cl: dicloroeteno. d) ( ) H3C ─ CHF ─ CHCl ─ CHBr ─ CH2 ─ CH3: 2-flúor-3-cloro-4-bromo-hexano. e) ( ) F ─ (C6H5) ─ CH3: 1-fluor-4-metil-fenol. 159 REFERÊNCIAS CANTO, E. L. do; PERUZZO, T. Química na abordagem do cotidiano. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2006. CANTO, E. L. do; PERUZZO, T. Química na abordagem do cotidiano. 5. ed. São Paulo: Moderna, 2009. CERRI, A. et al. Aferição da halitose pela concentração de compostos sulfurados voláteis após métodos de higienização lingual químico e mecânico. Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde/Brazilian Journal of Health Research, v. 5, n. 1, p. 6-12, 2003. Disponível em: https://bit.ly/3sW4F9F. Acesso em: 27 nov. 2021. CORDEIRO, T. O lado frágil da rainha. Aventuras na História, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3I81Okz. Acesso em: 28 nov. 2021. FELTRE, R. Química: Química Orgânica. 6. ed. São Paulo: Moderna, 2004. v. 3. FOGAÇA, J. R. V. Nitrilas ou Cianetos. Brasil Escola, c2021. Disponível em: https:// bit.ly/33DpH4p. Acesso em: 21 nov. 2021. HIBBERT, C. Queen Victoria: A Personal History. Londres: HarperCollins, 2000. HILÁRIO, F. F. Estudo do átomo de carbono (Hibridização), Estrutura de Lewis, Carga formal. Universidade Federal de Ouro Preto, [20--]. Disponível em: https://bit.ly/3I1hJB4. Aces- so em: 12 out. 2021. MCMURRY, J. Química orgânica. Tradução técnica: Ana Flávia Nogueira; Izilda Aparecida Begatin. São Paulo: Pioneira Learning, 2005. v. 1. MEDEIROS, L. John Snow. Oncoanestesia – Serviço de Anestesiologia do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, 2017. Disponível em: https://bit.ly/3LIn6qW. Acesso em: 28 nov. 2021. SCHMIDT, P. Determinação de compostos sulfurados em amostras de asfalto de petróleo empregando cromatografia líquida com detecção pulso- amperométrica. Dissertação (Mestrado em Química) – Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2018. Disponível em: https://repositorio.ufsm.br/ handle/1/15930. Acesso em: 27 nov. 2021. SOLOMONS, T. W. Graham. Química orgânica. Livros técnicos e científicos. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora S.A., 2002. v. 1. v. 2. 160 UEKANE, T. M.; ROCHA-LEÃO, M. H. M.; REZENDE, C. M. Compostos Sulfurados no Aroma do Café: Origem e Degradação. Revista Virtual Química, v. 5, n. 5, p. 891- 911, 2013. Disponível em: http://static.sites.sbq.org.br/rvq.sbq.org.br/pdf/v5n5a09.pdf. Acesso em: 29 nov. 2021. 161 PROPRIEDADES FÍSICAS, ISOMERIA E REAÇÕES QUÍMICAS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS UNIDADE 3 — OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • reconhecer propriedades e interações intra e intermoleculares dos compostos orgânicos; • entender a influência da geometria molecular, da polaridade e das interações intermoleculares sobre as propriedades gerais dos compostos orgânicos; • compreender a formação e a classificação dos isômeros nas diferentes categorias de isomeria plana e espacial; • compreender a existência dos compostos quirais na natureza e os efeitos fisiológicos dos enantiômeros; • identificar os diferentes tipos de reações em química orgânica e saber distinguir quando se trata de uma reação de substituição, adição ou eliminação. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – PROPRIEDADES FÍSICAS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS TÓPICO 2 – REAÇÕES QUÍMICAS EM QUÍMICA ORGÂNICA TÓPICO 3 – ISOMERIA EM QUÍMICA ORGÂNICA Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 162 CONFIRA A TRILHA DA UNIDADE 3! Acesse o QR Code abaixo: 163 TÓPICO 1 — PROPRIEDADES FÍSICAS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Como foi possível perceber anteriormente, as substâncias orgânicas represen- tam um conjunto muito diversificado de compostos químicos, apresentando variações tanto na estrutura e na distribuição dos seus átomos quanto dos elementos químicos presentes nas moléculas, o que lhes garante uma ampla multiplicidade de geometrias espaciais de suas moléculas. É importante notar que a composição e a organização dos elementos químicos presentes na estrutura molecular, além de influenciarem na classificação dos compostos em hidrocarbonetos, álcoois, éteres, aldeídos, cetonas, ácidos carboxílicos, aninas, ami- das, nitrilas, tiocompostos, enfim, das diferentes funções orgânicas existentes, influen- ciarão consideravelmente nas propriedades físicas – como polaridade, ponto de fusão, ponto de ebulição, densidade, solubilidade, entre outras – dos compostos orgânicos. No decorrer de décadas de estudos, os cientistas conseguiram perceber e descrever uma variação lógica e gradativa dessas propriedades físicas, ao longo de cada função e de cada série homóloga dos compostos orgânicos. A compreensão das propriedades físicas descomplica a aplicação das substâncias orgânicas no dia a dia. Por exemplo, na indústria química, é importante saber como os corantes se misturam aos solventes, para fabricar corretamente as várias (formas e cores) tintas; os plásticos se comportam em relação ao calor; os medicamentos transitam em nossos organismos; e assim por diante. Diante disso, neste tópico, estudaremos alguns aspectos gerais sobre a estrutura das moléculas orgânicas, como geometria molecular, polaridade das ligações covalentes, ligações intermoleculares, ligação de hidrogênio, interações dipolo-dipolo permanente e interações dipolo instantâneo-dipolo induzido. Além disso, veremos os diferentes estados físicos dos compostos orgânicos e as propriedades físicas de ponto de fusão e ponto de ebulição. Por fim, abordaremos a solubilidade de compostos orgânicos. 2 ASPECTOS GERAIS SOBRE A ESTRUTURA DAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS Ao olharmos para o passado, facilmente, identificamos que o primeiro passo importante para o esclarecimento da estrutura geométrica das moléculas orgânicas foi dado ainda no século XIX, quando Kekulè, durante seus estudos sobre o carbono, propôs os princípios fundamentaisda química orgânica: carbono é tetravalente, sempre 164 realiza quatro ligações; as quatro valências livres do carbono são iguais, permitindo a realização de múltiplas ligações, pois, ao ligarem-se entre si, os átomos de carbono formam longas e estáveis cadeias. Nesse mesmo período, imaginava-se que as quatro valências do carbono estariam situadas no mesmo plano, ou seja, se fôssemos representar uma das quatro ligações de um átomo de carbono no plano horizontal, as demais também estariam no mesmo plano (unidimensional). Somente em 1874, Le Bel e Van’t Hoff trouxeram a ideia de que, na verdade, o átomo de carbono possui uma geometria tetraédrica, afirmando que o carbono saturado ocuparia a posição central de um tetraedro e suas quatro ligações estariam alinhadas com os vértices desse tetraedro (FELTRE, 2004), conforme demonstrado na Figura 1. FIGURA 1 – REPRESENTAÇÃO TRIDIMENSIONAL DO ÁTOMO DE CARBONO (METANO) Metano “tetraédrico”: o átomo de carbono saturado está inserido na posição central com suas qua- tro ligações alinhadas aos vértices do tetraedro (ligações simples com átomos de hidrogênio). Modelo de cunha e traços é usado para facilitar a criação mental da estrutu- ra molecular; para isso, deve-se empregar a convenção gráfica e imaginar que: ── linha cheia é uma ligação (sa- turada ou insaturada) que está no plano do papel; - – - linha (ou cunha) tracejada é uma ligação saturada que “vai para trás” do plano do papel; cunha cheia é uma ligação saturada que “vem para a frente” do plano do papel. Modelo de pinos e bolas, geral- mente feito de madeira ou de plás- tico, é muito utilizado para facilitar a visualização espacial e tridimen- sional das moléculas. FONTE: Adaptada de Feltre (2004) A partir de então, introduziram o seu pensamento de estruturas tridimensionais, como demonstrado (Figura 1), para a molécula orgânica mais simples, o metano (CH4), em que os átomos de hidrogênio estão distribuídos ao longo dos eixos X, Y e Z do plano cartesiano e o átomo de carbono ocupa a posição central do tetraedro. Nessa geometria, as ligações químicas estão igualmente separadas por um ângulo de 109°28’. 2.1 GEOMETRIA MOLECULAR Hoje, sabemos que poucas moléculas são planas. De fato, somente moléculas muito simples, como as diatômicas (O2, N2, H2, Cl2, HCl, H2O, entre outras), possuem estrutura unidimensional. A maior parte das moléculas é tridimensional. Assim, a ideia do 165 carbono tetraédrico trouxe para química a preocupação com a organização dos átomos no espaço intramolecular, ou seja, com a geometria molecular (FELTRE, 2004). Ao longo dos anos, os cientistas perceberam que a geometria molecular era muito mais do que a simples disposição dos átomos no interior da molécula: essa organização era capaz de influenciar as propriedades físicas e químicas dos compostos orgânicos. A partir disso, surgiram os estudos da estereoquímica, um ramo da química que se dedica à investigação dos fenômenos físicos e químicos influenciados pela estrutura espacial das moléculas – tema que estudaremos detalhadamente no Tópico 2. A disposição dos átomos no interior da molécula está diretamente associada à repulsão entre os elétrons de cada átomo presente na estrutura. De fato, a geometria das moléculas é definida pela estabilidade das ligações existentes entre os seus átomos; assim, a melhor geometria molecular, para qualquer composto orgânico, será aquela em que ocorre a menor repulsão entre seus elétrons, tanto os presentes nas ligações quanto os elétrons livres (não ligantes). Nas espécies diatômicas, como H2, N2, O2, HCl e LiH, existe um único par de elétrons compartilhados, originando a ligação simples que une os átomos de ligação, de modo que há um único arranjo possível para os dois átomos, chamado de geometria linear. Essa mesma geometria, em que os elétrons ligantes e não ligantes ficam o mais longe possível uns dos outros por um ângulo de 180°, também será observada em moléculas triatômicas (com três átomos) ausentes de par de elétrons não ligantes, como é o caso do dissulfeto de carbono, CS2 (S=C=S) (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARD; SCHORE, 2013). 2.1.1 Modelo da repulsão dos pares eletrônicos da camada de valência (VSEPR) A explicação mais simples para a estrutura espacial das moléculas foi descrita pelo método elaborado pelos químicos ingleses Nevil Sidgwick e Herbert Powell, aperfeiçoado e divulgado pelo canadense Ronald Gillespie, que se baseia na teoria da repulsão dos pares eletrônicos da camada de valência (também conhecida pela sigla VSEPR, do inglês valence shell electron pair repulsion), a qual afirma que os pares eletrônicos ligantes (que se ligam aos outros átomos) e os “não ligantes” (pares eletrônicos livres) localizados ao redor do átomo central, se repelem, tendendo a permanecer o mais afastados quanto possível. Todos os pares de elétrons existentes ao redor do átomo central de uma molécula possuem cargas de mesmo sinal (negativo), portanto, se repelem mutuamente. Assim, se houver dois pares de elétrons ao redor do átomo central, eles tenderão a ficar de lados opostos, graças a essa repulsão. Se forem três pares, eles terão as posições dos vértices de um triângulo equilátero imaginário e, se forem quatro, as posições dos vértices de um tetraedro também imaginário. As geometrias moleculares, mais importantes para o tema deste tópico, são mostradas no Quadro 1, em que podemos observar que, para cada caso, são apresentadas algumas peculiaridades, como a quantidade de par de 166 elétrons ligantes (QPL) e não ligantes (QPNL) e o ângulo de ligação. Além disso, temos uma representação genérica da estrutura molecular, em que cada bolinha representa um átomo e cada vareta representa uma ou mais ligações covalentes. QUADRO 1 – GEOMETRIAS MOLECULARES IMPORTANTES NO ESTUDO DA QUÍMICA ORGÂNICA E SUAS PECULIARIDADES Geometria Q PL** Q PNL** Ângulo de ligação Representação genérica Linear 1 -- 180° Linear 2 zero 180° Angular 2 1 < 120° 2 2 < 109,5° Trigonal plana 3 Zero 120° Piramidal 3 1 109,5° Tetraédrica 4 Zero 109°28’ *Q PL: quantidade de par(es) de elétrons ligante; **Q PNL: quantidade de par(es) de elétrons não ligante(s). FONTE: Adaptado de Canto; Peruzzo (2006) As moléculas de água (angular, 104,5°) e de amônia (piramidal, 107°) contêm ângulos de ligação menores, que, na geometria tetraédrica (109°28’), é explicado devido à repulsão entre o par de elétrons não compartilhado e o par de elétrons compartilhado ser mais intensa do que a repulsão entre pares de elétrons compartilhados (CANTO; PERUZZO, 2006). INTERESSANTE Repulsão entre dois pares de elétrons compartilhados < Repulsão entre par de elétrons compartilhado e par de elétrons NÃO compartilhado < Repulsão entre dois pares de elétrons NÃO compartilhados ───── AUMENTO DA INTENSIDADE DE REPULSÃO ────> 167 2.1.2 Geometria dos átomos de carbono Na Unidade 1, vimos que o átomo de carbono é extremamente versátil, conse- guindo existir na hibridização Sp3 (saturado, quatro ligações simples), Sp2 (insaturado, uma ligação dupla) e Sp (insaturado, uma ligação tripla ou duas ligações duplas), tal característica influenciará a geometria molecular, principalmente em moléculas sim- ples que apresentam um único átomo de carbono. Assim, apesar de o carbono satura- do apresentar a geometria molecular tetraédrica, ao realizar ligações duplas ou triplas, pode assumir outras configurações espaciais, como mostra a Figura 2. FIGURA 2 – EXEMPLO DE MOLÉCULAS ORGÂNICAS E SUAS RESPECTIVAS GEOMETRIAS MOLECULARES FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) QUADRO 2 – GEOMETRIAS EXISTENTES PARA O ÁTOMO DE CARBONO Metano (CH4) Tetraédrica Metanal (HCOH) Trigonal plana Cianeto de hidrogênio Linear Dióxido de carbono (CO2) Linear Para moléculas maiores e mais complexas, não se costuma utilizara a geometria molecular, mas, sim, a geometria dos ástomos realizam ligações com dois ou mais outros átomos. Nesse momento, destacamos a geometriados átomos de carbono, uma vez que eles determinarão a existência de carbono quiral e consequente ocorrência de compostos isômeros – os quais analisaremos detalhadamente no Tópico 2. Assim, no estudo da química orgânica, será muito útil saber reconhecer as possíveis geometrias existentes para o átomo de carbono, conforme pode ser observado no Quadro 2. Hibridização Sp3 Carbono saturado (quaternário) Sp2 Carbono insaturado, uma ligação dupla (terciário) Sp2 Carbono insaturado, uma ligação tripla (secundário) Sp Carbono insaturado, duas ligações duplas (secundário) Representação na fórmula estrutural plana 168 Geometria real Tetraédrico Trigonal plano Linear Linear FONTE: Adaptado de Canto; Peruzzo (2006) Ao analisar o Quadro 2, é importante perceber que, quando desenhamos a fórmula estrutural plana de uma molécula, não mostramos necessariamente a geometria real dos átomos de carbono, ela é apenas uma forma simplificada e mais prática para se utilizar no dia a dia. De fato, um carbono quaternário (com hibridização Sp3) tem geometria tetraédrica, um carbono terciário (com hibridização Sp2) tem geometria trigonal plana, já os carbonos secundários (tanto com hibridização Sp2 quanto Sp) têm geometria linear. Será possível representar as ligações químicas de modo tridimensional, porém dese- nhando-as no papel? Para isso, utilizamos o modelo de cunha e traços, que facilita a criação mental das estruturas moleculares; assim, podemos empregar a seguinte convenção gráfica: • linha cheia (──): representa uma ligação (saturada ou insaturada) que está no plano do papel; • linha tracejada (- - -): representa uma ligação saturada que “vai para trás” do plano do papel; • cunha cheia ( ): representa uma ligação saturada que “vem para a frente” do plano do papel. 