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Esmeraldo Rosário Muerelocona Actuação dos Líderes Comunitários no Processo de Acesso à Terra e na Gestão de Conflitos de Terra na Cidade de Lichinga: Particularidades e os Desafios na Gestão Territorial (Licenciatura em Ensino de Geografia Com Habilitação em Turismo) Universidade Rovuma Extensão de Niassa 2023 Esmeraldo Rosário Muerelocona Actuação dos Líderes Comunitários no Processo de Acesso à Terra e na Gestão de Conflitos de Terra na Cidade de Lichinga: Particularidades e os Desafios na Gestão Territorial (Licenciatura em Ensino de Geografia Com Habilitação em Turismo) Monografia Científica apresentada ao Departamento de Geociências, Extensão de Niassa, para a obtenção do Grau Académico de Licenciatura em Ensino de Geografia com Habilitações em Turismo. Supervisor: Professor Doutor Júlio Ambrósio Masquete Universidade Rovuma Extensão de Niassa 2023 Índice Declaração ................................................................................................................................. iv Dedicatória.................................................................................................................................. v Agradecimentos ......................................................................................................................... vi Resumo ..................................................................................................................................... vii Lista de Símbolos e Abreviaturas ............................................................................................ viii Lista de Figuras e Gráficos ........................................................................................................ ix Lista de Quadros ......................................................................................................................... x CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO................................................................................................ 11 CAPÍTULO II: REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEPTUAL ............................................ 14 2.1. Conceitos: Acesso á Terra e Conflitos de Terra ............................................................ 14 2.1.1. Acesso á Terra ........................................................................................................... 14 2.1.2. Conflitos de Terra ...................................................................................................... 16 2.1.2.1. Causas e Tipologias de Conflitos de Terra............................................................. 17 2.2. Actuação dos Líderes Comunitários no Acesso á Terra ................................................ 19 2.3. Os Líderes Comunitários e a Gestão dos Conflitos de Terra ........................................ 20 2.3.1. O Papel dos Líderes Comunitários na Gestão dos Conflitos de Terra ....................... 21 CAPÍTULO III: CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA EM ESTUDO ........................................ 22 3.1. Localização, caracterização e superfície ....................................................................... 22 3.2. Limites da Cidade e Divisão Administrativa ................................................................. 22 3.5. Aspectos Físico-geográficos .......................................................................................... 24 CAPÍTULO IV: APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS ........................... 26 4.1. O Papel dos Líderes Comunitários no Processo de Acesso à Terra .............................. 26 4.2. As Atribuições dos Líderes Comunitários no Processo de Gestão de Conflitos de Terra …………………………………………………………………………………………31 4.3. As Particularidades na Actuação dos Líderes Comunitários Enquanto Actores no Acesso à Terra e na Gestão de Conflitos de Terra ................................................................... 36 5. Conclusões ........................................................................................................................ 38 6. Referencias Bibliográficas ................................................................................................ 39 Apêndices ................................................................................................................................. 41 Anexos ...................................................................................................................................... 47 iv Declaração Declaro por minha honra que esta monografia é original. Que a mesma é fruto da minha investigação estando indicadas ao longo do trabalho e nas referências as fontes de informação por mim utilizadas para a sua elaboração. Declaro ainda que o presente trabalho nunca foi apresentado anteriormente, na íntegra ou parcialmente, para a obtenção de qualquer grau académico. Lichinga, Junho de 2023 ______________________________________ (Esmeraldo Rosário Muerelocona) v Dedicatória Dedico este trabalho aos meus queridos pais: Rosário Muerelocona e Rita Singano. vi Agradecimentos Agradeço em primeiro lugar a Deus por me conceder a graça de vida, saúde e força para a realização do presente trabalho. Para ele vai o meu muito obrigado de todo coração. Ao Professor Doutor Júlio Ambrósio Masquete, na qualidade de Supervisor pelo incansável apoio que me concedeu durante a realização do presente trabalho de modo que se tornasse uma realidade e aos demais docentes do Departamento de Geociências, que durante os quatro anos me mostraram caminhos a trilhar. Aos meus pais Rosário Muerelocona e Rita Singano pelo apoio material e espiritual que me concederam durante os meus estudos, a eles meu muitíssimo obrigado. Agradeço também a minha amada irmã Natalina Rosário, os meus queridos irmãos e Primos, Danilo, Messias, Sildia, Jacinta, Belzito, Imak, Josefina, Adelina, Zinho, Alberto, Nércio, Anjo e Arlete, a tia Laurinda Agostnho e Victória Singano e, a todos os meus sobrinhos. A todos meus amigos, que de forma directa e indirecta ajudaram para a redacção do presente trabalho. O meu agradecimento estende-se também a toda turma de Licenciatura em Ensino de Geografia que ingressou no ano de 2019, pelo apoio e amizade que me proporcionaram durante essa longa caminhada. Por último agradeço à todos participantes que directa ou indirectamente ajudaram de forma que a presente monografia se tornasse uma realidade. Os participantes que fizeram parte do presente trabalho são: os líderes comunitários e alguns residentes dos bairros Chiulugo e Mitava, ao Conselho Municipal da Cidade de Lichinga, à todos estes vai meu muito obrigado. vii Resumo A pesquisa procura compreender as particularidades existentes na actuação dos líderes comunitários nos processos de acesso à terra e na gestão de conflitos de terra enquanto factores condicionantes da gestão do território. A pesquisa é de natureza qualitativa. O líder comunitário é aquele agente que busca soluções junto aos governos para os problemas do bairro em que actua. É ele que conhece de perto os problemas da comunidade e tem essa preocupação de cobrar providências perante a ausência do poder público, pois é a ele a quem os moradores se reportam. Nestes termos, procurou-se olhar para as atribuições dadas aos LCs para compreender a sua actuação na questão do acesso à terra e como os conflitos de terra tem sido resolvidos poe eles. As formas de acesso á terra em Moçambique são de acordo com o plasmado na Lei de Terra (19/97 de 1 de Outubro). Para a pesquisa, optou-se pela observação directa, pesquisa documental e bibliográfica e as entrevista semi- estruturadas. As percepções sobre a participação dos líderescomunitários no acesso e na gestão de conflitos de terras ilustram quão importantes são estas instituições na gestão destes diferendos, pois são as primeiras instituições contactadas pela comunidade no geral quando assiste-se conflitos de terras. Existe uma tendência evidente que indica que os líderes comunitários muitas vezes participam nos momentos de tomada de decisão em relação ao acesso e na procura de soluções de conflitos de terra que dizem respeito suas áreas de jurisdição. Palavras-chave: Actuação dos líderes; Acesso a terra; Conflitos de terra; Gestão territorial. viii Lista de Símbolos e Abreviaturas LCs - Líderes Comunitários ONGs - Organizações Não Governamentais LT - Lei de Terra R: - Resposta CMCL - Conselho Municipal da Cidade de Lichinga IOT - Instrumento de Ordenamento Territorial DUAT - Direito de Uso e Aproveitamento de Terra ACs - Autoridades Comunitárias BM - Bairro Mitava BC - Bairro Chiulugo PCMCL - Presidente do Conselho Municipal da Cidade de Lichinga. ix Lista de Figuras e Gráficos Fig. 1. Divisão Político-administrativo da cidade de Lichinga……………………………….23 Gráfico 1. Perfil dos entrevistados…………………………………………...……….……....26 x Lista de Quadros Quadro 1. Querendo uma parcela de terra, a quem se pode recorrer……………….….……27 Quadro 2. A participação dos atores no processo de acesso a terra…………….…….……..28 Quadro 3. As funções/atribuições dos actores no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional. ……………………………………………………………...