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Indaial – 2023
e MetabolisMo
Prof. Tetsade Camboim Bezerra Piermartiri
2a Edição
bioquíMica básica
Elaboração:
Prof. Tetsade Camboim Bezerra Piermartiri
Copyright © UNIASSELVI 2023
Revisão, Diagramação e Produção:
Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI
Impresso por:
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI.
Núcleo de Educação a Distância. PIERMARTIRI, Tetsade Camboim Bezerra.
Bioquímica Básica e Metabolismo. Tetsade Camboim Bezerra Piermartiri.
Indaial - SC: Arqué, 2023.
246p.
ISBN 978-85-459-2345-9
ISBN Digital 978-85-459-2342-8
“Graduação - EaD”.
1. Bioquímica 2. Básica 3. Metabolismo
CDD 572Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679
A bioquímica é um campo interdisciplinar que busca entender as substâncias
e os processos químicos que ocorrem nos organismos vivos. Ele investiga os princípios
fundamentais de organização que são cruciais para a existência da vida. Ao examinar
os componentes químicos e celulares dos organismos vivos, a bioquímica nos ajuda
a entender as propriedades da água e a estrutura e função de biomoléculas como
proteínas, carboidratos, lipídios e ácidos nucléicos. Além disso, a bioquímica explora
as reações químicas que ocorrem dentro das células, fornecendo informações sobre
os processos metabólicos que sustentam a vida. Assim, a bioquímica é um campo vital
que nos ajuda a entender as unidades que em conjunto formam a vida e as intrincadas
reações químicas que permitem que os organismos vivos funcionem.
O metabolismo é um subconjunto da bioquímica que se concentra nas reações
químicas necessárias para manter a vida em um organismo. Essas reações são regidas
pelas leis da termodinâmica e da bioenergética, que ditam a conversão dos alimentos
em energia e a eliminação dos resíduos. O processo de catabolismo é responsável por
quebrar moléculas para liberar energia, enquanto o anabolismo envolve a síntese de
moléculas necessárias para a vida.
A respiração celular é um aspecto fundamental do catabolismo, pois é o processo
pelo qual a energia é extraída das moléculas dos alimentos e usada para produzir ATP
(trifosfato de adenosina), que é a moeda energética das células. Essa energia é então
usada para várias funções celulares, como síntese de proteínas, replicação do DNA e
transporte de moléculas através da membrana celular. O metabolismo desempenha um
papel vital na sobrevivência e no bem-estar de um organismo, garantindo que a energia
esteja disponível para realizar as reações químicas necessárias que sustentam a vida.
Juntos, a bioquímica e o metabolismo fornecem uma compreensão fundamental
dos processos biológicos que sustentam a vida.
Este livro didático Bioquímica Básica e Metabolismo busca simplificar e explicar
de forma concisa os princípios fundamentais e termos-chave no campo da bioquímica e é
um excelente ponto de partida para aqueles que buscam expandir seus conhecimentos.
Abrange os tópicos essenciais dos principais textos de bioquímica, como “Nelson & Cox –
Princípios da Bioquímica”, “Berg & Stryer - Bioquímica” e “Rodwell - Bioquímica ilustrada
de Harper” que são cruciais para o ensino da disciplina de bioquímica nas universidades.
Para facilitar a compressão, os assuntos foram separados em três unidades,
com a bioquímica humana como foco principal. A Unidade 1 fornece uma introdução aos
fundamentos da bioquímica, estabelecendo as bases para o entendimento da disciplina.
A unidade 2 investiga o tópico das macromoléculas que são essenciais para a vida,
APRESENTAÇÃO
GIO
Olá, eu sou a Gio!
No livro didático, você encontrará blocos com informações
adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender
melhor o que são essas informações adicionais e por que você
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais
e outras fontes de conhecimento que complementam o
assunto estudado em questão.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos
os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina.
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada
também digital, em que você pode acompanhar os recursos
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que
também contribui para diminuir a extração de árvores para
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Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente,
apresentamos também este livro no formato digital. Portanto,
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com
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Preparamos também um novo layout. Diante disso, você
verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos,
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.
incluindo proteínas, carboidratos, lipídios e ácidos nucleicos. Finalmente, a Unidade 3
aborda o metabolismo, os processos complexos que ocorrem dentro de nossas células
para sustentar a vida.
O estudo da bioquímica é essencial para nossa compreensão do mundo natural
e tem implicações significativas para a saúde humana. À medida que continuamos a
explorar as complexidades dos organismos vivos, ganhamos novos conhecimentos
sobre as maravilhas da vida e o potencial para melhorar o bem-estar humano.
Bons estudos!
Prof. Tetsade Camboim Bezerra Piermartiri
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para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
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SUMÁRIO
UNIDADE 1 - FUNDAMENTOS DE BIOQUÍMICA .................................................................... 1
TÓPICO 1 - INTRODUÇÃO À BIOQUÍMICA .............................................................................3
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................3
2 BREVE HISTÓRICO DA BIOQUÍMICA ..................................................................................3
3 COMPOSIÇÃO QUÍMICA DA MATÉRIA VIVA ......................................................................53.1 FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ............................................................................................................ 5
RESUMO DO TÓPICO 1 ......................................................................................................... 13
AUTOATIVIDADE ..................................................................................................................14
TÓPICO 2 - ARQUITETURA CELULAR ................................................................................. 17
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 17
2 FUNDAMENTOS DE BIOLOGIA CELULAR ........................................................................ 17
2.1 AS CÉLULAS PROCARIONTES ..........................................................................................................25
2.2 AS CÉLULAS EUCARIONTES ............................................................................................................ 27
RESUMO DO TÓPICO 2 ......................................................................................................... 31
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 32
TÓPICO 3 - A ÁGUA ............................................................................................................. 35
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 35
2 ESTRUTURA DA MOLÉCULA DE ÁGUA ........................................................................... 36
2.1 PROPRIEDADES DA ÁGUA ................................................................................................................. 37
2.2 INTERAÇÕES FRACAS EM SISTEMAS AQUOSOS ....................................................................... 40
3 OSMOMETRIA ................................................................................................................... 41
4 pH E SISTEMAS TAMPÃO BIOLÓGICOS .......................................................................... 43
5 A ÁGUA COMO REAGENTE ............................................................................................... 49
LEITURA COMPLEMENTAR ................................................................................................ 52
RESUMO DO TÓPICO 3 ........................................................................................................ 55
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 56
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 58
UNIDADE 2 — AS MACROMOLÉCULAS E SUAS FUNÇÕES ................................................59
TÓPICO 1 — ESTRUTURA E FUNÇÃO DAS PROTEÍNAS ...................................................... 61
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 61
2 AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS ................................................................... 63
2.1 CLASSIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS ............................................................................................65
2.2 LIGAÇÃO PEPTÍDICA .......................................................................................................................... 67
3 ESTRUTURA DAS PROTEINAS ....................................................................................... 68
4 CLASSIFICAÇÃO DAS PROTEINAS E FUNÇÃO ...............................................................73
5 ENZIMAS E CATÁLISE .......................................................................................................76
5.1 FUNÇÃO DOS CATALISADORES ENZIMÁTICOS ............................................................................78
5.2 CINÉTICA ENZIMÁTICA ..................................................................................................................... 80
5.3 REGULAÇÃO DA ATIVIDADE ENZIMÁTICA ................................................................................... 84
5.4 COENZIMAS E VITAMINAS ................................................................................................................85
RESUMO DO TÓPICO 1 .........................................................................................................87
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................. 88
TÓPICO 2 - ESTRUTURA E FUNÇÃO DE CARBOIDRATOS E LIPÍDIOS .............................. 91
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 91
2 CARBOIDRATOS ................................................................................................................ 91
2.1 MONOSSACARÍDEOS .......................................................................................................................... 91
2.2 DISSACARÍDEOS E OLIGOSSACARÍDEOS .....................................................................................96
2.3 POLISSACARÍDEOS ............................................................................................................................ 97
3 GLICOCONJUGADOS ......................................................................................................100
4 LIPÍDIOS ..........................................................................................................................103
4.1 ÁCIDOS GRAXOS ................................................................................................................................103
4.2 TRIGLICERÍDEOS ...............................................................................................................................104
5 MEMBRANAS BIOLÓGICAS E TRANSPORTE ................................................................107
5.1 TRANSPORTE DE BIOMOLÉCULAS ...............................................................................................112
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................... 118
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................120
TÓPICO 3 - AS MACROMOLÉCULAS DA INFORMAÇÃO GENÉTICA .................................123
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................123
2 ESTRUTURA E FUNÇÃO DOS ÁCIDOS NUCLEICOS ......................................................123
2.1 NUCLEOTÍDEOS ................................................................................................................................ 123
2.2 ESTRUTURA DO DNA ..................................................................................................................... 127
2.3 ESTRUTURA DO RNA ...................................................................................................................... 129
3 TRANSMISSÃO DO MATERIAL GENÉTICO ................................................................... 131
3.1 REPLICAÇÃO .....................................................................................................................................131
3.2 TRANSCRIÇÃO .................................................................................................................................. 135
LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................139
RESUMO DO TÓPICO 3 ...................................................................................................... 144
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................145REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 147
UNIDADE 3 — PRINCIPAIS VIAS DO METABOLISMO E PROCESSOS
BIOENERGÉTICOS .....................................................................................149
TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO À BIOENERGÉTICA E AO METABOLISMO .............................. 151
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 151
2 PRINCÍPIOS DA BIOENERGÉTICA E TERMODINÂMICA ................................................152
2.1 PRINCIPAIS REAÇÕES BIOQUIMICAS ........................................................................................... 156
3 VISÃO GERAL DO METABOLISMO ..................................................................................159
RESUMO DO TÓPICO 1 .......................................................................................................163
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................164
TÓPICO 2 - METABOLISMO DE LIPÍDIOS, AMINOÁCIDOS E NUCLEOTÍDEOS ................165
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................165
2 METABOLISMO DE LIPÍDIOS E ÁCIDOS GRAXOS ..........................................................165
2.1 DIGESTÃO, MOBILIZAÇÃO E TRANSPORTE DE GORDURAS .................................................. 166
2.2 BETA-OXIDAÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS ......................................................................................168
2.3 CETOGÊNESE .................................................................................................................................... 173
2.4 BIOSSÍNTESE DE ÁCIDOS GRAXOS SATURADOS ..................................................................... 174
2.5 BIOSSÍNTESE DE ÁCIDOS GRAXOS INSATURADOS ................................................................ 178
2.6 BIOSSÍNTESE DE TRIACILGLICERÕIS E GLICEROFOSFOLIPÍDEOS ......................................180
2.7 METABOLISMO DO COLESTEROL ..................................................................................................180
2.8 LIPOPROTEÍNAS ...............................................................................................................................182
2.9 REGULAÇÃO METABOLISMOS DE LIPÍDIOS ..............................................................................185
3 METABOLISMO DE AMINOÁCIDOS .................................................................................187
3.1 DIGESTÃO DE PROTEÍNAS ..............................................................................................................188
3.2 TRANSAMINAÇÃO E DESAMINAÇÃO ..........................................................................................189
3.3 EXCREÇÃO DE NITROGÊNIO E CICLO DA UREIA .....................................................................191
3.4 BIOSSÍNTESE DE AMINOÁCIDOS ................................................................................................. 194
4 METABOLISMO DE NUCLEOTÍDEOS ............................................................................. 197
4.1 BIOSSINTESE DE NUCLEOTIDEOS ............................................................................................... 197
4.2 CATABOLISMO DE PURINAS E DE PIRIMIDINAS ....................................................................... 199
RESUMO DO TÓPICO 2 ...................................................................................................... 200
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................201
TÓPICO 3 - METABOLISMO DE CARBOIDRATOS E BIOENERGÉTICA ........................... 203
1 INTRODUÇÃO À RESPIRAÇÃO CELULAR ...................................................................... 203
2 GLICÓLISE ..................................................................................................................... 205
2.1 FASE PREPARATÓRIA ......................................................................................................................207
2.2 FASE DE PAGAMENTO ...................................................................................................................208
2.3 FERMENTAÇÃO .................................................................................................................................210
3 GLICONEOGÊNESE .........................................................................................................212
4 VIA DAS PENTOSES FOSFATO ......................................................................................215
5 METABOLISMO DO GLICOGÊNIO ....................................................................................218
6 CICLO DO ÁCIDO CÍTRICO ............................................................................................ 222
7 REGULAÇÃO ................................................................................................................... 225
7.1 REGULAÇÃO DA GLICOLISIS .......................................................................................................... 225
7.2 REGULAÇÃO DA GLICONEOGENESE ...........................................................................................227
7.3 REGULAÇÂO DO GLICOGENIO ..................................................................................................... 228
7.4 REGULAÇÃO DO CICLO DE KREBS .............................................................................................. 230
8 TRANSPORTE DE ELÉTRONS, CADEIA RESPIRATÓRIA E FOSFORILAÇÃO
OXIDATIVA ...................................................................................................................... 230
LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................241
RESUMO DO TÓPICO 3 ...................................................................................................... 243
AUTOATIVIDADE ............................................................................................................... 244
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 246
1
UNIDADE 1 -
FUNDAMENTOS DE
BIOQUÍMICA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• compreender a composição química da matéria viva e as estruturas tridimensionais
das moléculas biológicas;
• comparar e contrastar as estruturas presentes nas células procarióticas e células
eucarióticas;
• entender como as células obtêm energia e carbono;
• descrever as propriedades da água que são essenciais para a manutenção da vida.
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
TEMA DE APRENDIZAGEM 1 – INTRODUÇÃO À BIOQUÍMICA
TEMA DE APRENDIZAGEM 2 – ARQUITETURA CELULAR
TEMA DE APRENDIZAGEM 3 – A ÁGUA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
CHAMADA
2
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!
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3
INTRODUÇÃO À BIOQUÍMICA
1 INTRODUÇÃO
O nascimento da bioquímica, o estudo da química da vida, foi resultado dos
esforços dedicados de numerosos cientistas. Hoje, continua a progredir através do
avanço da tecnologia moderna e da pesquisa em áreas como biotecnologia e biologia
molecular, esclarecendo muitos aspectos da saúde e da doença.
Acadêmico, no Tema de Aprendizagem 1, abordaremos a história da bioquímica
e em seguida a composição química da matéria viva e a estruturas tridimensionais das
moléculas. O carbono é um elemento central na bioquímica devido à sua estruturamolecular que lhe permite formar fortes ligações covalentes com outros elementos e
formar moléculas complexas e diversas.
A estrutura do carbono também permite a formação de isômeros, que são
moléculas com a mesma fórmula molecular, mas com diferentes arranjos de átomos. Essa
diversidade na estrutura molecular desempenha um papel crítico no comportamento e
nas interações de moléculas em organismos vivos.
TÓPICO 1 - UNIDADE 1
2 BREVE HISTÓRICO DA BIOQUÍMICA
A bioquímica é o estudo dos processos químicos dos organismos vivos. Tem
raízes em várias disciplinas, incluindo biologia, química e física, e foi moldado por vários
cientistas ao longo da história. Dentre eles, destacam-se Friedrich Wöhler (1800-1882),
um químico alemão, sendo sua descoberta considerada por alguns historiadores como
o início da bioquímica. Em 1828, realizou a síntese de ureia (um composto encontrado
na urina humana) a partir de materiais inorgânicos, o que desafiou a crença de que
os seres vivos organismos só poderiam vir de matéria viva. Esta descoberta marcou o
nascimento da química orgânica como disciplina científica.
Marcellin Berthelot (1827-1907), um químico francês considerado o fundador
da bioenergética, estabeleceu os conceitos de reações endotérmicas e exotérmicas
em organismos e lançou as bases para a segunda lei da termodinâmica. Ele também
descobriu a sacarose, que chamou de "invertina".
Louis Pasteur (1822-1895), um microbiologista francês, é amplamente
considerado o pai da bioquímica. Ele conciliou a química com a biologia e realizou extensas
pesquisas sobre a fermentação, mostrando que ela era causada por microorganismos.
4
Ele demonstrou o papel dos microorganismos na deterioração e na doença e lançou as
bases para a pasteurização. Após sua morte, a bioquímica emergiu como uma disciplina
independente no século XX.
O Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina foi concedido a vários cientistas por
seus trabalhos em bioquímica e áreas afins, porém Wöhler, Berthelot e Pasteur não
estavam entre eles.
Em 1838, Gerhard Mulder (1802-1880), um químico holandês, descobriu uma
substância complexa contendo enxofre no sangue, ovos e queijo e a chamou de
"proteína" por sugestão de seu colega Jöns Jakob Berzelius (1779-1848). Isso marcou
a identificação do primeiro composto da vida e estabeleceu Mulder como uma figura
importante no início da história da bioquímica.
James Watson (1928 -) e Francis Crick (1916-2004) fizeram uma descoberta
revolucionária no campo da biologia quando propuseram o modelo de dupla hélice do
DNA em 1953 e receberam o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1962. Esse modelo
transformou a compreensão da replicação, armazenamento e transmissão da informação
genética. Rosalind Franklin (1920-1958) foi uma cientista importante na descoberta da
estrutura do DNA e que futuramente ajudaram os estudos de Watson e Crick.
Os mecanismos da catálise enzimática, a relação enzima-substrato e o conceito
de sítio ativo foram inicialmente desenvolvidos por Michael Polanyi (1891-1976) e J.B.S.
Haldane (1892-1964). Mais tarde, Linus Pauling (1901-1994) acrescentou ao seu trabalho.
Em 1913, L. Michaelis e M.L. Menten (1879-1960) estabeleceram a equação de Michaelis-
Menten, que ainda é utilizada como base para estudos de reações enzimáticas.
A estrutura tridimensional dos carboidratos foi proposta por Sir Robert Alexander
Haworth (1883-1950), e hoje essa estrutura leva seu nome. A Coenzima A e sua relação
com o metabolismo intermediário foi descoberta por Fritz Lipmann (1899-1986) e ele
dividiu o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1953 com Hans Adolf Krebs (1900-
1981) que descobriu os ciclos da uréia e do ácido cítrico (ciclo de Krebs).
Por último, Fred Sanger (1918-2013) merece reconhecimento como uma figura
marcante na história da bioquímica. Ele desenvolveu uma técnica para sequenciar ácidos
nucléicos, pela qual recebeu o Prêmio Nobel de Química em 1958 e novamente em 1980.
A bioquímica continua a evoluir com o uso de tecnologias modernas e pesquisas
em áreas como biotecnologia e biologia molecular. Esses avanços levaram novos
tratamentos para doenças, métodos aprimorados de produção de alimentos e uma
compreensão mais profunda dos processos fundamentais que governam a vida.
5
3 COMPOSIÇÃO QUÍMICA DA MATÉRIA VIVA
A tabela periódica é um gráfico de todos os elementos químicos conhecidos,
organizados em ordem crescente de número atômico (Figura 1). Embora existam muitos
elementos listados na tabela periódica, apenas alguns deles desempenham um papel
significativo na vida na Terra e menos de 30 são essenciais para os organismos. Dentre
esses, os quatro elementos mais abundantes nos organismos vivos são hidrogênio,
oxigênio, nitrogênio e carbono. Esses quatro elementos, juntamente com enxofre
e fósforo constituem aproximadamente 99% da massa de uma célula típica e são
essenciais para a formação de moléculas orgânicas complexas necessárias à vida,
como carboidratos, lipídios, proteínas e ácidos nucléicos. Sem esses elementos, a vida
como a conhecemos não seria possível.
Figura 1 – Elementos essenciais para a vida e a saúde dos animais.
Fonte : Nelson & Cox (2014, p.12)
Os elementos principais (vermelho) são componentes estruturais das células e dos
tecidos e são necessários na dieta em uma quantidade de vários gramas por dia. Para
os elementos-traço (amarelo), as quantidades requeridas são muito menores: para
humanos, alguns miligramas por dia de Fe, Cu e Zn são suficientes, e quantidades
ainda menores dos demais elementos. As necessidades mínimas para plantas e
microrganismos são semelhantes às mostradas aqui; o que varia são as maneiras
pelas quais eles adquirem esses elementos.
3.1 FUNDAMENTOS DE QUÍMICA
A química dos organismos vivos gira em torno do carbono, que é o esqueleto
de todas as moléculas biológicas e desempenha um papel central na química dos
organismos vivos. O carbono é um elemento versátil que pode participar de várias
formas de ligação covalente com ele mesmo e com outros elementos, como hidrogênio
(H), oxigênio (O), enxofre (S) e nitrogênio (N). Especificamente, o carbono pode formar
6
ligações covalentes simples, duplas e triplas com esses átomos. As ligações simples são
as mais comuns, mas as ligações duplas também são frequentemente encontradas em
biomoléculas, como ácidos graxos e ácidos nucléicos. Em contraste, ligações triplas são
relativamente raras em biomoléculas.
Essas diversas capacidades de ligação permitem a criação de estruturas
tridimensionais complexas presente nos processos biológicos necessários para a vida.
Essas estruturas estão presentes em uma variedade de grupos funcionais constituintes das
biomoléculas. Os grupos funcionais são responsáveis pelas reações e interações químicas
específicas que ocorrem dentro das células vivas, e o arranjo desses grupos no espaço
tridimensional determina a “personalidade” química geral de uma molécula (Figura 3).
Figura 2 – Alguns grupos funcionais comuns em biomoléculas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.15)
7
Os grupos funcionais estão pintados com uma cor usada para o elemento que
caracteriza aquele grupo: cinza para C, cor salmão para O, azul para N, amarelo para
S e cor de laranja para P. Nesta figura e em todo o livro, será usado R para representar
“qualquer substituinte”. Ele pode ser tão simples como um átomo de hidrogênio, mas
geralmente será um grupo contendo carbono. Quando dois ou mais substituintes
são mostrados em uma molécula, serão designados como R1, R2 e assim por diante.
Essa “personalidade” química pode afetar o comportamento da molécula e é um
fator crítico na determinação do papel da molécula no organismo.
A estrutura tridimensional de uma molécula é caracterizada por sua configuração
e conformação. A configuração refere-se ao arranjo dos átomos em relação a uma
ligação, enquanto a conformação se refere à forma geral e ao arranjo espacial da
molécula. Mudanças na configuração de uma molécula só podemocorrer através da
quebra de ligações covalentes, enquanto a conformação molecular pode ser alterada
girando em torno de ligações simples sem quebrar nenhuma ligação covalente.
Essa estrutura tridimensional é crítica na determinação das propriedades físicas
e químicas da molécula, incluindo sua reatividade, solubilidade e estabilidade.
Os modelos de representação de moléculas são representações visuais da
estrutura tridimensional de uma molécula. Existem três tipos principais: fórmula
estrutural em perspectiva, modelo de esfera e bastão e volume atômico (Figura 3).
A fórmula da perspectiva estrutural mostra a molécula como uma combinação
de linhas e símbolos, exibindo a ligação entre os átomos em uma visão em perspectiva.
Ajuda na compreensão da estrutura molecular e suas conexões com outras moléculas.
O modelo de esfera e bastão exibe os ângulos das ligações e os comprimentos das
ligações como esferas (representando átomos) conectadas por cilindros (representando
ligações). Este modelo fornece informações sobre as relações espaciais entre os átomos
e o tamanho e a forma das moléculas.
O modelo de volume atômico representa o raio de van der Waals de cada átomo
como seu raio, e os contornos do modelo definem o espaço ocupado pela molécula.
8
Figura 3 – Representações das moléculas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.16)
Três maneiras de representar a estrutura do aminoácido alanina (mostrado na forma
iônica encontrada em pH neutro). (a) Fórmula estrutural em perspectiva: uma cunha
sólida (◄) representa uma ligação na qual o átomo se projeta para fora do plano do
papel, na direção do leitor; a cunha tracejada, representa a ligação estendida para
trás do plano do papel. (b) Modelo de esfera e bastão, mostrando os comprimentos
relativos das ligações e os ângulos das ligações. (c) Modelo de volume atômico, no
qual cada átomo é mostrado com seu raio de van der Waals relativo correto.
A estereoquímica refere-se ao estudo do arranjo dos átomos no espaço
tridimensional, incluindo as posições relativas dos átomos e sua orientação. Compostos
contendo carbono podem existir como estereoisômeros, que são moléculas que
possuem as mesmas ligações na mesma formula molecular, mas diferem quanto a
sua estrutura espacial e por isso é chamada de isomeria espacial. Essa diferença na
configuração pode ter um impacto significativo nas propriedades da molécula, pois,
diferentes estereoisômeros, podem ter diferentes propriedades.
Existem dois tipos de isomeria espacial: isômeros geométricos e isômeros
ópticos (que só ocorre em moléculas quirais).
Isômeros geométricos, também conhecidos como isômeros cis-trans, diferem no
arranjo de seus grupos substituintes em relação a uma ligação dupla rígida (com pouca ou
nenhuma liberdade de rotação). Os grupos podem estar em cis, do latim, significa "neste
lado" e trans significa “através de”, ou seja, grupos em lados opostos (Figura 4).
9
Figura 4 – Configuração de isômeros geométricos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.16a)
Isômeros como o ácido maleico (maleato em pH 7) e o ácido fumárico (fumarato)
não podem ser interconvertidos sem quebrar ligações covalentes, o que requer o
gasto de muito mais energia do que a média da energia cinética das moléculas a
temperaturas fisiológicas.
Um carbono tetraédrico pode se arranjado em duas configurações espaciais
distintas, resultando em dois estereoisômeros com propriedades químicas semelhantes
ou idênticas, mas com propriedades físicas e biológicas diferentes.
Um átomo de carbono com quatro substituintes diferentes é considerado
assimétrico e chamado de centro quiral (da palavra grega chiros, que significa "mão")
(Figura 5). Uma molécula com um carbono quiral pode ter dois estereoisômeros, enquanto
uma molécula com uma quantidade n de carbonos quirais pode ter 2n estereoisômeros.
Figura 5 – Assimetria molecular: moléculas quirais e não quirais
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.17)
10
Quando um átomo de carbono tem quatro grupos substituintes diferentes (A, B,
X, Y), estes podem estar arranjados de duas maneiras, que representam imagens
especulares não sobreponíveis (enantiômeros). O átomo de carbono assimétrico é
chamado de átomo quiral ou centro quiral. (b)Quando um carbono tetraédrico tem
somente três grupos diferentes (isto é, o mesmo grupo ocorre duas vezes), somente
uma configuração é possível e a molécula é simétrica ou não quiral. Neste caso, a
molécula tem sua imagem superposta na imagem especular: a molécula do lado
esquerdo pode girar no sentido anti-horário (quando vista de cima para baixo na
direção da ligação de A com C) para formar a molécula vista no espelho.
Existem duas classes de isômeros ópticos, os que são imagens espelhadas um
do outro que não se superpõem são conhecidos como enantiômeros, enquanto aqueles
que não são imagens especulares são chamados diastereoisômeros (Figura 6).
O cientista Louis Pasteur observou, em 1843, que os enantiômeros são moléculas
muito semelhantes, mas diferem em sua interação com a luz polarizada, que possui
um único plano de vibração. Essas substâncias são chamadas de opticamente ativas.
Quando em soluções separadas, ambos os enantiômeros fazem com que o plano da
luz polarizada se dobre no mesmo desvio angular, mas em direções opostas. O isômero
que produz o desvio para a direita (sentido horário) é chamado dextrorrotatório (ou R),
e o isômero que provoca o desvio para a esquerda (sentido anti-horário) é chamado
levorrotatório (ou S). Essas formas são base para nomenclatura de substância pelo
sistema RS. Uma mistura racêmica ou equimolar que contém quantidades iguais de
ambos os enantiômeros mostra atividade óptica rotacional nula. Compostos sem
centros quirais não causam rotação da luz plano-polarizada.
As moléculas quirais são críticas para muitos processos biológicos e de grande
importância no desenvolvimento de medicamentos.
Figura 6 – Enantiômeros e diastereoisômeros.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.17)
11
Existem quatro diferentes estereoisômeros de 2,3-butanos dissubstituídos (n = 2
carbonos assimétricos, consequentemente 2n= 4 estereoisômeros). Cada um é
mostrado em um retângulo com a fórmula em perspectiva e o modelo de esfera
e bastão, que foi girado para a visualização de todos os grupos. Dois pares de
estereoisômeros são imagens especulares um do outro, ou enantiômeros. Outros
pares não são imagens especulares, sendo diastereoisômeros.
Uma maneira mais simples e padronizada de descrever a estereoquímica de uma
molécula é o sistema D e L, sendo amplamente utilizada em bioquímica. Neste sistema,
o estereoisômero com uma orientação específica do carbono assimétrico em relação à
configuração de referência (a forma "D") recebe a letra "D", enquanto o estereoisômero
com a orientação oposta (a forma "L") é atribuída a letra "L". A configuração de referência
é baseada no arranjo dos substituintes na molécula e, geralmente, é determinada por
convenções internacionais.
Um exemplo desse sistema é o gliceraldeído, que possui um único centro quiral.
Existem dois estereoisômeros do gliceraldeído, um com o grupo hidroxila e o grupo
aldeído na mesma direção (a forma D) e outro com o grupo hidroxila e o grupo aldeído
em direções opostas (a forma L).
Nos organismos vivos, as moléculas quirais geralmente estão presentes em
uma forma quiral específica. Por exemplo, os aminoácidos, que são os monômeros
constituintes das proteínas, ocorrem apenas na forma de isômero L. Da mesma forma,
a glicose, um açúcar, ocorre apenas como isômero D.
No laboratório, no entanto, é possível sintetizar qualquer forma de isômero,
independentemente de qual forma ocorre naturalmente na natureza. Sendo assim,
cientistas podem produzir as formas L e D de aminoácidos e glicose, entre outras
moléculas quirais.
Na natureza, as interações entre as moléculas são estereoespecíficas, pois
as moléculas têm uma configuração específica para interação. Por exemplo, algumas
enzimas podem reconhecer e interagir apenas com estereoisômerosespecíficos de
um substrato, e as drogas podem se ligar apenas a estereoisômeros específicos de
receptores. Logo, compreender a estereoquímica das moléculas é, portanto, fundamental
para entender seu comportamento, incluindo suas interações com outras moléculas e
seu papel nos organismos vivos (Figura 7).
12
Figura 7 – Encaixe complementar entre a macromolécula e uma molécula pequena
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.19)
A molécula de glicose se encaixa em uma cavidade na superfície da enzima
hexocinase (PDB ID 3B8A) e é mantida nesta orientação por várias interações não
covalentes entre a proteína e o açúcar. Esta representação da molécula de hexocinase
é produzida com o auxílio de um software que calcula a forma da superfície externa
de uma macromolécula, definida pelo raio de van der Waals de todos os átomos da
molécula ou pelo método do “volume de exclusão do solvente”, que é o volume onde
uma molécula de água não consegue penetrar.
13
Neste tópico, você aprendeu:
• Os fundamentos da química desempenham um papel crítico na compreensão dos
processos biológicos.
• O carbono, nitrogênio, hidrogênio, oxigênio são os elementos químicos essenciais
para vida.
• O carbono é o elemento-base de todas as moléculas orgânicas, incluindo as
macromoléculas.
• A estrutura tridimensional de uma molécula determina sua função e interações com
outras moléculas.
• Os modelos de representação são utilizados para demonstrar a organização
geométrica dos átomos, que são importantes para as ligações e reatividade
químicas.
• A configuração refere-se ao arranjo dos átomos em uma molécula, enquanto a
conformação se refere ao arranjo espacial dos átomos em uma molécula.
• O átomo de carbono assimétrico é chamado de átomo quiral ou centro quiral.
• O sistema D e L é uma convenção de nomenclatura usada em bioquímica para
descrever a estereoquímica de uma molécula.
• A estereoquímica das moléculas quirais é um fator importante no comportamento e
nas interações das moléculas nos organismos vivos e desempenha um papel crítico
em muitos processos biológicos.
• Muitas enzimas têm uma preferência específica por isômero, uma propriedade
conhecida como estereoespecificidade.
RESUMO DO TÓPICO 1
14
AUTOATIVIDADE
1 O carbono pode formar ligações covalentes simples, duplas e triplas, com outros
átomos de carbono e faz ligações com muitos outros elementos na tabela periódica
e, portanto, capaz de formar uma diversidade de compostos orgânicos. Sobre as
ligações do carbono, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:
( ) Um único átomo de carbono pode participar de duas ligações duplas
( ) Um único átomo de carbono pode participar de três ligações simples e uma ligação
dupla
( ) Um único átomo de carbono pode participar de quatro ligações simples
( ) Um único átomo de carbono pode participar de duas ligações simples e uma ligação
dupla.
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:
a) ( ) V – F – F – V.
b) ( ) V – F – V – F.
c) ( ) V - F – V – V.
2 As moléculas biológicas podem conter muitos tipos diferentes e combinações de
grupos funcionais. O grupo funcional é formado por uma série de compostos que
possui comportamento químico semelhante. Assinale a alternativa CORRETA que
caracteriza o grupo funcional fosfato, diferenciando-o de outros grupos funcionais.
a) ( ) Contém fósforo.
b) ( ) É hidrofílico.
c) ( ) Contém uma ligação dupla.
d) ( ) É ácido.
3 Enantiômeros são isômeros ópticos, ou seja, moléculas idênticas em sua estrutura
química, mas que possuem configurações espaciais diferentes e, portanto,
propriedades ópticas diferentes. Assinale a alternativa CORRETA que contém o termo
correto para uma mistura 50:50 de dois enantiômeros.
a) ( ) Mistura cis-trans.
b) ( ) Mistura de imagem espelhada.
c) ( ) Mistura quiral.
d) ( ) Mistura racêmica.
15
4 A estereoquímica é o estudo dos estereoisômeros que têm a mesma fórmula química
e a mesma sequência de átomos ligados, mas diferem nas orientações tridimensionais
de seus átomos no espaço. Descreva, resumidamente, os dois principais tipos de
isômeros ópticos?
5 Em 1848, um jovem químico de 25 anos, Louis Pasteur, surpreendeu a comunidade
científica ao apresentar o conceito de quiralidade molecular. Ele afirmou que as
moléculas - e não apenas objetos macroscópicos como cristais - podem exibir
quiralidade e podem ser separadas em estereoisômeros distintos. O que são moléculas
quirais? Dê um exemplo de uma molécula com carbono quiral.
16
17
ARQUITETURA CELULAR
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tema de Aprendizagem 3, abordaremos as propriedades dos
organismos vivos, que incluem alta complexidade e organização, um sistema de energia,
componentes interativos com diferentes funções, a capacidade de sentir e responder
ao ambiente, autorreplicação e evolução ao longo do tempo. As células podem obter
energia e carbono capturando energia luminosa do sol ou oxidando combustíveis
químicos para realizem seus processos metabólicos.
A membrana plasmática envolve todas as células e, dentro desse limite,
encontra-se o citosol, que contém vários componentes para o funcionamento das
células. Em células procariontes como bactérias e archaea, o material genético (DNA)
está contido em um nucleoide no citosol, enquanto em eucariontes, este está alojado
em um núcleo envolto por uma membrana.
A sequência precisa de nucleotídeos no DNA, apesar de seu grande tamanho,
garante a continuidade genética e é mantida com precisão por longos períodos. Essa
sequência precisa de DNA e é a base da continuidade genética dos organismos.
As mudanças evolutivas ocorrem por meio de mecanismos como mutação e
seleção natural, que alteram o material genético de um organismo e seus descendentes e
podem levar ao desenvolvimento de novas características e espécies ao longo do tempo.
UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
2 FUNDAMENTOS DE BIOLOGIA CELULAR
Uma célula é a menor unidade de vida e possui as estruturas necessárias para
manter a vida. As células são em sua maioria microscópicas, ou seja, não visíveis sem um
microscópio. Células animais e vegetais geralmente variam de 5 a 100 mm de diâmetro,
enquanto muitos microrganismos unicelulares medem de 1 a 2 mm de comprimento.
Todas as células possuem uma membrana plasmática que envolve e define a célula
e separa o ambiente interno (intracelular) do externo (extracelular). A membrana plasmática
é uma barreira hidrofóbica que permite a passagem de alguns íons inorgânicos e compostos
polares. A membrana é flexível e capaz de sofrer divisão celular sem perder sua integridade.
O citoplasma é uma solução aquosa contendo os componentes da célula,
incluindo organelas como mitocôndrias, ribossomos e o retículo endoplasmático. Esses
componentes podem ser separados em um processo de centrifugação.
18
As células eucarióticas (células com “núcleo verdadeiro” do grego eu, “verdade”,
e karyon, “núcleo”) têm um núcleo que abriga o DNA da célula. O núcleo é envolto por
uma membrana dupla, que protege o material genético em seu interior. Em contraste,
as células procarióticas (do grego pro, “antes”) não possuem membrana nuclear e, em
vez disso, têm seu material genético localizado no nucleoide do citoplasma, como as
bactérias e archae (Figura 8).
Figura 8 – As características universais das células vivas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.3)
Todas as células têm núcleo ou nucleoide, membrana plasmática e citoplasma. O
citosol é definido como a porção do citoplasma que permanece no sobrenadante
após rompimento suave da membrana plasmática e centrifugação do extrato
resultante a 150.000 g por 1 hora. As células eucarióticas têm uma variedade de
organelas contidas por membranas (mitocôndrias e cloroplastos) e partículas
maiores (ribossomos, p. ex.), que são sedimentadas por esta centrifugação e podem
ser recuperadas do precipitado.
Uma característica dos organismos vivos e das células é sua capacidade de se
reproduzir ao longo de numerosasgerações (Figura 9). Isso é evidente na observação de
que muitas bactérias, apesar da passagem de milhares de anos, têm o mesmo tamanho,
forma e estrutura interna de suas formas ancestrais.
19
Figura 9 – Duas inscrições antigas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.30, Figura 1-30)
Figura 10 – Do DNA ao RNA, do RNA à proteína e da proteína à enzima (hexocinase)
(a) O Prisma de Sennacherib, inscrito em torno de 700 a.C., descreve em caracteres
da linguagem assíria alguns eventos históricos durante o reinado do Rei Sennacherib.
O prisma contém cerca de 20.000 caracteres, pesa cerca de 50 kg e sobreviveu de
forma quase intacta por 2.700 anos. (b) Uma única molécula de DNA da bactéria E.
coli, extravasando de uma célula rompida, é centenas de vezes mais longa que a
própria célula e contém codificada toda a informação necessária para especificar a
estrutura e a função da célula. O DNA bacteriano contém cerca de 4,6 milhões de
caracteres (nucleotídeos), pesa menos do que 10–10 g e sofreu somente algumas
pequenas alterações durante os últimos milhões de anos (as manchas amarelas e os
pontos escuros nesta micrografia eletrônica colorida são artefatos da preparação).
A perpetuação de uma espécie biológica requer que sua conformação genética
seja mantida de modo estável, expressa com exatidão na forma de produtos dos genes
e reproduzida com o mínimo de erros (Figura 10).
20
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.31)
A sequência linear de desoxirribonucleotídeos no DNA (o gene), que codifica a proteína
hexocinase, é primeiro transcrita em uma molécula de ácido ribonucleico (RNA)
com uma sequência complementar de ribonucleotídeos. A sequência do RNA (RNA
mensageiro) é então traduzida na cadeia linear da proteína hexocinase, que então se
dobra na sua forma nativa tridimensional com o auxílio das chaperonas moleculares.
Uma vez em sua forma nativa, a hexocinase adquire sua atividade catalítica: ela catalisa
a fosforilação da glicose, usando ATP como doador do grupo fosforila.
A estrutura do DNA permite sua replicação e seu reparo com fidelidade. A
estrutura de dupla hélice do DNA permite replicação e reparo, enquanto sequências
lineares de DNA codificam proteínas com estruturas tridimensionais únicas. Quaisquer
erros na replicação ou reparo do DNA podem resultar em mutações, algumas das
quais podem ser prejudiciais ou letais, destacando a importância de mecanismos que
garantam a precisão da replicação e reparo do DNA.
Todos os organismos modernos derivam de um ancestral evolutivo comum
por meio de uma série de pequenas mutações ao longo do tempo. Essas mutações
conferem vantagens seletivas a alguns organismos, permitindo que eles se adaptem
melhor ao ambiente e aumentem suas chances de sobrevivência. Esse processo de
seleção natural ao longo do tempo leva à formação de novas espécies e à evolução das
espécies existentes (Figura 11).
21
Figura 11 – Duplicação e mutação de genes: um caminho para gerar novas atividades enzimáticas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.32)
Neste exemplo, o único gene da hexocinase em um organismo hipotético pode acabar
acidentalmente copiado duas vezes durante a replicação do DNA, de modo que o
organismo tenha duas cópias inteiras do gene, uma delas desnecessária. Ao longo de
gerações, à medida que o DNA com dois genes para a hexocinase é repetidamente
replicado, alguns erros raros podem ocorrer, levando a mudanças na sequência de
nucleotídeos do gene excedente e, portanto, da proteína que ele codifica. Em alguns
casos muito raros, a proteína produzida a partir desse gene mutado é alterada de tal
forma que ela se liga a um novo substrato – galactose neste caso hipotético. A célula
contendo o gene mutante adquire uma nova capacidade (metabolizar a galactose),
permitindo-lhe que sobreviva em um nicho ecológico que dispõe de galactose, mas
não de glicose. Se a mutação ocorrer sem a duplicação do gene, então a função original
do produto do gene é perdida.
A determinação da sequência do genoma se refere ao processo de obtenção
do conjunto completo de informações genéticas contidas em um organismo. Essa
informação é armazenada na molécula de DNA e é codificada na forma de um código
genético. Com avanços em tecnologia e técnicas, a sequência do genoma de centenas de
bactérias, mais de 40 archaea e um número crescente de microrganismos eucarióticos,
22
foi determinada (Figura 12). Essas informações nos ajudam a entender a composição
genética desses organismos e fornecem informações sobre sua evolução, biologia e
comportamento.
Figura 12 – Alguns dos muitos organismos cujos genomas foram completamente sequenciados
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.38, Tabela 1-2)
Organismo
Tamanho do genoma
(pares de nucleotídeos)
Interesse biológico
Mycoplasma genitalium 5,8 x 105 O menor organismo
Helicobacter pylori 1,6 x 106 Causa úlcera gástrica
Methanocaldococcus
jannaschii
1,7 x 106 Arqueia; cresce a 85°C
Haemophilus influenzae 1,9 x 106 Causa gripe bacteriana
Synechocystis sp. 3,9 x 106 Cianobactéria
Bacillus subtilis 4,2 x 106 Bactéria comum do solo
Escherichia coli 4,6 x 106
Algumas linhagens são
patógenos humanos
Saccharomyces cerevisiae 1,2 x 107 Eucarioto unicelular
Caenorhabditis elegans 1,0 x 108 Verme redondo multicelular
Arabidopsis thaliana 1,2 x 108 Planta modelo
Drosophila melanogaster 1,8 x 108
Mosca de laboratório
("mosca-da-fruta")
Mus musculus 2,7 x 109 Camundongo de laboratório
Homo sapiens 3,0 x 109 Humano
Uma maneira de estudar as relações evolutivas entre organismos é comparando
suas sequências e proteínas homólogas. As sequências homólogas são semelhantes em
termos de estrutura, função e origem e são consideradas evidências de um ancestral
evolutivo comum. As proteínas homólogas, por outro lado, são semelhantes em termos de
estrutura e função, mesmo que desempenhem tarefas diferentes em organismos diferentes.
Dois genes homólogos dentro da mesma espécie são chamados de parálogos,
enquanto dois genes homólogos em espécies diferentes são chamados de ortólogos. A
mesma terminologia se aplica às proteínas, com parálogos sendo proteínas semelhantes
dentro da mesma espécie e ortólogos sendo proteínas semelhantes em espécies diferentes.
Esses termos permitem aos cientistas determinar as relações evolutivas entre
as espécies e estudar a evolução de genes e proteínas específicos ao longo do tempo.
As diferenças nas sequências de genes homólogos podem indicar a distância evolutiva
entre duas espécies, com mais diferenças implicando uma maior divergência na evolução
23
Figura 13 – Filogenia dos três grupos da vida.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.4)
e um maior tempo decorrido desde o ancestral comum das espécies. Filogenias, ou
árvores genealógicas evolutivas, podem ser criadas para mostrar a relação evolutiva
entre as espécies, com maior proximidade na árvore, representando uma relação
evolutiva mais próxima (Figura 13).
As relações filogenéticas são frequentemente representadas por uma “árvore
genealógica” deste tipo. A base para esta árvore é a semelhança na sequência
nucleotídicas dos RNA dos ribossomos de cada grupo; a distância entre os ramos
representa o grau de diferença entre duas sequências; quanto mais similar for a
sequência, mais próxima é a localização dos ramos. As árvores filogenéticas também
podem ser construídas a partir de semelhanças na sequência de aminoácidos de uma
única proteína entre as espécies.
As células requerem energia e carbono para realizar processos metabólicos
e produzir seu material celular. Existem duas maneiras principais pelas quais as
células obtêm energia e carbono e essas podem ser classificados como fototróficas e
quimiotróficas.
As células fototróficas captam energia da luz solar para produzir energia e sin-
tetizar compostos orgânicos por meio da fotossíntese. Esse tipo de nutrição é chamado
de fototrofia, da palavra grega trofia, que significa nutrição, e foto, que significa luz. As
células fototróficas são encontradas em organismos fotossintéticos,como plantas, al-
gas e algumas bactérias. Durante a fotossíntese, essas células convertem energia lumi-
nosa em energia química armazenada em compostos orgânicos, como a glicose.
24
As células quimiotróficas, por outro lado, obtêm energia pela oxidação de
combustíveis químicos, como compostos orgânicos ou inorgânicos. As células
quimiotróficas são encontradas em organismos como fungos, bactérias e animais. Eles
usam reações químicas para extrair energia de moléculas do ambiente e armazená-la
na forma de ATP (trifosfato de adenosina), que é usado como fonte de energia para
realizar processos celulares.
Os fototróficos e os quimiotróficos podem ser ainda subdivididos em outras
duas categorias. Os autotróficos, que podem produzir todas as suas biomoléculas a
partir do CO2 e heterotróficos, que precisam de nutrientes orgânicos produzidos por
outros organismos. A maneira de um organismo obter nutrientes pode ser descrita pela
combinação desses termos. As cianobactérias são um exemplo de fotoautotróficas,
enquanto os humanos são quimio-heterotróficos (Figura 14).
Figura 14 – Todos os organismos podem ser classificados de acordo com a fonte de energia (luz solar ou
compostos químicos oxidáveis) e pela fonte de carbono usada para a síntese do material celular
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.5, Figura 1-5)
25
2.1 AS CÉLULAS PROCARIONTES
Os procariotos ou procariontes são organismos simples que não possuem
núcleo e outras organelas ligadas à membrana. Existem dois tipos principais de células
procarióticas: archaea e bactérias.
Archaea são um tipo menos conhecido de procariotos e são frequentemente
encontrados em ambientes extremos, como lagos com alto teor de sal, fontes termais
e fontes oceânicas profundas. Eles são considerados um ramo distinto da vida e são
geneticamente e fisiologicamente distintos das bactérias. Algumas archaea estão
envolvidas na produção de metano, enquanto outras estão envolvidas na degradação
de matéria orgânica.
As bactérias são o tipo mais conhecido de procariontes e podem ser
encontradas em uma ampla variedade de ambientes, incluindo solo, água e no corpo
humano, desempenhando um papel importante em muitos processos ecológicos e
estão envolvidos nas infecções e doenças humanas.
A bactéria mais amplamente estudada é a Escherichia coli (E. coli), comumente
encontrada no trato intestinal humano (Figura 15).
As principais estruturas das células procarióticas são os ribossomos, uma
membrana celular externa e interna que constituem o envelope celular, um nucleóide
no citoplasma que contém a molécula de DNA, pontos de adesão ou pili e flagelos que
participam no movimento bacteriano.
Os ribossomos são o maquinário de síntese de proteínas da célula, e o envelope
celular atua como uma barreira protetora e ajuda a manter a forma da célula. O nucleóide
abriga o DNA da célula, que é organizado em longas estruturas circulares conhecidas
como plasmídeos.
Na natureza, os plasmídeos podem carregar genes que conferem resistência a
antibióticos e assim algumas bactérias podem desenvolver resistência a antibióticos.
Essa é uma das razões pelas quais as infecções bacterianas podem ser difíceis de
tratar com antibióticos. As bactérias podem transferir plasmídeos para outras bactérias,
aumentando a disseminação da resistência a antibióticos.
As bactérias podem ser classificadas em gram-positivas e gram-negativas. A
classificação é baseada nos resultados de uma técnica de coloração chamada coloração
de Gram, desenvolvida pelo bacteriologista dinamarquês Hans Christian Gram, em
1884. A coloração de Gram diferencia as bactérias com base na composição da parede
celular e ainda é amplamente utilizado hoje para a classificação rápida de bactérias no
laboratório clínico.
26
As bactérias Gram-positivas têm uma parede celular espessa de peptidoglica-
no, juntamente com o ácido teicóico, que retém a coloração cristal violeta usada no pro-
cedimento de coloração de Gram. Essas bactérias aparecem roxas ou azuis ao micros-
cópio após a coloração. Algumas bactérias gram-positivas bem conhecidas incluem
Staphylococcus, Streptococcus e Bacillus.
