Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
TEMA: FISIOLOGIA CARDIOVASCULAR E EXERCÍCIO 1. INTRODUÇÃO O sistema cardiovascular é um sistema de transporte de material que auxilia na manutenção da homeostase do organismo. Nesse sistema, o coração desempenha um papel fundamental, bombeando sangue arterial (oxigenado) para os tecidos e sangue venoso para ser oxigenado nos pulmões. É um sistema que consegue se ajustar a diferentes tipos de estímulos – como, por exemplo, o exercício físico. Durante o exercício físico, ocorrem várias alterações (como aumento da frequência e débito cardíacos) no sistema cardiovascular com a finalidade de atender ao aumento da demanda metabólica do músculo esquelético. Com o tempo, o exercício físico acarreta diversas adaptações nesse sistema, como a bradicardia de repouso, trazendo vários benefícios à saúde. Adaptações cardiovasculares também são verificadas em populações especiais, como em cardiopatas, hipertensos e diabéticos que praticam atividade física. Porém, pensando nos benefícios cardiovasculares desencadeados pelo exercício físico nessas populações especiais, surgem vários questionamentos: que tipo de exercício estas populações podem realizar? Em qual intensidade, frequência, duração? Quais cuidados devem ser tomados para que a prática de atividades físicas não traga riscos a estas populações? O objetivo dessa aula é esclarecer estes e outros questionamentos relacionados ao sistema cardiovascular, ao exercício físico e às populações especiais, buscando aliar conceitos teóricos e práticos que auxiliem no dia-a-dia profissional. 2. SISTEMA CARDIOVASCULAR: FUNÇÕES E CARACTERÍSTICAS O sistema cardiovascular pode ser definido como uma rede de transporte de material que colabora para a manutenção da homeostase do organismo. O corpo humano possui três compartimentos de água: o intersticial, o intracelular e o plasmático, que juntos são denominados de água corporal total e representam cerca de 60% do peso corporal. Observamos que, dentro do sistema cardiovascular, circula apenas o volume plasmático (sangue), o qual se comunica com o líquido intersticial através das paredes dos pequenos vasos (capilares) dentro dos órgãos. Essa comunicação permite a regulação do líquido intersticial, que auxilia na nutrição e liberação de metabólitos das células. Ela se dá por meio do processo de difusão, troca de soluto entre plasma e líquido intersticial, o que faz com que o líquido intersticial adquira a composição do sangue que chega (arterial) (MOHRMAN & HELLER, 2007). O coração pode ser descrito como uma bomba dupla, que move o sangue sequencialmente por uma circulação pulmonar (coração direito) e por uma circulação sistêmica (coração esquerdo). A parede cardíaca é composta, predominantemente, por fibrócitos e células musculares estriadas cardíacas, além de matriz extracelular. A espessura da parede de cada câmara cardíaca é relacionada diretamente à sua função. Os átrios, que desenvolvem baixas pressões, apresentam parede relativamente fina. Já os ventrículos, que desenvolvem pressões maiores, apresentam parede consideravelmente mais espessa. Nesse caso, o ventrículo esquerdo, responsável pela alta pressão da circulação sistêmica, tem parede mais espessa que a do ventrículo direito, que não necessita desenvolver pressão muito elevada para bombear sangue pela circulação pulmonar. As valvas são estruturalmente projetadas para permitir o fluxo em apenas uma direção, bem como abrir e fechar passivamente em resposta à direção das diferenças de pressão através delas (LACHINI & IRIGOYEN, 2008). O fluxo sanguíneo no coração (Figura 1) se inicia com a chegada do sangue venoso, vindo dos órgãos, no átrio direito, através das veias cavas superior e inferior. O sangue passa da valva tricúspide para o ventrículo direito, sendo bombeado através da valva pulmonar para as artérias pulmonares e, por fim, para a circulação pulmonar. O sangue venoso pulmonar oxigenado flui das veias pulmonares para o átrio esquerdo, passando pela valva mitral até chegar ao ventrículo esquerdo. Do ventrículo esquerdo é bombeado através da válvula aórtica para a aorta, a fim de ser distribuído para os órgãos sistêmicos (MOHRMAN & HELLER, 2007). As ações de contração do ventrículo esquerdo e ejeção de sangue pela aorta são denominadas sístole, enquanto o relaxamento do coração com a chegada de sangue no ventrículo direito é denominado diástole. A ação eficiente de bombeamento do coração