…………28 Quadro 4. Problemas relacionados com a segurança pela posse de terra……………...…......29 Quadro 5. O que os actores têm feito para garantir a segurança pela posse de terra...…....….30 Quadro 6. Existência de conflitos pela ocupação de parcelas de terra, causas e os envolvidos………………………………………………………………………………….....31 . Quadro 7. Os atores envolvidos na resolução dos conflitos de terra.…………...…..……….31 Quadro 8. As atribuições dos atores neste processo de resolução………….………………...32 Quadro 9. Na resolução do conflito de terra, quem tem o poder de decisão final……………33 Quadro 10. O cumprimento das decisões tomadas………………..…………...……….…….34 11 CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO A compreensão da actuação dos Líderes Comunitários no acesso á terra e na gestão de conflitos de terra, constituem uma matéria de suma importância para a melhor gestão do território. Em Moçambique após a independência a cedência de terras a agentes externos era uma tarefa assumida pelas autoridades comunitárias no quadro da gestão dos aspectos de terras nas comunidades. A sua intervenção neste aspecto ganhava maior expressão, porque o pedido de cedência de terras, formalmente, deveria contar com o parecer dos Líderes Comunitários (Katiavala, 2006 apud Chigarisso, 2013). Ainda o autor defende que o testemunho dos LCs no processo de acesso á terra, em muitos casos, tenha sido objecto de questionamento por parte das populações locais, porque, muita das vezes, envolviam-se em negociações com empresários ou outros agentes externos sem o consentimento destas, gerando situações de conflitos de terra que acabavam por pôr em causa a sua credibilidade junto das comunidades. Para Katiavala (2006) actualmente em Moçambique, o papel das autoridades comunitárias são vistas em três diversas áreas de actuação tais como no plano executivo, no nível legislativo e na vertente judicial. Portanto para o autor, no plano executivo, as funções das autoridades comunitárias estão relacionadas com a gestão geral das comunidades, negociação e estabelecimento de ligações com agentes externos (Instituições do Estado, ONGs), gestão de terras, incentivo à produção agrícola e controlo da população. A nível legislativo, as lideranças comunitárias são responsáveis pelo estabelecimento de normas sociais, pela definição dos limites do território que ocupam as comunidades sob sua jurisdição e, também, pelo estabelecimento de regras de utilização de recursos comunitários como a terra, a água e a floresta (Katiavala, 2006). No que diz respeito as áreas de actuação, por fim Katiavala (2006) indica a vertente judicial que se baseia na acção dos líderes comunitários que está fundamentalmente direccionada para a administração da justiça, intervindo desta forma em processos de acesso, resolução de conflitos ligados a terra e na observância do cumprimento das normas sociais pelos membros das comunidades. As três áreas que Katiavala apresenta estão duma forma resumindo os papéis centrais que os líderes comunitários desempenham dentro de uma comunidade mesmo com a crescente tentativa de modernização destas instituições sociais, estas instituições continuam desempenhando papéis cruciais para a manutenção da ordem social e harmonia dentro da comunidade apesar de coexistirem conflitos dentro da mesma. 12 O estudo é de extrema importância científica, pois a geografia é uma ciência que permite observar, localizar, caracterizar e analisar os fenómenos no espaço, contudo sua importância é relevante no estudo e compreensão dos elementos da gestão territorial, uma vez que a gestão do território permite organizar o espaço urbano, de maneira que satisfaça as necessidades da população e mantem a cidade ou o território em bom funcionamento permitindo assim o seu desenvolvimento. Neste contexto torna-se necessário compreender a actuação dos líderes comunitários no acesso á terra e na gestão de conflitos de terra, elementos esses condicionantes da gestão do território. Por outro lado a gestão do território corresponde, na maior parte dos casos à vontade de corrigir os desequilíbrios de um espaço nacional ou regional e constitui um dos principais campos de intervenção da Geografia. A cidade de Lichinga faz parte de um meio urbano que esta a passar por constantes modificações por isso torna-se importante o conhecimento dos diversos elementos que actuam na modelagem do mesmo. A dinâmica do crescimento da cidade de Lichinga requer a realização da gestão do território com base na actuação dos líderes comunitários buscando ordenar e gerir os espaços e identificar as áreas passiveis da sua intervenção. A compreensão das particularidades existentes na actuação dos LCs no acesso e na gestão dos conflitos de terra visa orientar a tomada de decisões numa administração pública garantindo o desenvolvimento do próprio município. Entende-se assim que, o Líder Comunitário é um dos actores que actua tanto no processo de acesso à terra bem como na gestão dos conflitos de terra, aspectos esses relevantes para compreender as suas particularidades. Diante disto, coloca-se a seguinte pergunta de pesquisa: Que particularidades existem na actuação dos líderes comunitários nos processos de acesso à terra e na gestão de conflitos de terra entendidas como componentes da gestão territorial? A pesquisa tem como objectivo geral compreender as particularidades existentes na actuação dos líderes comunitários nos processos de acesso à terra e na gestão de conflitos de terra enquanto factores condicionantes da gestão de território. E tem como os seus específicos: Descrever o papel dos líderes comunitários no processo de acesso à terra; Levantar as atribuições dos líderes comunitários no processo de gestão de conflitos de terra; Identificar as particularidades na actuação dos líderes comunitários enquanto actores no acesso à terra e na gestão de conflitos de terra. 13 A pesquisa é de natureza qualitativa pois, procura dar conta dos significados, motivos, atitudes, crenças, percepções, representações e valores que se expressam na linguagem comum e na vida quotidiana. Para a pesquisa, optou-se pela observação directa, pesquisa documental e bibliográfica e as entrevista semi-estruturadas. Estas técnicas foram de maior importância na pesquisa, ao permitir fazer o levantamentode dados através da presença do pesquisador no grupo social e na região estudada, o que permitiu também ver de perto a forma como as ACs actuam no processo de acesso a terra e em conflitos de terra, isto por sua vez, permitiu efectuar uma confrontação em relação ao que os autores dizem e com o que realmente acontece na prática. O trabalho está estruturado em quatro capítulos. O primeiro é relativo a introdução, onde estão patentes: a contextualização, a problemática, a pergunta de partida, a justificativa, os objectivos geral, específicos e a metodologia da pesquisa. O segundo capítulo é relativo ao referencial teórico e conceptual, que integra a revisão da literatura e a teoria de base. O terceiro capítulo é dedicado a caracterização da área de estudo em que estão patentes a localização e caracterização da superfície da área em estudo, limites e divisão administrativa, aspectos demográficos, económicos, culturais e físico-geográficos da área em estudo. O quarto e último capítulo é refente a apresentação e discussão de resultados, onde foram apresentados e discutidos os dados recolhidos no campo, neste capítulo também é relativo a apresentação das conclusões da pesquisa. 14 CAPÍTULO II: REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEPTUAL Neste capítulo é apresentada a revisão da literatura sobre a matéria em estudo. Neste sentido, a literatura sobre o tema, apresenta-se em diversas perspectivas, sem deixar de lado o foco principal do estudo. 2.1. Conceitos: Acesso á Terra e Conflito de Terra 2.1.1. Acesso á Terra Acesso a terra é um processo pelo qual um individuo adquire certa parcela de terra. Que pode ser por ocupação ou por via de autorização. Negrão (2004) entende por sistema de uso da terra o conjunto de normas, regras e disposições legais, escritas ou não, que determinam as formas de acesso e uso e aproveitamento da terra, o controlo sobre os produtos nela existentes ou dela derivados, e a transmissão de direitos sobre as áreas determinadas. Por regra este conjunto de disposições é objecto de legislação avulsa, que vai sendo emitida à medida que o legislativo sente que há necessidade para tal. A questão da propriedade da terra bem como as normas relativas ao uso sustentável dos recursos também, por regra, são definidas ao nível da Constituição da República, e servem de orientação para a publicação da legislação avulsa e para o exercício dos vários sistemas de direitos costumeiros. Por razão de facilidade de expressão, normalmente, use-se a expressão acesso à terra subentende-se o conjunto de normas, regras e disposições legais que constituem o sistema de uso da terra (Negrão, 2004). Parafraseando Negrão (2004) embora a terra na República de Moçambique seja propriedade do Estado, este não tem o papel de adjudicador exclusivo da terra. A LT [Lei nº 19/97] prevê que a transmissão dos direitos de uso e aproveitamento, consequentemente o acesso à terra, possa ser feita por quatro vias distintas (i) por alocação directa do Estado em resposta a solicitação explícita e aprovação do respectivo plano de exploração; (ii) por alocação no âmbito dos sistemas de direitos costumeiros; (iii) pela simples ocupação, individual ou colectiva, desde que seja de boa fé; (iv) e, indirectamente, através da transmissão de benfeitorias existentes na parcela, normalmente por forma onerosa i.e. via mercado, a qual, nas zonas urbanas, implica a transmissão automática dos direitos de uso e aproveitamento de toda a parcela. A prática de venda de terra é um evidente atropelo à constituição da República de Moçambique, Titulo IV, Capítulo II, artigo 109, n.