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Ensaios de Antropologia 4

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Ensaios de 
Antropologia
Responsável pelo Conteúdo:
Prof. Dr. Edgar da Silva Gomes
Revisão Textual:
Prof. Dr.ª Selma Aparecida Cesarin
Antropologia e Diversidade Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
 
 
• Investigar as origens dos conceitos de etnia e raça e o modo como essas noções se articulam 
com uma concepção mais geral de cultura que leva à racialização de corpos humanos e às 
mais diferentes formas de racismo.
OBJETIVO DE APRENDIZADO 
• Etnia e Minoria Étnica;
• Raça e Racialismo;
• Raça e Etnia;
• Racismo: Histórico, Definições e Novos Usos.
UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Etnia e Minoria Étnica
A palavra “etnia” deriva do grego ethnos, que designa um grupo humano portador 
de um mesmo conjunto de traços linguísticos, culturais e/ou “raciais” determinantes de 
sua identidade. 
É interessante notar que o moderno sentido do termo permaneceu muito semelhante 
àquele que lhe atribuiu pioneiramente Heródoto, ainda no século V a.C.: de acordo com 
o “pai da História”, aquilo que definia o grego era ter o mesmo sangue, falar a mesma 
língua e compartilhar os mesmos hábitos e costumes.
Embora o significado do ethnos antigo tenha sido preservado em essência, as Ciên-
cias Humanas do século XX, especialmente, por meio da Antropologia Cultural, foram 
responsáveis por agregar ao conceito de etnia à importante noção de autoconsciência. 
Portanto, nossa Disciplina entende que não basta que determinada população com-
partilhe uma cultura, uma língua e uma ancestralidade para que se tenha uma etnia. 
É preciso, acima de tudo, que esse grupo se enxergue como parte de um mesmo povo.
Figura 1
Fonte: Adaptada de Getty Images
O debate em torno da questão étnica é complexo e remete a problemas filosóficos 
e epistemológicos que em muito extrapolam o escopo da Antropologia. Isso, porque 
o conceito está ligado a ideias como identidade, sentimento de pertença, mobilização 
política e, em última instância, às discussões sobre os motivos elementares que levam o 
homem a ser um animal necessariamente social. 
De forma resumida, poderíamos dizer que há duas abordagens principais para o 
tema. Por um lado, pode-se tomar a etnia como algo primordial, um laço ancestral 
que, independentemente de fatores externos e circunstâncias históricas, une determi-
nada população.
Esse ponto de vista está identificado com as Teorias chamadas essencialistas. Atual-
mente, tal posição enfrenta sérias resistências, já que, desde a década de 1980, estudos 
ligados à História Cultural e à Etimologia nos mostram que tradições e mentalidades 
aparentemente longevas podem ser construções culturais recentes, por vezes, animadas 
pela pura vontade política. 
8
9
O caso dos nacionalismos é emblemático: embora saibamos que o moderno conceito 
de Nação não tem mais do que 150 anos de idade, e que a maioria dos atuais países tive-
ram seus contornos territoriais e repertórios culturais definidos há pouquíssimo tempo, 
o discurso oficial veicula a ideia de que ser britânico, francês, americano ou brasileiro 
remete a um sentimento de pertença que une a população desde tempos imemoriais.
Nacionalismo: substantivo masculino.
• Preferência determinada pelo que é nacional; exaltação dos valores de seu país de 
nascimento e de tudo o que lhe é particular; patriotismo.
• [Política] Doutrina que prioriza o Estado como fundamental e único na gestão política.
• [Política] Ideologia de governo em que o povo teria poder para criar uma nação, um 
Estado absoluto.
• [Literatura] Movimento artístico que valoriza o que é nacional, próprio do povo, da 
pátria e de suas extensões, como fator essencial de criação.
Etimologia (origem da palavra nacionalismo). Do francês nationalisme; nacional + ismo.
