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Andrea Thompson Da Poian Debora Foguel Marílvia Dansa Petretski Olga Lima Tavares Machado Bioquímica II 2Volume4, 5, 6 e 7Módulos 2ª edição Andrea Thompson Da Poian Debora Foguel Marílvia Dansa Petretski Olga Lima Tavares Machado Volume 2 - Módulos 4, 5, 6 e 7 2a edição Bioquímica II Apoio: Material Didático Referências Bibliográfi cas e catalogação na fonte, de acordo com as normas da ABNT. Copyright © 2004, Fundação Cecierj / Consórcio Cederj Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Fundação. D111b Da Poian, Andrea Thompson. Bioquímica II. v. 2 / Andrea Thompson Da Poian. -- 2.ed. – Rio de Janeiro : Fundação CECIERJ, 2007. 270p.; 19 x 26,5 cm. ISBN: 85-89200-46-9 1. Respiração celular. 2. Ciclo de Krebs. 3. Metabolismo de aminoácidos. 4. Uréia. 5. Metabolismo de carboidratos. 6. Degradação. Sintese de ácidos. 7. Glicose. 8. Biossintese. 9. Insulina. 10. Glicocorticóides. I. Foguel, Debora. II. Petretski, Marílvia Dansa. III. Machado, Olga Tavares. IV. Título. CDD: 572 ELABORAÇÃO DE CONTEÚDO Andrea Thompson Da Poian Debora Foguel Marílvia Dansa Petretski Olga Lima Tavares Machado COORDENAÇÃO E REVISÃO Ana Tereza de andrade DESIGN INSTRUCIONAL E REVISÃO Alexandre Rodrigues Alves Carmen Irene Correia de Oliveira José Meyohas REVISÃO TÉCNICA Marta Abdala 2007/2 Fundação Cecierj / Consórcio Cederj Rua Visconde de Niterói, 1364 – Mangueira – Rio de Janeiro, RJ – CEP 20943-001 Tel.: (21) 2299-4565 Fax: (21) 2568-0725 Presidente Masako Oya Masuda Coordenação do Curso de Biologia UENF - Ana Beatriz Garcia UFRJ - Masako Oya Masuda UERJ - Cibele Schwanke EDITORA Tereza Queiroz COORDENAÇÃO EDITORIAL Jane Castellani REVISÃO TIPOGRÁFICA Jane Castellani Kátia Ferreira dos Santos COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO Jorge Moura PROGRAMAÇÃO VISUAL Equipe CEDERJ COORDENAÇÃO DE ILUSTRAÇÃO Eduardo Bordoni ILUSTRAÇÃO Jefferson Caçador Salmo Dansa Sami Souza CAPA Eduardo Bordoni PRODUÇÃO GRÁFICA Andréa Dias Fiães Fábio Rapello Alencar Departamento de Produção Universidades Consorciadas Governo do Estado do Rio de Janeiro Secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação Governador Alexandre Cardoso Sérgio Cabral Filho UENF - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO Reitor: Almy Junior Cordeiro de Carvalho UERJ - UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Reitor: Nival Nunes de Almeida UNIRIO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Reitora: Malvina Tania Tuttman UFRRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO Reitor: Ricardo Motta Miranda UFRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Reitor: Aloísio Teixeira UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Reitor: Roberto de Souza Salles Bioquímica II SUMÁRIO Módulo 4 Aula 12 - Respiração celular ____________________________________7 Aula 13 - Ciclo de Krebs - Parte 1 ______________________________ 17 Aula 14 - Ciclo de Krebs - Parte 2 ______________________________ 29 Aula 15 - Metabolismo de carboidratos I _________________________ 51 Aula 16 - Metabolismo de carboidratos II ________________________ 65 Módulo 5 Aula 17 - A oxidação dos aminoácidos e a produção de uréia _________ 83 Aula 18 - Ciclo da uréia______________________________________ 95 Aula 19 - Metabolismo de aminoácidos ________________________ 103 Módulo 6 Aulas 20 / 21 - Degradação de lipídeos _______________________ 115 Aulas 22 / 23 - Síntese de ácidos graxos _______________________ 135 Módulo 7 Aula 24 - Via das pentoses-fosfato ____________________________ 149 Aula 25 - Degradação do glicogênio ___________________________ 159 Aula 26 - Biossíntese do glicogênio ___________________________ 167 Aula 27 - Regulação do metabolismo do glicogênio _______________ 175 Aula 28 - Introdução à gliconeogênese _________________________ 187 Aula 29 - A via gliconeogênica _______________________________ 199 Aula 30 - Regulação da gliconeogênese ________________________ 211 Aula 31 - Introdução aos hormônios ___________________________ 223 Aula 32 - Glucagon e adrenalina _____________________________ 235 Aula 33 - Insulina e glicocorticóides ___________________________ 249 Gabarito _______________________________________________ 265 Volume 2 - Módulos 4, 5, 6 e 7 Respiração celular 12AULA BIOQUÍMICA II | Respiração celular 8 CEDERJ Figura 12.1: Símbolo alquímico. Uma cobra devorando a própria cauda. O círculo for- mado s imbol iza o infi nito. DA ANTIGUIDADE AO INÍCIO DA MODERNIDADE A Química da Antiguidade é essencialmente uma técnica: fabricação de cores, de bebidas fermentadas, de preparação de metais etc. Alguns produtos, como a cal e o enxofre, já eram conhecidos. Nessa época, os homens assumiam que a natureza era composta por quatro elementos fundamentais: fogo, ar, terra e água (os quatro elementos de Aristóteles); estes quatro elementos estavam associados a quatro qualidades: calor, frio, secura e umidade. No fi m da Antiguidade surge a Alquimia (século IX). O grande objetivo dos alquimistas era a busca do ouro, a transmutação dos metais. A interpretação das reações químicas acontecia através de um “pensamento mágico”. Apesar do seu misticismo, a Alquimia teve um papel central no progresso da Química. A vontade de experimentar se acentua em meados do século XVII. A noção de ácido (chamado spiritus salis por Livabius) é um pouco mais bem defi nida por Robert Boyle. O antagonismo entre ácidos e bases é mais bem estudado. A existência dos gases é revelada (chamado spiritus sylvestris ou espírito indomável por Van Helmont). Torricelli e Pascal demonstram a existência do vácuo. Os “químicos” dessa época começaram a duvidar se as substâncias seriam compostas apenas pelos quatro elementos e tentaram explicar por que quando um corpo queimava suas propriedades físicas e químicas se alteravam. Figura 12.2: Um laboratório alquímico. CEDERJ 9 A U LA M Ó D U LO 4 1 2 Outra verdade da época era a concepção de que o ar era único. Contudo, já se faziam referências quanto à qualidade do ar, atribuindo-se características de ar bom (defl ogisticado) e ar ruim (fl ogisticado), encontrados nas montanhas e em ambientes confi nados, respectivamente. Figura 12.3: Representação resumida da Teoria do Flogístico. A Terra era considerada um elemento pobre em fl ogístico, enquanto o metal era um elemento rico em fl ogístico. Surgiu, então, em 1760, a Teoria do Flogístico ou Princípio do Fogo, postulada por Georg Ernst Sthal, que unifi cava o pensamento da época. Esta teoria propunha que todo corpo suscetível à combustão contém um princípio de infl amabilidade (fl ogístico) que era liberado durante a queima. Assim, o fl ogístico existia não só na matéria inanimada como também nos seres vivos. Neste caso, o fl ogístico ou alma da matéria seria liberado durante a respiração no decorrer da vida, levando ao envelhecimento. TERRA (Pobre em flogístico) METAL (Rico em flogístico) FOGO (Flogiston) P P P E E BIOQUÍMICA II | Respiração celular 10 CEDERJ LAVOISIER Nesse contexto, o francês, economista e servidor público, Antoine Laurent Lavoisier, iniciou, como hobby, seus estudos na área da Chymica. Tido como conservador e metódico, introduziu métodos de trabalho que lançaram as bases para a química moderna. Graças ao seu poder econômico, pôde montar um laboratório, com instrumentos de precisão bastante sofi sticados para a época e, até então, nunca utilizados empesquisa. Lavoisier, interessado em entender os mecanismos da combustão de diferentes substâncias, realizou diversos experimentos, entre os quais um chamou particularmente sua atenção, conforme o enunciado que se segue: Figura 12.4: Antoine Laurent Lavoisier, cientista francês considerado o pai da química moderna. Lavoisier foi guilho- tinado durante a Revolução Francesa. Para saber mais consulte: http://scienceworld. wolfram.com/biography/ lavoisier.html “Por volta de oito dias atrás, eu descobri que o enxofre, ao ser queimado, em vez de perder peso, ao contrário, ganha peso; o mesmo acontece com o fósforo; este aumento de peso se deve a uma prodigiosa quantidade de ar que é fi xado durante a combustão e se combina com os vapores. Esta descoberta, que eu tenho estabelecido por experimentos que eu considero como decisivos, tem me levado a pensar que o que é observado na combustão do enxofre e fósforo pode acontecer no caso de todas as substâncias que ganham peso por combustão e calcinação; e eu estou convencido de que o aumento no peso de calxes metálicos é devido à mesma causa.” Nota selada depositada na Secretaria da Academia Francesa em 1º de novembro de 1772. Para saber mais, acesse: Teoria do Flogístico - http://www.hcc.hawaii.edu/hccinfo/instruct/ div5/sci/sci122/atomic/skepchem/phloggen.html Lavoisier: Principais contribuições para a Ciência Moderna - http: //www.lucknow.com/horus/guide/ec109.html#ec1092 Alquimia - http://143.107.237.20/~edsonro/index.htm CEDERJ 11 A U LA M Ó D U LO 4 1 2Conhecendo o contexto em que os resultados de Lavoisier foram obtidos, pense sobre o que esses resultados indicam em relação à Teoria do Flogístico. Intrigado com a Teoria do Flogístico, Lavoisier resolve estudá- la mais profundamente. Realiza experimentos com velas acesas e camundongos confi nados em campânulas