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Doença renal crônica (DRC) A doença renal crônica diz respeito a um espectro de anormalidades clínicas que agravam progressivamente a medida que a função renal diminui. A DRC é resultante de um grande número de doenças sistêmicas que danificam os rins ou são intrínsecas a esses órgãos. Clinicamente, a DRC define-se com taxa de filtração glomerular persistente abaixo de 60 mL/min/1,73m². Na DRC, a lesão renal não costuma ser reparada (ou seja, é irreversível), e assim, a perda de função persiste. O fato de não se fazer essa correção, distingue a DRC da lesão renal aguda, que pode ser corrigida e permitir o retorno da função renal. A perda dessa função renal danifica ainda mais as lesões renais e anormalidades clínicas mais graves. Assim, a DRC piora de forma progressiva, mesmo caso a “doença de base” seja resolvida. A DRC descreve um espectro de disfunção clínica que varia de anormalidades detectáveis apenas em exames laboratoriais, até a uremia, sendo a uremia definida como urina no sangue, como resultado do acúmulo de metabolitos não excretados e das anormalidades metabólicas que induzidas por eles. Quando o rim deixa de realizar a maioria de suas funções, o estado clínico fica conhecido como doença renal em estágio terminal, sendo os transplantes ou diálise necessários para manutenção da vida. Já a DRC crônica e progressiva permite instituir estratégias de tratamento que possam retardar a perda da função renal. Epidemiologia Segundo dados da Sociedade Brasileira de Nefrologia, a prevalência da doença renal crônica no mundo é de 7,2% para indivíduos acima de 30 anos e 28% a 46% em indivíduos acima de 64 anos. No Brasil, a estimativa é de que mais de dez milhões de pessoas tenham a doença. Desses, 90 mil estão em diálise (um processo de estímulo artificial da função dos rins, geralmente quando os órgãos tem 10% de funcionamento), número que cresceu mais de 100% nos últimos dez anos. No Brasil, a primeira causa de DRC é a hipertensão arterial sistêmica, em segundo a diabetes, seguido por glomerulonefrite crônica. Já nos EUA, observa-se o diabetes como principal etiologia da DRC, seguido por HAS e glomerulonefrites. Fatores de risco É importante reconhecer os fatores que aumentam o risco de DRC, mesmo nos indivíduos com TFG normal. Os fatores de risco incluem baixo peso ao nascer para a idade gestacional, obesidade infantil, hipertensão, diabetes melito, doença autoimune, idade avançada, descendência africana, história familiar de doença renal, episódio prévio de lesão renal aguda e existência de proteinúria, sedimento urinário anormal, ou anormalidades estruturais do trato urinário • Glomeruloesclerose diabética: excesso de glicose no sangue lesiona os capilares glomerulares, induzindo a oxidação. • Nefroesclerose hipertensiva: o aumento da pressão nos vasos também lesa a parede dos capilares. Fisiopatologia Primeiramente é importante conhecer o conceito da “hipótese do néfron intacto”. A hipótese do néfron intacto mantem cada uma das funções do néfron como uma unidade independente, de modo que a soma da função de todos os néfrons remanescente determina a TFG do rim, a estimativa mais precisa da função renal. A hipótese do nefron auxilia a explicar a importância da TFG como uma medida da função renal que resta. O néfron formado por glomérulo, túbulo proximal, alça de Henlle túbulo distal e ducto coletor, e cada indivíduo nasce com 0,75 a 1,25 milhões de néfrons em cada rim. Se os néfrons forem perdidos, os novos não são regenerados. A fisiopatologia da DRC caracteriza-se por dois grupos de mecanismos lesivos: 1. Mecanismos iniciais específicos de etiologias subjacentes ( por exemplo: anormalidades do desenvolvimento ou da integridade renal, deposição de imunocomplexos e inflamação em alguns tipos de glomerulonefrite, ou exposição a toxinas em algumas doenças dos túbulos e do interstício renais) 2. Hiperfiltração e hipertrofia dos néfrons viáveis, que são consequência da redução da massa renal a longo prazo. A medida que acontece dano renal progressivo e destruição dos néfrons, os outros néfrons são sobrecarregados e inicia-se a hiperfiltração glomerular para compensar a diminuição da TFG. As respostas a redução da quantidade de néfrons são mediadas por hormônios vasoativos, citocinas e fatores de crescimento. Por fim, essas adaptações de curto prazo (hipertrofia e hiperfiltração) para manter a TFG tornam-se mal adaptativas a medida que a pressão e o fluxo sanguíneo aumentados dentro do néfron predispõe uma distorção da arquitetura dos glomérulos, função anormal dos podócitos e rompimento da barreira de filtração que leva a destruição dos néfrons remanescentes e esclerose. Ou seja, os néfrons remanescente começam a sofrer fibrose e atrofia. Como já sabemos, as funções fisiológicas e metabólicas do rim incluem