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POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Florianópolis – Santa Catarina 2021 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO ESTADO DE SANTA CATARINA SECRETARARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DIRETORIA DE ENSINO GERÊNCIA DE GESTÃO DA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL S289p Secretaria de Estado da Educação. Governo de Santa Catarina Política de Alfabetização para a Rede Estadual de Ensino/ Secretaria de Estado da Educação. Governo de Santa Catarina.-- Florianópolis: Editora Secco. 2021. 48 p. 1. Política de Educação - Estado de Santa Catarina. 2. Planejamento Educacional. I. Título. CDU: 37.5(816.4) Catalogação na publicação por Kátia Rebello - CRB/14-609 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 3 Governador do Estado de Santa Catarina Carlos Moisés da Silva Secretário de Estado da Educação de Santa Catarina Luiz Fernando Cardoso Secretário Adjunto Vitor Fungaro Balthazar Diretora de Ensino Maria Tereza Paulo Hermes Cobra Diretor de Políticas e Planejamento Educacional Marcos Roberto Rosa Diretor de Gestão de Pessoas Marcos Vieira Diretor de Administração Financeira e Tecnologias Pedrinho Luiz Pfeifer 4 ESTADO DE SANTA CATARINA SECRETARARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DIRETORIA DE ENSINO GERÊNCIA DE GESTÃO DA EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL EQUIPE DE ELABORAÇÃO COORDENAÇÃO GERAL Isaac Ferreira Paula Cabral Zulmara Luiza Gesser COLABORADORES Angela Maria Zavarize Flávia Althof Maria Aparecida da Luz Simas Maria Cristina Vitoria Tavares Bertinetti Marilene da Silva Pacheco Marilize Rosana dos Santos de Amorim Mauricea Gazelle Burda Michela Rodrigues Goulart Patricia Carla Bittencourt Patrícia de Simas Pinheiro Silvana Pereira de Jesus Tania Maria Fiorini Geremias Tatiany Kretzer Vania Santos Ribeiro CONSULTORA Profª Drª Otília Lizete de Oliveira Martins Heinig PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO: Studio S Diagramação e arte Visual. 5 Sumário APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 AÇÕES PARA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 GLOSSÁRIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 6 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO APRESENTAÇÃO A alfabetização é um direito fundamental para o desenvolvimento pleno de todas as pessoas. Diante disso, a Secretaria de Estado da Edu- cação de Santa Catarina construiu uma Política de Alfabetização (PEA) com o intuito de garantir a alfa- betização efetiva em todo território catarinense. Sabemos que as pessoas que têm um nível insu- ficiente de domínio da leitura e da escrita ficam à margem da sociedade, excluindo uma parcela da população. Os últimos dados das avaliações em larga escala demonstram a necessidade de investimentos na educação no que cerca a aprendizagem de leitura, escrita e cálculo, ou seja, na alfabetização. A Política de Alfabetização para Rede Estadual de Ensino de Santa Catarina teve seus alicerces na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), na Política Nacio- nal de Alfabetização (PNA), nas Propostas Curriculares do Estado de Santa Catarina (PCSC), no Plano Estadual de Educação de Santa Catarina (PEE) e no Currículo Base da Educação Infantil e do Ensino Fundamental do Território Catarinense (CTBC). Este documento tem como objetivo garantir a alfa- betização das crianças até o segundo ano do Ensino Fundamental. Para o público-alvo da EJA, a meta para a alfabetização é que ela se concretize em três semestres letivos. Além disso, é nosso compromisso a valorização docente, a melhoria das condições de aprendizagem e a formação inicial/continuada (per- manente e em serviço) dos professores alfabetizadores. 7 A educação catarinense já é referência nacional considerando a qualidade nos processos de alfabe- tização dos seus estudantes. Desse modo, a Política de Alfabetização para a Rede Estadual de Ensino de Santa Catarina foi pensada e construída para conso- lidar o processo inicial de escolarização, bem como o desenvolvimento do percurso formativo e integral de cada cidadão. Luiz Fernando Cardoso Secretário de Estado da Educação POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO 9 A produção desta política pública1 se volta para a reflexão de um fenômeno que precisa ser compreendido e assegurado: aprender a ler e a escrever para usos sociais. Esta afirmação abre duas negociações importantes: a compreensão do que é uma política pública e a opção por uma concepção de alfabetização. Políticas públicas são, segundo Höfling (2001, p. 31), “entendidas como o ‘Estado em ação’ (Gobert, Muller, 1987); é o Estado implantando um projeto de governo, através de programas, de ações voltadas para setores específicos da sociedade”. Elas são de responsabili- dade do Estado no que tange à implementação e manutenção, mas são tecidas no diálogo entre órgãos públicos e agentes da sociedade. No que se refere à política educacional, mais que ações pontuais, se faz necessário ampliar o diálogo participativo para as tomadas de decisão, o planejamento e a execução. Além disso, é importante que haja uma política de avaliação da educação. A produção de política pública é social, por isso deve pensar ações que assegurem direitos, pois, “mais que oferecer ‘serviços’ sociais – entre eles a educação – as ações políticas, articuladas com as demandas da sociedade, devem se voltar para a construção de direitos sociais”. ( HÖFLING, 2001, p. 40, grifo nosso). 1 As ações decorrentes desta política foram submetidas a um pro- cesso de consulta pública no mês de junho de 2021. As proposições foram consideradas relevantes pelos participantes do processo de consulta. Os dados coletados mostram que a aprovação das ações obteve índices superiores a 83%. ALFABETIZAÇÃO: A alfabetização, atualmente, é enten- dida como a aprendizagem de um sistema de representação da cadeia sonora da fala pela forma gráfica da escrita – o sistema alfabético – e das normas que regem seu emprego. [...] Em síntese, alfabetização é o processo de aprendizagem do sistema alfabético e de suas convenções, ou seja, a apren- dizagem de um sistema notacional que representa, por grafemas, os fonemas da fala.(SOARES, M. B. Disponível em: http:// www.ceale.fae.ufmg.br/ app/webroot/ glossarioceale/verbetes/alfabetizacao) 10 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Para a tomada de decisões acerca da concepção de alfabetização nesta Política, é preciso voltar na linha do tempo e compreender o contexto histórico catarinense em seus documentos educacionais no que diz respeito à alfabetização. Na Proposta Curricular de Santa Catarina (1998), três pontos são importantes: ela se localiza dentro de uma abordagem histórico-cultural; é compreendida como um processo interdiscursivo e definida como processo de apropriação das diferentes linguagens. Esta Proposta retoma a de 1991 quanto à atividade de reestruturação de textos como uma forma de sis- tematização. No documento de 2005, Proposta Curricular de Santa Catarina: estudos temáticos, a abordagem his- tórico-cultural permanece e se inclui a teoria dialógica, ambas como teorias que fundamentam as concepções de ensino e aprendizagem da língua. Além de ser compreendida como um processo interdiscursivo é considerada interação. A alfabetização é definida em sentido restrito e próprio com base em Soares (2003, p. 15): “processo de aquisição do código escrito e das habilidades de leitura e escrita”. Há referência às “múl- tiplas facetas da alfabetização” (SOARES, 2004). Nesse documento, aparece também o termo letramento (vide p. 43) como prática social da leitura e da escrita, oqual se associa à alfabetização. O documento explica que a “alfabetização é elemento essencial do letra- mento que orienta o indivíduo para que se aproprie do código escrito, aprenda a ler e escrever e ao mesmo tempo conviva e participe de práticas reais de leitura e escrita” (p. 24). Esta tomada de posição indica uma perspectiva do alfabetizar letrando. O documento LEITURA: Ler é um processo receptivo uma vez que o indivíduo recebe o texto produ- zido, cabendo a ele a descodificação, compreensão, interpretação e retenção da informação. (HEINIG, 2003, p. 24). A leitura é um processo de construção de sentidos, ou seja, há uma ação do leitor sobre o lido, que lhe permite atuar num movimento de ir e voltar ao texto numa relação com o dito pelo autor, não focan- do apenas na extração do significado, mas interagindo sobre/com o escrito a fim de relacionar o que se apresenta, a sua composição, a escolha lexical, a ordem dos argumentos ou informações. O sentido que o leitor constrói exige dele ações sobre o dito e o não dito. (HEINIG, 2019, p.107-8). ESCRITA: A relação entre esses dois processos é fundamental, pois a escrita se apoia na leitura, entretanto, por ser um processo produtivo, escrever é mais complexo que ler. Assim como o processamento da lei- tura, o da escritura pode ser dividido em etapas. Para Scliar- Cabral (2001; 2003), o que acontece inicialmente é a moti- vação, que leva o redator, por intenções pragmáticas, a escrever o texto. Depois, ocorre a seleção dos esquemas mentais bem como a dos registros linguísticos que devem ser adequados ao gênero textual, ao receptor e objetivos a fim de que o texto alcance seus propósitos. Feito isso, vem a fase de planejamento; depois acontece a linearização linguís- tica. (HEINIG, 2003, p. 25). 