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Geradores de vapor: caldeiras Apresentação Os geradores de vapor, também chamados de caldeiras, são equipamentos conhecidos desde a Revolução Industrial inglesa. Na realidade, há registros de equipamentos similares operando com vapor há mais de 2 mil anos. Apesar de antigos e muito conhecidos, os geradores de vapor foram atualizados ao longo do tempo, evoluindo e acompanhando a marcha tecnológica, chegando aos dias de hoje com um papel fundamental na sociedade. Muito além de equipamentos associados à poluição gerada pela queima de carvão em termelétricas, essas caldeiras permanecem sob o interesse de pesquisas atuais que usam calor geotérmico, ou solar, para converter vapor em energia elétrica, e parecem ser uma promessa de apoio na busca por uma matriz energética mais limpa. Os princípios de operação dos geradores de carvão são profundamente apoiados em conceitos da termodinâmica. Os projetos, muitas vezes complexos e grandiosos, buscam sempre elevar a eficiência dos ciclos, reduzindo perdas e diminuindo impactos no meio ambiente. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender a classificar as caldeiras de acordo com seus aspectos principais, além de entender a que aplicação cada modelo se destina, conectando suas características aos princípios e propriedades termodinâmicos. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer as características das caldeiras.• Relacionar os dados técnicos de caldeiras e a qualificação da água.• Analisar a eficiência das caldeiras.• Desafio A lenha e o óleo são combustíveis muito utilizados em caldeiras. Caldeiras de pequeno e médio porte, que fornecem vapor para processos industriais, frequentemente utilizam esses combustíveis. A lenha é também usada em caldeiras inseridas em processos de cogeração, em que o vapor é fornecido para o processo industrial e também para a geração local de energia elétrica por meio de uma turbina de vapor. Apesar de serem combustíveis baratos, seu impacto no meio ambiente tem levado algumas indústrias a optar por um combustível mais limpo, o gás natural. A conversão de uma caldeira a lenha ou a óleo para gás natural é possível, desde que observados diversos aspectos técnicos. Suponha que você foi contratado para fazer uma consultoria para uma empresa de sua cidade sobre a conversão de uma caldeira flamotubular. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/87df0798-6d38-4f9f-b1ef-9e7e3531a479/90e54f5d-c6a2-4f56-9c72-b55d8256d678.png Assim, com base nos dados da tabela, determine os parâmetros a serem apresentados ao cliente: a) Eficiência da caldeira operando com óleo. b) Percentual da energia inserida na caldeira para pré-aquecer a água de alimentação. c) Consumo esperado de gás natural para atender ao consumo de vapor da planta, considerando uma eficiência da caldeira de 70%. Infográfico vPor serem equipamentos que operam com grandes volumes de vapor a alta temperatura e pressão, os geradores de vapor representam um perigo potencial para as vizinhanças de sua localização. Ao longo da história, muitos acidentes envolvendo caldeiras já foram registrados e a morte de operadores e pessoas próximas comprova o risco desses empreendimentos. Veja, no Infográfico, os principais equipamentos e dispositivos adotados para garantir a operação segura de geradores de vapor. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/d102291d-1664-43b6-8192-7c05f8587a5b/7efee1ac-98ce-416d-bd89-5a60843e40ff.png Conteúdo do livro De forma mais básica, geradores de vapor têm como objetivo transferir para água líquida o calor proveniente de outra fonte. Essa transferência de calor promove a evaporação da água para posterior utilização. Embora o objetivo básico seja comum, existem vários modelos de geradores de vapor com características construtivas diferentes que se apoiam em princípios de operação distintos. Apesar de os modelos construtivos serem variados, alguns princípios são comuns a todos os tipos de caldeiras. É o caso, por exemplo, do tratamento da água a ser utilizada na vaporização. Esse e outros procedimentos de manutenção acabam sendo muito similares, independentemente do tipo ou da escala do gerador. Questões como determinação da eficiência e fontes de perdas envolvidas na conversão de energia também são parecidas entre os diferentes modelos. No capítulo Geradores de vapor: caldeiras, da obra Máquinas térmicas, base teórica desta Unidade de Aprendizagem, você vai conhecer as características técnicas dos modelos mais comuns de geradores de vapor, as caldeiras flamotubulares e aquatubulares. Entenda suas aplicações e princípios de operação. Boa leitura. MÁQUINAS TÉRMICAS Conrado Ermel Geradores de vapor: caldeiras Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer as características das caldeiras. � Relacionar os dados técnicos de caldeiras e qualificação da água. � Analisar a eficiência das caldeiras. Introdução Não há uma definição universal sobre o equipamento conhecido como caldeira. Esse dispositivo, também conhecido como gerador de vapor, possui várias definições, apesar de fazer parte do cotidiano industrial. Pode-se dizer que uma caldeira é um equipamento cuja finalidade é gerar vapor de água a partir de seu estado líquido, recebendo energia de uma fonte externa. É importante entender que a caldeira pode ser vista como um con- junto, como no caso de uma caldeira que queima carvão ou lenha, ou apenas como o sistema que transfere calor de uma fonte qualquer, produzindo vapor. Essa diferenciação é importante, pois, a partir dela, tem-se a clareza de que o equipamento gerador de vapor pode ser operado com diferentes combustíveis. Caldeiras são utilizadas em plantas termelétricas movidas a carvão, gás natural ou energia nuclear e também transformam em eletricidade a energia recebida de fontes geotérmicas, biomassa ou parques de energia solar térmica. Neste capítulo, você vai estudar os diferentes modelos e classifica- ções de caldeiras, como as caldeiras flamotubulares e aquatubulares, verificando os seus aspectos comuns e as suas diferenças. 