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A Clinica em Freud 1 a 6

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A CLÍNICA EM FREUD
AULA 1
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Raquel Berg
CONVERSA INICIAL
Bem-vindos(as)! Nesta aula, falaremos sobre as Experiências clínicas de Sigmund Freud e
alguns dos principais médicos que contribuíram para o t rabalho de Freud, como Charcot , Breuer e
Berheim, dentre outros. Também falaremos um pouco do contexto sócio-histórico de Freud, uma vez
que influenciou significat ivamente Freud na aproximação com os estudos sobre a histeria. Nas
próximas aulas, falaremos das principais influências e das cartas de Freud a Fliess, nas quais Freud
traz grande parte de seus primeiros esboços do que viria a ser futuramente a psicanálise de maneira
mais ampla. Na sequência, falaremos sobre os textos “Sobre a concepção das afasias”, “Algumas
Considerações para um estudo comparativo das paralisias motoras orgânicas e histéricas” e
“Projeto para uma Psicologia Científica”. Nas últ imas aulas, falaremos sobre os primeiros casos
clínicos de Freud, t razendo um resumo de seus principais casos: Srta. Anna O., Sra. Emmy Von N., Miss
Lucy R., Katharina e Srta. Elisabeth Von R. Além disso, int roduziremos um pouco do que foi a teoria da
técnica freudiana, pelo menos em seus primórdios. Também falaremos sobre a psicoterapia da histeria
e as considerações de Breuer.
Na aula de hoje, t raremos cinco temas principais: os relatos sobre os estudos de Freud em Paris e
Berlim, os estudos de Charcot a respeito das doenças do sistema nervoso, a análise de Bernheim
sobre o tema da sugestão, a comunicação preliminar de Breuer e as contribuições de Averbeck, Weir
Mitchell e Forel a respeito da neurastenia, histeria e hipnot ismo. Depois, falaremos do tópico “na
prát ica” sobre como esses temas se correlacionam com tópicos do nosso cot idiano, e em
“finalizando” faremos uma retomada dos temas examinados nesta aula. Mais informações poderão ser
encontradas nos livros citados nas referências, os quais poderão ser consultados caso haja qualquer
dúvida a respeito dos tópicos aqui t ratados.
TEMA 1 – RELATOS SOBRE OS ESTUDOS DE FREUD EM PARIS E
BERLIM
Esses relatos de Freud foram escritos quando Freud, em 1885, teve a oportunidade de receber
uma bolsa de estudos (Bolsa de Estudos do Fundo do Jubileu Universitário) por seis meses, fornecida
pela Universidade de Viena. Ernest Jones posteriormente escreveu, de forma detalhada, a respeito
dessa experiência e como ela deu início a um afastamento progressivo de Freud da neurologia para a
Psicologia. Vale informar que esses relatórios foram encontrados quase 70 anos após terem sido
escritos e hoje se encontram na Biblioteca da Universidade de Viena, guardados no acervo da
inst ituição. Nesses escritos, Freud relata suas experiências no Hospice de la Salpêtrière, um hospício
localizado em Paris. Segundo o autor, em Viena ele não t inha à sua disposição um material clínico tão
rico e vasto quanto na França, e seus aprendizados durante esse período de seis meses foram
significat ivos para mudar suas concepções a respeito das psicopatologias recorrentes nos
consultórios médicos.
O Salpêtrière, na época, era um conjunto de prédios de dois andares dispostos em formato de
quadriláteros, com inúmeros pát ios e jardins. Sua estrutura era similar à de outros hospitais na Europa,
pois assim como o hospital de Viena, Sapêtrière também fora estabelecido em uma ant iga fábrica de
material bélico desat ivada. O hospital francês abrigava muitas mulheres idosas, além de homens com
doenças nervosas, e como asilo chegava a ter quase cinco mil pessoas. Charcot , que t rabalhava nesse
hospital desde seu internato, conduzia um laboratório dedicado a estudar doenças nervosas crônicas,
além de ser professor responsável pela neuropatologia. Ele também t inha à sua disposição outros
departamentos dentro do próprio hospital, como o laboratório de anatomia e fisiologia, o museu de
patologia, um estúdio de fotografia para preparação de moldes de gesso, um gabinete de
oftalmologia e um inst ituto de elet ricidade e hidropat ia.
O objet ivo inicial de Freud ao viajar a Paris era estudar os problemas anatômicos relacionados aos
seus estudos sobre at rofias e degenerações secundárias que se seguiam às afecções encontradas
nos cérebros das crianças. No laboratório de Viena ele não t inha condições para seguir com seus
estudos em anatomia; já na clínica de Salpêtrière havia uma quant idade de material clínico bastante
vasta, o que possibilitou a Freud ver muitos pacientes enquanto aprendia com Charcot sobre seus
métodos cient íficos. Freud, com outros alunos estrangeiros e assistentes médicos, acompanhava
Charcot constantemente enquanto ele discut ia com todos seus casos clínicos e as manifestações
sintomát icas mais complexas de seus pacientes. Freud (1956[1886], p. 44):
Podia-se verificar a maneira como ele [Charcot], inicialmente, ficava indeciso em face de alguma
nova manifestação difícil de interpretar; podia-se seguir os caminhos pelos quais se esforçava
por chegar a uma compreensão; podia-se estudar o modo como avaliava as dificuldades e as
vencia; e podia-se observar, com surpresa, que ele nunca se cansava de observar o mesmo
fenômeno, até que seus esforços repetidos e sem prevenções lhe permitissem chegar a uma
visão correta de seu significado. Quando, além de tudo isso, acode à lembrança a total
sinceridade manifestada pelo Professor durante essas sessões, compreende-se por que o autor
deste relatório, assim como aconteceria com qualquer outro estrangeiro em situação
semelhante, deixou Salpêtrière com irrestrita admiração por Charcot.
Uma vez encerrados os estudos de Freud sobre anatomia e as doenças orgânicas do sistema
nervoso, Freud passou a focar seus estudos sobre as neuroses, principalmente a histeria (tanto em
homens quanto em mulheres). Até aquele momento, a palavra histeria ainda não t inha um significado
bem definido, e seus sintomas eram sinais negat ivos que, em épocas anteriores, poderiam condenar os
pacientes à morte por bruxaria e possessão demoníaca. Havia muitos preconceitos ligados à histeria,
uma vez que os médicos consideravam os histéricos como mero simuladores, sujeitos a irritações de
caráter genital sem uma definição mais clara do que isso. Charcot baseava seus estudos nos casos
clínicos mais bem estabelecidos ou completamente desenvolvidos, que permit iam ao médico
estabelecer com segurança o diagnóst ico. Ao ut ilizar o hipnot ismo – técnica que até então era
considerada como uma pseudociência – Charcot foi capaz de definir uma sintomatologia básica para a
histeria, sem negligenciar as simulações apresentadas pelos pacientes histéricos. Esses estudos
posteriormente permit iram a Freud escrever seu art igo “Comparações entre a Sintomatologia
Histérica e Orgânica”, que veremos no próximo tema.
As classificações das neuroses como provenientes de t raumas encontraram resistência da
comunidade cient ífica, especialmente dos professores e assistentes do Charité da Universidade de
Berlim. No entanto, a principal diferença era que Charcot estudava casos simples e com diagnóst ico
bem desenvolvido, enquanto os professores alemães se dedicavam a analisar casos complexos e sem
definições sintomát icas claras.
Freud, durante seu estágio em Paris, também adquiriu amplo conhecimento sobre o hipnot ismo.
Segundo Freud, quase não se podia acreditar no que aconteciam aos pacientes hipnot izados a menos
que já se t ivesse alguma experiência com isso antes. Charcot dedicava-se a estudar a hipnose e a
histeria tanto quanto já o fizera enquanto estudava a esclerose múlt ipla e a at rofia muscular
progressiva, e posteriormente Freud fez a t radução em alemão dos estudos e conferências de seu
professor Charcot .
Além dos estudos em hipnose e histeria, Freud estudou epilepsia e outras doenças nas
art iculações, coreia e diversas formas de “t iques” (como a doença de Gilles de la Touret te), e
acompanhou as preparações das células nervosas e neróglia do professor Ranvier (1956[1886],p. 48).
Ao todo, Freud permaneceu cinco meses em Paris, e depois um mês em Berlim. Nesse últ imo, Freud
teve a oportunidade de estudar crianças que sofriam de doenças nervosas nas clínicas dos
professores Mendel e Eulenburg e do Dr. Baginsky, e depois visitou o laboratório de agricultura do
professor Zuntz para estudar a localização do sent ido da visão no córtex cerebral. No laboratório de
Munk, por fim, Freud pôde estudar o t rajeto do nervo acúst ico.
TEMA 2 – CHARCOT E AS DOENÇAS DO SISTEMA NERVOSO
Este texto, na verdade, t rata do prefácio que Freud escreveu sobre as “Novas Conferências
sobre as Doenças do Sistema Nervoso”, e sobre seu art igo “Conferências das Terças-Feiras”.
Segundo Freud, a principal contribuição desse t rabalho veio do fato de seu material ter sido
completamente improvisado, pois Charcot não conhecia previamente os pacientes que analisava.
Assim que os via, interrogava e confirmava ou revia seu diagnóst ico com base nos exames que t inha
em mãos. Segundo o autor, a ent idade mórbida, a “entité morbide”, permanece como a base de todo
novo caso, embora apresentem fenômenos diferentes entre si; no centro de cada série está o “type”,
que é a forma extrema de um caso clínico. Quando essa forma se apresenta de maneira rudimentar, o
autor a chama de “formes frustes”, pois nesses casos somente um especialista é capaz de definir um
diagnóst ico. Esses t rês termos são a base da clínica médica francesa, que se diferencia do modelo
alemão, no qual a interpretação é feita sobre o estado fisiológico do paciente e sobre a inter-relação
dos sintomas. No entanto, para Freud (1892), o modelo francês se mostra autossuficiente, pois relega
a segundo plano os fatores fisiológicos para se concentrar nos sintomas e no sent ido deles. E assim,
Charcot ut ilizava de sua experiência clínica para analisar os casos e dar seu veredicto, ainda que
sempre se mostrasse aberto a quaisquer novas teorias que pudessem surgir.