11 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO aborda também a formação do professor e afirma que a decisão metodológica “extrapola a simples escolha de um método” (p. 28). Sugere o uso de variados gêne- ros textuais em práticas sociais concretas; propõe um ambiente alfabetizador e, retomando o documento de 1998, apresenta o professor alfabetizador como detentor do conhecimento científico e pedagógico e a prática alfabetizadora como discursiva. No que tan- ge ao processo de ensino e aprendizagem, destaca o planejamento, a rotina, o conhecimento da realidade dos alunos e o diagnóstico da classe. A avaliação é ca- racterizada como cumulativa, processual e contínua. Em 2011, foi produzido o documento (versão pre- liminar) “Orientação curricular com foco no que ensinar: conceitos e conteúdos para a Educação Básica”. Nele se retoma a Resolução n. 4 de 2010, na qual se afirma que o foco central está na alfabetização nos três primeiros anos (p. 10). O documento af irma a relação entre a prática pedagógica e a concep- ção de alfabetização; além disso, anco- ra sua compreensão de alfabetização e de letramento na Proposta de 2005, com destaque para a construção de sentidos no processo de aprender a ler e escrever. Traz também uma distinção entre sistema alfabético e ortográfico, o que não havia sido apresentado ainda. Apresenta sugestão de gêneros textuais por ano e eixo; elenca a materialidade linguística a ser trabalhada em cada série a partir do gênero; sugere como metodo- logias a sequência didática, o projeto didático e inclui as atividades permanentes; na avaliação, são SENTIDO: O tema é um sistema de signos dinâmico e complexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de um dado momento da evolução. O tema é uma reação da consciência em devir ao ser em devir. A significação é uma aparato técnico para a realização do tema. (BAKHTIN/ VOLOCHÍNOV,1992, p.129). GÊNERO TEXTUAL: Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nos- sa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicati- vos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas. Em contraposição aos tipos, os gêneros são entidades empíricas em situações comunicativas e se expressam em designações diversas, constituindo em princípio listagens abertas. [...]. Como tal, os gêneros são formas textuais escritas ou orais bastante estáveis, histó- rica e socialmente situadas” (MARCUSCHI, 2008, p. 155). 12 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO apresentadas as habilidades por eixo (oralidade, apropriação do sistema de escrita alfabética, leitu- ra e produção textual), indicando as expectativas para cada ano. A Proposta Curricular de Santa Catarina (2014) apre- senta o termo Ecologia na perspectiva de Barton (1994) e Tomazoni (2012). Deixa claro que alfabetização não é sinônimo de letramento e apresenta o conceito de cultura escrita como maior no qual está contido o de letramento e neste o de alfabetização. A defini- ção dos termos segue a dos documentos anteriores. O trabalho com gêneros, aqui denominados como “do discurso” é indicado para a educação infantil e para a alfabetização, o que também se aproxima dos documentos anteriores. Reafirma que o domínio do sistema de escrita alfabética é progressivo e ocorre em favor dos usos sociais da escrita. Evidencia “não haver espaço para o ensino normativista no plano da palavra e da frase isolada”, mas que o ensino ocorra na perspectiva dos usos e com os gêneros do discurso. O Currículo Base da Educação Infantil e do Ensino Fundamental do Território Catarinense (CBTC) de 2019 apresenta a alfabetização com e para o letramento. Três termos no que se refere ao sistema de escrita foram mencionados: aprendizado (da leitura e da escrita), apropriação e domínio (sistema alfabético-or- tográfico). Se no documento de 1998, a alfabetização é definida como “processo de apropriação das diferentes linguagens”, aqui é “como processo de apropriação do sistema escrito”, em ambos a ideia de processo e apropriação se mantém, mas há um afunilamento do objeto. Como no documento de 2014, aborda o percurso formativo e se refere ao progressivo domínio do sistema de escrita; igualmente indica o trabalho PRODUÇÃO DE TEXTO: A produção de textos insere-se nesse mesmo universo dialógi- co, no qual um conjunto de as- pectos precisa ser considerado quando se trata de atividade proposta na/pela escola: que se tenha o que dizer; que se tenha razão para dizê-lo; que se tenha para quem dizê-lo; que o locutor/ autor se assuma como tal; e que se escolham estratégias para dizê- -lo. Esses aspectos procuram dar conta das condições de produção que normalmente cercam o ato de escrever e, por isso, garantem, minimamente, que, de fato, na escola se produzam textos e não se façam redações/composições, as quais tendem a não ter sentido fora da escola já́ que correspon- dem a formas de usar as línguas restritas à ambientação escolar. A produção de textos, assim, sempre se dá em gêneros do discurso e, para produzir um texto em um de- terminado gênero, é preciso que estudantes tenham vivenciado interações com autores por meio de tais gêneros antes de realizar as produções. (SANTA CATARINA, 2014, p. 127). 13 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO com os gêneros discursivos. Retomam a perspectiva da interação discursiva, apresentada no documento de 2005. Citam, como no documento de 2011, os ei- xos que envolvem os planejamentos no processo de alfabetização, mas com alguma distinção: oralidade, leitura, escrita e análise linguística/semiótica, seguindo a orientação da BNCC. No que tange à avaliação, esta deve ser ancorada nas demais concepções apresen- tadas e tem a função de subsidiar e retroalimentar a prática pedagógica. Respeitando o percurso histórico construído até aqui e dialogando com os documentos Nacionais BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e PNA (Política Nacional de Alfabetização), chegou-se à compreensão de que alfabetização é o processo de aprendizagemdo sistema de escrita alfabético. Este, com apoio em Soares (2016, p. 47), é definido como: o sistema alfabético é o sistema primeiro, não é um sistema de substituição de outro preexistente – não é um código, a não ser que se considerasse que os grafemas “substituem” os sons da fala, o que não é linguisticamente verdadeiro: os grafe- mas representam os sons da fala, e o sistema de escrita alfabético foi inventado como um sistema de representação, não como um código. Esta política compreende que há três facetas da alfabetização, conforme Soares (2003; 2016): linguísti- ca, interativa e sociocultural. A primeira é específica da alfabetização e se volta para “a representação visual da cadeia sonora da fala” (SOARES, 2016, p. 28) SEA (SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICO): É um sistema de representação e não um código. O sistema alfabético é o sistema primeiro, não é um sistema de substituição de outro preexistente – não é um código, a não ser que se conside- rasse que os grafemas “substituem” os sons da fala, o que não é linguisticamen- te verdadeiro: os grafemas representam os sons da fala, e o sistema de escrita alfabético foi inventado como um sis- tema de representação, não como um código. (SOARES, 2016, p. 47). 