As bactérias gram-negativas, por outro lado, têm uma camada mais fina de pepti-
doglicano e carecem de ácido teicóico. Como resultado, elas não retêm a coloração cristal
violeta e, em vez disso, absorvem a contracoloração (safranina), aparecendo rosa ou ver-
melha ao microscópio. Além da camada mais fina de peptidoglicano, as bactérias gram-
-negativas possuem uma membrana externa composta por lipopolissacarídeos (LPS) e
proteínas que atuam como uma barreira adicional. Os LPS, também conhecidos como
endotoxinas, podem ter efeitos tóxicos em outros organismos e causar uma série de rea-
ções no sistema imunológico quando entram na corrente sanguínea. Algumas bactérias
gram-negativas bem conhecidas incluem Escherichia coli, Salmonella e Pseudomonas.
Figura 15 – Características estruturais comuns das células de bactérias e arqueias
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.6)
27
(a) Este desenho em escala da E. coli serve para ilustrar algumas características
comuns. (b) O envelope celular das bactérias gram-positivas é uma simples membrana
com uma camada grossa e rígida de peptidoglicanos em sua superfície externa. Uma
variedade de polissacarídeos e outros polímeros complexos estão entrelaçados com
os peptidoglicanos e, recobrindo o todo, ainda existe uma “camada sólida” e porosa de
glicoproteínas. (c)E. coli é gram-negativa e tem uma dupla membrana. Sua membrana
externa tem um lipopolissacarídeo (LPS) na superfície externa e fosfolipídeos na
superfície interna. Esta membrana externa está impregnada de canais proteicas
(porinas) que permitem a difusão de pequenas moléculas através delas, mas não de
outras proteínas. A membrana interna, feita de fosfolipídeos e proteínas, é impermeável
a ambos, às moléculas pequenas e grandes. Entre a membrana interna e externa, no
periplasma, existe uma camada delgada de peptidoglicanos, que confere à célula
forma e rigidez, mas que não retém o corante de Gram. (d). As membranas arqueanas
variam em estrutura e composição, mas todas têm membrana única cercada por
uma camada externa que inclui uma estrutura tipo peptidoglicano, uma concha de
proteínas porosas (camada sólida) ou ambas.
2.2 AS CÉLULAS EUCARIONTES
Os eucariotos ou eucariontes são um tipo de organismo que possui células
eucarióticas. Essas células são caracterizadas pela presença de um núcleo envolto em
uma membrana, e uma variedade de outras organelas. Os eucariotos incluem uma ampla
gama de organismos, desde protozoários unicelulares até organismos multicelulares
complexos, como animais e plantas. Alguns exemplos comuns de eucariotos incluem
fungos, algas, animais e os humanos (Figura 16).
As células eucarióticas são distintas das células procarióticas, como as bactérias,
que não possuem núcleo ou organelas.
As células eucarióticas animais são estruturas complexas que contêm várias
organelas importantes, cada uma das quais desempenha um papel específico na função
celular.
A mitocôndria é o principal local da respiração celular, onde a energia é produzida
por meio da oxidação da glicose e de outros nutrientes. Essa energia é armazenada na
forma de ATP, que é utilizado pela célula para realizar diversas funções.
O retículo endoplasmático (RE) e o aparelho de Golgi são importantes para
a síntese e processamento de proteínas e lipídios. O RE atua como um local para
dobramento e modificação de proteínas, enquanto o aparelho de Golgi é responsável por
classificar e modificar as proteínas antes que sejam secretadas da célula ou enviadas
ao seu destino final.
28
Os peroxissomos são organelas especializadas que desempenham um papel
fundamental no metabolismo lipídico. Eles contêm enzimas que oxidam ácidos graxos
de cadeia muito longa, que são usados como fonte de energia pela célula.
Os lisossomos são semelhantes aos peroxissomos, mas contêm enzimas
digestivas que degradam resíduos celularese outros compostos, pelo mecanismo
chamado de autofagia.
As células eucarióticas possuem um citoesqueleto composto por filamentos
de proteínas que formam estruturas alongadas que fornecem estrutura, estabilidade e
atuam como trilhos para o movimento das organelas celulares.
As células vegetais também contêm várias estruturas únicas que não são
encontradas nas células animais. Por exemplo, elas têm grandes vacúolos centrais,
que servem como compartimento de armazenamento para ácidos orgânicos e outros
resíduos. Além disso, as células vegetais contêm cloroplastos, que são responsáveis por
converter a luz solar em energia através da fotossíntese. A parede celular das plantas
também é diferente da das células animais, sendo mais espessa e rígida e capaz de à
pressão osmótica.
29
Figura 16 – Estrutura da célula eucariótica
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.6)
Ilustrações esquemáticas dos dois principais tipos de célula eucariótica: (a)
representação da célula animal e (b) representação da célula vegetal. As células
vegetais geralmente têm diâmetro de 10 a 100 mm – maiores do que as células animais,
que variam entre 5 e 30 mm. As estruturas marcadas em vermelho são exclusivas
das células animais; as marcadas em verde são exclusivas das células vegetais. Os
30
microrganismos eucarióticos (como protistas e fungos) têm estruturas semelhantes
às das células animais e vegetais, mas muitos também têm organelas especializadas,
não ilustradas aqui.
No laboratório, o fracionamento subcelular é uma técnica usada para isolar
e estudar as várias organelas dentro de uma célula eucariótica. O processo de
fracionamento subcelular permite aos cientistas isolar organelas individuais e estudá-las
isoladamente. Ao analisar a composição e a função de cada organela, os pesquisadores
podem obter uma compreensão mais profunda dos processos celulares e do papel que
cada organela desempenha nesses processos.
No processo de fracionamento subcelular, as células são homogeneizadas para
liberar as organelas. O homogeneizado é então misturado com um meio de sacarose, que
tem uma pressão osmótica semelhante à das organelas. Isso é importante porque evita
que as organelas inchem ou explodam, o que, de outra forma, alteraria sua estrutura
e função. Uma vez que o homogeneizado foi misturado com o meio de sacarose, é
centrifugado. Durante esse processo, as organelas maiores se depositam no fundo do
tubo devido à sua maior massa, enquanto o material menor e mais solúvel permanece
no sobrenadante.
31
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• Todas as células são circundadas por uma membrana plasmática que separa o meio
extracelular do meio intracelular.
• As células mais simples são procariotas.
• As bactérias gram-positivas têm uma parede celular espessa de peptidoglicano e
aparecem roxas ao microscópio.
• As bactérias gram-negativas têm uma camada mais fina de peptidoglicano e
uma membrana externa composta de lipopolissacarídeos e aparecem em rosa ao
microscópio.
• Os eucariotos são mais complexos, caracterizados por múltiplas organelas envoltas
por uma membrana dupla, incluindo um núcleo.
• A árvore filogenética da vida inclui três domínios: Bactéria, Archaea e Eukarya.
• As principais formas pelas quais as células obtêm energia e carbono são por meio
de fototróficos e quimiotróficos, que podem ser classificados com base na forma
como obtêm sua energia.
32
AUTOATIVIDADE
1 Embora os elefantes sejam animais e as árvores sejam plantas, ambos são seres vivos
e, portanto, têm células que desempenham funções semelhantes. Ao compreender as
semelhanças e diferenças na estrutura celular básica de animais e plantas, podemos
aprender muito sobre como a vida na Terra evoluiu e como diferentes espécies
se adaptaram as suas condições ambientais únicas. Sendo assim, em termos de
estrutura celular básica, acerca do que um elefante e uma arvore têm em comum,
analise as sentenças a seguir:
I- Ambos são eucariotos.
II- Ambos têm um núcleo celular.
III- Ambos possuem mitocôndrias.
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Somente a sentença I está correta.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças, I, II e III estão corretas.
2 Uma maneira de classificar os organismos é pelo modo que as células obtêm energia e
carbono. Alguns organismos podem sintetizar todos os seus componentes orgânicos
a partir de compostos inorgânicos, como o dióxido de carbono (CO2) usando a energia
do sol, enquanto outros requerem compostos orgânicos de seu ambiente. Assinale a
alternativa CORRETA que descreve um organismo que pode sintetizar todos os seus
componentes orgânicos necessários a partir do CO2 usando a energia do sol.
a) ( ) Fotoautotrófico.
b) ( ) Foto-heterotrófico.
c) ( ) Quimioautotrófico.
d) ( ) Quimio-heterotrófico.
3 As células são a unidade básica da vida e existem em dois tipos principais:
procarióticas e eucarióticas. As células procarióticas são menores e mais simples do
que as células eucarióticas, faltando muitas das organelas que estão presentes nas
células eucarióticas. A respeito das organelas celulares estarem ausentes nas células
procarióticas, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Núcleo.
b) ( ) Lisossomo.
c) ( ) Retículo Endoplasmático.
d) ( ) Todos os anteriores.
33
4 As células eucarióticas são estruturas complexas que compõem os organismos que
vemos ao nosso redor, incluindo plantas, animais e fungos. Eles são maiores e mais
intrincados do que as células procarióticas e possuem muitas organelas ligadas à
membrana que desempenham funções específicas dentro da célula. O estudo da
biologia celular eucariótica é vital para nossa compreensão da vida e dos intrincados
processos que ocorrem dentro das células. Cada organela tem uma estrutura e função
distintas, e entender essas organelas é essencial para entender o funcionamento
geral da célula. Descreva cinco organelas da célula eucariótica e sua função.
5 As bactérias são um grande grupo de organismos unicelulares e microscópicos,
classificados como células procarióticas, pois não possuem um núcleo verdadeiro.
Esses organismos possuem uma estrutura simples, incluindo parede celular, cápsula,
DNA, pili, flagelo, citoplasma e ribossomos. As bactérias podem ser gram-positivas ou
gram-negativas, dependendo dos métodos de coloração. Essa técnica foi proposta por
Christian Gram para distinguir os dois tipos de bactérias com base na diferença em suas
estruturas de parede celular. Descreva as principais diferenças entre as bactérias Gram-
positivas e Gram-negativas.
34
35
TÓPICO 3 -
A ÁGUA
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tema de Aprendizagem 3, abordaremos as propriedades que
tornam a água essencial para a vida e seu papel nos processos biológicos. A água
compreende 70% do peso da maioria dos organismos e possui propriedades únicas,
como a capacidade de dissolver uma ampla gama de moléculas devido à sua polaridade,
atuando como solvente para muitos compostos polares e iônicos. Sua alta capacidade
térmica também permite que funcione como um tampão térmico, ajudando a regular a
temperatura nos organismos vivos.
As moléculas de água são altamente coesas devido às pontes de hidrogénio, o
que, por sua vez, leva a alta tensão superficial, alta viscosidade e pontos de ebulição e
fusão mais altos do que os de outros solventes comuns (Figura 17).
UNIDADE 1
Figura 17 – Ponto de fusão, ponto de ebulição e calor de vaporização de alguns solventes comuns
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 48)
Ponto de
fusão (°C)
Ponto de
ebulição (°C)
Calor de
vaporização (J/g)*
Água 0 100 2.260
Metanol (CH3OH) -98 65 1.100
Etanol (CH3CH2OH) -117 78 854
Propanol (CH3CH2CH2OC) -127 97 687
Butanol (CH3(CH2)2CH2OC) -90 117 590
Acetona (CH3COCH3) -95 56 523
Hexano (CH3(CH2)4CH3) -98 69 423
Benzeno (C6H6) 6 80 394
Butano (CH3(CH2)2CH3) -135 -0,5 381
Clorofórmio (CHCL2) -63 61 247
*A energia na forma de calor necessária para levar 1,0 g de um líquido no seu ponto
deebulição e na pressão atmosférica até seu estado gasoso na mesma temperatura.
Essa é uma medida direta da energia necessária para superar as forças de atração
entre as moléculas na fase líquida.
36
A osmometria é usada para medir a pressão osmótica de uma solução, sendo
importante para entender o movimento da água através das membranas celulares.
O pH de uma solução é uma medida de sua acidez, ou basicidade, e é importante
em muitos sistemas biológicos. Por exemplo, enzimas e outras proteínas funcionam de
forma otimizada dentro de uma faixa específica de pH, e mudanças no pH podem afetar
a estabilidade e a atividade dessas moléculas. Tampões são soluções que podem resistir
a mudanças no pH quando pequenas quantidades de ácido ou base são adicionadas
a eles. Eles desempenham um papel importante na manutenção do pH de fluidos
biológicos, como o sangue.
Na bioquímica, a água também desempenha um papel importante em muitas
reações químicas, como as reações de condensação e hidrólise.
2 ESTRUTURA DA MOLÉCULA DE ÁGUA
A molécula de água (H2O) consiste em dois átomos de hidrogênio e um átomo
de oxigênio ligados por ligações covalentes. A fórmula estrutural da água é H-O-H,
sendo que os elétrons nas ligações covalentes entre os átomos de oxigênio e hidrogênio
não são distribuídos igualmente (chamadas dipolos) e os elétrons ficam mais próximo
do oxigênio. Essa distribuição desigual da densidade de elétrons faz da água uma
molécula polar. Isso resulta em uma atração entre o oxigênio parcialmente negativo de
uma molécula e o hidrogênio parcialmente positivo de outra, que forma as ligações de
hidrogênio ou pontes de hidrogênio (Figura 18).
As pontes de hidrogênio são mais fracas do que as ligações covalentes, devido
à natureza eletrostática da interação. A energia de ligação (a energia necessária para
romper a ligação) de uma ponte de hidrogênio na água líquida é tipicamente em torno
de 4,7 kcal/mol, enquanto a energia de ligação de uma ligação covalente entre átomos
de oxigênio e hidrogênio (O-H) é de cerca de 110 kcal/mol. As pontes de hidrogênio
não são exclusivas entre as moléculas de água, pois outras moléculas como álcoois,
aldeídos e cetonas também formam pontes de hidrogênio com moléculas de água ou
com outros compostos.
37
Figura 18 – Estrutura da molécula de água.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 48)
(a) (painel à esquerda) A natureza dipolar da molécula de água é mostrada em modelo
de esfera e bastão; as linhas tracejadas representam os orbitais não ligantes. Existe
um arranjo aproximadamente tetraédrico dos pares de elétrons mais externos da
camada ao redor do átomo de oxigênio; os dois átomos de hidrogênio têm cargas
parciais positivas localizadas (d1) e o átomo de oxigênio tem carga parcial negativa
(d–). (b) Duas moléculas de H2O unidas por ligação de hidrogênio (representada aqui e
ao longo deste livro por três linhas azuis) entre o átomo de oxigênio da molécula mais
acima e um átomo de hidrogênio da molécula mais abaixo. As ligações de hidrogênio
são mais longas e mais fracas que as ligações covalentes O-H (painel à direita) Algumas
ligações de hidrogênio de importância biológica.
2.1 PROPRIEDADES DA ÁGUA
A água é um solvente polar porque suas moléculas têm um leve desequilíbrio
de carga elétrica, o que significa que uma extremidade da molécula, a extremidade do
oxigênio, tem uma leve carga negativa (é mais eletronegativo) e a outra extremidade, do
hidrogênio, tem uma leve carga positiva. Essa distribuição de carga polar permite que a
molécula de água interaja com outras moléculas polares ou carregadas, como íons ou
compostos polares.
38
Essa propriedade permite que a água dissolva uma ampla gama de moléculas
conhecidas como compostos hidrofílicos, derivada da palavra grega fílico, que significa
amar, e hidro que significa água. Por exemplo, a solubilização do NaCl (cloreto de
sódio, ou sal de cozinha) em água ocorre através do processo de dissociação, em que
a molécula de NaCl se decompõe em seus íons individuais, Na+ e Cl-. Os átomos de
oxigênio nas moléculas de água que têm uma carga parcial negativa, atraem os íons
de sódio carregados positivamente. Da mesma forma, os átomos de hidrogênio nas
moléculas de água que têm uma carga parcial positiva atraem os íons cloreto carregados
negativamente. Isso é conhecido como atração eletrostática entre íons e moléculas
polares, e é a principal força que mantém os íons em solução e os mantém dissolvidos
na água (Figura 19).
Figura 19 – A água como solvente
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 51)
Além disso, quando os íons são dissolvidos em água, eles são cercados por uma
camada de hidratação de moléculas de água. Essa camada de hidratação (ou solvatação)
se forma devido à natureza polar das moléculas de água, que são atraídas pelos íons
e ajudam a estabilizar ainda mais os íons em solução, afetando as propriedades da
solução, como sua viscosidade e condutividade.
Em contraste, os compostos hidrofóbicos, que têm aversão à água, dissolvem-
se em solventes apolares, como clorofórmio e benzeno. Esse efeito hidrofóbico é
particularmente importante na formação das membranas celulares.
Os compostos anfipáticos possuem regiões polares e apolares (Figura 20).
39
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 50)
Figura 21 – Compostos anfipáticos em solução aquosa
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 52)
Figura 20 – Alguns exemplos de biomoléculas polares, apolares e anfipáticas
(mostradas nas suas formas ionizadas em pH 7)
Os compostos anfipáticos em solução aquosa tendem a se organizar em
estruturas chamadas micelas, nas quais as partes hidrofóbicas (apolares) da molécula
se escondem no interior, interagindo umas com as outras, enquanto as regiões polares
da molécula interagem com a água ao redor. Isso minimiza a quantidade de área de
superfície hidrofóbica exposta à água, pois as partes hidrofóbicas estão protegidas
dentro da micela (Figura 21). Esse comportamento é observado em muitas moléculas
biológicas, como os lipídios, que formam a estrutura de bicamada na membrana celular.
Moléculas de água altamente ordenadas formam “gaiolas”
ao redor das cadeias de grupos alquila hidrofóbicas
Grupo alquila
hidrofóbico
Grupo “polar”
hidrofílico
“Agrupamentos oscilantes” de
moléculas de H O na fase aquosa2
O
H
H
O O
C
CH H
Moléculas de água altamente ordenadas formam “gaiolas”
ao redor das cadeias de grupos alquila hidrofóbicas
Grupo alquila
hidrofóbico
Grupo “polar”
hidrofílico
“Agrupamentos oscilantes” de
moléculas de H O na fase aquosa2
O
H
H
O O
C
CH H
Moléculas de água altamente ordenadas formam “gaiolas”
ao redor das cadeias de grupos alquila hidrofóbicas
Grupo alquila
hidrofóbico
Grupo “polar”
hidrofílico
“Agrupamentos oscilantes” de
moléculas de H O na fase aquosa2
O
H
H
O O
C
CH H
40
(a) Ácidos graxos de cadeia longa têm cadeias de grupos alquila muito hidrofóbicas,
cada qual envolta por uma camada de moléculas de água altamente ordenadas (b)
Pela aglomeração conjunta em micelas, as moléculas de ácidos graxos expõem a
menor área superficial possível na água, e menos moléculas de água serão necessárias
na camada de água ordenada. A energia ganha pela liberação das moléculas de água
até então imobilizadas estabiliza a micela.
O alto valor do calor específico da água (a energia térmica necessária para
aumentar a temperatura de 1 g de água em 1ºC) é uma outra propriedade que permite
que ela atue como um "tampão térmico", de modo que ela pode absorver e liberar
energia térmica lentamente, mantendo a temperatura de um organismo relativamente
constante à medida que a temperatura do ambiente flutua e o calor é gerado como
subproduto do metabolismo. Isso é benéfico para organismos que vivem em ambientes
com temperaturas flutuantes.
Alguns vertebrados exploram o alto calor da vaporização da água usando o
suor para dissipar o excesso de calor corporal. O suor e principalmente água, quando
evapora, remove o calor do corpo, resfriando-o.
As plantas usam apropriedade de coesão interna da água, devido às pontes de
hidrogênio, para transportar nutrientes através do processo de transpiração.
O gelo possui menor densidade que a da água líquida e isso tem implicações
biológicas para os organismos aquáticos. Muitos organismos aquáticos podem
sobreviver em temperaturas congelantes produzindo moléculas que diminuem o
ponto de congelamento (anticongelantes) do sangue, permitindo que sobrevivam em
ambientes abaixo de zero.
2.2 INTERAÇÕES FRACAS EM SISTEMAS AQUOSOS
As ligações de hidrogênio, assim como as interações de van der Waals,
interações eletrostáticas (ligação iônica) e interações hidrofóbicas, são consideradas
ligações fracas em comparação com as ligações covalentes, porém elas desempenham
um papel crucial na determinação da forma e estrutura de macromoléculas, como
proteínas e ácidos nucléicos (Figura 22). A conformação mais estável para essas
moléculas é alcançada quando um grande número de todas essas interações fracas
dentro da molécula e entre a molécula e seu solvente circundante é maximizado. Além
disso, as regiões hidrofóbicas da molécula tendem a se agregar através de interações
hidrofóbicas para evitar o contato com o solvente aquoso.
41
Figura 22 – Os quatro tipos de interações não covalentes (“fracas”) entre biomoléculas em solvente aquoso
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 52)
3 OSMOMETRIA
A osmose é o processo pelo qual a água se move através de uma membrana
semipermeável de uma região de maior concentração de água para uma região de
menor concentração de água. Esse movimento (difusão) é impulsionado pela diferença
na pressão osmótica entre as duas regiões. A osmolaridade, ou a concentração de
partículas dissolvidas, é uma medida da pressão osmótica e é usada para descrever a
concentração relativa de uma solução (Figura 23).
• Em uma solução isotônica, a pressão osmótica é a mesma em ambos os lados da
membrana, portanto não há movimento líquido de água. A osmolaridade do solvente
é igual ao citosol.
• Em uma solução hipertônica, a pressão osmótica é maior fora da célula, fazendo
com que a água se mova para fora da célula e encolha. A osmolaridade do solvente
é maior que o citosol.
• Em uma solução hipotônica, a pressão osmótica é maior dentro da célula, fazendo
com que a água se mova para dentro da célula, podendo causar seu inchaço ou
até mesmo ruptura devido à osmólise. A osmolaridade do solvente é menor que o
citosol.
42
Figura 23 – Efeito da osmolaridade extracelular no movimento da água através de uma membrana
plasmática.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 56)
Quando uma célula em balanço osmótico com o meio circundante – isto é, uma célula
em (a) um meio isotônico – é transferida para (b) uma solução hipertônica ou (c) uma
solução hipotônica, a água tende a se mover através da membrana na direção que
deve igualar a osmolaridade nos lados externo e interno da célula.
As bactérias e as plantas possuem uma parede celular rígida e com capacidade
de resistir à pressão osmótica. Já as células animais possuem bombas que ajudam a
permanecer em equilíbrio com o meio ambiente.
O efeito do soluto depende das partículas dissolvidas e não da massa. As
macromoléculas como as proteínas, ácidos nucleicos e polissacarídeos tem pouco
efeito na osmolaridade de uma solução. Desta forma, uma solução de glicose tem uma
osmolaridade maior do que uma solução de água porque as moléculas de glicose são
dissolvidas em água e, portanto, contribuem para a pressão osmótica. Da mesma forma,
uma solução de sal (cloreto de sódio) tem uma osmolaridade maior do que uma solução
de água porque os íons de sal são dissolvidos em água e contribuem para a pressão
osmótica. Por outro lado, uma solução contendo proteínas ou ácido nucleico, embora
contenha muitas partículas, não terá um efeito significativo na osmolaridade da solução.
43
4 pH E SISTEMAS TAMPÃO BIOLÓGICOS
A posição na qual uma reação química está em equilíbrio é determinada por
sua constante de equilíbrio, Keq (algumas vezes expressa simplesmente por K). Para
a reação geral de conversão dos regentes A + B nos produtos C + D, a constante de
equilíbrio pode ser calculada pela razão da concentração de produtos para os reagentes
no equilíbrio: Keq = [C]eq[D]eq/[A]eq[ B]eq.
As moléculas de água têm uma pequena capacidade de sofrer ionização
reversível, o que cria um íon de hidrogênio (H+ ou próton) e um íon hidróxido (OH-),
resultando na reação:
H2O↔H
+ + OH-
A constante de equilíbrio para esta ionização reversível da água é: Keq = [H+]
[OH-]/[H2O], aplicando o valor da concentração da água pura de 55.5 M a 25°C (1000 g/l
dividido por 18 g/mol) e o Ka da água é 1.8 x 10-16 M, o resultado do valor do produto de
[H+] [OH–] em solução aquosa a 25°C é sempre igual a 1x10-14 M2 . Como o número total
de íons hidrogênio em um dado volume de água pura é exatamente igual ao número de
íons hidróxido, cada um tem uma concentração de 1x10–7 M.
O pH é determinado pelo logaritmo negativo da concentração do íon hidrogênio,
representado por pH = –log[H+], e é expresso em molaridade (M). Molaridade é o número
de moles de soluto por litro de solução. A escala de pH varia de 0 a 14, sendo 7 neutros,
sendo que pH + pOH = 14.
Em água pura, a concentração de íons H+ e íons hidróxido (OH-) é igual a 1x10–7
M a 25°C ou seja [H+] = [OH-] = 1x10–7 M. Quando as concentrações de H+ e OH- são
iguais, o pH é neutro e seu valor é 7, que é calculado por pH = -log (1x10–7) = 7.
Soluções com pH inferior a 7 são consideradas ácidas porque contêm uma
concentração maior de íons H+ do que de íons OH-. Ou seja, [H+] > [OH-] e pH < 7. Por
exemplo, uma solução com pH 4 tem uma concentração de H+ de 10-4 M, que é maior
que 10–7 M.
Por outro lado, soluções com pH maior que 7 são consideradas alcalinas ou
básicas, porque contêm uma concentração maior de íons OH- do que de íons H+. Ou
seja, [H+] < [OH-] e pH > 7. Por exemplo, uma solução com pH 10 tem uma concentração
de H+ de 10-10 M, que é inferior a 10–7 M.
O pH aquoso pode ser medido por indicadores coloridos como tornassol,
fenolftaleína ou vermelho de fenol (Figura 24). Exemplos de ácidos fortes são o ácido
clorídrico (HCL), ácido sulfúrico e nítrico. São completamente ionizados em solução
aquosa por bases fortes como NaOH e KOH.
44
Figura 24 – O pH de alguns fluidos aquosos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 60)
Os ácidos podem ser definidos como doadores de prótons e são representados
pela fórmula HA ↔ A- + H+. Enquanto as bases são aceptoras de prótons (B + H2O ↔BH
+ +
OH-) segundo a teoria de Brønsted -Lowry. Um doador de prótons e seu correspondente
aceptor de prótons constituem um par conjugado ácido-base (Figura 25).
A constante de equilíbrio para uma reação na qual um ácido perde um
próton é conhecida como constante de ionização ou constante de dissociação ácida,
normalmente designadas por Ka. Ácidos fortes se dissociam completamente na água.
45
Figura 25 – Pares conjugados ácido-base consistem em um doador de prótons e um aceptor de prótons
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 61)
Alguns compostos como o ácido acético e íons amônio são monopróticos; eles só
podem doar um próton. Outros são dipróticos (ácido carbônico e glicina) ou tripróticos
(ácido fosfórico). As reações de dissociação de cada par são mostradas onde elas
ocorrem ao longo de um gradiente de pH. A constante de equilíbrio ou dissociação (Ka)
e seu logaritmo negativo, o pKa, são mostrados para cada reação.
A titulação determina a quantidade de um ácido em uma certa solução.
Por exemplo, para determinar a concentração de ácido acético (CH3COOH) em uma
solução, adiciona-se uma quantidade conhecida de uma base forte, como hidróxido
de sódio (NaOH), até que o ácido seja neutralizado revelando o valor de pKa do ácido
(Figura 26). O valor de pKa do ácido acético é 4,76, que é inversamente proporcional
à força do ácido acético. Ou seja, os ácidos mais fortes têm um pKa mais baixo, por
exemplo, em comparação o ácidosulfúrico (H2SO4) tem um pKa de -3. O pKa pode ser
determinado por meios experimentais medindo o pH no ponto central da curva de
titulação para o ácido ou a base, que é o ponto no qual exatamente metade do ácido
ou base foi neutralizado.
46
Figura 26 – A curva de titulação do ácido acético
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 62)
Depois da adição de cada incremento de NaOH à solução de ácido acético, o pH da
mistura é medido. Esse valor é colocado em um gráfico em função da quantidade
de NaOH adicionada, expresso como a fração da concentração total requerida para
converter todo o ácido acético (CH3COOH) na sua forma desprotonada, acetato
(CH3COO–). Os pontos então obtidos geram a curva de titulação. Nos retângulos estão
mostradas as formas iônicas predominantes nos pontos designados. No ponto central
da titulação, as concentrações de doadores de prótons e aceptores de prótons são
iguais, e o pH é numericamente igual ao pKa. A zona sombreada é a região útil do poder
tamponante, geralmente entre 10 e 90% da titulação de um ácido fraco.
As células e organismos mantém um pH citosólico específico e constante e em
geral perto do pH 7, o que mantém biomoléculas em seu estado iônico otimizado. Essa
constância do pH nas células é atingida por meio de tampões biológicos.
Um tampão funciona mantendo o pH de uma solução em um nível relativamente
constante. Quando um ácido ou base é adicionado a uma solução tampão, o ácido ou base
irá reagir com o tampão, fazendo com que o ácido ou base seja neutralizado. Isso ocorre
porque o tampão é composto por um ácido fraco e sua base conjugada correspondente.
Quando o ácido é adicionado à solução, ele reage com a base conjugada, e quando a
base é adicionada à solução, ele reage com o ácido fraco. Essa reação ajuda a manter o
pH da solução em um nível relativamente constante.
47
Figura 27 – Ionização da histidina
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 65)
O aminoácido histidina, um componente das proteínas, é um ácido fraco. O pKa do
nitrogênio protonado da cadeia lateral é 6,0.
A equação de Henderson-Hasselbalch permite calcular o pH de uma solução
tampão. pH = pKa + log([A-]/[HA]), onde pKa é a constante de dissociação do ácido, e
[A-] e [HA] representam as concentrações da forma dissociada do ácido e da forma não
dissociada do ácido, respectivamente. Esta equação nos permite determinar o valor de
pH que causa 50% de dissociação do ácido. Em uma solução tampão, o ácido e sua
base conjugada estão em equilíbrio, e a solução tampão é capaz de resistir a mudanças
no pH devido à presença de um ácido ou de uma base.
O citoplasma das células contém alta concentração de aminoácidos com
grupos funcionais que são ácidos fracos e bases fracas e que atuam como tampão
efetivo (Figura 27).
O sistema fosfato é um importante tampão biológico que ajuda a manter a
constância do pH nas células. O sistema tampão é formado por um ácido fraco, H2PO4,
e sua base conjugada, HPO4
2. O ácido fraco pode se dissociar em suas espécies A e H+,
enquanto também permanece em sua forma não dissociada como H2PO4. Isso cria um
equilíbrio químico, em que o ácido e suas formas dissociadas estão em equilíbrio. O pH
de uma solução contendo este sistema tampão pode ser calculado usando a equação
de Henderson-Hasselbalch: pH = pKa + log([HPO4
2-]/[ H2PO4]), em que o pKa é 6,86. Isso
torna o tampão fosfato adequado para ajudar a manter um pH estável no citoplasma
dos mamíferos, que oscila entre 6,9 e 7,4. Como o sistema tampão é capaz de aceitar
ou doar prótons de maneira eficaz, ele ajuda a manter o pH dentro dessa faixa, evitando
mudanças drásticas na acidez que podem ser prejudiciais à célula.
Outro importante sistema tampão biológico é o sistema tampão bicarbonato.
Esse sistema envolve a reação química do ácido carbônico (H2CO3), dissociando-se em
um próton (H+) e bicarbonato (HCO3-).
48
Esse sistema é mais complexo, pois o ácido carbônico é formado pela reação
reversível de CO2(d), dissolvido em solução aquosa (pois em condições normais, o CO2
é um gás): CO2(d) + H2O ↔ H2CO3. Assim, a própria concentração de H2CO3 depende da
concentração de CO2 (pressão parcial de CO2) na solução.
Esse sistema tampão é eficaz em pH próximo a 7,4, pois o H2CO3 do plasma
está em equilíbrio com o CO2 (gás) do ar contido nos pulmões. A taxa de inspiração e
expiração ajusta esse equilíbrio para manter o pH constante, essa taxa de respiração é
controlada pelo tronco cerebral (Figura 28).
Figura 28 – O sistema tampão do bicarbonato.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 67)
O CO2 no espaço aéreo pulmonar está em equilíbrio com o tampão bicarbonato do
plasma sanguíneo que circula pelos capilares pulmonares. Como a concentração de
CO2 dissolvido pode ser ajustada rapidamente por mudanças na taxa de respiração,
o sistema tampão bicarbonato do sangue está em estreito equilíbrio com um grande
reservatório potencial de CO2.
O sistema tampão bicarbonato é afetado pelo ácido lático produzido no músculo
ou no catabolismo de proteínas alterado. O H+ formado pelo ácido lático deixa os tecidos
pelo sangue, aumentando a concentração de CO2 no sangue e, consequentemente,
alterando o pH e causando acidose.
As alterações no pH podem apresentar sintomas de dor de cabeça, vômito,
tontura, convulsão e coma – pois as enzimas não funcionam adequadamente em pH
alterado.
49
Figura 29 – O pH ótimo de algumas enzimas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 68)
Figura 30 – Participação da água nas reações biológicas.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 69)
A pepsina é uma enzima digestiva secretada no suco gástrico, que tem pH ,1,5, o que
permite à enzima funcionar de forma ótima. A tripsina, uma enzima digestiva que age
no intestino delgado, tem um pH ótimo que se assemelha ao pH neutro do lúmen do
intestino delgado. A fosfatase alcalina do tecido ósseo é uma enzima hidrolítica que
presumivelmente auxilia na mineralização dos ossos.
5 A ÁGUA COMO REAGENTE
A água também pode atuar como reagente e não apenas como solvente. Nas
reações de condensação, a água é eliminada como subproduto. Um exemplo de reação de
condensação é a formação de uma ligação fosfoanidrido entre dois fosfatos inorgânicos
durante a produção de ATP (trifosfato de adenosina). Nas reações de hidrólise, a água
é usada para quebrar as ligações químicas entre as moléculas. Como na quebra da
ligação fosfoanidrido no ATP pela adição de água, que libera energia e a converte em
ADP (difosfato de adenosina) e fosfato inorgânico. Esta reação é importante para a
transferência de energia dentro das células para processos metabólicos (Figura 30).
50
ATP é um fosfoanidrido formado pela reação de condensação (perda de elementos
da água) entre ADP e fosfato. R representa o monofosfato de adenosina (AMP). Esta
reação de condensação requer energia. A hidrólise do ATP (adição de elementos da
água) para formar ADP e fosfato libera uma quantidade equivalente de energia. Estas
reações de condensação e hidrólise do ATP são somente um dos exemplos do papel
da água como reagente nos processos biológicos
A capacidade do carbono em formar diferentes tipos de ligações através de diferentes
formas de hibridização é fundamental para sua função única na formação de estruturas
complexas necessárias para a vida.
O processo de hibridização do carbono é uma reorganização dos orbitais atômicos do
átomo de carbono, ou seja, quando os orbitais atômicos originais, que são os orbitais 2s
e 2p, se combinam para formar um conjunto de orbitais híbridos que são utilizados para
formar ligações covalentes com outros átomos. Os diferentes tipos de orbitais híbridos,
podem ser sp, sp2 e sp3, dependendo do número de orbitais p que se combinam com
o orbital s. Por exemplo, quando o carbono se une a outro carbono, pode formar quatro
ligações simples ou usar hibridização sp3. Alternativamente, pode formar uma ligação dupla
e duas ligações simples, também usando hibridização sp3. Duas ligações duplas podem
ser formadas usando hibridização sp,enquanto uma ligação tripla e uma ligação simples
também podem ser criadas usando hibridização sp, como mostrado na tabela abaixo.
As ligações duplas entre carbono e oxigênio são especialmente importantes em muitas
moléculas, pois são cruciais para a formação e função de uma ampla variedade de
macromoléculas, incluindo carboidratos, lipídios e ácidos nucleicos.
NOTA
Tabela 1 – Possíveis ligações com carbono encontrados em compostos orgânicos
Elemento
químico
Número de
ligações com o
Carbono
Tipo de ligações Exemplos
Carbono (C) 4
4 simples
2 simples + 1 dupla
1 simples + 1 tripla
2 duplas propadieno
Oxigênio (O) 2 2 simples 1 dupla
ácido carboxílico
Hidrogênio (H) 1 1 simples
álcool
Nitrogênio (N) 3
3 simples
1 simples + 1 dupla
1 tripla
amina
51
Enxofre (S) 2 2 simples 1 dupla dissulfeto de carbono
Halogênios:
Flúor (F)
Cloro (Cl)
Bromo (Br)
Iodo (I)
1 1 simples
haleto de alquila
https://sites.usp.br/bioquimica/propriedades-da-agua/
https://sites.usp.br/bioquimica/propriedastampao/
http://www.sbq.org.br/
https://www.labxchange.org/
DICA
https://sites.usp.br/bioquimica/propriedades-da-agua/
https://sites.usp.br/bioquimica/propriedastampao/
http://www.sbq.org.br/
https://www.labxchange.org/
52
DEMONSTRAÇÃO DO EFEITO TAMPÃO DE COMPRIMIDOS EFERVESCENTES COM
EXTRATO DE REPOLHO ROXO
Viviani Alves de Lima, Miriam Battaggia, Andréia Guaracho, Adriano Infante
Revista Química Nova na Escola (QNEsc)
Neste experimento são utilizados extrato de repolho roxo e comprimido
efervescente para se chegar ao conceito de solução tampão.
O pH do suco gástrico situa-se normalmente na faixa de 1,0 a 3,0. É comum,
entretanto, esse suco tornar-se mais ácido que o normal, causando a chamada azia e
prejudicando a digestão. Quando isso acontece, faz-se uso de comprimidos antiácidos,
que têm como função elevar o pH até a faixa da normalidade. Por que não se pode
usar bases como a soda cáustica (NaOH) para elevar o pH do estômago? Que diferença
há entre as propriedades de um comprimido efervescente e as propriedades da soda
cáustica? Estas questões serão investigadas neste experimento.
LEITURA
COMPLEMENTAR
Material Reagentes Procedimento
2 béqueres
de 50 mL
3 tubos de
ensaio
estante
para tubos
de ensaio
2 conta-
gotas
1 comprimido
antiácido
efervescente
água destilada
10 mL de extrato
de repolho roxo
100 mL de solução
de ácido clorídrico
0,1 mol/L
100 mL de solução
de hidróxido de
sódio 0,1 mol/L
• Coloque, até 3 cm de altura em um dos tubos de
ensaio, ácido clorídrico; em outro, água destilada e,
no último, solução de hidróxido de sódio.
• Adicione a cada um 5 gotas do extrato de repolho
roxo. Registre a coloração adquirida pela solução
de cada tubo (Nota 1).
• Coloque em um tubo de ensaio ácido clorídrico,
algumas gotas de extrato de repolho e vá
adicionando solução de hidróxido de sódio (Nota 2).
• Coloque nos béqueres 50 mL de água. Em um
deles, acrescente o comprimido efervescente.
Coloque 20 gotas de extrato de repolho em cada
béquer.
• Adicione às duas soluções 10 gotas de solução
de hidróxido de sódio. Agite e registre suas
observações (Nota 3).
• Acrescente à solução que contém o comprimido
efervescente mais gotas de solução de hidróxido de
sódio. Vá agitando e contando o número de gotas até
observar mudança (Nota 4).
53
Notas
1. As cores observadas são: no ácido clorídrico, vermelha; na água, lilás, e no hidróxido
de sódio, verde, passando a amarelo.
2. Observa-se assim alteração brusca de pH, indicada pela rápida mudança da coloração
da solução.
3. Na solução com comprimido efervescente, a cor se mantém.
4. A solução resiste por mais tempo à mudança de pH que as demais.
Questões propostas
• A variação de pH da solução inicial de ácido clorídrico é mais brusca quando se
acrescenta solução de NaOH ou de comprimido efervescente?
• Por que a ingestão de excesso de antiácidos também pode trazer consequências
altamente indesejáveis para o organismo?
Conclusões e comentários
Verifica-se que mesmo com a adição de hidróxido de sódio ou ácido clorídrico,
não ocorre alteração significativa do pH da solução que contém o comprimido
efervescente, quando essa adição não é muito excessiva, ao contrário do que acontece
com a outra solução, em que a mudança é brusca mesmo com pequenas quantidades.
Verifica-se, assim, que o comprimido efervescente em solução age como
controlador de pH, não deixando ocorrer mudanças bruscas – isto é, funciona como
uma solução tampão.
Soluções tampão são as soluções que resistem a variações de pH, quando a
elas são adicionados ácidos ou bases. Tais soluções são amplamente empregadas em
análise química e até mesmo em escala industrial, quando as variações de pH alteram
os resultados desejados.
54
Também em nosso organismo elas estão presentes, mantendo o pH do estômago
próximo a 2, o do sangue próximo a 7,4, o da urina ao mínimo de 4,5. Por isso, é também
importante que certos medicamentos sejam ‘tamponados’, para que não percam ou não
mudem seus efeitos em diferentes condições de pH.
Fonte: QUÍMICA NOVA NA ESCOLA Equilíbrio Ácido Base N° 1, obtido de http://qnesc.sbq.org.br/online/
qnesc01/exper2.pdf
55
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• A água é uma molécula polar atuando como solvente para muitas substâncias
iônicas e polares. A água não interage com moléculas apolares.
• A água forma ligações de hidrogênio conhecidas como pontes de hidrogênio.
• A água possui alta capacidade térmica, o que ajuda a regular a temperatura
• A osmolaridade refere-se à concentração de partículas de soluto em uma solução e
desempenha um papel importante na regulação do equilíbrio de fluidos em sistemas
biológicos.
• A pressão osmótica gerada pelo gradiente de concentração de solutos ajuda a
manter o equilíbrio adequado de fluidos através das membranas celulares.
• As moléculas de água têm uma pequena capacidade de sofrer ionização reversível.
• O pH é uma medida de [H+] em uma solução.
• O pH se encontra em uma escala logarítmica e é uma medida da acidez/alcalinidade
de uma solução.
• O conceito de ácidos e bases de Brønsted-Lowry é importante para entender as
reações ácido-base e a transferência de prótons (H+) em sistemas biológicos.
• Todos os processos nos seres vivos ocorrem em uma faixa de pH ideal.
• Um sistema tampão funciona mantendo o pH de uma solução em um nível
relativamente constante. Um tampão é composto de um ácido fraco e sua base
conjugada.
• A água é um reagente importante em muitas reações químicas em sistemas
biológicos, como nas reações de hidrólise.
56
AUTOATIVIDADE
1 Na natureza, podemos encontrar uma variedade de ligações que mantêm átomos
e compostos juntos. Acerca do tipo de ligação fraca que você pode encontrar entre
moléculas de água e também em seu próprio DNA, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Uma ligação covalente apolar.
b) ( ) Uma ligação covalente polar.
c) ( ) Uma ligação iônica.
d) ( ) Uma ligação de hidrogênio.
2 O pH é uma medida da acidez ou alcalinidade de uma solução. Ele é definido como o
logaritmo negativo da concentração de íons hidrogênio (H+) presentes na solução.
Assinale a alternativa CORRETA que melhor descreve uma solução desconhecida
com um pH de 8,0.
a) ( ) Ligeiramente básica.
b) ( ) Ácida.
c) ( ) Neutra.
d) ( ) Fortemente básica.
e) ( ) Ligeiramente ácida.
3 Os compostos anfipáticos são moléculas que possuem propriedades hidrofóbicas e
hidrofílicas, e, em solução aquosa, tendem a se organizar em estruturas específicas
para minimizar as interações hidrofóbicas desfavoráveis. Acerca da estrutura globular
que tem um núcleo hidrofóbico e uma superfície hidrofílica, assinale a alternativa
CORRETA:
a) ( ) Micelas.
b) ( ) Lipídios.
c) ( ) Camada de hidratação.
d) ( ) Nenhuma das anteriores.
4 Johannes Nicolaus Brønsted e Thomas Martin Lowry foram dois químicos
dinamarqueses que trabalharam juntos no início do século XX. Eles proposeram a
teoria de ácido-baseconhecida como Teoria de Brønsted-Lowry. Na reação a seguir
entre o ácido clorídrico e a amônia, quais dos compostos podem ser denominados
um ácido de Brønsted-Lowry ou uma base de Brønsted-Lowry. Explique:
HCl(aq) + NH3(aq) → NH4+(aq) + Cl−(aq)
57
5 O tampão é uma solução biológica ou química que age para manter o pH relativamente
constante quando se adiciona ácido ou base à solução. Isso é de grande importância,
pois muitos processos biológicos e químicos são sensíveis à mudança de pH e podem
ser afetados por variações bruscas no pH. Explique como um tampão mantém o pH
constante.
58
REFERÊNCIAS
BERG, J. M.; STRYER, LU. Bioquímica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2014.
FERRIER, D. Bioquímica ilustrada. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2019.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 7. ed. Porto Ale-
gre: Artmed, 2019.
NELSON, D. L. & COX, M. M. Princípios de bioquímica. 6. ed. Porto Alegre: Artmed,
2014
RODWELL, V. W. et al. Bioquímica ilustrada de Harper. 31. ed. Porto Alegre: AMGH,
2021.
SANTOS, A. P. S. A et al. Bioquímica prática - Protocolos para análise de biomolé-
culas e exercícios complementares. Disponível em: http://gurupi.ufma.br:8080/jspui/
handle/1/445. Acesso em: 31 mar. 2023.
http://gurupi.ufma.br:8080/jspui/handle/1/445
http://gurupi.ufma.br:8080/jspui/handle/1/445
59
AS MACROMOLÉCULAS E
SUAS FUNÇÕES
UNIDADE 2 —
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• descrever os quatro principais tipos de macromoléculas biológicas;
• descrever as estruturas das macromoléculas biológicas;
• compreender as funções das macromoléculas biológicas;
• compreender a natureza das moléculas catalíticas;
• compreender os mecanismos envolvidos no fluxo de informação genética nos
sistemas biológicos.
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
TEMA DE APRENDIZAGEM 1 – ESTRUTURA E FUNÇÃO DAS PROTEÍNAS
TEMA DE APRENDIZAGEM 2 – ESTRUTURA E FUNÇÃO DE CARBOIDRATOS E LIPÍDIOS
TEMA DE APRENDIZAGEM 3 – AS MACROMOLÉCULAS DA INFORMAÇÃO GENÉTICA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
CHAMADA
60
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!
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61
TÓPICO 1 —
ESTRUTURA E FUNÇÃO DAS PROTEÍNAS
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
As grandes estruturas moleculares (ou supramoleculares) necessárias para a
vida, são constituídas a partir de moléculas orgânicas chamadas de macromoléculas
biológicas. Existem quatro classes principais de macromoléculas biológicas: as proteínas,
os carboidratos, os lipídios e os ácidos nucléicos.
Cada uma dessas macromoléculas é formada por subunidades monoméricas.
(Figura 1). Essas subunidades são unidas entre si por ligações covalentes. Por outro
lado, as macromoléculas que formam as estruturas supramoleculares estão unidas
entre si por ligações não covalentes, que são ligações mais fracas, como pontes de
hidrogênio, as interações iônicas, as interações hidrofóbicas e as interações Van der
Waals. As ligações fracas combinadas em grandes números conferem estabilidade aos
complexos supramoleculares.
As macromoléculas são componentes importantes da célula e executam uma
ampla variedade de funções. Na célula, elas compõem a maior parte da massa seca,
sendo que água compõe a maior parte da massa completa de uma célula (Figura 1)
Figura 1 – Hierarquia estrutural na organização molecular das células
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 11)
62
As organelas e outras estruturas relativamente grandes das células são feitas de
complexos supramoleculares, que, por sua vez, são feitos de moléculas menores e
de subunidades moleculares menores. Por exemplo, o núcleo desta célula de planta
contém cromatina, complexo supramolecular que consiste em DNA e proteínas
(histonas). O DNA é feito de subunidades monoméricas simples (nucleotídeos), assim
como as proteínas (aminoácidos).
Figura 2 – Componentes moleculares de uma célula de E. coli
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.15)
Porcentagem do
peso total de célula
Número aproximado de
espécies moleculares
diferentes
Água 70 1
Proteínas 15 3.000
Ácidos nucleicos
DNA
RNA
1
6
1-4
> 3.000
Polissacarídeos 3 10
Lipídeos 2 20
Subunidades monoméricas e
intermediárias
2 500
Íons inorgânicos 1 20
As proteínas são as macromoléculas mais abundantes da célula e fundamentais
para a estrutura e função celular. Constituem-se como polímeros compostos por
aminoácidos, sendo sintetizadas a partir dos moldes de mRNA pelos ribossomos.
Acadêmico, no Tema de Aprendizagem 1, abordaremos as propriedades dos
aminoácidos, como eles se unem como blocos para formar as proteínas com estruturas
tridimensionais singulares e capazes de desempenhar funções biológicas específicas.
O proteoma é o conjunto das proteínas em funcionamento na célula, e o estudo da
proteômica é a caracterização dessas proteínas.
Algumas proteínas têm atividade catalítica e funcionam como enzimas capazes
de quebrar ligações moleculares, reorganizar ligações ou formar novas ligações. Essas
enzimas podem conter um componente não proteico chamado cofator, podendo ser
uma coenzima ou vitamina que é necessário para o funcionamento adequado da enzima.
