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Trabalho de Conclusão de Curso PÓS-GRADUAÇÃO EM TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL ALUNO: Sandra Alves dos Santos Carneiro ORIENTADOR: Nome do Orientador ¹ Psicóloga. Técnica do SUAS na cidade de Pará de Minas REGULAÇÃO EMOCIONAL EM TRABALHADORES DOS CENTROS DE REFERÊNCIA ESPECIALIZADO A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA SANDRA ALVES DOS SANTOS CARNEIRO¹ RESUMO A identificação e o manejo das emoções têm se tornado relevantes para a saúde mental do indivíduo. O mundo atual, globalizado e tecnológico exige cada vez mais uma Regulação Emocional adaptativa, principalmente no contexto de trabalho, visto que o mesmo pode se tornar um ambiente aversivo e adoecedor. Este estudo teve por objetivo analisar e compreender como anda a saúde mental dos trabalhadores e o processo da regulação emocional nas relações de trabalho dos trabalhadores do SUAS, em especial, os que atuam nos Centros de Referência Especializado à População em Situação de Rua (Centro Pop). Esta análise teve a contribuição da teoria da psicodinâmica do trabalho que ajudou a compreender a relação entre trabalho/prazer/sofrimento. Para além disso, buscou-se investigar como pode a Terapia cognitivo comportamental contribuir no processo de regulação emocional adaptativa deste trabalhador. O trabalho fundamenta-se por meio da revisão literária, qualitativa e exploratória. O texto é baseado em uma temática mais aberta e de interpretação textual. Pesquisas feitas em livros, artigos científicos, dissertações, teses e revistas eletrônicas fundamentaram este estudo. Foram selecionados artigos que contribuíram para analisar o assunto, nos quais pode-se verificar a escassez de pesquisas relacionadas à saúde mental dos trabalhadores do SUAS, especialmente, os trabalhadores do Centro Pop. Concluiu-se como relevante, o papel da “regulação emocional adaptativa” para relações de trabalho menos adoecedoras. Além disso, observa-se que a Terapia Cognitivo-Comportamental pode ser tornar eficaz, através do uso de técnicas adequadas, seja na clínica individualmente, ou no ambiente de trabalho, através de técnicas que motivem o trabalhador a transformar a “regulação emocional disfuncional” em “regulação emocional funcional”. PALAVRAS-CHAVE: Centro Pop; População em Situação de Rua; Regulação Emocional; Trabalhadores do SUAS. MENTAL HEALTH OF WORKERS OF REFERENCE CENTERS SPECIALIZED TO POPULATION IN STREET SITUATIONS: PERSPECTIVES THROUGH EMOTIONAL REGULATION ABSTRACT The identification and management of emotions have become relevant to the individual's mental health. The current, globalized and technological world increasingly requires an adaptive Emotional Regulation, especially in the work context, since it can become an aversive and sickening environment. This study aimed to analyze and understand the role of emotional regulation in the work relationships of SUAS workers, especially those who work in the Specialized Reference Centers for the Homeless Population (Centro Pop). This analysis had the contribution of the theory of psychodynamics of work that helped to understand the relationship between work/pleasure/suffering. The work is based on literary, qualitative and exploratory review. The text is based on a more open theme and textual interpretation. Research carried out in books, scientific articles, dissertations, theses and electronic journals supported this study. Articles were selected that contributed to the analysis of the subject, in which one can verify the scarcity of research related to the mental health of SUAS workers, especially workers from the Pop Center. It was concluded as relevant, the role of “adaptive emotional regulation” for less sickening work relationships. In addition, it is observed that Cognitive-Behavioral Therapy can be made effective, through the use of appropriate techniques, either in the clinic individually, or in the work environment, through techniques that motivate the worker to transform the "dysfunctional emotional regulation". in “functional emotional regulation”. KEYWORDS: Pop Center; Homeless Population; Emotional Regulation; Mental health. Sumário ´ 1. INTRODUÇÃO 5 2. TEMAS REVISADOS 6 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS 17 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 18 1. INTRODUÇÃO A identificação das emoções e sua vivência de forma saudável têm se tornado cada vez mais relevantes para a saúde mental do