14 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO e seu objeto de conhecimento que é a “apropriação do sistema alfabético-ortográfico e das convenções de escrita” (SOARES, 2016, p. 29). Constituem parte da faceta específica da alfabetização: “consciência fonológica e fonêmica, identificação das relações fonema- grafema, habilidades de codificação e decodificação da língua escrita, conhecimento e reconhecimen- to dos processos de tradução da forma sonora da fala para a forma gráfica da escrita” (SOARES, 2003, p. 13). Portanto, assume-se a necessidade de um trabalho na alfabetização que consi- dere a faceta linguística da língua escrita e a aprendizagem da leitura e da escri- ta como um processo. Entretanto, não se desvinculam das facetas interativa e sociocultural, pois as relações entre le- tramento e alfabetização são indissociá- veis. A faceta interativa da língua escrita diz respeito à “língua escrita como veículo de interação entre as pessoas, de expressão e compreensão de mensagens;” por sua vez, a faceta sociocultural da língua escrita inclui “os usos, funções atribuídos à escrita em con- textos socioculturais”. (SOARES, 2016, p. 28-9) A escolha do termo aprendizagem para o proces- so da alfabetização se sustenta na compreensão de que o sujeito é ativo e, por isso, para aprender ele participa do processo, portanto, trata-se de uma aprendizagem situada: FONEMA: “A definição clássica de fonema, estabelecida pelo linguis- ta R. Jakobson (1949), é “o fonema é um feixe de traços distintivos” (SCLIAR-CABRAL, 2013, p. 101). Observação: Fonema não é som. “O fonema é uma entidade psíquica. [...] é um feixe de traços invariantes, de natureza abstrata, que são reconhecidos por sua função de distinguir sig- nificados, permitindo que as pessoas se comuniquem através da linguagem verbal. Não importa como as pes- soas pronunciem o terceiro segmento que aparece na palavra carta, pois o som que o carioca produz só tem de parecido com o que um gaúcho de Bagé diz pelo fato de que são consoantes, e só! Mas o fonema é o mesmo!” (SCLIAR-CABRAL, 2013, p. 103). GRAFEMA: “Uma ou mais letras que representam um fonema (no sistema alfabético do português do Brasil, não mais que duas letras)”. (SCLIAR-CABRAL, 2003, p. 27). 15 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO [...] diferentemente das abordagens comporta- mentais, que veem a aprendizagem como um resultado da internalização de conhecimentos descontextualizados pelo indivíduo ou pela ob- servação da ação modelar de outras pessoas, a aprendizagem situada está centrada nas relações interpessoais. Ela é situada porque ocorre numa atividade, na qual contexto e cultura são especí- ficos, realizando-se na interação, num processo de coparticipação social. Nesse sentido, aprender envolve engajamento em uma comunidade de aprendizagem. Nela, um participante in- terage com outro(s) numa atividade situada, movendo-se em níveis de participação e, conse- quentemente, de domínio. Significa envolver-se plenamente nas práticas socioculturais de uma comunidade de aprendizagem. (OLIVEIRA; TI- NOCO; SANTOS, 2011, p. 50-1, grifos das autoras). Tendo como ancoragem as concepções apresen- tadas até aqui e o contexto histórico catarinense na produção de seus documentos anteriores, a presente política foi produzida com os seguintes objetivos: 16 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Apresentar à Rede Estadual de Educação de Santa Catarina uma política para a alfabetização considerando as metas 5 e 9 do PEE (2015-2024), a fim de que suas estratégias sejam alcançadas. Garantir o direito de alfabetização para crianças nos dois pri- meiros anos do ensino fundamental e para jovens, adultos e idosos não alfabetizados. a. Ao final do primeiro ano, o aluno deverá: compreender o siste- ma de escrita alfabético; ler textos com autonomia e escrever palavras, frases e até textos com a mediação do professor. b. Ao final do segundo ano, o aluno deverá: ampliar conhecimentos linguísticos sobre o sistema de escrita alfabético-ortográfico; ler textos usando estratégias de leitura e produzir textos conside- rando as condições de enunciação. c. Na EJA o aluno deverá aprender a ler e escrever em até três semestres letivos. 1 2 Além dos seus objetivos, a Política dialoga com o Plano Estadual de Educação - Lei nº 16.794 de 2015, cuja primeira diretriz do Art. 2º é a “erradicação do analfabetismo”. Dá-se especial atenção à meta 5 e à 9 com destaque para as estratégias 9.2, 9.4 e 9.7 (SANTA CATARINA, 2016, p. 40-41; 53), mas com alteração do prazo para consolidação do processo inicial de alfabetização das crianças – do final do terceiro para o segundo ano, conforme orientações nacionais e o CBTC: 17 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Meta 5: Alfabetizar todas as crianças aos 6 (seis) anos de idade ou até no máximo, aos 8(oito) anos de idade no Ensino Fundamental. Estratégias: 5.1 Estruturar os processos pedagógicos a fim de garantir a alfabetização plena a todas as crianças até o final do terceiro ano do ensino fundamental, articulando-os com as estraté- gias desenvolvidas na educação infantil com a valorização dos professores, alfabetizadores e com formação continuada e apoio pedagó- gico específico. 5.2 Criar e implementar, onde não houver, política de alfabetização que garanta a permanência dos professores alfabetizadores para os três primeiros anos do ensino fundamental. 5.3 Instituir instrumentos de avaliação sistêmica, periódica e específica, para aferir a alfabeti- zação das crianças, bem como estimular os sistemas de ensino e as escolas a criarem os respectivos instrumentos de avaliação e monitoramento. 5.4 Selecionar, certificar e divulgar tecnologias educacionais para a alfabetização de crian- ças, asseguradas a diversidade de métodos e propostas pedagógicas, bem como o acom- panhamento dos resultados nos sistemas de ensino em que forem aplicadas, devendo ser disponibilizadas, preferencialmente, como recursos educacionais abertos. 18 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO 5.5 Fomentar o desenvolvimento de tecnolo- gias educacionais e de práticas pedagógicas inovadoras que assegurem a alfabetização e favoreçam a melhoria do fluxo escolar e a aprendizagem dos estudantes, consideradas as diversas abordagens metodológicas e sua efetividade. 5.6 Garantir a alfabetização de crianças do campo, indígenas, quilombolas e de populações itine- rantes, com a produção de materiais didáticos específicos, e desenvolver instrumentos de acompanhamento que considerem o uso da língua materna pelas comunidades indíge- nas e a identidade cultural das comunidades quilombolas.5.7 Promover e estimular a formação inicial e con- tinuada de professores para a alfabetização de crianças, com o conhecimento de novas tecnologias educacionais e práticas pedagó- gicas inovadoras, estimulando a articulação entre programas de pós-graduação stricto sensu e ações de formação continuada de professores para a alfabetização. 5.8 Assegurar a alfabetização das pessoas, pú- blico da educação especial, considerando as suas especificidades, inclusive a alfabetização bilíngue de pessoas surdas, sem estabeleci- mento de terminalidade temporal. 5.9 Promover, em consonância com as Diretrizes do Plano Nacional do Livro e da Leitura, a for- mação de leitores e a capacitação de profes- sores, bibliotecários e agentes da comunidade para atuarem como mediadores da leitura. 19 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO 5.10 Implantar, até o segundo ano de vigência do Plano, programas de incentivo à leitura. 5.11 Garantir a continuidade de programas de alfabetização que apresentem bons resul- tados, no sentido de que se tornem políticas públicas de Estado. Meta 9: Elevar a taxa de alfabetização da população com 15 (quinze) anos ou mais de idade para 98% (noventa e oito por cento) até 2017 e, até o final da vigência deste Plano, reduzir em 50% (cinquenta por cento) a taxa de analfabetismo funcional. Estratégias: [...] 9.2 Realizar diagnóstico dos jovens e adultos com ensino fundamental e médio incompletos, para identificar a demanda ativa por vagas na educação de jovens e adultos. [...] 9.4 Implementar ações de alfabetização de jovens e adultos com garantia de continuidade da escolarização básica. [...] 9.7 Proceder levantamento de dados sobre a demanda por EJA, na cidade e no campo, para subsidiar a formulação de política pú- blica que garanta o acesso e a permanência a jovens, adultos e idosos a esta modalidade da educação básica. 