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Aula - Desdobramentos da boa-fe objetiva

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31/08/2021
1
Por princípio, entendam-se os ditames
superiores, fundantes e simultaneamente
informadores do conjunto de regras do Direito
Positivo.
Pairam, pois, por sobre toda a legislação,
dando-lhe significado legitimador e validade
jurídica.
A respeito deles, discorre o jusfilósofo WILLIS
SANTIAGO GUERRA FILHO:
“Princípios, por sua vez, encontram-se em um
nível superior de abstração, sendo igual e
hierarquicamente superiores, dentro da
compreensão do ordenamento jurídico como
uma ‘pirâmide normativa’ (Stufenbau), e se
eles não permitem uma subsunção direta de
fatos, isso se dá indiretamente, colocando
regras sob o seu ‘raio de abrangência’
31/08/2021
2
E essa alteração no trato ideológico do Direito
Civil fora muito bem sentida por LUIZ EDSON
FACHIN:
“Da eliminação e das fronteiras arquitetadas
pelo sistema privado clássico abre-se o Direito
Civil contemporâneo.
Do estágio de direitos absolutos, individualistas
e perpétuos, migra para a sua conformação
contemporânea, o modelo de família num
reconhecimento plural de entidades familiares,
do contrato e da propriedade funcionalizados,
mudanças que repercutem nos direitos e
deveres que os diversos sujeitos apresentam”
Temos, portanto:
a) o princípio da autonomia da vontade ou do
consensualismo;
b) o princípio da força obrigatória do contrato;
c) o princípio da relatividade subjetiva dos
efeitos do contrato;
d) o princípio da função social do contrato;
e) o princípio da boa-fé objetiva;
f) o princípio da equivalência material.
31/08/2021
3
Princípio da autonomia da vontade ou do
consensualismo
Não se pode falar em contrato sem autonomia da
vontade.
E, por isso, o princípio da autonomia da vontade
(ou do consensualismo) deve ser sempre visto
como o primeiro princípio contratual específico.
Mesmo em um sistema como o nosso, que toma
por princípio maior a função social do contrato,
este não poderá, obviamente, ser distendido a
ponto de neutralizar a livre-iniciativa das partes,
consoante bem advertiu o insuperável
Professor ARRUDA ALVIM:
“Parece, portanto, que a função social vem
fundamentalmente consagrada na lei, nesses
preceitos e em outros, mas não é, nem pode
ser entendida como destrutiva da figura do
contrato, dado que, então, aquilo que seria um
valor, um objetivo de grande significação
(função social), destruiria o próprio instituto do
contrato”
31/08/2021
4
Essa liberdade de contratar, por sua vez,
manifesta-se no plano pessoal, ou seja, na
liberdade de escolher a pessoa com a qual
contratar.
Nota-se, com isso, que, com o advento do
liberalismo, mormente após a propagação das
ideias iluministas, esse importante princípio ganhou
ainda mais visibilidade.
A autonomia da vontade, nessa linha, vista no
plano da bilateralidade do contrato, pode ser
expressa pelo denominado consensualismo270: o
encontro das vontades livres e contrapostas faz
surgir o consentimento, pedra fundamental do
negócio jurídico contratual.
Nota-se, por conseguinte, de todo o exposto,
que a autonomia da vontade e o
consensualismo permanecem como base da
noção de contrato, embora limitados e
condicionados por normas de ordem pública
em benefício do bem-estar comum.
31/08/2021
5
Princípio da força obrigatória do contrato
O princípio da força obrigatória, denominado
classicamente pacta sunt servanda, traduz a natural
cogência que deve emanar do contrato, a fim de que
se lhe possa reconhecer utilidade econômica e social.
De nada valeria o negócio, se o acordo firmado entre
os contraentes não tivesse força obrigatória.
Seria mero protocolo de intenções, sem validade
jurídica.
Segundo ORLANDO GOM ES , “o princípio da força
obrigatória consubstancia-se na regra de que o
contrato é lei entre as partes. Celebrado que seja,
com a observância de todos os pressupostos e
requisitos necessários à sua validade, deve ser
executado pelas partes como se suas cláusulas fossem
preceitos legais imperativos”.
E arremata o ilustre civilista baiano: “Essa força
obrigatória, atribuída pela lei aos contratos, é a
pedra angular da segurança do comércio
jurídico”275.