indivíduo, pois assim, o possibilita ter relações interpessoais e profissionais mais saudáveis. O mundo globalizado e tecnológico exige cada vez mais aperfeiçoamento, entrega e pro atividade no ambiente de trabalho (Harvey, 2012). Frente ao exposto, considera-se que o tema escolhido “Regulação emocional em trabalhadores dos Centros de Referência Especializado a População em Situação de Rua” é pertinente, atual e contemporâneo. A discussão do assunto se torna mais uma fonte de informação e ampliação da compreensão do tema e permite auxiliar no fortalecimento e aprimoramento na gestão dos trabalhadores do SUAS e na criação de estratégias de enfrentamento à precarização do trabalho e ao manejo da saúde mental desses trabalhadores. O estudo pretende analisar e compreender a regulação emocional e seus processos; verificar técnicas que podem ser utilizadas para modificar a regulação emocional disfuncional em regulação funcional, desenvolvendo mais processos adaptativos; bem como, identificar emoções funcionais e disfuncionais em termos de respostas da regulação emocional. Como também, pretende contextualizar os temas pertinentes à pesquisa, tais como, População em Situação de Rua, Centro Pop. Para a execução deste estudo utilizou-se o modelo de revisão narrativa da literatura. Para Santos e Noronha (2010) a pesquisa bibliográfica é a análise de obras já publicadas, tendo sua finalidade a articulação e explicitação de um tema específico. Esta análise crítica possibilita estabelecer comparativos entre os diferentes autores pesquisados. O método narrativo mostra-se o mais utilizado para o estudo de publicações amplas, sendo ideal para o raciocínio e articulação teórica e contextual a respeito de uma temática específica (ROTHER, 2013). Foram feitos estudos dos textos em caráter exploratório e qualitativo do material. A seguir, serão apresentadas e discutidas as categorias relacionadas aos aspectos da emoção, regulação emocional, População em situação de rua, Centro Pop, intervenção cognitivo-comportamental; apresentando, ainda, as considerações finais. 2. TEMAS REVISADOS 2.1 População em Situação de Rua O termo População em Situação de Rua é definido como um conjunto de habitantes, que em sua diversidade partilham de características comuns a pobreza extrema, a ausência de moradia tradicional e a fragilização ou rompimento de vínculos familiares. São pessoas que utilizam os espaços públicos e locais em ruínas como ambientes de moradia, seja ela de forma permanente ou temporária (Brasil, 2020). Para Silva (2009) a procura por trabalho se tornou maior que a oferta e mediante a falta de oportunidade e ausência aquisitiva para se obter um local digno para se morar, trabalhadores passaram a viver nas ruas dos grandes centros urbanos. Vários são os fatores que podem levar uma pessoa a viver nas ruas, o uso abusivo de álcool e outras drogas, o desemprego e o rompimento de vínculo familiar são relevantes nesse processo (Brasil, 2009). O número de pessoas que passam a fazer das ruas seu espaço de moradia vem crescendo a cada dia. De acordo com a Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua (PNPSR) realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA,2020), estima-se que no Brasil há cerca de 221 mil pessoas nesta situação. O estudo aponta um crescimento de 140% entre o ano de 2012 a março de 2020, dados extraídos do Cadastro Único do Governo Federal (Cadúnico) e do censo anual do sistema único de Assistência Social (Censo SUAS), que traz informações das secretarias municipais. Estima-se que estenúmero possa ter aumentado de forma significativa devido à pandemia do Coronavírus (IPEA,2020). De acordo com números da pesquisa, o perfil deste público mostra prevalência de homens, com 82% e as mulheres com 18%. Com relação à cor e raça, 67% dessas pessoas são consideradas pretas e pardas. Considera-se que 53% tenham idade entre 25 a 44 anos. A Tabela 1 lista os percentuais relacionados aos principais motivos que levam as pessoas a saírem de suas casas e tomarem as ruas como seu espaço de moradia. Tabela 1 - Perfil da População em Situação de Rua no Brasil Razões para ida às ruas Problemas com álcool e drogas 35,5% Desemprego 29,8% Fragilização e rompimento de vínculo familiar 29,1% Outros motivos 5,6% Fonte: Elaborada pela autora, baseada na PNPSR, IPEA, 2020. Observa-se que o significativo crescimento desta população, no Brasil e no mundo, faz emergir estudos sobre o tema, sobre as formas de manejo e intervenções quanto às