separadas e hermeticamente fechadas. Observa que os camundongos em pouco tempo morriam e que as velas rapidamente se apagavam. Pense sobre isso! Figura 12.5: Experimento inicial de Lavoisier. Campânulas são cubas de vidro que não deixam passar ar do meio externo para o ambiente onde estão a vela e o rato. A que conclusões você acredita que Lavoisier deve ter chegado? Intrigado com a função química do “ar ruim”, Lavoisier é convidado para participar de uma Reunião Anual da Academia de Ciências da França. Durante o encontro com o professor e presbítero inglês Joseph Priestley, ele fi cou bastante interessado nos experimentos do colega, que apresentamos a seguir. Pense sobre isso! BIOQUÍMICA II | Respiração celular 12 CEDERJ Experimentos de Priestley 1. Calcinação Hg + O2 2HgO 2. Decomposição do óxido 2HgO 2Hg + O2 3. Redução com adição de carvão (também chamada de redução com phogistoal) 2HgO + C 2Hg + CO2 metal de mercúrio oxigênio óxido de mercúrio metal de mercúrio oxigênio óxido de mercúrio Símbolo utilizado para representar aquecimento brando. Símbolo utilizado para representar aquecimento intenso. metal de mercúrio óxido de mercúrio carvão (carbono) dióxido de carbono ou “ar fi xado” CEDERJ 13 A U LA M Ó D U LO 4 1 2O que você faria se fosse Lavoisier? Paralelamente às experiências de caracterização do “ar bom” e do “ar ruim”, Lavoisier observou que a queima de velas de tamanhos iguais originava velas menores e de tamanhos diferentes quando aprisionadas em campânulas de dimensões variadas. Esse resultado despertou no cientista o interesse em relacionar o tamanho da vela com a liberação do fl ogiston. Assim, percebeu que o critério de pesar a vela poderia ser de grande utilidade. Com balança de alta precisão, pôde realizar diversos experimentos de medidas de peso e obteve a seguinte tabela: Tabela 12.1: Resultados do peso do sistema vela + ar + campânula antes e após a queima da vela. Peso antes da queima Peso depois da queima CONJUNTO X X VELA + AR* Y < Y (perde peso) CAMPÂNULA W > W (ganha peso) * ar antes = defl ogisticado; ar depois = fl ogisticado Que fenômeno deve estar ocorrendo? A partir desse resultado, Lavoisier formula a seguinte reação: Lavoisier, dessa forma, postula que “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” ou “a energia não pode ser criada nem destruída, a vida se mantém graças à transformação de energia”. Posteriormente, esta idéia é fi rmada cientifi camente como a Teoria da Conservação das Massas. Nessa época, Lavoisier trabalha com seu aplicado aluno La Place. Nos meses que se seguiram, ambos dedicaram-se a comprovar a idéia de que a combustão da vela e a respiração eram na realidade o mesmo fenômeno. Considerando a reação descrita acima, que componente faltava ser verifi cado para que Lavoisier e La Place resolvessem esse problema? Pense sobre isso! Pense sobre isso! matéria orgânica + ar respirável CO2 + água + calor Pense sobre isso! BIOQUÍMICA II | Respiração celular 14 CEDERJ Após diversas tentativas de observar o calor na forma de luz nos órgãos respiratórios de camundongos e moribundos, Lavoisier percebe que o calor liberado pela respiração não poderia ser medido com os aparelhos que possuía, e resolve construir o equipamento abaixo: Figura 12.6: Calorímetro de Lavoisier e La Place. O aparelho apresenta três câma- ras: a mais interna (1) é a câmara que abriga a vela ou a cobaia; a do meio (2) é preenchida por gelo e contém uma saída (a) por onde escoa o gelo derretido pelo calor liberado pela queima ou pela respiração; a câmara mais externa (3), também é preenchida por gelo e apresenta uma saída (b) para escoar o gelo derretido. Este é o calorímetro de gelo de Lavoisier e La Place (Figura 12.6); aparelho utilizado para obter medidas quantitativas do calor produzido durante a queima de uma vela e da respiração de uma cobaia (geralmente utilizavam porquinho-da-índia). Após realizar diversos experimentos com tempos de queima e de respiração fi xos, os cientistas obtiveram o seguinte resultado (Tabela 12.2): Tabela 12.2: Relação entre produção de CO2 e peso derretido após a queima de matéria orgânica e a respiração de uma cobaia. Produção de CO2 Gelo derretido Gelo/ CO2 Matéria orgânica 112,35g 2998g 26,69g Cobaia 11,87g 330,30g 27,80g a 1 2 3 b CEDERJ 15 A U LA M Ó D U LO 4 1 2Esses resultados foram capazes de esclarecer a dúvida que restava em relação à combustão e à respiração? Descreva sua opinião sobre os dois fenômenos, baseada nos resultados mostrados até aqui. Esta aula foi baseada no material organizado pelo Departamento de Bioquímica Médica, CCS, UFRJ. RESUMO Nesta aula você acompanhou como Lavoisier chegou à equação geral da respiração celular, aceita até hoje (matéria orgânica + ar respirável CO2 + água + calor). Pense sobre isso! INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA Na próxima aula, nós continuamos a história. Falaremos mais especifi camente do ciclo do ácido cítrico e como ele foi sendo elucidado. Com as informações apresentadas na Aula 13, você mesmo construirá o ciclo, antes de ser apresentado a ele, o que ocorrerá na Aula 14. Foi o que Krebs fez e, por isso, o ciclo do ácido cítrico é chamado ciclo de Krebs. Então, vamos lá... Ciclo de Krebs - Parte 1 13AULA BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 1 18 CEDERJ Como vimos na aula anterior, o resultado da genialidade de Lavoisier, somada ao trabalho de Laplace e Priestley, resultou na seguinteequação geral da respiração celular: Matéria orgânica + O2 CO2 + H2O + ENERGIA Mas a história não parou por aí. A partir de agora você conhecerá outros personagens da história da Bioquímica. Eles contribuíram para a descoberta dos passos da respiração celular. INTRODUÇÃO A HISTÓRIA DO CICLO DO ÁCIDO CÍTRICO Comecemos com OTTO WARBURG, um eminente bioquímico alemão durante a primeira metade do século XX. Filho de militar da mais alta patente do exército, era possuidor de uma disciplina rígida e personalidade forte. Alguns relatos contam que, para dar continuidade a seus experimentos no período recessivo da Primeira Grande Guerra, dividia boa parte de seus ganhos com a alimentação de suas cobaias. Estava interessado em entender as etapas da equação de Lavoisier, em diferentes tecidos. Para esta fi nalidade, desenvolveu, por volta de 1918, um método manométrico (baseado em medidas de pressão) para medir o consumo de oxigênio e a produção de CO2. Este aparelho foi, mais tarde, batizado de respirômetro de Warburg, em sua homenagem (Figura 13.1). O respirômetro de Warburg teve ampla aplicação na Bioquímica e, ainda hoje, é utilizado na determinação de CO2 produzido por diferentes preparações biológicas. Em 1935, Albert Szent-Györgyi, um pesquisador húngaro, começou a publicar uma série de importantes trabalhos sobre a respiração de suspensões de músculo de peito de pombo. Sendo um músculo muito solicitado no vôo, ele requer muita energia e possui uma capacidade oxidante excepcionalmente alta. Szent-Györgyi estudou, em particular, o comportamento metabólico dos ácidos dicarboxílicos C4 (ácidos com quatro carbonos que possuem dois grupos carboxílicos). Ele também estava interessado em estabelecer a conexão entre fermentação e oxidação, como fi ca claro na seguinte passagem: OT T O HE I N R I C H WA R B U R G Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1931, por suas descobertas a respeito da natureza e do modo de ação das enzimas respiratórias. CEDERJ 19 A U LA M Ó D U LO 4 1 3 OXIDAÇÃO E FERMENTAÇÃO Tomemos como exemplo a fermentação láctica em células musculares. Neste processo, a molécula de hexose é fragmentada em duas moléculas de ácido láctico. Juntas, estas duas moléculas de ácido láctico contêm menos energia que a molécula de hexose original. Esta pequena diferença de energia é o ganho da célula. Alternativamente a molécula de hexose pode ser submetida à combustão, gerando CO2 e H2O. No último caso, grande quantidade de energia livre é desperdiçada. A fermentação é o mais simples dos dois processos. Ao mesmo tempo ele é pouco econômico, pois a maior parte da energia da molécula de hexose permanece nas moléculas de ácido láctico. Por volta de 30 vezes mais energia é liberada por oxidação. Conseqüentemente, a fermentação pode manter somente as formas de vida mais simples. Nesse ponto, pode existir uma pequena dúvida de que a fermentação não é somente o mais simples, mas também o processo mais antigo, precedendo a oxidação na história da vida. O desenvolvimento de formas de vida mais complexas tornou-se possível somente depois que a oxidação pelo oxigênio molecular foi “inventada” pela natureza. Esta seqüência de eventos se refl ete em nossas células, nas quais nós encontramos oxidação e fermentação intimamente misturadas e entrelaçadas em um sistema produtor de energia. A íntima relação entre os dois processos tem ocupado muitos bioquímicos, como Pasteur, a descobrir suas interdependências quantitativas, agora conhecidas como “Reação de Pasteur”. Pasteur descobriu que existe algum tipo de equilíbrio entre oxidação e fermentação. Se a oxidação é suprimida por remoção do oxigênio, a fermentação se inicia. Se nós promovemos outra vez a oxidação, a fermentação cessa. O mecanismo desta relação tem sido um dos mais atraentes quebra-cabeças