requer uma coordenação precisa da contração das células isoladas do músculo cardíaco, o que ocorre quando um impulso elétrico excitatório (potencial de ação) passa rapidamente sobre sua membrana. Esse potencial é conduzido de uma célula para a outra através de sinapses (gap junctions) que conectam todas as células do coração a um sincício funcional (atuando como uma unidade sincrônica). Além disso, as células musculares em determinadas áreas do coração apresentam especializações para o controle da frequência da excitação cardíaca, da via de condução e da taxa de propagação do impulso através das várias regiões do coração. Esses componentes especializados incluem: nodo sinoatrial (nodo AS), nodo atrioventricular (nodo AV), feixe de His e ramos do feixe direito e esquerdo compostos por células especializadas denominadas fibras de Purkinje (MOHRMAN & HELLER, 2007). Figura 2 – Via do fluxo sanguíneo no coração. (Fonte: WECKER, 2010). O nodo SA contém células especializadas que funcionam como o marca-passo cardíaco; elas iniciam o potencial de ação conduzido através do coração. O nodo AV contém células de condução lenta que criam um pequeno atraso entre a contração atrial e a contração ventricular. As fibras de Purkinje apresentam condução rápida e asseguram que todas as células ventriculares se contraiam aproximadamente no mesmo instante (LACHINI & IRIGOYEN, 2008). A ação do coração é influenciada, ainda, tanto pelo sistema nervoso autônomo simpático quanto pelo parassimpático, dependendo das necessidades homeostáticas do organismo. O coração é inervado por fibras simpáticas adrenérgicas, as quais, quando ativas, liberam norepinefrina (noradrenalina) nas células cardíacas. A norepinefrina interage com os receptores β1– adrenérgicos nas células cardíacas, aumentando a frequência cardíaca, a velocidade de condução do potencial de ação, bem como a força e a frequência de contração e relaxamento (MOHRMAN & HELLER, 2007). As fibras colinérgicas do sistema parassimpático chegam ao coração através do nervo vago, inervando os nodos SA, AV e o músculo atrial. Quando ativo, há liberação de acetilcolina nas células cardíacas. A acetilcolina interage com os receptores muscarínicos nas células do músculo cardíaco, diminuindo a frequência cardíaca (nodo SA), a velocidade de condução do potencial de ação (nodo AV) e, em alguns casos, a força de contração das células musculares atriais (LACHINI & IRIGOYEN, 2008). Figura 2: Sistema cardíaco de excitação e condução. (Fonte: CAPONE NETO, 2000). Em geral, um aumento da atividade nervosa simpática é acompanhado de uma redução da atividade parassimpática e vice-versa (LACHINI & IRIGOYEN, 2008). O sistema cardiovascular é composto, também, por diversos tipos de vasos sanguíneos, os quais podem ser denominados artérias, arteríolas, capilares, vênulas e veias. Estes se distinguem por diferenças nas dimensões físicas, características morfológicas e função, sendo o leito vascular algo contínuo, decorrente de uma transição gradual de um tipo de vaso para o outro, como descrito a seguir, segundo MOHRMAN & HELLER (2007). As artérias são vasos de paredes espessas, compostas de músculo liso, fibras de elastina e colágeno; são chamadas de vasos condutores porque apresentam resistência relativamente baixa ao fluxo sem sofrer alterações. As arteríolas são menores e apresentam proporcionalmente otamanho do lúmen e paredes mais espessas, com mais músculo liso e menos material elástico, quando comparadas às artérias. As arteríolas são denominadas vasos de resistência, devido a sua alta e mutável resistência, que regula o fluxo sanguíneo periférico. Os capilares representam os menores vasos sanguíneos, com uma única camada de células endoteliais, as quais separam o sangue do líquido intersticial em cerca de apenas 1 µm. São denominados vasos de troca e possuem uma área de superfície total de troca entre sangue e líquido intersticial de cerca de 100 m2. Após deixar os capilares o sangue é encaminhado por vênulas e veias, retornando ao coração. Os vasos venosos apresentam paredes finas e músculo liso; são chamados de vasos de capacitância, pois, em situações como durante um exercício, as vênulas e veias chegam a conter mais de 50% do volume sanguíneo total. O fluxo sanguíneo através dos vasos sofre influência do sistema nervoso simpático, que inerva as arteríolas. O sistema nervoso simpático libera noradrenalina, substância que interage com os receptores α-adrenérgicos nas células do músculo liso provocando constrição arteriolar. A redução do diâmetro arteriolar aumenta a resistência vascular e diminui o fluxo sanguíneo, representando o controle reflexo da resistência vascular e do fluxo sanguíneo de um órgão. As veias e vênulas também são bastante inervadas pelo sistema nervoso simpático, acarretando vaso constrição e aumento do débito cardíaco. Não há controle neural importante nas artérias ou capilares. 