Fonte: https://bit.ly/39OAiJJ
Outra abordagem possível para o problema consiste em assumir que a etnia é uma 
construção histórica, política e social, ou seja, que a identidade étnica, o laço que une 
determinado povo, não é algo natural ou essencial, mas uma invenção coletiva. 
Essa posição, que podemos classificar genericamente como construtivista, suscita 
diversos outros problemas, como o do caráter coercitivo da identidade étnica: até que 
ponto a etnia é uma construção espontânea de uma Sociedade e até que ponto ela 
responde a interesses políticos e discursos de poder por vezes xenófobos e intolerantes? 
Pelo primeiro ponto de vista, o foco da análise recai sobre o caráter naturalmente 
dinâmico da cultura. Pelo segundo, destacam-se os aspectos ideológicos do discurso da 
pertença étnica.
No âmbito da Antropologia, “etnia”, geralmente, aparece como sinônimo de “povo” 
ou “cultura”, no sentido de “Sociedade humana dotada de traços distintivos próprios”.
O termo também esteve associado, especialmente, nos últimos dois séculos, à ideia 
de “nação”, mas é preciso tomar cuidado com tal aproximação. Em primeiro lugar, por-
que essa é uma palavra muito jovem, que ganhou seu sentido moderno somente no final 
do século XVIII. 
Isso significa que ela está intimamente atrelada a noções contemporâneas como a de 
Estado nacional, algo absolutamente estranho à maior parte das culturas não ocidentais 
do Planeta. 
Em segundo lugar, porque “nação” não se refere a um povo que partilha somente 
uma língua e uma cultura, mas partilha também um território. Portanto, embora em 
alguns casos “etnia” e “nação” coincidam, a nação pode abarcar mais de uma etnia ou, 
ao contrário, a etnia ultrapassar qualquer limite nacional.
9
UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Já na Linguagem comum, a noção de etnia adquiriu uma carga profundamente pre-
conceituosa que merece nossa atenção: termos como “étnico” ou “grupo étnico” se 
referem sempre a culturas diferentes da nossa e, em geral, consideradas inferiores. 
Isso inclui Sociedades africanas, indígenas americanas, asiáticas e, a partir especial-
mente da segunda metade do século XX, populações de imigrantes que aportaram na 
Europa ou nos Estados Unidos. 
Assim, em um interessante processo de inversão, o étnico passou a designar justa-
mente aquilo que não faz parte do repertório cultural “padrão” de uma nação. 
Fiquemos com um exemplo caro à realidade brasileira: expressões como “roupa de 
estampa étnica” ou “penteado étnico” designam, na maior parte dos casos, vestimentas 
e cortes de cabelo ligados ao padrão estético que entendemos como sendo africano – ou 
simplesmente “afro”.
Além de revelar uma profunda ignorância por parte do enunciador – tendo em vista 
que a África, aludida pelo exemplo, acolhe uma infinidade de tradições culturais e es-
téticas completamente distintas –, essa acepção de etnia carrega traços de exotismo 
e primitivismo que remetem, em última instância, a um ponto de vista etnocêntrico e 
culturalmente hierarquizante. 
Trata-se, portanto, de uma definição que não faz parte do vocabulário antropológico, 
mas que deve ser levada em conta para que se compreenda melhor o peso das questões 
étnicas no interior das Sociedades contemporâneas.
Leia a Matéria publicada no portal Vila Mulher, disponível em: https://bit.ly/2NLhUJV 
Outro ponto importante a ser destacado é a costumeira associação entre etnia e mi-
noria (ou, mais precisamente, minoria étnica).
A Antropologia nos ensina que todo grupo humano que se reconhece dono de uma 
tradição cultural singular e diferente das demais pode ser considerado uma etnia. 