63
2 AMINOÁCIDOS, PEPTÍDEOS E PROTEÍNAS
As proteínas, tanto as de bactérias, como as achadas nos seres humanos, são
constituídas principalmente pelos mesmos grupos de 20 tipos de aminoácidos. Porém,
as diferentes combinações e arranjos de aminoácidos dão origem à vasta diversidade
de proteínas encontradas em organismos vivos.
A maioria dos aminoácidos são α-aminoácidos, contendo um grupo carboxila
(-COOH), um grupo amino (-NH3
+), um carbono α, um hidrogênio (H) e uma cadeia
lateral ou grupo R que difere para cada aminoácido. O carbono α é quase sempre quiral,
exceto na glicina. Sendo assim, apresenta dois estereoisômeros possíveis L e D, sendo
enantiômeros (imagens não sobrepostas).
Por convenção, L e D referem-se à configuração similar ao gliceraldeído, sendo
L grupo-amino na esquerda, e D grupo-amino na direita (Figura 3). Os aminoácidos nas
proteínas são exclusivamente estereoisômeros L.
Figura 3 – Estereoisomerismo em α-aminoácidos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.15)
A figura apresenta: (a) Os dois estereoisômeros da alanina, L– e D–alanina, são
imagens especulares não sobrepostas um do outro (enantiômeros).
Os grupos carboxila e amino dos aminoácidos, e as cadeias laterais ionizáveis,
podem sofrer protonação (adição de H) e desprotonação (retirada de H), dependendo
do pH.
Em soluções ácidas, os grupos ionizáveis apresentam-se protonados (-COOH,
-NH3
+), em soluções de pH neutro é um íon bipolar ou zwitterríon (do alemão, íon híbrido
-COO-, -NH3
+), e em soluções alcalinas, apresentam-se desprotonados (-COO-, -NH2).
(Figura 4)
64
Figura 4 – Formas não iônicas e zwitteriônicas de aminoácidos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.83)
A figura apresenta: (esquerda) A forma não iônica não ocorre em quantidades
significativas em soluções aquosas. O zwitteríon predomina em pH neutro. Um
zwitteríon pode atuar tanto como ácido (doador de prótons) quanto como base
(aceptor de prótons). (direita) Titulação de um aminoácido. Aqui é mostrada a curva de
titulação de 0,1 M de glicina a 25ºC. As espécies iônicas que predominam em pontos-
chave na titulação são mostradas acima do gráfico. Os retângulos sombreados,
centrados em torno de pK15 2,34 e pK25 9,60, indicam as regiões de maior poder de
tamponamento. Observe que 1 equivalente de OH–5 0,1 M de NaOH foi adicionado.
A titulação ácido-base envolve a adição ou remoção gradual de prótons. O pKa
e pKb (ou -log do Ka, ou do Kb) descrevem o grau de ionização de um ácido ou base e
são usados para indicar a força de um ácido ou base. O pKa e pKb são iguais ao valor do
pH quando metade do ácido ou da base se dissocia, e sãoregiões de tamponamento.
Os aminoácidos possuem caráter anfótero, podendo se comportar como ácidos
e bases fracas. Os aminoácidos com apenas dois grupos ionizáveis, apresentam duas
regiões de tamponamento (Exemplo: a glicina, pKa 2,34 e pKb 9,60, Figura 4), enquanto
os aminoácidos com cadeias laterais ionizáveis apresentam uma terceira região de
tamponamento.
O ponto isoelétrico (pI) corresponde ao valor de pH em que a molécula se
encontre eletricamente neutra, ou seja, quando o número de cargas positivas for igual
ao número de cargas negativas (carga elétrica líquida igual a zero). De modo geral,
65
pode ser calculado pela média dos valores de pKa e pKb, sendo pI = (pKa + pKb) /2. Por
exemplo, a glicina tem pI = (2,35 + 9,60/2) = 5,97.
A determinação da forma iônica dos aminoácidos é importante em processos
técnicos de separação e purificação dessas moléculas.
2.1 CLASSIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS
As cadeias laterais (o grupo R) dos aminoácidos possuem diferentes propriedades
químicas, como carga, tamanho e polaridade, que influenciam a maneira como os
aminoácidos interagem entre si e com seu ambiente. Por exemplo, algumas cadeias
laterais têm forte afinidade com a água e são hidrofílicas, enquanto outras não interagem
bem com a água e são hidrofóbicas. Essas propriedades podem afetar a conformação
geral da proteína, bem como sua função e interações com outras moléculas. Em geral,
as cadeias laterais desempenham um papel crucial na determinação da estrutura e
função das proteínas.
Os aminoácidos são então classificados em 5 grupos de acordo as propriedades
químicas da sua cadeia lateral (R). (Figura 5) São abreviados por 3 letras, com símbolo
de uma letra (Ex: Alanina, ALA, A).
1. Grupo R alifáticos (não contém anéis): são apolares e hidrofóbicos, tendem a se
aglomerar no interior da molécula, onde participam em interações hidrofóbicas. São
7: alanina, glicina, leucina, isoleucina, metionina, prolina e valina;
2. Grupo R aromáticos: são relativamente hidrofóbicos. Absorvem luz ultravioleta
280nm, dando esta característica para identificação de proteínas. São 3: fenilalanina,
tirosina e triptofano.
3. Grupo R polares, não carregados: são mais solúveis em água. São 5: asparagina,
cisteína, glutamina, treonina e serina.
4. Grupo R carregado positivamente (básicos): hidrofílicos. São 3: arginina, histidina e
lisina.
5. Grupo R carregado negativamente (ácidos): hidrofílicos. São 2: aspartato e glutamato.
66
Figura 5 – Os 20 aminoácidos comuns de proteínas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.79)
A figura apresenta as fórmulas estruturais que mostram o estado de ionização que
predomina em pH 7,0. As porções não sombreadas são aquelas comuns a todos os
aminoácidos; aquelas sombreadas são os grupos R.
Os grupos carregados atuam como doadores e aceptores de elétrons. Por essas
características, as proteínas podem ter ação tamponante – a capacidade de resistir à
mudança do pH.
No laboratório, os aminoácidos aromáticos tirosina e triptofano são identificados
por reação com o ácido nítrico, originando um composto amarelo (em meio ácido),
chamada de reação xantoproteica (xanto, do grego, significa amarelo).
Na nutrição, os aminoácidos são classificados como essenciais ou não essenciais.
Os aminoácidos essenciais, são aqueles que humanos e outros vertebrados não
conseguem sintetizar a partir de intermediários metabólicos. Esses aminoácidos devem
67
Figura 6 – Formação de uma ligação peptídica por condensação
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.86)
A figura apresenta o grupo a-amino de um aminoácido (com grupo R2) atua como
nucleófilo para deslocar o grupo hidroxila de outro aminoácido (com grupo R1),
formando uma ligação peptídica (sombreada). Os grupos amino são bons nucleófilos,
mas o grupo hidroxila é um grupo de saída fraco e não prontamente deslocado. No
pH fisiológico, a reação mostrada aqui não ocorre em grau apreciável.
ser consumidos na dieta, porque o corpo humano não possui as vias metabólicas
necessárias para sintetizar esses aminoácidos. São os aminoácidos metionina, lisina,
leucina, isoleucina, triptofano, valina, treonina, fenilalanina e histidina.
2.2 LIGAÇÃO PEPTÍDICA
Os aminoácidos formam polímeros, unidos por ligação covalente, a ligação
peptídica (C-N) para formar os peptídeos e proteínas. Trata-se de uma reação de
condensação entre o carbono da carboxila e o nitrogênio da amina, liberando uma
molécula de água (H2O) (Figura 6). Esse processo não acontece por uma reação direta
entre os aminoácidos, mas pela maquinaria de síntese de proteínas que inclui os
ribossomos, os locais de síntese de proteínas na célula. A sequência de ácidos nucléicos
no DNA ou RNA fornece as instruções, os ribossomos e outras proteínas e enzimas
ajudam a ler esse código genético para ligar os aminoácidos na ordem correta formando
as proteínas. Este é um processo altamente coordenado e complexo que é essencial
para a função dos organismos vivos.
Os polímeros de aminoácidos são chamados de peptídeos, oligopeptídeos
(contendo alguns aminoácidos), polipeptídios (contendo muitos aminoácidos) e/
ou proteínas (sendo o n= o número de aminoácidos de uma proteína, por exemplo, a
hemoglobina humana possui 574 aminoácidos).
68
No laboratório, o reagente de biureto contendo sulfato de cobre (II) (CuSO4)
é comumente usado para a determinação de concentração de proteínas, em ensaio
colorimétrico. Os íons de Cu2+ provenientes do CuSO4, formam um complexo com as
ligações peptídicas presentes na amostra, desenvolvendo uma coloração violeta.
As proteínas conjugadas apresentam, além dos aminoácidos, um grupo
prostético que desempenha um papel importante na função da proteína. Exemplo:
lipoproteína (contêm lipídios), glicoproteína (contêm carboidratos), fosfoproteínas
(contêm grupos fosfato), hemeproteínas (contêm o grupo heme), flavoproteínas (contêm
nucleotídeos de flavina) e metaloproteína (contêm ferro, zinco, cálcio e cobre).
3 ESTRUTURA DAS PROTEINAS
Cada proteína apresenta uma composição de aminoácidos bem característica
e que forma estruturas tridimensionais. As estruturas das proteínas são comumente
definidas em 4 níveis: 1. primária, 2. secundária, 3. terciária e 4. quaternária (Figura 7).
Figura 7 – Níveis de estrutura nas proteínas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.96)
A figura apresenta a estrutura primária que consiste em uma sequência de aminoá-
cidos unidos por ligações peptídicas e inclui quaisquer pontes dissulfeto. O polipep-
tídeo resultante pode ser disposto em unidades de estrutura secundária, como em
uma hélice a. A hélice é uma parte da estrutura terciária do polipeptídeo dobrado,
que é ele mesmo uma das subunidades que compõem a estrutura quaternária da
proteína multissubunidade, nesse caso a hemoglobina.
69
Figura 8 – Grupo peptídico planar
Fonte: Nelson & Cox (2014, p 118)
A figura apresenta em (a) Cada ligação peptídica tem algum caráter de ligação du-
pla devido à ressonância, e não pode girar. Embora o átomo de N em uma ligação
peptídica seja sempre representado com uma carga positiva parcial, considerações
cuidadosas dos orbitais de ligação e dos mecanismos quânticos indicam que o N
tem uma carga líquida neutra ou levemente negativa. (b) Três ligações separam os
A estrutura primária consiste na sequência de aminoácidos, começando pela
extremidade N- terminal e terminando com a extremidade C- terminal. Essa sequência
primária reflete a sequência do gene da qual a proteína foi codificada, ou seja, é a forma
através da qual a informação genética é expressa.
A estrutura primária é importante para a formação tridimensional das proteínas.
Por exemplo, na anemia falciforme, o ácido glutâmico, polar na sequência primária, é
substituído pelo aminoácido valina não polar. Essa alteração causa modificações na
estrutura tridimensional dessa hemoglobina, que passa a ter a uma forma de foice com
capacidade de se agregar, alterando sua função.
Cada proteína possui uma sequência de aminoácidos queé única, porém não
é sempre fixa, o que confere uma característica polimórfica às proteínas, de forma que
pequenas variações na sequência podem não alterar sua função.
Em um polímero de aminoácidos, a ligação peptídica que une os aminoácidos
tem um caráter parcial de ligação dupla, o que ajuda a manter a estrutura geral da
proteína (Figura 8). Essa característica restringe o movimento da ligação peptídica,
mantendo-a em uma configuração planar rígida. No entanto, as outras ligações na
proteína, como as ligações entre os átomos de carbono nas cadeias laterais, têm
rotações livres e podem se mover para formar diferentes conformações. Isso permite
que a proteína adote uma variedade de formas e estruturas diferentes, conhecidas
como sua estrutura secundária.
70
carbonos a consecutivos em uma cadeia polipeptídica. As ligações N-Cα e Cα-C po-
dem girar, sendo descritas pelos ângulos diedros designados f e c, respectivamente.
A ligação peptídica C¬N não está livre para rotação. Outras ligações simples do es-
queleto também podem estar rotacionalmente obstruídas, dependendo do tamanho
e da carga dos grupos R.
A estrutura secundária é constituída de arranjos estáveis e recorrentes, como a
α-hélice aconformação β (Figura 9).
A α-hélice é uma estrutura helicoidal em que o esqueleto polipeptídeo está
enrolado em torno de um eixo imaginário e os grupos R projetam-se para fora, evitando
o impedimento estérico (repulsão eletrostática). Cada volta da hélice é formada por 3,6
resíduos de aminoácidos, que se repetem. A estrutura é estabilizada por ligações de
hidrogênios, entre o H do grupo amino, e o presente no grupo da carbonila (C=O).
Nem toda sequência de aminoácidos forma α-hélice, a formação dessa estrutura
pode ser impedida pelas interações entre os grupos R (em grupos R carregados, os
aminoácidos irão repelir-se mutuamente), os volumes de grupos R adjacentes, e
interações entre os resíduos de aminoácidos das extremidades do segmento helicoidal
e o dipolo elétrico inerente da α-hélice.
Outro tipo de arranjo de estrutura secundária é a conformação β estendida na
forma de zigue-zague. Os aminoácidos também interagem por pontes de hidrogênio, e
as cadeias laterais projetam-se em direção oposta. Estão organizados de forma paralela
ou antiparalela. Quando vários segmentos β estão lado a lado, são chamados de folhas β.
As cadeias polipeptídicas em estrutura secundária podem estar unidas entre si
através de conexões chamadas de voltas ou alças. Exemplo são o barril β e a alça β-β-β.
71
Figura 9 – (esquerda) Modelos de hélice α, mostrando os diferentes aspectos de sua estrutura
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.121 e 123)
(a) Modelo de esfera e bastão mostrando as ligações de hidrogênio internas da ca-
deia. A unidade que se repete forma uma volta da hélice: 3,6 resíduos. (b) Hélice
α vista de uma de suas extremidades, ao longo do eixo central (obtida a partir do
PDB ID 4TNC). Observe as posições dos grupos R, representados pelas esferas roxas.
Observe modelo de esfera e bastão, que ressalta o arranjo helicoidal, dá uma falsa
impressão de que a hélice é oca, pois as esferas não mostram os raios de van der
Waals de cada um dos átomos. (direita) A conformação β das cadeias polipeptídicas.
Estas visões (a) lateral e (b, c) superior mostram os grupos R saindo do plano da folha
β enfatizam a forma pregueada formada pelos planos das ligações peptídicas. (Um
nome alternativo para esta estrutura é folha β pregueada. As ligações de hidrogênio
entre as cadeias adjacentes também são mostradas. A orientação das cadeias adja-
centes (setas), do aminoterminal para carboxiterminal, pode ser a mesma ou oposta,
formando (b) folhas β antiparalelas ou (c) folhas β paralelas.
Na estrutura terciária, ocorrem interações entre as estruturas regulares
secundárias e/ou regiões sem estrutura definida. Essas interações são formadas por
ligações fracas, porém em grande número, que influenciam o enovelamento da proteína.
A conformação da proteína diz sobre seu arranjo no espaço, assumindo
normalmente conformações termodinâmicas estáveis, com menor energia livre (G).
Essa conformação funcional é chamada de nativa.
As interações químicas na forma nativa que estabilizam a proteínas são ligações
fracas, que podem ser:
72
• Pontes de hidrogênio, que não são regulares como acontece na estrutura secundária.
• Interações hidrofóbicas, ocorrem entre cadeias apolares de aminoácidos e estão,
presentes no interior da proteína para diminuir o contato com a água.
• Ligações iônicas, são interações entre as regiões carregadas, sendo mais frequentes
na superfície da proteína, onde podem talvez estabelecer interações com a água.
A estrutura terciária também pode ser estabilizada por ligação covalente, como
a ponte dissulfeto (S-S), que é formada por reação de oxidação entre dois resíduos de
cisteína (Figura 10)
Figura 10 – Ondulação permanente é engenharia bioquímica
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.127)
Proteínas com semelhança na estrutura primária e/ou terciária e com funções
semelhantes fazem parte da mesma família.
A estrutura quaternária é formada por associação de subunidades distintas,
podendo formar multímetros (muitos) ou oligômeros (alguns). As subunidades podem
ser iguais ou diferentes e são mantidas na estrutura quaternária por ligações não
covalentes.
No entanto, algumas proteínas podem ser intrinsicamente desordenadas e com
padrões estruturais distintos.
73
Tabela 2 – Funções das proteínas
Tabela 3 – Níveis estruturais das proteínas
Fonte: a autora.
Fonte: a autora.
4 CLASSIFICAÇÃO DAS PROTEINAS E FUNÇÃO
As proteínas podem ser classificadas de acordo com as funções que realizam
(Tabela 2).
Classe Exemplo
Enzimas – função catalítica Tripsina
Transportadoras Hemoglobina
Contrácteis Actina e miosina
Defesa Anticorpos
Reguladoras Hormônios como a insulina
Estruturais Colágeno
As proteínas também podem ser classificadas quanto à forma (Tabela 3).
Fibrosas Globulares
Cadeias polipeptídicas arranjadas de for-
ma alongada.
Cadeias polipeptídicas que se organizam
em esferas.
São geralmente insolúveis, pela quantida-
de de aminoácidos hidrofóbicos.
São geralmente solúveis.
Desempenham papéis estruturais, confe-
rindo força e flexibilidade.
Desempenham várias funções dinâmicas
na célula.
Exemplo: o colágeno, α-queratina.
Exemplos: enzimas, proteínas de defesa,
reguladoras e transportadoras.
O colágeno são proteínas que conferem resistência. São encontradas nos tecidos
conectivos, tendões e cartilagens. Na estrutura quaternária, as cadeias polipeptídicas
se contorcem entre si, formando cadeias em α. A vitamina C é necessária para a
hidroxilação dos aminoácidos no colágeno e a falta dessa vitamina causa o escorbuto, a
degeneração do tecido conectivo.
A α-queratina é uma proteína que ocorre nos mamíferos, nos cabelos, unhas
e chifres. Possui estrutura quaternária complexa formada pela associação lateral de
cadeias α-hélices, formando longos filamentos. A formação de pontes de dissulfeto
entre as cadeias confere grande resistência às fibras de α-queratina.
74
A mioglobina e hemoglobina são exemplos de proteínas globulares. Possuem
um grupo heme (com o ferro) na sua estrutura que faz ligações com o O2 nas células
musculares e nas hemácias.
Além disso, as proteínas podem ser classificadas com base em sua origem, por
exemplo, se são produzidas por bactérias, plantas ou animais.
As mudanças na estrutura da proteína podem alterar a sua atividade biológica. A
desnaturação é um processo de perda da estrutura tridimensional que pode resultar em
perda da função sem romper as ligações peptídicas. Pode ser um processo irreversível
ou reversível, e nesse último a proteína retorna ao seu estado original.
Os principais agentes desnaturantes são:
• A temperatura, pois o calor age nas interações fracas como ponte de hidrogênio.
No entanto, algumas proteínas de arquibactériasevoluíram para funcionar em
temperaturas de 100oC.
• O pH, que pode alterar a carga líquida das proteínas, causando repulsão eletrostática
e rompendo ligações.
• Os solventes orgânicos, como o álcool e a acetona, que promovem alterações nas
ligações hidrofóbicas.
• Os detergentes e solutos, como a ureia, que possuem baixo peso molecular e afetam
a estabilidade das proteínas em solução aquosa.
• Agentes redutores, que desfazem ligações dissulfeto (S-S).
A desnaturação pode levar à precipitação de proteínas e formação de agregados
proteicos. No laboratório é possível promover a precipitação de proteínas, pois essas
são moléculas carregadas. Os íons positivos de metais pesados reagem com as cargas
negativas das proteínas, principalmente se o pH estiver acima do pI da proteína (ponto
neutro), formando precipitados. Por outro lado, quando a proteína está abaixo do seu pI,
a carga líquida total da molécula é positiva, o que facilita a interação com ácidos fortes
e precipitação da proteína.
A alteração da estrutura tridimensional e da função de proteínas pode causar
doenças. As proteínas podem estar alteradas quando ocorre falhas no dobramento
de forma espontânea ou por uma mutação de um determinado gene. Essas proteínas
podem expor sua superfície hidrofóbica e ligam-se com outras proteínas, formando
agregados. O organismo atua para corrigir proteínas deformadas, direcionando-as para
as vias de reciclagem (via UPR, do inglês Unfolded Protein Response) e/ou através das
vias de degradação como autofagia e o sistema ubiquitina-proteoma. No entanto, o
acúmulo dos agregados causa doenças como o Parkinson, o Alzheimer e a doença da
vaca louca (doença do príon).
75
As proteínas são moléculas flexíveis e dinâmicas que interagem com outras
moléculas. Os ligantes são moléculas que fazem ligações reversíveis com uma proteína
no sítio de ligação ou sítio ativo (em enzimas). Essa interação está acoplada a uma
mudança conformacional na proteína denominada encaixe induzido. Essa ligação
reversível pode ser descrita por uma constante de associação (Ka) ou uma constante de
dissociação (Kd).
Um exemplo clássico de estrutura e função das proteínas é observado na
molécula de hemoglobina.
A hemoglobina (Hb) é uma proteína presente nas hemácias e realiza o transporte
de oxigênio. É uma hemeproteína, constituída por quatro globinas (a parte proteica), e
quatro grupos prostéticos, heme. Uma molécula de hemoglobina com quatro moléculas
de O2 é denominada oxi-hemoglobina (HbO2).
O grupo heme, é um complexo entre a protoporfirina (com quatro anéis pirrólicos)
e o ferro que está preso no centro da molécula. Essa estrutura mantém o ferro no estado
ferroso (Fe2+) e inibe a sua oxidação para Fe3+, pois apenas o Fe2+ faz ligações reversíveis
com oxigênio.
A função da hemoglobina depende tanto da capacidade de se ligar quanto
de liberar o oxigênio. A ligação do oxigênio a hemoglobina é alostérica. Essa ligação
da hemoglobina com o oxigênio altera a conformação da hemoglobina, que passa do
estado R com alta afinidade pelo oxigênio para captar oxigênio nos pulmões; para o
estado T com baixa afinidade, liberando o oxigênio nos tecidos, dependente da pressão
parcial de oxigênio (pO2 em mmHg) (Figura 11) A P50 é a pO2 em que a Hb está 50%
saturada, e é, normalmente, 27 mmHg.
Figura 11 – Curva sigmoide de ligação (cooperativa)
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.166)
76
A curva sigmoide de ligação pode ser vista como uma curva híbrida que reflete a
transição de um estado de baixa afinidade para um de alta afinidade. Devido a sua li-
gação cooperativa, evidenciada por uma curva sigmoide, a hemoglobina é mais sen-
sível às pequenas diferenças na concentração de O2 entre os tecidos e os pulmões,
o que lhe permite se ligar ao oxigênio nos pulmões (onde a pO2 é alta) e liberá-lo nos
tecidos (onde a pO2 é baixa).
A hemoglobina também carrega CO2 (HbCO2) e H+, sendo que o H+ liga-se
a diferentes sítios da proteína. No entanto, a maior parte do CO2 é convertido para
bicarbonato (HCO3-) pela hidratação do CO2 catalisada pela enzima anidrase carbônica.
Essa reação resulta em mais H+ nos tecidos, o que reduz o pH.
A presença do CO2 e a variação do pH produz o efeito Bohr e tem influência na
ligação e liberação de oxigênio pela hemoglobina. A redução do pH resulta na redução
de afinidade da hemoglobina por O2 e garante a disponibilidade de O2 para os tecidos.
Por outro lado, o meio alcalino aumenta a afinidade da hemoglobina por O2.
A função da hemoglobina é complementada por modulação alostérica de
interação ao BPG (2,3-bifosfoglicerato), que diminui a afinidade da hemoglobina ao
oxigênio em relação pO2 nos pulmões. E em caso de altitude ou de doenças pulmonares,
os níveis de BPG aumentando para facilitar ainda mais a liberação de O2 nos tecidos.
5 ENZIMAS E CATÁLISE
As enzimas são catalisadores biológicos, assim são capazes de acelerar as
reações químicas na célula por um fator de 105 a 107. As enzimas funcionam diminuindo a
energia de ativação necessária para que uma reação ocorra, o que permite que a reação
ocorra de forma mais rápida e eficiente. Essa função é essencial nos sistemas vivos,
pois muitas reações na célula ocorreriam muito lentamente sem a ajuda de enzimas. Em
alguns casos, a reação seria tão lenta que seria efetivamente impossível de acontecer.
A maioria das enzimas são proteínas, porém um pequeno grupo de RNA realiza
atividade catalítica, como a ribozima, envolvida na síntese de proteínas, catalisando
reações peptídicas. As enzimas são classificadas de acordo com o tipo de reação que
catalisam (Tabela 4).
A reação química catalisada por uma enzima é específica e distingue uma
enzima de outra. Na enzima (E), a reação ocorre em um bolsão denominado sítio ativo
(Figura 12). A molécula que se liga ao sítio ativo é o substrato (S), formando um complexo
enzima-substrato ou ES. O composto resultante é o produto (P).
77
A enzima quimotripsina, com o substrato ligado (PBD ID 7GCH). Alguns dos resíduos-
-chave do sítio ativo aparecem como uma mancha vermelha na superfície da enzima
Com exceção de algumas das enzimas, como pepsina, renina e tripsina, a maioria
dos nomes das enzimas terminam em "ase". A nomenclatura de enzimas indica o substrato
sobre o qual a enzima atuou e qual o tipo de reação foi catalisada. Por exemplo, a enzima
fosfatase é uma hidrolase que catalisa a hidrólise de ésteres de fosfato.
Tabela 4 – Classificação das Enzimas
Figura 12 – Ligação de um substrato no sítio ativo de uma enzima
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 192)
Classe Nome Tipo de reação
1 Oxidorredutase Reações de oxidação-redução ou transferência de elétrons.
2 Transferase
Transferem grupos funcionais como amina, fosfato, acil,
carboxil.
3 Hidrolases Reações de hidrólise de ligação covalente.
4 Liases
Adição de grupos a duplas ligações ou remoção de grupos
deixando dupla ligação, clivagem de C-C, C-O, C-N.
5 Isomerases
Reações de interconversão entre isômeros óticos ou
geométricos.
6 Ligases
Condensação de duas moléculas, sempre às custas de
energia, geralmente do ATP.
A função da enzima é aumentar a velocidade da reação sem, contudo, afetar
o equilíbrio final, e a enzima não é gasta no processo. Assim, uma reação enzimática
simples pode ser descrita como: E + S ⇌ ES ⇌ EP ⇌ E + P (enzima + substrato ⇌
complexos transitórios ⇌ enzima + produto).
78
5.1 FUNÇÃO DOS CATALISADORES ENZIMÁTICOS
Um catalisador pode ajudar a reação a atingir o equilíbrio mais rapidamente,
mas não pode alterar a constante de equilíbrio ou o estado de equilíbrio da reação. Na
reação de conversão SP, a função do catalisador é acelerar a conversão de S para P (e
de P para S), porém, sem alterar a proporção entre reagentes e produtos encontrados no
final da reação e assim mantem o equilíbrio (K´eq) da reação que é K´eq=[P]/[S].
A energia livre de Gibbs (G) é um importante parâmetro termodinâmico que
determina a viabilidade de umareação química. Em sistemas biológicos, a energia
livre de Gibbs é frequentemente usada para prever a direção de uma reação e se ela
prosseguirá até a conclusão ou chegará ao equilíbrio. A variação de energia livre é
chamada de ΔG ou ΔG'o (nas condições padrões a 25 °C e pH 7).
As reações biológicas dependem da energia livre de Gibbs e tendem a ocorrer
em direção ao equilíbrio (ΔG =0). Em geral, o sinal de ΔG determina a direção na qual
uma reação química ocorrerá. As reações onde o equilíbrio libera energia e favorece a
formação do produto, são ditas exergônicas e são espontâneas (então ΔG < 0 é negativo).
As reações endergônicas são desfavoráveis termodinamicamente e absorvem energia
(então ΔG > 0 é positivo).
No entanto, mesmo para as reações espontâneas (ΔG < 0), algumas reações
não alcançam o equilíbrio, pois existe uma barreira energética entre a transformação
dos reagentes a produtos. Essa barreira possui uma energia de ativação ou ΔG‡. Os
catalisadores aceleram a velocidade da reação por diminuírem a energia de ativação.
Sendo assim, ΔG‡ mais baixa significa uma reação mais rápida.
Quando os reagentes são transformados em uma reação, passam por um
estado de transição, um estado intermediário e instável em que a reação pode tanto
continuar quanto voltar. Nas reações enzimáticas, a reação ocorre por um caminho
alternativo, criando um estado de transição, com energia de ativação menor e formação
de complexos transitórios que colaboram com a eficiência da catálise.
A reação S⇌P (com ou sem enzima) pode ser descrita por um diagrama de
coordenada da reação que representa a variação de energia durante a reação (Figura 13).
79
Figura 13 – Diagrama da coordenada da reação comparando uma reação catalisada por enzima com uma
não catalisada
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.193)
Na reação S à P, os intermediários ES e EP ocupam o nível mínimo na curva da pro-
gressão da energia de uma reação catalisada por uma enzima. Os termos DG‡não
catalisada e DG‡catalisada correspondem, respectivamente, à energia de ativação
da reação não catalisada e à energia de ativação total da reação catalisada. A energia
de ativação é menor quando a reação é catalisada por uma enzima.
O complexo ES é o primeiro passo na catálise enzimática e alguns modelos de
interação ES foram propostos que ajudam a entender o mecanismo das enzimas.
• O modelo chave e fechadura exemplifica a especificidade pelo substrato. Trata-se,
porém, de um modelo rígido, não explicando toda a complexidade da catálise e o
estado de transição.
• O modelo de ajuste induzido é o mais aceito e mostra como a ligação do substrato
induz uma mudança de conformação na enzima, para uma conformação que possui
propriedades catalíticas aumentadas.
Essa interação entre a enzima e o substrato é acompanhada de liberação de
energia livre, ou energia de ligação, proveniente das interações fracas que estabilizam
a reação.
A energia de ligação atua na redução da entropia, mantendo o substrato em
uma melhor orientação, e, na dessolvatação, a enzima substitui as ligações do substrato
com a água (ou seja, excluindo as moléculas de água que eram um impedimento para
a reação).
O mecanismo de ação das enzimas pode variar. Uma vez que o substrato está
ligado à enzima, alguns grupos catalíticos específicos contribuem para a catálise no
complexo ES, ajudando no rompimento ou formações de ligações:
80
• A catálise ácido-base refere-se à transferência de prótons mediada por certos
aminoácidos e não água.
• A catálise covalente forma ligação covalente transitória, onde alguns grupos
funcionais ou coenzimas servem como agentes nucleofílicos.
• A catálise por íons metálicos realiza interação iônica entre metais ligados a enzimas
e substrato.
5.2 CINÉTICA ENZIMÁTICA
A cinética enzimática determina a velocidade das reações químicas catalisadas
pelas enzimas e quais os fatores que afetam a velocidade das reações enzimáticas.
Os cientistas Leonor Michaelis e Maud Menten propuseram um modelo para
estudar a ação enzimática em que a enzima e o substrato formam um complexo ES a uma
certa constante de velocidade (k1) e reversível (k-1). E em seguida complexo ES é rompido
em uma segunda etapa mais lenta (k2), fornecendo a enzima regenerada e o produto P.
A velocidade da reação depende da concentração crescente de substrato,
deslocando o equilíbrio para formação do complexo ES.
Para mensurar a velocidade em um experimento de cinética enzimática,
o valor da enzima é fixado, sou seja, a concentração total de enzima é a mesma. A
concentração do substrato varia, sempre adicionando muito mais substrato que enzima.
Utiliza-se apenas o tempo inicial em que a velocidade inicial (𝑉𝑜) está relacionada com
a concentração do substrato. Ou seja, o início representa melhor a velocidade da reação
e esta é a velocidade inicial. Conforme vai aumentando a concentração do substrato,
a velocidade é alterada, o que mostra que a concentração do substrato interfere na
velocidade da reação.
Sendo assim, com essas informações, é possível construir um gráfico de
velocidade inicial (𝑉𝑜 em µM/min) pela concentração do substrato ([S] em mM). O gráfico
resultante é uma curva hiperbólica (Figura 14 e 15).
Na parte inferior da curva, a velocidade depende da concentração do substrato ([𝑆]
em mM). Na parte superior da curva, o aumento da concentração do substrato não mais altera
a velocidade da reação (em µM/min), e a reação está na sua velocidade máxima (𝑉má𝑥).
Ao longo de todo o processo, a enzima pode estar livre (E) ou formando o complexo,
ligada ao substrato (ES). Aumentando a concentração de substrato, teremos um momento
em que 50% da enzima estará livre e 50% na forma de complexo ES. Nesse momento de
50%, podemos também concluir que temos metade da 𝑉má𝑥 acontecendo nessa reação.
81
A [S] detectada a uma velocidade de reação igual a metade de 𝑉má𝑥 é chamada
de constante de Michaelis-Menten, 𝐾𝑚 onde 𝐾𝑚 = 𝑉má𝑥/2.
Figura 14 – Dependência da velocidade inicial da concentração de substrato
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.203)
Figura 15 – Velocidades iniciais de reações catalisadas por enzimas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.201)
Este gráfico mostra os parâmetros cinéticos que definem os limites da curva em [S]
elevada e baixa. Em baixa [S], Km>>[S], e o termo [S] no denominador na equação de
Michaelis-Menten se torna desprezível. A equação fica simplificada a V0 = Vmáx[S]/
Km, e V0 apresenta uma dependência linear de [S], como observado aqui. Em alta
[S], quando [S] >>Km, o termo Km, denominador na equação de Michaelis--Menten,
torna-se desprezível, e a equação fica simplificada a V0 = Vmáx, o que é consistente
com o platô observado em [S] elevada. A equação de Michaelis-Menten é, portanto,
consistente com a dependência observada de V0 por [S], e a forma da curva é defi-
nida pelos termos Vmáx/Km em baixa [S] e Vmáx em alta [S].
82
Uma enzima teórica catalisa a reação S⇌P. A enzima está presente em uma
concentração suficiente para catalisar a reação a uma velocidade máxima, Vmáx,
de 1 mM/min. A constante de Michaelis, Km (explicada no texto), é 0,5 mM. Estão
mostradas as curvas de progressão da reação para as concentrações abaixo,
exatamente no Km e acima dele. A velocidade de uma reação catalisada por uma
enzima diminui à medida que o substrato é convertido em produto. A tangente de
cada curva, no tempo zero, define a velocidade inicial, V0, de cada uma das reações.
A velocidade da reação com um único substrato, catalisada pela enzima, é
descrita na equação de Michaelis-Menten (𝑉𝑜 =𝑉má𝑥 [𝑆] / 𝐾𝑚 + [𝑆]).
Essa reação pode ser simplificada quando 𝑉𝑜 =𝑉má𝑥/2, de forma que 𝐾𝑚 = [𝑆],
ou seja, 𝐾𝑚 é numericamente igual à concentração do substrato e fornece uma medida
de [𝑆], para que ocorra uma catálise significativa. Essa equação é denominada cinética
do estado estacionário, na qual a concentração de ES e dos intermediários permanecem
constantes ao longo do tempo.
O valorde 𝐾𝑚 (em M) também é utilizado como inverso da medida de afinidade
entre a enzima e o substrato. Quanto menor o Km, maior a afinidade. Por exemplo a
enzima hexocinase pode ter como substrato a glicose ou a frutose. O Km para a glicose
é de 0.15mM, nessa [S] essa enzima está na metade da sua 𝑉má𝑥, porém para a frutose
é necessária uma concentração 10x maior (km= 1,50 mM) para se obter a metade 𝑉má𝑥.
Ou seja, a hexocinase teria maior afinidade pela glicose, e menos afinidade pela frutose.
A enzima quando saturada é descrita pela constante Kcat, que define o número
de renovação ou número máximo de moléculas de substratos convertidos em produto
por segundo.
A relação que Kcat/𝐾𝑚 fornece medida de eficiência catalítica. Os valores de
Kcat/𝐾𝑚 na ordem de 108 e 109 M-1s-1, estão próximos a perfeição cinética de uma
enzima, onde todo encontro entre a enzima e o substrato, resultará em um produto. A
enzima anidrase carbônica é um exemplo de eficiência da enzima com alto valor Kcat/
Km. Essa enzima acelera (de forma reversível) a hidratação de CO2, formando o ânion
bicarbonato (HCO3
-). Na catálise, o CO2 se acopla ao sítio catalítico e recebe o ataque
nucleofílico de OH- para formar HCO3
-, que possui função de sistema tampão no sangue
dos mamíferos. O bicarbonato é um ácido fraco e pode ser revertido CO2 e H2O quando
o pH diminui.
Na maioria das reações, dois ou mais substratos podem ligar-se à enzima e
participar da reação, como ocorre no exemplo da fosforilação da glicose pela enzima
hexocinase: Glicose + ATP ⇌ Glicose-6-fosfato + ADP. As velocidades dessas reações
de bissubstrato também podem ser analisadas pela abordagem de Michaelis-Menten. A
hexocinase tem um Km característico para cada um dos seus substratos.
83
Outros fatores, além da concentração do substrato podem influenciar a atividade
enzimática como a temperatura e o pH. Isso porque as enzimas dependem de pH ótimo
no qual a atividade catalítica seja máxima, sendo que atividade catalítica decresce em
pH maior ou menor. O aumento da temperatura pode favorecer a velocidade das reações
químicas. No entanto, algumas proteínas podem sofrer desnaturação e, assim, acarretar
alteração na sua função.
Um exemplo de reação enzimática é a da enzima α-amilase salivar (ou
ptialina), uma hidrolase que tem a função de degradar carboidratos, na boca. Ela é
predominantemente produzida pelas glândulas parótidas e pâncreas.
No laboratório, a presença do carboidrato amido nos alimentos é detectada pela
formação de um complexo amido-iodo (principalmente com a amilose) que desenvolve
uma cor azul intensa. O desaparecimento dessa cor é observado, adicionando saliva,
pois a α-amilase faz a hidrólise das ligações α (1-4) das cadeias do amido, produzindo
glicose, maltose e oligossacarídeos. A coloração azul diminui proporcionalmente à
atividade enzimática, comparado com um controle.
As enzimas podem ser inibidas de forma reversível ou irreversível. Os inibidores
da atividade enzimática possuem um papel regulador no organismo e são também
usados como agentes farmacêuticos. A determinação do tipo de inibidor pode ser
visualizada em um gráfico duplo-recíproco (gráfico 1/V0 versus 1/[S]) (Figura 16).
A inibição reversível pode ser de 3 tipos:
• Com inibidor competitivo, o inibidor tem estrutura similar ao substrato e compete
pelo sítio ativo da enzima. Forma um complexo EI que não leva a catálise. A análise
cinética mostra alteração de Km, com um valor maior, o Km aparente.
• Com o inibidor não competitivo, o inibidor liga-se à um sítio ativo distinto do
substrato no complexo ES, formando ESI, que impede a formação do produto. Na
avaliação cinética, Km permanece inalterado, mas, como a enzima fica inativa, a
𝑉má𝑥 é reduzida, dependendo da concentração do inibidor.
• Com inibição mista, o inibidor liga-se tanto à enzima quanto ao complexo ES
alterando tanto Vmá𝑥 quanto Km.
Os inibidores irreversíveis inativam a enzima fazendo ligações estáveis, ou
destroem um grupo funcional essencial para a ativação da enzima. Os inibidores
irreversíveis suicidas inativam a enzima usando o próprio mecanismo de reação da
enzima e são muito utilizados no planejamento de fármacos.
84
Figura 16 – O gráfico duplo-recíproco possibilita uma maneira fácil de determinar se o inibidor de uma
enzima é competitivo, incompetitivo ou misto
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.209)
A penicilina é um antibiótico do tipo betalactâmico que faz inibição irreversível
da enzima transpeptidase, a qual, por sua vez, confere a rigidez da parede bacteriana
para evitar a lise osmótica. A resistência das bactérias é conferida pela presença da
enzima beta-lactamases, que cliva o anel betalactâmico do antibiótico. Os antibióticos
mais potentes possuem em sua composição o ácido clavulônico, que é inibidor suicida
das beta-lactamases.
Outro exemplo de inibidor irreversível é a aspirina, que transfere um grupo
acetila para enzima Cox. Isso inativa a enzima e libera o ácido salicílico. A Cox é uma
enzima responsável pela síntese das prostaglandinas que regulam vários processos
fisiológicos e a dor.
5.3 REGULAÇÃO DA ATIVIDADE ENZIMÁTICA
O controle da catálise é crucial para a vida. Através de mecanismos reguladores,
as células catalisam apenas as reações que necessitam em determinados momentos.
A energia química é usada de forma econômica. As enzimas regulatórias presentes nos
processos metabólicos influenciam na velocidade de toda a sequência de reações. As
enzimas alostéricas possuem locais de ligação além do sítio ativo, esses outros locais
são específicos para cada modulador ou efetor alostérico. Tais enzimas não obedecem
a cinética de Michaelis-Menten, pois respondem a múltiplos efetores que interferem
na velocidade máxima e na constante de Michaelis-Menten. Essas enzimas exibem
gráficos com curva de saturação sigmóide e não uma curva hiperbólica.
A regulação de enzimas também pode acontecer por modificações covalentes
reversíveis que podem alterar as propriedades locais da enzima, podendo ter a adição
de um grupo fosfato (fosforilação), de um grupo metila (metilação), entre outros. Podem,
ainda, ser moduladas por proteínas internas como a ubiquitina e a sumo.
85
Algumas enzimas são sintetizadas na forma de precursores inativos, chamados
zimogênios, que serão transformados em enzima em outro local.
5.4 COENZIMAS E VITAMINAS
Algumas enzimas necessitam de um componente químico ou grupo prostético
denominado cofator. São íons inorgânicos como Fe2+, Mg2+, Mn2+ e o Zn ou uma
coenzima, que pode ser uma molécula orgânica ou metalogênica como as derivadas
das vitaminas. A enzima completa, junto com seu grupo prostético é denominada
holoenzima. A parte proteica de uma dessas enzimas é denominada apoenzima ou
apoproteína.
As vitaminas são micronutrientes vitais que não são sintetizados de forma
endógena, sendo obtida principalmente por meio da dieta. Existem dois grupos
principais de vitaminas, as lipossolúveis, essas são mais facilmente armazenadas em
gordura após a absorção e as hidrossolúveis, estas não ficam armazenadas e requerem
ingestão regular para evitar a deficiência. A maioria das coenzimas são vitaminas ou são
derivadas de vitaminas.
As vitaminas lipossolúveis incluem as vitaminas A, D, E e K. As vitaminas
lipossolúveis desempenham papéis essenciais em vários processos fisiológicos, como
visão, saúde óssea, função imunológica e coagulação (Figura 17).
As vitaminas hidrossolúveis incluem vitamina C e complexo de vitamina B
(tiamina, riboflavina, niacina, ácido pantotênico, piridoxina, biotina, folato e cobalamina).
As coenzimas estão também envolvidas em uma variedade de processos
metabólicos no corpo humano. A coenzima NAD (nicotinamida adenina dinucleotídeo)
desempenha um papel fundamental no processo de respiração celular para gerar
energia para as células. Está envolvida em várias outras reações importantes no corpo,
incluindo a degradação da glicose e a síntese de ácidosgraxos. A coenzima FAD (flavina
adenina dinucleotídeo) é outra coenzima que desempenha um papel fundamental
no metabolismo. Está envolvida em várias reações importantes no corpo, incluindo a
quebra de ácidos graxos e a produção de energia. Também está envolvido na síntese
de certos aminoácidos e na desintoxicação de drogas e outras substâncias nocivas no
corpo. Tanto o NAD quanto o FAD são essenciais para o bom funcionamento do corpo e
são normalmente obtidos da dieta na forma de vitaminas.
86
Figura 17 – A produção da vitamina D3 e o metabolismo
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.373)
(a) O colecalciferol (vitamina D3) é produzido na pele pela radiação UV sobre o
7-desidrocolesterol, que rompe a ligação que está em cor salmão. No fígado, um grupo
hidroxila é adicionado ao C-25; no rim, uma segunda hidroxilação em C-1 produz o
hormônio ativo, 1a,25-di-hidroxivitamina D3. Este hormônio regula o metabolismo do
Ca2++ no rim, no intestino e nos ossos. (b) A vitamina D da dieta evita o raquitismo, uma
doença comum em climas frios, em que as roupas pesadas bloqueiam o componente
UV da luz solar necessário para a produção da vitamina D3 na pele. Neste detalhe de
um grande mural de John Steuart Curry, Os benefícios sociais da pesquisa bioquímica
(1943), as pessoas e os animais à esquerda representam os efeitos da nutrição pobre,
incluindo as pernas arqueadas de um menino com raquitismo clássico. À direita estão
as pessoas e os animais mais saudáveis com os “benefícios sociais da pesquisa”,
incluindo o uso da vitamina D para prevenir e tratar o raquitismo. Este mural está no
Departamento de Bioquímica na Universidade de Wisconsin-Madison.
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RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
• As proteínas são uma classe de macromoléculas que desempenham diversas
funções na célula.
• Os aminoácidos são os monômeros que formam as proteínas. Cada aminoácido
contém um grupo carboxila (-COOH), um grupo amino (-NH3+), um carbono α, um
hidrogênio (H) e uma cadeia lateral ou grupo R que difere.
• Existem 20 aminoácidos principais. Os aminoácidos estão ligados entre si por
ligação peptídica para formar os peptídeos e proteínas.
• As proteínas são organizadas em quatro níveis: primário, secundário, terciário e
quaternário.
• Mudanças estruturais da proteína podem levar à desnaturação da proteína e perda
de função.
• As enzimas são proteínas que aceleram a velocidade das reações reduzindo a
energia de ativação e não são consumidas durante uma reação.
• As enzimas podem ser inibidas de forma reversível ou irreversível.
• As vitaminas são obtidas da dieta e são essenciais para o funcionamento de enzimas
que requerem cofatores.
88
AUTOATIVIDADE
1 As macromoléculas são fundamentais para o funcionamento de todos os seres
vivos, desempenhando papéis importantes em processos como armazenamento de
energia, estrutura celular e transporte de informações. Sobre as macromoléculas,
assinale a alternativa INCORRETA:
a) ( ) As quatro principais macromoléculas essenciais à vida são proteínas, lipídios,
carboidratos e ácidos nucléicos.
b) ( ) As macromolécula são composta de subunidades menores chamadas
monômeros.
c) ( ) Todas as quatro macromoléculas são compostas dos mesmos monômeros,
porém em configurações moleculares diferentes.
d) ( ) Cada macromolécula têm funções específica na célula.
2 As proteínas são macromoléculas complexas que desempenham uma ampla
variedade de funções no organismo. Sua estrutura é composta por quatro níveis:
estrutura primária, secundária, terciária, além da estrutura quaternária. A estrutura da
proteína é crucial para sua função e pode ser alterada por vários agentes, conhecidos
como agentes desnaturantes, tais como mudanças na temperatura, pH, soluções
salinas etc. Acerca dos níveis estruturais das proteínas são afetados por agentes
desnaturantes, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Estrutura primária e secundária.
b) ( ) Estrutura terciária e quaternária.
c) ( ) Estrutura secundária, terciária e quaternária.
d) ( ) A estrutura da proteína não é afetada por agentes desnaturantes.
3 As vitaminas são moléculas essenciais para o nosso organismo. Várias doenças são
causadas por deficiência de vitaminas. O raquitismo é uma doença associadas a
carência de de determinada vitamina. Acerca dessa vitamina, assinale a alternativa
CORRETA:
a) ( ) D.
b) ( ) E.
c) ( ) A.
d) ( ) B.
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4 Os aminoácidos são as unidades básicas das proteínas. Os aminoácidos essenciais
não são sintetizados pelo organismo, como a isoleucina, leucina, valina, fenilalanina,
metionina, treonina, triptofano, lisina e histidina. Enquanto os aminoácidos não
essenciais podem ser sintetizados pelo organismo, a partir de outros precursores.
São os aminoácidos alanina, ácido aspártico, asparagina, ácido glutâmico e a serina.
Descreva a estrutura geral de um α-aminoácido e como eles se diferem?
5 As reações químicas que ocorrem nos seres vivos são catalisadas por enzimas. As
enzimas aumentam a velocidade dessas reações, tornando-as mais eficientes e
permitindo que os processos biológicos aconteçam rapidamente. Uma das variáveis
que afeta a velocidade de uma reação enzimática é a concentração do substrato.
Em um experimento a concentração do substrato X (denominado Sx), é baixa. O que
acontece com a velocidade da reação catalisada por enzima se a concentração de Sx
for aumentada?
90
91
ESTRUTURA E FUNÇÃO DE
CARBOIDRATOS E LIPÍDIOS
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tema de aprendizagem 2, abordaremos duas importantes
macromoléculas, que participam no fornecimento de energia da maioria dos animais e
plantas, os carboidratos e lipídios.
Os carboidratos são um grupo de macromoléculas que são fonte de energia
vital para a célula e fornecem suporte estrutural para células vegetais, fungos e todos
os artrópodes.
