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01_Concepções Atuais da Educação

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CONCEPÇÕES ATUAIS DA EDUCAÇÃO 
 
 
 
 
 
 2 
SUMÁRIO 
 
UM PASSADO SEMPRE PRESENTE ....................................................................... 5 
EDUCAÇÃO TRADICIONAL ...................................................................................... 6 
EDUCAÇÃO INTERNACIONALIZADA....................................................................... 7 
NOVAS TECNOLOGIAS ............................................................................................ 7 
PARADIGMAS HOLONÔMICOS ............................................................................... 8 
EDUCAÇÃO POPULAR ........................................................................................... 10 
SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E EDUCAÇÃO ..................................................... 13 
PERMANÊNCIA E TRANSFORMAÇÃO .................................................................. 19 
POR UMA NOVA LINGUAGEM ............................................................................... 25 
DO NÃO-ESCRITO AO PARA-ALÉM-DA-ESCRITA ................................................ 32 
A TEORIA EDUCACIONAL NO OCIDENTE ............................................................ 40 
TEORIA EDUCACIONAL PÓS-MODERNA ............................................................. 46 
AMERICANISMO E EDUCAÇÃO ............................................................................. 50 
PARA ENTENDER A RELAÇÃO ESCOLA-FAMÍLIA ............................................... 65 
ESCOLA E FAMÍLIA NA REVISTA DO ENSINO ..................................................... 68 
EDUCAÇÃO, TRABALHO E CIDADANIA ................................................................ 91 
A NOVA ORDEM MUNDIAL: A PROMESSA ........................................................... 93 
DESORDEM E FRUSTRAÇÃO DA PROMESSA ..................................................... 96 
EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DO HOMEM SOCIAL ................................................. 99 
CONSERVAÇÃO E REPOSIÇÃO DA EXISTÊNCIA PELO TRABALHO ............... 100 
EDUCAÇÃO E INSTAURAÇÃO DA CULTURA SIMBÓLICA ................................. 103 
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 107 
 
 
 
 
 3 
 
PERSPECTIVAS ATUAIS DA EDUCAÇÃO 
 
 Nas últimas duas décadas do século XX assistiu-se a grandes mudanças tanto 
no campo socioeconômico e político quanto no da cultura, da ciência e da tecnologia. 
Ocorreram grandes movimentos sociais, como aqueles no leste europeu, no final dos 
anos 80, culminando com a queda do Muro de Berlim. 
 
 
 
Ainda não se tem ideia clara do que deverá representar, para todos nós, a 
globalização capitalista da economia, das comunicações e da cultura. As 
transformações tecnológicas tornaram possível o surgimento da era da informação. 
 
É um tempo de expectativas, de perplexidade e da crise de concepções e 
paradigmas não apenas porque inicia-se um novo milênio – época de balanço e de 
reflexão, época em que o imaginário parece ter um peso maior. O ano 2000 exerceu 
um fascínio muito grande em muitas pessoas. Paulo Freire dizia que queria chegar ao 
ano 2000 (acabou falecendo três anos antes). É um momento novo e rico de 
possibilidades. Por isso, não se pode falar do futuro da educação sem certa dose de 
cautela. 
 
 
 
 
 4 
Paulo Freire, o mentor da educação para a consciência 
https://novaescola.org.br/conteudo/460/mentor-educacao-consciencia 
 
 
 
 
 
 
É com essa cautela que serão examinadas, algumas das perspectivas atuais 
da teoria e da prática da educação, apoiando-se naqueles educadores e filósofos que 
tentaram, em meio a essa perplexidade, apesar de tudo, apontar algum caminho para 
o futuro. A perplexidade e a crise de paradigmas não podem se constituir num álibi 
para o imobilismo. 
 
No início deste século, H. G. Wells dizia que “a História da Humanidade é cada 
vez mais a disputa de uma corrida entre a educação e a catástrofe”. A julgar pelas 
duas grandes guerras que marcaram a “História da Humanidade”, na primeira metade 
do século XX, a catástrofe venceu. No início dos anos 50, dizia-se que só havia uma 
alternativa: “socialismo ou barbárie” (Cornelius Castoriadis), mas chegou-se ao final 
do século com a derrocada do socialismo burocrático de tipo soviético e 
enfraquecimento da ética socialista. E mais: pela primeira vez na história da 
humanidade, não por efeito de armas nucleares, mas pelo descontrole da produção 
industrial, pode-se destruir toda a vida do planeta. Mais do que a solidariedade, 
estamos vendo crescer a competitividade. Venceu a barbárie, de novo? Qual o papel 
da educação neste novo contexto político? Qual é o papel da educação na era da 
informação? Que perspectivas podemos apontar para a educação nesse início do 
Terceiro Milênio? Para onde vamos? 
 
Para iniciar, verifica-se o significado da palavra “perspectiva”. A palavra 
“perspectiva” vem do latim tardio “perspectivus”, que deriva de dois verbos: perspecto, 
que significa “olhar até o fim, examinar atentamente”; e perspicio, que significa “olhar 
através, ver bem, olhar atentamente, examinar com cuidado, reconhecer claramente” 
(Dicionário Escolar Latino-Português, de Ernesto Faria). A palavra “perspectiva” é rica 
de significações. 
 
 
https://novaescola.org.br/conteudo/460/mentor-educacao-consciencia
https://novaescola.org.br/conteudo/460/mentor-educacao-consciencia
 
 
 5 
Segundo o Dicionário de filosofia, do filósofo italiano Nicola Abbagnano, 
perspectiva seria “uma antecipação qualquer do futuro: projeto, esperança, ideal, 
ilusão, utopia. O termo exprime o mesmo conceito de possibilidade, mas de um ponto 
de vista mais genérico e que menos compromete, dado que podem aparecer como 
perspectivas coisas que não têm suficiente consistência para serem possibilidades 
autênticas”. Para o Dicionário Aurélio, muito conhecido entre nós, brasileiros, 
perspectiva é a “arte de representar os objetos sobre um plano tais como se 
apresentam à vista; pintura que representa paisagens e edifícios a distância; aspecto 
dos objetos vistos de uma certa distância; panorama; aparência, aspecto; aspecto sob 
o qual uma coisa se apresenta, ponto de vista; expectativa, esperança”. Perspectiva 
significa ao mesmo tempo enfoque, quando se fala, por exemplo, em perspectiva 
política, e possibilidade, crença em acontecimentos considerados prováveis e bons. 
Falar em perspectivas é falar de esperança no futuro. 
 
Hoje muitos educadores, perplexos diante das rápidas mudanças na 
sociedade, na tecnologia e na economia, perguntam-se sobre o futuro de sua 
profissão, alguns com medo de perdê-la sem saber o que devem fazer. Então, 
aparecem, no pensamento educacional, todas as palavras citadas por Abbagnano e 
Aurélio: “projeto” político-pedagógico, pedagogia da “esperança”, “ideal” pedagógico, 
“ilusão” e “utopia” pedagógica, o futuro como “possibilidade”. Fala-se muito hoje em 
“cenários” possíveis para a educação, portanto, em “panoramas”, representação de 
“paisagens”. Para se desenhar uma perspectiva é preciso “distanciamento”. É sempre 
um “ponto de vista”. Todas essas palavras entre aspas indicam uma certa direção ou, 
pelo menos, um horizonte em direção ao qual se caminha ou se pode caminhar. Elas 
designam “expectativas” e anseios que podem ser captados, capturados, 
sistematizados e colocados em evidência. 
UM PASSADO SEMPRE PRESENTE 
 
A virada do milênio é razão oportuna para um balanço sobre práticas e teorias 
que atravessaram os tempos. Falar de “perspectivas atuais da educação” é também 
falar, discutir, identificar o “espírito” presente no campo das ideias, dos valores e das 
 
 
 6 
Conheça um pouco mais sobre a história e o pensamento de Freinet. 
https://novaescola.org.br/conteudo/1754/celestin-freinet-o-mestre-do-trabalho-e-do-bom-senso 
 
práticas educacionais que as perpassa, marcando o passado, caracterizando opresente e abrindo possibilidades para o futuro. Algumas perspectivas teóricas que 
orientaram muitas práticas poderão desaparecer, e outras permanecerão em sua 
essência. Quais teorias e práticas fixaram-se no ethos educacional, criaram raízes, 
atravessaram o milênio e estão presentes hoje? Para entender o futuro é preciso 
revisitar o passado. No cenário da educação atual, podem ser destacados alguns 
marcos, algumas pegadas, que persistem e poderão persistir na educação do futuro. 
 
Educação Tradicional 
 
Enraizada na sociedade de classes escravista da Idade Antiga, destinada a 
uma pequena minoria, a educação tradicional iniciou seu declínio já no movimento 
renascentista, mas ela sobrevive até hoje, apesar da extensão média da escolaridade 
trazida pela educação burguesa. A educação nova, que surge de forma mais clara a 
partir da obra de Rousseau, desenvolveu-se nesses últimos dois séculos e trouxe 
consigo numerosas conquistas, sobretudo no campo das ciências da educação e das 
metodologias de ensino. O conceito de “aprender fazendo” de John Dewey e as 
técnicas Freinet, por exemplo, são aquisições definitivas na história da pedagogia. 
Tanto a concepção tradicional de educação quanto a nova, amplamente consolidadas, 
terão um lugar garantido na educação do futuro. 
 