2.2 POLARIDADE DAS LIGAÇÕES COVALENTES Antes de aprofundar o estudo sobre a polaridade das ligações covalentes, é necessário relembrar o conceito geral de eletronegatividade. Por definição, dizemos que a eletronegatividade representa a capacidade que um átomo (de um elemento qualquer) tem de atrair para si o par eletrônico que ele compartilha com outro átomo em uma ligação covalente. IMPORTANTE Baseando-se em medidas experimentais, o químico estadunidense Linus Pauling criou uma escala para expressar a eletronegatividade, que facilmente conseguimos compreender ao observar um esquema da tabela periódica (Figura 3), sendo importante lembrar que esses valores não têm unidade. 169 FIGURA 3 – VALORES E COMPORTAMENTO DA ELETRONEGATIVIDADE DOS ELEMENTOS QUÍMICOS AO LONGO DA TABELA PERIÓDICA FONTE: Canto; Peruzzo (2006, p. 103) Nos valores informados na Figura 3, podemos observar que, de modo geral, a eletronegatividade aumenta ao longo de um período e de baixo para cima, em um grupo. Assim, é fácil concluir que os halogênios, o oxigênio e o nitrogênio são os elementos mais eletronegativos, com destaque para o flúor, o elemento de maior eletronegatividade (igual a 4,0). A partir desses valores, podemos construir uma fila (em ordem decrescente de eletronegatividade) com alguns dos elementos químicos comumente encontrados no estudo da química orgânica, temos: F (4,0) > O (3,5) > N (3,0) ≈ Cl (3,0) > Br (2,8) > I (2,5) ≈ S (2,5) ≈ C (2,5) > Se (2,4) > P (2,1) ≈ H (2,1) > metais (1,9 – M < 1,0) E como aplicamos esse conceito e esses valores no nosso estudo? Ao imaginarmos uma molécula formada por dois átomos iguais, por exemplo, a molécula do gás hidrogênio (H2), em que há uma única ligação química, do tipo covalente, originada pelo compartilhamento de um par de elétrons, o par eletrônico permanece igualmente distante dos dois átomos de hidrogênio, uma vez que ambos os átomos apresentam o mesmo valor de eletronegatividade, e, assim, exercem a mesma atração sobre o par eletrônico. Dizemos, então, que a ligação H ─ H é apolar (não há diferença de eletronegatividade) e, consequentemente, a molécula H2 é apolar. Entretanto, quando temos uma molécula (covalente) formada por dois átomos diferentes, como o ácido clorídrico (HCl), o elemento químico com maior eletronegatividade atrai (puxa) para si o par eletrônico. Nesse caso, o átomo de cloro exerce maior atração sobre o par eletrônico compartilhado e, por isso, dizemos que a ligação H ─ Cl é polar (há diferença de eletronegatividade), gerando dois polos na molécula e, consequentemente, 170 o ácido clorídrico é polar. A densidade de carga é representada pela letra delta minúscula (δ), acompanhada de um sinal positivo (δ+) para representar o polo positivo e a presença de uma maior densidade de cargas positivas, e de um sinal negativo (δ–), para representar o polo negativo e a maior concentração de cargas negativas. Dessa maneira, a molécula do ácido clorídrico pode ser escrita da seguinte forma: H δ+ ─ Cl δ–, para mostrar que o “lado” da molécula em que está o cloro é mais eletronegativo do que o do hidrogênio ou, ainda, que o “lado” do cloro tem maior densidade eletrônica que o do hidrogênio, pois os orbitais eletrônicos da ligação (H ─ Cl) estão direcionados ao núcleo do átomo de cloro (FELTRE, 2004). É importante saber que a medida da polaridade das ligações químicas e, portanto, de todas as moléculas é feita através do chamado momento dipolar (µ). O momento dipolar (µ) é matematicamente determinado pela multiplicação do valor de carga parcial (δ) pela distância (d) entre os dois extremos de uma ligação. Assim, temos: Medido na unidade debye (D), equivale a: coulomb.metro INTERESSANTE No entanto, o momento dipolar das moléculas é mais bem compreendido ao utilizarmos o vetor momento dipolar ( ), que representa a direção da polarização de uma ligação covalente. Para determiná-lo, é importante saber que: • O vetor momento dipolar ( ) possui a direção de uma reta que une os dois núcleos atômicos da ligação química em questão e sua direção (sempre será) no sentido do polo positivo para o negativo. • As ligações apolares possuem vetor momento de dipolo nulo ( = 0). • Em moléculas com mais de dois átomos, devemos analisar cada ligação química de modo individual, pois elas terão vetores ( ) independentes. Assim, para saber se a molécula é polar ou apolar, devemos somar todos os vetores ( ) existentes na molécula e concluir se são nulos ou não. • A polaridade de uma molécula com mais de dois átomos será expressa pelo vetor momento de dipolo resultante ( ). Quando ele for nulo, a molécula será apolar, do contrário, a molécula será polar. 171 É importante observar que uma molécula com ligações covalentes polares tanto pode ser polar quanto apolar. Tudo dependerá da geometria da molécula e da consequente soma (resultante) de todos os vetores momento dipolar existentes na molécula (FELTRE, 2004). Por exemplo, a molécula de tetracloreto de carbono, CCl4, representada na Figura 4, possui um átomo de carbono quaternário (com hibridização Sp3), assumindo a forma geométrica tetraédrica. Nesse caso, as quatro ligações simples (C ─ Cl) dão origem a quatro vetores ( ) que parte do centro do tetraedro para as extremidades, indo em direção ao elemento mais eletronegativo (Cl = 3,0; C = 2,5). Assim, a soma resultante dos vetores é nula e, consequentemente, a molécula do tetracloreto de carbono é apolar. FIGURA 4 – VETORES MOMENTO DIPOLAR ( ) EXISTENTES NA MOLÉCULA DO TETRACLORETO DE CARBONO (CCl4) FONTE: Adaptada de Feltre (2004) No entanto, bastaria trocar um dos átomos de cloro por um elemento menos eletronegativo, como o de hidrogênio (H = 2,1), para que houvesse a modificação dos vetores ( ). Nesse caso, a nova molécula (CHCl3) apresentaria um momento de dipolo resultante ( ) diferente de zero, originando uma substância polar. Devemos lembrar também que, quando os vetores momento dipolar não se anulam, a molécula é polar. 2.3 INTERAÇÕES INTERMOLECULARES Como vimos anteriormente, os átomos presentes no interior de uma molécula influenciam sua carga elétrica, gerando polos elétricos com cargaparcial positiva (ẟ+) e negativa (ẟ–). Se pararmos para pensar, na natureza, dificilmente, encontramos moléculas isoladas; em geral, elas são encontradas em grandes conjuntos, levando à formação das substâncias nos diferentes estados físicos de agregação da matéria (sólido, líquido e gasoso). 172 Sabendo que as cargas elétricas interagem e se repelem, como as moléculas coexistem num material? Será que elas interagem entre si ou permanecem afastadas umas das outras? GIO Apesar de parecer uma resposta complexa, existem forças de atração entre as moléculas, mantendo-as unidas nos estados sólido e líquido: as chamadas ligações ou forças ou interações intermoleculares, que dependem da estrutura e da polaridade das próprias moléculas. Os três tipos mais importantes, que estudaremos detalhadamente a seguir, são: interações dipolo permanente-dipolo permanente, ligação de hidrogênio e interações dipolo instantâneo-dipolo induzido. 2.3.1 Interações dipolo-dipolo permanente As interações dipolo-dipolo permanente (também chamadas simplesmente de dipolo-dipolo) ocorrem única e exclusivamente entre moléculas polares, ou seja, em moléculas que os elétrons estão distribuídos de forma assimétrica, apresentando uma parte da molécula com maior densidade eletrônica (carga negativa) e uma com déficit de elétrons (maior densidade de carga positiva). No caso de moléculas diatômicas, o elemento mais eletronegativo atrai os elétrons da ligação e força o surgimento de um dipolo elétrico (VOLLHARDT; SCHORE, 2013; CANTO; PERUZZO, 2006). Por exemplo, na molécula do ácido clorídrico (HCl), a maior porção da densidade eletrônica está no átomo de cloro, conforme apresentado na Figura 5. A maior densidade de carga está localizada sobre o átomo de cloro, já que ele possui maior eletronegatividade (H = 2,1; Cl = 3,0); assim, ao “puxar” os elétrons da ligação covalente (H ─ Cl), leva à formação de um polo negativo e um positivo na molécula. A densidade de carga é representada pela letra delta minúscula (δ), acompanhada de um sinal positivo (δ+), para representar o polo positivo e a presença de uma maior densidade de cargas positivas, e de um sinal negativo (δ–), para representar o polo negativo e a maior concentração de cargas negativas. 173 FIGURA 5 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA: DO DIPOLO PERMANENTE DO HCL (A) E DA INTERAÇÃO DIPOLO-DIPOLO PERMANENTE ENTRE SUAS MOLÉCULAS (B) Dipolo permanente da molécula de HCl (maior densidade de carga negativa no cloro ẟ –, devido a sua alta eletronegatividade) A Interação dipolo-dipolo permanente entre molécula de HCl (linha tracejada) B FONTE: <https://bit.ly/36qmJkF>. Acesso em: 8 dez. 2021. Evidentemente, o lado positivo de uma molécula atrai o lado negativo da molécula vizinha, e assim sucessivamente. Essas forças de coesão recebem o nome de interações dipolo-dipolo permanente. Quanto maior for a polaridade da molécula, mais intensas serão essas interações. As interações dipolo permanente possuem força de intensidade média, quando comparada aos demais tipos de interação, são mais intensas que as interações dipolo induzido, mas apresentam menor intensidade que a força da ligação de hidrogênio. ATENÇÃO 2.3.2 Ligação de hidrogênio Ao falar em ligações de hidrogênio, é comum associar sua ocorrência entre mo- léculas de água. De fato, a estrutura e a geometria molecular da água não só possibilitam, como incentivam a formação de pontes de hidrogênio. Essa característica, ainda, traz propriedades únicas à água, como a tensão superficial, que gera uma espécie de película na superfície aquática. Contudo, elas não ocorrem unicamente com a água; outro exem- plo de grande importância para a existência da vida são as moléculas de DNA e RNA, as cadeias de nucleotídeos são ligadas por pontes de hidrogênio. A interação ocorre nas bases nitrogenadas (adenina, timina, guanina, uracila e citosina), que se juntam umas às outras para formar os pares. Nesse caso, o nitrogênio e o oxigênio de uma se ligam ao hi- drogênio da outra. Na Figura 6, estão representados alguns esquemas genéricos de como ocorrem as ligações de hidrogênio em diferentes tipos de substâncias orgânicas. 174 FIGURA 6 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DE LIGAÇÕES DE HIDROGÊNIO (CUNHA TRACEJADA) EM AMINAS PRIMÁRIAS (A), ÁLCOOIS (B) E ÁCIDOS CARBOXÍLICOS (C) A B C FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) A tensão superficial é originada quando as moléculas de água, que estão na superfície dos líquidos, realizam ligações de hidrogênio com moléculas que ficam abaixo e ao lado, sendo atraídas para o interior do líquido, já que não há moléculas acima delas para se ligarem. Essa “película d’água” é tão intensa que permite que alguns insetos caminhem sobre ela, além de exercer papel fundamental para alguns fungos, bactérias, larvas, algas e crustáceos, auxiliando na sua existência na superfície de lagos. INTERESSANTE Na Figura 6, podemos observar que a ligação de hidrogênio é formada quando, em uma molécula, tivermos o hidrogênio ligado a um átomo pequeno e muito eletronegativo (como F, O, N), originando uma grande polarização dessa ligação, o que produzirá no hidrogênio um intenso polo positivo. A “deficiência eletrônica” do hidrogênio o leva a “buscar por equilíbrio”, interagindo com um par de elétrons de outra molécula vizinha, resultando numa interação relativamente intensa entre as moléculas, chamada de ligação de hidrogênio (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Na água (H2O), no fluoreto de hidrogênio (HF) e na amônia (NH3), líquidos ou sólidos, são essas forças que mantêm as moléculas unidas. 2.3.3 Interações dipolos instantâneo-dipolo induzido De acordo com o visto até aqui, facilmente saberíamos dizer que as moléculas apolares são aquelas formadas por átomos que não apresentam diferença de eletro- negatividade e, por isso, não possuem dipolos ou partes com diferentes densidades de carga eletrônica. Ao refletirmos sobre essa afirmação, seria possível perguntar por que as substâncias apolares não são encontradas única e exclusivamente no estado gasoso? Seria óbvio pensar que as substâncias apolares deveriam manter suas molé- culas e seus átomos o mais afastados possível entre si, com o mínimo de interação, uma vez que elas são substâncias eletricamente “neutras”. No entanto, sabemos que isso não é verdade, basta lembrarmos que os hidrocarbonetos que compõem a gasolina são líquidos. Então, como isso é possível? 175 Os hidrocarbonetos, assim como todas as demais substâncias apolares, existem nos estados sólido e líquido, devido às forças de dipolo induzido, também chamado de interação dipolo instantâneo-dipolo induzido. Por exemplo, em um copo contendo gasolina (ou outro hidrocarboneto qualquer), não seria possível dizer quantas moléculas estão presentes no copo, mas podemos afirmar que há algumas centenas delas, pois toda molécula é formada por átomos, os quais são formados por prótons e elétrons em contínuo (e ininterrupto) movimento. Assim, podemos dizer que as moléculas possuem uma “nuvem eletrônica” em constante movimento, mesmo ela sendo neutra (apolar). Quando duas moléculas apolares se aproximam, suas “nuvens eletrônicas” (formadas por elétrons, partículas de carga elétrica negativa) instantaneamente se repelem, provocando o seu afastamento máximo. Nesse exato momento, é gerado um acúmulo de elétrons em uma das extremidades da molécula, levando a uma polarização momentânea da molécula, ou seja, cria-se um dipolo no qual uma região fica parcialmente negativa (δ–, com maior quantidade de elétrons) e a outra fica parcialmente positiva (δ+, com deficiência de elétrons). Essa molécula (momentaneamente) polarizada induz a polarização de suas moléculas vizinhas, e assim sucessivamente (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). A Figura 7 mostra a representação esquemática desse fenômeno. FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DAS INTERAÇÕES DIPOLO INSTANTÂNEO-DIPOLO INDUZIDO FONTE: O autor As interações dipolo instantâneo-dipoloinduzido também são conhecidas como forças dipolo induzido-dipolo induzido, forças de dispersão de London, em homenagem ao físico Fritz Wolfgang London (1900-1954), ou, ainda, como forças de Van Der Waals. É importante saber que elas ocorrem em todas as substâncias, polares ou apolares. Apesar de serem fracas, é o único tipo de interação intermolecular que ocorre entre as moléculas das substâncias apolares (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). 