Dentre os escritos de Charcot referentes ao tema da histeria, observa-se que além do foco
sobre os critérios descrit ivos do fenômeno histérico, cabem os fenômenos observados durante os
estados hipnót icos, o que levou Charcot a concluir que a origem dos ataques histéricos está
diretamente relacionada a uma lembrança, “a revivescência alucinatória de uma cena que é
significat iva para o desencadeamento da doença. [...] o conteúdo da lembrança geralmente é ou um
trauma psíquico, que, por sua intensidade, é capaz de provocar a irrupção da histeria no paciente, ou é
um evento que, devido à sua ocorrência em um momento part icular, tornou-se t rauma” (Freud, 1892, p.
179). Aqui, Charcot faz menção à histeria t raumát ica, na qual não existe, a bem dizer, um t rauma em
part icular, mas um conjunto deles, interligados na memória, pois não necessariamente eles tenham
relação de lugar ou tempo. Assim, pode haver t raumas menores, diferentes t ipos de t raumas ou
situações que, por sua condição, foram percebidas como t raumát icas, com a intensidade de um
trauma. Para Charcot (citado por Freud, 1892, p. 179) “um t rauma teria que ser definido como um
acréscimo de excitação no sistema nervoso, que este e incapaz de fazer dissipar-se adequadamente
pela reação motora. Um ataque histérico [portanto] talvez deva ser considerado como uma tentat iva
de completar a reação ao t rauma”.
Charcot associa os delírios das vít imas de histeria a um estado no qual emergem na consciência,
sob a forma modificada de sintomas, ideias e impulsos que estavam inibidas pela consciência
enquanto o indivíduo estava em um estado sadio. Uma situação parecida, acrescenta Charcot , é o
estado em que nos encontramos durante os sonhos. Os estudos de Charcot também se estenderam
nas comparações entre as afasias e paralisias orgânicas e histéricas, que foram logo depois base para
os estudos de Freud sobre o mesmo assunto.
Charcot também discute, em suas conferências, o cuidado que os médicos precisavam ter com a
questão da sugestão, uma vez que não se pode atribuir que a hipnose, de forma imediata e superficial,
será capaz de solucionar de modo simplista o problema da histeria.
TEMA 3 – BERNHEIM E O TEMA DA SUGESTÃO
Bernheim e a escola de Nancy (na época, esse hospital possuía tanto renome quanto Salpêtrière,
em Paris) acreditavam que a hipnose, assim como a sugestão hipnót ica, podiam ser aplicadas e t razer
grandes contribuições não só a pacientes histéricos e neuropát icos graves, como a todas as pessoas
saudáveis, pois permit iam ampliar a atuação terapêut ica. Bernheim compart ilhava da opinião de outros
estudiosos como Forel (que veremos mais a frente, no tema 5). Segundo Bernheim, acredita-se que a
sugestão feita pelos médicos a seus pacientes falsifica os fenômenos ligados aos sintomas
histéricos, criando ataques, paralisias e contraturas que simulam sintomas fisiológicos legít imos. Por
outro lado, no entanto, essa mesma sugestão auxilia o médico durante o t ratamento. O fenômeno
histérico tem ligação com o que Freud (1888) nomeia de fenômeno de transfert, no qual há a
t ransferência de sensibilidade de uma parte do corpo para outra parte (por exemplo, pode ocorrer de
um sintoma se ret irar de uma parte do corpo anestesiada para outra parte mais sensível). Para o autor,
apesar de os sintomas parecerem se originar da sugestão, eles são fenômenos autênt icos, oriundos
de fenômenos psíquicos legít imos. Esses sintomas histéricos são regidos por leis, e nesse ponto que
se torna relevante ao autor afirmar que a sintomatologia histérica não se dá por meio da sugestão:
Os relatos provenientes de épocas passadas e de países distantes, que foram reunidos por
Charcot e seus discípulos, não dão margem à dúvida de que as peculiaridades dos ataques
histéricos, das zonas histerógenas, da anestesia, das paralisias e das contraturas se têm
manifestado em todos os tempos e lugares, tal como foram vistas quando Charcot efetuava sua
memorável investigação dessa grande neurose. (Freud, 1888, p. 115).
Assim, Freud (1888) afirma que se existem fenômenos relacionados à histeria relacionados à
sugestão do invest igador, esse fato deve ser t ratado a parte dos estudos sobre histeria, pois
qualquer estudioso que já tenha visto as contrações musculares específicas de fenômenos histéricos
e as reações fisiológicas desencadeadas durante os sintomas sabem que não é possível at ribuir à
sugestão tais efeitos, pois “a sugestão não pode produzir algo que não esteja cont ido na consciência
ou seja nela int roduzido” (Freud, 1888, p. 116). Como crít ica aos estudos de Bernheim, Freud (1888)
comenta da necessidade de Bernheim de ter incluído em seus estudos os fenômenos histéricos
ligados à hiperexcitabilidade, uma vez que esses estudos quest ionam a sugestão como fator
possivelmente condicionante do sintoma neurót ico. Assim, segundo Freud (1888), o que falta nos
estudos de Bernheim é at relar o conceito de sugestão a um fenômeno psicopatológico que requer
condições especiais para ocorrer, assim como os sintomas histéricos, embora não sejam a mesma
coisa.
TEMA 4 – ESBOÇOS PARA A COMUNICAÇÃO PRELIMINAR DE BREUER
Este texto, basicamente, é uma carta a Breuer, na qual Freud apresenta um esboço do que
futuramente foi seu estudo “Comunicação Preliminar – sobre o mecanismo psíquico dos fenômenos
histéricos”, de 1893. Nesse texto, Freud propõe organizar o art igo em cinco tópicos principais:
1. as teorias sobre a constância da soma de excitação (o que futuramente viria a ser
apresentado nos estudos sobre a teoria da constância x catexia de invest imento, e que
futuramente viria a embasar a teoria das pulsões); a teoria da memória (que posteriormente irá
embasar os estudos de Freud sobre o inconsciente, recalque e retorno do recalcado ou da
lembrança reprimida ou recalcada, dentre outros); e o teorema que estabelece que os
conteúdos dos diferentes estados de consciência não estão relacionados entre si;
2. a origem dos sintomas histéricos. Aqui, Freud t razalguns dos itens que posteriormente farão
parte de suas hipóteses, como os sonhos e os afetos específicos, os quais ele classifica como
itens que colocam o indivíduo suscet ível aos sintomas histéricos. Além disso, Freud inclui os
traumas e suas origens, os quais fazem parte da et iologia da histeria, segundo o autor. Ele
também menciona que os sintomas podem ser deslocamentos de somas de excitação que não
foram dissipadas, sendo assim, o sintoma como uma reação do organismo pela via do
deslocamento (tentat iva de reação);
3. os ataques histéricos como uma tentat iva de reação pela recordação (do evento t raumát ico).
Ou seja, a recordação que compõe o ataque histérico é uma lembrança inconsciente e que se
encontra sob uma forma rudimentar e modificada (por condensação e deslocamento, que será
posteriormente t rabalhado no texto “Projeto para uma psicologia cient ífica”). Assim, durante o
ataque histérico, o indivíduo se acha parcial ou totalmente sob influência dessas recordações
inconscientes;
4. a origem dos sintomas – aqui, o autor menciona brevemente a questão de quais lembranças ou
experiências ficam ret idas na memória. Posteriormente, esse tema será t ratado no texto sobre
a et iologia da histeria. Aqui, o autor afirma que (Freud, 1892, p. 196):
Se uma pessoa histérica intencionalmente procura esquecer uma experiência, ou
decididamente rechaça, inibe e suprime uma intenção ou ideia, esses atos psíquicos, em
consequência, entram no segundo estado de consciência; daí produzem seus efeitos
permanentes e a lembrança deles retorna sob a forma de ataque histérico.
5. a fórmula patológica da histeria, a qual Freud considera que a soma ou acúmulo de excitação e o
t rauma, associados a um certo estado de consciência, criam a disposição para o que o autor
chama inicialmente como histeria disposicional e acidental, na descarga dessa soma mediante a
reação motora apropriada, ou seja, o ataque histérico. Inicialmente, a nomenclatura adotada era a
de Charcot , histeria t raumát ica (na qual os sintomas aparecem depois de algum tempo de um
evento t raumát ico, sendo reflexos somát icos dessa experiência ameaçadora). Posteriormente,
Freud abandona essas terminologias para adotar os conceitos de histeria de defesa (na qual os
sintomas surgem para proteger o indivíduo de emoções desagradáveis), histeria hipnoide
(originadas por estado hipnót ico) e histeria de retenção (com afetos ab-reagidos, ou seja,
barrados pelas defesas do próprio indivíduo). Depois, Freud revê essas terminologias e passa a
usar histeria de conversão (ou seja, com o t rauma convert ido em sintomas), histeria de angústia
(na qual Freud considera a fobia como o t ipo de sintoma principal. Esse termo veio com o texto
“O pequeno Hans”).
Além disso, Freud t raz em seu texto que as recordações diretamente associadas aos sintomas
não podem ser acessadas pelo paciente, a não ser por meio da hipnose. Os conteúdos são, portanto,
dissociados da consciência normal (posteriormente, Freud t raz em seu texto “projeto para uma
psicologia cient ífica” que os desejos dissociados de seu conteúdo podem retornar sob a forma de
sintomas, sonhos ou chistes). Segundo o autor, os sintomas podem ser desencadeados por influências
internas ou externas. Além disso, as questões sexuais têm influência direta na formação de sintomas,
e o papel da terapia é ident ificar a fonte do t rauma (o t rauma originário), para assim tentar corrigi- lo
por meio da hipnose.