20 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO A produção desta Política mantém seu olhar para o estado de Santa Catarina, sua realidade e construção de documentos anteriores, mas também dialoga com documentos recentes como a BNCC e a Política Nacio- nal de Alfabetização, assumindo um posicionamento a partir dos acordos feitos na parte de alfabetização do Currículo Base do Território Catarinense. O que se apresenta a seguir é uma leitura crítica desses docu- mentos para justificar a tomada de posição que esta Política assume. A definição de alfabetização na PNA, com base na ciência cognitiva da leitura, dá ênfase às habilidades de leitura, de escrita e foca o ensino. No caso desta Política, há uma ampliação do arcabouço teórico, o que leva à compreensão de que habilidades apenas não são suficientes para o ensino, além disso, é preciso também considerar a aprendizagem e nela sujeito como ativo nesse processo. A PNA se refere a “ativi- dades que estimulem a leitura e a escrita de textos cada vez mais complexos, a fim de que a pessoa se torne capaz de usar essas habilidades com indepen- dência e proficiência para aprender, transmitir e até produzir novos conhecimentos”. (BRASIL, 2019, p. 19). As palavras “atividades”, “estimulem”, “habilidades”, “transmitir” e o operador argumentativo “até” antes de produzir indicam uma perspectiva diferente do CBTC, o qual cita ações, não atividades; considera o sujeito como social, por isso ele precisa mais do que estímulos. O CBTC concede especial relevância aos usos sociais da leitura e da escrita. A PNA busca assumir uma perspectiva para o ensi- no na alfabetização e assim se manifesta com ênfase para as evidências, termo que é retomado ao longo do documento: 21 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO De acordo com essa perspectiva, as políticas e as práticas educacionais devem ser orientadas pelas melhores evidências em relação aos prová- veis efeitos e aos resultados esperados, exigindo que professores, gestores educacionais e pessoas envolvidas na educação consultem a literatura científica nacional e internacional para conhecer e avaliar o conhecimento mais recente sobre os processos de ensino e de aprendizagem. (BRA- SIL, 2019, p. 20). A produção do documento elegeu dois paradigmas: o da ciência cognitiva da leitura e o das neurociências. O termo “evidências”, na PNA, está baseado em pes- quisas experimentais. Entretanto, há outras evidências uma vez que o ato pedagógico tem uma série de va- riáveis que não se controlam. No caso desta Política, ainda que se considerem as contribuições das duas áreas eleitas, especialmente para a leitura, há uma série de aspectos necessários para discussões acerca da alfabetização. É fundamental, além dos aspectos linguísticos, levar em conta o contexto social e histórico de cada criança e sua inserção no mundo da escrita. Ainda em relação à citação anterior, é preciso ter clara uma política de formação de professores, o que se apresenta na estratégia sete da meta 5 do Plano Estadual de Educação, além de exigir a consulta à literatura, uma vez que nem todos os professores e gestores têm condições para tal tarefa. Na PNA, é apresentada uma definição de “literacia” que necessita de ampliação ante ao que se apresenta como objeto de conhecimento na faceta linguísti- ca mencionada. Estudos nacionais já desenvolvidos 22 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO consideram que o letramento não se organiza em níveis e ocorra em práticas ou eventos de letramento que podem ser apenas observados se forem consi- derados os seus elementos visíveis. Portanto, não é possível afirmar que exista apenas um método para alfabetizar, nem se filiar a uma única corrente teórica, conforme preconizam os documentos já produzidos no contexto educacional catarinense. No que diz respeito à BNCC, há mais aproxima- ções entre este documento e a Política estadual, pois ambas compreendem que o tempo para esse processo inicial é de dois anos, além disso, conside- ram os aspectos linguísticos e sociais no processo de alfabetização, bem como apresentam a mesma concepção de linguagem. En- tretanto, a compreensão de que “alfa- betizar é trabalhar com a apropriação pelo aluno da ortografia do português do Brasil escrito,[...]” (BRASIL, 2017, p. 88) se distancia desta Política. Nela se assume que, por se tratar de um sistema inventado, a escrita demanda ensino e aprendizagem, além disso não é a orto- grafia que está no foco, mas o sistema de escrita alfabético. Outro ponto de discussão deriva da citação “perceber seus sons, como se separam e se juntam em novas palavras etc.” (BRASIL, 2017, p. 88). No caso desta Política, há uma compreensão distinta do que seja som e do que seja fonema, o que é fundamental para a aprendizagem da organiza- ção do sistema de escrita alfabético. Por outro lado, concorda-se que as relações entre fonografêmicas e grafofonêmicas não são simples e precisam ser compreendidas por quem ensina para que possa organizar o ensino na alfabetização. LINGUAGEM: A linguagem comum e única é um sistema de normas linguísticas. Porém, tais normas não são um imperativo abstrato, mas sim forças criadoras da vida da linguagem. (BAKHTIN,2010, p. 81). Assim, na prática viva da língua, a consciência linguística do locutor e do receptor nada tem a ver com um sistema abstrato de formas normativas, mas apenas com a linguagem no sentido de conjunto de contextos possíveis de uso de cada forma particular. Para o falante nativo, a palavra não se apresenta como um item de dicionário, mas como parte das mais diversas enun- ciações dos locutores A, B ou C de sua comunidade e das múltiplas enunciações de sua própria prática linguística (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 1992, p. 95). 23 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Para a produção desta Política, foram selecionados e estudados conceitos fun- dantes como: alfabetização, letramento, cultura escrita, gêneros textuais, língua, leitura e escrita. Considerandoo conceito de alfabetização apresentado anterior- mente relativo às crianças do 1.º e 2.º ano do ensino fundamental, incluindo jovens, adultos e idosos não alfabetizados, po- demos tratar do letramento como um processo de inclusão e participação nas culturas escritas, ou seja, esses sujeitos poderão ler e escrever textos de diferentes lugares sociais de práticas de escrita. Tam- bém significa que poderão circular nas diferentes áreas do conhecimento com textos adequados às suas especificidades e estes contemplarão os componentes curriculares previstos no Currículo Base do Território Catarinense. Assume-se, então, que o letramento “constitui conjunto de conhecimentos, atitudes e capacidades indispensáveis para o uso da língua em práticas sociais que requerem habilida- des mais complexas” (SOARES, 1998, p. 18). Aliado a isso, compreendemos que o letramento é plural, pois “localiza essas práticas na vida das pessoas, práticas que são realizadas com finalidades para atingir os seus fins específicos de vida, e não um conjunto de competências que estão armazenadas na cabeça das pessoas”. (DIONÍSIO, 2007, p. 211) As culturas escritas são compreendidas como mo- dos de organização social que tem a escrita como fundamento (sociedade grafocêntrica), que envolve CULTURA ESCRITA: Modo de organização social que tem a escrita como fun- damento, que envolve formas de comportamento, valora- ções e saberes construídos pela humanidade e presentes na forma como os sujeitos se inter-relacionam em seu tempo e para além dele por meio dessa mesma escrita (SANTA CATARINA, 2014, p. 107-8). Cultura escrita é o lu- gar – simbólico e material – que o escrito ocupa em/para determinado grupo social, comunidade ou sociedade. Essa definição baseia-se na acepção antropológica de cultura, considerada como toda e qualquer produção material e simbólica, criada a partir do contato dos seres humanos com a natureza, com os outros seres humanos e com os próprios artefatos, criados a partir dessas relações. (GAL- VAO, A. M. O. Disponível em: http://www.ceale.fae.ufmg. br/app/webroot/glossarioceale/verbetes/cultura-escrita). LÍNGUA: Tomamos a língua não como um sistema de categorias gramaticais abstratas, mas como uma língua ideologica- mente saturada, como uma concepção de mundo, e até como uma opinião concreta que garante um maximum de compreensão mútua, em todas as esferas da vida ide- ológica. Eis porque a língua única expressa as forças de união e de centralização concretas, ideológicas e verbais, que decorrem da relação indissolúvel com os processos de centralização sócio-política e cultural. (BAKHTIN, 2010, p. 81). As línguas, compreendidas como instrumentos psico- lógicos de mediação simbólica, possibilitam aos sujeitos a veiculação de saberes de toda ordem, considerando que é por meio da oralidade, da escrita, da sinalização em línguas de sinais e das linguagens viso-gestuais, que os processos de ensino e aprendizagem acontecem em todas as áreas do conhecimento, tanto quanto é por meio da escrita que os conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, em suas constantes ressignificações, têm lugar nas práticas escolares. Os sujeitos, movidos pela sociointeração, nomeiam o mundo, atribuem valor a ele, organizando sua experiência por meio das línguas. (SANTA CATARINA 2014, p. 112). 