necessidades e demandas trazidas por esta população. Em exacerbada vulnerabilidade social, ou seja, sob constante situações de ameaças e violação de direitos (Brasil, 2009), vivenciam em seu dia a dia exclusão social, violências, falsa autonomia e desconhecimento quanto aos seus direitos sociais. A ausência de informação e de compreensão faz com que a sociedade rotule estes indivíduos e mantenha uma cultura julgadora quanto aos motivos de sua ida e permanência nas ruas. Essas pessoas sofrem, diariamente, preconceito e marginalização. Tal situação priva a PSR ao acesso integral à saúde e a garantia dos direitos sociais. O desenvolvimento acelerado desta população ampliou a necessidade da política brasileira em estudar e elaborar planos de acolhimento das suas demandas. Grande avanço com relação à garantia de direitos destas pessoas foi a instituição da Política Nacional para População em Situação de Rua (Brasil,2009). A partir da implantação desta política criou-se o Centro de Referência Especializado no atendimento à População em Situação de Rua, o Centro Pop. No próximo, tópico no intuito de contextualizar historicamente a implantação deste equipamento destinado ao atendimento a PSR, abordaremos a implantação do Sistema Único de Assistência Social e a criação do Centro Pop. 2.2 Centro de referência Especializado a População em Situação de Rua A Assistência Social no Brasil Iniciou-se através promulgação da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) (Lei nº 8724/1993), sendo esta integrada à Seguridade Social. Esta política está embasada no acolhimento de todo o indivíduo que dela precisar, sendo sua garantia um direito de todos e um dever do Estado. A implantação da Política Nacional de Assistência Social (PNAS, 2004) trouxe um novo olhar sobre os direitos sociais e a universalização do atendimento às pessoas em vulnerabilidade social (Brasil, 2004). Ela foi concretizada pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS) através de benefícios, programas e serviços voltados à política pública de assistência social (BRASIL, 2005). O SUAS trouxe nova proposta com relação a forma de fornecer assistência à população em geral, sendo a sua finalidade primordial a promoção e a proteção social dos indivíduos. A ruptura com o modelo assistencialista-clientelista praticado anteriormente, se deu no ensejo de promover uma política pública emancipatória que possibilite o desenvolvimento humano e social do indivíduo. O novo molde permitiu investir de forma sistemática, na instrumentalização das boas práticas de atendimento realizadas pelos órgãos públicos. Os atendimentos são embasados na promoção e na proteção dos direitos garantidos pela Constituição Federal a todas as pessoas e são considerados fatores cruciais no desenvolvimento desta política (BRASIL, 2004). Por meio de serviços, programas, projetos e benefícios, o Sistema Único de Assistência Social está organizado em um nível de complexidade dividido em dimensões de proteção social básica e proteção social especial de média e alta complexidade. A instituição pública correspondente é o Centro de Referência de Assistência Social. (CRAS) e Centro de Assistência Social (CREAS). Até o ano de 2008 não existia um órgão específico no atendimento a PSR e em 2009, com o objetivo de acolher a crescente demanda dessa população, verificou-se a necessidade de implantar a Política Nacional para a População em Situação de Rua, política pública específica na garantia de direitos dessas pessoas (BRASIL, 2009). Assim surgiu o Centro de Referência Especializado a População em Situação de Rua (Centro Pop), equipamento destinado a atender pessoas que fazem das ruas seu espaço de moradia e de sustento, seja de forma temporária ou de forma permanente (Brasil, 2009). O Centro Pop é mantido através de repasses financeiros efetuados pelas três esferas governamentais: União, estado e município (BRASIL, 2011). Sua implantação no território deve estar em acordo com o perfil estabelecido pelas normativas do governo, uma delas é a Portaria MDS nº 381, de 12 de dezembro de 2006, onde consta a necessidade da realização de um diagnóstico socioterritorial que permitirá identificar o melhor local para sua implantação, as demandas, a relevância e a pertinência da implantação do Centro POP no território. O atendimento do Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua é garantido por lei, para além dele, o órgão também poderá ofertar o Serviço Especializado em Abordagem Social, serviço no