O ataque histérico é, aqui, caracterizado segundo a proposta de Charcot com quatro fases
t ípicas (Freud, 1892): 1) fase epileptoide; 2) fase dos grandes movimentos; 3) fase das “grandes
passionnelles”; e 4) fase do delírio terminal. Ademais, os ataques são “uma descarga periódica dos
centros motores e psíquicos do córtex cerebral” (Freud, 1892, p. 194).
TEMA 5 – CONTRIBUIÇÕES DE AVERBECK, WEIR MITCHELL E FOREL
5.1 A NEURASTENIA AGUDA DE AVERBECK
Neste texto, Freud faz uma crít ica à formação médica da época, e que essa deficiência podia ser
observada principalmente nos estudos sobre neurastenia, pois o quadro clínico dos pacientes era
estudado com mais veemência pelos médicos que t rabalhavam como terapeutas e nos sanatórios,
mas nas demais especialidades pouco se via a respeito. Para o autor (Freud, 1886, p. 71):
Esse estado patológico do sistema nervoso seguramente pode ser classificado como a mais
comum de todas as doenças em nossa sociedade: complica e agrava muitíssimo outros
quadros clínicos em pacientes das melhores classes, sendo ainda praticamente desconhecido
dos médicos de boa formação científica, ou tido por eles como apenas um nome moderno com
conteúdo arbitrariamente constituído.
Freud conclui que, independente do posicionamento dos médicos a respeito de questões como
as levantadas por Averbeck sobre o serviço militar obrigatório como cura para os males da vida em
sociedade e a responsabilidade do Estado no t ratamento de t rabalhadores de classe média, essas
questões devem ser debat idas pelo meio cient ífico como relevantes para o t rabalho de assistência
médica.
5.2 O CONFORTO DE CERTAS FORMAS DE NEURASTENIA E HISTERIA DE WEIR
MITCHELL
A principal contribuição de Weir Mitchell nos estudos de Freud se deu em método terapêut ico,
baseado no t ratamento catárt ico. Esses estudos se originaram na Filadélfia, Estados Unidos, e
posteriormente foram recomendados na Alemanha por Burkart durante uma conferência. Segundo
Freud (1886, p.7 2): “esse método, combinando repouso no leito, isolamento, alimentação abundante,
massagem e elet ricidade, de forma estritamente controlada, supera os estados de exaustão nervosa
graves e de longa duração”.
Essa proposta com diferentes formas de t ratamento, segundo Freud, amplia os conhecimentos a
respeito das estratégias terapêut icas e serviu de base para o que Freud posteriormente propôs como
método catárt ico.
5.3 HIPNOTISMO EM FOREL
Segundo Freud, os estudos sobre hipnot ismo de Forel foram descobertas tão importantes que
podem ser comparadas às maiores descobertas referentes ao espírito humano. Os estudos sobre a
sugestão, naquele momento, eram considerados como uma pseudociência, junto a outras técnicas
ditas espirituais ou baseadas em ritos e superst ições sem sent ido. Assim sendo, Freud defende os
estudos de Forel, afirmando categoricamente que os cient istas que crit icam esses estudos não os
conhecem nem se deram ao t rabalho de tentar aplicar a hipnose para descobrir como ela realmente
funciona, apenas estabelecem uma “ant ipat ia cáust ica” injust ificada. Ademais, just ificam as curas
obt idas por meio do hipnot ismo como acasos que nada provam, como se o uso do hipnot ismo fosse
feito pelos médicos por mot ivos obscuros e fora dos princípios ét icos cient íficos. Vale lembrar que,
afirma Freud, mesmo antes do surgimento do hipnot ismo os médicos já se valiam da sugestão (aliadas
a medicações como brometos, morfina e hidrato de cloral) para tentar influenciar seus pacientes a
recalcarem seus sintomas e se apresentarem curados com base nas palavras de seus cuidadores.
Se, por um lado, médicos renomados como o dr. Meynert crit icam a hipnose (tal como também o
farão posteriormente com a psicanálise) como se seu conhecimento em determinadas áreas lhes
desse propriedade para julgar e crit icar estudos em áreas diferentes de suas especialidades, por outro
lado, alguns cient istas como o Obersteiner e Krafft -Ebing se colocaram como irrestritamente a favor
da hipnose dentro da prát ica médica, enfat izando os ót imos resultados que obtêm a part ir dos
métodos sugest ivos e que nada têm a ver com nacionalidade ou raça (aqui, o autor t raz essa
provocação por causa das insinuações de que a posição de Forel deriva de suas origens. Freud, além
de ser judeu e sensível a esse tema por mot ivos pessoais, posteriormente irá escrever inúmeros
textos com crít icas a esse respeito e ao posicionamento da comunidade cient ífica com relação à
psicanálise).
Segundo Freud(1886), esse t ipo de t ratamento consiste em induzir um estado hipnót ico que
permite veicular uma sugestão à pessoa hipnot izada. O estado hipnót ico nada mais é do que um sono
comum, nas diversas fases do adormecer. Durante o sono, segundo o autor, a pessoa perde o
equilíbrio e o controle psíquico e a at ividade mental se apresenta de forma desordenada que, em
alguns aspectos, lembra os estados de loucura. Na vida diária, as pessoas são educadas a reprimir
ideias e mot ivações impróprias, incluindo pensamentos caót icos que angust iam o indivíduo. Assim, a
proposta da hipnose é tão somente auxiliar o paciente, pela sugestão, a eliminar essas ideias que, de
alguma forma, adoecem e t razem sofrimento aos pacientes. Assim, não há nada de perigoso na
hipnose, a menos que o médico que a exerça tenha a intenção de fazer mau uso desse conhecimento,
o que precisa ser avaliado de outra forma (pois o problema não é exatamente a técnica, mas sim
quem a usa). Afirma Freud (1886, p. 134):
O fato principal do hipnotismo consiste na possibilidade de colocar uma pessoa num estado
especial da mente (ou, mais precisamente, do cérebro) que se assemelha ao sono. Esse estado
é conhecido como hipnose. Um segundo conjunto de atos consiste na maneira como esse
estado é produzido (e encerrado). Isto parece ser possível de três modos: (1) ela influência
psíquica que uma pessoa exerce sobre outra (sugestão), (2) ela influência (fisiológica) de
determinados métodos (fixação), por ímãs, pela mão do hipnotizador etc. e (3) pela
autoinfluência (autossugestão) [...] um terceiro grupo de fatos diz respeito à conduta da pessoa
hipnotizada.
Nesse terceiro grupo, Freud (1886) afirma que é possível induzir pela sugestão inúmeros efeitos,
pois a influência do julgamento fica reduzida e o cérebro se acha vulnerável durante o estado
hipnót ico. Os fenômenos da hipnose podem ser explicados por t rês teorias: de Messmer, que fala de
uma t ransmissão de fluído magnet izante; somát ica, com base em reflexos medulares e na
modificação do estado fisiológico do sistema nervoso; e a da sugestão, da qual Forel e Freud
compart ilham. Essa últ ima, criada por Liébeault e seus discípulos (como Bernheim, Beaunis e
Liégeouis), baseia-se na hipótese de que é produzida por efeitos psíquicos internos, semelhante ao
sono. No entanto, a diferença aqui é que na hipnose há o relacionamento at ivo entre a pessoa que
está hipnot izada e o hipnot izador, incluindo a permissão da paciente em estar nessa condição.
Com relação ao hipnot izador, Freud (1886) afirma que não é uma exclusividade médica e que não é
qualquer pessoa que pode hipnot izar. O hipnot izador deve estar imbuído de entusiasmo, paciência,
criat ividade e determinação. Uma pessoa que tenta hipnot izar com base em um padrão
preestabelecido e sem segurança terá pouco ou nenhum resultado sat isfatório. Além disso, algumas
doenças apresentam boas respostas ao hipnot ismo, assim como ocorre com a digitalina. Doenças
como vert igem, síndrome de Meniére (que é um distúrbio do ouvido interno), tosse e tuberculose
apresentam pouco resultado. Já a histeria e certas doenças apresentaram excelentes resultados.
Por fim, o autor t raz a importância forense da hipnose, uma vez que os “crimes sugeridos” ainda
são palco de estudo e preparação dos juristas, uma que “deve permanecer em aberto até que ponto a
consciência de se t ratar apenas de uma experiência facilita à pessoa a execução de um crime” (Freud,
1886, p. 140).
NA PRÁTICA
A descrição dessa prát ica t rata do art igo de Freud “Observação sobre um caso de hemianestesia
em um homem histérico”. O paciente sofria de ataques convulsivos, embora tenha t ido uma infância
normal e nunca apresentara convulsões ou doenças que são comuns em crianças. Aos oito anos, o
paciente foi at ropelado e, em decorrência desse acidente, sofreu uma ruptura do t ímpano direito,
vindo posteriormente a sofrer de desmaios durante diversos meses, ao todo dois anos. Desse
acidente veio um embotamento intelectual que se reflet iu em seu desempenho escolar. Completou o
ensino primário mais tarde, e depois da morte dos pais, passou a aprendiz de gravador, tendo
permanecido nesse cargo por 10 anos. Não se permit iu a relacionamentos ou divert imentos para
poder se dedicar totalmente ao t rabalho. Via-se obrigado a reflet ir muito acerca de si mesmo e de
suas ambições e, por fazê- lo com tanta frequência, caía em estado de excitada fuga das ideias, sono
agitado e digestão mais lenta, além de palpitações vez ou outra.