º 2 e a LT, Capítulo II, artigo 3 que pressupõe que: A Terra é propriedade do Estado e não pode ser vendida ou, por qualquer outra forma, alienada, hipotecada ou penhorada. Sobre a questão da venda de terras, Carrilho 15 (1992), afirma que embora seja ilegal, é do domínio público que existe um activo mercado de terras, no qual se vendem, se alugam ou de outra forma não autorizada pela lei se transferem direitos de uso e aproveitamento da terra à margem do conhecimento formal do Estado. Na verdade, o direito de uso de terra tem sido tratado como direito de propriedade privada. Segundo estudos realizados pelo Cruzeiro do Sul – IIID e a recolha realizada por outras fontes apontam que em termos de controlo alocativo da terra, o Estado garante apenas 15% da terra, ficando a maioria sobre o controlo alocativo dos sistemas costumeiros (20%) e no meio urbano o mercado cobre 65% (Manhicane, 2007). Acesso através do direito consuetudinário refere-se a garantia de acesso à terra para habitação e agricultura, que esta a cargo dos líderes comunitários. Ademo (2003), justifica este cenário como decorrente da nova conjuntura sobre a terra, argumentando ainda que, a atribuição pelos líderes comunitários e/ou chefes dos bairros foi cada vez mais se diluindo com a individualização da terra pelos moradores. E o acesso através da compra Norton (2003) apud Negrão (2010), afirmam que quando a procura por terra aumenta ainda mais, a tendência é tê-la como mercadoria que pode ser comprada e vendida, quer na forma de transferência de direitos de uso de propriedade quer das benfeitorias. Relativamente a concessão pelo Conselho Municipal Negrão (2010), defende que quando a terra é abundante a sua valorização é dada pelo seu significado simbólico, e a gestão é feita pelas instituições locais de acordo com as normas e costumes comummente aceites. Todavia, à medida que a procura aumenta, a percepção sobre o valor da terra altera-se, passando esta a ser tida como “recurso” que é preciso preservar e usar com normas e regras, muitas vezes de carácter legal, sob a responsabilidade do Estado. Neste âmbito, a LT (lei n.º19/97), no seu artigo 23 pressupõe que, compete aos Presidentes dos Conselhos Municipais e de Povoações e aos Administradores do Distrito, nos locais onde não existam órgãos municipais, autorizar pedidos de uso e aproveitamento de terra nas áreas cobertas por planos de urbanização e desde que tenham serviços públicos de cadastro. No território moçambicano, a terra é propriedade do Estado e o seu acesso é regulado pela Legislação de terras em vigor (Lei nº19/97 de 01 de Outubro, Decreto nº66/98 de 8 de Dezembro e Decreto nº 60/2006, de 26 de Dezembro). De acordo com o artigo 3 da LT, na República de Moçambique a terra é propriedade do Estado e não pode ser vendida, ou por qualquer outra forma, alienada, hipotecada ou penhorada. Como meio universal de criação da riqueza e do bem-estar social, o uso e aproveitamento da terra é direito de todo povo 16 moçambicano. Na Lei de terras (Lei nº 19/97 de 1 de Outubro), estão previstas que as condições de uso e aproveitamento da terra são determinadas pelo Estado. 2.1.2. Conflito de Terra Parafraseando Alfredo (2009),o conflito é entendido como uma situação de tensão e disputa claramente manifestadas pelas partes que reivindicam algo. Mas Ferreira et al (2001:511) definem conflito como “o processo de tomar consciência da divergência existente entre as partes, traduzida em algum grau de oposição ou incompatibilidade entre os objectivos das partes, ou da ameaça dos interesses de ambas as partes”. Segundo Vargas (2010:54) “o conflito é mais do que um desacordo, ou choque de interesses: é uma interferência deliberada sobre a tentativa da outra parte de atingir seus objectivos ”.Segundo Hodgson apud Martinelli (1998), a simples existência de diferentes grupos já cria um potencial latente de conflitos, em contrapartida, Martinelli (1998) defende que, um conflito, frequentemente surge como uma pequena diferença de opinião, podendo muitas vezes se agravar e tornar-se uma hostilidade que leve a um conflito destrutivo entre duas pessoas ou grupos. Valá (2003), define conflitos de terra como diferendos que se verificam motivados pela posse ou não de terra, ouainda pela tendência do seu alargamento. Amoretti e Carlet (2012), olham para os conflitos de terra como uma acção de resistência e enfrentamento pela posse ou uso da terra que envolve vários intervenientes, pequenos arrendatários, pequenos proprietários, ocupantes, sem terra dentre outros. Para Alfredo (2009), os conflitos de terra, devem ser vistas como uma situação que opõem duas ou mais pessoas que alegam ser possuidoras do direito sobre a terra, cuja solução deve ser entendido como uma situação de tensão e disputa claramente manifestadas pelas partes que reivindicam um direito sobre a terra. Para Felício e Fernandes (2007), um conflito de terra é um confronto entre classes sociais, entre modelos de desenvolvimento, por territórios, enfrentado a partir da conjugação de forças que disputam ideologias para convencerem ou derrotarem as forças opostas. Os intervenientes dos conflitos de terra muitas vezes são multifacetados, envolvendo os nativos, os conselhos municipais, e demais cidadãos com terras, em outros casos cidadãos com interesse em adquirir. 17 2.1.2.1. Causas e Tipologias de Conflitos de Terra Alfredo (2009) levanta alguns factores que constituem as causas dos conflitos de terra em Moçambique, agrupando-os em geográfico e económico. Factor geográfico: as zonas urbanas das grandes cidades capitais de Moçambique têm uma densidade populacional bastante elevada quando comparada com a maioria dos distritos do país. Daí que a pressão exercida sobre os recursos naturais seja de facto muito intensa, estando assim na origem de alguns conflitos sobre a posse de terra. O factor económico: Muitas vezes a grande procura de terra por agentes económicos de várias origens e com objectivos de realizar os seus investimentos constitui também factor de conflitos de terra. Em Dynamiques et enjeux des conflits fonciers, Chauveau e Mathieu (1998:245) propõem duas correntes de análise dos conflitos de terra e suas causas. A primeira corrente vê nos conflitos de terra fenómenos completamente negativos a resolver ou prevenir, o máximo possível, por meio de autoridades externas competentes, dotadas de meios próprios. Esta corrente tem em conta o papel dado à integração social, como elemento estruturante das sociedades, e considera a violência e injustiça, frequentemente presentes nos conflitos, fontes de desperdícios humanos e sociais. A desvantagem desta abordagem, consideram os autores, é de confiar a resolução dos conflitos de terra a actores externos ao local onde acontecem os conflitos (poderes públicos), correndo o risco de ser ineficaz por querer impor uma ordem social muito diferente das lógicas sociais locais e criar violência e injustiças de outra natureza, que podem enfraquecer as capacidades locais de resolução dos conflitos. Um conflito de terra pode ser iminente ou declarado. O conflito de terra é iminente quando envolve violência simbólica e é declarado quando a carga de violência simbólica ou física ultrapassa o considerado tolerável nas relações da vida social quotidiana, ou seja, quando passa da simples ameaça, presente nos momentos de interacção e negociação quotidiana, à acção. Assim, pode-se considerar um conflito de terra a disputa, simbólica ou física, pelo acesso e controlo deste recurso, que opõe diferentes interessados e utilizadores (Chauveau e Mathieu, 1998). De acordo com Chigarisso (2013), os tipos de conflitos de terras existentes são: venda das mesmas terras a diferentes indivíduos; conflitos de natureza intracomunitária; conflitos de natureza intra-familiar; conflitos de terras de caris extracomunitários; e conflito de terra interfamiliar. 