1 Aspectos gerais de caldeiras As caldeiras são dispositivos de alta complexidade e, por lidarem com vapor de água sob alta pressão e alta temperatura, são instalações de alta periculo- sidade. Esses equipamentos apresentam variadas características construtivas, que diferem de modelo para modelo. Entretanto, algumas características são comuns a todas as caldeiras — algumas dessas características serão apresen- tadas nesta seção. Classificação de caldeiras Existem diversos modelos de caldeiras, desenvolvidos para atender a aplica- ções específicas, mas, em linhas gerais, é possível classificar as caldeiras com base em algumas de suas características principais. Caldeiras são o coração de plantas termelétricas e diversos outros segmentos da indústria. Segundo Woodruff, Lammers, H. e Lammers, T. (2014), elas convertem energia prove- niente de quatro fontes de energia básicas: energia química de combustíveis fósseis, energia nuclear, e a partir da fissão ou da fusão de átomos. Assim, as caldeiras podem se destinar a suprir três demandas principais: 1. aquecimento ou fornecimento de calor para processador; 2. geração de energia elétrica; 3. movimentação de máquinas e motores (motores de barcos e navios, por exemplo). Essa definição é um pouco mais ampliada sob a visão de Rayaprolu (2009), que classifica as caldeiras segundo diversos aspectos. A Figura 1 apresenta algumas dessas classificações. Geradores de vapor: caldeiras2 Figura 1. Classificações de caldeiras quanto aos seus diferentes aspectos. Fonte: Adaptada de Rayaprolu (2009). Quanto à disposiçãodo sistema de água e do compartimento da fonte quente, há dois grandes grupos de caldeiras: as flamotubulares e as aquatubu- lares. Elas abrangem diferentes formas de acomodar a transferência de calor para a água e, por serem muito relevantes, serão tratadas nas seções seguintes. A forma de alimentação também é utilizada como uma forma de classificação de caldeiras, sendo que o sistema de alimentação é naturalmente dependente do combustível utilizado. Nesse quesito, caldeiras são bastante flexíveis, pois necessitam apenas de uma fonte de calor capaz de fornecer energia suficiente para mudar o estado da água para vapor. Por esse motivo, podem operar com uma grande variedade de combustíveis e fontes de calor, como é o caso de plantas geotérmicas e usinas térmicas solares. 3Geradores de vapor: caldeiras Potter e Somerton (2017) apresentam uma importante classificação de cal- deiras que está relacionada com a pressão de operação do fluido de trabalho e afeta diretamente o estado do fluido. Ciclos termodinâmicos operando em pressões inferiores a 200 bar são denominados subcríticos. Em faixas de pressão entre 200 e 300 bar, o ciclo passa a ser chamado de supercrítico, e, quando a pressão de trabalho passa de 300 bar, temos o ciclo ultra-supercrítico. Uma classificação não tão usual pode ser discutida em relação à utilização da caldeira, sendo ela dividida entre industrial, caldeira de utilidade e caldeira nuclear. Segundo Rayaprolu (2009), outra classificação prática, muito utilizada, se refere ao sistema de montagem das caldeiras. Sob esse aspecto, as caldeiras podem ser classificadas em caldeiras prontas (em inglês, package boilers) ou caldeiras montadas no local (em inglês, field-erected boilers). A primeira é fornecida ao cliente, já totalmente montada, pronta para ser instalada no local de operação. Esse tipo geralmente é utilizado para caldeiras de pequeno porte. O segundo tipo, geralmente referente a caldeiras de médio e grande porte, tem suas peças fabricadas previamente, para posterior montagem da estrutura e dos equipamentos da caldeira diretamente no lugar de operação. Na Figura 2, são apresentadas as faixas de operação de cada tipo de caldeira em função da pressão de operação e da capacidade de geração. Dentro de todo o espectro apresentado na Figura 2, ressaltam-se as caldeiras flamotu- bulares, muito comuns em indústrias de pequeno e médio porte, de diversos segmentos, sendo usadas para fornecer vapor saturado à unidade industrial. Tem-se também em destaque a região de operação de caldeiras subcríticas de combustível pulverizado (PF, do inglês pulverised-fuel), operando com a finalidade tanto de gerar energia elétrica como de atender à demanda de vapor para determinados processos no parque industrial. A sigla CFBC (do inglês circulating fluidized bed boilers) se refere às caldeiras com leito fluidizado circulante, enquanto a sigla BFBC (do inglês bubbling fluidized bed combus- tion) se refere às caldeiras com combustão em leito fluidizado borbulhante. No campo de caldeiras supercríticas e ultra-supercríticas (não apresentadas na figura), temos exclusivamente caldeiras operando com o objetivo de gerar energia elétrica — ou seja, centrais termelétricas. Geradores de vapor: caldeiras4 Figura 2. Tipos de caldeiras em relação à faixa de pressão de operação e sua capacidade de geração de vapor. Fonte: Adaptada de Rayaprolu (2009). Compreender as motivações para o desenvolvimento dos equipamentos a vapor e o seu aperfeiçoamento, conhecendo o contexto local e cronológico, é uma forma interessante de se analisar a evolução desses equipamentos. Assista ao vídeo intitulado “A História das máquinas térmicas e termodinâmica — Ciência com um Q de História”, do canal Ciência do Q? no YouTube, e conheça a história de diversas máquinas térmicas e caldeiras, bem como sua relação com a termodinâmica. 5Geradores de vapor: caldeiras Aplicações dos modelos de caldeiras Pode-se encontrar caldeiras aquatubulares em empreendimentos de variadas proporções. Não há limitação da capacidade de produção de vapor inerente à característica construtiva (SABET, 2016). Essas caldeiras são aplicadas, em grande parte, em centrais térmicas, operando com ciclo Rankine, para gerar energia elétrica, como mostra a Figura 3. A letra (a) corresponde ao circuito termo-hidráulico do ciclo, (b) é a área de combustão da caldeira, juntamente com a destinação dos gases de combustão; a área (c), apesar de também ser denominada circuito termo-hidráulico, é tratada separadamente, pois envolve circuitos complexos para tratar a água de resfriamento. O gerador elétrico (d) é acoplado diretamente ao eixo da turbina a vapor, para diminuir perdas mecânicas. Figura 3. Esquema simplificado dos componentes de uma planta termelétrica a vapor. Fonte: Adaptada de Moran et al. (2018). Geradores de vapor: caldeiras6 Certamente, o ciclo Rankine é o mais utilizado em centrais termelétricas. Seu nome é uma homenagem à pessoa que calculou pela primeira vez o valor do máximo trabalho que poderia ser extraído de um ciclo operando entre os limites de uma caldeira e um condensador: William John Macquorn Rankine. Por outro lado, caldeiras flamotubulares se destinam à geração de vapor saturado, para atender à demanda de utilidades como vapor e água quente para processos industriais (TEIR, 2003). Podemos encontrar caldeiras flamotubula- res em segmentos variados, como a indústria de alimentos (laticínios, bebidas, frigoríficos, entre outros). Esse tipo de indústria utiliza o vapor saturado para fins de aquecimento e também para limpeza de equipamentos e ambientes. Na indústria de alimentos, grande parte da utilização do vapor é dedicada a sistemas de aquecimento indireto. Nesse caso, o fluido de trabalho, o vapor, não