176 3 ESTADOS FÍSICOS DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS Todas as substâncias existentes na natureza podem ser encontradas em três estados (fases) de agregação, também chamados de estados físicos, conhecidos como: sólido, líquido e gasoso. Cada estado de agregação pode ser diretamente associado ao comportamento cinético (grau de agitação) das moléculas que formam as substâncias. Dois fatores determinam a fase em que as substâncias se encontram: a temperatura e a pressão (SOLOMONS, 2002). Para cada substância, há uma faixa de temperatura e pressão que determinará seu estado de agregação. Por exemplo, a água, em temperaturas inferiores a 0 °C, mantendo-se a pressão de 1 atm, assume a forma sólida; na temperatura de 0° a 100 °C, é líquida; já em temperaturas maiores que 100° C, apresenta-se no estado gasoso. Como sabemos, os estados de agregação não são fixos, ou seja, ao variarmos a temperatura ou a pressão exercida sobre a matéria, as substâncias podem passar de uma fase para outra. Nesses casos, dizemos que a alteração no arranjo molecular das substâncias provoca a mudança de estado físico ou estado de agregação da matéria. As possíveis mudanças de fase são: fusão (passagem do estado sólido para o líquido), solidificação (mudança do estado líquido para o sólido), vaporização (mudança do estado líquido para o gasoso), condensação (passagem do estado gasoso para o líquido), sublimação (passagem do estado sólido para o gasoso diretamente, sem passar pelo estado líquido) e cristalização (mudança do estado gasoso para o sólido, sem passar pelo estado líquido). ATENÇÃO E o que impede ou facilita as mudanças de estados de agregação da matéria? São as forças intermoleculares existentes na substância. Por exemplo, quando uma substância molecular passa do estado líquido (ou sólido) para o estado gasoso, ocorre o rompimento de ligações intermoleculares. No entanto, é muito importante perceber que, nessa (ou em qualquer outra) mudança de estado de agregação, as moléculas não são quebradas tampouco destruídas, mas apenas separadas (ou unidas) umas das outras. De fato, ocorre o rompimento das ligações existentes entre as moléculas, mas não entre seus átomos, ou seja, são modificações em nível intermolecular e não intramolecular. Para elucidar esse conceito, por exemplo, na produção do quentão, coloca- se um pouco de água e especiarias para esquentar, seguidas de açúcar, vinho e um pouco de cachaça, deixando a mistura ferver por alguns instantes. Antes de perceber os aromas das especiarias adicionadas, sente-se o cheiro de álcool etílico (liberado pela cachaça). Como isso aconteceu? Ao aquecer a mistura contendo cachaça (bebida com alto teor de alcoólico), ocorre o rompimento das ligações de hidrogênio entre as moléculas do álcool e da água, promovendo a vaporização do álcool etílico. 177 Outros exemplos facilmente observados no cotidiano são a vaporização da acetona, que ocorre a partir do rompimento de interações dipolo-dipolo, e a vaporização da gasolina, após rompimento de interações dipolo instantâneo-dipolo induzido. 3.1 PONTO DE EBULIÇÃO E PONTO DE FUSÃO DE COMPOSTOS ORGÂNICOS Para compreendermos os fenômenos existentes na fusão e na ebulição de compostos orgânicos, precisamos compreender que ambos estão diretamente associados a dois fatores: das forças intermoleculares existentes entre as moléculas do composto e do tamanho (e, portanto, da massa molecular) das moléculas do composto. • Influência das intermoleculares sobre o ponto de fusão e ponto de ebulição: o ponto de fusão (PF) informa a temperatura necessária para a mudança de uma substância no estado sólido para o líquido, enquanto o ponto de ebulição (PE) constata a temperatura necessária para a transformação de um líquido para o estado gasoso. Dessa forma, podemos associar ambas as transformações com a energia (na forma de calor) necessária para romper os diferentes tipos de interações intermoleculares existentes em uma determinada substância. Obviamente, quanto maior for a força dessas interações, maior será o gasto energético para rompê-las. Assim, a presença de interações dipolo- dipolo permanente fará com que o ponto de ebulição seja maior do que se houvesse apenas as interações dipolo instantâneo-dipolo induzido. A presença de ligações de hidrogênio fará com que o ponto de ebulição seja maior ainda. • Influências do tamanho e da massa molecular sobre o ponto de fusão e o ponto de ebulição: de modo geral, podemos dizer que, quanto maior for o tamanho da molécula, maior será a superfície para atuação das forças intermoleculares e, como consequência, mais difícil será para separar umas das outras e “migrar” de um estado físico para outro. Assim, quanto maior o tamanho da molécula, maior será a temperatura necessária para a sua fusão (ponto de fusão) e ebulição (ponto de ebulição). 3.1.1 Ponto de ebulição e fusão de compostos orgânicos apolares Como percebemos até aqui, em química orgânica, os compostos químicos são classificados em diferentes funções (álcoois, fenóis, éteres, ácidos carboxílicos, aminas etc.), com o intuito de facilitar nossa compreensão e estudos. No entanto, com a grande quantidade de compostos orgânicos, houve a necessidade de criar subdivisões, chamadas de séries orgânicas. Entre as séries orgânicas, existe a série homóloga, que representa um conjunto de compostos orgânicos pertencentes à mesma função orgânica, mas que diferem entre si pela quantidade de grupos metileno (CH2). Como pertencem à mesma função orgânica, os compostos de uma série homóloga possuem as mesmas propriedades químicas, mas, por serem diferentes no número de grupos metileno, variam gradualmente em suas propriedades físicas, à medida que aumenta sua massa molecular (FELTRE, 2004). 178 A série homóloga dos alcanos é um bom exemplo de família de compostos apolares. As interações dipolo instantâneo-dipolo induzido (fracas forças de Van der Waals), existentes entre suas moléculas, são responsáveis pelos baixos pontos de ebulição dos alcanos, conforme pode ser observado na Figura 8. FIGURA 8 – TEMPERATURAS DE EBULIÇÃO DOS ALCANOS NORMAIS FONTE: Canto; Peruzzo (2006, p. 212) O gráfico da Figura 8 traz o ponto de ebulição dos alcanos normais, ou seja, de hidrocarbonetos de cadeia aberta, normal e saturada em função do número de carbonos presentes na molécula. É fácil perceber que as temperaturas de ebulição aumentam gradativamente, com o aumento de suas massas moleculares, ou seja, quanto maior a massa molecular de um alcano não ramificado, maior seu ponto de ebulição. É importante lembrarmos de que, com aumento da cadeia carbônica, há o aumento de interações intermoleculares – no caso dos compostos orgânicos apolares não ramificados, há o aumento gradativo de forças de Van der Waals. Assim, na temperatura de 25 °C e na pressão de 1 atm, os alcanos com 1 a 4 átomos de carbono são gasosos, de 5 a 17 são líquidos e com 18 ou mais átomos de carbono são sólidos. De forma semelhante, o ponto de fusão dos alcanos de cadeia normal também aumenta com o aumento do tamanho das moléculas, conforme mostra a Figura 9. 179 FIGURA 9 – TEMPERATURAS DE FUSÃO DOS ALCANOS NORMAIS FONTE: Canto; Peruzzo (2006, p. 163) Ao compararmos duas substâncias com o mesmo tipo de interação intermolecular, a que tiver maior tamanho (estimado pela massa molecular) possuirá maior ponto de ebulição. ATENÇÃO No entanto, é importante destacar que moléculas ramificadas, que apresentam o mesmo tipo de interação intermolecular e mesma massa molecular,possuem pontos de ebulição e fusão menores do que as de cadeia normal. Uma comparação entre compostos isômeros é apresentada na Figura 10. FIGURA 10 – EFEITO DO COMPRIMENTO DA CADEIA PRINCIPAL SOBRE O PONTO DE EBULIÇÃO DE COM- POSTOS ORGÂNICOS COM MESMO TIPO DE INTERAÇÃO INTERMOLECULAR E MESMA MASSA MOLECULAR 2,2-dimetil-propano, C5H12 PE: 9 °C 1 2-metil-butano, C5H12 PE: 28 °C Pentano, C5H12 PE: 36 °C FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) 180 Ao compararmos substâncias orgânicas com mesma massa molecular e com mesmo tipo de ligação intermolecular, a que tiver maior tamanho da cadeia principal possuirá maior ponto de ebulição, devido ao maior número de interações intermoleculares. DICA 3.1.2 Ponto de ebulição e fusão de compostos orgânicos polares Ao observarmos o comportamento químico dos haletos orgânicos, compostos altamente polares, temos uma noção geral do comportamento químico dos demais compostos polares. Ao contrário dos hidrocarbonetos, os haletos orgânicos possuem dois polos bem definidos: um com maior densidade eletrônica (região da molécula em que está o halogênio) e outra com déficit eletrônico (região na qual estão os átomos de carbono). Assim, as interações dipo-dipo permanente promovem forte atração de suas moléculas, influenciando diretamente em suas propriedades químicas (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Novamente, reforçamos que o ponto de fusão informa a temperatura necessária para a mudança de uma substância no estado sólido para o líquido, ao passo que o ponto de ebulição determina a temperatura necessária para a transformação de um líquido para o estado gasoso. Dessa forma, podemos associar ambas as transformações com a energia (na forma de calor) necessária para romper os diferentes tipos de interações intermoleculares. Obviamente, quanto maior for a força dessas interações, maior será o gasto energético para rompê-las. Assim, é de se esperar que os pontos de fusão e ebulição dos haletos orgânicos sejam mais altos do que o dos hidrocarbonetos correspondentes. O Quadro 3 mostra essa comparação. QUADRO 3 – COMPARAÇÃO DOS PONTOS DE EBULIÇÃO DE HALETOS ORGÂNICOS COM SEU HIDROCAR- BONETO CORRESPONDENTE Composto orgânico PE (°C) CH4 – 161,5 CH3F – 78,2 CH3Cl – 23,8 CH3Br + 4,5 CH3I + 42,4 FONTE: Adaptado de Canto; Peruzzo (2006) 181 Desse modo, o ponto de ebulição aumenta rapidamente com o aumento da massa atômica do halogênio. Como consequência, os haletos de massa molecular elevada são sólidos, os de massa molecular intermediária são líquidos incolores e de cheiro agradável, e os mais simples são gasosos. É importante ter em mente que essas informações sobre os haletos também valerão para outras funções orgânicas, que são igualmente moléculas polares, como as cetonas e aldeídos. 3.1.3 Ponto de fusão e ponto de ebulição dos compostos orgânicos com ligação de hidrogênio Anteriormente, vimos que as ligações de hidrogênio são formadas quando a molécula orgânica apresenta em sua estrutura um átomo pequeno e muito eletronegativo (como o F, O, N) diretamente ligado a um átomo de hidrogênio, originando uma ligação altamente polarizada e um intenso polo positivo. A “deficiência eletrônica” do hidrogênio o leva a “buscar por equilíbrio”, ao interagir com moléculas vizinhas através de ligações de hidrogênio (VOLLHARDT; SCHORE, 2013; CANTO; PERUZZO, 2006). Funções orgânicas, como álcoois, cetonas, aminas, amidas, aldeídos e ácidos carboxílicos, contêm em sua estrutura átomos de oxigênio e/ou nitrogênio, ambos mais eletronegativos que o carbono e o hidrogênio, levando à formação de regiões com grande e pequena concentração de elétrons, por isso, são chamadas de moléculas polares. Essa característica torna suas interações intermoleculares mais acentuadas, pois realizam ligações de hidrogênio. Por exemplo, os álcoois possuem o grupo funcional hidroxila (OH) que permite realizar ligações de hidrogênio entre suas moléculas, sendo o átomo de hidrogênio (deficiente de elétrons) atraído pelos pares de elétrons (não ligantes) de um átomo de oxigênio de uma molécula vizinha, formando uma ligação de hidrogênio entre elas, e isso ocorre sucessivamente. Dessa forma, quanto maior o número de ligações de hidrogênio formadas entre duas ou mais moléculas, mais próximas e unidas elas estarão. Ao compararmos os pontos de ebulição de alcanos com seus álcoois correspon- dentes, notamos que os alcanos entram em ebulição muito mais rápido (Quadro 4). 