qual profissionais vão às ruas para uma busca ativa dos usuários, oferta o serviço e coleta as demandas nas ruas. Tal serviço não se faz obrigatório e não deve prejudicar o fluxo de atendimento do equipamento (BRASIL, 2011). Em acordo com Brasil (2011) o serviço deve ofertar ações como promoção de autonomia, resgate de vínculos, resgate da integralidade enquanto cidadão civil, seja na garantia da recuperação da documentação civil, tais como carteira de identidade, cadastro de pessoa física, entre outros. Além disso, realiza atendimento em rede e possibilita articulação com demais políticas públicas e serviços De acordo com as orientações técnicas estabelecidas na tipificação é de suma relevância que a equipe do Centro Pop seja composta por profissionais que estejam em consonância com o perfil e apresentem habilidades para o desenvolvimento do trabalho social com a PSR. Para além, necessita-se de um olhar profissional ético e acolhedor, como também atitudes profissionais que fortaleçam o espaço como ambiente de confiança e de respeito (BRASIL, 2011). A tabela 2 enfatiza a composição da equipe técnica do Centro Pop. Tabela 2- Composição da equipe técnica do Centro Pop Composição da equipe Técnica do Centro Pop Coordenador 1 Assistentes sociais 2 Psicólogos (as) 2 Técnico de nível superior 1 Auxiliares administrativos 2 Fonte: Elaborada pela autora, baseada nas Orientações Técnicas, Brasil 2011. Apesar de todos os esforços para a prestação de serviços e equipamentos de assistência social, o Estado tem atuado junto à “população em situação de rua” no sentido de respeitar as múltiplas identidades e a diversidade humana no trato com “pessoas em situação de rua”. O comportamento da equipa do POP deverá ter em conta a dinâmica de atendimento a diferentes grupos de “pessoas na rua” em termos de acolhimento e atendimento adaptado. Compreende-se que com a implantação da Política Nacional para PSR (2009) observa-se avanço na política e crescimento nos estudos com relação à PSR, todavia, pouca atenção se dá à saúde mental e ao sofrimento psíquico vivenciado pelos trabalhadores do SUAS, mais especificamente os dos Centros Pop. 2.3 Emoções As emoções têm papel importante nos modos de vida da humanidade e são classificadas em emoções primárias e secundárias (Damásio, 1998). Para Damásio (1998) a emoção é um comportamento natural do ser humano, necessário e eficaz ao enfrentamentodas adversidades da vida. Para o autor, há relevância em se compreender e distinguir os conceitos de emoções e de sentimentos. Damásio descreve as emoções como processos extrínsecos ao sujeito, ou seja, sua relação com o ambiente. Os sentimentos são processos intrínsecos, voltados para o interior do sujeito, tais como, a personalidade, os comportamentos, etc. Estes processos influenciam diretamente como duas pessoas podem reagir de maneira diferentes a um mesmo evento estressor ou desagradável, em especial o processo intrínseco. As emoções podem apresentar padrão universal, mesmo expressadas em culturas diferentes. Para Paul Ekman (2011) isso ocorre devido a forma de ser expressada por cada indivíduo, mesmo sendo pertencentes a culturas diferentes, os seres humanos têm algumas emoções com padrão universal. Elas têm características únicas que diferem umas das outras, mas podem ser sentidas e interpretadas em qualquer lugar do mundo, devido à expressão facial. As emoções caracterizadas como universais são: “raiva, tristeza, surpresa, medo, nojo, desprezo e alegria”. Neste sentido, alguns autores enfatizam que alterações fisiológicas como taquicardia, ou seja, aumento dos batimentos cardíacos, sudorese, aumento da pressão arterial podem emergir perante a manifestação de uma emoção (CALLAHAN; McCOLLUM, 2002; GONDIM, 2006, LIMA et al., 2005). Beck (2014) salienta as emoções como forma de enfrentamento a situações e eventos vivenciados em nosso cotidiano. As define como mola propulsora de mudança pessoal, assim como, mecanismo de fuga e esquiva de situações desagradáveis. Para o autor, as emoções estão relacionadas aos pensamentos automáticos, ou seja, pensamentos imediato que interferem na interpretação de eventos, influenciando comportamentos e respostas emocionais. Corroborando com a linha de funcionalidade das emoções, Meller (2016) aponta que as mesmas são estímulos para respostas automáticas, ou seja, disfuncionais, frente a eventos estressores. O autor também acredita que elas têm papel relevante na adaptação social e nas relações intra e interpessoais do