 
 
 
 
 
A educação tradicional e a nova têm em comum a concepção da educação 
como processo de desenvolvimento individual. Todavia, o traço mais original da 
educação desse século é o deslocamento de enfoque do individual para o social, para 
o político e para o ideológico. A pedagogia institucional é um exemplo disso. 
 
https://novaescola.org.br/conteudo/1754/celestin-freinet-o-mestre-do-trabalho-e-do-bom-senso
https://novaescola.org.br/conteudo/1754/celestin-freinet-o-mestre-do-trabalho-e-do-bom-senso
 
 
 7 
A experiência de mais de meio século de educação nos países socialistas 
também a testemunha. A educação, no século XX, tornou-se permanente e social. É 
verdade, existem ainda muitos desníveis entre regiões e países, entre o Norte e o Sul, 
entre países periféricos e hegemônicos, entre países globalizadores e globalizados. 
Entretanto, há ideias universalmente difundidas, entre elas a de que não há idade para 
se educar, de que a educação se estende pela vida e que ela não é neutra. 
Educação Internacionalizada 
 
No início da segunda metade deste século, educadores e políticos imaginaram 
uma educação internacionalizada, confiada a uma grande organização, a Unesco. Os 
países altamente desenvolvidos já haviam universalizado o ensino fundamental e 
eliminado o analfabetismo. Os sistemas nacionais de educação trouxeram um grande 
impulso, desde o século passado, possibilitando numerosos planos de educação, que 
diminuíram custos e elevaram os benefícios. A tese de uma educação internacional já 
existia deste 1899, quando foi fundado, em Bruxelas, o Bureau Internacional de Novas 
Escolas, por iniciativa do educador Adolphe Ferrière. Como resultado, tem-se hoje 
uma grande uniformidade nos sistemas de ensino. Pode-se dizer que hoje todos os 
sistemas educacionais contam com uma estrutura básica muito parecida. No final do 
século XX, o fenômeno da globalização deu novo impulso à ideia de uma educação 
igual para todos, agora não como princípio de justiça social, mas apenas como 
parâmetro curricular comum. 
 
Novas Tecnologias 
 
As consequências da evolução das novas tecnologias, centradas na 
comunicação de massa, na difusão do conhecimento, ainda não se fizeram sentir 
plenamente no ensino – como previra McLuhan já em 1969 –, pelo menos na maioria 
das nações, mas a aprendizagem a distância, sobretudo a baseada na Internet, 
parece ser a grande novidade educacional neste início de novo milênio. A educação 
 
 
 8 
Vamos conhecer um pouco mais sobre as ideias de McLuhan? Vale a pena conferir. 
https://medium.com/das-teorias/marshall-mcluhan-o-profeta-da-era-digital-89be96dc4818 
 
opera com a linguagem escrita e a nossa cultura atual dominante vive impregnada por 
uma nova linguagem, a da televisão e a da informática, particularmente a linguagem 
da Internet. 
 
 
 
 
 
 
A cultura do papel representa talvez o maior obstáculo ao uso intensivo da 
Internet, em particular da educação a distância com base na Internet. Por isso, os 
jovens que ainda não internalizaram inteiramente essa cultura adaptam-se com mais 
facilidade do que os adultos ao uso do computador. Eles já estão nascendo com essa 
nova cultura, a cultura digital. 
 
Os sistemas educacionais ainda não conseguiram avaliar suficientemente o 
impacto da comunicação audiovisual e da informática, seja para informar, seja para 
bitolar ou controlar as mentes. Ainda se trabalha muito com recursos tradicionais que 
não têm apelo para as crianças e jovens. Os que defendem a informatização da 
educação sustentam que é preciso mudar profundamente os métodos de ensino para 
reservar ao cérebro humano o que lhe é peculiar, a capacidade de pensar, em vez de 
desenvolver a memória. Para ele, a função da escola será, cada vez mais, a de 
ensinar a pensar criticamente. Para isso é preciso dominar mais metodologias e 
linguagens, inclusive a linguagem eletrônica. 
 
Paradigmas Holonômicos 
 
Entre as novas teorias surgidas nesses últimos anos, despertaram interesse 
dos educadores os chamados paradigmas holonômicos, ainda pouco consistentes. 
 
https://medium.com/das-teorias/marshall-mcluhan-o-profeta-da-era-digital-89be96dc4818
https://medium.com/das-teorias/marshall-mcluhan-o-profeta-da-era-digital-89be96dc4818
 
 
 9 
Complexidade e holismo são palavras cada vez mais ouvidas nos debates 
educacionais. Nesta perspectiva, pode-se incluir as reflexões de Edgar Morin, que 
critica a razão produtivista e a racionalização modernas, propondo uma lógica do 
vivente. Esses paradigmas sustentam um princípio unificador do saber, do 
conhecimento, em torno do ser humano, valorizando o seu cotidiano, o seu vivido, o 
pessoal, a singularidade, o entorno, o acaso e outras categorias como: decisão, 
projeto, ruído, ambiguidade, finitude, escolha, síntese, vínculo e totalidade. 
 
Essas seriam algumas das categorias dos paradigmas chamados holonômicos. 
Etimologicamente, holos, em grego, significa todo e os novos paradigmas procuram 
centrar-se na totalidade. Mais do que a ideologia, seria a utopia que teria essa força 
para resgatar a totalidade do real, totalidade perdida. Para os defensores desses 
novos paradigmas, os paradigmas clássicos – identificados no positivismo e no 
marxismo – seriam marcados pela ideologia e lidariam com categorias redutoras da 
totalidade. 
 
Ao contrário, os paradigmas holonômicos pretendem restaurar a totalidade do 
sujeito, valorizando a sua iniciativa e a sua criatividade, valorizando o micro, a 
complementaridade, a convergência e a complexidade. Para eles, os paradigmas 
clássicos sustentam o sonho milenarista de uma sociedade plena, sem arestas, em 
que nada perturbaria um consenso sem fricções. Ao aceitar como fundamento da 
educação uma antropologia que concebe o homem como um ser essencialmente 
contraditorial, os paradigmas holonômicos pretendem manter, sem pretender superar, 
todos os elementos da complexidade da vida. 
 
Os holistas sustentam que o imaginário e a utopia são os grandes fatores 
instituintes da sociedade e recusam uma ordem que aniquila o desejo, a paixão, o 
olhar e a escuta. Os enfoques clássicos, segundo eles, banalizam essas dimensões 
da vida porque sobrevalorizam o macro-estrutural, o sistema, em que tudo é função 
ou efeito das superestruturas socioeconômicas ou epistêmicas, linguísticas e 
psíquicas. Para os novos paradigmas, a história é essencialmente possibilidade, em 
que o que vale é o imaginário (Gilbert Durand, Cornelius Castoriadis), o projeto. 
 
 
 10 
Existem tantos mundos quanto nossa capacidade de imaginar. Para eles, “a 
imaginação está no poder”, como queriamos estudantes em maio de 1968. 
 
Na verdade, essas categorias não são novas na teoria da educação, mas hoje 
são lidas e analisadas com mais simpatia do que no passado. Sob diversas formas e 
com diferentes significados, essas categorias são encontradas em muitos intelectuais, 
filósofos e educadores, de ontem e de hoje: o “sentido do outro”, a “curiosidade” (Paulo 
Freire), a “tolerância” (Karl Jaspers), a “estrutura de acolhida” (Paul Ricoeur), o 
“diálogo” (Martin Buber), a “autogestão” (Celestin Freinet, Michel Lobrot), a 
“desordem” (Edgar Morin), a “ação comunicativa”, o “mundo vivido” (Jurgen 
Habermas), a “radicalidade” (Agnes Heller), a “empatia” (Carl Rogers), a “questão de 
gênero” (Moema Viezzer, Nelly Stromquist), o “cuidado” (Leonardo Boff), a 
“esperança” (Ernest Bloch), a “alegria” (Georges Snyders), a unidade do homem 
contra as “unidimensionalizações” (Herbert Marcuse), etc. 
 
Evidentemente, nem todos esses autores aceitariam enquadrar-se nos 
paradigmas holonômicos. Todas as classificações e tipologias, no campo das ideias, 
são necessariamente reducionistas. Não se pode negar as divergências existentes 
entre eles. Contudo, as categorias apontadas anteriormente indicam uma certa 
tendência, ou melhor, uma perspectiva da educação. Os que sustentam os 
paradigmas holonômicos procuram buscar na unidade dos contrários e na cultura 
contemporânea um sinal dos tempos, uma direção do futuro, que eles chamam de 
pedagogia da unidade. 
 
Educação Popular 
 
O paradigma da educação popular, inspirado originalmente no trabalho de 
Paulo Freire nos anos 60, encontrava na conscientização sua categoria fundamental. 
 
 
 
 
 11 
Vamos conhecer um pouco mais sobre o pensamento de Paulo Freire. 
http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=340 
 
A prática e a reflexão sobre a prática levaram a incorporar outra categoria não 
menos importante: a da organização. Afinal, não basta estar consciente, é preciso 
organizar-se para poder transformar. Nos últimos anos, os educadores que 
permaneceram fiéis aos princípios da educação popular atuaram principalmente em 
duas direções: na educação pública popular – no espaço conquistado no interior do 
Estado –; e na educação popular comunitária e na educação ambiental ou sustentável, 
predominantemente não governamentais. Durante os regimes autoritários da América 
Latina, a educação popular manteve sua unidade, combatendo as ditaduras e 
apresentando projetos “alternativos”. Com as conquistas democráticas, ocorreu com 
a educação popular uma grande fragmentação em dois sentidos: de um lado ela 
ganhou uma nova vitalidade no interior do Estado, diluindo-se em suas políticas 
públicas; e, de outro, continuou como educação não-formal, dispersando-se em 
milhares de pequenas experiências. 
 
Perdeu em unidade, ganhou em diversidade e conseguiu atravessar 
numerosas fronteiras. Hoje ela incorporou-se ao pensamento pedagógico universal e 
orienta a atuação de muitos educadores espalhados pelo mundo, como a testemunha, 
o Fórum Paulo Freire, que se realiza de dois em dois anos, reunindo educadores de 
muitos países. 
 
 
 
 
 
 
As práticas de educação popular também se constituem em mecanismos de 
democratização, em que se refletem os valores de solidariedade e de reciprocidade e 
novas formas alternativas de produção e de consumo, sobretudo as práticas de 
educação popular comunitária, muitas delas voluntárias. O Terceiro Setor está 
crescendo não apenas como alternativa entre o Estado burocrático e o mercado 
insolidário, mas também como espaço de novas vivências sociais e políticas hoje 
consolidadas com as organizações não-governamentais (ONGs) e as organizações 
http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=340
 
 
 12 
de base comunitária (OBCs). Este está sendo hoje o campo mais fértil da educação 
popular. 
 
Diante desse quadro, a educação popular, como modelo teórico reconceituado, 
tem oferecido grandes alternativas. Dentre elas, está a reforma dos sistemas de 
escolarização pública. A vinculação da educação popular com o poder local e a 
economia popular abre, também, novas e inéditas possibilidades para a prática da 
educação. 
 