regulação da pressão arterial, das funções endócrinas e das concentrações de íons nos líquidos extracelulares e intracelulares, além da excreção de escorias. Em resposta a DRC em que todas as funções acima estão prejudicadas. Por exemplo, o balanço que significa o estado em que a ingestão ou a produção de uma substância é equivalente à sua eliminação. A capacidade de excretar sódio diminui, mas os néfrons restante conseguem aumentando a fração de excreção, no entanto, a capacidade de atingir o equilíbrio entre aporte e excreção é limitada, e se o equilíbrio de sódio for positivo porque a ingestão de sódio excede sua excreção, ocorrerão hipertensão arterial sistêmica e edema. Progressão da doença renal crônica Mesmo quando a doença de base que inicialmente danificou o rim não está mais ativa, a função renal continua a cair, provavelmente porque a hipertensão sistêmica, lesão renal hemodinâmica, proteinúria e acúmulos de nefrotoxinas contribuem para a lesão progressiva. A hipertensão crônica está associada a lesão isquêmica aos glomérulos devido a transmissão da pressão arterial para a arteríola aferente e glomérulo, causando glomeruloesclerose. O tratamento eficaz da hipertensão retarda a progressão da DRC. A lesão glomerular associada a angiotensina II surge da constrição preferencial da arterial eferente. O desbalanço na vasoconstrição aumenta a pressão intracapilar e aumenta a TFG, mas esse aumento de TFG se dá a custa de danos capilares. Visto que a angiotensina é a mediadora da constrição arteriolar eferente que causa danos aos capilares quando está tentando compensar, os inibidores de enzima conversora de angiotensina e os bloqueadores de angiotensina podem prevenir tanto a hiperfiltração quanto o dano renal. Manifestações Hipertensão: A hipertensão em pacientes com DRC reflete, em grande parte, a expansão do volume extracelular devido a uma dieta rica em sal em conjunto com o comprometimento da capacidade de excretar sódio; a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona também desempenha um papel. A resposta normal ao sódio retido é um aumento do volume extracelular, que eleva a pressão arterial e aumenta a excreção de sódio, provocando um equilíbrio entre a ingestão de sódio e excreção de sal. No novo estado estável dinâmico, no entanto, o equilíbrio de sal pode apenas ser mantido enquanto a pressão arterial for alta. Outro mecanismo para o desenvolvimento da hipertensão em pacientes com DRC é a ativação do sistema renina- angiotensina-aldosterona e do sistema nervoso simpático, conforme evidenciado pelos níveis circulantes de renina e aldosterona que estão muito altos para indivíduos que são hipertensos. Os inibidores do sistema renina-angiotensina-aldosterona retardam a perda da função renal. Doenças endócrinas: a DRC reduz a capacidade da insulina de estimular a captação de glicose pelos músculos, denominando-se de resistência a insulina. O resultado é aumento transitório da glicemia que causa elevação compensatória na liberaçãode insulina para manter glicemia normal. Outro mecanismo que afeta o estado endócrino do paciente com DRC é o comprometimento da capacidade do rim de degradar as proteínas de pequeno porte, incluindo vários hormônios. Por exemplo, os pacientes diabéticos com DRC podem progressivamente perder a capacidade de degradar a insulina e podem até mesmo desenvolver hipoglicemia se forem tratados com sua dose habitual de insulina. Manifestações ósseas: a redução da TFG diminui a excreção de fosfato, causando retenção desse elemento, o fosfato retido estimula a síntese de FGF (fator de crescimento fibroblástico) por osteócitos e de PTH e o crescimento de paratireoides, no entanto conduz a diminuição dos níveis de calcitrol. Todos esses fatores levam ao hiperparatireoidismo. As manifestações clínicas do hiperparatireoidismo grave consistem em dor e fragilidade ósseas, tumores marrons, síndromes compressivas e resistência à eritropoietina (EPO), em parte relacionada com a fibrose da medula óssea. Acúmulo de toxinas urêmicas: dietas com alimentos ricos em proteínas faz com que estes sejam metabolizados em aminoácidos usados na formação dos estoques proteicos. Os aminoácidos são metabolizados para formar a ureia ou produtos potencialmente tóxicos que são excretados quando a função renal está normal. A fisiopatologia da síndrome urêmica pode ser dividida em três esferas de manifestações disfuncionais: (1) distúrbios secundários ao acúmulo das toxinas normalmente excretadas pelos rins; (2) anormalidades consequentes à perda das outras funções renais, como a homeostase hidreletrolítica e a regulação hormonal; e (3) inflamação sistêmica progressiva e suas consequências vasculares e nutricionais Anemia: as células renais produzem a eritropoietina, assim, a hematopoiese das hemácias depende do estímulo da eritropoietina à medula óssea. Quando