Ocorre que, no caso das Sociedades ocidentais, o uso dessa noção para designar, 
como acabamos de ver, grupos em geral minoritários que destoam da norma cultural de 
um país ou comunidade, faz parecer que etnia se refere sempre a comunidades “exóticas”, 
como as indígenas, ou restritas a guetos, como no caso dos imigrantes. 
Embora corriqueira, essa associação não é obrigatória. Cumpre lembrar que uma 
minoria social não se define pela quantidade de indivíduos que dela participam, mas pela 
condição – marginal, subordinada, excluída– com que eles se inserem na Sociedade. 
Um dos exemplos mais flagrantes de como uma minoria pode ser numericamente 
majoritária é o dos negros: em países como Brasil, Estados Unidos ou África do Sul, 
cuja população é composta por uma enorme parcela de afrodescendentes, é possível 
classificar a comunidade negra, sob vários aspectos, como uma minoria.
O caso dos negros, diga-se de passagem, é a forma mais evidente que a questão étnica 
assumiu na nossa cultura. Tanto pelo número expressivo de africanos trazidos ao país 
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durante séculos quanto pela forma particularmente perversa com que eles foram inse-
ridos na SOCIEDADE brasileira – diferentemente, por exemplo, das ondas imigratórias 
europeias, que nunca vivenciaram situações de escravidão, o racismo contra indivíduos 
de pele escura constitui o mais expressivo embate étnico de nossa história. 
Mas antes de refletirmos sobre esse problema, precisamos entender melhor a ideia 
de raça, suas semelhanças e diferenças com a noção de etnia e sua importância política 
ao longo dos últimos séculos.
Quais minorias étnicas você conhece e com quais convive no seu dia a dia? Como você reconhece 
que se trata de uma “etnia” diferente da sua? Pelo vestuário? Pela alimentação? Pela linguagem?
Raça e Racialismo
A palavra “raça” deriva do latim ratio que, apesar de possuir mais de uma acepção, 
pode ser traduzido como “categoria” ou “espécie”. O uso do termo é antigo e pode ser 
encontrado, por exemplo, nos escritos do viajante veneziano Marco Polo que, no século 
XIII, relatou seu encontro com a “raça persa”. 
Como se pode notar, o sentido original da palavra se aproxima muito daquilo que 
hoje entendemos como nação ou povo. 
Seu significado atual, intimamente ligado às diferenças físicas observáveis entre os 
grupos humanos, ganhou força somente no início da era moderna, quando as Ciências 
Naturais, especialmente a Zoologia e a Botânica, procuravam segmentar e classificar os 
diferentes seres vivos que habitam o Planeta.
O surgimento da raça como categoria das Ciências Humanas se deve à transposição 
do conceito biológico para o campo da Antropologia Física e da Etnografia. 
Conforme vimos na Unidade anterior, a Revolução Cultural e Científica pela qual 
passou o Ocidente a partir do século XVI – Revolução esta que deu origem à boa parte 
dos pressupostos epistemológicos das Disciplinas nascentes no século XIX, Antropologia 
inclusa – trouxe consigo a crença de que a Ciência é capaz de compreender plenamente 
o funcionamento do mundo e, junto a ela, a defesa da unidade de método entre Ciências 
Naturais e do homem. 
Imbuídos dessas convicções, os pensadores modernos renegaram as explicações teo-
lógicas para as diferenças entre os povos – explicações que remetem a Jafé, Sem e Cam, 
descendentes do patriarca Noé e que, de acordo com o Livro Sagrado cristão, estariam 
na origem dos “brancos”, “amarelos” e “negros” – e passaram a recuperar o conceito de 
raça já existente nas Ciências da Natureza para explicar as distinções fenotípicas entre 
os homens.
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UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Figura 2
Fonte: Getty Images
Evidentemente, esse tipo de construção teórica não se dá no vácuo, livre de influên-
cias do contexto histórico e social. Portanto, o que pode à primeira vista parecer um 
empreendimento científico neutro esteve, desde o início, contaminado por valores etno-
cêntricos e caros à Ciência hegemônica naquela época. 