Os lipídios são uma classe de macromoléculas de natureza apolar e hidrofóbica.
Os principais tipos incluem gorduras e óleos, ceras, fosfolipídios e esteroides. Os lipídios
desempenham muitas funções diferentes em uma célula, são fontes de energia para
uso a longo prazo na forma de gorduras e fornecem isolamento do ambiente para
plantas e animais.
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
2 CARBOIDRATOS
Os carboidratos como o açúcar e o amido são a principal fonte para a produção
de energia na maioria das células não fotossintéticas. A fórmula empírica do carboidrato é
Cn(H2O)n, em que, para cada carbono, há uma água. Logo o termo “carbono hidratado”. O
n na fórmula representa um determinado número, no mínimo, os carboidratos são de 3C.
Os carboidratos são divididos em 3 classes principais: mono-; di-; e polissacarídeos.
A palavra “sacarídeo” é derivada do grego sakcharon, que significa “açúcar”.
2.1 MONOSSACARÍDEOS
Os monossacarídeos (chamados de “oses” açucares simples) são sólidos
incolores, cristalinos, solúveis em água e com sabor adocicado. São constituídos por
uma única unidade de aldeído (C=O, grupo carbonil na extremidade, com C ligado ao
hidrogênio) ou cetona (grupo carbonil entre carbonos), e que apresentam pelo menos
dois grupos hidroxilas.
92
Os açúcares que possuem aldeído são chamados de aldoses, e os que tem
função cetona são chamados de cetoses. O mais simples são as trioses de 3 carbonos,
como os gliceraldeídos (aldotrioses) e di-hidroxicetonas (cetotrioses). As demais
classificações são de tetroses de 4C, pentoses de 5C, hexoses de 6C e heptoses de 7C.
Na nomenclatura, os carbonos do açúcar começam a ser numerados a partir
da extremidade da cadeia mais próxima ao grupo carbonil. Os monossacarídeos de
6C, D-glicose e a D-frutose são os mais comuns na natureza. As pentoses, D-ribose e
2-deoxi-D-ribose são os componentes dos ácidos nucleicos (Figura 18).
Na projeção de Fischer, a cadeia de carbonos é escrita na vertical, com o grupo
carbonil próximo ou na extremidade.
Figura 18 – Monossacarídeos representativos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.244)
(a) Duas trioses, uma aldose e uma cetose. Ogrupo carbonil em cada molécula está
sombreado. (b) Duas hexoses comuns. (c) As pentoses componentes de ácidos
nucleicos. A D-ribose é um componente do ácido ribonucleico (RNA) e a 2-desóxi-
D-ribose é um componente do ácido desoxirribonucleico (DNA).
A maioria dos açúcares possuem pelo menos um centro quiral com um carbono
assimétrico ligado a quatro átomos ou grupos diferentes, permitindo que existam
formas isoméricas opticamente ativas. Sendo assim, os açúcares podem apresentar 2
estereoisômeros possíveis, L e D, sendo enantiômeros, ou seja, são imagens especulares
(é a imagem no espelho) e não são sobrepostas (Figura 19).
O número de carbonos assimétricos (n) determina o número de isômeros,
utilizando-se a expressão 2n, por exemplo, uma aldohexose com quatro carbonos
assimétricos possui n= 4, logo o número de isômeros é 24 =16, sendo que 8 destes da
forma D e 8 da forma L.
93
Figura 19 – Três maneiras para representar os dois enantiômeros do gliceraldeído
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.245)
Os enantiômeros são imagens especulares um do outro. Modelos de esfera e bastão
mostram a verdadeira configuração das moléculas. Lembre-se de que, nas fórmulas
em perspectiva, a extremidade larga da cunha sólida projeta-se para fora do plano
do papel, em direção ao leitor; na cunha descontínua, ela se estende para trás.
Por convenção, L e D referem-se à configuração similar ao gliceraldeído,
sendo L grupo -OH na esquerda, e D grupo -OH na direita do carbono assimétrico. As
estruturas D e L não são interconversíveis e, portanto, são biologicamente diferentes.
Em organismos, as hexoses são isômeros D, porém alguns açúcares também ocorrem
na forma L (lembrando que as proteínas são isômeros L).
Açúcares epímeros são aqueles que diferem na configuração das hidroxilas de
apenas 1 carbono. Por exemplo, a D-manose é um epímero de D-glicose porque os dois
açúcares diferem apenas na configuração em C2.
Em solução aquosa, monossacarídeos com mais de 5 carbonos normalmente
ocorrem como estruturas cíclicas, em anéis que são representados pela perspectiva de
Haworth (Figura 19).
94
Figura 20 – Convenção-chave
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.247)
Para converter uma fórmula de projeção de Fisher de qualquer D-hexose linear em
uma fórmula em perspectiva de Haworth mostrando a estrutura cíclica da molécula,
desenhe o anel de seis membros (cinco carbonos e um oxigênio, na direita superior),
numere os átomos no sentido horário começando com o carbono anomérico, e,
então, coloque os grupos hidroxila.
Os açúcares que formam anéis com 6 elementos parecem-se com o pirano e
são piranoses (como a glicose, uma aldose); já os que formam anéis com 5 elementos
parecem-se com o furano e são furanoses (como a frutose, uma cetose). Essa estrutura
forma-se a partir de uma reação do grupo hidroxila -OH de álcoois, que ataca o
grupamento carbonila presente nos aldeídos e cetonas do próprio carboidrato, formando
o anel. Essa reação forma o hemiacetal (nos aldeídos) ou hemicetal (nas cetonas).
Na forma cíclica, o carbono anomérico - isto é, o átomo de carbono que continha
o grupo carbonil na forma linear, produz um novo centro quiral com 2 configurações
possíveis: α-anômero e β-anômero. Esses se interconvertem em soluções aquosas
por um processo chamado mutarrotação. Em solução, a D-glicose é uma mistura dos
anômeros α e β, sendo a β-D-Glicose predominante (Figura 20).
95
A reação entre o grupo aldeído em C-1 e o grupo hidroxila em C-5 forma uma ligação
hemiacetal, produzindo um dos dois estereoisômeros, os anômeros a e b, que
diferem apenas na estereoquímica do carbono hemiacetal. Esta reação é reversível.
A interconversão dos anômeros a e b é chamada de mutarrotação. (direita) Piranoses
e furanoses. As formas piranose da D-glicose e as formas furanose da D-frutose
estão mostradas aqui como fórmulas em perspectiva de Haworth. Os limites do
anel mais próximos ao leitor são representados por linhas mais grossas. Os grupos
hidroxila abaixo do plano do anel nestas perspectivas de Haworth apareceriam à
direita em uma projeção de Fischer (compare com a Figura 7-6). Pirano e furano
estão mostrados para comparações.
Figura 21 – Formação das duas formas cíclicas da D-glicose
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.247 – 248)
Os açúcares como a glicose podem agir como redutores, logo são moléculas
reativas. Os átomos do carbono anomérico (C1 nas aldoses e C2 nas cetoses) são
capazes de reduzir agentes oxidantes contendo íons metálicos (como Cu2+).
Em laboratório, a reação de Benedict identifica açucares redutores. Nesse
experimento, o reagente Benedict de cor azulada constituída por Cu(OH)2, sofre reação
de redução pela presença de um açúcar redutor e a formação do óxido cuproso (Cu2O),
que tem cor vermelho tijolo. Essa propriedade redutora foi por muito tempo utilizada
para medir glicose na corrente sanguínea e na urina.
Os açúcares simples podem ser convertidos em compostos derivados com
função metabólica e estrutural nos organismos. Os derivados da hexose são açúcares
96
com substituições no grupo hidroxila. A glicosamina, por exemplo, está substituída pelo
grupo amino chamado de aminoaçúcares.
A oxidação dos monossacarídeos em C1 pode formar os ácidos aldônicos, e, em
C6, os ácidos urônicos, estes possuem importante função nos tecidos conjuntivos de
mamíferos.
A condensação de ácido fosfórico com um dos grupos hidroxila de um açúcar
forma um éster de fosfato, essas moléculas participam em muitas vias metabólicas.
2.2 DISSACARÍDEOS E OLIGOSSACARÍDEOS
Os dissacarídeos são formados a partir da ligação covalente entre monossacarí-
deos, chamados de O-glicosídicas. (Figura 21) Essa ligação é formada pela condensação
entre o hemiacetal e o álcool liberando H2O.
Figura 22 – Formação da maltose
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.252)
Um dissacarídeo é formado a partir de dois monossacarídeos (aqui, duas moléculas
de D-glicose) quando um ¬OH (álcool) de uma molécula (à direita) se condensa
com o hemiacetal intramolecular da outra (à esquerda), com a eliminação de H2O
e a formação de uma ligação glicosídica. O inverso desta reação é uma hidrólise
– ataque da ligação glicosídica pela água. A molécula de maltose, mostrada aqui,
conserva um hemiacetal redutor no C-1 não envolvido na ligação glicosídica. Como a
97
mutarrotação interconverte as formas a e b do hemiacetal, as ligações nesta posição
algumas vezes são representadas por linhas onduladas, conforme mostrado aqui,
para indicar que a estrutura pode ser tanto α quanto β.
A sucrose é um dissacarídeo, conhecido como a sacarose de mesa, formada a partir
da condensação do C1 da D-glicose com C2 da D-frutose, formando GLC (α1- 2β)FRU.
A lactose é um dissacarídeo formada pela ligação da D-galactose e D-glicose.
A lactose requer uma enzima específica para quebrar essa ligação. À medida que o
ser humano envelhece, uma característica evolutiva dessa enzima é a perda da sua
expressão em pessoas de certas regiões do mundo.
Os oligossacarídeos são polímeros curtos, de monossacarídeos. São geralmente
encontrados ligados a proteínas e a lipídios.
Os polímeros de açúcares redutores, apresentam em uma extremidade o
carbono anomérico livre que é a extremidade com função redutora. Por outro lado,
os açucares não redutores como a sacarose, o carbono anomérico está envolvido na
ligação glicosídica impossibilitando a molécula de reagir.
2.3 POLISSACARÍDEOS
A maioria dos carboidratos encontrados na natureza ocorre como polissacarídeos
(polímeros de muitos monossacarídeos) de alta massa molecular, chamados de
glicanos. Os polissacarídeos possuem diversas funções, atuando no armazenamento,
na fonte de intermediários de energia; na estrutura de ácidos nucleicos; na estrutura da
parede celular; e na interação célula-célula.
São classificados como (Figura 22):
• Homopolissacarídeos, polímeros que contêm o único monossacarídeo. Por exemplo:
amido, glicogênio, celulose.
• Heteropolissacarídeos, polímerosque contêm mais de um tipo de monossacarídeo.
Exemplos: peptidoglicanos das bactérias, glicosaminoglicanos na matriz extracelular
dos tecidos.
98
Figura 23 – Homo e heteropolissacarídeos
Figura 24 – Glicogênio e amido
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.254)
Os polissacarídeos podem ser compostos por um, dois ou alguns monossacarídeos
diferentes, em cadeias lineares ou ramificadas de vários comprimentos.
O amido é a forma de armazenamento da glicose nas plantas. Exemplos são o
arroz, a batata e o milho. O amido contém 2 tipos de polímeros de glicose: a amilose não
ramificada, em que os monossacarídeos estão unidos por ligações α1-4, adotando um
rearranjo tipo hélice; e a amilopectina, que pode também fazer ligações de ramificação
do tipo α1-6 nas extremidades não redutoras.
O glicogênio é o principal polissacarídeo de armazenamento em células animais.
Possui mais ramificações e é mais compacto que o amido e com menos acesso à água.
Possui apenas uma ponta redutora, o que deixa a molécula menos reativa. É abundante
no fígado e está presente nos músculos esqueléticos como fonte de energia rápida.
A quebra de glicogênio é feita a partir das várias extremidades não redutoras, o que
permite produzir mais glicose rapidamente (Figura 23).
99
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.256)
(a) Segmento curto de amilose, polímero linear de resíduos de D-glicose em ligações
(a1S4). Uma única cadeia pode conter alguns milhares de resíduos de glicose. A
amilopectina tem trechos de resíduos ligados de maneira similar, situados entre
pontos de ramificação. O glicogênio tem a mesma estrutura básica, porém é mais
ramificado do que a amilopectina. (b) Ponto de ramificação (a1S6) no glicogênio ou na
amilopectina. (c) Agrupamento de amilose e amilopectina como o que supostamente
ocorre nos grânulos de amido. Fitas de amilopectina (em preto) formam estruturas em
hélice dupla umas com as outras ou com fitas de amilose (em azul). A amilopectina
tem pontos de ramificação (a1S6) frequentes (em vermelho). Os resíduos de glicose
nas extremidades não redutoras das ramificações mais externas são removidos
enzimaticamente durante a mobilização do amido para produção de energia. O
glicogênio tem estrutura similar; porém, é mais ramificado e mais compacto.
No laboratório, o reagente de lugol contém o iodo que forma complexos corados
com os polissacáridos, produzindo uma cor azul intensa na presença das cadeias
helicoidais da amilose, enquanto na presença de polissacarídeos mais ramificados como
o glicogênio, a interação com o iodo será menor, e a coloração menos intensa.
A celulose é uma substância fibrosa insolúvel em água com funções estruturais.
É linear, sem ramificações, formando fitas longas e retas que interagem com as fitas
vizinhas por ligações de hidrogênio. As unidades de glicose são unidas em configuração
β1-4 que não podem ser quebradas por enzima dos animais vertebrados. Entretanto,
em animais ruminantes, microrganismos simbióticos fazem a hidrólise da celulose. Para
os seres humanos, a celulose são fibras alimentares, importantes para o funcionamento
intestinal.
A quitina é similar à celulose, com uma substituição da hidroxila em C2 por um
grupo amina acetilado. Os resíduos de N-acetilglicosamina em ligações β1-4 forma
longas cadeias retas com função estrutural. É o principal componente do exoesqueleto
duro de invertebrados como insetos e crustáceos.
100
3 GLICOCONJUGADOS
Os glicoconjugados são moléculas em que o carboidrato está ligado a uma
proteína (os proteoglicanos ou glicoproteínas) ou a um lipídio (os glicolipídios).
Possuem importantes funções no transporte de informações, bem como no
reconhecimento e na interação entre células. A glicobiologia estuda a estrutura e
função dos glicoconjugados.
Figura 25 – Glicoconjugados
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.263)
As estruturas de alguns proteoglicanos, glicoproteínas e glicoesfingolipídeos típicos
descritos no texto.
Os proteoglicanos são macromoléculas da superfície das células ou da matriz
extracelular, contendo uma proteína (o cerne proteico) ligada por ligação tetrassacarídica
a várias cadeias de açúcar – os glicosaminoglicanos sulfatados (como o heparan-
sulfato, sulfato de condroitina, dermatan sulfato ou queratan sulfato). O grupo negativo
do açúcar faz com que esse complexo tenha, em volta de si, grandes quantidades de
água, proporcionando a viscosidade e lubrificação das articulações.
101
Figura 26 – Interações entre as células e a matriz extracelular
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.263)
A associação entre as células e os proteoglicanos da matriz extracelular é mediada
por uma proteína de membrana (integrina) e por uma proteína extracelular
(fibronectina, neste exemplo) que tem sítios de ligação tanto para integrina quanto
para proteoglicano. Observe a proximidade na associação das fibras de colágeno
com a fibronectina e o proteoglicano.
Muitos proteoglicanos podem se ligar a uma única molécula de ácido hialurônico
e formar os agregados proteoglicano. Esses agregados ficam entrelaçados com as
proteínas fibrosas de matriz – como o colágeno, a elastina e a fibronectina – e garantem
força elasticidade à matriz extracelular (Figura 25).
As glicoproteínas são glicoconjugados menores de proteína e glicanos. São exem-
plos a imunoglobulina G, certos hormônios e proteínas do leite, como a lactose-albumina.
A ligação do oligossacarídeo com a proteína se dá por:
• O-ligado, em que -OH do resíduo serina ou treonina (da proteína) liga-se ao
carboidrato.
• N-ligado, em que o nitrogênio da amida de um resíduo Asn (da proteína) se liga ao
carboidrato.
As alterações genéticas na adição de resíduos de açúcar a uma proteína (a
glicosilação de proteínas) causam graves problemas no desenvolvimento físico e
mental, podendo ser fatais para o indivíduo.
102
Os glicolipídios são carboidratos ligados aos lipídios. Os glicoesfingolipídios são
componentes da membrana plasmática, com uma “cabeça” de carboidrato que serve
como ponto de interação. Os grupos sanguíneos ABO são exemplos de glicolipídios que
diferem entre si na cabeça de monossacarídeo.
Os lipopolissacarídeos são glicolipídios presentes na superfície externa das
bactérias gram-negativas, que são alvos do sistema imunológico dos hospedeiros.
As lectinas são proteínas que se ligam com especificidade aos carboidratos.
São importantes para o reconhecimento celular, sinalização, adesão e destino de outras
moléculas. (Não confundir com leptina, que é um hormônio, e lecitina, que é um lipídio).
As lectinas estão presentes nas bactérias e nos vírus e reconhecem glicolipídios na
superfície celular do hospedeiro.
Em humanos, as lectinas, selectinas, são proteínas da membrana plasmática
presente em certas células, controlam a interação entre células, como por exemplo, a
de leucócitos com as células endoteliais em um sítio de infecção.
Figura 27 – Função das interações lectina-ligante durante a movimentação de leucócitos para um sítio de
infecção ou ferimento
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 270)
Um leucócito movendo-se ao longo de um capilar é desacelerado por interações
transitórias entre moléculas de selectina-P da membrana plasmática das células
endoteliais do capilar e glicoproteínas ligantes de selectina-P da superfície do
leucócito. Por interagir com moléculas de selectina-P consecutivas, o leucócito rola
sobre a superfície do capilar. Próximo a um sítio de inflamação, interações mais fortes
entre integrinas da superfície do leucócito e seus ligantes na superfície do capilar
levam a uma adesão firme. O leucócito para de rolar e, sob a influência de sinais
enviados a partir do sítio de inflamação, começa a extravasar – escapar através da
parede do capilar –, movendo-se em direção ao sítio de inflamação.
103
4 LIPÍDIOS
Os lipídios são compostos químicos com a propriedade comum de solubilidade
em solventes orgânicos (como clorofórmio e o metano) e são insolúveis em água. A pa-
lavra lipos significa “gordura”no grego. Os lipídios possuem diversas funções biológicas
como moléculas de reserva, como vitaminas lipossolúveis, exercem papel de hormônios
e são os constituintes das membranas celulares. Eles podem ocorrer como moléculas
híbridas como os glicolipídios (carboidratos + lipídios) e lipoproteínas (lipídios + proteínas).
Podem ser classificados como lipídios de armazenamento ou lipídios simples
(ácidos graxos), lipídios de membranas ou lipídios compostos (fosfolipídios e glicolipídios),
ou ainda, como sinalizadores (hormônios), cofatores enzimáticos (vitaminas lipossolúveis
A, D, E e K) e pigmentos (como a clorofila).
4.1 ÁCIDOS GRAXOS
A maioria dos lipídios apresentam ácidos graxos em sua estrutura. Os ácidos
graxos são moléculas anfipáticas por serem constituídas tanto por um grupo polar, da
cabeça – COOH, como apolar, da cadeia hidrocarboneto alifática.
Os ácidos graxos geralmente têm um número par de carbono (C4 a C36),
separados em cadeia curta até 4C, cadeia média até 10C e cadeia longa, acima de
12C. Os mais comuns são aqueles que contêm de 12 a 24 carbonos. Podem apresentar
somente ligações simples em sua estrutura de hidrocarbonetos – os ácidos graxos
saturados – ou uma ou mais ligações na configuração cis – os ácidos graxos insaturados
ou poliinsaturados, conhecidos como PUFA (polyunsaturated fatty acids).
Os ácidos graxos insaturados podem ser convertidos em ácidos graxos
saturados pela hidrogenação. Quando a conversão é incompleta, forma ácidos graxos
insaturados com a ligação na posição trans, conhecidos como gorduras trans. Essas
gorduras ocorrem em baixa quantidade na natureza e estão presentes em alimentos
industrializados, sendo o seu consumo associado às doenças cardiovasculares.
Em solução aquosa, os ácidos graxos se aproximam, formando interações
hidrofóbicas. Ácidos graxos saturados unidos apresentam uma maior rigidez devido
ao alinhamento ordenado das suas cadeias alifáticas. Por outro lado, as duplas ligações
dos ácidos graxos insaturados causam uma dobra na cadeia, proporcionando uma maior
desordem no conjunto (Figura 27). Essa característica tem consequências no ponto de
fusão e na determinação dos lipídios no estado solido ou líquido. No estado líquido,
em temperatura ambiente, os óleos possuem maior porcentagem de ácidos graxos
poliinsaturados.
104
Figura 28 – O empacotamento de ácidos graxos em agregados estáveis
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.359)
A extensão do empacotamento depende do grau de saturação. (a) Duas
representações do ácido esteárico completamente saturado, 18:0 (estearato em pH
7), em sua conformação normal estendida. (b) A ligação dupla cis (em vermelho) no
ácido oleico, 18:1(D9) (oleato), restringe a rotação e introduz uma dobra rígida na
cauda hidrocarbonada. Todas as outras ligações na cadeia estão livres para rotação.
(c) Os ácidos graxos completamente saturados na forma estendida empacotam-se
em arranjos quase cristalinos, estabilizados por muitas interações hidrofóbicas. (d)
A presença de um ou mais ácidos graxos com ligações duplas cis (em vermelho)
interfere nesse agrupamento compacto e resulta em agregados menos estáveis.
4.2 TRIGLICERÍDEOS
Os ácidos graxos são comumente esterificados ao grupo hidroxila do glicerol
(chamados de ésteres de glicerol) e podem formar os monoacilgliceróis, diacilgliceróis e
triacilgliceróis (ou triglicerídeos) (Figura 28).
Os triacilgliceróis são compostos apolares e hidrofóbicos e estão presentes em
grandes quantidades em óleos e gorduras e com importante papel biológico de reserva
energética, isolamento térmico e proteção contrachoques. Eles acumulam-se no tecido
adiposo, e sua metabolização gera um equivalente energético (por kg) muito maior que
os carboidratos.
105
Figura 29 – O glicerol e um triacilglicerol
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.359)
O triacilglicerol misto mostrado aqui tem três ácidos graxos diferentes ligados à
cadeia do glicerol. Quando o glicerol apresenta ácidos graxos diferentes em C-1 e
C-3, o C-2 é um centro quiral. (direita) Depósitos de gordura nas células. (a) Secção
transversal de tecido adiposo branco de humanos. Cada célula contém uma gotícula
de gordura (branco) tão grande que espreme o núcleo (corado em vermelho) contra
a membrana plasmática. (b) Secção transversal de uma célula de cotilédone de
uma semente da planta Arabidopsis. As estruturas grandes e escuras são corpos
proteicos, que estão rodeados por gordura de armazenamento nos corpos oleosos,
de coloração clara.
A diferença na composição de ácidos graxos entre gorduras animais e vegetais
determinam suas propriedades físicas, como o ponto de fusão. Os triacilgliceróis das
gorduras animais são ricos em ácidos graxos saturados conferindo uma consistência
sólida à temperatura ambiente. Em contraste, os óleos vegetais são ricos em ácidos
graxos insaturados e permanecem líquidas à temperatura ambiente.
As ceras, como nas colmeias, são formadas por ésteres de ácido graxo de
cadeia longa com álcoois de cadeia curta. Sua temperatura de fusão é maior que os
triacilgliceróis (Figura 29).
106
Figura 30 – Cera biológica
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.362)
(a) Triacontanoilpalmitato o principal componente da cera de abelha, é um éster de
ácido palmítico com o álcool triacontanol. (b) Favo de mel, construído com cera de
abelha, firme a 25°C e completamente impermeável à água.
No laboratório, a reação de saponificação, forma os sabões encontrados
comercialmente. Essa reação ocorre através do tratamento de óleos com soluções
alcalinas concentradas, que resulta na liberação do glicerol e formação de sais de
ácidos graxos, originados pela incorporação do sódio à molécula de ácido graxo. Os sais
de ácidos graxos apresentam uma característica anfipática onde em solução aquosa
diminuem a tensão superficial da água formando espuma sob agitação.
Os lipídios saponificáveis são os ácidos graxos e lipídios compostos como
fosfolipídios e glicolipídios. Os demais lipídios não saponificáveis são os esteróis,
terpenos (compostos de isoprenos) e prostaglandinas.
Os esteróis são lipídios que contêm um sistema de 4 anéis de carbono fusiona-
dos. O colesterol possui uma cabeça (-OH), um álcool, ligado ao carbono saturado dos
anéis (Figura 30).
Figura 31 – Colesterol
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.368)
107
Na estrutura química do colesterol, os anéis são denominados A a D para simplificar a
referência aos derivados do núcleo esteroide; os átomos de carbono estão numerados
em azul. O grupo hidro-xila do C-3 (sombreado em azul) é o grupo cabeça polar. Para
armazenar e transportar o esterol, esse grupo hidroxila se condensa com um ácido
graxo para formar um éster de esterol.
O colesterol tem um importante papel nas membranas celulares, mas também
é precursor de hormônios, ácidos biliares e vitaminas. A alta concentração de colesterol
no sangue está associada ao desenvolvimento da aterosclerose, depósito de lipídios
nos vasos sanguíneos, nas doenças cardiovasculares.
5 MEMBRANAS BIOLÓGICAS E TRANSPORTE
As membranas das células, ou membranas plasmáticas, possuem uma estrutura
de bicamada lipídica. As membranas delimitam a célula, separando o ambiente externo
do interno, porém possibilitando o transporte de íons e moléculas para dentro e fora delas.
Os principais lipídeos de membrana são (Figura 31):
• Os fosfolipídeos (como os glicerofosfolipídeos e esfingofosfolipídeos).
• Os glicolipídeos (como os esfingoglicolipídeos, galactolipídeos e sulfolipídeos).
• As membranas também contêm esteróis, como o colesterol nos animais e
fitocolesterol nos vegetais.
108
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Todos os tipos de lipídeos representados aqui têm ou glicerol ou esfingosina como
esqueleto (em cor salmão), ao qual estão ligados um ou mais grupos alquila de
cadeia longa (em amarelo) e um grupocabeça polar (em azul). Em triacilgliceróis,
109
glicerofosfolipídeos, galactolipídeos e sulfolipídeos, os grupos alquilas são ácidos
graxos em ligação éster. Os esfingolipídeos contêm um único ácido graxo em
ligação amida com o esqueleto de esfingosina. Os lipídeos de membrana de
arqueias são variáveis; aqueles representados aqui têm duas cadeias alquilas muito
longas e ramificadas, cada extremidade em ligação éter com a porção glicerol. Nos
fosfolipídeos, o grupo cabeça polar está unido por meio de ligação fosfodiéster,
enquanto os glicolipídeos têm uma ligação glicosídica direta entre o açúcar do grupo
cabeça e o esqueleto de glicerol.
Nos glicerofosfolipídeos, uma das posições do glicerol é ocupada por um
fosfato, enquanto as outras duas são compostas de ácido graxo. O fosfato está
unido por ligação fosfodiéster ao C3 do glicerol e, na outra extremidade, liga-se a um
grupo substituinte X variado, como um aminoálcool, a serina ou colina, formando, por
exemplo, a fosfatidilcolina. O grupo substituinte pode estar carregado ou neutro, e essas
diferenças contribuem para propriedades na superfície da membrana.
Os fosfolipídios são anfipáticos e anfifílicos, o que significa que eles possuem
regiões hidrofóbicas e hidrofílicas na mesma molécula. Ou seja, uma região hidrofílica,
a “cabeça” contendo o fosfato, grupo X e o glicerol ligados a uma “cauda” hidrofóbica
com duas cadeias longas e apolares de ácidos graxos. Essa estrutura faz com que
quando misturados em água, os fosfolipídios formem agregados, agrupando sua porção
hidrofóbica e deixando o grupo hidrofílico em contato com a água. Ao se agregarem,
as moléculas apolares reduzem a área exposta à água, formando micelas, vesículas e
a bicamada lipídica, dependendo das características de seus ácidos graxos. (Figura 33)
Figura 33 – Agregados lipídicos anfipáticos formados na água
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.388)
(a) Em micelas, as cadeias hidrofóbicas dos ácidos graxos são sequestradas no
núcleo da esfera. Praticamente não há água no interior hidrofóbico. (b) Na bicamada
aberta, todas as cadeias laterais acil, exceto aquelas das margens da lâmina, estão
110
protegidas da interação com a água. (c) Quando a bicamada bidimensional se dobra
sobre ela mesma, ela forma uma bicamada fechada, uma vesícula oca tridimensional
(lipossomo) envolvendo uma cavidade aquosa.
Os ácidos graxos podem formar um éster com um aminoálcool, a esfingosina,
e formar um esfingolipídio que não contém glicerol. Podem conter um grupo fosfato
em sua estrutura, formando um esfingofosfolipídeo, como a esfingomielina. Os
esfingolipídeos podem também conter um mono- ou oligossacarídeo e são conhecidos
como glicolipídios, globosídeo ou glanglosídeo.
Os glicoesfingolipídios são importantes determinantes dos diferentes grupos
sanguíneos no sistema ABO. (Figura 33) Os glicoesfingolipídeos estão presentes nas
membranas das células, sendo abundantes no sistema nervoso.
Figura 34 – Glicoesfingolipídeos como determinantes dos grupos sanguíneos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.368)
Os grupos sanguíneos humanos (O, A, B) são determinados em parte pelos
grupos de oligossacarídeo da cabeça desses glicoesfingolipídeos. Os mesmos três
oligossacarídeos também são encontrados ligados a certas proteínas do sangue de
indivíduos dos tipos sanguíneos O, A e B, respectivamente. Os símbolos-padrão para
açúcares são utilizados aqui.
O modelo do mosaico fluido descreve a estrutura da membrana plasmática
formada pela bicamada lipídica, onde os fosfolipídeos anfipáticos se arranjam por meio
de interação hidrofóbica de forma que apenas a cabeça polar entra em contato com a
111
Figura 35 – Dois estados extremos da bicamada lipídica.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.368)
a) No estado ordenado líquido (Lo), os grupos polares das cabeças são arranjados
uniformemente na superfície, e as cadeias acila quase não apresentam movimento,
estando agrupadas em uma geometria regular. (b) No estado líquido desordenado
(Ld), ou estado fluido, cadeias acila sofrem muito mais movimentação térmica e não
apresentam organização regular. O estado dos lipídeos em membranas biológicas é
mantido entre esses extremos.
água (do meio extracelular e intracelular), enquanto as caudas apolares ficam na parte
interna da membrana.
A fluidez das membranas depende da sua composição. A presença de mais
ácidos graxos saturados leva a uma maior compactação e maior rigidez. Por outro lado,
as dobras dos ácidos graxos insaturados resultam em maior fluidez. A quantidade de
esteróis aumenta a rigidez, pois preenche os espaços vazios. A estrutura da membrana
pode ser alterada por temperatura (Figura 34).
A distribuição dos lipídios entre as lâminas das membranas plasmáticas varia,
gerando uma assimetria da composição lipídica da membrana com consequências na
sua função biológica. Os fosfolipídios da membrana são translocados por enzimas para
passar de um lado para o outro da bicamada, um movimento conhecido como flip-flop.
Esses lipídios também se movimentam por difusão lateral.
Várias proteínas estão embebidas na bicamada lipídica e podem projetar-se para
apenas um lado ou ambos de forma assimétrica. Podem atuar como transportadores,
receptores de membrana, transferindo sinais celulares, e outras, ainda, atuam na
catálise das reações de oxidação, como as proteínas da membrana mitocondrial.
112
As proteínas periféricas estão associadas à superfície de uma membrana celular
por meio de vários tipos de interações não covalentes, como pontes de hidrogênio ou
ligações iônicas. Essas proteínas podem ser extraídas da membrana por tratamento
com ureia ou soluções salinas concentradas, que podem interromper as interações
não covalentes que mantêm a proteína na membrana. As proteínas periféricas são
tipicamente solúveis em água, como por exemplo a o citocromo c, que desempenha um
papel fundamental na cadeia de transporte de elétrons.
As proteínas integrais estão embebidas na membrana através de interações
hidrofóbicas. Exemplo são as integrinas, caderinas e lectinas que promovem adesão
célula, compõe a matriz extracelular e são pontes de ligação.
5.1 TRANSPORTE DE BIOMOLÉCULAS
As membranas biológicas são permeáveis a moléculas apolares, como oxigênio
e dióxido de carbono. No entanto são impermeáveis aos solutos polares ou carregados,
como íons e açúcares.
O transporte de biomoléculas pela membrana pode ocorrer de forma ativa ou
passiva, conforme descrito a seguir:
• Na difusão simples, solutos apolares se movem a favor do gradiente de concentração
até o equilíbrio ser alcançado.
No entanto, se o soluto for carregado eletricamente, o equilíbrio é alcançado
pela combinação do potencial elétrico (Vm) e da razão entre a concentração dos solutos
através da membrana, chamado de gradiente ou potencial eletroquímico:
• As proteínas transportadoras ou permeases realizam transporte passivo com
difusão facilitada do soluto a favor do gradiente eletroquímico.
• Os canais iônicos apresentam especificidade para íons, e a direção é determinada
pelo gradiente eletroquímico. Esses canais podem funcionar por “portões”
controlados por voltagem ou ligante (Figura 35).
• Os ionóforos são transportadores de íon a favor do gradiente eletroquímico.
• O transporte ativo primário é realizado contra o gradiente eletroquímico impulsionado
por ATP.
• O transporte ativo secundário é impulsionado pelo movimento iônico de outra
molécula a favor do seu gradiente.
113
Figura 36 – Diferenças entre canais e transportadores
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 404)
(a) Em um canal iônico, um poro transmembrana está aberto ou fechado, dependendo
da posição do único portão. Quando ele estiver aberto, íons passam através dele
com uma velocidade limitada apenas pela taxa de difusão máxima do equilíbrio.
(b) Transportadores (bombas) possuem dois portões, que nunca estão abertos ao
mesmo tempo. O movimento de um substrato (um íon ou uma pequena molécula)
através da membranaé, portanto, limitado pelo tempo necessário para um portão
abrir e fechar (em um lado da membrana) e para o segundo portão abrir. A velocidade
de movimento através dos canais iônicos pode ter ordens de magnitude acima da
velocidade de movimento através das bombas, porém os canais permitem o fluxo
dos íons apenas a favor de seus gradientes eletroquímicos, enquanto bombas
podem mover substratos contra o seu gradiente de concentração.
A glicose que entra nos eritrócitos é um exemplo de difusão facilitada. (Figura 36)
O seu transportador, o GLUT1, é uma proteína integral que passa por duas conformações
para mover a glicose a favor do seu gradiente de concentração, que é normalmente para
dentro da célula. A glicose que entra na célula é rapidamente metabolizada, mantendo-
se baixas suas concentrações intracelulares.
114
Figura 37 – Modelo de transporte de glicose para dentro do eritrócito pelo GLUT1
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 404)
O transportador existe em duas conformações: T1, com o sítio de ligação de glicose
exposto na superfície externa da membrana plasmática, e T2, com o sítio de ligação
exposto na superfície interna. O transporte de glicose ocorre em quatro passos. 1 A
glicose do plasma sanguíneo se liga ao sítio estereoespecífico em T1; isso reduz a
energia de ativação para 2 uma mudança conformacional a partir de glicosefora·T1
para glicosedentro· T2, efetuando a passagem transmembrana da glicose. 3 A glicose
é liberada de T2 para o citoplasma, e 4 o transportador retorna à conformação T1,
pronto para transportar outra molécula de glicose.
O transporte ativo é o principal consumo de energia da célula (Figura 37). O
transporte ativo primário está acoplado à uma reação exergônica como a conversão
de ATP para ADP + Pi, gerando a energia necessária para o transporte do soluto. Um
exemplo é o transporte de ABC que bombeia biomoléculas e fármacos para fora da
célula. Nas células tumorais, esse tipo de transportador, a Glicoproteína P, é responsável
pela resistência dos tumores a certos fármacos.
No transporte ativo secundário, o fluxo endergônico de um soluto está acoplado
ao fluxo exergônico de outro soluto.
As proteínas transportadoras podem atuar em sistema de co-transporte e
simultaneamente carregar dois solutos através da membrana. Quando os dois solutos
se movem em direções opostas, isso é chamado de antiporte; e quando se movem na
mesma direção, de simporte.
115
Figura 38 – Dois tipos de transporte ativo
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.409)
(a) No transporte ativo primário, a energia liberada pela hidrólise de ATP impulsiona
o movimento de soluto (S1) contra o gradiente eletroquímico. (b) No transporte ativo
secundário, o gradiente de um íon X (S1) (geralmente Na1) se estabelece por transporte
ativo primário. O movimento de X (S1) a favor de seu gradiente eletroquímico provê
agora energia para impulsionar o cotransporte de um segundo soluto (S2) contra
seu gradiente eletroquímico.
Todas as células apresentam em suas membranas a bomba eletrogênica (que
carregam solutos com carga) de Na+ e K+. Essas proteínas são canais iônicos que
utilizam a energia do ATP e bombeiam para fora da célula 3 íons de Na+ e ao mesmo
tempo trazem para dentro da célula 2 íons de K+. Isso resulta em um desequilíbrio iônico
que produz o potencial de membrana nas células, isso é essencial nos neurônios para a
condução do potencial de ação.
116
Figura 39 – Papel da Na+ e K+. ATPase em células animais
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 412)
Em células animais, o sistema de transporte ativo é responsável principalmente pelo
estabelecimento e manutenção das concentrações intracelulares de Na1 e K1 e pela
geração do potencial de membrana. Ele faz isso ao movimentar três Na1 para fora
da célula para cada dois K1 que move para dentro. O potencial elétrico através da
membrana plasmática é fundamental na sinalização de neurônios, e o gradiente de
Na1 é usado para impulsionar “morro acima” o cotransporte de solutos em muitos
tipos celulares.
As moléculas de água se movimentam pela membrana plasmática através
dos canais chamados de aquaporinas (Figura 39). Esses canais são especificamente
projetados para permitir o movimento de moléculas de água através da membrana.
Em alguns casos, as aquaporinas também podem regular o fluxo de outras moléculas
pequenas. São encontrados em todos os tipos de organismos, desde bactérias até
plantas e animais. As aquaporinas facilitam o rápido movimento das moléculas de
água através da membrana, permitindo que as células mantenham sua hidratação e
funcionem adequadamente.
117
Figura 40 – Aquaporina
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.420)
A proteína é um tetrâmero de subunidades idênticas, cada qual com um poro
transmembrana. (a) Um monômero da aquaporina de espinafre SoPIP2;1 (derivado
do PDB ID 2B5F), visto no plano da membrana. As hélices formam um poro central,
e dois segmentos helicoidais curtos (em verde) contêm as sequências Asn-Pro-Ala
(NPA), encon-tradas em todas as aquaporinas que formam parte do canal de água.
(b)Esse desenho de aquaporina 1 bovina (derivado do PDB ID 1J4N) mostra que o
poro (em marrom; preenchido com moléculas de água mostradas em vermelho
e branco) se estreita em His180 para um diâmetro de 2,8 Å (aproximadamente o
tamanho da molécula de água), limitando a passagem de moléculas maiores do que
H2O. A carga positiva de Arg195 repele cátions, incluindo o H3O1, impedindo sua
passagem pelo poro. As duas hélices curtas mostradas em verde estão orientadas
com seus dipolos carregados positivamente apontando para o poro, de forma a
forçar a molécula de água a se reorientar à medida que o atravessa; isso quebra as
cadeias de ligações de hidrogênio nas moléculas de água, impedindo a passagem
de prótons pelo “salto de prótons”.
118
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• Os carboidratos são classificados como monossacarídeos, dissacarídeos e
polissacarídeos.
• Monossacarídeos de cinco ou mais átomos de carbono formam estruturas cíclicas.
Consequentemente, a glicose em solução existe como uma mistura em equilíbrio
de três formas, duas delas cíclicas (α- e β-) e uma de cadeia aberta.
• Os derivados dos monossacarídeos são moléculas com importantes papéis
no metabolismo celular, como os ácidos urônicos, aminoaçúcares e açúcares
fosforilados.
• Os monossacarídeos são unidos por ligações glicosídicas formando dissacarídeos e
polissacarídeos, com a eliminação de uma molécula de água para cada ligação formada.
• Glicose, galactose e frutose são monossacarídeos comuns, enquanto dissacarídeos
comuns incluem lactose, maltose e sacarose.
• Amido e glicogênio são polissacarídeos com função de armazenamento de glicose
em plantas e animais, respectivamente.
• As longas cadeias de polissacarídeos podem ser ramificadas ou não ramificadas. A
celulose é um exemplo de um polissacarídeo não ramificado, enquanto o glicogênio
e amilopectina são moléculas altamente ramificadas.
• Glicoconjugados são carboidratos ligados a moléculas de proteína ou lipídeos, e são
os proteoglicanos, glicoproteínas e glicolipídios.
• Os lipídios são uma classe de macromoléculas de natureza apolar e hidrofóbica. Os
principais tipos incluem gorduras e óleos, ceras, fosfolipídios e esteroides.
• Os ácidos graxos com apenas ligações simples são conhecidos como ácidos graxos
saturados. Os ácidos graxos insaturados podem ter uma ou mais ligações duplas na
cadeia de hidrocarbonetos.
• O colesterol é um tipo de esteroide, sendo importante constituinte da membrana
plasmática, onde ajuda a manter a fluidez da membrana.
• Triacilgliceróis ou triglicerídeos são compostos três ácidos graxos ligados ao glicerol,
formando uma molécula hidrofóbica, com função de armazenamento de energia.
119
• As células são envoltas por uma membrana celular, a bicamada lipídica composta
principalmente de fosfolipídios, glicolipídios e colesterol. As proteínas são também
importante componentes das membranas biológicas.• O transporte de biomoléculas pela membrana pode ocorrer de forma ativa ou
passiva.
120
AUTOATIVIDADE
1 As macromoléculas que desempenham uma série de funções no organismo e podem
ser classificados de acordo com sua estrutura, tamanho e composição. A celulose e o
amido são exemplos de um tipo de molécula. Acerca desse tipo, assinale a alternativa
CORRETA:
a) ( ) Monossacarídeos.
b) ( ) Homopolissacarídeos.
c) ( ) Lipídios.
d) ( ) Dissacarídeos.
e) ( ) Heteropolissacarídeos.
2 A bicamada lipídica desempenha uma função crucial na manutenção da integridade
da célula e na comunicação celular. Acerca de que é composta a bicamada lipídica
que envolve as células, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Fosfolipídios.
b) ( ) Glicolipídios.
c) ( ) Colesterol.
d) ( ) Todas as alternativas.
3 Os ácidos graxos são constituídos tanto por um grupo polar, da cabeça – COOH, como
apolar, da cadeia hidrocarboneto alifática. Os ácidos graxos são considerados um
determinado tipo de molécula. Acerca desse tipo, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Hidrofílicas.
b) ( ) Anfipáticas.
c) ( ) Hidrofóbicas.
d) ( ) Anfifílicas.
4 Os carboidratos podem ser classificados como monossacarídeos, dissacarídeos
e polissacarídeos. Monossacarídeos são os mais simples de todos, enquanto
dissacarídeos e polissacarídeos são formados por ligação glicosídica. Quais dos dois
compostos abaixo é um monossacarídeo? Explique.
A B
121
5 Os ácidos graxos são uma classe importante de lipídios que desempenham uma
ampla gama de funções em organismos vivos. Os ácidos graxos podem ser saturados
ou insaturados devido a presença de ligações duplas. O ponto de fusão de um
composto é a temperatura na qual ele passa de estado sólido para líquido. Por que os
ácidos graxos insaturados têm pontos de fusão mais baixos do que os ácidos graxos
saturados?
122
123
TÓPICO 3 -
AS MACROMOLÉCULAS DA INFORMAÇÃO
GENÉTICA
1 INTRODUÇÃO
Os ácidos nucleicos são as macromoléculas mais importantes para a continuidade
da vida. No Tema de Aprendizagem 3, abordaremos uma visão geral da estrutura dos
nucleotídeos, dos ácidos nucleicos DNA e RNA e da transmissão do material genético.
Essas moléculas carregam a informação genética que contém as instruções
para o funcionamento da célula encontrado em todos os organismos vivos.
Estão envolvidas no fluxo das informações celulares que compõem o dogma
central da biologia proposto por Francis Crick em 1958, onde as informações presentes
no DNA são um conjunto de instruções que podem ser transcritas para o RNA e que são
então traduzidas para combinar aminoácidos e assim produzir as proteínas da célula.
UNIDADE 2
2 ESTRUTURA E FUNÇÃO DOS ÁCIDOS NUCLEICOS
Os ácidos nucleicos, DNA – Ácido desoxirribonucleico (do inglês, DesoxyiboNu-
cleic acid) – e o RNA, ácido ribonucleico (do inglês, RiboNucleic acid), são polímeros de
unidades de nucleotídeos. Possuem um papel biológico de armazenamento e transmis-
são da informação genética.
2.1 NUCLEOTÍDEOS
Cada nucleotídeo apresenta 3 componentes característicos (Figura 40): (1) A
Base nitrogenada, pirimidina ou purina; (2) Uma pentose, monossacarídeos aldeídos;
e (3) Um grupo fosfato.
O grupo fosfato em meio aquoso e pH fisiológico é carregado negativamente,
dando o caráter ácido para a molécula. A molécula sem o grupo fosfato é denominada
nucleosídeo (Tabela 5).
Os nucleotídeos possuem 2 tipos de pentoses, na forma de β-furanose (um anel
de furano):
• Para o RNA, a D-ribose possui o grupo -OH no C2’.
• Para o DNA, a 2-desoxi-D-ribose, o grupo -OH do C2’ é substituído do por – H .
124
Assim, se o açúcar for ribose, o resultado é um ribonucleotídeo. Se o açúcar é
desoxirribose, o resultado é um dos quatro desoxirribonucleotídeos.
A numeração do carbono com apóstrofe (´) diferencia-se dos demais carbonos
das bases nitrogenadas. O “D” das pentoses indica a isomeria, com o -OH à direita do
centro quiral na configuração linear.
Figura 41 – Estrutura de nucleotídeos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.282)
(a) A estrutura geral mostrando a convenção numérica do anel de pentose. Esse é um
ribonucleotídeo. Nos desoxiribonucleotídeos, o grupo ¬OH no carbono 2´ (vermelho)
é substituído por H. (b) Os compostos ancestrais das bases pirimídicas e púricas dos
nucleotídeos e dos ácidos nucleicos, mostrando a convenção numérica.
O DNA é estável em condições alcalinas, pois não possui o grupo hidroxila do C2’.
Por outro lado, o 2’-OH do RNA atua como grupamento nucleofílico intramolar, sendo
mais suscetível à hidrólise em condições alcalinas.
As bases nitrogenadas presentes nos ácidos nucleicos são moléculas fracamente
básicas e por isso chamados de bases. Todas as bases nucleotídicas absorvem luz UV,
no comprimento de onda 260nm.
As bases pirimidinas são moléculas planas com um único anel que contém o
nitrogênio. São as citosinas (C), timinas (T) e uracilas (U). As bases purinas possuem 2
anéis. Um anel pirimidina fundido a um anel imidazólico, formando a adenina (A) e na
guanina (G) (Figura 41).
125
Nota: “Nucleosídeo” e “nucleotídeo” são termos genéricos que incluem ambas as
formas ribo ou desoxirribo. Também, ribonucleosídeos ou ribonucleotídeos são aqui
designados simplesmente como nucleosídeos e nucleotídeos (p. ex., riboadenosina
como adenosina), e desoxirribonucleosídeos e desoxirribonucleotídeos como
deso-xinucleosídeos e desoxinucleotídeos (p. ex., desoxirriboadenosina como
desoxiadenosina). Ambas as formas de denominação são aceitas, mas os nomes
mais curtos são mais comumente usados. A timina é uma exceção; “ribotimidina” é
usado para descrever sua ocorrência incomum no RNA.
A ocorrência das bases difere no DNA e no RNA. As bases formam pares
definidos por Watson e Crick de maneira que A é sempre pareado com T, e G é sempre
pareada com C na estrutura do DNA. Enquanto na estrutura do RNA, A é pareado com
U e G com C, principalmente.
Figura 42 – Nomenclatura de nucleotídeo e de ácido nucleico
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.282)
Base Nucleosídeo Nucleotídeo Ácido nucleÍco
Purinas
Adenina Adenosina Adenilato RNA
Desoxiadenosina Desoxiadenilato DNA
Guanina Guanosina Guanilato RNA
Desoxiguanosina Desoxiguanilato DNA
Pirimidinas
Citosina Citidina Citidilato RNA
Desoxicitidina Desoxicitidilato DNA
Timina Timidina ou desoxitimidina
Timidilato ou
desoxitimidilato
DNA
Uracila Uridina Uridilato RNA
O DNA e o RNA são polímeros de nucleotídeos ligados covalentemente por
pontes do grupo fosfato em ligação fosfodiéster, formando um esqueleto hidrofílico de
fosfato e resíduos de pentose alternados (Figura 41).