Nessa linha, uma vez configurados os
pressupostos da teoria, a parte lesada poderá
ingressar em juízo pleiteando a revisão ou a
resolução do contrato.
Com isso, podemos facilmente perceber como
o pacta sunt servanda, nos dias que correm,
tornou-se visivelmente menos rígido, da mesma
forma como vislumbramos no princípio da
autonomia da vontade ou do consensualismo.
31/08/2021
6
Princípio da relatividade subjetiva dos efeitos
do contrato
Regra geral, os contratos só geram efeitos entre
as próprias partes contratantes, razão por que
se pode afirmar que a sua oponibilidade não é
absoluta ou erga omnes, mas, tão somente,
relativa.
Como negócio jurídico, em que há a
manifestação espontânea da vontade para
assumir livremente obrigações, as disposições
do contrato, a priori, somente interessam às
partes, não dizendo respeito a terceiros
estranhos à relação jurídica obrigacional.
Assim, o contrato celebrado entre Caio e Tício
não pode, em princípio, afetar Florisvaldo.
Todavia, existem figuras jurídicas que podem
excepcionar esta regra.
É o caso, por exemplo, da estipulação em
favor de terceiro e do contrato com pessoa a
declarar.
31/08/2021
7
Como visto, tudo aquilo que, outrora, era tido
como princípio do Direito Privado, referente a
contratos, tem se flexibilizado em função de
outros interesses, não necessariamente
limitados às partes contratantes, o que nos
parece uma consequência evidente do
macroprincípio constitucional da dignidade da
pessoa humana, bem como daquilo que
PAULO LUIZ NETTO LÔBO chama de “princípios
sociais dos contratos”277.
Feitas tais considerações, passaremos a
estudar justamente tais princípios sociais, a
saber, os princípios da função social do
contrato, da equivalência material e da boa-fé
objetiva.
31/08/2021
8
Princípio da função social do contrato
A socialização do contrato não é ideia nova.
A partir do momento em que o Estado passou a
adotar uma postura mais intervencionista,
abandonando o ultrapassado papel de mero
espectador da ambiência econômica, a
função social do contrato ganhou contornos
mais específicos.
O contrato é figura que acompanha as
mudanças de matizes da propriedade,
experimentando inegável interferência deste
direito.
HUM BERTO THEODORO JR., citando o professor
curitibano PAULO NALIN, na busca por delimitar
as suas bases de intelecção, lembra-nos, com
acerto, que a função social manifestar-se-ia
em dois níveis:
a) intrínseco — o contrato visto como relação
jurídica entre as partes negociais, impondo-se o
respeito à lealdade negocial e à boa-fé
objetiva, buscando-se uma equivalência
material entre os contratantes;
b) extrínseco — o contrato em face da
coletividade, ou seja, visto sob o aspecto de
seu impacto eficacial na sociedade em que
fora celebrado.
31/08/2021
9
E nessa perspectiva temos que a relação
contratual deverá compreender os deveres
jurídicos gerais e de cunho patrimonial (de dar,
fazer, ou não fazer), bem como deverão ser
levados em conta os deveres anexos ou
colaterais que derivam desse esforço
socializante.
Com isso, obrigações até então esquecidas
pelo individualismo cego da concepção
clássica de contrato ressurgem gloriosamente,
a exemplo dos deveres de informação,
confidencialidade, assistência, lealdade etc. E
todo esse sistema é, sem sombra de dúvida,
informado pelo princípio maior de proteção da
dignidade da pessoa humana.
Para nós, a função social do contrato é, antes
de tudo, um princípio jurídico de conteúdo
indeterminado, que se compreende na medida
em que lhe reconhecemos o precípuo efeito
de impor limites à liberdade de contratar, em
prol do bem comum.
31/08/2021
10
Princípio da equivalência material
Desenvolvido por PAULO LUIZ NETTO LÔBO,
“o princípio da equivalência material busca
realizar e preservar o equilíbrio real de direitos
e deveres no contrato, antes, durante e após
sua execução, para harmonização dos
interesses. Esse princípio preserva a equação e
o justo equilíbrio contratual,seja para manter a
proporcionalidade inicial dos direitos e
obrigações, seja para corrigir os desequilíbrios
supervenientes, pouco importando que as
mudanças de circunstâncias pudessem ser
previsíveis.”