O modelo teórico da educação popular, elaborado na reflexão sobre a prática 
da educação durante várias décadas, tornou-se, sem dúvida, uma das grandes 
contribuições da América Latina à teoria e à prática educativa em âmbito internacional. 
A noção de aprender a partir do conhecimento do sujeito, a noção de ensinar a partir 
de palavras e temas geradores, a educação como ato de conhecimento e de 
transformação social e a politicidade da educação são apenas alguns dos legados da 
educação popular à pedagogia crítica universal. 
 
Universalização da Educação Básica e Novas Matrizes 
Teóricas 
 
Neste começo de um novo milênio, a educação apresenta-se numa dupla 
encruzilhada: de um lado, o desempenho do sistema escolar não tem dado conta da 
universalização da educação básica de qualidade; de outro, as novas matrizes 
teóricas não apresentam ainda a consistência global necessária para indicar caminhos 
realmente seguros numa época de profundas e rápidas transformações. Essa é uma 
das preocupações do Instituto Paulo Freire, buscando, a partir do legado de Paulo 
Freire, consolidar o seu “Projeto da Escola Cidadã”, como resposta à crise de 
paradigmas. 
 
 
 
 
 13 
A concepção teórica e as práticas desenvolvidas a partir do conceito de Escola 
Cidadã podem constituir-se numa alternativa viável, de um lado, ao projeto neoliberal 
de educação, amplamente hegemônico, baseado na ética do mercado, e, de outro 
lado, à teoria e à prática de uma educação burocrática, sustentada na “estadolatria” 
(Antonio Gramsci). É uma escola que busca fortalecer autonomamente o seu projeto 
político-pedagógico, relacionando-se dialeticamente – não mecânica e 
subordinadamente – com o mercado, o Estado e a sociedade. Ela visa formar o 
cidadão para controlar o mercado e o Estado, sendo, ao mesmo tempo, pública quanto 
ao seu destino – isto é, para todos – estatal quanto ao financiamento e democrática e 
comunitária quanto à sua gestão. 
 
Seja qual for a perspectiva que a educação contemporânea tomar, uma 
educação voltada para o futuro será sempre uma educação contestadora, superadora 
dos limites impostos pelo Estado e pelo mercado, portanto, uma educação muito mais 
voltada para a transformação social do que para a transmissão cultural. Por isso, 
acredita-se que a pedagogia da práxis, como uma pedagogia transformadora, em 
suas várias manifestações, pode oferecer um referencial geral mais seguro do que as 
pedagogias centradas na transmissão cultural, neste momento de perplexidade. 
 
SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E EDUCAÇÃO 
 
Costuma-se definir nossa era como a era do conhecimento. Se for pela 
importância dada hoje ao conhecimento, em todos os setores, pode-se dizer que se 
vive mesmo na era do conhecimento, na sociedade do conhecimento, sobretudo em 
consequência da informatização e do processo de globalização das telecomunicações 
a ela associado. Pode ser que, de fato, já se tenha ingressado na era do 
conhecimento, mesmo admitindo que grandes massas da população estejam 
excluídas dele. Todavia, o que se constata é a predominância da difusão de dados e 
informações e não de conhecimentos. Isso está sendo possível graças às novas 
tecnologias que estocam o conhecimento, de forma prática e acessível, em 
 
 
 14 
gigantescos volumes de informações, que são armazenadas inteligentemente, 
permitindo a pesquisa e o acesso de maneira muito simples, amigável e flexível. 
 
 
 
É o que já acontece com a Internet: para ser “usuário”, basta dispor de uma 
linha telefônica e um computador. “Usuário” não significa aqui apenas receptor de 
informações, mas também emissor de informações. Pela Internet, a partir de qualquersala de aula do planeta, pode-se acessar inúmeras bibliotecas em muitas partes do 
mundo. As novas tecnologias permitem acessar conhecimentos transmitidos não 
apenas por palavras, mas também por imagens, sons, fotos, vídeos (hipermídia), etc. 
Nos últimos anos, a informação deixou de ser uma área ou especialidade para se 
tornar uma dimensão de tudo, transformando profundamente a forma como a 
sociedade se organiza. Pode-se dizer que está em andamento uma Revolução da 
Informação, como ocorreram no passado a Revolução Agrícola e a Revolução 
Industrial. 
 
Ladislau Dowbor (1998), após descrever as facilidades que as novas 
tecnologias oferecem ao professor, se pergunta: o que eu tenho a ver com tudo isso, 
se na minha escola não tem nem biblioteca e com o meu salário eu não posso comprar 
um computador? Ele mesmo responde que será preciso trabalhar em dois tempos: o 
tempo do passado e o tempo do futuro. Fazer tudo hoje para superar as condições do 
atraso e, ao mesmo tempo, criar as condições para aproveitar amanhã as 
possibilidades das novas tecnologias. 
 
 
 15 
As novas tecnologias criaram novos espaços do conhecimento. Agora, além da 
escola, também a empresa, o espaço domiciliar e o espaço social tornaram-se 
educativos. Cada dia mais pessoas estudam em casa, pois podem, de casa, acessar 
o ciberespaço da formação e da aprendizagem a distância, buscar “fora” – a 
informação disponível nas redes de computadores interligados – serviços que 
respondem às suas demandas de conhecimento. Por outro lado, a sociedade civil 
(ONGs, associações, sindicatos, igrejas, etc.) está se fortalecendo não apenas como 
espaço de trabalho, em muitos casos, voluntário, mas também como espaço de 
difusão de conhecimentos e de formação continuada. 
 
É um espaço potencializado pelas novas tecnologias, inovando 
constantemente nas metodologias. Novas oportunidades parecem abrir-se para os 
educadores. Esses espaços de formação têm tudo para permitir maior 
democratização da informação e do conhecimento, portanto, menos distorção e 
menos manipulação, menos controle e mais liberdade. É uma questão de tempo, de 
políticas públicas adequadas e de iniciativa da sociedade. A tecnologia não basta. É 
preciso a participação mais intensa e organizada da sociedade. O acesso à 
informação não é apenas um direito. É um direito fundamental, um direito primário, o 
primeiro de todos os direitos, pois sem ele não se tem acesso aos outros direitos. 
 
Na formação continuada necessita-se de maior integração entre os espaços 
sociais (domiciliar, escolar, empresarial, etc.), visando equipar o aluno para viver 
melhor na sociedade do conhecimento. Como previa Herbert McLuhan, o planeta 
tornou-se a nossa sala de aula e o nosso endereço. O ciberespaço não está em lugar 
nenhum, pois está em todo o lugar o tempo todo. Estar num lugar significaria estar 
determinado pelo tempo (hoje, ontem, amanhã). No ciberespaço, a informação está 
sempre e permanentemente presente e em renovação constante. O ciberespaço 
rompeu com a ideia de tempo próprio para a aprendizagem. Não há tempo e espaço 
próprios para a aprendizagem. Como ele está todo o tempo em todo lugar, o espaço 
da aprendizagem é aqui – em qualquer lugar – e o tempo de aprender é hoje e sempre. 
 
 
 
 
 16 
A sociedade do conhecimento se traduz por redes, “teias” (Ivan Illich), “árvores 
do conhecimento” (Humberto Maturana), sem hierarquias, em unidades dinâmicas e 
criativas, favorecendo a conectividade, o intercâmbio, consultas entre instituições e 
pessoas, articulação, contatos e vínculos, interatividade. A conectividade é a principal 
característica da Internet. 
 
O conhecimento é o grande capital da humanidade. Não é apenas o capital da 
transnacional que precisa dele para a inovação tecnológica. Ele é básico para a 
sobrevivência de todos e, por isso, não deve ser vendido ou comprado, mas sim 
disponibilizado a todos. Esta é a função de instituições que se dedicam ao 
conhecimento apoiado nos avanços tecnológicos. Espera-se que a educação do 
futuro seja mais democrática, menos excludente. Essa é ao mesmo tempo nossa 
causa e nosso desafio. Infelizmente, diante da falta de políticas públicas no setor, 
acabaram surgindo “indústrias do conhecimento”, prejudicando uma possível visão 
humanista, tornando-o instrumento de lucro e de poder econômico. 
 
 
 
A educação, em particular a educação a distância, é um bem coletivo e, por 
isso, não deve ser regulada pelo jogo do mercado, nem pelos interesses políticos ou 
pelo furor legiferante de regulamentar, credenciar, autorizar, reconhecer, avaliar, etc. 
de muitos tecnoburocratas. Quem deve decidir sobre a qualidade dos seus 
certificados não é nem o Estado e nem o mercado, mas sim a sociedade e o sujeito 
 
 
 17 
Veja um artigo interessante que discute a sociedade da informação e os seus desafios. 
http://www.scielo.br/pdf/ci/v29n2/a09v29n2.pdf 
 
aprendente. Na era da informação generalizada, existirá ainda necessidade de 
diplomas? 
 
O que cabe à escola na sociedade informacional? Cabe a ela organizar um 
movimento global de renovação cultural, aproveitando-se de toda essa riqueza de 
informações. Hoje é a empresa que está assumindo esse papel inovador. A escola 
não pode ficar a reboque das inovações tecnológicas. Ela precisa ser um centro de 
inovação. Temos uma tradição de dar pouca importância à educação tecnológica, a 
qual deveria começar já na educação infantil. 
 
Na sociedade da informação, a escola deve servir de bússola para navegar 
nesse mar do conhecimento, superando a visão utilitarista de só oferecer informações 
“úteis” para a competitividade, para obter resultados. Deve oferecer uma formação 
geral na direção de uma educação integral. O que significa servir de bússola? Significa 
orientar criticamente, sobretudo as crianças e jovens, na busca de uma informação 
que os faça crescer e não embrutecer. 
 