A doença começou t rês anos antes, logo após um desentendimento com seu irmão. Durante
esse desentendimento, o irmão o ameaçou com uma faca, o que produziu no paciente um medo
inexplicável; teve zumbidos na cabeça, como se ela fosse estourar, e correu para casa. Logo que
chegou na porta, desmaiou. Durante algum tempo teve espasmos, e quando passaram, sent iu
fraqueza e passou a ter dores de cabeça e pressão int racraniana. A sensibilidade do lado esquerdo de
seu corpo parecia alterada, seus olhos se cansavam facilmente e t inha agitações constantes. Logo
depois foi acusado de roubo por uma mulher, o que o fez ficar tão deprimido que chegou a pensar em
suicídio. Depois desses ocorridos, um t remor muito intenso tomou conta de seus membros
esquerdos, como se t ivesse sido at ingido por algum t ipo de AVC. Seus olhos muitas vezes só
enxergavam cinza, e passou a ter sonhos aterrorizantes nos quais imaginava estar caindo de uma
grande altura. Começou a sent ir dores do lado esquerdo do corpo, e frequentemente sent ia como se
seu estômago t ivesse estourado, o que fez o paciente parar de t rabalhar. Queixa-se que tem uma
sensação peculiar na garganta, como se a língua est ivesse presa, seguem os zumbidos e outras
coisas do t ipo. Sua memória estava prejudicada com relação aos eventos que ocorreram desde o
início dos sintomas, embora as lembranças mais ant igas permanecessem intactas. Os ataques
repet iram-se de seis a nove vezes em t rês anos, sendo somente um de maior risco para a saúde.
O paciente estava pálido. Relata Freud (1886, p. 63-64):
Quando comprimo o ponto de saída dos nervos supra-orbital, infra-orbital ou do mento, do lado
esquerdo, o paciente volta a cabeça com uma expressão de dor intensa [...] A pele da metade
esquerda da cabeça comporta-se, no entanto, de modo muito diferente do que esperávamos:
está completamente insensível a estímulos de qualquer espécie. [...]. Repito agora a experiência
no lado direito e mostro que aqui a sensibilidade do paciente é normal. [...] se procedermos agora
a um exame do tronco e dos membros, verificaremos também uma anestesia absoluta,
sobretudo no braço esquerdo.
Após uma análise minuciosa do paciente, Freud (1886) conclui que todos os distúrbios devessem
ser at ribuídos à anestesia geral do lado esquerdo. E destaca ainda que, quando os olhos eram
vendados, as reações motoras se alteravam, o que não é comum em pacientes com doenças
neurológicas. Por fim, Freud (1886) descreve que o cordão espermát ico esquerdo também está
sensível, de forma semelhante a como a histeria se estabelece nas zonas histerógenas nas mulheres.
Ainda que Freud não t raga nesse texto sua análise sobre o caso, fica claro que o t ratamento
desse paciente histérico, assim como o t ratamento dos demais pacientes que sofrem dessa mesma
enfermidade, é o acompanhamento médico seguido de uma compreensão mais profunda das
experiências que geraram o t ranstorno que, nesse caso, inicialmente aparenta ser o conflito do
paciente com seu irmão.
FINALIZANDO
Como mencionamos no início desta aula, nosso objet ivo foi t razer os principais autores que
influenciaram o t rabalho de Freud. Inicialmente, apresentamos o próprio relato de Freud a respeito de
seu estágio em Paris e Berlim, com destaque para seus aprendizados a respeito da histeria com
Charcot . Depois, t rouxemos as contribuições de Charcot para os estudos de Freud com relação à
diferenciação entre as patologiasorgânicas e histéricas, o estabelecimento de conceitos como a
“ent ité morbide”, o “type” e as “formes frustes” que compõem a base da clínica francesa a respeito
da histeria; com Bernheim, da escola de Nancy, Freud discute a questão da sugestão como fator
terapêut ico no t ratamento da histeria, embora muitos estudiosos não acreditassem nessa
metodologia como verdadeiramente cient ífica. O t rabalho de Freud com Breuer, apresentado aqui, foi
a base do esboço para seu manuscrito posterior “Comunicação Preliminar”, de 1893. Por fim,
t rouxemos as contribuições de Averbeck, Weir Mitchell e Forel para os estudos de Freud, incluindo
sua crít ica a respeito da formação médica da época, que pouco t inha contato com as questões
psicológicas fora dos hospitais e sanatórios; a questão do método catárt ico, que posteriormente será
trabalhado por Freud em outros art igos, e o tema do hipnot ismo que, assim como discut iu Bernheim
com o tema da sugestão, sofria de um profundo descrédito pela medicina e pela ciência da época.
Esperamos que tenham aproveitado as discussões apresentadas aqui para conhecer um pouco
mais das origens da psicanálise, e convidamos a todos a cont inuar acompanhando as aulas para saber
mais sobre como Freud elaborou e desenvolveu seus estudos, criando assim as bases da psicanálise.
REFERÊNCIAS
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inéditos, 1866-1899. v. 1.
FREUD. (1892) Prefácio e notas de rodapé à t radução das conferências das terças-feiras, de
Charcot . Publicações pré-psicanalíticas e esboços inéditos, 1866-1899. v. 1.
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A CLÍNICA EM FREUD
AULA 2
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Raquel Berg
CONVERSA INICIAL
Bem-vindos a esta aula! Nela, falaremos sobre as Experiências clínicas de Sigmund Freud e
alguns dos principais médicos que contribuíram para o trabalho de Freud, tais como Charcot, Breuer
e Berheim, entre outros. Também falaremos um pouco do contexto sócio-histórico de Freud, uma vez
que esse contexto influenciou significativamente Freud na aproximação com os estudos sobre a
histeria.
Em conteúdos posteriores, falaremos das principais influências e das cartas de Freud a Fliess,
nas quais Freud traz grande parte de seus primeiros esboços do que viria a ser futuramente a
psicanálise de maneira mais ampla.
Mais adiante, falaremos também dos textos “Sobre a concepção das afasias”, “Algumas
Considerações para um estudo comparativo das paralisias motoras orgânicas e histéricas” e
“Projeto para uma Psicologia Científica”.
Falaremos ainda sobre os primeiros casos clínicos de Freud, trazendo um resumo de seus
principais casos: Srta. Anna O., Sra. Emmy Von N., Miss Lucy R., Katharina e Srta. Elisabeth Von R.
Além disso, introduziremos um pouco do que foi a teoria da técnica freudiana, pelo menos em seus
primórdios. Também falaremos sobre a psicoterapia da histeria e as considerações de Breuer.
Nesta aula, traremos os temas que, na verdade, foram a subdivisão de toda a conversa entre
Freud e Breuer e Freud e Fliess, com exceção do “Projeto para uma Psicologia Científica”, que terá
uma atenção especial em conteúdos posteriores.
Já mencionamos anteriormente o quanto Breuer foi importante para o trabalho de Freud. Fliess
era médico otorrinolaringologista e manteve com Freud, durante muitos anos, uma comunicação por
correspondência intensa e frequente entre os anos de 1887 e 1902. Segundo James Strachey (Freud,
1895, p. 219):
[Fliess] era mais acessível às ideias de Freud do que qualquer outro contemporâneo. Por
conseguinte, Freud lhe comunicava seus pensamentos com a máxima liberdade, e o fazia não
apenas em suas cartas, como também numa série de documentos (“Rascunhos”, como os
chamamos aqui) que representavam relatos organizados de suas ideias em evolução e que, em
alguns casos, são os primeiros esboços de obras posteriormente publicadas.
Essas cartas foram reveladas logo após a Segunda Guerra Mundial, tendo sido mantidas em
sigilo por Marie Bonaparte, sendo essa história contada nos textos de Ernest Jones. A maioria das
informações que serão apresentadas aqui são um grande resumo dos principais textos de Freud,
com alguns tópicos que ainda estavam em processo de amadurecimento conceitual. A principal
relevância das informações que serão trazidas aqui mostra os vieses e os caminhos que Freud
estava trilhando até chegar aos textos finais e traz aos leitores uma boa ideia dos primórdios da
psicanálise.
Depois de apresentarmos um resumo dessas correspondências, falaremos na seção Na Prática
sobre como esses temas se correlacionam com tópicos do nosso cotidiano e em Finalizando
faremos uma retomada dos temas examinados nesta aula. Mais informações poderão ser
encontradas nos livros citados nas referências, os quais poderão ser consultados caso haja qualquer
dúvida a respeito dos tópicos aqui tratados.
TEMA 1 – O CONCEITO DE NEUROSE
Os primeiros rascunhos de Freud se propõem a discutir a questão da neurose. Nessa época, o
autor ainda não tinha estabelecido uma diferenciação clara entre os tipos de neurose, muito embora
ele já traga o conceito geral do significado de neurose e algumas ideias que mais tarde irão compor
sua teoria.
Neste primeiro momento, assim como também traz Laplanche e Pontalis (2001), a neurose aqui
se traduz como a expressão de um conflito interno, de ordem psíquica, originado de experiências de
caráter sexual. Vale lembrar que, nessa época, como menciona Foucault em seu texto História da
Sexualidade (1984, v. II), a questão da sexualidade – na verdade, do doutrinamento dos desejos e da
repressão daquilo que era considerado um tabu – era uma marca constante entre as pessoas e
gerava constantes demandas para Freud e outros profissionais da época. Além disso, boa parte do
material acerca das questões psíquicas humanas provinha da filosofiaem seus primórdios e da
medicina como uma ciência atual, o que deixava Freud com poucos recursos e opções além de seu
próprio consultório e consultas a seus colegas de profissão (como Charcot, entre outros).
Naquele momento, as neuroses se enquadravam a infecções em geral (como neurose digestiva,
cardíaca etc.) quanto neuroses de cunho psíquico como a histeria. Segundo Laplanche e Pontalis
(2001), já nessa época Freud se preocupava em compreender o mecanismo psicogênico dos
transtornos, sendo que aqui ainda não estava clara em sua teoria a diferenciação entre neurose e
psicose: “daí resulta que o eixo da sua classificação passa entre as neuroses atuais, onde a etiologia
é procurada num ‘disfuncionamento’ somático da sexualidade, e as psiconeuroses, onde o conflito
psíquico é determinante” (2001, p. 297).
A partir daí, Freud segue em seus estudos referentes às neuroses e às psicoses (as perversões
já estavam em um campo separado nessa época) e só mais tarde que ele consegue delimitar as
neuroses com base nos sintomas e caráter do ego.