da Bioquímica desde então. ALBERT VON SZENT-GYÖRGYI, Ph. D., M.D. Professor de Química Orgânica e Biológica, Universidade de Szeged, Hungria. ALBERT SZENT- GYÖRGYI Nasceu em Budapeste. Em 1937 recebeu o Prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina por suas descobertas na área dos processos de combustão biológica, particularmente com respeito à vitamina C e ao ácido fumárico. Ele não é uma gracinha? É o meu favorito. BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 1 20 CEDERJ HANS ADOLF KREBS, um bioquímico alemão, testou os mesmos ácidos orgânicos que Szent-Györgyi (ácidos dicarboxílicos C4) em fatias de córtex de rim e obteve o seguinte resultado (veja a Tabela 13.1): Substrato adicionado Consumo de O2 (µmols/g de peso seco) Bicarbonato formado (µmols/g de peso seco) Sem adição 670 0 Acetato 1340 393 Succinato 1520 555 Fumarato 1290 705 Malato 1340 756 Piruvato 1070 318 Note que Krebs usou o respirômetro de Warburg e mediu tanto o consumo de O2, pela diminuição da pressão e conseqüente deslocamento da coluna do respirômetro, quanto a formação de CO2, pela medida da quantidade de bicarbonato formada no poço central do respirômetro. Desta forma, Krebs mostrou que qualquer um dos substratos utilizados aumentava a taxa de respiração em relação ao controle (sem adição do substrato). Como nos músculos de pombo de Szent-Györgyi, Krebs viu que o rim também era capaz de respirar, utilizando como substratos ácidos dicarboxílicos de quatro carbonos (succinato, fumarato e malato), além de acetato (dois carbonos) e piruvato (três carbonos). Enquanto isso, no laboratório de Warburg, após um acidente experimental com um de seus respirômetros, os tecidos de músculo foram carbonizados e, por descuido do seu técnico, o mesmo respirômetro foi utilizado em um outro experimento. Qual não foi a surpresa de Otto Warburg, quando constatou um grande aumento na respiração do tecido. Análises do material contido nas paredes do respirômetro mostraram altos níveis de um composto orgânico associado ao ferro. Warburg prosseguiu seus estudos com a intenção de identifi car este fator, que chamou “Atmungsferment” (enzima), pois, uma vez inativado, todo o processo de respiração cessava. Tabela 13.1: Oxidação e formação de bicarbonato a partir de ácidos orgânicos em lâminas de rins de porquinho-da-índia. O que sugere este experi mento? ! SI R HA N S AD O L F KR E B S Nasceu em Hildesheim, Alemanha. Prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1953. CEDERJ 21 A U LA M Ó D U LO 4 1 3A próxima etapa desse quebra-cabeça foi resolvida por David Keilin, em 1925, que redescobriu uma substância que ele denominou cytochrome (CITOCROMO). Esta substância, como o Atmungsferment, estava intimamente ligada aos processos oxidativos. Segundo Keilin, o citocromo era diretamente oxidado na sua forma divalente para a forma trivalente (férrica). Os dois sistemas, Atmungsferment e Cytochrome, foram denominados sistemas W.K. (sistema Warburg-Keilin). Szent-Györgyi sabia do envolvimento do O2 nos processos oxidativos e fi cou intrigado com o fato de que a oxidação do succinato era especialmente bloqueada por um ácido dicarboxílico (C3), o ácido malônico. Resolveu, então, investigar o que aconteceria com a respiração em duas situações: 1) ao bloquear a oxidação do succinato; 2) ao incluir pequenas quantidades de fumarato, normalmente presente no tecido. Assim Szent-Györgyi descreveu seus resultados: “Os resultados foram surpreendentes. Pequenas quantidades de malonato envenenam a respiração quase como o cianeto. Ácido fumárico estimula fortemente a respiração. A respiração rapidamente declinante dos tecidos in vitro pode ser mantida constantepor longos períodos pelo ácido fumárico. Como Baumann & Stare têm mostrado no Laboratório de Keilin, igualmente alguns poucos γ de fumarato (γ = uma milionésima parte do grama) foram ativos. Foram consumidos vários anos de trabalho pesado para ajustar as observações contraditórias em uma teoria. A teoria é esta: os ácidos dicarboxílicos C4 são uma ligação na cadeia respiratória entre o alimento e o sistema W.K. Sua função é transferir o hidrogênio do alimento ao citocromo e reduzir por este hidrogênio seu ferro trivalente à forma divalente. Falando mais precisamente, o citocromo oxida dois átomos de hidrogênio da molécula de ácido succínico. Pela perda de dois átomos de hidrogênio, o ácido succínico é convertido a ácido fumárico. Estes dois átomos de H perdidos são recolocados novamente por hidrogênios oriundos do alimento. O alimento, entretanto, não cede seus dois hidrogênios imediatamente ao ácido fumárico. Ele cede seus 2 átomos de hidrogênio para o ácido oxaloacético, que é também um ácido dicarboxílico (C4). Por tomar 2H, o ácido oxaloacético volta a ácido málico. Ácido málico, então, cede seus dois hidrogênios ao ácido fumárico, e, assim, o ácido fumárico é convertido a ácido succínico. Este pode ser outra vez oxidado por citocromo, enquanto o ácido málico, após ceder seus 2Hs, torna-se ácido oxaloacético, que pode tomar hidrogênio do alimento novamente, e assim o jogo recomeça, hidrogênios sendo transmitidos todo o tempo do alimento via oxaloacético – málico – fumárico – succínico ao sistema W.K.” CI T O C R O M O S Os citocromos foram primeiro descritos como mio-hematina e histo-hematina por MacMunn. Essa história você verá com mais detalhes na Aula 15. BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 1 22 CEDERJ O resumo esquemático da história está a seguir: Fermentação Esquema 13.1: Esse esquema geral você já conhece. Respiração Esquema 13.2 Levando em conta o esquema proposto por Szent-Györgyi, que transformações você verifi ca em cada etapa desta seqüência de reações? Qual o papel das trioses nos processos fermentativos e oxidativos propostos por Szent-Györgyi? O que ocorreria nesta seqüência de reações na presença e na ausência de O2? ! Ácido láctico C O HCOH CEDERJ 23 A U LA M Ó D U LO 4 1 3Chegamos então ao primeiro esquema que tentava explicar como ocorre a respiração celular (ver Esquema 13.2). O próximo passo foi a observação de que a adição de pequenas quantidades de ácidos orgânicos ativava tremendamente essa via. Este efeito, chamado efeito catalítico, já havia sido observado por Krebs durante a descoberta do ciclo da uréia (que você conhecerá na Aula 18). A respeito da oxidação dos ácidos orgânicos e o efeito catalítico do ácido succínico, Krebs escreveu: Szent-Györgyi reportou experimentos em 1935 e 1936 que sugeriam que o ácido succínico e seus derivados ácido fumárico, ácido málico e ácido oxaloacético cataliticamente promovem oxidação em tecidos musculares. Provas conclusivas deste efeito catalítico foram apresentadas por Stare & Baumann em dezembro de 1936. Estes autores mostraram que pequenas quantidades destas substâncias eram sufi cientes para provocar um aumento na respiração e que o aumento é um múltiplo da quantidade de oxigênio necessária para a oxidação das substâncias adicionadas. Além disso, a substância adicionada não foi usada, mas pode ser subseqüentemente detectada no meio. Assim, não permanece nenhuma dúvida de que o ácido succínico e substâncias relacionadas podem atuar como catalisadores na respiração. Fonte: KREBS H. A.; CAMBRIDGE, M. A.; HAMBURG M. D. The intermediate metabolism of carbohidrates. De acordo com esta passagem, tal efeito catalítico exercido pelos ácidos orgânicos C4 pode ser explicado com a seqüência de reações proposta por Szent-Györgyi? A seqüência de reações de Szent-Györgyi explica convenientemente a equação de Lavoisier? ! EFEITO CATALÍTICO DO ÁCIDO CÍTRICO O passo seguinte foi a descoberta de que o ácido cítrico também atua como ativador catalítico (Krebs e Johnson, 1937). Adicionado ao músculo em pequenas quantidades, ele acelera a oxidação de carboidratos da mesma maneira que o ácido succínico. A análise experimental deste efeito revelou não somente o mecanismo da ação catalítica do ácido cítrico, mas também do ácido succínico e compostos relacionados. Em adição, isto levou à elucidação dos principais passos na degradação oxidativa de carboidratos. BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 1 24 CEDERJ O DESTINO DO ÁCIDO CÍTRICO O ácido cítrico, por longo tempo, foi conhecido como sendo facilmente oxidável em tecidos vivos, embora os detalhes de seu metabolismo intermediário tenham permanecido obscuros até março de 1937, quando Martius e Knoop descobriram que o ácido α-cetoglutárico é um produto da oxidação do ácido cítrico. O destino do ácido no corpo já era bem conhecido. Esta substância tinha grande interesse fi siológico, já que apareceu como um intermediário na degradação de ácido glutâmico, de prolina e de histidina. Já se sabia que ele forma, na oxidação, ácido succínico e dióxido de carbono. CEDERJ 25 A U LA M Ó D U LO 4 1 3Considerando a junção das duas reações imediatamente anteriores, é possível passar do ácido cítrico ao ácido succínico, e esta reação pode ser diretamente demonstrada se ácido malônico é adicionado. ÁCIDO MALÔNICO inibe especifi camente a oxidação do ácido succínico, mas não inibe a degradação do ácido cítrico e ácido α-cetoglutárico. Qual a relação entre tais reações e a seqüência de reações de Szent-Györgyi? ! Krebs sabia que a síntese de ácido cítrico, a partir de ácido oxaloacético, era conduzida pela condensação com uma segunda substância, cuja natureza química não era ainda conhecida. Supunha-se que a segunda substância fosse derivada de um carboidrato e apostava-se que seria o ácido pirúvico. A condensação desta segunda substância com o acido oxaloacético para formar ácido cítrico foi formulada da seguinte maneira por Krebs (veja reação a seguir): ÁC I D O M A L Ô N I C O Ou malonato é um inibidor da respiração celular, no passo de formação do succinato no ciclo do ácido cítrico. PS. A nomenclatura das moléculas apresentadas é aquela utilizada nos trabalhos da época. 