 
 
 
 
Hoje vale tudo para aprender. Isso vai além da “reciclagem” e da atualização 
de conhecimentos e muito mais além da “assimilação” de conhecimentos. A sociedade 
do conhecimento possui múltiplas oportunidades de aprendizagem: parcerias entre o 
público e o privado (família, empresa, associações, etc.); avaliações permanentes; 
debate público; autonomia da escola; generalização da inovação. As consequências 
para a escola e para a educação em geral são enormes: ensinar a pensar; saber 
comunicar-se; saber pesquisar; ter raciocínio lógico; fazer sínteses e elaborações 
teóricas; saber organizar o seu próprio trabalho; ter disciplina para o trabalho; ser 
independente e autônomo; saber articular o conhecimento com a prática; ser aprendiz 
autônomo e a distância. 
 
http://www.scielo.br/pdf/ci/v29n2/a09v29n2.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ci/v29n2/a09v29n2.pdf
 
 
 18 
Neste contexto de impregnação do conhecimento, cabe à escola: amar o 
conhecimento como espaço de realização humana, de alegria e de contentamento 
cultural; selecionar e rever criticamente a informação; formular hipóteses; ser criativa 
e inventiva (inovar); ser provocadora de mensagens e não pura receptora; produzir, 
construir e reconstruir conhecimento elaborado. E mais: numa perspectiva 
emancipadora da educação, a escola tem que fazer tudo isso em favor dos excluídos, 
não discriminando o pobre. Ela não pode distribuir poder, mas pode construir e 
reconstruir conhecimentos, saber, que é poder. Numa perspectiva emancipadora da 
educação, a tecnologia contribui muito pouco para a emancipação dos excluídos se 
não for associada ao exercício da cidadania. 
 
Como diz Ladislau Dowbor (1998:259), a escola deixará de ser “lecionadora” 
para ser “gestora do conhecimento”. Segundo o autor, “pela primeira vez a educação 
tem a possibilidade de ser determinante sobre o desenvolvimento”. A educação 
tornou-se estratégica para o desenvolvimento, mas, para isso, não basta “modernizá-
la”, como querem alguns.Será preciso transformá-la profundamente. 
 
A escola precisa ter projeto, precisa de dados, precisa fazer sua própria 
inovação, planejar-se a médio e a longo prazos, fazer sua própria reestruturação 
curricular, elaborar seus parâmetros curriculares, enfim, ser cidadã. As mudanças que 
vêm de dentro das escolas são mais duradouras. Da sua capacidade de inovar, 
registrar, sistematizar a sua prática/experiência, dependerá o seu futuro. Nesse 
contexto, o educador é um mediador do conhecimento, diante do aluno que é o sujeito 
da sua própria formação. Ele precisa construir conhecimento a partir do que faz e, 
para isso, também precisa ser curioso, buscar sentido para o que faz e apontar novos 
sentidos para o que fazer dos seus alunos. 
 
Em geral, temos a tendência de desvalorizar o que fazemos na escola e de 
buscar receitas fora dela quando é ela mesma que deveria governar-se. É dever dela 
ser cidadã e desenvolver na sociedade a capacidade de governar e controlar o 
desenvolvimento econômico e o mercado. 
 
 
 
 19 
A cidadania precisa controlar o Estado e o mercado, verdadeira alternativa ao 
capitalismo neoliberal e ao socialismo burocrático e autoritário. A escola precisa dar o 
exemplo, ousar construir o futuro. Inovar é mais importante do que reproduzir com 
qualidade o que existe. A matéria-prima da escola é sua visão do futuro. 
 
A escola está desafiada a mudar a lógica da construção do conhecimento, pois 
a aprendizagem agora ocupa toda a nossa vida. E porque passamos todo o tempo de 
nossas vidas na escola – não só nós, professores – devemos ser felizes nela. A 
felicidade na escola não é uma questão de opção metodológica ou ideológica, mas 
sim uma obrigação essencial dela. Como diz Georges Snyders (1998) no livro A 
alegria na escola, precisamos de uma nova “cultura da satisfação”, precisamos da 
“alegria cultural”. O mundo de hoje é “favorável à satisfação” e a escola também pode 
sê-lo. 
 
O que é ser professor hoje? Ser professor hoje é viver intensamente o seu 
tempo, conviver; é ter consciência e sensibilidade. Não se pode imaginar um futuro 
para a humanidade sem educadores, assim como não se pode pensar num futuro sem 
poetas e filósofos. Os educadores, numa visão emancipadora, não só transformam a 
informação em conhecimento e em consciência crítica, mas também formam pessoas. 
Diante dos falsos pregadores da palavra, dos marketeiros, eles são os verdadeiros 
“amantes da sabedoria”, os filósofos de que nos falava Sócrates. Eles fazem fluir o 
saber (não o dado, a informação e o puro conhecimento), porque constroem sentido 
para a vida das pessoas e para a humanidade e buscam, juntos, um mundo mais 
justo, mas produtivo e mais saudável para todos. Por isso eles são imprescindíveis. 
 
PERMANÊNCIA E TRANSFORMAÇÃO 
 
A antropóloga Betty Mindlin desenvolve há tempos um trabalho de extrema 
relevância. Trata-se da coleta de histórias, diretamente na fonte que são os narradores 
indígenas de diversas etnias, notadamente do norte do Brasil, fazendo, a seguir, a 
 
 
 20 
Para conhecer um pouco sobre o trabalho de Betty Mindlin, veja essa entrevista. 
http://www.record.com.br/autor_entrevista.asp?id_autor=4888&id_entrevista=83 
 
transposição da narrativa em linguagem oral, na maior parte das vezes nas línguas 
de origem, para a escrita, em Português. 
 
Trabalho árduo, que somente tem sido possível em razão da experiência, 
competência acadêmica, dedicação e compromisso da pesquisadora com os 
indígenas. Trabalhando com diferentes grupos, vivendo o dia-a-dia das aldeias, 
colaborando na organização de sua defesa quando em contato com as novas levas 
de conquistadores da Amazônia, Betty Mindlin desenvolveu pesquisas, tanto a partir 
do Iamá – Instituto de Antropologia e Meio Ambiente, contando com a cooperação de 
outros antropólogos, como Carmen Junqueira e Mauro Leonel, quanto junto ao 
Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo. 
 
 
 
 
 
Além disso, a antropóloga mantém processo de interlocução permanente com 
pesquisadores de outros países, marcando sua atuação por vivência e abordagem 
cosmopolita, assim como por valorização plena da diversidade cultural (Mindlin, 1998), 
em suas múltiplas, complexas e desafiantes faces. 
 
Formada originalmente em Economia, curso no qual lecionou por algum tempo 
na USP e na Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, Betty Mindlin soube tirar proveito 
dessa origem em sua ida para a Antropologia. De fato, o olhar acurado para a temática 
da exploração e a visão crítica das singularidades do processo de desenvolvimento 
do Brasil1 foram aspectos que colaboraram em muito para que a pesquisadora tivesse 
certo tipo de posicionamento em relação à temática indígena. 
 
A marca notável desse posicionamento é o respeito pelo ser de cada indígena, 
pelo ser de cada grupo, ao mesmo tempo em que convivem, evidentemente 
justapostas em seus trabalhos, a afirmação da capacidade indígena para a 
autodeterminação e a certeza de que todo o apoio à identidade cultural de cada grupo 
http://www.record.com.br/autor_entrevista.asp?id_autor=4888&id_entrevista=83
http://www.record.com.br/autor_entrevista.asp?id_autor=4888&id_entrevista=83
 
 
 21 
é indispensável nos duros processos que o contato com a sociedade não-indígena 
impõe (Mindlin, 1997b). É por isso que sua presença em prol da causa indígena tem 
se feito, sobretudo, com os resultados de seu trabalho. 
 
Em suas pesquisas, sempre respeitando e fortalecendo as identidades culturais 
dos diversos grupos indígenas com os quais trabalha, Betty Mindlin tem desenvolvido 
um vasto levantamento das histórias de cada um desses povos, agrupando-as, 
posteriormente, por temas. Ressalta-se que esses agrupamentos são apenas uma 
forma de sistematização, que outros critérios poderiam ser adotados para classificá-
los, tal sua riqueza e diversidade. 
 
Com isso, a pesquisadora vem compondo um material precioso que permite 
aos indígenas, a um só tempo, o registro da memória e a possibilidade de 
compartilhar, cada qual, sua cosmologia com os demais, indígenas e não-indígenas. 
Como lembra Marcos Terena (1998:892): “O desenvolvimento, reivindicado em nome 
dos direitos humanos, tornar-se-á capenga, cremos, caso não esteja acompanhado 
do desenvolvimento cultural, da autoestima e de uma identidade étnica, 
compreensível inclusive ao mundo que nos cerca, como um código oral, legado pelos 
velhos aos mais jovens.” 
 
Na sequência de um trabalho que já inclui Vozes da origem, Tuparis e tarupás, 
Moqueca de maridos, vem se juntar o magnífico Terra grávida, que será tratado aqui 
de maneira particular. 
 
Seguindo, primordialmente, a tradição de Lévi-Strauss e Franz Caspar, as 
narrativas míticas recolhidas são parte da história desta Terra que há 500 anos é 
chamada Brasil, e que graças a essa pesquisa podem ser afinal conhecidas em 
português, em linguagem atraente mesmo para o leitor menos acostumado às leituras 
antropológicas. 
 
 
 
 
 
 
 22 
Vamos ver uma matéria que fala um pouco sobre a vida de Lévi-Strauss. 
https://educacao.uol.com.br/biografias/claude-levi-strauss.htm 
 
 
 
 
 
 
 
Preocupada em analisar o rico material coletado, a autora de Terra grávida 
oferece uma introdução elucidativa para aqueles que já tenham familiaridade com 
esse tipo de produção. Aqui se insere, por exemplo, a análise que Mindlin faz do mito 
do Gavião, retomando e complementando a análise feita por Lévi-Strauss em O cru e 
o cozido (Mindlin, 1999:27-30). 
 
Da mesma forma, esse ensaio introdutório terá, sem dúvida, função motivadora 
para aqueles que pouco tenham se dedicado a essa verdadeira aventura, de 
mergulhar em mundos de mitos e personagens tão pouco conhecidos como presentes 
na construção de referências da diversidade constituinte do Brasil. 
 
É possível avaliar a complexidade do trabalho realizado por Betty Mindlin, ao 
serem observados os distintosprocedimentos metodológicos desenvolvidos em cada 
um dos trabalhos citados. Em Vozes da origem, as narrativas dos Suruí foram 
gravadas, transcritas na língua original, mediante uma escrita fonética própria da 
língua Suruí desenvolvida pela pesquisadora, para serem então traduzidas para o 
português, com o auxílio de intérpretes complementando os próprios conhecimentos 
de Mindlin. Lembra a autora: “É claro que o estilo reflete minha própria maneira de 
escrever e com frequência há uma espécie de tradução cultural, necessária para 
familiarizar o leitor com aspectos da vida indígena” (Mindlin, 1999:261). 
 