TEMA 2 – SOBRE AS NEUROSES: RASCUNHO A, B, D, CARTA 18
2.1 RASCUNHO A: SOBRE AS NEUROSES
No rascunho A, Freud levanta sete problemáticas principais, que são:
1. Se a angústia das neuroses é ligada a algum tipo de inibição sexual ou etiologia primária.
2. O quanto uma pessoa sadia reage a traumas sexuais tardios em comparação com pessoas
com predisposição a doenças psíquicas.
3. Se o coito interrompido é um fator nocivo que predispõe as pessoas às neuroses?
4. Se a neurastenia é inata ou adquirida.
5. Se a hereditariedade tem outras influências sobre o desenvolvimento de transtornos.
�. O que está intrínseco à etiologia da depressão periódica.
7. Se a anestesia sexual das mulheres se trata apenas de uma espécie de impotência que, por si
só, causa neuroses.
Além disso, nesse rascunho, Freud apresenta algumas teses:
1. Todas as neuroses têm algum componente sexual.
2. A função sexual pode ter efeito causal direto ou predispor para outras doenças.
3. A neurastenia nos homens é acompanhada de impotência.
4. A neurastenia nas mulheres é consequência direta da neurastenia nos homens.
5. A depressão periódica é uma forma de neurose de angústia.
�. A neurose de angústia é uma inibição da função sexual.
7. O excesso e a sobrecarga de trabalho não fazem parte da etiologia das neuroses.
�. A histeria indica a repressão de afetos concomitantes.
Baseado nas problemáticas anteriores e em suas teses, Freud explana para Fliess alguns
grupos de observação, ou “grupos-controle”, tais como pessoas sadias ou com gonorreia, mulheres
estéreis, culturas nas quais algumas anormalidades sexuais são comuns, pessoas sob efeito de
esgotamento mental ou físico e pessoas com traumas sexuais de tenra idade.
2.2 RASCUNHO B: A ETIOLOGIA DAS NEUROSES
Aqui, Freud segue com sua discussão sobre a etiologia das neuroses, iniciando seu texto com a
questão de que toda neurastenia é consequência de uma vida sexual anormal. Além disso,
juntamente com Breuer, ele concluiu que toda histeria ou é hereditária ou traumática, assim como
neurastenia é sexual.
Assim, na etiologia de uma afecção nervosa, é necessário distinguir entre uma precondição e os
fatores desencadeantes e como se dá a relação entre esses dois fatores. Sua conclusão é de que “o
que falta para o efeito integral na etiologia primária pode ser substituído pela etiologia de segunda
ordem; esta, contudo, é dispensável, ao passo que a de primeira ordem é imprescindível” (Freud,
1896, p. 224). Ou seja, apenas o esgotamento sexual pode provocar, sozinho, a neurastenia.
Nesse documento, Freud afirma que a neurastenia masculina ocorre em homens que não foram
seduzidos de forma precoce por mulheres, sujeitando-se tão somente à masturbação. O segundo
fator que influencia na neurastenia masculina é a prática do coito interrompido. Já nas mulheres, a
neurastenia ocorre em mulheres sadias e não sadias, em casadas quando a neurastenia já está
presente no homem (ou a impotência) e pode surgir de forma traumática ou como um fator
preexistente.
Os casos de neurastenia são acompanhados de uma diminuição da autoconfiança, pessimismo
e ideias contraditórias entre si e aflitivas. Alguns de seus sintomas crônicos são: hipocondria, fobias
em geral ligadas ao corpo (agorafobia, claustrofobia etc.), ruminações de memória e pensamentos
obsessivos.
Por fim, a depressão periódica é um outro tipo de neurose de angústia que se apresenta como
um ataque de angústia diferente da melancolia, também influenciada por questões sexuais, como o
coito interrompido. O autor aqui conclui que o papel do médico é de profilaxia, verificando inclusive
fatores para doenças sexualmente transmissíveis.
2.3 RASCUNHO D E CARTA 18: SOBRE A ETIOLOGIA E TEORIA DAS PRINCIPAIS
NEUROSES
Esse texto aborda uma série de informações a respeito das neuroses, tais como a questão da
morfologia, que se subdividem em neurastenia e pseudoneurastenia, neuroses de angústia, neurose
obsessiva, histeria, melancolia, mania, neuroses mistas e suas ramificações.
Além disso, ele considera que na etiologia básica das neuroses existe uma série de fatores
etiológicos, condições físicas e predisposições hereditárias.
Os estudos sobre a etiologia das neuroses possuem contato direto com a teoria da constância,
na qual o acúmulo de excitação predispõe a uma condição de neurose. A excitação sexual, em
especial quando se torna nociva ao indivíduo, gera perturbações no equilíbrio interno e promove
mecanismos de defesa que geram ou contribuem para o surgimento da neurose.
Na carta 18, Freud (1894, p. 233) segue comentando que seus estudos ainda possuem lacunas
sobre o tema das neuroses. No entanto, sabe-se que há três mecanismos para a formação das
neuroses: as transformações dos afetos (relacionados à histeria de conversão), os deslocamentos
dos afetos (relacionados às obsessões) e as trocas de afetos (relacionados à neurose de angústia e
melancolia).
As neuroses estão relacionadas à sexualidade e podem sofrer a interferência de fatores como
degenerações orgânicas, velhice, conflitos internos e experiências traumáticas. Nesse sentido,
dependendo dos fatores sexuais envolvidos, qualquer pessoa pode desenvolver uma neurose de
angústia mesmo sem ter nenhuma doença congênita ou adquirida.
TEMA 3 – ANGÚSTIA, RASCUNHOS E, F
3.1 A ANGÚSTIA
Seria bastante prepotência acreditarmos que, em um curto espaço de tempo e estudo, seria
possível compreender, de forma aprofundada, o conceito de angústia, seja para Freud ou para
qualquer um dos pós-freudianos. Laplanche (1993) discute o conceito de Angst, a angústia, como
uma terminologia para além dos sintomas e dos conceitos de neurose e psicose. A angústia, aqui, se
trata de uma qualificação do afeto.
Os principais textos de Freud a respeito do tema é a descrição do caso Pequeno Hans (de 1909,
e que será apresentado e discutido em conteúdos posteriores), no qual a principal preocupação de
Freud é o afeto e o deslocamento desse afeto para a constituição de um sintoma, pois “essa coisa
que é simbolizada no sintoma é mais verdadeira do que ele” (Laplanche, 1998, p. 95), e o texto
“Inibições, sintomas e angústia”, do volume XX (1926), que também será apresentado de modo mais
detalhado em conteúdos futuros.
Ou seja, podemos traduzir essa angústia como uma quantidade de afeto, muito embora Freud
não tenha estabelecido essa relação em 1895, sendo essa quantidade de afeto apenas uma força
motriz, como iremos detalhar no conteúdo específico sobre o “Projeto para uma Psicologia
Científica” (1895).
O termo angústia pode trazer algumas dúvidas aos alunos com relação à tradução, tal como
ocorre com outras terminologias, pois a tradução inglesa se refere como ansiedade e a tradução do
alemão como angústia. Muito embora esses termos não signifiquem a mesma coisa, nos textos de
Freud, podemos compreender apenas como uma diferença de tradução.
3.2 RASCUNHO E: COMO SE ORIGINA A ANGÚSTIA
O Rascunho E seguenos estudos sobre a neurose. Inicialmente, acreditava-se que toda neurose
tinha um fundo sexual, mas logo Freud percebe que pessoas com bloqueios sexuais e sem
bloqueios podiam, igualmente, desenvolver neurose de angústia. Portanto, o fator físico sexual não
determinava, por si só, a neurose de angústia, o que levou Freud a buscar respostas também na
esfera psíquica.
No caso da pessoa com melancolia, por sua vez, a abstinência sexual tem caráter psíquico,
enquanto na neurose de angústia a tensão é física. Naquela época, o coito interrompido era um fator
considerado como gerador de angústia, assim como a senilidade e a abstinência sexual, presente
em virgens e pessoas voluntariamente abstinentes por, por exemplo, motivos religiosos. Nesses
casos, segundo o autor, a tensão física aumenta e o afeto sexual não tem um direcionamento
adequado, provocando angústia. Nesse texto, Freud se pergunta por que a transformação se torna
angústia? O autor explica:
Angústia é a sensação de acumulação de um outro estímulo endógeno, o estímulo de respirar, um
estímulo que é incapaz de ser psiquicamente elaborado à parte o próprio respirar; portanto, a
angústia poderia ser empregada para a tensão física acumulada em geral. Além disso, se
examinarmos mais detidamente os sintomas da neurose de angústia, encontraremos nela os
componentes separados de um grande ataque de angústia, ou seja, dispneia isolada, palpitações
isoladas, sensação de angústia isolada, ou uma combinação desses elementos. [...] Na neurose de
angústia, existe uma espécie de conversão, tal como ocorre na histeria [...]; contudo, na histeria, é a
excitação psíquica que toma um caminho errado, exclusivamente em direção à área somática, ao
passo que aqui é uma tensão física, que não consegue penetrar no âmbito psíquico e, portanto,
permanece no trajeto físico. (Freud, 1894, p. 240-1)
3.3 RASCUNHO F: COLEÇÃO III
O Rascunho F é um resumo de dois casos de Freud: o primeiro trata de Herr K, 27 anos. No
relato do autor, o paciente tem um caso de neurose de angústia. Toda a família sofre de transtornos
neuróticos. Três semanas antes, o paciente teve um súbito ataque de angústia, com sensação de
congestão desde o peito até a cabeça. Sentia que algo terrível iria acontecer, com palpitações e,
depois, ataques, com depressão e apatia.
Durante a consulta com Freud, o paciente trouxe uma série de informações sobre sua vida
sexual, seu comportamento de masturbação durante a adolescência e sua desilusão amorosa
recente. Ao interpretar o caso, Freud atribui uma parte do transtorno como hereditária, uma vez que
os demais membros da família também sofrem de neuroses.
Naquela época, não era comum os homens usarem preservativos e, para Freud, o uso de
preservativo pelo paciente por medo de contrair alguma doença foi dito como gerador da angústia,
embora nos dias de hoje seja altamente recomendado que as pessoas utilizem preservativos para
evitarem contrair DST em relações sexuais.