182 QUADRO 4 – COMPARAÇÃO DOS PONTOS DE EBULIÇÃO DE ÁLCOOIS COM SEUS ALCANOS CORRESPONDENTES Álcool Ponto de ebulição Alcano Ponto de ebulição Metanol, CH3OH + 64,8 Metano, CH4 - 161,5 Etanol, CH3CH2OH + 78,5 Etano, C2H6 - 88,6 Propan-1-ol, CH3CH2CH2OH + 97,4 Propano, C3H8 - 42,1 Butan-1-ol, CH3(CH2)2CH2OH + 117,3 Butano, C4H10 - 0,5 Hexan-1-ol, CH3(CH2)4CH2OH + 157,2 Hexano, C6H14 - 69,2 FONTE: Adaptado de Canto; Peruzzo (2006) Isso acontece porque a ebulição corresponde a uma mudança de estado físico intimamente dependente do rompimento das forças intermoleculares existentes na fase líquida. Desse modo, quanto maior for a intensidade das forças intermoleculares, mais difícil será para rompê-las, mais energia será necessária e, consequentemente, maior será a temperatura de ebulição. Um caso interessante é o que ocorre nos ácidos carboxílicos, que formam pontes de hidrogênio duplas entre duas moléculas, ou seja, para separar suas moléculas, será necessária uma quantidade de energia ainda maior que a dos álcoois. O Quadro 5 mostra uma comparação dos pontos de ebulição de alguns ácidos carboxílicos com seus álcoois correspondentes. QUADRO 5 – COMPARAÇÃO DOS PONTOS DE EBULIÇÃO DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS COM SEUS ÁLCOOIS CORRESPONDENTES Ácido carboxílico Ponto de ebulição Álcool Ponto de ebulição Ácido metanoico HCOOH + 100,6 Metanol, CH3OH + 64,8 Ácido etanoico CH3COOH + 118,2 Etanol, CH3CH2OH + 78,5 Ácido propanoico CH3CH2COOH + 141,8 Propanol, CH3CH2CH2OH + 97,4 FONTE: Adaptado de Canto; Peruzzo (2006) 183 3.2 SOLUBILIDADE DE COMPOSTOS ORGÂNICOS A solubilidade representa a tendência que um determinado composto sólido tem de se tornar solúvel em um líquido e uma substância líquida tem de se tornar miscível em outro líquido. Para que isso ocorra, é necessário romper interações intermoleculares preexistentes por novas interações. Daí a afirmação de que “semelhante dissolve semelhante”, ou seja, substâncias polares dissolvem-se com maior facilidade em líquidos polares, enquanto substâncias apolares se dissolvem com maior facilidade em líquidos apolares (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Como a maioria das substâncias orgânicas são compostos apolares, ou com grandes cadeias carbônicas (o que lhes garante um caráter apolar), apresentam pouca ou nenhuma solubilidade na água (líquido polar). De fato, as substâncias orgânicas são, em geral, solúveis em solventes orgânicos, ou seja, em líquidos como os hidrocarbonetos e éteres que são apolares (ou pouco polares). Para exemplificar esse comportamento, podemos observar, no Quadro 6, a influência da cadeia carbônica na solubilidade dos compostos orgânicos. QUADRO 6 – INFLUÊNCIA DA CADEIA CARBÔNICA NA SOLUBILIDADE (MISCIBILIDADE) DE ÁLCOOIS EM ÁGUA FONTE: Adaptado de Canto; Peruzzo (2006) Álcool Solubilidade em água (gramas/100 g de água) Metanol, CH3OH Infinita Etanol, CH3CH2OH Infinita Propan-1-ol, CH3CH2CH2OH Infinita Butan-1-ol, CH3(CH2)2CH2OH 7,9 Pentan-1-ol, CH3(CH2)3CH2OH 2,2 Hexan-1-ol, CH3(CH2)4CH2OH 0,6 No Quadro 6, um caso bem interessante é que a miscibilidade de monoálcoois saturados em água é originada através da formação de ligações de hidrogênio entre as moléculas do álcool com as da água. Entretanto, à medida que aumenta a cadeia carbônica (porção apolar da molécula), os monoálcoois tornam-se líquidos viscosos, cada vez menos solúveis em água e mais solúveis em solventes orgânicos, tornando-se sólidos (semelhantes à parafina)quando contêm mais de doze átomos de carbono, como é o caso do C15H31OH. 184 Para compreendermos esses fatos, é necessário lembrarmos que um álcool é formado por um grupo orgânico (R), apolar, que é insolúvel em água (e solúvel em solventes orgânicos), e pelo grupo funcional hidroxila (OH), que é altamente polar, esta porção é responsável pelas ligações de hidrogênio com a água. Assim, conforme o predomínio do grupo R ou do OH, prevalecerão as propriedades do primeiro ou do segundo. Um esquema sobre a solubilidade é descrito na Figura 11. FIGURA 11 – ESQUEMA GERAL DA SOLUBILIDADE (MISCIBILIDADE) DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS FONTE: Feltre (2004, p. 167) Uma propriedade fisiológica interessante é que o aumento do número de oxidrilas, numa cadeia carbônica, confere ao composto um sabor adocicado. Por exemplo, a glicerina C3H5(OH3) com três oxidrilas na molécula é levemente adocicada; já o açúcar comum, C12H14O3(OH)8 com oito oxidrilas, é bastante doce (CANTO; PERUZZO, 2006). INTERESSANTE É importante saber que as partes apolares de uma molécula são denominadas grupos hidrófobos. Em geral, sua presença contribui para que o composto não se dissolva bem na água. Já as partes polares de uma molécula são chamadas de grupos hidrófilos. Quanto maior o número de grupos hidrófilos, maior será a tendência de a substância se solubilizar em água. 185 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • De acordo com a teoria da VSEPR, os pares eletrônicos ligantes e os “não ligantes”, localizados ao redor do átomo central, repelem-se, tendendo a permanecer o mais afastados quanto possível. • Apesar de o carbono saturado apresentar a geometria molecular tetraédrica, ao realizar ligações duplas ou triplas, pode assumir diferentes configurações espaciais. • Uma ligação covalente será polar sempre que os dois átomos que estabelecem essa ligação possuírem diferentes eletronegatividades. Já a polaridade de uma molécula com mais de dois átomos é expressa pelo vetor momento de dipolo resultante ( ). Se ele for nulo, a molécula será apolar; do contrário, a molécula será polar. • As interações dipolo-dipolo permanente, também chamadas simplesmente de dipolo-dipolo, ocorrem única e exclusivamente entre moléculas polares. • Ligações de hidrogênio são interações que ocorrem tipicamente entre moléculas que apresentam átomos de H ligados a F, O ou N. • As interações dipolo instantâneo-dipolo induzido ocorrem em todas as substâncias, polares ou apolares. Apesar de fracas, é o único tipo de interação intermolecular que ocorre entre as moléculas das substâncias apolares. • Quando uma substância molecular muda de estado físico de agregação, ocorre o rompimento de ligações intermoleculares. • Ao compararmos duas substâncias com o mesmo tipo de interação intermolecular, a que tiver maior tamanho (estimado pela massa molecular) possuirá maior ponto de ebulição. • Ao compararmos duas substâncias com massas moleculares e tamanhos aproximadamente iguais, a que possuir forças intermoleculares mais intensas terá maior ponto de ebulição. 186 • Ao compararmos substâncias orgânicas com a mesma massa molecular e o mesmo tipo de ligação intermolecular, o tamanho da cadeia principal é um bom indicador do tamanho da molécula. É de se esperar que a que possuir cadeia principal mais extensa, terá maior ponto de ebulição. • A solubilidade representa a tendência que um determinado composto sólido tem de se tornar solúvel em um líquido e que uma substância líquida tem de se tornar miscível em outro líquido. Como a maioria das substâncias orgânicas são compostos apolares ou com grandes cadeias carbônicas, apresentam pouca ou nenhuma solubilidade na água. 187 1 A polaridade das substâncias orgânicas é uma consequência originada tanto da diferença de eletronegatividade quanto da organização espacial (geometria) dos átomos presentes na molécula. Tendo em mente apenas substâncias apolares, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Acetona e ácido etanoico. b) ( ) Ácido etanoico e metanol. c) ( ) Metanol e tetracloreto de carbono. d) ( ) Tetracloreto de carbono e hexano. e) ( ) Hexano e metilamina. 2 Observe a estrutura molecular de quatro compostos orgânicos a seguir: AUTOATIVIDADE FONTE: O autor No estado líquido, os tipos de forças intermoleculares que existem em cada uma dessas substâncias, respectivamente, são: a) ( ) Dipolo induzido, ligação de hidrogênio, dipolo-dipolo permanente e dipolo induzido. b) ( ) Dipolo induzido, ligação de hidrogênio, dipolo induzido e dipolo-dipolo permanente. c) ( ) Dipolo induzido, ligação de hidrogênio, ligação de hidrogênio e dipolo induzido. d) ( ) Ligação de hidrogênio, dipolo-dipolo permanente, dipolo induzido e ligação de hidrogênio. e) ( ) Todas são ligações de hidrogênio. 3 As forças de atração, chamadas de interações intermoleculares, são responsáveis por manter as moléculas unidas nos estados sólido e líquido. No entanto, a intensidade de suas forças é influenciada pela geometria e pela polaridade das próprias moléculas. Classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) De acordo com a teoria da VSEPR, os pares eletrônicos ligantes e os “não ligantes”, localizados ao redor do átomo central, repelem-se, tendendo a permanecer o mais afastados quanto possível. ( ) Moléculas orgânicas polares são formadas por ligações covalentes polares, ou seja, são caracterizadas pela ausência de diferença de eletronegatividade entre seus átomos, gerando vetor momento de dipolo resultante ( ) nulo. 188 ( ) As interações dipolo-dipolo permanente ocorrem somente entre moléculas apolares. Já as interações dipolo instantâneo-dipolo induzido ocorrem tanto em substâncias polares quanto apolares. ( ) Ligações de hidrogênio são interações que ocorrem tipicamente entre moléculas que apresentam átomos de H ligados a F, O ou N. ( ) A muda de estado físico de agregação, de qualquer substância orgânica, ocorre mediante o rompimento de ligações químicas. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – V – V – F – F. b) ( ) V – F – F – V – F. c) ( ) F – F – F – V – V. d) ( ) V – V – F – V – F. e) ( ) V – F – V – V – F. 4 A temperatura de ebulição dos compostos orgânicos é influenciada por dois fatores: o tipo de interação intermolecular e o tamanho da estrutura molecular. Com base na ordem crescente da temperatura de ebulição, analise as substâncias a seguir: I- Propano (C3H8). II- 1-propanol (C3H8O). III- Etano (C2H6). IV- Propano-1,2-diol (C3H8O2). Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) II – IV – I – III. b) ( ) III – I – IV – II. c) ( ) II – IV – III – I. d) ( ) III – I – II – IV. e) ( ) IV – II – III – I. 5 Sobre os compostos orgânicos, há uma infinidade de substâncias, dos mais diversos tipos e tamanhos, com grupos funcionais que lhes conferem o caráter polar ou apolar. Além disso, dependendo das forças de interação existentes entre suas moléculas, podem ser encontrados na forma gasosa, líquida e, até mesmo, sólida. As interações intermoleculares, além de influenciarem os estados físicos de agregação, são importantes para determinar a solubilidade dos diversos compostos orgânicos existentes. Comente sobre a solubilidade dos compostos orgânicos e a afirmação de que “semelhante dissolve semelhante”. 189 ISOMERIA EM QUÍMICA ORGÂNICA 1 INTRODUÇÃO Atualmente, nosso planeta Terra e tudo o que existe nele é formado por (ao menos) um dos 118 elementos químicos, catalogados e reunidos na tabela periódica. Assim, tudo o que conhecemos, seja criado pela natureza ou pelas mãos humanas, seja pertencente ao reino mineral, vegetal ou animal, pode ser descrito por 118 elementos químicos. Pensando dessa forma, parece algo muito simples, mas, ao revisitarmos o que estudamos até aqui e ao olharmos para a química orgânica, percebemos que existe uma infinidade de combinações, arranjos e estruturas possíveispara esses elementos. Então, percebemos que representar uma substância química, unicamente, através de sua fórmula molecular não é uma informação muito relevante; na verdade, isso pode nos levar a muitos enganos. Por exemplo, em um laboratório químico, para a identificação de um frasco de reagente com a fórmula C2H6O, ele poderia ser interpretado como etanol (CH3CH2OH) ou como metoximetano (CH3OCH3). Se simplesmente se escrever C15H32, a qual das 4.347 “arrumações” diferentes de seus 15 átomos de carbono se referia? Esse fenômeno, em que uma única fórmula molecular representa duas ou mais substâncias diferentes é conhecido, na química orgânica, como isomeria ou isome- rismo, e os diferentes compostos que apresentam em comum uma mesma fórmula molecular são chamados de isômeros. No entanto, é importante saber que, apesar de terem quantidades iguais dos mesmos elementos, os isômeros demonstram proprieda- des diferentes, devido à organização dos átomos, ou seja, possuem fórmulas estruturais diferentes (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Se as diferenças entre os isômeros são percebidas no modo, na sequência, em que os átomos se unem para formar a molécula, a qual pode ser explicada por fórmulas estruturais planas, temos isômeros constitucionais ou isômeros planos. Quando as diferenças entre as moléculas dos isômeros só podem ser percebidas ao analisarmos a estrutura espacial das moléculas, ou seja, a orientação de seus átomos no espaço, temos estereoisômeros ou isômeros espaciais (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). UNIDADE 3 TÓPICO 2 - 2 ISOMERIA PLANA Quando a diferença dos isômeros pode ser identificada através da análise de suas fórmulas estruturais planas, dizemos que é um caso de isomeria constitucional ou isomeria plana, pois a diferença está na organização, na maneira com que seus átomos se unem para formar as moléculas dos diferentes isômeros. 190 O estudo da isomeria plana é divido em cinco categorias: isomeria de cadeia, de posição, de compensação (metameria), de função e tautomeria. A seguir, estudaremos detalhadamente cada uma delas. 2.1 ISOMERIA DE CADEIA A isomeria de cadeia, também chamada de isomeria de núcleo, ocorre quando a diferença existente entre os isômeros se dá quanto ao tipo de cadeia, ou seja, todos pertencem a uma única função orgânica (possuem o mesmo grupo funcional), mas diferem no tipo de estrutura carbônica; assim, um pode ter cadeia aberta, outro cadeia fechada, cadeia normal ou pode conter ramificações, ou, ainda, um isômero pode ter a cadeia homogênea e o outro heterogênea. Alguns exemplos podem ser observados no Quadro 7. QUADRO 7 – EXEMPLOS DE ISOMERIA PLANA DE CADEIA Fórmula molecular Isômeros C5H10 Cadeia aberta insaturada Cadeia fechada Cadeia fechada ramificada C4H8O2 Cadeia normal Cadeia ramificada C2H7N Cadeia heterogênea Cadeia homogênea FONTE: Adaptado de Feltre (2004) QUADRO 8 – EXEMPLOS DE ISOMERIA PLANA DE POSIÇÃO 2.2 ISOMERIA DE POSIÇÃO A isomeria de posição ocorre quando os isômeros têm a mesma cadeia carbônica, mas diferem pela posição de insaturações (ligações duplas ou triplas), ramificações ou pela localização do grupo funcional, conforme os exemplos descritos no Quadro 8. Fórmula molecular Isômeros C4H8 Observa-se a mudança da posição da insaturação (ligação dupla). 191 FONTE: Adaptado de Feltre (2004) C4H6Cl2 Observa-se a mudança da posição das ramificações (cloreto). C3H8O Observa-se a mudança da localização do grupo funcional hidroxila (OH). 2.3 ISOMERIA DE COMPENSAÇÃO A isomeria de compensação, também chamada de metameria, é um caso particular de isomeria de posição, cuja diferença entre os isômeros se dá pela posição de um heteroátomo inserido na cadeia principal. Nesse caso, os isômeros são chamados de metâmeros. O Quadro 9 apresenta exemplos desse tipo de isomeria. QUADRO 9 – EXEMPLOS DE ISOMERIA PLANA DE COMPENSAÇÃO (METAMERIA) FONTE: Adaptado de Feltre (2004) Fórmula molecular Metâmeros C4H10O Observa-se que, apesar da modificação da localização (posição) do heteroátomo oxigênio, resultan- do no encurtamento e alongamento cadeia carbonica, em ambos os casos, temos a função éter. C4H11N Observa-se que, apesar da modificação da localização (posição) do heteroátomo nitrogê- nio, em ambos os casos, temos o grupo funcional amina. C3H6O2 Nesse exemplo, é mais fácil enxergar a mudança da cadeia carbônica, antes e depois do grupo funcional éster. 2.4 ISOMERIA DE FUNÇÃO A isomeria de função, também chamada de isomeria funcional, ocorre quando os isômeros apresentam grupos funcionais diferentes. No Quadro 10, podemos observar que os compostos possuem a mesma fórmula molecular, mas são de grupos funcionais diferentes. 