Nos nucleotídeos, o C1’ da pentose faz uma ligação N-β-glicosídica como o N1
das pirimidinas e o N9 das purinas. Essa ligação é formada pela remoção de H2O (um
-OH da pentose e um H da base); e, do outro lado, o ácido fosfórico está esterificado
com a hidroxila do C5’ da pentose em uma ligação fosfodiéster.
As bases podem ser vistas como grupos laterais ligadas ao esqueleto central. As
extremidades da cadeia nos carbonos 5’ e 3’ não apresentam nucleotídeo.
126
Em um ácido nucleico, a sequência de nucleotídeos é representada de forma
simplificada por uma sequência de letras, com cada letra representando uma base
nitrogenada específica. Por exemplo, a sequência se 5'-ATG-3' representa a sequência
que se inicia com a extremidade 5' e termina na extremidade 3' e as bases nitrogenadas
nos nucleotídeos estão nessa ordem: adenina (A), timina (T) e guanina (G).
Além da sua função de constituintes dos ácidos nucleicos, os nucleotídeos
também apresentam uma variedade de funções no metabolismo celular. Estão
envolvidos no armazenamento de energia química e são componentes das coenzimas
NAD+ e FAD, além da participação de transdução de sinal nos sistemas biológicos.
Os nucleotídeos são formados pela combinação de um nucleosídeo com um
ou dois fosfatos adicionais ligados, como a adenosina monofosfato (AMP), adenosina
difosfato (ADP) e adenosinatrifosfato (ATP). A hidrólise de nucleotídeos como o ATP e
GTP, produz a energia química necessária para as reações celulares.
Figura 43 – Ligações fosfodiéster no esqueleto covalente do DNA e do RNA
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 285)
127
As ligações fosfodiéster (uma das quais está sombreada no DNA) ligam unidades
nucleotídicas sucessivas. O esqueleto de pentose e grupamentos fosfato alternados
nos dois tipos de ácidos nucleicos é altamente polar. As extremidades 5´ e 3´ da
macromolécula podem estar livres ou podem estar ligados a um grupo fosforil.
2.2 ESTRUTURA DO DNA
O DNA é o material genético encontrado em todos os organismos vivos, desde
bactérias unicelulares até mamíferos multicelulares. Na célula podemos encontrar dois
tipos de DNA: o DNA nuclear e o DNA mitocondrial.
O DNA é composto por duas fitas de nucleotídeos unidas por pontes de
hidrogênio. Cada fita de DNA é formada por um esqueleto de açúcar-fosfato, com bases
as nitrogenadas adenina, guanina, citosina e timina.
A estrutura primária do DNA é a sequência covalente de bases que carregam a
mensagem genética. A ordem é sempre lida na direção 5’3’.
A estrutura secundária do DNA refere-se à maneira pela qual duas fitas de DNA
estão enroladas em torno do mesmo eixo para formar uma dupla hélice de orientação
à direita com o esqueleto do lado de fora. O modelo de dupla hélice foi proposto por
Watson e Crick em 1953. (Figura 42)
A determinação da estrutura secundária do DNA foi obtida com base em padrão
de difração de raio X dos estudos de Rosalind Franklin e Wilkins, além de outros dados
de análises químicas que serão descritos a seguir.
As cadeias de dupla fita são complementares e antiparalelas. Na estrutura de
dupla hélice do DNA, cada base de uma fita está pareada com a base da segunda fita,
unidas por ligação de hidrogênio, em que AT forma 2 pontes de hidrogênio, e GC forma
3 pontes de hidrogênio. A especificidade de pareamento entre as bases resulta na regra
de Erwin Chargaff, em que em qualquer amostra de dupla fita de DNA, a quantidade de
A será sempre igual a quantidade de T. E similarmente, G e C. Assim conclui-se que a
somas dos resíduos de purina (A+G) é igual à soma dos resíduos de pirimidina (T + G).
As ligações de hidrogênio, juntamente com as interações de empilhamento de
base contribuem para a estabilidade da dupla hélice.
A quantidade de AT e GC presente na estrutura do DNA interfere na suscetibilidade
da dupla fita de sofrer desnaturação. O DNA rico em pares GC são mais estáveis e com
ponto de fusão maior, sendo essa uma característica utilizada para experimentos
bioquímicos de PCR.
128
As duplas fitas podem ser separadas e sintetizadas em novas fitas
complementares, sendo que cada fita funciona como molde na replicação do DNA. No
laboratório, o DNA pode ser desenrolado e separado em condições de aquecimento ou
em pHs extremos.
Na dupla hélice do DNA, os pares de base estão empilhados perpendicularmente a
uma distância de 3,4 A com 10,5 pares por volta. O pareamento entre as bases na α-hélice
forma espaços vazios nas voltas, chamadas de sulcos ou cavidades maior e menor, que
são sítios para interação de proteínas, ligantes tóxicos e fármacos (Figura 43).
A estrutura proposta por Watson e Crick é conhecida como forma B do DNA,
porém o DNA pode ocorrer em formas tridimensionais diferentes como a forma A
e a forma Z. Outras variações estruturais do DNA são conhecidas como pareamento
alternativo ou tipo não-Watson-Crick.
O DNA pode apresentar outras variações estruturais como nas sequências
palindrômicas, onde as duas fitas possuem a mesma sequência, porém uma é inversa
da outra como na sequência AATT//TTAA. Essas sequências permitem a formação de
estruturas incomuns no DNA, com a formação de grampos. Esse tipo de estrutura
irregular não ocorre nos genes, e são locais de reconhecimento para enzimas de restrição
que efetuam cortes no DNA, sendo uma característica utilizada na terapia genética.
Figura 44 – Modelo de Watson-Crick para a estrutura do DNA
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.289)
129
O modelo original proposto por Watson e Crick tinha 10 pares de bases ou 34 Å (3,4
nm) por volta da hélice; medidas subsequentes revelaram 10,5 pares de bases ou
36 Å (3,6 nm) por volta. (a) Representação esquemática, mostrando as dimensões
da hélice. (b) Representação em bastão mostrando o esqueleto e o empilhamento
de bases. (c) Modelo de volume atômico. (direita) Complementaridade das cadeias
na dupla-hélice de DNA. As cadeias antiparalelas complementares do DNA seguem
as regras propostas por Watson e Crick. As cadeias antiparalelas pareadas por
bases são diferentes na sua composição de bases: a cadeia da esquerda tem a
composição A3T2G1C3; a da direita, A2T3G3C1. Elas também se diferenciam na
sequência quando cada cadeia é lida na direção 5´3´. Observe as equivalências de
bases: A=T e G=C no duplex.
Na estrutura terciária, o DNA pode apresentar-se de uma forma mais condensada
ou empacotada. Em procariotos, o DNA circular de plasmídeos dobra-se sobre si mesmo
e torna-se super torcido e mais compacto.
Nos eucariotos, o DNA encontrado no núcleo pode estar complexado com
proteínas histonas. As histonas são ricas em aminoácidos com cadeias laterais
carregadas positivamente, que fazem ligação eletrostática com as cargas negativas
dos grupos fosfato do DNA. As histonas empacotam e organizam o DNA em unidades
estruturais de nucleossomos. Esses nucleossomos se organizam em estruturas maiores,
formando a cromatina compacta dos cromossomos.
O genoma humano, que é o conjunto completo de material genético presente
em uma célula humana, contém cerca de 3 bilhões de nucleotídeos. Esses nucleotídeos
estão organizados em 23 pares de cromossomos, que são formados por longas cadeias
de DNA. Cada cromossomo contém muitos genes, o segmento de uma molécula de
DNA que codificam as instruções para a produção de proteínas e outras moléculas.
2.3 ESTRUTURA DO RNA
O RNA é composto por apenas uma fita de nucleotídeos. Pode formar uma
estrutura secundária quando a cadeia se dobra sobre si mesma, porém não assume
conformação em dupla hélice. Se houver pareamento, pontes de hidrogênio serão
formadas. As regiões sem pareamento podem formar estruturas tipo alças. O RNA
pode ainda fazer pareamentos não-Watson-Crick. Esses elementos estruturais podem
influenciar a função da molécula de RNA, por exemplo, permitindo que ela se ligue a
outras moléculas ou influenciando sua estabilidade.
Um exemplo característico de uma estrutura secundária de RNA é encontrado
no RNA transportador (tRNA) (Figura 44)
130
A sequência de bases do RNA é complementar à sequência de codificação
do DNA do qual foi copiada. Relembrando que no RNA, a base U ocupa o lugar da
base T. Logo, uma fita de DNA com a sequência AATTGCGCAA, a sequência do RNA
complementar será UUAACGCGUU.
O RNA tende a ser menor em tamanho em comparação com o DNA. No entanto,
o tamanho pode depender de sua função e do organismo em que se encontra. O RNA
é encontrado tanto no núcleo como no citoplasma, e pode exercer diferentes funções.
Por exemplo, as ribozimas são RNA com atividade catalítica similar à das enzimas.
Figura 45 – Estrutura tridimensional do RNA
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 296)
(a) Estrutura tridimensional do tRNA de fenilalanina em levedura (PDB ID 1TRA).
Alguns padrões de pareamento de bases incomuns encontrados neste tRNA estão
mostrados. Observe também o envolvimento do oxigênio de uma ligação fosfodiéster
da ribose em um arranjo de ligação de hidrogênio e um grupo 29-hidroxila da ribose
em outro (ambos em vermelho). (b) Ribozima cabeça-de-martelo (denominada
131
desta forma devido à estrutura secundária no sítio ativo que parece a cabeça de
um martelo), obtida de certos vírus de plantas (obtida de PDB ID 1MME). Ribozimas,
ou enzimas de RNA, catalisam uma variedade de reações, principalmente do
metabolismo de RNA e na síntese proteica. As estruturas tridimensionaiscomplexas
desses RNAs refletem a complexidade inerente na catálise, como descrito para
enzimas proteicas no Capítulo 6. (c) Segmento de mRNA conhecido como íntron,
de um protozoário ciliado Te -trahymena thermophila (obtido do PDB ID 1GRZ). Esse
íntron (uma ribozima) catalisa sua própria excisão do meio dos éxons em uma cadeia
de mRNA.
3 TRANSMISSÃO DO MATERIAL GENÉTICO
A replicação e transcrição são os processos envolvidos na produção de novos
ácidos nucléicos, o DNA ou RNA.
3.1 REPLICAÇÃO
A replicação do DNA é o processo pelo qual as células fazem cópias de seu DNA
antes de se dividirem. Isso garante que cada uma das células filhas receba um conjunto
completo de instruções genéticas.
A replicação do DNA ocorre na fase S (fase de síntese) do ciclo celular. As
principais enzimas que participam desse processo são a DNA polimerase e a DNA
helicase.
A unidade do DNA em que está acontecendo a replicação é conhecida como
replicon. A enzima helicase desenrola a estrutura de dupla hélice da molécula de DNA e
separa as duas fitas. Isso cria uma forquilha de replicação, com uma fita servindo como
modelo para a síntese da nova fita. As bactérias possuem um único replicon, porém os
eucariotos podem ter vários.
Em seguida, uma enzima chamada primase adiciona uma pequena sequência
iniciadora de RNA (primer) às fitas modelo que servem como pontos de partida para a
síntese de DNA.
A replicação do DNA é sintetizada pela DNA polimerase (ou DNA pol). (Figura 45)
Esta polimerase sintetiza as novas fitas adicionando os desoxiribonucleotídeos (dNTP)
às fitas molde, seguindo as regras de pareamento de bases (A com T e C com G).
À medida que a polimerase se move ao longo das fitas molde, ela sintetiza as
novas fitas na direção 5'3', adicionando nucleotídeos um a um, com a liberação do
pirofosfato inorgânico (PPi). O 3´OH livre é ponto no qual o DNA é alongado.
132
Figura 46 – Alongamento da cadeia de DNA
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.1014)
(a) O mecanismo catalítico para a adição de um novo nucleotídeo pela DNA-
polimerase envolve dois íons Mg2+, coordenados aos grupos fosfato do nucleotídeo
trifosfato que chega, ao grupo 39 hidroxila que atuará como nucleófilo e três
resíduos Asp, dois dos quais são altamente conservados em todas as DNA--
polimerases. O íon Mg21 representado na parte de cima facilita o ataque do grupo 39
hidroxila do iniciador ao fosfato a do nucleotídeo trifosfato; o outro íon Mg21 facilita
o deslocamento do pirofosfato. Ambos os íons estabilizam a estrutura do estado de
transição pentacovalente. As RNA-polimerases usam um mecanismo semelhante
(b) A atividade da DNA-polimerase I também precisa de uma fita simples não pareada
para atuar como molde e uma fita iniciadora para fornecer o grupo hidroxila livre na
extremidade 3’, à qual a nova unidade de nucleotídeo é adicionada. Cada nucleotídeo
que chega é selecionado em parte pelo pareamento de bases ao nucleotídeo
133
Figura 47 – Definindo as fitas de DNA na forquilha de replicação
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.1013)
Uma nova fita de DNA (vermelho-claro) sempre é sintetizada na direção 5’3’. O
molde é lido na direção oposta, 5’3’. A fita líder é sintetizada continuamente na
direção adotada pela forquilha de replicação. A outra fita, retardada, é sintetizada
descontinuamente em pequenos pedaços (fragmentos de Okazaki) em uma direção
oposta àquela em que a forquilha de replicação se move. Os fragmentos de Okazaki
são ligados pela DNA-ligase. Em bactérias, os fragmentos de Okazaki têm 1.000 a
2.000 nucleotídeos de comprimento. Nas células de eucariontes, eles têm 150 a 200
nucleotídeos de comprimento.
apropriado na fita-molde. O produto da reação tem uma nova hidroxila 3’ livre,
permitindo a adição de outro nucleotídeo. O par de bases recentemente formado
migra para deixar o sítio ativo disponível para o próximo par a ser formado. (c) O
núcleo da maioria das polimerases tem um formato semelhante ao de uma mão
humana que envolve o sítio ativo. A estrutura mostrada é a DNA-polimerase I de
Thermus aquaticus, ligada ao DNA (PDB ID 4KTQ). (d) Uma interpretação do desenho
da estrutura da DNA-polimerase mostra as partes de inserção e pós-inserção no
sítio ativo. O sítio de inserção é onde ocorre a adição de nucleotídeos, e o sítio de
pós-inserção é o local para onde o par de bases recentemente formado migra depois
que aparece.
Como as fitas são antiparalelas, uma fita líder é sintetizada continuamente 5'3',
enquanto a outra terá uma síntese descontínua ou retardada, formando fragmentos de
novas fitas chamados de Okasaki (Figura 46).
134
Os organismos possuem propriedades básicas para replicação do DNA:
• A replicação é semiconservativa, de forma que cada fita mãe de DNA funciona como
molde para a síntese de novas fitas filhas. Assim, cada dupla hélice recém-formada
contém uma fita nova e uma fita velha.
• A replicação começa em uma região específica, a origem, que são regiões ricas em
AT, que desnaturam em temperaturas mais baixas por terem apenas duas pontes
de hidrogênio.
As bactérias possuem várias DNA polimerases, sendo as principais: a DNA
polimerase I e a DNA polimerase III, uma enzima multimérica e a principal responsável pela
síntese pois possui maior velocidade de polimerização (nucleotídeos por segundo) e mais
processividade, que é o número de nucleotídeos formados antes de se soltar do molde.
Os eucariotos possuem 5 tipos principais de DNA polimerases: α, β, γ, ε, δ. As
polimerases α, ε e δ estão mais ativas no processo de divisão celular, enquanto a γ
polimerase é responsável pela replicação do DNA mitocondrial.
A síntese de uma molécula de DNA prossegue em 3 estágios: (1) iniciação, (2)
alongamento e (3) terminação. As informações desses estágios provêm de experimentos
realizados em bactérias, porém os princípios são conservados em todos os sistemas de
replicação.
No estágio (1), iniciação, a DNA polimerase em bactérias associa-se com o DNA
na origem (chamado de OriC).
O estágio (2), elongação, é a fase de síntese da fita líder e da fita descontínua.
Primeiramente, a DNA polimerase com as enzimas acessórias avançam na forquilha de
replicação. Logo após, a fita descontínua é dobrada com a ajuda de um complexo de
proteínas para que a DNA polimerase siga na direção 5'3', fazendo a polimerização de
ambas as fitas. Por fim, os fragmentos da fita descontínua são selados pela DNA ligase
e os primers são removidos.
No estágio (3) de terminação, as duas forquilhas de replicação do cromossomo
circular se encontram. Em seguida, as enzimas topoisomerases quebram ligações,
separando as duas hélices formadas.
A replicação do DNA é um processo altamente preciso com mecanismos que
garantem a fidelidade da replicação. Mesmo assim, erros de replicação podem ocorrer
e serão corrigidos por diferentes mecanismos após a replicação. Esses erros são
chamados de mutações e alguns podem afetar a estrutura e a função da molécula de
DNA com consequências na expressão gênica ou perda de função.
135
No laboratório, a aplicação resultante do conhecimento dos mecanismos de
replicação do DNA é utilizada em técnicas como a de reação em cadeia polimerase
(PCR) e a do sequenciamento de DNA, que abriram novas perspectivas de manipulação
do genoma e novos métodos de diagnóstico.
3.2 TRANSCRIÇÃO
O gene é o segmento de uma molécula de DNA que contém as informações
necessárias para a síntese de um produto com função biológica. A transcrição converte
a informação genética de um gene em um filamento de RNA.
Enquanto o genoma é estável, o transcriptoma, que consiste em todas as
moléculas de RNA produzidas em uma célula, pode ser variável, de acordo com o estado
fisiológico, do tipo de tecidos, das influências externas, dentre outros mecanismos.
O processo de transcrição é realizado pela RNA polimerase.
Os RNA produzidos nesse processo são:
• mRNA, O RNA mensageiro que codifica para a sequência de aminoácidos das
proteínas;• tRNA, O RNA transportador que identifica e transporta aminoácidos até o ribossomo;
• rRNA, O RNA ribossômico que é o constituinte dos ribossomos, responsáveis pela
síntese das proteínas.
Outros RNAs adicionais produzidos têm função regulatória e catalítica.
O mRNA de procariotos pode ser policistrônico, que contém mais de um gene.
Em eucariotos, o mRNA são sempre monocistrônicos, que codificam um único gene. O
mRNA é lido em conjuntos de três bases conhecidas como códons. Cada códon codifica
um único aminoácido.
Nos eucariotos, a transcrição ocorre no núcleo, onde o RNA é processado e
transportado para o citoplasma para realizar tradução. Ao final da transcrição, o RNA
de eucariotos passa por um processamento antes de ser traduzido em proteína no
citoplasma.
Nos procariotos, a transcrição e tradução são processos acoplados que ocorrem
simultaneamente, pois não existe o compartimento do material genético no núcleo.
As RNA polimerases são enzimas que realizam a transcrição. Os procariotos
possuem apenas um tipo de polimerase do RNA. Os eucariotos possuem três tipos de
RNA polimerase:
136
• RNA polimerase I, transcreve genes de rRNA (conhecidos como 5.8S, 28S e 18S).
• RNA polimerase II, transcreve genes que codificam para pre-mRNA.
• RNA polimerase III, transcreve outros RNAs, como o tRNA.
A síntese de RNA pela RNA polimerase é semelhante à do DNA com suas 3
etapas: (1) iniciação, (2) elongação e (3) terminação. Porém, com uma etapa anterior, de
reconhecimento (Figura 47).
Alguns fármacos, como antibióticos, agem interferindo no processo de
transcrição, fazendo ligações com a polimerase. Alguns cogumelos produzem um agente
tóxico que inibe a RNA polimerase em eucariotos. Outros agentes podem intercalar-se
entre os ácidos nucleicos e inibirem a replicação ou transcrição.
Certos vírus de RNA, conhecidos como retrovírus, carregam a enzima
transcriptase reversa que catalisa a síntese de DNA complementar ao RNA viral, após
entrar na célula hospedeira. O DNA viral entra no núcleo e é integrado no genoma do
hospedeiro para ser transcrito posteriormente, gerando proteínas virais.
No laboratório, as transcriptases reversas são utilizadas nas técnicas de
clonagem do DNA, tornando possível a síntese de DNA complementar (cDNA) a partir de
um molde de mRNA.
137
Figura 48 – Início da transcrição e alongamento pela RNA-polimerase da E. coli.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.1064)
O início da transcrição precisa de várias etapas geralmente divididas em duas fases,
ligação e início. Na fase de ligação, a interação inicial da RNA-polimerase com o
promotor leva à formação de um complexo fechado, no qual o DNA promotor é ligado
de maneira estável, mas não desenrolado. Uma região de 12 a 15 pb de DNA
– do interior da região -10 à posição 12 ou 13 – é então desenrolado para formar
um complexo aberto. Intermediários adicionais (não mostrados) foram detectados
nas vias que levam aos complexos fechados e abertos, junto com várias mudanças
na conformação proteica. A fase de iniciação envolve o início da transcrição e a
remoção do promotor (etapas 1 a 4 aqui). Uma vez que o alongamento tenha
começado, a subunidade s é liberada e substituída pela proteína NusA. A polimerase
deixa o promotor e fica comprometida com o alongamento do RNA (etapa 5). Quando
a transcrição está completa, o RNA é liberado, a proteína NusA se dissocia e a
RNA-polimerase se dissocia do DNA (etapa 6). Outra subunidade s se liga à RNA-
polimerase, e o processo se reinicia.
138
O tamanho das macromoléculas é dado em termos de massa molecular (ou peso molecular)
e é tipicamente expresso em dalton (Da ou D), sendo que 1000 D = 1 kilodalton (kD).
A massa molecular das proteínas depende do número e tipo de aminoácidos que elas
contêm. As proteínas podem variar em tamanho, desde pequenas moléculas com massas
moleculares de alguns milhares de daltons até grandes moléculas com massas moleculares
de vários milhões de daltons.
A massa molecular dos carboidratos depende de seu tamanho e complexidade. Açúcares
simples, como a glicose, têm uma massa molecular de cerca de 180 Da, enquanto
carboidratos maiores, como amido e celulose, têm massas moleculares que podem variar
de vários milhares a vários milhões de daltons.
A massa molecular dos lipídios depende do tipo e número de cadeias de ácidos graxos que
eles contêm. Lipídios simples, como ácidos graxos, têm massas moleculares que variam de
200 a 400 Da, enquanto lipídios mais complexos, como triacilgliceróis (gorduras)
e fosfolipídios, têm massas moleculares que podem variar de vários milhares a
várias centenas de milhares de daltons.
A massa molecular dos ácidos nucleicos depende do comprimento de suas
cadeias poliméricas. O DNA e o RNA são compostos de nucleotídeos e sua
massa molecular depende do número dos nucleotídeos que ele contém.
Por exemplo, a massa molecular de uma molécula de DNA com um
comprimento de 10.000 nucleotídeos tem de cerca de 300.000 Da.
www.labxchange.org
www.celuladidatica.ufpr.br/membrana-biologicas.php
https://www.instagram.com/descomplica_doutoras
https://learn.genetics.utah.edu/content/labs/
www.projeto-biologico.arizona.edu/default.html
NOTA
DICA
http://www.labxchange.org
http://www.celuladidatica.ufpr.br/membrana-biologicas.php
https://www.instagram.com/descomplica_doutoras
https://learn.genetics.utah.edu/content/labs/
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139
É o DNA!
HÁ 60 ANOS ERA DESCRITA A PRIMEIRA FORTE EVIDÊNCIA DA RELAÇÃO ENTRE
ÁCIDO NUCLÉICO E HEREDITARIEDADE
Mônica Bucciarelli Rodriguez
Revista Ciência Hoje
Qualquer estudante com um mínimo de informação em biologia sabe que as
características genéticas da grande maioria dos seres vivos são transmitidas de geração
a geração pelo ácido desoxirribonucleico (DNA). No entanto, a primeira demonstração do
papel central desempenhado por essa molécula na hereditariedade ocorreu há apenas
seis décadas, e não foi aceita de imediato.
Uma experiência realizada em 1928 pelo microbiólogo inglês Frederick Griffith
(1877-1941) mostrou, para surpresa geral, que bactérias capazes de causar uma doença
podiam, mesmo depois de mortas, ‘passar’ essa capacidade para bactérias vivas que a
tinham perdido, mas não descobriu como isso ocorria. Esse enigma só seria decifrado em
1944, quando um trabalho de três médicos norte-americanos – Oswald T. Avery (1877-
1955), Colin M. MacLeod (1909-1972) e Maclyn McCarty (1911-) –indicou que o DNA das
bactérias mortas seria o responsável pela transmissão da virulência para as bactérias vivas.
Tal associação era tão surpreendente para a época que, embora ficasse clara
na experiência, recebeu pouco destaque no título do trabalho de Avery e colegas:
‘Estudos sobre a natureza química da substância indutora de transformação de tipos
de Pneumococcus’. A informação mais importante estava no subtítulo – ‘Indução de
transformação por uma fração de ácido desoxirribonucléico isolada de Pneumococcus
tipo III’ –, mas este certamente só chamaria a atenção de especialistas da área.
Qual a razão para tamanho cuidado? A composição química dos ácidos nucléicos
e das proteínas já era conhecida. Sabia-se que os primeiros eram longas moléculas
formadas por apenas quatro tipos de unidades básicas, o que as tornava quimicamente
muito monótonas, sobretudo porque estava em voga a teoria de que o DNA seria uma
longa seqüência de ‘blocos’ idênticos, cada um reunindo quatro diferentes nucleotídeos
(moléculas constituídas de um açúcar específico que se liga a uma base nitrogenada
e a um grupo fosfato). Em contrapartida, sabia-se que as proteínas eram polímeros
formados por 20 aminoácidos diferentes. Assim, apresentavam uma diversidade de
estrutura muito maior, e por isso eram as moléculas mais cotadas como as responsáveis
primárias pela grande diversidade genética dos seres vivos, embora em 1897 o zoólogo
norte-americano Edmund B. Wilson (1856-1939) já tivesse sugerido que esse papel
cabiaa um ácido nucléico. Mas o que Avery, MacLeod e McCarty de fato fizeram?
LEITURA
COMPLEMENTAR
140
Para entender isso, é importante conhecer o experimento precursor, de Fre-
derick Griffith. O microbiólogo trabalhava, no Laboratório de Patologia do Ministério
da Saúde britânico, com pneumococos (nome comum da bactéria Streptococcus
pneumoniae, então conhecida como Pneumococcus, que causa pneumonia), já
classificados anteriormente em diversos tipos. Essa classificação se baseava nas
respostas a anticorpos presentes em soros, que distinguiam o mucopolissacarídeo
(constituinte da cápsula que envolve certas bactérias) específico de cada tipo de
pneumococo. Quando cultivados em placas de petri, em laboratório, os pneumo-
cocos que sintetizam suas cápsulas geram colônias ‘lisas’. A injeção subcutânea
de cultura líquida desses pneumococos em camundongos causa a sua morte. No
entanto, o cultivo in vitro permite também o surgimento de colônias ‘rugosas’, cujas
bactérias perderam a capacidade de sintetizar mucopolissacarídeo (e, portanto, não
têm cápsulas). As mutantes rugosas não podiam mais ser classificadas com os soros
e, além disso, perdiam a virulência: camundongos inoculados com elas permane-
ciam vivos, ao contrário do que ocorria se fossem inoculados com pneumococos
lisos. Griffith mostrou que quando bactérias lisas do tipo III mortas (pela aplicação
de calor) eram misturadas com bactérias rugosas derivadas do tipo II, e depois essa
suspensão mista era inoculada em camundongos, estes morriam, e os pneumoco-
cos vivos recuperados dos corpos eram do tipo III (Figura 1).
141
Figura 1. Pneumococos selvagens do tipo III (que produzem colônias lisas), quando inoculados em camun-
dongos, os matam (A), e pneumococos do tipo II mutantes (que produzem colônias rugosas) perdem a
virulência (B). Em sua experiência, Griffith mostrou que, quando a mistura de pneumococos lisos do tipo
III mortos pelo calor (não virulentos) com bactérias rugosas vivas (C) é injetada nos camundongos, estes
morrem (D), e bactérias selvagens do tipo III são recuperadas de seu organismo. Esse resultado indica que
houve uma transformação das bactérias rugosas pela ação de algum ‘princípio transformante’ contido na
suspensão com bactérias mortas.
O cientista concluiu que uma substância liberada pelas bactérias mortas fazia
com que as bactérias não virulentas mudassem de tipo e voltassem a ser capazes de
matar os camundongos. Ele chamou essa substância de ‘princípio transformante’, e
chamou o processo de transformação, como é conhecido até hoje. Posteriormente, a
transformação de pneumococos foi obtida in vitro – e não apenas em camundongos
(in vivo) – e observada em outros organismos, sendo relacionada a uma alteração de
características genéticas produzida por recombinação de genes.
142
Figura 2. Na experiência de Avery e colegas, foi usada uma fração purificada e não virulenta (A) do extrato
de pneumococos lisos do tipo III, virulentos. Essa fração, rica em DNA, mantinha a capacidade de promo-
ver transformação (B) quando tratada com enzimas que destroem proteínas (proteases), mas perdia essa
propriedade (C) quando tratada com enzimas que degradam DNA (DNAses). Isso revelou que o DNA era o
responsável pela transformação das bactérias – ou seja, era o portador das características genéticas
A natureza do princípio transformante de Griffith permaneceu obscura até
o trabalho de Avery, MacLeod e McCarty. Eles repetiram a transformação in vitro de
pneumococos, no Instituto Rockfeller para Pesquisa Médica, mas substituíram as células
mortas pelo calor por uma fração purificada de extrato de bactérias lisas (incapaz, por
si só, de provocar a doença) e trataram esse material com diferentes enzimas, cada
uma capaz de destruir um tipo específico de macromolécula. A experiência revelou que
essa fração mantinha sua capacidade transformante quando tratada com enzimas que
degradam proteína ou RNA, mas perdia essa capacidade quando tratada com enzimas
143
que degradam DNA (Figura 2). Esses resultados indicavam que a natureza química do
‘princípio transformante’ era DNA. Cientes de que essa conclusão não seria aceita com
facilidade, os autores foram cautelosos na discussão do trabalho, onde escreveram:
“No atual estado de conhecimento, qualquer interpretação do mecanismo envolvido
na transformação tem que ser puramente teórica.” Apesar da cautela, defenderam
que o DNA tinha uma participação não apenas estruturalmente importante, mas
funcionalmente ativa na determinação das atividades bioquímicas e nas características
específicas dos pneumococos.
O tempo e o consequente desenvolvimento da ciência mostraram que Avery
e seus colaboradores estavam certos em sua acanhada proposição. Muitas vezes
aquilo que não parece certo para o senso comum – como a ideia de que o DNA seria
o material genético, e não as proteínas – revela-se absolutamente claro e óbvio
após o esclarecimento de seu mecanismo. Informações curiosas sobre o princípio
transformante e sobre pesquisas realizadas antes e após essa descoberta estão no site
http://profiles.nlm.nih.gov/CC/Views/Exhibit/documents/discovery.html, que traz ainda
uma biografia de Oswald T. Avery. Uma descrição simples e correta da caracterização
estrutural e funcional do DNA, acompanhada de um debate sobre as implicações do
avanço do conhecimento genético, é feita pelo jornalista brasileiro Marcelo Leite em O
DNA (Coleção Folha Explica, 2003).
Apesar da importância da descoberta de Avery e colaboradores e do amplo
reconhecimento que o experimento alcançou no meio científico (é descrito em
praticamente todos os manuais de genética e biologia molecular), seus autores
curiosamente não foram agraciados com o prêmio Nobel.
Fonte: Disponível em: https://www2.icb.ufmg.br/grad/genetica/dna.pdf. Acesso em: 15 mar. 2023.
http://profiles.nlm.nih.gov/CC/Views/Exhibit/documents/discovery.html
https://www2.icb.ufmg.br/grad/genetica/dna.pdf
144
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• Os ácidos nucleicos possuem um papel biológico de armazenamento e transmissão
da informação genética.
• Os ácidos nucleicos são o DNA – Ácido desoxirribonucleico (do inglês,
DesoxyiboNucleic acid) – e o RNA, ácido ribonucleico (do inglês, RiboNucleic acid),
formado por polímeros de nucleotídeos lidos na sequência 5’3’.
• Os componentes dos nucleotídeos são: a base nitrogenada, pirimidina ou purina;
uma pentose, monossacarídeos aldeídos; e um grupo fosfato.
• Os nucleotídeos também apresentam outras funções no metabolismo celular.
• O DNA é formado por duas fitas e possui uma estrutura secundária de dupla hélice
onde as bases são complementares e antiparalelas.
• O RNA é formado de uma fita simples
• Na replicação do DNA, cada fita do DNA original serve como modelo para a síntese
de uma fita complementar.
• A DNA polimerase é a principal enzima necessária para a replicação.
• Na transcrição, um segmento de DNA serve como modelo para a síntese de uma
sequência de RNA.
• A RNA polimerase é a principal enzima necessária para a transcrição.
• Três tipos de RNA são formados durante a transcrição: mRNA, rRNA e tRNA.
145
AUTOATIVIDADE
1 O DNA (ácido desoxirribonucleico) e as proteínas são duas importantes macromoléculas
da célula. O DNA é responsável pelo armazenamento e transmissão da informação
genética, enquanto as proteínas são importantes para várias funções biológicas,
incluindo de estrutura celular, a regulação metabólica e a realização de reações
químicas. Ambos o DNA e as proteínas são compostos de elementos químicos, no
entanto, alguns elementos são encontrados somente em um dos compostos, e não
na outra. Acerca dos elementos que são encontrados no DNA, mas não nas proteínas,
assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Carbono
b) ( ) Nitrogênio
c) ( ) Oxigênio
d) ( ) Fósforo
e) ( ) Enxofre
2 A estrutura do DNA é estabelecida por interações específicas de base entre as duas
fitas complementares formando a duplahélice de DNA. As quatro bases nitrogenadas
encontradas no DNA são adenina (A), citosina (C), guanina (G) e timina (T). A adenina
complementa a timina, enquanto a citosina complementa a guanina.
Uma fita de DNA contendo 20 A, 25 G, 30 C e 22 T, quando completada pela segunda
fita, terá um determinado total de bases. Acerca desse total, assinale a CORRETA:
a) ( ) 40 A, 50 G, 60 C e 44 T
b) ( ) 50 A, 47 G, 50 C e 47 T
c) ( ) 45 A, 45 G, 52 C e 52 T
d) ( ) 42 A, 52 G, 52 C e 42 T
3 A molécula de RNA, ou ácido ribonucleico, é uma molécula importante na biologia
celular, responsável por muitas funções, incluindo a tradução do código genético do
DNA para proteínas. Na molécula de RNA, a adenina faz pareamento com determinada
base. Acerca dessa base, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Citosina.
b) ( ) Timina.
c) ( ) Uracila.
d) ( ) Guanina.
146
4 Uma fita molde de gene de DNA tem a sequência 5′-ATGAGCGACTTTGCGGGATTA-3′.
Qual é a sequência de nucleotídeos complementar no DNA e qual a sequência do
RNA que será formada a partir desse molde?
5 O DNA é uma molécula que armazena informações genéticas, as quais são
responsáveis por regular a expressão gênica, ou seja, a síntese de proteínas. Para
que as informações armazenadas no DNA sejam utilizadas na produção de proteínas,
é necessário que ocorra a transcrição. Qual é o papel do DNA na transcrição? Qual é
o produto formado na transcrição?
REFERÊNCIAS
147
REFERÊNCIAS
BERG, J. M.; STRYER, LU. Bioquímica. 7 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2014.
FERRIER, D. Bioquímica ilustrada. 7 ed. Porto Alegre: Artmed, 2019.
NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 7. ed. Porto Ale-
gre: Artmed, 2019.
NELSON, D. L. & COX, M. M. Princípios de bioquímica. 6. ed. Porto Alegre: Artmed,
2014
RODWELL, V. W. et al. Bioquímica ilustrada de Harper. 31. ed. Porto Alegre: AMGH,
2021.
WILSON, K.; WALKER, J. Principles and Techniques of Biochemistry and Molecular
Biology. 7 ed. Cambridge Univ. Press, 2010.
148
149
PRINCIPAIS VIAS
DO METABOLISMO
E PROCESSOS
BIOENERGÉTICOS
UNIDADE 3 —
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
• compreender como ocorre a transformação, o armazenamento e consumo de
energia dentro das células;
• descrever os princípios da bioenergética e as leis da termodinâmica;
• descrever as principais vias metabólicas;
• identificar os reagentes e produtos da respiração celular e onde essas reações
ocorrem em uma célula.
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar
o conteúdo apresentado.
TEMA DE APRENDIZAGEM 1 – INTRODUÇÃO À BIOENERGÉTICA E AO METABOLISMO
TEMA DE APRENDIZAGEM 2 – METABOLISMO DE LIPÍDIOS, AMINOÁCIDOS E
NUCLEOTÍDEOS
TEMA DE APRENDIZAGEM 3 – METABOLISMO DE CARBOIDRATOS E BIOENERGÉTICA
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TÓPICO 1 —
INTRODUÇÃO À BIOENERGÉTICA E AO
METABOLISMO
UNIDADE 3
1 INTRODUÇÃO
As células desempenham as funções da vida através de várias reações
químicas. A bioenergética é o estudo do fluxo de energia através dos sistemas vivos,
especificamente no nível celular. Ele examina as reações químicas que ocorrem dentro
das células, incluindo aquelas que consomem ou geram energia, que são coletivamente
chamadas de metabolismo.
O metabolismo é necessário para que as células mantenham seu equilíbrio
energético e sustentem os vários processos que ocorrem dentro delas (Figura 1). As vias
metabólicas podem ser categorizadas em diferentes tipos com base em sua estrutura
e função.
Figura 1 – A relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 503)
152
As vias catabólicas liberam energia química na forma de ATP, NADH, NADPH e FADH2.
Esses transportadores de energia são usados em vias anabólicas para converter
precursores pequenos em macromoléculas celulares
As vias catabólicas são vias que degradam moléculas e liberam energia e
são tipicamente convergentes, enquanto as vias anabólicas constroem moléculas
e consomem energia e são tipicamente divergentes. As vias cíclicas envolvem um
composto de partida sendo regenerado por meio de uma série de reações que convertem
outro composto de partida em um produto. A maioria das células tem as enzimas para
realizar as vias catabólicas e anabólicas, sendo que a síntese e degradação são reguladas
para evitar gasto inútil de energia.
O corpo humano possui uma rede complexa de vias metabólicas responsáveis
pela realização de várias reações bioquímicas necessárias para o crescimento, reparo
e manutenção das funções corporais. Essas vias podem ser agrupadas em várias
categorias, incluindo metabolismo lipídico, metabolismo de aminoácidos, metabolismo
de nucleotídeos e metabolismo de carboidratos.
A respiração celular é a culminação final das vias catabólicas, como a glicólise, o
ciclo de Krebs e a cadeia de transporte de elétrons, que convertem a energia armazenada
nas moléculas orgânicas em forma de ATP, a moeda energética da célula.
Acadêmico, no Tema de aprendizagem 1, abordaremos o estudo da bioenergética
e as leis da termodinâmica que descrevem como a energia é transferida e transformada em
um sistema. A variação na energia livre de uma reação pode ser negativa (libera energia,
exergônica) ou positiva (consome energia, endergônica). Todas as reações requerem uma
entrada inicial de energia para prosseguir, chamada de energia de ativação.
Nos sistemas vivos, as células desempenham as funções da vida por meio de
várias reações químicas. O metabolismo de uma célula refere-se à combinação de
reações químicas que ocorrem dentro dela. As reações catabólicas quebram substâncias
químicas complexas em outras mais simples e estão associadas à liberação de energia.
Os processos anabólicos constroem moléculas complexas a partir das mais simples e
requerem energia.
2 PRINCÍPIOS DA BIOENERGÉTICA E TERMODINÂMICA
Uma célula viva opera uma variedade de funções metabólicas e, para manter
esse nível de atividade, ela deve obter e gastar energia. Há um fluxo contínuo de
energia nas células e seus arredores. A bioenergética é o ramo da bioquímica que trata
do estudo das transformações de energia nos organismos vivos. Tem como objetivo
compreender as mudanças de energia que ocorrem nas células vivas e os processos
153
químicos responsáveis por essas mudanças. Analisa as diferentes formas de energia
que as células vivas usam como energia química, energia térmica e energia luminosa,
e como elas são transformadas em outras formas de energia, como o ATP, que a célula
pode usar como moeda energética para realizar suas funções.
A bioenergética também examina o metabolismo energético das células, que
inclui as vias e enzimas envolvidas na produção, armazenamento e uso de energia.
Ele também analisa como as células obtêm energia de seu ambiente, como por meio
da fotossíntese e da respiração celular, e como usam essa energia para realizar os
processos celulares. (Figura 2)
Figura 2 – Algumas Inter conversões de energia em organismos vivos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 21)
154
À medida que a energia metabólica é gasta para realizar o trabalho celular, o grau
de desordem do sistema “mais” o do meio externo (expresso quantitativamente
como entropia) cresce à medida que a energia potencial das moléculas nutrientes
complexas decresce. (a) Organismos vivos extraem energia do seu meio; (b) convertem
parte dela em formas de energia utilizáveis para produzir trabalho; (c) devolvem parte
da energia ao meio na forma de calor; e (d) liberam, como produto, moléculas que
são menos organizadas do que o combustível de partida, aumentando a entropia
do universo. Um efeito de todas estas transformações é (e) o aumento daordem
(aleatoriedade diminuída) do sistema na forma de macromoléculas complexas.
As leis da termodinâmica descrevem como a energia é transferida e
transformada em um sistema. A primeira lei da termodinâmica, também conhecida como
lei da conservação de energia, afirma que a quantidade total de energia no universo é
constante, sendo que a energia pode mudar de forma ou pode ser transportada de uma
região para outra, mas não pode ser criada ou destruída. Sendo assim, a energia é usada
e não gasta, sendo convertida de uma forma para outra.
A segunda lei da termodinâmica afirma que toda transferência ou transformação
de energia aumenta a desordem, ou entropia, do universo, assim a entropia total de
um sistema fechado sempre aumentará com o tempo. No entanto os seres vivos são
altamente ordenados, exigindo a entrada constante de energia para serem mantidos
em um estado de baixa entropia.
A bioenergética utiliza três parâmetros termodinâmicos para descrever as trocas
de energia que ocorrem nas reações químicas: energia livre de Gibbs (G), Entalpia (H) e
Entropia (S). As unidades de energia livre de Gibbs e Entalpia são joules/mol ou calorias/
mol, e a unidade de entropia é joules/mol · Kelvin (J/mol · K), sendo 1 cal = 4, 184 J.
• A energia livre de Gibbs (G) é uma medida da energia disponível para realizar trabalho.
A partir desse parâmetro as reações podem ser classificadas como exergônicas se
ela libera energia livre, resultando em uma mudança negativa na energia livre (ΔG
< 0). Por outro lado, uma reação endergônica é aquela em que o sistema adquire
energia livre, resultando em uma variação positiva na energia livre (ΔG > 0).
• Entalpia (H) é a medida do conteúdo de calor do sistema reagente. Reflete o número
e o tipo de ligações químicas nos reagentes e produtos. As reações são classificadas
como exotérmicas (ΔH < 0) ou endotérmicas (ΔH > 0) com base na liberação ou
absorção de calor, respectivamente.
• Entropia (S) é uma medida da desordem ou aleatoriedade de um sistema. Uma reação
prossegue com ganho de entropia quando os produtos são menos complexos e
mais desordenados que os reagentes.
As reações químicas são influenciadas por duas forças principais: a tendência de
atingir o estado mais estável (medido pela entalpia, H) e a tendência de atingir o maior grau
155
de desordem (medido pela entropia, S). A força motriz líquida de uma reação é a variação na
energia livre de Gibbs, ou ΔG, que é o resultado destes dois fatores: ΔG = ΔH - TΔS.
A ΔG de um sistema que ocorre durante uma reação pode ser medida sob
qualquer conjunto de condições. No entanto, se os dados forem coletados em condições
padrão de pH 7, temperatura a 25º Celsius e pressão de 1 atmosfera, o resultado é a
variação de energia livre padrão aparente, ΔG°', que é usado para prever se a reação é
espontânea ou não. Essa ΔG'° é um valor constante que é calculado usando a constante
de equilíbrio (K'eq) da reação usando a equação ΔG'°= -RT ln K'eq, onde R é o constante
do gás e T é a temperatura em Kelvin.
A ΔG depende de ΔG'° e das concentrações dos reagentes e produtos, e pode
ser calculada usando a equação ΔG = ΔG'°+ RT ln([produtos]/[reagentes]). A partir dessa
equação, tem se que um ΔG negativo indica uma reação exergônica e tende a caminhar
para sua conclusão, um ΔG positivo indica uma reação endergônica e tende a ir na
direção oposta e um ΔG =0 (a soma dos ΔGs das duas reações separadas) indica que o
sistema está em equilíbrio.
Embora algumas reações tenham um ΔG negativo, o que significa que são
termodinamicamente favoráveis, elas podem não ocorrer a uma velocidade significativa.
Por exemplo, a combustão da lenha em CO2 e H2O é termodinamicamente favorável,
mas não ocorre à temperatura ambiente porque a energia de ativação necessária para
a reação é maior que a energia disponível. Porém, se for fornecida uma fonte externa de
energia, como um fósforo aceso, a reação pode prosseguir, convertendo a madeira em
produtos mais estáveis e liberando energia na forma de calor e luz. O calor liberado pela
reação exotérmica pode fornecer a energia de ativação para a combustão de regiões
próximas, tornando o processo autopropagável. Nos organismos vivos, as enzimas
são responsáveis por diminuir a energia de ativação necessária para que as reações
ocorram, permitindo que elas aconteçam em um ritmo mais rápido.
A ΔG de uma reação não é afetada pelas etapas específicas ou intermediários
envolvidos na reação. Por exemplo, em uma reação em que o composto A é convertido
no composto B e, em seguida, o composto B é convertido no composto C. A mudança
geral na energia livre da reação A para C é a soma dos valores ΔG individuais do reações
A à B e B à C. Isso ocorre porque os valores ΔG são aditivos, o que significa que o valor
ΔG final para uma reação é a soma dos valores ΔG de todas as reações individuais que
levam ao produto.
Em um sistema fechado, as reações químicas ocorrerão espontaneamente até
atingirem o equilíbrio, ponto no qual as velocidades das reações direta e oposta são
iguais e as concentrações dos reagentes e produtos permanecem constantes. Uma
célula viva é, no entanto, um sistema termodinâmico aberto porque troca materiais e
energia com seu ambiente, onde nutrientes, oxigênio e resíduos estão constantemente
entrando e saindo da célula. Além disso, a célula é capaz de reciclar os produtos de certas
reações químicas em outras reações, o que lhe permite manter um estado estável de
156
metabolismo. Esta troca constante de materiais e energia também requer uma entrada
constante de energia, pois a célula deve trabalhar para manter sua própria organização
e contrariar a tendência natural de equilíbrio e entropia. Ou seja, os organismos vivos
estão em uma batalha constante contra o equilíbrio e a entropia.
2.1 PRINCIPAIS REAÇÕES BIOQUIMICAS
As reações bioquímicas referem-se às reações químicas que ocorrem dentro
das células e são essenciais para o seu bom funcionamento e a sobrevivência dos
organismos vivos. Essas reações bioquímicas são catalisadas por enzimas, que catalisam
reações como isomerização, ligação e hidrólise.
Dentre essas, as reações de transferência de grupos fosforil e reações de
oxidação-redução desempenham um papel vital no metabolismo.
As células vivas desenvolveram mecanismos altamente eficientes para controlar
e utilizar a energia de seus arredores, de acordo com a as leis da termodinâmica. Eles
convertem a energia química armazenada em moléculas orgânicas, como açúcares e
gorduras, em energia armazenada nas moléculas de trifosfato de adenosina (ATP), a
moeda energética das células vivas (Figura 3). A energia armazenada nas moléculas de
ATP pode ser usada para conduzir vários processos celulares, como a síntese de novas
moléculas, o transporte de moléculas através da membrana e a contração muscular.
A conversão de ATP em ADP e fosfato inorgânico (Pi), ou em AMP e PPi, é
uma reação química altamente exergônica (ΔG° é negativo e grande em módulo)
que libera energia. A variação de energia livre padrão (ΔG°) da hidrólise de ATP é -7,3
kcal/mol ou -30,5 kJ/mol. Isso significa que quando o ATP é hidrolisado em ADP e Pi,
ele libera -7,3 kcal/mol de energia. Essa energia pode ser acoplada a outras reações
químicas que requerem energia, como as reações endergônicas que não acontecem
espontaneamente.