Já o livro Tuparis e tarupás foi marcado por uma peculiaridade: os narradores 
Tupari falavam bem o português, sendo o trabalho da pesquisadora mais o de 
respeitar seu estilo e sabor, conforme suas próprias palavras. 
 
 
https://educacao.uol.com.br/biografias/claude-levi-strauss.htm
https://educacao.uol.com.br/biografias/claude-levi-strauss.htm
 
 
 23 
Descrevendo o processo de pesquisa que resultou em Moqueca de maridos e 
Terra grávida, o qual envolveu os Suruí, Kampé, Gavião, Kanoé, Zoró, Arara, 
Macurap, Jabuti, Aruá, Arikapu, Ajuru e Tupari, Betty Mindlin assim registra o trabalho 
realizado: “Gravei, talvez, duas centenas de horas, quase sempre em língua indígena. 
As traduções foram feitas, não palavra por palavra, seguindo transcrições na língua, 
como no caso Suruí, mas por intérpretes que ouviam as narrativas ao mesmo tempo 
que eu (também por outros, uma segunda ou terceira vez, ao ouvirem as fitas), em 
geral pessoas com dons expressivos e criativos. Ao escrever as histórias, levei em 
conta o seu português e seu estilo e a minha própria imaginação, para transmitir o 
clima dos mitos. Algumas histórias, assim, têm uma certa recriação, na forma de 
escrever, fiel, porém, ao conteúdo, sem invenções novas” (Mindlin, 1999:262). 
 
Confrontando o árduo trabalho de pesquisa, com seu resultado, Betty Mindlin 
declara sua respeitosa forma de recriação ou, talvez mais apropriadamente, de 
transcriação: “Procurei usar todos meus conhecimentos, em vez de ficar ao pé de uma 
letra que ainda não há. Isso não quer dizer que eu não tenha sido fiel tanto aos 
conteúdos quanto às formas – não inventei, segui um clima” (Mindlin, 1999:262). 
 
Colocando o direito de voz como princípio e o reconhecimento dos direitos dos 
narradores, reafirma a autora: “Trata-se de um trabalho conjunto, feito por muitos 
contadores” (Mindlin, 1999:263). Por isso, a pesquisadora tem um cuidado notável ao 
traçar os perfis dos narradores indígenas, exalando carinho e afeto pela história de 
cada um, em uma junção preciosa de atitude científica com o mais indispensável 
humanismo que a construção do conhecimento está a requerer. 
 
Do ponto de vista de contribuição à formação de educadores, torna-se subsídio 
singular conhecer esses narradores-pessoas, indígenas cujos nomes e sagas passam 
a ser conhecidos – e então as narrativas ganham vida própria, porque se sabe de 
onde vêm. 
 
 
 
 
 
 24 
Sem dúvida, verá despertar em si sentimentos de respeito e solidariedade 
aquele que ler os perfis dos narradores, como Galib Pororoca Gurib Ajuru, Awuru 
Odete Aruá, Armando Moero Jabuti, Pacoré Marina Jabuti, Akukã Francisco Kanoé (o 
último de seu povo), Amamoekub Aningui Basílio Macurap, Amonãi Manuel Tupari. 
Dentre todos, foi selecionado um dos perfis, que haverá de falar sobre o caráter vívido 
dos perfis traçados por Mindlin (1999:250): “Aratori Teresa Macurap – É a viúva 
inconsolável de Dorodoim, mãe de Sawerô Basílio Macurap e madastra de Menkaiká 
Juraci Macurap. Vive na Baía das Onças, na A. I. Guaporé. Chorando de saudade, 
contou histórias em Macurap, traduzidas por Sawerô.” 
 
Constituem-se, ainda, em informações relevantes os dados que a autora traz 
sobre os povos de onde provêm as histórias e suas línguas, assim como o glossário 
que oferece, material riquíssimo a ser explorado tanto na formação de professores 
para Pluralidade Cultural, quanto na aplicação em sala de aula, nos diferentes níveis 
de ensino. 
 
Observe-se que esse trabalho de Betty Mindlin, como os anteriores, 
complementa trabalhos de outros autores, já antes dirigidos especificamente a 
educadores, como os elaborados a partir do Mari/USP, que já se tornaram clássicos 
(Silva, 1987; Silva e Grupioni, 1995), alguns em cooperação com o MEC, além de 
pesquisas de mestrado e doutorado que têm trazido contribuição específica para a 
compreensão da temática de professores indígenas (por exemplo, Silva, 1997). 
 
Enquanto esses trabalhos trazem informações indispensáveis para a formação 
dos professores que atuam no sistema de ensino brasileiro, a complementação 
propiciada pelas obras de Betty Mindlin tem a ver com a possibilidade de imersão dos 
professores, assim como de qualquer pessoa interessada, em mundos ricos e 
desconhecidos, que o preconceito e os interesses econômicos têm feito calar. 
 
Para finalizar esta parte da reflexão, ressaltando ainda mais a relevância e o 
caráter indispensável da leitura de Terra grávida por professores e educadores em 
geral, é com grande honra que é aqui apresentada a carta dirigida por Lévi-Strauss a 
Betty Mindlin: 
 
 
 25 
 
“Paris, 10 de março de 2000 
Cara Senhora, 
 
Terra grávida, que a senhora houve por bem me enviar, é um complemento 
muito precioso de suas obras precedentes. Nessa, como nas outras, a senhora reuniu 
uma rica mitologia proveniente de povos sobre os quais não se possui quase nada. O 
conjunto forma um corpus impressionante que guarda relação com as grandes 
coletâneas clássicas da mitologia ameríndia. Foi muito proveitoso para mim. Com 
meus agradecimentos, solicito, cara Senhora, que aceite a expressão de minha 
respeitosa homenagem. 
 
POR UMA NOVA LINGUAGEM 
O apelo da simplicidade que há no acesso a informações via Internet tem se 
constituído em um caminho perverso de simplificação das potencialidades presentes 
nas novas tecnologias digitais. Em particular no campo da educação, tal simplificação 
tem trazido perspectivas de “ensino a distância”, que são saudadas como “o” potencial 
por excelência dessas tecnologias no campo da educação. 
 
Ainda que valorizando as potencialidades comunicativas presentes na Internet 
como mídia interativa, é necessário superar essa visão, quando se trata de ampliar o 
horizonte de reflexão e, portanto, de compreensão do alcance, dos limites e das 
possibilidades das tecnologias digitais como campo de construção de conhecimento, 
portanto com reflexos diretos na educação. 
 
Daí o caminho é buscar o que se tem produzido de pesquisa nesse campo. 
Contudo, não-pesquisas escritas, que só fazem repetir a lógica argumentativa da 
linguagem verbal racional, mas sim aquelas que tragam a possibilidade de vivenciar 
seus caminhos, provar as marcas que sofreram, partilhar o sentido e a prática da 
autoria. 
 
 
 
 26 
Quem é Certeau? Quer conhecer um pouco mais sobre esse intelectual? Veja o link. 
http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/567886-quem-e-michel-de-certeau-para-mim-o-maior-teologo-para-os-dias-de-hoje 
Mesmo correndo o risco de reduzir o alcance dessa obra – já que é aprisionada, 
aqui, regredida aos moldes convencionais – é importante o exercício de diálogo, mais 
que um comentário ou síntese (a qual seria mesmo impossível). Vale lembrar, em 
primeiro lugar, que essa obra exige uma imersão em sua proposta, não se entregando 
a um olhar. 
 
Trata-se de um contato passivo e ativo ao mesmo tempo. Passivo, porque, se 
se pretende conhecê-la, não haverá como não vivenciá-la, será necessário haver uma 
entrega à proposta, fruto, provavelmente, da formação psicanalítica dos autores. 
Ativo, porque serão os sentidos do leitor (denominação insuficiente para a relação que 
se estabelece nessa proposta) que guiarão o percurso. 
 
Porém, de que caminho se trata? A referência a “método” é presente o tempotodo, na própria metáfora do labirinto. O desvelar das intenções dos autores, contudo, 
surge apenas quando se têm em mente suas referências filosófico-teóricas: 
Heiddeger, Wittgenstein, Gadamer, Lacan, Certeau (este, historiador e psicanalista 
lacaniano, como o coordenador). 
 
 
 
 
 
 
De fato, da Hermenêutica, a obra traz soberano o conceito de jogo, conforme 
já trabalhado pelo coordenador em trabalho anterior: “Os jogos de linguagem 
apresentam a ideia de que todo encontro com ela é sempre movediço e de que faz 
parte do seu próprio acontecer a busca da verdade. No alemão, por exemplo, o termo 
Spiel (jogo, interpretação, risco, brincadeira) pretende acolher grande parte deste 
acontecer. Como técnica, a multimídia radicaliza e ratifica o princípio de que a 
linguagem tem seu verdadeiro sentido em toda ação que se converte numa 
modificação daquele que a experimenta. 
 
http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/567886-quem-e-michel-de-certeau-para-mim-o-maior-teologo-para-os-dias-de-hoje
 
 
 27 
A linguagem multimidiática se apresenta como um jogo, exatamente porque, tal 
como este, é o ‘sujeito’ de si mesma. (…) Brilhantemente explorado por Johan 
Huizinga em Homo Ludens, a concepção de jogo assume maior responsabilidade no 
encontro entre a cultura e a linguagem. O autor apresenta o jogo como elemento 
fundador das funções culturais, do Direito, da Poesia, da Guerra, etc., sobretudo no 
sentido de impulsionar o jogador (een spelltje doen, em holandês), 
independentemente de ser o resultado da ação de uma consciência lógica. Esta seria, 
tanto em Huizinga, quanto nas propostas hermenêuticas, o principal fascínio no Spiel: 
jogar é, sobretudo, ser jogado. O jogo é dono dos jogadores” (Bairon, 1995:83-84). 
 