192 QUADRO 10 – EXEMPLOS DE ISOMERIA PLANA DE FUNÇÃO Fórmula molecular Isômeros C2H6O Álcool Éter C3H6O Cetona Aldeído C7H8O Fenol Álcool aromático Éter aromático FONTE: Adaptado de Feltre (2004) 2.5 TAUTOMERIA A tautomeria, também chamada de isomeria dinâmica, é um caso particular de isomeria de função em que os isômeros coexistem em equilíbrio dinâmico em solução. Apesar de essa isomeria ocorrer em compostos que apresentam o nitrogênio ou o oxigênio ligados (ao mesmo tempo) a um hidrogênio e a um carbono saturado, os casos mais comuns de tautomeria ocorrem entre aldeído e enol, e entre cetona e enol. • Tautomeria aldoenólica (aldeído ⇌ enol): ocorre entre um aldeído e um enol quando ambos estão presentes numa solução aquosa. Por exemplo, em meio aquoso, uma pequena parte de aldeído acético (etanal) transforma-se em etenol (um enol), que, por sua vez, regenera-se novamente em aldeído. Assim, há um equilíbrio químico entre esses compostos que possuem a mesma fórmula molecular – C2H4O (Figura 12). FIGURA 12 – TAUTOMERIA ALDOENÓLICA FONTE: Feltre (2004, p. 179) 193 FIGURA 13 – TAUTOMERIA CETOENÓLICA FONTE: Feltre (2004, p. 179) o Para compreender o esquema representado na Figura 12, precisamos ter em mente que as ligações carbono-hidrogênio são covalentes com caráter polar, cujos elétrons compartilhados estão mais próximos do átomo mais eletronegativo (o carbono, ẟ–) e geram uma carga elétrica parcial positiva (ẟ+) no átomo de hidrogênio. Esse “centro” deficiente de elétrons é facilmente atraído pelos pares de elétrons (não ligantes) do átomo de oxigênio, levando à formação de uma hidroxila e à consequente mudança da posição da ligação dupla, mantendo-se, assim, a estabilidade química do oxigênio (regra do octeto). • Tautomeria cetoenólica (cetona ⇌ enol): ocorre entre uma cetona e um enol quando ambos estão presentes numa solução aquosa. Por exemplo, em meio aquoso, uma pequena parte de propan-2-ona (uma cetona) transforma-se em prop-1-en-2-ol (um enol), que, por sua vez, regenera-se novamente em cetona. Assim, há um equilíbrio químico entre esses compostos que possuem a mesma fórmula molecular – C3H6O (Figura 13). 3 ISOMERIA ESPACIAL A isomeria espacial, também chamada de estereoisomeria, ocorre quando dois compostos apresentam a mesma fórmula molecular e a mesma estrutura plana, mas diferem quanto a sua estrutura espacial. Portanto, é possível diferenciar os isômeros somente após analisarmos a organização dos seus átomos no espaço de forma tridimensional, e não mais apenas em papel. Os compostos orgânicos que apresentam esse tipo de isomeria são chamados de estereoisômeros. Existem dois tipos de isomeria espacial: a geométrica (também conhecida como cis e trans) e a óptica. A seguir, estudaremos detalhadamente cada uma delas. 194 3.1 ISOMERIA GEOMÉTRICA A isomeria geométrica, também chamada de isomeria cis-trans, ocorre em dois casos principais: em compostos de cadeias abertas, com ligação dupla entre átomos de carbonos, e em compostos cíclicos. Nessas duas situações, a molécula apresenta uma ligação carbono-carbono fixa e, portanto, não há possibilidade de livre rotação (giro) ao redor dessa ligação. Analisaremos cada um dos casos a seguir. FIGURA 14 – LIVRE ROTAÇÃO VERSUSROTAÇÃO INTERROMPIDA FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) 3.1.1 Isomeria geométrica em compostos com ligação dupla Para compreendermos o conceito de livre rotação, mencionado anteriormente, podemos utilizar como exemplo duas tábuas unidas por um único prego (Figura 14A). É possível movimentá-las? A resposta correta é sim, pois, ao unir duas tábuas por um único prego, temos a possibilidade de girá-las livremente, tanto no sentido horário quanto anti-horário. Contudo, ao atravessar um segundo prego nessas duas tábuas (Figura 14B), ainda haverá movimento? Nesse caso, não será mais possível girá-las. Esse mesmo conceito pode ser aplicado às ligações carbono-carbono. Assim, numa ligação simples entre carbonos, observamos a liberdade rotacional e dizemos que os compostos (Figura 15A) não são isômeros, pois representam a mesma substância. Entretanto, quando observamos uma ligação dupla entre carbonos, a liberdade rotacional deixa de existir (Figura 15B) e, então, dizemos que os compostos são isômeros e não representam a mesma substância. 195 FIGURA 15 – ROTAÇÃO DE LIGAÇÕES ENTRE ÁTOMOS DE CARBONO FIGURA 16 – ISOMERIA GEOMÉTRICA DO DICLOROETENO FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) Quando não há liberdade rotacional na ligação entre carbonos, como ocorre nas ligações duplas, observamos a formação de estereoisômeros, ou seja, compostos orgânicos que apresentam fórmulas moleculares iguais, com a mesma estrutura plana, mas diferentes quanto a sua estrutura espacial. Para facilitar a compreensão do tema, analisaremos duas estruturas existentes do dicloroeteno (C2H2Cl2), conforme mostrado na Figura 16. Na Figura 16, a ligação dupla impede a rotação dos átomos de carbono, embora existam duas formas possíveis para a disposição geométrica dos grupos ligados aos carbonos da dupla. Quando os átomos de cloro (representados pelos círculos maiores em verde) estão posicionados ao mesmo lado do plano espacial da molécula (Figura 16A), temos a formação do isômero cis, porém, quando estão em lados opostos (Figura 16B), temos o isômero trans. 196 Os compostos de cadeias abertas com ligação dupla entre átomos de carbonos serão chamados de: • Cis: quando apresentarem grupos ligantes iguais posicionados do mesmo lado do plano espacial molecular. • Trans: quando apresentarem grupos ligantes iguais posicionados em lados opostos do plano espacial molecular. Para que uma determinada fórmula estrutural plana apresente este- reoisômeros cis e trans, é necessário que, além de uma ligação dupla entre átomos de carbono, cada um dos carbonos da ligação dupla conte- nha dois grupos ligantes (R) diferentes entre si, ou seja, R1 ≠ R2 e R3 ≠ R4. IMPORTANTE ATENÇÃO É importante perceber que, apesar de apresentarem fórmulas moleculares iguais, os estereoisômeros são compostos orgânicos com propriedades físico-quími- cas diferentes. No caso do dicloroeteno (C2H2Cl2), a geometria espacial do cis-1,2-di- cloroeteno leva à formação de uma molécula polar com maior número de ligações de hidrogênio entre suas moléculas, gerando maior ponto de ebulição quando comparado à molécula trans-1,2-dicloroeteno, que é apolar. Na infinidade de compostos orgânicos, é muito provável existirem estereoisômeros com grupos ligantes diferentes, não é mesmo? Nesse caso, o uso do sistema de nomenclatura cis-trans gera muitas dúvidas, pois não temos grupos de ligantes iguais para determinar se eles estão do mesmo lado do plano espacial ou se em lados opostos. Para resolver esse problema, foi criado o sistema de nomenclatura E-Z, no qual examinamos os grupos ligantes nos átomos de carbono da ligação dupla (C=C) e determinamos, em cada um, seu respectivo número atômico. Então, os compostos serão chamados de: • Z: quando os grupos ligantes de maior número atômico estiverem posicionados no mesmo lado do plano espacial molecular. • E: quando os grupos ligantes de maior número atômico estiverem posicionados em lados opostos do plano espacial molecular. 197 Para determinar a nomenclatura E-Z do haleto orgânico 2-cloro-3-metilpent- 2-eno, devemos observar atentamente a ligação dupla existente entre os átomos de carbono, conforme apresentado na Figura 17, além de avaliar os grupos ligantes pelo seu número atômico ou complexidade (tamanho da estrutura). Aqueles que apresentam maior número atômico ou maior complexidade são considerados prioritários. FIGURA 17 – NOMENCLATURA E-Z DO HALETO ORGÂNICO 2-CLORO-3-METILPENT-2-ENO FONTE: O autor Na Figura 17A, consideramos que o carbono 2 da cadeia carbônica apresenta dois grupos ligantes, o metil (CH3) e o cloro (Cl), que, por ter maior número atômico, tem maior prioridade. Já no outro lado, o carbono 3 apresenta como grupos ligantes o metil (CH3) e o etil (CH2 ─ CH3), que, por ter maiores números de carbono, tem maior prioridade. Assim, constatamos que, na Figura 17A, os grupos ligantes de maior prioridade (maior número atômico e maior complexidade) estão posicionados no mesmo lado do plano espacial molecular e, por isso, recebe a nomenclatura Z-2-cloro-3-metilpent-2-eno. Na Figura 17B, devemos considerar os mesmos grupos ligantes da Figura 17A, mas os grupos ligantes de maior prioridade (Cl, maior número atômico e etil, e maior complexidade) estão posicionados em lado opostos do plano espacial molecular e, por isso, recebe a nomenclatura E-2-cloro-3-metilpent-2-eno. O sistema de isomeria E-Z foi criado pelos químicos Christopher Kelk Ingold, Vladimir Prelog e colaboradores. As letras E e Z têm origem de palavras alemãs: entgegen, que significa “opostos”, e zusammen, que corresponde a “juntos”. INTERESSANTE É importante saber que usamos, comumente, a nomenclatura cis-trans até mesmo para os casos de estereoisômeros com grupos ligantes diferentes, sendo o isômero Z correspondente ao cis e o E, ao trans. 198 3.1.2 Isomeria geométrica em compostos cíclicos A presença de um ciclo em uma molécula também pode originar isômeros cis- trans, já que, assim como ocorre com as ligações duplas, os ciclos não permitem a livre rotação ao redor das ligações carbono-carbono. Desse modo, para ocorrer à isomeria geométrica nos compostos cíclicos, basta que pelo menos dois carbonos do ciclo apresentem grupos ligantes diferentes (Figura 18). FIGURA 18 – ISOMERIA GEOMÉTRICA DO DICLOROCICLOPENTANO FONTE: <https://bit.ly/3vgWlUC>. Acesso em: 18 dez. 2021. Na Figura 18, pode-se observar que há uma mudança na posição dos grupos ligantes do anel, o que permite classificar os isômeros em cis e trans. Assim, quando os ligantes iguais estão no mesmo lado do plano espacial molecular, trata-se do isômero cis e, quando os ligantes iguais estão lados opostos do plano espacial molecular, do isômero trans. 3.2 ISOMERIA ÓPTICA A isomeria óptica é um tipo de isomeria espacial que estuda o comportamento dos compostos orgânicos frente a um feixe de luz polarizada. Aqueles que conseguem modificar o plano da luz polarizada são chamados de opticamente ativos; apesar de apresentarem a mesma fórmula molecular, os isômeros ópticos são diferenciados pelo tipo de desvio do plano de luz polarizada, pois a desviam em sentidos contrários, um para a direita e outro para a esquerda. Para entendermos melhor esse assunto, primeiramente, precisamos compreender o que é uma luz polarizada. 3.2.1 Luz natural e luz polarizada A luz natural, emitida pelo sol e, até mesmo, pelas lâmpadas fluorescentes das nossas residências, é formada por ondas eletromagnéticas, ou seja, uma combinação de ondas elétricas e magnéticas que vibram em planos espaciais perpendiculares entre si (Figura 19), propagando seus feixes luminosos em infinitos planos (direções). Esse fenômeno é responsável por tornar a luz natural conhecida como policromática e classificada como um tipo de luz não polarizada. 199 FIGURA 19 – COMPORTAMENTO DA LUZ NATURAL FIGURA 20 – COMPORTAMENTO DA LUZ POLARIZADA FONTE: Adaptada de Feltre (2004) FONTE: Adaptada de Feltre(2004) Já na luz polarizada, os planos de vibração elétrico e magnético não giram, ou seja, apresenta um único plano, conforme demonstrado na Figura 20. É importante entender que o nosso olho não consegue distinguir o modo de oscilação da luz, tampouco o plano de vibração da onda eletromagnética, ou seja, a olho nu, não conseguimos diferenciar a luz natural (não polarizada) da luz polarizada. No entanto, existem equipamentos com lentes especiais, chamados de polarizadores, que são capazes de fazer padronizar o modo de vibração da luz. Assim, ao serem atravessados por um feixe luminoso, toda a luz sofre o fenômeno da polarização, vibrando em um único plano, tendo, ao final do percurso, uma luz totalmente polarizada. 3.2.2 Luz polarizada e compostos (isômeros) orgânicos A luz polarizada é utilizada para avaliar a atividade óptica de compostos (isômeros) orgânicos. Ao ser incidida sobre uma determinada amostra, podemos observar três situações: • Desvio da vibração do plano da luz polarizada para a direita: significa que o composto é opticamente ativo. Ao promover o giro da luz no sentido horário, ou seja, dextrogiro (do latim dexter, que significa “direito”), o isômero óptico é denominado de dextrorrotatório ou dextrogiro, representado pela letra D ou por um sinal positivo (+) na sua nomenclatura. 200 • Desvio da vibração do plano da luz polarizada para a esquerda: significa que o composto é opticamente ativo. Ao promover o giro da luz no sentido anti-horário, ou seja, levogiro (do latim laevus, que significa “esquerdo”), o isômero óptico é denominado de levorrotatório ou levogiro, representado pela letra L ou por um sinal negativo (-) na sua nomenclatura. • A vibração do plano da luz polarizada não é desviada: significa que o composto é opticamente inativo ou pode ser uma mistura racêmica, formada por 50% do isômero dextrogiro e 50% do levogiro. Como é possível identificar se um composto orgânico apresenta (ou não) atividade óptica sem a utilização de um polarizador? Um modo seguro de “prever” se a molécula de um composto orgânico apresenta atividade óptica é analisar sua estrutura molecular plana e observar se a molécula possui algum carbono assimétrico, isto é, um átomo de carbono que contém quatro grupos ligantes diferentes. Um exemplo de fácil compreensão é o ácido láctico (ou ácido-2-hidróxi-propanoico), representado na Figura 21. FIGURA 21 – CARBONO ASSIMÉTRICO DO ÁCIDO LÁCTICO FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Na Figura 21A, observamos que o carbono central é assimétrico, pois todos os seus ligantes são diferentes: H, CH3, OH e COOH. É importante saber que os carbonos assimétricos costumam ser indicados com um asterisco, sendo chamados de carbono quiral. Ao compara- mos a forma tetraédrica da molécula do ácido láctico (Figura 21B), com sua imagem especular (imagem gerada por um espelho; Figura 21C), percebemos que os grupos ligantes (CH3 e COOH) estão localizados em posições diferentes, demostrando que os isômeros são moléculas orgâni- cas diferentes. Ao tentarmos “sobrepor” uma molécula sobre a outra (Figura 21D), nunca haverá coincidência de todos os grupos. Esse tipo de isomeria, em que uma molécula é a imagem es- pecular da outra, mas não são sobreponíveis, é chamado de isomeria óptica. Os isômeros são denominados de isômeros ópticos ou enantiômeros ou, ainda, enantiomorfos. 