18 Sobre a venda das mesmas terras a diferentes indivíduos, este tipo de conflitos de terras é um dos mais problemáticos porque vê-se o crescente materialismo económico das pessoas que se envolvem nestes tipos de problemas (Chigarisso, 2013). Os conflitos de natureza intracomunitária, Chigarisso (2013) em seu estudo sustenta que, este tipo de conflitos destacam-se principalmente as disputas pelos espaços com terras boas para a prática da agricultura, que têm a ver com os limites das machambas, assistindo-se frequentemente transposições dos limites de machambas e dos terrenos. Neste tipo de conflito existe a componente herança pois há aqueles herdeiros que cresceram nas cidades e pretendem regressar às terras dos seus familiares. Às vezes, não conhecem os verdadeiros limites das terras de seus familiares, vêm apenas por indicação de outros parentes ou familiares e ao demarcarem as terras de sua herança transpõem os limites, abrangendo casas e quintas, criando conflitos com a vizinhança. O problema de delimitação de fronteiras é um dos que tem causado muitos conflitos. Na sua obra intitulada "Tipologia dos conflitos sobre ocupação da terra em Moçambique", Uacitissa Mandamule (2016) escreve que os conflitos de terra de natureza intra-familiar são de índole intra-familiar, fazem parte desta natureza de conflitos as questões de herança, que têm as seguintes dimensões: a herança entre os filhos e sobrinhos e a herança entre os filhos da mesma família e mãe e mesmo entre filhos e tios. As novas gerações defendem a herança pelos filhos, enquanto razão de existência dos pais. O conflito intra- familiar é aquele que acontece no seio da família nuclear ou alargada, envolvendo os binómios pais-filhos, maridos-esposas, sogros-noras/genros, etc., sempre que haja divergência de objectivos e interesses entre os mesmos (Gaspar, 2003). Para Uacitissa Mandamule (2016) os conflitos de terras extracomunitários consiste na relação entre proprietários privados e as comunidades locais, que vai desde as demarcações iniciais até definitivas e os procedimentos legais de obtenção de títulos de uso e aproveitamento das terras. As delimitações de terrenos, normalmente chocam com o sistema de produção das comunidades encontradas, o que cria grandes conflitos com as comunidades. Os Conflito de terra inter-familiar ocorre quando duas ou mais famílias entram em concorrência pelo acesso e posse de um mesmo espaço. Basicamente, estes conflitos relacionam-se com a não-observância dos limites e o desrespeito pelos marcos que separam as áreas de uma e outra família. Estes ocorrem com maior incidência nas regiões próximas das vias fluviais, visto que as condições naturais destas favorecem a prática da actividade 19 agrícola, principal fonte de rendimento e de subsistência das famílias no meio rural (Mandamule, 2016). 2.2. Actuação dos Líderes Comunitários no Acesso á Terra Um dos atores sociais de destacável importância junto às comunidades locais são os líderes comunitários. Os LCs são tidos como um poder local e/ou poder exercido por pessoas influentes e com legitimidade para decidir sobre a vida da comunidade e dos recursos nelas existentes, no que concerne à sua forma de uso e aproveitamento (Uate, 2017). A Lei de Terras, no seu artigo primeiro, define a comunidade local (onde opera o poder da autoridade local) como: (...) agrupamento de famílias e indivíduos, vivendo numa circunscrição territorial de nível de localidade ou inferior, que visa a salvaguarda de interesses comuns através da protecção de áreas habitacionais, áreas agrícolas, sejam cultivadas ou em pousio, florestas, sítios de importância cultural, pastagens, fontes de água e áreas de expansão (Moçambique, 1997). Ainda que instituídas e reconhecidas por Lei, Moçambique continua sendo palco de debates sobre o poder e papel das instituições políticas locais. De acordo com Lourenço (2007), continuam não estando claras, nas sociedades africanas no geral e, em particular, para Moçambique, a separação do que pertence ao domínio “tradicional” com o que então irá constituir o “moderno”, tampouco estes dois elementos estão, de fato, enquadrados numa realidade política. Tal fato, na opinião de Lourenço(2007), deu-se pela importância que outrora representaram para o governo colonial, quando chegaram a ser usados como intermediários administrativos do poder colonial junto às comunidades que tutelavam. Na verdade, Meneses (2009) diz que o reconhecimento das autoridades locais como sistema de administração indirecta foi legalizado na gestão colonial em Moçambique em 1929, quando então passam a ser reconhecidos um régulo para cada território tradicional. Entretanto, a autora salienta que esse poder representou para o colono o caminho mais fácil de envolver os nativos nos objectivos da colónia. Afinal, o poder tradicional local foi usado pelo sistema colonial no controle de cobrança dos impostos dos indígenas, na garantia do recrutamento da força de trabalho e na resolução de conflitos das populações que tutelavam e, em certos casos, como acrescenta Lourenço (2007), os nativos se tornaram até mesmo agentes de policiamento local da estrutura colonial. Como foi referido anteriormente, em Moçambique, a terra é propriedade do Estado e, para a comunidade, representa uma dádiva Divina, pertencendo ao conjunto da comunidade. 20 Assim, cabe ao chefe dessa comunidade (neste caso o líder), portanto, a autoridade local, também designada autoridade tradicional, determinar as regras de sua posse, ocupação e uso por parte particular, sendo o critério determinante os princípios locais onde o acesso, uso e controle é regulado pelas suas próprias tradições. Transpondo o modelo tradicional de acesso e controle de terra para a família, o trabalho de Gengenbach (1998) sintetiza melhor a forma como ele ocorre. Segundo o autor, de um modo geral, quem detém o controle das terras é o regulado, quem arbitra sobre a colectividade. Este, por sua vez, divide a terra pelos grupos familiares residentes em seu povoado. Por grupo familiar, Gengenbach (1998, p. 10) refere-se ao “chefe do grupo, seus irmãos, os filhos (homens) casados (ligação agnática), a esposa ou as esposas do chefe do grupo e sua prole. O grupo familiar é composto de casas formadas por cada mulher casada e seus filhos”. Portanto, cabe ao chefe de cada grupo garantir que todos membros tenham acesso à terra suficiente para agricultura e residência. Para Alfredo (2009), o controle da terra opera-se, normalmente, junto às famílias e/ou indivíduos isolados, que podem, nomeadamente, fazer o repasse, aluguel ou empréstimo da terra. No entanto, a linhagem ou outra hierarquia da comunidade, no caso, o regulado ou a autoridade tradicional que também pode ser designada por líder comunitário pode ter o direito de aprovar ou não quando se trata do repasse dessa terra. Na verdade, ainda que se fale de controle de terra por parte do regulado, dos grupos familiares ou dos indivíduos, na prática, o fato de a terra em Moçambique ser da pertença do Estado, não se admite que particulares detenham de títulos de propriedade da terra. O que indivíduos pertencentes a uma comunidade podem obter, para lhes garantir a posse e, consequentemente, o controle da terra, é o direito de posse das mesmas. Segundo Alfredo (2009), a posse representa uma situação em que a pessoa que tem acesso à terra é capaz de fazer algum uso do recurso, podendo a posse representar um poder correspondente ao exercício do direito de propriedade ou situação na qual a pessoa terá o controle de alguma coisa. 2.3. Os Líderes Comunitários e a Gestão dos Conflitos de Terra Em alguns casos com vista a gestão e resolução de conflitos de terra, os Conselhos Municipais tem pautado pela atribulação de terrenos, embargos e demolições. Neste processo observa-se muitas vezes falta de transparência e não cumprimentos dos procedimentos legalmente estabelecidos para o efeito. Enquanto noutros casos a resolução de conflitos é um 21 processo que é levado a cabo por três instâncias administrativas: Círculos dos Bairros, Postos Administrativos Municipais entre outros. Zandamela (2015) salienta que em certos casos pelo crescente registo de casos de conflitos de terra, existem zonas que possuem comissões eleitas pelos residentes que auxiliam os LCs no processo de reconhecimento dos proprietários de direito de uso de terra lesados para junto das instâncias administrativas de resolução de conflitos exercer pressão e auxílio no processo de resolução. Em casos de constrangimentos no processo de resolução dos conflitos, os casos são encaminhados para outra instância, este que por sua vez, em caso delimitações podem encaminha-los para as outas instâncias mais superiores de modo a que se possa resolver o conflito de forma justa possível (Zandamela, 2015). 2.3.1. O Papel dos Líderes Comunitários na Gestão dos Conflitos de Terra Bloomfield e Reilly, Miall citado por Andrade (2014), afirmam que a resolução de conflitos enfatiza a intervenção de terceiros qualificados que procuram explorar o que são as raízes do problema e identificam soluções criativas para as partes em conflito. Em seu estudo Rachael Knight (2018) salienta que, em muitos casos, levar um caso ao tribunal apenas prolonga o conflito de terra, exige tempo e recursos valiosos e aprofunda as hostilidades. Além disso, os tribunais – e os procedimentos judiciais – podem ser parciais em favor das elites ou das pessoas com mais poder. Existem como mecanismos que o líder comunitário usa para a gestão dos conflitos de terra: realização de reuniões comunitárias; realização de trabalhos com outros líderes comunitários e a mediação. Na realização de reuniões comunitárias Knight (2018) sustenta que, o líder comunitário procura reunir todos os envolvidos em uma discórdia e criar uma discussão aberta pública. O objectivo é ouvir todos os lados e identificar as raízes do problema, os danos causados e todas as leis pertinentes. Enquanto a realização de trabalhos com outros líderes comunitários ajuda em situações em que as discussões e negociações internas não funcionarem, pode ser útil levar o conflito de terra a um nível mais alto. Os líderes respeitados podem usar sua autoridade para ajudar as partes a resolver os conflitos de terra difíceis (Rachael Knight, 2018). Segundo Knight (2018), a mediação é geralmente adequada se as negociações não estiverem indo adiante e as partes sentirem que precisam da assistência de alguém que não faça parte do litígio. A mediação pode ser necessária quando as pessoas estiverem ficando muito emotivas, dificultando um acordo. 