indivíduo. Para Elster (2007) o repertório emocional do indivíduo é consequência da avaliação pessoal de normas sociais e morais aprendidas com o processo de socialização e mesmo que seja vivenciada individualmente, não deve ser compreendida de forma individual e subjetiva. As emoções são apresentadas por muitos autores como reações e sensações eficazes para a sobrevivência humana. Corroboram a ideia de que o ambiente e os processos internos influenciam diretamente nas reações emocionais. Além disso, acrescentam que o sujeito experimenta diversas sensações emocionais ao longo da vida. Muitos estudiosos consideram que o alicerce da vida emocional começa na família e ela tem papel fundamental no auxílio à identificação, compreensão e nas formas de enfrentamento das emoções, sendo seu início na infância. É na família que o gerenciamento das emoções é desenvolvido (EKMAN, 2011). As emoções têm um significado relevante nas interações sociais e é por meio delas que a vida tem textura, riqueza, contentamento, sabor e sentido. (LEAHY, THIRCH; NAPOLITANO, 2013). Segundo Niedenthal; Krauth-Gruber; Ric (2006), citado por Zadra; Presciliano (2020) uma interação social satisfatória exige uma regulação adequada das emoções, pois, sua ausência pode desencadear emoções negativas, e como consequência fazer emergir conflitos relacionais e sentimento de insatisfação à outra pessoa. Em suma, são os sentimentos e as emoções que nos conectam a outras pessoas, mas também, apontam nossas necessidades e frustrações. 2.4 Regulação emocional A regulação emocional pode ser considerada o modo com que uma pessoa desenvolve suas estratégias de enfrentamento a fim de lidar com as emoções que lhe causam estresse e desconforto, sem impactar a sua vida social. Trata-se, portanto, de um processo adaptativo, que se inicia na primeira infância, quando a criança consegue perceber, nomear e manejar a natureza das suas emoções. (LEAHY, THIRCH; NAPOLITANO, 2013). A regulação emocional foi desenvolvida pelo ser humano no intuito de ajudá-lo a reconhecer e ao mesmo tempo lidar com as experiências diárias, de modo que, o indivíduo a use para conferir intensidade às emoções. Sendo assim, ela funciona como um termostato homeostático, que controla as emoções indesejadas e atua como modulador que visa equilibrar, ora para mais, ora para menos as situações emocionais (LEAHY et al., 2013). Como técnicas para tal, o controle das emoções requer desenvolver estratégias de enfrentamento que diminuam as sensações físicas desagradáveis diante de situações estressoras. (LISBOA et al., 2002). Gottman e seus colaboradores (1996) citado por Leahy et al. (2013) constataram em seus estudos um procedimento de treinamento das emoções que é capaz de reconhecer até níveis baixos de intensidade emocional, vendo que essas emoções desagradáveis são compreendidas como uma oportunidade de obter apoio. A dificuldade ou inabilidade de identificar, nomear e processar as emoções é definida como desregulação emocional (LEAHY, THIRCH; NAPOLITANO, 2013). De fato, as técnicas de regulação emocional podem ser vistas como uma forma de se desenvolver e potencializar a inteligência emocional do ser. A desregulação emocional ocorre quando as pessoas têm dificuldade em identificar, compreender e expressar como se sentem. Ela pode manifestar na expressão das emoções intensificadas (riso, choro, etc.), o que inclui o aumento da intensidade de uma emoção intrusiva que causa incômodo ao indivíduo. O enfrentamento das emoções é um processo que recebe um status cognitivo, dinâmico e consciente. Ele diz respeito às habilidades sociais emocionais desenvolvidas, que passam pelo reconhecimento das emoções até o melhor modo de lidar com as emoções desagradáveis. Um modo natural e aceitável pela qual os seres humanos reagem a situações aflitivas e difíceis consiste em tentar evitar ou fugir de uma situação problemática. Ocorre quando o indivíduo adota esse comportamento para evitar conflitos e situações estressantes, inesperadas. Em se tratando do controle emocional no ambiente de trabalho, Gross (2013) refere à regulação emocional como um processo consciente ou inconsciente, automático ou controlado de processos neurofisiológicos, cognitivos e comportamentais que visa alterar a experiência emocional através da transformação entre o que se sente, e o que se expressa emocionalmente em diferentes situações vivenciadas. O autor faz menção ao termo "trabalho emocional", que segundo ele é a regulação emocional frente