201 A palavra quiral é derivada do grego cheir, que significa “mão”. Esse termo deu origem, na língua portuguesa, a várias palavras, como quiromancia (leitura das mãos) e cirurgia (intervenção com as mãos). INTERESSANTE Ainda sobre o ácido láctico, assim como para os demais enantiômeros, é importante saber que os (dois) isômeros ópticos apresentam propriedades físicas (como ponto de fusão e ponto de ebulição) iguais, diferenciando-se pelo desvio do plano da luz polarizada. No entanto, uma mistura racêmica, ou seja, uma mistura contendo exatamente 50% do isômero dextrogiro com seu antípoda levogiro, não desvia o plano da luz polarizada, pois o desvio gerado por uma forma enantiomérica (por exemplo, o ácido D, com desvio no sentido horário) será neutralizado pelo desvio provocado pelo seu antípoda (no caso, a forma L, com giro anti-horário). Assim, dizemos que o racêmico é inativo por compensação externa ou simplesmente que é opticamente inativo (FELTRE, 2004). Em compostos orgânicos com dois carbonos assimétricos iguais, como ocorre no ácido tartárico (ácido di-hidróxi-succínico), os carbonos assimétricos 2 e 3 estão ligados aos mesmos grupos e, portanto, são equivalentes entre si (Figura 22A). FIGURA 22 – CARBONOS ASSIMÉTRICOS DO ÁCIDO LÁCTICO FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Assim, dão origem a dois isômeros com atividade óptica e enantiomorfos entre si: o ácido d-tartárico e o ácido l-tartárico. Como visto anteriormente, ao misturarmos partes iguais dos enantiômeros, eles formarão o racêmico, que, como sempre, é opticamente inativo (inativo por compensação externa). No entanto, existe um isômero que é inativo por compensação interna: o ácido mesotartárico (Figura 22B), que possui um plano de simetria na molécula, dividindo-a em duas partes iguais, que resultam na inatividade óptica do composto. O Quadro 11 mostra uma comparação de algumas propriedades físicas das formas enantioméricas do ácido tartárico. 202 QUADRO 11 – PROPRIEDADES FÍSICAS DAS FORMAS ENANTIOMÉRICAS DO ÁCIDO TARTÁRICO FONTE: Adaptado de Feltre (2004) Ácido Ponto de fusão (ºC) Densidade (g/mL) Solubilidade (g/100 g de H2O) Poder rotatório específico D 170 1,76 139 +12 L 170 1,76 139 -12 Racêmico 206 1,69 21 0 Meso 140 1,67 125 0 3.2.3 Compostos quirais na natureza e efeitos fisiológicos dos enantiômeros Muitos compostos extraídos de matérias-primas naturais são quirais, podendo aparecer tanto na forma isolada, ou seja, só um enantiômero, quanto na forma de misturas racêmicas. Um bom exemplo é o limoneno, o composto orgânico aromático responsável pelo aroma característico do limão e da laranja. O enantiômero levogiro assume a configuração (S)-limoneno, sendo responsável pelo aroma de limão. Já o enantiômero dextrogiro, (R)-limoneno, é responsável pelo aroma de laranja. Obviamente, ao formarem uma mistura racêmica, teremos um aroma diferente dos enantiômeros isolados. No organismo humano, existem 22 aminoácidos que formam as proteínas e as enzimas, dos quais somente um não apresenta quiralidade; os 21 aminoácidos restantes são quirais e só existem na forma de enantiômero (SOLOMONS, 2002; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Alguns enantiômeros exercem grandes diferenças sobre o organismo vivo, ou seja, apresentam efeitos fisiológicos distintos. Por exemplo, a adrenalina (substância química responsável pela aceleração dos batimentos cardíacos) contém em sua estrutura um centro quiral, porém, somente o enantiômero levogiro tem efeito fisiológico. Outro exemplo interessante é o da asparagina: enquanto um de seus enantiômeros estimula as papilas gustativas a produzirem a sensação de sabor doce, o outro produz a sensação de sabor amargo (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Como a maioria do organismo humano é formada por substâncias quirais, é de se esperar que os medicamentos contenham princípios ativos igualmente quirais, interagindo de forma mais eficiente e exercendo o seu efeito curativo de forma mais eficaz. Um exemplo disso é o propoxifeno, um analgésico e anti-inflamatório. O enantiômero (+)- (2S, 3R)-propoxifeno tem propriedade analgésica, enquanto o seu isômero óptico (-)-(2R, 3S)-propoxifeno possui propriedade antitussígena (ORLANDO et al., 2007). Todavia, certamente, o caso mais conhecido de fármaco quiral é a talidomida, um medicamento comercializado na forma de mistura racêmica (entre o final da década de 1950 e início da década de 1960) para aliviar sintomas de enjoos e enxaqueca. Após ter sido amplamente utilizado por gestantes, houve um elevado número de nascimentos de 203 crianças com malformação, descobrindo-se que somenteo isômero dextrogiro, ou (R), era responsável pelas propriedades analgésicas, sedativas e antessentires, enquanto a talidomida levogira (S) é teratogênica, sendo responsável pelas mutações nos fetos. Entre os efeitos colaterais observados pela ingestão da (S)-talidomida por gestantes estavam: o desenvolvimento incompleto ou defeituoso dos membros dos fetos; malformação em coração (como a ausência de aurículas), intestino, útero e vesícula biliar; efeitos nos músculos dos olhos e da face; surdez; defeitos na tíbia; entre outros (MORO; INVERNIZZI, 2017). Assista ao documentário Tá faltando alguma coisa, dirigido pela presidente da Associação Brasileira dos Portadores da Síndrome da Talidomida (ABPST), Claudia Marques Maximino, em parceria com Thiago Taboada, que retrata a história da talidomida no Brasil e a luta dos direitos das pessoas que foram afetadas por essa tragédia da medicina, disponível em: https://bit.ly/3v9AleG. Além disso, nele, é realizada uma dura crítica pelo fato de o país ser o único no mundo a ter uma terceira geração com deformidades geradas pelo uso da droga. DICA 204 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como: • Isômeros são compostos de mesma fórmula molecular que apresentam propriedades diferentes, devido a fórmulas estruturais diferentes. • Se as diferenças entre os isômeros são percebidas na sequência em que os átomos se unem para formar a molécula e pode ser explicada por fórmulas estruturais planas, temos isômeros constitucionais ou isômeros planos. • Os casos mais comuns de isomeria plana são: isomeria de cadeia, de posição, de compensação (metameria), de função e tautomeria. • Isomeria de cadeia é aquela em que os isômeros têm cadeias diferentes. Isomeria de posição ocorre quando os isômeros têm a mesma cadeia carbônica, mas diferem pela posição de ramificações ou de ligações duplas ou triplas. Na isomeria de compensação (ou metameria), os isômeros diferem pela posição de um heteroátomo na cadeia carbônica. Isomeria de função (ou funcional) acontece quando os isômeros pertencem a funções químicas diferentes. Tautomeria é o caso particular de isomeria funcional em que os dois isômeros ficam em equilíbrio químico dinâmico. • As diferenças entre os isômeros só podem ser percebidas ao ser analisada a estrutura espacial das moléculas, ou seja, a orientação dos átomos no espaço: se estereoisômeros ou isômeros espaciais. • Para que uma dada fórmula estrutural plana permita a existência de isômeros geométricos, é necessário, além da presença de uma ligação dupla, que cada um dos átomos de carbonos da ligação dupla contenha dois ligantes diferentes entre si. • Chamamos de (isômero) cis o composto orgânico que contém grupos ligantes iguais, posicionados do mesmo lado do plano espacial molecular, e de trans o isômero que contém grupos ligantes iguais, posicionados em lados opostos. • A assimetria molecular estará presente se houver, na estrutura, um carbono que faça quatro ligações simples e que esteja ligado a quatro grupos diferentes. O carbono em questão é chamado de carbono assimétrico, carbono quiral ou centro quiral. A presença de um carbono quiral é condição suficiente para a isomeria óptica. • Mistura racêmica é uma mistura formada por iguais quantidades de uma substância levorrotatória e seu respectivo enantiômero dextrorrotatório. É opticamente inativa, ou seja, não desvia o plano da luz polarizada. 205 1 Na química orgânica, são denominados isômeros dois ou mais compostos diferentes que apresentam a mesma fórmula molecular. Quando é possível perceber a diferença através de suas fórmulas estruturais planas, dizemos que é um caso de isomeria constitucional ou isomeria plana. Com base nos cinco tipos de isomeria plana existentes, isto é, no tipo de isomeria que ocorre entre os pares de compostos orgânicos, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Isomeria de função. II- Isomeria de posição. III- Isomeria de cadeia. IV- Isomeria de compensação. V- Isomeria dinâmica. ( ) Dimetilamina e etilamina. ( ) Etoxietano e metoxipropano. ( ) 1-propen-2-ol e propanona. ( ) Metanoato de metila e ácido etanoico. ( ) But-1-eno e but-2-eno. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) IV – III – V – II – I. b) ( ) V – III – IV – I – II. c) ( ) III – I – II – IV – V. d) ( ) III – IV – V – I – II. e) ( ) III – IV – II – I – V. 2 No equilíbrio entre uma cetona e um enol em meio aquoso, chamado de ceto-enólico, ocorre a migração de um átomo de hidrogênio (diretamente ligado a um carbono vizinho à carbonila) para o oxigênio da carbonila. Esse fenômeno leva à formação de uma nova substância, pertencente à outra função orgânica, porém com fórmula molecular idêntica à da substância original. Dizemos, então, que esses compostos são isômeros. Considere a figura a seguir e assinale a alternativa que apresenta o tipo de isomeria que se estabelece entre a propano-2-ona e o prop-1-en-2-ol: AUTOATIVIDADE 206 FONTE: O autor a) ( ) Isomeria de cadeia. b) ( ) Isomeria de posição. c) ( ) Isomeria de função. d) ( ) Isomeria de dinâmica (tautomeria). e) ( ) Isomeria de compensação (metameria). 3 O ciclopropano, composto usado como anestésico, e o propeno, utilizado como matéria- prima para a produção de polímeros, são isômeros entre si. Descreva a fórmula estrutural de cada um, as suas fórmulas moleculares e o tipo de isomeria desses compostos. 4 Em um cenário de ficção científica, um cientista constrói uma máquina de teletrans- porte, na qual todas as ligações químicas dos compostos presentes na cabine A são quebradas, e os átomos são transportados para a cabine B, na qual as ligações são refeitas. Para o teste de teletransporte, foi escolhido o composto uísque lactona (I), presente no carvalho e um dos responsáveis pelo sabor do uísque. A figura, a seguir, mostra um teste hipotético, em que, colocando o composto I na cabine A, após o te- letransporte, foi observado o composto II na cabine B. FONTE: <https://bit.ly/3sbaa5f>. Acesso em: 12 fev. 2022. Sobre esse experimento, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) O experimento foi um sucesso, pois o composto II é exatamente a mesma molécula que o composto I. b) ( ) O experimento foi um sucesso, pois, embora os compostos I e II sejam enantiômeros, eles apresentam propriedades físicas e químicas iguais. c) ( ) O experimento não foi um sucesso total, pois os compostos I e II têm propriedades diferentes, sendo isômeros de posição. 207 d) ( ) O experimento não foi um sucesso total, pois os compostos I e II têm propriedades diferentes, sendo isômeros de função. e) ( ) O experimento não foi um sucesso total, pois os compostos I e II têm propriedades diferentes, sendo isômeros geométricos (trans e cis). 5 Durante uma investigação química, descobriu-se três substâncias orgânicas, descritas pela mesma fórmula molecular: C3H8O. Sabe-se que “A” tem apenas um hidrogênio ligado a um carbono secundário e é isômero de posição de “C”. Tanto “C” quanto “A” são isômeros de função de “B”. Com base nessas informações, as substâncias A, B e C são, respectivamente: a) ( ) Isopropanol, propan-1-ol e metoxietano. b) ( ) Metoxietano, isopropanol e propan-1-ol. c) ( ) Propan-2-ol, metoxietano e propan-1-ol. d) ( ) Etoxietano, propan-2-ol e metoxietano. e) ( ) 1-propanol, propan-2-ol e metoxietano. 208 209 TÓPICO 3 - REAÇÕES QUÍMICAS EM QUÍMICA ORGÂNICA 1 INTRODUÇÃO No século XVIII, Antoine-Laurent de Lavoisier cunhou a celebre frase “Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” (PINCELI, 1997). Após anos de estudo, ele observou que todas as reações químicas são, na verdade, transformações da matéria, nas quais a proporção das massas sempre é conservada, porém, para evidenciar a veracidade desse fenômeno, os experimentos científicos devem ser realizados em ambiente fechado. No entanto, foi somente no século XIX, após a síntese da ureia (realizadapelo químico francês Friedrich Wöhler) e o consequente nascimento da química orgânica, que os químicos buscaram desenvolver compostos já existentes na natureza (CANTO; PERUZZO, 2006). Considerando que existem inúmeras substâncias orgânicas, a quantidade de reações químicas possíveis também deve ser muito grande. Embora muito numerosas, as principais reações orgânicas seguem padrões bem definidos, o que facilita nossa compreensão ao estudarmos suas etapas. É importante sabermos que as leis da química continuam valendo mesmo nas reações da química orgânica, ou seja, ácidos reagem com bases, oxidantes reagem com redutores, moléculas polares (em geral) são mais reativas que apolares; o comprimento das ligações, sua estabilidade, ângulo e força de ligação também são fatores que influenciam diretamente as reações orgânicas (FELTRE, 2004). Nesse contexto, o conhecimento básico da reatividade das moléculas orgânicas influencia no nosso dia a dia, pois elas são amplamente empregadas na transformação da matéria-prima proveniente da indústria petroquímica, dos animais e dos vegetais em novos produtos, como medicamentos, plásticos, corantes, fibras têxteis artificiais, perfumes, produtos de limpeza e higiene pessoal, entre outros produtos. Normalmente, as reações estudadas na química orgânica são mais lentas que as estudadas na química inorgânica, porque as reações orgânicas envolvem substâncias moleculares, enquanto as inorgânicas ocorrem, basicamente, entre compostos iônicos. Dessa maneira, por serem substâncias iônicas, que já estão quimicamente aptas, “disponíveis”, para reagir, tornando o processo muito mais rápido, muitas vezes, instantâneo. Por outro lado, as reações moleculares, em geral, são mais lentas, pois necessitam a clivagem de ligações nas moléculas iniciais (reagentes) para ocorrer à transformação e originar novas ligações que resultaram em novas moléculas (produtos da reação). UNIDADE 3 2 REAÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO As reações de substituição, como o próprio nome sugere, são aquelas em que ocorre a substituição de um átomo (ou grupo de átomos) de uma molécula orgânica (pre- cursora) por outro átomo (ou grupo de átomos) (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). 210 Toda vez que nos referirmos à molécula orgânica que iniciará a reação orgânica e “sofrerá” a substituição (adição ou eliminação), ela será denominada como molécula precursora ou “molécula-alvo”, já que será “atacada” pelos demais reagente para originar o produto desejado. DICA De modo geral, a reação de substituição pode ser descrita da seguinte forma: FIGURA 23 – REAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO FONTE: O autor Observamos que o princípio básico das reações de substituição é a troca mútua de um componente A entre os reagentes I e II da reação. É importante saber que esse tipo de reação ocorre principalmente com alcanos, hidrocarbonetos aromáticos (benzeno e seus derivados) e com haletos orgânicos. A seguir, veremos alguns exemplos das reações de substituição mais importantes: halogenação, nitração, sulfonação, alquilação e acilação. 