3 BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 1 26 CEDERJ “Este esquema, ainda que suportado por evidência experimental, é, em parte, hipotético e, por esta razão, vamos abster-nos da discussão de detalhes; mas deve ser enfatizado que o efeito fi nal, que é a síntese de ácido cítrico na presença de ácido oxaloacético, é um fato experimental. Martius e Knoop Baseado nos resultados mostrados acima e nas citações, proponha um esquema de reações que explique o efeito catalítico do ácido cítrico e do α-cetoglutarato, integrando as trioses nesta seqüência. ! A SUBSEQÜENTE ELABORAÇÃO DO CICLO DOS ÁCIDOS TRICARBOXÍLICOS O esquema básico de 1937 tem resistido ao teste do tempo. Existem evidentemente grandes vazios em relação ao mecanismo da formação do citrato a partir de oxaloacetato e piruvato. Citado em H. Krebs (1970) The history of the tricarboxylic acid cycle. Perspect. Biol. Med. 14: 151-170 A solução deste problema esperou pela descoberta da coenzima A (CoA) por Lipmann, na década de 1940. No mesmo período, Ochoa e Lynem mostraram que a acetil- coenzima A (acetil-CoA) é o intermediário que reage com o oxaloacetato para formar citrato. CEDERJ 27 A U LA M Ó D U LO 4 1 3Além disso, a coenzima A foi também encontrada como participantena formação de succinato a partir de α-cetoglutarato, formando succinil coenzima A (succinil-CoA) como intermediário. Com base nessas informações, construa o seu esquema representando o ciclo do ácido cítrico. ! Se você acompanhou o texto e conseguiu construir seu ciclo com base nas informações apresentadas, parabéns. Isso não é fácil. Se você não conseguiu, consulte os tutores de Bioquímica e discuta suas difi culdades com eles. Ao chegar ao fi nal desta aula, você já conhece o ciclo do ácido cítrico ou grande parte dele. Neste caso, a próxima aula será apenas para detalhar o que você já sabe. Nela você verá cada reação, o nome das enzimas, co-fatores e outros papéis metabólicos que o ciclo apresenta. Não esqueça que os exercícios virão no fi nal do módulo. R E S U M O Nesta aula nós vimos a história do ciclo do ácido cítrico, seus principais personagens e as etapas iniciais de elucidação dessa via. A evolução do conceito de Lavoisier até chegar aos principais intermediários e reações do ciclo. Ciclo de Krebs - Parte 2 Ao fi nal desta aula, você deverá ser capaz de: Conhecer a origem da molécula de acetato, na forma de acetil-CoA, a qual inicia o Ciclo de Krebs. Aprender a importância das vitaminas hidrossolúveis como formadoras de coenzimas, importantes para a atividade de complexos multienzimáticos. Conhecer as reações do Ciclo de Krebs. Caracterizar as enzimas envolvidas nessas reações. Identifi car as etapas de conservação da energia gerada durante as reações do Ciclo de Krebs. Conhecer as vias de reposição de componentes do ciclo. 14AULA ob jet ivo s BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 30 CEDERJ INTRODUÇÃO Como você viu na Aula 12 o ciclo do ácido cítrico foi descoberto por Hans Krebs e, portanto, é também denominado de Ciclo de Krebs. Você viu nas Aulas 9 e 10 que algumas células obtêm energia por processos fermentativos em que a molécula de glicose é quebrada na ausência de oxigênio. Para a maioria das células eucarióticas e para algumas bactérias, sob condições aeróbicas, seus combustíveis orgânicos são transformados em CO2 mais água, sendo a glicólise o primeiro estágio da degradação completa da glicose. Após esse estágio, você viu que a molécula de piruvato poderia seguir diversos caminhos metabólicos; entre eles, podia ser convertida em etanol e em lactato, se a célula estivesse na ausência de oxigênio. No entanto, a molécula de piruvato pode também ser convertida a acetil-CoA. Na realidade, o grupo acetil, na forma de acetil-CoA, é um intermediário comum ao metabolismo de quase todos os compostos biológicos. Ele pode ser formado a partir de glicídios, lipídeos e proteínas (veja a Figura 14.1). Figura 14.1: Esquema de formação de acetil-CoA. Lembre-se de que o metabolismo pode ser dividido em três estágios. Você verá que o Ciclo de Krebs é um desses estágios. Não se preocupe ainda com os nomes das moléculas que aparecerão no estágio 2 (Figura 14.2), ou seja, no Ciclo de Krebs, pois é sobre isso que falaremos nesta aula. O estágio 3 será estudado nas Aulas 15 e 16. CEDERJ 31 A U LA M Ó D U LO 4 1 4 Figura 14.2: Estágios do metabolismo. graxos BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 32 CEDERJ A oxidação de grupos acetila é um dos principais processos metabólicos, e mais de dois terços dos ATPs utilizados pelas células são produzidos como resultado da transferência de elétrons de grupos acetila para o oxigênio molecular na mitocôndria. Durante o metabolismo, os grupos acetila são ligados como tioéster à coenzima A, um tiol que tem como função transportar grupos acetil dentro da célula. Qualquer que seja a fonte, grande parte da molécula de acetil é convertida em CO2 mais água, mas qualquer excesso pode ser utilizado para a síntese de ácidos graxos, corpos cetônicos e colesterol. A oxidação completa de acetil-CoA para CO2 e água ocorre em uma série de reações conhecidas como ciclo do ácido cítrico, ciclo do ácido tricarboxílico ou Ciclo de Krebs. É sobre essas transformações que falaremos nesta aula, que começa com a conversão da molécula de piruvato em acetil-CoA e pela entrada dos grupos acetil no Ciclo de Krebs. Nós então analisaremos as reações do Ciclo de Krebs e as enzimas que as catalisam. Como alguns desses intermediários podem também ser usados por outras vias, nós falaremos de algumas vias de reposição desses intermediários. PRODUÇÃO DE ACETATO – FORMAÇÃO DA MOLÉCULA DE ACETIL-COA Em organismos aeróbicos, glicose e outros açúcares, ácidos graxos e muitos aminoácidos são oxidados em CO2 e água via ciclo do ácido cítrico e cadeia respiratória. Antes de entrar no Ciclo de Krebs os esqueletos dessas moléculas são degradados aos grupos de acetil da molécula de acetil-CoA, a forma por que o ciclo aceita a maioria do seu combustível. Os aminoácidos podem entrar no Ciclo de Krebs através de outros intermediários do Krebs, como veremos mais adiante. A estrutura da coenzima A e o processo de formação da molécula de acetil-CoA são mostrados na Figura 14.3. Essa coenzima complexa é abreviada como CoA ou CoASH. Ela é composta por β- mercaptoetanolamina, pela vitamina ácido pantotênico, pela adenosina difosfato (ADP). A coenzima A existe na forma reduzida (CoASH) e atua como transportadora de grupos acil. CEDERJ 33 A U LA M Ó D U LO 4 1 4 Nós vamos inicialmente enfocar nossa atenção na molécula de piruvato, derivado de glicose e de outros açúcares. Ela é oxidada em acetil- CoA pelo complexo enzimático piruvato desidrogenase. Esse complexo enzimático está localizado exclusivamente na matriz mitocondrial. Está presente em altas concentrações em tecidos como o músculo cardíaco e os rins. Nas condições fi siológicas o ΔGo é muito negativo e portanto a reação é irreversível. A reação catalisada pelo complexo piruvato desidrogenase é esquematizada abaixo. Piruvato + NAD + CoASH Acetil-CoA + CO2 + NADH + H + (ΔGo= - 8kcal\mol) piruvato desidrogenase Esta reação é uma descarboxilação oxidativa, um processo irreversível no qual o grupo carboxila é removido do piruvato como uma molécula de CO2 e os dois carbonos, remanescentes formam o grupo acetil da molécula de acetil-CoA. Como vimos, nessa reação ocorre a formação de uma molécula de NADH. Os elétrons transportados por essa molécula serão transferidos para o oxigênio na cadeia transportadora de elétrons, levando à formação de ATP. Esse assunto você estudará nas Aulas 14 e 15. A desidrogenação combinada com a descarboxilação da molécula de piruvato em acetil-CoA requer a ação seqüencial de três enzimas e cinco coenzimas diferentes ou grupos prostéticos, que são: 1) tiamina pirofosfato (TPP); 2) fl avino adenino dinucleotídeo (FAD); 3) coenzima A (CoA); 4) nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD); 5) ácido lipóico. Veja a Figura 14.4. Figura 14.3: Estrutura da coenzima e formação da molécula de acetil-CoA. β- Mercaptoe tanolamina Coenzima A (CoA ou CoASH) BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 34 CEDERJ Quatro vitaminas hidrossolúveis diferentes são necessárias na nutrição humana e são componentes vitais neste sistema. Essas vitaminas são: 1) tiamina na TPP; 2) ribofl avina no FAD; 3) niacina no NAD; 4) pantotenato na CoA. NAD e FAD são transportadoras de hidrogênios, a tiamina tem um papel importante na clivagem de ligações adjacentes a grupos carbonila. A coenzima A contém pantotenato, que