O paciente tinha também o hábito de se masturbar na adolescência e, considerando que as
pessoas se casavam cedo naquela época (final do século XIX / início do século XX), a manutenção
da masturbação até próximo da idade adulta foi considerada por Freud como também um fator
gerador de transtorno psíquico. Isso mostra como a análise de transtornos e a interpretação de
comportamentos precisa ser situada no tempo e no espaço.
Outro paciente também descrito nesse rascunho foi Herr von F. Sua queixa é de que sentia que
estava perdendo a vivacidade. Caso semelhante ao anterior, caracterizado por Freud como
depressão periódica, melancolia e neurastenia, com quadro de hereditariedade e necessidade de
masturbação.
TEMA 4 – MELANCOLIA E RASCUNHO G
4.1 MELANCOLIA
Segundo Roudinesco e Plon (1998), o termo melancolia é utilizado desde os primórdios como
“uma forma de loucura caracterizada pelo humor sombrio, isto é, por uma tristeza profunda, um
estado depressivo capaz de conduzir (o indivíduo) ao suicídio e por manifestações de medo e
desânimo que adquirem ou não um aspecto de delírio” (p. 505).
Freud apenas se apropriou do termo para caracterizar uma determinada forma de transtorno,
embora as melhores definições ainda sejam advindas dos poetas, filósofos e escritores. Sim, Freud
também era um amante da filosofia, da arte e da poesia, mas isso será tema de conteúdos
posteriores.
Eles também descrevem que foi a teoria hipocrática que, durante séculos, permitiu descrever a
melancolia ao longo do tempo: ânimo entristecido, sentimento de um abismo infinito, extinção do
desejo e da fala, torpor (ou seja, ausência de reações adequadas a um determinado estímulo)
seguido de exaltação, além do desejo constante pela morte e um sentimento de nostalgia e luto.
Não é à toa que Freud, mais tarde, escreve Luto e Melancolia (1915) para estabelecer um
comparativo entre essas duas condições nas quais há um “pesar pelo algo perdido” e descrever, de
forma mais detalhada, o estado melancólico já tão conhecido entre artistas como Shakespeare e
Victor Hugo, caracterizando-o então como a forma patológica do estado de luto.
Segundo Roudinesco e Plon (1998), foi com a psiquiatria do século XIX que a melancolia saiu do
campo da arte e da literatura e passou a servir como uma terminologia associada a um transtorno
mental e “dominada pela divisão entre psicose e neurose” (1998, p. 506).
Com Esquirol, a melancolia foi associada ao termo loucura circular, aproximada assim da mania
e com Kraepelin ela se ligou à loucura maníaco-depressiva, tornando-se posteriormente na psicose
maníaco-depressiva. Pode-se perceber aqui ainda uma dificuldade em diferenciar neurose e psicose,
além de uma mistura entre diversos conceitos.
Por isso, Freud opta por não seguir nessas definições de Esquirol e Kraepelin e retoma o antigo
conceito de melancolia, agora como um estado subjetivo e não mais como uma expressão de um
estado de espírito. Posteriormente, com Melanie Klein, esse conceito irá se desdobrar na formação
da posição depressiva (com contrapartida com a posição esquizoparanoide) como um estado no
qual se estabelece a problemática da perda do objeto de amor.
4.2 RASCUNHO G: MELANCOLIA
Nesse rascunho, Freud traz algumas conclusões parciais sobre o tema da melancolia:
1. Existem muitas correlações entre melancolia e anestesia sexual.
2. Ela se desenvolve pela masturbação.
3. A forma mais intensa é hereditária.
4. O afeto correspondente é o luto, já que envolve a perda da vida pulsional.
5. A anorexia é o transtorno de correlato mais direto com a melancolia.
Nesse artigo, Freud (1895, p. 248) traz um desenho esquemático da sexualidade, como
mostrado na Figura 1, a seguir:
Figura 1 – Esquema da sexualidade, segundo Freud
Nessa Figura 1, Freud (1895) demonstra que, na melancolia, ocorrem diversas formas de
anestesia sexual. Segundo o autor, em todos os casos, há a omissão de uma sensação voluptuosa
(como ele assim chama primariamente a libido), que normalmente é dirigida aos órgãos sexuais e
seus correlatos de prazer (que, posteriormente, será mais profundamente discutido).
Como não há uma carga voluptuosa suficiente, no momento do sexo, pode ocorrer a frigidez,
que também sofre com a falta de carga quando há, logo antes, a masturbação (pois a energia sexual
se esgota no próprio prazer antes mesmo de ocorrer a relação sexual).
A carga sexual também pode ser suprimida (na verdade, desviada de seu destino) como uma
defesa inconsciente (ou, como posteriormente será chamada, defesa egóica) e há a anestesia
histérica, correlato análogo à anorexia nervosa. Essas condições estabelecem ao indivíduo uma
predisposição à melancolia e, frente a uma experiência posterior traumática, dá-se então a anestesia
melancólica.
Figura 2 – Desvio da libido, segundo Freud
A Figura 2 (Freud, 1895, p. 251) mostra que, quando a libido (aqui chamada de grupo sexual
psíquico) perde uma parte de uma catexia ou energia de investimento (aqui ainda chamada de
quantidade de excitação),há um retorno dessa energia para o viés psíquico, produzindo sofrimento
pelo esforço dos neurônios em desfazer essa mudança de caminho das energias sexuais
(posteriormente Freud também tratará disso como na formação dos sintomas, na neurose e no
recalque / retorno do recalcado).
Esse esforço, além de sofrimento também produz dor, uma vez que seu papel é evitar ao
máximo que se estabeleçam associações (Freud irá discutir com mais detalhes como funcionam
essas associações em seu “Projeto para uma Psicologia Científica”, de 1895).
Figura 3 - Contrapartida do movimento de desvio da libido, segundo Freud
Por fim, a Figura 3 (Freud, 1895, p. 252) mostra a contrapartida do movimento que comumente
se expressa quando a libido é desviada. Aqui, em vez da energia ser desviada para dentro, ela é
desviada para fora, tendo seu correlato a mania “na qual o excedente de excitação se comunica a
todos os neurônios associados” (Freud, 1895, p. 252).
Freud também traz aqui nesse texto a existência de três formas de melancolia: a primeira, na
qual a excitação cessa por completo; a segunda, que surge e desaparece de forma cíclica; e a
terceira, que se desvia e aparece em contexto diverso. Esse estado anestésico, segundo o autor, está
relacionado à melancolia e é mais frequente em mulheres por questões sociais. Entre os efeitos da
melancolia estão a inibição psíquica, o empobrecimento pulsional e o respectivo sofrimento. Esse
tema será posteriormente tratado em “Luto e Melancolia”.
TEMA 5 – PARANOIA (RASCUNHO H)
Essa é a primeira vez que Freud trata do tema da paranoia em seus textos. Aqui, Freud (1895)
traz um esboço do que será posteriormente desenvolvimento em seus textos, em especial o Caso
Schreber (vol. XII, p. 16-7, 1911). Ele afirma: “na psiquiatria, as ideias delirantes situam-se ao lado
das ideias obsessivas como distúrbios puramente intelectuais, e a paranoia se situa ao lado da
loucura obsessiva como uma psicose intelectual” (1895, p. 253).
Assim como no transtorno obsessivo compulsivo, na paranoia também há um conflito em jogo.
É uma forma patológica de defesa, que depende de uma predisposição psíquica associada a uma
situação na qual o ego é incapaz de tolerar, projetando então o conteúdo para o mundo externo.
Assim, na paranoia ocorre o que Freud chama de transposição ou projeção, pois uma vez que não
possibilidade de se internalizar o afeto, reprimi-lo, recorremos ao ambiente externo para expressar
esse sentimento e nos defender dele, tal como ocorre com as ideias obsessivas.
Na comparação entre as formas de defesa, portanto: na histeria a ideia incompatível é separada
do fato e o afeto é convertido na esfera somática (a histeria de conversão); na ideia obsessiva, o
afeto conflituoso encontra um substituto; na confusão alucinatória a totalidade da ideia incompatível
é mantida afastada do ego e há um desligamento parcial do mundo externo, restando as
alucinações; na paranoia o conteúdo e o afeto são mantidos (em contraste com as alucinações),
mas são projetados para o mundo externo; por fim, nas psicoses as ideias rechaçadas assumem o
controle e as alucinações são hostis ao ego, gerando um perigo para o próprio sujeito.
NA PRÁTICA
Primeiramente, traremos dois casos relatados na carta 14 (1898, p. 229-30) sobre a neurose de
angústia:
1. Mulher, 41 anos, com 4 filhos entre 7 e 16 anos. Apresentava problemas nervosos no ano
anterior, com ataques de vertigem e sensação de fraqueza, agorafobia, expectativa ansiosa e
um pouco de histeria.
2. Homem, 42 anos, com 3 filhos entre 17 e 13 anos. Com a morte do pai, passou a apresentar
súbitos ataques de angústia com palpitações e temores hipocondríacos de câncer da língua;
vários meses depois, um segundo ataque, com cianose, pulso intermitente e medo de morrer; a
partir de então, fraqueza, vertigem, agorafobia, alguma dispepsia. Em ambos os casos, vivência
de coito interrompido, o que para Freud era o que provocava a neurose em ambos os casos.
O segundo exemplo é do Rascunho H, no qual uma mulher de cerca de 30 anos que morava com
os irmãos. Conta que, num determinado momento, a família recebeu a visita de um amigo que era
caixeiro-viajante. Numa manhã, quando ela foi arrumar as camas, o encontrou ainda deitado.
Ele a chamou e, quando ela se aproximou, ele colocou o pênis na mão da moça, que se afastou.
A partir daí, a moça adoeceu e começou a apresentar delírios de que estava sendo perseguida e
observada; acreditava que as vizinhas tinham pena dela por ter sido abandonada pelo pretenso
namorado e por acharem que ela ainda o esperava. Quando voltava a si, ela percebia que seus
delírios estavam relacionados ao fato de ter se excitado quando tocou o rapaz, mas logo essa
consciência se esvaía e ela voltava ao estado paranoide.