ao ambiente organizacional e trata-se do processo de controle da expressão das emoções e dos sentimentos no intuito de atender às demandas emocionais do profissional e de seu contexto de trabalho. As formas de enfrentamento das emoções podem ser classificadas como positivas ou negativas. Os estilos de enfrentamento variam muito de pessoa para pessoa. Estudos identificam padrões negativos na regulação das emoções intensas. Ou seja, algumas estratégias podem ser escolhidas de maneira errônea, prejudicando a sua saúde emocional, como: a redução imediata de uma emoção desconfortável, como o uso de substância, ou atitudes que estimulam o comportamento compulsivo, como comer. (LEAHY, 2016). A saúde das emoções é tão importante quanto à saúde do corpo. Ela torna o sujeito corajoso, forte e, por conseguinte, feliz; pois proporciona bem-estar e promove o autoconhecimento. A Tabela 2 mostra algumas estratégias de regulação emocionais adaptativas e mal adaptadas. Tabela 3- Estratégias de regulação emocional disfuncional e funcional Emoções Mal adaptativas Adaptativas Esquiva Autocontrole Culpabilização Aceitação Evitação Modificação de esquemas emocionais Preocupação/ruminação Resolução de problemas / Relaxamento Abuso de substância Expressão / Apoio social Fonte: Elaborado pelo autor, baseado em Leahy, Tirch e Napolitano, 2013.Leahy, Tirch e Napolitano (2013) denota quão importante é o papel da família na formação emocional do indivíduo. Consoante a essa ideia, Goleman (2011) aborda que pais e/ou responsáveis que possibilitam a expressão dos sentimentos desde a infância, estimulam o desenvolvimento de aptidões emocionais dos sujeitos ao longo da vida. Para o desenvolvimento de uma educação emocional positiva, Rodrigues (2015) postula que há quatro palavras centrais em torno deste conceito: “perceber, nomear, verbalizar e comportamento”. “Para a autora, “o perceber” diz respeito ao entendimento, de forma crítica, da emoção que há em si e no outro”. Quanto à “nomeação”, se trata do ato de nomear a própria emoção e a emoção do outro. A verbalização se refere a verbalizar adequadamente a própria a emoção e, também, a emoção do outro. No que tange o “comportamento”, ele se refere à capacidade de discernir que o comportamento próprio pode interferir no comportamento do outro. De acordo com Beane (2010), as pessoas são seres sociais que têm uma necessidade de ser parte de um grupo, expressando suas emoções e sentimentos; amando e sendo amadas. Assim, dito de outro modo, a educação emocional significa ter consciência da própria emoção e dispor de recursos para lidar com as emoções inoportunas. 2.4 Contribuições da Terapia Cognitivo Comportamental para regulação emocional em trabalhadores do Centro Pop A teoria cognitiva compreende que o indivíduo se atribui como um ser humano de origem “biopsicossocial”, mas o foco está nos elementos cognitivos para o esclarecimento dos processos envolvidos na psicopatologia e na psicoterapia efetiva (BECK e DOZOIS, 2011). Mediante a posição dos autores, entende-se que a terapia cognitiva se baseia na ideia de que o processamento da informação é essencial para a existência, adaptação e sobrevivência humana. Nesta linha de pensamento, verifica-se que as pessoas não sobreviveriam ao meio ambiente em que vivem se não possuíssem a capacidade de processar e sintetizar informações deste meio. Portanto, o sistema cognitivo, ou processamento da informação, está essencialmente ligado ao domínio emocional e ao repertório comportamental. As questões de saúde mental são questões que envolvem ambos os repertórios, seja ele comportamentais e fisiológicos, visto que a cognição desempenha um papel importante nesse modelo, pois o comportamento humano normal depende teoricamente da capacidade do indivíduo de entender a natureza do ambiente social e físico. Pode envolver inter-relações complexas entre os dois sistemas emocionais diferentes. Os autores, Beck e Dozois (2011) enfatizam que esses repertórios e sistemas funcionam de forma ativa e dependente do sujeito e são ativados por meio de estratégias coordenadas no sentido de alcançar objetivos específicos, tais como, a busca contínua de situação que podem vir a lhe trazer bem-estar, como também, situação que podem lhe causar sofrimento. Em se tratando do contexto aplicado a este trabalho, a “regulação emocional em trabalhadores dos Centros de Referência Especializados a População em situação de Rua”, busca-se a compreensão de como a Terapia Cognitiva Comportamental