entra em contato direto com o alimento. Trocadores de calor, geralmente construídos em aço inox, promovem a troca de calor dentro de tanques e rea- tores, garantindo, assim, os níveis de cuidado sanitário e higiene necessários. Em casos em que a injeção de vapor é feita diretamente no alimento, caldeiras dedicadas são utilizadas. De acordo com Lewis e Heppell (2000), nesses sistemas de distribuição de vapor, existem cuidados especiais em relação ao tratamento da água, para evitar corrosão e detritos na linha de vapor. É comum nessas aplicações a utilização de caldeiras elétricas dedicadas. Cada fabricante de caldeira adota seus procedimentos de segurança e seu know-how tecnológico. Em linhas gerais, muitos utilizam as normas americanas da American Society of Mechanical Engineering para balizar seus projetos. A inspeção de caldeiras industriais também é uma atividade de grande importância, pois ela garante condições de operação seguras. No Brasil, a Norma Regulamentadora R-13 dispõe sobre caldeiras e vasos de pressão. Ela discrimina os procedimentos adequados e os formulários a serem preenchidos e também indica quais profissionais têm habilitação para desempenhar a função de inspetor de vasos de pressão. 7Geradores de vapor: caldeiras Processos industriais que requerem vapor saturado são caracterizados por variações no perfil de consumo. Conforme apresentado por Teir (2003), essa característica é muito bem atendida por caldeiras flamotubulares, tornando esse tipo de caldeira muito popular na indústria. Seus custos de instalação e manutenção são muito menores, se comparados aos custos de caldeiras aquatubulares. Porém, sua utilização acaba sendo limitada a indústrias com pequeno consumo de vapor. Esse tipo de caldeira não é encontrado atualmente em plantas de geração de energia elétrica. 2 Dados técnicos e qualificação da água de caldeiras Caldeiras são suscetíveis às condições ambientais, especialmente às condições de tratamento da água utilizada. Assim, é necessário entender o princípio de funcionamento de cada modelo de caldeira e como isso torna a caldeira vulnerável a diversos problemas de manutenção. Aquatubular: princípio de funcionamentoDe acordo com Sabet (2016), geradores de vapor aquatubulares são aqueles em que a água está contida dentro dos tubos, enquanto a combustão e a passagem dos gases à alta temperatura ocorrem do lado de fora dos tubos. Sob o ponto de vista da transferência de calor, caldeiras aquatubulares são o oposto de caldeiras flamotubulares. Entretanto, as diferenças das caldeiras aquatubulares em relação às flamotubulares, que são os geradores de vapor mais populares na indústria, são muito mais expressivas. Geradores de vapor: caldeiras8 A função de uma caldeira aquatubular, assim como de qualquer outra caldeira, é transferir energia térmica proveniente de alguma fonte para o fluido de trabalho. A fonte de energia abrange combustíveis fósseis, líquidos, sólidos e gasosos, além de fontes geotérmicas, energia solar térmica ou rejeito de calor de outros processos. Em todos os casos, a fonte de calor está na parte externa dos tubos que conduzem a água. Assim, ocorre o processo de evaporação gradual da água, que é posteriormente extraída de um reservatório situado na parte superior da caldeira (TIER, 2003). Conforme apresentado na Figura 4, existem duas correntes principais nas caldeiras aquatubulares. A primeira é a corrente dos gases de combustão, que é a fonte de calor do processo. A outra grande corrente é o circuito de água. Assim, a caldeira pode ser vista como um grande trocador de calor, em que a evaporação da água ocorre dentro dos tubos, com três etapas, denominadas evaporação nucleada, zona de transição e evaporação de filme, conforme apresentado por Buecker (2002) e mostrado na Figura 4c. A Figura 4b apresenta apenas uma simplificação do processo. Caldeiras aquatubulares são equipamentos complexos, que possuem inúmeros trocadores de calor, bombas e sistemas de segurança. A Figura 4a dá uma noção mais realista de uma caldeira aquatubular que opera com combustível pulveri- zado. Nesse caso, ela possui sistema de aquecimento de ar, economizador e superaquecedor. As paredes de água promovem a evaporação da água, que retorna ao tubulão superior em sua fase gás. Nesse processo contínuo, segundo Buecker (2002), água e vapor são separados no tubulão, e o vapor saturado seco é, então, forçado a passar por uma série de trocadores de calor, que levam o fluido ao estado de vapor superaquecido. Dessa forma, ele pode ser expandido em uma turbina a vapor, garantindo que não haja formação de condensado e, consequentemente, danos nas palhetas da turbina. Após vários estágios de expansão, o vapor condensado retorna para o sistema de abastecimento de água, reiniciando o seu ciclo. 9Geradores de vapor: caldeiras Figura 4. Caldeira aquatubular. (a) Caldeira aquatubular com combustível pulverizado, aquecedor de ar, economizador e superaquecedor (SH = superaquecedor, do inglês su- perheater; AH = preaquecedor, do inglês air heater; RH = reaquecedor, do inglês reheater; ECON = economizador). (b) Diagrama simplificado das correntes quente e fria. (c) Etapas da evaporação da água dentro do tubo (DNB = transição da zona de nucleação, do inglês departure from nucleate boiling). Fonte: a) Adaptada de Rayaprolu (2013); b) Sarkar (2015, p. 57); c) Buecker (2002, p. 29). (a) (b) (c) Geradores de vapor: caldeiras10 Características técnicas As caldeiras aquatubulares podem ser aplicadas em pequena, média e grande escala, mas são muito comuns em empreendimentos de grande porte, tendo como objetivo gerar vapor superaquecido para posterior expansão em turbinas. Há uma grande variedade de modelos construtivos de caldeiras aquatubulares. O princípio de operação das caldeiras aquatubulares é o mesmo, porém, sua forma construtiva pode variar significativamente em relação à combustão utilizada ou em relação ao circuito termo-hidráulico (sistema água/vapor). A combustão de combustíveis pulverizados, muito comum nesse tipo de caldeira, é obtida por meio da moagem do combustível (usualmente carvão) e da posterior pulverização do combustível em pó (ANNARATONE, 2008). O carvão é reduzido a partículas que podem variar de 55 a 100 micro- metros. Uma parcela da energia inserida no ciclo é destinada aos moinhos, equipamentos de grande porte e difícil manutenção. A injeção de carvão pode ser feita em um esquema de queima frontal, ou queima tangencial. A câmara de combustão é revestida de tubos de água, que formam a chamada parede de água, onde ocorre a transferência de calor para gerar o vapor, como mostrado na Figura 5. Figura 5. Paredes de água de uma caldeira aquatubular em estágio de