Animados pelo discurso ufanista das nações, pela Teoria darwinista erroneamente 
transportada para os estudos sociais e pela força do Colonialismo que avançava sobre 
a África e a Ásia, pensadores dos séculos XVIII e XIX passaram não só a identificar 
as supostas raças humanas como também a organizá-las em hierarquias, procurando 
explicações biológicas para comportamentos morais e situações de aparente atraso 
ou primitivismo. 
Em um perverso círculo vicioso, a ideologia da raça justificava a dominação imposta 
aos povos africanos e asiáticos ao mesmo tempo em que ganhava legitimidade empírica 
por meio justamente dessa dominação.
Curiosamente, a noção moderna de raça, que assume sua face mais trágica com a 
opressão das populações negras, não coincide com a época de ouro do tráfico negreiro 
e da escravidão. Muito pelo contrário: o ideário racialista ganhou força justamente na 
segunda metade do século XIX, quando essas práticas estavam em declínio, criticadas 
duramente e abolidas em boa parte do Globo. 
Isso ocorreu em parte porque a escravatura foi uma instituição plenamente aceita no 
Ocidente até meados da Idade Moderna, o que tornava dispensável um intricado aporte 
teórico como o do racialismo para sustentá-la moralmente. 
Com o advento dos ideais iluministas – aquele homem universal do qual tratamos na 
Unidade anterior, dotado de direitos fundamentais inalienáveis – e do Capitalismo como 
modo de produção hegemônico (o que alterou profundamente as relações de trabalho), 
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a ideia de que um ser humano pode ser objeto de posse passou a ser repudiada, e a ideo-
logia racista surgiu para justificar a continuidade da situação de opressão e desigualdade 
tanto dos negros fixados em países ocidentais quanto das próprias Sociedades africanas, 
sistematicamente subjugadas por nações como Inglaterra, França, Alemanha e Bélgica. 
Afinal, para o ideário racista, a desigualdade entre os homens não advém de uma re-
lação de dominação concreta como aquela que existe entre o senhor e seu escravo, mas 
sim de uma determinação biológica que escapa de qualquer controle, posto que ditada 
pela própria Natureza.
Como o racismo produziu uma desigualdade social sistemática nos EUA, mesmo depois do 
fim da escravidão? Disponível em: https://youtu.be/Mqrhn8khGLM
Mas o que, exatamente, vem a ser raça? 
Ao longo das décadas, diferentes pensadores tentaram fornecer respostas precisas e 
“científicas” para esse questionamento. 
Grosso modo, há duas concepções possíveis (e complementares). A primeira, mais 
grosseira, é aquela que se atém quase que exclusivamente às características físicas das 
populações. É também a noção que, ainda hoje, está mais profundamente disseminada 
em nosso inconsciente coletivo. 
Dois de seus teóricos pioneiros foram Alexander Crummel (1819-1898) e Carl von 
Linné, ou Lineu (1707-1778). Este último, um naturalista sueco muito influente no seu 
tempo e reconhecido até hoje por suas contribuições (de fato louváveis) às Ciências Na-
turais, elaborou uma classificação que ilustra como poucas o rigor científico com que se 
tratou a questão das raças humanas e a associação ideológica entre características físicas 
e os traços comportamentais. 
De acordo com Lineu, o Homo sapiens se subdivide em quatro grupos, sendo eles:
• Europæus albus (“europeu branco”): pele branca, aparência sanguínea (isto é, 
pessoa saudável, corada), musculoso, engenhoso, inventivo, governado pelas Leis, 
usa roupas apertadas;
• Americanus rubescens (“americano vermelho”, o indígena): moreno, colérico, 
cabeçudo, amante da liberdade, governado pelo hábito, tem o corpo pintado;
• Asiaticus fuscus (“asiático moreno”): amarelo, melancólico, governado pela 
opinião e pelos preconceitos, usa roupas largas;
• Africanus niger (“negro africano”): negro, astucioso, preguiçoso, negligente, 
governado pela vontade de seus chefes (ou seja, propensos ao despotismo), unta 
o corpo com óleo ou gordura.