Entretanto, diferentemente do mencionado autor,
preferimos, por razões didáticas e metodológicas,
tratar desse princípio como um subproduto
normativo do princípio maior, senão axial, da
função social do contrato, haja vista que, sem
dúvida, no campo de abrangência deste último,
encontra-se subsumido. (Pablo Stolze)
De fato, somente se poderá atingir o tão almejado
solidarismo social, em fina sintonia com a
proteção da dignidade da pessoa humana, se o
contrato buscar, de fato, o equilíbrio entre as
prestações das partes pactuantes, evitando-se,
assim, o abuso do poder econômico e a tirania —
já anacrônica — do vetusto pacta sunt servanda.
31/08/2021
11
Princípio da boa-fé
Podemos observar que a boa-fé é, antes de tudo, uma
diretriz principiológica de fundo ético e espectro
eficacial jurídico. Vale dizer, a boa-fé se traduz em um
princípio de substrato moral, que ganhou contornos e
matiz de natureza jurídica cogente.
Contextualizando esse importante princípio em nossa
ordem constitucional, PAULO ROBERTO NALIN
pondera:
“... tendo o homem como centro necessário das
atenções, oportuno de indagar da possibilidade de
localização da boa-fé enquanto princípio geral do
Direito, no sistema constitucional, assim como os
demais princípios então ditos fundamentais inclusos na
Carta, como o da dignidade do ser humano, a vida, a
integridade física, a liberdade, a propriedade privada,
a livre manifestação do pensamento, a intimidade e
vida privada etc.”296.
Delimitação conceitual
Antes de aprofundarmos os contornos deste
importantíssimo princípio, faz-se necessário que
estabeleçamos uma diagnose diferencial entre a
boa-fé objetiva e a boa-fé subjetiva.
Esta última consiste em uma situação psicológica,
um estado de ânimo ou de espírito do agente que
realiza determinado ato ou vivencia dada
situação, sem ter ciência do vício que a inquina.
Distingue-se, portanto, da boa-fé objetiva, a qual,
tendo natureza de princípio jurídico — delineado
em um conceito jurídico indeterminado —,
consiste em uma verdadeira regra de
comportamento, de fundo ético e exigibilidade
jurídica.
31/08/2021
12
BRUNO LEWICKI pontifica que a concepção de
boa-fé (subjetiva),
“ligada ao voluntarismo e ao individualismo que
informam o nosso Código Civil, é insuficiente
perante as novas exigências criadas pela
sociedade moderna. Para além de uma análise
de uma possível má-fé subjetiva no agir,
investigação eivada de dificuldades e incertezas,
faz-se necessária a consideração de um patamar
geral de atuação, atribuível ao homem médio,
que pode ser resumido no seguinte
questionamento: de que maneira agiria o bonus
pater familiae, ao deparar-se com a situação em
apreço? Quais seriam as suas expectativas e as
suas atitudes, tendo em vista a valoração jurídica,
histórica e cultural do seu tempo e de sua
comunidade?”297.
A resposta a estas últimas indagações,
portanto, encontra-se na definição da boa-fé
objetiva, que, conforme já vimos, consiste em
um princípio vinculado a uma imprescindível
regra de comportamento, umbilicalmente
ligada à eticidade que se espera seja
observada em nossa ordem social.
Ladeando, pois, esse dever jurídico principal, a
boa-fé objetiva impõe também a observância
de deveres jurídicos anexos ou de proteção,
não menos relevantes, a exemplo dos deveres
de lealdade e confiança, assistência,
confidencialidade ou sigilo, informação etc.
31/08/2021
13
Tais deveres — é importante registrar — são
impostos tanto ao sujeito ativo quanto ao
sujeito passivo da relação jurídica
obrigacional, pois referem-se, em verdade, à
exata satisfação dos interesses envolvidos na
obrigação assumida, por força da boa-fé
contratual.
31/08/2021
14
Faz-se necessário que estabeleçamos uma
diagnose diferencial entre a boa-fé objetiva e a
boa-fé subjetiva.
Esta última consiste em uma situação psicológica,
um estado de ânimo ou de espírito do agente que
realiza determinado ato ou vivencia dada
situação, sem ter ciência do vício que a inquina.
Em geral, esse estado subjetivo deriva do
reconhecimento da ignorância do agente a
respeito de determinada circunstância, como
ocorre na hipótese do possuidor de boa-fé que
desconhece o vício que macula a sua posse.