montagem. (a) Visão geral. (b) Detalhe do nicho para inserção do queimador. Fonte: Teir (2003, p. 58). (a) (b) 11Geradores de vapor: caldeiras Outro ponto de projeto que pode diferir em caldeiras aquatubulares está relacionado à forma de circulação da água nos dutos. Segundo Woodruff, Lammers, H. e Lammers, T. (2004), a classificação em relação a essa carac- terística pode ser dividida entre esquema de circulação natural e esquema de circulação forçada. Na circulação natural (Figura 6a), a bomba de alimentação apenas garante a manutenção do nível de água do tubulão, à medida que ele diminui em função do consumo de vapor. A circulação natural ocorre devido à variação da massa específica da água, à medida que ela recebe o calor da fornalha. O vapor de água, apresentando massa específica muito menor do que a água líquida, tende a retornar ao tubulão superior naturalmente. Essa circulação, então, ocorre de forma permanente durante a operação da caldeira. Na prática, segundo Teir (2003), a pressão no sistema deve ser menor do que 170 bar para que haja uma circulação adequada. No esquema de circulação forçada (Figura 6b), uma segunda bomba promove a circulação da água, acelerando seu retorno ao tubulão superior (BUECKER, 2002). Figura 6. Esquemas de circulação de água em uma caldeira aquatubular. (a) Circulação natural. (b) Circulação forçada. Fonte: Adaptada de Teir (2003). (a) (b) Tubulão secundário Geradores de vapor: caldeiras12 O Quadro 1 apresenta uma comparação entre as vantagens e desvantagens desses dois sistemas, com base em Teir (2003). Fonte: Adaptado de Teir (2003). Circulação natural Circulação forçada Vantagens � Mais tolerante a impurezas na água. � Menor consumo de energia (bombas). � Grande reservatório de água, o que facilita a estabilidade de controle (inércia térmica). � Tubos com diâmetros menores. � Flexibilidade no desenho construtivo. � Não depende da massa específica da água. Desvantagens � Vazão menor, logo, as dimensões da caldeira precisam ser muito grandes. � Dimensionamento mais criterioso. � Apenas ciclos subcríticos (< 170 bar). � Maior consumo de energia. � Não adequada para variações bruscas no consumo de vapor. � É necessário um tubulão de vapor dedicado, que apresenta custo elevado. Quadro 1. Comparação entre o esquema de circulação natural e forçada Flamotubulares: princípio de funcionamento Caldeiras flamotubulares são assim chamadas por sua característica construtiva, em que feixes de tubos são dispostos dentro de um reservatório de água. Como os tubos estão imersos, seu lado externo está em contato com a água, enquanto o lado interno é percorrido pelos gases de combustão. Em geral, são caldeiras de pequeno e médio porte, utilizadas na maioria dos processos industriais para fornecer vapor saturado, além de água quente (ANNARATONE, 2008). O arranjo construtivo de caldeiras flamotubulares é concebido de forma que um grande vaso de pressão age como um reservatório que contém a mistura água-vapor, como mostra a Figura 7. A combustão que ocorre na câmara gera gases de combustão quentes, que transferem energia para o líquido que o rodeia, através dos tubos de passagem. 13Geradores de vapor: caldeiras Figura 7. Diagrama de funcionamento de uma caldeira flamotubular de passe simples. A denominação flamotubular é oriunda exatamente do fato de os tubos conterem, em seu interior,os gases quentes e, em sua parte externa, a água. O queimador, geralmente operando com óleo ou gás natural, permite a formação de uma chama quase horizontal, que percorre boa parte do tubo de chama, ou câmara de combustão. A Figura 8 mostra o resultado de uma simulação numérica computacional indicando o campo de temperatura esperado, dando uma noção do formato de chama dentro da câmara de combustão de uma caldeira de três toneladas de consumo de vapor por hora. Figura 8. Campo de temperatura de uma simulação computacional da combustão de óleo na câmara de uma caldeira flamotubular com produção de 3.000 kg/h de vapor, a uma pressão de trabalho de 10 bar. Geradores de vapor: caldeiras14 No anteparo existente na outra extremidade da caldeira, os gases de com- bustão à alta temperatura são direcionados ao feixe de tubos que os conduz até a chaminé. Durante todo o caminho percorrido, a transferência de energia para a água força a formação de vapor saturado na camada superior da caldeira. O vapor é extraído pela tomada superior, indicada na Figura 7. Características técnicas De acordo com Rayaprolu (2013), caldeiras flamotubulares são adequadas para utilização apenas com combustíveis limpos, como é o caso do gás natural ou do óleo. A estrutura interna por onde os gases de combustão circulam é complexa e naturalmente acumula sujeiras e incrustações. As constantes mudanças de direção e os pequenos diâmetros dos tubos demandam uma rotina frequente de manutenção dessas caldeiras. O formato cilíndrico, característico das caldeiras flamotubulares, tem sua origem no conceito de se ter um grande reservatório de mistura líquido-vapor à alta pressão. Sendo um vaso de pres- são, o formato cilíndrico garante uma distribuição homogênea das tensões e auxilia na integridade estrutural da caldeira. Soldas e acessos devem seguir normas de segurança criteriosas (SARKAR, 2015). Combustíveis com alto nível de particulado ou formação de fuligem, como carvão, lenha ou mesmo biomassa, não podem ser utilizados, em função da maior exigência de manutenção. Outra questão importante envolvendo caldeiras flamotubulares é o poder calorífico do combustível utilizado. Esse tipo de caldeira apresenta dimensões reduzidas, assim, a área de transferência de energia dos gases para a água não é grande. Dessa forma, é necessário que a combustão esteja contida na região da câmara de combustão, ou tubo de chama, para que, ao chegar no anteparo da outra extremidade, apenas gases de combustão sejam transportados. Segundo Rayaprolu (2013), caldeiras flamotubulares são projetadas para atenderem a consumos de vapor de até 35 toneladas por hora e pressões de trabalho menores do que 25,3 Bar ou 2,53 MPa. A geometria desses geradores de vapor é tradicionalmente tubular, disposta no sentido horizontal, como mostrado na Figura 7. Entretanto, caldeiras de pequeno porte podem ter seu arranjo construtivo no sentido vertical. O design das caldeiras flamotubulares acaba dificultando o investimento em segurança de operação. Por se tratar de um reservatório grande, esse vaso de pressão contém uma grande quantidade de vapor saturado e pode representar grande risco de morte aos operadores, no caso de um acidente. Por ser uma caldeira de baixo custo, compacta, de rápida produção, alguns fabricantes 15Geradores de vapor: caldeiras podem não destinar a qualidade