24 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO diferentes formas de comportamento, valoração e saberes construídos pela humanidade e presentes na forma como os sujeitos se inter-relacionam em seu tempo e para além dele por meio dessa mesma escri- ta (SANTA CATARINA, 2014, p. 107-108). Sendo assim, das culturas escritas emergem diferentes gêneros textuais nos inúmeros contextos de escrita. Segundo Marcuschi, “os gêneros são formas textuais escritas ou orais bastante estáveis, histórica e socialmente situadas”. Além disso, ainda segundo o mesmo autor, “apresentam padrões sociocomunicativos caracterís- ticos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas”. (2008, p. 155). Em consonância a essas concepções, a língua é compreendida como forma de interação verbal se- gundo a perspectiva enunciativa assumida nos do- cumentos anteriores. Portanto, ela não é um sistema estável, pois leva em consideração, além da signifi- cação, o sujeito interlocutor, o locutor e as condições enunciativas. Esta política assume que “ ler é um processo receptivo uma vez que o indivíduo recebe o texto produzido, cabendo a ele a descodificação, compreensão, interpretação e retenção da informação” (HEINIG, 2003, p. 24), por isso, a leitura deve anteceder a escrita. Para além disso, “a leitura é um processo de construção de sen- tidos, ou seja, há uma ação do leitor sobre o lido, que lhe permite atuar num movimento de ir e voltar ao texto numa relação com o dito pelo autor, não focando 25 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO apenas na extração do significado, mas interagindo sobre/com o escrito a fim de relacionar o que se apresenta, a sua com- posição, a escolha lexical, a ordem dos ar- gumentos ou informações. O sentido que o leitor constrói exige dele ações sobre o dito e o não dito”. (HEINIG, 2019, p.107-8). A escrita é um processo produtivo e se apoia na lei- tura, entretanto, é mais complexo devido a condições como a distribuição do texto na página de acordo com o gênero textual, os espaços em branco entre as palavras, a codificação dos fonemas em grafemas e as condições de produção do texto. Na perspectiva metodológica enten- demos que a alfabetização com êxito não depende de um único método teórico. Nessa perspectiva nos aproximamos da estratégia 5.4 de nosso Plano Estadual de Educação que visa assegurar “a diversida- de de métodos e propostas pedagógicas” e da estratégia 5.5 que visa favorecer a “aprendizagem dos estudantes, conside- radas as diversas abordagens metodológi- cas e sua efetividade” (SANTA CATARINA, 2016, p. 40-41). As metodologias necessitam compre- ender os processos cognitivos e linguísti- cos, levando em consideração o uso social da leitura e da escrita, com atividades que estimulem e orientem a aprendizagem. Desse modo, o alfabeti- zador precisa ter embasamento teórico para escolher o caminho a ser percorrido em direção ao objeto final: alfabetização de todos. SIGNIFICADO: A significação não quer dizer nada em si mesma, ela é apenas um potencial, uma possibilidade de significar no interior de um tema concreto. (BAKHTIN/VOLOCHÍ- NOV,1992, p.131). Por isso, a investigação de uma palavra pode apontar para significação contextual ou para a sig- nificação da palavra no sistema da língua, ou seja, em estado de dicionário. MÉTODO: Conjunto de procedimentos que, com base em teorias e princípios linguísticos e psicológicos, orientam essa apren- dizagem, em cada uma das suas facetas. No entanto, os métodos não atuam autonomamente, sem limitações e obstáculos; constituídos de procedimentos de interação entre alfabetizador(a) e alfabetizandos, efetivam-se na inter-relação entre participantes diferenciados, em situ- ação de aprendizagem coletiva, em um contexto escolar inserido em determinada comunidade socioeconômica e cultural. Ou seja: os métodos [...] configuram-se como um processo de grande complexidade. (SOARES, 2016, p. 50-1). Complementando: “[...] reverte os termos da ex- pressão métodos de alfabetização para alfabetizar com método: orientar a criança por meio de procedimentos que, fundamentados em teorias e princípios, estimulem e orientem as operações cognitivas e linguísticas que progressivamente a conduzam a uma aprendizagem bem-sucedida da leitura e da escrita em uma ortografia alfabética” (SOARES, 2016, p. 331). 26 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Portanto, a lfabetizar com métodos implica planejamento inten-cional, avaliação diagnóstica,processual e contínua, definição de rotinas, assim como o uso de recursos didáticos e tecnológicos que fomentem práticas educativas inovadoras, assegurem e favoreçam a alfabetização, o ambiente alfabetizador e a forma- ção do professor. a concepção de avaliação adotada ratifica as indicações das Resoluções do CNE/CEB nº 4/2010 e nº 7/2010 e demais documentos curriculares, assumindo-a como dimensão formativa com função diagnóstica, proces- sual e contínua. No que tange ao ambiente alfabetizador, que vai além da sala de aula, este deve ser rico de materiais escritos a serem lidos pelos estudantes, inicialmente, com mediação do professor. Os materiais escritos, os jogos, o planejamento, a organização dos conteúdos e a avaliação devem cooperar para aprendizagem da leitura e escrita. A função diagnóstica é ponto de partida para o (re) planejamento das ações pedagógicas considerando os conhecimentos prévios, apropriados pelo aluno no decorrer do percurso formativo. A segunda função considera vários aspectos da prática pedagógica, as metodologias, a diversidade de instrumentos, o acom- panhamento de atividades desenvolvidas pelo aluno durante o processo de aprendizagem, a construção dos conhecimentos, assim como a reorientação do percurso do processo de ensino e aprendizagem. 27 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Nos processos de ensino e de aprendizagem, é preciso considerar o caráter histórico do currículo e, portanto, das competências, habilidades e conheci- mentos a serem construídos e avaliados. Há um ca- ráter seletivo do que vai ser ensinado e do que vai ser avaliado, por isso devem ser elencados os objetivos de aprendizagem, que orientam o planejamento, as ações pedagógicas e a avaliação. Dessa forma, pode- -se compreender que há três relações fundamentais dentro da perspectiva adotada aqui: 1) entre a apren- dizagem do aluno e as ações dos docentes; 2) entre instrumentos de avaliação e objetivos de aprendiza- gem; 3) entre formas de registro, acompanhamento e organização do ensino. A avaliação em larga escala apresenta índices e estes são referenciais para a construção de políticas e ações da alfabetização para a Rede. Os dados de- correntes das avaliações sistêmicas se constituem como diagnóstico e oferecem direcionamento às ações de modo contextualizado, portanto não se ca- racterizam exclusivamente como currículo. O diálogo com as avaliações de larga escala na alfabetização deve ser feito com cuidado e atenção, pois, como alertam Esteban (2012) e Dickel (2016), não abarcam todas as dimensões da alfabetização. Além disso, é preciso coerência com a concepção de alfabetização e de letramento adotada por esta Política, pois nem todas as aprendizagens conseguem ser mensura- das por um instrumento avaliativo como os usados nesse tipo de avaliação devido às suas limitações. Portanto, os dados provenientes da avaliação em larga escala podem servir como diagnóstico, como estudo e contextualização da alfabetização nacional e local, para que se amplie a compreensão do que ocorre nesse processo. AÇÕES PARA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO 29 As ações abaixo relacionadas são prementes para que a Política de Alfabetização da Rede Estadual de Ensino se efetive, a curto/médio prazo, mantendo como foco estratégias que viabili- zam os processos de alfabetização em cada unidade escolar catarinense. Tais ações materializarão a referida Política que despontará como referência em todo o território nacional. Ação 1: Garantir que o Currículo Base do Território Catarinense seja contemplado no planejamento e ações dos professores para a alfabetização. Ação 2: Viabilizar a participação de representantes da Rede Estadual de Ensino nas discussões das instituições de ensino superior acerca do processo de formação inicial de profes- sores alfabetizadores. Ação 3: Promover articulações da Rede Estadual de Ensino com programas de pós-graduação lato e stricto sensu, in- centivando a formação de grupos de estudos, ampliação de pesquisas na área da alfabetização no cenário acadêmico catarinense e a inserção/permanência de professores alfa- betizadores em tais programas. 