157
Figura 3 – O trifosfato de adenosina (ATP) fornece energia
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 24)
Aqui cada P representa um grupo fosforila. A remoção do grupo fosforila terminal
(sombreado em cor salmão) do ATP, pela quebra da ligação fosfoanidrido para
gerar difosfato de adenosina (ADP) e o íon fosfato inorgânico (HPO4
2–), é altamente
exergônica; essa reação costuma ser acoplada a várias reações endergônicas nas
células. O ATP também fornece energia para vários processos celulares pela clivagem
que libera os dois fosfatos terminais, resultando em pirofosfato inorgânico (H2P2O7
2–),
frequentemente abreviado como PPi.A transferência de um grupo fosforil, pirofosforil ou adenilil do ATP a um substrato
ou a uma enzima acopla a energia da quebra do ATP às transformações endergônicas
de substratos. A transferência de um grupo fosfato do ATP para um substrato, como a
glicose, é um exemplo desse processo, chamado de fosforilação da glicose. Este processo
aumenta o nível de energia do substrato permitindo que ele participe de outras reações
químicas. Dessa maneira, o ATP fornece energia para reações anabólicas, incluindo a
síntese de macromoléculas e o transporte de moléculas e íons através das membranas
contra gradientes de concentração.
Esse acoplamento energético pode ser mais facilmente visualizado em um
exemplo mecânico simples (Figura 4).
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Adenosina (Trifosfato de adenosina, ATP)
Adenosina (Difosfato de adenosina, ADP)
Fosfato inorgânico (Pi)
Adenosina (Monofosfato de adenosina, AMP)
Fosfato inorgânico (PPi)
P P
P
P
P
P
P
P P
P P
P
O-
O-
O-
-O
-O
-O
O
O
O
O O
O
O
O
O
O
C
C
N N
N
CH
N
HC
O
O- O-
CH2
NH2
H H
H H
OH
OH
OH
OH
OH
+
+
158
Figura 4 – Acoplamento energético em processos químicos e mecânicos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.24)
O movimento de queda de um objeto libera energia potencial que pode realizar
trabalho mecânico. A energia potencial disponibilizada pelo movimento de queda
espontânea, no processo exergônico (vermelho), pode ser acoplada ao processo
endergônico representado pelo movimento ascendente de um segundo objeto
(azul). (b) Na reação 1, a formação de glicose-6-fosfato a partir da glicose e do
fosfato inorgânico (Pi) gera um produto com conteúdo energético maior que o
dos reagentes. Para esta reação endergônica, ΔG é positivo. Na reação 2, a quebra
exergônica do trifosfato de adenosina (ATP) tem uma grande variação negativa de
energia livre (ΔG2). A terceira reação é a soma das reações 1 e 2, e a variação da
energia livre, ΔG3, é a soma aritmética de ΔG1 e ΔG2. Pelo fato de ΔG3 ser negativo,
o processo como um todo é exergônico e ocorre espontaneamente.
Se a concentração de ATP for muito baixa, não será possível a transferência
de grupos fosfato suficientes para conduzir as reações endergônicas de forma eficaz.
Portanto, a concentração de ATP deve ser mantida bem acima da concentração de
equilíbrio das reações geradoras de energia do catabolismo para garantir que haja ATP
suficiente disponível para conduzir as reações endergônicas e manter o alto potencial
de transferência de grupo do ATP.
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(a) Exemplo mecânico
ΔG > 0
Trabalho
realizado ao
levantar o
objeto
Endergônico
ΔG < 0
Perda de
energia
potencial
de
posição
Exergônico
(b) Exemplo químico
En
er
gi
a
liv
re
, G Reação 1:
Glicose + Pi
Glicose-6-fosfato
ΔG1
Reação 2:
ATP ADP + Pi
ΔG2
Reação 3:
Glicose + ATP
Glicose-6-fosfato + ADP
ΔG3
ΔG3 = ΔG1 + ΔG2
Reação coordenada
159
Além do ATP, as células contêm outros compostos de alta energia que possuem
um alto potencial de transferência do grupo fosforil. Estes incluem fosfoenolpiruvato,
1,3-bifosfoglicerato e fosfocreatina, todos os quais têm uma energia livre negativa de
hidrólise. Isso significa que eles liberam energia quando são quebrados. Esses compostos
podem atuar como fontes de energia para reações endergônicas, semelhantes ao ATP.
As reações de oxidação e redução, são também conhecidas como reações
redox. Em uma reação redox, os átomos têm seu estado de oxidação (ou número de
oxidação) alterado. A oxidação é o processo de perda de elétrons e resulta em um
aumento no estado de oxidação de um átomo. A redução, por outro lado, é o processo
de ganhar elétrons e resulta em uma diminuição no estado de oxidação de um átomo.
As coenzimas NAD+ e FAD são moléculas constituídas por adenosina difosfato
e um composto orgânico nicotinamida (da vitamina B3) para NAD+, e por riboflavina (da
vitamina B2), para o FAD. Essas coenzimas possuem duas formas, a oxidada, que é um
receptor de elétrons, e a reduzida, que é um transportador de elétrons gerados através
da glicólise, do ciclo de Krebs e da β-oxidação de ácidos graxos.
Em sistemas biológicos, as reações de oxidação e redução estão intimamente
ligadas à transferência de elétrons entre as moléculas. Por exemplo, na respiração
celular, a glicose é oxidada para produzir dióxido de carbono e água, enquanto os
elétrons são transferidos para o NAD+ que é reduzido a NADH. O NADH então transfere
os elétrons para a cadeia de transporte de elétrons, onde são usados para produzir ATP.
3 VISÃO GERAL DO METABOLISMO
Os organismos vivos podem ser divididos em dois grupos principais com base
na forma como obtêm carbono: autótrofos e heterótrofos.
Os autotróficos, como plantas e algas, podem usar dióxido de carbono como sua
única fonte de carbono. Os heterotróficos, como animais e a maioria dos microrganismos,
devem obter carbono de compostos orgânicos mais complexos, como a glicose.
Os autótrofos são autossuficientes, enquanto os heterótrofos dependem de outros
organismos para obter nutrientes. Autotróficos e heterótrofos vivem juntos em um ciclo
interdependente no qual os autótrofos produzem compostos orgânicos e oxigênio por
meio da fotossíntese e os heterótrofos consomem esses compostos e liberam dióxido
de carbono. Esse ciclo é impulsionado pela energia solar e carbono, oxigênio e água são
constantemente reciclados entre os dois grupos (Figura 5).
160
Figura 5 – Ciclo do dióxido de carbono e do oxigênio entre o domínio autotrófico (fotossintético) e o
heterotrófico na biosfera
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 532)
O fluxo de massa por esse ciclo é enorme; 4 x 1011 toneladas de carbono são
recicladas anualmente na biosfera.
Metabolismo é o processo pelo qual os organismos vivos convertem nutrientes
em energia e constroem as moléculas necessárias para a vida. Esse processo pode ser
dividido em vias menores, cada via envolvendo uma série de enzimas que catalisam
reações químicas específicas. Cada enzima tem suas próprias características, como a
eficiência catalítica ou sua capacidade de regular o fluxo de moléculas intermediárias.
Ao final dessa unidade, você encontrará a figura de um mapa metabólico, que
mostra as principais vias envolvidas no metabolismo energético. Esse mapa facilita o
entendimento das conexões entre diferentes vias descrita nessa unidade, é possível
rastrear o movimento de moléculas intermediárias e prever os efeitos de interrupções
em uma via, como as causadas por drogas ou doenças hereditárias, distúrbios genéticos.
O termo metaboloma se refere ao conjunto completo de moléculas presentes
em um organismo, incluindo todos os metabólitos que estão envolvidos no metabolismo.
O metabolismo pode ser dividido em duas categorias principais: catabolismo e
anabolismo (Figura 6).
O catabolismo é o conjunto de vias metabólicas que quebram moléculas
complexas, como carboidratos, proteínas e gorduras em moléculas mais simples. Essas
moléculas são então degradadas em acetil-CoA, que entra no ciclo de Krebs, onde é
oxidada para gerar grandes quantidades de ATP via fosforilação oxidativa.
161
Os processos catabólicos são exergônicos, que são reações que liberam energia.
A energia liberada é usada para alimentar os processos celulares e uma parte dela é
conservada na forma de ATP e transportadores de elétrons reduzidos (NADH, NADPHe FADH2), enquanto o restante é perdido como calor. O catabolismo também permite
que os nutrientes sejam convertidos em monômeros necessários para a biossíntese
de moléculas complexas. É um processo convergente, onde uma grande variedade de
moléculas é transformada em poucos produtos.
O anabolismo, por outro lado, é um processo divergente no qual alguns precursores
biossintéticos, como aminoácidos, formam uma ampla variedade de produtos poliméricos
ou complexos, como proteínas. As reações anabólicas são endergônicas, o que significa
que requerem energia, que normalmente é fornecida pela hidrólise do ATP. Essas reações
geralmente envolvem reduções químicas, onde o poder redutor geralmente é fornecido
por doadores de elétrons, como NADH, FADH2. Um exemplo é o processo de síntese de
ácidos graxos, uma reação que é termodinamicamente desfavorável. A reação é acoplada
à hidrólise do ATP, que libera energia que é usada para conduzir a síntese de ácidos
graxos. Assim, a energia liberada pela reação favorável é usada para conduzir a reação
termodinamicamente desfavorável, tornando o processo geral termodinamicamente
favorável. Isso permite que a célula realize uma ampla gama de reações anabólicas que,
de outra forma, seriam impossíveis devido às leis da termodinâmica.
Algumas vias metabólicas são cíclicas, e envolvem uma série de reações
que convertem um componente inicial em um produto e, em seguida, regeneram o
componente inicial no processo. Esses caminhos cíclicos são projetados para conservar
recursos e energia reciclando intermediários em vez de produzir produtos residuais. Um
exemplo de uma via metabólica cíclica é o ciclo do ácido cítrico, também conhecido
como ciclo de Krebs.
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(a) Convergente, catabólica, (b) divergente, anabólica, e (c) cíclica. Em (c), um dos
compostos de partida (no caso, o oxaloacetato) é regenerado e reingressa na via.
O acetato, um intermediário metabólico chave, é o produto da degradação de uma
variedade de combustíveis (a), serve de precursor de um grande número de produtos
(b) e é consumido na via catabólica conhecida como o ciclo do ácido cítrico (c).
163
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
• A conexão entre as leis da termodinâmica, ΔG e reações metabólicas.
• Os seres vivos são sistemas termodinâmicos abertos e são capazes de realizar
trocas de energia e materiais com o meio externo.
• As reações podem ser endergônicas e exergônicas.
• As diferenças entre os dois grupos principais de organismos, os autótrofos e os
heterótrofos.
• O que é o metabolismo, as vias metabólicas e a relação entre anabolismo, catabolismo
e energia química.
• A importância das reações de transferência de grupo fosforil e oxidação-redução
no metabolismo.
• O ATP, FAD e NAD+ são importantes moléculas do metabolismo celular.
164
AUTOATIVIDADE
1 A termodinâmica estuda as relações entre a energia, o trabalho e a entropia de um
sistema. Dentro dessa área existem três leis conhecidas como leis da termodinâmica.
Assinale a alterativa CORRETA da lei da termodinâmica que afirma que a energia não
pode ser criada nem destruída.
a) ( ) Primeira lei da termodinâmica.
b) ( ) Segunda lei da termodinâmica.
c) ( ) Entropia.
d) ( ) Entalpia.
2 A variação de energia livre de Gibbs, ΔG, de um sistema que ocorre durante uma
reação é utilizada para prever se uma reação será espontânea ou não. Assinale a
alternativa CORRETA do valor de ΔG para um sistema está em equilíbrio.
a) ( ) ΔG = 0
b) ( ) ΔG = 1
c) ( ) ΔG = -1
d) ( ) ΔG = ΔG’0
3 A bioquímica é a área da biologia que estuda as reações químicas que ocorrem nas
células, incluindo o metabolismo celular. Esses processos podem ser divididos em
duas categorias principais. Assinale a alternativa CORRETA que apresenta o termo que
descreve o processo celular de quebrar moléculas grandes em moléculas menores.
a) ( ) Anabolismo.
b) ( ) Catabolismo.
c) ( ) Catálise.
d) ( ) Absorção.
4 NAD e FAD são coenzimas encontrados em muitos organismos, incluindo seres
humanos. Eles atuam como transportadores de elétrons em reações de oxidação-
redução importantes para a produção de energia celular. Descreva as formas reduzida
e oxidada dos transportadores de elétrons NAD e FAD.
5 O acoplamento é uma estratégia importante utilizada por organismos para transformar
reações. Explique como o acoplamento facilita reações termodinamicamente
desfavoráveis.
165
METABOLISMO DE LIPÍDIOS,
AMINOÁCIDOS E NUCLEOTÍDEOS
1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tema de aprendizagem 2, abordaremos o metabolismo de lipídios,
aminoácidos e nucleotídeos que fazem parte dos processos metabólicos responsáveis
pela biossíntese, degradação e transporte dessas moléculas para manutenção da vida.
O metabolismo de lipídeos é essencial para o armazenamento de energia,
formação da membrana celular e produção de hormônios pelo colesterol. Nos animais,
os lipídios são obtidos a partir da dieta ou produzidos pelo fígado, sendo então
transportados por todo o corpo na forma de lipoproteínas. Desequilíbrios no metabolismo
lipídico podem levar a condições como obesidade e doenças cardiovasculares.
Os aminoácidos essenciais são obtidos dos alimentos enquanto os aminoácidos
não essenciais podem ser produzidos pelo corpo e são então usados para sintetizar
proteínas ou convertidos em outros intermediários. Um dos principais processos
metabólicos envolvendo aminoácidos é a remoção do nitrogênio, que está presente na
forma de amônia (NH3). A amônia é tóxica em altas concentrações, por isso precisa ser
removida para evitar danos ao corpo. Isso é conseguido através do ciclo da ureia, que
converte a amônia em ureia, uma molécula menos tóxica que é excretada na urina.
Os nucleotídeos são componentes essenciais dos processos celulares, formados
por uma base nitrogenada, um açúcar e um grupo fosfato. Eles desempenham um papel
crucial na síntese de ácidos nucléicos, DNA e RNA, bem como na transferência de energia
dentro das células através da síntese de ATP. Além disso, atuam como componentes de
cofatores enzimáticos como NAD e FAD, envolvidos em diversas reações metabólicas.
Os nucleotídeos também funcionam como segundos mensageiros nas vias de
transdução de sinal, responsáveis pela transmissão de sinais dentro e entre as células. O
metabolismo dos nucleotídeos abrange tanto a síntese de novo a partir de precursores
simples quanto as vias de salvação que reciclam os nucleotídeos existentes.
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
2 METABOLISMO DE LIPÍDIOS E ÁCIDOS GRAXOS
Os lipídios são um grupo diversificado de biomoléculas que incluem triacilgliceróis
e esteroides, e desempenham papéis importantes no organismo. A digestão e a absorção
de lipídios envolvem a quebra dos lipídios da dieta em moléculas menores que podem
ser absorvidas e transportadas pelo organismo.
166
Através da degradação ou beta-oxidação de ácidos graxos, o corpo gera a
energia necessária para realizar suas funções. Esse processo ocorre principalmente nas
mitocôndrias das células e resulta na produção de acetil-CoA, NADH e FADH2. Essas
moléculas serão usadas para gerar ATP no ciclo de Krebs e no processo de fosforilação
oxidativa que serão discutidas em detalhes no tema de aprendizagem 3.
Quando há baixa disponibilidade de carboidratos, como durante o jejum ou uma
dieta pobre em carboidratos, o corpo produz os corpos cetônicos, como acetoacetato
e beta-hidroxibutirato, a partir de ácidos graxos, para servirem como fonte de energia
para as células.
A biossíntese de ácidos graxos a partir de precursores como o acetil-CoA é um
processo que ocorre principalmente no fígado e no tecido adiposo e é regulado por
hormônios como a insulina e o glucagon.
O metabolismo do colesterol é importante para a produção do colesterol,
presente nas membranas celulares e como precursor dos hormônios esteroides,ácidos
biliares e vitamina D. Por outro lado, fatores como genética, dieta e estilo de vida podem
afetar o metabolismo do colesterol e contribuir para níveis elevados de colesterol no
sangue o desenvolvimento das doenças cardiovasculares.
Os lipídeos juntamente com o colesterol são transportados pelo corpo pelas
lipoproteínas que são partículas complexas consistindo em um núcleo de lipídios
cercado por uma casca de proteínas. Diferentes tipos de lipoproteínas têm diferentes
funções e estão envolvidas no transporte de diferentes tipos de lipídeos.
2.1 DIGESTÃO, MOBILIZAÇÃO E TRANSPORTE DE GORDURAS
A digestão das gorduras provenientes da alimentação no estômago com
a liberação de enzimas chamadas lipases gástricas, onde são degradados em
compostos menores. Esse processo continua no intestino delgado com a ajuda dos
sais biliares, que solubilizam as gorduras formando micelas mistas acessíveis à ação
de lipases pancreáticas, que quebram os triglicerídeos em ácidos graxos menores e
glicerol, os quais difundem-se para dentro das células na mucosa intestinal. Ali, são
reconvertidos a triacilgliceróis e empacotados com o colesterol e lipoproteínas para
serem transportados aos tecidos alvos na forma de quilomícrons que entram no sistema
linfático e eventualmente chegam à corrente sanguínea (Figura 7).
Os ácidos graxos absorvidos são armazenados no tecido adiposo na forma de
triacilgliceróis de reserva, agregando-se em gotículas lipídicas, para serem utilizados
como fonte de energia quando necessário. Os triacilgliceróis têm o maior conteúdo de
energia entre todos os nutrientes armazenados, fornecendo mais de 38 kJ/g de energia,
que é cerca de 9 calorias por grama. Isso é maior que a quantidade de energia fornecida
por carboidratos.
167
Quando os hormônios sinalizam necessidade de energia, os triacilgliceróis
armazenados no tecido adiposo são mobilizados. Os níveis baixos de glicose ativam os
hormônios glucagon (ou outros sinais, ativam a adrenalina), que se liga ao seu receptor
na membrana do adipócito e estimula a ação de segundos mensageiros para abrir as
gotículas de lipídios e ativar as lipases hormônio-sensível nos adipócitos, resultando na
hidrólise de ácidos graxos livres e glicerol.
Os ácidos graxos saem do tecido adiposo e se ligam à albumina sérica no
sangue para serem transportados aos tecidos alvos, onde são liberados e oxidados para
fornecer energia. O glicerol segue outra via, em que será transformado no intermediário
di-hidroxi-acetona fosfato e pode ser oxidado na via da glicólise.
A quantidade de energia armazenada no corpo na forma de triacilgliceróis é
significativa. Estima-se que 15 kg de tecido adiposo sejam suficientes para suprir as
necessidades energéticas basais por cerca de 12 semanas. As necessidades energéticas
basais de uma pessoa são a energia necessária para manter as funções corporais
básicas, como respirar e manter a temperatura corporal.
Figura 7 – O processamento dos lipídeos da dieta em vertebrados
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.668)
168
A digestão e a absorção dos lipídeos da dieta ocorrem no intestino delgado, e os
ácidos graxos liberados dos triacilgliceróis são empacotados e distribuídos para os
músculos e o tecido adiposo. Os oito passos são discutidos no texto.
2.2 BETA-OXIDAÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS
O catabolismo dos ácidos graxos ocorre através da β-oxidação na mitocôndria,
e é uma via central de produção de energia em muitos órgãos e tecidos, e a principal
fonte energética do coração e do fígado de mamíferos. O cérebro, que normalmente
depende da glicose como fonte de energia, pode também utilizar os corpos cetônicos
que são subprodutos da β-oxidação.
A entrada de ácidos graxos maiores de 12 carbonos na mitocôndria, que são a
maioria, ocorre pela ativação do ácido graxo e pelo sistema de transporte carnitina, em
duas etapas:
1. A primeira etapa, é a ativação do ácido graxo no citosol pela enzima Acil-CoA
sintetase, que catalisa a formação de um acil-graxo-CoA ativado com energia da
clivagem de ATP.
O acil-graxo-CoA ativado também poderá ser utilizado no citosol para sintetizar
lipídeos de membrana.
2. A segunda etapa é o transporte para dentro da mitocôndria pelo sistema de
transporte carnitina (Figura 8).
Nesse sistema, a enzima carnitina acil-transferase I liga transitoriamente o acil-
graxo à carnitina, liberando CoA no citosol. O produto formado, acil-graxo-carnitina entra
na matriz da mitocôndria pelo transportador. Na matriz, o grupo acila é transferido pela
ação da carnitina acil-transferase para outro CoA mitocondrial, e a carnitina é liberada
para retornar ao citosol pelo mesmo transportador.
169
Figura 8 – Entrada de ácido graxo na mitocôndria pelo transportador acil-carnitina/carnitina
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.672)
Após a formação da acil-carnitina-graxo na membrana externa ou no espaço
intermembrana, ela se desloca para a matriz pela difusão facilitada por meio do
transportador na membrana interna. Na matriz, o grupo acila é transferido para
a coenzima A mitocondrial, tornando a carnitina livre para retornar ao espaço
intermembrana pelo mesmo transportador. A aciltransferase I é inibida por malonil-
CoA, o primeiro intermediário na síntese de ácidos graxos (ver Figura 21-2). Essa
inibição evita a síntese e a degradação simultâneas dos ácidos graxos.
O acil-graxo-CoA na matriz mitocondrial será oxidado pela β-oxidação, sendo
assim chamado por promover quebra por oxidação do ácido graxo sempre em seu
carbono β. É uma via cíclica em que a molécula vai diminuindo de tamanho.
Cada ciclo da β-oxidação de ácidos graxos pares e saturados, com apenas
ligações simples, possui 4 reações catalisadas por 4 enzimas diferentes. O ciclo ocorre
a cada 2 carbonos com redução da coenzima NAD+ e FAD.
Observe o exemplo das 4 etapas da β-oxidação (ou ciclo de Lynen) do palmitoil-
CoA com 16 carbonos: (1) desidrogenação, (2) hidratação, (3) oxidação e (4) tiólise (Figura 9).
170
Figura 9 – A via da β-oxidação
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.673)
Em cada passagem por essa sequência de quatro passos, um resíduo acetil
(sombreado em cor salmão) é removido na forma de acetil-CoA da extremidade
carboxílica da cadeia acil graxo – nesse exemplo, o palmitato (C16), que entra como
palmitoil-CoA. (b)Mais seis passagens pela via produzem mais sete moléculas de
acetil-CoA, a sétima vinda dos dois últimos átomos de carbono da cadeia de 16
carbonos. Oito moléculas de acetil-CoA são formadas no total.
1. A etapa (1) é a desidrogenação, com remoção do hidrogênio do acil-CoA produzindo
uma dupla ligação com configuração trans entre o carbono C2 e C3, para formar
o trans-Δ2-enoil-CoA (o símbolo Δ2 indica o local da dupla indicação no C2). Essa
reação é catalisada pela enzima acil-CoA desidrogenase com transferência de
elétrons para o FAD.
171
Figura 10 – Produção de ATP durante a oxidação de uma molécula de palmitoil-CoA em CO2 e H2O
Esse FADH reduzido vai entrar na cadeia respiratória, e os elétrons passam para
O2 com produção de ATP.
2. A etapa (2) é a hidratação, específica para configuração trans, para desfazer a dupla
ligação e produzir um estereoisômero L-β-Hidroxiacil-CoA.
3. Na etapa (3), é a oxidação, formando o β-cetoacil-CoA. Essa reação é catalisada
pela enzima β-hidroxiacil-CoA desidrogenase, reduzindo o NAD+. Essa enzima é
específica para o isômero L.
O NADH segue para o Complexo I da cadeia respiratória.
As etapas 1 a 3 formaram uma ligação menos estável, que será rompida na
última etapa do ciclo:
4. Na etapa (4) uma tiólise, a enzima acil-CoA-acetiltransferase (ou tiolase) adiciona
uma molécula de CoA e forma 2 fragmentos: Acetil-CoA e um R-acil-CoA.
O R-acil resultante, com menos 2C a cada ciclo, fará mais ciclos de β-oxidação
até ser totalmente convertido em Acetil-CoA.
A equação para uma passagem utilizando o exemplo do palmitato, é:
Palmitoil-CoA + CoA + FAD + NAD+ + H2O à Miristoil-CoA + Acetil-CoA + FADH2 + NADH + H+
Assim, cadapassagem no ciclo resulta em:
• NADH, FADH2 para a fosforilação oxidativa (que serão utilizados para formar 2.5 ATP,
e 1.5ATP respectivamente).
• 1Acetil-CoA para o ciclo de Krebs, onde é completamente oxidado a CO2, originando
3NADH e FADH para a fosforilação oxidativa e GTP.
Sendo assim, os 7 ciclos de degradação de um ácido graxo de 16C, produz
31NADH, 15FADH2 (para a fosforilação oxidativa, (Figura 10) e 8GTP resultando em 108
ATP. Porém, retirando-se os 2ATP utilizados para a ativação do ácido graxo, tem-se que
o ganho líquido por molécula de palmitato são 106 ATP.
Enzima que catalisa o passo de
oxidação
Quantidade de NADH
ou FADH2, formado
Quantidade de ATP
formado no final*
Acil-CoA-desidrogenase 7 FADH2 10,5
β-Hidroxiacil-CoA-desidrogenase 7 NADH 17,5
Isocitrato-desidrogenase 8 NADH 20
a-Cetoglutarato-desidrogenase 8 NADH 20
Succinil-CoA-sintetase 8+
172
Succinato-desidrogenase 8 FADH2 12
Malato-desidrogenase 8 NADH 20
Total 108
*Esses cálculos pressupõem que a fosforilação oxidativa mitocondrial produz 1,5 ATP por FADH, oxidado e
2,5 ATP por NADH oxidado.
'O GTP produzido diretamente nesse passo produz ATP na reação catalisada pela nucleosídeo-difosfato-
quinase (p. 526).
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.673)
Os ácidos graxos insaturados, com uma ou mais duplas ligações, são a maioria
dos ácidos graxos no organismo, e suas ligações estão na configuração cis, logo não
podem receber a hidratação na etapa (2) da β-oxidação.
Para os ácidos graxos monoinsaturados, como oleoil-CoA (Δ9), quando o ciclo
chega na dupla ligação, a enzima Δ3-Δ2-enoil-CoA isomerase converte a configuração
cis em trans. Esse intermediário pode então retornar ao ciclo e completar a β-oxidação.
Para ácidos graxos poli-insaturados com mais de uma ligação dupla, como
o linoleoil-CoA (Δ9, Δ12), a primeira etapa é similar aos monoinsaturados, e a enzima
isomerase converte a configuração cis para trans, formando um intermediário que
reentra no ciclo da β-oxidação. Na segunda dupla ligação, uma enzima redutase
converte um intermediário que possui a dupla ligação trans-Δ2-cis-Δ4 para trans-Δ3
oxidando o NAPH. A seguir, uma segunda enzima isomerase converte o intermediário
com dupla ligação trans-Δ3 em trans-Δ2, e esse reentra o ciclo da β-oxidação.
A oxidação de um ácido graxo com um número ímpar de carbonos leva à formação
final de um resíduo de 3 carbonos, o propionil-CoA. Nesses casos, a enzima propionil-
CoA carboxilase, que possui cofator biotina, catalisa uma reação de carboxilação,
formando um intermediário com 4 carbonos, em uma reação que consome bicarbonato
e ATP. O intermediário com 4 carbonos sofre epimerização de D para L pela enzima
epimerase e depois um segundo rearranjo intramolecular catalisado por uma enzima
mutase para formar succinil-CoA, que poderá entrar no ciclo de Krebs ou será utilizado
como precursor do grupo heme que está presente principalmente na hemoglobina.
Os peroxissomos, presentes nas células do fígado e rins, também realizam
β-oxidação de ácidos graxos, mas apenas os de cadeia muito longa, processo que a
mitocôndria não é capaz de fazer.
Nas plantas, toda a β-oxidação ocorre principalmente nos peroxissomos das
folhas e nos glioxissomos nas sementes e não na mitocôndria. Os peroxissomos e
glioxissomos são semelhantes em função. Nesses casos, o papel dessa β-oxidação é
fornecer precursores biossintéticos e não energia. O FADH2 transfere elétrons diretamente
para o O2. E o NADH e Acetil-CoA são exportados para o citosol. O NADH é regenerado, e o
Acetil-CoA, utilizado em precursores para gliconeogênese no ciclo do glioxilato.
173
2.3 CETOGÊNESE
Nos mamíferos, o acetil-CoA formado no fígado durante a β-oxidação
pode entrar no ciclo de Krebs ou ser convertido a corpos cetônicos (o acetoacetato,
β-hidroxibutirato e acetona). A formação dos corpos cetônicos ocorre na matriz da
mitocôndria. A enzima tiolase catalisa a condensação de 2 moléculas de acetil-CoA. E,
reações seguintes das demais enzimas geram o acetoacetato, que produz acetona e
β-hidroxibutirato. A acetona é exalada, e os demais corpos cetônicos são exportados
para os tecidos, onde são convertidos em acetil-CoA e oxidados para fornecer energia,
principalmente em condições de jejum (Figura 11).
As pessoas diabéticas, particularmente diabetes tipo 1, não produzem insulina sufi-
ciente para regular os níveis de açúcar no sangue, levando a uma superprodução de corpos
cetônicos e uma condição chamada cetoacidose diabética. Os corpos cetônicos são ácidos
carboxílicos que se ionizam, liberando prótons. No diabetes não controlado, essa produção
de ácido pode superar a capacidade do sistema tampão bicarbonato do sangue e produzir
uma redução no pH sanguíneo, chamada de acidose. A combinação de cetose com a aci-
dose, a cetoacidose é uma condição, se não for tratada, potencialmente letal.
Figura 11 – Regulação da síntese de triacilgliceróis pela insulina
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.849)
A insulina estimula a conversão dos carboidratos e das proteínas da dieta em gordura.
As pessoas com diabetes melito precisam de insulina ou são insensíveis a ela. Isso
resulta em diminuição da síntese de ácidos graxos, e a acetil-CoA proveniente do
catabolismo dos carboidratos e das proteínas é desviada para a produção de corpos
cetônicos. Pessoas com cetose grave exalam cheiro de acetona, de modo que essa
condição é, às vezes, confundida com embriaguez.
174
2.4 BIOSSÍNTESE DE ÁCIDOS GRAXOS SATURADOS
Os ácidos graxos são os principais componentes do triacilgliceróis para o
armazenamento de energia e dos fosfolipídios de membrana. O fígado é o principal
órgão responsável pela síntese de ácidos graxos que acontece na mitocôndria. O
processo é endergônico e redutor, usando ATP como fonte de energia metabólica e
NADPH como agente redutor.
O precursor da síntese de ácidos graxos é o acetil-CoA proveniente da oxidação
do piruvato e do catabolismo dos esqueletos carbônicos dos aminoácidos. No entanto,
a membrana da mitocôndria é impermeável ao acetil-CoA, o que significa que este não
pode passar pela membrana por conta própria. Para chegar ao citosol, a célula usa um
sistema de transporte chamado de lançadeira (Figura 12).
Nesse sistema, o acetil-CoA reage com o oxaloacetato na mitocôndria,
produzindo o citrato, uma molécula que pode facilmente ser transportado da mitocôndria
para o citosol por meio do transportador de citrato. Essa é uma reação catalisada pela
enzima citrato-sintase que faz parte do ciclo de Krebs.
Uma vez no citosol, a enzima citrato-liase cliva o citrato, em uma reação
que consome ATP, para regenerar acetil-CoA e oxaloacetato no citosol, que é então
convertido em malato, e devolvido à matriz mitocondrial através do transportador de
malato-α-cetoglutarato. No entanto, a maior parte do malato é convertida em piruvato
no citosol, produzindo NADPH que é necessário para a biossíntese de ácidos graxos. O
piruvato é transportado de volta para a mitocôndria através do transportador de piruvato.
175
Figura 12 – Lançadeira para a transferência de grupos acetil da mitocôndria para o citosol
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.836)
A membrana mitocondrial externa é livremente permeável a todos esses compostos.
O piruvato derivado do catabolismo dos aminoácidos na matriz mitocondrial ou da
glicose por glicólise no citosol é convertido em acetil-CoA na matriz. Os grupos acetil
saem da mitocôndria como citrato; no citosol, eles são liberados na forma de acetil-
CoA para a síntese dos ácidos graxos. O oxaloacetato é reduzido a malato, que pode
retornar à matriz mitocondrial, onde é convertido em oxaloacetato. O principal destino
do malato citosólico é a oxidação pela enzima málica, gerando NADPH citosólico; o
piruvato produzido retorna à matriz mitocondrial.
O ciclo de Krebs permanece ativo na mitocôndria, necessário para fornecer
energia para os processos de biossíntese. A via das pentoses-fosfato fornece o restante
de NADPH necessário.
Nas célulasfotossintéticas dos vegetais, a síntese de ácidos graxos não ocorre
no citosol, mas no estroma dos cloroplastos. Nas plantas, o malato pode ser convertido
a piruvato e entrar na mitocôndria, e o NADPH citosólico é reduzido.
176
A biossíntese e degradação do ácidos-graxos ocorrem por vias diferentes, por
diferentes enzimas, e em compartimentos diferentes. A biossíntese ocorre no citosol e
a degradação na mitocôndria.
A primeira etapa da biossíntese de ácidos-graxos é a formação de malonil-
CoA a partir do precursor Acetil-CoA. Essa reação é catalisada pela enzima acetil-CoA
carboxilase (ACC) e requer biotina.
Primeiro, um grupo carboxil derivado do bicarbonato (HCO3–) é transferido para
a biotina em uma reação dependente de ATP. O grupo biotinila age como transportador
temporário de CO2, transferindo-o para a acetil-CoA na segunda reação, gerando
malonil-CoA. Essa primeira etapa deixa a molécula termodinamicamente favorável para
a biossíntese do ácido-graxo.
Em seguida, a biossíntese de ácidos-graxos pode então ocorrer através
uma sequência de reações repetidas, por um sistema de complexo multienzimático,
denominado ácido-graxo sintase.
O ácido graxo sintase é um grande complexo composto por vários domínios
diferentes. Esses domínios são sítios de ligação para outras moléculas e são importantes
para o bom funcionamento da enzima. Um dos componentes desse complexo é a
proteína transportadora de grupos acila (ACP, do inglês acyl carrier protein), contendo –
SH e o grupo prostético 4-fosfopanteteína (da vitamina B5). Esse grupo atua como um
transportador para o grupo acil durante a biossíntese de ácidos graxos.
A biossíntese de ácidos graxos é um processo que ocorre em uma série de
quatro etapas repetidas: condensação, redução, desidratação e redução. Para iniciar
esse processo, uma molécula de acetil-CoA é transferida para o grupo -SH do domínio KS
e uma molécula de malonil-CoA é esterificada ao grupo -SH do domínio ACP. Ambos os
domínios fazem parte do complexo ácido-graxo sintase. Uma vez que essas moléculas
estejam no lugar, as reações que levam à biossíntese de ácidos graxos podem ocorrer
(Figura 13).
• A etapa (1) é a condensação do malonil-CoA com o acetil-CoA, em uma reação
irreversível e liberando CO2 (o mesmo que formou o malonil). A cadeia é alongada
em 2 carbonos.
• A etapa (2) é a redução do produto, acetoacetil-ACP, por uma enzima redutase, em
uma reação que consome o NADPH.
• A etapa (3) é a desidratação, formando uma dupla ligação.
• Na etapa (4), a dupla ligação é reduzida (saturada), para formar o butiril-ACP,
consumindo um outro NADPH.
177
Figura 13 – Adição de dois carbonos a uma cadeia acil graxo em crescimento: uma sequência de quatro
etapas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.836)
Cada grupo malonila e acetila (ou acilas maiores) é ativado por um tioéster que
os une à ácido graxo--sintase, um sistema multienzimático descrito no texto. 1 A
condensação de um grupo acila ativado (um grupo acetil da acetil-CoA é o primeiro
grupo acila) e dois carbonos derivados da malonil-CoA, com a eliminação de CO2do
grupo malonila, alonga a cadeia acila em dois carbonos. O mecanismo da primeira
etapa dessa reação está mostrado para ilustrar o papel da descarboxilação em
facilitar a condensação. O produto b-cetônico dessa condensação é, então, reduzido
em três etapas seguintes praticamente idênticas às reações de β-oxidação, mas na
sequência inversa; 2 o grupo b-cetônico é reduzido a um álcool, 3 a eliminação de
H2O cria uma ligação dupla, e 4 a ligação dupla é reduzida, formando o grupo acil
graxo saturado correspondente.
178
O resultado é uma cadeia saturada de 4C, finalizando o primeiro ciclo. Para iniciar
o próximo ciclo, o domínio ACP é deslocado e liberado para receber mais um malonil-CoA
e assim dando continuidade ao ciclo para alongar a cadeira em 2C e liberando CO2, para
formar 6C e, em seguida, 8C, e assim por diante. O produto final é o palmitado de 16C.
O resumo do processo global para formar o palmitato de 16C, são necessários 8
Acetil-CoA, 7 ATP e 14 NADPH. A equação global é:
8 Acetil-CoA + 7ATP + 14NADPH + 14H+à Palmitato + 8CoA + 7ADP + 7Pi + 14NADP++
6H2O
Essa equação pode ser dividida em duas equações menores, primeiro, o ATP é
necessário para ligar o CO2 à acetil-CoA para formar as sete moléculas de malonil-CoA:
7Acetil-CoA + 7CO2 + 7ATP à 7Malonil-CoA + 7ADP + 7Pi
Em seguida, os sete ciclos de condensação e redução, onde as moléculas de
NADPH são necessárias para reduzir o grupo α-ceto e a ligação dupla, resultando na
reação:
Acetil-CoA + 7Malonil-CoA + 14NADPH + 14H+à Palmitato + 7CO2+ 8CoA + 14NADP
++
6H2O
O palmitato é o principal produto da biossíntese de ácido-graxo nas células
animais e o precursor de ácidos de cadeias longa. O processo que se segue de
alongamento da cadeia ocorre na mitocôndria e no RE liso, com um mecanismo de
doação de carbono, similar ao da biossíntese de palmitato com as etapas de condensação,
redução, desidratação e redução.
2.5 BIOSSÍNTESE DE ÁCIDOS GRAXOS INSATURADOS
A adição de dupla ligação transforma ácidos-graxos saturados em
monoinsaturados. Essa dupla ligação é introduzida por uma enzima oxidase de função
mista, pois oxida dois substratos diferentes simultaneamente.
Nos mamíferos, certos tipos de ácidos graxos chamados ácidos graxos poli-
insaturados de cadeia longa (chamados de PUFA) são criados a partir de ácidos graxos
essenciais que são obtidos através da dieta. Esses PUFAs são formados através de uma
série de reações de dessaturação (adição de uma ligação dupla entre dois átomos de
carbono) e alongamento (adição de dois átomos de carbono).
As plantas são os únicos organismos capazes de sintetizar ácidos graxos
essenciais. Eles fazem isso adicionando uma segunda ligação dupla em posições
específicas de carbono, como carbono Δ12 e Δ15, para criar ácido linoléico (ômega 6) e
179
ácido α-linolênico (ômega 3), respectivamente. Esses ácidos graxos poli-insaturados
essenciais são os precursores de outros lipídios importantes, como o araquidonato
(20:4), EPA (20:5) e DHA (22:6). Esses lipídios têm muitas funções biológicas importantes,
incluindo no desenvolvimento e a função do cérebro e na manutenção da saúde
cardiovascular (Figura 14).
Figura 14 – Vias de síntese de outros ácidos graxos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.842)
O palmitato é o precursor do estearato e dos ácidos graxos saturados de cadeias
mais longas, assim como dos ácidos graxos monoinsaturados palmitoleato e oleato.
Os mamíferos são incapazes de converter oleato em linoleato ou em a-linolenato
(sombreado em cor salmão), que são, portanto, necessários na dieta como ácidos
graxos essenciais. A conversão de linoleato em outros ácidos graxos poli-insaturados
e em eicosanoides está representada nesta figura. Os ácidos graxos insaturados
são simbolizados pela indicação do número de carbonos e do número e posição de
ligações duplas.
180
2.6 BIOSSÍNTESE DE TRIACILGLICERÕIS E
GLICEROFOSFOLIPÍDEOS
Os triacilgliceróis são formados a partir do acil-CoA graxo (ativado) e glicerol-
3-fosfato em diversas etapas biossintéticas. O glicerol-3-fosfato é produzido na via da
gliceroneogênese a partir de di-hidroxiacetona-fosfato derivado do piruvato.
Os ácidos graxos são combinados com glicerol para formar diacilglicerol-3-
fosfato, mais comumente chamado de ácido fosfatídico. Esta reação é catalisada pela
enzima glicerol-3-fosfato aciltransferase e é a etapa comprometida da síntese de
triacilglicerol. Esse intermediário pode ser convertido em uma molécula de triacilglicerol
(também conhecido como triglicerídeo) ou em um glicerofosfolipídeo.
A molécula de triacilglicerol resultante é então empacotada em gotículas
lipídicas e transportada para fora da célula para armazenamento no tecido adiposo.
Os glicerofosfolipídeos são componentes da membrana celular e são essenciais
para manter sua fluidez e estabilidade.
2.7 METABOLISMO DO COLESTEROL
O colesterol é um componenteessencial das membranas celulares e precursor
dos hormônios esteroides, ácidos biliares e vitamina D. Pode ser obtido da dieta, dos
estoques de gordura ou sintetizado pelo organismo, principalmente no fígado e intestino
delgado.
A maior parte da síntese do colesterol em vertebrados ocorre no fígado,
sendo exportado em uma de três formas: ácidos biliares, colesterol biliar ou ésteres de
colesterila.
O colesterol é formado a partir do acetil-CoA no citosol em uma série de reações
complexas com 4 etapas principais (Figura 15):
• A etapa (1) é a condensação de 3 acetatos formando o mevalonato.
Essa é a principal etapa de regulação do colesterol, com formação de HMG-CoA
e conversão em mevalonato pela enzima HMG-CoA redutase citosólica com consumo de
NADPH. Essa enzima é alvo dos fármacos, estatinas, que inibem a síntese de colesterol
para o tratamento das doenças da hipercolesterolemia e prevenção da aterosclerose. O
mais conhecido deles é a atorvastatina.
• A etapa (2) é a conversão do mevalonato em unidades de isoprenos ativados, com
consumo de ATP. Os isoprenos podem também ser precursores de outros lipídios.
181
• A etapa (3) é a polimerização dos isoprenos para formar o esqualeno linear. E
consome NADPH.
• A etapa (4) é a ciclização do esqualeno, consumindo NADPH para formar uma
estrutura de anéis para produção do colesterol, que são 4 anéis fundidos.
Figura 15 – Os quatro estágios são discutidos no texto
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.860)
As unidades isoprenoides no esqualeno estão demarcadas pelas linhas tracejadas
em cor-de-rosa.
A molécula de colesterol possui uma pequena cabeça polar (presença de -OH),
resultando em uma molécula anfipática e permitindo a interação com os lipídios e água.
O colesterol é essencial para a integridade da membrana plasmática. Ele
preenche os espaços vazios entre as moléculas vizinhas de fosfolipídios insaturados,
tornando, dessa forma, a membrana mais rígida (modulação da fluidez) e menos
permeável.
182
Os hormônios derivados do colesterol possuem uma estrutura similar, porém
com funções muito distintas. Os hormônios corticoides afetam o metabolismo e o
sistema imune. A testosterona e estradiol agem nas características sexuais. E os
hormônios mineralocorticoides regulam a absorção e excreção de sais minerais.
A bile é um fluido produzido pelo fígado que contém ácidos biliares e seus
sais. Os ácidos biliares são derivados do colesterol, mas possuem um número maior de
grupos hidroxila. A bile é armazenada na vesícula biliar e liberada no intestino delgado
quando necessário. Os sais biliares são moléculas anfipáticas, pois possuem regiões
hidrofóbicas e hidrofílicas. Eles agem como um detergente, quebrando os agregados de
gordura em gotículas menores chamadas micelas, mais acessíveis à ação de enzimas
pancreáticas chamadas lipases que quebram os triacilgliceróis.
Quando a gordura dietética é consumida, os sais biliares a emulsificam, para
dispersar os triacilgliceróis, que são degradados pelas lipases secretadas do pâncreas
no intestino. Os ácidos graxos produzidos por essa etapa se difundem pelas membranas
das células intestinais e são reesterificados com glicerol para serem empacotados
com quilomícrons, transportados para os tecidos-alvo por meio do sistema linfático
e, eventualmente, atingem a corrente sanguínea. Esses ácidos graxos são absorvidos
principalmente pelo fígado, músculo e tecido adiposo.
Algumas fibras alimentares, como a aveia, podem ajudar a diminuir o colesterol,
ligando-se aos sais biliares e evitando que sejam reabsorvidos pelo organismo,
favorecendo sua eliminação.
2.8 LIPOPROTEÍNAS
O colesterol, seus ésteres e outros lipídios são insolúveis em água e, portanto,
são transportados pelas lipoproteínas plasmáticas.
As lipoproteínas formam diversos compostos esféricos, com os lipídios
hidrofóbicos no centro e as cadeias laterais dos aminoácidos na superfície (Figura
16). Esses complexos podem ser separados por ultracentrifugação e visualizados por
microscopia eletrônica. São comumente agrupados em classes:
• Quilomícrons e partículas remanescentes de quilomícrons.
• VLDL – lipoproteínas de densidade muito baixa (Very-Low Density Lipoproteins) e
lipoproteínas de densidade intermediária (IDL).
• LDL – lipoproteínas de baixa densidade (Low Density Lipoproteins).
• HDL – lipoproteínas de alta densidade (High Density lipoproteins).
183
Figura 16 – Lipoproteínas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p. 865)
(a) Estrutura de uma lipoproteína de baixa densidade (LDL). A apolipoproteína
B-100 (apoB-100) é uma das maiores cadeias polipeptídicas conhecidas, com 4.636
resíduos de aminoácidos (Mr512.000). Uma partícula de LDL contém um núcleo com
aproximadamente 1.500 moléculas de ésteres de colesterila, envolvido por uma
camada de cerca de 500 moléculas de colesterol, 800 moléculas de fosfolipídeos
e uma molécula de apoB-100. (b) Quatro classes de lipoproteínas, visualizadas ao
microscópio eletrônico após coloração negativa. No sentido horário, a partir da parte
superior à esquerda: quilomícrons, 50 a 200 nm de diâmetro; VLDL, 28 a 70 nm;
HDL, 8 a 11 nm; LDL, 20 a 25 nm. Os tamanhos mostrados das partículas são aqueles
medidos para essas amostras; os tamanhos das partículas variam consideravelmente
em diferentes preparações.
Os quilomícrons são grandes lipoproteínas compostas por triacilgliceróis,
colesterol, fosfolipídio e apolipoproteína (o termo apo designa a proteína livre sem o
lipídio). Os quilomícrons depletados de seus triacilgliceróis são absorvidos pelo fígado
por endocitose.
As lipoproteínas VLDL transportam lipídios sintetizados ou empacotados no
fígado e distribuídos aos tecidos periféricos. Com a ativação das lipases e perda dos
triacilgliceróis, as VLDL vão diminuindo de tamanho, transformando-se em IDL e LDL.
As LDL são ricas em colesterol, e sua principal apolipoproteína é a ApoB-100,
que se liga aos receptores de LDL extra-hepáticos para receber o colesterol. A LDL que
não foi captada por esses tecidos retorna ao fígado para ser reesterificada ou convertida
a sais biliares. A LDL alta no sangue indica um acúmulo de colesterol.
184
O transporte reverso de colesterol, ou seja, o excesso de colesterol no sangue
e nos tecidos extra-hepáticos é transportado de volta para o fígado pela HDL. O HDL
possui uma enzima que esterifica o colesterol, tornando-o mais insolúvel e inacessível
dentro da partícula de HDL, diferente do colesterol transportado pela LDL. O HDL alto no
sangue indica um bom metabolismo de reabsorção do colesterol.
As apolipoproteínas interagem com receptores na superfície das células-alvo
e regulam o transporte, redistribuição e absorção de lipídios entre diferentes tecidos,
ativando lipases para a degradação dos triacilgliceróis (Figura 17).
A hipercolesterolemia pode ser causada por problemas de reabsorção do
colesterol através de mutações em receptores específicos para LDL (hipercolesterolemia
familiar) ou em dietas ricas em gorduras e ácidos graxos, que saturam e inibem a
reabsorção de LDL no fígado.
O colesterol em excesso no sangue proveniente da dieta ou sintetizado pode
estar associado à condição de aterosclerose, formando acúmulo de colesterol (placas)
que pode obstruir os vasos sanguíneos, levando à falência cardíaca.
Figura 17 – Lipoproteínas e transporte dos lipídeos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.867)
185
Figura 18 – Regulação coordenada da síntese e da degradação dos ácidos graxos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.673).
Os lipídeos são transportados na corrente sanguínea como lipoproteínas,
existentes em diversas formas variantes, cada uma com diferentes funções e com
composições lipídica e proteica distintas, portanto, com densidades diferentes. As
etapas numeradas estão descritas no texto. Na via exógena (setas azuis), os lipídeos
da dieta são empacotados em quilomícrons; a maior parte do seu conteúdo em
triacilgliceróis é liberada pela lipase lipoproteica nos tecidos adiposo e muscular,durante o transporte ao longo dos capilares. Os quilomícrons remanescentes
(contendo na maior parte pro-teínas e colesterol) são captados pelo fígado. Os sais
biliares produzidos no fígado auxiliam na dispersão das gorduras da dieta e são,
então, reabsorvidos na via êntero-hepática (setas verdes). Na via endógena (setas
vermelhas), os lipídeos sintetizados ou empacotados no fígado são distribuídos aos
tecidos periféricos pela VLDL. A extração dos lipídeos da VLDL (acompanhada pela
perda de parte das apolipoproteínas) converte, gradualmente, parte da VLDL em LDL,
que transporta o colesterol para os tecidos extra-hepáticos ou de volta para o fígado. O
fígado capta LDL, remanescentes de VLDL (chamadas de lipoproteínas de densidade
intermediária, ou IDLs) e os remanescentes de quilomícrons por endocitose mediada
por receptor. O excesso de colesterol nos tecidos extra-hepáticos é transportado
de volta ao fígado como HDL pelo transporte reverso do colesterol (setas roxas). C
representa colesterol; EC representa ésteres de colesterila.