2.1 SUBSTITUIÇÃO EM ALCANOS Os alcanos, também chamados hidrocarboneto parafínico (do latim parum affinis), são compostos que apresentam baixa reatividade química. De fato, por terem estruturas moleculares formadas exclusivamente por átomos de carbono e hidrogênio que se ligam, unicamente, através de ligações simples (C ─ H e C ─ C), originam moléculas pouquíssimo polarizadas (apolares), estáveis e relativamente fortes (FELTRE, 2004). Assim, as reações envolvendo alcanos necessitam de condições especiais de pressão e temperatura, algumas vezes, recorrem a utilização de luz ultravioleta e aquecimento, tudo isso para facilitar e acelerar o processo reacional. A seguir, veremos alguns exemplos das reações de substituição mais importantes e comuns que ocorrem com os alcanos. 211 FIGURA 24 – EXEMPLO DE HALOGENAÇÃO FONTE: Adaptada de Feltre (2004) 2.1.1 Halogenação A halogenação é uma reação de substituição, assim chamada porque um alcano (R-CH3) reage com uma substância simples halogenada (por exemplo: F2, Cl2, Br2 e I2), formando haleto orgânico (R-CH2-Cl) e hidro-halogênio halogenado (HCl). Apesar de poderem ocorrer com todos os halogênios, as reações mais comuns são a cloração (Cl2) e a bromação (Br2) (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Para compreendermos melhor, podemos observar o exemplo a seguir: Nessa equação, descreve-se a monocloração do metação, ou seja, a substituição de um átomo de hidrogênio presente no metano (CH3 ─ H) por um átomo de cloro. Além disso, percebemos que os produtos são originados em decorrência da saída de um hidrogênio do alcano e de um átomo de halogêneo da substância simples halogenada. Assim, o hidrogênio interage com o átomo de halogêneo, formando o hidro-halogênio correspondente (HCl); já o outro átomo de cloro (Cl–), liga-se diretamente ao alcano, formando um haleto orgânico. Após a monocloração de um alcano, se a reação ocorrer em meio com excesso de cloro e com o auxílio de calor e de luz ultravioleta, o metano pode sofrer substituição nos demais hidrogênios de sua molécula, obtendo os seguintes produtos: clorometano, diclorometano, triclorometano e tetraclorometano, como representado na reação a seguir: INTERESSANTE FIGURA – CLORAÇÃO DO METANO FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) Esses compostos clorados, derivados do metano, são muito utilizados como solventes não inflamáveis, trazendo maior segurança para o trabalho realizado nos laboratórios e na indústria química, a qual faz uso de solventes orgânicos, já que a maioria dos solventes orgânicos é altamente inflamável, o que pode causar diversos tipos de acidentes (FELTRE, 2004; CANTO; PERUZZO, 2006). 212 Quando a molécula do alcano é ramificada e existem várias possibilidades de substituições, o produto da reação sempre será uma mistura de isômeros. Os diferentes produtos formados na cloração do 2-metil-butano podem ser vistos na Figura 25. FIGURA 25 – HALOGENAÇÃO DE ALCANO RAMIFICADO: MISTURA DE PRODUTOS ISÔMEROS FONTE: Canto; Peruzzo (2006, p. 168) Percebemos que os produtos (isômeros) são formados em proporções diferentes. A porcentagem desses produtos é influenciada, em grande parte, pela facilidade com que o hidrogênio “sai” do hidrocarboneto. Hidrogênios ligados a carbonos terciários saem com maior facilidade, seguidos dos ligados aos carbonos secundários e, por fim, dos primários. 2.1.2 Nitração A nitração é uma reação de substituição, assim chamada porque um alcano (R-CH3) reage com ácido nítrico (HNO3), originando um nitrocomposto (R-CH2-NO2) e água (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Um exemplo pode ser observado na Figura 26. 213 FIGURA 26 – EXEMPLO DE NITRAÇÃO FIGURA 27 – EXEMPLO DE SULFONAÇÃO FONTE: Adaptada de Feltre (2004) FONTE: Adaptada de Feltre (2004) Nessa equação, a formação dos produtos ocorre em virtude da saída de um hidrogênio do alcano e de um grupo hidroxila (OH) do ácido nítrico. Assim, o hidrogênio interage com a hidroxila, formando água; já o íon NO2 – (restante do ácido nítrico) é inserido no alcano, originando o nitrocomposto correspondente ao nitrometano. 2.1.3 Sulfonação A sulfonação é uma reação de substituição, assim denominada porque um alcano (R-CH3) reage com ácido sulfúrico (H2SO4), formando o ácido sulfônico (R-CH2- SO3H) correspondente e água (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Nessa equação, a formação dos produtos ocorre em virtude da saída de um hidrogênio do alcano e de um grupo hidroxila (OH) do ácido sulfúrico. Após isso, o hidrogênio interage com a hidroxila, formando água; já o íon SO3H – (restante do ácido sulfúrico) é inserido no alcano, originando o ácido sulfônico correspondente ao ácido metanossulfônico. De modo geral, podemos dizer que as substituições nos alcanos envolvem três etapas: • 1ª etapa: ocorre a quebra da ligação existente entre halogênios (na halogenação) ou entre o nitrogênio e a hidroxila (na nitração), ou entre o oxigênioe a hidroxila de um ácido sulfúrico (na sulfonação). • 2ª etapa: ocorre a clivagem da ligação carbono-hidrogênio de um alcano ou do anel benzênico. • 3ª etapa: por fim, tem-se a formação de novas ligações entre os átomos (ou grupos) que foram inicialmente separados. 214 2.2 SUBSTITUIÇÃO EM COMPOSTOS AROMÁTICOS Os compostos aromáticos também sofrem reações de substituição similares às estudadas nos alcanos. Portanto, elas funcionam de maneira análoga às reações de dupla-troca ou deslocamento que aprendemos em química inorgânica. É importante sabermos que as reações de substituição aromática são chamadas de substituição aromática eletrofílica (SEAr), pois são reações orgânicas em que ocorre a substituição de um ligante presente no anel aromático (rico em elétrons pi) por um átomo (ou agregado atômico) deficiente de elétrons, chamado de eletrófilo (VOLLHARDT; SCHORE, 2013). As substituições aromáticas eletrofílicas mais importantes são a nitração aromática, a halogenação aromática, a sulfonação aromática, a alquilação de Friedel-Crafts e a acilação de Friedel-Crafts. 2.2.1 Halogenação aromática A halogenação aromática é uma reação de substituição, em que um composto aromático, representado pelo benzeno (C6H6), reage a uma substância simples halogenada (geralmente, Cl2 ou Br2), formando um haleto orgânico aromático (C6H6 ─ Cl) e um hidrácido halogenado (HCl). Para essa reação ocorrer, é necessária a utilização de ácidos de Lewis (AlCl3 , FeBr 3 , FeCl 3 ) como catalisadores (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). FIGURA 28 – EXEMPLO DE HALOGENAÇÃO AROMÁTICA FONTE: Adaptada de Feltre (2004) A formação dos produtos ocorre em função da saída de um átomo de hidrogênio, presente na estrutura molecular do benzeno, e de um átomo de halogêneo da substância simples halogenada. Assim, o hidrogênio interage com o átomo de halogêneo, formando o hidrácido halogenado (HCl), enquanto o outro átomo de halogêneo restante da substância halogenada liga-se ao benzeno, formando o haleto orgânico aromático denominado de clorobenzeno (ou cloreto de fenila). 215 FIGURA 29 – EXEMPLO DE NITRAÇÃO AROMÁTICA FONTE: Adaptada de Feltre (2004) 2.2.2 Nitração aromática A nitração aromática é uma reação de substituição em que um composto aromático, representado pelo benzeno (C6H6), reage com o ácido nítrico (HNO3), originando um nitrobenzeno (C6H6 ─ NO2) e água como produtos da reação. Para que a reação ocorra, é necessária a utilização de ácido sulfúrico (H2SO4 ) como catalisador (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). A formação dos produtos ocorre com a saída de um átomo de hidrogênio, presente na estrutura molecular do benzeno, e de uma hidroxila (OH) do ácido nítrico. Assim, o hidrogênio interage com a hidroxila, formando uma molécula de água e o íon nitrito (NO2 –), e o restante do ácido nítrico liga-se ao benzeno, formando o nitrobenzeno. 2.2.3 Sulfonação aromática A sulfonação aromática é uma reação de substituição em que um composto aromático, representado pelo benzeno (C6H6), reage com o ácido sulfúrico (H2SO4), formando um ácido benzenossulfônico (C6H6 ─ SO3H) e água. Para que essa reação ocorra, é necessária a utilização de calor como catalisador (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). FIGURA 30 – EXEMPLO DE SULFONAÇÃO AROMÁTICA FONTE: Adaptada de Feltre (2004) A formação dos produtos ocorre através da saída de um átomo de hidrogênio, presente na estrutura molecular do benzeno, e de uma hidroxila (OH) do ácido sulfúrico. Assim, o hidrogênio interage com a hidroxila (OH), formando água, enquanto o íon SO3H – (restante do ácido sulfúrico) liga-se ao benzeno, originando o ácido sulfônico que corresponde ao ácido benzenossulfônico. 216 2.2.4 Alquilação e acilação de Friedel-Crafts Na química orgânica, um grupo de átomos, originados de um hidrocarboneto, através da remoção de um hidrogênio de um carbono saturado, é denominado grupo alquila. Já um grupo de átomos originados de um ácido carboxílico, através da remoção de uma hidroxila (OH), é denominado grupo acila. Dessa forma, podemos obter haletos orgânico de ambos os tipos, ou seja, tanto na forma de haletos de alquila quanto na forma de haletos de acila. Como esse processo não se dá de forma espontânea, é necessária a utilização de catalisadores, geralmente ácidos de Lewis (como AlCl 3 , FeBr 3 e FeCl 3 ) (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). A alquilação de Friedel-Crafts é uma reação de substituição em que um composto aromático, representado pelo benzeno (C6H6), reage com um haleto orgânico (por exemplo, CH3Cl), formando um hidrocarboneto aromático ramificado (C6H6 ─ R) e água. Para que essa reação ocorra, é necessário adicionar cloreto de alumínio (AlCl3) como catalisador (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). FIGURA 31 – ALQUILAÇÃO DE FRIEDEL-CRAFTS FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) A formação dos produtos ocorre através da saída de um átomo de hidrogênio, presente na estrutura molecular do benzeno, e do radical alquila (R), presente no haleto orgânico. Assim, o hidrogênio interage com o átomo de halogêneo, formando o hidro- haleto correspondente (HCl), e o radical alquila (restante do haleto) liga-se ao benzeno, formando um hidrocarbonero aromático ramificado, chamado de metilbenzeno (tolueno). Já a acilação de Friedel-Crafts é uma reação de substituição em que um composto aromático, representado pelo benzeno (C6H6), reage com um cloreto de ácido orgânico (R ─ COCl), formando uma cetona (C6H6CO ─ R) e um hidro-halogênio (HCl). Para que a reação ocorra, é necessário adicionar cloreto de alumínio (AlCl3) como catalisador (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). 217 FIGURA 32 – ACILAÇÃO DE FRIEDEL-CRAFTS FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) A formação dos produtos ocorre através da saída de um átomo de hidrogênio, presente na estrutura molecular do benzeno, e do radical acila do cloreto de ácido orgânico. Assim, o hidrogênio interage com o átomo de halogêneo, formando o hidro-haleto correspondente (HCl), e o radical acila (restante do cloreto de ácido orgânico) liga-se ao benzeno, formando uma cetona aromática chamada de metil-fenil-cetona (1-feniletanona). Quando já existe um grupo (G) ligado ao anel benzênico de um composto aromático, ele influenciará a reação (SEAr), “orientando” a entrada dos grupos substituintes, ou seja, ele direcionará a substituição dos hidrogênios das posições ORTO, META ou PARA. • Certos grupos facilitam a reação e orientam a entrada de um segundo grupo na estrutura no anel aromático, direcionando a reação de substituição nas posições orto (1,2) e para (1,4), por isso, são chamados de grupos ORTO-PARA dirigentes ou ATIVANTES. De modo geral, são formados por um único átomo ou por um grupo de átomos que estão unidos apenas por ligações SIGMA (ligações simples). Alguns exemplos são: halogênios (cloro, bromo e iodo), hidroxila (OH), amina (NH2), e radicais alquila (metila, etila, propila etc.). Um exemplo de uma substituição eletrofílica aromática com um grupo ativante, orto- para dirigente pode ser visto na figura a seguir: ATENÇÃO FIGURA – EXEMPLO DE UM GRUPO ATIVANTE, ORTO-PARA DIRIGENTE FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) 218 • Entretanto, outros grupos dificultam a reação e orientam a entrada de um segundo grupo na estrutura no anel aromático, direcionando a reação de substituição nas posições meta (1,3), por isso, são chamados de grupos META dirigentes ou DESATIVANTES. De modo geral, são formados por átomos que estão unidos por ligação dupla, tripla ou dativa (ligações pi). Alguns exemplos são: os grupos nitro (NO2), sulfônico (HSO3 H), carbonilas (C=O), nitrilas (C≡C) e carboxilas (COOH). Observa-se um exemplo de uma substituição eletrofílica aromática com um grupo desativante, meta dirigente na figura a seguir: FIGURA – EXEMPLO DE UM GRUPO DESATIVANTE, META DIRIGENTE FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) FONTE: Canto; Peruzzo (2004); Vollhardt; Schore (2013). 3 REAÇÕES DEADIÇÃO As reações de adição, como o próprio nome sugere, são aquelas em que ocorre a adição de átomos ou agregados atômicos em uma molécula orgânica. Esse tipo de reação ocorre, principalmente, em compostos insaturados, ou seja, aqueles que contêm ao menos uma ligação dupla ou tripla em sua estrutura molecular. Para que ocorra uma reação de adição, o pré-requisito é que a molécula-alvo contenha pelo menos uma insaturação em sua estrutura, ou seja, um carbono com hibridização Sp2 ou Sp3, de modo que haja a presença de uma ligação do tipo π (pi). É importante lembrarmos que as insaturações são formadas por uma ligação sigma (σ) e uma π, nas ligações duplas, e uma σ e duas π, nas ligações triplas. Durante o processo de adição, a ligação pi (π), que é mais fraca que a ligação sigma (σ) da insaturação, é rompida, permitindo a adição de átomos ou grupos de átomos aos carbonos que participavam da dupla ou tripla ligação (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013) Assim, para cada quebra de uma ligação π, acontece a formação de duas ligações do tipo sigma (σ). O mecanismo das reações de adição à dupla ligação (C=C) pode ser compreendido ao lembrarmos que a dupla ligação é um local com alta densidade elétrica, isto é, uma região na estrutura molecular rica em elétrons pi (π). Dessa forma, 219 ela consegue atrair íons positivos (H+) de moléculas vizinhas, como ácidos (HCl, HBr, HI etc.), e, até mesmo, da própria água (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). A Figura 33 mostra o mecanismo da reação do propeno com o HBr. FIGURA 33 – MECANISMO DA REAÇÃO DO PROPENO COM O HBR FONTE: Adaptada de Feltre (2004) É importante observarmos que a reação ocorre em duas etapas. Na primeira, ocorre o ataque eletrófilo do cátion hidrogênio (H+ proveniente da dissociação do ácido, nesse caso, o ácido bromídrico HBr) à molécula do propeno (CH2 = CH ─ CH3), gerando um íon de carbono (carbocátion). Como o carbocátion é muito instável e extremamente reativo, ele (imediatamente) dá início à segunda etapa da reação, originando o produto desejado (FELTRE, 2004). Eletrófilo é um átomo ou uma molécula que aceita um par de elétrons, para formar uma ligação covalente. Costuma ser chamado de ácido de Lewis. DICA De modo geral, os casos mais comuns de adição ocorrem nas ligações duplas (C=C) e triplas (C≡C) e nas carbonilas (C=O). A seguir, veremos alguns exemplos das reações orgânicas de adição mais importantes: hidrogenação catalítica, halogenação, adição de haletos de hidrogênio e hidratação. 