necessária para que esse equipamento suporte adequadamente as condições de operação. A característica construtiva de caldeiras flamotubulares faz com que o grande reservatório de água seja também um grande reservatório térmico. Dessa forma, esse tipo de caldeira consegue suportar grandes variações no consumo instantâneo de vapor (TEIR, 2003). Em geral, esse tipo de caldeira tem uma vida útil esperada de 25 anos, sendo que há registros de operação de caldeiras com mais de 75 anos. Além das rotinas de manutenção necessárias, o tratamento da água de alimentação é um dos pontos-chave para garantir o bom funcionamento do equipamento. Caldeiras flamotubulares de médio e grande porte são montadas no local final de instalação. Para atender a demandas menores, alguns fabricantes oferecem uma solução de montagem compacta. Essa solução reduz drasti- camente o tempo e os custos de montagem e comissionamento da caldeira. Caldeiras desse tipo também representam menor investimento inicial. Os testes de qualidade são realizados no próprio fabricante, e, depois de entregue, é necessário conectar o equipamento às linhas de vapor, água e energia elétrica, para o sistema de controle. Todavia, conforme Teir (2003), elas necessitam de intervalos menores de manutenção e limpeza, para garantir a disponibilidade e a vida útil. Tratamento da água de caldeira Independentemente do tipo de caldeira com que se esteja trabalhando, os cuidados com o tratamento da água de alimentação que será transformada em vapor são comuns. A água captada da natureza carrega consigo muito mais do que moléculas de H2O. Inúmeros minerais, impurezas e componentes dissolvidos se encontram nela e são imperceptíveis ao olho humano quando a água se encontra em seu estado líquido, sob pressão atmosférica e temperatura ambiente. Porém, quando é aquecida e transformada em vapor saturado ou vapor superaquecido, esses componentes podem se tornar um grande problema para a operação de caldeiras (SABET, 2016). O tratamento de água para caldeiras é um assunto muito importante, e cada uma das diversas fases em que a água se encontra recebe uma denominação específica, como descrito a seguir (RAYAPROLU, 2013). � Água bruta: recém captada, sem tratamento. � Água tratada: recebe cuidados iniciais. � Água abrandada: tratamento da dureza da água. Geradores de vapor: caldeiras16 � Condensado: retornado do processo (sem misturas). � Água desmineralizada: quase totalmente livre de sólidos dissolvidos. � Água de alimentação: mistura pronta para entrar na caldeira. � Água da caldeira: água dentro da caldeira. � Água de reposição: adicionada para repor perdas. Três processos recebem uma atenção especial em se tratando de cuidados com a água utilizada em caldeiras: desaeração, condicionamento da água e do vapor e carryover. A desaeração visa a diminuir os níveis de oxigênio dissolvido na água. O condicionamento se refere aos diversos parâmetros e componentes existentes na água não tratada. Carryover é um termo em inglês que define o fenômeno de arraste de partículas de impurezas para fora do reservatório de água da caldeira. Diversas propriedades da água devem ser controladas em todas as etapas mostradas anteriormente. Algumas das principais impurezas encontradas na água são listadas no Quadro 2, assim como os seus efeitos e a forma de tratamento. Item Descrição Efeito Tratamento Dureza Ca, Mg e sais: CaCO3 Incrustação ABR, DM, limpeza e agentes de superfície Alcalinidade HCO, CO3, OH, CaCO3 Espuma, transporte de particulado, cor- rosão em linhas com condensado (CO2) ABR, DM, HX, AX Ácidos livres HCK, H2SO4, CaCO3 Corrosão NA CO2 Corrosão em linhas com condensado Aeração, desaeração, NA SO4 -a Incrustação (CaSO4) DM Cl-1 Aumento da corrosão DM Na+1 Corrosão (OH) DM Quadro 2. Impurezas encontradas na água, seus efeitos e tratamento (Continua) 17Geradores de vapor: caldeiras Fonte: Adaptado de Rayaprolu (2003). Item Descrição Efeito Tratamento SiO2 Incrustação AX na DM Fe e Mn Deposição nos tubos e turbina Aeração, abrandamento com calcário, CX, agentes de superfície O2 Corrosão na caldeira e trocadores de calor Desaeração, Na2SO3, inibidor de corrosão Sólidos dissolvidos Espuma ABR, CX, DM Sólidos suspensos Depósito de impurezas na caldeira e nos trocadores de calor Filtragem Óleo Espuma e arrasto de impurezas Filtragem ativa com carbono Abreviações: ABR: abrandamento da água; DM: desmineralização; HX: abrandamento com trocadores de calor; AX: desalcalinização com trocador de ânions; NA: neutralização com alcalinos;CX: trocador de cátions. Quadro 2. Impurezas encontradas na água, seus efeitos e tratamento (Continuação) 3 Eficiência em caldeiras Assim como qualquer outro equipamento, a caldeira deve ter sua operação avaliada sob diversos parâmetros, como a capacidade de atender à demanda requisitada, a segurança do dispositivo, a velocidade de resposta e, é claro, a sua eficiência (RAYAPROLU, 2009). A eficiência de uma máquina pode ser determinada de diversas formas — em geral, não há uma definição única e absoluta sobre como a eficiência deve ser definida. Em caldeiras, dois métodos são bastante utilizados, conforme descrito a seguir. Geradores de vapor: caldeiras18 Método direto Talvez uma das formas mais intuitivas para definir a eficiência seja relacio- nar o somatório de toda a energia inserida no sistema com todo o trabalho extraído. Para caldeiras, essa abordagem é válida, e, conforme apresentado por Annaratone (2008), podemos avaliar a eficiência por meio da equação 1. (1) O calor inserido, Qinserido, pode ser determinado como a soma da energia química do combustível com a energia necessária para aquecer o ar de entrada da caldeira Qaq–ar. A energia do combustível pode ser estimada em função do poder calorífico do combustível e de sua vazão de entrada no sistema. (2) onde a vazão de combustível ṁcomb é dada em kg/s, e o poder calorífico superior é dado em kJ/kg. Nesse ponto, pode-se utilizar também o poder calorífico inferior do combustível, e a escolha dependerá do tipo de tratamento que será dado em relação à umidade do combustível. Em caldeiras onde exista o preaquecimento do ar de entrada, deve-se considerar a energia gasta para elevar a temperatura dele: (3) onde ṁar é a vazão de ar admitido, em kg/s, e CPar o calor específico do ar à pressão constante. A energia extraída do sistema, em se tratando de uma caldeira, cujo produto é justamente a massa de vapor por unidade de tempo, pode ser estimada de maneira semelhante à equação 3, mas considerando as propriedades do vapor entregue, conforme a equação 4: (4) onde hvapor é a entalpia do vapor extraído do sistema, kJ/kg, e hágua a entalpia da água admitida na caldeira. 