não tem esse hormônio, não se produz hemácias e causa anemia. Manifestações clínicas A manifestação clínica pode ser assintomática ou oligossintomática. Em geral: pele seca, prurido, equimoses, palidez e soluços. Urinarias: noctúria, opisúria, hematúria e proteinúria. As manifestações clinicas e laboratoriais incluem: acumulo de escórias nitrogenadas; distúrbios hidreletrolíticos e acidobásicos; distúrbios minerais e ósseos; anemia e distúrbios da coagulação; hipertensão e alterações da função cardiovascular; distúrbios gastrintestinais; complicações neurológicas; distúrbios dermatológicos; e distúrbios do sistema imune. Estadiamento Estágio 1: Os rins ainda funcionam bem, mas aparece já um sinal da lesão, como proteína na urina. Estágio 2: Os rins têm uma leve diminuição no seu funcionamento. Assim como na fase 1, é importante ter o diagnóstico de doença renal crônica para tratar e prevenir o agravamento para os estágios mais avançados. Estágio 3: Os rins perdem sua eficiência de maneira moderada e já começam a surgir os primeiros sintomas da doença renal crônica. Estágio 4: O funcionamento do rim já está bastante prejudicado e exige mais cuidados. Estágio 5: É a fase da insuficiência renal, onde os rins já não funcionam mais. É neste estágio em que se iniciar o tratamento com a terapia renal substitutiva, como a diálise ou o transplante Diagnóstico Caso haja suspeita de DRC, a ênfase deve ser colocada na obtenção de um histórico de hipertensão, anormalidades urinárias e o tratamento com medicamentos que possam afetar a função renal. O histórico familiar deve enfocar a presença de familiares com doenças renais, cálculos renais ou cirurgia envolvendo o trato urinário, bem como diabetes e hipertensão. O exame físico deve incluir as aferições da pressão arterial em posição deitada e de pé em ambos os braços e uma pesquisa de achados associados à DRC, tais como anormalidades da pele, prurido persistente, rins policísticos palpáveis, evidências de diminuição da massa corporal magra, edema periférico e anormalidades neurológicas. Exame microscópico: achados de eritrócitos e cilindros eritrocitários no sedimento urinário pode refletir lesão. Cilindros granulares finos e proteínas, sugerem doença renal diabética. Microalbuminúria é definida como 30 a 300mg de albumina/24 horas, em uma amostra de urina em pelo menos duas amostras separadas por três meses. E a macroalbuminúria indica DRC avançada. Outros achados são: Os exames bioquímicos sanguíneos devem incluir os níveis de sódio, potássio, cloreto, bicarbonato, cálcio, fósforo, fosfato alcalino, PTH e ácido úrico. Os níveis sanguíneos de glicose e hemoglobina A1c devem ser monitorados em pacientes diabéticos. Em pacientes com suspeita de vasculite ou glomerulonefrite, a testagem frequentemente inclui medições de anticorpos antinucleares (ANA), anticorpos contra DNA de fita dupla, complemento sérico e níveis de anticorpos contra citoplasma de neutrófilos, bem como marcadores de hepatite A, B e C. Exames de imagem: Ultrassonografia dos rins e da bexiga. Os rins aumentados sugerem que a DRC deve-se ao diabetes, à nefropatia associada ao HIV ou doenças infiltrativas. Rins pequenos sugerem doença glomerular. Tratamento A restrição da ingesta alimentar de sal e a utilização dos diuréticos de alça, algumas vezes em combinação com metolazona, podem ser necessários para manter a euvolemia. A restrição hídrica está indicada apenas quando há hiponatremia. A hiperpotassemia costuma responder à restrição de potássio na dieta, ao uso de diuréticos caliuréticos e à evitação de suplementos de potássio (incluindo fontes ocultas, como substitutos de sal na dieta), bem como à diminuição da dose ou à evitação de medicamentos retentores de potássio (especialmente os inibidores da enzima conversora de angiotensina [ECA] ou bloqueadores do receptor de angiotensina [BRAs]). Os diuréticos caliuréticos estimulam a excreção urinária do potássio, enquanto as resinas de captação do potássio (p. ex., resonium cálcico, poliestireno de sódio ou patirômero) podem promover a perda de potássio pelo trato GI, podendo reduzir a incidência de hiperpotassemia. A hiperpotassemia intratável é uma indicação (embora rara) para considerar a instituição da diálise nos pacientes com DRC. A acidose tubular renal e a subsequente acidose metabólica com anion gap da DRC progressiva respondem à suplementação alcalina, em geral com bicarbonato de sódio. Estudos recentes sugeriram que essa reposição deva ser considerada quando a concentração sérica do bicarbonato cai a menos de 20-23 mmol/L para evitar o estado de catabolismo proteico observado mesmo com graus leves de acidose metabólica e para retardar a progressão da DRC. Referências: Goldman Cecil Medicina Medicina interna Harrison Biblioteca virtual da saúde
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