3.1 HIDROGENAÇÃO CATALÍTICA A hidrogenação é uma reação química em que uma molécula orgânica reage com o hidrogênio (H2) na presença de um catalisador, que pode ser o níquel metálico (Ni(s)), a platina (Pt(s)) e o paládio (Pd(s)), daí o nome hidrogenação catalítica, pois 220 promove a quebra de uma ligação pi e subsequente adição de átomos de hidrogênio (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). A Figura 34 demonstra um exemplo de hidrogenação de alceno. FIGURA 34 – EXEMPLO DE HIDROGENAÇÃO DE ALCENO FONTE: O autor Nessa equação, mantendo-se as condições ideais de temperatura e pressão, aliadas à presença de um catalisador, a molécula inicial perde sua insaturação. No exemplo em questão, temos a hidrogenação do eteno, que dá origem ao etano. Quando a hidrogenação catalítica ocorre em alcenos, ela costuma ser chamada de reação de Sabatier-Senderens, em homenagem ao químico Paul Sabatier (ganhador do prêmio Nobel de Química, em 1912, pela descoberta desse tipo de reação) e seu assistente Senderens. Essa reação é amplamente utilizada na indústria química e alimentícia, podendo criar margarinas a partir de óleos vegetais, ou seja, um lipídio líquido com ligações insaturadas é transformado em gorduras sólidas (saturadas) pela hidrogenação catalítica. INTERESSANTE É importante sabermos que, nas reações de adição de hidrogênio em moléculas contendo tripla ligação (alcinos) ou com mais de uma insaturação (como nos dienos), o processo é o mesmo. No entanto, temos a reação “dividida” em duas etapas, uma vez que, nessas moléculas, duas ligações pi serão rompidas e, consequentemente, para gerar o produto final, ocorrerá um consumo maior de hidrogênio. Nesses casos, para que a reação seja completada, ou seja, ocorra a hidrogenação completa da molécula inicial, eliminando todas as suas insaturações, é necessário utilizar um catalisador forte, pois a hidrogenação apresenta um processo lento na segunda etapa da reação. Se o catalisador não for forte o suficiente ou estiver em pequena quantidade, essa etapa não acontecerá. Embora sejam menos reativos que os alcenos, o ponto vulnerável dos alcinos é a ligação tripla. Ao serem quebradas duas vezes, gerarão o dobro de reações de adição vistas para os alcenos. Um exemplo de hidrogenação de alcino é apresentado na Figura 35. 221 FIGURA 35 – EXEMPLO DE HIDROGENAÇÃO DE ALCINO FONTE: O autor Nessa equação, o processo ocorre em duas etapas. Na primeira, temos a formação do alceno correspondente, a partir da quebra de uma ligação pi do alcino inicial. Já na segunda etapa, temos como produto da reação um alcano, a partir da quebra da ligação pi presente na insaturação do alceno. Se for empregado um catalisador forte (como Ni ou Pt), a reação produzirá diretamente o alcano; por outro lado, se for usado um catalisador mais fraco (como Pd, misturado com BaSO4), a reação parará no alceno (FELTRE, 2004). 3.2 HALOGENAÇÃO Para que ocorra a halogenação, ou seja, a adição de átomos de halogênio (F, Cl, Br ou I), é necessário que aconteça a clivagem de uma insaturação, isto é, a quebra de uma ligação π, para que haja a adição de átomos novos à estrutura molecular. Todavia, para esse tipo de reação, não consideraremos a adição de flúor (F), que, por ser um átomo muito reativo, em virtude de sua grande eletronegatividade, pode destruir a molécula orgânica original (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). FIGURA 36 – EXEMPLO DE HALOGENAÇÃO FONTE: O autor Nessa equação, a reação existente se dá entre o eteno (função alceno) e o cloro (no estado gasoso), originando o 1,2-dicloro-etano (função haleto orgânico), também chamado de cloreto de etileno. É importante saber que a halogenação é um processo espontâneo, por isso não requer a presença de um catalisador. Dessa forma, nas reações com alcinos ou moléculas orgânicas com mais de uma insaturação, a reação continuará acontecendo (espontaneamente) enquanto houver reagentes e insaturações na estrutura molecular (FELTRE, 2004). 222 FIGURA 37 – EXEMPLO DE HALOGENAÇÃO DE ALCINO FONTE: O autor Nessa equação, assim como ocorre na hidrogenação, a halogenação de alcinos se dá em duas etapas. Na primeira, temos a formação do haleto correspondente, a partir da quebra de uma ligação pi do alcino inicial. Já na segunda etapa, temos como produto da reação um di-haleto, a partir do rompimento da ligação pi presente na insaturação do haleto. Independentemente do tipo de insaturação presente na estrutura molecular do composto “inicial” (precursor), existe uma ordem de reatividade entre os halogênios, na qual temos: Cl2 > Br2 > I2 (FELTRE, 2004). 3.3 HIDRO-HALOGENAÇÃO Para que ocorra a hidro-halogenação, ou seja, a adição de um hidrogênio e um halogênio em uma molécula orgânica, é necessário que, assim como nos casos anteriores, ocorra a clivagem de uma insaturação, isto é, o rompimento de uma ligação π para que haja a adição dos novos átomo na estrutura molecular (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Assim como ocorre na halogenação, para esse tipo de reação, não consideramos a adição de flúor (F), que, por ser um átomo muito reativo, em virtude de sua grande eletronegatividade, pode destruir a molécula orgânica original. FIGURA 38 – EXEMPLO DE HIDRO-HALOGENAÇÃO FONTE: O autor Nessa equação, observamos que não é necessário o uso de catalisadores, pois se trata de uma reação espontânea; além disso, a reação se dá entre o eteno (função alceno) e o hidro-halogênio (um ácido inorgânico),originando o composto chamado de bromoetano (função haleto orgânico). Alguns pontos são importantes: 223 FIGURA 39 – EXEMPLO DE REAÇÃO DE HIDRATAÇÃO FONTE: O autor • Por ser um processo espontâneo, na hidro-halogenação de alcinos ou de moléculas orgânicas com mais de uma insaturação, a reação continuará acontecendo (espon- taneamente) enquanto existirem reagentes e insaturações na estrutura molecular do composto orgânico (FELTRE, 2004). • A ordem de reatividade está diretamente associada à capacidade de o ácido (hi- dro-halogênio) doar prótons (H+), ou seja, com a força do ácido utilizado na reação. Portanto, temos a seguinte ordem de reatividade: HI > HBr > HCl (FELTRE, 2004). 3.4 HIDRATAÇÃO Nas reações de hidratação, ou seja, de adição de uma molécula de água à estrutura molecular de compostos orgânicos, é necessário que, assim como nos casos anteriores, ocorra a clivagem de uma insaturação, isto é, há o rompimento de uma ligação π para que haja a adição dos novos átomo na estrutura molecular. Além disso, a reação exige um meio acidificado (FELTRE, 2004; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Nessa equação, nas condições impostas pelo sistema reacional, uma molécula de água é dividida em duas partes: hidroxila e hidrogênio, e ambos são adicionados em carbonos vizinhos, que, antes, faziam parte da dupla ligação. No entanto, esse processo não é exclusivo das ligações duplas; na verdade, um mecanismo muito semelhante é observado nas triplas ligações (e em moléculas orgânicas com mais de uma insaturação) – a reação ocorrerá em duas (ou mais etapas) enquanto existirem reagentes e insaturações na estrutura molecular do composto orgânico (FELTRE, 2004). Em reações de hidro-halogenação e de hidratação, cuja estrutura molecular do composto orgânico precursor (inicial) apresenta cadeia carbônica assimétrica em relação à ligação dupla (C=C), podemos imaginar a formação de dois produtos diferentes. Assim, podemos observar a hidro-halogenação do propeno, a partir da sua reação com ácido clorídrico (HCl), conforme representado na figura a seguir: ATENÇÃO 224 FIGURA – EXEMPLO DE HIDRO-HALOGENAÇÃO DO PROPENO FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) No entanto, um desses isômeros (compostos diferentes com mesma fórmula molecular) possui maior probabilidade de ocorrer. Na prática, só é observada a formação de um produto (representado em A). Os cientistas perceberam que esse fenômeno ocorria independentemente do ácido halogenado presente, ou seja, também foi observado nas reações de adição com ácido bromídrico (HBr), iodídrico (HI) e, até mesmo, com água (H ─ HO) (CANTO; PERUZZO, 2006). Em 1869, o químico russo Vladimir Markovnikov conseguiu compreender a ocorrência de tal fenômeno e estabeleceu a seguinte regra, hoje conhecida como regra de markovnikov: na adição de hidro-halogenação ou de H2O (hidratação) a uma ligação dupla (C=C), o átomo de H adiciona-se, preferencialmente, ao carbono da dupla, que já contém mais hidrogênios, ou seja, o H adiciona-se ao carbono que contém mais átomos hidrogenados diretamente ligados a ele (CANTO; PERUZZO, 2006). 3.5 REAÇÕES DE ADIÇÃO EM COMPOSTOS AROMÁTICOS Para compreender como ocorrem as adições em compostos orgânicos aromáticos, recordaremos o conceito de ressonância; para isso, a Figura 40 mostra a estrutura precursora de todo o composto aromático, o benzeno. FIGURA 40 – RESSONÂNCIA DO ANEL AROMÁTICO: BENZENO FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) 225 FIGURA 41 – HIDROGENAÇÃO E HALOGENAÇÃO FORÇADAS DO BENZENO FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) Na Figura 40, as estruturas A e B são muito semelhantes, mas o que muda é a posição de suas insaturações. Assim, dizemos que elas são hibridas de ressonância. O termo ressonância é usado para descrever uma situação em que, sem alterar a posição dos átomos, podemos escrever mais de uma fórmula estrutural diferente, modificando apenas a posição de alguns elétrons – no caso, mudando de posição as ligações duplas. É importante saber que, apesar de representarmos o benzeno tanto da forma estrutural A quanto na B, isoladamente, nenhuma delas representa bem o benzeno. Na verdade, os elétrons das ligações duplas não se localizam nem como em A nem como em B. Dizemos, então, que os elétrons das ligações duplas estão deslocalizados e que o benzeno é um híbrido de ressonância, ou seja, a forma mais correta para sua representação é mostrada na Figura 40C (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Anteriormente, vimos que os compostos aromáticos se caracterizam pelas reações de substituição. Se o anel benzênico (aromático) é insaturado, por que não sofre adição? A resposta está diretamente correlacionada com o fenômeno da ressonância. Em função da ressonância, não existem (realmente) ligações simples e duplas no anel benzênico. Na verdade, as ligações carbono-carbono, existentes na sua estrutura, têm caráter intermediário às ligações (puramente) simples (C ─ C) e duplas (C = C). De fato, medidas experimentais comprovam que as ligações carbono-carbono, presentes no benzeno, são da ordem de 140 pm (picometro, 10–12 metros); já as ligações simples têm tamanho estimado em 153 pm e as duplas de 133 pm. Por essa razão, o benzeno não costuma fazer reações de adição, e sim reações de substituição, características de compostos saturados (CANTO; PERUZZO, 2006; VOLLHARDT; SCHORE, 2013). Entretanto, em condições especiais de temperatura e pressão, aliadas ao uso de catalisadores especiais, podem forçar as reações de adição em compostos aromáticos. Os exemplos mais interessantes dessas reações forçadas são a hidrogenação e a halogenação (Figura 41). 226 3.6 REAÇÕES DE ADIÇÃO À CARBONILA A carbonila, grupo orgânico formado por um carbono Sp2 diretamente ligado a um átomo de oxigênio (ligação dupla, pi) e outras duas ligações simples (sigma), é encontrada nos compostos orgânicos pertencentes à função cetona, aldeído, ácido carboxílico, ésteres e anidridos, porém, abordaremos as reações de adição que ocorrem em aldeídos e cetonas. De modo geral, esses compostos são muito reativos, sendo os aldeídos mais reativos do que as cetonas (CANTO; PERUZZO, 2006). Tanto a hidrogenação de aldeídos quanto a hidrogenação de cetonas não são processos espontâneos e, portanto, são necessárias condições especiais de pressão e temperatura, aliadas à adição de catalisadores (Ni(s)). Na Figura 41A, está representada a hidrogenação forçada do benzeno, levando à produção do ciclano (ciclo alcano) correspondente ao chamado ciclo-hexano. Já na Figura 41B, está representada a halogenação forçada do benzeno, obtendo como produto da reação o haleto orgânico, chamado de 1,2,3,4,5,6-hexacloro-ciclo-hexano. Esse processo ocorre de forma semelhante para os demais halogênios (Br e I). FIGURA 42 – HIDROGENAÇÃO DE CETONA E ALDEÍDO FONTE: O autor Nessas equações, mantidas as condições necessárias à reação de hidrogenação, temos a formação de um álcool secundário, a partir de uma cetona e um álcool primário, com base em um aldeído. Esse fenômeno mantém-se independentemente da acetona ou do aldeído utilizado como reagente precursor. O mecanismo das reações de adição à carbonila (C=O) pode ser compreendido ao lembrarmos que o ponto reativo da molécula de um aldeído ou cetona é, sem dúvida, a carbonila, uma vez que representa uma ligação altamente polarizada, que, além disso, contém ressonância (Figura 43). 227 FIGURA 43 – RESSONÂNCIA DA CARBONILA FIGURA 44 – MECANISMO DA REAÇÃO DE ADIÇÃO DE CIANIDRETO (HCN) À CARBONILA FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) FONTE: Adaptada de Canto; Peruzzo (2006) Na Figura 43, a deslocalização eletrônica (migração dos elétrons presentes na ligação pi em direção ao átomo mais eletronegativo, o oxigênio) origina uma estrutura em que o carbono (carbonílico) está deficiente em elétrons, ou seja, momentaneamente, está com carga positiva. Nesse híbrido de ressonância, o carbono está suscetível a ataques nucleofílicos, isto é, aos “ataques” por