possui um grupamento tiol reativo. Esse grupamento é crítico na formação de um tioéster com grupamentos acila. É através dessa associação que os grupamentosacila são transportados. A energia de hidrólise da ligação tioéster é relativamente alta, permitindo a doação de grupamentos acila para diversos compostos. Assim, podemos dizer que a molécula de coenzima A associada com grupamentos acila atua como uma molécula ativada para transferência desses grupos. O quinto co-fator da piruvato desidrogenase, o lipoato, possui dois grupos tióis (SH) que são importantes na oxidação reversível de uma ponte de enxofre, semelhante àquelas das cisteínas em proteínas. Assim, o complexo piruvato desidrogenase contém três enzimas, a piruvato desidrogenase (E1), a diidrolipoil transacetilase (E2) a diidrolipoil desidrogenase (E3). Cada uma delas está presente em múltiplas cópias. A Figura 14.5 mostra esquematicamente como o complexo piruvato desidrogenase conduz as cinco reações consecutivas na descarboxilação e desidrogenação da molécula de piruvato. Na etapa 1 o piruvato é descarboxilado e, na forma de aldeído, é ligado ao grupamento hidroxila da tiamina. Na etapa 2 o grupamento aldeído é oxidado em acetato. Os dois elétrons removidos nessa oxidação reduzem o grupamento –S–S– de um grupo lipoil na enzima E2 a dois grupamentos tióis (-SH). O acetato produzido nessa reação de óxido-redução é esterifi cado em um grupo SH do lipoil e então transesterifi cado em coenzima A para formar o acetil- CoA (etapa 3). A energia de oxidação leva à formação de um tioéster de alta energia do acetato. As reações remanescentes catalisadas pelo complexo piruvato desidrogenase (etapas 4 e 5) são de transferências de elétrons necessárias para regenerar a forma oxidada do grupo lipoil da enzima E2 e assim preparar a enzima do complexo para um novo ciclo de oxidação. Os elétrons removidos do grupo hidóxil-etil derivado do piruvato passa através do FAD para o NADH. CEDERJ 35 A U LA M Ó D U LO 4 1 4 Figura 14.4: Co-fatores do complexo piruvato desidrogenase. Acetaldeído ativado BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 36 CEDERJ Figura 14.5: Representação do complexo piruvato desidrogenase e das etapas de descarboxilação da molécula de piruvato. CEDERJ 37 A U LA M Ó D U LO 4 1 4AS REAÇÕES DO CICLO DE KREBS Para começar a primeira volta do ciclo, a molécula de acetil- CoA doa seu grupo acetil para um composto de quatro carbonos, o oxaloacetato, para formar a molécula de citrato com seis carbonos. Citrato é então transformado em isocitrato, uma molécula também com seis carbonos. Essa molécula é desidrogenada, com perda de CO2 para produzir um composto com cinco carbonos, o α-cetoglutarato. Essa molécula perde CO2, produzindo um composto com quatro carbonos, chamado succinato. O succinato é então convertido enzimaticamente, em três etapas, regenerando a molécula de oxaloacetato, a qual está pronta para reagir novamente com outra molécula de acetil-CoA. Como você pôde ver, duas moléculas de CO2 foram formadas e serão eliminadas. Uma molécula de oxaloacetato foi utilizada, mas foi regenerada ao fi nal do processo. Assim, em teoria, uma molécula de oxaloacetato poderia ser utilizada infi nitamente no ciclo; de fato, oxaloacetato está presente nas células em baixíssimas concentrações. Quatro das oito etapas desse ciclo são oxidações nas quais a energia de oxidação é conservada na forma das coenzimas reduzidas NADH e FADH2. Um resumo dessas etapas é apresentado na Figura 14.6. Figura 14.6: Etapas do Ciclo de Krebs. succinil-CoA BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 38 CEDERJ Embora o Ciclo de Krebs possua um papel fundamental nas vias metabólicas produtoras de energia, alguns intermediários com quatro e cinco carbonos podem ser utilizados como precursores de outras moléculas. Para repor compostos do ciclo, as células empregam reações anapleróticas (reposição) que serão apresentadas no fi nal desta aula. Agora, nós vamos examinar cada uma das oito etapas do ciclo com maior detalhe, dando ênfase às transformações químicas, observando as etapas de oxidação com formação de CO2 e de coenzimas reduzidas. Etapa 1 – Formação do citrato A primeira etapa ou reação do ciclo é a condensação do acetil-CoA com oxaloacetato para formar citrato, catalisada pela citrato sintase. Nesta reação, o grupamento metil (CH3) do grupo acetil é ligado ao grupo carbonila do oxaloacetato, formando um intermediário instável, o citroil CoA, que permanece ligado ao sítio ativo da enzima. Esse intermediário é rapidamente hidrolisado, liberando a coenzima A e uma molécula de citrato. A hidrólise desse tioéster de alta energia torna a reação altamente exergônica. A grande variação de energia livre nesta reação é essencial para o funcionamento do ciclo, pois, como vimos anteriormente, a concentração de oxaloacetato é muito baixa. A coenzima A liberada nessa etapa é reciclada para participar de outra reação de descarboxilação oxidativa de uma molécula de piruvato. Veja a Figura 14.7: Figura 14.7: Primeira etapa do Ciclo Reação de formação do citrato. Etapa 2 – Formação do isocitrato via cis-aconitato O citrato contém um álcool terciário que é muito difícil de ser oxidado, por isso essa molécula é convertida no seu isômero, isocitrato, pela enzima aconitase. Essa enzima catalisa a transformação reversível do citrato em isocitrato, que é mais fácil de ser oxidado. CEDERJ 39 A U LA M Ó D U LO 4 1 4A reação envolve sucessiva desidratação e hidratação, através da formação de um intermediário, o cis-aconitato, que normalmente não se dissocia do sítio ativo da enzima. Essa reação é impulsionada no sentido de formação do isocitrato, pois essa molécula é constantemente consumida na etapa seguinte do ciclo. Veja Figura 14.8. Figura 14.8: Reação de formação do isocitrato. Etapa 3 – Oxidação do isocitrato a α-cetoglutarato e CO2 Nesta etapa, a isocitrato desidrogenase catalisa a descarboxilação oxidativa do isocitrato para formar α-cetoglutarato. Existem duas diferenças entre a piruvato desidrogenase e a isocitrato desidrogenase: a primeira requer NAD como aceptor de elétrons e a segunda pode utilizar tanto NAD como NADP; a piruvato desidrogenase, dependente de NAD, ocorre somente na matriz mitocondrial, enquanto a isocitrato desidrogenase ocorre na matriz e no citosol. Na matriz ela atende ao Ciclo de Krebs e no citosol ela é importante para regenerar a molécula de NADPH, que é essencial para as reações redutivas anabólicas. Veja a Figura 14.9. Figura 14.9: Reação de formação do α-cetoglutarato. BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 40 CEDERJ Etapa 4 – Oxidação do α-cetoglutarato a succinil-CoA e CO2 Nesta etapa, ocorre uma outra descarboxilação oxidativa, na qual o α-cetoglutarato é convertido em succnil CoA e CO2, pela ação do complexo α-cetoglutarato desidrogenase. Nessa reação o NAD serve como aceptor de elétrons e a coenzima A como um carreador do grupo succinil. A energia de oxidação do α-cetoglutarato é conservada na formação do tioéster da molécula de succinil-CoA. Essa reação é semelhante à reação catalisada pelo complexo piruvato desidrogenase, tanto na estrutura quanto na função. Ele inclui enzimas e coenzimas homólogas às do complexo piruvato desidrogenase (Figura 14.10). Figura 14.10: Reação de formação do succinil-CoA. Etapa 5 – Conversão do succnil-CoA a succinato – fosforilação em nível de substrato A molécula de succinil-CoA tem uma ligação tioéster semelhante à da molécula de acetil-CoA, ou seja, uma ligação com uma forte energia livre padrão de hidrólise (ΔGo = -36kJ/mol) . A energia liberada na quebra desta ligação é utilizada para a síntesede uma ligação fosfoanidrido de uma molécula de ATP ou de GTP (guanosino trifosfato), liberando ainda 2,9 kJ/mol. O succinato é formado nesse processo. A enzima que catalisa essa reação é a succinil CoA sintetase. A formação de ATP ou de GTP à custa da energia liberada na descarboxilação oxidativa do α-cetoglutarato é uma fosforilação em nível de substrato, semelhante às reações de síntese de ATP que você viu na via glicolítica. O GTP formado nessa reação perde seu grupamento fosforil terminal para uma molécula de ADP, formando uma molécula de ATP. Veja as Figuras 14.11 e 14.12. CEDERJ 41 A U LA M Ó D U LO 4 1 4 Figura 14.11: Reação de formação do succinato. Figura 14.12: Esquema representativo da reação onde ocorre a fosforilação em nível de substrato. Succinato BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 42 CEDERJ Etapa 6 – Oxidação do succinato a fumarato – desidrogenação fl avino-dependente O succinato é oxidado em fumarato pela fl avoproteína succinato desidrogenase (Figura 14.13). Em eucarióticos, a succinato desidrogenase está fortemente associada à membrana interna mitocondrial. Em procarióticos, está associada à membrana plasmática. Ela é a única enzima do Ciclo de Krebs associada à membrana. Ela possui uma fl avino adenino dinucleotídeo (FAD) ligada covalentemente. A estrutura dessa coenzima nos estados reduzido e oxidado é apresentada na Figura 14.14. Os elétrons passam do succinato através do FAD por centros ferro- enxofre (Fe – S) antes de entrar na cadeia de transporte de elétrons. Você verá o funcionamento da cadeia de transporte de elétrons