pode intervir de forma a ajudar esses trabalhadores frente aos repertórios emocionais utilizados no ambiente corporativo. Neste sentido Leahy et al. (2013), propõem a terapia de aceitação e compromisso (ACT) como estratégia da TCC para a regulação emocional, ela que se baseia na teoria comportamental de linguagem e cognição que é conhecida como teoria dos quadros relacionais. Ela fornece uma perspectiva teórica sobre os processos centrais envolvidos na psicopatologia e na desregulação emocional. Com base nessa premissa, as principais causas de problemas relacionados à emoção incluem formas como a natureza do processamento da linguagem humana que ajudam a evitar a experiência. As estratégias da ACT colocam os pacientes em contato direto e experiencial com sua experiência atual, interrompem a fusão cognitiva, facilitam a aceitação da experiência, ajudam os pacientes a se libertarem das crenças que possuem a respeito de si próprios, o que traz nova forma de se ver e valorizar perante si e a perspectiva de futuro. O modelo de abordagem inicia-se a partir do reconhecimento das emoções. Uma vez que o instrumento utilizado permite verificar o fluxo emocional, possibilitando o processo psicoeducativo das emoções com o foco na regulação emocional. O atendimento a pessoas em vulnerabilidade social, especialmente a PSR requer muito dinamismo, para o atividade e criatividade para que o processo terapêutico seja atrativo e eficaz. Desse modo, elas precisam ser treinadas para aprimorar suas habilidades em lidar com suas emoções. No que tange o equilíbrio emocional no trabalho visto a subjetividade, a inteligência prática e a coletividade, a TCC apresenta suas técnicas, tais como, a psicoeducação, o mindfulness, entre outras para ajudar trabalhadores na modulação funcional das emoções em seu ambiente de trabalho. Técnicas que podem ser aplicadas tanto na clínica, como nas organizações, sejam de forma individual em consultório, ou coletiva, nos ambientes de trabalho como os Centros Pop. Dito de outro modo, a TCC auxilia a promover a regulação emocional adaptativa e enfraquecer os repertórios disfuncionais que podem acarretar sofrimento psíquico no trabalho. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo teve o objetivo de investigar o tema “Regulação Emocional em trabalhadores dos Centros de Referência Especializado a População em Situação de Rua. ” Há muitas pesquisas referentes ao público atendido neste equipamento, como também, ao Sistema Único de Saúde (SUAS). Entretanto, nota-se incipiência quanto ao número de pesquisas relacionadas à saúde mental dos trabalhadores do SUAS, em especial, o Centro Pop. Devido à complexidade do tema e a escassez de pesquisas pertinentes ao mesmo, mostra-se relevante a realização de pesquisas qualitativas visto o aumento do número da População de Rua e suas demandas. Como consequência disso, há sobrecarga e precarização no trabalho dos servidores que atuam nesta área, fator predisponente a sofrimento e ausência de saúde mental no trabalho. Os resultados desta investigação apontam que trabalhadores que buscam por treinamento emocional têm mais probabilidade de autorregular suas emoções, promovendo assim, relações profissionais mais saudáveis. Daí a importância da psicoeducação para a identificação das emoções e o treinamento de habilidades sociais, para que este trabalhador possa se expressar de forma funcional e clara frente a situações no ambiente organizacional que lhe cause sofrimento. Durante a pesquisa, observou-se também a eficácia da intervenção em Terapia Cognitivo Comportamental no processo terapêutico destes trabalhadores. Assim como, o manejo de algumas possíveis técnicas que podem ser utilizadas pelo terapeuta no tratamento. Espera-se que este estudo contribua positivamente para as mais variadas nuances do tema, no meio acadêmico como forma de ampliação da compreensão do tema, no contexto de fortalecimento e aprimoramento na gestão dos trabalhadores do SUAS e na criação de estratégias de enfrentamento à precarização do trabalho e ao manejo da saúde mental desses trabalhadores. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática [recurso eletrônico]. Tradução: Sandra Mallmann da Rosa; revisão técnica: Paulo Knapp, Elisabeth Meyer. – 2. Ed. – Porto Alegre: Artmed, 2014. BECK, Aaron T.; DOZOIS, David J.A. Cognitive Therapy: Current Status and Future Directions. Annual Review of Medicine, v. 62, n. 1, p. 397–409, 2011. 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