De fato é de Gadamer (1991:149), autor que perpassa toda a reflexão e 
proposta metodológica do trabalho, a afirmação recorrente ao longo de Hipermídia: 
“todo jogar é um ser jogado”.7 Essa proposta fundamenta a relação que Gadamer 
estabelece entre jogo e obra de arte, também fundamental para se compreender a 
proposta, feita por Bairon, da adoção da estética como via de compreensão: “O que 
teria que ser objeto de nossa reflexão não seria a consciência estética, mas a 
experiência da arte (…). (…) a experiência da arte não é nenhum objeto frente ao qual 
se encontre um sujeito que o é para si mesmo. Pelo contrário, a obra de arte tem seu 
verdadeiro ser no fato de que se converte em uma experiência que modifica a quem 
a experimenta” (Gadamer, 1991:144-145). 
 
Na proposta de Bairon, encontram-se obras de arte trazendo o uso de 
diferentes linguagens como busca de compreensão universal. Lá estão fotografias 
amalgamadas em colagens digitais, ou então compondo telas, firmamento iluminado 
como no laboratório de topologia, ou trazendo a escuridão permanente por sobre o 
labirinto (seria o mergulho no inconsciente? No desconhecido? No que está a ser 
conhecido?). 
 
Jogando (vivendo-se o “ser jogado”) no labirinto, a seta do “mouse” desliza por 
sobre uma parede do labirinto sensibilizada, surgem imagens de Magritte, referência 
constante, que conduzem a outras experiências, nas quais é dada a possibilidade de 
sair, nas alternativas iconográficas que vão sendo desvendadas, ou ficar, e suportar 
a expectativa do que está por vir. O usuário/leitor/jogador encontrará animações que 
 
 
 28 
Veja uma análise crítica do filme Tempos Modernos. 
https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/analise-critica-do-
filme-tempos-modernos-com-charles-chaplin/55215 
 
raptarão sua atenção, envolvendo-o em um clima impossível de controlar. Um 
exemplo é a sarça ardente futurista do desejo, dançando inapreensível ao som de um 
mantra oriental. Ou qualquer outra coisa que seja a mesma representação visual e 
sonora, que o leitor/jogador venha a perceber: assim será. 
 
As citações cinematográficas, de clássicos como Tempos Modernos, 
Metrópolis, 2001 Uma Odisseia no Espaço, entre outros, são um exercício de pesquisa 
de filmes que têm profundo significado neste século que se encerra, vinculando-os a 
conceitos explorados pela Psicologia, pela História, pela Linguística e pela 
Antropologia. Assim, ora a História da Cultura fornece os elos da interdisciplinaridade,8 
ora é a arte que o faz. 
 
 
 
 
 
 
Já afirmara anteriormente o autor: “A livre criação daquele que produz uma obra 
de arte tem o potencial de abertura ao mundo, que nenhuma metodologia científica 
de tradição iluminista garante. A liberdade de ação imagética na arte pressupõe, em 
essência, uma igual liberdade de interpretação e expressão. Longe do domínio técnico 
‘conteudístico’, a compreensão pode possibilitar um estar-no-mundo que promova o 
encontro daquele que interpreta com o que é interpretado, ao ponto desta promoção 
revelar os horizontes envolvidos” (Bairon, 1995:199). 
 
Vale ressaltar que as tecnologias digitais propiciam facilidades no uso dos 
diversos recursos propiciados pela arte, em suas diversas manifestações. 
Antecipando a riqueza com que exploraria esse potencial, Bairon (1995:209) afirmava 
em trabalho anterior: “(…) A linguagem da arte é a linguagem do não-sentido, do 
desapropriar-se de qualquer significado, da valorização da subjetividade, não a 
kantiana, mas a da polifonia bakhtiniana. 
 
https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/analise-critica-do-filme-tempos-modernos-com-charles-chaplin/55215
https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/analise-critica-do-filme-tempos-modernos-com-charles-chaplin/55215
 
 
 29 
No mundo contemporâneo, vídeo, animação, colagem, efeitos, cinema, artes 
plásticas, etc., brigam para manterem a própria identidade institucional; mas, como 
vimos tudo indica que haverá uma grande hibridação dos meios de manifestação 
artística, a ponto de não conseguirmos mais diferenciar o espaço da arte, já que esta 
está cada vez mais tornando-se cotidiano. ” 
 
É importante destacar que o uso de trabalhos como Hipermídia, na formação 
de professores, traz vantagens de várias ordens. Primeiramente, como experiência de 
compreensão, incorporando o cognitivo e o sensitivo, oportunidades de ampliação de 
horizontes. Talvez alguém indagasse – como é frequente – de que serviria esse tipo 
de vivência, se for posteriormente “condenado” a trabalhar em escolas que não 
dispõem de facilidades da informática. Trata-se, contudo, de um modo de abordar o 
conhecimento, de lidar com a riqueza das produções culturais humanas, não se 
aprisionando nos limites do impresso em tinta e papel. Uma vez vivenciada essa 
formação, o professor terá condições de buscar e oferecer recursos variados a seus 
alunos. 
 
Isto porque, como já foi tratado, os conceitos de jogo e estética são 
estruturadores da proposta analítica de Hipermídia. Há três verbos que expressam os 
objetivos buscados por esse trabalho em hipermídia e que estão voltados para o 
usuário/leitor/jogador: imergir, perguntar, projetar. 
 
Enquanto jogo, Hipermídia convida a uma imersão, após a qual não se tem 
como voltar atrás. O vivido já terá alterado algo naquele que o vive, pela percepção, 
pelo conhecimento, ainda que inapreensível e por vezes indizível. 
 
A profusão e riqueza de informações oferecidas anunciam, por um lado, o 
volume e a duração das pesquisas prévias realizadas, dentro e a partir de diferentes 
regionalidades científicas e artísticas. Tais pesquisas propiciaram levantamento 
conceitual e iconográfico ao longo de muitos anos, permitindo exploração de 30 
conceitos, apresentados e compostos em 64 locais de interação que podem ser 
percorridos em diferentes níveis.9 
 
 
 
 30 
Uma vez imerso, o leitor/usuário/jogador vê-se frente ao inesperado, ao 
incompreensível, instigado então a perguntar. Atividade essencialmente 
hermenêutica, perguntar é inevitável quando se percorre o labirinto, o qual se mostra 
e se esconde; oferece, porém, não o fazde forma simplista: provoca e, gentil, permite 
que se prossiga, ou não, até o limite de cada nível sucessivo de imersão. Pelo sistema 
de busca de palavras, pode-se pular de um conceito para outro, de uma região para 
outra do labirinto, assim como se tem a possibilidade de consultar, a qualquer 
momento, o registro dos próprios passos, pelo navegador. 
 
O uso de técnicas atualíssimas, envolvendo cálculos e minucioso trabalho de 
criação digital, traz a possibilidade de girar 360º em torno de diferentes objetos, ao 
que parece buscando operar visualmente a noção de “giro ontológico”,10 propiciado 
pelo perguntar. 
 
Imergir e perguntar complementam-se, como possibilidade de compreensão, 
no projetar. Bairon (1995:199) advertia em trabalho anterior: “(…) a compreensão 
deve ter presente que, tanto o comum, o peculiar, como o científico e o poético, devem 
ser o resultado tanto do comparativo, quanto da adivinhação. A adivinhação é 
imprescindível na arte como na ciência, pois jamais pode ser resultado somente da 
aplicação de regras.” 
 
Se é verdade que tal ação independe de suporte material, é, contudo, 
extremamente facilitada pela exploração hermenêutica feita pela via da linguagem da 
hipermídia, enquanto conjunção de diferentes linguagens e mídias, propiciada pela 
compatibilização operada pela digitalização. A incompletude que se manifesta a cada 
interação, a impotência a cada vai-e-vem, resultado do “ser jogado” (quando tudo o 
que se queria era jogar), levam à busca de outros conceitos, de outras experiências 
estéticas que projetarão o sujeito/leitor/usuário/jogador, que pouco a pouco se 
percebe autor. 
 
Nesse ponto ficam evidentes os dois princípios norteadores da proposta, 
elaboração e produção de Hipermídia: a não-linearidade e a reticularidade. 
 
 
 
 31 
Vale a pena conhecer um pouco sobre a história do intelectual Fernand Braudel. 
https://www.infoescola.com/biografias/fernand-braudel/ 
 
Ao propor o não-linear como elemento de compreensão do estar-no-mundo e 
do permanente recolocar-se, o trabalho desafia as fronteiras das regionalidades 
científicas. Contudo, isto é feito com rigor e destreza, dentro da tradição proposta há 
tanto por Fernand Braudel – e aí fica evidente o papel da História da Cultura como elo 
interdisciplinar. 
 
 
 
 
 
 
Ao mesmo tempo, na hipermídia está sendo analisada, a escolha a cada 
momento coloca-se tão atraente quanto difícil, como criança em frente a vitrine de 
doces, pois é feita uma oferta generosa de conceitos, referências estéticas, textos 
teóricos, notas de rodapé reflexivas, imagens pouco frequentes de autores (seria, aí, 
um eco da abordagem enciclopédica do Il Seiscentos, de Umberto Eco, um dos 
autores/obra de referência do coordenador?). 
 
Com base nessa oferta generosa se constrói, na prática, a possibilidade de 
uma produtiva reticularidade que desafia o institucional na ciência e na arte. Todo 
aquele que se interessar poderá ter o CD-ROM à mão, para a qualquer momento 
navegar, experimentar novos caminhos, descobrir novas nuances das criações 
estéticas belíssimas, apresentadas em cores e sons, a fornecer-lhe conteúdo para 
ser, também, autor. O que mais poderia buscar a própria educação? 
 
Imagens cujas texturas são revestidas de conceitos, jogos de criança, como o 
“jogo da velha”, aplicados a conceitos extremamente complexos, trilhas musicais 
sensíveis, com um quê de épico por vezes, locuções instigantes que exploram as 
possibilidades sonoras da língua portuguesa. É a estimulação do campo perceptivo, 
jogando com os sentidos de uma nova e distinta maneira, que permite apenas concluir 
com a própria obra: “aqui está uma nova série infinita”. 
 
https://www.infoescola.com/biografias/fernand-braudel/
https://www.infoescola.com/biografias/fernand-braudel/
 
 
 32 
DO NÃO-ESCRITO AO PARA-ALÉM-DA-ESCRITA 
 
Ler Terra grávida e outros trabalhos semelhantes de Betty Mindlin é descobrir 
o Brasil para além da informação que é útil, porém insuficiente como proposta de 
encontro de alteridade – indispensável, no caso. É encontrar o vigor e beleza da 
diversidade, constituinte do universal. Trata-se de contribuição para transformar 
mentalidades construídas a partir de ensinamentos nas escolas, a tantos, por tanto 
tempo, que criaram um imaginário do “índio brasileiro”, que, por desinteresse cultural 
e interesses de dominação, disseminaram a ignorância com relação à riqueza da 
diversidade brasileira. 
 