3. CONCEITOS RELACIONADOS AO SISTEMA CARDIOVASCULAR No sistema cardiovascular, determinados conceitos são de fundamental importância para a compreensão e a manipulação de estratégias que otimizem sua função. A seguir, são apresentados alguns desses conceitos de acordo com RONDON et al (2010). O débito cardíaco (DC) é caracterizado pela quantidade de sangue bombeada pelos ventrículos a cada minuto. Ele se relaciona diretamente às alterações do volume sistólico (VS) e à quantidade de sangue ejetada pelo ventrículo esquerdo a cada batimento cardíaco; relaciona-se também à frequência cardíaca (FC), número de batimentos cardíacos por minuto, da seguinte maneira: DC = VS x FC Podemos, então, verificar aumento ou redução do débito cardíaco de acordo com o comportamento do VS e da FC. O VS, por exemplo, é o resultado da diferença entre o volume diastólico final e o volume sistólico final (VS = diastólico final - volume sistólico final), sendo seu aumento ou redução atrelado a esses parâmetros. Já a FC é influenciada pelo sistema nervoso autônomo simpático e parassimpático e pela FC intrínseca de marca-passo (contribuição do nodo SA). Na bradicardia de repouso desencadeada pelo treinamento físico aeróbico, por exemplo, há diminuição da atividade simpática, aumento da atividade parassimpática e diminuição da FC intrínseca de marca-passo. Outro parâmetro importante do sistema cardiovascular é a pressão arterial (PA), força exercida pelo sangue contra a parede interna das artérias decorrente de um batimento cardíaco. A PA refere-se a dois instantes do ciclo cardíaco: a sístole e a diástole. A PA exercida na sístole é chamada de PA sistólica (PAS) e é definida como o maior valor verificado durante a aferição da pressão arterial. Já a PA exercida na diástole é denominada PA diastólica (PAD) e consiste no menor valor verificado durante a mensuração da PA. Ressalta-se ainda o conceito de resistência vascular periférica (RVP), definida como a resistência oferecida pelos vasos à passagem de sangue. A RVP interfere na PA por meio da vasoconstrição (fechamento dos vasos), acarretando aumento da PA; ou da vasodilatação (abertura dos vasos), com consequente redução da PA. A PA pode ser representada também pela PA média (PAM), que se relaciona diretamente ao DC e RVP, como podemos observar pela seguinte equação: PAM = DC x RVP A PAM é representada também pela relação entre PAS e PAD: PAM = PAD + 1/3 (PAS – PAD) A seguir, estudaremos o comportamento desses parâmetros cardiovasculares quando da prática de exercícios físicos. 4. EXERCÍCIO FÍSICO E SISTEMA CARDIOVASCULAR O exercício físico desencadeia diferentes respostas no sistema cardiovascular de acordo com o tipo de exercício (dinâmico, estático ou resistido), sua duração e intensidade, além da massa muscular envolvida. Chamaremos o exercício físico agudo de exercício físico, e o exercício físico crônico de treinamento físico. No exercício físico dinâmico (contração muscular, seguida de movimento articular) observamos aumento da atividade simpática, o qual desencadeia aumento da FC, do VS e do DC. Há redução da RVP devido à vasodilatação (pelo acúmulo de metabólitos na musculatura ativa); com isso, há aumento da PAS e redução da PAD. Essas respostas sofrem influência da intensidade do exercício e da massa muscular envolvida (BRUM et al., 2004). Já o treinamento físico dinâmico ou aeróbico desencadeia adaptações que se expressam no sistema cardiovascular através da diminuição da resposta taquicárdica durante o exercício, bradicardia de repouso, aumento do volume sistólico tanto em repouso como durante o exercício físico (NEGRÃO et al., 1996), aumento do débito cardíaco máximo (BRANDÃO et al., 1993) e do retorno venoso (PARSSINEN & SEPPALA, 2002) e consequente redução da RVP. Os principais parâmetros cardiovasculares que sofrem adaptações com esse tipo de treinamento físico são, portanto, a FC e a PA. Além disso, a bradicardia de repouso é utilizada como um marcador de eficácia do treinamento físico aeróbio