Nesse caso, o próprio legislador, em vários
dispositivos, cuida de ampará-lo, não fazendo o
mesmo, outrossim, quanto ao possuidor de má-fé
(arts. 1.214, 1.216, 1.217, 1.218, 1.219, 1.220, 1.242,
do CC/2002).
Distingue-se, portanto, da boa-fé objetiva, a
qual, tendo natureza de princípio jurídico —
delineado em um conceito jurídico
indeterminado —, consiste em uma verdadeira
regra de comportamento, de fundo ético e
exigibilidade jurídica.
31/08/2021
15
E mais adiante complementa:
“O Direito obriga, então, a que, nessas
circunstâncias, as pessoas não se desviem dos
propósitos que, em ponderação social,
emerjam da situação em que se achem
colocadas: não devem assumir
comportamentos que a contradigam —
deveres de lealdade — nem calar ou falsear a
actividade intelectual externa que informa a
convivência humana — deveres de
informação. Embora as estrutura e teleologia
básicas sejam as mesmas, adivinha-se a
presença de concretizações diversas,
consoante os fatos que lhes deem origem”299.
31/08/2021
16
Compreendida a noção da boa-fé objetiva
em matéria contratual, a sua aplicação
pragmática gera importantes efeitos, nos mais
diferentes campos.
Tais repercussões práticas podem ser
sistematizadas em algumas locuções de uso
corrente no dia a dia das lides forenses,
consistentes em figuras parcelares, expressão
que deve ser entendida como argumentações
usuais para decisões com fundamentação
tópica.
Como bem observa LUCIANO DE CAMARGO
PENTEADO:
“A boa-fé, segundo a insuperável classificação feita por
Menezes Cordeiro ao tratar do exercício inadmissível das
posições jurídicas, apresentaria oito figuras parcelares, ou
seja, tipos de argumentos recorrentes com vistas a sua
aplicação tópica. Entre eles estariam o venire contra factum
proprium, o tu quoque, a exceptio doli, desdobrada em
exceptio doli generalis e exceptio doli specialis, a
inalegabilidade das nulidades formais, o desequilíbrio no
exercício jurídico, a supressio e a surrectio. Sendo figuras
parcelares de uma cláusula geral e não noções próprias de
uma definição conceitual, é preciso desde já salientar que,
em sua aplicação, não é necessário que todos os
pressupostos estejam presentes, havendo a possibilidade de
se julgar, não em termos de tudo ou nada, mas em termos de
um mais e de um menos. Do mesmo modo, determinada
situação jurídica pode ser reconduzida a mais de uma das
figuras parcelares da boa-fé, porque estas gozam de certa
plasticidade. Todas, entretanto, resultam da incidência do CC
422, em matéria de contratos e de direito das obrigações. São
tipos em torno dos quais é possível agrupar os casos que
tratem do tema da boa-fé objetiva. Como tipos, permitem
esta qualificação móvel”
31/08/2021
17
Tais figuras parcelares, também chamadas de
“função reativa” ou de subprincípios da boa-
fé objetiva, consistem em verdadeiros
desdobramentos da boa-fé objetiva, de
relevantíssima utilização, independentemente
da denominação utilizada.
Assim, ousando ressistematizar, para meros
efeitos didáticos no nosso sistema normativo, a
classificação do grande professor português,
apresentamos, a seguir, aqueles que
consideramos os principais efeitos do
desdobramento do princípio da boa-fé
objetiva311.
Venire contra factum proprium
A primeira repercussão pragmática da aplicação
do princípio da boa-fé objetiva reside na
consagração da vedação do comportamento
contraditório.
Na tradução literal, venire contra factum proprium
significa vir contra um fato próprio. Ou seja, não é
razoável admitir-se que uma pessoa pratique
determinado ato ou conjunto de atos e, em
seguida, realize conduta diametralmente oposta.
Parte-se da premissade que os contratantes, por
consequência lógica da confiança depositada,
devem agir de forma coerente, segundo a
expectativa gerada por seus comportamentos.
31/08/2021
18
Bom exemplo deriva do art. 330 do Código
Civil, em que o credor, que aceitou, durante a
execução de pacto de trato sucessivo, o
pagamento em lugar diverso do
convencionado, não pode surpreender o
devedor com a exigência literal do contrato,
para alegar descumprimento. A ideia, inclusive,
pode ser desdobrada para o tempo do
cumprimento do contrato, em que a tolerância
habitual de determinado atraso, sem oposição,
impede a cobrança de sanção pela mora do
período.