19Geradores de vapor: caldeiras Essa abordagem, conhecida como método direto, segundo Rayaprolu (2013), é adequada para resolver uma gama de avaliações envolvendo caldeiras, como caldeiras de pequeno e médio porte. Essas caldeiras costumam utilizar como combustível o óleo e o gás natural. O método direto é adequado a esse tipo de caldeira porque os combustíveis citados apresentam um poder calorífico bastante estável, o que torna as incertezas do método aceitáveis. Ainda assim, esse método apresenta incertezas significativas, não podendo ser usado em caldeiras de grande porte, que queimam combustível pulverizado, por exemplo. Método indireto (heat loss) O método indireto, também conhecido como perda de calor (em inglês, heat loss), é um teste de eficiência abrangente, aceito em praticamente todo o mundo. Trata-se de uma rotina de testes complexa realizada após o início da operação da caldeira para registrar a sua “assinatura”, ou seja, a sua caracte- rística de operação. O método indireto se baseia nas perdas de calor previstas no funcionamento natural da caldeira (Figura 9) e nos desvios que os valores calculados apresentam em relação ao estado ideal de operação dela. Figura 9. Balanço de energia típico de uma caldeira (RH = reaquecedor; SH = superaque- cedor; ECON = economizador; AH = aquecedor de ar). Fonte: Adaptada de Rayaprolu (2009). Geradores de vapor: caldeiras20 Segundo Rayaprolu (2009), esse teste é mais criterioso e leva em con- sideração a incerteza de medição dos diversos instrumentos e dispositivos distribuídos pela caldeira. Assim, o método se torna menos sensível a eventuais problemas de medição durante os testes. Se considerarmos uma caldeira com uma eficiência média de 80%, um erro de leitura de 2% em algum parâmetro pode significar um erro de até 1,6% no cálculo da eficiência, quando o método direto é utilizado. Esse mesmo erro de leitura de 2%, quando computado pelo método indireto, é reduzido para um erro acumulado de apenas 0,4% no cálculo da eficiência. Perdas e ineficiências Um grande desafio é determinar os somatórios da energia de entrada e de saída do sistema. Maior ainda é o desafio de identificar e localizar as perdas, de forma a agir efetivamente no aumento da eficiência. Segundo Rayaprolu (2013), as principais perdas em caldeiras industriais podem ser definidas conforme descrito a seguir. � Perdas de energia nos gases de combustão: compreendem de 70 a 80% de todas as perdas em uma caldeira. Ocorrem porque é necessário que os gases de combustão saiam da chaminé com temperatura relativamente alta, para evitar condensação e problemas com corrosão. � Incombustos: a combustão incompleta é reduzida aumentando-se o excesso de ar da mistura. Porém, isso aumenta as perdas no gás de combustão. Há uma região de máxima eficiência a ser buscada nesse sentido. � Perdas por radiação: perdas diretas da caldeira para o meio. Valores de referência de < 1% para caldeiras pequenas e < 0,3% para caldeiras de grande porte podem ser adotados. � Perda por calor sensível: existe apenas em caldeiras que operam com combustíveis sólidos. Refere-se à energia perdida pelas cinzas pesadas e cinzas volante (leves). � Perdas não contabilizadas: geralmente são pequenas perdas, difíceis de computar, como é o caso de erros de instrumentos. Teir (2003) estima as perdas de calor por incombustos para cada tipo de caldeira, conforme apresentado no Quadro 3. 21Geradores de vapor: caldeiras Fonte: Adaptado de Teir (2003). Tipo de caldeira Percentual de perda de calor por unidade de combustível inserida Caldeira a óleo 0,2 a 0,5% Caldeira a carvão com remoção de cinzas secas 3% Caldeira a carvão com remoção de cinzas fundidas Aproximadamente 2% Caldeira com queima em grelha 4 a 6% Quadro 3. Estimativa de perda de calor por combustível incombusto para diferentes ti- pos de caldeiras Para se garantir a operação segura e eficiente de qualquer caldeira, é preciso conhecer os seus princípios de funcionamento e as fontes de perdas mais importantes. Conhecer essas fontes é a melhor forma de trabalhar o aumento da eficiência da caldeira. A operação de caldeiras é complexa e resulta na interligação de diferentes sistemas que precisam operar em perfeito ajuste. Além de projetos ousados, esses equipamentos requisitam manutenção detalhada constantemente. Aspectos como o tratamento da água são de grande importância para garantir a vida útil do equipamento e uma operação segura. Ainda, segundo Woodruff, Lammers, H. e Lammers, T. (2004), o tratamento adequado da água utilizada na caldeira afeta diretamente a sua eficiência. Os depósitos de sujeira reduzem a efetividade da troca de calor, o que, a longo prazo, reduz significativamente a eficiência de qualquer caldeira, seja ela aquatubular ou flamotubular. Nas centrais termelétricas, onde caldeiras aquatubulares são muito em- pregadas, o ciclo Rankine é o mais utilizado. Embora o ciclo ideal considere processos como a expansão na turbina e o bombeamento para a caldeira como sendo isentrópicos, no ciclo real, as irreversibilidades do processo alteram significativamente o rendimento do ciclo, como mostrado no Quadro 4. Geradores de vapor: caldeiras22 Fonte: Adaptado de Sarkar (2015). Parâmetro Ciclo de Carnot Ciclo Rankine saturado (ideal) Ciclo Rankine saturado (real) Calor adicionado [kJ/kg] 1.441,8 2.531,58 2.560,16 Eficiência do ciclo [%] 44,01 36,61 29,19 Trabalho líquido [kJ/kg] 634,76 937,91 747,29 Consumo específico de vapor [kg/kWh] 5,67 3,84 4,82 Quadro 4. Comparação de desempenho entre os ciclos de potência As irreversibilidades do processo reduzem a eficiência do ciclo de Rankine de 36,61% para 29,19% no caso estudado por Sarkar (2015). Para melhorar a eficiência e compensar essas perdas,diversos arranjos são desenvolvi- dos no ciclo. Çengel e Boles (2013) mostram que, ao consultar o diagrama temperatura-entalpia do ciclo, conclui-se que é possível aumentar a eficiência do ciclo ao se reduzir a pressão no condensador. O aumento da pressão e da temperatura, mantendo o reservatório da fonte fria, também causa uma elevação na eficiência; entretanto, limitações físicas não permitem grandes variações nesses parâmetros. Na prática, o ciclo Rankine é equipado com sistemas de reaquecimento, que inserem novamente energia no vapor expandido no primeiro estágio da turbina. Esse vapor novamente superaquecido passa por mais estágios da turbina. Outro sistema a ser incorporado é o regenerador, ou aquecedor de água. Dessa forma, a eficiência da caldeira é elevada, na medida em que a água já entra no tubulão com uma temperatura mais próxima do ponto de ebulição (RAYAPROLU, 2013). Ganapathy (2003) diz que, em geral, caldeiras flamotubulares apresentam baixos índices de eficiência térmica, e, como os gases de combustão deixam a caldeira com uma temperatura aproximada de 400 a 450°C, o uso de eco- nomizadores não é comum. Entretanto, em situações em que o aumento da eficiência da caldeira é muito importante, essa pode ser uma solução. 