e a formação de ATPs decorrentes da fosforilação oxidativa nas próximas aulas. Figura 14.13: Reação de formação do fumarato. Figura 14.14: Estrutura da coenzima FAD reduzida e oxidada. CEDERJ 43 A U LA M Ó D U LO 4 1 4Etapa 7 – Hidratação do fumarato a malato A hidratação do fumarato que resulta em malato é catalisada pela enzima fumarase (Figura 14.15). Figura 14.15: Reação de formação do malato. Etapa 8 – Regeneração do oxaloacetato Na última reação do ciclo, a enzima malato desidrogenase, ligada ao NAD, catalisa a oxidação do malato em oxaloacetato. O equilíbrio dessa reação fi ca muito longe das condições de equilíbrio termodinâmico, mas como nas células intactas o oxaloacetato é constantemente removido, pela reação seguinte, catalisada pela citrato sintase e altamente exergônica (etapa 1), as concentrações de oxaloacetato permanecem muito baixas, impulsionando a reação catalisada pela malato desidrogenase no sentido de formação do oxaloacetato. Veja a Figura 14.16. Figura 14.16: Reação de formação do oxaloacetato. L-malato oxaloacetato BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 44 CEDERJ A energia de oxidação do ciclo é conservada de modo muito efi ciente A Figura 14.17 apresenta as oito etapas do Ciclo de Krebs ressaltando as estruturas dos compostos formados. Podemos verifi car que um grupo com dois carbonos, na forma de acetil-CoA, entra no ciclo por combinação com o oxaloacetato. Os dois carbonos emergem do ciclo, na forma de CO2, na descarboxilação do isocitrato e do α-cetoglutarato. A energia liberada dessas descarboxilações foi conservada na redução de três NAD+ e um FAD e na produção de um ATP ou GTP. No fi nal do ciclo uma molécula de oxaloacetato foi regenerada. Embora somente um ATP tenha sido formado em nível de substrato, as coenzimas reduzidas, três NADH e um FADH, fornecem um grande fl uxo de elétrons na cadeia de transporte de elétrons, formando um grande número de moléculas de ATP durante a fosforilação oxidativa. Um processo cíclico, com oito etapas, parece, à primeira vista, ser uma via muito complexa para a oxidação de uma molécula de dois carbonos em CO2. No entanto, o papel do ciclo do ácido cítrico não está confi nado à oxidação do acetato. Essa via desempenha um papel central no metabolismo intermediário; seus produtos de quatro e cinco carbonos em determinadas circunstâncias metabólicas servem como combustíveis para outras vias. Podem, por outro lado, ser pontos de entrada de intermediários formados em outras vias de degradação; por exemplo, oxaloacetato e α-cetoglutarato são produzidos a partir do aspartato e do glutamato, respectivamente, quando proteínas são degradadas. O ciclo do ácido cítrico, como outras vias metabólicas, é produto da evolução onde uma boa parte ocorreu antes do advento dos organismos aeróbicos. Ele não representa o caminho mais curto do acetato até CO2, mas é a via que confere maior vantagem seletiva. Alguns seres anaeróbicos usaram algumas das reações dessa via em processos biossintéticos; alguns microorganismos modernos ainda usam o Ciclo de Krebs de modo incompleto não como fonte de energia, mas como precursor biossintético. Tais microorganismos usam as três primeiras reações do ciclo para produzirem α-cetoglutarato, mas não têm a enzima α-cetoglutarato desidrogenase e, portanto, não dão prosseguimento ao ciclo. Eles usam o composto formado para vias biossintéticas. Eles possuem as enzimas que catalisam as etapas reversíveis de conversão de oxaloacetato a succinil-CoA. CEDERJ 45 A U LA M Ó D U LO 4 1 4 Figura 14.17: Etapas do Ciclo de Krebs e estrutura dos componentes formados. REAÇÕES ANAPLERÓTICAS São reações para a reposição de intermediários do ciclo que são removidos para vias biossintéticas. Em mamíferos, a reação mais importante para reposição de intermediários do Krebs é a reação catalisada pela piruvato carboxilase. Ela ocorre no fígado e nos rins. Em organismos aeróbicos, o ciclo do ácido cítrico é uma via anfi bólica, ou seja, serve tanto para processos catabólicos como para processos anfi bólicos. Além de seu papel no catabolismo oxidativo de carboidratos, ácidos graxos e aminoácidos, o ciclo fornece precursores para muitas vias biossintéticas. Como podemos observar na Figura 14.19, α-cetoglutarato e oxaloacetato servem como precursores dos aminoácidos glutamato e aspartato. Esses aminoácidos podem ser usados para síntese de outros aminoácidos ou para síntese de bases nitrogenadas, purinas e acetil succinil-CoA Condensação BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 46 CEDERJ Figura 14.18: Principais papéis biossintéticos do ciclo de Krebs. pirimidinas. Oxaloacetato pode ser convertido a glicose, em processos gliconeogênicos (formação de glicose) quando os níveis de glicose estão abaixo daqueles considerados normais. Esse aspecto será mais bem estudado nas últimas aulas desta disciplina. O succinil-CoA é o intermediário central na síntese do anel porfi rínico de grupos heme que atuam como transportadores de oxigênio. Grupos heme fazem parte das moléculas de hemoglobina, da mioglobina e de carreadores de elétrons, como os citocromos. CEDERJ 47 A U LA M Ó D U LO 4 1 4Regulação do ciclo do ácido cítrico A regulação das enzimas-chave em vias metabólicas, por efetores alostéricos e por modulação covalente, assegura a produção de intermediários e de produtos na velocidade requerida para manter a célula em um estado estável, evitando a superprodução de um intermediário. O fl uxo de átomos de carbono do piruvato é fi namente regulado em dois níveis: em nível de formação do acetil-CoA e em nível de formação de citrato. O ciclo é também regulado em nível das reações catalisadas pelas enzimas isocitrato desidrogenase e da α-cetoglutarato desidrogenase. Veja a Figura 14.20. O complexo piruvato desidrogenase é modulado por dois tipos de regulação. Primeiro,dois produtos da reação da piruvato desidrogenase, acetil-CoA e NADH, inibem o complexo (Figura 14.21). Segundo, o complexo piruvato desidrogenase existe de duas formas: 1) um ativo, desfosforilado; 2) um inativo, fosforilado (Figura 14.21). A inativação do complexo é feita por uma proteína quinase que está fortemente ligada ao complexo. A reativação é catalisada por uma proteína fosfatase que desfosforila o complexo (Figura 14.21). Resumindo esse processo de regulação, podemos dizer que quando a situação energética da célula é alta, ou seja, quando os níveis de ATP, acetil-CoA e NADH são altos, os produtos de reação catalisados por esse complexo enzimático, o complexo enzimático é inibido. O que também ocorre quando os níveis de ácidos graxos estão aumentados. Essa inibição ocorre porque ácidos graxos podem ser convertidos em acetil-CoA no processo de β-oxidação que você irá estudar na Aula 22 desta disciplina. Por outro lado, quando os níveis energéticos da célula estão baixos, ou seja, quando os níveis de AMP (adenosina monofosfato), NAD+ e CoA estão reduzidos, ocorre uma ativação alostérica do complexo piruvato desidrogenase. BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 48 CEDERJ Figura 14.19: Principais fatores reguladores do ciclo do ácido cítrico. CEDERJ 49 A U LA M Ó D U LO 4 1 4 Figura 14.20: Regulação do complexo piruvato desidrogenase por fosforilação e por desfosforilação. BIOQUÍMICA II | Ciclo de Krebs - Parte 2 50 CEDERJ Ciclo do glioxalato – uma variante anabólica do ciclo Metabolicamente, células vegetais e microorganismos diferem em muitos aspectos importantes. De interesse neste momento é que as células vegetais e microorganismos não podem sintetizar carboidratos a partir de gorduras. Essa conversão é crucial para o desenvolvimento das sementes, pois estas apresentam reservas de triacilgliceróis. Quando as sementes germinam, triacilgliceróis são quebrados para serem convertidos em açúcares, para servir de fonte de energia para o crescimento da planta. As plantas sintetizam açúcares usando o ciclo do glioxalato, o qual pode ser considerado um variante anabólico do Ciclo de Krebs (Figura 14.21). Figura 14.21: Ciclo do glioxalato. Metabolismo de carboidratos I 15AULA BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 52 CEDERJ RESPIRAÇÃO CELULAR Agora, que você conhece o ciclo do ácido cítrico, sua história e o conhecimento atual, vamos acompanhar um pouco da descoberta dos citocromos e da cadeia transportadora de elétrons mitocondrial. Esta etapa é fundamental para entender o processo completo da respiração celular, uma forma mais efi ciente de extração de energia utilizada pelos organismos aeróbicos. É nesta etapa que os NADHs e os FADH2s reduzidos no ciclo do ácido cítrico se reoxidam gerando energia para a síntese de aproximadamente 30 moléculas de ATP. O conhecimento de como isto acontece, veio aos poucos. Acompanhe nesta aula os passos históricos fundamentais e, na próxima, acompanhe o processo completo, tal como é entendido hoje. Nesta aula, você irá encontrar questões que não tem uma resposta correta, que pode ser mais ou menos elaborada e, por isso, não apresentamos gabarito. A aula não é essencial para entender o tema (respiração celular), mas é importante que você tente entender a história, mergulhando nela. Discuta com seu tutor e seus colegas. Fica muito mais interessante. A DESCOBERTA DOS CITOCROMOS