22 CAPÍTULO III: CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA EM ESTUDO Neste capítulo, apresenta-se a descrição da área de estudo como forma de situar, o espaço geográfico, a caracterização da área de Estudo, entre outros aspectos relevantes. 3.1. Localização, caracterização e superfície 3.2. Limites da Cidade e Divisão Administrativa O Município da Cidade de Lichinga, situa-se na região norte da República de Moçambique na Província do Niassa e é cidade capital da mesma, entre as coordenadas 13,18 Latitude Sul e 34,14 longitude Leste, a uma altitude de 1.358 metros, Lichinga dista cerca de 50 km da margem Leste do Lago Niassa em linha recta e, tem como limites: A Norte – O rio Sambula e linha imaginária que separa da Localidade de Lussanhando; A Oeste - O rio Muangata e linha imaginária que separa dos Postos Administrativos de Lione e Meponda; A Sul e a Este – Uma linha imaginária que separa do Posto Administrativo de Mussa. De acordo com o PEU 1 do Municipal da Cidade de Lichinga 2013/23, em termos político-administrativos, a Cidade de Lichinga é dividido em quatro (4) Postos Administrativos e um total de 19 bairros, nomeadamente: Posto Administrativo Urbano de Sanjala: bairro Sanjala, Nzinge, Muchenga, Namacula, popular e Chiulugo; Posto Administrativo Urbano de Chiuaula: bairro de Estação, Lucheringo e Cerâmica; Posto Administrativo Urbano de Massenger: bairro de Massenger, Assumane e Sambula, Utumuile, Naluila; PostoAdministrativo Urbano de Lulumile: bairro de Lulumile, Nomba, N´toto, 23 de Setembro e Mitava. De acordo com o RDML 2 , a sua posição geográfica é privilegiada sob ponto de vista económico, uma vez que dista a 50 km do Lago Niassa sendo a terminal da linha férrea (ramal do Corredor de desenvolvimento de Nacala) que a liga ao corredor de desenvolvimento o qual liga a República do Malawi. Aliado ao potencial em termos de possuir um Aeroporto com voos domésticos regulares. Complexos industriais e grande possuidor de terras férteis que faz de Lichinga um dos celeiros do País e com todos suportes para crescer economicamente. 1 Plano de Estrutura Urbana 2 Relatório de diagnóstico – Município de Lichinga 23 Por outro lado, a existência de boas condições naturais e agroclimáticas para a prática da agricultura em quase toda área municipal até ao distrito e a ligação da Cidade a rede nacional de energia eléctrica, faz também de Lichinga um Município com grande potencial de crescimento e desenvolvimento socioeconómico. Ocupando uma área com cerca de 290km² de superfície e com uma população global de 204720 habitantes segundo senso de 2017, a cidade de Lichinga está administrativamente dividida em 4 Postos Administrativos Urbanos e estruturados em 19 bairros comunais. Fig. 1. Divisão político-administrativo da cidade de Lichinga. Fonte: Masquete, 2017. 3.3. Aspectos demográficos De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (2019), em 2017 a Autarquia de Lichinga possuía uma população com 204,720 habitantes. Sendo que a população em 2007 era de 142,331 habitantes, tem se que no último decénio, aumentou a população da Autarquia com mais 62,389 habitantes, e um crescimento anual de 3.7%. Dados do INE (2019) indicam que a população da Autarquia de Lichinga tem ligeiramente mais mulheres (51%) do que homens (49%), é uma população maioritariamente jovem com 45% de habitantes com idades compreendidas entre 15-44 anos contra apenas 8.9% com idade superior a 45 anos. 24 3.4. Economia e Cultura A Influência económica é bastante reduzida comparada com outras capitais provinciais. É uma cidade dependente, sobretudo da cidade de Nampula, como terminal do Corredor de Nacala. Lichinga é uma cidade com características económicas eminentemente agrícolas. Possui pequenas indústrias de processamento primário de produtos agrícolas. A rede de infra-estruturas é ainda incipiente. E tem como principais actividades económicas: a agricultura (cultivo de milho, feijão, batata, criação de animais e hortícolas). Há cinco instituições bancárias, prática de turismo de infra-estruturas, existindo alguns estabelecimentos hoteleiros (Perfil do Conselho Municipal da Cidade de Lichinga, 2011). A sua população embora dentro de grandes diversidades étnico - culturais, com predomínio de Ayaos, Macuas, Nyanjas e outros grupos e professam as religiões muçulmana, católica e anglicana. 3.5. Aspectos Físico-geográficos De acordo com Masquete (2017) devido à sua localização geográfica, na zona de Baixas Pressões Equatoriais, das células anticiclónicas tropicais e das frentes polares do Antárctico, o ritmo climático de Moçambique acompanha duas estações distintas: uma quente e chuvosa (de Outubro a Março) e a outra seca e fresca (de Abril a Setembro). Neste sentido e de maneira geral, Moçambique possui um clima quente e húmido, cujas variações zonais resultam da influência dos factores como a continentalidade, altitude, exposição e posição geográficas, no comportamento da precipitação e temperatura. Muchangos (1999) apud Masquete (2017), especificamente, grande parte do Norte de Moçambique regista temperaturas anuais superiores a 25ºC e somas pluviométricas superiores a 800 mm. Os valores máximos de pluviosidade registam-se nas zonas planálticas e montanhosas de Manica e Niassa, havendo de destacar a cidade de Lichinga, com mais de 1000 mm e temperaturas médias inferiores a 18º C. A variação temporal da precipitação na cidade de Lichinga permite verificar que ao longo do ano registam- se 4 meses (Junho- Setembro) em que os valores de precipitação são críticos para o desenvolvimento das culturas, constituindo um período onde as necessidades de irrigação se elevam. Segundo a interpretação da carta temática de solos a cidade de Lichinga é caracterizado pela predominância de solos argilosos vermelhos tóxicos, cobrem a maior parte da cidade de Lichinga, numa área de 212 km². São solos argilosos, castanho-avermelhado- escuros, ocorrem em interflúvios e encostas superiores, sendo profundos, maior que 100 cm, apresentam uma drenagem boa. 25 A cidade de Lichinga possui uma morfologia característica de planalto, desenvolvendo-se na sua maioria no sentido Norte-Sul, com uma vasta superfície aplanada localizada na parte central, bem como se observam zonas de planícies interceptadas pelos principais cursos de água. Há ocorrência de declives escarpados, concentrando-se na sua maioria, na parte oriental, e a proliferação de blocos intrusivos resultantes de processos característicos da região. As altitudes variam de 980 m a 1520 metros. 26 CAPÍTULO IV: APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS Neste capítulo fez-se a apresentação e a discussão dos resultados da pesquisa, a partir da realização de entrevistas semi-estruturadas dirigidas aos LCs, ao CMCL e aos membros da comunidade. Estas metodologias foram aplicadas de modo a compreender as particularidades existentes na actuação dos líderes comunitários nos processos de acesso à terra e na gestão de conflitos de terra enquanto factores condicionantes da gestão de território. Assim fez-se a apresentação das respostas obtidas pelos entrevistados sobre o assunto em causa, e de seguida fez-se a devida discussão dos dados ora apresentados. Os resultados apresentados a seguir dizem respeito a depoimentos de 25 entrevistados dos quais, 17 homens e 8 mulheres. Dos 17 homens, 2 régulos (1 de Mitava e 1 de Chiulugo), 2 secretários de bairro (1 do bairro Chiulugo e outro de Mitava), 1 director da urbanização (representando o CMCL) e os restantes 12 são simples moradores dos bairros (6 de Mitava e outros 6 de Chiulugo). No estudo, dos entrevistados 75% representam os homens e os restantes 25% as mulheres. Como ilustrado no Gráfico a baixo. Gráfico 1. Perfil dos entrevistados. Fonte: Autor, 2023. 4.1. O Papel dos Líderes Comunitários no Processo de Acesso à Terra Nesta secção procura-se entender o papel dos líderes comunitários no processo de acesso á terra na cidade de Lichinga, a partir da aplicação de entrevistas semi-estruturadas para os LCs, o CMCL e para os residentes dos bairros. 75% 25% Perfil dos Entrevistados Homens Mulheres 27 Foi efectuada a seguinte questão aos entrevistados: Querendo uma parcela de terra, a quem se pode recorrer? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1:Devem falar com o régulo da Zona. R2: o régulo. R3: fala com o régulo e ele encaminha a situação ao secretário para prosseguir com o processo. R4: qualquer autoridade do bairro. R1: Recorre-se a um pedido dirigido ao PCMCL para tal. R1: Tem que dirigir-se as estruturas dos bairros. R2: tem de falar com o régulo. R3: falas com o secretário do bairro ele é quem vai encaminhar a situação ao régulo. R4: o chefe de zona. Quadro 1. Querendo uma parcela de terra, a quem se pode recorrer. Fonte: Autor, 2023. De acordo com os depoimentos acima, pode-se perceber uma certa divergência de ideias com relação a quem deve-se recorrer querendo uma parcela de terra na cidade. A maior parte dos entrevistados afirmaram que deve-se recorrer ao Régulo representando as ACs para ter acesso a uma parcela de terra. Por sua vez o CMCL afirma categoricamente que deve-se recorrer ao Municípiopara tal. Diante desta situação, pode-se perceber que tanto os Líderes comunitários assim como o CMCL são as entidades a quem se pode recorrer querendo uma parcela de terra. A outra questão efectuada aos entrevistados foi: Como os actores têm participado no processo de acesso a terra? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: Através de indicações dos melhores locais para habitar ou fazer machambas R2: perguntando a finalidade do terreno. R3: decidindo se pode ou R1: Tem participado através da elaboração de IOT R1: Eles dizem como as pessoas devem usar os terrenos que são dados R2:ti diz que tipo de construção deve fazer. R3: eles servem de 28 não ti atribuir o terreno. R4: fala onde deve construir e como construir. testemunhas. R4: cabe a eles decidirem se podem ou não aceitar o pedido. Quadro 2. A participação dos atores no processo de acesso a terra. Fonte: Autor, 2023. A partir das declarações apresentadas acima, pode-se perceber as formas em que os atores têm participado no processo de acesso a terra. Por um lado os mesmos têm estado presentes no momento de indicação e selecção das áreas que reúnem condições para habitação e para a prática da agricultura. E por outro lado, tem participado através da implementação e elaboração do instrumento de ordenamento territorial. Diante disto, podemos perceber que os atores têm um papel importante nos processos de acesso a terra na cidade, pois contribuem assim de forma activa no ordenamento do território, cabe a eles decidirem se podem ou não atribuir a parcela de terra desejada. Em relação a pergunta: Quais são as funções/atribuições dos actores no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: Atribuímos os terrenos desocupados (quando não tem nenhuma casa) durante muitos anos, ou seja quando o dono demora construir. R2: fazemos apresentação do futuro morador do bairro. R3: pedimos para tratar a declaração de residência R4: só damos algumas regras de convivência do bairro. R1: o Município diz para a pessoa que quer a parcela, para tratar os documentos necessários para o efeito. R1: Fazer um pequeno questionamento a pessoa (onde vem, donde é, quer viver em quanto tempo, pede para mostrar qualquer tipo de documento de identificação), tudo isso para ter as informações básicas a pessoa. R2: pedem para tratar declaração de residência. R3: diz se o local dá pra fazer casa ou não. R4: aparece para testemunhar. 29 Quadro 3. As funções/atribuições dos actores no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional. Fonte: Autor, 2023. Diante do acima exposto, pode-se perceber que existem regras em que os atores tem deixado e que devem ser seguidas (por ex. o tipo de casa a ser construída naquele local, etc.), então para tal existem certos parâmetros que os atores deixam ficar para o pretendente da parcela, os atores devem ter as informações suficientes de quem a pessoa é. Existem alguns documentos que a pessoa deve tratar e que através dos mesmos já se pode ter as informações básicas da pessoa que pretende a parcela. Então os atores trabalham de modo a que os que pretendem parcelas para erguer habitações estejam dentro da política do ordenamento territorial da cidade e que o tipo da edificação seja do conhecimento deles. Foi efectuada a seguinte questão aos entrevistados: Têm havido problemas relacionados com a segurança pela posse de terra? Sim ou não, justifique-se. Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: Sim. Muitas vezes já foi chamado para intervir neste tipo de problema. E muitas vezes surge através de falta de uma coisa que sirva de limite das parcelas. R2: sim, não saber onde termina o seu terreno tem criado isso. R3:sim. Mas não acontece com frequência. R4:sim. Aumentam os seus limites de terreno porque não tem nenhuma coisa que impede fazer isso. R1: Sim. Algumas pessoas fazem as suas casas mas não tem título de DUAT, consequentemente não sabe os seus reais limites e não tem nada que ele usa como elemento limitador entre uma e outra parcela. R1: Sim. Muitos de nós, nossos terrenos não tem nada que serve de limite do terreno, e muitas vezes surgem denúncias de lutas por causa de invasão dos terrenos. R2: dificilmente acontece, porque aqui não somos muitas pessoas. R3: sim. Lembro uma vez o régulo tinha que plantar uma bananeira no limite de duas parcelas porque sempre criava-se confusão. R4: sim. Pessoas deste bairro não respeitam os limites dos outros. 30 Quadro 4. Problemas relacionados com a segurança pela posse de terra. Fonte: Autor, 2023. De acordo com as respostas dos informantes tem havido sim problemas de segurança pela posse terra na cidade. Muitas vezes existem moradores à vários anos nos bairros mas que não fazem nenhuma ideia dos reais limites das suas parcelas, e isso consequentemente pode surgir certa insegurança dos mesmos. Alguns moradores têm se aproveitado desta situação e apoderam-se parcialmente, as vezes na sua totalidade dos terrenos alheios. E muitos casos desta natureza tem como a causa principal a falta de DUAT, onde aparecem os seus reais limites e que a pessoa já tem algo que lhe faça estar segura na sua parcela. Para a questão: O que os actores têm feito para garantir a segurança pela posse de terra? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: Colocação de plantas nos limites para evitar que outros se aproveitem das parcelas dos vizinhos. R2: pedimos para colocarem casa no limite do terreno. R3: colocamos bananeiras, porque não seca facilmente. R4: optamos a aconselhar as pessoas para colocarem flores nos limites. R1: Têm colocado algumas barreiras feitas de blocos e ou cimentos, para limitar as parcelas de terra. Em alguns casos faz-se o plantio de bananeiras entre os limites das parcelas. R1: As vezes nos obrigam a colocar plantas nos limites, ou mesmo algum tipo barreiras. R2: nos pedem para colocar muro de vedação. R3: as bananeiras têm sido uma das formas comuns de garantia de segurança. R4: falam para fazer declaração e colocar qualquer coisa para servir de limite. Quadro 5. O que os actores têm feito para garantir a segurança pela posse de terra. Fonte: Autor, 2023. De cordo com os resultados apresentados pode-se perceber que em alguns casos tem-se colocados sinalizadores que ajudam a delimitar as parcelas. A maior parte dos casos, na cidade tem se colocado entre as parcelas de terra uma planta, que ajuda a limitar as mesmas. 31 De forma geral, mesmo sendo técnicas não muito eficazes, os atores tem feito algo de modo a que possam garantir a segurança pela posse das parcelas. 4.2. As Atribuições dos Líderes Comunitários no Processo de Gestão de Conflitos de Terra Através da aplicação das entrevistas semi-estruturadas, procura-se entender a atribuição dada aos líderes comunitários como atores na gestão de conflitos de terra na cidade de Lichinga. Ao ser colocada a questão: Tem conhecimento da existência de conflitos pela ocupação de parcelas de terra? Se sim, quais tem sido as causas e os envolvidos nestes conflitos? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: sim tenho conhecimento. As principais causas são a falta de documento do espaço e os que fazem parte destes conflitos tem sido os membros desta comunidade. R2: sim. Outros vivem sem fazer chegar a informação as autoridades do bairro. R3: muitas pessoas vivem a tantos anos, mas não conhecem os verdadeiros limites do seu terreno. E depois criam problemas com pessoas da zona. R1: Sim. A falta de título de DUAT das parcelas. Os envolvidos maioritariamente tem sido membros residentes nas mesmascomunidades. R1: sim. Isso acontece porque nós as pessoas não temos documentação dos nossos espaços. E isso acaba fazendo confusão dos limites e outros se aproveitam das espaços doutros. Muitas vezes são os membros destes bairros que lutam entre si. R2: muitos de nos vivemos escondidos no bairro, sem as lideranças locais saberem. Mais tarde começam a criar problemas, infelizmente com os membros da mesma comunidade. R3: sim existem. Por causa da falta de conhecimento real dos nossos limites. 