@import url(https://fonts.googleapis.com/css?family=Source+Sans+Pro:300,400,600,700&display=swap); PRINCÍPIOS DA AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA. HISTÓRICO DA NEUROPSICOLOGIA A neuropsicologia, enquanto uma área do conhecimento, surgiu a partir do interesse em compreender a localização anatômica das funções mentais e suas primeiras evidências enquanto ciência são oriundas de estudos conduzidos com indivíduos acometidos por danos cerebrais.Contudo, desde a Antiguidade, busca-se identificar que parte do corpo humano seria a sede de controle da mente, das emoções e do comportamento. Há evidências de que técnicas de trepanação eram praticadas desde a pré-história e umas das hipóteses, dentre as várias existentes, para explicar esta prática é a de que, na Antiguidade, acreditava-se que ao fazer orifícios no crânio criava-se uma saída para os maus espíritos e assim era possível curar transtornos mentais e dores de cabeça (RODRIGUES; CIASCA, 2010). O papiro egípcio chamado de Papiros de Edwin Smith (1600 a.C.) é considerado o documento mais antigo com relatos da localização das funções mentais, nele constam a descrição de 48 indivíduos com lesões cerebrais (HAMDAN et al., 2011).ILUSTRAÇÃO DE CRÂNIO SUBMETIDO A TREPANAÇÃOO coração também já foi tido como o centro da mente ou da alma humana. Essa ideia ficou conhecida como hipótese cardíaca. Ainda hoje, ouvimos popularmente expressões coerentes com esta ideia, como, por exemplo, quando dizemos "fazer o que o coração manda".No período grego clássico, muitos filósofos buscaram explicar a relação corpo e alma. Platão (428-348 a.C.) explicava que o corpo era a instância material, perene e mutável do homem enquanto a alma era a imaterial, a eterna, imutável. Aristóteles (384-322 a.C.) explicava a atividade mental dividindo-a em diversas capacidades (pensar, julgar, imaginar, etc.), mas todas tinham o coração como sede anatômica (HAMDAN et al., 2011). As ideias baseadas na hipótese cardíaca enfrentaram críticas dos adeptos da chamada hipótese cerebral, que viam o cérebro como o responsável pela atividade mental. O filósofo Alcmaeon de Crotona (500 a.C.) defendia que havia no cérebro uma localização para cada sensação humana. Um dos mais influentes defensores da hipótese cerebral foi o médico grego Hipócrates (460-377 C), \u201co pai da medicina\u201d, defensor da ideia de pensamento e sensações coordenadas pelo cérebro (HAMDAN et al., 2011).A hipótese cardíaca foi definitivamente abandonada a partir das confirmações da hipótese cerebral. Entre essas confirmações encontram-se os achados de Galeno (130-201 a.C.), obtidos a partir da dissecação do cérebro de animais e cadáveres que contribuíram para a teoria ventricular. Segundo esta teoria, os ventrículos cerebrais eram a sede da mente e os resultados de Galeno descreviam com precisão estas estruturas anatômico-fisiológicas. Nesta época, os ventrículos causavam grande interesse entre os anatomistas porque se destacam na aparência gelatinosa que o cérebro não fixado apresentava. Segundo a teoria ventricular, haveria três ventrículos, o primeiro associado às sensações, o segundo associado à razão e ao pensamento e o terceiro seria o responsável pela memória.A Igreja reconhecia a explicação de Galeno de que os fluidos que circulavam nos ventrículos seriam os espíritos e que estes determinavam os comportamentos (COSENZA et al., 2008). Com apoio da Igreja, que tinha forte influência sobre as ideias da época, a teoria ventricular perdurou até boa parte da Idade Média.O filósofo francês René Descartes (1596-1650), baseado nos princípios dodualismo cartesiano, defende, no final do século XVII, a ideia de que a mente e ocorpo seriam entidades separadas e elas interagiam a partir de uma estruturaencontrada no corpo humano, a glândula pineal. Esta glândula era vista como asede do espírito no corpo e por meio dela eram controlados os comportamentos(HAMDAN et al., 2011). A hipótese cerebral tornou-se a ideia predominante e o debate passou a ser quanto à organização e ao funcionamento do órgão de comando. Entre os estudiosos que defenderam a hipótese cerebral estavam os holistas e os localizacionistas, que apesar de concordarem sobre o cérebro como a sede do funcionamento mental discordavam sobre a forma como esse controle era possível.Para os holistas, o cérebro atuaria como um todo comandando as funções mentais e o comportamento; enquanto os localizacionistas acreditavam em um funcionamento fragmentado, de forma que cada uma de suas regiões