sobre o sistema cardiovascular (OLIVEIRA & KRIEGER, 2002). Na Tabela 1 encontram sumarizadas as respostas do sistema cardiovascular ao exercício e ao treinamento físico aeróbico. Tabela 1 – Respostas cardiovasculares agudas e crônicas ao exercício físico dinâmico. TIPO Agudo ou Crônico FC VS DC RVP PA Dinâmico Exercício PAS / PAD Treinamento No exercício físico estático ou isométrico, a contração muscular exerce uma força contra uma resistência imóvel, isto é, o comprimento do músculo não se altera ao exercer força (iso + métrico = mesmo comprimento) (KREIGHBAUM & BARTHELS, 1996). Nesse tipo de exercício há aumento da FC, com manutenção ou até redução do VS e pequeno acréscimo no DC. Observa-se aumento da RVP, o que ocasiona elevação acentuada da PA. Isso ocorre porque a contração muscular sustentada com o exercício estático promove obstrução mecânica do fluxo sanguíneo muscular, acúmulo de metabólitos e consequente aumento da atividade nervosa simpática. As respostas ao exercício físico estático dependem de sua intensidade e da duração e da massa muscular envolvida (BRUM et al, 2004). No treinamento físico estático também verificam-se adaptações, como redução da FC, embora de menor magnitude em comparação com o treinamento dinâmico, redução da PA (ponto de controvérsia na literatura) e do consumo de oxigênio pelo miocárdio avaliado pelo duplo-produto (PAS X FC), aumento do VS e aprimoramento da função sistólica e diastólica (SANTARÉM, 2001). FLECK (1988), em sua meta- análise, relatou que no repouso a FC, a PA e as funções sistólica e diastólica apresentam pequena ou nenhuma alteração decorrente do treinamento estático; já durante a realização do exercício físico, observa-se uma ligeira elevação do DC, devido ao aumento da FC e a uma grande elevação da PA. As respostas ao exercício e ao treinamento estático estão resumidas na Tabela 2. Tabela 2 – Respostas cardiovasculares agudas e crônicas ao exercício físico estático. TIPO Agudo ou Crônico FC VS DC RVP PA Estático Exercício / / BRUM e colaboradores (2004) destacam que, embora as respostas cardiovasculares aos exercícios físicosdinâmicos e estáticos sejam bem características, na prática diária os exercícios executados apresentam componentes dinâmicos e estáticos, de modo que a resposta cardiovascular a esses exercícios depende da contribuição de cada um desses componentes. Dessa forma, os exercícios resistidos ou de musculação (exercícios localizados contra resistências) ganham destaque, pois quando realizados com baixa intensidade apresentam predominantemente características dinâmicas; por outro lado, quando realizados em alta intensidade, mesmo com movimentos articulares, apresentam grande componente isométrico (FORJAZ et al., 2010). As respostas cardiovasculares verificadas com os exercícios resistidos assemelham-se às observadas nos exercícios estáticos: aumento da FC, redução do VS e do DC, manutenção da RVP e grande aumento da PA (BRUM et al., 2004). No treinamento resistido, as respostas cardiovasculares dependem da intensidade do exercício desenvolvido. O treinamento de baixa intensidade desencadeia adaptações semelhantes às encontradas com o treinamento físico aeróbico, porém de menor magnitude; já com o treinamento de alta intensidade, observa-se elevado componente isométrico, o que acarreta adaptações como redução ou manutenção de FC, PAS e PAD, sendo mantidos VS, DC e RVP (FORJAZ et al., 2010). Na Tabela 3, verificamos um sumário das respostas cardiovasculares ao exercício e ao treinamento resistido. Tabela 3 – Respostas cardiovasculares agudas e crônicas ao exercício físico resistido. 5. POPULAÇÕES ESPECIAIS E EXERCÍCIO FÍSICO A prática regular de exercícios físicos tem demonstrado ser um meio de proteção contra doenças cardiovasculares, reduzindo as taxas de mortalidade cardiovascular e de mortalidade associada a outras doenças crônicas, como diabetes, hipertensão ou dislipidemia (NOBRE et al., 2010). Estudos têm demonstrado que adultos que praticam exercícios físicos apresentam aumento da longevidade independente d sexo ou da idade (ANDERSEN et al., 2000). Portanto, o exercício físico é uma importante ferramenta para a prevenção e melhoria na qualidade de vida de pessoas com doenças crônicas. O tipo de treinamento físico mais amplamente recomendado é o treinamento aeróbico, o qual apresenta maiores benefícios para o sistema cardiovascular e menores riscos. Em cardiopatas, o treinamento físico aeróbico acarreta