Originalmente, essa classificação é muito mais completa, com descrições detalhadas 
das características físicas de cada uma das subespécies. 
Procuramos destacar somente algumas dessas atribuições, com atenção especial 
à forma com que Lineu relaciona a organização política de cada Sociedade aos seus 
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UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
traços biológicos (trechos grifados): segundo ele, temos um homem europeu natural-
mente adaptado ao Estado de Direito contraposto, por exemplo, ao indígena, limitado 
a seguir a tradição, o “hábito” – uma Sociedade,portanto, sem dinâmica, sem transfor-
mação, sem história. 
O que mais impressiona é o quanto dessa classificação elaborada no século XVIII 
permanece incutida no imaginário do Ocidente. 
Afinal, se olharmos atentamente para os discursos racistas, é fácil encontrar de 
forma mais ou menos evidente essa velha ideia de Humanidade seccionada em quatro 
grandes grupos.
Figura 3
Fonte: Wikipedia Commons
A outra concepção possível de raça poderia ser chamada de “histórico-cultural”, pois 
ela considera não só os elementos fenotípicos das populações humanas, mas também 
suas ancestralidades e práticas culturais. 
Seu principal teórico foi William Edward B. Du Bois (1868-1963), defensor da ideia 
de que existem, no mínimo, oito grandes raças humanas.
Para essa vertente, a definição de uma raça deve levar em conta também as similari-
dades culturais entre os povos e, especialmente, sua procedência geográfica. 
Isso permitiu a Du Bois falar tanto de uma “raça negra”, composta pelos habitantes 
da África Subsaariana e por seus descendentes espalhados pelo mundo, quanto das 
raças “eslava” ou “românica”, ambas brancas.
É importante que deixemos claro o significado de racialismo, para que ele não seja 
confundido com racismo. O termo se refere simplesmente à aceitação da ideia de raça 
como paradigma teórico, sem hierarquias ou juízos de valor a priori. 
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Crummel e Du Bois – eles próprios negros – foram, como vimos, racialistas, mas 
ambos se engajaram num movimento político e intelectual chamado Pan-Africanismo, 
defensor da união e do fortalecimento da raça negra justamente contra o racismo e a 
subjugação do continente africano pelas potências ocidentais. 
Essa ideia pode parecer estranha hoje, haja vista que o conceito de raça humana já 
foi desacreditado pelas pesquisas científicas e que, após experiências traumáticas como 
o Holocausto judeu ou o apartheid sul-africano, sabemos que a crença nas diferenças 
biológicas entre os homens pode levar a caminhos políticos temerários. 
Mas no século XIX, período em que o conceito moderno de raça ganhou força e 
legitimidade, tal noção era perfeitamente aceita nos meios científicos mais sofisticados, 
e sua utilização não atendia necessariamente à ideologia da inferiorização.
Raça e Etnia
Nesse momento, já devem estar mais claras as diferenças existentes entre etnia e 
raça. De modo geral, pode-se dizer que a raça se define sempre, embora não exclusi-
vamente, com base em aspectos biológicos, fenotípicos, enquanto a etnia está ligada a 
aspectos culturais, sociais, históricos e até psicológicos. 
Figura 4
Fonte: Getty Images
É por isso que uma suposta raça – como, por exemplo, a negra – pode abarcar uma 
série de etnias diferentes. É também notável que a etnia só se concretize a partir do 
autorreconhecimento de certo povo enquanto unidade cultural. Isso significa que, diver-
samente da raça, uma identidade étnica não pode ser impositiva.
15
UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Mas ainda é preciso analisar melhor a questão do racismo. Isso porque a noção cor-
rente nos dias de hoje é muito diferente daquela empregada há, digamos, meio século. 