30 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Ação 4: Estabelecer um processo de formação continuada/ permanente presencial para professores alfabetizadores, dos primeiros anos, segundos anos e da Educação de Jovens e Adultos (EJA), da Rede Estadual de Ensino, bem como para gestores, especialistas e técnicos envolvidos com ações no âmbito da alfabetização. Ação 4.1: Ampliar o conhecimento sobre o ensino da leitura, incluindo conhecimentos sobre os princípios do sistema de escrita alfabético, as estratégias de leitura e a construção de sentido na leitura por meio de cursos e acervo digital e físico, bem como ordenar as prioridades a serem focadas na aprendizagem da leitura e da escrita. Ação 4.2: Ampliar o conhecimento sobre o ensino da escrita, incluindo conhecimentos sobre os princípios do sistema de escrita alfabético e as estratégias para produção textual de acordo com o gênero por meio de cursos e acervo digital e físico. Ação 4.3. Aplicar um questionário para o levantamento do perfil do professor alfabetizador da Rede Estadual de Ensino, de modo a planejar ações formativas contextualizadas. Ação 4.4. Formar, por coordenadorias, grupos de estudos sobre alfabetização para aprofundamento teórico e socialização de práticas. Ação 5: Promover ações que busquem garantir a estrutura necessária para o acesso, a permanência e o êxito da apren- dizagem no processo de alfabetização. Ação 5.1: Garantir, na Rede Estadual de Ensino, a permanência dos professores alfabetizadores de 1º e 2º anos, com experiência profissional e formação específica. 31 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Ação 5.2: Criar mecanismos legais que possibilitem a contratação de professores assistentes de alfabetização. Ação 5.3: Propor a alteração de dispositivo legal para fixar o número máximo de alunos por sala de aula de alfabetização, com base no planejamento de oferta educacional do estado catarinense. Ação 5.3.1: Dialogar com o Ministério Público e instituições correlatas, no intuito de garantir que as turmas de alfabetização não ultrapassem o número de alunos estabelecido pela SED. Ação 5.4: Garantir que todas as unidades escolares da Rede Estadual de Ensino tenham profissionais e espaços adequados para promoção do incentivo à leitura. Ação 5.5: Investir na infraestrutura das escolas, na aquisição de materiais pedagógicos, equipamentos e mobiliários que viabilizem melhorias nas condições de trabalho dos professores alfabetizadores e no atendimento às crianças. Ação 5.6: Articular um planejamento junto às diretorias da SED e às Coordenadorias Regionais de Ensino para a viabilização das ações acima mencionadas. Ação 6: Conhecer o acervo de livre acesso dos materiais didáticos específicos para a alfabetização e tecnologias educacionais, fundamentados teoricamente na Política Es- tadual de Alfabetização e no Currículo Base do Território Catarinense, para divulgação, uso e ampliação. 6.1 Estimular o conhecimento de tecnologias educacionais direcionadas à alfabetização por meio de cursos a distância ou presencial e por meio de um acervo digital. 32 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO Ação 7: Desenvolver plataforma interativa digital para o compartilhamento de materiais, experiências inovadoras em alfabetização e informações acerca do tema por meio de reportagens, artigos científicos, relatos de experiência etc. Ação 8: Desenvolver processos avaliativos e instrumentos unificados para avaliar a aprendizagem da leitura e da es- crita nos 1.º e 2.º anos e na EJA. Ação 8.1: Analisar os dados das avaliações de larga escala para o encaminhamento de novas ações. Ação 8.2: Integrar ao sistema de registros pedagógicos o instrumento de avaliação descritiva. Ação 8.3: Acompanharos registros dos professores no sistema de gestão educacional de Santa Catarina (SISGESC), a partir de descritores específicos de alfabetização alinhados ao CBTC e a esta Política. 33 REFERÊNCIAS BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http:// basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNC C_20dez_site.pdf. ______. Política Nacional de Alfabetização. Brasília: MEC, 2019. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/ images/banners/caderno_pna_final.pdf. DICKEL, A. A avaliação nacional da alfabetização no contexto do sistema de avaliação da educação básica e do pacto nacional pela alfabetização na idade certa: responsabilização e controle. Cadernos Cedes, Campinas, v. 36, n. 99, p. 193-206, maio-ago., 2016. DIONÍSIO, Maria de Lourdes. Educação e os estudos atuais sobre letramento. Entrevista. Perspectiva, v. 25, n. 1, jan./jul. 2007b. Disponível em http:// www.perspectiva.ufsc.br/perspectiva_numeros_ anteriores_2007_01.php, Acesso em 16/02/02009. 34 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO ESTEBAN, Maria Tereza. Avaliação: uma prática em busca de novos sentidos. 5.ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. ______. Considerações sobre a política de avaliação da alfabetização: pensando a partir do cotidiano escolar. Revista Brasileira de Educação, v. 17, n. 51, p. 573-592, set. /dez. 2012. HEINIG, Otília Lizete de Oliveira Martins et al. É que a gente não sabe o significado: homófonos não homógrafos. 2003.Tese Doutorado. Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Comunicação e Expressão. Programa de Pós-Graduação em Linguística. ______. O papel do professor no processo de construção de sentido na leitura. In: SOUZA, Ana Claudia et al. Diálogos linguísticos para a leitura e a escrita. Florianópolis: Insular, 2019. HÖFLING, Eloisa de. Estado e políticas (públicas) sociais. Cadernos Cedes, v. 21, p. 30-41, 2001. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008. OLIVEIRA, Maria Socorro; TINOCO, Glícia Azevedo; SANTOS, Ivoneide Bezerra de Araújo. Projetos de letramento e formação de professores de língua materna. Natal: EDUFRN, 2011. 35 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO SANTA CATARINA. Proposta curricular de Santa Catarina: educação infantil, ensino fundamental e médio: formação docente para educação infantil e séries iniciais. Florianópolis: COGEN, 1998. ______. Proposta curricular de Santa Catarina: disciplinas curriculares. Florianópolis: COGEN, 1998. ______. Proposta curricular de Santa Catarina: estudos temáticos. Florianópolis: IOESC, 2005. ______. Orientação curricular com foco no que ensinar: conceitos e conteúdos para a educação básica. Florianópolis: DIEB, 2011. ______. Proposta curricular de Santa Catarina: Formação Integral na Educação Básica. Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado da Educação - [s.l.] : [s.n.], 2014. ______. Plano Estadual de Educação de Santa Catarina 2015-2024 Florianópolis: DIOESC, 2016. ______. Currículo Base da Educação Infantil e do Ensino Fundamental do Território Catarinense. Florianópolis: SED, 2019. SOARES, Magda Becker. Letramento e escolarização. In: RIBEIRO, Vera Masagão. Letramento no Brasil. São Paulo: Global, p. 89-114, 2003. 36 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO ______. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de Educação, n. 25, p. 5-17, 2004. ______. Alfabetização: a questão dos métodos. São Paulo: Contexto, 2016. 37 GLOSSÁRIO ALFABETIZAÇÃO: A alfabetização, atualmente, é entendida como a aprendizagem de um sistema de representação da cadeia sonora da fala pela forma gráfica da escrita – o sistema alfabético – e das normas que regem seu emprego. [...] Em síntese, alfabetização é o processo de aprendizagem do sistema alfabético e de suas convenções, ou seja, a aprendizagem de um sistema notacional que representa, por grafe- mas, os fonemas da fala.