aumento na tolerância aos esforços e no VO2 de pico, redução da FC e da PA, menor progressão da placa de ateroma, entre outros benefícios (ALVES et al., 2010). Na hipertensão arterial, verifica- se redução da PA, que pode ser desencadeada por redução da atividade simpática e da FC, melhoria da vascularização e aumento do fluxo sanguíneo (RONDON et al., 2010). Observa-se também, após uma sessão de exercício físico, o fenômeno da hipotensão pós-exercício (redução da PA no período de recuperação). Alguns trabalhos têm demonstrado que o treinamento físico intervalado de alta intensidade para cardiopatas proporciona benefícios: melhora o condicionamento físico e a qualidade de vida e controla fatores de risco (ROGNMO et al., 2004; TJONNA et al., 2009). Apesar desses resultados, deve-se considerar a necessidade de mais estudos para confirmar essas repostas. Outro aspecto a ser considerado é a TIPO Agudo ou Crônico FC VS DC RVP PA Resistido Exercício Treinamento / / PAS e PAD associação de outras doenças às cardiopatias, o que pode dificultar a realização desse tipo de treinamento. O treinamento físico aeróbico também altera de forma benéfica o perfil lipídico, reduzindo a concentração de triglicerídeos e aumentando os níveis de HDL - colesterol (NUNES et al., 2010). Na obesidade, além da melhoria do perfil lipídico, o treinamento aeróbico conduz a uma melhor regulação do balanço energético, à melhora do condicionamento físico e à perda de peso, quando associado à restrição calórica (TROMBETTA et al., 2010). No diabetes, destaca-se o aumento da sensibilidade à insulina e a redução da medicação (DE ANGELIS et al., 2010), além de outros benefícios, como a já citada melhora do perfil lipídico. Os exercícios resistidos, quando feitos de maneira complementar ao treinamento aeróbico, também parecem trazer benefícios a estas populações, principalmente por melhorar a resistência vascular periférica. Os exercícios resistidos de baixa intensidade e que não atingem fadiga concêntrica promovem menor sobrecarga cardíaca e pequena elevação da pressão arterial (FORJAZ et al., 2010). Quanto aos riscos, podemos verificar que exercícios físicos extenuantes ou de alta intensidade estão associados com risco de infarto do miocárdio, desencadeado por ruptura de placa de ateroma, principalmente em indivíduos sedentários ou que se exercitam de maneira não frequente (WILLICH et al., 1993). Em exercícios resistidos de alta intensidade e/ou quando atingem fadiga concêntrica, há aumento excessivo da FC e da PA, sendo verificado risco de isquemia cardíaca logo após o término do exercício: a vasodilatação muscular reduz o retorno venoso, desencadeando queda do DC e das PAS e PAD, diminuindo a perfusão coronariana (FORJAZ et al., 2010). O aumento da PA pode, ainda, desencadear rompimento de aneurismas, causando acidentes vasculares cerebrais (VERMEER et al., 1997). Porém, o treinamento físico aeróbico e o treinamento resistido, quando executados de acordo com as recomendações, são seguros, sendo capazes de proporcionar diversos benefícios à saúde: afinal, melhoram o condicionamento e a qualidade de vida dessas populações. 6. PRESCRIÇÃO DE EXERCÍCIOS PARA POPULAÇÕES ESPECIAS A prescrição de exercícios para populações com doenças crônicas deve ser cuidadosa, considerando as características de cada doença, a interferência da utilização de remédios nas respostas ao exercício físico, a condição física do paciente e as variáveis a serem manipuladas no exercício físico (tipo, duração, intensidade). Em primeiro lugar, deve-se proceder uma avaliação clínica prévia para verificar se a doença está controlada; no caso do diabetes, deve-se verificar se há complicações associadas, para que a prescrição de exercícios físicos seja adequada e traga benefícios a essas pessoas. Segundo Alves e colaboradores (2010), a prescrição de exercícios físicos para cardiopatas deve ser realizada com base nos limiares ventilatórios fornecidos pelo teste ergoespirométrico (entre limiar anaeróbico e 10% abaixo do ponto de compensação respiratória). Na falta de uma avaliação ergoespirométrica, os autores indicam que a intensidade do exercício seja determinada pela FC de reserva (FCres), sendo aconselhável uma intensidade entre 50% e 70% da FCres. A FCres é a diferença entre FC máxima (FCmáx) e FC de repouso (FCrep), podendo ser calculada pela equação de Karvonen: FCres = (FCmáx – FCrep) x % treinamento físico + FCrep Quanto ao tipo de exercício