Supressio
A expressão supressio também é um importante
desdobramento da boa-fé objetiva.
Decorrente da expressão alemã Verwirkung312,
consiste na perda (supressão) de um direito pela
falta de seu exercício por razoável lapso temporal.
Trata-se de instituto distinto da prescrição, que se
refere à perda da própria pretensão. Na figura da
supressio, o que há é, metaforicamente, um
“silêncio ensurdecedor”, ou seja, um
comportamento omissivo tal, para o exercício de
um direito, que o movimentar-se posterior soa
incompatível com as legítimas expectativas até
então geradas.
31/08/2021
19
Assim, na tutela da confiança, um direito não
exercido durante determinado período, por
conta desta inatividade, perderia sua eficácia,
não podendo mais ser exercitado. Nessa linha,
à luz do princípio da boa-fé, o comportamento
de um dos sujeitos geraria no outro a
convicção de que o direito não seria mais
exigido.
O exemplo tradicional de supressio é o uso de
área comum por condômino em regime de
exclusividade por período de tempo
considerável, que implica a supressão da
pretensão de cobrança de aluguel pelo
período de uso.
Embora evidentemente próximo, há diferença da
supressio para a prescrição, pois, enquanto esta
subordina a pretensão apenas pela fluência do
prazo, aquela depende da constatação de que o
comportamento da parte não era mais aceitável,
segundo o princípio da boa-fé.
Da mesma forma, há evidente proximidade da
supressio e do venire contra factum proprium, não
sendo desarrazoado vislumbrá-los em uma relação
de gênero (venire) e espécie (supressio). Todavia,
vale destacar que a supressio se refere
exclusivamente a um comportamento omissivo, ou
seja, à não atuação da parte gerando a
ineficácia do direito correspondente.
31/08/2021
20
Surrectio
Costumamos afirmar, em sala de aula, que a surrectio
é o outro lado da moeda da supressio.
Com efeito, se, na figura da supressio, vislumbra-se a
perda de um direito pela sua não atuação evidente, o
instituto da surrectio se configura no surgimento de um
direito exigível, como decorrência lógica do
comportamento de uma das partes.
O art. 330 do CC/2002 pode ser considerado um
didático exemplo. De fato, se o credor aceitou,
durante a execução do contrato, que o pagamento
se desse em lugar diverso do convencionado, há tanto
uma supressio do direito do credor de exigir o
cumprimento do contrato quanto uma surrectio do
devedor de exigir que o contrato seja, agora,
cumprido no novo lugar tolerado.
� Tu quoque
� Tu quoque, Brutus, fili mi! 
� A célebre frase, historicamente atribuída a 
Júlio César, pela constatação da traição de 
seu filho Brutus, dá nome também a um dos 
mais comuns desdobramentos do princípio 
da boa-fé objetiva.
� A aplicação do tu quoque se constata em 
situações em que se verifica um 
comportamento que, rompendo com o valor 
da confiança, surpreende uma das partes da 
relação negocial, colocando-a em situação 
de injusta desvantagem.
31/08/2021
21
Um bom exemplo é a previsão do art. 180 do
CC/2002, que estabelece que o “menor, entre
dezesseis e dezoito anos, não pode, para
eximir-se de uma obrigação, invocar a sua
idade se dolosamente a ocultou quando
inquirido pela outra parte, ou se, no ato de
obrigar-se, declarou-se maior”.
Outro bom exemplo desse desdobramento do
princípio da boa-fé objetiva reside no instituto
do exceptio non adimpleti contractus. S e a
parte não executou a sua prestação no
contrato sinalagmático, não poderá exigir da
outra parte a contraprestação.
Exceptio doli
A “exceção dolosa”, conhecida como
exceptio doli, consiste em um desdobramento
da boa-fé objetiva, que visa a sancionar
condutas em que o exercício do direito tenha
sido realizado com o intuito, não de preservar
legítimos interesses, mas, sim, de prejudicar a
parte contrária.
Uma aplicação deste desdobramento é o
brocardo agit qui petit quod statim redditurus
est, em que se verifica uma sanção à parte
que age com o interesse de molestar a parte
contrária e, portanto, pleiteando aquilo que
deve ser restituído.
31/08/2021
22
É o exemplo, no direito positivo brasileiro, do art.