2.9 REGULAÇÃO METABOLISMOS DE LIPÍDIOS
O nível energético corporal determina a síntese ou degradação de ácidos-
graxos nas células por ação hormonal (Figura 18).
186
Quando a dieta disponibiliza uma fonte imediata de carboidratos como combustível,
a β-oxidação dos ácidos graxos é desnecessária, sendo, portanto, desativada. Duas
enzimas são essenciais na coordenação do metabolismo dos ácidos graxos: a acetil-
-CoA-carboxilase (ACC), primeira enzima na síntese dos ácidos graxos, e a carnitina-
--aciltransferase I, que limita o transporte de ácidos graxos para dentro da ma-
triz mitocondrial para a β-oxidação. A ingestão de uma refeição rica em carboidratos
aumenta o nível de glicose no sangue e, portanto, 1 ativa a liberação de insulina. 2 A
proteína-fosfatase dependente de insulina desfosforila a ACC, ativando-a. 3 A ACC
catalisa a formação de malonil-CoA (o primeiro intermediário da síntese de ácidos
graxos), e 4 o malonil-CoA inibe a carnitina-aciltransferase I, impedindo assim a en-
trada de ácidos graxos na matriz mitocondrial. Quando baixam os níveis de glicose
no sangue, entre as refeições, 5 a liberação de glucagon ativa a proteína-cinase de-
pendente de cAMP (PKA), que 6 fosforila e inativa a ACC. Com a baixa concentração
de malonil-CoA, a inibição da entrada de ácidos graxos na mitocôndria é aliviada,
e 7 os ácidos graxos entram na matriz mitocondrial e 8 tornam-se o principal com-
bustível. Como o glucagon também ativa a mobilização de ácidos graxos no tecido
adiposo, um suprimento de ácidos graxos começa a chegar ao sangue.
Nos mamíferos, a produção de colesterol é regulada (Figura 19). A diminuição
dos níveis de ATP está associada com o aumento nos níveis de AMP, ativando as cinase
AMPK e a fosforilação (e inativação) da enzima HMG-CoA redutase, comprometida, na
síntese de colesterol.
O glucagon também estimula a fosforilação e inativação da HMG-CoA redutase,
enquanto a insulina ativa a enzima por desfosforilação, favorecendo a síntese do
colesterol.
Oxiesteróis metabólitos de colesterol, inibem a HMG-CoA redutase por estimular
a proteólise da enzima.
A síntese e degradação da enzima HMG-CoA redutase são reguladas a longo
prazo em resposta às concentrações de colesterol. Os elementos reguladores de esterol
são proteínas que atuam como sensores na célula e, quando necessário, ativam genes-
alvos do metabolismo do colesterol e outros lipídios.
187
Figura 19 – A regulação da formação de colesterol equilibra a sua síntese com a captação a partir da
alimentação e o estado energético
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.673)
A insulina promove a desfosforilação (ativação) da HMG-CoA redutase; glucagon
promove sua fosforilação (inativação); e a proteína cinase dependente de AMP,
AMPK, quando ativada por baixa [ATP] em relação a [AMP], a fosforila inativando-a.
Oxiesteróis metabólitos de colesterol (p. ex., 24(S)-hidroxicolesterol) estimula a
proteólise da HMG-CoA redutase.
3 METABOLISMO DE AMINOÁCIDOS
Os aminoácidos são os monômeros constituintes das proteínas e desempenham
papéis importantes em vários processos fisiológicos do corpo. O metabolismo dos
aminoácidos é um processo complexo que envolve vários mecanismos, incluindo
digestão de proteínas, transporte, desaminação, excreção de nitrogênio e ciclo da ureia
e síntese.
Durante a digestão, as enzimas no estômago e no intestino delgado quebram
as proteínas em aminoácidos individuais. Esses aminoácidos são então transportados
através da parede intestinal e para a corrente sanguínea, onde são distribuídos para
vários tecidos e órgãos por todo o corpo. Alguns dos aminoácidos são usados para
sintetizar novas proteínas, que são essenciais para o crescimento, reparo e manutenção
de várias estruturas e funções do corpo.
Existem certas condições metabólicas nos animais que resultam na desaminação
dos aminoácidos. Este processo envolve a remoção do grupo amino do aminoácido que
contém nitrogênio. O nitrogênio é excretado pelo corpo no ciclo da ureia, enquanto o
188
restante do esqueleto de carbono é convertido em outras moléculas ou utilizados para
a produção de energia, seja por serem convertidos em glicose ou por serem utilizados
no ciclo de Krebs para produzir energia na forma de ATP.
Os organismos variam muito em sua capacidade de sintetizar os 20 aminoácidos
comuns, enquanto a maior parte das bactérias e plantas pode sintetizar todos eles,
os mamíferos sintetizam apenas cerca de metade deles, tendo que obter o restante
através da dieta. Esses aminoácidos são chamados de essenciais.
3.1 DIGESTÃO DE PROTEÍNAS
Nos seres humanos, as proteínas da dieta são digeridas pelas enzimas proteases.
Este processo é realizado por um grupo de enzimas chamadas proteases. A maioria das
proteases é sintetizada em uma forma inativa conhecida como zimogênios, o que as
impede de digerir as próprias proteínas do corpo antes de chegarem ao seu destino.
Uma vez que as proteínas atingem o estômago, a acidez do suco gástrico (pH
1,0 a 2,5) desempenha um papel tanto na morte de células e bactérias estranhas quanto
na desnaturação das proteínas, tornando suas ligações peptídicas mais vulneráveis à
hidrólise enzimática. A principal enzima protease do estomago é a pepsina, que inicia
o processo de quebra das proteínas em cadeias peptídicas menores. As proteínas par-
cialmente digeridas chegam ao intestino delgado, e são degradadas por um grupo de
proteases chamadas tripsina, quimiotripsina e carboxipeptidases. Essas enzimas que-
bram as ligações peptídicas entre os aminoácidos, liberando os aminoácidos individuais.
As proteases produzem os aminoácidos livres, que são absorvidos no intestino
e transportados até o fígado. O fígado desempenha um papel importante na regulação
dos níveis de aminoácidos no corpo, pois pode armazená-los ou metabolizá-los
conforme necessário.
As vias do catabolismo de aminoácidos são bastante semelhantes na maioria
dos organismos.
Em animais, os aminoácidos sofrem oxidação em 3 circunstâncias metabólicas:
• Durante a dinâmica normal de síntese e degradação das proteínas no organismo
(meia-vida das proteínas, alvos da via ubiquitina-proteossoma).
• Quando há excesso de aminoácidos na dieta, pois os aminoácidos não são
armazenados, e a massa muscular é ativada apenas por sinais específicos.
• Nas situações de faltas de carboidratos ou em que as reservas de energia já foram
consumidas, como no jejum ou diabetes mellitus não controlado, quando as
proteínas teciduais serão utilizadas como combustível.
189
3.2 TRANSAMINAÇÃO E DESAMINAÇÃO
O catabolismo da maioria dos L-aminoácidos ocorre principalmente no fígado.
Este processo envolve a eliminação do grupo amina, também conhecido como
desaminação, bem como a excreção do grupo amina para o ciclo da ureia e conversão
do esqueleto de carbono em compostos intermediários que podem ser utilizados para
diversas vias metabólicas e por isso chamados de intermediáriosanfibólicos.
A enzima chave envolvida neste processo é a aminotransferase ou transaminase,
que remove e transfere o grupo amino (NH3+) dos aminoácidos. Essas enzimas
requerem um cofator chamado fosfato de piridoxal (PLP), que é derivado da vitamina B6.
O PLP forma um intermediário com o grupo amino através de um mecanismo chamado
mecanismo de "pingue-pongue" (Figura 20).
Figura 20 – Transaminações catalisadas por enzimas. Em muitas reações de aminotransferases, o
a-cetoglutarato é o aceptor do grupo amino
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.867)
Todas as aminotransferases necessitam de piridoxal-fosfato (PLP) como cofator.
Embora a reação esteja mostrada aqui no sentido da transferência do grupo amino
para o a-cetoglutarato, ela é facilmente reversível.
Na maioria dos casos, o aceptor do grupo amino é o α-cetoglutarato, que forma
glutamato e um α-cetoácido como resultado da reação. Este processo é importante
para o bom funcionamento do corpo, pois permite que o fígado regule os níveis de
aminoácidos no corpo e forneça os intermediários necessários para várias vias
metabólicas. O glutamato é o doador do grupo amino para as vias de biossíntese ou
para as vias de excreção nitrogenada.
190
O grupo amino NH3
+ (amônia) se converte em NH4
+ (íon amônio) em pH fisiológico.
Alguns aminoácidos são desaminados por reações especiais. Mas também convergem
para formar NH4
+ e glutamato.
O glutamato formado segue dois caminhos importantes: (1) uma desaminação
oxidativa ou (2) uma nova transaminação. Com o objetivo de canalizar o nitrogênio da
maioria dos aminoácidos para NH4
+ e aspartato.
• A desaminação acontece no fígado, o glutamato é transportado do citosol para a
mitocôndria, onde sofre desaminação oxidativa (libera o seu grupo amino), catalisada
pela enzima glutamato-desidrogenase, doando H+ para NAD+ ou NADP. O produto
dessa reação reversível é o α-cetoglutarato, que pode ser utilizado no ciclo de Krebs
e/ou no ciclo da ureia.
A enzima glutamato-desidrogenase é uma enzima alostérica e sofre regulação
do ATP que age como modulador positivo e do GTP, como modulador negativo.
• Na transaminação reversível, o grupo amino do glutamato é transferido para o
oxaloacetato para formar a-cetoglutarato e o aspartato por ação da enzima aspartato
aminotransferases (AST). O aspartato será um segundo doador de nitrogênio no
ciclo da ureia.
A aspartato aminotransferase é a mais ativa aminotransferase dos mamíferos,
evidenciando a importância dessa reação.
A amônia livre produzida nos tecidos, incluindo o cérebro, a NH4
+ livre, combina-
se com glutamato pela ação da enzima glutamina-sintase, com consumo de ATP,
formando a L-glutamina. Essa glutamina serve como fonte de grupo amino para a
biossíntese e como transportadora de amônia para o fígado ou rins. É uma forma de
transporte não tóxico para amônia que esta normalmente presente no sangue em
concentrações muito maiores que os demais aminoácidos. Nos tecidos alvos, a enzima
glutaminase converte glutamina em glutamato e amônia.
No músculo, quando há necessidade de combustível, o glutamato pode ser
catalisado pela enzima alanina-aminotransferase (ALT), que transfere o grupo amino
do glutamato para o piruvato, formando o aminoácido alanina. A alanina funciona como
um transportador da amônia e do esqueleto carbônico do piruvato desde o músculo
até o fígado. No fígado, a alanina é catalisada, transferindo o grupo amino para o
α-cetoglutarato, formando o piruvato e o glutamato. O piruvato é utilizado para produzir
glicose, que é então devolvida para ser combustível no músculo no ciclo da glicose-
alanina. O músculo e o cérebro não fazem a gliconeogênese.
191
Figura 21 – O ciclo da glicose-alanina
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.867)
A alanina funciona como transportadora de amônia e do esqueleto de carbono do
piruvato do músculo esquelético até o fígado. A amônia é excretada, e o piruvato é
utilizado para produzir glicose, que é devolvida ao músculo.
As enzimas transaminases (ALT, AST) são intracelulares, e, portanto, a presença
dessas enzimas no sangue está relacionada à lesão tecidual, principalmente no fígado,
que é rico em transaminases. Podem estar aumentadas no sangue, como na hepatite
infecciosa e tóxica, cirrose e no exercício físico intenso.
3.3 EXCREÇÃO DE NITROGÊNIO E CICLO DA UREIA
O ciclo da ureia é o processo pelo qual o nitrogênio é removido dos aminoácidos
e excretado na forma de ureia. O ciclo converte a amônia, um subproduto tóxico do
metabolismo das proteínas, em uréia, que é menos tóxica e pode ser excretada na urina.
Esse processo é essencial para manter o equilíbrio de nitrogênio no corpo e prevenir o
acúmulo de níveis nocivos de amônia. Peixes e anfíbios excretam amônia diretamente
através de suas brânquias, e pássaros e répteis excretam resíduos nitrogenados como
ácido úrico.
192
A maior parte dos animais terrestre secreta amônia na forma de ureia, os répteis
e aves, na forma de ácido úrico, e os peixes excretam amônia livre, que é diluída na
água do ambiente. As plantas quase nunca utilizam aminoácidos para obter energia,
e geralmente reciclam todos os grupos aminos, não fazendo a excreção nitrogenada.
O ciclo da ureia acontece no fígado e envolve cinco etapas que ocorrem nas
mitocôndrias e no citosol.
1. A amônia, proveniente de várias fontes, forma, na mitocôndria, o carbamoil-fosfato,
pela enzima carbamoil-fosfato-sintase I. Essa reação utiliza o nitrogênio da amônia,
o carbono do bicarbonato e consome 2ATP. Essa enzima sofre regulação.
2. O carbamoil-fosfato entra no ciclo da ureia e condensa-se a uma molécula de
ornitina, formando a citrulina.
3. A citrulina é transportada para o citosol, onde seu grupo carbonila é condensado
com um segundo grupo amino do aspartato, formando a arginina-succinato, com
consumo de 1ATP;
4. Uma enzima liase quebra a arginina-succinato, liberando uma molécula de fumarato
e um aminoácido, a arginina. Essa é a única reação reversível do ciclo.
5. O fumarato é convertido em uma ação reversível a malato e entra na mitocôndria
para unir-se aos intermediários do ciclo de Krebs. A arginina é hidrolisada produzindo
a ureia e regenerando a ornitina. A ornitina retorna à mitocôndria, de volta ao ciclo
da ureia.
Na equação geral, a ureia é produzida a parti do NH4
+, aspartato e HCO3
-, com
consumo de 3ATP.
NH4
++ HCO3
- + 3ATP4- + H2O à Ureia + 2ADP
3- + 4Pi2- + AMP2- + 2H+
Contudo, a interconvenção entre o ciclo da ureia e o ciclo de Krebs (ou ciclo do
ácido cítrico), conhecida como “bicicleta de krebs”, reduz o custo energético geral da
produção da ureia. A lançadeira malato-desidrogenase produz 1NADPH na mitocôndria
(que forma 2.5ATP na fosforilação oxidativa) (Figura 22).
A conversão da amônia em ureia é fundamental para manter os níveis desse
íon baixos em mamíferos. Não há outra via metabólica para eliminar o NH4
+. O fígado é
o único órgão que processa e elimina o excesso de amônia formado no organismo. A
amônia é convertida em ureia e atinge a circulação, chegando aos rins, onde é excretada
na urina. A ureia dá a cor amarelada e o cheiro da urina.
Como a amônia livre é tóxica, os defeitos no ciclo da ureia podem causar
acúmulos de amônia ou intermediários, bem como mudanças no pH celular, causando
doenças. No entanto, seres humanos precisam manter uma dieta com proteínas, pois
alguns aminoácidos são essenciais e não são sintetizados pelo corpo humano.
193
Na regulação, a primeira enzima do ciclo da ureia, a carbamoil-fosfato-sintetase
I, é alostérica e estimulada pelo N-acetilglutamato, sintetizado a partir de condensação
de acetil-CoA e glutamato pela enzima N-acetilglutamato sintase, que, por sua vez,
é ativada pela arginina. A concentração desses intermediários é determinante para a
ativação dessas enzimas.
A expressão gênica a longo prazo regula a síntese das enzimas do ciclo da ureia
e da carbamoil-fosfato-sintetase I em condições dependentes da dieta.
Figura22 – Vínculos entre o ciclo da ureia e o ciclo do ácido cítrico
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.867)
Esses dois ciclos interconectados têm sido denominados “bicicleta de Krebs”. As vias
que unem o ciclo do ácido cítrico ao ciclo da ureia são conhecidas como lançadeira
do aspartato-arginino-succinato; elas unem efetivamente os destinos dos grupos
amino e dos esqueletos de carbono dos aminoácidos. As interconexões são bastante
elaboradas. Por exemplo, algumas enzimas do ciclo do ácido cítrico, como a fumarase
e a malato--desidrogenase, apresentam isoenzimas citosólicas e mitocondriais. O
fumarato produzido no citosol, seja no ciclo da ureia, na biossíntese de purinas ou
em outros processos, pode ser convertido em malato citosólico, utilizado no citosol
ou transportado para a mitocôndria para entrar no ciclo do ácido cítrico. Esses
processos são ainda interligados com a lançadeira do malato-aspartato, conjunto
194
de reações que traz equivalentes redutores para a mitocôndria (ver também Figura
19-31). Esses diferentes ciclos ou processos contam com um número limitado de
transportadores na membrana mitocondrial interna.
A avaliação do metabolismo de proteínas pode ser feita pelo balanço de nitrogênio,
que consiste na quantidade de nitrogênio ingerido menos a quantidade de nitrogênio
excretado, ou seja, equivale a quanto nitrogênio está sendo incorporado no corpo. Em
indivíduos adultos saudáveis, o balanço de nitrogênio está em equilíbrio. O balanço é
negativo durante o jejum, diabetes mellitus não controlado, dieta sem carboidratos ou
sem proteínas. Já durante o crescimento, em crianças lactantes, gestantes ou ainda em
situações de desenvolvimento muscular e neoplasias, o balanço é positivo.
Uma vez que o grupo amino é removido do aminoácido, o esqueleto de carbono
resultante está na forma de α-cetoácido. Esses produtos podem então ser direcionados
para a gliconeogênese, que é o processo de geração de glicose a partir de fontes que
não sejam carboidratos, ou para a cetogênese, que é o processo de geração de corpos
cetônicos no fígado. Os esqueletos de carbono de certos aminoácidos, como leucina,
lisina e fenilalanina, só podem ser convertidos em corpos cetônicos e são chamados de
aminoácidos cetogênicos. Os aminoácidos restantes, como alanina e aspartato, podem
ser convertidos em glicose e glicogênio e são chamados de aminoácidos glicogênicos. No
geral, a via de catabolismo de aminoácidos é uma fonte relativamente menor de produção
de energia no corpo humano. Normalmente representa apenas 10 a 15% da energia usada
pelo corpo, enquanto a glicólise e a oxidação de ácidos graxos são muito mais ativas.
Os aminoácidos de cadeia ramificada (leucina, isoleucina, valina) não são
degradados no fígado. Eles sofrem transaminação e descarboxilação oxidativa por
enzimas específicas no tecido periférico.
Diversas doenças humanas graves são causadas por defeitos genéticos nas
enzimas do catabolismo dos aminoácidos. A fenilcetonúria é uma doença genética com
deficiência na enzima fenilalanina hidroxilase, a primeira enzima do metabolismo da
fenilalanina para ser convertida em tirosina. A deficiência desta enzima causa o acúmulo
de fenilalanina no sangue ou nos tecidos, causando toxidade e retardo mental no cérebro.
O teste do pezinho diagnostica a doença, e o tratamento é a restrição da fenilalanina.
3.4 BIOSSÍNTESE DE AMINOÁCIDOS
A biossíntese de aminoácidos é o processo de produção de aminoácidos
necessários para a formação de proteínas a partir de intermediários obtidos da glicólise,
do ciclo de Krebs ou da via das pentoses fosfato (Figura 23). Essas vias estão descritas
no Tema de aprendizagem 3.
195
Os aminoácidos são classificados em três grupos: aminoácidos não essenciais;
aminoácidos essenciais; e, aminoácidos condicionais.
Os aminoácidos não essenciais são sintetizados pelo corpo. Os aminoácidos
não essenciais incluem: alanina, arginina, asparagina, ácido aspártico, cisteína, ácido
glutâmico, glutamina, glicina, prolina, serina e tirosina.
Os aminoácidos essenciais não podem ser sintetizados pelo corpo. Como
resultado, eles devem ser obtidos dos alimentos. Os 9 aminoácidos essenciais são:
histidina, isoleucina, leucina, lisina, metionina, fenilalanina, treonina, triptofano e valina.
Os aminoácidos condicionais geralmente não são essenciais, exceto em
condições de doença e estresse. Os aminoácidos condicionais incluem: arginina,
cisteína, glutamina, tirosina, glicina, ornitina, prolina e serina.
Algumas vias biossintéticas de aminoácidos são simples, enquanto outras
são mais complexas. A biossíntese desses aminoácidos é regulada por mecanismos
alostéricos, com a enzima reguladora tipicamente localizada no início da via. As vias
para diferentes aminoácidos também estão interligadas e coordenam a regulação.
Um exemplo de uma via simples é a formação aminoácidos não essenciais como
o glutamato por aminação redutiva de α-cetoglutarato, que serve como precursor de
glutamina, prolina e arginina. A alanina e o aspartato são formados a partir do piruvato
e oxaloacetato, respectivamente, por transaminação, enquanto a cadeia carbônica
da serina é derivada do 3-fosfoglicerato e serve como precursora da glicina. Nos
microrganismos, a cisteína é produzida a partir de serina e sulfeto, obtidos do meio
ambiente. Nos mamíferos, a cisteína é produzida a partir da metionina e da serina por
uma série de reações.
A biossíntese de aminoácidos essenciais é um processo muito mais complexo
que envolve várias etapas e vias. Aminoácidos aromáticos, como fenilalanina, tirosina e
triptofano, são produzidos por meio de vias que envolvem intermediários importantes,
como corismato e fosforibosil-pirofosfato. A via da histidina está conectada com a
via de síntese de purina. A tirosina também pode ser produzida pela hidroxilação da
fenilalanina, o que a torna um aminoácido condicionalmente essencial.
196
Figura 23 – Visão geral da biossíntese de aminoácidos
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.867)
Os precursores dos esqueletos de carbono são obtidos a partir de três fontes: a
glicólise (cor salmão), o ciclo do ácido cítrico (azul) e a via das pentoses-fosfato (roxo).
Muitas biomoléculas importantes são derivadas de aminoácidos. Por exemplo,
a glicina é um precursor das porfirinas e a degradação do heme produz bilirrubina,
um precursor dos pigmentos biliares com várias funções fisiológicas. A creatina e a
fosfocreatina, uma molécula de armazenamento de energia, são derivadas da glicina
e da arginina. A glutationa, formada a partir de três aminoácidos, é um importante
antioxidante nas células. Além disso, as bactérias podem sintetizar D-aminoácidos a
partir de L-aminoácidos por meio de reações de racemização que requerem piridoxal-
fosfato, que são comumente encontrados em certas paredes bacterianas e em alguns
antibióticos.
Os aminoácidos aromáticos também são precursores de várias substâncias nas
plantas. Alguns aminoácidos, quando descarboxilados por meio de reações dependentes
de PLP, produzem importantes aminas biológicas, incluindo neurotransmissores. Além
disso, a arginina é um precursor do óxido nítrico, um mensageiro biológico.
197
4 METABOLISMO DE NUCLEOTÍDEOS
Os nucleotídeos purina e pirimidina são os constituintes dos ácidos nucléicos,
servindo como substratos para a biossíntese de DNA e RNA. São também utilizados
como moeda de energia na forma de ATP e GTP, e atuam como derivados de coenzimas
como NAD, NADP e FAD. Além disso, derivados cíclicos de nucleotídeos de purina,
como cAMP e cGMP, desempenham um papel na regulação do metabolismo. Sem os
nucleotídeos, processos importantes como a biossíntese de proteínas, a replicação do
material genético e a divisão celular não seriam possíveis.
Os nucleotídeos são sintetizados por duas vias principais: as vias de novo e as
vias de salvação. A síntese de novo de nucleotídeos de purina e pirimidina inicia partir
de precursores simples: aminoácidos, ribose-5-fosfato, CO2 e NH3em um processo
comum a quase todos os organismos. As vias de salvação, por outro lado, permitem que
os organismos reciclem compostos de purina e pirimidina obtidos através da dieta ou
liberados a partir da degradação de ácidos nucleicos.
Células que proliferam rapidamente, como células cancerígenas ou bactérias
infecciosas, requerem quantidades maiores de nucleotídeos para sintetizar DNA e RNA.
Essa demanda aumentada torna as vias de biossíntese de nucleotídeos alvos atraentes
para o controle dessas células por meio do uso de antibióticos e drogas anticancerígenas
que inibem a biossíntese de nucleotídeos purina ou pirimidina.
4.1 BIOSSINTESE DE NUCLEOTIDEOS
As vias de novo para a síntese de pirimidina e purina compartilham vários
precursores importantes, sendo o principal o fosforribosil-pirofosfato (PRPP). Outro
precursor importante é o aminoácido glicina para purinas e aspartato para pirimidinas.
A glutamina é a principal fonte de grupos amina em cinco etapas diferentes das vias
de novo. O aspartato também é utilizado como fonte de um grupo amino em duas das
etapas das vias das purinas.
Os nucleotídeos de purina adenosina 5-monofosfato (AMP) e guanosina 5-mo-
nofosfato (GMP) contêm adenina e guanina como suas bases purinas, respectivamen-
te. O anel purínico dos nucleotídeos é formado pela combinação de vários compostos,
incluindo aspartato, formiato, glutamina, glicina e CO2. As purinas não são sintetizadas
como bases independentes, mas são formadas como ribonucleotídeos, que são cons-
truídos sobre uma ribose 5-fosfato pré-existente (Figura 24).
198
Figura 24 – Origem dos átomos no anel das purinas
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.912)
Essa informação foi obtida a partir de experimentos utilizando isótopos, com
precursores marcados com 14C ou 15N. O formato é obtido na forma de N10-
formiltetra--hidrofolato.
O sistema de anel purina é sintetizado passo a passo pela reação de 11 enzimas,
começando com a formação de 5-fosforribosilamina. O primeiro passo é a formação
do anel imidazólico. Nas etapas seguintes, o segundo anel é formado e o produto final
dessa via é o inosinato (IMP). O inosinato é então transformado em adenilato (AMP) pela
adição de um grupo amino derivado do aspartato, e em guanilato (GMP) pela adição
de um grupo amino derivado da glutamina, através de um mecanismo de oxidação
dependente de NAD+.
Os ribonucleotídeos de pirimidina são citidina 5-monofosfato (CMP; citidilato) e
uridina 5-monofosfato (UMP; uridilato) que contêm citosina e uracil, respectivamente,
como bases de pirimidina. A biossíntese de novo de nucleotídeos de pirimidina
ocorre de forma um pouco diferente da síntese de nucleotídeos de purina. Nesse
processo, é necessário o carbamoil-fosfato, um intermediário no ciclo da ureia. Esse
intermediário reage com o aspartato, produzindo N-carbamoil-aspartato, a primeira
etapa comprometida com a biossíntese de pirimidinas e reações subsequentes forma
o orotato. Em seguida, ribose-5-fosfato é ligado ao anel de pirimidina para produzir
ribonucleotídeos de pirimidina.
Os nucleosídeos monofosfato formados são convertidos em seus derivados
trifosfato por reações de fosforilação enzimática, onde um grupo fosfato é adicionado à
posição 5' do nucleosídeo em cada etapa.
A enzima ribonucleotídeo redutase, catalisa a conversão de ribonucleotídeos
em desoxirribonucleotídeos pela redução do grupo 2'-OH a um grupo 2'-H.
199
Os nucleotídeos de timina estão presentes nas bases do DNA e são derivados de
dCDP e dUMP. O folato, da vitamina B, desempenha um papel importante na biossíntese
de nucleotídeos, especialmente na conversão de dCDP em dTDP. A forma ativa do
folato, tetra-hidrofolato de metileno é necessária como cofator nessa reação e atua
como doadora de grupo metil na formação de nucleotídeos de timina. Uma deficiência
de folato pode levar a uma diminuição na produção de nucleotídeos de timina e na
síntese de DNA, o que pode causar vários problemas de saúde.
A renovação do ácido nucleico (síntese e degradação) é um processo metabólico
contínuo na maioria das células, e esse processo pode levar à liberação de purinas
livres na forma de adenina, guanina e hipoxantina. Essas podem ser usadas em vias
de salvação, na reconstrução de nucleotídeos, reduzindo assim a necessidade de
síntese de novo e conservando energia. A enzima fosforribosil-transferase ressintetiza
os nucleotídeos AMP e GMP das bases adenina e guanina, respectivamente. Essa via é
semelhante para a bases pirimídicas.
A síndrome de Lesch-Nyhan ilustra a importância da via de salvação. Essa
síndrome é uma doença genética rara causada por uma deficiência na enzima
hipoxantina-guanina fosforibosiltransferase (HGPRT), resultando na incapacidade do
corpo de reciclar as bases purinas, levando a uma superprodução de purinas pela via
de novo e na produção de altos níveis de ácido úrico. Isso causa danos semelhante
ao da gota, incluindo dor nas articulações e inflamação. O cérebro é especialmente
dependente da via de salvação, resultando em sintomas neurológicos em crianças
com síndrome de Lesch-Nyhan, como movimentos involuntários e comprometimento
cognitivo. Essa síndrome é outro alvo potencial para a terapia gênica, que visa corrigir o
defeito genético e restaurar a atividade normal do HGPRT.
4.2 CATABOLISMO DE PURINAS E DE PIRIMIDINAS
As purinas provenientes da dieta e da renovação dos nucleotídeos púricos dos
ácidos nucleicos são degradas e convertidas em ácido úrico, que é então excretado
na urina. As principais enzimas envolvidas no catabolismo das purinas são a xantina
oxidase e a xantina desidrogenase, que convertem a xantina, subproduto da adenosina
e guanosina, em ácido úrico.
O acúmulo de ácido úrico na forma de cristais de urato de sódio causa a doença
chamada de gota com sintomas de inflamação, dor e artrite nas articulações afetadas.
Os rins também são afetados, pois o excesso de ácido úrico pode se depositar nos
túbulos renais, levando a cálculos renais. A gota é mais comum em homens do que
em mulheres e é mais provável de ocorrer à medida que as pessoas envelhecem. A
causa exata da gota não é totalmente compreendida, mas geralmente está associada
à excreção reduzida de urato, que pode ser devido a uma variedade de fatores, como
genética, dieta e certas condições médicas. As vias para a degradação das pirimidinas
geralmente levam à produção de NH4
+ e, assim, à síntese de ureia.
200
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• Os lipídios são hidrolisados para produzir ácidos graxos e glicerol.
• As gorduras digeridas e absorvidas são mobilizadas e podem servir como fontes de
energia em momentos de necessidade.
• Os ácidos graxos são oxidados por meio de uma série de reações conhecidas como
β-oxidação para fornecer energia para a célula.
• A síntese de ácidos graxos acontece na mitocôndria e é um processo endergônico.
• O colesterol é precursor dos hormônios esteroides, ácidos biliares e vitamina D.
• As lipoproteínas são moléculas complexas que transportam lipídios e colesterol por
todo o corpo.
• A primeira etapa do catabolismo dos aminoácidos é a remoção do grupo amino, por
meio de reações de transaminação e desaminação.
• A amônia é tóxica em altas concentrações, por isso é convertida a ureia no ciclo da
ureia e é excretada na urina.
• Os esqueletos de carbono dos aminoácidos sofrem outras reações para formar
compostos que podem ser usados para a síntese de glicose ou para a síntese de
corpos cetônicos.
• O metabolismo dos nucleotídeos abrange a síntese de novo a partir de precursores
simples e as vias de salvação que reciclam os nucleotídeos existentes.
• Os nucleotídeos degradados formam o ácido úrico e amônia que pode entrar no
ciclo da ureia.
201
AUTOATIVIDADE
1 Quando fazemos dieta para emagrecer, os triglicerídeos do nosso tecido adiposo são
degradados em ácidos graxos que são liberados no sangue e transportados ligados
a uma proteína e levados para os tecidos alvos. Dentro dascélulas, os ácidos graxos
são transportados para as mitocôndrias por um tipo de transporte específico. Assinale
a alternativa CORRETA que descreva a proteína e transporte envolvido no processo
de mobilização de gorduras no corpo humano.
a) ( ) Albumina e carnitina.
b) ( ) Albumina e colesterol.
c) ( ) Lipoproteínas e carnitina.
d) ( ) Albumina e Lipoproteínas.
2 A insulina é um hormônio produzida pelo pâncreas que regula o nível de glicose
no sangue e sua desregulação pode levar a vários problemas de saúde, incluindo o
diabetes. Assinale a alternativa CORRETA sobre a que a deficiência de insulina está
associada:
a) ( ) Redução da lipólise.
b) ( ) Aumento da cetogênese.
c) ( ) Gliconeogênese reduzida.
d) ( ) Proteólise reduzida.
3 O ciclo da ureia é um processo importante de excreção de nitrogênio no corpo humano.
É uma via metabólica que permite a conversão de amônia tóxica, um subproduto da
degradação de proteínas, em ureia, que é excretada pelos rins. Acerca das reações
do ciclo da ureia, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Ocorre apenas na mitocôndria.
b) ( ) Libera ATP como subproduto do ciclo.
c) ( ) Requer o grupo α-amino do aspartato.
d) ( ) É induzida por dietas de baixa proteína.
4 A Acetil-CoA carboxilase (ACC) é uma enzima crucial na regulação da síntese de
ácidos graxos no corpo. A sua atividade é regulada por vários fatores, incluindo
sinais de estado de energia e estímulos hormonais, e tem um impacto significativo
na produção de ácidos graxos e na homeostase energética do corpo. Como a ACC
é regulada? A célula realiza síntese de ácidos graxos quando o estado de energia é
baixo? Explique.
202
5 O metotrexato inibe a diidrofolato redutase, uma enzima responsável pela conversão
do diidrofolato em tetraidrofolato, e tem sido usado na quimioterapia do câncer,
incluindo o tratamento da leucemia. Como ele inibe as células cancerígenas?
203
TÓPICO 3 -
METABOLISMO DE CARBOIDRATOS E
BIOENERGÉTICA
1 INTRODUÇÃO À RESPIRAÇÃO CELULAR
Todos os seres vivos estão continuamente usando energia. Nos seres humanos,
a energia é necessária para se mover, mas também para respirar, para pensar e até
durante o sono. Nas células, a energia é necessária em muitas funções, como na síntese
e quebra de moléculas, no transporte de moléculas para dentro e para fora das células
e manutenção da célula.
A respiração celular é o processo pelo qual as células geram energia na forma
de ATP, quebrando moléculas orgânicas – glicose, ácidos graxos e alguns aminoácidos
– na presença de O2 e com produção de CO2. Quando o oxigênio é utilizado na respiração
celular, esse processo é chamado de respiração celular aeróbia e acontece em três
estágios principais (Figura 25).
A glicólise no citoplasma é o ponto central do metabolismo de carboidratos
e ocorre no primeiro estágio da respiração celular, onde uma molécula de glicose é
convertida em duas moléculas de piruvato, gerando um ganho líquido de 2ATP e 2NADH.
Em seguida, o ciclo do ácido cítrico, também chamado de ciclo de Krebs ou
ciclo do TCA, acontece na mitocôndria. O ciclo do ácido cítrico começa pela oxidação do
acetil-CoA derivado do piruvato na etapa anterior, produzindo CO2 e a energia liberada é
conservada nos transportadores de elétrons reduzidos como NADH e FADH2.
O último estágio da respiração celular ocorre na membrana interna da mitocôndria
e é chamado de fosforilação oxidativa. A energia dos elétrons transportados por NADH
e FADH2 é usada para bombear prótons através da membrana, criando um gradiente
de prótons que impulsiona a síntese de ATP, a moeda energética da célula, usada pelos
seres vivos para suprir suas necessidades de energia. A estequiometria dessas reações
permite um rendimento total de aproximadamente 32 ATP por molécula de glicose.
No Tema de Aprendizagem 3, abordaremos as reações do metabolismo de
carboidrato e as enzimas que catalisam as reações metabólicas liberando a energia
presente nos carboidratos para alimentar as células e os sistemas que compõem o
corpo.
Sob condições anaeróbias, na ausência de oxigênio ou na hipóxia, a produção
de energia pode ser feita por meio da fermentação.
UNIDADE 3
204
A glicose que não foi utilizada no processo da respiração celular é armazenada
na forma de glicogênio. Por outro lado, quando os estoques de glicogênio se esgotam,
a glicose pode ser sintetizada pelo próprio corpo para manter os níveis de glicose no
sangue e prover energia para o funcionamento das células.
Figura 25 – Catabolismo de proteínas, gorduras e carboidratos durante os três estágios da respiração celular
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.634)
Estágio 1: a oxidação de ácidos graxos, glicose e alguns aminoácidos gera acetil-CoA.
Estágio 2: a oxidação dos grupos acetil no ciclo do ácido cítrico inclui quatro etapas
nas quais os elétrons são removidos. Estágio 3: os elétrons carreados por NADH e
205
FADH2 convergem para uma cadeia de transportadores de elétrons mitocondrial (ou,
em bactérias, ligados à membrana plasmática) – a cadeia respiratória – reduzindo, no
final, O2 a H2O. Esse fluxo de elétrons impele a produção de ATP.
2 GLICÓLISE
A glicose é o principal combustível da maioria das nossas células. As vias
alimentadoras para o fornecimento da glicose são os estoques de glicogênio, e, a
partir da dieta, provém principalmente de dissacarídeos, como sacarose e lactose, ou
polissacarídeos, como o amido, que são hidrolisados por enzimas digestivas e a glicose
distribuída para o todo o corpo pela corrente sanguínea.
A glicólise (do grego, “quebra do açúcar”) ou via glicolítica, é a via metabólica
da degradação da glicose, um monossacarídeo de 6 carbonos para formar 2 moléculas
de piruvato de 3 carbonos, passando por reações sequenciais em que a energia livre
é conservada na forma de ATP e NADH. Essas reações ocorrem no citoplasma em 10
etapas, divididas em 2 fases (Figura 26). Todas essas reações são catalisadas por enzimas
específicas, sendo a enzima fosfofrutocinase-1 a mais importante para a regulação da
via, uma vez que controla a velocidade da glicólise.
A primeira fase da glicólise é chamada de preparatória ou de investimento, pois
utiliza duas moléculas de ATP, e a segunda fase é chamada de pagamento pois produz
um saldo positivo de ATP.
206
Figura 26 – As duas fases da glicólise
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.545)
207
Para cada molécula de glicose que passa pela fase preparatória (a), duas moléculas
de gliceraldeído-3-fosfato são formadas; as duas passam pela fase de pagamento
(b). O piruvato é o produto final da segunda fase da glicólise. Para cada molécula de
glicose, dois ATP são consumidos na fase preparatória e quatro ATP são produzidos
na fase de pagamento, dando um rendimento líquido de dois ATP por molécula de
glicose convertida em piruvato. As reações numeradas correspondem aos títulos
numerados discutidos no texto. Lembre-se que cada grupo fosforil, representado
aqui como possui duas cargas negativas (-PO32-).
2.1 FASE PREPARATÓRIA
Primeiro, a fase preparatória, de investimento, a energia do ATP é consumida.
São 5 etapas:
1. A fosforilação da glicose faz com que ela permaneça na célula para ser metabolizada.
A glicose, uma aldose, hexose, é transportada para dentro da célula por
transportadores de glicose e é fosforilada no C6 formando glicose-6-fosfato. O ATP é
o doador do grupo fosforil. Essa é uma reação exergônica irreversível catalisada pela
primeira enzima da via, hexocinase, uma transferase.
Todas as cinases requerem um íon divalente como o Mg2+, que atrai e forma
complexo com o ATP. A hexocinase passa por um ajuste induzido ao ligar-se com o
substrato e muda sua conformação, catalisando a transferência do grupo fosforil do ATP
para a glicose. Essa é uma enzima que sofre regulação.
A glicólise é o centro do metabolismo dos carboidratos, uma vez que outras
D-hexoses, incluindo a frutose, a galactose e a manose, também podem ser fosforiladas
e entrar naglicólise.
2. Isomerização da glicose-6-fosfato, uma aldose em uma cetose, a frutose-6-
fosfato. Reação reversível catalisada pela fosfo-hexose-isomerase (ou fosfoglicose-
isomerase).
3. Fosforilação da frutose-6-fosfato a frutose-1,6-bisfosfato, com a transferência de
um grupo fosforil do ATP.
O prefixo “bi” é usado quando 2 grupos fosfatos estão em diferentes posições;
usa-se “di” quando os grupos fosfato estão ligados um ao outro.
A frutose-1,6-bisfosfato estará comprometida apenas para a glicólise. Essa é
uma reação irreversível catalisada pela enzima PFK-1 (fosfofrutocinase-1) que sofre
complexa regulação alostérica.
208
4. Clivagem da ligação C-C da frutose-1,6-bisfosfato em 2 isômeros trioses-fosfatos
interconversíveis. A enzima aldolase catalisa a condensação aldólica inversa
resultando na formação de uma cetose – di-hidroxi-acetona-fosfato e uma aldose
– gliceraldeído-3-fosfato; e
5. Interconvenção, realizada pela enzima triose-fosfato isomerase, pois apenas
aldoses seguiram na segunda etapa da via glicolítica.
2.2 FASE DE PAGAMENTO
Depois, a segunda fase é a pagamento ou lucro. As reações acontecem em
dobro, a partir das duas trioses formadas na fase anterior, com formação de ATP e
transferência de elétrons para o NAD+ produzindo o NADH.
6. A oxidação e fosforilação do gliceraldeído-3-fosfato formando o 1,3-bifosfoglicerato
com produção de NADH. Essa é uma reação reversível da enzima gliceraldeído-3-
fosfato desidrogenase da classe das oxidorredutase.
7. O 1,3-bifosfoglicerato tem uma ligação fosfórica rica em energia (acil-fosfato). A
enzima fosfoglicerato-cinase transfere o grupo fosforil para o ADP, formando ATP e
3-fosfoglicerato.
8. Transferência do fosforil do C3 para o C2 formando 2-fosfoglicerato, pela ação da
enzima fosfoglicerato-mutase em uma reação reversível.
9. A enzima enolase remove H20 para formar uma dupla ligação entre carbonos,
formando o fosfoenolpiruvato ou PEP, em uma reação reversível.
10. A última etapa da glicólise. A piruvato-cinase transfere o fosforil da PEP para o ADP,
formando ATP e piruvato. Essa é uma reação irreversível e a enzima sofre regulação.
Na equação global (fase de lucro menos a fase de investimento), para cada
molécula de glicose degradada a 2 piruvatos, 2ATP são gerados - provenientes de
2ADP + 2Pi, e 2NADH são produzidos - utilizando 2NAD+. Sendo assim, a equação geral
resumida da glicólise é
Glicose + 2NAD+ + 2ADP + 2Pi à 2 Piruvato + 2NADH + 2H+ + 2ATP + 2H2O
Essa equação pode ser dividida em dois processos:
1. Exergônico: a conversão de glicose a piruvato.
Glicose + 2NAD+ à 2 Piruvato + 2NADH + 2H+ ΔG1’º = - 146 kJ/mol
2. Endergônico: a formação de ATP a partir de ADP e Pi.
2ADP + 2Pi à 2ATP + 2H2O ΔG2’º = 2(30,5 kJ/mol) é 61,0 kJ/mol
A soma desses dois processos fornece a variação da energia livre padrão total
da glicólise (ΔGs’º) onde, ΔGs’º = ΔG1’º + ΔG2’º = - 146 kJ/mol + 61 kJ/mol, resultando em
- 85 kJ/mol.
209
Essas equações mostram que sob condições padrão, a glicólise é um processo
essencialmente irreversível, o que significa que a conversão de glicose em piruvato não
é facilmente reversível.
Isso se deve ao fato de que as reações na glicólise envolvem uma grande
diminuição líquida na energia livre, em que os produtos das reações estão em um estado
de energia menor que os reagentes. Logo, a energia liberada durante as reações leva à
conclusão da conversão de glicose em piruvato.
As duas moléculas de piruvato formadas pela glicólise ainda contêm a maior
parte da energia potencial química existente na glicose. A energia será extraída
dependendo do estado da célula e o piruvato poderá ser metabolizado por 3 rotas
principais (Figura 27):
• Nas condições aeróbias, o piruvato é transformado em acetil-CoA e entra no ciclo
de Krebs para ser oxidado a CO2, doando elétrons para a fosforilação oxidativa na
mitocôndria.
• E em condições anaeróbias resultam na permanência do piruvato no citoplasma
para o processo de fermentação. O piruvato é reduzido a lactato por meio da
fermentação láctica nas células como do músculo.
• Em alguns vegetais e microrganismos, em condições anaeróbicas, acontece a
fermentação alcoólica com produção de etanol e CO2.
Figura 27 – Os três destinos catabólicos possíveis do piruvato formado na glicólise
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.545)
210
O piruvato também serve como precursor em muitas reações anabólicas, não
mostradas aqui.
2.3 FERMENTAÇÃO
A fermentação é o termo geral para a degradação anaeróbica da glicose ou
outros nutrientes orgânicos para obtenção de energia.
O NAD+ necessário para a glicólise é escasso e precisa ser continuamente
regenerado. Em condições aeróbias, as duas moléculas NADH serão reoxidadas a
NAD+ pela transferência de seus elétrons para a cadeia de transporte de elétrons na
mitocôndria durante a etapa da fosforilação oxidativa. E em condições anaeróbicas,
serão regenerados durante o processo de fermentação.
A fermentação láctica é catalisada de forma reversível pela enzima lactato-
desidrogenase. O piruvato recebe elétrons do NADH e é transformado em L-lactato, e
o NADH é regenerado. Ocorre no músculo esquelético muito ativo, nos eritrócitos, nos
tecidos vegetais submersos, nos tumores sólidos ou nas bactérias lácticas.
O lactato formado pelo músculo esquelético em atividade (ou pelos eritrócitos)
pode ser reciclado pelo ciclo de Cori, no músculo durante o exercício intenso, quando o
metabolismo aeróbico não providencia a energia necessária. O lactato é transportado
pelo sangue até o fígado, onde é reconvertido a piruvato pela lactato-desidrogenase, e
transformado em glicose pela gliconeogênese. A glicose retorna ao músculo.
Figura 28 – Cooperação metabólica entre o músculo esquelético e o fígado: o ciclo de Cori
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.948)
211
Cooperação metabólica entre o músculo esquelético e o fígado: o ciclo de Cori
Músculos extremamente ativos usam o glicogê-nio como fonte de energia, gerando
lactato via glicólise. Durante a recupera-ção, parte deste lactato é transportada
para o fígado e convertida em glicose via gliconeogênese. Esta glicose é liberada
no sangue e retorna ao músculo para repor seus estoques de glicogênio. A via total
(glicose S lactato S gli-cose) constitui o ciclo de Cori.
O processo de fermentação alcoólica ocorre em leveduras e microrganismos que
fermentam glicose em etanol e CO2, em vez de lactato. A glicose é convertida a piruvato
pela glicólise (produz 2ATP), e o piruvato é convertido a CO2 e etanol (regenerando o
NADH) em um processo de duas etapas.
1. Primeiro: reação reversível da piruvato-descarboxilase resulta em CO2 e acetoaldeído.
A piruvato-descarboxilase está presente em leveduras utilizadas para fabricação de
cerveja (Figura 29) e pão (Saccharomyces cerevisiae).
2. Segundo: redução do acetoaldeído a etanol, regenerando o NADH pela enzima
álcool-desidrogenase. Está presente em muitos organismos que metabolizam
etanol, incluindo o homem.
212
Figura 29 – Fermentações etanólicas: fabricando cerveja e produzindo biocombustíveis
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.566)
3 GLICONEOGÊNESE
A gliconeogênese é a síntese de glicose, um processo com alto custo energético,
porém essencial para manter as concentrações de glicose no sangue, quando
necessário. Essa via compartilha 7 etapas na direção oposta da glicólise, contornando
as 3 reações irreversíveis (Figura 30). Em animais as duas vias ocorrem principalmente
no citosol.
213
Figura 30 – Vias opostas da glicólise e da gliconeogênese em fígado de rato
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.569)
As reações da glicólise estão do lado esquerdo, em vermelho; a via oposta, a
gliconeogênese, está mostrada do lado direito, em azul. Os principais pontos de
regulação da gliconeogênese representados aqui.
Em mamíferos, a gliconeogênese no fígado, nos rins e no intestino delgado
gera a glicose para uso pelo cérebro, músculose eritrócitos, pois estes não fazem a
gliconeogênese. Uma nova molécula de glicose pode ser produzida a partir de lactato,
piruvato, glicerol, intermediários do ciclo de Krebs e certos aminoácidos glicogênios.
Quando o piruvato é o precursor, há as seguintes 3 reações de contorno:
214
1. O primeiro contorno envolve uma sequência de reações com enzimas da mitocôndria
e do citosol. Na mitocôndria, o piruvato de 3C é convertido a oxaloacetato de
4C. O carbono é proveniente do bicarbonato e adicionado pela enzima piruvato-
carboxilase mitocondrial com consumo de ATP e requer a coenzima biotina.