No fi nal do século passado, um pesquisador inglês chamado MacMunn descreveu, sob os nomes mio-hematina e histo-hematina, um tipo de pigmento respiratório, identifi cado em músculos e outros tecidos de animais das mais diferentes espécies. Ele observou que este pigmento, no estado reduzido, apresentava um ESPECTRO característico composto por quatro bandas de absorção. No estado oxidado, o mesmo não apresentava as mesmas bandas. Em 1889, Levy reproduziu cuidadosamente os experimentos de MacMunn, obtendo os mesmos resultados. Entretanto, Levy interpretou o pigmento encontrado por MacMunn como uma hemoglobina. Esta interpretação dos resultados de Levy foi apoiada por Hoope Seyler que observou a presença de CO na preparação de derivados de hemoglobina. Apesar de insistentes réplicas e argumentos de MacMunn, a discussão foi encerrada e o pigmento respiratório de MacMunn foi gradualmente esquecido. ES P E C T R O Ver na aula de fotossíntese (Aula 6) o espectro de luz visível. CEDERJ 53 A U LA M Ó D U LO 4 1 5 Figura 15.1: As observações de MacMunn se basearam no espectro observado quando um feixe de luz visível atravessa o material biológico e é decomposto por um prisma. Na segunda década do século XX, David Keilin, durante seus estudos sobre a respiração em vermes e insetos parasitas, mostrou que o pigmento mio-hematina ou histo-hematina não só existia, como também possuía distribuição e importância bem maiores que as supostas anteriormente por MacMunn! Após meticuloso estudo de microespectroscopia em células e tecidos de insetos, vermes, aracnídeos, moluscos, levedura e vegetais superiores, Keilin propôs o nome Cytochrome (que signifi ca pigmento celular), para defi nir o ubíquo composto que representava claramente um característico espectro de absorção composto por quatro bandas, as quais denominou a, b, c e d, correspondentes ao estado reduzido do citocromo. O espectro do pigmento no estado oxidado não apresentava bandas distintas de absorção. A Figura 15.1 mostra, de forma esquemática, o dispositivo experimental de Keilin, usando um microespectroscópio ocular de Zeiss para estudar o espectro nos músculos torácicos de um inseto (abelha). Na Figura 15.2 você vai encontrar o resultado observado por Keilin. No lugar de MacMunn, o que você faria para ratifi car sua descoberta frente às críticas sobre uma provável contaminação dos tecidos analisados, com derivados da hemoglobina? ! Espectro de absorção Prisma Lente Lente Objeto Estágio do microscópio Fonte de luz BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 54 CEDERJ Figura 15.2: Espectro de absorção da luz visível de músculos de abelha (a). As linhas mais escuras são as linhas de absorção que aparecem sobre um espectro de luz visível de fundo característico (b). Sabendo-se da propriedade oxirredutora dos citocromos e do possível envolvimento com o fenômeno da respiração, o que você espera que aconteça com o espectro de absorção quando a abelha movimenta as asas e quando esta permanece quieta? Keilin também trabalhou com suspensão de levedura. O que você espera ter acontecido quando Keilin borbulhou ar na cubeta contendo uma suspensão de levedura? ! Keilin verifi cou ainda que o aparecimento ou não das bandas era grandemente afetado pela presença de agentes como o monóxido de carbono e o cianeto. Alguns anos mais tarde, Keilin e Hartree, um de seus colaboradores, utilizando estes inibidores observaram que cada conjunto de faixas do espectro de absorção não surgia ou desaparecia ao mesmo tempo. Perceberam que após a adição de cianeto existia uma ordem seqüencial para o aparecimento das bandas que sempre se repetia: d, a, c e b. No lugar de Keilin e Hartree, o que você concluiria a partir destas observações? Qual o destino fi nal dos elétrons após o último citocromo? ! O envolvimento dos citocromos no processo de oxidação dos açúcares e consumo de oxigênio começava a ser desvendado. Os citocromos foram designados posteriormente, na ordem de sua seqüência no processo de transporte de elétrons como: citocromo b, citocromo c, citocromo a e citocromo a3 (ou citocromooxidase). a b CEDERJ 55 A U LA M Ó D U LO 4 1 5Pouco tempo depois, o ciclo dos ácidos tricarboxílicos (ciclo do ácido cítrico) foi elucidado por Sir Hans Krebs, mas ainda havia muita discussão sobre os mecanismos que acoplavam as oxidações ao fornecimento de energia para os seres vivos. Neste contexto, dois pesquisadores russos, Belitser e Tsybakova, em 1939, estabeleceram uma possível relação entre a glicólise e as reações de oxidação e redução associadas à fosforilação. Suas descobertas foram assim descritas: O MECANISMO DE FOSFORILAÇÃO ASSOCIADO À RESPIRAÇÃO V. A. Belitser e E. T. Trybakova Laboratório de Química Fisiológica, Universidade de Moscou, U.S.S.R. (Submetido em 10 de junho de 1939) A síntese de adenosinatrifosfato e fosfagen (fosfocreatina) ocorre no músculo à custa da energia derivada da glicólise ou da respiração celular. Entretanto, através de algumas descobertas indiretas, parece que alguns processos oxidativos podem estar ligados com a fosforilação sem ter qualquer conexão direta com a glicólise. Braunshteyn e Severin mostraram que a oxidação do ácido pirúvico, cetobutírico e ácido glutâmico, bem como de alanina, causa uma estabilização da adenosina trifosfato em eritrócitos nucleados. Grimlund encontrou que a oxidação do ácido lático, ácido pirúvico e ácido succínico aumenta a capacidade de trabalho de um músculo no qual a glicólise foi obliterada. Isto também foi encontrado por Meyerhof e seus colaboradores para o caso do ácido lático e também declarou que a oxidação lática causa a estabilização do fosfagen em músculos envenenados por iodoacetato. Levando em consideração estes achados em que etapa está ocorrendo o armazenamento de energia na forma de “fosfagen” (ésteres de fosfato)? ! BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 56 CEDERJ Assim, Belitser e Tsybakova interessados em investigar a síntese de ésteres de fosfato (fosfagen) realizaram o seguinte experimento: incubaram preparações de músculos de pombo na presença ou ausência de ácido pirúvico (o substrato respiratório) e mediram fosfagen sintetizado e taxa respiratória (Figura 15.3). Figura 15.3: Síntese de Fosfagen na presença de ácido pirúvico (músculo de pombo). I: antes da incubação; II: em N2 sem ácido pirúvico; III: o mesmo com ácido pirúvico; IV: in O2 com ácido pirúvico; V: o mesmo sem ácido pirúvico. Nesta e nas ilustrações seguintes, o fosfagen sintetizado é expresso em mg de P2O5 e a taxa respiratória é expressa em µL de O2 por 30 minutos, por grama de tecido. O que sugere este resultado? ! Observe que na presença de ácido pirúvico e O2 (IV) tanto a síntese de fosfagen quanto a taxa de respiração celular são maiores que nas outras situações experimentais e, além disso, são proporcionais. Os mesmos autores também mostraram, no mesmo trabalho, que praticamente todo o ácido pirúvico era oxidado durante a respiração. Além disso, eles investigaram o efeito de outros substratos respiratórios (ácido cítrico, ácido fumárico, α-cetoglutarato e ácido succínico) na síntese de fosfagem e no consumo de oxigênio, como mostrado abaixo (Tabela 15.1). 6,0 5,0 4,0 3,0 2,0 1,0 100,0 200,0 300,0 400,0 500,0 I II III IV V R es p ir aç ão , L O 2 Fo sf ag en , m g P 2 O 5 CEDERJ 57 A U LA M Ó D U LO 4 1 5 Datas dos Experimentos Tecido Substrato Respiração em µL O2 por 1 g de tecido por 30 minutos Aumento de fosfagem em mg de P3O2 por g de tecido Sem substrato Com substrato Sem substrato Com substrato 1939 1° de abril 19 de abril 05 de maio 07 de abril 1938 03 de junho 16 de maio 26 de outubro 10 maio Coração de coelho Coração de coelho Coração de coelho Coração de coelho Músculo de pombo Músculo de pombo Músculo de pombo Músculo de pombo Ácido cítrico Ácido Fumárico α - cetoglutarato Ácido Succínico Ácido málico Ácido lático Ácido pirúvico Ácido acético 263 95 120 206 280 252 214 170 399 386 540 956 420 387 420 153 4,00 0,20 0,45 2,30 0 0 0 0 7,25 5,62* 3,40* 4,26 1,84 1,56 2,34 0 Tabela 15.1: Síntese de fosfagen ligada à oxidação de vários substratos. * na presença de 0,02 de NaF Que conclusões você tiraria deste experimento? Repare que na presença do substrato há um aumento na síntese de fosfagen e na taxa respiratória. Apenas quando o substrato respiratório era o ácido acético não foi observado um aumento signifi cativo na presença do substrato. Cerca de dois anos mais tarde, 1941, Fritz Lipmann postulava o conceito de “ligação fosfato rica em energia”, como descreveu a seguir. BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 58 CEDERJ GERAÇÃO METABÓLICA E UTILIZAÇÃO DA ENERGIA LIGADA AO FOSFATO Fritz Lipmann Laboratório de Pesquisa Bioquímica, Hospital Geral de Massachusetts e Departamento de Química Biológica – Escola Médica de Harvard, Boston, Massachusetts I- Introdução Histórica Por um longo período a descoberta de Harden e Young, a fosforilação de hexose na fermentação alcoólica, foi considerada com signifi cado apenas como uma forma de modelar a molécula de hexose para ajusta-lá à quebra fermentativa. Entretanto, como resultado de um estudo intensivo das reações intermediárias da fermentação e a relação entre ação muscular e metabolismo, tornou-se evidente que