23Geradores de vapor: caldeiras Atemperadores são dispositivos que injetam água fria em linhas de vapor superaque- cido, para modular a pressão e a temperatura do fluido (Figura 10). Figura 10. Atemperador de vapor. Fonte: Adaptada de Buecker (2002). Uma válvula de controle regula a vazão de água, controlando, assim, a temperatura do vapor. O atemperador, também conhecido como dessuperaquecedor, serve como um “freio” na planta térmica. Porém, seu uso excessivo implica em perdas de eficiência significativas, uma vez que ele resfria o vapor gerado. Todo o calor necessário para superaquecer o vapor é literalmente desperdiçado no momento em que o atemperador entra em ação. Acesse o vídeo “Desuperheating Animation”, no canal SpiraxSarcoUSA no YouTube, e confira uma animação de um atemperador em operação. A área de estudo de geradores de vapor é antiga e ampla. Conceitos do século XVIII são ainda utilizados e dão origem a plantas de geração de ener- gia que fornecem eletricidade para cidades atuais. Esses conceitos, muitas vezes complexos, são a base para o entendimento da termodinâmica e dos equipamentos utilizados. Ainda que os vários segmentos de estudo exijam aprofundamento e dedicação, uma visão geral e o entendimento básico dos princípios é o mínimo necessário para qualquer profissional que atue com a grande área de caldeiras. Novas tecnologias e equipamentos são apresentados constantemente. É preciso estar atento a tendências de melhoria na eficiência de operação, assim como aos cuidados com o meio ambiente. Entretanto, qualquer nova tecnologia invariavelmente se apoia nos pilares da termodinâmica e nos conceitos já sedimentados. Geradores de vapor: caldeiras24 ANNARATONE, D. Steam generators description and design. Berlin: Springer, 2008. BUECKER, B. Basics of boiler & HRSG design. Tulsa: PennWell, 2002. ÇENGEL, Y. A.; BOLES, M. A. Termodinâmica. 7. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013. GANAPATHY, V. Industrial boilers and heat recovery steam generators. New York: Marcel Dekker, 2003. LEWIS, M.; HEPPELL, N. Continous thermal processing of foods. Maryland: ASPEN Publi- shers Inc., 2000. MORAN, M. J. et al. Fundamentals of engineering thermodynamics. 9. ed. Hoboken: Wiley, 2018. POTTER, M. C.; SOMERTON, C. W. Termodinâmica para engenheiros. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2017. (Coleção Schaum). RAYAPROLU, K. Boilers a practical reference. Boca Raton: CRC Press, 2013. RAYAPROLU, K. Boilers for power and process. Boca Raton: CRC Press, 2009. SABET, M. Industrial steam systems: fundamentals and best design practices. Boca Raton: Taylor & Francis Group, 2016. SARKAR, D. K. Thermal power plant design and operation. Amsterdan: Elsevier, 2015. TEIR, S. Steam boiler technology. 2. ed. Helsink: Helsink University of Technology, 2003. WOODRUFF, E. B.; LAMMERS, H. B.; LAMMERS, T. F. Steam planta operation. 8. ed. New York: McGraw-Hill, 2004. Leitura recomendada DESUPERHEATING animation. [S. l.: s. n.], 2015. 1 vídeo (1 min 20 seg). Publicado pelo canal SpiraxSarcoUSA. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=w6sf3sZ7vug. Acesso em: 13 ago. 2020. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. 25Geradores de vapor: caldeiras Dica do professor O reservatório de água de uma caldeira, em que a mistura líquido-vapor coexiste, é um ambiente instável, turbulento e agressivo. Ao mesmo tempo que é necessário monitorar e controlar os diversos parâmetros físicos de operação da caldeira, a seleção de instrumentos que o façam com a exatidão necessária e com a garantia de sua integridade física pode ser um desafio. Nesta Dica do Professor, veja algumas das tecnologias em instrumentos de medição mais utilizadas para quantificar variáveis importantes em um gerador de vapor. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/d9aca6919ddfa2acfa9117add64c2a47 Exercícios 1) Caldeiras são dispositivos que operam com condições de alta pressão e temperatura. Sobre a segurança em caldeiras, é correto afirmar que: A) caldeiras são equipamentos que representam perigo, pois são vasos de pressão. Entretanto, por serem robustas, não requerem manutenção frequente, operando durante anos sem darem problema. B) válvulas de alívio de pressão (segurança) são dispositivos que podem eventualmente ser aplicados a caldeiras do tipo flamotubulares. Caldeiras aquatubulares não precisam, pois o tubulão de vapor é separado da fornalha. C) caldeiras são equipamentos que representam perigo, pois são vasos de pressão. O nível mínimo de água dentro do reservatório é um fator extremamente importante para garantir a segurança da operação. D) em geral, as caldeiras são equipamentos que representam pouco perigo, pois operam com água. Por serem robustas, não requerem manutenção frequente, operando durante anos sem darem problema. E) em caldeiras flamotubulares, o nível da água é um parâmetro muito importante, sendo que é mais arriscado o nível de água subir além do máximo do que deixar o nível de água da caldeira ficar menor do que o limite mínimo. 2) Caldeiras flamotubulares e aquatubulares apresentam princípios construtivos diferentes e, por suas características próprias, se destinam a aplicações também distintas. Assinale a alternativa que melhor descreve a classificação e aplicação dos tipos de caldeiras (aquatubular ou flamotubular) nos diversos segmentos da indústria: A) Caldeira flamotubular ==> Apenas pequeno porte Caldeira aquatubular ==> Geração de energia elétrica Caldeira aquatubular ==> Ciclo combinado B) Caldeira flamotubular ==> Apenas grande porte Caldeira aquatubular ==> Geração de energia elétrica Caldeira aquatubular ou flamotubular ==> Ciclo combinado C) Caldeira flamotubular ==> Apenas grande porte Caldeira flamotubular ==> Geração de energia elétrica Caldeira flamotubular ==> Ciclo combinado D) Caldeira aquatubular ==> Apenas grande porte Caldeira aquatubular ==> Geração de energia elétrica Caldeira aquatubular ==> Ciclo combinado E) Caldeira flamotubular ==> Apenas grande porte Caldeira aquatubular ==> Gera apenas vapor saturado Caldeira aquatubular ou flamotubular ==> Ciclo combinado 3) O tratamento da água é um tópico especial em relação à operação de caldeiras. Assinale a alternativacorreta sobre esse processo. A) O tratamento da água de caldeira é necessário apenas quando vapor superaquecido é o objetivo. Vapor saturado com temperaturas menores não exige tratamento da água. B) Água não devidamente tratada, com elevada dureza, pode acarretar problemas de corrosão no tubulão de vapor e também nas linhas de distribuição para o processo. C) Em caldeiras flamotubulares, o problema de deposição de minerais e impurezas é muito reduzido, pois a água está pelo lado de fora dos tubos, ou seja, não está em um espaço confinado. D) O número de ácidos livres, óleo, dióxido de carbono, oxigênio dissolvido e a pressão da água são parâmetros de tratamento indispensáveis para um bom funcionamento da caldeira. E) Entre os parâmetros de qualidade da água fornecida para a caldeira que precisam ser controlados, podem-se citar sua dureza, alcalinidade e nível de sólidos dissolvidos, entre outros. 