32 Disputas saem entre os membros das mesmas comunidade. Quadro 6. Existência de conflitos pela ocupação de parcelas de terra, causas e os envolvidos. Fonte: Autor, 2023. Com os resultados acima expostos, entende-se que na cidade de Lichinga muitas vezes a causa dos conflitos de terra estão associados a falta de título de DUAT, mesmo com muitos anos a viver num determinado bairro, há necessidades de adquirir o título de DUAT. Nestes diferendos muitas das vezes as pessoas que fazem parte são membros da mesma comunidade, raramente existem envolvimento de membros de comunidades diferentes. Foi efectuada a seguinte questão para os entrevistados: Quais tem sido os atores envolvidos na resolução dos conflitos de terra? E como têm sido resolvidos esses conflitos? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: Normalmente nas resoluções dos conflitos tem de estar as pessoas que estão em problema e todos que fazem parte das estruturas locais do bairro. Muitas vezes temos sentado no tribunal comunitário, e noutras vezes temos ido lá no local em problema e resolvemos o conflito conversando e aconselhando os dois. R2: quando se resolvem estes problemas de terra devem estar todos líderes da zona e as pessoas em problema. R1: o Município, o líder comunitário, as partes conflituantes e alguns membros da zona para servirem de testemunhas vivas. O Município tem resolvido estes diferendos com base na Lei de terra vigente em Moçambique. R1: As pessoas que estão a disputar, o régulo, secretário de bairro, chefe de zona, e outros que fazem parte das autoridades locais têm estado na resolução. Os líderes têm explicado as pessoas como deve-se viver em harmonia nas comunidades e dizem quais são as formas tradicionais de resolução do tipo de conflito e de seguida tem decidido o que fazer, tendo em conta as formas tradicionais de resolução vigente na zona. 33 Resolvemos em conversa e depois dê-mos a sentença. Quadro 7. Os atores envolvidos na resolução dos conflitos de terra. Fonte: Autor, 2023. Com os resultados apresentados pode-se entender que no momento da resolução dos conflitos de terra ficam presentes: os representantes da estrutura local (o regulo, o secretário de bairro, chefe de zona e todos que fazem parte da Liderança da zona), as partes envolvidas, as vezes representante do Conselho Municipal e alguns moradores do bairro para servirem de testemunhas. A resolução dos conflitos de terra, pode acontecer em um tribunal comunitário ou na parcela em discussão. Os LCs primeiro começam a explicar as pessoas presentes e aos conflituantes quais são as regras de convivência da zona, e de seguida ouvem as duas partes envolvidas, e dai dá-se o veredicto. Por sua vez o Município tem participando através do uso da legislação de Terra vigente em Moçambique. Foi efectuada a seguinte questão aos entrevistados: Quais são as atribuições dos atores neste processo de resolução? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: O que têm-se feito no dia da resolução aqueles todos que participam tem sua tarefa naquele local. As estruturas tem o papel de mediador da resolução, depois de tudo eles tem dado as ordens para que as pessoas em problema se entendem ou procuram maneiras de se sair do problema. R2: nos estamos para dirigir a situação e determinar R1: Atribui-se o papel de orientador do conflito, fazendo com que a resolução saia mais justa possível. R1: Praticamente são eles que fazem o problema acabar através de demostrações de experiencias de vida também são eles que fazem com que o problema tenha um desfecho bom ou não. Normalmente eles ficam a frente de todo o caso para ser uma resolução ordeira. R2: os atores apenas são meros ouvintes e só depois eles determinam quem tem 34 quem tem razão. R3: nos somos considerados pessoas com experiencias e que conhecemos as nossas zonas e os seus moradores, então sabemos como resolver o problema. R4: por estarmos dotados de experiências sabemos como resolve-se assuntos ligados a terra, então somos chamados para por o fim o problema com base nas regras da zona de resolução. ou não a razão. R3: servem para decidir quem tem razão. Quadro 8. As atribuições dos atores neste processo de resolução. Fonte: Autor, 2023. De acordo com os depoimentos acima, cada actor tem a sua tarefa específica, enquanto os Líderes comunitários são os que procuram formas de resolução do problema, e que também os mesmos têm o papel de mediadores do problema, de modo a que reduzam a violência no seio das comunidades, concordando assim com o autor abaixo. O papel das ACs na resolução de conflitos de terra é percebido pelos residentes tendo em conta os seguintes aspectos: Redução da violência, acessibilidade e disponibilidade das autoridades, custos e soluções imediatas fornecidas pelas autoridades (Uate, 2017). Normalmente o CMCL intervém quando o conflito toma um outro rumo, ou seja, quando o problema é mais complicado de ser resolvido localmente (no bairro). Por sua vez o Município também fica a mediar o problema procurando melhores soluções com base nos mecanismos legais. Quando colocada a questão aos informantes: No processo da resolução do conflito de terra, quem tem o poder de decisão final? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: O régulo da zona. R1:O Conselho Municipal da R1: Os régulos ou alguém 35 R2: os que fazem parte dos líderes da zona. R3: se não for o régulo, só deve ser alguém que foi indicado por ele, a decidir. Cidade de Lichinga é quem tem o poder final de decisão. que faça parte das autoridades locais indicado por ele. R2: o secretário do bairro ou mesmo o chefe de zona. Quadro 9. Na resolução do conflito de terra, quem tem o poder de decisão final. Fonte: Autor, 2023. No exposto acima dá a perceber que neste processo todo da resolução dos conflitos de terra quem detém o poder de decisão final são os LCs (que pode ser o régulo, ou mesmo alguém delegado por ele). Por outro lado quando o conflito é esta complicado de resolver, recorre-se ao CMCL para dar segmento o caso, nestes termos o Município é quem tem o poder de decisão. Assim quem detém o poder de decisão final são os LCs e o CMCL apenas. Outra questão efectuada para os entrevistados foi a seguinte: As decisões nesse encontro têm sido integralmente cumpridas pelas partes conflituantes? No caso negativo quais tem sido as acções de segmento tomadas pelas partes conflituantes? Respostas LCs CMCL Os residentes dos bairros R1: Sim. R2:Sim. R3:Sim R1: Nem sempre. R1: Sim. R2: Sim. R3:Sim. Quadro 10. O cumprimento das decisões tomadas. Fonte: Autor, 2023. De acordo com as respostas a maior parte dos informantes afirmam que sim, e outra parte diz não. Então existe uma ligeira diferença de posicionamentos. Com isso dá a perceber que quando são resolvidos os conflitos de terra na cidade de Lichinga a maior parte tem cumprido com o que foi determinado aquando da resolução. Em suma os resultados apresentados dão claramente a perceber que na cidade de Lichinga as decisões que são tomadas aquando da resolução dos conflitos de terra têm sido cumpridas não na sua totalidade mas, os resultados sãosatisfatórios. 36 4.3. As Particularidades na Actuação dos Líderes Comunitários Enquanto Actores no Acesso à Terra e na Gestão de Conflitos de Terra Nesta secção procura-se trazer o levantamento das particularidades que existem na actuação dos Líderes Comunitários, tendo em conta a sua actuação no acesso a terra e na gestão dos conflitos de terra. A actuação dos LCs é tida como desafiadora, uma vez que as mesmas figuras no momento de atribuição das parcelas intervêm como um dos elementos centrais mas, também no momento da resolução de algum tipo de conflito sobre a terra desta mesma zona por ele atribuída. Assim, por serem os mesmos actuando nestes dois processos há uma provável falta de justiça neste processo no momento da acção e ou resolução dos conflitos, mas também podem existir melhores formas de resolução uma vez que o actor é mesmo, pois ele certamente tem noção dos limites de cada membro da comunidade, não deixando de lado que ele participou no momento da atribuição da parcela. Na figura de um líder comunitário sabendo do seu poder que exerce dentro da comunidade em algum momento a resolução dos conflitos é de acordo com a sua vontade de modo a que não saia com uma reputação manchada, para tal em alguns casos mesmo sabendo quem realmente merece ganhar o caso ele acaba por influenciar o outro lado só para manter a sua imagem. O que acontece no processo de acesso a terra, muitas vezes a pessoa que quer a parcela é obrigado a aceitar os parâmetros dados pelos LCs, uma vez que depende deles para obter a parcela. Em casos de futuros conflitos haverá uma tendência não positiva de resolver o caso, de acordo com a maneira ou a forma que a pessoa teve acesso a parcela, ainda assim uma vez que foi a mesma figura a intervir neste processo, a resolução vai ser tendo em conta a pessoa e não as circunstâncias legais e ou tradicionais de resolução de conflitos de terra que devem ser devidamente seguidas, sob o risco da própria população acabar por não estar a favor da decisão. A fraca interacção entre os órgãos de governação local e o Estado (como o caso do CMCL) nos processos de acesso a terra e na resolução dos conflitos de terra fazem destes processos não legalmente aceites uma vez que em acções que envolveriam os dois apenas um faz sem o outro, e quando é assim dificilmente poderá notar-se avanços de modo a que sejam bem geridos os territórios. O líder comunitário no acesso a terra realiza actividades que normalmente seria outra entidade a fazer e por sua vez acaba por realizar duas actividades em simultâneo uma que lhe diz respeito e a outra que não. 37 As acções se fossem de forma plasmada na Lei, estes dois processos (o acesso e a gestão de conflitos de terra) seriam definitivamente justos e bem executados sem nenhum tipo de reclamação, pois a legislação tem todos os seus pontos revisados de modo que a gestão dos territórios seja bem feito e que ajude assim a promover o desenvolvimento dos respectivos territórios. 