a ligação éster fosfato primária da hexose transforma-se metabolicamente em um novo tipo de ligação fosfato de alta energia. (...) Durante vários processos metabólicos o fosfato é introduzido em compostos não meramente, ou no mínimo não somente, para facilitar sua quebra, mas como um provável carreador de energia. Resumir a geração metabólica e a circulação deste peculiar tipo de energia química é a proposta primária deste trabalho. Logo foi reconhecido o papel do ATP como um carreador de energia nos processos metabólicos. Mas, qual o sítio de síntese de ATP na célula? O que você faria para responder a esta questão? ! Em 1949, devido ao desenvolvimento tecnológico propiciado pela Segunda Grande Guerra, E. P. Kennedy e A. L. Lehninger utilizam centrífugas refrigeradas e submetem variando de 1.500 X g (1g = 9,8m/s2, aceleração da gravidade) até 20.000 g. CEDERJ 59 A U LA M Ó D U LO 4 1 5 Fração Substrato Consumo de oxigênio (µM) Mitocôndria Citrato α-cetoglutarato Piruvato + oxaloacetato Nada 7,1 6,3 7,1 0,18 Precipitado Nuclear Sobrenadante Citrato α-cetoglutarato Piruvato + oxaloacetato Nada Citrato α-cetoglutarato Piruvato + oxaloacetato Nada 1,9 1,7 0,98 0,0 0,54 0,0 1,4 0,31 ACELERAÇÃO FRAÇÃO CELULAR 1.000 X g: Precipita células íntegras e núcleo. de 5.000 até 15.000 X g: Precipita grandes vacúolos, cloroplastos e mitocôndrias. de 50.000 até 150.000 X g: Precipita microssomas de retículo endoplasmático. Acima de 500.000 X g: Precipita algumas proteínas solúveis. Desta forma, Kennedy e Lehninger isolam diferentes frações e obtêm o seguinte resultado (Tabela 15.2): Tabela 15.2: Atividade das frações subcelulares de fígado de rato na oxidação de compostos intermediários do ciclo de Krebs. Comparando a taxa respiratória (consumo de oxigênio) das três frações obtidas (mitocôndria, precipitado nuclear e sobrenadante), qual das frações celulares está envolvida com a respiração, e como você integraria os resultados obtidos por Keilin e Belitser & Tsybakova? Como você comprovaria o seu esquema?! BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 60 CEDERJ Kennedy e Lehninger mediram paralelamente o consumo de oxigênio e o fosfato esterifi cado, utilizando vários substratos respiratórios. A Tabela 15.3 apresenta estes resultados. Observe que, em comparação com o controle (sem adição de substrato), existe um aumento tanto na taxa respiratória quanto no fosfato esterifi cado quando são utilizados citrato, alfa-cetoglutarato, piruvato + oxaloacetato ou octanoato como substratos. Experimento Substrato Consumo de oxigênio 1 Nada Citrato α−cetoglutarato Piruvato + oxaloacetato 0,18 7,1 6,3 7,1 2 Nada (0,0001 M malato presente) Octanoato 0,5 4,5 µM Fosfato esterifi cado 24,2 106 113 113 37 121 y 32Pi esterifi cado 0,67 31,3 39,3 32,6 3,2 27,8 % Tabela 15.3: Esterifi cação de fosfato acoplado à oxidação na mitocôndria. Anos mais tarde, no laboratório de A.L. Lehninger, foi verifi cado que nucleotídeos de diidro-difosfopiridina (DNPH2 na nomenclatura antiga, atualmente conhecido como NADH) aumentavam a incorporação de 32Pi (fosfato inorgânico radioativo) em um composto com a propriedade ÁCIDO LÁBIL como a adenosina trifosfato (ATP). Tal incorporação não ocorria na presença de N2 ou na ausência de íons Mg 2+. Consumo de O2 por DPNH2 Utilizando preparação mitocondrial de fígado de rato, Lehninger fez os experimentos mostrados nas Figuras 15.4 e 15.5. No primeiro experimento (Figura 15.4), ele testou o efeito da concentração de citocromo c na velocidade de consumo. (lembre que é NADH). ÁC I D O LÁ B I L Propriedade “ácido lábil” signifi ca que o composto é sensível a meios ácidos. Usa-se lábil em contraposição a resistente. Temos ainda termolábil em contraposição a termorresistente. CEDERJ 61 A U LA M Ó D U LO 4 1 5 O que sugere o experimento da Figura 15.4? ! Os resultados mostram que, na ausência de citocromo, o consumo de oxigênio é basal e que a adição de citocromos à preparação de mitocôndria de fígado de rato aumenta a taxa respiratória. No segundo experimento (Figura 15.5), ele testou o efeito da concentração de citocromo c na velocidade de oxidação de DPNH2 (lembre que é NADH). Figura 15.4: Efeito da concentração de citocromo c na velocidade de oxidação de DPNH2. 1 – sem adição de citocromo 2 – adição de 5 x 10-6 M 3 – 1,0 x 10–5 M 4 – 5 x 10–5 M 5 – 1,5 x 10-4 M 10 20 30 40 50 M ic ro át o m o s d e o xi g ên io c o n su m id o tempo em minutos Consumo de O2 / DNPH2 adicionado 0 5 10 15 20 M ic ro át o m o s d e O 2 co n su m id o M ic ro m o ls D PN f o rm ad o o u D PN H 2 d es ap ar ec id o tempo em minutos 25 30 Figura 15.5: Correlação entre o consumo de oxigênio, o desaparecimento de DNPH2 e o aparecimento de DPN durante a oxidação do DNPH2. BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 62 CEDERJ Qual a relação entre o desaparecimento de NADH2 e o consumo de oxigênio na Figura 15.5? ! A seguir, Lehninger mediu simultaneamente a relação entre DPNH2 e fosfato (orto-fosfato) no ensaio de respiração (Tabela 15.4). Tabela 15.4: Medidas da razão Pi/DPNH2. Experimento número Tipo de enzima Citocromo c (M) 2 H2O 4 X 10 -4 0,003M DPN Tempo (minutos) 0 8 15 0 17 Orto-fosfato (µM) 4,72 2,81 1,96 7,43 7,27 DPNH2 (µM) 4,94 3,92 3,13 P/DPNH2 1,89 1,52 Tubos duplicados contendo 0,005M de MgCl2, 0,005M de KCl, 0,002M a 0,004M de ADP, 0,02M de tampão glicil-glicina pH 7,4, citocromo c, ortofosfato, DPNH2, na concentração indicada na tabela e 0,03M de NaF. Cada tubo recebeu 0,30 ml da suspensão da partícula indicada (partículas derivadas de 50 mg de fígado de rato) para um volume total de 2,0 mL. A temperatura nos diferentes experi- mentos variou de 17 – 24o C. Observando as medidas de A.L. Lehninger na Tabela 15.4, sugira o papel do NADH2 durante a oxidação da glicose e relacione com a síntese de ATP. ! Observe que a concentração de DPNH2 cai e a de fosfato também, conforme aumenta o tempo de ensaio. Entretanto, a relação fosfato e DPNH2 parece não ser muito alterada, o que sugere que a utilização do fosfato (provavelmente para a síntese de ATP) e a diminuição na concentração de DPNH2 (provavelmente oxidado a DPN) são eventos acoplados. CEDERJ 63 A U LA M Ó D U LO 4 1 5 Figura 15.6: A estrutura do 2,4-dinitrofenol (DNP), um veneno metabólico. Em 1948, Loomis e Lipmann publicam um trabalho investigando o acoplamento entre o consumo de oxigênio e a fosforilação, com o efeito do 2,4-dinitrofenol (DNP): Tabela 15.5: Efeito do DNP no consumo de oxigênio e fosfato em homogenatos de rim de coelhos. Adições Consumo de oxigênio Nenhuma 8 X 10 -4 MDNP 8,0 7,9 Consumo de fosfato 17,5 1,3 Razão Pi: O 2,2 0,2 Todas as amostras contêm 10 ml da preparação de uma enzima similar àquela de Green et al., preparada por centrifugação de homogenato de rim de coelho em tampão KCl-NaHCO3 e lavagem do resíduo 2 vezes com o tampão fresco. A isto foi adicionado 0,1 ml de hexoquinase de levedura e 0,0067M de MgCl2. Clinon foi o primeiro a mostrar que o dinitrofenol em baixas concentrações bloqueia completamente as reações sintéticas sem interferir na oxidação. Outros autores têm mostrado que esta droga inibe a assimilação de nitrogênio, crescimento e diferenciação, a formação de enzimas adaptativas, e Hotchkiss tem reportado dados prelimirares mostrando que o DNP previne consumo de fosfato durante a respiração de células de levedura. Estes resultados parecem indicar que DNP atua no mecanismo básico da célula pelo qual a geração de ligações fosfato está acoplada a reações de oxidação. Loomis & Lipman, 1948 Que conclusões você tiraria destes dados? ! BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos I 64 CEDERJ É interessante que o DNP (Tabela 15.5) não afeta o consumo de oxigênio, mas inibe drasticamente o consumo de fosfato. Isso signifi ca que, embora os dois processos estejam acoplados, eles são independentes (ver hipóteses de acoplamento de energia na próxima aula). Durante muitos anos, o DNP foi prescrito para uso em tratamento da obesidade, pois os pacientes que o utilizavam mostravam uma rápida diminuição em seu peso. Como você explicaria este fenômeno do ponto de vista bioquímico? Você acharia adequado tal tratamento? ! Os resultados mostrados até aqui dão uma idéia do que ocorre na mitocôndria e que resulta em transformação da energia química do alimento em energia química da molécula de ATP. Este processo é vital para os organismos aeróbicos. Na aula seguinte, vamos mostrar como isso acontece. Não esqueça que o que sabemos é resultado desta história e de muitas outras que não caberiam aqui. Muita gente trabalhou e continua trabalhando para entender como este processo ocorre. Metabolismo de carboidratos II Ao fi nal desta aula, você deverá ser capaz de: Entender os processos de oxirredução dos componentes da cadeia transportadora de elétrons. Compreender o processo de síntese de ATP. 16AULA ob jet ivo s BIOQUÍMICA II | Metabolismo de carboidratos II 66 CEDERJ Da história contada na aula anterior podemos extrair as idéias fundamentais que explicam como a energia contida no alimento pode ser transformada em ATP nas células, na presença de oxigênio. O pigmento respiratório de MacMunn ou os citocromos de Keilin; o processo de transferência
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