940 do CC/2002, que preceitua que aquele
“que demandar por dívida já paga, no todo ou
em parte, sem ressalvar as quantias recebidas
ou pedir mais do que for devido, ficará
obrigado a pagar ao devedor, no primeiro
caso, o dobro do que houver cobrado e, no
segundo, o equivalente do que dele exigir,
salvo se houver prescrição”.
Outro exemplo de aplicação é a figura do
assédio processual, consistente na utilização
dos instrumentos processuais para
simplesmente não cumprir a determinação
judicial.
Trata-se, nas palavras da magistrada M YLENE
PEREIRA RAM OS , de situação processual de
“procrastinação por uma das partes no
andamento de processo, em qualquer uma de
suas fases, negando-se a cumprir decisões
judiciais, amparando-se ou não em norma
processual, para interpor recursos, agravos,
embargos, requerimentos de provas, petições
despropositadas, procedendo de modo temerário
e provocando incidentes manifestamente
infundados, tudo objetivando obstaculizar a
entrega da prestação jurisdicional à parte
contrária” (63ª Vara do Trabalho de S ão Paulo,
Processo 02784200406302004).
Vale registrar, ainda, que a doutrina esmiúça a
exceptio doli em exceptio doli generalis e exceptio
doli specialis.
31/08/2021
23
Nesse ponto, observa LUCIANO DE CAMARGO
PENTEADO:
“ A exceptio doli specialis nada mais seria do que
uma particularização da exceptio doli generalis
referida a atos de caráter negocial e a atos dele
decorrentes, quando o primeiro houvesse sido
obtido com dolo.
Assim, a generalis, como o próprio nome diz, é
gênero e a outra espécie. A diferença específica
encontra-se nos casos em que a fonte da que
dimana o possível direito é um negócio jurídico e
não qualquer outra fonte. O caráter
excessivamente geral das duas figuras acaba por
tornar sua aplicação perigosa em termos de
segurança jurídica, valor que parece preservado
pelas figuras anteriormente consideradas, na
medida em que tem pressupostos concretos de
verificação”313.
Inalegabilidade das nulidades formais
A inalegabilidade das nulidades formais é a
aplicação da regra de que ninguém se deve valer
da própria torpeza, como desdobramento do
princípio da boa-fé objetiva.
Consiste também em uma aplicação específica
do venire contra factum proprium, vedando o
comportamento contraditório em matéria de
nulidade.
Trata-se de um princípio amplamente abarcado
na legislação brasileira, notadamente no campo
processual, valendo lembrar, por exemplo, as
regras do art. 276 do CPC-2015314 e do art. 796, b,
da Consolidação das Leis do Trabalho315.
31/08/2021
24
Desequilíbrio no exercício jurídico
A menção ao desequilíbrio no exercício jurídico
é nada mais, nada menos, do que o
reconhecimento da função delimitadora do
exercício de direitos subjetivos, exercida pela
boa-fé objetiva.
Com efeito, o exercício desproporcional e, por
isso, abusivo de direitos caracteriza um ato
ilícito que não pode ser tolerado pelo
ordenamento jurídico.
Cláusula de Stoppel
Finalmente, como último desdobramento do
princípio da boa-fé objetiva, vale registrar a figura
conhecida como “Cláusula de Stoppel” ou
“Cláusula de Estoppel”316.
Trata-se de uma expressão típica do direito
internacional, em que se busca preservar a boa-fé
e, com isso, a segurança das relações jurídicas
neste importante campo.
Consiste,em síntese, na vedação do
comportamento contraditório no plano do Direito
Internacional.
Na observação de Rodrigo Murad do Prado:
31/08/2021
25
“No caso das Atividades Militares na Nicarágua o
stoppel foi arguido pelos Estados Unidos, tendo a
Corte rejeitado este argumento, lembrando que
não basta que um Estado tenha aceitado de uma
maneira clara e constante um regime jurídico ou
um princípio, tornando-se ainda mais necessário
que o seu comportamento tenha levado a um
outro ou outros Estados, fundamentados nesta
atitude, a modificar a sua posição em seu prejuízo
ou a sofrer um prejuízo”317.
Configura-se, portanto, como uma aplicação
pragmática da boa-fé objetiva em relações
internacionais, desde que a situação de prejuízo
por quebra da confiança seja, como visto, de
possível constatação.

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