4) Em centrais termelétricas, as caldeiras têm o objetivo de converter a energia química de um combustível em energia mecânica de eixo em uma turbina, que posteriormente é convertida em energia elétrica. Em relação à eficiência e perdas em caldeiras, qual das seguintes afirmações está correta? A) Apenas o poder calorífico superior (PCS) do combustível pode ser utilizado para determinar a eficiência de uma caldeira. B) Ciclos regenerativos são interessantes, pois extraem o melhor da eficiência dos ciclos de Brayton e Rankine. C) Uma forma de se determinar a eficiência em caldeiras (forma direta) é dada por Eficiência = Qsaída / Qentrada. D) No ciclo de Rankine, o reaquecimento aumenta a temperatura da água antes de ela entrar no tubulão da caldeira, não influenciando na eficiência. E) Em caldeiras de grande porte, as perdas por radiação chegam a representar 70-80% de todas as perdas do processo. 5) Caldeiras aquatubulares estão presentes em usinas termelétricas e também em diversos segmentos da indústria, em que podem atender à demanda de vapor para o processo, além de gerar eletricidade localmente quando instaladas em cogeração. Assinale a alternativa que melhor descreva uma caldeira aquatubular em relação a suas diversas características. A) Caldeiras aquatubulares têm como principal característica de diferenciação o fato de a fonte quente (geralmente combustão) estar do lado de fora dos tubos, enquanto a água percorre o interior destes. Podem operar em ciclos subcríticos e supercríticos, sendo que os últimos são projetados para maiores demandas de vapor. Caldeiras aquatubulares podem operar com combustível pulverizado e sólidos em forma de grelha ou leito fluidizado. Na prática, a cogeração só é possível ao se utilizarem caldeiras aquatubulares. B) Caldeiras aquatubulares têm como principal característica de diferenciação o fato de a fonte quente (geralmente combustão) estar do lado de fora dos tubos, enquanto a água percorre o interior destes. Podem operar apenas em ciclos subcríticos, visando ao projeto para maiores demandas de vapor. Caldeiras aquatubulares podem operar com combustível pulverizado e sólidos em forma de grelha ou leito fluidizado. Na prática, a cogeração só é possível ao se utilizarem caldeiras aquatubulares. C) Caldeiras aquatubulares têm como principal característica de diferenciação o fato de a fonte quente (geralmente combustão) estar do lado de fora dos tubos, enquanto a água percorre o interior destes. Podem operar em ciclos subcríticos e supercríticos, sendo que os últimos são projetados para maiores demandas de vapor. Caldeiras aquatubulares podem operar com combustível pulverizado, não podendo trabalhar com sólidos em forma de grelha ou leito fluidizado. A cogeração só é possível com caldeiras aquatubulares. Caldeiras aquatubulares têm como principal característica de diferenciação o fato de a fonte quente (geralmente combustão) estar do lado de dentro dos tubos, enquanto a água percorre D) o exterior destes. Podem operar em ciclos subcríticos e supercríticos, sendo que os últimos são projetados para maiores demandas de vapor. Caldeiras aquatubulares podem operar com combustível pulverizado e sólidos em forma de grelha ou leito fluidizado. Na prática, a cogeração só é possível ao se utilizarem caldeiras aquatubulares. E) Caldeiras aquatubulares têm como principal característica de diferenciação o fato de a fonte quente (geralmente combustão) estar do lado de fora dos tubos, enquanto a água percorre o interior destes. Podem operar em ciclos subcríticos e supercríticos, sendo que os últimos são projetados para maiores demandas de vapor. Caldeiras aquatubulares podem operar com combustível pulverizado e sólidos em forma de grelha ou leito fluidizado. Não são aplicáveis em ciclos combinados. Na prática Na matriz energética brasileira e mundial, centrais termelétricas desempenham um papel importante. Por se tratar de uma forma de conversão não sazonal, essas usinas servem como uma segurança para tempos de estiagem ou durante a oscilação dos ventos. A busca por níveis cada vez mais altos de eficiência dessas plantas levou à concepção do ciclo combinado. Nessa configuração, os rejeitos térmicos de um ciclo de potência a gás (Brayton) são utilizados para alimentar uma caldeira que opera segundo um ciclo de Rankine. Confira, Na Prática, como essa combinação pode elevar a eficiência dos ciclos térmicos para valores superiores a 50%. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/faba3aca-4e20-4a70-8bf3-5fb7fa5fa874/3276a587-c5e8-48ea-b779-cf67909f9514.png Saiba + Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Maquete – Casa das caldeiras Na indústria, as caldeiras são instaladas a uma distância segura das demais construções. Por serem equipamentos perigosos, recebem um pavilhão dedicado, onde uma equipe de operadores e de manutenção está sempre prestando os cuidados necessários. Neste vídeo, faça um tour por uma sala de caldeiras virtual e conheça o arranjo dos equipamentos na prática. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Como funciona uma turbina a vapor? Caldeiras aquatubulares são muito utilizadas em plantas termelétricas. O vapor superaquecido na caldeira é expandido em turbinas especialmente projetadas para operarem no ciclo em questão. Entenda o funcionamento e as características dessas máquinas assistindo a este vídeo. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Caldeira aquatubular Caldeiras aquatubulares têm um grande potencial para utilização em diversas indústrias. Dimensionando sua produção de vapor para atender ao processo e mover uma turbina a vapor, essas instalações, chamadas de cogeração, podem suprir a demanda de mais de um tipo de energia. Conheça o projeto de uma caldeira própria para essa configuração assistindo a este vídeo. https://www.youtube.com/embed/ndXiI4GnBkI https://www.youtube.com/embed/aECASHzv320 Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://www.youtube.com/embed/98u-bhwkUyA
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