A irmã mais velha percebia que, quando a paciente se aproximava de falar sobre o episódio, algo
a reprimia e ela logo evitava o assunto. Quando Freud a pressionou a falar, ela abandonou a terapia,
enviando-lhe uma carta de que aquilo a aborrecera muito e, por isso, estava abandonando as
consultas, segundo Freud, como uma forma de defesa contra a lembrança e o sentimento de se
sentir como uma mulher depravada.
Portanto, conclui o autor, “o propósito da paranoia é rechaçar uma ideia que é incompatível com
o ego, projetando seu conteúdo para o mundo externo” (1895, p. 256): isso ocorre assim com o
alcoólatra que não aceita sua impotência e a justifica como culpa da mulher, não do álcool, ou do
hipocondríaco que não aceita que sua doença tem origem sexual.
FINALIZANDO
Como mencionamos no início desta aula, nosso objetivo foi trazer algumas das influências no
trabalho de Freud, expressas em seus rascunhos. Trabalhamos de forma aprofundada sobre seus
estudos e análises sobre a neurose, sobre o conceito inicial de angústia ou ansiedade, sobre a
melancolia e os esboços a respeito da paranoia.
Esperamos que tenham aproveitado as discussões apresentadas aqui para conhecer um pouco
mais das origens da psicanálise e convidamos você a continuar acompanhando os conteúdos para
saber mais sobre como Freud elaborou e desenvolveu seus estudos, criando, assim, as bases da
psicanálise.
REFERÊNCIAS
FOUCAULT, M. História da Sexualidade 2: o uso dos prazeres. Rio de Janeiro: Graal, 1984.
FREUD, S. Histeria. 1895. In: PUBLICAÇÕES pré-psicanalíticas e esboços inéditos. 1866-99. v. 1.
LAPLANCHE, J. Problemáticas I: a angústia. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
LAPLANCHE, J.; PONTALIS, J. B. Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A CLÍNICA EM FREUD
AULA 3
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Raquel Berg
CONVERSA INICIAL
Anteriormente, falamos sobre as Experiências clínicas de Sigmund Freud e alguns dos
principais médicos que contribuíram para o trabalho de Freud, tais como Charcot, Breuer e Berheim,
dentre outros. Nessa aula, também falaremos um pouco do contexto sócio-histórico de Freud, uma
vez que esse contexto influenciou significativamente Freud na aproximação com os estudos sobre a
histeria. Falaremos das principais influências e das cartas de Freud a Fliess, nas quais Freud traz
grande parte de seus primeiros esboços do que viria a ser futuramente a psicanálise de maneira
mais ampla. Na próxima aula, falaremos sobre os textos “Sobre a concepção das afasias”, “Algumas
Considerações para um estudo comparativo das paralisias motoras orgânicas e histéricas” e
“Projeto para uma Psicologia Científica”. Nas últimas aulas, falaremos sobre os primeiros casos
clínicos de Freud, trazendo um resumo de seus principais casos: Srta. Anna O., Sra. Emmy Von N.,
Miss Lucy R., Katharina e Srta. Elisabeth Von R. Além disso, iremos introduzir um pouco do que foi a
teoria da técnica freudiana, pelo menos em seus primórdios. Também falaremos sobre a
psicoterapia da histeria e as considerações de Breuer.
Na aula anterior e na de hoje, traremos ostemas que, na verdade, foram a subdivisão de toda a
conversa entre Freud e Breuer e Freud e Fliess, com exceção do “Projeto para uma Psicologia
Científica”, que terá uma atenção especial na próxima aula. Já mencionamos na aula anterior o
quanto Breuer foi importante para o trabalho de Freud. Fliess era médico otorrinolaringologista e
manteve com Freud, durante muitos anos, uma comunicação por correspondência intensa e
frequente entre os anos de 1887 e 1902. Segundo James Strachey (Freud, 1895, p. 219):
[Fliess] era mais acessível às ideias de Freud do que qualquer outro contemporâneo. Por
conseguinte, Freud lhe comunicava seus pensamentos com a máxima liberdade, e o fazia não
apenas em suas cartas, como também numa série de documentos (“Rascunhos”, como os
chamamos aqui) que representavam relatos organizados de suas ideias em evolução e que, em
alguns casos, são os primeiros esboços de obras posteriormente publicadas.
Essas cartas foram reveladas logo após a Segunda Guerra Mundial, tendo sido mantidas em
sigilo por Marie Bonaparte, sendo essa história contada nos textos de Ernest Jones. A maioria das
informações que serão apresentadas aqui são um grande resumo dos principais textos de Freud,
com alguns tópicos que ainda estavam em processo de amadurecimento conceitual. A principal
relevância das informações que serão trazidas aqui mostra os vieses e os caminhos que Freud
estava trilhando até chegar aos textos finais, e traz aos leitores uma boa ideia dos primórdios da
psicanálise. Depois de apresentarmos um resumo dessas correspondências, falaremos do tópico
“na prática” sobre como esses temas se correlacionam com tópicos do nosso cotidiano; e, em
“finalizando”, faremos uma retomada dos temas examinados nessa aula. Mais informações poderão
ser encontradas nos livros citados nas referências, os quais poderão ser consultados caso haja
qualquer dúvida a respeito dos tópicos aqui tratados.
O Rascunho I (Enxaqueca: aspectos estabelecidos) será suprimido de nossas análises porque se
trata de uma tentativa de estabelecer conexão entre a sintomatologia da enxaqueca e as questões
sexuais, mais presentes nas mulheres. Naquela época, seria difícil dizer se a enxaqueca feminina era
de fato um problema ginecológico, de caráter psíquico ou mero artifício para lidar com as obrigações
sexuais presentes nos casamentos sem amor.
TEMA 1 – MECANISMOS DE DEFESA (CARTA 22)
A carta 22 tem uma importância básica por trazer um resumo entre os transtornos descritos na
aula anterior. A tabela abaixo mostra esse comparativo:
  Afeto Conteúdo da ideia Alucinação Resultado
Histeria
eliminado pela
conversão
- -
ausente da
consciência
-
defesa instável com ganho
satisfatório
Ideia obsessiva conservado + - ausente da
consciência
- defesa permanente sem ganho
substituto
encontrado
Confusão
alucinatória
ausente - - ausente
favorável ao
EGO
favorável à
defesa
defesa permanente com ganho
acentuado
Paranoia conservado + +
projetado para
fora
hostil ao EGO
favorável à
defesa
defesa permanente sem ganho
Psicose histérica
domina a
consciência
+ +
domina a
consciência
hostil ao EGO
hostil à
defesa
fracasso da ideia
TEMA 2 – NEUROSES DE DEFESA (RASCUNHO K: AS NEUROSES DE
DEFESA - UM CONTO DE FADAS NATALINO)
Nesse estudo, Freud traça uma comparação entre histeria, neurose obsessiva e paranoia.
Segundo o autor, esses 3 transtornos possuem alguns pontos em comum, pois são extravasamentos
excessivos de estados afetivos psíquicos normais, extravasamentos que não trazem nenhum
benefício ou resolução de conflitos, apenas um prejuízo para o ego. Assim, estão presentes reações
de conflito (no caso da histeria), de autocensura (no caso da neurose obsessiva) e de mortificação
(no caso da paranoia), sendo todos conectados a conflitos sexuais infantis e possivelmente de
caráter hereditário, que precisam ser reprimidos:
O rumo tomado pela doença nas neuroses de recalcamento é, em geral, sempre o mesmo: (1) a
experiência sexual (ou a série de experiências), que é traumática e prematura e deve ser recalcada.
(2) Seu recalcamento em alguma ocasião posterior, que desperta a lembrança correspondente; ao
mesmo tempo, a formação de um sintoma primário. (3) Um estágio de defesa bem-sucedida, que é
equivalente à saúde, exceto quanto à existência do sintoma primário. (4) O estágio em que as
ideias recalcadas retornam e em que, durante a luta entre elas e o ego, formam-se novos sintomas,
que são os da doença propriamente dita: isto é, uma fase de ajustamento, de ser subjugado, ou de
recuperação com uma malformação. (Freud, 1895, p. 269)
Na neurose obsessiva, a experiência primária é acompanhada de prazer, sem dor ou mescla de
nojo (como é esperado quando, por exemplo, a criança aprende a se limpar após as fezes, ou quando
está constipada e aprende que precisa se alimentar melhor. Nesses casos, seria esperado que a
criança vivenciasse uma sensação de nojo ou de dor, o que não ocorre no desenvolvimento da
neurose obsessiva). Quando essa experiência então é lembrada posteriormente, daí então surge a
vergonha e o desprazer pela autocensura, fazendo com que o ego tente recalcar a lembrança. Além
disso, Freud (1895) também afirma que, na neurose obsessiva, há uma experiência de passividade
durante o prazer, e a recordação dessa experiência posteriormente é que gera o desprazer e o
sentimento de angústia associado com ideias ou afetos obsessivos, rituais, acumulação obsessiva
de objetos, escrupulosidade e autocensura excessiva.
Na paranoia, nenhuma autocensura se forma, e o desprazer gerado é atribuído a pessoas que, de
algum modo, relacionam-se com a pessoa paranoica, com um processo de projeção. Nesse sentido,
o sintoma primário é a desconfiança, e o afeto reprimido que retorna pode vir sob a forma de
alucinação (visual, auditiva etc.) que lembram a autocensura, ou seja, essas alucinações aparecem
sob a forma de ordens e ameaças ao ego e ao indivíduo que, por terem sido distorcidas, parecem ser
de origem indefinida. Os sintomas mais comuns são ligados à megalomania e ao medo de
perseguição, pois são delírios de proteção ao ego. E, diferente da histeria e da neurose obsessiva, a
paranoia se desenvolve mais tarde no individuo, pois depende de o ego estar formado para ser
subjugado.