É sintomático que, atualmente, chamemos de “racismo” preconceitos que se voltam, 
na verdade, contra etnias, tais quais indígenas, migrantes ou estrangeiros. Embora possa 
parecer um erro conceitual grosseiro, esse vocabulário costuma ser consciente e poli-
ticamente orientado, pois reflete as configurações particulares que o racismo adquiriu 
historicamente na nossa Sociedade. 
É sobre esse percurso, especialmente, com relação ao caso brasileiro, que nos ate-
remos agora.
• Raça: é definida majoritariamente por aspectos biológicos e, portanto, por características 
físicas das pessoas (cor da pele, tipo de cabelo, altura, formato da cabeça etc.); 
• Etnia: é definida, em grande parte, por hábitos e costumes compartilhados por um grupo 
social (tipos de comida e de roupas, formas de expressão artística e linguística etc.)
Racismo: Histórico, Definições e Novos Usos
O conceito de racismo se disseminou e ganhou concretude teórica somente no início 
do século XX (não o confundir com raça ou racialismo que, como vimos, são ideias bem 
anteriores a esse período). 
Desde então, o termo recebeu inúmeros significados por parte de defensores e crí-
ticos, mas até meados daquele século, todas as concepções racistas se ancoraram de 
alguma forma no pressuposto de que as raças humanas possuem características físicas 
transmitidas hereditariamente, e que dessas características derivam qualidades morais, 
intelectuais, psicológicas, estéticas, religiosas, linguísticas e culturais. 
A partir dessa perspectiva essencialista e determinista, construíram-se escalas va-
lorativas para as diferenças entre os homens, sempre baseadas numa suposta divisão 
primordial, biológica, da espécie.
Ao longo das décadas, o racismo serviu de base para uma série de políticas segrega-
cionistas fomentadas pelo próprio Estado. Dois dos casos mais relevantes são o norte-
-americano e o sul-africano. 
No primeiro, as Leis raciais perduraram até a década de 1960, quando movimentos 
sociais massivos, como aquele liderado por Martin Luther King, pressionaram politica-
mente o Governo a aprovar a chamada Lei dos Direitos Civis de 1964, que extinguiu for-
malmente a discriminação da população afrodescendente nos Estados Unidos – embora 
o preconceito de fato tenha perdurado. 
Já no caso da África do Sul, o regime de apartheid (“separação”, em africâner) dividiu 
a população do país em três grupos raciais – os brancos, os colorados (mestiços) e os ne-
gros, garantindo à minoria branca privilégios como reserva de porções territoriais, acesso 
a locais públicos restritos aos negros e usufruto pleno dos direitos políticos, entre outros. 
Essa forma de segregação oficial durou entre 1948 e 1994.
16
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Você Sabia?
Martin Luther King Jr. foi um pastor batista e o principal nome do movimento por Direitos 
Civis nos Estados Unidos entre as décadas de 1950 e 1960. Sob a sua liderança, o movi-
mento antirracista americano organizou diversos protestos não violentos de Desobedi-
ência Civil. Entre eles, o mais emblemático foi a chamada Marcha Sobre Washington, 
ocorrida em 28 de agosto de 1963, na qual cerca de 250 mil pessoas se reuniram para 
reivindicar o fim da segregação racial naquele país. Foi nessa Marcha que fez seu discur-
so mais conhecido que se inicia com a frase “Eu tenho um sonho” (I have a dream). Martin 
Luther King foi assassinado a tiros em Memphis, em 4 de abril de 1968.
Fonte: https://bit.ly/3wy2077
O caso do racismo no Brasil carrega algumas peculiaridades que merecem nossa 
atenção. À semelhança dos Estados Unidos, nosso país viveu o trauma da escravidão e 
recebeu quantidades massivas de africanos cativos entre os séculos XVI e XIX. 