No citosol, oxaloacetato perde o carbono, recebendo transferência de fosforil do
GTP para produzir uma ligação fosfoenol formando a PEP de 3C pela ação da PEP-
carboxicinase. Essas etapas sofrem regulação.
Para transportar oxaloacetato da mitocôndria para o citosol, este é reduzido a
malato pela malato-desidrogenase com consumo de NADH mitocondrial. O malato deixa
a mitocôndria por transportador. No citosol é reoxidado a oxaloacetato com produção de
NADH citosólico, que será utilizado na via da gliconeogênese.
Esse transporte não acontece quando o lactato é o precursor, pois a conversão
de lactato em piruvato pela lactato-desidrogenase gera o NADH citosólico. Então,
quando o lactato é precursor, a PEP é transportada para fora da mitocôndria, dando
continuidade à via da gliconeogênese (Figura 31).
2. No segundo contorno, a enzima frutose-1,6-fosfatase-1 faz a hidrólise do fosfato do
C1 da Frutose-1,6-bifosfato, formando a frutose-6-fosfato + Pi.
3. No último contorno, a glicose-6-fosfatase faz a hidrólise da ligação éster de fosfato,
produzindo a glicose + Pi.
A gliconeogênese, assim como a glicólise é um processo essencialmente
irreversível nas células. É uma via dispendiosa, sendo que para cada glicose formada
a partir de 2piruvato gastam-se 4 ATP, 2 GTP, e 2 NADH. A equação global da
gliconeogênese é:
2Piruvato + 4ATP + 2NADH + 2H+ + 4H2O à Glicose + 4ADP + 2GDP + 6Pi + 2NAD+
Nos mamíferos, não ocorre a conversão líquida de ácidos graxos em glicose. Os
vegetais, as leveduras e muitas bactérias possuem a via do glioxilato, para converter
acetil-CoA em oxaloacetato e, assim, utilizar ácidos graxos como matéria-prima para a
gliconeogênese. Esse mecanismo é utilizado pelas plantas durante a germinação das
sementes.
215
Figura 31 – Vias alternativas da transformação do piruvato em fosfoenolpiruvato
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.573)
A importância relativa das duas vias depende da disponibilidade de lactato ou
piruvato e das necessidades citosólicas de NADH para gliconeogênese. A via à direita
predomina quando o lactato é o precursor, já que NADH citosólico é gerado na reação
da lactato-desidrogenase e não pode ser transportado para fora da mitocôndria.
4 VIA DAS PENTOSES FOSFATO
As hemácias maduras não possuem as organelas intracelulares encontradas
nas outras células eucarióticas como o núcleo (são enucleadas), lisossomo, aparelho de
Golgi e mitocôndrias, e por isso são incapazes de reproduzir, de sintetizar proteínas e
não realizam β-oxidação, ciclo de Krebs e a fosforilação oxidativa. Consequentemente,
são completamente dependentes da glicólise para gerar ATP. O ATP é utilizado
principalmente no funcionamento da bomba Na+K+, para manter e reparar a membrana
216
e, em menor quantidade, para que os átomos de ferro da hemoglobina se mantenham
na forma reduzida.
A glicose penetra nas hemácias por difusão facilitada mediada pelo transportador
de glicose (GLUT1), sendo convertida em glicose-6-fosfato pela enzima hexocinase,
e segue principalmente a via glicolítica, para a produção de ATP. O produto da via
glicolítica, o lactato, é reciclado no ciclo de Cori, que devolve a glicose.
A via glicolítica nas hemácias possui também um desvio, para produzir
2,3 bifosfoglicerato (2,3-BPG) por isomerização. O 2,3-BPG é a molécula que estabiliza
a hemoglobina no estado T, com a finalidade de facilitar a liberação do oxigênio para os
tecidos.
Além das hemácias, o fígado, tecido adiposo, córtex adrenal, testículos,
glândulas mamárias, células fagocitárias possuem uma outra via de oxidação da glicose
chamada via das pentoses fosfato (PPP). Nessa via, a glicose-6-fosfato é o substrato
chamada via das pentoses fosfato para produzir ribose-5-fosfato (R5P), riboluse-5-
fosfato (Ru5P) e a coenzima reduzida NADPH2.
A ribose-5-fosfato é usada para a síntese de nucleotídeos dos ácidos nucleicos
ou é reciclada na via das penstoses-fosfato para mais produção de NADPH2.
A sequência de reações dessa via pode ser dividida em duas fases (Figura 32):
• A primeira fase consiste na oxidação da glicose-6-fosfato em 6-fosfogliconato,
acompanhada por redução do NADP+.
A glicose-6-fosfato desidrogenase é a enzima que catalisa a primeira reação
da via.
A lactona é hidrolisada e gera uma segunda molécula de NADPH e ribulose-5-
fosfato. Em seguida, uma isomerase gera a ribose-5-fosfato, precursora para a síntese
de nucleotídeos.
• A segunda fase não oxidativa, reversível, compreende etapas não oxidativas com
rearranjo dos esqueletos de carbono, que convertem pentoses-fosfato a glicose-6-
fosfato, e reinicia o ciclo.
A Equação global da via das pentoses-fosfato é:
Glicose-6-fosfato + 2NADP+ + H2O à ribose-5-fosfato +CO2 + 2NADPH + 2H
+
A regulação da entrada de glicose-6-fosfato na via glicolítica ou na via das
pentoses-fosfato é determinada pelas concentrações relativas de NADP+ e NADPH. O
NADPH faz a inibição alostérica da enzima glicose-6-fosfato desidrogenase.
217
O NADPH produzido pela via das pentoses-fosfato será utilizado para produzir
a glutationa, que participa do sistema de antioxidantes da célula e assim evitar o dano
oxidativo.
A glutationa reduzida (GSH) é um tripeptídeo de ácido glutâmico, cisteína e
glicina, sintetizada nas hemácias com consumo de ATP. Possui um grupo -SH da cisteína
atuando como aceptor de elétrons, facilmente oxidável, formando a glutationa oxidada
(GSSG). A célula aumenta o metabolismo da via das pentoses para gerar mais NADPH
(através da ação das desidrogenases), necessário para a regeneração da glutationa por
reação catalisada pela enzima flavoproteína glutationa redutase (GR) (Figura 32).
A glutationa também impede que proteínas no citoplasma formem pontes
dissulfeto entre seus grupos -SH e previne a agregação de proteínas, como nos casos
da formação dos corpos de Heinz, agregados insolúveis de hemoglobina cujos grupos
—SH foram oxidados e que se coram de roxo com cresil violeta.
As deficiências enzimáticas, entre outros fatores intrínsecos ou extrínsecos,
resultam em anemias hemolíticas. Em indivíduos deficientes em glicose-6-fosfato
desidrogenase, a produção de NADPH está diminuída e a destoxificação de espécies
reativas como H2O2 está inibida, consequentemente aumentando a presença dessas
espécies reativas que causam o dano oxidativo na e célula. Esse mecanismo resulta
na destruição de glóbulos vermelhos (hemólise) depois de uma doença aguda ou uso
de certos medicamentos. Por outro lado, nesses indivíduos, a presença aumentada de
espécies reativas confere resistência contra o parasita da malária, que infecta as hemácias.
Figura 32 – Esquema geral da via das pentoses-fosfato
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.575)
218
O NADH formado na fase oxidativa é utilizado para produzir glutationa, GSSG (ver
Quadro 14-4) e dar suporte para a biossíntese redutora. O outro produto da fase
oxidativa é a ribose-5-fosfato, que serve como precursor para nucleotídeos,
coenzimas e ácidos nucleicos. Em células que não estão utilizando a ribose-5-
fosfato para a biossíntese, a fase não oxidativa regenera seis moléculas da pentose
em cinco moléculas da hexose glicose-6-fosfato, permitindo a produção contínua
de NADPH e convertendo glicose-6-fosfato (em seis ciclos) a CO2.
5 METABOLISMO DO GLICOGÊNIO
No organismo, o excesso de glicose é convertido em formas poliméricas dearmazenamento; o glicogênio, em vertebrados; e o amido, nas plantas. Em vertebrados, o
glicogênio é encontrado principalmente no fígado, para manter a glicemia no sangue nas
primeiras horas de jejum, e no músculo esquelético, onde fornece fonte local de energia
rápida. Nesses tecidos, o glicogênio é armazenado no citosol na forma de grânulos,
onde estão presentes também as enzimas responsáveis pela sua metabolização.
A degradação ou quebra dos polímeros para obtenção de glicose é chamada de
glicogenólise.
A síntese de glicogênio é chamada de glicogênese, processo pelo qual o
glicogênio é sintetizado, adicionando unidades monoméricas de glicose ligadas entre
si por ligações α1-4, formando polímeros de cadeias lineares e também ramificadas por
ligações α1-6.
O ponto de partida para a síntese de glicogênio é glicose-6-fosfato. A glicose
livre que entrou no citosol é fosforilada pela enzima hexocinase com transferência do
fosfato do ATP, formando a glicose-6-fosfato. Esta pode ser convertida para glicose-1-
fosfato na reação reversível catalisada pela fosfoglicomutase.
A síntese de glicogênio utiliza como precursor uma forma ativada da glicose, que
são os nucleotídeos de açúcar ou UDP-glicose. Para formar a UDP-glicose, a glicose-
1-fosfato é unida por ligação éster de fosfato a um nucleotídeo uridina trifosfato (UTP)
liberando PPi, pela reação da enzima UDP-glicose pirofosforilase.
A UDP-glicose é o doador de glicose para a síntese de glicogênio na reação
catalisada pela enzima glicogênio-sintase. Essa enzima promove a transferência
de glicose (da UDP-glicose) para o C4 da extremidade não redutora na molécula de
glicogênio, a partir de um molde. Estendendo o glicogênio (n+1) com novas ligações na
configuração α1-4, e o UDP é liberado.
No entanto, a enzima glicogênio sintase só catalisa reações de adição de glicose
a partir de um molde já formado. A formação inicial (“de novo”) de um molde é realizada a
partir da proteína glicogenina. Uma enzima transferase liga um resíduo UDP-glicose ao
219
-OH do aminoácido (Tyr) da proteína glicogenina. Em seguida, a glicogenina forma um
complexo com a enzima glicogênio-sintase, adicionando UDP-glicose para formar um
molde de 8 unidades. Após finalizado o molde, a enzima glicogênio-sintase dissocia-se
da glicogenina e prossegue estendendo a cadeia.
As ramificações encontradas no glicogênio são catalisadas pela enzima de rami-
ficação do glicogênio. Essa enzima remove um ramo (ou fragmento) terminal de 7 glico-
ses de um polímero de glicogênio (com n>11) e catalisa a transferência desse ramo para
a hidroxila do C6 de outro resíduo de glicose que está localizado mais internamente na
mesma cadeia ou outra cadeia, formando uma ramificação com ligação α1-6 (Figura 33).
Figura 33 – Síntese da ramificação do glicogênio
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.619)
A enzima de ramificação do glicogênio (também chamada de amilo-[1S4]-[1S6]
transglicosilase, ou glicosil-[4S6]-transferase) forma um novo ponto de ramificação
durante a síntese do glicogênio.
O resultado da ação da enzima de ramificação é um polímero altamente
ramificado. As cadeias de glicogênio se distribuem em camadas, sendo as camadas
externas as mais ramificadas. Os polímeros de glicogênio contêm várias unidades não
redutoras e apenas uma unidade redutora no seu interior (o açúcar redutor tem um
aldeído livre que pode ser oxidado) (Figura 34).
220
Figura 34 – Estrutura da partícula de glicogênio
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.619)
Iniciando com uma molécula de glicogenina central, as cadeias de glicogênio (12 a
14 resíduos) se distribuem em camadas. As cadeias internas têm, cada uma, duas
ramificações (α1à6). As cadeias na camada mais externa não são ramificadas. Existem
12 camadas em uma partícula madura de glicogênio (estão mostradas aqui somente
cinco), consistindo em cerca de 55.000 resíduos de glicose em uma molécula com
cerca de 21 nm de diâmetro e Mr-1 x 107.
A degradação do glicogênio é a via da glicogenólise, liberando uma unidade
de glicose por vez, porém de várias pontas não redutoras do glicogênio. Na primeira
etapa, a enzima glicogênio-fosforilase remove as moléculas de glicose-1-fosfato da
extremidade não redutora do glicogênio.
A reação é uma fosforólise (sem hidrólise de ATP). Um fosfato inorgânico
ativado ataca a ligação glicosídica α1-4, removendo um resíduo de glicose-1-fosfato,
formando um glicogênio menor (n-1). Quando alcança um ponto anterior a 4 resíduos da
ramificação α1-6, a enzima de desramificação catalisa duas reações:
a. de atividade transferase, removendo 3 resíduos e reconectando-os em ligação α1-4
a uma extremidade não redutora;
b. de atividade glicosidase, liberando o resíduo ramificado que ficou por hidrólise.
O polímero linear restante volta a ser substrato para enzima glicogênio-
fosforilase (Figura 35).
221
Figura 35 – Degradação do glicogênio próximo a um ponto de ramificação (α1à6)
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.614)
Seguindo-se à remoção sequencial dos resíduos terminais de glicose pela glicogênio-
fosforilase, os resíduos próximos a uma ramificação são removidos por um processo
em duas etapas que requer a enzima de desramificação bifuncional. Na primeira, a
atividade de transferase da enzima remove um bloco de três resíduos de glicose da
ramificação para uma extremidade não redutora próxima, à qual é religado por uma
ligação (α1à4). O resíduo remanescente no ponto de ramificação, em ligação (α1à6),
é então liberado como glicose livre pela atividade de glicosidase (α1à6) da enzima
de desramificação. Os resíduos de glicose são mostrados na forma condensada que
omite os grupos ¬H, ¬OH e ¬CH2OH dos anéis piranosídicos.
A glicose-1-fosfato pode ser convertida em glicose-6-fosfato por reação
reversível catalisada pela enzima fosfoglicomutase.
222
No citosol do fígado, a glicose-6-fosfato pode ser transportada para o retículo
endoplasmático, onde sofre a ação glicose-6-fosfatase, transformando-se em glicose
+ Pi. Essa glicose livre será transportada para os capilares para chegar aos tecidos que
a requerem como combustível.
No músculo, a glicose-6-fosfato entra na via glicolítica para fornecer combustível.
6 CICLO DO ÁCIDO CÍTRICO
O ciclo de Krebs, também conhecido como ciclo do ácido cítrico ou ciclo dos
ácidos tricarboxílicos (TCA), é uma série de reações químicas que ocorrem na matriz
mitocondrial das células eucarióticas. A principal função do ciclo de Krebs é gerar
energia na forma de ATP por meio da oxidação do acetil-CoA, derivado da quebra de
carboidratos, gorduras e proteínas.
As mitocôndrias são formadas por duas membranas, a externa, que é mais lisa e
mais permeável, e a membrana interna, com invaginações (cristas), essa é impermeável
à maioria das moléculas e íons que precisam de transportadores específicos para
atravessar a membrana.
O piruvato proveniente da glicólise é transportado do citosol para a mitocôndria
por transportador específico, pois a membrana interna da mitocôndria é impermeável
ao piruvato. O piruvato na mitocôndria é convertido em acetil-CoA através das reações
catalisadas por um complexo de enzimas chamado de complexo piruvato desidrogenase
(PDH). Esse complexo sofre regulação.
O complexo consiste em três enzimas diferentes (E1, E2 e E3). A enzima
E1, também conhecida como piruvato desidrogenase, contém tiamina pirofosfato
(TPP), que é um derivado da vitamina B1. A enzima E2, também conhecida como di-
hidrolipoil-transacetilase, contém coenzima A (CoA) e lipoato. A enzima E3, também
conhecida como di-hidrolipoil-desidrogenase, contém flavina adenina dinucleotídeo
(FAD) e nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD), derivados das vitaminas B2 e B3,
respectivamente.
Cada uma dessas enzimas e cofatores desempenha um papel específico na
reação geral catalisada pelo complexo. Os diferentes cofatores são necessários para
o bom funcionamento do complexo e muitas vezes são obtidos através da dieta. A
deficiência de qualquer umadessas vitaminas pode levar a uma disfunção no complexo
piruvato desidrogenase e pode resultar em problemas de saúde.
Uma vez dentro da matriz mitocondrial, o piruvato é descarboxilado por uma
reação irreversível que produz CO2, ácido acético e reduz o NAD+ a NADH. Em seguida,
o ácido acético é ligado a CoA por ligação tioéster para formar o acetil-CoA (Figura 36).
223
Figura 36 – Reação geral catalisada pelo complexo da piruvato-desidrogenase
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.635)
As cinco coenzimas participantes desta reação e as três enzimas que formam o
complexo são discutidas no texto
O acetil-CoA produzido da glicólise ou derivado de outros compostos, entra
no ciclo de Krebs, onde se combina ao oxaloacetato de 4 carbonos para formar um
composto de 6 carbonos chamado citrato. O citrato é então decomposto em uma série
de reações que liberam CO2, H+ e energia na forma de ATP e NADH. O ciclo termina com
a regeneração do oxaloacetato que então pode reagir com outra molécula de acetil-
CoA. Esse processo pode ser divido em 8 etapas:
1. A primeira etapa do ciclo é a condensação do grupo acetil do acetil-CoA ao
oxaloacetato para a formação do citrato, com adição de H2O e liberando CoA que
será reciclado posteriormente. Essa é uma reação irreversível catalisada pela enzima
citrato-sintase. Essa enzima sofre regulação.
2. O citrato é então isomerizado a isocitrato. A enzima aconitase catalisa a uma
transformação reversível. Essa enzima contém um centro ferro-enxofre (Fe-S) que
atua na ligação do substrato ao H2O na catalise.
A terceira e quarta etapa são duas reações sucessivas de descarboxilação
oxidativa (perda de 1 carbono), cada uma delas com redução do NAD+ a NADH e
liberando CO2.
3. A enzima isocitrato-desidrogenase, com presença do íon divalente Mn2+ catalisa
uma reação irreversível para formar o α-cetoglutarato que contém uma dupla
ligação.
4. O complexo α-cetoglutarato desidrogenase faz a ligação de CoA ao grupo succinil,
formando succinil-CoA em uma reação irreversível. Esse complexo é similar ao PDH
e também sofre regulação.
5. O succinil-CoA é convertido a succinato pela enzima succinil-CoA-sintetase, em
uma reação reversível. A quebra da ligação tioéster libera energia que é utilizada
para a fosforilação do GDP a GTP. Esse GTP pode ser doador de grupo fosfato para
posteriormente formar ATP em uma outra reação.
224
6. O succinato é oxidado formando o fumarato com uma dupla ligação. Essa reação
é reversível catalisada pela enzima succinato-desidrogenase e o FAD é reduzido
a FADH2. Essa enzima forma o complexo II da membrana interna mitocondrial,
diferentemente das demais enzimas do ciclo de Krebs que estão livres na matriz
mitocondrial.
7. A hidratação do fumarato forma o malato. Essa é uma reação reversível catalisada
pela enzima fumarase, com rompimento da dupla ligação por uma molécula de H2O
e introdução do grupo –OH.
8. A última etapa é a oxidação do –OH do malato formando o oxaloacetato com redução
de NAD+ a NADH pela ação da enzima malato-desidrogenase.
Ao final, para cada acetil-CoA que entra no ciclo, 2CO2 saem do ciclo, redução
de 3NAD+ e FAD para 3NADH e FADH, produção de GTP que pode ser convertido a ATP,
e o oxaloacetado é reciclado (Figura 37). A reação global para o ciclo de Krebs pode ser
resumida como:
Acetil-CoA + 3NAD+ + FAD + GDP + Pi + 2H2O → CoA-SH + 3NADH + FADH2 + 3H+ +
GTP + 2CO2
Figura 37 – Produtos de uma rodada do ciclo do ácido cítrico
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.635)
A cada rodada do ciclo do ácido cítrico, três moléculas de NADH, uma de FADH2,
uma de GTP (ATP) e duas de CO2 são liberadas em reações de des-carboxilação
oxidativa. Aqui, e em algumas das figuras seguintes, todas as reações do ciclo
estão representadas como se elas ocorressem em apenas uma direção, lembre-se,
entretanto, que a maioria das reações são reversíveis.
225
O NADH e FADH vão abastecer a fosforilação oxidativa, levando a formação de
um grande número de ATP.
O ciclo de Krebs também produz várias moléculas intermediárias que são usadas
em outras vias metabólicas. Esses compostos podem atuar como precursores para
a biossíntese de outras moléculas, como ácidos graxos, esteróis, aminoácidos, bases
nitrogenadas, porfirina, heme e glicose. Este processo é conhecido como via anfibólica,
porque participa de processos catabólicos e anabólicos.
Por exemplo, o citrato pode ser convertido em acetil-CoA, o ponto de partida
para a biossíntese de ácidos graxos, e também o precursor da síntese de colesterol.
O α-cetoglutarato é um precursor de aminoácidos como glutamina e glutamato, e
também um precursor de bases nitrogenadas em ácidos nucléicos. O succinil-CoA é um
precursor da porfirina e heme e também um precursor da hemoglobina. O oxaloacetato,
que é o primeiro intermediário do ciclo de Krebs, é um precursor do aminoácido aspartato
e também um precursor da glicose através da gliconeogênese.
As reações anapleróticas são um grupo de reações metabólicas que adicionam
intermediários ao ciclo de Krebs para repor os intermediários que foram removidos
do ciclo para fins de biossíntese. Essas reações ajudam a manter o equilíbrio dos
intermediários dentro do ciclo e garantem que o ciclo continue a produzir energia para a
célula. Exemplos de reações anapleróticas incluem a conversão de piruvato em acetil-
CoA, que repõe o suprimento de acetil-CoA no ciclo, e a conversão de oxaloacetato em
malato, que repõe o suprimento de oxaloacetato.
7 REGULAÇÃO
As vias metabólicas do metabolismo de carboidratos são reguladas para
funcionar junto de forma econômica. As reações irreversíveis são geralmente os alvos de
regulação hormonal e alostérica. Na modulação alostérica, a interação com o modulador
ocorre em sítio diferente de onde ocorre a catálise.
Os hormônios agem pelo seu receptor e via de segundos mensageiros para
atingir enzimas envolvidas nas vias energéticas.
7.1 REGULAÇÃO DA GLICOLISIS
A via da glicólise e gliconeogênese são altamente reguladas. A insulina secretada
após a alimentação ou em situações de hiperglicemia, estimula as enzimas reguladoras
da glicólise. O glucagon secretado no jejum ou em situações de hipoglicemia afeta
principalmente as células do fígado, agindo como inibidor das enzimas reguladoras da
glicólise e ativando a gliconeogênese (Figura 38).
226
Figura 38 – Regulação das vias que produzem ATP
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.762)
Este diagrama mostra a regulação interconectada da glicólise, da oxidação do
piruvato, do ciclo do ácido cítrico e da fosforilação oxidativa pelas concentrações
relativas de ATP, ADP, AMP e por NADH. Alta [ATP] (ou baixa [ADP] e [AMP]) produz
baixas velocidades de glicólise, oxidação do piruvato, oxidação do acetato via ciclo
do ácido cítrico e fosforilação oxidativa. Todas as quatro vias são aceleradas quando
227
o uso de ATP e a formação de ADP, AMP e Pi aumentam. A interligação da glicólise
e do ciclo do ácido cítrico pelo citrato, o qual inibe a glicólise, suplementa a ação do
sistema de nucleotídeos da adenina. Além disto, níveis aumentados de NADH e de
acetil-CoA também inibem a oxidação de piruvato a acetil-CoA, e uma alta razão
[NADH]/[NAD1] inibe as reações das desidrogenases do ciclo do ácido cítrico.
Os principais pontos da regulação da catálise na via glicolítica, são:
1. A enzima hexocinase é inibida logo que uma quantidade significativa de produto, a
glicose-6-fosfato é produzida;
2. A PFK-1 é um importante sítio de regulação alostérica. Sua atividade é estimulada
por substrato, a frutose-6-fosfato e por AMP.
O excesso de ATP inibe a atividade da PFK-1, sendo esse o principal mecanismo
regulador da glicólise.
Além do ATP, o citrato, intermediário do ciclo de Krebs e precursor da biossíntese
dos ácidos graxos, também age como modulador inibitório.
Outro importante modulador positivo da PFK1 é o efetor frutose-2,6-bisfosfato
formado a partir da frutose-6-fosfato na reação catalisada pela fosfofrutoquinase-2
(PFK2),na presença de insulina. Esse efetor é uma molécula com função apenas
regulatória que ativa a via glicolítica, mas inibe a gliconeogênese.
3. A piruvato cinase é um ponto de controle secundário. É estimulada pela presença
de substrato, a PEP e a insulina. E é parcialmente inibida pelas concentrações de
ATP, acetil-CoA e pelo glucagon.
7.2 REGULAÇÃO DA GLICONEOGENESE
Na regulação da gliconeogênese, a piruvato-carboxilase é ativada por acetil-
CoA, quando acumulado (este também inibe a piruvato desidrogenase do ciclo de Krebs,
deixando o piruvato para a gliconeogênese).
A enzima PEP-carboxicinase sofre regulação principalmente hormonal do
glucagon.
A frutose 1,6-bisfosfatase é inibida pelo AMP, sinalizando diminuição energética.
É também inibida pela ação do metabólito regulador a frutose-2,6- bisfosfatase (que
reverte a ação da PFK2, e parando a produção o efetor frutose-2,6-bisfosfato). O glucagon
diminui as concentrações desse metabólico regulador, estimulando a gliconeogênese.
228
Além disso, os hormônios podem ativar a expressão de fatores de transcrição.
Esses fatores, agem no núcleo regulando a expressão de genes que codificam para as
enzimas da via glicolítica e da gliconeogênese.
7.3 REGULAÇÂO DO GLICOGENIO
O glicogênio é a reserva de energia mais rapidamente disponível e sofre
regulação, evitando gasto inútil de energia.
A enzima glicogênio-fosforilase, que degrada o glicogênio, é o principal centro
de regulação (Figura 39). Essa enzima existe em duas formas: “a” e “b”. A forma b, menos
ativa, pode ser convertida por modificação covalente para formar “a”, fosforilada e ativa,
para fornecer glicose como combustível.
Figura 39 – Regulação da glicogênio-fosforilase muscular por modificação covalente
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.621)
Na forma mais ativa da enzima, fosforilase a, os resíduos de Ser14, um de cada
subunidade, estão fosforilados. A fosforilase aé convertida em sua forma menos ativa,
fosforilase b, por perda enzimática destes grupos fosforil, catalisada pela fosforilase-
229
Figura 40 – A glicogênio-fosforilase do fígado como sensor de glicose
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.622)
a-fosfatase (também conhecida como fosfoproteína-fosfatase 1, PP1). A fosforilase b
pode ser reconvertida (reativada) em fosforilase a pela ação da fosforilase-b-cinase.
(Ver também a Figura 6-42 sobre a regulação da glicogênio-fosforilase.).
A enzima fosforilase-b-cinase, que fosforila a glicogênio-fosforilase para a
forma “a”, recebe regulação alostérica por estímulo do hormônio glucagon no fígado, e
no músculo, pela adrenalina, Ca2+ e AMP.
A forma ativa “a” é desfosforilada pela fosfatases (PP1) para a forma “b”. Essa
fosfatase é estimulada pela insulina e inibida pelo glucagon ou adrenalina.
A enzima glicogênio-fosforilase no fígado pode receber regulação alostérica da
glicose. A presença de glicose ativa a fosfatase para retornar à forma “b” da glicogênio-
fosforilase. Dessa maneira, a glicogênio-fosforilase age como sensor do fígado,
diminuindo a quebra do glicogênio sempre que o nível de glicose no sangue está alto
(Figura 40).
A ligação da glicose a um sítio alostérico da isoenzima da fosforilase do fígado induz
uma mudança conformacional que expõe seus resíduos de Ser fosforilados à ação
da fosforilase-fosfatase (PP1). Esta fosfatase converte a fosforilase a em fosforilase
b, reduzindo claramente a atividade de fosforilase e diminuindo a degradação do
glicogênio em resposta à alta glicose sanguínea. A insulina também age indiretamente
na estimulação da PP1 e na diminuição da degradação do glicogênio.
A enzima glicogênio-sintase da síntese de glicogênio também é um alvo de
regulação e existe em duas formas: “a” e “b”. Porém a forma “a” ativa não é fosforilada,
e a fosforilação inativa a enzima na forma “b”, pela ação do glucagon, via AMPc e PKA.
A glicose é também o modulador alostérico da glicogênio-sintase, e a ausência
de glicose inativa esta enzima.
230
7.4 REGULAÇÃO DO CICLO DE KREBS
O ciclo de Krebs recebe regulação de efetores alostéricos e modificações
covalentes garantindo um estado de equilíbrio para a célula. As enzimas alvos de
regulação são as que catalisam as reações irreversíveis fortemente exergônicas, como
as do complexo da piruvato desidrogenase, a enzima citrato-sintase, a enzima isocitrato
desidrogenase e o complexo a-cetoglutarato-desidrogenase (Figura 41).
O ATP e NADH, e os produtos das reações servem como inibidores, quando há
acúmulo de combustível nas células e uma grande quantidade de produto já foi formada.
Por outro lado, essas enzimas podem ser estimuladas por ADP, NAD+ e no músculo por
Ca2+ que estimula a contração muscular e produção de ATP para repor a energia.
8 TRANSPORTE DE ELÉTRONS, CADEIA RESPIRATÓRIA E
FOSFORILAÇÃO OXIDATIVA
A cadeia respiratória e fosforilação oxidativa na mitocôndria é a culminação do
metabolismo em organismos aeróbicos, para regenerar as coenzimas NADH e FADH2,
gerando energia na forma de ATP.
As mitocôndrias são organelas com duas membranas, interna e externa,
encontradas nas células da maioria dos organismos eucarióticos, incluindo plantas
e animais (Figura 41). A membrana interna mitocondrial é impermeável a NADH. Os
elétrons carregados pelo NADH que são originados no citoplasma (tais como na glicólise)
são indiretamente utilizados na fosforilação oxidativa por um sistema de lançadeiras via
malato-aspartato e pela desidrogenase do glicerol-3-fosfato.
231
Figura 41 – Anatomia bioquímica de uma mitocôndria
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.733)
(a) A membrana externa tem poros que a tornam permeável a pequenas moléculas e
íons, mas não a proteínas. As convoluções (cristas) da membrana interna fornecem
uma grande área de superfície. A membrana interna de uma única mitocôndria do
fígado pode ter mais de 10.000 conjuntos de sistemas de transferência de elétrons
(cadeias respiratórias) e de moléculas de ATP-sintase distribuídos na superfície da
membrana. (b) As mitocôndrias do músculo cardíaco, que têm cristas mais profusas
e, assim, uma área muito maior de membrana interna, contêm mais de três vezes o
número de conjuntos de sistemas de transferência de elétrons que as (c) mitocôndrias
do fígado. As mitocôndrias dos músculos e do fígado têm tamanho aproximado ao
de uma bactéria 2 1 a 2 mm de comprimento. As mitocôndrias de invertebrados, de
plantas e de microrganismos eucariotos são semelhantes àquelas aqui mostradas,
mas com variações muito maiores no tamanho, na forma e no grau de convoluções
da membrana interna.
232
Na membrana interna da mitocôndria estão alojados os complexos (I, II, III, IV)
da cadeia respiratória, a coenzima Q (ou ubiquinona) e a ATP sintase, que realizam a
fosforilação oxidativa. Cada complexo é constituído por diversas subunidades proteicas
associadas a grupos prostéticos diferentes como a heme, o cobre, e centros Fe-S
(Figura 42). A presença desses metais é importante para permitir as reações de óxido-
redução. A coenzima Q é um componente móvel com propriedades hidrofóbicas, que se
difunde facilmente na bicamada lipídica da membrana mitocondrial.
Figura 42 – Os componentes proteicos da cadeia mitocondrial de transferência de elétrons
*Número de subunidades em equivalentes bacterianos entre parenteses.
'O citocromo c não é parte do complexo enzimático, ele se move entre os complexos III e IV como proteína
livremente solúvel.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.738)
Proteína/complexo enzimático
Massa
(kDa)
Número de
subunidades*
Grupo(s)
prostético(s)
I NADH-desidrogenase 850 43 (14) FMN, Fe-S
II Succinato-desidrogenase 140 4 FAD, Fe-S
III Ubiquinona: citocromo
c-oxidorredutase
250 11 Hemes, Fe-S
Citocromo c1 13 1 Heme
IV Citocromo-oxidase 160 13 (3-4) Hemes; CuA, CuB
Esses complexos I, II, III e IV, na cadeia respiratória, são ordenados por ordem crescente
de potencial redox. O potencial de óxido-redução (Eo), ou potencial redox, é a afinidade de uma
molécula por elétrons (em Volts),é uma medida da capacidade de uma molécula de aceitar
ou doar elétrons. A mudança no potencial redox, ou ΔEo, está inversamente relacionada à
mudança na energia livre, o ΔGo. A transferência de elétrons do NADH para o O2 na cadeia
respiratória é exergônica, ou seja, libera energia, possui ΔEo>1, resultando em ΔGo (- 220 kJ/
mol) negativo. Isso devido ao alto potencial redox do O2, que permite que ele aceite elétrons
facilmente. A energia livre liberada dessas reações é capturada para bombear prótons,
resultando em um gradiente eletroquímico utilizado para produzir ATP pela ATP sintase.
Os complexos respiratórios se associam firmemente uns com os outros na
membrana interna para formar respirassomos. Esses complexos trabalham em conjunto
para realizar o processo de fosforilação oxidativa. O NADH e o FADH2 cedem elétrons,
respectivamente, aos complexos I e II. Os elétrons são transferidos do complexo I ou II
para o complexo III pela coenzima Q (abreviado Q), e do complexo III para o complexo IV
pelo citocromo C para chegar ao O2. O fluxo de elétrons é acompanhado por efluxo de
prótons da matriz para o espaço intermembrana (Figura 43).
O complexo I, é a primeira enzima e o maior complexo da cadeia chamado de
NADH:ubiquinona-oxidoredutase ou NADH-desidrogenase. Esse complexo catalisa 2
processos simultâneos:
233
• Transferência exergônica de elétrons, em que oxida o NADH mitocondrial e transfere
elétrons através de complexos Fe-S e FMN para Q, que assume a forma reduzida,
QH2; e
• Transferência endergônica de 4 prótons (H+) para o espaço intermembrana, que dá
início à primeira etapa na formação do gradiente de prótons.
O Complexo II é a enzima succinato desidrogenase, que também participa no
ciclo de Krebs:
• Catalisa a oxidação de succinato a fumarato e redução de FAD a FADH2. Os elétrons
são doados a Q.
• Não contribui para o gradiente de prótons.
A coenzima Q recebe elétrons dos complexos I e II, bem como do FADH2 do
metabolismo de glicerol e da primeira reação da β-oxidação de ácidos graxos, e
converte-se na forma reduzida, QH2.
O Complexo III é chamado de Ubiquinona: citocromo c-oxido redutase. O
citocromo C é uma proteína periférica, associada à superfície externa da membrana
mitocondrial através de interações eletrostáticas. Possui um grupo prostético heme,
que aceita e transfere elétrons. No complexo III, o QH2 reduzido é reoxidado. São duas
reações desse complexo:
• Transferência de elétrons do QH2 para o citocromo c, passando por 2 ciclos de
redução do Citocromo c, com a formação da semiquinona (QH.).
• Transferência de 4 prótons (H+), sendo dois de QH2 e dois da matriz – para o espaço
intermembrana, contribuindo para o gradiente de prótons.
O Complexo IV é a última enzima da cadeia de transporte de elétrons, conhecido
como citocromo oxidase. Esse complexo carrega elétrons do citocromo C para o oxigênio
molecular, reduzindo-o a H2O. São duas reações desse complexo:
• Passagem de elétrons do citocromo C até o lado da matriz mitocondrial. A redução
do O2 por quatro elétrons ocorre em 4 ciclos pois os centros redox carregam apenas
um elétron por vez.
• Transferência de 2 prótons para o espaço intermembrana.
Ao final da cadeia respiratória, o bombeamento de prótons produz um gradiente
de prótons. A concentração maior de H+ do lado de fora e menor do lado de dentro
altera o pH e cria uma diferença de cargas elétricas, o que resulta na formação de um
gradiente eletroquímico.
Na teoria quimiosmótica formulada por Paul Mitchel, a energia conservada nesse
gradiente eletroquímico é chamada de força próton-motriz (Figura 43). O retorno dos
prótons do espaço intermembrana para a matriz mitocondrial é um processo espontâneo
234
a favor do gradiente eletroquímico e com liberação de energia. Esse retorno de prótons
ocorre pelo canal do complexo da ATP-sintase, e a energia proveniente da força próton-
motriz permite o processo endergônico para gerar e liberar o ATP.
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4,
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48
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Nessa simples representação da teoria quimiosmótica aplicada às mitocôndrias, os
elétrons do NADH e de outros substratos oxidáveis passam por meio de uma cadeia de
carregadores assimetricamente arranjados na membrana interna. O fluxo de elétrons
é acompanhado pela transferência de prótons através da membrana, produzindo
tanto um gradiente químico (ΔpH) quanto um gradiente elétrico (Δ¥) (combinados,
a força próton-motriz). A membrana mitocondrial interna é impermeável a prótons;
235
os prótons só podem retornar à matriz através de canais específicos de prótons (Fo).
A força próton-motriz que direciona os prótons de volta para a matriz proporciona a
energia para a síntese de ATP, catalisada pelo complexo F1, associado ao Fo.
A transferência de elétrons na cadeia e a síntese de ATP são obrigatoriamente
acopladas, o que significa que são dependentes uma da outra. Sem o retorno de
elétrons pelo canal da ATP-sintase, o gradiente de prótons se dissiparia e a transferência
de elétrons pelos complexos cessaria. Dessa forma, seria impossível continuar o
bombeamento de elétrons (pelos complexos) contra o gradiente eletroquímico.
Algumas moléculas, no entanto, fornecem uma via alternativa para os prótons
retornarem à matriz mitocondrial e são chamados de desacopladores. A proteína
desacopladora termogenina utiliza a energia do gradiente eletroquímico para ser
dissipada em calor. Essa proteína está presente no tecido marrom de mamíferos e no
recém-nascido.
O gradiente de prótons também está presente nos flagelos das bactérias,
proporcionando o movimento bacteriano.
A ATP sintase é a principal fonte de ATP das células. Possui dois complexos F0 e
F1 divididos em subunidades. F0 é a porção incluída na membrana com o rotor e o canal
de passagem de prótons. F1 é a porção que se estende para a matriz da mitocôndria e que
sintetiza ATP (Figura 44). O mecanismo de síntese de ATP pode ser divido em 3 etapas:
• A subunidade beta de F1 liga-se ao substrato (ADP+Pi) e muda sua conformação;
• A passagem de prótons por F0 libera energia e ativa o rotor, que movimenta as
subunidades de F1.
• Ao final da rotação, a subunidade gama força a subunidade beta para liberar o ATP
e retornar à sua conformação original.
A rotação da ATP-sintase pode ser visualizada por microscópio pela marcação
do complexo F0 com filamento de actina fluorescente.
236
Figura 44 – Demonstração experimental da rotação de Fo e de Ƴ
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.754)
O F1 foi geneticamente modificado para conter uma sequência de resíduos de His,
adere-se firmemente a uma lâmina de microscópio coberta com um complexo de Ni;
a biotina é covalentemente ligada a uma subunidade c de Fo. A proteína avidina, que
liga firmemente a biotina, está covalentemente ligada a longos filamentos de actina
marcada com uma sonda fluorescente. A ligação biotina-avidina agora liga filamentos
de actina à subunidade c. Quando o ATP é fornecido como substrato para a atividade
ATPásica de F1, observa-se o filamento marcado rodar continuamente em uma
direção, provando que o cilindro Fo de subunidades c gira. Em outro experimento,
um filamento de actina fluorescente foi ligado diretamente à subunidade g. A série
de micrografias fluorescentes (ler da esquerda para a direita) mostra a posição
do filamento de actina em intervalos de 133 ms. Observe que, à medida que o
filamento gira, ele faz um salto discreto a cada cerca de 11 quadros de imagens.
Presumivelmente, o cilindro e o eixo se movem como uma unidade.
A força próton-motriz também propicia o transporte de 4 ATP para fora da matriz
em troca de 3 ADP para dentro da matriz (Figura 45).
O fosfato é transportado para dentro da matriz através de translocase específica
do tipo simporte juntamente com a entrada de prótons.
237
Figura 45 – Adenina-nucleotídeo e fosfato-translocases
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.757)Sistemas de transporte da membrana mitocondrial interna carregam ADP e Pi para
a matriz e ATP recentemente sintetizado para o citosol. A adenina-nucleotídeo-
translocase é um antiportador; a mesma proteína move ADP para a matriz e ATP
para fora. O efeito de substituir ATP4- por ADP3- na matriz é o efluxo líquido de uma
carga negativa, favorecido pela diferença de cargas através da membrana interna
(positiva fora). Em pH 7, o Pi está presente tanto como HPO4- quanto como H2PO4-.
A fosfato-translocase é específica para H2PO4-. Não existe nenhum fluxo líquido
de carga durante o simporte de H2PO4- e H+, mas a concentração relativamente
baixa de prótons na matriz favorece o movimento de H+ para dentro. Assim, a força
próton-motriz é responsável por proporcionar energia para a síntese de ATP e por
transportar substratos (ADP e Pi) para dentro e produto (ATP) para fora da matriz
mitocondrial. Todos esses três sistemas de transporte podem ser isolados como um
único complexo ligado à membrana (ATP sintassomo).
O número de ATP sintetizado por O2 consumido, é a razão P/O. O valor experimental
mais amplamente aceito para o número de prótons requeridos para possibilitar a síntese
de uma molécula de ATP é 4, porém 1 ATP é usado no transporte de Pi, ATP e ADP
através da membrana mitocondrial. Assim na fosforilação oxidativa, para cada NADH,
formam-se 3 ATPs e, para cada FADH2, são 2 ATPs.
No entanto, o transporte de fosfato também requer o movimento de prótons
para dentro da matriz, o que reduz a contagem de ATPs para 2.5 para o NADH e 1.5 para
FADH2. Essa razão P/O pode variar um pouco em diferentes organismos, dependendo
238
das propriedades da ATP sintase de gerar ATP. Alguns organismos podem ter uma
ATP sintase um pouco mais eficiente, o que resultaria em uma proporção maior de ATP
produzida por NADH e FADH2.
No total, a oxidação de uma molécula de glicose via glicólise, a reação do
complexo piruvato desidrogenase, o ciclo de Krebs e a fosforilação oxidativa produzem
entre 30-32 ATP (Figura 46).
Figura 46 – Estequiometria da redução de coenzimas e formação de ATP na oxidação aeróbia da glicose via
glicólise, reação do complexo da piruvato-desidrogenase, ciclo do ácido cítrico e fosforilação oxidativa
Reação
Número de ATP ou
coenzimas reduzidas
diretamente formados
Número de ATP formados
no final do processo*
Glicose à glicose-6-fosfato -1 ATP -1
Frutose-6-fosfato à frutose-
1,6-bifosfato
-1 ATP -1
2 Gliceraldeído-3-fosfato à
2 1,3-bifosfoglicerato
2 NADH 3 ou 5'
2 1,3-Bifosfoglicerato à
23-fosfoglicerato
2 ATP 2
2 Fosfoenolpiruvato à
2 piruvato
2 ATP 2
2 Piruvato à 2 acetil-CoA 2 NADH 5
2 Isocitrato à
2 a-cetoglutarato
2 NADH 5
2 a-Cetoglutarato à
2 succinil-CoA
2 NADH 5
2 Suecinil-CoA à 2 succinato A ATP (ou 2 GTP) 2
2 Succinato à 2 fumarato 2 FADH2 3
2 Malato à 2 oxaloacetato 2 NADH 5
Total 30-32
*Calculado como 2,5 ATP por NADH e 1,5 ATP por FADH. Um valor negativo Indica consumo.
* O número formado é 3 ou 5, dependendo do mecanismo utilizado para a transferência de equivalentes de
NADH do citosol para a matriz mitocondrial; ver Figuras 19-30 e 19-31.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.649)
A passagem de elétron pelos complexos pode resultar ocasionalmente em
transferências de elétrons para o O2, formando um radical livre, superóxido altamente
reativo (O2+e-à•O2
-). e outras espécies reativas de oxigênio (ERO) e o peróxido de
hidrogênio. Essas espécies reativas de oxigênio podem provocar sérios danos oxidativos,
reagindo com enzimas, lipídeos de membranas e ácidos nucleicos. As células reagem,
239
acionando os sistemas de enzimas antioxidantes como a superóxido-dismutase (SOD) e
a glutationa-peroxidase (GPx). A GPx atua oxidando a glutationa, que é então regenerada
pela glutationa redutase, utilizando o NADPH.
A fosforilação oxidativa é regulada pelas demandas energéticas da célula, do
ADP e a razão ATP/ADP+Pi, e também depende do suprimento de NADH e FADH2. O
ATP e ADP podem alterar a velocidade da fosforilação oxidativa, pois também estão
envolvidos na regulação dos outros estágios da respiração celular.
Algumas drogas são capazes de atuar especificamente sobre cada complexo da
cadeia, bloqueando sua ação e com consequências na síntese de ATP. São exemplos: no
Complexo I, os barbituratos e rotenona (inseticida); no Complexo II, o malonato (similar
ao succinato) é um inibidor competitivo; no Complexo III, o antibiótico antimicina; no
Complexo IV, cianeto e CO; e a ATP sintase, o antibiótico oligomicina.
Fonte: Nelson & Cox (2014, p.588)
NOTA
240
O metabolismo como malha tridimensional. Uma típica célula eucariótica tem a capacidade
de produzir cerca de 30.000 proteínas diferentes, que catalisam milhares de reações
diferentes envolvendo muitas centenas de metabólitos, muitos deles compartilhados por
mais de uma “via”. Nesta imagem resumida e muito simplificada das vias metabólicas, cada
ponto representa um composto intermediário e cada linha de conexão representa uma
reação enzimática.
Consulte no banco de dados KEGG PATHWAY com mapa interativo do
metabolismo: https://bit.ly/42AJTxt
VIDEO A Mitocôndria em 3 Atos: https://bit.ly/3JIFhwx; https://bit.
ly/3K5huZ6; https://bit.ly/40C0pLT
DICA
241
De onde menos se espera
Atletas de elite que têm um gênero específico de bactérias no intestino
apresentam recuperação muscular mais acelerada e, consequentemente,
melhor desempenho.
Franklin Rumjanek
Instituto de Bioquímica Médica
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Revista Ciência Hoje
O sucesso de atletas de elite depende de muitos fatores. Estamos acostumados a
acompanhar relatos diversos que descrevem protocolos rígidos, geralmente, envolvendo
treinamento árduo, alimentação controlada, descanso e, em alguns casos, a dopagem –
prática proibida que consiste na injeção de compostos, como a testosterona (hormônio
anabolizante), para aumentar a massa muscular dos atletas. Jamais imaginaríamos
que um dos segredos do sucesso poderia ter origem no intestino dos atletas, mais
especificamente, num gênero de bactérias com o curioso nome de Veillonela atypica.
Pesquisadores norte-americanos descobriram que, durante – e logo após – o
exercício vigoroso, ocorre o crescimento agudo de populações de bactérias V. atypica
nos intestinos de alguns maratonistas. A pergunta seguinte foi: qual a relação desses
microrganismos com o desempenho dos atletas de elite? Essa pergunta foi respondida
recentemente e se encontra no artigo do biólogo molecular Jonathan Scheiman e
colaboradores publicado na revista Nature Medicine em junho último.
LEITURA
COMPLEMENTAR
242
Para explicar esse fenômeno, é preciso antes descrever rapidamente um pouco
o que acontece no metabolismo. Um exercício como a maratona implica a contração
muscular repetitiva durante um período relativamente longo. Para que a contração
ocorra, o músculo usa a glicose como combustível. O metabolismo rápido da glicose se
faz por intermédio de um processo chamado de glicólise anaeróbica, que compreende
uma série de reações químicas que acontecem na ausência de oxigênio. Essas reações
geram adenosina trifosfato (ATP), composto importante para a contração muscular.
Acontece que, juntamente com o ATP, a glicólise também produz o lactato ou
ácido láctico. Quem já fez exercícios repetitivos sabe que, ao final de certo tempo, o
músculo sofre fadiga, o que produz uma sensação bem conhecida de queimação ou dor
e, nesse momento, a pessoa deve parar o exercício. Quando isso acontece, o desconforto
cessa e, após algum tempo, os músculos estão prontos para continuar a contrair.
Quem provoca essa sensação é o lactato, que nada mais é do que um ácido.
Ao se acumular, esse ácido acaba produzindo uma acidez local, responsável por essa
sensação de fadiga. Durante o descanso, o lactato sai do músculo e entra na corrente
sanguínea e, também, nos intestinos, de onde acaba sendo excretado ou, então,
utilizado em outras vias metabólicas.
Para