Na histeria, o fator presente é a passividade sexual e a experiência de desprazer que deve
ocorrer mais tarde que na neurose obsessiva. Segundo Freud (1895, p. 276):
O recalcamento e a formação de sintomas defensivos só ocorrem posteriormente, em conexão
com a lembrança; e, daí em diante, defesa e subjugação (isto é, a formação dos sintomas e a
irrupção dos ataques) podem estar combinadas em qualquer grau de histeria. O recalcamento não
es dá pela construção de uma ideia antitética excessivamente forte [...], mas sim pela
intensificação de uma ideia limítrofe, que, depois, representa a lembrança no fluxo do pensamento.
TEMA 3 – CRONOLOGIA DAS NEUROSES (CARTAS 46 E 52)
3.1 CARTA 46
Nessa carta, Freud (1895) estabelece de forma cronológica as psiconeuroses de acordo com os
estágios de vida, conforme podemos observar nas próximas 2 tabelas:
Idades
Ia Ib A II B III
Até os 4 anos
Pré-consciente
Até os 8 anos  
Até os 14 anos
Pré-puberdade
 
Até o fim da vida
Maturidade
Na tabela anterior, as colunas A e B são os períodos nos quais se dá o recalque para a formação
dos sintomas e das neuroses. Segundo Freud, esses são períodos de transição entre as épocas da
vida, sendo a tabela anterior e a próxima os primórdios de seus estudos que, posteriormente, dariam
origem à teoria da sexualidade (Três ensaios sobre a teoria da sexualidade, lançado em 1905). Na
próxima tabela, vê-se um resumo do momento em que ocorre a formação de cada neurose:
Requisitos cronológicos
  Ia Ib A II B III
  Até os 4 Até os 8   Até os 14   Até X
Histeria Cena   Recalque   Recalque  
Obsessão   Cena Recalque   Recalque  
Paranoia   Cena e Recalque
Com base nessas informações, Freud conclui quetanto a histeria quanto a neurose obsessiva
podem se desenvolver no início da vida, enquanto a paranoia é um transtorno mais característico da
vida adulta. Apesar de não ser o objeto de estudo aqui, é importante informar que essas hipóteses
sobre as idades de início de cada transtorno foram apenas um primeiro rascunho de Freud sobre o
tema. Aqui ele também já antecipa o que será discutido a respeito da energia de catexia, do afeto ou
força quantitativa inerente a uma representação, e da mobilidade dessa energia ao se desvincular da
memória original e se deslocar de acordo com as regras de cada sistema de defesa. Quando a força
dessas recordações a serem reprimidas aumenta, surge o distúrbio psíquico. E, se esse aumento for
de tal dimensão a ponto de tomarem o controle da consciência, produz-se então a psicose.
3.2 CARTA 52
Nessa carta, o autor segue discutindo sobre os mecanismos de defesa. Segundo o autor,
nossas lembranças são, de tempos em tempos, rearranjadas segundo novas circunstâncias e novas
experiências: “assim, o que há de essencialmente novo a respeito de minha teoria é a tese de que a
memória não se faz presente de uma só vez, mas se desdobra em vários tempos; que ela é
registrada em diferentes espécies de indicações” (Freud, 1895-6, p. 281). A figura abaixo é um
primeiro quadro esquemático do aparelho psíquico que Freud utiliza para apresentar sua ideia:
  I II III  
Pcp I-Pcp Ics Pcs Cs
XX XX XX XX XX
X XX X X X
    X    
A tabela acima foi adaptada para facilitar nossa leitura, incluindo as siglas comumente usadas
para descrever o aparelho psíquico freudiano relativo aos primeiros anos de trabalho dele
(chamados de primeira tópica, que antecedem o texto da Interpretação dos Sonhos, de 1905): Pcp
significa percepção; I-pcp significa indicação da percepção; Ics é o inconsciente; Pcs é o pré-
consciente e Cs é a consciência. Esse primeiro indicativo sobre a formação do sistema psíquico será
mais bem trabalhado nos textos “Projeto para uma Psicologia Científica”, também de 1895, e no
Rascunho “Uma nota sobre o bloco mágico”, no qual Freud faz um paralelo entre esse brinquedo tão
popular na época e o sistema psíquico.
Na descrição sobre como funciona o aparelho psíquico, portanto, podemos compreender que as
percepções nos cercam a todo momento, e que cada pessoa pode ter uma compreensão ou
indicação da percepção diferente, de acordo com sua genética e experiência prévia. A informação
captada é processada então no subconsciente e encaminhada ao inconsciente, recalcada quando
trouxer algum tipo de conflito ou sofrimento para o indivíduo. Quando não há nenhum sentimento de
conflito envolvido, essa lembrança, imagem, som ou cheiro apreendido retornam à consciência e
ficam gravados, podendo se conectar a outras informações (anteriores ou posteriores). Dessa forma,
as informações apreendidas são permanentemente reeditadas e reelaboradas, pois a construção
das mesmas passa por um constante processo de reconstrução e revisão.
A informação recalcada pode passar por um processo normal de defesa ou patológico. Quando
se torna patológico, significa que ele se associou a uma memória que estava no Ics por não ter sido
processada, já que provocava demasiado sentimento de conflito ou sofrimento. Além disso, quanto
mais vezes essa lembrança recalcada retorna à Cs, ainda que modificada, mais o aparelho psíquico
irá se esforçar por reprimi-la novamente ou modificá-la. No entanto, no caso dos eventos sexuais, há
uma diferença:
O que determina a defesa patológica (recalcamento), portanto, é a natureza sexual do evento e sua
ocorrência numa fase anterior. Nem todas as experiências sexuais produzem desprazer; a maioria
delas produz prazer. Assim, a maioria delas está ligada a um prazer não passível de inibição. O
prazer não passível de inibição dessa espécie constitui uma compulsão. Chegamos, pois, à
seguinte formulação. Quando uma experiência sexual é recordada numa fase diferente, a liberação
de prazer é acompanhada por uma compulsão e a liberação de desprazer é acompanhada pelo
recalcamento.
Freud, ao estabelecer novamente como os transtornos se encaixam na cronologia de
desenvolvimento humano, traz a seguinte formulação:
  Até 4 anos Até 8 anos Até 14-15 anos Idem
Histeria atual compulsão recalcado em I-pcp  
N. obsessiva   atual recalcado nas indicações de Ics  
Paranoia     atual reprimido nas indicações de Pcs
Perversão atual atual compulsão (atual) recalcamento impossível ou não tentado
Assim, para o autor, há 3 grupos de psiconeuroses: histeria, neurose obsessiva e paranoia,
sendo que a primeira experiência de recalque só ocorre após os 4 anos de idade, e na perversão (que
para Freud já é considerada dentro de um outro grupo; posteriormente, ele traça como sendo 3
grupos psíquicos a neurose, a psicose e a perversão).
TEMA 4 – ETIOLOGIA DA HISTERIA E DOS IMPULSOS (RASCUNHO L,
M E N)
4.1 RASCUNHO L: NOTAS I
Esse rascunho trata basicamente do tema da histeria. Segundo Freud, para se tratar da histeria,
é necessário o médico conseguir regressar, juntamente com o paciente, às cenas primevas que
deram origem ao transtorno, ainda que por meio das fantasias que foram criadas para dificultar o
acesso ao inconsciente e à memória recalcada. As fantasias servem para, além de proteger o
aparelho psíquico, aprimorar as lembranças e sublimá-las, ou provocar prazer com essas
lembranças originalmente angustiantes. Alguns dos exemplos de fantasias apresentadas por Freud
são: com empregadas, recorrentemente tidos por mulheres que as consideram como pessoas de
baixo padrão moral, sem valor e sexualmente ligadas com o pai ou o irmão da família; com
cogumelos e embrulhar, pois a palavra alemã para cogumelos (Schwämme) também significa
esponja e está associada com métodos contraceptivos da época, assim como embrulhar e
camisinha; com dores, no sentido de que há a repetição intencional da dor ao se bater a genitália
contra uma quina ou um móvel, provocando a sensação de prazer e de dor ao mesmo tempo; e às
doenças, nos casos dos pacientes que desejam estar doentes.
4.2 RASCUNHO M: NOTAS II
Na sequência do tema sobre a histeria, considera-se que algumas cenas são diretamente
acessíveis e outras apenas por intermédio das fantasias. Segundo Freud (1895, p. 300), “as cenas
recalcadas são organizadas por ordem crescente de resistência: as que foram recalcadas com
menos energia vêm à luz primeiro, porém só incompletamente, devido à sua associação com as que
foram duramente recalcadas”. Como esse processo de recalque pode se dar mais de uma vez,
principalmente se novas informações se ligam à lembrança recalcada, há uma espécie de fluxo
contínuo, repetitivo e renovador, com distorções e fragmentações da informação, que perde a
temporalidade e o contexto à medida que é reeditada no inconsciente, conforme o desenho a seguir:
Na histeria, as fantasias são independentes e contraditórias, e se dá pelo deslocamento das
associações; na paranoia, as fantasias são sistematizadas e em perfeita harmonia, e as associações
se dão por um deslocamento causal. Já na neurose obsessiva, os sintomas derivam das próprias
fantasias, como ocorre com as fobias, e a associação se dá por um deslocamento por semelhança
(no lugar e no tempo).
4.3 RASCUNHO N: NOTAS III
Na sequência das notas, Freud (1895) discute a importância dos impulsos hostis contra os pais
na formação das neuroses, como um elemento integrante a elas e que é recalcado quando há a
compaixão por esses pais, em períodos de doença ou morte. Além disso, Freud discute se os
impulsos poderiam derivar das fantasias, associa a arte às fantasias e aos sintomas como a
satisfação direta dos desejos.
TEMA 5 – ESTUDOS DE CASOS (CARTAS A FLIESS)
As cartas a Fliess são basicamente uma continuação dos rascunhos, com a descrição de
alguns casos e sua interpretação. A carta 21, por exemplo, traz a descrição de 2 casos, sendo o
primeiro com queixa de sensibilidade nos olhos e problemas com um casamento

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