físico, ALVES e colaboradores (2010) recomendam exercícios que utilizem grandes grupos musculares e que possam ser mantidos por prolongado período de tempo, de forma rítmica, como caminhada, corrida e ciclismo. Observam, ainda, que os exercícios resistidos de baixa a moderada intensidade (até 50% da contração voluntária máxima) podem ser praticados de maneira complementar ao treinamento aeróbico, com séries de 10 a 15 repetições, com intervalo de descanso entre as séries, auxiliando na melhora da resistência muscular. Para hipertensão, recomenda-se exercícios físicos de 3 a 6 vezes por semana, com intensidade entre 50% e 70% da FCres para indivíduos sedentários e de 60% a 80% da FCres para indivíduos condicionados e com duração de 30 a 60 minutos (RONDON et al., 2010). Os exercícios resistidos devem ser feitos de maneira complementar e não devem ultrapassar 50% da contração voluntária máxima (RONDON et al., 2010). Para diabéticos, De Angelise colaboradores (2010) recomendam exercícios físicos com base nos mesmos princípios de treinamento de indivíduos não diabéticos, desde que haja controle glicêmico, acompanhamento médico (periódico), ausência de doenças associadas, como cardiopatias, e ausência ou controle das complicações desencadeadas pelo diabetes. O diabético deve estar em bom estado de controle metabólico; o controle deve ser realizado por exames laboratoriais periódicos e por automonitoração glicêmica domiciliar. A glicemia capilar deve ser realizada antes, durante (se necessário) e após a sessão de exercícios, com o intuito de analisar a resposta individual à prática de exercícios e de orientar ajustes da alimentação e das doses de insulina necessárias para uma prática de exercícios segura. Outro cuidado a ser tomado é verificar as extremidades, para evitar ou tratar lesões não percebidas. Os mesmos autores recomendam, também, que o exercício físico seja realizado com intensidade de 40% a 60% do VO2 máximo ou 50% a 70% da FC máxima, quando realizado todos os dias; se realizado até 3 vezes por semana, pode ser utilizada intensidade maior que 60% do VO2 máximo ou maior que 70% da FC máxima; quando determinada por teste ergométrico, deve ficar entre 50% e 80% da FCres; quando determinada por teste ergoespirométrico, deve ficar entre o limiar anaeróbico e o ponto de compensação respiratória. A intensidade deve ser aumentada de maneira progressiva, o que auxilia no controle glicêmico, especialmente em diabéticos obesos, que necessitam de maior intensidade de exercício para alcançar os mesmos benefícios obtidos por diabéticos magros. Quanto ao uso de exercícios resistidos, De Angelis e colaboradores (2010) salientam que eles devem ser realizados 3 vezes por semana, envolvendo grandes grupos musculares, progredindo até 3 séries de 8 a 10 repetições. Os diabéticos que utilizam insulina devem receber, ainda, orientações quanto aos ajustes de doses de insulina e de ingestão de alimentos para a realização de atividades físicas de longa duração, pois pode haver hipoglicemia durante ou após o exercício. As recomendações para os obesos são similares às recomendações feitas aos cardiopatas, atentando para o aumento da duração do exercício, com finalidade de aumento do gasto energético e melhora da adaptação cardiovascular. Quando a obesidade estiver associada à síndrome cardiometabólica, atentar também para os cuidados com a glicemia, se houver presença de diabetes. Cuidados preventivos relativos a problemas osteomioarticulares, comuns na obesidade, devem ser adotados na tentativa de evitar lesões durante a sessão de treinamento (Trombetta et al., 2010). Para a execução dos testes ergométrico e ergoespirométrico recomendados às diferentes populações, é necessário observar que, para a realização desses testes, é preciso saber se o paciente faz uso de medicamentos, tais como betabloqueadores ou anti-hipertensivos, os quais alteram a FC e a PA durante o teste. Se sim, recomenda- se o uso desses medicamentos no dia do teste. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como visto nesta apostila, o sistema cardiovascular tem papel fundamental em nosso organismo, pois participa da nutrição e da remoção de metabólitos por meio de uma rede coordenada de transporte de material. Com o coração exercendo a função de bomba e os vasos a de rede de distribuição de sangue, o sistema cardiovascular consegue de adequar às diferentes demandas metabólicas, por meio de ajustes de parâmetros como a FC, o VS, o DC e a RVP. O exercício físico altera esses parâmetros desencadeando diversas respostas cardiovasculares de acordo com o tipo, a duração e a intensidade do exercício, além da massa muscular envolvida. Para populações especiais, como as relatadas nesta apostila, o treinamento físico aeróbico, complementado por exercícios resistidos, parece trazer benefícios efetivos à saúde. Saber como determinar a intensidade de um treinamento – utilizando, por exemplo, a FCres para a prescrição adequada – é de fundamental importância para manter a segurança e o bem-estar do indivíduo/paciente. É fundamental considerar, além das recomendações a cada população, a vontade da pessoa na escolha da atividade a ser desenvolvida: isso pode significar a aderência plena ao programa de treinamento. Por isso, bom senso e conhecimento devem caminhar juntos nas escolhas de um bom profissional! 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, G.B.; ROVEDA, F.; CAMARGO, E.W.; NUNES, N.; NERY, S.S.; SILVA., C.E.G. e OLIVEIRA, P.A. Reabilitação cardiovascular e condicionamento físico. In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. ANDERSEN, L.B.; SCHNOHR, P.; SCHROLL, M. and HEIN HO. All-cause mortality associated with physical activity during leisure time, work, sports, and cycling to work. Arch Intern Med. n.160, v.11, p.1621-8, 2000. BRANDÃO, M.U.P.; WANJNGARTEN, M.; RONDON, E.; GIOGI, M.C.P.; HIRONAKA, F.; NEGRÃO, C.E. Left ventricular function during dynamic exercise in untrained and moderately trained subjects. Journal of Applied Physiology. v.75, n.5, p.1985-95, 1993. BRUM, P.C.; FORJAZ, C.L.M.; TINUCCI, T. e NEGRÃO, C.E. Adaptações agudas e crônicas do exercício físico no sistema cardiovascular. Rev. Paul. Educ. Fís. São Paulo, v.18, p.21-31, 2004. CAPONE NETO, A. Fisiopatologia do ritmo cardíaco. In: Fisiopatologia Cardiovascular. 1ª ed., São Paulo. Atheneu, 2000. DE ANGELIS, K.; ALONSO, D.O.; RAMIRES, P.R.; MELO, K.; IRIGOYEN, M.C. e SILVA, M.E.R. Diabetes e exercício físico. In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. FLECK, S. J. Cardiovascular adaptations to resistance training. Medicine Science in Sports and Exercise. v.20, n.5, p.146-51, 1988. FORJAZ, C.L.M; REZK, C.C.; CARDOSO JUNIOR, C. G. e TINUCCI, T. Sistema cardiovascular e exercícios resistidos. . In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. KREIGHBAUM, E.; BARTHELS, K.M. Biomechanics: a qualitative approach for studying human moviment. 4ª ed., 1996. LACHINI, S. e IRIGYEN, M.C. Estrutura e função do sistema cardiovascular. In: Fisiologia. 3ª ed., Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2008. MOHRMAN, D.E. e HELLER, L.J. Visão geral do sistema cardiovascular. In: Fisiologia Cardiovascular. 6ª ed., Rio de Janeiro, McGraw-Hill Interamericana, 2007. NEGRÃO, C.E.; FORJAZ, C.L.M.; RONDON, M.U.P.B.; BRUM, P.C.; Adaptação cardiovascular ao treinamento físico dinâmico. In: SOCESP – Cardiologia, atualização e reciclagem. São Paulo, Atheneu, v.2, p.532-40, 1996. NOBRE, M.R.C.; SANTOS, L.A. e FONSECA, V.R. Epidemiologia do risco cardiovascular e atividade física. In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. NUNES, A.P.O.B.; VINAGRE, C.G.C.M. e MARANHÃO, R. C. Metabolismo de lípides plasmáticos e exercício físico. In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. OLIVEIRA, E. M.; KRIEGER, J. E. Hipertrofia cardíaca e treinamento físico. Hipertensão, v. 5, n. 2, p. 73-8, 2002. PARSSINEN, M.; SEPPALA, T. Steroid use a long-term health risks in former athletes. Sports Medicine. v.32, n.2; p.83-94, 2002. ROGNMO, O.; HETLAND, E.; HELGERUD, J.; HOFF, J. AND SLØRDAHL, S.A. High intensity aerobic interval exercise is superior to moderate intensity exercise for increasing aerobic capacity in patients with coronary artery disease. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. v.11, n.3, p.216-22, 2004. RONDON, M.U.P.B.; SANTOS, A.C.; MARTINEZ, D.G.; ALONSO, D.O.; RONDON, E. e ZAMO-ROTH, F.S. Fisiologia integrativa no exercício físico. In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. _________________; LATERZA, M.C.; ZAMO-ROTH, F.S.; BRUM, P.C. e KRIEGER, E.M. Hipertensão arterial e exercício físico aeróbio. In: Cardiologia do exercício:do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. TJONNA, A.E.; STOLEN, T.O.; BYE, A.; VOLDEN, M.; SLORDAHL, S.A.; ODEGÅRD, R. and SKOGVOLL E, WISLOFF, U. Aerobic interval training reduces cardiovascular risk factors more than a multitreatment approach in overweight adolescents. Clin Sci. v.116, n.4, p.317-26, 2009. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15179103 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15179103 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15179103 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18673303 http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18673303 TROMBETTA, I.C.; BATALHA, L.T.; NUNES, C.M. e HALPERN, A. Obesidade, síndrome cardiometabólica e exercício físico. In: Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ª ed., Barueri, Manole, 2010. VERMEER, S.E.; RINKEL, G.J. and ALGRA A. Circadian fluctuations in onset of subarachnoid hemorrhage. New data on aneurysmal and perimesencephalic hemorrhage and a systematic review. .Stroke. v.28, n.4, p.805-8, 1997. WILLICH, S,N,; LEWIS, M.; LÖWEL, H.; ARNTZ, H.R.; SCHUBERT, F. and SCHRÖDER, R. Physical exertion as a trigger of acute myocardial infarction. Triggers and Mechanisms of Myocardial Infarction Study Group. N Engl J Med. v.329, n.23, p.1684-90, 1993. Referências Infográficas SANTARÉM, J.M. disponível em: <http://www.saudetotal.com/cecafi/texto.htm>. WECKER, J.E. Aulas de Anatomia, disponivel em: www.auladeanatomia.com/cardiovascular/coracao.htm TEMA: FISIOLOGIA CARDIOVASCULAR E EXERCÍCIO EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 1) Como o sistema cardiovascular se comunica com o líquido intersticial? A) Através das arteríolas; B) Através do volume plasmático (sangue); C) Através de capilares; D) Através das vênulas; 2) A norepinefrina interage com os receptores β1– adrenérgicos nas células cardíacas desencadeando: A) Aumento da frequência cardíaca, da velocidade de condução do potencial de ação e redução da força e frequência de contração e relaxamento; B) Aumento da frequência cardíaca, da velocidade de condução do potencial de ação, da força e frequência de contração e relaxamento; C) Redução da frequência cardíaca, da velocidade de condução do potencial de ação e da força de contração; http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Willich%20SN%22%5BAuthor%5D http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Lewis%20M%22%5BAuthor%5D http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22L%C3%B6wel%20H%22%5BAuthor%5D http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Arntz%20HR%22%5BAuthor%5D http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Schubert%20F%22%5BAuthor%5D http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed?term=%22Schr%C3%B6der%20R%22%5BAuthor%5D javascript:AL_get(this,%20'jour',%20'N%20Engl%20J%20Med.'); http://www.auladeanatomia.com/cardiovascular/coracao.htm D) Aumento da frequência cardíaca, redução da velocidade de condução do potencial de ação e da força e frequência de contração e relaxamento; 3) O que não interfere nas respostas cardiovasculares ao exercício físico é: A) A massa muscular envolvida; B) O tipo de exercício físico executado; C) A duração do exercício físico; D) Nenhuma das anteriores. 4) O exercício resistido pode ser realizado por hipertensos: A) De maneira complementar ao treinamento físico aeróbico e com baixa intensidade; B) De maneira complementar ao treinamento físico aeróbico e com alta intensidade; C) De maneira complementar ao treinamento físico estático e com baixa intensidade; D) De maneira principal, complementado pelo treinamento físico aeróbico de intensidade moderada; 5) Assinale a alternativa incorreta: A) A pressão arterial é a força exercida pelo sangue contra a parede interna das artérias decorrente de um batimento cardíaco; B) O débito cardíaco se relaciona inversamente às alterações do volume sistólico e da frequência cardíaca; C) A intensidade do exercício físico para populações especiais (como, por exemplo, cardiopatas) pode interferir na segurança de um programa de exercícios; D) A frequência cardíaca de reserva é um parâmetro utilizado para a prescrição de exercícios físicos; RESPOSTAS 1 – C 2 – B 3 – D 4 – A 5 – B ANDERSEN, L.B.; SCHNOHR, P.; SCHROLL, M. and HEIN HO. All-cause mortality associated with physical activity during leisure time, work, sports, and cycling to work. Arch Intern Med. n.160, v.11, p.1621-8, 2000. VERMEER, S.E.; RINKEL, G.J. and ALGRA A. Circadian fluctuations in onset of subarachnoid hemorrhage. New data on aneurysmal and perimesencephalic hemorrhage and a systematic review. .Stroke. v.28, n.4, p.805-8, 1997.
Compartilhar