 
Mentalidade na qual os grupos indígenas, apesar do desaparecimento de 
muitos pelas políticas históricas de conquista e exploração, ainda permanecem como 
mais de duas centenas de grupos, falando quase o mesmo tanto de línguas. 
 
Vale também o desafio de jogar o jogo proposto por Bairon. Estudar jogando, 
jogar estudando. Descobrir as trilhas das próprias possibilidades de criação, nas 
múltiplas formas de percorrer o labirinto e nas idas e voltas por entre os níveis. Nos 
caminhos do labirinto, “dar com a cara na parede” pode ser produtivo, porque permite 
atravessar o limite, por meio da compreensão de novos planos, com novas 
experiências estéticas. 
 
 
 
 33 
Roberto Gambini, fazendo o prefácio de Tuparis e tarupás, pode ser aqui 
invocado para auxiliar a compreensão de quão próximas são as abordagens de Betty 
Mindlin e Sérgio Bairon: “Os mitos revelam o fundo da alma. O fundo da alma – não 
da mente – é repleto de imagens incomuns, bizarras, inesperadas, que chocam e 
exasperam a mente consciente porque a desafiam, como a provar-lhe que aquilo que 
chama de realidade é apenas um arranjo temporário e artificial das coisas, que tudo é 
se assim parece, mas que o ser é abismal e inesgotável. A linguagem mítica – 
especialmente esta, brasileira, cheirando a mato, inusitada e nova, ainda que milenar 
– subverte a ordem das coisas, provocando releituras do mundo. Um mito contém 
tanta verdade sobre a natureza do real quanto a mais profunda intuição da psicologia 
do inconsciente. Aí reside seu valor, que ultrapassa os códigos estéticos da literatura 
e da arte. Um mito vale não apenas por ser belo, mas porque contém uma centelha 
de conhecimento roubado aos céus como o fogo de Prometeu ou da arara” (Gambini, 
1993:12). 
 
Embora o cheiro de mato possa aqui ser trocado por criação digital impactante, 
Lúcia Santaella, ao fazer a apresentação de Hipermídia, também explora a temática 
da profusão e da quebra da linearidade como fator de subversão e de compreensão: 
“Assim como a hipermídia como técnica permite a integração sem suturas das 
diferentes mídias e linguagens, isomorficamente nesta hipermídia integram-se, em 
cruzamentos e sobreposições, em vizinhanças e coabitações, o conceitual e o criador, 
o intelectual e o estético, as superfícies e palimpsestos de textos, imagens, falas e 
sons, estradas e sinalizações, ícones e pistas de navegação que intermitentemente 
lançam ao leitor piscadelas secretas para fisgá-lo nessa aventura intelectual em que 
pensamento e êxtase sinestésico se enlaçam” (Santaella, 2000). 
 
Assim também se encontra o uso deliberado da própria imaginação, em que a 
criatividade transbordada é disciplinada pelos objetivos buscados: a temática do autor/ 
produtor (Williams, 1992) e o convite ao leitor/autor. Em Bairon (1995), eis o que 
propõe, como já foi visto: “A liberdade de ação imagética na arte pressupõe, em 
essência, uma igual liberdade de interpretação e expressão.” Em Mindlin (1999:263), 
essa proposta também se afirma como convite: “Espero, como no caso de meus 
 
 
 34 
Uma forma de aprender sobre o pensamento de um filósofo é aprender um 
pouco sobre a sua vida e formação. Veja mais. 
https://www.estudopratico.com.br/epistemologia-de-bachelard/ 
 
trabalhos anteriores, que as traduções sejam refeitas, com base no registro gravado 
que tenho nas várias línguas ou utilizando novas gravações. 
 
Conservo as gravações e as traduções de cada narrativae de cada Narrador; 
minha documentação é uma espécie de museu ou arquivo para os índios ou outros 
pesquisadores e todo o livro pode ser reescrito por escritores índios ou outras 
pessoas.” 
 
A escola, como nossa civilização, tem valorizado demais o verbal e o racional. 
A formação de professores se afirma nessa mesma atitude, fechando um ciclo vicioso, 
a transmissão de certo tipo de conhecimento que se pretende linear, que se multiplica 
e reproduz como se fosse linear, instaurando facilmente a falta de motivação para o 
estudo. Acomoda-se, como analisa Bachelard (1984:167): “Chega uma altura em que 
o espírito gosta mais daquilo que confirma o seu saber do que daquilo que o contradiz, 
prefere as respostas às perguntas. Passa então a dominar o instinto conservativo e o 
crescimento espiritual cessa.” 
 
 
 
 
 
 
O conhecimento veiculado então pela escola parece esgotar-se em si, “sem 
utilidade”, o que de certa forma é verdade, se o que se oferece arrefece qualquer 
vontade de conhecer mais. Como cessar a capacidade de indagar? Como romper o 
fluxo de interesse? Vale lembrar uma vez mais Bachelard (1984:166): “O espírito 
científico proíbe-nos de ter uma opinião sobre questões que não compreendemos, 
sobre questões que não sabemos formular claramente. É preciso, antes de tudo, saber 
formular problemas.” 
 
A oferta de vivências estéticas polissêmicas, muitas vezes trazendo o recurso 
à palinódia como desafio, a possibilidade de aprofundamento por níveis, a ausência 
https://www.estudopratico.com.br/epistemologia-de-bachelard/
https://www.estudopratico.com.br/epistemologia-de-bachelard/
 
 
 35 
de uma estrutura que se bastaria a si, a abertura para a ação – coautoria, portanto – 
do leitor/jogador/navegador ao escolher, tudo isso significa, para os padrões até aqui 
vividos, uma mudança substancial nas possibilidades educacionais. 
 
Do ponto de vista do desenvolvimento curricular na escola, em seus diferentes 
níveis, essa abordagem facilita a própria compreensão da ideia de transversalidade e 
da elaboração de projetos desenvolvidos em torno de temas com tal característica. 
Assim, a formação de professores pode incorporar esse tipo de 
leitura/jogo/aventura/autoria com grandes vantagens, comparativamente ao uso de 
meios convencionais. 
 
O que aí se observa é a mesma escolha da possibilidade de viver mais a busca 
da compreensão que do conhecimento, mediante a mesma liberdade de criação, a 
mesma imersão na sensível para além do racional, que há na narrativa indígena, e 
que nesta é marcada pela simplicidade dos recursos estéticos usados. Assim, o corpo 
torna-se instrumento, pela voz, pelo gesto, pela expressão, com o que se garante a 
permanência e, ao mesmo tempo, a transformação da mensagem, a cada vez. Em 
Hipermídia, em meio ao percurso, reverbera-se a mesma afirmação: “Corpo é 
ferramenta”. 
 
O trabalho de Bairon também se assemelha à pesquisa de Betty Mindlin na 
preocupação da permanência do tradicional no novo. Em suas pesquisas, Mindlin 
colhe mitos de narrativas orais e faz seu registro, como forma de garantir sua 
permanência entre os indígenas e de busca-la na sociedade brasileira, divulgando-a. 
A passagem do oral ao escrito se faz, assim, pelo bem de ambos. 
 
Bairon faz dialogar entre si conceitos de regionalidades científicas distintas, 
explorando ao longo da pesquisa o conceito de cultura, fazendo inúmeros exercícios 
hermenêuticos no percurso do labirinto, fundindo linguagens hoje tradicionais – 
escrita, fotografia, cinema, vídeo, som –, mediante as possibilidades da linguagem da 
hipermídia. Com isso enriquece o já existente – como as precisas citações de cinema 
– e explora as possibilidades heurísticas da realização da investigação conceitual com 
a nova ferramenta, a hipermídia. 
 
 
 36 
Vale lembrar que Bachelard (1984:171), comentando características do “livro 
do ensino científico moderno”, afirma: “Mal se leem as primeiras páginas, vê-se que o 
senso comum deixa de poder falar; deixam igualmente de se ouvir as perguntas do 
leitor. A frase Amigo leitor seria de bom grado substituída por um aviso severo: Aluno, 
toma atenção! O livro põe as suas próprias questões. O livro comanda. ” 
 
Esse ponto oferece possibilidades de se apresentar um dos aspectos que mais 
diferencia o tipo de ensino a distância que vem se fazendo e as estruturas 
hipermidiáticas. Com frequência, o uso da Internet como suporte tem sido apontado 
como veículo preferencial dessa modalidade de ensino, beirando frequentemente um 
ufanismo tecnológico, de resto já vivenciado na década de 60 com a ideia de educação 
pelo rádio e pela tevê e nos anos 80 com a disseminação do vídeo. Todas essas 
propostas puderam ser incorporadas aos processos de ensino, cooperando na difusão 
de conhecimento. Contudo, recomenda a cautela histórica que se evite a empolgação 
de cunho substitutivo (“nada que não seja isso”). 
 
De fato, o que se tem visto em sua grande maioria ainda apresenta limites, seja 
de ordem técnica, seja de ordem conceitual. Do ponto de vista de estruturas, essa 
condução, que talvez poderia ser chamada de “heterocondução”, frequentemente 
apresenta uma lógica pronta, em que mesmo as alternativas são evidentemente 
limitadas. Do ponto de vista conceitual, muitas vezes repete-se, disfarçada, a estrutura 
linear dos livros tradicionais, pouco havendo, então, de exploração efetiva da 
capacidade analítica que o meio digital propicia. 
 
Além disso, a restrição imediata de permanência na Internet, pelo acesso por 
assinaturas de tempo limitado, significa a submissão à lógica de mercado; mesmo nos 
portais gratuitos, essa lógica está presente pela exposição a mensagens de 
patrocinadores, os quais, por sua vez, determinam o que é, ou não, relevante. 
 