cerebrais teria uma função específica (COSENZA et al., 2008).Entre os localizacionistas, teve grande influência a frenologia \u2013 teoria de Franz Joseph Gall (1757-1828), difundida por seu aluno Johann Gaspar Spurzheim (1776-1832). Estes estudiosos afirmavam que o cérebro estava organizado em aproximadamente 35 funções específicas (ver Figura 2) e acreditavam ser possível, por meio da análise do crânio, descrever a personalidade de uma pessoa. Esta técnica foi chamada de personologia anatômica. Segundo Consenza et al. (2008), os pressupostos básicos da frenologia podem ser resumidos da seguinte forma:cada região cerebral pode ser entendida m m \u201có g \u201d q m determinada atividade mental ou comportamental específica;uma região cerebral bem desenvolvida pode crescer em volume e resultar em um crescimento visível no crânio.a superfície craniana poderia ser moldada a partir do desenvolvimento de cada região cerebral; A frenologia foi criticada pela comunidade científica porque seus pressupostos não foram comprovados. Um grande opositor de Gall foi Flourens (1794-1867), um fisiologista que estudava o cérebro de animais e percebeu que alguns comprometimentos em determinadas regiões cerebrais não resultavam em danos permanentes. Em seu estudo com pássaros observou que, independente do local lesionado, o animal poderia restabelecer o padrão de funcionamento, pois não era a região lesionada e sim a extensão da lesão que dificultava a recuperação. Suas conclusões o fizeram defender as ideias de que qualquer região cerebral poderia assumir as funções de outra área em caso de lesão e que, portanto, o cérebro funcionaria como um todo no qual todas as partes estariam envolvidas em todos os comportamentos (GAZZANIGA et al., 2006). Outro opositor das ideias localizacionistas e defensor das propostas de Flourens foi Karl Lashley (1890-1958), que apresentou os princípios da "ação de massa" em referência a ideia de que seria a quantidade de material lesionado que determinaria os prejuízos funcionais e comportamentais e o principios da "equipotencialidade" em referência a possibilidade de diferentes regiões cerebrais poderem exercer a mesma função.Lashey fez experimentos com ratos em labirintos e mostrou que os animais conseguiam executar a tarefa de encontrar a saída mesmo após lesão em determinadas áreas cerebrais. Sua conclusão sobre estes resultados era que para aprender a se locomover o animal utilizava funções visuais e proprioceptivas, então a lesão em somente uma destas áreas era compensada com uso da área preservada. Mesmo diante do fracasso das ideias de Gall e de descobertas como a de Floures, o debate entre holistas e localizacionistas permanecia a favor do segundo grupo uma vez que novas e importantes descobertas foram feitas no sentido de se identificar áreas especializadas do cérebro. Assim, por longo período os neurocientistas estudaram o cérebro no intuito de descobrir novas regiões do cérebro responsáveis por uma função mental ou comportamentos específicos. Entre as principais contribuições para as ideias localizacionistas estão as descobertas sobre as regiões cerebrais relacionadas à linguagem. Paul Broca (1824-1880) apresentou a descrição de pacientes acometidos por lesões nos lobos frontais do hemisfério cerebral esquerdo, que apresentavam comprometimento na produção da fala e preservação da compreensão da linguagem. Essa síndrome foi chamada de afasia de Broca e a área da lesão, conhecida atualmente como a área de Broca, passou a ser considerada como o "centro funcional da linguagem".ILUSTRAÇÃO DO MAPA FRENOLÓGICO DE GALL NA CAPA DA REVISTA AMERICAN PHRENOLOGICAL JOURNAL Posteriormente, o neurologista Carl Wernicke (1848-1904) descreveu pacientes que também apresentavam comprometimento de suas habilidades linguísticas, contudo apresentavam um tipo de lesão diferente daquela descrita por Broca. Nos pacientes de Wernicke a lesão ocorria no córtex temporal do hemisfério cerebral esquerdo e a principal dificuldade era na compreensão da linguagem. Esse tipo de comprometimento ficou conhecido como afasia de Wernicke. Outra contribuição de Wernicke é a ideia de que lesões nasconexões entre estas regiões cerebrais também levaria ao comprometimento da linguagem. A chamada afasia de condução foi outro distúrbio da linguagem explicado por este estudioso. Nesta síndrome as lesões ocorrem no fascículo arqueado, região responsável pela conexão entre as áreas de Broca e de Wernicke.
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