(SOARES, M. B. Disponível em: http://www.ceale.fae.ufmg.br/ app/webroot/ glossarioceale/verbetes/alfabetizacao) APRENDIZAGEM: Aprender significa participar de uma nova ativida- de. Na aprendizagem, os indivíduos se integram a sistemas múltiplos de atividades através de di- ferentes contextos ou em contextos cruzados. [...] Aprendizagem situada – diferentemente das abordagens cognitivas e comportamentais, que veem a aprendizagem como um resultado da inter- nalização de conhecimentos descontextualizados pelo indivíduo ou pela observação da ação modelar de outras pessoas, a aprendizagem situada está centrada nas relações interpessoais. Ela é situada porque ocorre numa atividade, na qual contexto 38 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO e cultura são específicos, realizando-se na intera- ção, num processo de coparticipação social. Nesse sentido, aprender envolve engajamento em uma comunidade de aprendizagem. Nela, um par- ticipante interage com outro(s) numa atividade situada, movendo-se em níveis de participação e, consequentemente, de domínio. Significa envol- ver-se plena- mente nas práticas socioculturais de uma comunidade de aprendizagem. (OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS, 2011, p. 50-1). CAMPO/ESFERA: A noção de esfera da comunicação discursiva (ou da criatividade ideológica ou da atividade humana ou da comunicação social ou da utilização da língua ou simplesmente ideologia) é compreendida como um nível específico de coerções que, sem descon- siderar a influência da instância socioeconômica, constitui as produções ideológicas, segundo a lógica particular de cada campo. (GRILLO, 2006, p. 143). As esferas ou campos de atividade humana ou de circulação dos discursos – já que toda atividade humana se entretece de discursos – são a instância organizadora da produção, circulação, recepção dos textos/enunciados em gêneros de discurso especí- ficos em nossa sociedade. Os gêneros discursivos integram as práticas sociais e são por elas gerados e formatados. (ROJO, R. Disponível em: http://www. ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/ ver- betes/esferas-ou-campos-de-atividade-humana). CULTURA ESCRITA: Modo de organização social que tem a escrita como fundamento, que envolve formas de com- portamento, valorações e saberes construídos pela 39 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO humanidade e presentes na forma como os sujeitos se inter-relacionam em seu tempo e para além dele por meio dessa mesma escrita (SANTA CATARINA, 2014, p. 107-8). Cultura escrita é o lugar – simbólico e material – que o escrito ocupa em/para determi- nado grupo social, comunidade ou sociedade. Essa definição baseia-se na acepção antropológica de cultura, considerada como toda e qualquer produ- ção material e simbólica, criada a partir do contato dos seres humanos com a natureza, com os outros seres humanos e com os próprios artefatos, criados a partir dessas relações. (GALVAO, A. M. O. Disponí- vel em: http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/ glossarioceale/verbetes/cultura-escrita). ENSINO: Os processos de escolarização e de alfabetização sempre elegeram o ensino do “ler e do escrever” como um de seus objetivos centrais. [...]. No Ciclo de Alfabetização, o ensino de Língua Portugue- sa encontra-se geralmente organizado em torno de quatro grandes eixos de ensino: (i) leitura de textos; (ii) produção de textos; (iii) oralidade e (iv) conhecimentos linguísticos. Tais eixos são normal- mente trabalhados de forma inter-relacionada e em diferentes áreas do conhecimento. Nas aulas de História, Matemática e Ciências, por exemplo, as crianças leem e escrevem textos verbo-visuais de gêneros específicos: calendários, gráficos, linha do tempo e relatórios, entre outros. Por tal razão, as diversas propostas curriculares contemporâneas têm defendido que o texto seja visto como a unida- de de ensino de Língua Portuguesa e os gêneros textuais como seus principais objetosde ensino. Na esfera escolar, as crianças têm oportunidades 40 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO de viver experiências planejadas, usar a lingua- gem e refletir sobre as práticas de linguagem. Ao ler a capa de um livro de literatura infantil, refletir sobre palavras novas de uma canção ou tentar grafar uma palavra na produção de legendas, elas se engajam em situações de aprendizagem em que a escuta e a leitura de textos de diferentes gêneros, assim como a produção de textos orais e escritos ganham grande relevância para o seu de- senvolvimento humano. No Ciclo de Alfabetização, ganha importância também o trabalho de análise, reflexão e sistematização sobre os conhecimentos linguísticos em diferentes níveis (fonológico, mor- fossintático, semântico), uma vez que as crianças também estão se apropriando do sistema de es- crita de base alfabética, do léxico e da gramática da língua portuguesa. Por essa razão, o ensino de Língua Portuguesa volta-se para reflexões siste- máticas sobre a relação entre o oral e o escrito, para questões da variação linguística e aspectos da textualidade (como os sinais de pontuação) e da normatividade (como algumas regularidades ortográficas). Defende-se ainda, como um princí- pio pedagógico do ensino da Língua Portuguesa, que a linguagem é o lugar da diversidade e da heterogeneidade de práticas culturais; por isso as práticas escolares precisam ser sensíveis às diferenças culturais e linguísticas, utilizando-as a favor da formação cidadã e de uma aprendiza- gem significativa da língua materna. (BUNZEN, C. Disponível em: in: http://www.ceale. fae.ufmg.br/ app/webroot/glossarioceale/verbetes/ensino-de- -lingua-portuguesa). 41 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO ESCRITA: A relação entre esses dois processos é fundamental, pois a escrita se apoia na leitura, entretanto, por ser um processo produtivo, escrever é mais complexo que ler. Assim como o processamento da leitura, o da escritura pode ser dividido em etapas. Para Scliar- Cabral (2001; 2003), o que acontece inicialmente é a motivação, que leva o redator, por intenções pragmáticas, a escrever o texto. Depois, ocorre a seleção dos esquemas mentais bem como a dos registros linguísticos que devem ser adequados ao gênero textual, ao receptor e objetivos a fim de que o texto alcance seus propósitos. Feito isso, vem a fase de planejamento; depois acontece a lineari- zação linguística. (HEINIG, 2003, p. 25). FONEMA: “A definição clássica de fonema, estabelecida pelo linguista R. Jakobson (1949), é “o fonema é um feixe de traços distintivos” (SCLIAR-CABRAL, 2013, p. 101). Observação: Fonema não é som. “O fonema é uma entidade psíquica. [...] é um feixe de traços invarian- tes, de natureza abstrata, que são reconhecidos por sua função de distinguir significados, permi- tindo que as pessoas se comuniquem através da linguagem verbal. Não importa como as pessoas pronunciem o terceiro segmento que aparece na palavra carta, pois o som que o carioca produz só tem de parecido com o que um gaúcho de Bagé diz pelo fato de que são consoantes, e só! Mas o fonema é o mesmo!” (SCLIAR-CABRAL, 2013, p. 103). 42 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO GÊNERO TEXTUAL: Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas. Em contraposição aos tipos, os gêneros são enti- dades empíricas em situações comunicativas e se expressam em designações diversas, constituindo em princípio listagens abertas. [...]. Como tal, os gêneros são formas textuais escritas ou orais bas- tante estáveis, histórica e socialmente situadas” (MARCUSCHI, 2008, p. 155). GRAFEMA: “Uma ou mais letras que representam um fonema (no sistema alfabético do português do Brasil, não mais que duas letras)”. (SCLIAR-CABRAL, 2003, p. 27). LEITURA: Ler é um processo receptivo uma vez que o indi- víduo recebe o texto produzido, cabendo a ele a descodificação, compreensão, interpretação e re- tenção da informação. (HEINIG, 2003, p. 24). A leitura é um processo de construção de sentidos, ou seja, há uma ação do leitor sobre o lido, que lhe permite atuar num movimento de ir e voltar ao texto numa relação com o dito pelo autor, não focando apenas na extração do significado, mas interagindo sobre/ com o escrito a fim de relacionar o que se apresenta, a sua composição, a escolha lexical, a ordem dos argumentos ou informações. O sentido que o leitor constrói exige dele ações sobre o dito e o não dito. (HEINIG, 2019, p.107-8). 