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RESENHA Obra: CARDOSO, Ciro Flamarion S. A Crise do Colonialismo Luso na América Portuguesa (1750/1822). In: LINHARES, Maria Yedda (Org.) História Geral do Brasil Historicamente as colônias tinham por função reforçar a economia dos colonizadores, sendo subordinadas por completo aos seus interesses e necessidades, ou seja, à colônia caberia a produção de excedentes que pudessem ser comercializados pelas metrópoles e absorver as manufaturas produzidas por elas, fortalecendo política e economicamente o absolutismo. A acumulação de capital pelo comércio sustentou o processo industrial e o fortalecimento do capitalismo na Europa. Os Estados absolutistas e suas burguesias mercantis transferiram a responsabilidade da colonização e da produção de víveres tropicais, como o açúcar, para os produtores coloniais, ocupando-se tão somente da comercialização do produto. Apesar da política monopolista dos europeus e da exploração colonial houve desenvolvimento das colônias, pois existia uma certa conformidade entre os interesses das elites coloniais e das burguesias da metrópole. O progresso das colônias, porém, aprofundava as medidas restritivas no comércio e a exploração pelas metrópoles, o que tornou o pacto colonial insustentável para as coloniais. Mesmo seguindo os padrões do restante da Europa, Portugal mostrou algumas distinções nos séculos XVII e XVIII. Com a União Ibérica (1580-1640), a luta para expulsar os holandeses do território colonial e a queda da produção açucareira, Portugal afundou em uma grave crise econômico-financeira. Exemplo disso foi o Tratado de Methuen, acordo comercial entre Portugal e Inglaterra o qual definia que os ingleses poderiam comercializar seus tecidos isentos de impostos alfandegários em Portugal, enquanto o país luso venderia seus vinhos nas mesmas condições, o que ressaltou a dependência econômica do antes poderoso país ibérico com o capital inglês, devido ao déficit gerado na balança comercial. Para quitar a dívida, Portugal destinou a maior parte do ouro extraído no Brasil para os ingleses durante o século XVIII, ajudando no financiamento da Revolução Industrial inglesa na época. As medidas implementadas pelo Marquês de Pombal não surtiram o efeito desejado piorando o panorama econômico e político, pois exaltou os ânimos coloniais em virtude do crescimento da arrecadação de impostos, fazendo brotar movimentos constantes de emancipação indicando uma tendência irreversível para a independência. Mesmo com a saída de Pombal, revoltas de cunho emancipatório continuaram a acontecer em diferentes regiões. Aliadas a esse clima instável, acontecimentos como o Terremoto de Lisboa, em 1755, a decadência do comércio açucareiro, o declínio da produção de ouro, as crises sociais resultantes de políticas administrativas efetivadas no Estado do Grão-Pará e Maranhão, que expulsaram jesuítas e a experiência do uso do trabalho indígena na produção agrícola em larga escala, contribuíram para o acirramento do clima. Não se conhecia, até o século XIX, uma ideia conjunta de Brasil, pois as províncias refletiam de maneira regional em relação à independência, além do termo “independência” possuir significados diferentes para setores da elite colonial que se considerava portuguesa e não brasileira. No ano de 1789, em Minas Gerais, uma crise econômica causada pelo ouro escasso, aumentou a pressão por parte dos portugueses pela exigência do Quinto (imposto de 20% cobrado sobre o metal extraído) mediante o cumprimento da Derrama (cobrança obrigatória do imposto atrasado), invadindo cidades e propriedades na busca de alcançar o valor do Quinto. Nessa conjuntura surgiu a fracassada Conjuração Mineira, evento organizado pela elite local com o intuito de tomar o poder e formar uma república. No mesmo ano, a Conjuração Baiana, surgida nas elites, alcançou projeção social com a entrada de membros do povo, como mulatos, escravos forros, brancos pobres, e soldados que também defendiam a proclamação de uma república na Bahia, a abolição da escravidão e das discriminações com base na cor da pele. A vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil, em 1808, precipitou mudanças no processo de independência econômica das colônias de Portugal. A Abertura dos Portos terminou com o exclusivo colonial, aceitando que nações amigas da coroa, Inglaterra naquele instante, mantivessem laços de comércio com o Brasil e o Estado do Grão-Pará e Maranhão. Questões como o estabelecimento de manufaturas, a criação do Banco do Brasil e a invasão da Guiana Francesa, em 1808, a elevação do Brasil a Reino Unido a Portugal e Algarves, em 1815, a Insurreição Pernambucana, 1817, e a tomada da parte oriental do Uruguai, 1816-1820, transformaram o lugar das colônias portuguesas no âmbito do continente. Por fim, a Revolução do Porto, 1820, resultante de uma crise política em Portugal, contribuiu para enfraquecer o relacionamento com o Brasil e a posterior Proclamação de fato da Independência, em 1822, configurando a crise do colonialismo luso na América como um evento de longa duração. Após a somatória de acontecimentos, o processo de independência do Brasil tornou-se inevitável, porém ocorreu apenas com o retorno de Dom João VI a Portugal, pois as elites da Colônia temiam a perda dos privilégios alcançados com a condição de Reino Unido a Portugal e Algarves. Já os portugueses em Portugal também ambicionavam a manutenção dos privilégios trazidos por um governo mais liberal, subordinado a uma Constituição, o que colocava o rei em posição delicada, uma vez que iria contrariar uma das partes “portuguesas” do reino. A continuação de Dom Pedro I no Brasil desenhava uma espécie de acordo com uma nova elite, a qual em parte queria a união a Portugal, sendo a separação definitiva pouco desejada. Dessa forma, esse acordo dava a garantia de uma independência livre de revolução, em 7 de setembro de 1822, e, inusitadamente, de uma colônia que continuava sob o comando de integrantes da metrópole.