38 5. Conclusões Através da pesquisa pode-se concluir que as particularidades existentes na actuação dos líderes comunitários no processo de acesso à terra são: indicar e seleccionar os lugares que podem ser atribuídos as parcelas; fazer o levantamento das informações básicas da pessoa que pretende a parcela de terra; determinar se podem ou não atribuir a parcela e, por sua vez garantir a segurança pela posse da terra. E na gestão de conflitos de terra os LCs incentivam a aquisição de DUAT; eles são os atores principais da gestão dos conflitos de terra; são os que detém o poder de decisão final aquando da resolução dos conflitos. O papel dos líderes comunitários no processo de acesso à terra na cidade de Lichinga é fundamental uma vez que, deve-se recorrer a eles para ter acesso a parcela de terra, também os mesmos têm estado presentes no momento de indicação e selecção das áreas que reúnem melhores condições para habitação e para a prática da agricultura. Os LCs trabalham de modo a que os que pretendem parcelas para erguer habitações estejam dentro da política do ordenamento territorial da cidade e que o tipo da edificação seja do conhecimento deles. As atribuições dos líderes comunitários no processo de gestão de conflitos de terra fazem parte de uma realidade que não pode ser deixada de lado pois, a quando da resolução dos diferendos os LCs primeiro começam a explicar as pessoas presentes e aos conflituantes quais são as regras de convivência da zona, e de seguida ouvem as duas partes envolvidas, e dai dão o veredicto final. Assim os Líderes comunitários são os que procuram formas de resolução do problema, e que também os mesmos têm o papel de mediadores do problema, de modo a que reduzam a violência no seio das comunidades, consequentemente neste processo todo da resolução dos conflitos de terra quem detém o poder de decisão final são eles (os líderes comunitários). Na cidade de Lichinga as decisões que são tomadas pelas ACs aquando da resolução dos conflitos de terra têm sido cumpridas a 98%. 39 6. Referencias Bibliográficas Adamo, M. A. (2003). “Mercado de terras nas áreas urbanas, sua implicação na ocupação e uso de terra: estudo de caso da área periurbana da cidade da Matola”, Maputo – UEM. Alfredo, B. (2009). Alguns Aspectos do Regime Jurídico da posse e do Direito de Uso e Aproveitamento da Terra e os Conflitos Emergentes em Moçambique. UNISA. Andrade, A. (2014). A Perspectiva Sociológica da Resolução de Conflitos no Estudo do Comportamento Frente as Instituições. Tese Apresentada ao Curso do Doutorado em Sociologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial de obtenção do título de Doutor em Sociologia. Belo Horizonte. Bruce, J. W. (1992), “Questões de Posse da Terra em África: Uma visão global”. Extra especial. Carrilho, João. 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O PAPEL DOS LÍDERES COMUNITÁRIOS NO ACESSO À TERRA 1.1. Querendo uma parcela de terra, a quem posso recorrer? 1.2. Como tem participado no processo de acesso a terra? 1.3. Quais são as funções/atribuições do líder no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional? 1.4. E em que consiste ou qual é a atribuição do Município no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional? 1.5. Neste bairro tem havido problemas relacionados com a segurança pela posse de terra?sim ou não, justifique-se. 1.6. O que o líder tem feito para garantir a segurança pela posse de terra doutros membros da comunidade de modo a que não sejam invadidos por novas ocupações? II. ATRIBUIÇÕES DOS LÍDERES COMUNITÁRIOS NA GESTÃO DE CONFLITOS DE TERRA 2.1. Tem havido conflitos pela ocupação de parcelas de terra na área que lidera? a) Se sim, Quais tem sido as causas dos conflitos pela ocupação de terra? 2.1.1. Quais tem sido os envolvidos? 2.2. Como têm sido resolvidos esses conflitos de terra? 2.3. Quem são os intervenientes que participam na resolução? 2.4. Quais são as atribuições do líder neste processo de resolução? 2.5. Quem tem o poder de decisão final? 2.6. As decisões nesse encontro têm sido integralmente cumpridas pelas partes conflituantes? no caso negativo quais tem sido as acções de seguimento tomadas pelas partes conflituantes? 2.6. Pela sua experiência de trabalho como líder, quais são as sugestões que aponta para a redução dos conflitos pela ocupação de parcelas de terra? Fim! 43 GUIÃO DE ENTREVISTA PARA O CONSELHO MUNICIPAL DA CIDADE DE LICHINGA Dados pessoais Nome:………………………………………………………………………………………… Sexo:…..;Idade:………;Profissão:………; Nível de escolaridade:……; Área de formação:.......... Questões I. O PAPEL DOS LÍDERES COMUNITÁRIOS NO ACESSO À TERRA 1.1. Querendo uma parcela de terra, a quem posso recorrer? 1.2. Como o Município tem participado no processo de acesso a terra para fins habitacionais? 1.3. Quais são as funções/atribuições do líder comunitário no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional? 1.4. E em que consiste ou qual é a atribuição do Município no processo de aquisição de parcela de terra para fim habitacional? 1.5. Tem conhecimento da existência de problemas relacionados com a segurança pela posse de terra? se sim, qual é a causa? 1.6. O que o Município tem feito para garantir a segurança pela posse de terra? 1.7. O que o líder poderia fazer para garantir a segurança pela posse de terra doutros membros da comunidade de modo a que não sejam invadidos por novas ocupações? II. ATRIBUIÇÕES DOS LÍDERES COMUNITÁRIOS NA GESTÃO DE CONFLITOS DE TERRA 2.1. Tem conhecimento da existência de conflitos pela ocupação de parcelas de terra na cidade de Lichinga? a) Se sim, quais tem sido as causas dos conflitos pela ocupação de terra? b) Quais tem sido os envolvidos? 2.2. Como têm sido resolvidos esses conflitos de terra? 2.3. Quem são os intervenientes que participam na resolução? 2.4. Quais são as atribuições do líder neste processo de resolução? 2.5. Quem tem o poder de decisão final? 2.6. Qual é o papel do Município na resolução de conflitos de terra? 2.7. Pela sua experiência de trabalho, quais são as sugestões que aponta para a redução dos conflitos pela ocupação de parcelas de terra? Fim! 44 GUIÃO DE ENTREVISTA PARA OS MEMBROS DA COMUNIDADE Dados pessoais Nome:………………………………………………………………………………………… Sexo:…...;Idade:………; Nível de escolaridade:..............; Tempo de Residência no bairro:............ Questões I. O PAPEL DOS LÍDERES COMUNITÁRIOS NO ACESSO A TERRA 1.1. Querendo uma parcela de terra, a quem posso recorrer? 1.2. Pela sua experiência, qual é o papel do líder no processo de acesso a terra para fim habitacional? 1.3. Tem conhecimento da existência de problemas relacionados com a segurança pela posse de terra? Se sim, qual é a causa? 1.4. Tem conhecimento de algumas acções desenvolvidas pelo líder para garantir a segurança pela posse de terra? II. ATRIBUIÇÕES DOS LÍDERES COMUNITÁRIOS NA GESTÃO DE CONFLITOS DE TERRA 2.1. Quais tem sido as causas dos conflitos pela ocupação de terra? 2.1.1. Qual foi a causa do conflito pela ocupação de terra em que esteve envolvido? 2.2. Pedimos para indicar os atores envolvidos na resolução desse conflito? 2.3.Como têm sido resolvidos esses conflitos de terra? 2.4. Quais são as atribuições do líder comunitário neste processo de resolução? 2.5. Pela sua experiência, quem tem o poder de decisão final? 2.6. Pela sua experiência, Qual é o papel do Município na resolução de conflitos? 2.7. Pela sua experiência, que sugestão aponta para a redução dos conflitos pela ocupação de parcelas de terra? Fim! Apêndice 2: Fotos com os líderes comunitários de Mitava. 45 Apêndice 3: Perfil dos entrevistados Lista dos entrevistados 1. Artísio Leutério Jacinto Uane Magenge - Director da Urbanização do CMCL, Engenheiro de construção civil, de 40 anos de idade. Entrevistado no dia 26 de Abril de 2023. 2. Wodala Selemane - De 62 anos de idade, Régulo de Chiulugo a 6 anos. Entrevistado no dia 27 de Abril se 2023. 3. Saisse Alique - De 60 anos de idade, Régulo de Mitava a 10 anos. Entrevistado no dia 30 de Abril de 2023. 4. Saide Momade – de 54 anos de idade, Secretário do Bairro Mitava a 4 anos. Entrevistado no dia 30 de Abril de 2023. 5. Ajoana Samite Aweto - De 51 anos de idade, Residente do Bairro Mitava a 51 anos. Entrevistada no dia 01 de Maio de 2023. 6. Ajaba Hamza – de 29 anos de idade, Residente do Bairro Mitava a 10 anos. Entrevistado no dia 30 de Abril de 2023. 7. Abdala Narito Asside - de 52 anos de idade, Residente do Bairro Chiulugo a 32 anos. Entrevistado no dia 29 de Abril de 2023. 8. Cândida Machido - De 29 anos de idade, Residente do Bairro Chiulugo a 29 anos. Entrevistada no dia 27 de Abril de 2023. 9. Aneninha