Por isso, a identidade da comunidade negra nacional não se funda em traços étnicos, 
remetidos a antepassados vindos de diferentes regiões da África e portadores de tradi-
ções culturais diversas, mas sim sobre o elemento concreto da cor de pele: o escravismo 
e a segregação não atingiram bantos ou iorubás, duas etnias africanas, mas simples-
mente negros. 
Isso também explica porque a questão étnica brasileira adquiriu majoritariamente o 
caráter de luta contra a discriminação racial. Embora o preconceito contra práticas cultu-
rais e linguísticas também exista em nosso país, a forma mais evidente de discriminação 
ao longo da nossa história foi propriamente racista, voltada ao enorme contingente de 
afrodescendentes que compõe a população.
No entanto, diferentemente da grande maioria das nações com passado escravista, 
o Brasil nunca teve Leis de segregação racial como as americanas ou sul-africanas.
Isso significa que, embora os negros tenham sido sistematicamente excluídos de fato 
da economia nacional e dos processos de decisão política, embora o país tenha adotado 
políticas deliberadas de “embranquecimento” da população com a “importação”de imi-
grantes europeus após o término da escravidão, e embora várias de nossas instituições 
tenham sido (e ainda sejam) discriminatórias em relação à comunidade negra, o racismo 
nunca foi uma prática oficial.
Figura 5
Fonte: Getty Images
17
UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Isso alimenta, por um lado, ideias como a de democracia racial, ideologia ancorada 
na crença de que o Brasil e as demais regiões colonizadas pelas nações ibéricas (Portugal 
e Espanha) foram mais tolerantes com os cativos trazidos da África do que, por exemplo, 
a Sociedade norte-americana, na qual houve Leis raciais. 
Prova disso seria a prática corriqueira da miscigenação entre europeus, negros e 
indígenas nos tempos coloniais, um elemento supostamente basilar da cultura nacional. 
Por outro lado, essa ideia interdita o debate sobre o racismo no país, já que, via de 
regra, nossas práticas discriminatórias são veladas, não oficiais e obscurecidas pelo mito 
da “cultura mestiça” que alega não existir preconceitos de cor.
A partir aproximadamente da década de 1970, os estudos científicos de ponta, espe-
cialmente aqueles protagonizados pela genética, derrubaram progressivamente a ideia 
de raça, demonstrando a irrelevância das diferenças biológicas entre os seres humanos 
e, acima de tudo, a inexistência de qualquer conexão entre Biologia e Cultura ou capa-
cidade intelectual. 
Com isso, o racismo “clássico”, ancorado na velha ideia de raça, entrou em franco 
declínio. No entanto – e esse é o ponto central para a discussão que se faz no âmbito 
das Ciências Humanas, seus mecanismos de funcionamento sobrevivem e continuam 
presentes nas práticas sociais até os dias de hoje.
A regra básica do velho racismo dependia da associação direta entre Biologia e com-
portamentos coletivos. Quando a Ciência provou a inexistência de tais aspectos bioló-
gicos, o “racismo contemporâneo” entra em cena para biologizar determinados Setores 
sociais, isto é, a considerá-los membros de um grupo específico de homens, portadores 
de uma Humanidade própria e distinta das demais, para então, como antes, atribuir-lhes 
traços comportamentais coletivos. 
É por isso que se pode falar em racismo contra estrangeiros, migrantes, membros de 
grupos religiosos distintos e, no limite, mulheres, jovens, idosos, homossexuais. 
Embora a ideia de raça não esteja necessariamente em jogo em nenhum desses casos, 
o mecanismo de exclusão que ela carrega – isto é, a crença de que os homens são desi-
guais por natureza – continua a ser usado, de modo inconsciente.