43 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO LETRAMENTO: Um conjunto de práticas sociais, que envolvem o texto escrito, não do ponto restrito da linguagem, mas de qualquer texto. Portanto, aí vamos enveredar por um letramento que é plural, envolve, integra outras linguagens que não é apenas a linguagem verbal através dos textos. Então, o sentido plural localiza essas práticas na vida das pessoas, práticas que são realizadas com finalidades para atingir os seus fins específicos de vida, e não um conjunto de competências que estão armazenadas na cabeça das pessoas. (DIONÍSIO, 2007, p. 211). O letramento refere-se ao processo de inclusão e participação na cultura escrita, envolvendo o uso da língua em situ- ações reais. Ou seja, constitui conjunto de conheci- mentos, atitudes e capacidades indispensáveis para o uso da língua em práticas sociais que requerem habilidades mais complexas. (SANTA CATARINA, 2005, p.24). LÍNGUA: Tomamos a língua não como um sistema de cate- gorias gramaticais abstratas, mas como uma língua ideologicamente saturada, como uma concepção de mundo, e até como uma opinião concreta que garante um maximum de compreensão mútua, em todas as esferas da vida ideológica. Eis porque a língua única expressa as forças de união e de cen- tralização concretas, ideológicas e verbais, que de- correm da relação indissolúvel com os processos de centralização sócio-política e cultural. (BAKHTIN, 2010, p. 81). As línguas, compreendidas como instru- mentos psicológicos de mediação simbólica, possi- bilitam aos sujeitos a veiculação de saberes de toda ordem, considerando que é por meio da oralidade, 44 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO da escrita, da sinalização em línguas de sinais e das linguagens viso-gestuais, que os processos de ensino e aprendizagem acontecem em todas as áreas do conhecimento, tanto quanto é por meio da escrita que os conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, em suas constantes ressignifica- ções, têm lugar nas práticas escolares. Os sujeitos, movidos pela sociointeração, nomeiam o mundo, atribuem valor a ele, organizando sua experiência por meio das línguas. (SANTA CATARINA 2014, p. 112). LINGUAGEM: A linguagem comum e única é um sistema de nor- mas linguísticas. Porém, tais normas não são um imperativo abstrato, mas sim forças criadoras da vida da linguagem. (BAKHTIN,2010, p. 81). Assim, na prática viva da língua, a consciência linguística do locutor e do receptor nada tem a ver com um sistema abstrato de formas normativas, mas ape- nas com a linguagem no sentido de conjunto de contextos possíveis de uso de cada forma particular. Para o falante nativo, a palavra não se apresenta como um item de dicionário, mas como parte das mais diversas enunciações dos locutores A, B ou C de sua comunidade e das múltiplas enunciações de sua própria prática linguística (BAKHTIN/VOLO- CHÍNOV, 1992, p. 95). MÉTODO: Conjunto de procedimentos que, com base em teo- rias e princípios linguísticos e psicológicos, orientam essa aprendizagem, em cada uma das suas facetas. No entanto, os métodos não atuam autonomamen- te, sem limitações e obstáculos; constituídosde procedimentos de interação entre alfabetizador(a) e alfabetizandos, efetivam-se na inter-relação entre 45 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO participantes diferenciados, em situação de apren- dizagem coletiva, em um contexto escolar inserido em determinada comunidade socioeconômica e cultural. Ou seja: os métodos [...] configuram-se como um processo de grande complexidade. (SO- ARES, 2016, p. 50-1). Complementando: “[...] reverte os termos da expressão métodos de alfabetização para alfabetizar com método: orientar a criança por meio de procedimentos que, fundamentados em teorias e princípios, estimulem e orientem as operações cognitivas e linguísticas que progressi- vamente a conduzam a uma aprendizagem bem- -sucedida da leitura e da escrita em uma ortografia alfabética” (SOARES, 2016, p. 331). PRODUÇÃO DE TEXTO: A produção de textos insere-se nesse mesmo uni- verso dialógico, no qual um conjunto de aspectos precisa ser considerado quando se trata de atividade proposta na/pela escola: que se tenha o que dizer; que se tenha razão para dizê-lo; que se tenha para quem dizê-lo; que o locutor/autor se assuma como tal; e que se escolham estratégias para dizê-lo. Es- ses aspectos procuram dar conta das condições de produção que normalmente cercam o ato de escrever e, por isso, garantem, minimamente, que, de fato, na escola se produzam textos e não se fa- çam redações/composições, as quais tendem a não ter sentido fora da escola já́ que correspondem a formas de usar as línguas restritas à ambientação escolar. A produção de textos, assim, sempre se dá em ge ̂neros do discurso e, para produzir um texto em um determinado gênero, é preciso que estudantes tenham vivenciado interações com au- tores por meio de tais gêneros antes de realizar as produções. (SANTA CATARINA, 2014, p. 127). 46 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO PROJETO DE LETRAMENTO: Prática social em que a escrita é utilizada para atin- gir algum outro fim, que vai além da mera apren- dizagem da escrita (a aprendizagem dos aspectos formais apenas), transformando objetivos circulares como ‘escrever para aprender a escrever’ e ‘ ler para aprender a ler’ em ler e escrever para compreender e aprender aquilo que for relevante para o desen- volvimento e realização do projeto (KLEIMAN, 2000, p. 238). (OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS, 2011, p. 47). SEA (SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICO): É um sistema de representação e não um código. O sistema alfabético é o sistema primeiro, não é um sistema de substituição de outro preexistente – não é um código, a não ser que se considerasse que os grafemas “substituem” os sons da fala, o que não é linguisticamente verdadeiro: os grafemas represen- tam os sons da fala, e o sistema de escrita alfabético foi inventado como um sistema de representação, não como um código. (SOARES, 2016, p. 47). SENTIDO: O tema é um sistema de signos dinâmico e com- plexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de um dado momento da evolução. O tema é uma reação da consciência em devir ao ser em devir. A significação é uma aparato técnico para a realização do tema. (BAKHTIN/VOLOCHÍ- NOV,1992, p.129). SIGNIFICADO: A significação não quer dizer nada em si mesma, ela é apenas um potencial, uma possibilidade de sig- nificar no interior de um tema concreto. ( BAKHTIN/ 47 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO VOLOCHÍNOV,1992, p.131). Por isso, a investigação de uma palavra pode apontar para significação contextual ou para a significação da palavra no sistema da língua, ou seja, em estado de dicionário. SEQUÊNCIA DIDÁTICA: Corresponde a um conjunto de atividades articula- das que são planejadas com a intenção de atingir determinado objetivo didático. É organizada em torno de um gênero textual (oral ou escrito) ou de um conteúdo específico, podendo envolver dife- rentes componentes curriculares. No caso de sua relação com o ensino da escrita, a sequência pode ter como objetivo ajudar o aluno a dominar melhor um determinado gênero textual, favorecendo uma comunicação mais adequada em dada situação em que o uso do gênero trabalhado se faz necessário (planejamento e produção de uma apresentação oral em evento da escola, ou de cartas do leitor a se- rem enviadas a revistas, por exemplo). É importante que as atividades propostas na sequência didática para o trabalho com gêneros textuais atendam à finalidade do gênero e a possibilidade de adequação aos destinatários que estão fora da escola, e não apenas para o professor e os colegas de turma. No segundo caso, em que a sequência é organizada em torno de conteúdos específicos, o foco é a apropria- ção de um determinado conceito ou procedimento (uso de determinada regra ortográfica, discussão sobre reciclagem, entre outros). [...] A sequência didática é uma forma de organização do traba- lho pedagógico que permite antecipar o que será enfocado em um espaço de tempo que é variável em função do que os alunos precisam aprender, da mediação e do constante monitoramento que o professor faz para acompanhar os alunos, por 48 POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO meio de atividades de avaliação durante e ao final da sequência didática. (PESSOA, A. C. G. Disponí- vel em: http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/ glossarioceale/verbetes/sequencia-didatica). SISTEMA ORTOGRÁFICO: A ortografia é uma convenção necessária e não tão arbitrária como dizem alguns que a ensinam sem verdadeiramente conhecê-la. Mattoso Câmara Jr. (1968, p. 175) afirma que a grafia é uma técnica para o uso da comunicação escrita. A língua portuguesa reporta-se aos elementos da fonação. Nas línguas ocidentais, que utilizam a escrita alfabética, os gra- femas, representados por letras, se reportam à re- alização dos fonemas, e as letras são completadas pela pontuação e pelos sinais diacríticos. Sendo con- venção, então, nas línguas em que existe a escrita, a tendência é fixar um sistema estrito de grafia, o qual é denominado de orto (ortho) de origem grega que significa “correto”. (HEINIG, 2003, p. 42-3). APRESENTAÇÃO POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO PARA A REDE ESTADUAL DE ENSINO AÇÕES PARA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA DE ALFABETIZAÇÃO REFERÊNCIAS GLOSSÁRIO
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