 
 
 37 
 
Embora pedindo estudo específico, é interessante lembrar, por exemplo, que a 
divulgação massiva da Internet no Brasil como meio de comunicação, popularizando 
o computador como instrumento, deu-se em uma novela – Explode coração (Rede 
Globo, 1995)12 – onde a cigana Dara trava contato, com aquele por quem se 
apaixonaria, em um chat. Vale observar a estratégia de marketing embutida na novela, 
em particular por associar a nova tecnologia ao esoterismo, pela presença cigana, 
com leitura do futuro através de mãos, de cartas de baralho, acentuando o estereótipo, 
com relação aos ciganos, e, quiçá, a ilusão de que a Internet seria algo mágico. 
 
Não se trata, aqui, de minimizar as facilidades e possibilidades presentes na 
Rede. Mesmo a simples disseminação de “mensagens” em “correntes”, uso entre 
internautas atualmente tão corriqueiro quanto envergonhado,13 pode ter um papel a 
cumprir, por exemplo, na descoberta maravilhada que idosos fazem da Internet como 
meio de comunicação, assim como solitários em geral. Ou ainda, vale lembrar as listas 
de discussão, originariamente praticadas em meios acadêmicos, nos primórdios da 
Internet, e hoje quase obrigatórias entre organizações não-governamentais e 
movimentos sociais (Castells, 1999). 
 
Sem dúvida há grandes vantagens no uso e na consulta à Internet, para fins 
educacionais, mas ela, em si, ainda não propicia possibilidades de exploração 
conceitual como se observa em outros produtos digitais, como no exemplo de 
hipermídia aqui analisado – e aí o suporte do CDROM é mais adequado, por permitir 
 
 
 38 
sua exploração com maior liberdade, sem as pressões presentes quando se marca, 
como se faz no Brasil, a duração da consulta pelo “tempo conectado”. 
 
Os autores aqui estudados também têm em comum abordar o presente como 
duradouro, porque mutável, o ser humano que vive da tradição ao futuro como um 
único tempo. Lembram, aí, Grahame Clark, arqueólogo que ressalta a importância de 
salvar a tradição, não permitindo que se fossilize. Reverbera essa atitude, sem dúvida, 
na preocupação ética de Betty Mindlin, ao recolher as narrativas, assimcomo em 
Bairon, ao se deter na construção digital de objetos tridimensionais, permitindo ao 
usuário/ jogador conhecer, por exemplo, a sala de Freud em Viena, sua cadeira (a 
girar, em uma das brincadeiras de criação), o famoso divã, sua vitrine de objetos. 
 
Vale lembrar que a noção de aventura – e aí se inclui a viagem/navegação pelo 
tempo e pelo espaço, pelo diverso e pelo idêntico – encontra-se tanto em Terra grávida 
quanto em Hipermídia. São explorações dos conceitos de cultura e de linguagem, que 
permitem pronunciar vivencialmente a pluralidade presente em ambos. 
 
O trabalho de Mindlin é evidentemente vinculado à pluralidade cultural 
brasileira, cooperando, assim, na construção/transformação da identidade 
cultural/identidade nacional. Contudo, vai além, trata do universal, como lembra 
Gambini (1993:13): “(…) esses contos brasileiros recolhidos no mato mereceriam a 
atenção de exegetas do nível de Antônio Candido, Joseph Campbell ou Marie Louise 
von Franz. Quem sabe assim nós brasileiros começaríamos a valorizar aquilo que diz 
a alma ancestral de nossa terra e teríamos algo que nos enaltecesse para mostrar ao 
mundo.” 
 
Da mesma forma, o trabalho de Bairon é também um produto tipicamente 
brasileiro, a configurar novas percepções/criações que o Brasil propicia, mas se abre 
também para o mundo, de onde igualmente tira inspiração. Como afirma Santaela 
(2000): “Não tenho dúvidas de que este magnífico trabalho será um marco na história 
da hipermídia não só no Brasil mas também em um contexto internacional, pelo 
hibridismo denso cuja germinação só a sopa biótica do sincretismo próprio à cultura 
brasileira poderia propiciar.” 
 
 
 39 
Trazem ambos, Mindlin e Bairon, os desafios de uma realidade complexa, da 
qual muitas vezes a escola e a formação de professores têm estado distantes – a 
compreensão de como se faz cotidianamente a constituição da identidade cultural e 
da identidade nacional no Brasil. 
 
Terra grávida, como quer seu nome, traz dessa complexidade a permanência 
e o novo, o milenar desconhecido. É, em si, um convite para que o educador repense 
suas práticas mediante subsídios efetivos, sendo tocado pelas histórias e pelos mitos 
que trazem a vida de grupos indígenas. Indígenas que, ao serem tratados na escola 
como têm sido – ou seja, como se fossem, independentemente de seus grupos, 
homogêneos restos de um passado –, são invisibilizada como parte constituinte deste 
presente plural e diversos que de fato o Brasil é. 
 
Para Bairon, a complexidade referida significa avançar nas possibilidades 
tecnológicas sem cair num determinismo maquínico aparentemente aberto, mas sem 
perspectivas, porque aprisionado na tecnologia como valor em si. Ao invés disso, o 
que faz é, avançando nas possibilidades hipermidiáticas, repercutir as construções 
culturais e científicas, reconstruir e ampliar as possibilidades de criação estética e 
conceitual, de capacidade de perguntar e buscar, capacidades especificamente 
humanas. 
 
Hipermídia é, pois, um convite para a aproximação a um meio que, pela 
mitificação indevida, é visto por muitos educadores, pelas condições de nosso país, 
como futuro inacessível, com o que se perde de vista este presente no qual está entre 
nós, por toda parte, determinando nossa existência, à espera de que tomemos as 
rédeas desse processo. A reiteração hermenêutica de que “o ser se define pelo 
entorno”, soberano no mapa do labirinto, é o convite à reflexão e o alerta que os 
educadores não podem deixar de perceber. 
 
 
 
 
 40 
A TEORIA EDUCACIONAL NO OCIDENTE 
 
Nos séculos XIX e XX, no Ocidente, ocorreram três grandes revoluções em 
teoria educacional. 
 
Na transição do século XX para o XXI, está-se assistindo uma quarta revolução. 
As três primeiras, segundo historiadores da filosofia da educação, têm seus melhores 
representantes nos nomes de Herbart, Dewey e Paulo Freire. Já a quarta revolução, 
da maneira como está ocorrendo, pode encontrar justificativas em Richard Rorty e 
Donald Davidson. As três primeiras foram revoluções modernas em teoria 
educacional, enquanto a quarta é pós-moderna. 
 
Cada uma dessas revoluções girou em torno da emergência de um elemento-
chave na discussão entre os filósofos da educação: em Herbart, a emergência da 
mente; em Dewey, a emergência da democracia; em Paulo Freire, a emergência do 
oprimido. A quarta revolução, por sua vez, segue em torno da emergência da metáfora 
– entendida segundo as novas visões de Davidson estudado por Rorty. 
 
As revoluções anteriores não perderam a importância diante daquela que está 
ocorrendo agora, pois pertencem ao passado em um sentido cronológico e não 
valorativo, pelo qual teriam visto a perda de relevância de seus elementos-chave. 
Afinal, hoje em dia, avançou-se muito em filosofia da mente e não seria possível fazer 
teoria educacional sem considerá-la. Assim, a herança de Herbart está viva. 
 
No caso de Dewey, mais ainda se tem a sensação de algo vivo: não passaria 
pela intenção da maioria dos filósofos da educação no Ocidente preferirem a 
educação autoritária no lugar da educação democrática, e talvez poucos ainda 
acreditem que poderia haver verdadeira educação em uma situação social não 
dinâmica e não livre. Fora alguns ressentidos da direita e da velha guarda marxista, a 
maioria dos filósofos da educação considera a democracia um chão necessário para 
toda e qualquer educação. 
 
 
 41 
Paulo Freire, por sua vez, está presente quando se considera que os países 
ricos se tornaram mais ricos e os pobres mais pobres e que o fenômeno do 
aparecimento do “desenraizado”, seja ele o pobre ou o pertencente a grupos 
minoritários, é agora também visível mesmo onde estava prometido que 
desapareceria ou não surgiria: nas democracias ricas da América do Norte e Europa. 
 
As três primeiras revoluções, portanto, não se distinguem da revolução pós-
moderna em teoria da educação por um pretenso fato de que esta última teria 
superado tudo o que foi pensado em educação anteriormente. O que ocorre é que a 
revolução pós-moderna em teoria educacional está acoplada a uma maneira de 
conversar, em termos técnicos de filosofia e filosofia da educação, que desloca as 
filosofias da educação que justificavam as teorias educacionais modernas, nomeadas 
aqui por Herbart, Dewey e Freire. 
 
A TEORIA EDUCACIONAL NO OCIDENTE: ENTRE MODERNIDADE E ... 
Fonte: Elaboração do autor. 
 
O que se pretende dizer com isto é que as teorias educacionais modernas 
estiveram articuladas à filosofia da educação pré-linguistic turn. Por sua vez, a teoria 
da educação que melhor se insere no campo pós-moderno, e talvez possa vir a manter 
o nosso apreço pela democracia, está articulada às formas de conversação 
adquiridas, em filosofia, após a virada linguística e neopragmática. Porém, as teorias 
educacionais diferem não apenas em suas justificativas filosóficas, mas também em 
seus aconselhamentos e procedimentos didáticos. 
 
Segundo o pensamento rortyano, a filosofia da educação não é o fundamento 
da teoria educacional, mas apenas uma forma de discurso ad hoc que permite 
 
 
 42 
melhorar nossa coerência prática e, talvez, potencializar o que se está fazendo. Sendo 
assim, não serão expostas aqui as filosofias para depois derivar delas as teorias 
educacionais. Ao contrário, serão apresentadas as diferenças entre elas e, só então, 
demonstrado, de modo breve, que é possível encontrar diferentes filosofias da 
educação para cada uma dessas teorias educacionais. 
 
O Quadro 1 apresenta as quatro teorias educacionais aqui citadas, em seus 
passos didáticos, em comparação. 
 
Antes de qualquer comentário explicativo dos passos citados no Quadro 1, vale 
fazer um alerta: nenhuma dessas formulações deve ser entendida através da 
dualidade “diretividade versus não-diretividade”. O grande erro dos livros em teoria da 
educação e didática é o de apelarem

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