Esse uso do conceito de racismo pode ser problemático. Em primeiro lugar, ele não 
faz parte de um vocabulário conceitual mais rigoroso, como o da Antropologia, pois re-
corre a analogias e metáforas, além de costumeiramente confundir noções como raça e 
etnia. Ele também pode contribuir para banalizar a experiência das populações verdadei-
ramente estigmatizadas em termos racistas, tirando a especificidade histórica de eventos 
traumáticos como o apartheid na África do Sul ou os regimes escravistas nas Américas, 
e relegando o signo do racismo a qualquer experiência de rejeição ou injustiça social.
Mas esse uso não pode ser ignorado, pois ele evidencia o principal desafio teórico 
enfrentado hoje por aqueles que combatem o racismo, a saber: essa forma de precon-
ceito não depende mais da crença na raça para ter funcionalidade social. Essa é uma 
ideia que ajuda a entender, inclusive, a permanência de condutas preconceituosas contra 
populações estigmatizadas no passado pelo racismo “clássico”, como os negros, mesmo 
que o conceito de raça tenha perdido completamente sua validade.
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Figura 6
Fonte: Getty Images
O racismo contemporâneo se baseia numa essencialização que não é mais racial-bioló-
gica, mas, acima de tudo, histórica e cultural. É sensato supor que parte considerável (se 
não majoritária) dos atuais racistas não acredite na velha noção de raça, mas a associação 
entre modelos de comportamento e determinados grupos sociais, como se eles fossem 
donos de uma essência inescapável, transmitida hereditariamente, permanece corriqueira. 
Se antes eram os aspectos fenotípicos que determinavam os limites de cada grupo, 
hoje é a cultura, a história ou a procedência que mais contribuem para a estigmatização. 
Curiosamente, os vários racismos contemporâneos se voltam, muitas vezes, contra as 
minorias étnicas, e não contra as raças.
Os exemplos desse tipo de comportamento são inúmeros. Basta pensarmos, para 
usar um caso já “clássico”, no racismo presente hoje nos países da Europa Ocidental 
contra árabes, africanos e, a partir dos anos 1980, contra imigrantes vindos de países 
do chamado Terceiro Mundo e da antiga Europa Oriental.
No seu dia a dia, quantas pessoas que você conhece que ocupam posições de chefia em 
Empresas ou escritórios são negras e indígenas? Quantas são brancas? 
Ao que tudo indica, nosso século será marcado pela luta contra esse novo racismo, 
baseado nas diferenças culturais e identitárias, que emerge após o declínio da ideologia 
racialista elaborada entre o fim do século XVIII e o início do XX. 
Alguns dos desafios políticos e também teóricos (especialmente importantes, por-
tanto, para os cientistas sociais) já se desenham no horizonte: a luta pelo respeito às 
diferenças culturais e pela construção de políticas públicas multiculturalistas pode ser 
protagonizada tanto por antirracistas quanto por racistas. 
Os primeiros pedem o reconhecimento de sua identidade cultural particular ou, em 
outras palavras, a afirmação das diferenças para que se possa construir verdadeiramente 
uma situação de igualdade e respeito à diversidade. 
Já os segundos, fortemente organizados na Europa, podem reivindicar esse mesmo 
tipo de proteção para a sua cultura, que já é hegemônica, numa tentativa de viver sepa-
rados de árabes, africanos, hispânicos... enfim, dos “não-ocidentais”.
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UNIDADE Antropologia e Diversidade 
Étnica: Raça, Etnia e Racismo
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
 Livros
Seus Olhos viam Deus
HURSTON, Z. N. Seus Olhos viam Deus. Rio de Janeiro: Record, 2002.
 Filmes
A Cor Púrpura
1985, Estados Unidos; direção: Steven Spielberg.
https://youtu.be/V3NFGsA8hX4
Green Book: o Guia
2018, Estados Unidos; direção: Peter Farrelly.
https://youtu.be/QxXJ7vkFk48
Infiltrado na Klan
2018, Estados Unidos; direção: Spike Lee.
https://youtu.be/bbOJwWSEUmo
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Referências
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